ESTRATÉGIAS DE IMPLEMENTAÇÃO E EFEITOS DE ARRASTE DOS GRANDES PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO...

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Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo ESTRATÉGIAS DE IMPLEMENTAÇÃO E EFEITOS DE ARRASTE DOS GRANDES PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO NACIONAIS: EXPERIÊNCIAS DO PROGRAMA NUCLEAR DA MARINHA DO BRASIL CF (EN) Leonam dos Santos Guimarães Coordenador do Programa de Propulsão Nuclear Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo [email protected] .mil.br / tel: (011) 3817-7148 Resumo O desenvolvimento da ciência e tecnologia, para o qual a criatividade e a inovação têm que estar necessariamente presentes, suporta-se em três premissas fundamentais: a primeira delas se deve à existência do cérebro humano e ao incentivo à sua potencialidade; a segunda pode ser localizada na mobilização das pessoas e instituições em torno de objetivos, de bandeiras, de metas geradoras de algum benefício estratégico ou social; a terceira refere-se ao esforço nacional, canalizando recursos adequados para a área científica e tecnológica. A Marinha do Brasil, através de seu Centro Tecnológico em São Paulo desenvolveu uma abordagem particular para viabilizar estas três premissas básicas de forma a efetivar um salto tecnológico que permitisse ao Poder Naval Brasileiro, através da aplicação da propulsão nuclear para submarinos, aceder a um patamar de credibilidade compatível com a sua importância no cenário mundial. Este programa vem, desde o início dos anos 80, apresentando resultados altamente significativos não só no sentido vertical da efetiva consecução de suas metas, como também no sentido horizontal de disseminação das técnicas desenvolvidas através dos efeitos de arraste, ou seja aplicação dos resultados da Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) nuclear em outros setores, e de diversificação, que se refere a uma deliberada abertura do programa a outras atividades não estritamente nucleares. XI XI XI XI XI

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Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo

ESTRATÉGIAS DE IMPLEMENTAÇÃO E EFEITOS DE ARRASTE DOSGRANDES PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO

NACIONAIS: EXPERIÊNCIAS DO PROGRAMA NUCLEAR DA MARINHA DOBRASIL

CF (EN) Leonam dos Santos GuimarãesCoordenador do Programa de Propulsão NuclearCentro Tecnológico da Marinha em São Paulo

[email protected] / tel: (011) 3817-7148

Resumo

O desenvolvimento da ciência e tecnologia, para o qual a criatividade e ainovação têm que estar necessariamente presentes, suporta-se em três premissasfundamentais: a primeira delas se deve à existência do cérebro humano e ao incentivoà sua potencialidade; a segunda pode ser localizada na mobilização das pessoas einstituições em torno de objetivos, de bandeiras, de metas geradoras de algumbenefício estratégico ou social; a terceira refere-se ao esforço nacional, canalizandorecursos adequados para a área científica e tecnológica. A Marinha do Brasil,através de seu Centro Tecnológico em São Paulo desenvolveu uma abordagemparticular para viabilizar estas três premissas básicas de forma a efetivar um saltotecnológico que permitisse ao Poder Naval Brasileiro, através da aplicação dapropulsão nuclear para submarinos, aceder a um patamar de credibilidadecompatível com a sua importância no cenário mundial. Este programa vem, desde oinício dos anos 80, apresentando resultados altamente significativos não só nosentido vertical da efetiva consecução de suas metas, como também no sentidohorizontal de disseminação das técnicas desenvolvidas através dos efeitos de arraste,ou seja aplicação dos resultados da Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) nuclear emoutros setores, e de diversificação, que se refere a uma deliberada abertura doprograma a outras atividades não estritamente nucleares.

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PALAVRAS -CHAVE : Transferência de Tecnologia; Programas Mobilizadores; ArrasteTecnológico; Energia Nuclear; Indústria Naval

Abstract

The science and technology development, for which creativity and innovationmust be always present, are supported by three fundamental principles: the first isrelated to existence of human brains and good conditions for its realizations; thesecond could be located in people and institution mobilization for accomplishmentof objectives and goals which generate strategic or social benefits; the third arerelates to a national effort, making sufficient resources reach the scientific andtechnological areas. Brazilian Navy, trough its Technological Center in São Paulo,developed a particular approach to follow these principles in order to get atechnological “jump” which will give Brazilian Naval Power, through submarinenuclear propulsion, the capabilities required by the nation´s importance in theinternational scene. This Program, started in the early 80´s, has presented veryimpressive results, not only in the vertical sense pointing to its goal, but also in thehorizontal sense of diversification, referring to a deliberate change of activitiesaway from purely nuclear, and spin-offs, referring to application of results of nuclearR&D outside nuclear sector.KEYWORDS: TECHNOLOGICAL CHANGE; COOPERATIVE RESEARCH; SPIN-OFF EFFECTS; NUCLEAR

ENERGY; NAVAL INDUSTRY

“The development of naval nuclear propulsion plants is a goodexample of how one goes about getting a job done. It is a good subjectto study for methods... It has involved the establishment of proceduresand ways of doing government business for which there was noprecedent, and which I believe will be necessary in the future for similarlarge projects.”

Hyman George RickoverAdmiral, US NAVY

1. INTRODUÇÃOOs saltos tecnológicos alcançados pela indústria brasileira através de grandes

programas de desenvolvimento tecnológico tais como, sem pretender ser exaustivo, oPrograma de Satélites conduzido pelo INPE, o Programa de Águas Profundas conduzidopela PETROBRÁS e o Programa de Propulsão Nuclear conduzido pela Marinha doBrasil, indicam de maneira inequívoca o caminho a ser seguido para o efetivodesenvolvimento e disseminação de tecnologias avançadas no País.

Com efeito, esta constatação nada possui de original, pois a estratégia dedesenvolvimento científico e tecnológico através da implementação de grandes projetosnacionais vem sendo intensivamente praticada desde a Segunda Guerra Mundial pelasnações desenvolvidas. Os maiores e mais significativos exemplos desta estratégiapodem ser identificados no nosso sempiterno paradigma que são os EUA. Láencontraremos o que talvez tenha sido o pioneiro destes programas, o Projeto

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Manhattan (desenvolvimento de artefatos nucleares), que apesar de seus objetivoseticamente criticáveis, inquestionavelmente alterou para sempre os destinos dahumanidade. Os efeitos de arraste tecnológico do Programa Espacial americano, emespecial das missões Apollo, são amplamente conhecidos. Talvez menos divulgado,mas também altamente relevante, foram os efeitos do Programa de Propulsão Nuclearda U.S. Navy, que está na origem de 70% do parque eletro-nuclear mundial, baseadoem reatores do tipo PWR, que foram concebidos dentro de seu escopo, e que lançouas bases para disseminação das práticas de Garantia da Qualidade na indústria.

