ESTRATÉGIAS PARA CAPTAÇÃO DE RECURSOS JUNTO ÀS EMPRESAS PRIVADAS

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MIRIAM GOMES VIEIRA DE ANDRADE

ORGANIZAES DO TERCEIRO SETOR: ESTRATGIAS PARA CAPTAO DE RECURSOS JUNTO S EMPRESAS PRIVADAS

Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Engenharia de

Produo da Universidade Federal de Santa Catarina obteno como do requisito ttulo de parcial Mestre para em

Engenharia de Produo.

Orientadora : Prof. Maria Ester Menegasso, Dra.

Florianpolis 2002

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MIRIAM GOMES VIEIRA DE ANDRADE

ORGANIZAES DO TERCEIRO SETOR: ESTRATGIAS PARA CAPTAO DE RECURSOS JUNTO S EMPRESAS PRIVADAS

Esta dissertao foi julgada e aprovada em sua forma final para obteno do ttulo de Mestre em Engenharia de Produo no Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa Catarina.

Florianpolis, 05 de julho de 2002.

_______________________________ Prof. Ricardo Miranda Barcia, Ph.D. Coordenador do P.P.G.E.P.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________

________________________________

Prof. Maria Ester Menegasso, Dra. Orientadora

Prof. Jos Francisco Salm, Ph.D. UDESC/ESAG

_____________________________ Prof. Clerieli Aparecida Bier, Dra. UDESC/ESAG

___________________________ Prof. Marcos Laffin, Dr. UFSC

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AGRADECIMENTOS

queles de quem herdei acima de tudo a fora de vontade e a capacidade de ver no trabalho uma forma de enobrecer a existncia humana: meus amados pais Geraldo e Maria Amlia. Ao meu marido Guilherme, pelo amor e incentivo recebidos ao longo destes dois anos de trabalho. Aos meus irmos Anita, Cristina, Elisa, Daniel e Leonardo, por terem compreendido a minha ausncia durante a realizao desta dissertao. E em especial minha irm Lcia, cujos conhecimentos na rea social muito enriqueceram meu trabalho, no compartilhar fraterno dos mais importantes momentos desta dissertao. minha orientadora, Professora Maria Ester Menegasso, agradeo pela oportunidade que me foi dada e pela confiana em mim depositada, de grande valor nesta importante etapa da minha vida. s organizaes pesquisadas que prontamente disponibilizaram seu precioso tempo para o preenchimento do questionrio, fornecendo os dados que subsidiaram esta pesquisa e enriquecendo com a experincia do dia-a-dia cada tpico aqui abordado.

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A filantropia muito louvvel, mas no deve permitir que o filantropo ignore as injustias econmicas que fazem com que a filantropia seja necessria.Martin Luther King

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RESUMO

Esta dissertao objetiva identificar e categorizar as estratgias de captao de recursos junto s empresas privadas, utilizadas por organizaes do terceiro setor que atuam na rea de assistncia social. A abordagem metodolgica de pesquisa utilizada foi de carter quali-quantitativo, composta por uma parte descritiva, que teve por base uma pesquisa documental e bibliogrfica, e uma parte exploratria na qual foram utilizados os mtodos de observao sistmica, questionrios e entrevistas focalizadas. A amostra selecionada foi intencional, sendo composta por 35 organizaes de assistncia social atuantes na regio da Grande Florianpolis de Florianpolis, Estado de Santa Catarina. Os principais resultados da pesquisa mostram que apenas 23% das organizaes pesquisadas utilizam estratgias sistemticas de captao de recursos, embora 43,42% de seu oramento provenham de doaes privadas. Os dados revelam tambm que a captao de recursos junto s empresas privadas ainda incipiente, gerando apenas em mdia 4,52% dos recursos captados pelas organizaes pesquisadas. Com base nos dados sistematizados pela pesquisa, foi proposta uma estratgia para captao de recursos junto s empresas privadas. Tal estratgia composta por trs etapas: auto-anlise da organizao, desenvolvimento de projeto para a captao de recursos e estabelecimento e continuidade da parceria.

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ABSTRACT

The aim of this study was to investigate the fund-raising strategies applied by organizations operating in the area of social welfare while raising resources from private entreprises. The research was conducted using a quali-quantitative methodology and is composed by a descriptive chapter with a literature review, and an exploratory study in which sistematic observation, questionnaries and interviews were used to collect data from the organizations participating in the study. The selection of the sample was intentional and included 35 third-sector organizations operating in the metropolitan area of Florianpolis, Santa Catarina State. The main findings of the study show that only 23% of the organizations surveyed applied sistematic strategies to raise resources from private entreprises, although, on average, 43.42% of their budget is composed by private donations from other sources. The study also shows that fund-raising targeted specifically at private entreprises is still incipient, generating only 4,52%, on average, of the total funds raised by the organizations. Based on the findings a strategy for formulating fundraising project targeted at private entreprises was developed. The strategy includes three steps: organizational self-analysis, development of a fund raising project and establishment and continuitity of partnerships.

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SUMRIO

LISTA DE FIGURAS ...............................................................................................10

1 INTRODUO .....................................................................................................12 1.1 Exposio do Assunto ...................................................................................12 1.2 Definio dos Principais Termos...................................................................14 1.3 Organizao do Trabalho ...............................................................................16 1.4 Discusso do Tema e do Problema ...............................................................17 1.5 Objetivos ..........................................................................................................23 1.5.1 Geral...............................................................................................................23 1.5.2 Especficos .....................................................................................................23 1.6 Justificativa para Escolha do Tema...............................................................24 1.7 Limitao da Dissertao ...............................................................................26 2 FUNDAMENTAO TERICO-EMPRICA ........................................................28 2.1 O Terceiro Setor: Resgate Histrico..............................................................28 2.1.1 Conceituao .................................................................................................31 2.1.2 Legislao ......................................................................................................34 2.1.3 A organizao do terceiro setor de assistncia social....................................37 2.2 Gesto das Organizaes do Terceiro Setor ................................................39 2.2.1 Contextualizao............................................................................................39 2.2.2 Funes gerenciais ........................................................................................41 2.2.3 Medidas de desempenho ...............................................................................44 2.2.4 Estabelecimento de parcerias ........................................................................45 2.3 As Empresas e a Responsabilidade Social...................................................46 2.3.1 As empresas e os consumidores .................................................................. 46 2.3.2 Estratgias das empresas no Brasil ...............................................................47 2.3.3 Responsabilidade social.................................................................................48 2.3.4 Investimento social.........................................................................................49

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2.3.5 Balano social ................................................................................................50 2.3.6 Leis de incentivo: foco para organizaes de assistncia social....................51 2.4 Estratgias para Captao de Recursos .......................................................53 2.4.1 Contextualizao da captao de recursos....................................................53 2.4.2 Estratgias para captao de recursos junto s empresas privadas .............54 2.4.2.1 Constituio jurdica, ttulos e certificados...................................................56 2.4.2.2 Misso e rea de atividade..........................................................................56 2.4.2.3 Comunicao com a sociedade ..................................................................57 2.4.2.3.1 Marketing social .......................................................................................57 2.4.2.3.2 Justificativa para a comunicao com a sociedade..................................58 2.4.2.4 Recursos humanos......................................................................................59 2.4.2.5 Fontes de financiamento .............................................................................61 2.4.2.6 Estrutura do projeto de captao de recursos.............................................63 3 METODOLOGIA DA PESQUISA.........................................................................68 3.1 Caracterizao da Pesquisa: tipo, metodologia, perspectiva de anlise e modo de investigao....................................................................................68 3.2 Trajetria da Pesquisa ....................................................................................71 3.2.1 A pesquisa bibliogrfica e documental ...........................................................71 3.2.2 A pesquisa emprica .......................................................................................73 3.2.2.1 O perodo de levantamento da pesquisa.....................................................74 3.2.2.2 Condies gerais da pesquisa ....................................................................74 3.2.2.3 Contextualizao dos sujeitos .....................................................................74 3.2.2.4 Questionrio ................................................................................................75 3.2.2.5 Entrevista focalizada ...................................................................................77 3.2.2.6 Procedimentos de coleta.. ...........................................................................78 3.3 Limites da Pesquisa ....................................................................................... 79 4 RESULTADOS DA PESQUISA DE CAMPO: captao de recursos das organizaes de assistncia social..................................................................81 4.1 Caracterizao: Constituio Jurdica, Ttulos e Certificados ....................82 4.2 reas de Atuao ............................................................................................85 4.3 Comunicao com a Sociedade.....................................................................88 4.4 Recursos Humanos.........................................................................................94 4.5 Fontes de Financiamento ...............................................................................96 4.6 Captao de Recursos..................................................................................100

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4.6.1 Estrutura do projeto de captao de recursos..............................................103 4.7 Doao de Empresas ....................................................................................106 5 SNTESE DOS RESULTADOS DA PESQUISA: estratgias de captao de recursos ............................................................................................................110 5.1 Auto-anlise da Organizao .......................................................................111 5.1.1 Misso, constituio jurdica, ttulos e certificados .......................................111 5.1.2 Comunicao com a sociedade ...................................................................113 5.1.3 Recursos humanos ......................................................................................115 5.1.4 Fontes de financiamento ..............................................................................117 5.2 Desenvolvimento de Estratgias .................................................................119 5.2.1 Projeto de captao de recursos..................................................................120 5.3 Estabelecimento e Continuidade da Parceria.............................................121 6 CONCLUSO E RECOMENDAES ..............................................................123 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .....................................................................128 APNDICES .........................................................................................................136

