Estudo do Bilhar no Anel de Círculos Excêntricos...de bilhar T : Ω → Ω é um difeomor smo...

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAISINSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATASDEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA

    Dissertação de Mestrado

    Estudo do Bilhar no Anel de CírculosExcêntricos

    Reginaldo Braz BatistaOrientadoras: Sylvie Oli�son Kamphorst e Sônia Pinto de Carvalho

    2008

  • Estudo do Bilhar no Anel de CírculosExcêntricos

    Reginaldo Braz BatistaOrientadoras: Sylvie Oli�son Kamphorst e Sônia Pinto de Carvalho

    Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Matemática do Instituto de

    Ciências Exatas da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito à obtenção do

    título de MESTRE EM MATEMÁTICA.

    Belo Horizonte- MG

    2008

  • .

    Resumo

    Estudamos uma família a dois parâmetros de bilhares em mesas circulares com um obs-

    táculo interno. A dinâmica do sistema é descrita pela ação de um homeomor�smo no

    cilindro compacto. Estudamos a estabilidade de pontos �xos e utilizamos as simetrias

    do problema para analisar o comportamento das variedades invariantes associadas a um

    ponto �xo hiperbólico. Provamos a existência de pontos homoclínicos para certos pa-

    râmetros e estudamos as implicações dinâmicas da ocorrência de interseção homoclínica

    com cruzamento topológico.

  • .

    Abstract

    We study a two parameter family of billiards in circular tables with an internal obstacle.

    The dynamic is described by the action of an homeomorphism of the compact cylinder.

    We study the stability of the �xed points and we use the symmetries of the problem

    to analyze the behavior of the invariant manifolds of the hyperbolic �xed point. We

    prove the existence of homoclinic points for some parameters and we study the dynamical

    implication of the homoclinic intersection with topological crossing.

  • .

    Para: Ari Guimarães Batista e Stella Braz Batista,

    Sílvio, Divina, Maristela e Bruno.

    5

  • .

    Agradecimentos

    Agradeço a Sylvie Oli�son Kamphorst e Sônia Pinto de Carvalho por todos os anos de

    orientação, aos professores Mário Jorge Dias Carneiro, Carlos Gustavo Moreira e José

    Antônio Miranda pela participação na banca, ao Departamento de Matemática da UFMG,

    a todos os professores que tive até hoje e aos meus amigos.

  • Índice

    1 Introdução 9

    2 O bilhar no anel excêntrico 13

    2.1 A aplicação do bilhar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

    2.2 Dinâmica global . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

    2.3 Estrutura do espaço de fase . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

    2.3.1 Simetrias e órbitas periódicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

    2.3.2 As curvas β constante e o conjunto de singularidades . . . . . . . . 26

    2.3.3 Imagens de retas verticais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

    2.3.4 Imagens dos eixos de simetria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

    3 Pontos �xos 33

    3.1 O ponto �xo elíptico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

    3.2 O ponto �xo hiperbólico (π, 0) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

    3.2.1 Pontos homoclínicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39

    4 Entropia topológica 43

    7

  • 4.1 Critério geométrico para entropia topológica positiva . . . . . . . . . . . . 45

    4.2 Entropia topológica positiva do bilhar no anel excêntrico . . . . . . . . . . 50

    8

  • Capítulo 1

    Introdução

    Consideremos uma partícula em movimento retilíneo uniforme no interior de uma região

    plana D, limitada por uma fronteira, ∂D, com a qual a partícula sofre colisões elásticas.

    A descrição do comportamento dinâmico desta partícula é o que chamamos de Problema

    do bilhar na mesa D. Damos o nome de Bilhar ao sistema dinâmico de�nido pela situação

    descrita acima.

    Os bilhares originalmente surgiram como modelos para tratar problemas de mecânica

    clássica, hoje são iteressantes do ponto de vista teórico por constituírem fonte de exem-

    plos e servirem para testes de conjecturas. De fato, estes sistemas apresentam diversos

    fenômenos dinâmicos variando entre os casos que poderíamos classi�car como mais or-

    denados aos mais caóticos. Esses comportamentos são fundamentalmente determinados

    pela geometria da mesa.

    Para a descrição matemática do problema podemos considerar a partícula se movimen-

    tando com velocidade v unitária. O estado do sistema no instante t é dado pelo ponto

    (qt, vt) ∈ D× S1 sendo qt a posição da partícula na mesa e vt sua velocidade. A partir de

    um estado inicial (q0, v0) a partícula segue uma trajetória linear com velocidade constante

    v0 até sofrer um choque elástico com a fronteira, quando há uma mudança instantânea

    na direção da velocidade, v0 → v′0, determinada por uma re�exão em relação à direção

    tangente à curva no ponto de choque. Podemos assim descrever a dinâmica por um �uxo

    9

  • Figura 1.1: O movimento poligonal de uma partícula no bilhar

    Φt : M → M , onde M = D × S1 com a identi�cação (q, v) = (q, v′) nos pontos em que

    q ∈ ∂D. (ver [6] ou [3] para uma de�nição mais detalhada)

    A dinâmica do bilhar é mais comumente descrita por uma uma aplicação T : Ω → Ω,

    A aplicação de bilhar, onde Ω := {(q, v); q ∈ ∂D} é o conjunto dos pontos de colisão

    na mesa. Dado um ponto (qi, vi) ∈ Ω está associado um único ponto (qi+1, vi+1) ∈ Ω

    correspondente à primeira colisão com o bordo da partícula que sai de qi com velocidade

    vi. De�nimos:

    T (qi, vi) := (qi+1, vi+1)

    Cada trajetória na mesa é completamente determinada pela seqüência de colisões com o

    bordo, dada uma dessas colisões (q, v) obtemos todas as outras por {T n(q, v)}n∈Z .

    Na de�nição da aplicação T está implícita uma condição sobre a regularidade do bordo da

    mesa, não é possível determinar o movimento da partícula quando esta se choca com um

    ponto do bordo onde não está de�nida a tangente. Esta condição impõe uma restrição

    sobre a classe de mesas de bilhar tratáveis.

    Se a mesa tem o bordo dado por uma curva fechada convexa diferenciável a aplicação do

    bilhar está de�nida para todo ponto em Ω. Podemos nesse caso tomar as colisões (q, v)

    nas coordenadas (ω, α) sendo ω um parâmetro de comprimento de arco que identi�ca q

    e α o ângulo entre o vetor v e a normal ao bordo no ponto de colisão. Temos o seguinte

    resultado:

    Teorema 1.0.1 Se a fronteira da mesa for uma curva fechada Ck estritamente convexa, a

    10

  • aplicação do bilhar T : Ω → Ω é um difeomor�smo Ck−1 preservando a medida cos α dωdα.

    Figura 1.2: Colisões consecutivas numa mesa de bilhar

    A prova desse fato é devida a Birkho� e pode ser encontrada em [6] ou [3]. Basicamente

    o resultado é obtido da seguinte expressão para a derivada de T :

    D(ω0,α0)T =−1

    cos(α1)

    τK0 + cos α0 τ

    τK0K1 + K0 cos α1 + K1 cos α0 τK1 + cos α1

    (1.1)

    Nesta expressão temos (ω0, α0) e (ω1, α1) pontos de colisão consecutivos, K0 e K1 são as

    curvaturas do bordo em cada ponto de colisão e τ é o comprimento do segmento de reta

    dado pela trajetória entre ω0 e ω1 . A dependência em relação à curvatura justi�ca a

    perda de um grau de diferenciabilidade da aplicação em relação à diferenciabilidade do

    bordo.

    Podemos obter o seguinte resultado mais geral:

    Teorema 1.0.2 Se a fronteira da mesa de bilhar é dada pela união �nita de curvas Ck

    com k ≥ 3, estritamente convexas ou retas, então para um subconjunto de Ω a aplicação

    de bilhar T : Ω → Ω é um difeomor�smo local Ck−1 que preserva a medida cos αdωdα. O

    subconjunto em questão é de medida total.

    A prova desse fato encontra-se em [3], onde se estuda de forma detalhada o conjunto

    dos pontos em que a aplicação de bilhar não é diferenciável, Conjunto de singularidades.

    11

  • Este conjunto é basicamente constituído pelas condições iniciais que originam choque

    com pontos de não diferenciabilidade ou trajetórias que tangenciam o bordo, esta última

    situação justi�ca-se pela presença do termo −1cos(α1)

    na expressão da derivada que torna-se

    ilimitado nos pontos de tangência quando tem-se α1 = π2 . No complementar do conjunto

    de singularidades, Pontos regulares, a aplicação de bilhar comporta-se como em mesas

    convexas preservando a medida cos α dωdα. Mostra-se que o conjunto de singularidades

    tem medida nula donde conclui-se o resultado.

    Em resumo: a dinâmica do bilhar em mesas cujo bordo satisfaz as condições do teorema

    1.0.2 pode ser descrita por um sistema dinâmico discreto (Ω, T, µ). Sendo Ω o conjunto

    dos pontos de colisão e T : Ω → Ω um difeomor�smo em um subconjunto Ω′ ⊂ Ω de

    medida total com respeito à medida µ := cos αdωdα. O sistema é conservativo o que

    signi�ca que µ é uma medida invariante por T , i.e µ(T (A)) = µ(A).

    Neste contexto as trajetórias na mesa são traduzidas nas órbitas :

    O(ω, α) = {...T−1(ω, α), (ω, α), T (ω, α), ...}

    e estudar a dinâmica consiste em procurar descrever o comportamento de tais órbitas

    para a maioria dos pontos (ω0, α0) ∈ Ω.

    12

  • Capítulo 2

    O bilhar no anel excêntrico

    Neste trabalho vamos considerar o problema do bilhar em uma mesa circular contendo

    um disco como obstáculo interno. A essas mesas daremos o nome de Anéis Excêntricos.

    O estudo destes bilhares foi feito pela primeira vez por Saitô et all em [1].

    Figura 2.1: Anel Excêntrico

    De�nição 2.0.1 Um Anel Excêntrico (r, δ) é a região plana compreendida no interior

    de um círculo unitário de centro c e externa ao disco de raio r < 1 e centro c′ tal que

    |c− c′| = δ > 0 e r + δ < 1

    13

  • 2.1 A aplicação do bilhar

    A aplicação de bilhar no anel excêntrico é descontínua em decorrência das trajetórias que

    tangenciam o bordo do disco interno. No entanto, é possível descrever a dinâmica deste

    sistema por uma aplicação de bilhar modi�cada que preserva a medida da aplicação de

    bilhar usual. Para provar estes fatos iniciemos de�nindo a parametrização do conjunto de

    colisões.

