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    EM ABERTO: Manifestaes rpidas, entrevistas, propostas, experincias, tradues, etc.

    A ETNOGRAFIA DA ESCOLA '

    Bernard Charlot

    O texto a seguir uma nota sinttica de leitura, redigida no interesse daequipe de pesquisa Education Socialization et Collectivits Locales(E.S.C.O.L) da Universidade de Paris VIII, equipe pela qual sou responsvel.Esta equipe investiga as relaes com o saber e as redes de ao

    educativa numa zona de educao prioritria (a Z.E.P dos Francs-Moisinsem Saint-Denis).

    Por que me pareceu interessante redigir esta nota? Os trabalhos sobre asrelaes entre fracasso escolar e origem social tm sido conduzidos naFrana, numa perspectiva macro-educativa derivada da sociologiafuncionalista e que tem procurado pr em evidncia "a reproduo" e asdeficincias scio-culturais. Entretanto, se a "reproduo" entendida comocorrelao estatstica entre xito escolar e origem social, inegvel, osprocessos pelos quais se produz essa reproduo, as mediaes entreorigem social e xito ou fracasso escolar permanecem muito poucoconhecidas. Nossa pesquisa sobre a relao social com o saber tem porambio, precisamente, explorar essas mediaes. Estou tambm

    interessado em uma perspectiva etnogrfica sobre educao, que coloqueos problemas em termos micro-sociais e reencontre, por sua vez, aquesto da articulao entre micro e macro-social. Meu interesse pelaetnografia da escola, alm disso, tem suas razes num questionamento"neo-marxista" mais global sobre o papel dos atores, das micro-situaese da historicidade da constituio do. social.

    1 Trabalho publicado sob o ttulo "L'ethnographie de l'cole dans les travauxbritanniques", no n 18 da revista Pratiques de Formation (ANALYSES), editadapelo Servio de Formao Permanente da Universidade de Paris VIII, emdezembro de 1989, p.87-106, traduzido por Rogrio Cordova (UnB).

    2 Bernard Charlot professor da Universidade de Paris VIII, onde, poca em que

    redigiu esta nota era coordenador da equipe de pesquisa sobre Escolarizao,Socializao e Comunidades Locais (ESCOL). No Brasil tem traduzido o livro AMistificao Pedaggica: realidades sociais e processos ideolgicos na teoriada educao; traduo de Ruth Rissin Josef. 2 ed., Rio de Janeiro: Guanabara,1986.

    I - Anlise de Interao e Observao Antropolgica

    Referncias:

    - Stubbs (Michel) e Delamont (Sara) (Ed).. Explorations in ClassroomObservation. Jonh Wiley and sons; London, 1976. Ver particularmente,nesse livro, os artigos seguintes:

    . Delamont (Sara) e Hamilton (David): "Classroom research: a critique anda new approach" (resumido no texto a seguir);

    . Delamont (Sara): "Beyond Flander's fields: the relationship of subjectmatter and individuality to classroom Style";. Walker (Rob) e Adelman (Clem): "Strawberries"

    - Delamond (Sara) e Hamilton (David): "Revisiting classroom research: acontinuous cautionary tale", in Delamont (Sara) (ed): Readings on inter-action in the classroom. London: Methuen, 1984.

    Durante muito tempo a sala de aula foi uma caixa preta para ospesquisadores, simples suporte para uma pesquisa "input-output" ou paratestes psicomtricos. Considerava-se que aquilo que se passava dentroda sala de aula dependia da vida no meio externo, no se investigavacomo o mestre ensinava realmente e como o aluno realmente aprendia.Consequncia: professores permanecem indiferentes, at mesmo hostis, pesquisa em educao."Basically, classroom research aims to estudy the process that take placewithin the classroom black box" (Delamont et Hamilton,1976).

    Nos Estados Unidos da Amrica a pesquisa sobre sala de aula tem sidorealizada desde os anos sessenta. Mas ela no provoca revoluo nacompreenso da sala-de-aula. Este fracasso se deve ao fato de queprivilegiaram um tipo de observao em detrimento de outros: a anlise deinterao (observao por meio de grades de comportamento cujas rubricasso pr-elaboradas - B.C.) O autor de preferncia aqui Flanders -Analysing teaching behavior, Addison-Wesley, Reading, Massa-chussets,1970. Essa anlise repousa sobre uma concepo behaviorista: o sistema de observao reduz a vida corrente da sala de aula apequenas unidades, que podem ser codificadas, colocadas em tabelas,quantificadas.

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    Crtica da "anlise de interao" conforme Delamont e Hamilton:

    - Os dados coletados so separados do seu contexto social, temporal ehistrico;

    - Interessa-se apenas pelas condutas observveis, "abertas", sem levarem conta as diferentes intenes por detrs das condutas; "no attempt todiscover the actor's actual or self-perceived intention";

    - Focalizao sobre aquilo que pode ser categorizado ou medido;

    - Focalizao sobre pequenas unidades de conduta, mais que sobreconceitos globais; potencial limitado para ir alm dessas pequenas unidades;

    - Utilizao de "categorias pr-especificadas", o que pode tornar asexplicaes tautolgicas;

    - Fronteiras arbitrrias para um fenmeno que, em realidade, contnuo;o que torna presente o risco de criar uma distoro (biais) inicial;

    - As grades de observaes podem mostrar diferentes perfis de mestres,

    mas no podem jamais explicar porque os mestre diferem dessa maneira,questo que est, por definio, alm da capacidade do mtodo;

    - Walker e Adelman notam que essas grades consideram o papel dosmestres como central dentro da classe e no consideram a variedade doscomportamentos dos alunos no interior da classe e entre classes. Elassupem, ademais, um contexto onde o mestre fala e os alunos escutam,fato que corresponde mal realidade da sala de aula;

    - "Excluso dos dados considerados subjetivos, em benefcio de umaobjetividade superficial";

    - Distino rgida entre observador e observado, mantendo uma rgidadistncia; nada de levar em conta a conduta da criana em relao aoobservador;

    - Por desejo de objetividade, a anlise de interao se v freqentemente

    obrigada a estudar um grande nmero de classes, consideradas comoamostra representativa. Assim, pertubaes locais significativas, efeitosno habituais, atpicos, no so estudados em detalhes, embora possamapresentar uma significao.

    Essa anlise de interao dominou a pesquisa americana durante dezanos e ameaa hoje (1976) ser adotada na Inglaterra sem maiores crticas.Entretando, existe uma outra tradio americana de pesquisa sobre a sala

    de aula, menos conhecida: a observao antropolgica.

    A Observao Antropolgica

    A observao antropolgica se desenvolve margem da correntedominante de pesquisa em educao e se enraza na antropologia social,na psiquiatria e na observao participante em pesquisa sociolgica (natradio de Malinowski, Thomas e Walker, mais que na de Watson,Skinner e Sales).