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Aspectos mais importantes para julgar se uma empresa boa.............47 Figura 2 Organizaes de assistncia social entrevistadas .................................77 Figura 3 Constituio jurdica ...............................................................................82 Figura 4 Ttulos e certificados ..............................................................................83 Figura 5 Ttulo de Utilidade Pblica......................................................................83 Figura 6 Registro no Conselho de Assistncia Social ..........................................84 Figura 7 Anlise comparativa: ttulos e certificados .............................................84 Figura 8 Opo por reas de atividade ................................................................86 Figura 9 rea de atividade ...................................................................................87 Figura 10 Pblico beneficirio ..............................................................................87 Figura 11 Publica relatrio anual?........................................................................89 Figura 12 O relatrio anual est disponvel ao pblico?.......................................89 Figura 13 Qual a periodicidade da publicao? ................................................90 Figura 14 Faz parcerias para divulgar na mdia aberta? ..................................... 90 Figura 15 Anlise comparativa: faz parcerias para divulgar na mdia aberta? .... 91 Figura 16 Possui profissional de comunicao? ................................................. 91 Figura 17 Qual a mdia mais utilizada? ............................................................... 92 Figura 18 Recursos humanos ..............................................................................94 Figura 19 Possui profissional de captao de recursos? .................................... 95 Figura 20 Anlise comparativa: possui profissional de captao de recursos?....95 Figura 21 Fontes de financiamento ......................................................................97 Figura 22 Montante dos recursos utilizados em 2001 ..........................................98 Figura 23 Possui demonstrao financeira auditada?......................................... 99 Figura 24 Anlise comparativa: possui demonstrao financeira auditada?....... 99 Figura 25 A captao de recursos atividade sistemtica?.............................. 100 Figura 26 Seleciona empresas para a captao de recursos?.......................... 101

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Figura 27 Motivo para selecionar a potencial empresa financiadora..................101 Figura 28 Primeiro contato com a empresa financiadora ...................................102 Figura 29 Objetivo da captao..........................................................................102 Figura 30 Estrutura do Projeto de Captao de Recursos .................................104 Figura 31 Anlise comparativa: estrutura do Projeto de Captao de Recursos ............................................................................................105 Figura 32 Recebeu doaes de empresas privadas em 2001? ........................ 106 Figura 33 Setor da economia da principal empresa doadora .............................107 Figura 34 Como foram feitas as doaes?........................................................ 107 Figura 35 H quanto tempo as empresas so parceiras?................................. 108 Figura 36 As empresas que doaram em 2001 continuaro doando?................ 108 Figura 37 Check-list: misso, constituio jurdica, ttulos e certificados ...........113 Figura 38 Check-list: comunicao com a sociedade ....................................... 115 Figura 39 Check-list: recursos humanos ............................................................116 Figura 40 Anlise comparativa: fontes de financiamento ...................................117 Figura 41 Anlise comparativa: fontes de financiamento das organizaes de assistncia social ..............................................................................118 Figura 42 Check-list: fontes de financiamento....................................................118

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CAPTULO 1 INTRODUO 1.1 Exposio do Assunto No Brasil, como em outras partes do mundo, com a adoo do modelo neoliberal, atribuies do mbito antes estatal vm-se transferindo para a iniciativa privada e para a sociedade no seu todo. J recorrente a expresso de que o cenrio de uma poltica de desenvolvimento social exige a participao de novos atores. O Estado, que deveria ser o seu principal protagonista, no dispe de condies nem para implement-la. O papel do Estado tende a ser redefinido, reduzindo seu investimento na rea social e intensificando sua parceria com os setores da sociedade que possam colaborar no enfrentamento de tais questes, evidenciando a transformao da sociedade da sua condio de estadocntrica para sociocntrica, passando o bem pblico a ser responsabilidade de todos, no apenas do Estado. Pesquisa do United Nations International Children's Emergency Fund (UNICEF) indica existir no Brasil, em 1998/1999, de 54,4 milhes de pessoas 34,9% da populao consideradas pobres e 13 milhes de pessoas 8,7% da populao consideradas indigentes. Tal cenrio reacende, em determinados segmentos da sociedade, impulsos solidariedade, filantropia e emergncia do terceiro setor. No Brasil, nas ltimas dcadas do sculo XX, expande-se e se fortalece o terceiro setor, que rene organizaes sem fins lucrativos, criadas e mantidas com nfase na participao voluntria de mbito no-governamental, objetivando o benefcio pblico. As organizaes que compem o terceiro setor do continuidade a prticas tradicionais de caridade e filantropia, expandindo o seu sentido para outros segmentos, atravs da incorporao do conceito de cidadania e das diversas manifestaes da sociedade civil.

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Nessa perspectiva, o terceiro setor constitudo por um conjunto de organizaes sem fins lucrativos e composto de formas tradicionais de auxlio mtuo (assistenciais e beneficentes), movimentos sociais e associaes civis (associaes de bairros) filantropia empresarial (fundaes ligadas a empresa privadas) e ONGs (Organizaes No-Governamentais). No Brasil, segundo estudos comparativos realizados em 1999 pela John Hopkins University e pelo Instituto Superior da Religio (ISER), as organizaes do terceiro setor passam de 200 mil entidades e movimentam aproximadamente R$ 12 bilhes/ano, provenientes da prestao dos servios, do comrcio de produtos e da arrecadao de doaes. Naquele perodo, esse valor correspondia a 1,2% do PIB brasileiro, demonstrando enorme potencial de crescimento. No entanto, o terceiro setor vive o desafio da sustentabilidade organizacional, principalmente pela dependncia de tais organizaes em relao s fontes de recursos, seja governo, setor privado ou de organizaes internacionais. A retrao do Estado no financiamento de polticas de proteo social, a crise do estado de bem-estar social e o aumento da pobreza fizeram com que essas organizaes passassem a mobilizar novas fontes de financiamento, evidenciando a participao do empresariado nacional, principalmente por meio de suas fundaes, no desenvolvimento de projetos sociais ou de investimentos em aes sociais. Paradoxalmente, se numa primeira fase de sua existncia, as organizaes do terceiro setor se estruturaram gerencialmente para responder lgica do setor pblico e, posteriormente, das fundaes internacionais, nos ltimos anos est sendo necessria uma adaptao na estrutura organizacional para acompanhar as exigncias das parcerias entre as organizaes do terceiro setor e empresas privadas, que comeam a alocar recursos para os projetos ou aes sociais. Principalmente movidas pela conscincia de responsabilidade social, as empresas brasileiras passam a considerar as organizaes do terceiro setor como canais para viabilizar o investimento do setor privado empresarial na rea social. Contudo, parece que s as organizaes do terceiro setor que desenvolvem estratgias adequadas para captao de recursos esto tendo acesso ao financiamento das empresas privadas. As organizaes mais estruturadas j perceberam que as empresas privadas tomam deciso sobre seus investimentos sociais corporativos com base no resultado (DRUCKER, 1997, p. 79), e esses

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resultados so medidos por indicadores sociais e conceitos de eficincia, eficcia e efetividade, visando ao desenvolvimento social. Diante disso, as organizaes do terceiro setor passaram a conviver com o desafio de criar uma dinmica organizacional para poderem estabelecer parcerias com as empresas privadas. Resistncias, preconceitos e desconfiana mtua fazem parte do processo de estabelecer parcerias entre empresas privadas e organizaes do terceiro setor. No entanto, vm sendo superadas, gradativamente, na medida em que se generalizam as aes em parceria. Nesse sentido, portanto, essa busca contribui na ampliao da sistematizao do conhecimento da composio dos recursos, promovendo a sustentabilidade das organizaes do terceiro setor a

mdio e longo prazo, mediante a captao de recursos junto s empresas privadas. Ao serem conhecidas as atuais estratgias, ou ausncia delas, utilizadas pelas organizaes do terceiro setor que atuam na rea de assistncia social, na regio da Grande Florianpolis SC, para captao de recursos junto s empresas privadas, acredita-se que ser possvel fazer inferncias sobre as melhores prticas e potencializar tal fonte de recursos. Em face das reflexes e do cenrio apresentado, o desenvolvimento social exige novos atores, redefinindo-se oportunidades e responsabilidades. Numa sociedade em que cresce a desigualdade social, emergem parcerias entre diferentes empresas e organizaes que buscam desenvolver aes de interesse pblico. Essas parcerias sociais tornam-se assunto emergente, elegendo-se as estratgias de captao de recursos junto s empresas privadas pelas organizaes de assistncia social do terceiro setor como tema para o presente trabalho.

1.2 Definio dos Principais Termos Ao definir os principais termos, pretende-se minimizar uma das dificuldades de desenvolver estudos na rea do terceiro setor, j que os conceitos utilizados nas mais diferentes pesquisas tm caractersticas hbridas e nohomogneas. Assim, nesta dissertao adotam-se os entendimentos descritos a seguir.

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Assistencialismo: ao isolada de compensao ou recompensa a perdas verificadas por determinado segmento ou comunidade. (CASTRO, 1999) Assistncia Social: servio gratuito, de natureza diversa, prestado aos membros da comunidade social, atendendo s necessidades daqueles que no dispem de recursos suficientes.

Empresa Privada: entidade econmica, formada com capital privado, destinada a produzir ou vender mercadorias ou servios, tendo como objetivo o lucro. Estratgia: no Dicionrio Aurlio, a arte de aplicar os meios disponveis com vista consecuo de objetivos especficos. Neste trabalho pode ser tambm traduzida como os esforos, feitos de maneira planejada, para atingir determinado objetivo; um padro de comportamento (MINTZBERG, 2000).

Gesto: a ao de estabelecer ou interpretar objetivos e de alocar recursos para atingir uma finalidade previamente determinada. planejar, organizar, dirigir e controlar as aes a serem realizadas por uma organizao ou empresa (TENRIO, 2001).

Investimento Social: recurso destinado ao financiamento de projetos sociais, sem ser repassado atravs de lgica comercial: patrocnio ou campanha publicitria. Traz acoplado aos recursos financeiros o comprometimento da empresa privada em defender a causa da organizao financiada. (FALCONER e VILELA)

Organizao de assistncia social: organizao sem fins lucrativos que presta servios de assistncia social. Neste trabalho ser delimitada como qualquer organizao que no integra o Estado nem est diretamente ligada a empresas mercantis, e cujas atividades, de natureza no-lucrativa, esto voltadas para a esfera pblica, especialmente prestao de servios considerados relevantes para o desenvolvimento social, pertencendo ao Terceiro Setor.

Parceria: para este estudo o relacionamento entre duas pessoas jurdicas distintas para um fim de interesse comum. Pblico alvo: pblico a ser abordado pelo projeto de captao de recursos; nesta dissertao, as empresas privadas. Pblico beneficirio: pblico beneficiado pela atuao social da organizao; nesta dissertao, a comunidade em geral.

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Sustentabilidade: que se sustenta a longo prazo em carter econmico, social, ambiental e cultural. Terceiro Setor: o conjunto de organizaes sociais privadas, sem fins lucrativos, com atuao voltada ao atendimento das necessidades de segmentos da populao, visando ao bem comum (COELHO, 2000).