2. CARACTERÍSTICAS DOS PROGRAMAS DE ARRASTE TECNOLÓGICOA principal característica de um programa de arraste tecnológico é sua motivação,

provocada por um forte vontade política, capaz de criar um verdadeira bandeira juntoa qual uma significativa parcela da sociedade civil estaria pronta a cerrar fileiras.Evidentemente, para que esta motivação exista, torna-se indispensável uma definiçãoclara e uma divulgação objetiva dos reais benefícios estratégicos ou sociais que oprograma propõe-se a efetivar.

Destes benefícios provem uma segunda e fundamental característica destesprogramas: eles não podem ser analisados dentro da estrita racionalidade econômico-financeira, pois uma significativa parte de seus resultados são contabilmenteintangíveis. Uma rápida revisão dos acontecimentos deste século pode-nos mostrarde maneira clara que os verdadeiros saltos científicos e tecnológicos alcançados nesteperíodo não foram, e nem poderiam ser, motivados pela (ir)racionalidade dos mercados.Tal afirmativa não deve entretanto ser interpretada como uma crítica ao ideário liberal:a mesma revisão dos acontecimentos deste século nos mostra também que as forçasde mercado são as únicas capazes de efetivamente viabilizar a disseminação no seio dasociedade dos benefícios materiais decorrentes dos saltos tecnológicos, constituindoa derrocada da URSS o exemplo mais evidente deste fato.

Das razões da inadequação das forças de mercado em produzir reais saltostecnológicos podemos depreender duas outras características dos programas de arrastetecnológico: seu longo prazo de maturação, associado à perenidade dos seus efeitosinduzidos, e a impossibilidade de contabilização financeira da globalidade destes efeitos.Estas duas características estão à raiz das dificuldades da abordagem econômico-financeira destes programas e a incapacidade dos mercados a executá-los (“a longoprazo estaremos todos mortos ...”).

A dinâmica de execução dos programas de arraste apresenta também ascaracterísticas peculiares de multi-disciplinaridade, acarretando o envolvimento dediversas instituições, cada uma com sua cultura, idiossincrasias e modos de operaçãoespecíficos. Um projeto de arraste envolve então, simultaneamente e em diversasáreas, atividades de pesquisa básica, apoiadas por universidades, atividades depesquisa aplicada, apoiada por institutos especializados, atividades de desenvolvimentode materiais, componentes e instalações-protótipo, apoiadas por centros tecnológicos,e atividades de produção, apoiadas por indústrias. Evidentemente, para transformareste conjunto de instituições, a princípio desconexas e não comunicantes, em um

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sistema harmônico e organizado, no qual a partir da entrada de recursos suficientes(input) possam sair os produtos físicos (output) estabelecidos pelas metas do programa,torna-se necessária a implementação de uma estratégia gerencial particular.

A concepção, o desenvolvimento e a operacionalização desta estratégia,específica a cada programa de arraste tecnológico, constituem outra característicaparticular. Esta estratégia depende evidentemente dos objetivos e metas do programae de seus fatores condicionantes, de ordem científica, tecnológica, política, econômicae financeira. Entretanto, pode-se distinguir uma aspecto comum: em nenhum caso elespodem ser conduzidos de forma convencional e burocrática. As dimensões dos desafiosa que estes programas se propõe a superar exigem criatividade, inovação, audácia,profissionalismo e, principalmente, uma inabalável fé na importância de seus objetivose na essencialidade de suas metas, numa escala sem paralelo.

Resumidamente, podemos considerar que um projeto de arraste tecnológicorequer:• uma “massa crítica” de cérebros humanos, reunidos num ambiente que estimuleo pleno desenvolvimento de suas potencialidade;• a motivação, gerada por um objetivo colimador de esforços e sobre o qual não

pairem dúvidas sobre os benefícios estratégicos e sociais que dele virão a serderivados;

• um planejamento de metas intermediárias coerente e consistente com esteobjetivo, que seja de conhecimento de todos os envolvidos e sobre qual haja umconvencimento geral sobre sua adequação;

• uma abordagem gerencial que otimize a alocação de recursos (que serão sempreinsuficientes ...), de forma a aproveitar da melhor forma possível o esforço a serdispendido.3. DESENVOLVIMENTO DA ENERGIA NUCLEAR E O CONTEXTO DE P&D

As aplicações da energia nuclear para geração de potência tem sidodesenvolvidas em muitos países industrializados desde os anos 40. Os primeirosresultados iniciaram com a construção de reatores de pesquisa ou demonstração debaixa potência, principalmente para a compreensão dos fenômenos básicos, geraçãode dados, teste de combustíveis nucleares e componentes de reatores e para produçãode rádio-isótopos. A fase seguinte consistiu na produção em larga escala decombustíveis nucleares e a construção dos primeiros reatores nucleares de baixapotência. Ao mesmo tempo, vários organismos reguladores foram criados em muitospaíses, produzindo um grande volume de regulamentações e normas de projeto.tr:O estabelecimento deste novo setor industrial e suas numerosas ramificaçõesem vários outros setores exigiu o suporte de um enorme esforço de P&D. Esta P&Dcresceu em paralelo com a expansão da geração de potência pela energia nuclear, quepartiu de zero em 1950 para atingir cerca de 400 GW elétricos em 2000.

Para atingir a situação atual, foi requerido P&D em uma grande variedade deáreas, como por exemplo:• pesquisa básica sobre o fenômeno de fissão nuclear e os meios de controlá-la;

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• materiais estruturais e equipamentos para contenção de materiais nucleares;• projeto e construção de reatores, de acordo com vários princípios, tornando

sua operação segura;• técnicas de análise probabilística;• enriquecimento isotópico de materiais físseis;• projeto e fabricação de combustível;• reprocessamento do combustível usado e reciclagem do plutônio recuperado;• manuseio de rejeitos garantindo seu gerenciamento seguro e, finalmente, sua

disposição final;• modelagem matemática da operação do núcleo de reatores sob condições

especiais e avaliação da segurança e/ou riscos residuais;• desenvolvimento em eletrônica e instrumentação; e• desenvolvimento de equipamentos eletro-mecânicos de grande porte, tais como

bombas, trocadores de calor, turbinas e alternadores.Esta P&D foi principalmente suportada pelos governos: as contribuições do

setor privado restringiram-se, na maior parte dos casos à construção e operação deinstalações de demonstração industrial. A P&D financiada pelos governos introduziumuitas novas áreas de “excelência” científica e tecnológica, tanto no setor públicoquanto no privado.