    Para descrev-la, basta retomar as crtica dirigidas anlise de interao:

    - dados no sistemticos e abertos, susceptveis de serem enriquecidospelo prprio processo de observao ("unsystematic and open-ended");encoraja o desenvolvimento de novas categorias; no utiliza categoriaspr-especificadas e imutveis; as categorias e os conceitos emergemdurante a pesquisa;

    - aceita o cenrio complexo que encontrado e toma a totalidade comodado de base;

    - fundamenta-se na observao participante; recorre a pessoas queconsidera como "informantes" mais que "sujeitos";

    - realiza estudos em profundidade de um pequeno nmero de classes,sem pretender que essas classes sejam representativas de umaamostragem mais ampla;

    - utiliza uma srie de tcnicas "antropolgicas": observao participante,anotaes de campo, registros, entrevistas em profundidade. A idia

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    central a de que a natureza do problema deve determinar a escolha domtodo.

    Mais ainda:

    - o interesse pela sala de aula no deve fazer esquecer o contextoeducacional e social mais amplo;

    - o desenvolvimento de tcnicas audio-visuais de registro das situaesno deve se substituir presena fsica, na classe, de um observadorindependente.

    Em resumo (B.C): a anlise de interao e a obsevao antropolgica(participante) tm em comum a focalizao sobre a sala de aula enquantotal, sendo que a primeira se fundamenta numa epistemologia e numametodologia behavioristas, enquanto a segunda se centra sobre aquiloque "faz sentido" (to make sense) na classe e, em conseqncia, aplicauma metodologia "aberta", dando importcia s intenes dos atores e singularidade (temporalidade) das situaes.

    Il - As Idias Bsicas da Antropologia da Escola

    Referncia:

    - Delamont, (Sara), Interaction in the classroom, London, Methuen,1983,(2a ed; 1 ed. em 1976).

    O quadro de anlise derivado do interacionismo simblico (Mead).Principais referncias: Mead (Georges H.), Mind, Self and Society, University of Chicago Press, 1934; Blumer (H.), Symbolic Interactionism.Prentice Hall, 1969.

    Teses centrais de Mead:

    - Todos os seres humanos tm um "eu" (self), so reflexivos, "auto-interagentes" (self-interacting). Ns pensamos aquilo que ns fazemos, eaquilo que ns pensamos um elemento crucial do nosso modo de agir.Esse "eu" no uma estrutura enrijecida, mas um processo dinmico,sempre em mudanas;

    - H dois tipos de interao entre os seres humanos: simblicas e nosimblicas. Uma grande parte da interao humana simblica, o quequer dizer que ela inclui a interpretao. Quando as pessoas interagem,elas interpretam constantemente seus prprios atos e os dos outros,reagem, interpretam de novo, e assim sucessivamente. Nos atos sociais,os indivduos agem em conjunto, compartilham a construo daquilo queest acontecendo, construindo uma definio da situao.

    Citao de S. Delamont (p.29):

    "Este livro utiliza as perspectivas de pesquisa do interacionismo simblicopara estudar a sala de aula. A problemtica repousa sobre a idia bsicasegundo a qual os modelos cambiantes da vida da classe ("the changingpattems of classroom life") so construdos socialmente no decurso dotempo e esto constantemente sujeitos a negociaes e renegociaes".

    Referncia:

    - Woods (Peter). The Divided School. Routledge and Kegan Paul, London, 1979.

    O quadro geral de interpretao dos fenmenos escolares o interacionismosimblico:

    - Os seres humanos agem em relao s coisas com base nas significaes("of the meanings") que as coisas tm para eles. Os homens habitam ummundo.natural, mas tambm um mundo social, onde a existncia desmbolos, como a linguagem, os torna capazes de dar sentido aos objetos.Essa atribuio de sentidos, essa interpretao, o que os especificacomo seres humanos e sociais. Os interacionistas, em conseqncia, secentram ("focus on")sobre o mundo das significaes subjetivas ("subjec-tive meanings") e dos smbolos atrs dos quais elas so produzidas erepresentadas;

    - Essa atribuio de sentido aos objetos atravs dos smbolos, umprocesso contnuo. A ao no uma simples conseqncia de atributospsicolgicos (tendncias, atitudes, personalidades), no tambm umasimples conseqncia de fatores externos como as estruturas e os papis

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    sociais, mas resulta de um contnuo processo de atribuio de significado,que est sempre emergindo, num estado de fluxo e sujeito a mudana("results from a continuous process of meaning attribuition which is alwaysemerging in a state of flux and subject to change");

    - Esse processo tem lugar num contexto social. Cada indivduo alinha suasaes considerando as dos demais. Ele o faz colocando-se no lugar dooutro, interpretando as respostas do outro. Ele deve levar em conta asimpresses que os outros tm dele, mas tambm (deve) tentar influenciara definio da situao que os outros constrem. Isto implica a idia de"representao do eu" (desenvolvida por Goffman - B.C.) e aquela de"negociao" (idia central na obra de P. Woods e de muitos etngrafosingleses - B.C).

    Citao de Woods (p.2):

    "A abordagem sociolgica sobre a qual repousa este trabalho provm dointeracionismo simblico. Este se centra sobre a maneira pela qual aspessoas constrem o mundo social, tentam continuamente dar sentido aomundo ("to make sense of the world"), atribuem significaes e

    interpretaes aos acontecimentos, e utilizam smbolos para osrepresentarem. Ele enfatiza as construes pessoais, subjetivas, dosacontecimentos pelos mestres e pelos alunos, mais do que as afirmaesdos socilogos sobre tais eventos, e atribui a primeira importncia aoprocesso de atribuio de sentido e de definio de situao ("and el-evates the process of meanig-assignation and situation-definig to primeimportance").

    Outras referncias:

    - Woods (Peter) e Hammersley (Martin) (ed). School experience: Explorations in the Sociology of education. New York: Saint Martin Press,1977.

    "Uma base fundamental do trabalho neste livro a idia de que asaes no podem ser compreendidas e explicadas sem estudar asrazes da ao, mesmo se essas razes devem, por sua vez, serexplicadas por fatores no acessveis conscincia dos atores".

    "Essas 'novas sociologias' compartilham uma caracterstica central:um interesse pela maneira pela qual os atores constrem o mundosocial atravs da interpretao e da ao". "Mead sustenta que osseres humanos agem em relao s coisas na base dos significadosque as coisas tm para eles" ( act towards things on the basis of thebasis of the meanings the things have for them"). "A Etnometodologia,portanto, vai se referir aos estudos dos mtodos que as pessoasusam para atribuir sentido ao mundo ou, mais geralmente, paraordenar seu mundo". ("Ethnomethodology therefore was to refer tothe study of the methods people use to make sense of the world, or,more generally, to order they world".).

    "To make sense of the world" ("atribuir sentido ao mundo"): umaexpresso central entre todos os etngrafos da escola (B.C).

    - Furlong (Viv), "Interaction sets in the classroom: Towards a study of pupilknowlwdge", in Stubbs e Delamont (1976, op. cit.).

