EUTANÁSIA: MORTE DIGNA OU AUXÍLIO AO SUICÍDIO? · RESUMO: DE OLIVEIRA, Lorena Rodrigues....

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LORENA RODRIGUES DE OLIVEIRA EUTANÁSIA: MORTE DIGNA OU AUXÍLIO AO SUICÍDIO? GOVERNADOR VALADARES SETEMBRO/2009

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LORENA RODRIGUES DE OLIVEIRA

EUTANÁSIA: MORTE DIGNA OU AUXÍLIO AO SUICÍDIO?

GOVERNADOR VALADARES SETEMBRO/2009

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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE - UNIVALE FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS – FADE - CURSO DE DIREITO

EUTANÁSIA: MORTE DIGNA OU AUXILIO AO SUICÍDIO? Monografia apresentada ao Curso de Direito da UNIVALE como

requisito indispensável para a graduação em Direito.

Aprovada ( )

Aprovada com louvor ( )

Aprovada com restrições ( )

Reprovada ( )

Professor: _________________________________________________

Vinicius Sampaio da Costa - Orientador

Professor: _________________________________________________

Professor: _________________________________________________

Governador Valadares Setembro de 2009.

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Agradecimento:

Agradeço primeiramente a Deus pela sabedoria, pela paciência, por ter feito dos meus

problemas e obstáculos o mais belo caminho a minha vitória.

Agradeço a minha mãe, pela força, por ter lutado junto comigo esses 5 anos, agradeço

a meu pai, que sempre esteve ao meu lado e me incentivou cada dia, aos meus irmãos Julio

Cesar e Aroldo, e a minha Irmã Juliana mesmo estando longe.

Agradeço aos meus amigos, que não citarei aqui mas que de um modo especial e de

coração quero deixar o meu muito obrigada pela força, agradeço também aos meus desafetos

que de uma certa forma me incentivaram a ser a cada melhor, lutar pelos meus objetivos.

Agradeço a todos os meus grandes professores pelo exemplo, pela dedicação a minha

aprendizagem. Agradeço ao meu querido orientador Dr. Vinicius pela dedicação, pela atenção

e pela paciência, muito obrigada, quando eu crescer quero ser como você professor.

Em especial quero agradecer aos meus grandes e eternos amigos que fiz na faculdade e

que sempre estarão presentes em meu coração Marcelo, Marcos Guilherme, Marco Antônio,

Emerson, Ruberval, Alana, Anderson Bragatto, aos colegas da sala, meus colegas de trabalho,

minha grande e sincera amiga Andréia Wetter e família, a família Marçal, minha amiga

querida Michele, obrigada por me suportar, agradeço minha miguxinha Camila pela força, e

não poderia deixar de lembrar do meu grande amigo Celso Augusto que fez parte do inicio

dessa caminhada e mesmo abandonando o barco sempre me deu força pra continuar.

A todos que diretamente ou indiretamente fizeram parte dessa minha caminhada, das

minhas lagrimas, das minhas noites de sono em claro, das minhas idas e vindas... O meu

muito obrigada.

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É errado pensar que a vida é um jogo e que, se algo correr não exatamente de acordo

com as nossas expectativas, podemos jogá-lo de novo desde o início, com novas

oportunidades de êxito. Seria uma tolice considerar que temos direito a um caminho de

triunfos, sem sofrimentos nem desilusões, sem coragem nem heroísmo. Porque isso não

sucede a ninguém e não é deste mundo. Aqui é preciso escolher e, depois, seguir em frente até

ao fim. Por vezes com os ombros pesados de cansaço, de dor, de desilusão, de fracasso...

(Paulo Geraldo)

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RESUMO: DE OLIVEIRA, Lorena Rodrigues. Eutanásia – morte digna ou auxilio ao suicídio? 2009. Monografia (Graduação em Direito, Ciências Administrativas e Econômicas da UNIVALE, Governador Valadares, MG). Visa questionar qual o conceito jurídico mais adequado para a Eutanásia, bem como as opiniões diversas no que diz respeito ao tema. Serão desenvolvidas nesta monografia, duas concepções, quais sejam, a eutanásia como morte digna, e como auxilio ao suicídio. A eutanásia seria o ato de provocar a morte por compaixão em um doente incurável e terminal, pondo fim aos seus sofrimentos. Não se pode ocultar que a eutanásia é uma forma de liquidação da vida humana. Pelo exposto, é clara a importância do estudo da eutanásia para a sociedade em geral, tendo em vista a força com que a mesma atinge as concepções existentes em uma sociedade. Palavra – chave Eutanásia; morte; digna; auxilio; suicídio.

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ABSTRAT Visa question what the legal concept more suitable for euthanasia as well as the different opinions regarding the issue. Will be developed in this monograph, two concepts, namely, euthanasia as a dignified death, and as an aid to suicide. Euthanasia would be the act of causing death by compassion in a patient incurable and terminal, putting an end to their suffering. You can not hide the fact that euthanasia is a form of liquidation of human life. For these reasons, it is clearly important in the study of euthanasia for society in general, in view of the strength with which it reaches the existing designs in a society.

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SUMÁRIO. EUTANÁSIA: MORTE DIGNA OU AUXÍLIO AO SUÍCIDIO? 1 - INTRODUÇÃO 2 – HISTÓRICO DA EUTANASIA 2.1. A origem da Eutanásia.................................................................................................. 11 2.2. A prática da Eutanásia na Idade Antiga........................................................................ 13 2.3. A prática da Eutanásia na Idade Media......................................................................... 15 2.4. A prática da Eutanásia na Idade Media e contemporânea.............................................. 16 3 – EUTANÁSIA NO BRASIL ......................................................................................... 17 4 – CLASSES DA EUTANÁSIA....................................................................................... 18 5 – MODALIDADES.......................................................................................................... 20 5.1. Distanásia....................................................................................................................... 20 5.2. Ortotanásia..................................................................................................................... 21 6 – EUTANÁSIA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA.................................................... 23 6.1. Eutanásia no Âmbito Penal............................................................................................ 26 6.2. Eutanásia no Âmbito Civil............................................................................................. 28 7 – A EUTANÁSIA E O DIREITOCOMPARADO........................................................ 29 8 – EUTANÁSIA: MORTE DIGNA OU SUICÍDIO ASSISTIDO?.............................. 31 9- EUTANÁSIA: PRÓS E CONTRA............................................................................... 35 10 – CONCLUSÃO............................................................................................................. 42 11 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 43

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INTRODUÇÃO:

A eutanásia em seu conceito nos traz o significado de que é o ato de provocar a morte,

por compaixão, em um doente incurável e/ou em estado terminal, pondo fim ao sofrimento.

A eutanásia, distante de ser um acontecimento próprio da sociedade, apenas ganha

novo espaço, frente a problemas ocasionados pelas ações provindas do conhecimento do

homem ocorridas no século XX, que na busca de descobertas, desprendeu-se de alguns

aspectos fundamentais para a evolução de uma sociedade mais humanizada.

A eutanásia volta à tona nas discussões ocorridas em todas as esferas da sociedade

volta-se a questionar princípios tais como Ética e Moral.

Serão envolvidas duas concepções, que são elas: a eutanásia como morte digna ou, na

verdade, é um auxilio ao suicídio.

Em se tratando da disponibilidade da vida humana, o estudo da eutanásia cria

interesses a todas as camadas e classes sociais.

Encontra-se na Eutanásia, posições conflitantes quanto à sua pratica. Alegam o

contrários a tal pratica princípios religiosos, entendendo que, sendo a vida um dom divino não

tendo o homem o direito de subtraí-la de alguém.

Aparecem também, aqueles que apontam para a questão da sucessão de bens e

direitos, entendendo que tal pratica pode ser levada a termo apenas em beneficio do

profissional que a possibilita e ou dos herdeiros, desprezando-se por completo a vontade e as

crenças do enfermo.1

A eutanásia vem sendo aplicada há anos, com diferentes formas de execução. O

estudo, além de questionar e discutir sobre o significado do tema, será exposto também o

Histórico da Eutanásia; a Eutanásia no Brasil e quais são as modalidades normalmente usadas.