Logo após os programas de P&D em energia nuclear apresentarem resultados,desenvolveu-se uma consciência em diversas organizações industriais que as novastécnicas desenvolvidas para o uso da energia nuclear poderiam também ser exploradasem outros setores da ciência, tecnologia e indústria. Esta foi a origem das idéias sobre“diversificação” em outras atividades. Quando o setor nuclear atingiu sua maturidadetécnica e competitividade, alguns centros de P&D e indústrias começaram a converterparte de suas atividades e serviços em direção a outros objetivos.

Enquanto “diversificação” se refere a uma mudança deliberada de missão paraalém das atividades inseridas no contexto inicial, a aplicação dos resultados da P&Dnuclear em outros setores científicos, tecnológicos e industriais é denominada “efeitode arraste”(“spin-off”). O efeito de arraste, não exclusivo do setor nuclear, constituium mecanismo largamente difundido através do qual vários setores da ciência etecnologia se influenciam mutuamente. O efeito de arraste, mesmo sendo reconhecidocomo altamente relevante é, quase que por definição, tratado com uma prioridadesecundária. Constitui entretanto uma realidade indiscutível: o volumoso investimentohumano, intelectual e material no setor nuclear servem a diversos outros propósitos,ainda que nem todos possam ser quantificados nem tenham um valor monetário direto,possibilitando inúmeros benefícios nos demais setores científicos, tecnológicos eindustriais. O desenvolvimento da energia nuclear introduziu muitas novas áreas deexcelência científica ou técnica, muito além de seu domínio.

Atualmente, considerando-se a hipótese de uma expansão da capacidade nuclearinstalada, ou mesmo que esta capacidade permaneça estabilizada, mais P&D é requeridaem áreas tais como:• controle de reatores, interação homem-máquina e robótica;

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• uso mais econômico dos recursos energéticos contidos no combustível;• otimização da operação de reatores e extensão de sua vida útil;• desenvolvimento de tipos mais econômicos de reatores;• descomissionamento seguro de instalações nucleares, incluindo reatores e

instalações ligadas ao ciclo do combustível;• armazenamento seguro de combustíveis usados e rejeitos; e• mais recentemente, absorção pelo setor civil dos estoques de materiais nucleares

militares desativados.A P&D em andamento tem introduzido muitas novas áreas de “excelência”

científica e tecnológica, financiada tanto pelo setor público como pelo privado.

4. MOTIVAÇÃO DO PROGRAMA DA MARINHAEm 1978 amadureceu na Marinha a idéia de que seria conveniente para o Brasil

dispor de submarino com propulsão nuclear, para que pudéssemos ser, ao início doséculo XXI, uma potência naval compatível com as dimensões dos interesses brasileirosno mar e com nossa vulnerabilidade marítima. E por que, especificamente, é importantecontar com a propulsão nuclear?• Queiramos ou não, somos um País debruçado sobre o Oceano Atlântico, com

7408 km de extensão de costa oceânica;• De nossa população, de aproximadamente 145 milhões de habitantes, cerca de

105 milhões de pessoas, ou seja, 72,4%, vivem numa faixa litorânea até 100 km dacosta;

• Mais de 90% de nosso comércio exterior se faz por via marítima; e• Consideradas apenas as 200 milhas para nossa zona costeira de influência

econômica, temos uma superfície de 2.750.000 km2, que equivalem a 32,3% da áreacontinental. Na realidade, segundo o consenso internacional, essa zona de influênciaeconômica compreende toda a plataforma continental, que em nosso caso é superiora 200 milhas em alguns trechos. Dessa plataforma extraímos hoje dois terços denossa produção petrolífera, e a mesma é sabidamente muito rica também em outrosminerais.

Para preservarmos tantos interesses marítimos, é essencial que estejamospreparados para, caso necessário, controlar áreas marítimas estratégicas ou negar oseu controle por potências estrangeiras e impedir a exploração econômica por umoutro país sem nossa concordância, de áreas marítimas dentro da zona de exploraçãoeconômica exclusiva de nosso país.

Precisamos, portanto, possuir uma Marinha eficaz e eficiente, i.e. ao menorcusto possível para nossa sociedade. Como é previsível que por muito tempo nãopoderemos contar com uma esquadra poderosa o suficiente para garantir a defesa denossos interesses, a efetividade da defesa marítima tem, necessariamente, que privilegiaro fator surpresa, que atualmente só pode ser proporcionado pelo submarino.

O advento dos satélites e dos modernos sistemas de sensoreamento remotopraticamente eliminam a possibilidade de os navios de superfície escaparem à deteção.

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Isto se aplica também, em escala algo mais limitada, aos submarinos convencionais.Com efeito, esses têm que periodicamente operar próximo à superfície, na condição de“snorkel”, para recarregar suas baterias. Devido à exposição de mastros e ao elevadonível de ruído irradiado pelos motores diesel, sua deteção por sensores convencionais,eletromagnéticos e acústicos, empregados por navios de superfície, aeronaves esubmarinos inimigos é extremamente facilitada por esta condição de operação. Alémdisto, a descarga de gases de exaustão dos motores diesel próximo a superfície do margera um contraste térmico passível de deteção pelos sensores infra-vermelhos instaladosem satélites para sensoreamento remoto.

A inexistência da necessidade imperativa de operar periodicamente próximo àsuperfície, podendo permanecer longos períodos submerso, aliada a um projetocriterioso visando a minimização do nível de ruído irradiado, adotando-se certas soluçõestécnicas tais como a utilização da circulação natural para o resfriamento do reator,tornam a deteção de um submarino nuclear extremamente difícil.