1.3 Organizao do Trabalho A fundamentao terico-emprica desta dissertao foi desenvolvida em seis captulos, abrangendo referncias que subsidiaram todo o processo de pesquisa e orientaram a compreenso e interpretao do conjunto de dados e informaes coletadas. O primeiro captulo composto da exposio do assunto, na qual so definidos os principais termos e o problema a ser abordado. Ainda neste captulo estabelecem-se os objetivos geral e especficos, justifica-se a escolha do tema e apontam-se os limites da pesquisa. O segundo captulo foi elaborado com o intuito de classificar os entendimentos do terceiro setor. Para isso foi exposto o resgate histrico e sua relao com o primeiro e segundo setor. Ressalta a heterogeneidade das organizaes que compem o terceiro setor, analisando sua origem, visando a

facilitar o entendimento da formao de parcerias e recebimento de recursos provenientes das empresas privadas. Ainda nesse captulo contextualizam-se as organizaes do terceiro setor, focando nas organizaes de assistncia social, abordando tambm as questes bsicas da gesto: medidas de desempenho e funes gerenciais, com as quais as organizaes do terceiro setor podero fazer aperfeioamentos organizacionais visando ao estabelecimento de novas parcerias. A relao do terceiro setor com as empresas privadas relatada brevemente tambm no segundo captulo, abordando os aspectos relativos a responsabilidade social, que contempla o investimento social das empresas privadas, dentro do conceito de responsabilidade social e parceria de longo prazo com o desenvolvimento social, e expondo as leis de incentivo vigentes para as doaes em benefcio de projetos de assistncia social.

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Fechando o captulo dois so expostas as questes sobre as estratgias para a captao de recursos e relacionados os pr-requisitos organizacionais como constituio jurdica, ttulos e certificados, misso e as reas de atividade,

comunicao com a sociedade, a estrutura de recursos humanos e fontes de financiamento. Tambm apresentada a estrutura dos projetos de captao de recursos, uma das principais ferramentas para captao junto s empresas privadas. No terceiro captulo, traam-se os procedimentos metodolgicos adotados na pesquisa emprica, nos quais se contemplam, inicialmente, a caracterizao da pesquisa, tipo, metodologia de anlise e modo de investigao. Na continuidade, procedeu-se trajetria da pesquisa, descrevendo os diversos momentos e aes adotadas para a elaborao da pesquisa emprica, finalizando-se com a descrio do universo populacional escolhido e as delimitaes da pesquisa. O quarto captulo contempla a apresentao e anlise dos resultados da pesquisa de campo, por meio dos quais busca-se identificar como vm sendo desenvolvidas as estratgias das organizaes sem fins lucrativos para captao de recursos junto s empresas privadas e quais os resultados dessas estratgias no ano de 2001. A correlao entre a base terica e os resultados da pesquisa de campo feita no captulo cinco. Cada aspecto da estrutura organizacional e do projeto de captao de recursos explorados na pesquisa de campo ser relacionado com a fundamentao terica exposta no segundo captulo, propondo uma metodologia para elaborao de estratgias de captao de recursos junto s empresas privadas. O captulo seis apresenta as concluses desta dissertao. Traz, tambm, as recomendaes a serem consideradas no desenvolvimento de estratgias das organizaes do terceiro setor para captao de recursos junto s empresas privadas e na elaborao de futuros estudos acerca do assunto.

1.4 Discusso do Tema e do Problema As relaes comerciais e sociais vm passando pelas mais profundas transformaes ao longo dos anos. No sculo XII e no XIII, os integrantes do mercado dos burgos prometeram s comunidades autnomas, que no

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comercializavam neste mercado, que ao se especializar e passar a trocar entre comunidades de maneira eficiente, estas comunidades garantiriam s pessoas nveis de bem-estar e qualidade de vida superiores aos que elas vinham tendo, mas essa perda da autonomia das comunidades no lhes trouxe o bem-estar esperado (MATTAR, 2001). Muito pelo contrrio: o mercado que surgiu para melhorar a qualidade de vida das comunidades acabou sendo o maior vilo no processo de distribuio de riqueza, trazendo novos centros de poder econmico e poltico. Mais recentemente emergiu a globalizao, a revoluo nas comunicaes, o aumento da produtividade agroindustrial e a urbanizao, com poucos se beneficiando desse desenvolvimento. Em conseqncia, surgiram diversos problemas sociais como aumento da pobreza, da violncia, de doenas e da poluio ambiental, alm de conflitos religiosos, tnicos, sociais e polticos (TENRIO, 2001, p. 12). Vencer a misria parece um dos principais desafios do Brasil. Segundo os dados de 1999 do Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA), 23 milhes de brasileiros vivem na pobreza extrema, sendo friamente privados dos seus direitos bsicos de cidado. Segundo o mesmo Instituto, a distncia entre a renda dos 20% mais pobres e a dos 20% mais ricos no Brasil de 33 vezes, ressaltando ainda mais a m distribuio da riqueza, cujas conseqncias s podero ser enfrentadas com ampla mobilizao da sociedade. As organizaes do terceiro setor so as precursoras desse movimento. O terceiro setor composto por organizaes sem fins lucrativos, nascidas da iniciativa voluntria, e mobiliza a sociedade para que, ao trabalhar em parceria com os setores pblico e privado, seja um agente social de desenvolvimento (RODRIGUES, 1998, p. 34). Dentro desse contexto, o terceiro setor vem fortalecendo-se e construindo novas formas de relacionamento com o governo e as empresas privadas, visando ampliao e continuidade de aes que minimizem as desigualdades sociais e a erradicao das suas causas. A continuidade do trabalho das organizaes do terceiro setor se baseia na legitimidade de suas aes e na confiabilidade que lhe votam o grupo atendido e a sociedade como um todo. Mas o seu fortalecimento demanda tambm a ampliao das fontes de recursos, para garantir-lhes a sustentabilidade a mdio e longo prazo.1

1

Fonte: Instituto de Polticas Econmicas Aplicadas (IPEA)

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O descompasso entre as polticas de desenvolvimento e as polticas sociais, que priorizam o capital em detrimento do ser humano, fez com que se agigantassem os problemas sociais. Na atual economia a noo de desenvolvimento desconsidera o social (SERVA, 1997). O ter se tornou mais importante do que o ser, e os problemas da sociedade foram vistos com distanciamento pelos integrantes da populao favorecida pelo sistema vigente. Segundo Serva (1997), preciso repensar o significado de

desenvolvimento. Uma noo de desenvolvimento que provm das idias de supremacia da economia de mercado sobre o social favorece o crescimento da m distribuio da riqueza e a excluso social. Os questionamentos sobre as noes de desenvolvimento esto emergindo da sociedade, trazendo tona carncias sociais que no podem mais ser ignoradas. As manifestaes da sociedade, visando a minimizar tais carncias sociais, comearam a fortalecer-se no incio da dcada de 80, atuando de forma integrada com o setor pblico e privado, dentro do chamado terceiro setor, que rene organizaes sem fins lucrativos, criadas da iniciativa voluntria, objetivando o benefcio pblico. Atualmente o terceiro setor um guarda-chuva para diversas iniciativas das organizaes sem fins lucrativos que tiveram origem nas idias de benemerncia do sculo XIX (CASTRO, 1999, p. 7). Um dos grandes desafios das organizaes do terceiro setor no Brasil a sua sustentabilidade a mdio e longo prazo. Com a finalidade de vencer tal desafio, as organizaes tm buscado, nos ltimos anos, alternativas de gerao de renda e de diversificao de fontes de recursos. Novas parcerias esto sendo feitas para minimizar o problema da sustentabilidade das organizaes do terceiro setor. Com a crise fiscal do Estado contemporneo, o Governo, que financiava muitas aes sociais no Brasil (FRANCO, 2002), no tem recursos suficientes para suprir as demandas sociais e nesse contexto que as empresas privadas esto sendo chamadas a contribuir no processo de transformao social, em parceria com as organizaes do terceiro setor. A contribuio das empresas pode acontecer diretamente, por intermdio das suas fundaes ou para fundos pblicos. O essencial que as empresas percebam a importncia de participar e contribuir diretamente na soluo dos

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problemas das comunidades. Cabe tambm s organizaes sem fins lucrativos sensibilizar as empresas privadas sobre a sua parcela de responsabilidade para o desenvolvimento social. No entanto, no se pode negar que as parcerias entre as organizaes sem fins lucrativos e as empresas privadas implicam estabelecimento de relaes, muitas vezes contraditrias e at divergentes. O choque entre essas duas lgicas de ao organizacional inevitvel, e sua coordenao constitui um desafio de envergadura na instalao e no bom funcionamento de tais parcerias (SERVA, 1997). As diferenas de racionalidade podem levar as empresas privadas a avaliar a ao das organizaes do terceiro setor unicamente do ponto de vista quantitativo, e no respeitar as peculiaridades de aes que propem mudanas de comportamento. Deve ficar claro para as empresas que os resultados das aes sociais acontecero em prazo diferente do do mercado, provavelmente no respeitando os exerccios contbeis, pois na maioria das vezes implicaro mudanas de comportamento da sociedade. Outro desafio a ser vencido no desenvolvimento dessas parcerias fazer com que as empresas superem a dificuldade em admitir a representatividade da comunidade e, assim, dialogar em posio de igualdade com organizaes originadas da sociedade civil. H situaes em que, para doar, algumas empresas querem impor ao projeto certas questes que no lhe so pertinentes. Atualmente h um esforo de diversas entidades, como o Instituto Ethos2 e o Grupo de Institutos e Fundaes Empresariais (GIFE), que buscam

conscientizar as empresas para que se tornem, segundo Martinelli (1997, p. 83), empresas-cidads promovendo uma ao transformadora, operando sob uma concepo estratgica e compromisso tico. Esse esforo de conscientizar as empresas privadas sobre a importncia de sua contribuio tambm uma das responsabilidades de todas as organizaes do terceiro setor. O trabalho de conscientizao pode e deve ocorrer a cada contato com as empresas privadas. Ao captar recursos, as organizaes do terceiro setor devem faz-lo de maneira adequada para que, alm de conseguir os recursos financeiros disponveis, contribuam na conscientizao das empresas sobre seu importante papel na sociedade.