Em todo mundo a eutanásia é um assunto muito discutido, para a para que ela tenha seus

limites delineados e definidos a fim de ser ou não admitida como prática legal de suavização

de um sofrimento que não terá fim.

A eutanásia distante de ser um acontecimento próprio da nossa sociedade, apenas

ganha novo espaço, frente a problemas ocasionados pelas ações provindas do conhecimento

do homem ocorridas no século XX, que na busca de descobertas, desprendeu-se de alguns

aspectos fundamentais para a evolução de uma sociedade mais humanizada.

A eutanásia volta à tona nas discussões ocorridas em todas as esferas da sociedade,

volta-se a questionar princípios tais como ética e moral.

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Nota-se hoje que Eutanásia deixa de ser vista apenas como a simples possibilidade de

ocasionar a morte a alguém que está sofrendo em função de determinada moléstia. Entendem

os que são a favor da eutanásia que sua utilização não visa exterminar pessoas, mas, sim,

amenizar sofrimentos inevitáveis e dolorosos.

O estudo tem como escopo questionar qual o conceito jurídico mais adequado para a

eutanásia. Tendo em vista sua complexidade, a eutanásia não encontra ainda previsão legal no

Brasil.

Diante disso, abre-se caminho para questionamentos sobre quais as posturas a serem

adotadas nesse caso. No ordenamento jurídico pátrio, a prática da eutanásia não está elencada,

não de forma explícita e objetiva, no Código Penal.

Entretanto, aplica-se a tipificação prevista no art. 121, ou seja, homicídio, simples ou

qualificada, sendo considerado crime a sua prática em qualquer hipótese.

Dependendo as circunstâncias, a conduta do agente pode configurar o crime de

participação em suicídio (art. 122 do Código Penal) (GUERRA FILHO, 2005). Nosso Código

não aceita nem discrimina a Eutanásia, mas não vai ao rigor de não lhe conceder o privilégio

do relevante valor moral.

Comumente, as pessoas ao ouvirem falar em Eutanásia, exemplo quem é o homicídio

privilegiado por motivo de relevante valor moral, logo, a associam a doença e a enfermidade

de desfecho fatal.

No entanto, para os efeitos penais concernentes à concessão do privilégio, cumpre

realçar-se que nem sempre há de estar a Eutanásia indissoluvelmente vinculada à doença de

desate letal.

Do mesmo modo que na Eutanásia, o auxiliador viola a lei do respeito á vida humana

e infringe interesses da vida comunitária, de natureza moral, religiosa e demográfica.

O direito vê no suicídio um fato imoral e socialmente danoso, o qual haveria de ser

penalmente indiferente, quando a causá-lo, concorre junto com a atividade do sujeito

principal, uma outra força individual estranha.2

Este concurso de energia, destinado a produzir um dano moral e social, como o

suicídio, constitui exatamente aquela relação entre pessoas que determina a intervenção

preventivo-repressiva do direito contra o terceiro estranho, do qual exclusivamente provém o

elemento que faz sair o fato individual da esfera íntima do suicida”. (NORONHA, 1992, p.

20).3

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Enfim, o que na verdade ocorre é que há um medo coletivo da morte, ou como se vai

morrer, associado à idéia da dor que comumente antecede os últimos instantes da vida, todos

consideram preferível a morte súbita, imprevista, uma morte sem dor, sem sofrimento.

__________________________________________________________________________ 1 http: jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1861acessado no dia 04/04/2009 2 HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Vol. V, p. 128-131. 3 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal. São Paulo. Editora Saraiva, 1992 p 20

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2. HISTÓRICO DA EUTANÁSIA.

2.1 A origem da Eutanásia

Muitos autores, ao tratar do tema, citam os usos dos povos antigos, cuja sensibilidade

ética tanto se distanciava da nossa.

Em Esparta, por exemplo, era prática comum, e até mesmo obrigatória, a precipitação

de recém-nascidos malconformados do alto do monte Talgeto. Os birmaneses, por sua vez,

enterravam vivos os idosos e os enfermos graves. Populações rurais sul-americanas,

forçadamente nômades por fatores ambientais, sacrificavam anciãs e enfermas, para não os

abandonar ao ataque de animais selvagens.

Se nos reportarmos a povos modernos - contemporâneos, por exemplo - basta que nos

lembremos da Holanda, citada na nossa apresentação, ou mesmo do Japão.

Sobre o assunto dispõe Deivid Junior Diniz:

[...] A última vitória da Medicina – frente a sua impotência científica – quando é impossível triunfar sobre o mal incurável, será adormecer o agonizante na tranqüila sonolência medicamentosa que leva ao letargo e à morte total, suavemente. Será uma bem triste vitória, em verdade, porém, por seu conteúdo de altruísmo, sua profunda generosidade humana, chega a adquirir o valor das vitórias espirituais de uma religião (Ariosto Licurzi) [...].4

A palavra eutanásia (em oposição à ortotanásia – que significa a morte na hora certa

– e à distanásia – que significa a procrastinação da morte) deriva da expressão grega

euthanatos, onde eu significa bom (boa) e thanatos, morte. Numa definição puramente

etimológica, é a morte boa, a morte calma, a morte piedosa e humanitária. 5

O termo foi proposto por Francis Bacon, filósofo, político e ensaísta inglês, em 1623,

em sua obra Historia vitae et mortis, como sendo o "tratamento adequado às doenças

incuráveis". Bacon defendia a prática da eutanásia pelos médicos, quando estes não mais

dispusessem de meios para curar um enfermo atormentado. Ele acreditava que "a função do

médico é de curar e de aliviar as penas e as dores, não somente quando esse alívio possa

conduzir à cura, mas também quando possa trazer uma morte calma e fácil". Em sábias

palavras, José Ildefonso Bizatto insta que "o silêncio da morte se cala no papel, mas voa no

infinito o reconhecimento da vida que pulsa da alma humana".Historicamente, a eutanásia

vem sendo amplamente usada ao longo dos tempos. Segundo constam nos registros históricos,

esta prática era utilizada por povos como os gregos, romanos, germanos, sul-americanos,

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indianos, celtas, eslovenos, entre outros. No Brasil, algumas tribos deixavam à morte seus

idosos, principalmente aqueles que já não mais participavam das festas, caças, etc.6

O primeiro caso de eutanásia conhecido está relatado na Bíblia no Segundo

Livro dos Reis, cap. I, parágrafos 9-10, quando Saul, gravemente ferido em guerra, pede a

morte a um amacelita. O próprio Freud, pai da psicanálise, escolheu o momento de sua morte,

injetando veneno nas veias. Vários países tentaram a legalização da eutanásia. Porém, apenas

na Holanda o tema foi devidamente recepcionado pelo sistema legal, sendo admitida se

perpetrada por médicos. Similarmente ocorre no Estado americano de Oregon. Em vários

países a prática sofre redução de pena, e em outros, como na França e na Noruega, ocorre

isenção de pena. No Brasil, o Código Penal que data de 1940, incrimina a prática da

eutanásia, tipificando-a em seu artigo 122 (instigação, induzimento ou auxílio ao suicídio) ou,

ainda, em seu artigo 121, parágrafo 1° (homicídio privilegiado). 7

Não há dúvidas de que a vida é um bem jurídico por excelência, que

curiosamente só se fez constar expressamente, no Brasil, na Constituição Federal de 1988.

Todavia, o conceito de vida não pode restringir-se meramente à mecanicidade dos

movimentos respiratórios e cardíacos. Ao contrário, devemos entendê-la atrelada a valores de

cunho eminentemente subjetivos como liberdade, qualidade e dignidade. 8

______________________________________________________________________ 4 DINIZ, Junior Deivid, revista Consulex – nº 155/2008, acessado no dia 02/11/2008 5 ALVARENGA, Dílio Procópio Drummond de. Artigo do site www.jus.com.br acessado no dia 10/04/2009 6 BIZATTO, José Ildefonso. Eutanásia e Responsabilidade Médica, Leme, Ed. de Direito, 2000. 7 FRANÇA, Genival Veloso de. Eutanásia. In: Revista Residência Médica, Vol. 13, nº 4, São Paulo, Junho de 1984 8 NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal. Vol. II. São Paulo: Editora Saraiva, 1994

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2.2 A PRÁTICA DA EUTANÁSIA NA IDADE ANTIGA.