    Este autor prope uma definio ao mesmo tempo precisa e operacionalda noo de interao:

    "Por interao eu entendo situaes nas quais os indivduos chegam a

    uma "definio da situao" a partir de uma avaliao da ao apropriada,extradas de um mesmo senso comum. Isto , eles "vem" o que acontecede uma mesma maneira e chegam a um acordo sobre quais so asmaneiras apropriadas de se comportar nas circuntncias. O que nosignifica que todos os que esto em interao devam se comportar damesma maneira, mas to simplesmente que eles se comportam de umamaneira que possa ser interpretada pelos outros como mostrando'definies da situao' similares. E os alunos igualmente no necessitamdizer uns aos outros como eles esto vendo as coisas, uma vez que suasaes o diro simbolicamente para toda a classe".

    III - Diferenas e Filiaes das Problemticas

    Referncia principal:

    - Hammersley (Martin) e Woods (Peter) (ed.), Life in School: the Sociology of pupil culture. Open University Press, 1987 (2 ed.; 1 ed. 1984).

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    Diversos textos fazem referncia, implicitamente, a uma histria daantropologia da escola na Gr-Bretanha depois do final dos anos 60 e oincio dos anos 70. O livro de Hammersley e Woods explicita essa histria.

    1. A problemtica de Hargreaves, Ball e Lacey

    Referncia:

    - Hargreaves (David). Social relations in a Secondary School. London:Routledge an Keegan Paul, 1967;

    - Lacey (Colin). Hightown Grammar: the School as a Social System.Manchester: Manchester University Press, 1970;

    - Ball (Stephen). Beachside Comprehensive. Cambridge University Press,1980.

    A idia central que o processo escolar de encaminhamento para diferentestipos de ensino ("streaming") e de formao das turmas nos diferentesnveis ("banding") produz uma polarizao cultural dos alunos que afeta oseu desempenho. Esse processo produz uma polarizao de atitudes dosalunos com relao aos valores da escola. Alguns adotam uma culturaconformista, "pr-escola", enquanto outros constrem uma cultura darejeio.

    Essa interpretao reconhece a influncia da base social subjacente,influncia que se manifesta atravs da reao dos alunos organizaoinstitucional da escola, aos dispositivos de orientao, s exigncias daescola, ao seu nivel de sucesso. Essa reao no em si mesma, umefeito puramente objetivo. Ela se constri atravs do sentido que os alunosatribuem sua situao na escola.

    Dois artigos de Life in School permitem, na impossibilidade de ler oslivros de base, melhor compreender essa tese. Um deles escrito por C.Lacey: "Differentiation and subcultural polarisation"; o outro de S. Ball:"Banding, identity and experience".

    A origem social e a inteligncia no explicam tudo. Elas operam atravs dosistema de relaes sociais dentro da sala de aula, por mecanismos queno so completamente determinados por fatores externos, mecanismosde diferenciao e de polarizao que engedraro subculturas "pro" ou"anti-escola". "Por diferenciao, escreve Lacey, eu entendo a separaoe a classificao dos alunos segundo um conjunto de mltiplos critriosque constitue o sistema de valores normativos e acadmicos da escolabsica ("grammar school").

    A diferenciao definida, aqui, como largamente veiculada pelos docentesno curso de suas tarefas normais. A polarizao, por outro lado, produzida no interior do grupo de alunos, em parte como resultado dadiferenciao, mas influenciada por fatores externos e com uma autonomiaprpria. um processo de formao de uma subcultura na qual, culturanormativa que domina a escola, se ope uma cultura alternativa que eudenomino a cultura do "anti-grupo". O contedo da cultura do anti-gruposer, bem evidente, muito influenciado pela escola e pela sua situaosocial" (folk music, subcultura delinqente, etc,)(P.11). Notamos que adiferenciao se opera segundo critrios de hierarquizao,simultaneamente acadmicos e de conduta. O anti-grupo no se desenvolveno primeiro ano (escolar), mas comea a emergir no segundo, e sedesenvolve no terceiro e no quarto (o que lgico desde que ele efeitodas prticas escolares de diferenciao - B.C.).

    S. Ball desenvolve as mesmas teses - e precisa que aquilo que umprofessor conhece dos alunos decorre do dispositivo organizacional daescola ("banding" e "streaming"). Ele se refere explicitamente a Hargreavese Lacey, os quais cita. A diferenciao a "separao e a classificao(ranking) dos alunos pelo professor"; ela se opera segundo uma escalaacadmica e uma escala de conduta. Desde o segundo ano, os docentestm expectativas bem estabelecidas e bem diferentes em relao aosalunos (notar-se- que se trata de um forma de teoria da "rotulao"(labelling), isto , de uma etiquetagem - B.C. ). Os alunos so

    "categorizados". Intervm, ento, um segundo mecanismo, a polarizao,"formao de grupos subculturais". A mudana do modelo de conduta dogrupo 2 (o mais baixo - B.C.) no curso dos dois primeiros anos pode serinterpretada como emergncia de uma subcultura anti-escola, um desafioem relao cultura escolar normativa. Tendo os alunos desse grupo um

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    baixo estatuto ("statut") escolar, no do seu interesse manter seu empenho(investimento) em relao aos valores da escola. A emergncia dessasubcultura anti-escola representa o ajustamento desses alunos ao problemado estatuto com o qual so confrontados. Os alunos estabelecem novasnormas, novos critrios de estatuto ("statut"), os quais valorizam ascaractersticas que eles possuem, o tipo de conduta de que eles socapazes. Interagindo mais freqentemente entre si, aqueles quecompartilham a mesma posio dentro da classe desenvolvem suas

    prprias normas, valores, cultura, uma conformidade necessria parapossuir um estatuto dentro do anti-grupo.

    Essas teses, embora insistam sobre o fator institucional, repousam sobrea idia de que os alunos atribuem significao escola ("make sense ofschool"), e reagem escola em funo dessa significao. Pode-se,portanto, legitimamente, integr-las dentro da corrente etnogrfica (daqual Hargreaves, por sua vez um dos fundadores na Gr-Bretanha)(B.C.).

    2. A abordagem etnogrfica macro-educativa : Willis

    A abordagem etnogrfica em termos de sub-cultura, de cultura anti-escolar, de cultura de resistncia, oferece, em Hargreaves, Lacey e Ball,uma anlise do que ocorre dentro da escola (diferenciao e polarizao).Outros autores desenvolveram por outra parte, uma problemtica dacultura de resistncia anti-escolar que se enraza no prprio meio social.O autor de referncia, aqui, Willis, No obstante, o livro Life in Schoolcita igualmente autores de inspirao marxista que, distanciando-se dasteorias da reproduo, adotam esse tipo de enfoque (infelizmente asreferncias aqui so muito alusivas).

    O livro fundamental de Willis (P.) Learning to Labour, Saxon House,1977. Life in School apresenta um artigo de Willis ("Elements of a

    culture") que retoma suas principais teses.Face aos "alunos conformados s regras da escola" ("school conformistpupils"), que eles denominam de "ear-holes" ("babacas"), os alunos no-conformistas (lads) ("espertos") se consideram superiores e mais

    experimentados, porm de uma maneira diferente e mais anti-social:bebida, tumulto, sexo, modo de vestir, cigarro, etc... Face ao enfado, elesprocuram a "excitao"; desafiar a lei, beber, roubar, vandalizar. A violncia sua forma principal de ascendncia sobre os conformistas; a violnciaque pra o tempo e as crises e submerge plenamente no presente, essaviolncia que se exprime de modo todo particular, noite, nas ruas e nosbailes. Essa contra-cultura se cria na escola, menos, entretanto, comouma resposta ao fracasso escolar, (contrariamente s teses anteriormente

    mencionadas), do que como o desenvolvimento de uma cultura de classeexistente no seu ambiente ("the working class culture"), desenvolvimentoestimulado pelas pretenses autoridade exprimidas pelos docentes einaceitveis para os "lads".