    As colisões com o círculo externo serão identi�cadas pelas coordenadas (ω, α) sendo ω ∈

    [−π, π) o comprimento do arco entre o ponto P0 (ver Figura 2.1 ) e o ponto de colisão

    medido no sentido anti-horário, o ângulo α ∈ (−π2, π

    2) é o ângulo entre o vetor velocidade

    e o vetor normal no ponto de colisão medido no sentido horário.

    As colisões com o círculo interno serão identi�cadas pelas coordenadas (ω′, β) sendo ω′ ∈

    [(3 − r)π, (3 + r)π) o comprimento de arco medido no sentido horário a partir do ponto

    P1 e β ∈ [−π2 ,π2] o ângulo do vetor velocidade com a normal no ponto de colisão medido

    no sentido anti-horário.

    De�nimos então o conjunto de colisões por:

    C = [−π, π)× (−π2,π

    2) ∪ [(3− r)π, (r + 3)π)× [−π

    2,π

    2]

    que é a união de dois cilindros disjuntos dado que os bordos são duas curvas fechadas

    disjuntas. Observemos que o segundo cilindro, das colisões com o círculo interno, é fechado

    já que é possível haver colisões de tangência com o este bordo.

    Seja F := F(r,δ) : C → C a aplicação do bilhar em um anel (r, δ). Nas coordenadas (ω, α)

    escreveremos:

    F (ω0, α0) = (ω1, α1)

    Pelo teorema (1.0.2), F é um difeomor�smo C∞ a menos de um conjunto de medida nula,

    o conjunto de singularidades, que no caso é constituído pelos pontos de C que determinam

    trajetórias tangentes ao bordo interno, i.e os pontos (ω0, α0) tais que |α1| = π2 . Veremos

    adiante que este conjunto é formado por duas curvas fechadas C∞ em [−π.π) × (−π2, π

    2)

    14

  • que são grá�cos da coordenada ω dados pela equação:

    |sen (ω) + δsen (ω − α)| = r (2.1)

    estas curvas dividem o cilindro [−π.π)× (−π2, π

    2) nos conjuntos:

    B = {(ω, α) ∈ [−π.π)× (−π2,π

    2), |sen (ω) + δsen (ω − α)| ≤ r}

    e

    A = {(ω, α) ∈ [−π.π)× (−π2,π

    2), |sen (ω) + δsen (ω − α)| > r}

    Figura 2.2: Trajetórias tangentes ao disco interno.

    O conjunto B é formado pelos pontos (ω0, α0) tais que F (ω0, α0) é um ponto de colisão

    com o círculo interno. Os pontos (ω0, α0) ∈ A são tais que F (ω0, α0) corresponde a uma

    colisão com o círculo externo.

    Toda colisão com o círculo interno é precedida e sucedida por colisões com o círculo

    externo. Podemos então descrever completamente uma trajetória em (r, δ) considerando

    somente os pontos de colisão com o círculo externo. Isso nos leva a de�nir uma nova

    aplicação

    T : [−π.π)× (−π2,π

    2) → [−π.π)× (−π

    2,π

    2)

    que associa uma colisão (ω0, α0) no círculo externo com a próxima colisão que ocorrer

    também com o círculo externo. Podemos escrever:

    T (ω, α) =

    TA := F (ω, α) se (ω, α) ∈ A,TB := F 2(ω, α) se (ω, α) ∈ B (2.2)15

  • Figura 2.3: Parametrização das colisões na mesa de bilhar.

    Podemos também encontrar equações que relacionam (ω0, α0) com sua imagem T (ω0, α0) =

    (ω1, α1). A dedução destas relações encontra-se em [10] ou [9] e segue os parâmetros da

    Figura 2.3.

    TA =

    α1 = α0ω1 = ω0 + (π − 2α0) (2.3)

    TB =

    sen α0 + δ sen (α0 − ω0) = rsen β,

    sen α1 + δ sen (α1 + ω1) = rsen β,

    2β = α0 − ω0 + α1 + ω1

    (2.4)

    Essa nova aplicação substitui F com vantagens, pois além de estar de�nida em um domínio

    conexo é também um homeomor�smo que preserva a medida cos α dωdα.

    Proposição 2.1.1 A aplicação T : [−π, π) × (−π2, π

    2) → [−π, π) × (−π

    2, π

    2) é um home-

    omor�smo, C∞ a menos do conjunto de singularidades, e preserva a medida cos αdωdα.

    Podemos estenter continuamente T ao fecho de [−π, π) × (−π2, π

    2) de�nindo os pontos

    (ω,±π2) como sendo �xos.

    Prova: Como T |A := F |A e T |intB := F 2|intB são difeomor�smos C∞ resta-nos provar a

    continuidade em ∂B. Suponhamos {(ωk, αk)}k≥0 uma seqüência em B convergindo para

    (ω0, α0) ∈ ∂B. Denotemos T (ωk, αk) = (ωk1 , αk1) e βk = β(ωk, αk). Temos das relações 2.4

    que:

    sen αk1 + δ sen (αk1 + ω

    k1) = rsen β

    k

    16

  • 2βk = αk − ωk + αk1 + ωk1

    Segue que:

    sen αk1 + δ sen (2βk − αk + ωk) = rsen βk

    Quando k → ∞ temos βk → β(ω0, α0), ωk1 → ω1(ω0, α0) e αk1 → α1(ω0, α0). Tomando o

    limite na última igualdade acima obtemos:

    sen α1(ω0, α0) + δ sen (2β(ω0, α0)− α0 + ω0) = rsen β(ω0, α0)

    Como (ω0, β0) ∈ ∂B temos que β(ω0, α0) = ±π2 portanto:

    sen (2β(ω0, α0)− α0 + ω0) = sen (±π

    2− α0 + ω0) = sen (α0 − ω0)

    Então, podemos escrever:

    sen α1(ω0, α0) + δ sen (α0 − ω0) = rsen β(ω0, α0)

    Assim:

    sen α1(ω0, α0) = rsen β(ω0, α0)− δ sen (α0 − ω0) = sen (α0)

    Esta última igualdade, que segue das relações 2.4, implica que α1 = α0.

    Ainda das relações 2.4 temos que:

    ωk1 = 2βk − (α0 − ω0 + αk1)

    17

  • Tomando o limite em k e já considerando que α0 = α1(ω0, α0) temos:

    ω1(ω0, α0) = 2(±π

    2)− (α0 − ω0 + α1(ω0, α0))

    ω1 = ±π − 2α0 + ω0

    Como identi�camos π e −π temos �nalmente que:

    α1(ω0, α0) = α0

    ω1(ω0, α0) = π − 2α0 + ω0

    Logo (ω0, α0) e T (ω0, α0) satisfazem as relações 2.3, ou seja, TA(ω0, α0) = TB(ω0, α0) e

    conluímos a continuidade de T em ∂B.

    Sendo T contínua em [−π.π) × (−π2, π

    2) há uma única extensão contínua em [−π.π) ×

    [−π2, π

    2], esta extensão consiste em de�nir como �xos os pontos (ω,±π

    2). De fato:

    limα0→π2

    [ω1(ω0, α0)] = limα0→π2

    [ω0 + (π − 2α0)] = ω0 + (π − 2π)) = ω0

    portanto T (ω0,±π2 ) = (ω0,±π2).

    Quanto à medida, seja µ a medida invariante por F , e C um boreleano de [−π.π)×[−π2, π

    2].

    Denotemos por K o união ∂B∪{α = ±π2} que é um conjunto de medida nula. Temos que

    A = (C ∩ A) ∪ (C ∩ B) ∪ (C ∩ K)

    Sendo esta união disjunta temos:

    µ(T (A)) = µ(T (C ∩ A)) + µ(T (C ∩ B)) + µ(T (C ∩ K))

    Como

    µ(C ∩ K) = 0

    µ(T (C ∩ A)) = µ(F (C ∩ A)) = µ(C ∩ A)

    µ(T (C ∩ B)) = µ(F 2(C ∩ A)) = µ(A ∩ B)

    18

  • temos que

    µ(T (A)) = µ((C ∩ A) ∪ (C ∩ B) ∪ (C ∩ K)) = µ(A).

    Portanto µ é medida invariante por T . �

    Utilizando a expressão (1.1) para a derivada da aplicação do bilhar vamos obter a derivada

    da aplicação T :

    D(ω0,α0)T =

    ∂ω1(ω0,α0)

    ∂ω∂ω1(ω0,α0)

    ∂α

    ∂α1(ω0,α0)∂ω

    ∂α1(ω0,α0)∂α

    (2.5)

    Precisamos considerar separadamente os casos em que (ω0, α0) ∈ A e (ω0, α0) ∈ B. No

    primeiro caso, segue facilmente das relações 2.3 que:

    D(ω0,α0)T =

    1 −2

    0 1

    No caso em que (ω0, α0) ∈ B temos que T (ω0, α0) = F 2(ω0, α0), logo pela regra da cadeia

    D(ω0,α0)T = D(ω0,α0)F2 = DF (ω0,α0)F.D(ω0,α0)F .

    A condição inicial (ω0, α0) ∈ B determina uma colisão (ω′, β) = F (ω0, α0) com o círculo

    interno. Da expressão (1.1) temos que:

    D(ω0,α0)T =−1

    cos β

    −τ0 + cos α0 τ0

    −τ0+cos α0r

    − cos β τ0r

    + cos β

    (2.6)A condicão (ω′, β) determina uma colisão T (ω′, β) = (ω1, α1) com o bordo externo. No-

    vamente pela expressão 1.1 temos:

    D(ω′,β)T =−1

    cos α1

    τ1r

    + cos β τ1

    −τ1+cos α1r

    − cos β −τ1 + cos α1

    (2.7)

    19

  • Fazendo o produto de (2.6) com (2.7) obtemos:

    ∂ω1∂ω

    = −2τ0τ1r

    +2τ1 cos α0

    r− (τ0 + τ1 − cos α0) cos β

    ∂ω1∂α

    =2τ1τ0

    r+ τ0τ1 cos β

    ∂α1∂ω

    =2

    r(τ1τ0 − τ1 cos α0 − τ0 cos α1) + (τ1 + τ0 − cos α0 − cos α1) cos β +

    cos α1 cos α0r

    ∂α1∂α

    = −2τ1τ0r

    +2τ0 cos α1

    r+ (τ0 − τ1) cos β + cos α1 cos β

    quando calculadas em (ω0, α0)

    2.2 Dinâmica global

    Uma visão global da dinâmica do sistema é obtida observando a disposição das órbitas

    no espaço de fase Ω, as �guras a seguir ilustram casos típicos da dinâmica para diferentes

    parâmetros (r, δ). Elas são obtidas pela plotagem em Ω - aqui representado pelo retângulo

    [−π, π]× [−π2, π

    2] - de segmentos de órbitas para várias condições iniciais.