O submarino de propulsão nuclear constitui-se na alternativa mais eficiente eeconômica de que a Marinha pode dispor para atuar de maneira crível na defesa dosinteresses nacionais: seu custo é da mesma ordem de grandeza de duas fragatas similaresàs disponíveis atualmente e sua eficácia é muito maior.

Uma evidência da importância da propulsão nuclear é a existência atual decerca de 500 navios militares com propulsão nuclear (dos quais cerca de 480 sãosubmarinos) construídos ou em construção: em média um navio nuclear entrou emoperação a cada mês nesta última década.

Atualmente cinco países operam navios nucleares: China Popular, EstadosUnidos, França, Grã-Bretanha e Rússia. Todos esses países projetaram e construíramseus próprios navios de maneira autônoma. Apenas a Grã-Bretanha recebeu apoiotécnico norte-americano no início de seu programa de desenvolvimento.

O elenco limitado de países que possuem navios nucleares (a imensa maioriadestes constituída por submarinos) pode sugerir que esses navios se constituem emuma arma cara, privilégio de nações ricas, com interesses estratégicos globais. Trata-se, porém de um oligopólio essencialmente tecnológico, de imenso potencial econômico,zelosamente protegido pelos países que detêm a tecnologia.

Resulta, portanto, que é indispensável à nossa Marinha possuir a propulsãonuclear para poder exercer sua missão ao menor custo para a sociedade.

Por outro lado, considerando os aspectos extra-Marinha, simultaneamentetemos certeza de que a energia nuclear é forte candidata a complementar as necessidadesde nossa matriz energética em futuro não muito distante, face ao esgotamento denosso potencial hidroelétrico e ao custo e problemas técnicos associados às outrasalternativas. Assim sendo, é fundamental que nos capacitemos para exercer a opção

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nuclear, quando ela se fizer necessária, sem dependência e tutela externas no tocanteà tecnologia e aos fornecimentos.

5. ANTECEDENTES DO PROGRAMA DA MARINHA

No final da década de 70, a situação da pesquisa nuclear no Brasil não era nadaanimadora, pois desde meados do decênio anterior tinha havido um arrefecimento dosesforços autóctones de viabilização do ciclo do combustível.

Para compensar o atraso no qual o país se encontrava nessa área, foi celebradoem 1975 o Acordo Brasil-Alemanha, no qual os segmentos sociais que então detinhamo poder de decisão depositaram grandes esperanças. Esse acordo chegou a causarinicialmente alguma apreensão na comunidade internacional; os contratos e as medidaspolíticas e administrativas tomadas como decorrência, entretanto, acalmaram essacomunidade e marcaram uma época de grandes gastos e poucos resultados.

Em 1978, todos os institutos de pesquisa nuclear antes subordinados à ComissãoNacional de Energia Nuclear (CNEN) haviam sido transferidos para a entãoNUCLEBRÁS. Todos os diretores técnicos das subsidiárias desta eram, por contrato,necessariamente alemães. Era razoável, portanto, que houvesse um esvaziamento dapesquisa nos institutos nacionais, se não por razões comerciais, pelo menos pelanatural identificação desses diretores com os centros de pesquisa estrangeiros a quepertenciam.

O único instituto que não fora assimilado pela NUCLEBRÁS tinha sido oInstituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) de São Paulo. Como entretantoesse havia sido transferido pelo Governo Federal ao Governo do Estado de São Paulono início da década de 70, contrariando uma tendência mundial de manutenção dapesquisa nuclear na esfera federal, não contava o IPEN com o apoio nem daNUCLEBRÁS nem da CNEN. Embora tivesse seu custeio assumido pelo Estado de SãoPaulo, não dispunha esse Instituto de nenhum grande programa para catalisar edirecionar seus esforços e sua capacidade.

Tínhamos um paradoxo: o maior instituto de pesquisas nucleares do país, oIPEN, estava praticamente à margem e sem incentivo - uma prova cabal desse estadode coisas foi a mudança, a 16 de março de 1979, da razão social do Instituto, com a trocado nome Instituto de Energia Atômica (IEA) para Instituto de Pesquisas Energéticas eNucleares (IPEN). Essa mudança indicava o desalento, e este levava à busca de novoscaminhos, com a atividade nuclear se transformando em atividade complementar.

Resumindo, em 1978 e no início de 1979, a CNEN se encontrava atrofiada,apenas com atividades regulamentadoras e fiscalizadoras, sem o lastro técnicoproporcionado pela pesquisa, e com atribuições de coordenar o Programa Pró-Nuclearde formação de recursos humanos. A NUCLEBRÁS apostava tudo na transferência detecnologia alemã, muito embora propagandeasse alguma pesquisa. O IPEN estavatotalmente à margem dos acontecimentos.

Em virtude das pressões sobre os signatários do Acordo Brasil-Alemanha,este era extremamente restritivo no que diz respeito à aplicação de qualquer tecnologia,produto ou informação técnica dele decorrentes, na defesa de nosso País. Além disso,

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a transferência de tecnologia prevista no acordo restringia-se essencialmente aodetalhamento de projetos concebidos no estrangeiro. Pode-se afirmar com segurançaque os dispêndios decorrentes do dito Acordo pouquíssimo contribuíram para noscapacitar a executar as fases mais nobres da técnica de projeto - a concepção e oprojeto básico - que são aquelas que efetivamente têm um efeito multiplicadorsignificativo no domínio das tecnologias de ponta.

Valeria recordar que a principal razão que motivou o Brasil a assinar aqueleAcordo foi o desejo de dominar o ciclo do combustível nuclear. Naquela época, a usinade Angra-I já estava em construção e o volume de informações que dispúnhamos eque iríamos dispor em decorrência daquela usina não seria em muito ampliado com aimplantação das demais centrais núcleo-elétricas previstas no Acordo. Além do mais,o acesso à importação de usinas nucleares não nos era então bloqueado - e continuaa não sê-lo - todas as restrições e bloqueios de cunho político estavam, e continuam aestar, concentrados na tecnologia do ciclo do combustível. Caberia também acrescentarainda que a aquisição paulatina de centrais núcleo-elétricas, na medida das reaisnecessidades energéticas do País, permitiria a incorporação dos avanços tecnológicos,o que não seria possível pela compra em pacote de um grande número dessas usinas,conforme preconizado pelo dito Acordo.