    3 . As crticas abordagem em termos de subcultura

    Esta abordagem tem sido objeto, na corrente inglesa de etnografia daescola, de vrios tipos de crtica (por autores que, de sua parte, se criticamentre si).

    a) O interacionismo radical (B.C.)

    Ele se exprime atravs de Viv Furlong (o artigo publicado por Stubbs eDelamont retomado integralmente em Life in School). Furlong semanifesta contra a idia de que o aluno sofreria constragimentos epresses externas por parte de um grupo possuidor de normas, valores esubcultura prprios. Esse modelo, segundo Furlong, se ressente de trstipos de objees.

    Primeiramente, as interaes "no acontecem" nos grupos de amigos:elas "so construdas" pelos "indivduos". Quem interage com quem podemudar a cada minuto, segundo um grande nmero de circustncias. Ainterao dos alunos numa sala de aula no incluir, necessariamente,

    todos os amigos ao mesmo tempo, e incluir, freqentemente, alunos queabsolutamente no so amigos. O comportamento dos alunos muda aolongo das situaes, em curtos espaos de tempo.ele no determinadopor qualquer grupo, mas um contnuo ajustamento a uma cena socialcambiante. Essa extrema variabilidade da situao, apreendida como um

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    fluxo sem estrutura permanente, impede de pensar, evidentemente, emtermos de subcultura (B.C.). Para Furlong, a verdadeira questo "comoos alunos 'atribuem sentido' escola?", questo se pe em "quadros deinterao", isto , em situaes de interao em constante mudana. Essaprimeira crtica a crtica de fundo, qual as demais no fazem senoacrecentar nuances.

    Em segundo lugar, falso que as normas e os valores apresentem umaconsistncia. "There is no consistent culture for a group of friends". No hnem grupo consistente, nem cultura consistente para um grupo. A variedadedos comportamentos dentro da sala de aula demasiado grande para serdescrita em termos de cultura consistente. "Norms and values relate tospecific definitions of the situation and to tipical interaction sets, rather thanto a particular group of friends". (Normas e valores esto relacionados adefinies especficas da situao e quadros tpicos de interao, mais doque a um grupo particular de amigos).

    Em terceiro lugar, Furlong recusa o modelo segundo o qual o indivduo controlado por uma presso que lhe exterior, oriunda dos membros dogrupo ao qual ele pertence. necessrio, portanto, estudar a maneira pela

    qual a interao se constri e a maneira segundo a qual os alunos avivem... A situao de interao (confira a definio proposta anteriormentepor Furlong) deve ser estudada em termos de definio da situao,definio compartilhada por alguns alunos (porm, no sempre os mesmos)e que provoca certas condutas (mas no em todos); aqueles, porm quecompartilham a mesma definio da situao "compreendem", sem queexista necessidade de palavras, essa conduta..

    Para resumir a tese de Furlong (como o fazem Hammersley e Turner em"Confomist Pupils?" - Life in School -) pode-se dizer que ele insistesobre a enorme variabilidade contextual da conduta de um mesmo aluno,o que exclui a idia de uma subcultura consistente. Ele insiste numadefinio da situao que permite compreender a conduta (deles). Essa

    conduta varia em diferentes contextos, em particular em funo da avaliaoque os alunos fazem dos docentes como rgidos (stricts) ou no (softs),eficazes ou ineficazes. Hammersley e Turner criticam em Furlong,primeiramente, o fato de isolar completamente a situao escolar e, emsegundo lugar, o propor um modelo que no permite explicar porque o

    aluno s vezes se junta a uma ao de indisciplina ("disruptive action") es vezes no. Esto, entretanto, de acordo com Furlong, quanto a partirdas aes dos alunos "in relation to moment-to-moment Changes in theirsituation" (em relao com as mudanas incessantes e pontuais de suasituao). Consideram, porm, ser necessrio investigar como essasaes se estruturam dentro dos quadros ("frames"). O professor constituiquadros ("frames") que especificam a conduta que ele espera por parte

    dos alunos; algumas concernem qualquer situao escolar, outras apenasalgumas ocasies, outras ainda so muito especficas. Os alunos, por suavez, constroem, eles tambm, quadros ("frames"). Ademais, o aluno podeatribuir sentido a sua ao a partir de sua prpria identidade e de suabiografia ("the pupil may also make sense of his or her action in terms ofa conception of own identity and biography".). Mas tambm a se podeobservar uma grande variabilidade, seja quanto desejabilidade dosobjetivos enquanto tais, seja quanto situaes.

    b) O contexto social (B.C.)

    O artigo de Hammersley e Turner, que acabo de citar, mostra umatentativa de integrar o social de outra maneira. (Este artigo, com efeito,

    no invoca o social em termos de sub-cultura, mas de biografia e deidentidade. O que interessa particularmente para a problemtica daE.S.C.O.L.)

    Outros artigos mostram um enfoque do mesmo tipo. Assim, sempre emLife in School, o de M. Fuller, intitulado "Black girls in comprehensiveSchool of London". Fuller utiliza a idia de subcultura, mas a trabalha apartir de noes que destacam a identidade e a biografia. Segundo ele,a idia de subcultura no suficiente para compreender o comportamentoescolar das meninas negras (das Antilhas anglfonas). preciso levartambm em conta a situao, na sociedade, dos negros e das mulheres.Essas mocinhas das ndias Ocidentais so muito conscientes de suasrazes tnicas e se aceitam positivamente como negras. Mas elas so

    tambm conscientes de serem discriminadas como mulheres dentro desua prpria comunidade e, por essa razo, querem permanecer na Gr-Bretanha. Ficam furiosas com o fato de que o futuro lhes seja fechado, aomesmo tempo, como negras e como mulheres. Mas, contrariamente aosmeninos, elas desenvolvem uma subcultura que no a da apatia e do

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    desespero, nem uma rejeio automtica dos brancos e do outro sexo.Devido ao fato de que seu futuro est na Gr-Bretanha, elas procuram ummodo de viver com os brancos (modus vivendi) sem, que, entretanto,estejam prontas a sacrificar sua identidade de negras, que elas vivempositivamente. Isto se traduz na sua atitude face escola. Elas tm, naescola, estratgias para tentar administrar sua vida presente e futura. Aaquisio de qualificaes acadmicas entra nessas estratgias de controle

    do seu futuro, alm de ser afirmao pblica de alguma coisa que elasconhecem, mas que no reconhecida: seu prprio valor e sua igualdadecom os meninos. Essas meninas so tambm "pr-educao", sem, todavia,serem "pr-escola". Elas criticam a escola como enfadonha e infatilizantee no suportam suas rotinas cotidianas. No obstante, a escola conservaum pertinncia enquanto lugar de um sucesso acadmico. Elas trabalhamtambm conscientemente, embora aparentando no o fazer, da mesmaforma como no concedem nenhum valor aos outros aspectos dapersonagem do bom aluno. Evitam os conflitos abertos com os docentes,mas os exasperam, frequentemente, e no procuram ter uma boa reputao

    junto a eles. Uma vez que os exames so annimos, a qualidade do seutrabalho diz mais para elas do que a opinio do professor. Este exemplo,segundo Fuller, pe em dvida a idia de aluno conformista, tal como

    expressa por Hargreaves (1967) e por Willis (1977). Este artigo de Fuller,alm do seu interesse prprio (eu penso notadamente no caso das"beurettes", (jovens filhas de imigrantes arabes), mostra como a idia desubcultura pode, a um s tempo, integrar uma anlise mais fina daidentidade e dos projetos dos alunos, e se articular com os comportamentosescolares observveis.

