Estudio Biblico 3

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Estudos sobre Coríntios, Hebreus e Apocalipse José Adriano Filho

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Estudos sobre Coríntios, Hebreus e Apocalipse José Adriano Filho Diakonia dos pobres: 2 Coríntios 8-9 Estudios Bíblicos Não repelirás quem está na indigência, mas colocarás todas as coisas em comum com teu irmão e não dirás mais serem tuas próprias: pois, se compartilhas um bem imortal, com mais razão os bens mortais! (Didaquê 4,8) CONSEJO LATINOAMERICANO DE IGLESIAS • CLAI 2. Os coríntios devem seguir a prática de Jesus PROGMA FE Y ECONOMÍA SOLIDARIA • FES CONSEJO LATINOAMERICANO DE IGLESIAS • CLAI

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Estudos sobreCoríntios,Hebreus e

Apocalipse

José Adriano Filho

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ESTUDIO1 Diakonia dos pobres:2Coríntios 8-9

Não repelirás quem está na indigência, mas colocarás todas as coisas em comum com teuirmão e não dirás mais serem tuas próprias: pois, se compartilhas um bem imortal, commais razão os bens mortais! (Didaquê 4,8)

Na segunda carta de Paulo aos Coríntios destacam-se os capítulos 8-9, conhecidoscomo a coleta para a comunidade de Jerusalém. Paulo já havia mencionado antesesta coleta em 1 Coríntios 16,1-4 e não era a primeira vez que ele se envolvia numa

atividade como essa, pois antes o encontramos atuante no envio de um socorro aos irmãosque moravam na Judéia (Atos 11,27-30). Essa passagem é uma indicação de que o socorro fi-nanceiro pelo qual o apóstolo tanto se empenhou, não é acidental, mas tinha para ele um sen-tido mais profundo. A tradição deu o nome de “coleta” a essa coleta, mas Paulo refere-se a elacomo “serviço” (“diakonia”), um serviço” importante porque está estreitamente ligado ao evan-gelho de Jesus Cristo. Para os coríntios participar desse serviço é mostrar obediência ao evan-gelho de Cristo e a sinceridade da fé. Ajudar aos pobres é um dom de Deus que se manifestana ação concreta dos homens. A graça não é um dom inerte, não é uma riqueza da qual cadaum pudesse gozar egoisticamente: graça é participar da partilha dos bens com os irmãos(8,1.4.6.7.9; 9,8.13-15).

Este “serviço” não consiste tambémnuma simples coleta porque a unidade da igreja estava emjogo, já que a abertura da missão para fora de Israel estava sendo alicerçada e legitimada comessa coleta. Assim, o serviço aos pobres está destinado a expressar, fundamentar e estabelecera estrutura do novo povo de Deus. Paulo estende a solidariedade do povo para além das fron-teiras da lei. O apelo aos pobres fez surgir a oportunidade para um novo relacionamento como povo de Israel e fazer os coríntios entenderem que eram parte de um povo maior. No en-contro de JerusalémPaulo percebeu a oportunidade para provocar umanova formade agir nasigrejas gregas. Era importante tecer relações entre os de Jerusalém e os gregos, mover bens es-pirituais, pôr em movimento a generosidade material, modelar um novo estilo de relações so-ciais e criar um novo modelo de sociedade. Nesse sentido, a diakonia dos pobres visavafortalecer a unidade da igreja entre judeus e gentílico-cristãos.

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1. O exemplo dos macedônios2 Coríntios 8,1-5 introduz o assunto “o serviço dos pobres”, procurando despertar o interessedos coríntios pormeiodeumexemplo: Paulo elogia o comportamentodosmacedônios no ser-viço aos pobres. Menciona a generosidade das comunidades da Macedônia, cuja fonte é agraça de Deus (2 Coríntios 8,1-2). A “coleta” como serviço aos pobres de Jerusalém é expres-são da própria graça de Deus. É um dom de Deus que assume a forma do dom humano. A ati-tude dos macedônios mostra que Deus está ativo neles e opera por meio deles.

Os macedônios eram pobres, mas a sua generosidade era maior. Generosidade, no grego “ha-plótes”, significa simplicidade, sinceridade, franqueza. Trata-se da generosidade sincera, quevisa o bem estar do próximo, a partir da qual os macedônios participaram na arrecadação defundos para os pobres de Jerusalém (2 Coríntios 8,3-5). A generosidade e a grande disponi-bilidade dosmacedôniosmanifestaram-se de duasmaneiras: participaram comgrande alegriano meio de imensos sofrimentos e, apesar de serem pobres, mostraram grande generosidade.Essa alusão à situação particular das pessoas que formavam a comunidade mostra que da ex-trema pobreza nasceu a sua extrema riqueza. Assim, podemos caracterizar a generosidade dosmacedônios da seguinte forma: deram segundo as suas possibilidades, além das suas possibi-lidades, espontaneamente, pediram com insistência para participar na coleta.

As comunidades daMacedônia, portanto,mesmo sendopobres e passando por perseguições,fizeram a “coleta” para garantir a construção do reino. Essas igrejas eram tão pobres quanto ade Jerusalém, mas a contribuição financeira era fundamental para garantir a continuidade doscristãos de Jerusalém na participação na construção do reino: os mais pobres deram mais din-heiro, um sinal de que o reino já está presente.

2. Os coríntios devem seguir a prática de JesusA generosidade dos macedônios foi a sua disposição de pôr os bens materiais a serviço dosnecessitados. A solidariedade gera a disponibilidade, a qual gera a comunidade. Por sua vez, acomunidade gera a igualdade. A arrecadação era um serviço, um trabalho em favor das comu-nidades pobres de Jerusalém. Paulo pede que o bem estar do pobre valha o nosso “investi-mento” e que a arrecadação consiga mobilizar tudo o que os cristãos têm em disponibilidadepara doar. Dessa forma, ele desenvolve a idéia de serviço apresentada no texto. No v.4 os ma-cedônios pediram a graça de participar da assistência aos santos e Paulo “espera queTito con-siga completar essa graça entre os coríntios” (v.6) e que eles “abundem nesta graça” (v.7). Secoríntios tinham superabudância e excelência em suas virtudes, porque não acrescentar a issoa generosidade na participação do serviço aos pobres? Para mobilizar os coríntios a participa-rem do serviço aos pobres Paulo desenvolve três argumentos:

a) O exemplo de Cristo.. Os coríntios devem seguir o modelo de Jesus Cristo: “Pois con-heceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, por amor de vós se fez pobre, paraque pela sua pobreza fôsseis enriquecidos” (2 Coríntios 8,9). Cristo tornou-se pobre, ou seja,tornou-se humano e abdicou de sua riqueza divina, para enriquecer as pessoas com as dádivasda salvação (Filipenses 2,5-8). Com isto a pobreza, que culmina no sacrifício de na cruz, tornao marco da missão de Cristo. Isto é graça! Essas palavras são importantes pois mostram queum termo teológico tão importante como graça é aplicado à esfera da economia (das 18 vezesque 2 Coríntios usa a palavra graça, 10 estão no contexto da coleta). Paulo usa palavra graça de-signando salvação e coleta. Salvação está ligada ao pão nosso de cada dia, os dois estão interli-gados, um depende do outro. Trata-se de uma coleta que na verdade atinge o ser cristão da

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comunidade. É a prática do amor a partir da fé que leva à salvação, a qual provém da graça deDeus. No fundo a coleta dada é a gratidão pela graça recebida e que é revertida aos cristãos deJerusalém.

