Eu, Fernando Pessoa em quadrinhos

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– em quadrinhos – Susana Ventura e Guazzelli

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Nesta narrativa em quadrinhos Fernando Pessoa é visto a partir de sua obra e de uma carta em que ele explica ao amigo Adolfo Casais Monteiro o nascimento e vida de seus principais heterônimos – Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos – e do semi-heterônimo Bernardo Soares. O roteiro construído por Susana Ventura com base em textos históricos (cartas, obituários dos jornais de época) recebeu a leitura visual vertiginosa e genial de Guazzelli, em sua segunda incursão pela obra pessoana. O entusiasmo do quadrinista pela obra do poeta português gerou um curta-metragem de animação em formato de poema visual, o qual retrata o dia em que Fernando Pessoa virou imortal. Para isso Guazzelli também invocou seu “heterônimo”, que trabalha com animação há mais de vinte e cinco anos. A animação pode ser ativada por meio do QR Code impresso na contracapa do livro.

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ELOAR GUAZZELLI é ilustrador, quadrinista, diretor de arte para animação e wap designer. Mestre em Comunicação pela ECA-USP, atua como quadrinista desde a década de 1990 e tem trabalhos publi-cados em revistas da Argentina (Fierro e Lápiz Japonés) e da Espanha (Ojo Clínico). No Brasil, publicou Túnel de letras, O rei de pedra, O primeiro dia, entre outros livros. Foi premiado no Yomiuri International Cartoon Contest (1991) e no Salão Internacional de Piracicaba em 1991, 1992 e 1994. Neste último ano, recebeu também o troféu HQ Mix na categoria Desenhista Revelação. Além desses, recebeu inúmeros outros prêmios em festivais de cinema, salões de humor e bienais de quadrinhos dentro e fora do Brasil, e participou de exposições em diversas partes do mundo.

SUSANA VENTURA é doutora em Estudos Compa-rados de Literaturas de Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo. Como professora e pesquisadora das literaturas de língua portugue-sa, tem trabalhado em diferentes universidades brasileiras, portuguesas e francesas, ministran-do cursos e palestras. Além disso, atua ao lado de atores, músicos, grafiteiros, artistas plásticos e videoartistas em atividades que buscam levar a lite ratura a um grande número de pessoas. Pesquisadora ligada do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Universidade de Lisboa (CLEPUL) e do Centro de Pesquisas so-bre os Mundos Ibéricos Contemporâneos (CRIMIC), da Sorbonne (Paris IV). Autora de Convite à nave-gação: uma conversa sobre literatura portugue-sa e Viagem pela Literatura Portuguesa: leituras sugeridas (ambos pela Editora Peirópolis).

Neste álbum da coleção Clássicos em HQ, Fernan-do Pessoa, considerado uma das mais importan-tes expressões da língua e da literatura portugue-sa depois de Camões, é apresentado a partir de sua obra e de documentos, como a “Carta da gê-nese dos heterônimos”, escrita em 1935, alguns meses antes de sua morte, na qual explica ao ami-go Adolfo Casais Monteiro o nascimento e vida de seus principais heterônimos: Alberto Caeiro, Ricar-do Reis e Álvaro de Campos, e do semi-heterônimo Bernardo Soares.

Em dezembro daquele mesmo ano, o ponto de partida dessa narrativa, o poeta faz uma peque-na mala de viagem, levando consigo Sonetos de Bocage e umas poucas roupas, para ir ao Hospital São Luís dos Franceses, onde viria a falecer. Na imaginação da roteirista e no traço do quadrinis-ta, o clima lisboeta frio e chuvoso dessa cena foi pontuado pelo poema “Chuva oblíqua”, essencial na obra pessoana.

O poeta chega ao hospital e uma volta no tempo nos conduz ao mês de janeiro novamente, quando escreve ao amigo a carta sobre si mesmo e sua obra. A partir daí, os heterônimos aparecem e se apresentam, tanto nos poemas selecionados por Susana Ventura como no traço às vezes rascu-nhado, às vezes detalhadamente trabalhado de Eloar Guazzelli. Para completar a viagem, a notícia póstuma escrita pelo poeta Luís de Montalvor e publicada em Portugal no tradicional Diário de No-tícias, no dia seguinte ao da morte do poeta, lem-bra o leitor que “Se Fernando Pessoa morreu, se a matéria abandonou o corpo, o seu espírito não abandonará nunca o coração e o cérebro dos que o admiravam”.

O roteiro de Susana guia o leitor pelas imagens labirínticas do desenhista Guazzelli, que demons-tra que também ele sabe se perder e se encontrar nas multifacetadas personalidades artísticas de Pessoa para reconstruir mundos com múltiplos estilos e técnicas. Diferente uma visão fragmen-tada da biografia e da obra do poeta, o leitor terá aqui uma viagem completa e criativa, bem como elementos essenciais para compreender um dos maiores autores do século XX.