    Um outro artigo interessante, que me parece fundamentado na mesmaabordagem que a de Fuller, o artigo de John Furlong, "Black resistancein the liberal comprehensive", in S. Delamont (ed.), Readings on interac-tion in the classroom, London, Methuen, 1984. J. Furlong mostra que ,contrariamente s teses de Willis, a posio dos jovens negros (homens) ambgua (no consciente) em relao escola. Ao mesmo tempo eles

    rejeitam a escola e a autoridade que ela pretende impor (o que contrrio sua ideologia central da virilidade), mas mantm aspiraes acadmicasrelativamente elevadas, pois seria tambm contra a virilidade tornar-se umlixeiro. De outra parte, a escola para eles o espao social de sua vida emgrupo: eles chegam atrasados, faltam s aulas, mas esto l, nos corredores

    e sobretudo nos banheiros, onde eles constrem e experimentando a suaidentidade, notadamente atravs de interaes verbais intensas (do tipodaquelas descritas por Labov. B.C.)

    "To maintain their sense of dignity they had to work hard in class andflout the rules of the school and develop a reputation as a man".(Paramanter o seu senso de dignidade eles tinham que trabalhar duro na

    sala de aula, desconsiderar as regras da escola e desenvolver umareputao como um homem).

    "Their rejection of school could therefore never be complete becausethey were always tied to a recognition of his importance". (A rejeioda escola por parte deles, por isso, nunca poderia ser completa,porque eles estavam sempre vinculados ao reconhecimento daimportncia dela).

    c) Refinar o modelo

    Tendo a idia de subcultura e a distino entre alunos 'conformistas' e

    'no conformistas' enfrentado dificuldades, algumas pessoas tentaramrefinar o modelo.

    Hammersley e Turner, no artigo j citado (Life in School) criticam a idiade aluno conformista. De uma parte, a prpria categoria e sua definio("conformar-se definio escolar do papel do aluno") so demasiadosimplistas. De outra parte, no h um conjunto simples de valores veiculadospela escola, pelos professores e pela classe mdia, mas uma segmentao,bem como existem valores oficiais e valores subterrneos (velados).Enfim, h ambivalncia entre os alunos: uma grande parte da conformidade escola motivada por objetivos instrumentais (concursos, emprego ),mais do que por respeito aos valores escolares propriamente ditos. "Emoutros termos, a conformidade pode ser uma estratgia calculada, mais do

    que o simples produto de uma socializao bem sucedida dentro dasnormas e dos valores escolares". "O esquema 'pr/anti' no exprime, demaneira adequada, a estrutura (patterning) complexa das perspectivasdos alunos". Este esquema, de fato, se fundamenta nas pesquisas sobredelinqentes. Muitos autores sublinham que a abordagem etnogrfica da

    Em Aberto, Braslia, ano 11, n.53, jan./mar. 1992

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    educao se desenvolveu a partir de pesquisas sobre a delinquncia, amarginalidade, os alunos rejeitados pela escola. (Este fato, talvez, tenhaintroduzido vises conceituais, de sorte que no se tenha dado bastanteateno s classes "normais", funcionando em condies "normais", comalunos "normais". (B.C.). Hammersley e Turner evocam o esquemaalternativo proposto por Peter Woods, a partir de um esquema inicial deMerton, mas no param a, e propem sua prpria abordagem em termosde quadros de estruturao ("frames") (como mencionado acima).

    Woods prope, efetivamente, um modelo elaborado do esquemaconformista/no-conformista (sobre o qual, vale lembrar, repousa aidia de subcultura pr/anti-escola, tanto para Lacey quanto para Willis).Ele o prope em The Divided School (1979). E chega s categoriasseguintes: conformidade (sub-dividida em hiperconformidade, identificao,ritualismo e oportunismo, com subdiviso dessas mesmas sub-categorias);retraimento; colonizao (indiferena quanto aos fins, ambivalncia quantoaos meios; o aluno se esfora para sobreviver na escola, com uma certacumplicidade dos docentes; a forma de adaptao mais difundida naescola); intransigncia (indiferena aos fins, rejeio dos meios; so osalunos mais ameaadores para a instituio); rebelio (rejeio dos fins e

    dos meios, com substituio por outros objetivos e meios; tal o caso dasmoas que no pensam seno em ser cabelereiras; um acerto com taisalunos possvel). Essa classificao no destituda de interesse (aindaque o esquema no desperte em mim um entusiasmo excessivo (B.C.)).Entretanto, esta proposta deixa de lado, a meu ver, o problema central: aarticulao das determinaes externas e das determinaes internassobre a conduta na escola (tanto em termos de aprendizagem quanto emtermos gerais.).

    IV - Temas e Modos de Abordagem Dominantes nas PublicaesBritnicas

    Os principais representantes dessas obras, frequentemente coletivas,especialmente Sara Delamont e Peter Woods,(que, pelo menos do pontode vista editorial, esto no centro do movimento), tm tido o cuidado delembrar que o mtodo etnogrfico no exclue a utilizao, em paralelo, deoutros mtodos. Entre os quais se incluem os quantitativos. Alm disso,

    Em Aberto, Braslia, ano 11, n.53, jan./mar. 1992

    (lembram) que o estudo em sala de aula, das situaes, do sentido,no deve fazer esquecer que essa sala de aula ou essa escola estoincludos num contexto social mais amplo. Peter Woods, em The DividedSchool, se refere mesmo explicitamente a Max Weber (que ele realmenteusa, uma vez que a burocracia est no fundamento das mltiplas divisesda escola analisadas ao longo do livro), bem como se refere a Marx (cujautilidade, no caso, eu me pergunto qual tenha sido...). Ele chega a proporum quadro geral que permite ligar os niveis macro e micro, levando emconta a variao das situaes (s vezes utilizando Bernstein ou atmesmo Cicourel). Confesso, entretanto, no estar nada convencido poressa tentativa que me parece originar-se antes de um ecletismo que deuma superao-sntese no sentido hegeliano. Por outra parte, conformevimos, certos autores tentam realmente articular o social e o sentidoescolar: esse o problema de fundo da discusso sobre a noo desubcultura.