Quando da assinatura do Acordo, o País já dominava a etapa inicial do ciclo docombustível - da mineração do urânio até a produção do “yellow cake” - nas instalaçõesde Poços de Caldas e o Centro de Engenharia Química do IPEN já dominava, em escalalaboratorial, as etapas de purificação e produção de hexafluoreto de urânio. Ainda noIPEN, já havia incursões às etapas de reconversão e produção de pastilhas. Em suma,a competência de uma equipe reduzida daquele instituto tinha feito com que as etapasdo ciclo do combustível que dependiam fundamentalmente da Química apresentassemum bom grau de adiantamento.

Sem dúvida, a etapa do ciclo do combustível nuclear que representa o maiordesafio tecnológico e que por esta razão motivara o Acordo Brasil-Alemanha é oenriquecimento isotópico de urânio. O Acordo nada mais era que um grande pacote decompra de centrais nucleares para motivar a venda da tecnologia de enriquecimento.

A tecnologia de enriquecimento que os alemães haviam desenvolvido e queinicialmente se dispunham a transferir era a da ultra-centrifugação. Tivemos então, naassinatura dos contratos comerciais em que se desdobrou o Acordo, um fato insólito:alegando bloqueio da Holanda, um de seus parceiros no consórcio URENCO, bloqueioeste que teria sido motivado por pressão dos EUA durante a negociação dos contratos,a Alemanha retirou a possibilidade de venda da tecnologia de ultra-centrifugação.

Ofereceu, como sucedânea, a tecnologia de enriquecimento por jato centrífugo(“jet nozzle”), que se encontrava e ainda se encontra em desenvolvimento - nósbrasileiros participaríamos deste desenvolvimento, financiando-o. Infelizmente nossosnegociadores de contratos aceitaram essa modificação, o que significa que concordaramque nossos cofres públicos pagassem um alto preço por um grande pacote de comprade centrais que trazia em seu bojo o desenvolvimento de uma tecnologia de

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enriquecimento isotópico de urânio - o ponto principal do Acordo - que por sinal nãoera, e continua não sendo, nada promissora sob os aspectos técnicos e econômicos.

6. ESCOPO DO PROGRAMA DA MARINHA

Apesar do panorama desanimador ao fim dos anos 70, a Marinha vislumbrou apossibilidade de reverter as perspectivas futuras, através do lançamento de umprograma integrado de pesquisa e desenvolvimento. Desde 1978 ficou claro que umprograma de capacitação para a propulsão nuclear teria que partir de um esforçoautônomo genuinamente nacional e teria que compreender a viabilização do ciclo docombustível nuclear com tecnologia nacional, independente do Acordo Brasil-Alemanha, e a capacitação em projeto de pequenos reatores de potência do tipo PWR,com vistas à aplicação na propulsão de submarinos.

A importância do domínio do ciclo do combustível nuclear decorre do fato deque as restrições e o bloqueio internacionais, conforme anteriormente citado, estãoconcentrados na respectiva tecnologia. Aliás, como também já foi citado, a principalmotivação brasileira para a assinatura do Acordo Brasil-Alemanha foi a necessidadede se dominar essa tecnologia, já que a importação de centrais nucleares, principalobjeto comercial do acordo, não era bloqueada naquela época, e continua não sendo.

A etapa do ciclo do combustível que representa o maior desafio tecnológico éo enriquecimento isotópico de urânio, que por isso sempre mereceu a maiorconcentração de esforços daquela vertente do programa voltada para o ciclo docombustível.

A tecnologia escolhida foi a de enriquecimento por ultracentrifugação,considerada a mais promissora para um desenvolvimento independente.

Em 1981, um ano após ter sido completado seu projeto, concluiu-se a fabricaçãodo primeiro protótipo de ultracentrífuga, e em setembro de 1982 realizou-se com sucessoa primeira operação de enriquecimento isotópico de urânio com equipamentocompletamente projetado e construído no Brasil.

Em 1983 o programa foi revisto e ampliado, passando-se do desenvolvimentode ultracentrífugas para o de usinas de enriquecimento isotópico. Ou seja, teve inícioum esforço de nacionalização e industrialização de todos os equipamentos periféricosdas usinas de enriquecimento.ÿ: Em abril de 1988 foi inaugurado o Laboratório de Enriquecimento Isotópico(LEI), que constitui a primeira etapa da Usina de Demonstração de EnriquecimentoIsotópico de Urânio. A conclusão dessa usina constitui a principal meta do programa,no que diz respeito ao ciclo do combustível nuclear. Por outro lado as demais usinas dedemonstração do ciclo já foram projetadas, e o início das respectivas construçõesdepende exclusivamente do aporte de recursos.

No tocante ao desenvolvimento da capacidade de projeto e construção decentrais nucleares, optou-se pelo estabelecimento de metas intermediárias, paracapacitação nas áreas de projeto do núcleo de reatores, termohidráulica de alta pressãoe equipamentos a vapor, convergindo-se, então, para o projeto e construção de umreator de potência de pequeno porte.

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As metas intermediárias estão se concretizando na forma de grandesexperimentos de validação dos cálculos teóricos. Assim é que, em novembro de 1988,entrou em operação o reator nuclear de potência zero IPEN/MB-01. Para que isso fossepossível, foram realizadas todas as etapas necessárias à produção de seu combustível,foi desenvolvida toda a instrumentação necessária, e todos os seus equipamentos esistemas foram projetados e construídos em nosso país.

Também em novembro de 1988 entrou em funcionamento o circuitotermohidráulico experimental de 150 bar, também totalmente projetado e construído noBrasil, e que possui os mesmos recursos dos circuitos utilizados nos centros de paísesmais avançados, onde foram desenvolvidos reatores de água pressurizada.

Encontra-se ainda em fase de operação o Laboratório de Testes de Equipamentosde Propulsão, para desenvolvimento de equipamentos a vapor.

Uma parte significativa dos componentes do primeiro reator nacional de águapressurizada está em fabricação em nossa indústria, e está também em andamento aconstrução civil dos prédios que abrigam e dão apoio ao reator. Ou seja, o primeiroreator de potência genuinamente nacional está em gestação, e seguramente entrará emoperação ainda na atual década.

Já temos potenciais condições de dar o próximo passo em direção a um segundoprotótipo de reator nacional de água pressurizada. E já estamos habilitados a projetaruma mini central núcleo-elétrica com capacidade entre 60 e 100 Mw, utilizando osmodernos conceitos e técnicas que foram empregados no projeto do primeiro protótipo,que o tornam um reator intrinsecamente seguro, como deverão ser os reatores depotência da nova geração.