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O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social congrega empresas de todo o pas, de diferentes portes e setores, e busca torn-las parceiras na construo de uma sociedade mais prspera e justa. Web page:< http://www.ethos.org.br/>. Acesso em 08 maio 2002.

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Na verdade, a participao das empresas privadas nesse processo o resgate, ainda que timidamente, do principal propsito anunciado pelo mercado e que no foi cumprido: melhorar a qualidade de vida das comunidades que dele participasse. As parcerias entre as organizaes do terceiro setor e as empresas privadas podem acontecer de diversas formas. Esta dissertao far recorte visando a focar o investimento social propriamente dito. Os recursos repassados pelas empresas privadas so essenciais para garantir a sustentabilidade de algumas organizaes de assistncia social, mas para acess-los algumas providncias so necessrias, tanto das empresas quanto das organizaes sem fins lucrativos. Esta dissertao estudar os desafios impostos s organizaes do terceiro setor na captao de tais recursos. Alguns conceitos como planejamento, estratgias e medidas de desempenho , mesmo com resistncias por parte de algumas organizaes, esto vindo agregados aos recursos provenientes das empresas privadas. Conhecer esses conceitos e apropriar-se da lgica de desenvolvimento de projetos essencial para captar recursos, junto s empresas privadas, de forma sistematizada. As empresas privadas esto iniciando a investir parte de sua receita para aes sociais. Conforme a pesquisa Ao Social das Empresas3, realizada em 1999 pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA), o empresariado do sudeste do pas, por exemplo, aplicou em projetos sociais R$ 3,5 bilhes, representando no global, segundo estimativas, aproximadamente 30% do gasto social federal na regio (excludos os gastos com a previdncia social). A maioria das empresas privadas est comeando a fazer seus investimentos sociais atravs da avaliao de projetos e seus indicadores. Para captar recursos junto s empresas privadas, segue-se a lgica de resultados. Conceitos como: indicadores, avaliao do mercado e demanda do pblico benecicirio devem constar num projeto de captao de recursos. Algumas organizaes do terceiro setor repudiam tais conceitos porque acreditam que uma forma excessivamente mecanicista e quantitativa (FRASSON, 2001, p. 146), inadequada ao enfrentamento dos problemas sociais abordados. Porm, dificilmente alguma empresa doar recursos para projetos sociais sem conhecer os impactos sociais que sua aplicao produzir.

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A captao de recursos, por parte das organizaes do terceiro setor, junto s empresas privadas exige projetos que contemplem as estratgias da organizao e os indicadores sociais. Como no se conhece como as organizaes do terceiro setor na Grande Florianpolis-SC vm captando recursos, construiu-se a seguinte pergunta de pesquisa:

Que estratgias utilizam as organizaes do terceiro setor de assistncia social, da Grande Florianpolis-SC, no processo de captao de recursos, junto s empresas privadas?

A resposta para tal questionamento contribuir para conhecer os esforos que esto sendo feitos pelas organizaes do terceiro setor, visando captao de recursos junto s empresas privadas. Nesta dissertao tambm sero feitas inferncias, com base no referencial terico, com intuito de contribuir no desenvolvimento de estratgias para ampliar o acesso aos recursos disponibilizados pelas empresas privadas, ampliando assim as fontes de recursos, com vistas a garantir a sustentabilidade e a autonomia das organizaes do terceiro setor.

3

Disponvel em:< http://www.ipea.gov.br/>. Acesso em: 08 maio 2002.

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1.5 Objetivos 1.5.1 Geral Identificar e conhecer as estratgias utilizadas por organizaes do terceiro setor, na rea de assistncia social, da Grande Florianpolis-SC, no processo de captao de recursos junto s empresas privadas.

1.5.2 Especficos!

Levantar, na literatura especializada, as abordagens sobre as organizaes do terceiro setor de assistncia social: origem, conceituao, legislao e contextualizao.

!

Levantar, na literatura especializada, os principais conceitos de gesto administrativa, transladados para o terceiro setor.

!

Conhecer, com base na literatura especializada, os processos do investimento social por parte das empresas privadas.

!

Levantar as principais estratgias de captao de recursos, por parte das organizaes do terceiro setor de assistncia social, junto s empresas privadas, relatadas na bibliografia disponvel.

!

Descrever os dados, obtidos por meio de investigao, de como vm sendo desenvolvidas as estratgias das organizaes do terceiro setor de assistncia social para captao de recursos junto s empresas privadas na Grande Florianpolis-SC.

!

Correlacionar a base terica e os dados obtidos na pesquisa de campo, extraindo-se inferncias sobre os pr-requisitos organizacionais para captao de recursos, as estratgias para capt-los com base no desenvolvimento de projetos e os resultados que podem ser esperados.

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1.6 Justificativa para a Escolha do Tema

Sabe-se que, no Brasil, os recursos de origem governamental no so suficientes para atender plenamente a demanda social. A concorrncia pelos recursos disponibilizados por agncias de desenvolvimento internacional, devido ampliao do nmero de entidades que desenvolvem projetos sociais, tem aumentado significativamente. Em face das limitaes de recursos dos financiadores tradicionais agncias de desenvolvimento internacional e Governo , ampliar e diversificar as fontes de recursos tornou-se crucial para que as organizaes do terceiro setor possam, alm de sobreviver, desempenhar um papel relevante com o seu pblico e a sociedade em geral. Esta dissertao ter como foco a captao de recursos junto s empresas privadas, pois a autora acredita que uma fonte de recursos ainda pouco explorada em relao ao seu potencial, provavelmente devido dificuldade de serem aproximadas as duas lgicas organizacionais: empresas mercantis e organizaes do terceiro setor de assistncia social. A necessidade de captar recursos suscita o desafio de um novo relacionamento com o setor privado empresarial. Aos poucos as organizaes do terceiro setor de assistncia social esto incluindo, em sua pauta de trabalho, a preocupao com seu fortalecimento institucional e com a construo das condies de sua sustentabilidade a longo prazo. Para isto, algumas esto quebrando paradigmas e, em vez de passar o chapu pedindo doaes para a caridade, esto desenvolvendo projetos, para buscar parceiros comprometidos com o

desenvolvimento social. Ao pensar na captao de recursos, principalmente entre empresas privadas, a organizao do terceiro setor de assistncia social deve repensar sua misso, seus objetivos de longo prazo e seu desempenho diante do problema social enfrentado. As empresas privadas querem conhecer qual o impacto social decorrente da ao a ser desenvolvida e qual ser seu indicador social. Ou seja: qual ser a medida quantitativa que poder ser utilizada para avaliar o desempenho dos programas. Por sua experincia de haver trabalhado em instituio sem fins lucrativos por mais de trs anos, a autora sabe que muito difcil, para as organizaes do terceiro setor de assistncia social, explorar tal possibilidade de captao de

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recursos entre as empresas privadas. Essa captao requer uma linguagem que no faz parte da trajetria das organizaes do terceiro setor e, por outro lado, no faz parte da tradio empresarial brasileira investir no social. At bem pouco tempo, as organizaes do terceiro setor ignoravam o mundo empresarial, por tentar fazer oposio lgica de mercado existente. H pouco mais de duas dcadas as empresas sentiam-se desobrigadas de qualquer responsabilidade pela melhoria da qualidade de vida comunitria. A reduo desse distanciamento entre mercado e sociedade civil pressupe superao de preconceitos e explorao de formas novas de colaborao no enfrentamento de questes que interessam a todos, como a melhoria da educao e da sade, combate violncia e pobreza, promoo da cultura e do meio ambiente. A tomada de conscincia por parte das empresas de sua

responsabilidade social tambm um fenmeno recente, porm em rpido crescimento no Brasil. Nos ltimos anos tem-se ampliado o volume de recursos canalizados para investimentos sociais por parte de institutos e fundaes empresariais, conforme demonstra a pesquisa Ao Social nas Empresas, do IPEA, cujos dados levantados em 1999 revelam que 40% das empresas pretendiam aumentar seus investimentos para os anos seguintes. Tambm no trabalho de 4 anos como gerente de marketing institucional em um grande banco americano, a autora percebeu que realmente h recursos disponveis nas empresas privadas para os projetos sociais. Mas poucas entidades sabem identific-los e obt-los. As organizaes do terceiro setor encontram grande dificuldade em acessar os recursos disponibilizados pelas empresas privadas, sejam eles feitos diretamente pelas empresas ou disponibilizados por intermdio de suas fundaes ou institutos. Para facilitar o acesso, alm de bons projetos as organizaes do terceiro setor devem conhecer a legislao vigente, principalmente para se beneficiar da ainda tmida poltica de fomento, via incentivos fiscais, doao de recursos por parte de pessoas jurdicas. Convm ressaltar que, independente de polticas de fomento, as

empresas privadas esto evitando as simples doaes ou aes de benemerncia. A gravidade dos problemas sociais enfrentados no Brasil exige, tanto das empresas mercantis quanto das organizaes sem fins lucrativos, aes sociais desenvolvidas de forma responsvel e profissional, trazendo uma real melhora na qualidade de vida da comunidade atendida. Sob tal ponto de vista, as organizaes do terceiro

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setor devem desenvolver projetos consistentes, com intuito de garantir a legitimidade e a continuidade das aes promovidas. Todavia, a captao de recursos financeiros est tambm diretamente ligada ao saber captar e no s ao comprometimento e afinidade dos possveis investidores com a causa. Estratgias para captao bem definidas e a capacidade de mostrar os resultados das aes promovidas com os recursos captados podero garantir a continuidade da parceria e legitimar a organizao sem fins lucrativos como catalisadora de recursos para as aes sociais. Ao fornecer subsdios para entender as estratgias de captao de recursos pelas organizaes de assistncia social junto s empresas privadas, esta dissertao contribuir na identificao dos esforos feitos por essas organizaes da Grande Florianpolis (SC) no processo de captao de recursos junto s empresas privadas. Assim sero conhecidos as estratgias que podem estar alavancando, ou sua falta que esteja emperrando, tal processo de captao de recursos. E, ainda, seja de forma direta ou indireta, estar contribuindo para promover a capacitao de gestores habilitados a intervir proativamente e de forma mais afinada e, ao mesmo tempo, reflexiva, com as novas demandas da realidade das organizaes do terceiro setor.