A eutanásia não é a prática recente, nem tampouco aparece com a Idade

Moderna, mas podemos buscá-la no começo da civilização, principalmente na Grécia e Roma.

A eutanásia que os gregos conheceram, praticaram e da qual se tem provas históricas é

a que se chama falsa eutanásia, ou melhor, dizendo, a eutanásia de fundamento e finalidade

puramente eugênica.

Em Roma, nos termos de Hipócrates, a eutanásia já se fazia presente, os doentes

cansados de viver procuravam os médicos em busca de um alivio através da morte; os

cidadãos disformes ou monstruosos deveriam ser eliminados, pois o próprio Estado tinha

direito de não permitir a presença de tais pessoas na sociedade.

Em Atenas, 400 a.C, Platão pregava no terceiro livro de sua republica o sacrifício de

velhos, fracos e inválidos, sob o argumento de interesse do fortalecimento do bem-estar e da

economia coletiva.

Ainda entre os povos antigos, tem-se noticia de que os germanos matavam os

enfermos incuráveis, estes, na Birmânia, eram enterrados vivos juntamente com os velhos.

Não se pode esquecer que os antigos praticavam a eutanásia contra crianças aleijadas ou

débeis. As mesmas eram imoladas em nome de um programa de salvação publica de uma

sociedade sem comércio, sem letras e sem artes. A finalidade era a produção de homens

robustos e aptos para a guerra.9

A Bíblia Sagrada nos trás um caso considerado por muita uma pratica de

eutanásia, qual seja a morte do Rei Saul, de Israel; ferido na batalha e a fim de não cair

prisioneiro Saul lançará- se sobre a sua espada e já ferido, pedira a um amalecita que lhe

tirasse a vida. 10

No referente episodio o rei Davi releva a sua repulsa à eutanásia, n instante em

que sentenciou de morte o mesmo amalecita que por compaixão tirou a vida do Rei Saul a

pedido do mesmo. É imperioso lembrar que o Cristo foi submetido aos suplícios da

crucificação. Segundo Cícero, citado por Paulo Lucio Nogueira, deram-lhe de beber vinagre e

fel ``o vinho da morte , mas ele não tomou. Apesar da denominação vinho da morte, há quem

afirme que o gesto dos guardas judeus de darem a Jesus uma esponja umedecida de tal

mistura, antes de constituir ato de zombaria e crueldade, teria sido uma maneira piedosa de

amenizar seu sofrimento.

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Por fim, não se pode esquecer-se de dizer que a eutanásia se fazia presente na

vida dos povos antigos, no entanto, tinha uma denotação bem diferente da dos dias atuais, mas

a polêmica persiste.

______________________________________________________________________ 9 NOGUEIRA, Paulo Lúcio, Em defesa da vida, Editora Saraiva, 1995, p 43 10 SAGRADA, Bíblia, trad. De João Ferreira de Almeida. São Paulo, p 362-363

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2.3 A PRÁTICA DA EUTANÁSIA NA IDADE MÉDIA. Neste período da historia a eutanásia era praticada durante as guerras, o

guerreiros usavam entre os artefatos que compunham sua armadura, um punhal bastante

afiado, que tinha a forma de uma folha de louro, com o mesmo, os mortalmente feridos eram

eliminados, e também foi durante a idade media que ocorreram inúmeras epidemias e pestes,

onde as doenças alastravam-se com mais facilidade e rapidez, devido ao grande estado de

miséria em que se encontrava a população durante a decadência do feudalismo. 11

___________________________________________________________________________ 11 BITTENCOURT, Lameira. Eutanásia (Dissertação para Concurso). Belém: 1939.

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2.4 A PRÁTICA DA EUTANÁSIA NA IDADE CONTEMPORÂNEA E NA IDADE

MODERNA.

A discussão doutrinária a respeito da eutanásia, ocorrem desde o século

passado, e nos tempos de hoje não há nenhum tipo de diferença, pois há diversos livros, e

artigos envolvendo tal discussão, pessoas dos mais diversos campos da ciência, surgindo

assim , opiniões favoráveis e contrarias a pratica de tal ato.

Em relação a sua pratica e finalidade, ocorreram progressos com o passar do

tempo. Entretanto, as opiniões contrarias estão presente de forma intensa, apesar de sua

atinguidade a eutanásia não é um assunto pacifico na sociedade moderna.

Nos tempos modernos a Eutanásia, tem tido uma repercussão mundial, onde

vem crescendo em todas a áreas, ocorrendo assim, pois, todos estão sujeitos a doenças

incuráveis não importando assim, costume, etnia ou cultura.

De acordo com o filosofo Hans Jonas ´´ é preciso, antes de tudo, proteger a

vulnerabilidade da humanidade e ao dever de viver, acrescer e direito de morrer.´´ nos tempos

modernos a Eutanásia tem tido uma repercussão mundial, em todos os aspectos em se tratando

da expansão do assunto e sua pratica.12

___________________________________________________________________________ 12 BARROS, Flávio Augusto M. - Crimes contra a Pessoa. Saraiva, Rio de Janeiro, 1997.

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3- EUTANÁSIA NO BRASIL

De acordo com o que nos diz o historiador Von Martins segundo uma das

citações de Lameira Bittencourt, aqui no Brasil algumas tribos deixavam à morte seus idosos,

principalmente aqueles que já não mais participavam das festas, caças, etc. acreditam esses

indígenas que viver era poder participar de festas, caças, pescas, e os que eram privados de

tais ações não teriam mais nenhum estimulo para a vida.

Sendo assim, a morte viria como uma benção, uma vez que se a vida não tivesse

nenhuma daquelas atividades ela não teria nenhum significado. Na época colonial do Brasil, a

tuberculose foi motivo da pratica da eutanásia, pois naquela época não havia cura para tal

moléstia e todas as pessoas neste estado imploravam pela morte, pois a dor que sentiam era

insuportável e não havia cura para tal doença. Nos dias que vivemos ainda há casos de

eutanásia, mas não são divulgados; nossa lei penal vale-se da eutanásia para fins de atenuação

de pena, em caso concreto, crime de homicídio privilegiado, há que se dizer que médicos ao

ver a agonia de pacientes, amigos, ou parentes são levados a praticar tal ato, as doenças que

mais levam a pratica da eutanásia de acordo com uma pesquisa publicada na revista periódica

Residência Médica´´ são o câncer, a AIDS e também a raiva. Considerando que as doenças as

trazem a morte imediata; fazendo com que o paciente passe por um longo período de dor e

sofrimento podendo chegar de 6 meses a 2 anos.14

___________________________________________________________________________ 14 Silva, Sônia Maria Teixeira da. Artigo do site www. jus.com.br acessado no dia 22/03/2009

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4 - CLASSES DA EUTÁNASIA

É tarefa árdua estabelecer uma classificação para a eutanásia, capaz de fixar

terminologia e permitir tratamento sistemático. Os que abraçam essas formas justificam-na

como meio de reduzir a pesada carga, para a sociedade, daqueles pacientes com desarranjos

físicos e psíquicos graves. Pregam, na verdade, a eliminação simples, pura e cruel dos

psicopatas, monstros, alcoólatras, criminosos pervertidos e inválidos e acrescentam, como

argumento, o impedimento da propagação de tais problemas. 15

A literatura a respeito propõe - e tem sido aceita pelos estudiosos - classificação de

acordo com a iniciativa, os fins e os métodos. Assim, temos as seguintes modalidades:

Espontânea ou Libertadora: ocorre quando o enfermo incurável provoca a morte por

próprios meios;