7. ESTRATÉGIA GERENCIAL DO PROGRAMAAo engajar-se no programa de capacitação nuclear, teve a Marinha como

preocupação constante institucionalizar sua participação. Assim sendo, foi obtida aautorização presidencial para o desencadeamento do programa em dezembro de 1978 efoi assinado um convênio com a CNEN, o qual estabeleceu as bases para a cooperaçãoentre os dois organismos.

O desenvolvimento isolado da capacitação nuclear pela Marinha seria inviávele, ainda que não o fosse, constituir-se-ia em duplicação de recursos altamente ineficaz.Optou-se, por conseguinte, por uma abordagem cooperativa, engajando-se a capacidadetécnico-científico-industrial já instalada no País.

Desde a Segunda Guerra Mundial havia uma convivência muito próxima daMarinha com a comunidade científica e universitária de São Paulo, que se iniciara comos trabalhos no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) na área dedesenvolvimento de sonares, mas que se ampliara com o convênio com o Instituto dePesquisas Tecnológicas (IPT), e com a decisão de formar a maior parte dos oficiaisengenheiros na Escola Politécnica da USP. Ocorreu, assim, naturalmente umaaproximação entre a Marinha e o IPEN, que se tornaram parceiros no empreendimento.A cooperação foi institucionalizada através de um convênio entre a Diretoria Geral doMaterial da Marinha (DGMM) e o IPEN.

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Esse engajamento do IPEN apresentava vantagens de três naturezas distintas:em primeiro lugar, como não envolvia nenhuma entidade brasileira ligada ao AcordoBrasil-Alemanha, não prejudicava o andamento deste, objeto de grandes esperançasdo governo àquela época; em segundo, proporcionava àquele Instituto um projeto devulto capaz de colimar os esforços até então dispersos por várias atividades científicasnem sempre coordenadas; e finalmente, constituía-se num veículo civil paradisseminação do conhecimento acumulado visando colaborar na solução futura dosproblemas associados à composição da matriz energética do País.

O IPEN voltou, em outubro de 1982, à esfera federal, e é atualmente subordinadoà CNEN. A Marinha, por sua vez, criou a Coordenadoria para Projetos Especiais COPESP(que teve sua denominação alterada em 1995 para Centro Tecnológico da Marinha emSão Paulo CTMSP), sediada junto ao IPEN, para executar o programa. Esse modelo deíntima cooperação entre a Marinha e a agência nacional de energia nuclear para odesenvolvimento da propulsão nuclear e da tecnologia de centrais nucleares foiutilizado com sucesso pelos Estados Unidos e pela França e o mesmo vem ocorrendona China Popular. A colaboração com o IPEN evolui ao longo do tempo, envolvendoos demais institutos de pesquisa da CNEN, como o CDTN.

As participações relativas da Marinha e dos institutos de pesquisa levam emconta as capacidades e características respectivas das instituições. Em linhas gerais,a Marinha gerencia os esforços de projeto, construção e operação das instalações,desempenhando as tarefas de engenharia. O pessoal técnico dos institutos de pesquisaparticipa ativamente daquelas atividades que lhe são típicas, quais sejam, atividadescientíficas, concepção de sistemas e operação a nível laboratorial.

A preocupação inicial foi a de viabilizar o ciclo do combustível nuclear, pois erapatente que seria inútil desenvolvermos uma capacitação em projeto e construção deuma instalação propulsora nuclear para submarinos (e paralelamente de pequenascentrais núcleo-elétricas) se não dispuséssemos do combustível nuclear. Quando sefala em viabilizar o ciclo do combustível, a primeira preocupação é, necessariamente,com a etapa do enriquecimento isotópico do urânio, que é a mais complexatecnologicamente e a mais sujeita a bloqueios externos.

No que diz respeito aos sistemas e instalações, a abordagem global dos diversosdesenvolvimentos do programa no campo do ciclo do combustível, compreende asfases de concepção, comprovação laboratorial e construção de usinas-piloto dedemonstração industrial, para avaliação e eventuais ajustes no processo, além delevantamento de parâmetros econômicos. Paralelamente, estas usinas-piloto sãodimensionadas de tal forma que possam vir a atender futuramente à demanda da Marinhapor combustível nuclear. O programa não inclui a construção de unidades de porteindustrial com finalidades comerciais, que deverá ser feita por outros organismospúblicos ou privados.

A boa prática de engenharia aconselha que a ordem mencionada noparágrafo anterior seja seguida em novos desenvolvimentos de sistemas einstalações. Muitas vezes o açodamento ou o amadorismo fazem com que se tente

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“queimar” etapas, reduzindo ou eliminando as fases intermediárias de comprovaçãoexperimental e de construção de unidades-piloto. O resultado dessa omissão é,freqüentemente, uma instalação industrial com defeitos de nascença que comprometemseu funcionamento comercial.

A materialização dos objetivos do programa através de usinas de demonstraçãoproporciona, assim, economias a curto e a longo prazo. Isto porque, a par de permitirema demonstração da viabilidade e eficiência dos processos desenvolvidos e a correçãode eventuais defeitos antes da construção de unidades em escala industrial, elas têmporte suficiente para atender às demandas dos reatores navais, que são de pequenoporte, bem como dos reatores de pesquisa que dão suporte experimental aodesenvolvimento destes. Evita-se assim que as futuras unidades em escala industrialtenham que operar fora de seu padrão normal de funcionamento para atender a demandaparticularizada daquelas classes especiais de reatores.

O programa sempre privilegiou, portanto, um conteúdo de forte experimentaçãopara comprovação de cálculos teóricos, tanto mais necessário pela notória insuficiênciade recursos experimentais e laboratoriais de nossas universidades e pela conseqüentefalta de uma cultura experimental no País.

No que diz respeito às atividades de projeto, adotou-se como norma geral aexecução interna da concepção dos diversos sistemas, envolvendo técnicos e cientistasdo CTMSP e de diversas instituições de pesquisa e universidades nacionais. Contrata-se, então, junto às principais firmas projetistas genuinamente nacionais, os projetosbásico e executivo, cujos desenvolvimentos são acompanhados de perto e fiscalizadospela mesma equipe que concebeu os sistemas.