b) O útil ou convincente. Paulo parte da consideração de bom senso: convém acabar umaobra começada (2 Coríntios 8,10-12). Algo ocorreu e a coleta começada no ano anterior haviasido interrompida. O que teria acontecido? Com certeza foi a grande crise acontecida, em cujocontexto Paulo escreveu a carta apologética (2 Coríntios 2,14-6,13; 7,2-4), que ficou sem efeito.Então ele mandou uma segunda carta (10-13), que também ficou sem efeito. Houve, então, asegunda visita de Tito a Corinto e Tito conseguiu a reconciliação (2 Cor 1,1-2,13; 7,5-16).Paulo pede agora que eles continuem o que já havia sido começado. A carta produziu efeito ePaulo pode reiniciar a coleta. Assim, 2 Coríntios 8-9 tem por objetivo reestimular os coríntiosa reassumir a coleta parada. A carta deu resultado, pois Romanos 15,25-32 mostra que a coletafoi feita.

c) A igualdade. Jesus Cristo é o exemplo divino para a ação da comunidade junto aos co-ir-mãos. Ele não se tornou pobre para que todos ficassem pobres, mas para que todos fossemricos. Dessa forma, em lugar da pobreza, todos terão pelos menos a suficiência, graças à redis-tribuição feita pelos ricos. Assim como Cristo, as comunidades cristãs devem estar dispostas adesprender-se de tudo o que representa supérfluos e colocá-los a serviço dos pobres, para quehaja igualdade (2 Coríntios 8,13-15; 9,12-14). Assim, Paulo afirma que será realizada a igual-dade, a qual deve reinar entre os cristãos. Este modelo se encontra em Êxodo 16,18, a propó-sito do maná: “Nem quem tinha colhido muito tinha de sobra, nem quem recolhera poucolhe faltava”. O maná não podia ser acumulado, mas colhia-se a cada dia o suficiente para um dia.Isto era feito para garantir a igualdade. Da mesma maneira, coleta é feita pela comunidade cristãque crê na ressurreição do corpo e esta não admite a fome, pobreza e desigualdade social. A co-leta, que não tem por base a lei, mas sim a graça, é feita por amor aos pobres. É dessa maneiraque se denuncia a desigualdade social.

3. A sementeira e a colheita (2 Coríntios 9,6-15)Paulo envia uma delegação para resolver o assunto da coleta nas comunidades da Acaia, poisnão acredita que possa resolver tudo por carta. 2 Coríntios 9,1-5 afirma que o exemplo dosacaios suscitou a imitação de um grande número. Os acaios prometeram fazer da coleta um atode generosidade. Assim, 2 Coríntos 9,6-14 reúne cinco argumentos capazes de convencer osacaios a praticar a mais abundante generosidade. Paulo expressa por meio desses argumentosuma concepção nova das relações humanas e da constituição da sociedade.

a) Primeiro argumento.O desafio: “Mas digo isto: Aquele que semeia pouco, pouco tam-bém ceifará; e aquele que semeia em abundância, em abundância também ceifará” (2 Corín-tos 9,6) lembra outras passagens da Escritura: “Um dá liberalmente, e se torna mais rico; outroretém mais do que é justo, e se empobrece” (Provérbios 11,24); “Então, enquanto temos opor-tunidade, façamos bem a todos, mas principamente aos domésticos da fé” (Gálatas 6,10). A co-leta deve ser uma dádiva, o que significa superar e ultrapassar a si mesmo em direção aopróximo.

b) Segundo argumento. A generosidade não levará ninguém à penúria: “Cada um contri-bua segundo propôs no seu coração; não com tristeza, nem por constrangimento; porqueDeus ama ao que dá com alegria. E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça,a fim de que, tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda boa obra” (2 Co-ríntios 9,7-8). Para Paulo há dois tipos de doadores: o que semeia pouco, com tristeza e porobrigação e que, por isso, pouco ceifará; o que semeia em abundância, com alegria e confiança

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em Deus e que, por isso, muito ceifará. A suficiência permite transferir o dom de Deus para osnecessitados. A comunidade não deve demonstrar pequena fé ao dar, mas olhar para Deus,que tem muitos recursos. Ele pode dar o necessário para a própria subsistência e ainda o sufi-ciente para transbordar em favor de outros (Filipenses 4,19).

c) Terceiro argumento. A verdadeira justiça consiste em dar o excedente: “Conforme estáescrito: Espalhou, deu aos pobres; a sua justiça permanece para sempre. Ora, aquele que dá asemente ao que semeia, e pão para comer, também dará e multiplicará a vossa sementeira, e au-mentará os frutos da vossa justiça. Enquanto em tudo enriqueceis para toda a liberalidade, a qualpor nós reverte em ações de graças a Deus” (2 Coríntios 9,9-11). Devemos semear com ale-gria pois é o próprio Deus que cria nas pessoas a possibilidade de semear alegremente. A dá-diva de Deus é motivo e condição para as dádivas da comunidade. Este dar generoso, que seapresenta alegre e sem cálculos, é ação de justiça, pois quem reparte com o irmão, realiza a von-tade de Deus. Deus mesmo dará a semente (os recursos) para uma sementeira (ação) abun-dante. Ele também cuidará para que as dadivas não venham a empobrecer os doadores. Agenerosidade não só faz crescer frutos de justiça que honram a Deus, mas que ela tem a virtudede despertar a gratidão a Deus naqueles que são o alvo da generosidade

d) Quarto argumento. Uma coleta é nitidamente uma ação diaconal. Paulo fala em lei-tourgia. Diaconia e leitourgia sempre são testemunhos que louvam a Deus, o verdadeiro doa-dor de todos os bens. A redistribuição dos bens aos pobres é a verdadeira liturgia, a verdadeirareligião. Ela desemboca numa ação de graças: “Porque a ministração deste serviço não só supreas necessidades dos santos, mas também transborda em muitas ações de graças a Deus” (2Coríntios 9,12). A partilha das dádivas divinas se efetiva em múltiplas formas: na gratidão, nosuprimento das necessidades dos que são ajudados, na intercessão pelos doadores, na saudadedos beneficiados por fraterna comunhão com os benfeitores (os destinatários terão desejo deconhecer os doadores). Vendo a diaconia dos doadores, os irmãos beneficiados reconhecerãoa filantropia do próprio Senhor. Vendo o serviço dos coríntios, os irmãos de Jerusalém louva-rão a Deus.

e) Quinto argumento. O serviço aos pobres manifesta as verdadeiras disposições dos acaiose dele deriva a ação de graças dos pobres de Jerusalém (2 Coríntios 9,13-14). Os acaios ma-nifestam pela sua generosidade que vivem uma verdadeira comunhão, têm um verdadeiro es-pírito comunitário. A comunidade é uma realidade material e concreta: manifesta-se naredistribuição dos excedentes. A generosidade para com os pobres de Jerusalém é o sinal de queos pobres acaios praticam a comunhão, não somente com eles, os de Jerusalém, mas tambémcom todos. A graça de Deus está presente em toda essa seção: a coleta é uma graça de Deus,visto ser uma participação no próprio ser de Deus. Deus é dom, e poder dar é prolongar o agirde Deus. Prevendo essa riqueza multiforme da coleta, confiando na comunhão de todos osenvolvidos e na ação de graças a Deus que a todos unirá, o próprio apóstolo se vê envolvido pelagratidão: “Graças a Deus pelo seu dom inefável” (2 Coríntios 9,15). Portanto, a coleta é graça,generosidade, diaconia, benção, serviço sagrado e confissão.