Ativa: ocorre quando consiste no ato deliberado de provocar a morte sem sofrimento do

paciente, por fins misericordiosos;

Passiva: ocorre quando a morte do paciente ocorre, dentro de uma situação de terminalidade,

ou porque não se inicia uma ação medica ou pela interrupção de uma medida extraordinária;

Voluntária: ocorre quando a morte é provocada atendendo a vontade do paciente;

Involuntária: ocorre quando a morte é provocada contra a vontade do paciente;

Não voluntária: caracterizada pela inexistência de manifestação da posição do paciente em

relação a ela;

De Duplo Efeito: acontece quando a morte é acelerada como uma conseqüência indireta das

ações médicas, que são executadas visando o alivio do sofrimento de um paciente terminal;

Eugênica: é a eliminação indolor dos doentes indesejáveis, dos inválidos e velhos, no escopo

de aliviar a sociedade do peso de pessoas economicamente inúteis;

Criminal: é a eliminação de pessoas socialmente perigosas;

Experimental: é a eliminação de determinados indivíduos, com o fim experimental para o

progresso da ciência;

Solidarística: é a eliminação indolor de seres humanos no escopo de salvar vida de outrem;

Teológica: é a morte em estado de graça;

Legal: regulamentada ou consentida pela lei;

Suicídio – assistido: auxilio de quem já não consegue realizar sozinho a sua intenção de

morrer.

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Homicídio: resulta da distinção entre aquela praticada por médico e a praticada por parente ou amigo.16

___________________________________________________________________________ 15 Adaptado de Vários Autores, “Eutanásia”, Ed. São Paulo, Lisboa, 1994(Retirado de Fatos da Vida, nº 13) 16 SÁ, Maria de Fátima Freire de. Biodireito e direito ao próprio corpo: doação de órgãos, incluindo o estudo da Lei n. 9.434/97. Belo Horizonte: Del Rey, 2000

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5 - MODALIDADES: 5.1 DISTANÁSIA: A distanásia (do grego “dis”, mal, algo mal feito, e “thánatos”, morte) é etimologicamente o contrário da eutanásia. 17

Consiste em atrasar o mais possível o momento da morte usando todos os meios, proporcionados ou não, ainda que não haja esperança alguma de cura, e ainda que isso signifique infligir ao moribundo sofrimentos adicionais e que, obviamente, não conseguirão afastar a inevitável morte, mas apenas atrasá-la umas horas ou uns dias em condições deploráveis para o enfermo.18 A distanásia também é chamada “intensificação terapêutica”, ainda que seja mais correto denominá-la de “obstinação terapêutica”. Referindo-nos sempre ao doente terminal, perante a eminência de uma morte inevitável, médicos e doentes devem saber que é lícito conformarem-se com os meios normais que a medicina pode oferecer e que a recusa dos meios excepcionais ou desproporcionados não equivale ao suicídio ou à omissão irresponsável da ajuda devida a outrem. Essa recusa pode significar apenas a aceitação da condição humana, que se caracteriza também pela inevitabilidade da morte. Podem dar-se casos concretos em que seja difícil adotar uma decisão ética e profissionalmente correta, como acontece em muitos outros aspectos da vida: o juiz que tem de decidir se alguém é culpado ou inocente quando as provas não são taxativas; o professor que tem de optar entre aprovar ou reprovar um aluno, quando tem dúvidas, etc. Nestes casos, uma regra moral evidente é prescindir dos possíveis motivos egoístas da própria decisão e aconselhar-se junto de outros especialistas para decidir prudentemente. Com estes requisitos, um médico – como um juiz ou um professor – pode enganar-se, mas não cometerá um ato ilícito. 19

___________________________________________________________________________ 18 Bizatto, José Ildefonso. Eutanásia e Responsabilidade Médica, Leme, Ed. de Direito, 2000. 19 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite dos. O equilíbrio do pêndulo: a bioética e a lei, implicações médico-legais. São Paulo: Ícone, 1998. 20 SÁ, Elida. Biodireito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999.

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5.2 ORTOTANÁSIA: Algumas tribos antigas e selvagens denominavam morte branca obrigação "sagrada"

que o filho tinha para com o pai velho e doente, de fazer-lhe "adormecer suave e

definitivamente."

Na Idade Média chamou-se misericórdia matar os feridos e mutilados de guerra.

Entre os camponeses da América do Sul, durante longo período no passado distante,

denominava-se aliviara morte imprimida com emprego de arma branca aos velhos e doentes

graves, em situação extrema.

Na mesma trilha, no início do século, na Europa e nos Estados Unidos, passou-se a

denominar homicídio caritativo a prática da eliminação da vida em certas situações.

Morte liberadora ou libertadora, morte benéfica, l´uccisione pietosa, el homicídio por

altruísmo o compasion, homicídio piedoso, homicídio-suicídio, foram e são variantes

empregadas para definir o "homicídio eutanásico", gênero que a nosso ver compreende, na

atualidade, as espécies eutanásia e ortotanásia.21

Segundo um conceito generalizado, o homicídio eutanásico deve ser entendido como

aquele que é praticado para abreviar piedosamente o irremediável sofrimento da vítima, e a

pedido ou com o assentimento desta (Nélson Hungria, Comentários ao Código Penal, 3. ed.,

Forense, 1955, v. V, p. 125).

A ortotanásia consiste em suspender um tratamento de uma doença incurável que só

irá prolongar o sofrimento do paciente. Ela é o meio termo entre eutanásia e distanásia, pois

visa trazer qualidade de vida à fase terminal do paciente. Já foi até mesmo regulamentada pela

Lei Covas, criada quando o ex-governador paulista, Mário Covas, estava com câncer e queria

ter este direito regulamentado. Este procedimento é geralmente ministrado em pacientes com

câncer, nos quais se aplicam amplas doses de sedação e se descarta a internação na UTI

(Unidade de Terapia Intensiva), para que o paciente possa morrer ao lado dos parentes, apenas

controlando os sintomas de dor, medida tomada pelos paliativistas. 22

“É a supressão de medidas heróicas de manutenção da vida, mas que não têm efeito

imediato. Você apenas deixa que o processo de morrer aconteça naturalmente. Esse tipo de

eutanásia que você não injeta, mas suspende um tratamento essencial ao paciente, tem

aceitação na categoria médica. É a ortotanásia”, conclui Reinaldo Ayer. Para Sílvio Narvar

Ribas Sobrinho, agente de pastoral da capelania católica, representante da religião católica na

equipe de cuidados paliativos e coordenador de projetos de ações sociais do Hospital Emílio

Ribas, a ortotanásia acontece quando não há possibilidade de cura, mas se quer ter qualidade

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de vida. “A igreja, assim como a bioética, diz que, quando você está nos últimos instantes,

sejam retirados todos os recursos extraordinários de prolongamento da vida. Isto seria a

ortotanásia”, define.23

___________________________________________________________________________ 21 http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2962 acessado no dia 13/02/2009 22 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001. 23 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios. São Leopoldo: Editora Unisinos, 1999.

22

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6 - EUTANÁSIA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. A eutanásia no Brasil é crime, trata-se de homicídio doloso que, em face da motivação

do agente, poderia ser alçado à condição de privilegiado, apenas com a redução da pena.

Laborou com acerto o legislador penal brasileiro, não facultando a possibilidade da eutanásia.

De acordo com o art. 121, § 1º do Código Penal Brasileiro em vigor diz:

Se o agente comete crime impedido por motivo de relevante valor

social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em

seguida a injusta provocação da vitima, o juiz pode reduzir a pena de

um sexto a um terço.24

Ocorre, todavia, que na prática a situação é bem diferente, pois envolve além do

aspecto legal, o aspecto médico, sociológico, religioso, antropológico.

Muito praticada na antiguidade, por povos primitivos, a eutanásia até hoje encontra

seus simpatizantes que, freqüentemente, têm coragem de praticá-la, mas, muito raramente, de

defendê-la publicamente ou apontar seus benefícios de forma a convencer a opinião pública,

como aconteceu no caso Schiavo.