EU, FERNAN

DO PESSOA EM

QUADRINH

OSSUSAN

A VENTURA e GUAZZELLI

– em quadrinhos –

Susana Venturae

Guazzelli

Mesmo com mais de 120 anos de idade, Fernando Pessoa é um ícone pop. A curiosidade sobre a heteronímia ultrapassa fronteiras e vence as barreiras do tempo. Talvez multiplicar ‑se em muitos seja mesmo a única maneira de conseguirmos nos encontrar com alguma essência.Teria Fernando feito isso inadvertidamente, como conta na célebre carta enviada ao amigo Adolfo Casais Monteiro? Nunca saberemos a resposta exata, e talvez isso não seja mesmo o mais importante. O que nos resta (e não é pouco!) é encontrar Fernando Pessoa nos belos desenhos de Guazzelli, guiados pelo inteligente roteiro de Susana Ventura. Deixemos ‑nos conduzir então por mãos firmes ao mundo maravilhoso da arte pessoana.

Maurício Soares Filho

EU, FERNANDO PESSOA, POR GUAZZELLI

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Susana Venturae

Guazzelli

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Pessoa de todos e de cada um,sem tempo e sem idade

Levar aos leitores um livro que tem Fernando Pessoa e a sua obra de mil rostos como personagens centrais é uma forma de celebrar a magia da palavra, o prodígio e o mistério da criação e, naturalmente, a própria poesia.

Todos os grandes poetas portugueses sonharam, de uma forma ou de outra, ser super Camões, reinventado a épica e a lírica de uma existência luminosa que continua a resumir, na grandeza e na inquietação, o essencial da “portugalidade” e do destino dos portugueses no mundo.

Fernando Antônio Nogueira Pessoa, nascido no dia 13 de junho – Dia de Santo Antônio –, de 1888, morreu em 1935 praticamente inédito e desconhecido, mas com uma arca imensa onde foi guardando milhares de originais que, à medida que foram alcançando a luz do dia, o confirmaram como um dos mais geniais criadores poéticos de toda a tradição ocidental, para usar uma expressão de Harold Bloom.

Eterno viajante imóvel, Pessoa viajou sobretudo à proa das palavras, com as quais conseguiu construir um teatro inteiro de personagens, vozes e emoções, que trans‑cende, no fulgor e na grandiosidade, qualquer existência comum. Fernando Pessoa foi imenso e tornou ‑se eterno, e quanto mais o lemos e redescobrimos, mais nos descobrimos a nós próprios e às nossas inquietações, sonhos e mistérios. Com ele e por ele tornamo ‑nos senhores do nosso próprio desassossego, que tanto pode ser um livro como um périplo ulissiano em busca de um sentido para a vida.

Este Eu, Fernando Pessoa em quadrinhos, com roteiro de Susana Ventura e desenhos de Guazzelli, é uma conseguida abordagem do universo pessoano, com opção por uma estética que o coloca ao alcance de um vasto público, com natural destaque para o mais jovem, que se sente mais envolvido quando o suporte comunicacional é a imagem. Num país como o Brasil, onde a paixão pela obra do poeta dos heterô‑nimos não tem limite nem conhece esmorecimento, esta é mais uma aposta certa de Renata Borges e da Peirópolis, no quadro de uma estratégia editorial moderna, abrangente e capaz de atrair públicos diversificados, fazendo também a ponte com a boa literatura que se produz em Portugal.

A atualidade da obra do autor de O livro do desassossego é cada vez mais tocante e evidente, porque tem a universalidade e a intemporalidade que a fazem ser de todos nós sem deixar de ser de cada um, tal como o patrimônio dos heterônimos, eternamente de Pessoa e do mundo.

JOSÉ JORGE LETRIA

Abril de 2013

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Novembro de 1935, Rua Coelho da Rocha, 16 – 1º Direito, Campo de Ourique, Lisboa.

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Atravessa esta paisagem o meu sonho dum porto infinito

Que largam do cais arrastando nas águas por sombra

E a cor das flores é transparente de as velas de grandes navios

“Chuva oblíqua” – Fernando Pessoa

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Os vultos ao sol daquelas árvores antigas...

O porto que sonho é sombrio e pálido

E esta paisagem é cheia de sol deste lado...

Mas no meu espírito o sol deste dia é porto sombrio

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E os navios que saem do porto são estas árvores ao sol...

Liberto em duplo, abandonei -me da paisagem abaixo...

O vulto do cais é a estrada nítida e calma

Que se levanta e se ergue como um muro, E os navios passam por dentro dos troncos das árvores

Com uma horizontalidade vertical,

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E deixam cair amarras na água

pelas folhas uma a uma dentro...

Não sei quem me sonho...

Esta paisagem toda, renque de árvore, estrada a arder em aquele porto,

Súbito toda a água do mar do porto é transparente e vejo no fundo, como uma estampa enormeque lá estivesse desdobrada,

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E a sombra duma nau

Entre o meu sonho do porto e

o meu ver esta paisagem

E chega ao pé de mim, e entra por mim dentro,

mais antiga que o porto que passa

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