ESTRATÉGIAS DE ENSINO E APRENDIZAGEM E AUTONOMIA DO ... · estratégias é mais complexa que a...
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ISSN 2176-1396
ESTRATÉGIAS DE ENSINO E APRENDIZAGEM E AUTONOMIA DO
ESTUDANTE NO ENSINO SUPERIOR: UMA REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA
Marina Lupepso1 - PUCPR
Daniele Saheb2 - PUCPR
Eixo – Didática
Agência Financiadora: não contou com financiamento
RESUMO
A temática abordada na presente pesquisa trata da relação entre as estratégias de ensino e
aprendizagem e a autonomia da aprendizagem do estudante no ensino superior. O conceito de
estratégias de aprendizagem foi fundamentado a partir dos pressupostos de Roldão (2009) e
Anastasiou e Alves (2010), e, o conceito de autonomia foi baseado na concepção de Little
(1991) e Littlewood (1996). Caracteriza-se como uma pesquisa bibliográfica (GIL, 1999) com
o intuito de investigar quais as principais estratégias de ensino e aprendizagem no ensino
superior descritas nas pesquisas analisadas e se essas estratégias favorecem o desenvolvimento
da autonomia da aprendizagem dos estudantes. No processo de busca realizado no portal de
periódicos da CAPES e nas bases de dados da Science Direct e Scielo foram recuperados 16
artigos. Na sequência, realizou-se a etapa de seleção dos documentos, restando 05 artigos para
análise. Os artigos recuperados para análise passaram pelo processo de leitura e codificação.
Constataram-se as principais estratégias de ensino e aprendizagem identificadas nos
documentos analisados e os indícios de desenvolvimento da autonomia descritos em cada
pesquisa. Identificaram-se ao todo 10 diferentes estratégias mencionadas nas pesquisas, das
quais o estudo de caso foi a única estratégia citada em mais de um artigo. No processo de análise
também e verificaram-se poucos indícios de desenvolvimento da autonomia a partir das
estratégias utilizadas. Portanto, a pesquisa identificou a necessidade de novos estudos no âmbito
nacional que utilizem instrumentos/protocolos que possam aferir o desenvolvimento de
autonomia dos estudantes a partir da aplicação de diferentes estratégias de ensino e
aprendizagem.
Palavras-chave: Estratégias de ensino. Autonomia. Aprendizagem.
1 Mestranda em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Pedagoga na Universidade
Federal do Paraná (UFPR). Email: [email protected]. 2 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Professora da Pontifícia Universidade
Católica do Paraná (PUCPR). Email: [email protected].
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Introdução
Refletir sobre estratégias de ensino e aprendizagem nos incita inicialmente a
compreender o conceito de ensino e de aprendizagem. Roldão (2009, p. 14 e 15) define o ensino
como uma ação especializada “de fazer com que alguém aprenda alguma coisa que se pretende
e se considera necessária” e pressupõe uma ação organizada de “um conjunto variado de
dispositivos que promovem activamente a aprendizagem do outro, embora não possam garantir
em absoluto” que a aprendizagem efetivamente ocorra, visto que dependerá também de fatores
intrínsecos do indivíduo aprendente.
O ato de ensinar consiste em duas dimensões. A primeira é a intencionalidade do
processo de ensino, e, a segunda refere-se aos resultados alcançados. (ANASTASIOU, 2010).
Portanto, o processo de ensino na educação formal está atrelado ao estabelecimento de
objetivos. Para que estes objetivos sejam atingidos, o docente deverá mobilizar os meios
necessários e organizar as estratégias mais adequadas (DÍAZ BORDENAVE e PEREIRA,
2011).
A aprendizagem, por sua vez, está vinculada ao processo de ensino, pois não há ensino
sem aprendizado. Nessa perspectiva, Anastasiou (2010, p. 20) propõe o termo “ensinagem” que
caracteriza “uma prática social complexa efetivada entre os sujeitos, professor e aluno,
englobando tanto a ação de ensinar quanto a de apreender”.
A partir dessa interrelação entre os sujeitos e o mundo, a concepção de aprendizagem
se relaciona com outros conceitos como desenvolvimento, ensino e memória, por exemplo
(POZZO, 2002). Portanto, uma boa aprendizagem implica na produção de mudanças
duradouras, na possibilidade em utilizar o que foi aprendido em novas situações e é resultante
de uma prática realizada pelo indivíduo (ROMERO, 1995, apud POZZO, 2002).