Essa abordagem permitiu o engajamento das principais firmas de engenharia deprojeto brasileiras, além de inúmeras firmas menores, mas de alta qualificação. Adiversificação de contratadas possibilitou a saudável competição, com reflexospositivos nos custos dos empreendimentos e o sucesso pode ser medido pelacapacidade adquirida de projetar sistemas complexos de vapor, de vácuo e de processosquímicos, até então inexistentes no País.

No que concerne ao parque industrial fabricante de equipamentos, montou-se um sistema de nacionalização e industrialização de componentes e equipamentos,que integra o pessoal técnico do CTMSP e um grande número de indústriasnacionais de grande porte. O CTMSP gerencia o processo, vinculando a aquisiçãodos equipamentos desenvolvidos à prática de preços e qualidade compatíveiscom o mercado internacional.

As atividades a nível laboratorial são conduzidas principalmente em SãoPaulo, nas instalações do CTMSP e do IPEN. No Centro Experimental Aramar, emimplantação em Iperó, próximo a Sorocaba, estão sendo construídos os protótipose usinas de demonstração.

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8. GANHOS CIENTÍFICOS E TECNOLÓGICOS DECORRENTES DOPROGRAMA

Os ganhos científicos e tecnológicos advindos do domínio do ciclo docombustível nuclear e da capacitação em projeto, construção e operação de instalaçõespropulsoras nucleares têm profundo impacto no desenvolvimento do País, pois suainerente complexidade torna necessária a capacitação numa ampla gama de áreastecnológicas correlatas.

Emprendimentos de porte como as usinas de demonstração dos processos dociclo do combustível e o protótipo em terra de uma instalação propulsora nuclear parasubmarinos, entre outros, trazem imensos ganhos qualitativos para o setor científico etecnológico do País.Nacionalização

Desde o início das atividades do programa em 1979, sua equipe defrontou-secom óbices e oportunidades ímpares para um processo sistemático de absorção,aprimoramento e ampla disseminação de tecnologias de ponta até então indisponíveisno País.

Com efeito, já nos primeiros anos previa-se um crescente bloqueio àsexportações de equipamentos e componentes mais sofisticados pelos países detentoresdas respectivas tecnologias, aos quais não interessava o ingresso do Brasil no seuexclusivo clube, a disputar o rendoso mercado. Tal suspeita não tardou a se confirmar,em nome de uma pretensa restrição à proliferação nuclear.

Por outro lado, o enriquecimento de urânio por ultra-centrifugação caracteriza-se pela utilização de um grande número de máquinas idênticas ligadas em cascatas, econseqüentemente repetição das válvulas, medidores, sensores e demais equipamentosperiféricos. Essas características possibilitam a produção seriada dos componentes, oque favorece, ou mesmo viabiliza o engajamento da indústria privada nacional nodesenvolvimento, face às economias de escala obtidas. As demais etapas do ciclo docombustível também apresentam características análogas.

Considerados esses aspectos, constitui-se, logo ao início do programa, umapequena equipe de gerenciamento, encarregada de coordenar um processo sistemáticode nacionalização de matéria-prima, componentes e sistemas. Por nacionalizaçãoentende-se aqui o completo domínio dos princípios de funcionamento, dos materiais edas técnicas de fabricação, de modo a permitir a adaptação às nossas condições,aprimoramento, descaracterização dos equipamentos originais e diversidade deaplicações.

O processo sistemático de nacionalização de um componente ou equipamentoenvolve sempre a participação conjunta ou seqüencial de técnicos de instituições depesquisa e de indústrias nacionais, em geral altamente capacitadas e motivadas, masde pequeno ou médio porte. É condição essencial para seleção das indústriasparticipantes, a par da indispensável qualificação técnica, o compromisso assumidopelas mesmas de fornecimento assegurado ao programa a preços não superiores aosvigentes no mercado internacional.

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O sucesso do programa de nacionalização e seu efeito multiplicador podem sermedidos pela extensa gama de materiais, componentes e equipamentos avançadosque até menos de 10 anos atrás não eram fabricados nem muito menos projetados noPaís e que atualmente já o são, sendo também utilizados por um grande número deempresas em diversos campos de atividades.

O crescente bloqueio às importações a que foi submetido o programa emdecorrência de suas realizações e das respectivas divulgações veio a demonstrar quea nacionalização tornou-se sinônimo de viabilização.Integração com a Comunidade Científica e a Indústria

Os programas de desenvolvimento que integrem o esforço criativo dasuniversidades, a desejável objetividade das instituições de pesquisa e o pragmatismoda indústria constituem-se em poderosa alavancagem para o desenvolvimento técnico-científico do País.

Desde o início o CTMSP tem procurado, na medida de suas possibilidades,realizar e ampliar tal integração e acreditamos que as realizações existentes são emgrande parte resultantes da procura constante dessa integração.

A título de ilustração, cita-se apenas dois exemplos importantes dedesenvolvimentos: o dos aços “maraging” e o do motor de comutação eletrônica deímãs permanentes, em que a integração com a comunidade científica e com a indústriafoi e tem sido fundamental para o seu sucesso.

As ligas do tipo “Maraging” foram desenvolvidas na década de 60, tendocomo grande impulsionadora a NASA, em função de seu uso na exploração lunar. Aalta resistência e outras características tornaram a liga particularmente favorável paraaplicação em cilindros rotativos de ultra-centrífugas, podendo-se mesmo dizer queestas se tornaram economicamente viáveis depois do desenvolvimento das ligasmaraging. O “maraging” utilizado em ultra-centrífugas tem sua exportação no mercadointernacional controlada, sendo extremamente caro.

Nossas primeiras gerações de ultra-centrífugas utilizam maraging desenvolvidono País. Para o desenvolvimento desta liga foi necessária a combinação de esforços daEletrometal, dos técnicos do CTMSP, IPEN, IPT e de pesquisadores da COPPE/UFRJ eda USP. Este esforço integrado e concentrado permitiu viabilizar em dois anos o projetoda primeira geração de ultra-centrífugas.

Ligas de aços maraging menos resistentes que as utilizadas nos cilindrosrotativos de ultra-centrífugas, mas também viabilizadas por este esforço conjunto, sãoutilizadas na fabricação de células de carga, molas especiais, peças estruturais dofoguete SONDA, nos mísseis solo-solo anti-tanques MSS 1.2 desenvolvidas pelaempresa Orbita, em trens de pouso de aeronaves, etc. As ligas tipo MAR250 já foramexportadas para outros países, entre eles a Argentina.