A palavra eutanásia deriva de eu, que significa bem, e thanatos, que é morte,

significando boa morte, morte doce, morte sem dor nem sofrimento. As modalidades da

eutanásia são três: a libertadora, a piedosa e a morte econômica ou eugênica.

Na forma libertadora, o enfermo incurável pede que se lhe abrevie a dolorosa agonia,

com uma morte calma, indolor.

Já na forma piedosa, o moribundo encontra-se inconsciente e tratando-se de caso

terminal que provoca sofrimento agudo, proporcionando horríveis espetáculos, de agonia, seu

médico ou seu familiar, movido por piedade, o liberta, provocando a antecipação de sua hora

fatal.

Quanto à forma eugênica, trata-se da eliminação daqueles seres apsíquicos e associais

absolutos, disgenéticos, monstros de nascimento, idiotas graves, loucos incuráveis e outros.

Essa modalidade está presente na lembrança histórica das atrocidades dos nazistas, contra

judeus e outras minorias, em prol da apuração da raça ariana.

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Por esses problemas é que a eutanásia, embora sendo crime, é praticada impunemente

no Brasil.

Relatos de pessoas que aplicaram a eutanásia em parentes somam-se a relatos de

médicos que a praticaram, sempre todos imbuídos do espírito da “piedade”. Ora, não sejamos

hipócritas, pois o que realmente leva à prática da eutanásia não é piedade ou a compaixão,

mas sim o propósito mórbido e egoístico de poupar-se ao pungente drama da dor alheia.

Somente os indivíduos sujeitos a estados de extrema angústia são capazes do golpe

fatal eutanásico, pois o alívio que se busca não é o do enfermo, mas sim o próprio; que ficará

livre do “fardo” que se encontra obrigado a “carregar”.

Isto se aplica aos familiares, amigos, médicos, advogados, sociólogos, enfim, a todos

aqueles que já pensaram ou defenderam a prática desse crime hediondo, que iguala o homem

moderno a seus antepassados bárbaros e primitivos.

A falsidade no enfoque desse assunto salta aos olhos, quando nos deparamos a casos

concretos envolvendo interesses mundanos, quer de natureza conjugal ou de sucessão

patrimonial.

Embora muito remota pelos princípios humanos e cristãos da sociedade, a eutanásia,

caso seja legalizada no Brasil, se estará admitindo uma forma de burlar o crime de auxílio ao

suicídio pela modalidade libertadora, burlar o homicídio pela modalidade piedosa e

finalmente burlar o infanticídio e até o aborto criminoso pela modalidade eugênica ou

econômica. 25

A vida é nosso bem maior, dádiva de Deus. Não pode ser suprimida por decisão de um

médico ou de um familiar, qualquer que seja a circunstância, pois o que é incurável hoje,

amanhã poderá não sê-lo e uma anomalia irreversível poderá ser reversível na próxima

semana.

Afinal, se a sociedade brasileira não aceita a pena de morte, é óbvio que esta mesma

sociedade não aceita que se disponha da vida de um inocente, para poupar o sofrimento ou as

despesas de seus parentes. Enquanto for crime a eutanásia, sua prática deve ser punida

exemplarmente.

Em linhas gerais podemos afirmar que a todos é assegurado o direito à vida, o que de

fato é consagrado em nosso ordenamento jurídico, pois ele é o fundamental alicerce de

qualquer prerrogativa jurídica da pessoa, razão pela qual o Estado protege a vida humana,

desde a concepção até a morte. Previsto na Constituição Federal, artigo 5º, "caput", a principal

característica do direito à vida vem a ser sua indisponibilidade. A vida, dom divino que é, há 24

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que ser preservada em toda e qualquer circunstância, sendo inconcebível sua eliminação quer

pelo homem, quer pelo Estado.

Apesar desta afirmativa, em algumas circunstâncias, o próprio Estado permite que o

cidadão, legitimamente, pratique condutas que venham a retirar a vida de outrem, como por

exemplo, Estado de Necessidade, Legítima Defesa, Aborto Legal.

Assim, o direito à vida não pode ser visto isoladamente dentro de nosso ordenamento

jurídico, que possui diversos princípios norteadores, como o da dignidade da pessoa humana,

a proibição de tratamentos desumanos ou degradantes, dentre outros.

Assim, poderia a agonia física e moral, aliada à certeza da morte diante da

impossibilidade da cura da doença a que esteja uma pessoa acometida, como por exemplo a

AIDS, o câncer, ser mais uma hipótese de permissibilidade de retirada da vida, com o único

objetivo de abreviar os padecimentos por ela sofrido?

Na verdade, a questão que se coloca em discussão quando o assunto eutanásia é

abordado, vem a ser justamente a disponibilidade da vida humana.

___________________________________________________________________________ 24 BRASILEIRO, Código Penal, Editora Rideel, 2ª edição, 2005 25 Hungria, Nelson - Comentários ao Código Penal - Ed. Forense, 1958, vol.5 – Rio de Janeiro Artigo publicado no Diário do Grande ABC no dia 06/04/05

25

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6.1 - A EUTANÁSIA NO ÂMBITO PENAL Equipara-se ao homicídio, sem dar ouvidos às inovações ocorridas no estrangeiro. Os

códigos soviético (1922), peruano (1942) e uruguaio (1933), por exemplo, sobre o assunto,

apresentaram, respectivamente, isenção de pena ao homicídio por compaixão cometido a

pedido da vítima; impunidade ao auxiliador que agiu por compaixão e perdão judicial.

O primeiro eco, no Brasil, ouviu-se no Anteprojeto da Parte Especial do CP, cujo

artigo 121, parágrafo terceiro.

Se o homicídio é culposo: pena – reclusão de um a três anos. 26

O dispositivo mereceu do Prof. Goffredo Telles Jr a irônica observação:

"De ora em diante, ponham os velhos ricos suas barbas de molho..."

Enquanto não se transformar em lei, a matéria enquadra-se, como explicaremos

adiante, como delito privilegiado.

Segundo Jimenez de Asúa, as hipóteses de tratamento que a eutanásia pode receber

são quatro:

a- permitir ao juiz a concessão de perdão - deixa de aplicar a pena, reconhecendo

circunstâncias que o justifiquem. Em nosso direito, é causa de extinção de punibilidade;

b- pode-se elencar o móvel compassivo dentre as causas de exclusão de antijuridicidade -

nesse caso, a conduta é típica, mas abrangida por norma geral permissiva, que a torna lícita;

c- considerada como delito ordinário ou privilegiado;

d- como forma de "ação socialmente adequada".

Nossa lei penal vigente preferiu cuidar do tema como delito privilegiado.

Não criou tipo autônomo, mas uma hipótese atenuada do tipo básico de homicídio.

Está no artigo 121, parágrafo 1º, do CP, que faculta a redução de pena ( de um sexto a um

terço) imposta a quem matou impelido por motivo de relevante valor social ou moral.

A diferença com relação à atenuante genérica do artigo 65, III, a, está no fato de que

aquela especial redução de pena não encontra obstáculo sequer no mínimo cominado pelo

artigo 121. O homicídio piedoso é exemplo constante da Exposição de Motivos, no que se

refere a crimes privilegiados. Levando-se em consideração, quando abordamos, no tópico

relativo à classificação da eutanásia, que abraçamos a tese defendida pelo Dr. Erik Frederico

a respeito da ortotanásia, a que somos favoráveis, impõe-se uma questão: se a omissão é

penalmente relevante, em conformidade ao artigo 13 do Código Penal, em que se baseariam

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os defensores da ortotanásia para justificá-la, visto que houve defesa, anteriormente, da sua

licitude?