Por sua vez, a autonomia no processo de ensino e aprendizagem é caracterizada como a
capacidade de independência do sujeito para tomar decisões e realizar as escolhas que
permeiam suas ações (LITTLEWOOD, 1996). Esse processo está vinculado à capacidade de
realizar escolhas independentes, porém pode sofrer alternâncias. Little (1991) elucida que um
estudante pode apresentar um alto grau de autonomia em uma determinada área do
conhecimento, mas não ser autônomo em outra área.
Tomando como ponto de partida a concepção de ensino e de aprendizagem, pode-se
então esclarecer o conceito das estratégias de ensino e aprendizagem e quais as principais
estratégias que favorecem o desenvolvimento da autonomia do estudante.
7914
Roldão (2009, p. 25) esclarece que estratégias de ensino são muitas vezes caracterizadas
como “actividades, tarefas, experiências de aprendizagem”, entretanto, a concepção de
estratégias é mais complexa que a simples proposição de tarefas ou técnicas de ensino. As
estratégias de ensino estão centradas “na concepção finalizada e organizada da acção de ensinar,
operacionalizada em subestratégias, tarefas ou atividades” (ROLDÃO, 2009, p. 30).
As estratégias de “ensinagem” estão relacionadas à análise, seleção e uso de ferramentas
facilitadoras da aprendizagem, mas que não se resumem às técnicas de ensino por si só, elas
envolvem elementos determinantes como a descrição, as operações de pensamento, a dinâmica
da atividade e a avaliação do processo (ANASTASIOU e ALVES, 2010).
A avaliação é indispensável na aplicação de estratégias de ensino, uma vez que irá
“aferir da validade e adequação da estratégia durante o seu desenvolvimento”, o que permitirá
ao docente reavaliar o processo e definir as melhores estratégias para cada grupo de estudantes
que leciona (ROLDÃO, 2009, p. 64).
Mediante esses pressupostos, o presente artigo busca investigar quais as principais
estratégias de ensino e aprendizagem no ensino superior relatadas nas pesquisas selecionadas,
e se essas estratégias favorecem o desenvolvimento da autonomia dos estudantes.
Metodologia
Para atender ao objetivo dessa investigação, realizou-se uma pesquisa bibliográfica a
fim de efetivar uma análise qualitativa sobre as principais estratégias de ensino, e se as mesmas
favorecem o desenvolvimento da autonomia na aprendizagem do estudante.
A metodologia escolhida para a realização da pesquisa foi a pesquisa bibliográfica (GIL,
1999). Desenvolvida a partir de material já constituído, a presente pesquisa foi realizada por
meio da seleção e análise de artigos científicos visando identificar os principais estudos sobre
estratégias de ensino e aprendizagem e sua relação com o desenvolvimento da autonomia do
estudante.
Etapas da pesquisa
As fases da pesquisa bibliográfica foram realizadas a partir dos pressupostos de Gil
(1999).
7915
Figura 1 – Fases da pesquisa
bibliográfica
•Quais as principais estratégias de ensino e aprendizagem relatadas nas pesquisas e suarelação no desenvolvimento da autonomia dos estudantes?
Formulação do problema
• Identificação das estratégias.
•Relação com a autonomia.
Elaboração do plano de trabalho
•Pesquisa no Portal de periódico da CAPES e nas bases de dados da Science Direct eScielo.
Identificação e localização das fontes
•Leitura dos títulos dos artigos encontrados e download dos materiais selecionados.
Seleção das fontes
•Leitura flutuante dos textos.
Leitura exploratória dos artigos
•Leitura para verificar se os textos selecionados atendem aos objetivos da pesquisa.
Leitura seletiva dos artigos
•Localização e seleção das palavras-chave da pesquisa nos artigos e organização dasinformações encontradas.
Leitura analítica dos artigos
• Identificação das estratégias de ensino e aprendizagem e das relações com aautonomia.
Leitura interpretativa
•Criação dos códigos: objetivos, estratégias e autonomia.
Criação dos códigos de análise
•Organização das citações selecionadas a partir dos códigos estabelecidos.
Construção da lógica do artigo
•Organização, apresentação e análise dos resultados da pesquisa.