    Eu diria, muito vontade, que as teorias acima mencionadas podem seordenar em torno de dois plos, que delimitam o campo da etnografiaescolar. O primeiro plo representado por Willis: uma etnografia centradano meio social do aluno, mesmo se ela leva em conta o papel da escola

    na cristalizao de uma subcultura entre os jovens da classe trabalhadora.(Mas se trata, realmente, de uma etnografia, diferentemente do queocorre com as teorias francesas ou americanas da reproduo). O segundoplo representado pelo artigo de 1976 de Viv Furlong: uma etnografiado quotidiano da sala de aula, em sua infinita variabilidade, etnografiaque isola completamente o escolar do social. Eu diria, igualmente, quequaisquer que sejam as suas afirmaes de princpio, as etnografiasbritnicas da escola, de modo particular Peter Woods, esto realmentemuito prximas do segundo plo. Eles estudam, de fato, e s vezesexplicitamente, a sala de aula como um campo onde os atores definem asituao, negociam suas relaes, executam estatgias (a includas asde sobrevivncia). A sala de aula um campo social, no na medida emque ela est articulada ao social, mas na medida em que o social (de fato

    reduzido ao institucional) se fabrica atravs das aes e interaes dosatores (no sentido que eles lhes atribuem).

    Os ttulos dos captulos, dos artigos, ou os temas abordados pemsuficientemente em evidncia essa abordagem dominante.

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    Assim o livro de Sara Delamont, Interaction in the classroom, publicadoem 1976 e reeditado em 1983, livro que se pode considerar como fundador,apresenta a seguinte estrutura: Captulo 1 e incio do captulo 2: aproblemtica. Final do captulo 2: montando o cena (setting the scene).Captulo 3: os protagonistas: o professor. Captulo 4: os protagonistas: osalunos. Captulo 5: "A batalha comea: estratgias para a sala de aula".Uma cena sobre a qual se exercita uma batalha entre os protagonistas (o

    professor e os alunos).Trata-se e um campo fechado onde se confrontamestratgias e onde a situao definida atravs de aes e interaes,onde o imperativo de "atribuir sentido" ("to make sense")(imperativo a meuver essencial) de fato tratado como "atribuir sentido escola dentro daescola" ("faire sens de l'ecole dans l'ecole"). No se leva a, realmente, emconta (salvo excees, como vimos nos casos de Fuller ou John Furlong)o sentido da escola dentro de um projeto mais amplo de vida, na construode uma identidade social e profissional, dentro de uma trajetria, de umabiografia, tendo como referncia as prticas de vida, os discursos, osespaos, o tempo, etc, fora da escola.

    Certos temas retornam de maneira permanente nas diferentes publicaes:

    - a negociao;- a estratgia;

    - a percepo do outro protagonista (dos alunos pelo professor, e, sobretudo,do professor pelos alunos).

    Os estudos sobre esses temas so, no obstante, interessantes, comocondio, entretanto, de que se aceite o primeiro postulado: "a cena dada, faamos entrarem os atores e olhemos como eles constituem osocial atravs de suas interaes e do sentido que eles constrem".Ocorre que a gente tem frequentemente, durante a leitura, o sentimentode que se poderia ir mais longe ao considerar que alunos e professoreschegam escola como portadores de sentido, de expectativas, de

    aspiraes, de projees quanto ao futuro. E a gente tem o sentimento deque, ao se fechar sobre essa problemtica, a gente pode ajudar osmestres e eventualmente os alunos, a sobreviverem, mas nada mais; e,sobretudo, nada de reatribuir um sentido verdadeiro ao fato mesmo de ir escola, de entrar nessa cena.

    Citemos, entrementes, alguns estudos interesantes dentro desse quadrolimitado:

    - a arte e a maneira de fazer "gozaes" (to muck about);

    - a arte e a maneira de testar (to suss out) o professor, recolhendocaractersticas de seu comportamento desde os primeiros encontros,

    caractersticas que, como entrada em cena e esboo do social, interessamparticularmente a esses pesquisadores, a justo ttulo, pelo menos dentroda perspectiva escolhida);

    - a arte e a maneira de humilhar (show up) os alunos, ("rebaixar-lhes otopete");

    - como os professores ("includos a os liberais") so levados, pelosprprios alunos, a se auto-imporem uma personagem de mestre tradicional,rgido; com maior frequncia o que os alunos esperam de um bomprofessor (a definio da situao que eles impem ao mestre);

    - como gracejar ("to have a laugh") na sala de aula para os alunos, na salados professores para os colegas, particularmente s custas daadministrao; as funes complexas do humor nas estratgias docentes;

    - as verdadeiras funes do silncio dentro da sala de aula; menoscondio de trabalho que afirmao implcita de que "eu", o professor, soucapaz de controlar minha classe ( afirmao apenas da inteno, poisque, do lado de fora, o barulho que sai da sala de aula o nico indicadordo domnio ou no da classe pelo professor);

    - como, para muitos alunos em dificuldades escolares, especialmentealunos dos meios populares, "learning is working" (aprender equivale atrabalhar). "Realizar o trabalho proposto pelo professor era sempre o mais

    importante na aprendizagem; nova compreenso, se ocorria alguma, eraum prmio adicional". ("Doing the 'work' set by the teacher was always ofprime importance in learnig; new understandig, if it occurred, was anadded bonus") (Viv Furlong, in Woods e Hammersley, School experience.

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    Dois temas me interessam particularmente:

    . O da linguagem: como a linguagem do professor funciona comometalinguagem que serve para controlar tudo, ao mesmo tempo em quefunciona como linguagem expressiva. Estudo fino da seqncia de base:o professor prope uma questo, o aluno responde, o professor avalia aresposta (com freqncia indiretamente). Como o principal trabalho doaluno consiste em decifrar os sinais que o professor inclue em suas

    perguntas a fim de que os alunos saibam onde encontrar as respostas.

    Referncias:

    Stubbs (Michael). Language, school and classrooms. London, Methuen,1983 (2 ed., 1976). Ainda em Stubbs (M), "Keeping in Touch: somefunctions of teacher talk", in Stubbs (M) e Delamot(S.) (ed.) Explorationsin classroom observation, John Wilwy and Sons, London, 1976.Finalmente, Hammersiey (Martyn), "School learning: the cultural resourcesrequired by pupils to answer a teachers question", in Woods (P) eHammersiey (M.) (ed.) School Experience: Exploration in the Sociology of education. New York, Saint Martin's Press, 1977.

    . As estratgias de sobrevivncia (entre os alunos, mas tambm entreos professores): H um "currculo oculto" da sobrevivncia: primeiramente,sobreviver; a seguir, se possvel, ensinar qualquer coisa aos alunos.Sobreviver pela dominao, pela nogociao com os alunos, pela"confraternizao", pelo ritual e pela rotina; pela retrica, ou seja, elevandoo moral pela desvalorizao dos alunos ("despreparados" - B. C); pelacrtica adminstrao e pelo humor.