    Basicamente a estrutura do espaço de fase nestes bilhares é determinada pela existência

    de dois pontos �xos ((0, 0) e (π, 0)) e as principais alterações da dinâmica global ocorrem

    em função da mudança de estabilidade destes pontos em decorrência de uma variação nos

    parâmetros.

    Figura 2.4: Exemplos de trajetórias poligonais na mesa de bilhar e suas respectivas órbitas.

    A Figura 2.5 ilustra o caso típico da dinâmica para parâmetros r > δ. Nota-se a presença

    de curvas invariantes em torno de (0, 0) sugerindo a estabilidade deste ponto. Observa-se

    uma cadeia de ilhas de estabilidade associadas a uma órbita periódica. Nas proximidades

    20

  • Figura 2.5: Órbitas para a mesa de parâmetros (0.5,0.25). Em destaque o conjunto de

    singularidades dado pelas curvas em formato de senóides.

    dos bordos as órbitas estão restritas a curvas invariantes α =constante, correspondendo

    às condições iniciais que determinam apenas colisões com o círculo externo. Em destaque

    também as curvas de singularidade.

    A Figura 2.6 caracteriza a dinâmica para o caso r < δ. Nota-se a ausência da ilha central

    em torno de (0, 0) que deixa de ser elíptico para essa região de parâmetros. Persistem

    as curvas invariantes vizinhas ao bordo e algumas ilhas de estabilidade correspondendo a

    órbitas periódicas elípticas também são perceptíveis.

    Fica clara a dependência da dinâmica em relação aos parâmetros (r, δ) e a in�uência dos

    pontos (π, 0) e (0, 0) que são os dois únicos pontos �xos da aplicação T no interior de Ω.

    Analizaremos a dinâmica na vizinhança destes pontos com mais detalhe no capítulo 3.

    Em particular temos maior interesse em estudar o comportamento das variedades invari-

    antes associadas ao ponto (π, 0). Mostraremos a existência de interseções homoclínicas e

    algumas conseqüências desse fenômeno.

    21

  • Figura 2.6: Órbitas para a mesa de parâmetros (0.3,0.4)

    2.3 Estrutura do espaço de fase

    Nesta seção provamos algumas propriedades do espaço de fase que serão úteis no estudo

    que faremos da dinâmica dos bilhares excênctricos.

    Representaremos o cilindro Ω pelo retângulo [−π, π] × [−π2,−π

    2] o qual dividiremos em

    quadrantes tendo como referência as curvas

    γ0 := {(ω, 0)} φ0 := {(π, α)} ξ0 := {(0, α)}

    Denotaremos os quadrantes por Qi, i = 1, 2, 3, 4 na ordem da Figura 2.7. Cada Qi é um

    conjunto fechado cujo bordo são segmentos das curvas γ0, φ0, ξ0 e do bordo ∂Ω.

    Dado C ⊂ Ω um subconjunto qualquer, denotaremos por Cn o conjunto T n(C) para todo

    n ∈ Z. Diremos que C é invariante por T se T (C) = C. Diremos que C é �xado por T

    se ∀x ∈ C temos T (x) = x.

    22

  • Figura 2.7: A divisão do espaço de fase em quadrantes pelos eixos de simetria.

    2.3.1 Simetrias e órbitas periódicas

    De�niremos em Ω as seguintes aplicações, que chamaremos de simetrias:

    X : Ω → Ω X(ω, α) = (−ω, α)

    Y : Ω → Ω Y (ω, α) = (ω,−α)

    Aos conjuntos �xados por estas aplicações damos o nome de eixos de simetria. Temos

    γ0 := {(ω, 0)} como eixo de Y e os conjuntos φ0 := {(π, α)} e ξ0 := {(0, α)} os eixos de

    simetria de X.

    A aplicação T satisfaz as seguintes relações de simetria:

    Y T−1 = TY e XT−1 = TX (2.8)

    A primeira é uma propriedade geral das aplicações de bilhar, a segunda é conseqüência

    da simetria do anel excêntrico. Ambas podem ser provadas diretamente das equações 2.4

    e 2.3. A Figura 2.8 ilustra as simetrias na mesa de bilhar.

    Veri�caremos as implicações para a dinâmica decorrentes das relações (2.8). Observemos

    que X deixa invariante o eixo de simetria Y , i.e X(γ0) = γ0, e Y deixa invariantes os

    23

  • Figura 2.8: Simetrias do bilhar no anel excêntrico.

    eixos de simetria de X, i.e Y (φ0) = φ0 e Y (ξ0) = ξ0. Além disto se um conjunto C for

    invariante por alguma das simetrias X ou Y teremos

    C−n = T−n(C) = T−nX(C) = XT n(C) se X(C) = C

    C−n = T−n(C) = T−nY (C) = Y T n(C) se Y (C) = C

    Se tomamos C como um dos eixos de simetria temos:

    X(γn) = Y (γn)

    φ−n = X(φn) = Y (φn)

    ξ−n = X(ξn) = Y (ξn)

    Logo há uma relação de simetria entres as imagens dos eixos γ0, φ0 e ξ0. Estas curvas

    também estão relacionadas com os pontos periódicos de T .

    Proposição 2.3.1 Dados m, n inteiros não simultaneamente nulos, os pontos de (γm ∪

    φm ∪ ξm) ∩ (γn ∪ φn ∪ ξn) são pontos periódicos de T .

    prova: Observemos inicialmente que se (ω, α) ∈ cm∩c′n então T−n(ω, α) ∈ T−n(cm∩c

    ′n) =

    cm−n∩c′0, ou seja, T−n((ω, α)) ∈ c′0 e se este ponto for periódico (ω, α) também será. Logo

    para provar o resultado basta considerarmos as interseções do tipo cm∩ c′0. Vamos dividir

    em casos :

    1. γm ∩ γ0:

    24

  • Se (ω0, α0) ∈ γm∩γ0 então (ω0, α0) ∈ γ0 e (ω−m, α−m) = T−m(ω0, α0) ∈ T−m(γm) =

    γ0. Segue que:

    Y (ω−m, α−m) = (ω−m, α−m) e Y (ω0, α0) = (ω0, α0)

    Pelas relações de simetria satisfeitas por T temos:

    (ω0, α0) = Y (ω0, α0) = Y Tm(ω−m, α−m) = T

    −mY (ω−m, α−m)

    = T−m(ω−m, α−m) = T−2m(ω0, α0)

    Portanto (ω0, α0) é um ponto periódico de período menor ou igual a 2m.

    2. (φm ∪ ξm) ∩ (φ0 ∪ ξ0):

    Como no caso anterior, se (ω0, α0) ∈ (φm ∪ ξm)∩ (φ0 ∪ ξ0) então (ω0, α0) ∈ (φ0 ∪ ξ0)

    e (ω−m, α−m) ∈ (φ0 ∪ ξ0) donde:

    X(ω−m, α−m) = (ω−m, α−m) e X(ω0, α0) = (ω0, α0)

    Temos também que:

    (ω0, α0) = X(ω0, α0) = XTm(ω−m, α−m) = T

    −mX(ω−m, α−m)

    = T−m(ω−m, α−m) = T−2m(ω0, α0)

    Portanto (ω0, α0) é um ponto periódico de período menor ou igual a 2m.

    3. (φm ∪ ξm) ∩ γ0:

    Se (ω0, α0) ∈ (φm ∪ ξm) ∩ γ0 então (ω−m, α−m) ∈ (φ0 ∪ ξ0) donde:

    X(ω−m, α−m) = (ω−m, α−m) e X(ω0, α0) = (ω0, α0)

    Temos que:

    (ω−m, α−m) = Y (ω−m, α−m) = Y T−m(ω0, α0) = T

    mY (ω0, α0) = (ωm, αm)

    Como (ω−m, α−m) ∈ (φ0 ∪ ξ0) temos ω−m ∈ {0, π} donde xm ∈ (φ0 ∪ ξ0) já que

    pelas relações acima temos ωm = ω−m . Segue que xm ∈ (φ0 ∪ ξ0) e (ω−m, α−m) =

    T−2m(xm) ∈ T (φ0 ∪ ξ0) = (φ−m ∪ ξ−m). Ou seja, (ω−m, α−m) ∈ (φ0 ∪ ξ0) ∩ (φ−2m ∪

    ξ−2m) donde pelo caso 2 (ω−m, α−m) é um ponto periódico de período menor ou

    igual a 4m, assim como (ω0, α0).

    25

  • Não é uma conseqüência da proposição acima mas as interseções γ0 ∩ φ0 = (π, 0) e

    γ0 ∩ ξ0 = (0, 0) também são pontos periódicos, sendo os únicos pontos �xos de T no

    interior de Ω, isso pode ser veri�cado diretamente das equações 2.4.

    2.3.2 As curvas β constante e o conjunto de singularidades

    Consideremos agora as curvas β constante. Relembremos que β identi�ca o ângulo de

    colisão com o disco interno e que se expressa em função de (ω0, α0) por:

    β(ω0, α0) =1

    2(α0 − ω0 + α1(ω0, α0) + ω1(ω0, α0))

    Uma curva com β constante é o conjunto dos pontos (ω, α) tais que β(ω, α) = c para

    alguma constante c ∈ [−π2, π

    2]. Estas curvas são grá�cos C∞ de ω. De fato, derivando em

    relação a α0:∂β

    ∂α0=

    1

    2(1 +

    ∂α1∂α0

    +∂ω1∂α0

    )

    Mas:∂α1∂α0

    = −2τ0τ1r

    + 2τ0 cos α1

    r− (τ0 + τ1) cos β + cos α1 cos β

    e∂ω1∂α0

    = 2τ0τ1r

    + (τ0 + τ1) cos β

    Portanto:∂β

    ∂α0=

    1

    2(1 + 2

    τ0 cos α1r

    + cos α1 cos β)

    que é sempre não nulo já que α1 ∈ (−π2 ,π2) e β ∈ [−π

    2, π

    2]

    Segue do teorema da função implícita que para cada valor c ∈ [−π2, π

    2] o conjunto β(ω0, α0) =

    c é um grá�co C∞ de ω. Portanto as curvas β = const são fechadas e homotópicas aos

    bordos do cilindro.

    A região B do cilindro Ω é folheada pelas curvas β constante sendo que o conjunto de

    singularidades ∂B, é dado pelas curvas β = π2e β = −π

    2. Isso prova que o conjunto de

    singularidades tem medida nula por ser o grá�co de uma aplicação diferenciável.

    26

  • Outro caso que nos interessa é a curva β = 0, conjunto no qual coincidem as ações de T

    e X, i.e T (ω0, α0) = (ω0,−α0) = X(ω0, α0). Provemos esta a�rmação.