Redação do texto
7916
Fonte: adaptado de Gil (1999).
A primeira fase da pesquisa foi a delimitação do problema de investigação. Após a
proposição do objetivo elaborou-se o plano de trabalho estabelecendo a necessidade de
identificar as estratégias de ensino e aprendizagem mencionadas nas pesquisas e suas relações
com a autonomia.
Tendo o objetivo e plano de trabalho definidos, em julho de 2016 iniciou-se a coleta de
dados no Portal de periódicos da CAPES e nas bases de dados da Science Direct e Scielo
(TABELA 1), por meio dos descritores “estratégia”, “autonomia” e “ensino superior” utilizando
o operador boleano “AND”.
Tabela 1 – Identificação das fontes
Base de dados/portal Artigos localizados
Portal de periódicos da CAPES 05
Science Direct 03
Scielo 08
7917
Total 16
Fonte: as autoras (2016).
A partir da identificação dos documentos que contemplavam os descritores estabelecidos,
fez-se, a seleção inicial dos artigos. Para tanto, realizou-se a exclusão dos documentos
duplicados. A literatura cinzenta (teses e dissertações) também foi excluída, uma vez que se
delimitou apenas os artigos científicos como escopo da presente pesquisa (TABELA 2).
Tabela 2 – Processo de exclusão (etapa 1)
Critérios de exclusão Artigos excluídos
Duplicação 02
Tese 01
Dissertação 02
Total 05
Fonte: as autoras (2016).
Do montante inicial de materiais pesquisados (16), restaram para a etapa seguinte 11 artigos.
Esses artigos foram salvos e importados para um software de gerenciamento de informações, o
ATLAS.ti.
Na sequência realizou-se a demais fases de leitura indicadas por Gil (1999). Na etapa
exploratória, fez-se uma rápida leitura do material, com o intuito de verificar se os artigos
previamente selecionados abordavam a temática da presente pesquisa (GIL, 1999). Nessa etapa
foram excluídos 02 artigos. Em seguida fez-se a leitura seletiva do material, ou seja, uma leitura
mais minuciosa para verificar se os textos selecionados atendiam ao objetivo da pesquisa. Nessa
etapa foram excluídos mais 03 artigos.
Tabela 3 – Processo de exclusão (etapa 2)
Etapas da exclusão Artigos excluídos
Leitura exploratória 02
Leitura seletiva 04
Total 06
Fonte: as autoras (2016).
A etapa seguinte foi realizar a leitura analítica dos 05 textos restantes, com o intuito de
“ordenar e sumariar as informações contidas nas fontes, de forma que possibilitem a obtenção
de respostas da pesquisa” (GIL, 1999, p. 86). Esse procedimento foi realizado por meio do
ATLAS.ti com a identificação das palavras-chave nos textos selecionados. Constatou-se que a
palavra estratégia foi mencionada 73 vezes. Em relação à autonomia, a mesma foi abordada 15
vezes nos artigos analisados. Destaca-se que todos os artigos analisados abordavam a temática
de estratégias de ensino e aprendizagem e autonomia no ensino superior.
7918
A partir da identificação das palavras-chave da pesquisa, definiram-se alguns códigos
norteadores para a análise dos documentos selecionados. Os códigos criados foram: objetivos
(visando a identificar os objetivos de cada pesquisa), estratégias e autonomia. A criação desses
códigos está relacionada com a etapa definida por Gil (1999) de confecção de fichas, que no
caso da presente pesquisa foi realizada por meio de um software.
No código “objetivos”, foram atribuídas 05 citações, uma para cada artigo selecionado. Já
no código “estratégias”, foram selecionadas 06 citações que exemplificavam as estratégias de
ensino e aprendizagem mencionadas nos artigos; e no código “autonomia”, 08 citações que
explicavam a relação ou a falta dela com as estratégias abordadas.
A lógica de trabalho foi delimitada mediante a organização das citações selecionadas nos
textos por meio da construção de um quadro comparativo para cada código criado. A partir
dessas informações, construiu-se o presente texto mediante a apresentação e análise do quadro
criado.
Apresentação dos resultados
Para a apresentação dos resultados, optou-se pela criação de um quadro com as citações
e informações relacionadas aos códigos de análise criados: objetivos, estratégias e autonomia
(QUADRO 1).