A resposta está no próprio dispositivo: se inexiste dever de agir, comando que obrigue

a impedir o resultado, do mesmo modo, inexiste ilicitude. 27

___________________________________________________________________________ 26 BRASILEIRO, Código Penal, Editora Rideel, 2ª edição, 2005 27 SILVA, Sônia Maria Teixeira da. Artigo do site www. jus.com.br

27

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6.2 A EUTANÁSIA NO ÂMBITO CIVIL Enfocamos, superficialmente, as responsabilidades no campo civil, no item 6 ( culpa

civil). Aprofundemo-nos um pouco mais neste item.

O Código argentino, no seu artigo 1084, e o alemão, no art. 844, apresentam textos

expressos sobre a matéria. Falam em indenização pelo dano sofrido. O alemão possui uma

exceção: alude ao tempo provável de vida da vítima para orientar a fixação do montante e à

obrigação de se indenizar o dano sofrido por quem contratara serviços ao falecido. E o

brasileiro? O nosso Código Civil também traz texto de lei expresso sobre a matéria - é o artigo

1537, que reproduzimos:

A indenização, no caso de homicídio, consiste: I- No pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II- Na prestação de alimentos às pessoas a quem o defunto os devia.28

A interpretação ao pé da letra desses textos daria margem a uma excessiva restrição no

que tange à responsabilidade do agente.

Clóvis Bevilaqua diz que o legislador brasileiro buscou fugir à excessiva generalidade

com que se tratara a matéria da liquidação das obrigações, no Código Penal de 1830.

Contudo, ao fazê-lo, acabou por criar sistema muito tacanho. Insurgiram-se contra ele

os pretórios e a doutrina. A rigor, a simples integração sistemática do Código afasta o

entendimento originário que se cingia, rigidamente, às parcelas literalmente descritas no

artigo 1537. Levando-se em consideração o estado atual de evolução, podemos afirmar os

seguintes princípios, devidamente pesquisados:

1- Qualquer pessoa que tenha sofrido prejuízo tem ação de reparação, conforme o artigo 159,

do CC. A concubina, por exemplo, que prove o dano emergente da morte do companheiro

(RF-157:173);

2- O texto do artigo 1537 abarca, apenas, hipóteses especiais em que a necessidade de

demonstrar o dano é atenuada, ou até mesmo dispensada;

3- O dano moral é indenizável. Já o dizia o artigo 76, parágrafo único, do nosso Código,

quando o ratifica, com aura de Lei Maior, a Constituição Federal de 88, com todas as letras,

no seu artigo 5º, V.

___________________________________________________________________________ 28 BRASILEIRO, Código Civil, Editora Rideel, 2ª edição, 2005

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7 – EUTANÁSIA NO DIREITO COMPARADO. A experiência no Direito Comparado:

Vários países tentaram incluir em suas legislações a permissibilidade da prática da

eutanásia. O Uruguai, baseado na doutrina de Jiménez de Asúa, incluiu, em 1934, a

possibilidade da eutanásia no seu Código Penal, através do que chama de homicídio

piedoso1[25]. Em 1990 a Holanda estabeleceu uma rotina de notificação para os casos de

eutanásia, deixando, porém, de torná-la legal. Essa sistematização visou apenas isentar o

profissional médico de procedimentos criminais.

Nos Estados Unidos houve a tentativa, no Estado da Califórnia, de inclusão da

eutanásia no Código Civil.

Conforme já citado, os Territórios do Norte da Austrália, no ano de 1996, editaram

uma Lei que possibilita formalmente a eutanásia, estabelecendo inúmeros critérios para a sua

adoção. 29

Assim como a Igreja, a Associação Mundial de Medicina considera a eutanásia ativa

como sendo um procedimento eticamente inadequado, mas, de outra parte, a eutanásia passiva

- ou eutanásia por duplo efeito - são moralmente aceitas pela maioria das sociedades médicas

e correntes religiosas dentro do princípio da “morte com dignidade”, conforme nos informa

Carlos Fernando Francisconi.

As diversas legislações estrangeiras tem se ocupado, com bastante freqüência, do tema

da eutanásia em seus respectivos códigos.

Desta maneira, vemos que a prática é vista como uma forma de homicídio privilegiado

pela maioria dos povos latinos (Colômbia, Cuba, Bolívia, Costa Rica, Uruguai), e até como

uma ausência de delito em outros, exceto por motivo egoístico ( Peru ), embora alguns adotem

ainda uma postura extremamente conservadora, entre eles, a Argentina e o Brasil, que não

excluem o delito de figurar entre os tipos de homicídio, em suas diversas formas.

No caso particular do vizinho Uruguai, o código elaborado por Irureta-Goyena e

recentemente aprovado, estabelece o perdão judicial nos seguintes termos do seu artigo 37:

"Os juízes tem a faculdade de exonerar do castigo ao indivíduo de antecedentes honestos,

autor de um homicídio efetuado por móveis de piedade, mediante súplicas reiteradas da

vítima . " 30

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Por outro lado, as legislações européias são muito mais benevolentes, ora isentando de

qualquer pena (Rússia, Código Criminal de 1922), ora cominando penas atenuadas, como na

Inglaterra, Holanda, Suíça, Áustria, Noruega, República Checa e Itália, ainda que alguns

outros não a admitam formalmente (Grécia, França, Espanha e Bélgica).

Em Portugal, há limitação da pena de seis meses a três anos, quando houver pedido do

paciente (Código Penal Português, Artigo 134) e, de um a cinco anos, quando movido por

compaixão, emoção violenta, desespero ou outro valor relevante social ou moral (Artigo 133).

Nos Estados Unidos, a questão vinha sendo deixada ao livre arbítrio das legislações

estaduais, o que foi revisto por recente decisão da Corte Suprema norte americana que

estabeleceu ser a matéria de competência legislativa privativa da União.

No Canadá francófono, a lei 145 introduziu, em 1990, a figura do curador público

designado livremente por qualquer cidadão, e que dispõe de poderes executáveis ainda em

vida ( ao contrário do testamento ), devendo ser ratificado perante o registro público e

homologado judicialmente, o qual se torna possuidor de um mandado para agir em

determinadas circunstâncias e dentro dos limites propostos pelo concedente. Tal mandado

cobre, por exemplo, a delegação de consentimento de cuidados médicos e a administração de

bens, sendo revogável a qualquer tempo, de acordo com os mesmos procedimentos formais.

Atualmente, o curador público representa cerca de 16000 indivíduos maiores de idade e

supervisiona 5000 curadores privados e 12000 tutores, somente na província de Québec. Ele

também administra os bens das pessoas desconhecidas ou não encontráveis pelos registros

públicos.

Para uma melhor visão acerca da questão da Eutanásia, verifiquemos com maior

riqueza de detalhes a eutanásia praticada em alguns países.31

___________________________________________________________________________ 29 ALVES, Leo da Silva. Eutanásia. Revista Consulex, São Paulo, nº 29, p. 15, maio 1999. 30 REVISTA JURÍDICA CONSULEX, ano V – nº 114 –15 de outubro de 2001, p. 18. 31 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direito de morrer dignamente: eutanásia, ortotanásia, consentimento informado, testamento vital, análise constitucional e penal e direito comparado. In: SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite dos (org.). Biodireito: ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: RT, 2001.

30

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8 - EUTANÁSIA: MORTE DIGNA OU SUICIDIO ASSISTIDO?

O principal argumento daqueles que defendem a eutanásia incide sobre o direito que o

indivíduo tem, em determinadas circunstâncias - normalmente associadas a um forte

sofrimento físico ou psíquico decorrentes de uma doença incurável - de poder decidir pôr

termo à sua vida. Julgo que a morte não é em si um direito; antes uma inevitabilidade. Aquilo

que todo o ser humano tem direito é de viver e morrer com dignidade.

Outro argumento para justificar a eutanásia corresponde “ao sofrimento da pessoa”. O

sofrimento é muitas vezes visto como algo indigno, desumano, motivo de vergonha e que por

isso deve ser banido a qualquer preço, pelo que a eutanásia passa ser a vista como um gesto de

compaixão. Esta “piedade hipócrita” esconde, por vezes, uma injustiça e um sentimento

egoísta, uma vez que considera que os mais fracos, as vítimas do infortúnio, aqueles que

adoecem ou simplesmente envelhecem, já não têm lugar nesta sociedade.