4. Temas a serem discutidos no textoa) Necessidade e excedente. 2 Coríntios 8-9 mostra que algumas pessoas tinham necessi-dade, em comparação com outros que tinham em abundância. Uns estão na penúria, não têmos bens necessários e sofrem por isso no seu corpo. Outros têm mais que o necessário. O queultrapassa o necessário é o supérfluo. O necessário é o que faz falta, o excedente é aquilo de

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que não se sente falta (8,13.14; 9,12). O necessário é o que é preciso para que os pobres pos-sam viver. Esse conceito de direito dos pobres vem do judaísmo. No caso dos pobres de Jeru-salém havia outros motivos: Jerusalém era a cidade mãe dos cristãos, o ponto de partida donovo povo de Deus. Assim, os coríntios podiam compreender um pouco melhor este argu-mento, pois, tendo uma vez aprendido a ajudar os pobres de Jerusalém, poderão também aju-dar outros pobres e assim pouco apouco aprender que se está tecendo uma nova solidariedadeentre todos os crentes.

b) Pobreza e riqueza. Ricos e pobres são termos correlativos. O texto apresenta um parale-lismo entre ricos e pobres por um lado e, por outro, necessidade e supérfluo. Os pobres são osque passam necessidade e os ricos são os que têm supérfluo. No texto, opõe-se a pobreza dosmacedônios à riqueza da sua generosidade e a riqueza que Jesus tinha e a pobreza que adotou,a fim de que os que eram pobres se tornassem ricos. Jesus veio trazer a riqueza, mas esta ri-queza exclui o privilégio e inclui uma distribuição justa dos bens disponíveis.

c) Igualdade e suficiência.A finalidade do serviço aos pobres é que haja igualdade. O sen-tido do serviço é estabelecer a igualdade onde há desigualdade. A igualdade bíblica é igualdadeeconômica, uma igualdade na distribuição dos bens e no gozo dos bens materiais. Nem a po-breza, nem a riqueza, mas a igualdade. Paulo encontrou o rosto concreto da suficiência na suaprópria experiência missionária. Como apóstolo, teve uma vida itinerante e sempre insegura.Como peregrino, sempre foi ao encontro do imprevisto (Filipenses 4,12-13).

d) Comunidade ou koinonia

Em Atos 2,42-47 os cristãos tiram as conseqüências da solidariedade, colocando tudo o quepossuíam em comum. A koinonia consiste em pôr tudo à disposição dos necessitados, semreservar nada para si só, pois se baseia essencialmente no fato de que os fiéis gozam dos mes-mos bens divinos. Uma comunhão tão profunda conduz naturalmente à obrigação de partil-har bens temporais com os que dele carecem.

e) Amor (agape). O amor estabelece a aliança entre Deus e o povo. O amor é um atributofundamental de Deus e a origem de toda a história de Deus no meio dos homens. Amor é domprimordial, a substância da vida cristã. Amor tem um significado social. É solidariedade. O “ser-viço dos pobres” deriva do amor e é sinal da solidariedade que reúne as comunidades num sócorpo (8,7.8.24; 9.7). A solidariedade mostra que o amor é uma disposição prática, que produzefeitos materiais e muda o sentido da propriedade dos bens.

f) Disponibilidade. Paulo não pede aos coríntios o que eles não têm, mas unicamente oque eles têm em excesso, o supérfluo, pois o excedente de um pode gerar ou perpetuar a ca-rência do outro. O cristianismo se fundamenta num movimento exatamente o contrário ao daperpetuação da miséria, pois ele é construído sobre a prática da solidariedade.

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5. Questões a serem discutidasAs questões levantadas por 2 Coríntios 8-9 podem ser relacionadas não só com a vida econô-mica da igreja mas também com o sistema econômico vigente.

a. Um padrão de vida cada vez mais opulento, que tem nos publicitários os seus profetas, éafirmado como o valor maior nas sociedades atuais. A ganância pelo lucro fácil e rápidodas sociedades atuais tem gerado a fome e a miséria para milhões de pessoas em todo omundo. Segundo o texto, a lógica do acúmulo deve ser contestada. Devemos trabalharpela construção de um projeto coletivo que garanta a vida para todos. Como é possívelexistir tanta falta de solidariedade e ajuda para com os necessitados no mundo atual?

b. As comunidades devem praticar um sistema econômico que tenha como objetivo a ga-rantia de vida integral dos seus membros. O motivo que impulsiona o apóstolo a fazer essasafirmações tem origem no direito dos pobres do Antigo Testamento. É o projeto de igual-dade. Hoje há concorrência. As comunidades estão abertas para receber todos os que quei-ram aceitar a graça de Deus e vivê-la concretamente?

c. A contribuição para a igreja é a garantia de sobrevivência de uma igreja que tem um pro-jeto concreto de transformação do mundo. Esse projeto se inicia na sua própria práticaeconômica da igreja que, por sua vez, vem da graça de Deus. A vida em abundância é de-terminada por um projeto econômico: só há vida em abundância se há um projeto eco-nômico igualitário. A prática econômica da comunidade, que é conseqüência da graça deDeus, tem questionado a prática econômica vigente? A igreja tem se baseado no sistemaeconômico vigente ou tem procurado outra prática que garanta a sua unidade e a sobre-vivência dos seus membros?

d. 2 Coríntios 8-9 parece indicar que “a libertação” começa dentro das próprias fileiras”. Elavem de baixo, não de cima. A pobreza é um mal que pode ser erradicado a partir de baixo,dos pobres, devido ao seu potencial evangelizador. Quando queremos transformar algumacoisa, geralmente procuramos os influentes. Quando Deus quis salvar o mundo, escolheuos “desprezados deste mundo”. A postura em favor dos pobres é determinante em Jesus ena comunidade primitiva. De se fez pessoa pobre, começando pelo nascimento, para quena sua pobreza nos tornássemos ricos. Ao assumir a condição de miserável, Cristo tornapossível a vida total. Fica a questão: a partir de onde temos construído a nossa prática cristã?

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A experiência passada da comunidade cristãcomo um paradigma de ação para seu presente

e futuro imediato: Hebreus 10,32-34

Hebreus, após demonstrar que o sistema da antiga aliança é inferior quando comparadocom a nova aliança (7,1-10,18) e que Jesus abriu “novo e vivo caminho” pelo qualtemos acesso pleno a Deus (10,19-23), apresenta as conseqüências do afastamento

do sacrifício único da nova aliança (10,26-31). Em seguida, em 10,32-39, apresenta uma ex-periência da comunidade cristã no passado, exortando-a à perseverança, numa passagem queapresenta a primeira ocorrência de reprovação e de ameaça à comunidade cristã (10,33a). Aexortação contém um apelo que deriva de citações do Antigo Testamento (10,37-38) e apre-senta a fé pela qual o “justo viverá”. Hebreus relembra aos destinatários a força deles em meioao sofrimento passado (vv.32-34) e, em face daquela memória, exorta-os à esperança e perse-verança para que possam receber a promessa. Ao relembrar a experiência da comunidade nopassado sob circunstâncias adversas e exortá-la a considerar aquela experiência e perseverarpara receber o galardão, transforma-a num paradigma de ação para o seu presente e o futuroimediato.

As conexões que indicam o desenvolvimento do pensamento nos vv.32-36 são importantesnão só para uma percepção mais clara de como o paradigma se desenvolve, mas também parauma compreensão da sua relação com 10,37-38, onde o contraste entre “pela fé” e “voltar atrás”ocorre. Os vv.32-34 estão conectados com o v.36 por meio das palavras “perseverar” e “perse-verança”. “Não percais a vossa “segurança”, ela recebe uma grande recompensa”, de 10,35, estáconectado com “De fato, o que precisais é de persistência para cumprir a vontade de Deus e,assim, conseguir a realização da promessa” (10,36). A perseverança, de 10,36, já havia sido su-gerida no v.35 com a menção de “segurança” e a exortação a não abandonar a “confiança” estáfundamentada na esperança de um galardão futuro.