Quadro 1 – Códigos de análise
Objetivos Estratégias Autonomia
Alves et al (2013)
Utilizar diferentes estratégias de
ensinagem por meio de atividades
propostas aos alunos na disciplina de
Fisiologia da Atividade Motora I e
correlacionar o desempenho do aluno com
a sua participação nessas atividades
propostas.
Mapas conceituais, aulas
expositivas dialogadas,
estudo de casos, estudo
do meio, aulas práticas e
estudo de textos
científicos.
A utilização de estratégias de
ensino pode contribuir para a
maior autonomia dos
estudantes universitários.
Bocchi, Pessuto e Dell’aqua (1996)
Verificar as contribuições do modelo
operacional do estudo de caso como
estratégia de ensino/ Apreender as
dificuldades sentidas pelos alunos durante
o estudo de caso.
Estudo de caso. A estratégia adotada estimula
os estudantes à autonomia na
tomada de decisões e solução
de problemas na área.
Prado et al (2011)
Relatar a experiência de utilização de
seminários na disciplina Administração em
Enfermagem II.
Seminário. Os estudantes demonstraram
autonomia para irem além do
roteiro pré-elaborado,
incorporando saberes novos
aos antigos na intenção de
fazerem evoluir as práticas.
Sá e Garritz (2014)
7919
Analisar a transformação dos
conhecimentos e crenças de futuros
professores de Química, bolsistas do pibid,
sobre o tema “Natureza da Matéria” de
modo a torná-lo compreensível aos alunos
do Ensino Médio.
Jigsaw e o Júri Químico. XXX
Silva e Flores (2015)
Analisar as Ligas Acadêmicas estruturadas
e em funcionamento como uma estratégia
de ensino e aprendizagem no processo de
formação dos estudantes em Saúde.
Liga acadêmica. As Ligas Acadêmicas têm
potencial como instrumentos
de exploração da autonomia.
Fonte: as autoras (2016)
Análise e discussão dos resultados
A partir da elaboração do quadro 1, realizou-se a análise e discussão dos dados
identificados com base nos pressupostos de Roldão (2009) e Anastasiou e Alves (2010), no que
se refere às estratégias de ensino e aprendizagem; e nos pressupostos de Little (1991), no que
diz respeito à autonomia do estudante. As reflexões de Pozzo (2002) também contribuíram para
a reflexão da aprendizagem em função da escolha de determinadas estratégias.
Estratégias de ensino e aprendizagem evidenciadas nas pesquisas
Analisando os elementos apresentados no gráfico 1, verifica-se que foram mencionadas
ao todo 10 estratégias de ensino e aprendizagem, sendo o estudo de caso a única estratégia
mencionada em 02 pesquisas (ALVES et al, 2013 e BOCCHI, PESSUTO e DELL’AQUA,
1996).
Gráfico 1 – Estratégias de ensino e aprendizagem
7920
Fonte: as autoras (2016).
O estudo de caso, de acordo com a Stanford University (1994), relata uma história com
questões ou conflitos que precisam ser resolvidos, permitindo com que os estudantes
desenvolvam a capacidade de reflexão crítica e tomada de decisões.
No artigo de Alves et al (2013), os autores apresentam descritivamente cada uma das
estratégias adotadas, corroborando com os princípios de Roldão (2009, p. 60), de que as
estratégias devem ser caracterizadas como “um percurso intencional orientado para a
maximização da aprendizagem do outro.”
Em relação ao estudo de caso, os autores não apresentaram maiores detalhamentos,
tendo em vista que trabalharam com mais cinco estratégias em sua pesquisa. Portanto, o foco
não se deu na estratégia em si, mas no conjunto de estratégias utilizadas para verificar o
desempenho e a participação dos estudantes nas tarefas propostas.
Bocchi, Pessuto e Dell’aqua (1996), por sua vez, trouxeram o estudo de caso como única
estratégia para análise. Para os autores, o estudo de caso foi abordado em uma perspectiva
humanista, compreendendo o papel do docente, do estudante, a relação professor-educando, o
conhecimento e o processo de ensino e aprendizagem. Também apresentam um roteiro para
elaboração do estudo de caso contendo todas as fases do processo. Para verificar a percepção
dos estudantes sobre o estudo de caso enquanto uma estratégia de ensino e aprendizagem um
questionário foi aplicado pelos pesquisadores.