    Lema 2.3.1 β(ω0, α0) = 0 se e somente se T (ω0, α0) = (ω0,−α0)

    Prova: Se β(ω0, α0) = 0 temos:

    0 = 2β = α0 − ω0 + α1 + ω1

    donde (α0−ω0) = −(α1 +ω1) e sen (α0−ω0) = −sen (α1 +ω1). Das equações (2.4) segue

    que:

    sen α0 + sen α1 + δ (sen (α0 − ω0) + sen (α1 + ω1)) = 2rsen β = 0 (2.9)

    donde sen α0 + sen α1 = 0.

    Como α0, α1 ∈ (−π2 ,π2) concluímos que α0 = −α1 e de (2.3.2) temos ω1−ω0 = −(α1+α0) =

    0 donde ω0 = ω1.

    Por outro lado T (ω0, α0) = (ω0,−α0) então ω1 = ω0 e α1 = −α1 logo β(ω0, α0) =12(α0 − ω0 + α1 + ω1) = 0.

    Figura 2.9: As curvas β constante

    2.3.3 Imagens de retas verticais

    Descreveremos agora as imagens de retas verticais, em alguns problemas o comportamento

    da imagem de tais curvas é determinante para a obtenção de muitos resultados, este é o

    27

  • caso das aplicações do tipo Twist caracterizadas por uma condição de desvio das verticais,

    ver [7]. Aplicações de bilhares convexos apresentam essa propriedade, não é o caso do

    bilhar excêntrico como veremos a seguir.

    Fixado ω0 seja vω0 := ω0 × [−π2 ,π2] a reta vertical passando por ω0. Esta reta intercepta

    cada grá�co β = π2e β = −π

    2em um ponto, denotados respectivamente por (ω0, α+) e

    (ω0, α−). Descreveremos agora a imagem T (vω0) = (ω1(ω0, α), α1(ω0, α)).

    No intervalo [−π2, α+) temos que vω0 pertence à região A e temos por (2.8) que

    ∂ω1(ω0,α)∂α

    =

    −2. Portanto ω1(ω0, .) : [−π2 ,π2] → Ω é injetiva, donde segue que o único ponto de

    interseção entre vω0 e T (vω0) neste intervalo é o ponto �xo (ω0,−π2 ).

    No intervalo (α−, π2] temos vω0 também contida em A e

    ∂ω1(ω0,α)∂α

    = −2. Portanto ω1(ω0, .)

    é injetiva e o único ponto de interseção entre vω0 e T (vω0) neste intervalo é o ponto �xo

    (ω0,π2).

    No intervalo [α+, α−], vω0 pertence à região B e

    ∂ω1(ω0, α0)

    ∂α=

    2τ1τ0r

    + (τ0τ1) cos β > 0

    dado que τ0, τ1 e r são positivos e cos β ≥ 0 pois β ∈ [−π2 ,π2]. Segue que ω1(ω0, .) é injetiva

    portanto T (vω0) intercepta vω0 em um único ponto que é exatamente o mesmo ponto de

    interseção entre vω0 e β = 0, já que pelo lema 2.3.2 temos que se (ω0, α) ∈ {β = 0} então

    T (ω0, α) = (ω0, α1(ω0, α)) ∈ vω0 .

    Figura 2.10: Trajetórias correspondentes a uma reta vertical.

    Seja Π1 : Ω → [−π, π] a projeção na primeira coordenada. Observamos que dado ω0, o

    conjunto Π1(T (vω0)) não cobre [−π, π], a justi�cativa geométrica deste fato é que não é

    possível a partir de um ponto ω0 no bordo externo atingir todos os pontos do bordo externo

    28

  • Figura 2.11: Na primeira �gura: uma reta vertical, v, interceptando as curvas

    β =constante. Na segunda �gura: a imagem da vertical interceptando as imagens das

    curvas β =constante.

    com uma única iterada da aplicação de bilhar em decorrência do obstáculo interno, ver

    Figura 2.10.

    Assim, para cada ω0 existe um intervalo aberto I ⊂ [−π, π) tal que Π1(T (vω0)) ∩ I =

    ∅. Nota-se pela Figura 2.11 que os extremos deste intervalo correspondem aos pontos

    Π1(T (ω0, α±)) onde (ω0, α±) são os pontos de interseção entre vω0 e a curva de singulari-

    dades, β = ±π2.

    No caso especí�co do eixo ξ0, a reta vertical que passa por (0, 0), o intervalo complementar

    de Π1(T (ξ0)) em [−π, π) é um intervalo simétrico (−θ, θ) centrado no ponto π, logo a curva

    T (ξ0) não possui pontos em comum com a curva φ0, ver Figura 2.12

    A seguir utilizamos as propriedades das imagens de retas verticais para provar alguns

    lemas que serão úteis mais à frente.

    Lema 2.3.2 Se (ω0, α0) ∈ Q4 então ω0 ≤ ω1(ω0, α0) ≤ π

    prova: Seja ω0 ∈ [−π, 0] e seja vω0 a reta vertical passando por ω0. Denotemos por v+ω0 o

    segmento de vω0 entre os pontos (ω0, π2 ) e (ω0, α∗) = vω0 ∩ {β = 0}.

    O conjunto T (v+ω0) é uma curva contínua de extremos em (ω0,π2) e T (ω0, α∗) = (ω0,−α∗).

    Observemos que T (v+ω0) pertence à região de Q4 ∪Q1 compreendida entre as curvas vω0 e

    29

  • T (ξ0). Segue disso que T (v+ω0) não intercepta a curva φ0 portanto Π1(T (v+ω0

    )) pertence ao

    intervalo [ω0, π).

    Obsevermos que T (vω0 ∩ Q4) ⊂ v+ω0 portanto Π1T ((vω0 ∩ Q4)) ⊂ [ω0, π) donde segue que

    ω0 ≤ ω1(ω0, α0) ≤ π para todo (ω0, α0) ∈ Q4. �

    Lema 2.3.3 Seja (ω, α) ∈ Q4 ponto não �xado por T , se O+(ω, α) := {T n(ω, α)}n≥0 ⊂

    Q4 então (0, 0) ∈ O+(ω, α).

    prova: SendoO+(ω, α) subconjunto limitado em Q4 podemos de�nir ω∗ := sup{Π1(O+(ω, α))}.

    Dado esse ω∗ existe um α∗ tal que (ω∗, α∗) ∈ O+(ω, α). Pela invariância por T deO+(ω, α)

    e pelo lema 2.3.2 temos que:

    ω∗ ≤ ω1(ω∗, α∗) ≤ sup{Π1(O+(ω, α))} = ω∗

    Portanto T (ω∗, α∗) = (ω∗, α1(ω∗, α∗)) donde ou (ω∗, α∗) é um ponto �xo ou T (ω∗, α∗) ∈

    ({β = 0} ∩ vω∗).

    No caso de (ω∗, α∗) ser ponto �xo, não pode ser do tipo (ω∗, π2) pois existe uma vizinhança

    do bordo superior de Ω tal que a órbita de todo ponto nesta vizinhança pertence a uma

    curva invariante homotópica ao bordo, ver Figura 2.5 e 2.6 , logo não podemos ter uma

    órbita se acumulando em (ω∗, π2).

    Resta-nos então a segunda hipótese que, pelo lema 2.3.1, implica em:

    (ω∗, α1(ω∗, α∗)) = (ω∗,−α∗)

    devemos ter então α∗ = 0 pois do contrário teríamos (ω∗, α1(ω∗, α∗)) ∈ int(Q3). Sendo

    assim, (ω∗, α∗) ∈ γ0 ∩ {β = 0} = {(0, 0), (π, 0)}. Para �nalizar observemos que π ≤ ω0 ≤

    ω∗. Assim se ω∗ = π teríamos (ω, α) = (π, 0) ponto �xado por T o que contradiz nossa

    hipótese. Concluímos então que (ω∗, α∗) = (0, 0). �

    30

  • 2.3.4 Imagens dos eixos de simetria

    Descreveremos agora comportamento das imagens dos eixos de simetria. Segue das ob-

    servações anteriores sobre as imagens de verticais que as únicas interseções entre as cuvas

    φ0 = vπ e φ1 = T (vπ) são os pontos �xos (π, 0), (π, π2 ) e (π,−π2). Mostraremos que para

    o caso r > δ uma propriedade análoga vale também para a curva γ0, ou seja, as únicas

    interseções entre γ0 e γ1 são os pontos �xos (0, 0) e (π, 0).

    De fato se (ω0, α0) ∈ γ0 e (ω1, α1) ∈ γ1 ∩ γ0 então α0 = α1 = 0 e segue de 2.4 que:

    δ sen (−ω0) = rsen β = δ sen (ω1)

    2β = −ω0 + ω1(2.10)

    donde cos(ω0) = cos(ω1) e:

    cos(β)2−sen (β)2 = cos(2β) = cos(ω1) cos(ω0)+sen (ω1)sen (ω0) = cos(ω1)2+sen (ω1)2 = 1

    então:

    2 cos(β)2 = cos(β)2 + sen (β)2 + cos(β)2 − sen (β)2 = 2

    donde cos(β)2 = 1 e como β ∈ [−π2, π

    2] temos β = 0. Mas se β(ω0, α0) = 0 temos que

    (ω0, α0) ∈ (γ0 ∩ {β = 0}) = {(0, 0), (π, 0)}. O que demonstra o a�rmado.

    Temos portanto que γ1 é uma curva simples fechada no cilindro e que intesecta γ0 somente

    nos pontos �xos (0, 0) e (π, 0).

    Será útil provar que γ1 possui pontos no interior do quadrante Q4. Faremos isso agora:

    Seja v = (1, 0) o vetor tangente a γ0 no ponto �xo (π, 0) numa vizinhança na qual T é

    diferenciável. Temos que:

    D(π,0)T.v =1

    r(r − 2δr + 2δ − 2δ2, 2δ(r + δ))

    Como 0 < r + δ < 1 temos que:

    2δ(r + δ) > 0

    Temos também que:

    r − 2δr + 2δ − 2δ2 = r + 2δ(1− r − δ) > 0

    31

  • Logo o vetor D(π,0)T.v tem todas as coordenadas positivas, podemos então concluir que

    localmente ao ponto p a curva γ1 tem pontos no interior do quadrante Q4.

    Figura 2.12: Eixos de simetria e suas imagens.

    32

  • Capítulo 3

    Pontos �xos

    Figura 3.1: Pontos �xos.

    Para qualquer valor de parâmetros (r, δ) a aplicação T possui exatamente dois pontos �xos

    no interior do cilindro Ω, situados na região B onde a aplicação é diferenciável, são eles

    (π, 0) e (0, 0). O ponto (π, 0) é sempre hiperbólico, já o ponto (0, 0) pode ser hiperbólico,

    parabólico ou elíptico dependendo dos parâmetros (r, δ). Veri�quemos estes fatos.