O desenvolvimento do pensamento conduz também a outro aspecto em 10,37-38. Por umlado, “suportar o sofrimento” (v.32) está fundamentado na “melhor possessão” (v.34) e a “in-trepidez” tem em mente a “recompensa” (v.35). Por outro, a necessidade de “perseverança”(v.36) fundamenta-se não em “para cumprir a vontade de Deus e, assim, conseguir a realiza-ção da promessa”, mas nas citações do Antigo Testamento nos vv.37-38, que indicam que otempo de espera ainda não passou. Assim, 10,36: “De fato, o que precisais é de persistênciapara cumprir a vontade de Deus e, assim, conseguir a realização da promessa”, conduz a 10,37:“Pois ainda tão pouco, tão pouco tempo, e aquele que vem estará aí, não tardará”, que apre-senta a razão pela qual a comunidade deve manter a “segurança”. Assim, o compromisso e co-ragem da comunidade em circunstâncias adversas no passado, são apresentados como ummodelo de ação para o momento atual da comunidade cristã.

A experiência passada da comunidade é apresentada da seguinte forma:

“Mas recordai-vos dos vossos primórdios: mal havíeis recebido a luz e já aturáveis um pesadoe doloroso combate, aqui, oferecidos em espetáculos sob injúrias e perseguições; ali, feitos so-lidários dos que sofriam tais tratamentos. E, de fato, participastes nos sofrimentos dos prisio-neiros e aceitastes com alegria a espoliação dos vossos bens, sabendo que estáveis de posse deuma fortuna melhor e duradoura” (10,32-34).

Estes versos estão estruturados quiasticamente, constituindo uma indicação de que Hebreusprocura enfatizar a experiência da comunidade:

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A: Aqui, oferecidos em espetáculo sob injúrias e perseguiçõesB: Ali, feitos solidários dos que sofriam tais tratamentosB’: E, de fato, participastes nos sofrimentos dos prisioneirosA’: E aceitastes alegremente a espoliação dos vossos bens

O uso da conjunção adversativa “mas”, em 10,32, indica que Hebreus procura levar os desti-natários a agir de maneira oposta à que ele acabou de descrever em 10,26-31. A exortação a re-lembrar a experiência passada, uma característica regular da homilia cristã primitiva, não sóenvolve a memória dos eventos ocorridos durante a perseguição da comunidade (12,1.2.3.7),como também indica que a comunidade deveria agir no presente como agiu no passado. Asindignidades sofridas pela comunidade são destacadas e a referência à experiência de perse-guição torna-se mais específica com a apresentação do que aquela experiência envolveu. Umaparte da comunidade foi exposta ao ridículo, presa e sofreu abuso das autoridades, mas os de-mais membros da comunidade foram solidários com aqueles que passaram por estes sofri-mentos.

1. Exposição à vergonha públicaHebreus destaca a humilhação pública sofrida pelos destinatários: “oferecidos em espetáculossob injúrias e perseguições”. “Oferecidos em espetáculos” significa tornar-se espetáculo, ser ri-dicularizado e exposto à vergonha. “Injúrias” e “perseguições” indicam a natureza da humilha-ção a que os destinatários foram sujeitos. “Injúria” significa “desgraça”, “vergonha”, “escândalo”e, secundariamente, abuso e abjuração. Esta palavra descreve vários tipos de abuso verbal e oseu uso repetido em 11,26 e 13,13 sugere que o abuso foi um aspecto real e constante da ex-periência dos destinatários de Hebreus. O seu significado varia, portanto, de reprovação a mal-dição, passando a afronta, escárnio, injúria e ultraje, associando-se com comentários sarcásticose, freqüentemente, com escárnio, acompanhado por comentários degradantes, e, embora nãopossamos saber com precisão quando isto ocorreu, o autor de Hebreus considera a lembrançadesse momento de alguma forma necessária para a resposta da comunidade cristã no presente.A descrição da experiência passada revela que a honra deles estava sendo atacada individual ecoletivamente e exposta cada vez mais à degradação.

A vergonha infligida pelos perseguidores surgia normalmente de uma desgraça ligada a umcrime ou era resultado de uma condenação pública. Ela envolvia ataques verbais à honra e ca-ráter da pessoa e parece que isto foi comum aos cristãos em vários contextos sociais, estandodiretamente ligada à associação deles com Cristo (1 Pedro 4,14-16; Mateus 5,11; Lucas 6,22).O mais amargo elemento da experiência da comunidade foi a sua exposição à vergonha pública,mas Hebreus também mostra que o abuso verbal estava ligado a ataques físicos. Hebreus uti-liza a palavra thlipsis para descrevê-la, um expressão que indica todas as formas de perseguiçãoque os cristãos sofreram. Thlipsis é uma palavra usada na Septuaginta para descrever o sofri-mento de Israel (2 Reis 13,4), especialmente quando o salmista fala em nome do povo (Salmo4,1; 9,9; 10,1), nas referências a um dia ou tempo de angústia (Salmo 37; 50,15. Thlipsis é tam-bém um dos elementos mais comuns e gerais que o Novo Testamento utiliza para descrevera perseguição (Mateus 13,19.24; Atos 7,10; 14,22; Romanos 5,3; 8,35; 2 Coríntios 4,8; Apo-calipse 2,9). A fonte da aflição é tipicamente um inimigo humano e Hebreus não identifica ouataca aqueles que têm perseguido os seus destinatários e, embora Hebreus afirme que os des-tinatários ainda “não haviam resistido até o sangue” (12,4), ou seja, não ocorrera morte comoresultado dos julgamentos suportados, o compromisso deles com Cristo os expôs à censura,difamação e ao abuso físico.

Todos estes tormentos fizeram com que os destinatários de Hebreus se tornassem espetáculopúblico e não podemos saber com precisão quando isto ocorreu e as experiências de sofri-

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mento indicadas pertencem claramente ao passado da comunidade. É também provável quea intensa experiência de desgraça e a aguda desaprovação da sociedade tenham provocadonos cristãos um sentimento de vergonha, ou seja, eles se viram tentados a respeitar uma vez maisseus valores, relações e tradições. Mas, segundo Hebreus, foi a resistência a estas tentativas decontrole social no passado que fez deles os melhores exemplos para o presente, razão porqueHebreus considera a lembrança desse momento de alguma forma necessária para a respostados seus destinatários no presente, cuja honra estava sendo atacada individual e coletivamentee exposta cada vez mais à degradação. Sem dúvida alguma, o espetáculo público a que foramexpostos contribuiu para a dolorosa e natural ligação entre “injúrias” e “perseguições” que He-breus fala (10,33a).

2. Confisco da propriedade e prisãoOutro aspecto da experiência de perseguição e marginalização dos destinatários de Hebreusconsiste no confisco da propriedade e na prisão de alguns deles (10,34b). Não se sabe ao certose estamos diante de uma ação judicial oficial dos magistrados que impuseram pesadas mul-tas ou confiscaram as propriedades devido a infrações suspeitas ou se a referência é ao saquede casas depois que seus proprietários foram presos ou banidos. De qualquer forma, a perdade riqueza, particularmente como parte do ataque à honra da pessoa e à própria pessoa, envolviaa perda de status. Riqueza e posses geralmente não eram acumuladas como um fim em simesmo no mundo antigo, mas para prestígio e honra através do sistema de beneficência pri-vada ou pública. Uma perda de riqueza envolvia uma potencial perda de prestígio. A honra es-tava ligada à demonstração da riqueza, mesmo a pequena riqueza de um camponês. Qualquerque fosse a riqueza de alguém, ela consitia num tesouro e indicação do status da pessoa. Aperda de riqueza envolvia também uma perda proporcional de honra e provocaria o desprezode outros se fosse considerada como resultado de uma falta da própria vítima.