Os resultados da pesquisa realizada detectaram que o estudo de caso, para 70% dos
pesquisados, contribuiu para o conhecimento teórico-prático do conteúdo. Já a dificuldade para
a realização do estudo de caso foi o levantamento bibliográfico (58%). Os autores sugerem a
0
0,5
1
1,5
2
2,5
7921
utilização do estudo de caso para favorecer o “exercício da tomada de decisões” e “estimular o
aluno à iniciação científica”.
Para Anastasiou e Alves (2010, p. 98), no estudo de caso enquanto estratégia de ensino
e aprendizagem “o caso deve estar incluído no contexto de vivência do estudante, ou em parte
de uma temática em um estudo”, característica essa presente tanto no estudo de Alves et al
(2013) como de Bocchi, Pessuto e Dell’aqua (1996).
As demais estratégias relatadas em Alves et al (2013), exceto as aulas práticas, também
são apresentadas por Anastasiou e Alves (2010), que elucidam a necessidade do professor
conhecer os estudantes para então definir quais as estratégias mais indicadas para a efetivação
do processo de ensino e aprendizagem do conteúdo proposto. Pozzo (2002) também contribui
para essa reflexão ao esclarecer a necessidade de se adequar as práticas educativas aos objetivos
de aprendizagem que se pretende atingir. Para cada tipo de aprendizagem existem determinadas
estratégias que serão mais adequadas.
Em Prado et al (2010, p. 584), a pesquisa apresenta o seminário como uma estratégia de
ensino e aprendizagem. Os autores consideram o seminário como uma estratégia que “busca a
problematização de um determinado tema” por meio da reflexão crítica e do diálogo. Os autores
apresentam as etapas de mobilização, construção e síntese do conhecimento o que ratifica a
afirmação de Anastasiou e Alves (2010, p. 97) de que essas dimensões na preparação e
aplicação do seminário “vêm imbricadas, uma enriquece a outra ao mesmo tempo em que se
complementam”.
A pesquisa de Sá e Garritz (2014) apresenta duas estratégias que segundo os autores
favorecem a participação dos estudantes: o Jigsaw e o Júri Químico. Cabe esclarecer que na
caracterização dessas estratégias os autores empregam as palavras estratégias e métodos como
sinônimos.
Segundo os autores o Jigsaw foi proposto por Aronson e Patnoe (1997) e trabalha com
pequenos grupos de estudo no qual cada integrante estuda uma parte do material entregue. Em
seguida, os alunos dos grupos que estudaram a mesma parte do material se reúnem e discutem
sobre seus entendimentos e reflexões. Ao final, cada estudante retorna ao seu grupo original e
socializa as discussões com os demais integrantes.
O júri químico de acordo com Sá e Garritz (2014) foi proposto por Oliveira e Soares
(2005) como uma atividade lúdica de trabalho com conceitos de química por meio de um júri
simulado.
7922
Enquanto estratégia de ensino e aprendizagem, o júri simulado desenvolve diversas
operações do pensamento como: “defesa de ideias, argumentação, julgamento, tomada de
decisão”, entre outras. Envolve todas as dimensões do processo de construção do conhecimento
e permite a participação de um elevado número de estudantes. (ANASTASIOU e ALVES,
2010, p. 99).
Por fim, Silva e Flores (2015) trazem a liga acadêmica enquanto estratégia de ensino e
aprendizagem extracurricular. Para os entrevistados da pesquisa realizada pelos autores, o
objetivo das ligas é de aproximar o estudante da prática, aprender a fazer, formar profissionais
comprometidos, incentivar a pesquisa e extensão, entre outros. Entretanto, a pesquisa não
explorou a concepção da liga enquanto uma estratégia de ensino e aprendizagem de acordo com
os pressupostos de Anastasiou e Alves (2010). Para as autoras as estratégias se baseiam no
estudo, seleção, organização e proposição das ferramentas mais indicadas para a construção do
conhecimento.
Os resultados da pesquisa de Silva e Flores (2015, p. 414) indicam que as ligas
acadêmicas buscam “o desenvolvimento de competências, habilidades e valores entre os
estudantes, com base na identificação de lacunas curriculares”, entretanto, tendem priorizar o
ensino e a pesquisa.