    Referncias:

    Woods, The Divided School, e Woods, "Teaching for Survivafin Woodse Hammersiey, School Experience j mencionados. Com relao aoplano metodolgico, o essencial se encontra no livro de Peter Woods,Inside School: Ethnography in educational research, London, Routledgeand Keegan Paul, 1986. Citamos tambm, referente ao problema da

    Em Aberto, Braslia, ano 11 , n.53, jan./mar. 1992

    formao dos professores, Woods (Peter) e Polland (Andrew) (ed.), Sociology and Teaching, a new Challenge for the Sociology of Education,London, Croom Helm, 1988. Este livro contm dois artigos interessantesno plano metodolgico: John Quicke, "Using structured life histories toteach the Sociology and social psichology of education: an evaluation"; eRobert C. Burgesse, "Examinig classroom practices usig diaries and diaryinterviews".

    V - A Abordagem Etnogrfica nos Estados Unidos (USA)

    Referncia:

    - Spindler (George) (ed.) Doing the ethnografy of schooling. New York:Holt, Rinehart and Winston, 1982.

    O livro "editado" por George Spindler faz aparecerem diferenas notveiscom relao corrente britnica dominante. Embora, tal como entre osbritnicos, o conceito de base seja aquele de "interao", o livro deSpindler se apia sobre os conceitos de comunidade e de transmissocultural, "ln the anthropologist view, schooling is cultural transmission.Schooling exist, in this view, to recruit new members into the Community(usually its own offspring) and maitain the cultural system". ("Na perspectivada antropologia, escolarizao transmisso cultural. A escolarizaoexiste, desde este ponto de vista, para recrutar novos membros para acomunidade (usualmente sua prpria descendncia/prole) e manter osistema cultural").

    Esta concepo de escola, precisa Spindler, no a da maioria dosamericanos que, ao contrrio, consideram a escola como um instrumentode mudana (change) e de progresso ("improvement"). A idia retomadaem vrios artigos do livro. Assim, Kathleen Wilcox escreve:" The concep

    tion of school as primary transmitters of culture is very different from theconception common in United States of schools as reformers of culture.

    H, portanto, uma diferena importante entre o enfoque britnico e o dolivro de Spindler e que parece ser dominante nos Estados Unidos. O

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    primeiro, pensa em termos de interao; o segundo, de comunidade.Certamente no se deveria subestimar essa diferena. verdade quecertos americanos, como o canadense Erving Goffman ou osetnometodlogos, tambm refletem em termos de interao e deinterpretao, e a noo de comunidade, por sua vez, no estranha aosbritnicos, pois est subjacente noo de cultura. Entretanto, os britnicosbuscam relatar a constituio de subculturas a partir da frequncia dasinteraes, enquanto a corrente americana dominante usa o conceito de

    comunidade como inicial e, contrariamente queles, pensa as interaesa partir do conceito de comunidade. A diferena, portanto, real. De umlado, uma anlise em termos de interao-face-a-face ("face-to-face-inter-action"); de outro, uma anlise em termos de transmisso cultural. De umaparte, uma anlise centrada na escola, na sala de aula, nos protagonistas,nas negociaes, nas estratgias. De outra, uma anlise centrada em"como o contexto cultural e a base social so projetados no processoeducacional, determinando-o de fato" ("how the cultural context andCommunity backgroud are projected into, in fact determine, the educationalprocess") (H. Varenne).

    Qualquer que seja o conceito de base - interao ou comunidade - aobservao participante est no mago do enfoque metodolgico: trata-sede compreender "a partir do interior" o que determina a conduta. A nfase,entretanto, ainda desta vez, um pouco diferente entre britnicos eamericanos. Para os primeiros, o essencial compreender o que fazsentido para o ator ("to make sense of the world") e a nfase colocadasobre o processo de definio e de interpretao da situao . Para ossegundos, trata-se de respeitar a regra bsica de toda pesquisa etnogrfica:compreender os valores culturais especficos de uma comunidade"indgena" ("nativa"), sem nela projetar as suas prprias (do pesquisador),e, pois, imergir longamente nesta comunidade. Desde ento, a problemticado sentido passa por uma problemtica do "familiar" e do "estranho". Parao etngrafo que estuda uma comunidde indgena, a tarefa primeira tornar familiar aquilo que lhe estranho ("to make the strange familiar").Mas a situao completamente outra a partir do momento em que acomunidade estudada aquela qual pertence o prprio etngrafo: oproblema para ele, ento, passa a ser o de fazer estranho o que lhe erafamiliar ("to make the familiar strange"). Como explica Spindler, elepermanecia na sala de aula durante dias, indagando-se o que havia ali a

    observar, at que ele comea a ver os mestres e os alunos como "indgenas"envolvidos nos seus ritos, em interaes, em conflitos culturais, etc... Oprocesso etnogrfico conduz, ento, do "familiar" para o "estranho" e,outra vez, ao "familiar", ("from familiar to strange and back to familiar"). Adiferena de abordagem ilustra, parece, a diferena de origem e deformao dos prprios pesquisadores. Os britnicos sopreponderantemente docentes, ex-docentes, universitrios muito voltadospara os problemas da sala de aula (notadamente atravs de sua atividade

    na Open University de Londres). J os americanos - no s os queescrevem no livro de Spindler, mas outros tambm, como o caso deJohn Ogbu - so antroplogos de formao, so etngrafos especializadosnos problemas da escola.

    A diferena de enfoque se exprime, tambm, na escolha dos temas deinvestigao. Os britnicos estudam a sala de aula no seu quotidiano, comseus processos de negociao, as estratgias dos parceiros ("partenaires"),etc... Os americanos, centrados sobre a trasmisso cultural, se interessam,de modo muito particular pelo currculo oculto ("hidden curriculum").Conforme G. Spindler: "Com efeito, a importncia dos aspectos mascarados,no intencionais, no explicitados, tem sido a pedra de toque ("corner-stone") das posies tericas que emergiram durante este periodo de

    formao da antropologia da educao". Os americanos realizam,igualmente, estudos comparativos dos processos de trasmisso cultural:comparao do ensino a um jovem indiano por um mestre indiano e porum mestre no indiano; comparao dos modos de trasmisso dos valoresculturais a crianas de classe "baixa" e de classe "alta".

    Essa diferena de enfoque se exprime, igualmente, de maneira talvezainda mais significativa, no momento em que britnicos e americanosabordam os mesmos temas.

    Primeiro exemplo: a linguagem. Vimos como Stubbs ou Hammersleycolocam esse problema em termos de estratgias de argio na sala deaula. No livro de Spindler, Shirley Brice Heath retoma essa perspectiva,

    mas a estende anlise das situaes de comunicao na comunidade .E escreve que enquanto os professores, de entre eles e com seus prpriosalunos, instituem a criana como parceiro legtimo de uma conversao,os adultos dos meios populares negros no consideram a criana comoparceiro verbal antes que ela seja uma fonte real de informao; esperam

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    da criana, no que ela lhes responda verbalmente, seno que faa o quelhe foi pedido; falam crinaa antes que com ela.