A situação de reprovação e rejeição apresentada indica que os cristãos poderiam trazer a des-graça sobre eles mesmos ao se recusarem a cumprir as obrigações exigidas pelos padrões vi-gentes. A perda oficial, ou não, da propriedade, ligada com a degradação deles como cristãosenvolveria desgraça adicional, pois ela poderia também colocá-los numa situação econômicamais difícil, sendo difícil para eles recuperar a sua posição econômica anterior. De qualquerforma, o efeito geral daquela experiência foi de marginalização social, rejeição e degradação.O lugar dos cristãos na sociedade foi desafiado e as pessoas envolvidas perderam seu statuscomo cidadãos firmes e confiáveis. Podemos supor que com o passar do tempo a situaçãomudou e eles começaram a sentir o desejo de recuperar seu lugar na sociedade, bem comosua honra diante dos incrédulos. No decorrer do tempo, foram confrontados por aqueles queestavam conscientes da sua degradação, que bem poderiam lhes ter lembrado o seu novo sta-tus na sociedade. Assim, eles começaram a sentir vergonha, ou seja, a ficar preocupados coma sua reputação diante dos representantes da sociedade. Foi talvez mais fácil no fogo da perse-guição, no fervor da solidariedade religiosa, deixar de lado a opinião dos de fora. Viver com suaperda, entretanto, estava se tornando mais difícil.

Por isso, Hebreus realiza um jogo entre as palavras “propriedades, posses” (v.34b) e “posses-são” (v.34c), que é retoricamente efetivo ao desenvolver o contraste entre posses que podemser perdidas e posses permanentes que os cristãos possuem devido ao seu relacionamentocom Deus através de Cristo. O adjetivo “superior” é usado regularmente em Hebreus para ex-pressar a efetividade da realidade que os cristãos possuem (6,9; 7,19; 9,23; 11,16; 12,24). Aconfiança dos primeiros cristãos de que eles possuíam “uma fortuna melhor e duradoura” no

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mundo celestial que Cristo havia aberto para eles permitiu-lhes desenvolver uma perspectivaprópria sobre a privação sofrida em meio à perseguição. Quaisquer que tenham sido as cir-cunstâncias, os destinatários de Hebreus aceitaram alegremente aquelas perdas porque sabiamque possuíam “uma fortuna melhor e duradoura”, tinham consciência de possuir uma reali-dade superior, melhor que as posses terrenas, pois da mesma forma que o sumo sacerdote ce-lestial e a cidade que há de vir, a possessão deles é uma realidade permanente (7,3; 11,14-16;13,14).

3. A solidariedade da comunidadeHebreus nota também que outro componente na ação dos seus destinatários foi a disposiçãodaqueles que, presumivelmente, não tinham sofrido a mesma punição pública, demonstrar so-lidariedade com os que eram tratados daquela forma. Aqueles que não haviam sido atingidospessoalmente pela hostilidade a qual alguns membros da comunidade foram sujeitos se iden-tificaram abertamente com seus irmãos e irmãs. A afirmação de 10,33: “aqui, oferecidos emespetáculos sob injúrias e perseguições; ali, feitos solidários dos que sofriam tais tratamentos”,acentua a persistência demonstrada pelos destinatários em compartilhar o sofrimento dos seuscompanheiros. Além de suportar as aflições, eles tornaram-se “participantes” dos que foramtratados daquela maneira. Hebreus 10,25 alerta para o perigo de negligenciar a comunhão,mas agora destaca a mais ampla comunhão da comunidade cristã que alcançou completa ex-pressão em tempos de necessidade. No v.34 a recordação torna-se mais específica na afirma-ção da compaixão e sofrimento pessoal que os destinatários tinham experimentado. Suacomunhão com a aflição dos outros foi manifestada em sua compaixão pelos prisioneiros, aqual, sem dúvida, foi mais que mera simpatia, envolvendo o apoio concreto que o irmão presonecessitava (ver 13,3).

Os que não tinham sofrido a mesma punição pública, manifestaram uma verdadeira compai-xão para com os que estavam na prisão ao visitá-los e levar-lhes alimento e, sem dúvida, pro-curar a sua libertação. Os que vieram em auxílio dos que foram diretamente espoliados deramtestemunho de que preferiam a comunidade dos seus companheiros na fé e não aquela da cul-tura dominante. Eles vieram ousadamente em auxílio de seus irmãos e irmãs diante daquela so-ciedade (10,35) e não tiveram medo de possíveis represálias. O envolvimento deles com osseus companheiros não foi gratuito e a solidariedade manifestada naquele período é similar àmaneira com que Cristo se identificou com a condição humana (2.14; 4,15). A comunidadeagiu de forma solidária para com aqueles que necessitavam de apoio, tornando visível nomundo a solidariedade que Cristo compartilhou com o seu povo.

Vemos, portanto, que Hebreus 10,32-34 apresenta a coragem e compromisso da comunidadecristã sob circunstâncias adversas no passado como um modelo para a sua perseverança atual.Partindo de uma tradição cristã primitiva designada a fortalecer os cristãos na crise de perse-guição, o autor aplica aquela tradição aos destinatários, a fim de encorajá-los a imitar seu pró-prio exemplo. A perseverança da comunidade indica que seus membros “receberão apromessa”. A promessa, um motivo que aparece antes em Hebreus como uma alusão à salva-ção inaugurada por Cristo (4.1.8; 6,12.17; 8,6), surge novamente, constituindo-se num fiocondutor importante através do capítulo 11 (vv.13.17.33.39). Hebreus procura motivar a co-munidade a “não abandonar a segurança” (10,35), que é, significativamente, oposta à vergonha,assinalando o grande galardão que eles tinham recebido e que receberiam se permanecessemfirmes no seu compromisso. Os fiéis são exortados a demonstrar fé e não voltar atrás no seucompromisso com Cristo. Neste contexto, Hebreus retorna aos exemplos celebrados de com-

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promisso e fé, a fim de estimular o zelo deles pela honra diante de Deus e reforçar a idéia de queeles deveriam continuar afastados dos valores da sociedade vigente.

4. Questões a serem discutidas1. A confissão cristã provocou a degradação e trouxe privação aos destinatários de Hebreus.

O perigo real para ela seria colocar em perigo a sua honra diante de Deus ao voltar atrásdiante da pressão da sociedade. Assim, Hebreus 10,32-34, partindo de uma tradição queprocurava fortalecer os cristãos na crise de perseguição, procura encorajar a comunidadecristã a imitar o seu próprio exemplo no passado, quando uma parte da comunidade foi ex-posta ao ridículo, presa e ficou indefesa diante do confisco da sua propriedade, mas a outraparte foi solidária com o grupo que sofreu aquelas atrocidades. Como podemos recontara história das comunidades cristãs e como a vida delas pode hoje iluminar a nossa vidacomo comunidades cristãs comprometidas com o Reino de Deus?

2. A confiança da comunidade cristã de que ela possuía “uma fortuna melhor e duradoura”no mundo celestial que Cristo havia aberto para ela permitiu-lhe desenvolver uma pers-pectiva própria sobre a privação sofrida em meio à perseguição. Quaisquer que tenhamsido as circunstâncias, os destinatários de Hebreus aceitaram aquelas perdas porque sa-biam que possuíam “uma fortuna melhor e duradoura”, tinham consciência de possuiruma realidade superior, melhor que as posses terrenas, pois da mesma forma que o sumosacerdote celestial e a cidade que há de vir, a possessão deles é uma realidade permanente(7,3; 11,14-16; 13,14). No mundo atual, contudo, assistimos não só a expoliação de mui-tas pessoas bem como a justificação da miséria de muitos em nome de “melhores riquezascelestiais”. Como, como comunidade cristãs, devemos lidar com a questão das “posses-sões materiais” de forma que a justiça do reino de Deus seja contemplada?