    Para o ponto (π, 0) temos:

    DT(π,0) =1

    r

    r − 2δr + 2δ − 2δ2 2(1− δ)(1− r − δ)

    2δ(r + δ) r − 2δr + 2δ − 2δ2

    (3.1)E os autovalores desta matriz são:

    λ1,2 =(r − 2δr + 2δ − 2δ2)

    √(4δ(1 + δ)(δ − r)(1− r − δ))

    r

    Sendo δ 6= 0 e r+δ < 1 temos que os termos na raiz quadrada são sempre positivos donde

    os autovalores são reais e diferentes. Observemos que pela propriedade de preservar área

    33

  • temos det(DT(π,0)) = 1 portanto os auto-valores satisfazem λ1 = 1λ2 logo ambos têm

    módulo diferentes de 1 o que caracteriza o ponto �xo como sendo hiperbólico.

    Para o ponto (0, 0) temos:

    DT(0,0) =1

    r

    r + 2δr − 2δ − 2δ2 2(1 + δ)(1 + δ − r)

    2δ(δ − r) r + 2δr − 2δ − 2δ2

    (3.2)Com autovalores:

    λ1,2 =(r + 2δr − 2δ − 2δ2)

    √(4δ(1 + δ)(δ − r)(1− r + δ))

    r

    Como r e δ são positivos, apenas o fator (δ − r) na raiz quadrada pode mudar de sinal,

    alterando assim a natureza dos autovalores λ1 e λ2. Temos portanto, as seguintes possi-

    bilidades:

    • se r > δ , os autovalores são complexos conjugados e o ponto �xo é elíptico.

    • se r = δ os autovalores são iguais a −1 e o ponto �xo é parabólico.

    • se r < δ temos os autovalores reais e diferentes de ±1 e o ponto �xo é hiperbólico.

    Passamos agora a estudar a dinâmica localmente a cada um destes pontos �xos no caso

    r > δ, para isso utilizaremos o fato de que a aplicação T é diferenciável em uma vizinhança

    de cada ponto.

    3.1 O ponto �xo elíptico

    O Teorema da Forma Normal de Birkho�, [7], a�rma que se os autovalores λj de D(0,0)T

    são não ressonantes, i.e λn 6= 1, n = 1, 2, 3 ou 4, então existe um homeomor�smo h tal

    que h ◦ T ◦ h−1(z) = ei(γ+τ1|z|2)z + O(|z|4), ou seja T é conjugada com uma rotação, a

    menos dos termos O(|z|4), onde z é complexo e o primeiro coe�ciente de Birkho� τ1 é

    dado por uma expressão polinomial nos coe�cientes de Taylor de T até ordem 3.

    34

  • O Teorema do Twist de Moser, [8], a�rma que se τ1 é não nulo então a in�uência de

    O(|z|4) em alguns casos pode ser desconsiderada, nestes casos T age como uma rotação o

    que resulta na existência de curvas invariantes na vizinhança do ponto �xo.

    É possível mostrar, [12], que para o caso r > δ os autovalores de D(0,0)T são não resso-

    nantes e que o primeiro coe�ciente de Birkho� é dado por:

    τ1 = −1

    8(1− 1

    r) 6= 0

    Prova-se assim a existência de curvas invariantes em torno do ponto �xo elíptico (0, 0) o

    que explica a ilha de estabilidade observada na Figura 2.5.

    3.2 O ponto �xo hiperbólico (π, 0)

    Denotaremos por p o ponto �xo (π, 0). Pelo Teorema de Hartman-Grobman, [2], existe

    uma bola B(p, �) de centro p e raio � na qual T é conjugada topologicamente com DpT .

    É consequência deste teorema a existência local de uma variedade invariante estável cuja

    de�nição é:

    W sloc(p) := {x ∈ B(p, �)|T n(x) → p quando n →∞}

    Tem-se também a existência de uma variedade invariante instável de�nida por:

    W uloc(p) := {x ∈ B(p, �)|T−n(x) → p quando n →∞}

    Segue do Teorema da Variedade Estável, [2], que sendo T um difeomor�smo C∞ em

    B(p, �), a variedade estável local é uma curva C∞ tangente em p ao auto-espaço associado

    ao menor auto-valor de DpT . Analogamente a variedade instável é uma curva C∞ tangente

    em p ao auto-espaço associado ao maior auto-valor de DpT .Portanto são curvas que se

    interceptam transversalmente em p.

    É através das variedades invariantes que a in�uência de um ponto �xo hiperbólico se

    estende à dinâmica global. De fato, podemos de�nir globalmente as variedades invariantes

    pelos conjuntos:

    W s(p) := {x ∈ M |T n(x) → p quando n →∞} =∞⋃

    n=0

    T−n(W sloc(p))

    35

  • W u(p) := {x ∈ M |T−n(x) → p quando n →∞} =∞⋃

    n=0

    T n(W sloc(p))

    No que segue, vamos estudar propriedades das variedades invariantes globais associadas

    ao ponto (π, 0). Iniciamos com algumas observações sobre as simetrias das variedades

    locais.

    Seja B(p, �) a vizinhança de p na qual vale a conjugação entre T e DpT . Podemos de�nir

    as variedades invariantes de p utilizando o conjunto de B := B(p, �) da seguinte forma:

    W sloc =∞⋂n

    T n(B) e W uloc =∞⋂n

    T−n(B)

    Essa de�nição caracteriza W sloc como o maior conjunto T -invariante em B, i.e todo con-

    junto T -invariante de B está contido em W sloc. Analogamente W uloc é o maior conjunto

    T−1-invariante em B.

    As variedades invariantes locais se relacionam pelas simetrias X e Y . De fato, usando que

    a bola B(p, �) é um conjunto invariante por X e Y , i.e X(B) = B e Y (B) = B temos:

    X(W sloc) = X(∞⋂n

    T n(B)) =∞⋂n

    XT n(B) =∞⋂n

    T−nX(B) =∞⋂n

    T−n(B) = W uloc

    Analogamente Y (W sloc) = W uloc e consequentemente XY (W sloc) = W sloc e XY (W uloc) = W uloc.

    Segue da conjugação entre T e DpT que a única interseção entre W sloc e W uloc é o ponto

    �xo p. Isso implica que p também é a única interseção entre os eixos de simetria e as

    variedades locais. De fato, se por exemplo W uloc ∩ γ0 = q 6= p então:

    q = Y (q) = Y (W uloc ∩ γ0) = W sloc ∩ γ0

    donde q é um ponto de W sloc ∩W uloc diferente de p, o que não pode ocorrer.

    Concluímos então que W uloc possui dois ramos totalmente contidos no interior dos qua-

    drantes Qi e, como XY (W uloc) = W uloc, concluímos também que cada um destes ramos

    pertence a um quadrante distinto. Analogamente para W sloc.

    A próxima proposição e seu corolário garantem que as variedades invariantes globais

    petencem ao fecho topológico do conjunto constituído pelas imagens dos eixos de simetria.

    36

  • Proposição 3.2.1 Dado � > 0 existe k0 tal que para todo k ≥ k0 as curvas γk e φkpossuem segmentos com extremos em p e são tais que a �-vizinhança de qualquer ponto

    em Wuloc(p) possui um ponto destes segmentos.

    Prova Seja B := B(p, �) uma bola aberta na qual vale a conjugação topológica entre T e

    DpT garantida pelo teorema de Hartman- Grobman. Podemos escolher � su�cientemente

    pequeno de forma que:

    T (γ0 ∩B ∩Q4) ⊂ (Q4) e T (φ0 ∩B ∩Q4) ⊂ (Q4) (3.3)

    o que é garantido pelas propriedades das imagens dos eixos de simetria vistas na seção

    2.3.4.

    De�nimos a seqüência de conjuntos {Kn}n∈N da seguinte forma:

    K0 = B ∩Q4 e Kn := T (Kn−1) ∩K0 para n > 0

    Esta é uma seqüência de compactos encaixados. De fato, B e Q4 são compactos portanto

    Figura 3.2: De�nição dos conjuntos Kn

    K0 = B ∩ Q4 é compacto. Mas se para algum n o conjunto Kn é compacto então

    Kn+1 = T (Kn) ∩K0 também é compacto. Segue por indução em n que Kn é compacto

    para todo n.

    Por de�nição temos que K1 ⊆ K0 e por (3.3) sabemos que esta continência é estrita. Mas

    se para algum n tivermos Kn ⊆ Kn−1 então Kn+1 = T (Kn) ∩K0 ⊆ T (Kn−1) ∩K0 = Kn.

    Segue por indução em n que Kn ⊆ Kn−1 para todo n.

    Seja K∞ =⋂∞

    n=0 Kn, por ser a interseção de compactos encaixados este conjunto é não

    vazio e compacto. K∞ também é T−1-invariante, de fato se x ∈ K∞ então x ∈ Kn para

    37

  • todo n > 1 donde T−1(x) ∈ Kn−1 para todo n > 1, ou seja T−1(x) ∈ Kn para todo n logo

    T−1(x) ∈ K∞.

    Sendo K∞ ⊂ B um conjunto T−1−invariante temos que:

    K∞ ⊂∞⋂

    n=0

    T n(B) = W uloc(p) (3.4)

    A continência acima implica que W uloc(p) possui um ramo no interior do quadrante Q4.

    Provaremos agora que este ramo é exatamente K∞.

    Denotemos por U o conjunto (W uloc(p) ∩ Q4). Como p ∈ U temos que U ⊂ T (U) e por

    de�nição temos U ⊂ (B ∩Q4) = K0. Mas se U ⊂ Kn para algum n ≥ 0 temos:

    U ⊂ (T (U) ∩K0) ⊂ (T (Kn) ∩K0) = Kn+1

    Conclui-se por indução em n que U ⊂ Kn para todo n > 0 donde U ⊂ K∞. E juntamente

    com (3.4) temos K∞ = W uloc(p) ∩Q4. �

    Corolário 3.2.1 Qualquer segmento compacto da variedade instável globalWu(p) é apro-

    ximado pelas curvas γk e φk com k ∈ N

    prova Seja L um segmento compacto qualquer da variedade instável Wu(p). Existe n0tal que T−n0(L) ⊂ Wuloc(p). Como T n0 é homeomor�smo, dado � > 0 existe δ tal que se

    x ∈ B(T−n0(y), δ) então T n0(x) ∈ B(y, �).