As mais modernas gerações de ultra-centrífugas nacionais já estão sendo feitasem material composto, desenvolvido segundo a mesma abordagem.

O motor de comutação eletrônica é a mais moderna versão de máquina elétrica,na qual o motor e a eletrônica de potência deixam de ser componentes isolados do

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acionamento, passando a se integrarem num único componente. Estamosdesenvolvendo para uma segunda geração de submarinos, um sistema de propulsãocom motor de comutação eletrônica excitado por ímãs de terras raras (samário-cobalto),alimentado por um conversor do tipo “largura de pulso controlada - PWM” esupervisionado por micro-computador.

Para tanto foi assinado um contrato com a Escola Politécnica da USP, atravésda Fundação para o Desenvolvimento Tecnológico da Engenharia (FDTE), eestabelecido um programa de trabalho em três etapas:• Concepção e modelagem do motor em elementos finitos (através de programade computador desenvolvido pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, porencomenda do CTMSP), concepção e modelagem do sistema e validação em umprotótipo em escala reduzida.• Construção de um protótipo de 75 kW, 900 rpm, para demonstração dos

processos de fabricação, validação experimental de modelos matemáticos e testesdo sistema de controle.

• Construção de um protótipo de 1200 kW, 400 rpm, para demonstração daviabilidade de compactar o sistema, tornando-o passível de instalação à bordo desubmarinos e outros veículos.

As duas primeiras já foram concluídas, encontrando-se o protótipo de 75kWcompletamente testado e aprovado. A execução da terceira etapa depende dadisponibilidade futura de recursos. Vislumbra-se um potencial de larga aplicação domotor na propulsão de submarinos, ônibus elétricos e trens, bem como em usosindustriais onde seja requerida velocidade variável.

Cultura Experimental

Ao longo do desenvolvimento de todos os empreendimentos componentes doPrograma, o CTMSP tem considerado como indispensável a validação experimentaldos projetos. Esta diretriz tem implicado na implantação de um importante número debancadas experimentais e laboratórios.

Ao longo de sua existência, o CTMSP vem desenvolvendo uma mentalidadeexperimental no seu corpo técnico. Como resultados objetivos, possui hoje uma equipetreinada em instrumentação e num grande número de técnicas experimentais, que sãoamplamente aplicáveis a diversas áreas tecnológicas de interesse da Marinha emparticular e do País como um todo.

É preocupação constante e diuturna o fomento à criação, fixação edesenvolvimento da “cultura experimental”, não só no âmbito do corpo técnico doCTMSP, como também em todas as instituições que participam do programa, tais comoas universidades, institutos de pesquisa, centros tecnológicos, empresas de engenhariae indústria em geral. É notória a deficiência de instalações experimentais e laboratóriosno País, tanto para formação de recursos humanos como para desenvolvimento deprojetos, bem como identifica-se uma falta de afinidade dos técnicos, engenheiros epesquisadores brasileiros pelo trabalho experimental, sem dúvida, devido àquela

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deficiência. A CTMSP, dentro de suas possibilidades, tem contribuídosignificativamente para amenizar este quadro desfavorável.

Capacitação Tecnológica

Constitui-se em tarefa difícil de ser executada, identificar, dentro dos inúmeroscampos da engenharia do País, projetos de grande porte que possam ser classificadoscomo genuinamente nacionais, ou seja, cujo nascedouro tenha sido uma folha embranco sobre uma prancheta localizada dentro de nossas fronteiras.

No ramo dos grandes projetos de engenharia, como usinas para geração deenergia, indústrias de base e de transformação, navios e plataformas oceânicas, lavrae beneficiamento de minérios, portos, sistemas de comunicação e processamento dedados, etc., a regra tem sido a importação dos projetos de concepção e básico, sendoapenas alguns aspectos do projeto de detalhamento e construção executados pelasfirmas de engenharia do País.

A engenharia nacional tem sido sistematicamente alijada das atividades deconcepção e projeto básico que se constituem nas etapas mais nobres, criativas edotadas de efeito multiplicador de conhecimentos do processo de obtenção dos grandesempreendimentos.

Tem sido diretriz fundamental do programa trabalhar dentro de uma regradiametralmente oposta, qual seja, a concepção ser executada internamente, o projetobásico ser executado por firma de engenharia genuinamente nacional, em conjuntocom o CTMSP, e o detalhamento ser feito nestas projetistas, com o devidoacompanhamento. Esta diretriz não poderia ser outra, devido às restrições impostaspelo oligopólio internacional exercido pelas nações detentoras do conhecimentotecnológico na área nuclear.

Acredita-se que este procedimento de projeto, juntamente com a constantepreocupação com a validação experimental, tenha o efeito extremamente salutar defecundar a engenharia nacional, capacitando o pessoal técnico, disseminandoconhecimentos de ampla aplicação e gerando “know-how” de uma maneira muito maisefetiva que qualquer pacote de transferência de tecnologia poderia oferecer.

9. CONCLUSÕESO desenvolvimento da ciência e tecnologia, para o qual a criatividade e a

inovação têm que estar necessariamente presentes, suportam-se em três premissasfundamentais: a primeira delas se deve à existência do cérebro humano e ao incentivoà sua potencialidade; a segunda pode ser localizada na mobilização das pessoas einstituições em torno de objetivos, de bandeiras, de metas geradoras de algum benefícioestratégico ou social; a terceira refere-se ao esforço nacional, canalizando recursosadequados para a área científica e tecnológica. A Marinha do Brasil, através de seuCentro Tecnológico em São Paulo desenvolveu uma abordagem particular para viabilizarestas três premissa básicas de forma a efetivar um salto tecnológico que permitisse aoPoder Naval Brasileiro, através da aplicação da propulsão nuclear para submarinos,

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ascender a um patamar de credibilidade compatível com a sua importância no cenáriomundial. Este programa vem , desde o início dos anos 80, apresentando resultadosaltamente significativos não só no sentido vertical da efetiva consecução de suasmetas, como também no sentido horizontal de disseminação das técnicasdesenvolvidas através dos efeitos de arraste, ou seja, aplicação dos resultados daP&D nuclear em outros setores, e de diversificação, que se refere a uma deliberadaabertura do programa a outras atividades não estritamente nucleares.

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