3. No relato da experiência de sofrimento passada dos destinatários de Hebreu vemos queaqueles não haviam passado pelo sofrimento se tornaram “solidários dos que sofriam taistratamentos, participando nos sofrimentos dos prisioneiros”. Da mesma forma, em nossocontexto, diante so sofrimento provocado por diversas causas, como, como comunidadescristãs, podemos criar redes de solidariedade e acolhimento para os que são desalojadospelo sistema vigente? Lembremos da exortação de Hebreus 13,2-3: “Não negligencieis ahospitalidade, pois alguns, praticando-a, sem o saber acolheram anjos. Lembrai-vos dosencarcerados, como se presos com eles; dos que sofrem maus tratos, como se, com efeito,vós mesmos em pessoa fôsseis os maltratados.”

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A queda da Babilônia em Apocalipse 18

Apocalipse 18 descreve a destruição da Babilônia e o colapso do mundo associado a ela.Na época do Apocalipse, Babilônia era um nome utilizado como um símbolo do “podermundial”, portanto como um símbolo do império romano. O texto mostra navios co-

merciais que passam dia a dia a caminho da Babilônia. Não é surpresa que João condene aque-les que transportavam as mercadorias para a grande cidade. A literatura apocalíptica da épocarevela que ele não estava sozinho em sua condenação da Babilônia e o uso que ele faz da da li-teratura profética indica que ele estava preocupado com a ação recíproca da idolatria, poder mi-litar e comércio. João exorta os cristãos a separar ou evitar ligações econômicas e políticas coma Babilônia, pois as instituições e estruturas representadas por ela eram leais ao imperador quereivindicava ser divino ou era tratado como tal. Para ele, a propaganda imperial era um em-buste e sua lealdade pertence à nova Jerusalém.

Vejamos o texto:1 Depois disso vi outro anjo que tinha grande autoridade descendo do céu e a terra foi ilumi-nada com a sua glória. 2 E gritou com forte voz dizendo:Caiu, caiu, Babilônia, a grandee tornou-se morada de demônioscovil de todo espírito imundocovil de toda ave imundae covil de toda besta imunda e detestável3 porque todas as nações beberam do vinho da fúria da sua prostituiçãoos reis da terra com ela se prostituírame os mercadores da terra da força da sua luxúria enriqueceram.4 E ouvi outra voz do céu dizendo:Sai dela ó povo meupara que não participeis dos seus pecadospara que não recebais das suas pragas5 porque os pecados chegaram até o céue Deus se lembrou das suas injustiças.6 Dai-lhe como também ela deu e dai em dobro segundo as suas obrasno cálice em que ela misturou, misturai dobrado para ela,7 tanto quanto glorificou a si mesma e viveu em luxúriatanto dai a ela tormento e pranto.Porque no seu coração disse: Estou sentada como rainha, não sou viúva e pranto jamais verei.8 Por causa disto em um dia virão as suas pragas, morte, pranto e fome,e em fogo será queimadaporque poderoso é o Senhor Deus que a julgou.9 E chorarão e se lamentarão sobre ela os reis da terra que com ela se prostituíram e viveramem luxúria, quando virem a fumaça do seu incêndio, 10 de longe ficam de pé por causa do medo do seu tormento dizendo:Ai, ai, da grande cidadeBabilônia, a poderosa cidadeporque em uma hora veio o seu julgamento.11 E os mercadores da terra choram e lamentam sobre ela porque ninguém mais compra a suamercadoria, 12 mercadoria de ouro e de prata, de pedras preciosas, de pérolas, de linho e púr-pura, de seda, de escarlate, toda madeira odorífera, todo vaso de marfim, todo vaso de ma-deira preciosa, de bronze, de ferro, de mármore, 13 cinamomo, amono, perfumes, ungüento,

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incenso, vinho, azeite, farinha finíssima e trigo, animal de carga e ovelhas, cavalos e carros, es-cravos e vidas humanas.14 E o fruto do desejo de sua alma retirou-se de ti e todas as coisas delicadas e brilhantes per-deram-se de ti e jamais serão encontradas.15 Os mercadores destas coisas, que com ela enriqueceram, de longe ficarão de pé por causa domedo do seu tormento, chorando e pranteando,16 dizendo:Ai, ai, da grande cidadevestida de linho, púrpura e escarlateadornada de ouro, pedras preciosas e pérolas,17 Porque em uma hora foi devastada tão grande riqueza.E todo piloto e todo o que navega livremente, marinheiros e os que trabalham no mar, per-maneceram de longe, 18 e gritavam vendo a fumaça do seu incêndio dizendo:Quem é semelhante à grande cidade?19 E lançaram pó sobre as suas cabeças e gritavam chorando e pranteando dizendo:Ai, ai, da grande cidadea qual, da sua opulência, enriqueceram todos os que têm navios no marporque em uma hora foi devastada.20 Alegrai-vos sobre ela ó céuse vós santos, apóstolos e profetasporque Deus contra ela julgou a vossa causa.21 E um anjo forte tomou uma grande pedra como de moinho e a atirou no mar dizendo:Dessa maneira, com violência, Babilônia, a grande, será lançada e jamais será encontrada.22 E a voz de harpistas, de músicos, de flautistas, de tocadores de trombetas jamais será ou-vida em tie todo artífice (de toda arte)jamais será encontrado em tie a voz do moinhojamais será ouvida em ti23 e a luz da candeiajamais brilhará em tie a voz do noivo e da noivajamais será ouvida em tiporque os teus mercadores foram os grandes da terraporque na tua feitiçaria foram seduzidas todas as nações24 e nela foi encontrado sangue de profetas, santose de todos os que foram mortos sobre a terra.

Comentário do textoA destruição da Babilônia e o colapso do mundo associado a ela descrito em Apocalipse 18 sãoapresentados com os elementos do cântico fúnebre, já presente nos profetas do Antigo Tes-tamento. Os profetas utilizaram o cântico fúnebre para falar da comunidade, da nação, do povo,do declínio político, agitando, exortando e antecipando a queda do reino, variando do con-texto afetivo de tristeza para a ironia. Os lamentos fúnebres dirigidos contra Tiro (Ezequiel26-28) e com os oráculos proféticos sobre a queda da Babilônia (Jeremias 50-51; Isaías 13-14;47) são de grande significado para a composição do Apocalipse 18. Estes cânticos, que assi-nalam o contraste entre o brilho da cidade e sua devastação, entre o seu passado e o agora, con-tém o modelo para o lamento fúnebre de Apocalipse 18.

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1. Anúncio de queda e exortação a sair da Babilônia: vv.1-8Apocalipse 18:1-3 relata uma visão da queda da Babilônia. Os vv.1-2a apresentam a visão e osvv.2b-3 apresentam as razões pelas quais a cidade está sendo destruída. O mensageiro, “umoutro anjo”, se dirige ao vidente de forma diferente que outros anjos e o vidente ouve uma pro-clamação: um anúncio público do céu à terra, uma mensagem que consiste na queda da Ba-bilônia. A linguagem “Caiu, caiu Babilônia, a grande”, que proclma a queda da Babilônia, amesma usada no Antigo Testamento nos oráculos contra a Babilônia, exprime a certeza deum evento que ainda não havia ocorrido. A descrição da Babilônia destruída como “moradade demônios, morada de espíritos imundos, de aves impuras, de bestas impuras e detestáveis”,segue as figuras usadas nas profecias da devastação da Babilônia, Edom Nínive (Isaías 13:19-22; 34:11-15; Jeremias 50:39; 51:37).

Apocalipse 18:3 apresenta as razões da queda da Babilônia e atribui uma atividade diferente acada um dos grupos associados com a Babilônia: “as nações beberam o vinho da fúria da suaprostituição” (14:8; 17:2); “os reis que com ela se prostituíram”; “os mercadores da terra seenriqueceram da força da sua luxúria”. Assim, Apocalipse 18:1-2 demonstra a reapropriação daBabilônia como a denominação simbólica do poder mundial hostil através de uma releitura dosoráculos proféticos contra a Babilônia. As metáforas da má conduta sexual e intoxicação sãodesenvolvidas no v.3 e este versículo, ao mencionar as transgressões econômicas, prepara ocaminho para o uso dos oráculos de Ezequiel contra Tiro e seu rei nos vv.9-19. Com o uso dosoráculos contra Tiro, a dimensão econômica das transgressões da Babilônia vêm à luz.