1.7

Limitaes da Dissertao

No que se refere delimitao do tema, esta dissertao apresenta um limite na medida em que, ao utilizar como enfoque uma das reas que compem o terceiro setor as organizaes que atuam na rea de assistncia social faz-se um recorte na realidade de tal setor. Assim, esta dissertao aborda questes especficas das organizaes de assistncia social e no podem ser aplicadas s demais categorias que compem o terceiro setor. O presente estudo se refere nica e exclusivamente a estratgias de captao de recursos junto s empresas privadas. As categorias principais que o estudo prope limitam-se identificao das estratgias de captao de recursos das organizaes pesquisadas, identificando, nessas mesmas organizaes, estruturas organizacionais bsicas que

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possam viabilizar o desenvolvimento de estratgias de captao de recursos junto s empresas privadas. Em funo disto, os resultados segmentados pelas respectivas concluses finais no devero ser generalizados, sendo afetos s organizaes do terceiro setor que atuam na rea de assistncia social localizadas na Grande Florianpolis (SC). Alm da segmentao da realidade pesquisada neste trabalho, h uma srie de limites em decorrncia do tema, pois a falta de referencial terico consistente sobre captao de recursos por parte das organizaes do terceiro setor de assistncia social fez com que alguns tpicos no tivessem o devido

aprofundamento. Alm disso, esta dissertao visa a identificar como a captao de recursos junto s empresas privadas acontece, sem se preocupar em apropriar valor ao processo. J quanto limitao das tcnicas de coleta de dados e seu tratamento, cumpre ressaltar que as anlises pessoais da pesquisadora sobre a documentao e a bibliografia utilizadas sofrem inferncia direta de sua prpria viso de mundo. Feitas as consideraes acerca do tema e da pesquisa que aqui se inicia, cumpre destacar que cada captulo deste trabalho no tem carter conclusivo, pela prpria limitao temtica.

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CAPTULO 2 FUNDAMENTAO TERICO-EMPRICA

Aqui sero discutidas as informaes disponveis e relevantes para o tema em estudo. Buscou-se, por meio das teorias relacionadas e entendimentos de estudiosos, resgatar o surgimento do terceiro setor, a gesto das organizaes do terceiro setor, a participao das empresas privadas com base nos conceitos de responsabilidade social e as estratgias das organizaes do terceiro setor para captao de recursos, alm de dissertar sobre o arcabouo de referncias que subsidiou todo o processo de pesquisa e orientou a compreenso e interpretao do conjunto das informaes coletadas.

2.1 O Terceiro Setor: resgate histrico Segundo Castro (1999), o terceiro setor a esfera da sociedade composta por organizaes sem fins lucrativos nascidas da iniciativa voluntria, objetivando o benefcio pblico, atuando de forma integrada com os setores pblico e privado. Ao estudar a origem do terceiro setor, notam-se diversos caminhos que culminaram no fortalecimento e na sistematizao das aes da sociedade civil em prol do bem comum. O terceiro setor surgiu da conjuno de diversos fatores e tambm por isto que organizaes com objetivos e estruturas to diferentes esto colocadas sob um mesmo guarda-chuva. No Brasil o terceiro setor no uma realidade nova. Apesar de ter uma estrutura no claramente delineada e bastante complexa, essa complexidade poder ser entendida, pelo menos em parte, ao estudar sua origem. Diversos autores como Castro (1999); Landim e Beres (1999); Coelho (2000); Paes (2000); e Vilela e Falconer (2001) afirmam que a emergncia desse movimento social no Brasil tem suas origens remotas na Igreja Catlica. A tradio

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religiosa est ligada com os principais propsitos do setor (PAES, 2000, p. 62): a ajuda ao prximo, o repartir, a preocupao social. A filantropia, por intermdio das santas casas de misericrdia, as ordens e irmandades, que constituram as primeiras redes de servios assistenciais paralelas s organizaes do Estado, esto tambm na origem da atuao do terceiro setor. As aes das entidades ligadas Igreja, praticamente desde a chegada dos portugueses no Brasil, estavam demasiadamente carregadas com o conceito de benemerncia (CASTRO, 1999), e durante mais de trs sculos a filantropia foi desenvolvida neste pas sob a lgica da prtica assistencialista, com predomnio da caridade crist. Ricos filantropos sustentavam os educandrios, os hospitais, as santas casas de misericrdia, os asilos e demais organizaes que foram fundadas a partir do sc XVIII. A origem do terceiro setor tambm pode ser analisada com base nos conceitos de associativismo. Segundo Coelho (2000), por intermdio das organizaes religiosas e tnicas, as associaes voluntrias sempre estiveram presentes nas comunidades em maior ou menor grau, e antecedem o surgimento do welfare state o Estado do bem-estar. Aps a Segunda Guerra Mundial, a soluo das questes sociais ficou sob a responsabilidade do Estado, o welfare state, por suas polticas de assistncia pblica completas financiadas pela contribuio dos setores produtivos (CASTRO, 1999). A centralizao das polticas pblicas causou grande impacto nas associaes voluntrias, pois segundo Castro (1999) e Coelho (2000), desestimulou o desenvolvimento de aes visando a suprir as necessidades sociais e fazendo com que os indivduos no se sentissem mais responsveis pela comunidade nem pelos seus vizinhos, ao mesmo tempo que se sentiam seguros por saberem que ao Estado cabia solucionar os problemas sociais existentes. Mas no incio dos anos 70 a crise do welfare state trouxe de volta a insegurana. Para Coelho (2000) foi uma crise de financiamento, porque tal sistema foi desenvolvido para atender as necessidades de uma comunidade relativamente homognea do ps-guerra. Com o passar dos anos, a complexidade e a heterogeneidade da sociedade fizeram com as demandas sociais aumentassem e que o sistema no mais se sustentasse financeiramente. A complexidade e a heterogeneidade da sociedade brasileira foram ampliadas com os choques do petrleo na dcada de 70, que causaram uma das

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principais crises econmicas no pas, relegando parte significativa da populao a um patamar inferior na pirmide social, com supresso da renda e dos altos ndices inflacionrios. Naquele perodo, enquanto os mais pobres eram punidos pela corroso do valor da moeda, os mais ricos eram beneficiados pela correo monetria dos valores aplicados em bancos, agravando-se a desigualdade. A crise econmica foi mais um dos fatores que contriburam para colocar o Brasil entre os pases de maior ndice de desigualdade de renda. Pelos dados de 1999, do Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA), situava-se na faixa de pobreza. O aspecto conjuntural veio deteriorando-se, ampliando a demanda pelo aprimoramento das questes sociais degradadas, a tal ponto que o Estado no pde mais suportar o acmulo de papis. O acmulo das funes do Estado protetor e do Estado regulador (CAMARGO et al., 2001, p. 21) gerou pesados nus no oramento pblico, criando uma situao insustentvel, forando a participao de toda a sociedade na busca de solues, manifestaes sociais s quais no ficou alheio o terceiro setor. A origem do terceiro setor se prende tambm ao aparecimento das ONGs - Organizaes No-Governamentais, que se manifestaram mais enfaticamente nas dcadas de 60 e 70, e provenientes das comunidades de base (CASTRO, 1999, p. 8), em oposio ao Estado autoritrio. As ONGs tiveram caractersticas bem distintas das entidades constitudas pela classe trabalhadora ou pelas instituies ligadas Igreja; na verdade, surgiram como alternativa s entidades assitencialistas. De posio bastante radical no incio, colocavam-se como o voluntariado combativo (CASTRO, 1999, p. 8), no qual se opunham a uma situao estabelecida. Propunham solues para transformar a sociedade. No aceitavam aliar-se ao setor pblico nem ao privado. O fortalecimento da sociedade civil, atravs das aes das ONGs no Brasil se deu no bojo da resistncia ditadura militar. O questionamento do papel do Estado foi enfatizado no Brasil a partir de 1980, com a redemocratizao da Amrica Latina e com o surgimento do neoliberalismo como concepo poltico-econmico-cultural no Ocidente. Os Estados enxugaram a mquina governamental e provocaram transformaes na forma de gerir o social. No entanto, mudar as funes do Estado implicou rever as funes dos atores que com ele interagem. A sociedade civil precisou retomar o seu papel no desenvolvimento das polticas sociais e incrementar seus esforos, 34% da populao

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discutindo-se a forma de participao e a contribuio das empresas com fins lucrativos na soluo das questes sociais. Num espao de tempo muito curto, o mundo se viu diante de problemas globais cujas solues agora dependem da capacidade de articulao de um espectro mais amplo de agentes sociais (TENRIO, 2001, p. 12). As iniciativas de associativismo provenientes da cultura europia, a modernizao das aes de benemerncia da Igreja Catlica e a participao de outras religies, o surgimento das ONGs, a queda do welfare state o vcuo deixado pelo poder pblico no seu papel de promover o bem-estar da populao formaram, ainda que desordenadamente, as organizaes que compem o terceiro setor. Todo esse contexto histrico nos auxilia a conhecer um pouco da complexidade do terceiro setor. Mas os autores so unnimes ao afirmar que a caracterstica desse movimento emergir de movimentos populares, sendo organizados por aqueles que no seu cotidiano presenciam o problema predominante (CAMARGO et al.; HUDSON; 2001, 1999). As aes desse setor normalmente so desenvolvidas com parcerias e doaes de agentes pblicos ou privados. Todavia, para que tais parcerias se efetivem necessrio conhecer as diferentes lgicas de atuao entre os atores envolvidos.