Ou seja, no caso de surgirem idéias de suicídio nestes indivíduos não se procura

demovê-los, nem auxiliá-los.

Nestas situações prevalece um espírito de complacência e compreensão, já que o

sofrimento e o desespero em que se encontram conduzem automaticamente a um estatuto de

“suicidas justificados”. 32

Então, mas não serão também estes os motivos que levam a maioria dos indivíduos a

cometer o suicídio? O homem é o único ser vivo que reflete sobre a sua própria morte.

Na maioria dos países, excluindo o suicídio por motivos políticos ou religiosos mais

extremistas, é consensual que o suicídio não deve ser encorajado, devendo-se proteger o

indivíduo de causar a morte a si própria. Afinal, por que é que não existe consenso à volta da

eutanásia?

Desde Robbins (1959) verificou-se que mais de 90% das pessoas que se suicidam

apresentavam alterações psicopatológicas. Deste modo, estariam privadas do discernimento

necessário (em termos mentais) para avaliar em consciência e em liberdade, a decisão de se

suicidarem. Sabemos ainda que, por detrás do desejo de morrer, existem várias doenças

mentais tratáveis – como é o caso da depressão. Desta forma, a existência de um “suicídio

racional” é algo questionável e a história dá-nos um exemplo extraordinário a este respeito: a

esmagadora maioria dos prisioneiros dos campos de concentração, mesmo sendo submetidas a

um sofrimento atroz e às mais diversas torturas, raramente se suicidava.

Quase diariamente, os psiquiatras na sua atividade clínica confrontam-se com doentes

que tentaram o suicídio ou que têm idéias de se concretizar. A posição do psiquiatra é sempre

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a mesma: demover a pessoa protegê-la de si própria, aliviar-lhe a angústia e transmitir-lhe

palavras de esperança. Não se julgue, porém, que é sempre fácil fazê-lo, pois somos

confrontados com situações dramáticas, horrendas em termos de violência psíquica e cujo

sofrimento associado é incomensurável.

Diante de tanta tragédia, e da nossa impotência, muitas vezes o papel do médico

limita-se a acolher o sofrimento da pessoa. A escutá-la e a sofrer com ela. No entanto, tal

como acontece com muitas doenças incuráveis, para as quais o avanço da medicina vai

descobrindo novos tratamentos também verificaram que as situações de tormento infindável

muitas vezes acabam por ter uma solução. A pessoa depois de ajudada recupera a alegria de

viver e encontra um sentido para a vida.

A resposta à eutanásia está nos cuidados paliativos. É através desta visão humanista da

medicina que se procuram solucionar os problemas decorrentes da doença prolongada,

incurável e evolutiva, prevenindo o sofrimento que acarreta, proporcionando a maior

qualidade de vida possível aos doentes e às famílias.

Os defensores da eutanásia ou, em sentido lato, do suicídio assistido, apresentam-na

como um ato de misericórdia e de compaixão perante o sofrimento de uma doente vítima de

uma doença grave e incurável. Chegam a ser os próprios familiares que a incitam e reclamam.

Transmite-se assim a idéia de que, em determinadas circunstâncias dramáticas, ajudar alguém

a pôr fim à sua vida é um ato de caridade e de amor, quando é aí que reside a grande

hipocrisia da eutanásia. 32

___________________________________________________________________________ 31 ALVES, Cleber Francisco. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana:o enfoque da doutrina social da igreja. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. 32 AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Caracterização jurídica da dignidade da pessoa humana. Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 797, mar. 2002.

32

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A Eutanásia não é um suicídio assistido, o principal argumento daqueles que

defendem a eutanásia incide sobre o direito que o indivíduo tem, em determinadas

circunstâncias - normalmente associadas a um forte sofrimento físico ou psíquico decorrentes

de uma doença incurável - de poder decidir pôr termo à sua vida. Julgo que a morte não é em

si um direito; antes uma inevitabilidade. Aquilo que todo o ser humano tem direito é de viver

e morrer com dignidade. 33

Outro argumento para justificar a eutanásia corresponde “ao sofrimento da pessoa”. O

sofrimento é muitas vezes visto como algo indigno, desumano, motivo de vergonha e que por

isso deve ser banido a qualquer preço, pelo que a eutanásia passa ser a vista como um gesto de

compaixão. Esta “piedade hipócrita” esconde, por vezes, uma injustiça e um sentimento

egoísta, uma vez que considera que os mais fracos, as vítimas do infortúnio, aqueles que

adoecem ou simplesmente envelhecem, já não têm lugar nesta sociedade. Ou seja, no caso de

surgirem idéias de suicídio nestes indivíduos não se procura demovê-los, nem auxiliá-los.

Nestas situações prevalece um espírito de complacência e compreensão, já que o sofrimento e

o desespero em que se encontram conduzem automaticamente a um estatuto de “suicidas

justificados”.

Então, mas não serão também estes os motivos que levam a maioria dos indivíduos a

cometer o suicídio? O homem é o único ser vivo que reflete sobre a sua própria morte. Na

maioria dos países, excluindo o suicídio por motivos políticos ou religiosos mais extremistas,

é consensual que o suicídio não deve ser encorajado, devendo-se proteger o indivíduo de

causar a morte a si própria. Afinal, por que é que não existe consenso à volta da eutanásia?

Desde Robbins (1959) verificou-se que mais de 90% das pessoas que se suicidam

apresentavam alterações psicopatológicas. Deste modo, estariam privadas do discernimento

necessário (em termos mentais) para avaliar em consciência e em liberdade, a decisão de se

suicidarem. Sabemos ainda que, por detrás do desejo de morrer, existem várias doenças

mentais tratáveis – como é o caso da depressão. Desta forma, a existência de um “suicídio

racional” é algo questionável e a história dá-nos um exemplo extraordinário a este respeito: a

esmagadora maioria dos prisioneiros dos campos de concentração, mesmo sendo submetidas a

um sofrimento atroz e às mais diversas torturas, raramente se suicidava.

Quase diariamente, os psiquiatras na sua atividade clínica confrontam-se com doentes

que tentaram o suicídio ou que têm idéias de vi-lo a concretizar.

A posição do psiquiatra é sempre a mesma: demover a pessoa protegê-la de si própria,

aliviar-lhe a angústia e transmitir-lhe palavras de esperança. Não se julgue, porém, que é 33

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sempre fácil fazê-lo, pois somos confrontados com situações dramáticas, horrendas em termos

de violência psíquica e cujo sofrimento associado é incomensurável. Diante de tanta tragédia,

e da nossa impotência, muitas vezes o papel do médico limita-se a acolher o sofrimento da

pessoa. A escutá-la e a sofrer com ela. 34

___________________________________________________________________________ 33 http://www.universia.com.br/materia/materia.jsp?id=6629 acessado em 20/032009 34 http://www.webartigos.com/articles/1783/1/a-eutanasia-no-direito-brasileiro/pagina1.html

34

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9 - EUTANÁSIA PRÓS E CONTRA Da mesma forma que o aborto, que a pena de morte, que a questão da guerra justa, a

discussão sobre a eutanásia é instigante, polêmica e antiqüíssima. As opiniões não só se

dividem numericamente, mas também qualitativamente, pois se observa que mentes ilustres,

doutrinadores respeitáveis, situam-se em pólos opostos. São argumentos profundamente

abalizados, tanto favoráveis quanto contrários.

Inicialmente, levantemos as opiniões, numa síntese, daqueles que são favoráveis, sem a

preocupação de citar nomes.

O embasamento oferecido varia em proporção direta às formas admitidas.