Tendo em vista que cada estratégia de ensino e aprendizagem utiliza diferentes técnicas
e recursos didáticos, há que se esclarecer que não há recurso ou estratégia que não sejam bons.
O importante é que o docente saiba selecionar as estratégias mais adequadas para cada objetivo
definido (POZZO, 2002).
Relação das estratégias de ensino e aprendizagem e a autonomia do estudante
Na pesquisa de Alves et al (2013), a relação estabelecida entre as estratégias de ensino
utilizadas e a autonomia do estudante está explícita apenas no resumo, ao afirmarem que as
estratégias aplicadas podem contribuir para maior autonomia dos estudantes. Entretanto, a
pesquisa não apresentou a comprovação se efetivamente houve essa contribuição na autonomia
do estudante, apenas mencionou que o uso dessas estratégias permitem o desenvolvimento da
autonomia.
Em Bocchi, Pessuto e Dell’aqua (1996), os resultados da pesquisa apontam que o estudo
de caso estimulou a autonomia dos estudantes na tomada de decisões e resolução de problemas.
7923
No que diz respeito ao seminário, Prado et al (2010) descrevem que essa estratégia
possibilita a autonomia na construção do conhecimento, desenvolvendo a autonomia de
pensamento e da ação.
O artigo de Sá e Garritz (2014) não apresenta relação das estratégias utilizadas com o
desenvolvimento da autonomia. O termo autonomia nesta pesquisa está relacionado ao uso do
portfólio enquanto um método de avaliação.
O último artigo para análise, escrito por Silva e Flores (2015, p. 410), conclui que as
ligas acadêmicas “poderiam se tornar instrumentos de exploração da autonomia”, entretanto
essa relação não foi comprovada no estudo.
Esses resultados demonstram que os estudos sobre autonomia relacionados às
estratégias de ensino de aprendizagem não trazem a conceituação que se tem de autonomia,
muitas vezes associada apenas à independência na realização das tarefas propostas.
Little (1991) caracteriza autonomia na aprendizagem como a capacidade de reflexão
crítica, tomada de decisões e ação independente. Apesar da independência ser um dos
pressupostos da autonomia, ela por si só não garante que o sujeito seja autônomo, uma vez que
o estudante necessita analisar e decidir criticamente sobre o contexto de sua aprendizagem. O
autor também esclarece que a concepção de autonomia está relacionada com o desejo em
eliminar as barreiras existentes entre seu processo de ensino e aprendizagem e suas situações
de vida. Portanto, o conceito de autonomia perpassa a simples concepção de independência.
Autonomia requer um conjunto de competências na qual o indivíduo deverá ser capaz de tomar
decisões por meio de uma análise crítica das situações.
Também não há a evidência nas pesquisas analisadas de instrumentos/protocolos que
verifiquem se as estratégias promoveram, de alguma forma, o desenvolvimento da autonomia
dos estudantes.
Considerações finais
Ao identificar as principais estratégias de ensino e aprendizagem utilizadas no ensino
superior e sua relação no desenvolvimento da autonomia do estudante, esta pesquisa propôs,
em certa medida, verificar se há evidências da preocupação docente em utilizar estratégias que
não se prendam apenas em atender aos objetivos de aprendizagem do conteúdo, mas que visem
o desenvolvimento da autonomia do estudante.
7924
Os resultados da pesquisa evidenciam a ausência de estudos que apresentem
instrumentos/protocolos de verificação do desenvolvimento da autonomia do educando em
relação a diferentes estratégias de ensino e aprendizagem.
Constatou-se que nas pesquisas analisadas o estudo de caso e o seminário apresentam
indícios de promoção da autonomia dos estudantes. Certamente as estratégias de ensino e
aprendizagem por si só não serão capazes de estimular o desenvolvimento da autonomia do
estudante. É preciso motivação, vontade de querer realizar determinadas escolhas. Nesse
cenário, o professor tem papel fundamental de estimular o desenvolvimento da autonomia por
meio de estratégias que possuam essa intencionalidade e sejam desenvolvidas em sua
totalidade, visando o processo de construção do conhecimento.
Estudos futuros têm a possibilidade de verificar quais as principais características da
autonomia podem ser desenvolvidas por meio de diferentes estratégias de ensino e
aprendizagem no ensino superior.
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