    Consideremos V (δ) uma δ-vizinhança de Wuloc(p). Como a variedade local é igual à inter-

    seção da seqüência de compactos encaixados {Kn} temos que existe n tal que Kn ⊂ V (δ),

    então (γn ∩ B) ⊆ ∂Kn ⊆ V (δ). Conseqüentemente um segmento de γn está δ-próximo

    de T−n0(L), logo T n0(γn) possui um segmento que está �- próximo de L. Analogamente

    (φn ∩ B) ⊆ ∂Kn e pelo mesmo argumento existe um segemento de T−n0(φn) que está �-

    próximo de L. �

    Utilizando a simetria X podemos construir a seqüência de compactos {X(Kn)}n∈N que

    aproxima o ramo de W sloc(p) em Q3 e concluir que este ramo é aproximado pelas curvas

    38

  • γ−n e φ−n assim como qualquer segmento compacto da variedade global W s(p). Resulta-

    dos análogos são provados para os demais ramos das variedades invariantes.

    3.2.1 Pontos homoclínicos

    Seja f : M → M um difeomor�smo, dado um ponto �xo p dizemos que q é homoclínico

    a p se q ∈ Ws(p) ∩ Wu(p). i.e fn(q) e f−n(q) convergem para p quando n → ∞. A

    existência de pontos homoclínicos acarreta complexidade para a dinâmica. Em particular

    se o ponto homoclínico é originado por uma interseção transversal. Neste caso prova-

    se a existência de um subconjunto invariante por alguma potência de f cuja dinâmica é

    conjugada com um sistema simbólico, o Shift, [2]. Algumas conseqüências são a densidade

    de pontos periódicos e homoclínicos neste subconjunto invariante e a positividade da

    entropia topológica do sistema.

    A existência pontos homoclínicos para o ponto �xo p da aplicação de bilhar T para a faixa

    de parâmetros r > δ resulta da seguinte proposição:

    Proposição 3.2.2 No caso r > δ as variedades invariantes Wu(p) e Ws(p) possuem um

    ponto em comum sobre o eixo de simetria ξ0

    Prova Para provar a existência de interseção entre as variedades basta mostrar queWu(p)

    possui um ponto q 6= p em ∂Q4, então por simetria Ws(p) possui o mesmo ponto.

    Suponhamos por contradição que (Wu(p) − p) ∩ ∂Q4 = ∅, então dado qualquer ponto

    (ω0, α0) ∈ (Q4 ∩ Wu(p)) − {p} temos pelo lema 2.3.3 que O+(ω0, α0) tem (0, 0) como

    ponto de acumulação. Mas para r > δ o ponto (0, 0) é elíptico estável, portanto existe um

    aberto invariante V contendo (0, 0). Assim, se O+(ω0, α0) se acumula em (0, 0) temos que

    esta órbita pertence ao aberto V . Podemos tomar V su�cientemente pequeno de forma

    que p não pertença ao fecho de V , mas isso é uma contradição com o fato de (ω0, α0) ∈ Wup .

    39

  • Concluímos então queWu(p)∩ ∂Q4 6= ∅. Resta provar agora que esta interseção pertence

    ao eixo ξ0. Seja então U o segmento de Wu(p) de extremos em p e em um ponto q ∈ ∂Q4sendo q o primeiro ponto de interseção entre de Wu(p) e ∂Q4, o que equivale a dizer que

    somente p e q são pontos de U em ∂Q4.

    Suponhamos que q ∈ γ0, então temos que Y (U) é um segmento de Ws(p) contido em Q3cujo único ponto em γ0 é q. Isso implica que q é um ponto homoclínico.

    Por um lado temos que T (q) ∈ γ1(∈ Q4∪Q1) mas por outro temos que T (q) ∈ (Y (U)− q)

    logo pertence ao quadrante Q3. Uma contradição que nos leva a concluir que a primeira

    interseção entre Wu(p) e Q4 não ocorre em γ0. Com um argumento análogo podemos

    provar que essa primeira interseção também não pode ocorrer em φ0.

    Resta-nos então o segmento {α = π2} e o eixo ξ0. Como o primeiro é formado por pontos

    �xos concluímos que q ∈ ξ0. �

    A proposição acima garante a existência de interseção entre as variedades mas não es-

    clarece a natureza de tal interseção. São possíveis a tangência, a transversalidade ou

    mesmo a conexão de sela. Como não pedimos mais que a diferenciabilidade na vizinhança

    do ponto �xo podemos ter ainda outros tipos mais complicados de interseção.

    Experimentos numéricos como o ilustrado na Figura 3.3 indicam que para o caso r > δ

    a interseção deve ser em geral, no mínimo, um cruzamento topológico, i.e as variedades

    se cruzam mas não necessariamente de modo transversal. Assim, vamos supor daqui

    para frente que ocorre este tipo de interseção e procurar descrever algumas conseqüências

    dinâmicas advindas dessa suposição.

    Iniciamos utilizando a aproximação das variedades invariantes pelas imagens dos eixos

    de simetria para veri�car uma propriedade conhecida dos pontos homoclínicos que é o

    fato de serem aproximados por órbitas periódicas de período arbitrariamente grande e

    por pontos homoclínicos. No próximo capítulo ilustramos como provar a positividade

    da entropia topológica do sistema utilizando a interseção homoclínica e as simetrias do

    problema.

    40

  • Figura 3.3: A interseção das variedades invariantes sobre o eixo ξ0. Ao centro a ilha de

    estabilidade do ponto �xo elíptico (0, 0).

    Proposição 3.2.3 Os pontos homoclínicos a p topologicamente tranversos são aproxima-

    dos por pontos periódicos e pontos homoclínicos.

    prova: Seja q um ponto homoclínico dado por uma interseção topologicamente transversa

    dos segmentos Ls ⊂ Ws(p) e Lu ⊂ Wu(p).

    Seja B(q, �) uma bola fechada de centro em q e com raio � su�cientemente pequeno para

    que os segmentos Ls e Lu tenham interseção com o bordo ∂B em quatro pontos distintos:

    a, b ∈ Lu ∩ ∂B e c, d ∈ Ls ∩ ∂B. Considere δ > 0 su�cientemente pequeno de forma que

    as bolas de raio δ e centro em a, b, c e d sejam disjuntas.

    Seja s ⊂ B uma curva contínua com extremos em B(a, δ) ∩ ∂B(q, �) e B(b, δ) ∩ ∂B(q, �)

    e s′ ⊂ B também contínua com extremos em B(c, δ) ∩ ∂B(q, �) e B(d, δ) ∩ ∂B(q, �). A

    curva s divide B em duas regiões cada uma delas contendo pontos de s′ o que implica que

    s ∩ s′ 6= ∅.

    Pela Proposição 3.2.1 existe m ∈ N tal que segmentos de φm e γm estão δ-próximos de

    Lu e segmentos de φ−m e γ−m estão δ-próximos de Ls. Segue desse fato que φm ∩ ∂B e

    41

  • Figura 3.4: A curva s (pontilhada) que aproxima Lu intercepta a curva s′ que aproxima

    Ls.

    γm ∩ ∂B são pontos de B(c, δ) e B(d, δ) e φ−m ∩ ∂B e γ−m ∩ ∂B são pontos de B(a, δ) e

    B(b, δ). Pela observação no parágrafo anterior temos que γm ∩ φ−m 6= ∅ ,γ−m ∩ φm 6= ∅,

    γm ∩ γ−m 6= ∅ e φm ∩ φ−m 6= ∅. Todos estes pontos de interseção são periódicos.

    Pelo mesmo argumento podemos mostrar que Lu ∩ (γ−m ∪ γ−m) 6= ∅ e Ls ∩ (γm ∪ γm) 6= ∅

    e estes pontos de interseção são homoclínicos a p.

    As conclusões acima valem se considerarmos �′ ≤ �. Isso implica que para toda vizinhança

    de um ponto homoclínico à p topologicamente transverso existem pontos periódicos e

    outros pontos homoclínicos à p. �

    Com pequenas alterações na demonstração acima é possível veri�car também que os

    pontos homoclínicos de tangência também são aproximados por órbitas periódicas de

    período arbitrariamente grande e por pontos homoclínicos.

    42

  • Capítulo 4

    Entropia topológica

    A entropia topológica de uma aplicação f : M → M é um número, htop(f), que mede

    a complexidade do comportamento dinâmico do sistema (M, f) em termos da taxa de

    crescimento exponencial do número de órbitas que podem ser distinguidas ao longo do

    tempo dentro uma precisão dada.

    O cálculo da entropia topológica de um sistema permite localizá-lo em uma escala de

    complexidade comparado a outros sistemas, quanto maior htop(f) maior a complexidade.

    Por se tratar de um invariante topológico a entropia também permite decidir sobre a

    equivalência de dois sistemas.

    A seguir damos uma de�nição de entropia topológica para uma aplicação de um espaço

    compacto e apresentamos algumas propriedades deste conceito, baseamo-nos nas referên-

    cias [5] e [2].

    Dado um espaço métrico compacto M e uma aplicação f : M → M dizemos que um

    conjunto S ⊂ M é um (n, �) − gerador se para todo x ∈ M existe um y ∈ S tal que

    d(f i(x), f i(y)) < � para 0 ≤ i ≤ n

    Pela compacidade de M é sempre possível encontrar um (n, �) − gerador �nito para

    quaisquer n e �. (ver [5]). A cardinalidade r(n, �) de tal conjunto satifaz r(n, �) ≤ mn

    43

  • para algum m. Daí:

    limsupn→+∞(1

    nlog(r(n, �))) < +∞

    pois ( 1nlog(r(n, �))) ≤ ( 1

    nlog(mn)) = log(m).

    De�nimos a entropia topológica htop(f) de f pelo limite:

    htop(f) = lim�→0(limsupn→+∞(1

    nlog(r(n, �))))

    Utilizaremos neste trabalho algumas propriedades da entropia topológica que dizem res-

    peito à comparação entre as entropias de sistemas que se relacionam topologicamente.

    Precisamente dizemos que um sistema (N, g) é um fator topológico de (M, f) se existe

    uma plicação θ : M → N contínua, sobrejetora e satisfazendo fθ = θg. Neste caso temos

    que:

    htop(g) ≤ htop(f) (4.1)

    Se a aplicação θ de�nida acima for um homeomor�smo dizemos que os sistemas (M, f)

    e (N, g) são topologicamente equivalentes e teremos htop(g) = htop(f). Uma última pro-

    priedade útil é a que relaciona a entropia de f a uma de suas potências fk. Neste caso

    temos:

    htop(fk) = k.htop(f) (4.2)

    Agora apresentaremos brevemente uma classe de sistemas dinâmicos abstratos de grande

    utilidade teórica: os Shifts. Tais sistemas possuem entropia topológica positiva.