2.1.1 Conceituao

O terceiro setor compreende organizaes com objetivos e valores diversos, e estud-lo sem a devida delimitao pode conduzir a concluses inadequadas. As organizaes sem fins lucrativos atuam em diversas reas como: cultura e recreao, educao e pesquisa, sade, assistncia social, ambientalismo, desenvolvimento e defesa dos direitos, religio e associaes profissionais, entre outras. Para fins deste estudo ser feito um recorte num dos conjuntos que compem o terceiro setor: a assistncia social, por se tratar do conjunto mais vulnervel s oscilaes das fontes de financiamento tradicionais e que dificilmente gera receitas prprias, devido seu carter eminentemente assistencial. O terceiro setor pode ser conceituado como aquele que representa o conjunto de iniciativas da sociedade civil organizada, com base na ao voluntria, sem fins lucrativos e que visa ao desenvolvimento social. Mas essa conceituao

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bastante genrica e no retrata a diversidade do setor. As diferenas entre as organizaes que compem tal setor esto no porte, nas reas e nas formas de atuao, no tipo de pblico beneficiado ou associado etc. Tambm h diversidade e, s vezes, divergncia de valores, opinies e posies sobre os mais distintos temas (FALCONER e VILELA, 2001). A diversidade das organizaes que compem o terceiro setor pode no ser percebida como algo positivo, pois por falta de um conceito unificador, o todo vem parecer menor que as partes constituintes (SALAMON, 1997, p. 93). Com tantos conceitos e terminologias caracterizando diferentes tipos de organizaes, difcil perceber o real impacto social causado por esse setor. Mas tambm haveria o risco de, segundo Landim (2002), ao tentar unificar toda essa diversidade de organizaes, homogeneizar e despolitizar um campo onde h, naturalmente, conflito e diversidade de interesses e objetivos, dificultando a legitimao de cada entidade. O termo terceiro setor, refora Landim (2002, p. 1), uma abstrao, pois pode esconder mais do que revelar, porque se trabalha como um conjunto uniforme uma diversidade enorme de organizaes. No possvel tratar uma organizao que cuida de questes ambientais ou que trabalha com preveno de AIDS como sendo a mesma coisa que uma associao de jogadores de xadrez, sem tirar a legitimidade de nenhuma delas. Convm ressaltar somente que, ao estudar os objetivos e impactos dessas entidades na sociedade, teremos resultados bastante distintos, pois essas instituies tm estatutos diferentes no que concerne sua relao com a esfera pblica referencial que necessariamente deve ser tomado por quem ir estud-las para distingui-las. Segundo Menegasso (2000), as diferentes entidades que compem o terceiro setor nos[...] levam compreenso de que ele envolve a ao de sujeitos sociais diversos, como a filantropia, a ao caritativa, os movimentos sociais, as associaes comunitrias, os trabalhos educativos, organizativos e de assessoria tcnica, as ONGs, as iniciativas filantrpicas e religiosas, e, at mesmo, a cooperao internacional.

Dentro dessa diversidade existem alguns termos que so de uso geral e passaram a ser empregados como sinnimos de organizaes que atuam no

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terceiro setor. Embora amplamente utilizados, tais termos no possuem uma definio legal e portanto criam um pouco da confuso conceitual. Um dos termos mais utilizados Organizao No-Governamental (ONG). As entidades que compem o terceiro setor devem necessariamente ser autnomas e possuir administrao prpria, aonde se conclui que todas as entidades privadas podem ser consideradas organizaes no-governamentais. Isto vem causando certa polmica, pois atualmente muitas entidades sem fins lucrativos, mesmo com caractersticas e motivaes sociais diversas das organizaes que ajudaram a construir esse nome, se autodenominam ONG. A pluralidade do terceiro setor leva Landim (2002, p. 3) a propor a desconstruo do nome ONG. Esse nome vem tornando-se muito genrico e est sendo apropriado pela sociedade, pela opinio pblica, por vrios segmentos para designar muita coisa diferente. As ONGs Organizaes No-Governamentais, que construram tal designao, so as entidades que permanecem com as principais caractersticas das organizaes que surgiram na dcada de 60 e que eram compostas pelo voluntariado combativo. Muitas ocuparam espaos de grande visibilidade na esfera pblica e, por isto, para distingui-las dos organismos estatais (SERVA, 1997), foram denominadas Organizao No-Governamental (ONG). As ONGs esto voltadas para a transformao da sociedade e devem atuar em atividades como: educao, sade, defesa de minorias, cultura, ecologia e vrias outras. Em geral, elas tm uma atuao mais poltica do que as entidades filantrpicas, que trabalham com assistncia social aos necessitados. H pouco tempo o nome ONG ainda distinguia um conjunto de organizaes da sociedade brasileira, autnomas, voltadas para a construo da cidadania e para a prestao de servios, mas dentro de um iderio de democracia, cidadania, participao um campo que se colocava muito esquerda do espectro poltico do pas, um campo que foi importante no processo de democratizao, de construo de movimentos sindicais, no movimento de criao de identidades, como o movimento de mulheres e o movimento negro. Atualmente muitas organizaes com valores e formas de atuao diversas esto dentro do guarda-chuva ONG, expresso cujo uso demanda maior cuidado. importante a correta definio dos conceitos que sero utilizados ao longo desta dissertao, pois as diferenas entre as organizaes influenciam no

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estabelecimento de estratgias para formar parcerias visando ao financiamento e execuo de projetos sociais. Apesar de toda heterogeneidade do setor, por falta de terminologia mais apropriada esta dissertao utilizar o termo terceiro setor para designar o conjunto das organizaes privadas que tm o objetivo pblico, beneficiando toda a sociedade e no um pequeno grupo, como no caso de algumas associaes. Este recorte j est previsto na Lei 9790/99, que classifica apenas as organizaes privadas com objetivo pblico.

2.1.2 Legislao

As primeiras categorias que compem o que posteriormente viria a ser chamado de terceiro setor surgiram com o Cdigo Civil Brasileiro em 1916: as organizaes sem fins lucrativos. Todas as organizaes que compem o terceiro setor so necessariamente sem fins lucrativos, podendo ser fundao, associao ou instituto. A principal diferena entre a primeira e as demais sociedades o capital.Enquanto nas fundaes a pessoa jurdica se organiza em torno do patrimnio destinado consecuo dos fins comuns, nas associaes e sociedades predominam o elemento pessoal o agrupamento de pessoas fsicas que a compem (PAES, 2000, p. 36-37).

Ou seja, nas fundaes h um capital disponvel para a realizao dos objetivos, enquanto nas demais instituies h o objetivo em comum, porm muitas vezes ainda falta a fonte de recursos para a sua realizao. As organizaes que compem o terceiro setor podem ter diversas personalidades jurdicas: fundaes pblicas ou privadas, associaes ou sociedades civis, cooperativas ou cooperativas sociais. Aps ser constituda mediante estatuto, as organizaes podem requerer ttulos ou qualificaes que lhes garantam benefcios diferentes. Os principais ttulos e certificados concedidos pelo poder pblico s entidades de interesse social so: # Ttulo de Utilidade Pblica (Lei 91/35, Lei 6639/79, Decreto 50.517/61 e Decreto 60931/67): qualquer entidade com natureza jurdica de fundao,

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associao ou sociedade civil sem fins lucrativos, que seja constituda no pas, em efetivo funcionamento nos ltimos trs anos, sirva desinteressadamente coletividade e que no remunere sua diretoria e conselhos, pode ser declarada pelo Ministrio da Justia de Utilidade Pblica Federal. So direitos das entidades consideradas de Utilidade Pblica Federal:a) receber doaes da Unio; b) receber receitas das loterias federais; c) realizar sorteios; d) ser isentas de recolher a cota patronal para o INSS; e) ser isenta de depositar o FGTS; f) permitir que pessoas fsicas e jurdicas possam deduzir do Imposto de Renda sua doao (PAES, 2000, p.415, grifo nosso).

# Registro no Conselho Nacional de Assistncia Social (CNAS): a entidade que tiver interesse em ser vinculada ao CNAS deve possuir o ttulo de Utilidade Pblica e atender aos requisitos da Resoluo 31/99 do CNAS. # Certificado de Filantropia (Resoluo 177 do CNAS): isenta, junto ao INSS, o pagamento da cota patronal das entidades assistenciais e de benemerncia. A atual Constituio restringiu expressamente o benefcio s entidades

beneficentes de assistncia social. # Organizaes sociais (Lei 9.637/98): permite instituio firmar contrato de gesto com o poder pblico com vistas formao de parceria entre as partes para fomento e execuo de atividades dirigidas ao ensino, pesquisa cientfica, ao desenvolvimento tecnolgico, proteo e preservao do meio ambiente, cultura e sade. Merece maior ateno aqui a qualificao de Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico (OSCIP), pois no entender da autora essa lei delimita adequadamente as organizaes que devem compor o terceiro setor. # Ttulo de Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico (OSCIP): instituda pela Lei 9790/99 e regulamentada pelo Decreto 3.100/99, conhecida como a Nova Lei do Terceiro Setor ou o Marco Legal, dispe sobre a qualificao de pessoas jurdicas de direito privado sem fins lucrativos e institui e disciplina o Termo de Parceria. Em seu art. 2o, a lei estabelece claramente as instituies que no podero ser qualificadas de interesse pblico: instituies privadas de carter comercial ou no-assistencial e as entidades pblicas ou entidades privadas criadas pelo Poder Pblico, tais como: as sociedades comerciais; os

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sindicatos; as associaes de classe ou de representao de categoria profissional; as instituies religiosas ou voltadas para disseminao de credos, cultos, prticas e vises devocionais e confessionais; as organizaes partidrias e assemelhadas, inclusive suas fundaes; as entidades de benefcio mtuo destinadas a proporcionar bens e servios a um crculo restrito de associados ou scios; as entidades e empresas que comercializam planos de sade e assemelhados; as instituies hospitalares privadas nogratuitas e suas mantenedoras; as escolas privadas dedicadas ao ensino formal no-gratuito e suas mantenedoras; as organizaes sociais; as cooperativas; as fundaes pblicas; as fundaes, sociedades civis ou associaes de direito privado criadas por rgo pblico ou por fundaes pblicas; e as organizaes creditcias que tenham qualquer tipo de vinculao com o sistema financeiro nacional a que se refere o art. 192 da Constituio Federal. Para obter a qualificao de Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico/ OSCIP, uma entidade deve atender os seguintes requisitos dos artigos 1o, 2o, 3o, 4o e 5o da Lei 9790/99, ou seja:ser pessoa jurdica de direito privado sem fins lucrativos; atender aos objetivos sociais e s normas estatutrias previstas na Lei; apresentar cpias autenticadas dos documentos exigidos (FERRAREZI, 2000, p. 36).