Apocalipse 18,4-8, por sua vez, contém um aviso que consiste numa ordem para sair da cidade,cujas razões são especificadas (vv.4b-5) e uma ordem para executar julgamento sobre a Babi-lônia (vv.6-8). As ordens são dadas nos vv.6-7a e explicadas nos vv.7b-8. O povo de Deus éexortado a romper a sua relação com a Babilônia para não compartilhar do seu pecado pois“estes chegaram até o céu e Deus se lembrou das suas iniquidades”. O povo de Deus é tambémchamado a retribuir à Babilônia o mal, o sofrimento que a Babilônia lhe causou (v.6). “Dai-lheem dobro segundo as suas obras”, “preparar a taça”, são expressões da lex-talionis (Jeremias50:29; 51:34-40; Êxodo 22:4.7; Isaías 40:2). A noção da dupla retribuição está combinadacom a imagem da taça, a metáfora da intoxicação desenvolvida anteriormente (17:2; 18:3).Babilônia será punida apropriadamente: ela beberá uma dupla porção de sua própria taça, deacordo com as suas obras. A metáfora da taça é empregada numa irônica inversão: a imagemaplicada à influência intoxicante da Babilônia sobre as nações é também a imagem usada paradescrever a sua sentença (16:19; 17:2.4). A retribuição é expressa em termos da inversão de si-tuações e as repetições “dai/deu”, “dai-lhe em dobro”, “misturou/misturai em dobro” enfatizama correspondência entre os crimes de Babilônia e a punição que ela deve sofrer. O v.7 descrevea auto-glorificação e o orgulho da cidade, mas o seu destino é o resultado do seu próprio or-gulho. Assim, a exortação ao povo a sair da cidade termina com um apelo ao justo julgamentode Deus: “em um só dia” (v.8). A repentinidade deste julgamento é ainda destacada nosvv.8,10.17.19, onde “em um só dia” é o refrão recorrente na boca dos reis, mercadores e ma-rinheiros. Este julgamento, que traz morte, pranto, fome, a cidade queimada em fogo, é reali-zado pelo “poder de Deus”. Deus exerce a sua justiça definitiva no “tempo final” em favor doseu povo, como o seu Salvador (v.20).

2. Lamentos sobre a Babilônia: vv.9-20Os vv.9-19 apresentam os cânticos fúnebres de três grupos: dos reis (vv.9-10); dos mercado-res (vv.11-17a); dos marinheiros (vv.17b-19). O v.20, que conclui a seção, é uma ordem dadaaos santos, apóstolos e profetas para se alegrarem “porque Deus julgou a causa deles”, e suasua alegria contrasta com a tristeza dos reis, mercadores e marinheiros.

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2.1. O lamento dos reis: vv.9-10

O primeiro dos três lamentos pertence aos reis da terra, cujo relacionamento com a Babilôniaé descrito no v.3 como “os que com ela adulteraram e viveram em luxúria”. O v.10b apresentaa repetição do lamento “ai, ai” (18,16.19; cf. 8,13; Ezequiel 16:23), os quais fazem parte da en-fática declaração de julgamento contra Babilônia. Assim, a expressão “ai, ai” estendida na ex-pressão que segue: “Babilônia, a poderosa cidade”, chama a atenção para este elemento daqueda da grande cidade e concentra-se na ruína do seu poder. O final do lamento assinala a re-pentinidade da queda da grande cidade e reafirma a qualidade forense deste fato ao usar umaexpressão “Pois o seu julgamento veio em uma hora”. Dessa forma, o orgulho da Babilônia(v.7), seu poder descrito com a metáfora da má conduta sexual e intoxicação (14:8; 17:2.4;18:3.9), são repentinamente destruídos. Em Apocalipse 18:8 o poder de Deus é exercido emsua execução do julgamento da Babilônia. Em Apocalipse 18,10b o julgamento da Babilôniaenvolve a perda do seu poder.

2.2. O lamento dos mercadores: vv.11-17a

O segundo lamento, pronunciado pelos mercadores da terra, é precedido por uma enumera-ção das mercadorias fornecidas à Babilônia, que ilustra a luxúria da sua vida e a vastidão do seucomércio que se concentrava sobretudo nos portos da Ásia (vv.12-13). Aqueles que lamentamsão identificados como “os que se enriqueceram da força da luxúria da grande cidade” (v.3). Narelação das mercadorias encontramos “ouro, prata, pedras preciosas, linho, púrpura, seda, es-carlate, madeira aurífera, vaso de marfim, vaso de madeira preciosa, de bronze de mármore, ci-namomo, amomo, perfumes, unguento, incenso, vinho, azeite, farinha finíssima e trigo, animalde carga e ovelhas, cavalos e carros, escravos e vidas humanas” (veja Ezequiel 27:12-25). En-contramos pedras preciosas e objetos de luxo, metais (ouro, bronze, ferro), madeira e már-more, artigos de alimentação (vinho, azeite, farinha, trigo) e o negócio de escravos.

O catálogo apresentado descreve a imensa luxúria da Babilônia e enfatiza, principalmente, o queé perdido na queda da cidade. O próprio lamento, que repete seis dos itens da lista (v.16), as-sinala esta ruína de forma que lembra 18:12-13.14 e faz a ligação entre as vestes da prostitutae as vestes idênticas da grande cidade (ver 17:4). Por sua vez, Apocalipse 18:15 assemelha-seà 18:9 e 18:17b-19 quando descreve o medo dos mercadores e sua distância do incêndio dacidade. Estes, “choram e pranteiam”, pois não mais se beneficiam do comércio com a Babilô-nia. Eles são os que se enriqueceram com ela. Os vv.16-17a retomam 17:4, que descreve a opu-lência do aparecimento da prostituta, agora destruída pelo julgamento divino. Assim, se noprimeiro lamento os reis choram a queda da cidade, neste os mercadores lamentam a destrui-ção da sua riqueza, numa descrição derivada da grande prostituta.

2.3. O lamento dos marinheiros: vv.17b-19

No terceiro lamento (vv.17b-19), a identificação daqueles que lamentam como pilotos, os quenavegam livremente, marinheiros e os que trabalham no mar enfatiza mais o aspecto comer-cial que o marítimo: “na qual enriqueceram todos os que têm navios no mar” (19b), já evi-dente na identificação do grupo como “os que trabalham no mar”. O seu gesto de lamento nov.19: “Lançam pó sobre as suas cabeças” e “gritavam chorando e pranteando”, inclui tambéma exclamação “Quem é semelhante à grande cidade?”, antes do gesto e do próprio lamento. Olamento, começando com uma expressão geral da tristeza, seguida por uma referência especí-fica à glória anterior da grande cidade: “Porque em uma hora foi tornada deserta”, expressa atristeza dos marinheiros com a ruína da riqueza ganha através do comércio marítimo com a Ba-

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bilônia. Os marinheiros lamentam as oportunidades perdidas para adquirir mais riqueza, damesma forma que os mercadores o fizeram (vv.15-17a).