    Dado um conjunto �nito de símbolos A = {a1, ...aN} de�nimos os espaço de seqüências

    bi-in�nitas:

    ΣN = {...s−1.s0.s1...|sj ∈ A ∀j ∈ Z}

    de�ne-se uma topologia neste conjunto cuja base é dada pelos cilindros simétricos Cα−k...α−1.α0....αk

    que por sua vez são de�nidos por:

    Cα−k...α−1.α0....αk{(s) ∈ ΣN |si = αi com− k ≤ i ≤ k}

    44

  • Com esta topologia ΣN é um espaço métrico completo, compacto e totalmente desconexo.

    Neste espaço está de�nido um homeomor�mso σ : ΣN → ΣN que age "transladando"as

    seqüências, i.e, σ(s)i = si+1, por essa razão σ recebe o nome de shift.

    O sitema dinâmico (ΣN , σ) é um sistema simbólico de dinâmica bastante complexa tanto

    que serve de paradigma para o que freqüentemente se chama de caos. A propriedade

    que nos interessa aqui é que estes sistemas apresentam entropia topológica positiva, mais

    precisamente podemos provar (ver [15]) que htop(σ) = log(N) para σ : ΣN → ΣN

    4.1 Critério geométrico para entropia topológica posi-

    tiva

    O objetivo desta seção é apresentar um método geométrico [14] pelo qual é possível

    provar que uma aplicação f possui entropia topológica positiva. A estratégia é conseguir

    uma fatoração topológica entre alguma potência de f e o shift (Σ2, σ) . Assim, pelas

    propriedades (4.1) e (4.2) teremos:

    htop(f) =1

    nhtop(f

    n) ≥ 1n

    htop(σ) > 0

    Iniciemos com algumas de�nições: seja f : M → M um homeomor�smo de uma va-

    riedade bidimensional. Considere N ⊂ M um subconjunto homeomorfo ao retângulo

    [−1, 1]× [−1, 1] e R ⊂ N pré imagem em N do retângulo [−1, 1]× [−ρ, ρ].

    Identi�caremos N com o retângulo [−1, 1]× [−1, 1] e R com o retângulo [−1, 1]× [−ρ, ρ],

    essa identi�cação é feita por simplicidade de notação sem prejuízo para as de�nições e

    resultados que seguem.

    De�nição 4.1.1 Um conjunto V ⊆ int(N) é chamado de essencial se V contém uma

    curva unindo as duas componentes de N/R.

    45

  • De�nição 4.1.2 Uma faixa horizontal é um conjunto S ⊆ R tal que

    • S é fechado e conexo por caminhos

    • S contém uma curva unindo os bordos verticais de R, i.e {−1} × [−ρ, ρ] e {1} ×

    [−ρ, ρ]

    • ∂S é uma curva de Jordan dada pela união de um número �nito de arcos todos com

    extremos nos bordos verticais de R

    Toda faixa horizontal S possui em ∂S exatamente duas curvas ligando os bordos verti-

    cais de R. Denotaremos por cmax a curva mais próxima de [−1, 1]×{ρ} e por cmin a outra.

    De�nição 4.1.3 Seja S uma faixa horizontal. Dizemos que uma aplicação F estica S

    sobre R se F (S) ⊂ int(N), F (∂S ∩ int(R)) ⊂ N/R e F leva cmax e cmin em componentes

    opostas de N/R.

    Figura 4.1:

    Lema 4.1.1 Seja S uma faixa horizontal e V um subconjunto essencial de N . Supon-

    hamos que F estica S sobre R. Então F (S ∩ V ) é essencial.

    prova Por de�nição de conjunto essencial, V contém um arco γ : [0, 1] → R tal que γ(0)

    pertence a cmax de S, γ(1) pertence a cmin e γ(t) ⊆ int(R) para 0 < t < 1.

    46

  • Uma componente de ∂S ∩ int(R) é chamada de positiva se é levada por F na componente

    de N \R que contém F (cmax). Chamamos de negativa a componente de ∂S ∩ int(R) que

    é levada por F na componente de N/R que contém F (cmin).

    Seja t0 ∈ [0, 1) o último valor do parâmetro para o qual γ(t) intercepta uma componente

    positiva de ∂S ∩ int(R) e t1 ∈ (t0, 1] o próximo valor no qual γ(t) intercepta ∂S.

    Observe que se γ(t) deixar S através de alguma componente de ∂S ∩ int(R) então deve

    voltar a S atravessando a mesma componente.

    O arco de γ(t) entre γ(t0) e γ(t1) pertence a S e sua imagem por F é uma curva em

    int(N) que liga as duas componentes de N \ R, já que F (γ(t0)) e F (γ(t1)) pertencem a

    componentes opostas de N \R. Assim F (S ∩ V ) é essencial. �

    Figura 4.2:

    Teorema 4.1.1 Suponhamos que N contém duas faixas horizontais fechadas e disjuntas,

    S0 e S1, que são esticadas através de R por F . Então o shift completo Σ2 é fator topológico

    de F .

    prova: Seja

    Λ =∞⋂

    k=−∞

    F k(S0 ∪ S1)

    47

  • que é o conjunto dos pontos cujas órbitas por F estão contidas nas faixas S0 e S1. A

    cada z ∈ Λ associamos uma seqüência π(z) de 0′s e 1′s de acordo com seu itinerário pelas

    faixas, mais precisamente π(z) é a seqüência cujo k-ésimo termo é 0 se F k(z) ∈ S0 ou 1

    se F k(z) ∈ S1.

    Seja π : Λ → Σ2 a aplicação que leva um ponto z ∈ Λ em sua seqüência π(z) ∈ Σ2. Esta

    aplicação está bem de�nida uma vez que as faixas S0 e S1 são disjuntas. Logo para todo

    k e qualquer z existe um único Si tal que F k(z) ∈ Si e assim existe uma única seqüência

    em Σ2 associada a z. Veremos que π : Λ → Σ2 é uma fatoração de Λ sobre Σ2.

    1. π é contínua.

    Sejam z ∈ Λ e α = π(z) ∈ Σ2. Dada uma vizinhança V de α existe um inteiro

    positivo r para o qual o cilindro Cα[−r,r] está contido em V .

    Para −r ≤ k ≤ r seja Bk ⊂ N uma bola aberta contendo z tal que F k(Bk) inter-

    cepta somente a faixa Sαk , a existência de Bk é garantida pela continuidade de F e

    pelo fato de S0 e S1 serem fechadas e disjuntas.

    O conjunto B = (⋂r

    k=−r Bk) ∩ Λ é uma vizinhança de z em Λ tal que F k(B) ⊆ Sαkpara −r ≤ k ≤ r, ou seja, para todo z′ ∈ B, π(z′)k = αk donde F (z′) ∈ Cα[−r,r] e

    F (B) ⊆ Cα[−r,r] e conclui-se assim a continuidade de π.

    2. Vale a igualdade π ◦ F |Λ = σ ◦ π.

    Seja z ∈ Λ e α = π(z). Por de�nição F k(z) ∈ Sαk e logo z ∈ F−k(Sαk). Temos

    então que z ∈⋂∞

    k=−∞ F−k(Sαk) e π(

    ⋂∞k=−∞ F

    −k(Sαk)) = π(z).

    Logo

    π ◦ F (z) ⊆ π ◦ F (∞⋂

    k=−∞

    F−k(Sαk)) = π(∞⋂

    k=−∞

    F−k+1(Sαk))

    48

  • Por uma mudança de índice na interseção in�nita temos:

    π ◦ F (z) ⊆ π(∞⋂

    k=−∞

    F−k(Sαk+1))

    Observe que

    π(∞⋂

    k=−∞

    F−k(Sαk+1))k = αk+1

    Logo

    π(∞⋂

    k=−∞

    F−k(Sαk+1)) = σ ◦ π(z)

    Finalmente como σ ◦ π(z) é um único ponto em Σ2 temos a igualdade π ◦ F (z) =

    σ ◦ π(z).

    3. π é sobrejetiva.

    Para mostrar esse item vamos precisar Lema 4.2.1 e do seguinte :

    Lema 4.1.2 Dado r ≥ 1 o conjunto:

    F (Sα−1) ∩ F 2(Sα−2) ∩ ... ∩ F r(Sα−r)

    é essencial para cada α ∈ Σ2

    prova Por indução em r. O caso r = 1 é claro pois F estica Si através R. Suponha

    que o lema valha para r > 1. Então:

    V = F (Sα−2) ∩ F 2(Sα−3) ∩ ... ∩ F r(Sα−r−1)

    é essencial e pelo Lema 4.2.1:

    F (Sα−1 ∩ V ) = F (Sα−1) ∩ F 2(Sα−2) ∩ ... ∩ F r+1(Sα−(r+1))

    é essencial, portanto o lemma vale para r + 1, donde concluímos por indução que é

    válido para todo r.

    49

  • Corolário Para cada α ∈ Σ2 e cada r ≥ 0 o conjunto Λr(α) =⋂r

    k=−r F−k(Sαk) é

    não vazio.

    prova: Seja β = σr+1(α) então αj = βj−r−1.

    Λr(α) = F−r(Sα−r) ∩ F−r+1(Sα−r+1) ∩ ... ∩ F r(Sαr))

    substituindo αj por βj−r−1 temos:

    Λr(α) = F−r(Sβ−2r−1) ∩ F−r+1(Sβ−2r) ∩ ... ∩ F r(Sβ−1))

    Podemos escrever:

    Λr(α) = F−(r+1)(F (Sβ−2r−1) ∩ F 2(Sβ−2r) ∩ ... ∩ F 2r(Sβ−1))

    e concluímos que Λ(r) é não vazio já que pelo Lema 4.1.2 o conjunto F (Sβ−2r−1)) ∩

    F 2(Sβ−2r) ∩ ... ∩ F 2r(Sβ−1) é essencial e portanto não vazio.

    Os conjuntos Λr(α) são interseções �nitas de compactos, portanto são compactos e

    temos Λ0(α) ⊃ Λ1(α) ⊃ ...Λn(α) ⊃ ... Logo⋂∞

    r=0 Λr(α) é não vazio para cada α, ou

    seja existe z ∈⋂∞

    k=−∞ F−k(Sαk). Segue que para todo α ∈ Σ2 existe z ∈ Λ tal que

    π(z) = α donde π é sobrejetiva.

    4.2 Entropia topológica positiva do bilhar no anel ex-

    cêntrico

    C. Foltin em [13] provou que os bilhares excêntricos apresentam entropia topológica po-

    sitiva para algum valor de parâmetro r su�cientemete pequeno. Nesta seção ilustramos

    como a existência de um ponto homoclínico topologicamente transversal implica na po-

    sitividade da entropia topológica do sistema. Utilizamos as simetrias do espaço de fase

    para construir a fatoração topológica com o shift de dois símbolos.

    50

  • Suponha que exista um ponto q homoclínico topologicamente transverso sobre eixo ξ0.