A Lei da OSCIP no substitui o ttulo de Utilidade Pblica Federal, fornecido pelo Ministrio da Justia, nem o Certificado de Filantropia, fornecido pelo Conselho Nacional de Assistncia Social (FERRAREZI, 2000). Atualmente possvel ter, ao mesmo tempo, o certificado de OSCIP e o Certificado de Filantropia. Contudo, apesar da contnua alterao de datas est previsto que em determinado momento a organizao do terceiro setor ter de optar por uma ou por outra certificao. Por isto, tambm, parte das organizaes civis ainda resistem s mudanas do marco legal institudas pela Lei 9790/99, pois receiam perder os poucos benefcios que conquistaram, quando tiverem de optar por uma ou por outra certificao. Segundo Ferrarezi, as principais mudanas proposta por esta Lei 9790/99 so:

37 Processo de qualificao (menos oneroso e mais gil); Abrangncia institucional; [...] Acesso a recursos pblicos: menos burocrtico e com maior controle pblico social; Mecanismos de planejamento, avaliao e controle dos projetos que envolvem recursos pblicos (gesto estratgica). Possibilidade de remunerao do dirigente (FERRAREZI, 2001, p. 29).

-

Contudo, a opo de remunerao do dirigente deve constar obrigatoriamente no estatuto; a OSCIP no pode omitir se ir remunerar ou no seus dirigentes. Se remunerar seus dirigentes no ter iseno do imposto de renda. Apesar da diversidade das organizaes que compem o terceiro setor, todas tm caractersticas em comum. Segundo Hudson (1999), as organizaes que o compem, alm de serem sem fins lucrativos, devem ser representativas, contribuindo para o desenvolvimento de polticas pblicas e para os processos de integrao e coeso social. Ao mesmo tempo devem ser inovativas, sendo desenvolvidas tanto por tcnicos quanto por voluntrios que esto diretamente envolvidos com os problemas. Devido heterogeneidade das organizaes que o compem, fica difcil desenvolver um estudo em campo to amplo. Com o objetivo de utilizar as diversas fontes de consulta disponveis, a autora se esquivar dessa problemtica: no desenvolver um conceito preciso sobre o terceiro setor, mas utilizar o sistema de qualificao proposto pela reforma social do Marco Legal do terceiro setor: a Lei 9790/99, Lei da Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico (OSCIP). Essa lei restringe o terceiro setor s organizaes privadas, sem fins lucrativos e com fins pblicos. As organizaes que tm ou esto aptas a ter a qualificao de OSCIP sero genericamente as organizaes que compem o terceiro setor para fins deste estudo.

2.1.3 Organizao do terceiro setor de assistncia social

Segundo a Lei Orgnica de Assistncia Social (LOAS) Lei 8742/93, as organizaes do terceiro setor que atuam na rea de assistncia social tm por objetivos:I - a proteo famlia, maternidade, infncia, adolescncia e

38 velhice; II - o amparo s crianas e adolescentes carentes; III - a promoo da integrao no mercado de trabalho; IV - a habilitao e reabilitao das pessoas portadoras de deficincias e promoo de sua integrao na vida comunitria. [...]

Mesmo com objetivos to nobres, tais organizaes recebem algumas crticas, dentre as quais a principal a promoo do assistencialismo e clientelismo, e no das aes transformadoras da sociedade. Mas a partir do incio dos anos 90 houve uma transformao das motivaes das aes sociais, como a conscincia da necessidade de participao e solidariedade, culminando nos conceitos de responsabilidade social e cidadania. At o final do sculo XIX quase tudo o que se consolidara no pas em termos de assistncia social constitua-se em organizaes sem fins lucrativos criadas pela Igreja Catlica na sua relao quase simbitica com o Estado. Somente em 1889, com a Proclamao da Repblica no Brasil, a Igreja se desvinculou do Estado. Os anos 1930 inauguram o perodo intervencionista com a expanso do Estado na prestao direta de servios nessa rea. Paralelamente houve a dissoluo do campo de organizaes autnomas do tipo associativista, como as profissionais e sindicais seguindo os padres histricos do autoritarismo, atrelando dentro de um projeto corporativista, estas organizaes ao Estado (LANDIM, 1999, p. 25). Esse processo, porm, no extinguiu o vasto campo para surgimento e atuao dessas organizaes sem fins lucrativos na rea de assistncia social, responsveis, em grande parte, pela prestao de servios s amplas camadas da populao que ficavam margem das polticas sociais corporativas. Nesse mesmo momento foram comuns as relaes de colaborao entre tais organizaes e o Estado (LANDIM, 1999), culminando com as organizaes sociais que se tornaram braos do poder pblico, para desenvolver aes sociais j pr-estabelecidas atravs de polticas de governo e do Programa Nacional de Publicizao. Isto teve como origem a conhecida aliana entre o Estado Getulista e a Igreja Catlica, favorecendo-se ento o enorme campo para as organizaes sociais ligadas ao catolicismo e, secundariamente, tambm as relacionadas a outras religies, como a esprita e as evanglicas, assim como as seculares que surgiram (LANDIM e BERES, 1999).

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Na assistncia social no-estatal rea antiga que desempenhou importantes papis, ao longo da histria, mesmo que pouco visveis e estudados, nas prticas das polticas sociais e nas estratgias de sobrevivncia da pobreza as sem fins lucrativos tm mais peso relativo quanto a ocupao de mo-de-obra. Os resultados da pesquisa Comparativa Internacional da Universidade John Hopkins e Instituto de Estudos da Religio (ISER) mostram que, em 1995, as aes de assistncia social privadas ocupavam mais pessoal do que o setor pblico: esse responsvel por 42,7% das ocupaes, contra 45,2% das organizaes nolucrativas e apenas 12,7% das empresas privadas lucrativas (LANDIM, 1999, p. 27). As organizaes de assistncia social, privadas ou no, so terreno particularmente em foco, quando se trata das discusses sobre as relaes de clientelismo poltico ou do chamado assistencialismo, contrrio lgica dos direitos, sombra que, historicamente, paira sobre essas organizaes. Porm esse campo vem transformando-se, mais recentemente, em termos de prticas, iderios e posies assumidas no espao pblico, no campo da cidadania (LANDIM e BERES, 1999) e est desenvolvendo novos processos de gesto para avaliar sua contribuio no desenvolvimento das sociedades. A assistncia social trabalha visando ao enfrentamento da pobreza, garantia dos mnimos sociais, ao provimento de condies para atender s contingncias e universalizao dos direitos sociais (BRASIL, 1993). Em conjunto com as demais iniciativas do terceiro setor vem crescendo, transformando-se e reposicionando-se no cenrio contemporneo.

2.2 Gesto das Organizaes do Terceiro Setor

2.2.1 Contextualizao

As organizaes podem ser analisadas sob diversos aspectos. A multifacetada complexidade das organizaes (FLEURY e FISCHER, 1996) pode ser analisada por intermdio de diversas teorias. Analisando as organizaes do segundo setor composto pelas empresas privadas com fins lucrativos e as do terceiro setor composto pelas entidades privadas sem fins lucrativos por intermdio da Teoria da Delimitao dos Sistemas (RAMOS, 1989), podemos dizer que: as

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organizaes do terceiro setor pertencem categoria isonmica que se caracteriza pela atuao na esfera pblica, pelo aspecto autogratificante das atividades desempenhadas, pela iniciativa voluntria deliberao da autoridade e pelo espao scio-aproximador. Dentro dessa mesma teoria, as empresas privadas com fins lucrativos podem ser classificadas na categoria econmica, em que prevalece um espao organizacional altamente ordenado, estabelecido para a produo de bens e para a prestao de servios, sendo um espao scio-afastador, definido por Ramos (1989, p. 130). Convm ressaltar, porm, que segundo Ramos (1989), esses tipos de organizaes definidos nas duas categorias aqui mencionadas no existem no mundo real no seu estado puro, pois todas as organizaes so sistemas sociais mistos (RAMOS, 1989). Essas diferenas devem ser estudadas, para trabalhar na melhor integrao e parceria desses setores em busca do desenvolvimento social. A integrao desses setores ir, ao mesmo tempo que buscar solues para os problemas sociais existentes, criar condies para que paradigmas sejam quebrados e uma nova lgica econmica possa emergir consistentemente. O entendimento das lgicas de mercado e do terceiro setor podem levar a um abrandamento dos atritos, conduzindo a uma gradual convergncia e uma mistura de identidades entre esses dois mundos. Com a integrao poder-se- humanizar as relaes do mercado e contribuir na profissionalizao das aes promovidas pelo terceiro setor, unindo a sociedade em prol do bem comum e do real desenvolvimento do Pas. A crise das sociedades modernas exige solues englobando vrias dimenses da vida social (SERVA, 1997). Ao se descobrirem as diferenas, conheceremos as semelhanas que podem viabilizar essa integrao. Ao estudar os processos de gesto das organizaes do terceiro setor relevante observar que as teorias administrativas, at hoje desenvolvidas, focaram prioritariamente as entidades com fins lucrativos ou de gesto estatal. Ao tentar transladar para o terceiro setor os conceitos desenvolvidos por essas teorias administrativas deve-se tomar o cuidado para tambm no trazer uma lgica de mercado baseada na razo instrumental (SERVA, 1997), que difere da lgica das aes sociais. Para a formao de novas parcerias, so necessrias novas perspectivas na forma de analisar e compreender o trabalho das pessoas que congregam as organizaes do terceiro setor.