Neste sentido, a denúncia que se expressa nesta seção na forma do lamento dos reis, merca-dores e marinheiros, assinala a destruição do poder imperial e de todos os que se beneficiaramcom ele. A releitura de Jeremias 50-51 e Ezequiel 26 não só estabelece a continuidade entre osvv.4-8 e 9-19, mas também integra estes materiais no desenvolvimento do tema do poder comoum aspecto da ordem política que é inseparável da ordem teológica. Assim, estes lamentosanunciam a destruição da Babilônia, a cidade para onde confluíam as riquezas do mundo eonde a idolatria do mundo inteiro, dos pequenos e dos grandes, dos trabalhadores e dos che-fes, se manifesta com a mais insuportável luxúria. A estrutura de poder na qual o império seconverteu, submetendo muitos povos ao seu poderio econômico do qual se sustenta, e a ex-pansão desse poder para os estados e reinos que dele participam e a rede de relações de de-pendência que foi criada, vêm ao fim. O juízo escatológico de Deus vem sobre este poderabsoluto, as riquezas acumuladas e a cidade. O poder de Deus se manifesta no julgamento pormeio do qual a Babilônia perde o seu poder e aqueles que choram a sua ruína são os que com-partilhavam da sua atividade. Por essa razão, a seção termina no v.20 com um imperativo diri-gido aos santos, apóstolos e profetas para regozijarem-se, pois “Deus contra ela julgou a vossacausa”, pois ao julgar a Babilônia, Deus vingou os cristãos e lhes fez justiça. O que é causa de la-mento para os associados da grande cidade é proclamado pela voz celestial como causa de ce-lebração para os “santos, apóstolos e profetas”.

3. Ação simbólica e sua interpretação: vv.21-24Apocalipse 18:21-24 contém o último lamento da queda da Babilônia. Inicia-se com uma na-rrativa curta que descreve um ato simbólico profético, a ação do anjo de “atirar uma grandepedra, como de moinho, ao mar” (Jeremias 25:10; 51:63-64), interpretado como uma pré-es-tréia da queda da Babilônia. Apresenta três partes: o relato: v.21; a interpretação: vv.21b-23b;as razoes do julgamento: vv.23c-24. Desta forma, se os vv.9-19 fala da ruína da Babilônia em suarelação com o mundo tal como representado nos seus aspectos político e comercial, os vv.21-24 apresentam a destruição repentina da Babilônia, numa referência à extinção da vida internada cidade representada nos seus prazeres, no trabalho de seus artesãos e na sua vida familiar. Acanção de julgamento afirma que “não mais se achará ali a voz de harpistas, de músicos, de to-cadores de flautas, de clarins; não haverá mais artífices, não se ouvirá mais a pedra do moinho,luz não mais brilhará, não se ouvirá mais a voz do noivo e da noiva” (vv.22-23; veja Jeremias7:34; 25:10; Ezequiel 26:13).

Os vv.23b-24 apresentam três razões para o julgamento da grande cidade:

1. “Os seus mercadores foram os grandes da terra” (Isaías 23:8)

2. “Na sua feitiçaria foram seduzidas todas as nações” (Apocalipse 14:8; 17:2; 18:3; Naum3:4; Isaías 47:12)

3. “Nela se encontrou sangue de profetas, santos e de todos os que foram mortos sobre aterra” (Apocalipse 6:10; 16:6; 17:6; 19:2).

Por causa de seus crimes, a pena adequada deve ser aplicada contra a Babilônia. É por estarazão que estes versículos apresentam o quadro de uma cidade desolada e desprovida dos sonse atividades que caracterizam a vida urbana. Em lugar destes, é encontrado o sangue daquelesque a Babilônia silenciou e que consiste na evidência dos crimes pelos quais ela merece con-denação. Os mercadores, mencionados como os que se beneficiaram com a luxúria de Babi-

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lônia, aparecem pela última vez em 18:24. O retrato da desolação da cidade é completado pelosilêncio dos vv.22-23. Apocalipse 18, portanto, como narrativa da queda da Babilônia, combinacânticos fúnebres escatológicos e anúncios de desgraça, especificando as razões para tal des-graça. Sua mensagem denuncia o sistema econômico que poder político instalou, o qual vemao fim juntamente com os associados que dele se beneficiavam.

4. Questões a serem discutidasApocalipse 18, ao fazer uma releitura dos profetas do Antigo Testamento, não denuncia so-mente as transgresões na esfera religiosa, mas acrescenta uma novidade ao incluir as trans-gressões na esfera econômica e também denunciá-las como idolatria. Assim, este capítulo nospermite fazer algumas observações em termos da atualidade:

a. A descrição da Babilônia apresenta idolatria e envolvimento com o seu comércio, além dodestaque dado à sua auto-glorificação e arrogância. Babilônia é um sistema político queabrange tudo. Tem aliados que se beneficiam da sua política e estão associados no seu pro-jeto econômico. Riqueza, orgulho, blasfêmia, atitudes arrogantes e obras injustas estão uni-das num mesmo comportamento em passagens que expressam principalmente a certezade que Deus derruba os soberbos e os injustos. Vários sistemas políticos-econômicos atuaistambém vitimam milhões de pessoas em todo o mundo, consideram-se eternos e lutampara se perpetuar no poder. Como, como comuindades cristãs, podemos discernir na his-tória estes sistemas e denunciá-los?

b. Apocalipse 18:9-19 apresenta o lamento dos reis, mercadores e navegantes. A Babilônia édescrita em sua luxúria e orgulho como um comerciante que se enriqueceu a partir do do-mínio das rotas marítimas, mas quando a cidade cai, juntamente com ela rompe-se todauma rede de relações econômicas. Esta é a razão do lamento dos reis, mercadores e ma-rinheiros, pois estes, antes associados à cidade, agora compartilham da sua sorte. Todosestes versículos formam um discurso contra o exercício do poder econômico e o modocomo ele se expressa, neste caso através do comércio. Temos outra vez o fator econômicocomo o elemento básico que constitui o pecado do poder imperial e que merece o juízode Deus. Portanto, como podemos discernir e denunciar os mecanismos econômicos in-justos no no mundo atual que provocam a miséria de muitos em todo o mundo?

c. No mundo atual, a globalização do mercado acontece de forma rápida e radical e a expec-tativa é que a economia e o comércio mundial cresçam, produzindo maior benefício paratodos. Mas, ironicamente, enquanto o mercado global triunfa integrando a todos os povose sociedades, o que visto é a promoção da injustiça econômica entre as nações pobres ericas, e entre os economicamente fortes e fracos. A ilimitada competição das forças eco-nômicas torna a situação social volátil, provocando conflitos violentos, criando a exclusãode milhões de pessoas: os pobres, os fracos e a maior parte da população são excluídos dosbenefícios do mercado globalizado pelos poderes constituídos e autoridades econômicas.As suas vítimas já não mais se restringem a uma parte do mundo e são hoje visíveis emtoda parte. O sacrifício dos mais fracos é justificado em nome do progresso. A vitimizaçãodos seres humanos pelo mercado global torna-se hoje um ponto a partir do qual podemosentender os efeitos que a globalização da economia provoca. Por isso, da mesma formaque a descrição de Apocalipse 18, estamos diante de “uma situação pecaminosa que nãopassa desapercebida aos olhos de Deus, nem é algo pelo qual Ele possa ficar desinteres-sado”. O sistema econômico-político atual constitui o cerne de uma situação pecaminosaque também cai sob o juízo de Deus.

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El presente material es una publicación del Programa de Fe, economía y Sociedad, una iniciativa conjunta deiglesias y organizaciones cristianas al servicio de Dios en América Latina y el Caribe.

Este material fue publicado gracias al convenio suscrito entre Pan para Todos y el CLAI, para impulsar el Diálogo Global con los Sectores Financieros en América Latina (DGF).

Les agradecemos enviar sus aportes, sugerencias e inquietudes a la atención de:Franklin Canelos • Fe, economía y Sociedad CLAI • Casilla 17-08-8522 • Quito-Ecuador

(593-2) 2553 996, 2529 933 • e-mail: [email protected]

Segunda edición, ampliada y corregida

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