    Segundo exemplo: a "resistncia mudana " entre professores. Vimosque Peter Woods interpreta essa estratgia em termos de sobrevivncia.G. Spindler v a a consequncia da funo de transmisso e deconservao cultural da escola: "A resitncia mudana nas instituieseducativas monumental, no simplesmente porque os educadores sejam

    conservadores ou, sobretudo, sem poder; mas porque as escolas tm porfuno transmitir a cultura e existem no contexto de uma comunidade".

    suficiente andar um passo a mais para reencontrar, no prprio seio dacorrente etnogrfica, a problemtica da reproduo. No livro de Spindleresse passo dado explicitamente por Katleen Wilcox, que no se podeconsiderar como marginal, uma vez que no apenas apresenta um captulosobre suas prprias pesquisas, mas ainda redige o captulo de sntesesobre a etnografia da educao. K. Wilcox articula diretamente suaspesquisas sobre as concluses de S. Bowles e de Gintis, os representantesamericanos da teoria da reproduo sob a forma marxista (Shooling incapitalist America. New York: Basic Books, 1976). Ela mostra, por umapesquisa etnogrfica, como as crianas pertencentes a classes sociaisdiferentes so socializadas com base em modelos diferentes, que aspreparam para ocupar lugares diferentes na hierarquia do trabalho: aetnografia confirma e corrobora aqui as teses macro-educativas sobrereproduo. No se trata de uma escorregadela ("glissement") no problema,mas de uma posio explcita de K. Wilcox, a qual extrai as ltimasconsequncias de uma tese essencial na etnografia americana daeducao.

    "Os etngrafos tm, muito frequentemente, elaborado sua concepo deescola a partir do conceito de trasmisso cultural (...) Esse tipo de anlisederiva da tradio estrutural-funcionalista no pensamento das cinciassociais".

    A abordagem etnogrfica, que pode aparecer como uma teoria do ator,do sentido, da interao, da interpretao da situao, se torna, naverso proposta por K. Wilcox e endossada por Spindler, em razo dasteorias macro-educativas centradas na estrutura, na funo, no sistema

    e nos agentes, uma abordagem que pe a preeminncia do macro-educativo sobre o micro-educativo e que se filia explicitamente ao estrutural-funcionalismo. (Eu no estou seguro de que a sociologia da educaoganhe com essa reduo. Que a abordagem etnogrfica confirme, poroutras vias, as teses macro-educativas sobre a reproduo, me parece deum interesse limitado. A meu juizo, a contribuio verdadeira da etnografiada educao est em outra parte: ela pe em evidncia a situao por trsdo sistema, a interao por detrs da estrutura, o sentido por detrs da

    funo, o ator por detrs do agente ou 'diante de', ou 'atravs de' ou'suporte de' ou 'realidade de' - segundo as problemticas de base qualcada um esteja ligado e, dessa maneira, introduz a exigncia de umtrabalho sobre articulao do micro com o macro-educativo e, mais alm,do micro com o macro-social(B.C)).

    Certas posies britnicas, como a de Viv Furlong, por exemplo, sefecham no micro-social. A posio americana, tal como levada a suasltimas consequncias por Katleen Wilcox, tende a reduzir o micro-sociala um reflexo do macro-social. Nem uma via nem outra me parecemavanar em direo a uma melhor comnpreenso da articulao do microe do macro, essa melhor compreenso que E.S.C.O.L tenta construir em

    sua pesquisa sobre a relao social com o saber ("le rapport social ausavoir").

    G. Splinder parece consciente do problema no momento em que escreveque "as crianas de todas as idades elaboram suas prprias construesda realidade. Sua conduta no apenas uma forma juvenil das normas oudos modelos dos adultos". A prpria K. Wilcox convida a uma superaode suas posies tericas quando elogia, em John Ogbu, uma problemticamais "ecolgica" que "estrutural-funcionalista", bem como uma concepodinmica e histrica do processo social e das interaes interpessoais.

    As teses de John Ogbu, antroplogo de origem nigeriana que trabalha nosEE.UU. - portanto, dentro de uma sociedade para ele "indgena" - so

    efetivamente interessantes. Ele as desenvolve em The next generation:an ethnography of education in an urban neighborhood (New York:Academic Press, 1974) e em Minority education and caste: the americansystem in cross-cultural perspective. (New York: Academis Press,1978).

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    Esses livros mereciam, por si ss, uma resenha. Eu sublinharei, aqui,simplesmente as idias essenciais.

    A gente, explica Ogbu, quer entender o fracasso escolar, das crianasamericanas pertencentes s minorias tnicas, apontando suas deficincias("handicaps") socio-culturais ("cultural deprivation") e, de uma maneiramais geral, culpando seu "meio" ("Backgroud/environnement"). Os estudosetnogrficos de Ogbu, num bairro densamente povoado de negros e de

    americanos-mexicanos (na California) conduzem a concluses diferentes.Contrariamente ao que afirmam as teses sobre as deficincias ("handicaps"), os pais e as crianas das minorias tnicas atribuem ("attachent")uma grande importncia escola, enquanto permite ter acesso a um bomofcio ("mtier") e a uma melhor situao social. Alm disso, as crianasdessas minorias, quando se esforam ("travaillent dur"), so bem sucedidasna escola. O problema fundamental no , pois, saber por que as crinasno so bem sucedidas na escola (manifestando suas "deficincias"), mas"por que elas no trabalham suficientemente na escola uma vez que, elasmesmas e seus pais, atribuem grande importncia ao xito escolar?". Odeslocamento da problemtica, pode-se ver, radical!

    Ogbu responde a essa questo: essas crianas, pertencentes a minoriashistoricamente subordinadas (o que no o caso dos asiticos), tambmaprenderam, atravs de seus pais, que possvel ter xito na escola semque, todavia, numa sociedade racista, se obtenha a recompensa sob

    forma de um bom trabalho e de uma boa situao social. A falta detrabalho e de esprito de competio das crianas das minorias tnicas ,assim, uma "adaptao s chances limitadas de se beneficiarem de suaeducao". Essa adaptao ao fracasso escolar ("shoolfailure adaptation") reforada pelo comportamento da classe mdia e dos docentes, queinterpretam a vida das clases populares em termos de "deficincias",impem a essas classes uma relao de patres a clientes ("de patrons aclients"), e, dessa forma, lhes negam toda autonomia e todo discurso

    legtimo no campo educacional. O fracasso das crinaas das minoriastnicas "no , portanto, um fenmeno individual, mas uma adaptaocoletiva, que se transmite de uma gerao a outra".

    O fracasso escolar uma adaptao coletiva a uma relao social desubordinao no campo educativo, dentro do mercado de trabalho e nasociedade como um todo. Essa adaptao coletiva, mas se realizaatravs de condutas individuais (e ela no , portanto, fatal para o indivduo,mesmo se a soluo coletiva do problema supe uma reestruturao dasrelaes sociais -(B.C.)). Essas teses de Ogbu so, para ns, uma pista aseguir, pois que a E.S.C.O.L trabalha sobre a relao social com osaber em uma zona de educao prioritria.

    Traduo do Professor Rogrio Andrade Crdova - UNB/FE/PAD e doutorando em Educao (Filosofia e Histria) na PUC/SP.

    Em Aberto, Braslia, ano 11, n.53, jan./mar. 1992