    Denotemos por Lu e Ls dois segmentos compactos das variedades invariantes, instável e

    estável respectivamente, que se interceptam em q.

    Lema 4.2.1 Existe n0 tal que segmentos das curvas γn0, φn0, γ−n0 e φ−n0 limitam um

    conjunto conexo contendo q em seu interior e cujo bordo é formado por exatamente um

    segmento de cada uma das curvas γn0, γ−n0, φn0 e φ−n0.

    prova: Na prova da proposição 3.2.3 mostra-se que dado � > 0 existe n0 tal que as

    seguintes interseções:

    γn0 ∩ γ−n0 , γn0 ∩ φ−n0 , φn0 ∩ φ−n0 e φn0 ∩ γ−n0

    são todas não vazias com pontos da bola aberta B(q, �).

    Como q ∈ ξ0, o conjunto φn0 ∩ φ−n0 possui um ponto p1 sobre o eixo ξ0, já que φn0 =

    X(φ−n0). Seja φn0(t) uma parametrização da curva φn0 tal que φn0(t0) = p1, e orientada

    de forma que para algum t1 > t0 temos φn0(t1) ∈ γ−n0 , e para todo t0 < t < t1 temos que

    φn0(t) não pertence à γ−n0 . Diremos neste caso que φn0(t1) é a primeira interseção entre

    φn0 e γ−n0 . Denotaremos φn0(t1) por p2.

    Seja agora γ−n0(t) parametrização de γ−n0 tal que γ−n0(t′0) = p2 e orientada de forma que

    para algum t′1 > t′0 temos que γ−n0(t′1) é a primeira interseção entre γ−n0 e o eixo ξ0, que

    denotaremos por p3.

    Por construção temos que o segmento de φn0(t) entre t0 e t1 intercepta γ−n0(t) somente

    no ponto p2. Assim, temos uma curva simples ligando p1 a p3 dada pela união de segmen-

    tos de φn0 e γ−n0 . A imagem pela simetria X desta curva é também uma curva simples

    ligando p1 a p3 dada pela união de segmentos das curvas φ−n0 e γn0 . A união desta duas

    curvas limita uma região conexa contendo q em seu interior e cujo bordo é formado por

    exatamente um segmento de cada curva γn0 , γ−n0 , φn0 e φ−n0

    Pelo lema acima podemos de�nir uma coleção de conjuntos {Dn}n≥n0 onde Dn é o conexo

    contendo q limitado pelas curvas γn, φn, γ−n e φ−n. Pela simetria Y existe um segundo

    51

  • ponto homoclínico q′ = Y (q) sobre o eixo ξ0, ao qual associamos uma coleção de conjuntos

    {D′n}n≥n0 tais que D′n = Y (Dn).

    Os lemas a seguir provam algumas propriedades dos conjuntos Dn e D′n que serão úteis

    mais adiante.

    Lema 4.2.2 Dado � > 0 existe n tal que Dn ⊂ B(q, �)

    prova: Consideremos Ls e Lu segmentos compactos das variedades que se interceptem

    em q e que estejam totalmente contidos em B(q, �). Dada a compacidade dos segmentos

    podemos escolher δ > 0 tal que a δ−vizinhança de Ls ∪ Lu esteja totalmente contida em

    B(q, �).

    Seja n1 tal que as imagens por T n1 e T−n1 dos eixos de simetria contenham segmentos na

    δ-vizinhança de Ls ∪ Lu. Temos assim que Dn1 ⊂ B(q, δ).

    Lema 4.2.3 Existe n tal que T (Dn) ∩Dn = ∅

    prova: Existe �′ > 0 tal que as bolas abertas B(q, �′) e B(T (q), �′) são disjuntas. Pela

    continuidade de T , existe também δ′ tal que T (B(q, δ′)) ⊂ B(q, �′) donde T (B(q, δ′)) ∩

    B(q, δ′) = ∅. Escolhendo n tal que Dn ⊂ B(q, δ′) temos que T (Dn) ∩Dn = ∅.

    A partir de agora �xemos � > 0 tal que B(q, �) ∩ B(q′, �) = ∅. Fixaremos também n0 de

    forma que Dn0 ⊂ B(q, �) D′n0 ⊂ B(q′, �) e T (Dn0) ∩Dn0 = ∅, T (D′n0) ∩D

    ′n0

    = ∅.

    O conjunto T−n0(Dn0) tem duas componentes do bordo sobre os eixos de simetria γ0 e φ0,

    são as imagens por T−n0 dos segmentos de ∂Dn0 pertencentes à γn0 e φn0 . Analogamente

    para T−n0(D′n0). Estas pré-imagens servirão como faixas verticais utilizadas no método

    da seção anterior, portanto passaremos a usar a seguinte notação.

    S0 = T−n0(Dn0) e S1 = T

    −n0(D′n0)

    52

  • Figura 4.3: A aproximação das variedades pelos eixos de simetria de�nem o conjunto Dn.

    A pré-imagem T−n(Dn) é um conjunto que possui componentes do bordo sobre os eixos

    de simetria.

    Por construção o conjunto Dn0 é simétrico em relação a X, i.e X(Dn0) = Dn0 . Como

    conseqüência temos T 2n0(S0) = X(S0) e S1 = XY (S0). De fato:

    X(S0) = XT−n0(Dn0) = T

    n0X(Dn0) = Tn0(Dn0) = T

    2n0(S0)

    e

    XY (S0) = XY (T−n0(Dn0)) = T

    −n0XY (D−n0) = T−n0X(D′−n0) = T

    −n0(D′−n0) = S1

    A Figura 4.4 ilustra os conjuntos S0, S1 e suas imagens por T 2n0 .

    Figura 4.4: Os conjuntos S0, S1 e suas imagens por T 2n0 , X(S0) e X(S1) respectivamente.

    Observemos que os segmentos de γ0 e φ0 que pertencem a ∂S0 são levados por T 2n0 em

    segmentos de γ2n0 e φ2n0 que são as componentes de ∂X(S0) que não pertencem aos eixos

    53

  • de simetria. Os segmentos de γ−2n0 e φ−2n0 em ∂S0 por sua vez são levados por T 2n0 nos

    segmentos de γ0 e φ0 pertencentes a ∂X(S0).

    Escolhemos n0 de forma que T (Dn0) ∩ Dn0 = ∅, portanto temos que T (S0) ∩ S0 = ∅,

    o mesmo valendo pra S1. Observemos que T (S0) é um subconjunto de Q4 e T (S1) um

    subconjunto de Q2, (ver Figura 4.5 ).

    Figura 4.5: O conjunto S0 e sua imagem T (S0) ⊂ Q4 e o conjunto S1 com sua imagem

    T (S1) ⊂ Q2

    Passamos agora a descrever a disposição do conjunto T (X(S0)), para tanto consideremos

    c : [0, 1] → X(S0) uma curva contínua tal que c(0) ∈ φ0 e c(1) ∈ γ0. Observemos que

    para algum t0 ∈ (0, 1) c(t0) pertence à variedade Wsp .

    Como T (Dn0) ∩ Dn0 = ∅ temos que T (X(S0)) ∩ X(S0) = ∅ logo T (c(t)) é uma curva

    contínua sem pontos em comum com X(S0).

    Como φ0 ∩X(S0) é segmento do bordo de S0 temos que T (c(0)) ∈ T (S0) ⊂ Q4. E como

    γ0 ∩X(S0) é segmento do bordo de S1 temos que T (c(1)) ∈ T (S1) ⊂ Q2.

    O ponto s(t0) pertencente à variedade estável é levado em um ponto T (c(t0)) também na

    variedade só que mais póximo de p.

    Concluímos que T (c(t)) é uma curva contínua ligando um ponto de T (S0) a um ponto de

    T (S1) passando por um ponto de Wsp na região interna ao anel composto pelos conjuntos

    S0,X(S0), S1 e X(S1), (ver Figura 4.4).

    54

  • Figura 4.6: A imagem de uma curva contínua ligando pontos de ∂X(S0)∩φ0 e ∂X(S0)∩γ0

    Como esse é o comportamento de qualquer curva contínua em X(S0) que liga pontos de

    ∂X(S0) ∩ φ0 e ∂X(S0) ∩ γ0 concluímos que o conjunto T (X(S0)) tem a disposição como

    ilustrado na Figura 4.7. Por simetria XY podemos descrever a disposição do conjunto

    T (X(S1)).

    Figura 4.7: As imagens por T dos conjuntos X(S0) e X(S1) .

    Para nos adequarmos ao método geométrico da seção anterior é necessário de�nir um

    conjunto N homeomorfo a um retângulo o qual tem S0 e S1 como faixas horizontais. Para

    nossos propósitos é su�ciente de�nirmos N como qualquer conjunto conexo que contenha

    os conjuntos S0, S1 tal que os segmentos γ0∩∂S0, φ0∩∂S0 e γ0∩∂S1, φ0∩∂S1 façam parte

    do bordo de N . De�niremos N de forma a conter em seu interior os conjuntos T (S0),

    55

  • T (S1), T (X(S0)) e T (X(S1)) . A Figura 4.8 ilustra uma escolha possível de N .

    Figura 4.8: O conjunto N .

    Proposição 4.2.1 T 2n+1 estica S0 e S1 através de R

    prova

    Indicaremos por cimax e cimin respectivamente as curvas cmax e cmin da faixa horizontal Si.

    Com essa notação temos que c0max = φ−2n0 ∩ ∂S0 e c0min = γ−2n0 ∩ ∂S0. Segue que:

    T 2n+1(c0max) = T (T2n0(φ−2n0 ∩ ∂S0)) = T (φ0 ∩X(S0)) ⊂ N/R+

    T 2n+1(c0min) = T (T2n0(γ−2n0 ∩ ∂S0)) = T (γ0 ∩X(S0)) ⊂ N/R−

    Ou seja, a aplicação T 2n0+1 leva a faixa horizontal S0 em T (X(S0)) que é subconjunto do

    interior de N e leva as curvas c0max e c0min em componentes opostas de N/R, então T 2n0+1

    estica S0 sobre N . Por simetria concluímos também que T 2n0+1 estica S1 sobre N . �

    A proposição acima conclui o que pretendíamos mostrar, ou seja, se as variedades in-

    variantes Wup e Wsp possuem uma interseção topologicamente transversal sobre o eixo de

    simetria ξ0 então a aplicação T possui entropia topológica positiva. Observemos mais uma

    56

  • vez que não provamos que a interseção entre as variedades é topologicamente transver-

    sal, mas �zemos esta suposição com base em experimentos computacionais que sugerem

    que este é o comportamento dessas interseções para a maior parte dos casos em que os

    parâmetros do bilhar satisfazem r > δ.

    57

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