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2.2.2 As funes gerenciais

Trazer alguns dos conceitos administrativos para as organizaes do terceiro setor um grande desafio, pois as variveis se comportam de maneira diferente. Ao analisar a varivel tempo, nota-se que projetos comunitrios se do no tempo social, pois eles implicam muito mais o desabrochar de modalidades de socializao do que a produo pura e simples de resultados quantificveis (SERVA, 1997). A maturao de um projeto social no respeita os perodos formais contbeis ou administrativos, mas ter seu tempo prprio para atingir os resultados esperados. Portanto, as organizaes do terceiro setor que pretendem captar recursos com empresas privadas com fins lucrativos tero mais este desafio: estipular o tempo de maturao do programa social. Isto porque interessa a qualquer investidor social saber quando e como os resultados de seu investimento social trar retorno para a sociedade. Claro que ao estipular um cronograma de atuao dentro de um projeto no sero estabelecidos prazos contbeis para a produo de resultados, mas se obedecer peculiaridade de cada ao. So funes gerenciais essenciais da administrao: planejamento,

organizao, direo e controle. A captao de recursos permeia esses quatro momentos gerenciais. No planejamento (o que fazer) a organizao traa seus objetivos e define os recursos e os meios necessrios para atingi-los. Na organizao (quem faz): estabelece atribuies e responsabilidades, distribuindo os recursos e definindo formas de trabalho. Na direo: conduz e motiva as pessoas para realizar os objetivos. E no controle: compara os objetivos estabelecidos e os recursos previstos com os resultados atingidos e os recursos realmente gastos, a fim de tomar medidas corretivas ou mudar os rumos fixados (TENRIO, 2001). No planejamento so traados os objetivos, estabelecendo ou revendo a misso e a viso da entidade o processo de aprendizagem sobre a organizao. por intermdio dele que se estabelece o foco de atuao e se prioriza qual o pblico beneficiado com determinada ao social. Nesse momento tambm se define se a entidade vai captar recursos financeiros, qual o montante e em que setores da economia o far. O planejamento pode ser considerado o ncleo da administrao estratgica, embora Mintzberg et al. (2000) condenem tamanha simplificao de conceito, alertando que a estratgia deve contemplar o detalhamento de suas dez escolas: design, planejamento, posicionamento,

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empreendedora, configurao.

cognitiva,

aprendizado,

poder,

cultural,

ambiental

e

de

Mas admitindo a simplificao condenada por Mintzberg et al. (2000), pode-se dizer que estratgia um plano de ao, um padro. A estratgia a consistncia de comportamento ao longo do tempo (MINTZBERG et al., 2000, p. 17). Tal consistncia se d atravs de um planejamento, feito por intermdio do desenvolvimento de projetos ou planos de negcio, que podem ter diversos formatos, conforme o objetivo. Uma das funes gerenciais bsicas a organizao, que prope a diviso do trabalho e pode ser explicitada por meio de vrios instrumentos, dentre os quais se destacam os estatutos, os organogramas, os regimentos internos, os manuais de procedimentos ou as rotinas e descrio de cargos (TENRIO, 2001). A organizao tem o objetivo de estabelecer responsabilidades. Se bem desenvolvida, essa funo gerencial pode minimizar os comuns atritos entre os tcnicos e os voluntrios de uma organizao. Com as funes e responsabilidades bem delimitadas no sobrar muito espao para divergncias internas,

potencializando o trabalho em equipe, composta tanto por voluntrios quanto por profissionais contratados. A funo de direo representa um grande desafio para as organizaes do terceiro setor, pois essas entidades normalmente so compostas por equipe tcnica e voluntrios, que vo at a entidade com expectativas, necessidades e objetivos distintos. Conciliar tais fatores e conseguir que as pessoas trabalhem da melhor maneira possvel e otimizando a utilizao dos recursos disponveis um grande desafio. O exerccio da funo direo exige do gerente a capacidade de coordenar, liderar, motivar e tomar decises. Na coordenao evita-se a superposio ou falta de recursos, e maximizam-se os recursos existentes, utilizando como instrumento o cronograma. A outra funo da direo a motivao. Na tentativa de entender o que motiva as pessoas, foram desenvolvidas diversas teorias. Uma das mais importantes teorias sobre a motivao a Teoria de Maslow, que parte do pressuposto de que as necessidades dos indivduos esto hierarquizadas, sendo cada qual almejada aps ter sido atendida a anterior. Os cinco tipos de necessidades so: conservao, manuteno, social, estima, auto-realizao.

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Na pesquisa feita por Tenrio (1997), foi constatado que o quadro dirigente e tcnico altamente estimulado a trabalhar pela essncia da misso da organizao, contagiando, em certo grau, o pessoal que presta trabalho administrativo e servios, porque essas organizaes estimulam seus membros pela auto-realizao (TENRIO, 2001, p. 91) afinidade dos objetivos organizacionais e pessoais. No processo decisrio so tomadas as decises estratgicas, tticas e operacionais, convertendo-as em ao. A tomada de deciso no uma tarefa simples por si s; porm, quando feita numa organizao sem fins lucrativos pode tornar-se ainda mais complexa, j que a cada tomada de deciso estar sendo estabelecido qual o problema social a ser trabalhado com as aes da organizao e quais os problemas que no sero trabalhados naquele determinado momento. necessrio que haja liderana. A liderana o processo no qual um indivduo influencia outros a se comprometerem com a busca de objetivos comuns (MOTTA, apud TENRIO, 2001, p. 84). Grande parte do poder do lder se encontra no prprio grupo. Acreditava-se que a liderana era inata; hoje, porm, vista como conjunto de habilidades e conhecimentos que podem ser aprimorados e aprendidos, desenvolvidos e aperfeioados (TENRIO, 2001). Motta (apud TENRIO, 2001) distingue trs dimenses que englobam as qualidades e habilidades requeridas por um lder: a organizacional domnio acerca da organizao e seu contexto; a interpessoal habilidades relacionadas aos processos de interao e comunicao; e qualidades pessoais autoconhecimento, iniciativa, coragem, persistncia e integridade. Os executivos principais das organizaes sem fins lucrativos precisam exercer a liderana. A liderana cuida de esclarecer a misso, motivar as pessoas e dar organizao um sentido de propsito (HUDSON, 1999, p. 230). De forma um pouco estereotipada, as tarefas da liderana so: criar uma viso de longo prazo, estabelecer amplos propsitos e direo, criar um futuro melhor; ensinar por exemplos e por elogios; criar sistemas mais eficientes; e olhar para o futuro. A funo de controle serve para analisar os resultados que esto sendo alcanados. simultaneamente o resultado de um planejamento anterior e o embrio de um novo (TENRIO, 2001, p. 96). O controle pode ser desenvolvido por

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projetos, para avaliar a eficincia de cada ao. Para as entidades que desejam, ou j captam recursos de terceiros, o controle oramentrio ainda mais importante, pois com ele possvel avaliar a aplicao dos recursos recebidos. Diante ao quadro de incertezas e de disputa por financiamentos, torna-se indispensvel s organizaes do terceiro setor adotar medidas gerenciais para incrementar sua capacidade de concretizar objetivos propostos (TENRIO, 2001), deixando claros ao investidor social os objetivos e a forma de atuao da organizao.

2.2.3 Medidas de desempenho

No se pode gerenciar o que no pode ser medido, j afirmavam Kaplan e Norton (1997). Quando se aborda a gesto das organizaes sem fins lucrativos, deve-se pensar sempre nas medidas de desempenho que possam retratar mais fielmente a eficincia, a eficcia e a efetividade das aes sociais realizadas. Sem querer contaminar o terceiro setor com a lgica de mercado, o desafio de gesto dessas organizaes ter bons nveis de eficincia, eficcia e efetividade. Essas trs medidas de avaliao de atividades so tambm indicadores de desempenho das organizaes do terceiro setor. Ao analisar a eficincia, podemos associ-la com a melhor forma de fazer algo com os recursos disponveis. A eficcia o que deve ser feito, isto , atingir o objetivo. E a efetividade, neste caso, diz respeito a capacidade de atender s expectativas da sociedade. Para que tais medidas de desempenho sejam satisfatrias necessrio planejar para saber quais objetivos atingir; usar melhor os recursos; administrar os problemas atuais; fazer os processos funcionarem bem; e olhar o presente (HUDSON, 1999) com a viso do futuro. No af de atender as necessidades das comunidades muitas

organizaes no param para analisar a eficcia, efetividade e eficincia das suas aes. Diversos autores, como Hudson (1999) e Tenrio (2001), propem que as organizaes do terceiro setor se apropriem de alguns conceitos administrativos, que foram desenvolvidos prioritariamente para atender a lgica de mercado Estado e setor lucrativo, para que a integrao dos setores seja menos conflituosa, e os recursos recebidos sejam mais bem aplicados.

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O indicador social outra medida de desempenho, em geral quantitativa dotada de significado social substantivo (VILLAMONTE, 2001), usado para substituir, quantificar ou operacionalizar um conceito social abstrado, de interesse terico ou prtico, mais do que estatsticas pblicas, como os censos demogrficos, pois a informao quantitativa contextualizada. Tal ferramenta quantitativa instrumento operacional para monitoramento da realidade social, e mediante um indicador social que se poder avaliar se os resultados de determinado programa social alcanou seus objetivos ou no. Por exemplo: diminuio da taxa de evaso escolar em determinado perodo de tempo. Os indicadores sociais devem estar presentes nos projetos que visam captao de recursos, pois como repetidamente se colocar nesta dissertao, os recursos privados sero destinados a projetos que tragam melhorias reais sociedade.

2.2.4 Estabelecimento de parcerias

A dinmica das relaes de troca na sociedade ser alterada cada vez mais rpido. As organizaes do terceiro setor de assistncia social e as empresas privadas precisam estabelecer parcerias para continuar existindo. Prosseguir sozinha rumar rapidamente para a lista de estratgias ameaadas de extino (AUSTIN, 2001, p. 24). A complexidade da parceria intersetorial causada, entre outros aspectos, porque os indicadores de desempenho so visivelmente diferentes; contudo, apesar dessa dificuldade, a busca da parceria entre organizao de assistncia social e empresa privada imprescindvel. Por intermdio dessas parcerias as atividades que seriam desenvolvidas isoladamente passam a ser desenvolvidas em conjunto, maximizando esforos e recursos. claro que a parceria no estabelecida no seu mais profundo grau, desde o primeiro momento. Porm, as organizaes do terceiro setor de assistncia social que buscam firmar parceria com empresas privadas devem ter cuidado para que as expectativas de ambos os parceiros estejam claras e sejam viveis. Por sua complexidade, a parceria intersetorial um processo de aprendizado contnuo no qual devem ser respeitadas, segundo Austin (2001),

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algumas diretrizes: 1) checar se h vinculao com os objetivos por parte das pessoas de ambas entidades; 2) checar se h clareza de objetivos de ambos os parceiros; e 3) se h congruncia de misso, estratgia e valores. Seguindo essas diretrizes, deve-se estabelecer um processo de comunicao contnua e efetiva em perspectiva de longo prazo. As parcerias implicam muito mais que dar e receber doaes. Elas implicam mobilizar e combinar mltiplos recursos e capacidades para gerar benefcios para ambos os parceiros e valor social para a comunidade.

2.3 Empresas e Responsabilidade Social

2.3.1 As empresas e os consumidores

Atualmente, percebe-se a crescente necessidade de uma postura socialmente responsvel por parte das empresas, sejam elas com ou sem fins lucrativos, obje