Vamos dividir os que apresentam argumentos favoráveis em dois grupos: os

permissivistas mais radicais e os mais moderados. Apóiam-se os mais radicais nas seguintes

alegações:

a- toda vida gravemente tolhida em suas manifestações por padecimento físico ou moral

carece de valor;

b- nessas hipóteses, pode representar gravame injusto para a família e para a sociedade, por

exemplo, ocupando leitos hospitalares;

c- se a situação é irreversível, não há porque lutar contra o que as próprias forças da ciência

revelam-se impotentes.

d- o interessado tem direito à morte condigna; e

e- os que admitem a forma eugênica ainda dizem que a mesma atenuaria, na vida social, a

proliferação das mazelas da população eliminada, evitando o "mau exemplo" ( no caso dos

criminosos) e a propagação genética.

Os mais moderados acrescentariam a tudo isso certas condicionantes, como:

a- o consentimento do interessado ou de membro da família;

b- a certeza da proximidade e inevitabilidade da morte atestada por profissional habilitado etc.

Neste grupo, costumam posicionar-se os que rejeitam a eutanásia eugênica, em

princípio. O Dr. Erik Frederico Gramstrup batiza essa corrente de pensamento como "teoria

Hedonista", pois as razões invocadas poderiam ser resumidas em um único princípio: o de que

a vida humana só mereceria apreço na medida em que fosse apta para proporcionar prazeres e

utilidades, para a própria pessoa ou para a comunidade. 35

___________________________________________________________________________ 35 SILVA, José Afonso. Ob. Cit., p.109

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Para ele, "isso significa olvidar o valor absoluto da vida, que persegue fins superiores a

si, sendo, portanto indisponível." Aqui, claro, iniciam-se, pois, os argumentos contrários à

eutanásia, fazendo críticas, evidentemente, à posição precedente.

O princípio fundamental é de natureza deontológica, ou seja, filosófica, metajurídica:

o homem é simples peça encartada em uma ordem universal superior, não lhe competindo

usar mal de seu livre-arbítrio para subvertê-la. Voltamos àqueles princípios aprendidos no

Direito Natural. O homem não pode tirar a própria vida, que é um bem supremo. ( Deus deu,

Deus tira).

Assim, a simples dor, por exemplo, não é justificativa aceitável para o extermínio de si

ou de outrem. O objetivo supremo da existência passa ao largo do deleite, pois que, no seu

curso, as situações de desconforto são mais freqüentes do que as de prazer. Como cita o Dr.

Erik, a expressão "vida sem valor" é tão contraditória quanto a quadratura do círculo!

Outro aspecto de que não podemos fugir aponta para os problemas dos encargos

sociais gerados pelo enfermo.

No Jornal O Estado de São Paulo, de 16 de maio de 1990, na página 14, escreveu o

ilustre criminalista, Dr. Luiz Flávio D´Urso:

"Ora, não sejamos hipócritas, pois o que realmente leva à prática da eutanásia não é a piedade ou a compaixão, mas sim o propósito mórbido e egoístico de poupar-se ao pungente drama da dor alheia."

E como disse o Dr. Erik, completando:

"... e aos encargos econômicos e pessoais que ela representa."

Palavras duras, mas a realidade! Há inúmeros exemplos na sociedade. E, de fato, em

nada melhora esse quadro se o paciente der o consentimento. Paralelo ao fato de ser um

direito irrenunciável, um enfermo em estado terminal não possui condições para manifestar

sua vontade. E, mesmo que manifestasse, seria escasso, senão nenhum, o valor de sua

manifestação de vontade.

Ora, se nega, com habitualidade, eficácia fática e jurídica ao consentimento de quem

tem o desenvolvimento mental incompleto, quanto mais a quem perdeu o poderoso instinto de

auto conservação, por estar com as faculdades perturbadas.

Além do mais, possui razões de sobra todos aqueles que defendem a tese de que a

medicina não é pitonisa infalível. Há casos reais, de pessoas desenganadas por médicos, em

que eles vaticinam três a quatro meses de vida para seu paciente. E acabam falecendo antes do

próprio paciente, anos e anos depois! Quantas vezes uma espera não daria à técnica o tempo

necessário para oferecer solução satisfatória? 36

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Pior. Que dizer dos casos em que o profissional atestasse um quadro dramático com intenções

pérfidas, a soldo, por exemplo, dos herdeiros?

Quanto ao argumento eugênico, refuta-se com indignação. Faz pressupor que um

grupo ou determinados grupos alcem-se na posição de semideuses, com arbítrio para definir

que peculiaridades retiram humanidade a um ser. 36

Conseqüências desastrosas dessa tese aparecem na história da humanidade. O

Nazismo, por exemplo. Quantas barbaridades não foram animalescamente cometidas em

nome da conservação de uma suposta "pureza racial"?

Por outro lado, muitos que se posicionam como favoráveis à eutanásia não se estariam

perguntando: "Somos obrigados ética e juridicamente a prolongar, em vão, a agonia dos

mortos-vivos? "

Evidentemente, essa não é a posição da grande maioria que é contrária à eutanásia. O

Jornal O Estado de São Paulo, de 25 de abril de 1990, trouxe a notícia seguinte:

No dia 28 de março, R.C.C., de 23 anos, foi internada no Hospital das Clínicas de São Paulo com o fígado praticamente sem funções e com o pulmão esquerdo comprometido por uma infecção. Internada na Unidade de Terapia Intensiva, seu estado agrava-se a cada dia. Seu sangue não coagula, sua respiração é feita por meio de aparelhos e, aos poucos, ela vai perdendo a consciência.

Como diz a maioria dos estudiosos que defendem agudamente a não-eutanásia: quando

se afirma a transcendência da vida humana, não se quer dizer mais do que literalmente a frase

assevera.

Realmente, não há motivo algum para que se apliquem lenitivos extraordinários se a

vida não mais se sustenta em virtude do colapso de suas funções. É o caso de R.C.C.

O ilustre Professor Paulo José da Costa Jr escreveu, em 3 de junho de 1990, no jornal

O Estado de São Paulo, na página 44:

"Como se vê, a ortotanásia não implica qualquer conduta do médico. Este não pratica, mesmo

solicitado, a morte piedosa. Não age: deixa apenas de prolongar, por meios artificiais, uma

vida que, além de sofrida, mostra-se irrecuperável."

Eis a posição de vários doutrinadores. São contrários à eutanásia, mas favoráveis a

ortotanásia, tomada a expressão no sentido estrito, isto é, de omissão no prolongamento

artificial e desnecessário de uma existência inviável. A conclusão da maioria contrária à

eutanásia ( mas favorável à ortotanásia) pode assim ser sintetizada:

37

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a- prescrição da eutanásia ativa;

b- garantia de morte digna ao paciente, empregando-se os sedativos necessários;

c- possibilidade da interrupção do tratamento por meios extraordinários, notadamente de

terapia reanimatória no caso de coma irreversível.

Segundo o Dr. Erik Frederico, a orientação acima se adapta à do Código de Ética

Médica que, no seu artigo 66 (Cap. V), veda ao profissional:

"Utilizar, em qualquer caso, meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda que o pedido deste ou de seu responsável legal".

Tal preceito, na verdade, repete a passagem do juramento de Hipócrates: "A ninguém

darei, para ajudar, remédio mortal, nem conselho que o induza à perdição."

Quando falamos em Direito à Vida, passa pela nossa mente que, frente aos demais

direitos da personalidade, a vida apresenta-se, por assim dizer, como substância - entendido

no sentido aristotélico: aquilo que existe em si - em face dos acidentes - que existem em

outro.

Trata-se do direito à integridade da pessoa humana e sua tutela. A integridade física

pode ser definida como um "modo de ser físico da pessoa, perceptível mediante os sentidos".

É direito essencial da pessoa, por ser este um direito de personalidade que consiste no

direito que cada um tem de não ter seu corpo atingido por atos ou fatos alheios.

Conforme nos ensina Pontes de Miranda, no seu Tratado de Direito Privado,

v.VII/16/17, seu objeto pode consistir em não ser atingido o corpo da pessoa e não a

propriedade deste corpo, advindo daí que o direito à integridade corporal é um bem em si,

protegido pelo Direito. 37

___________________________________________________________________________ 36 JUNGES, José Roque. Ob. Cit., p. 110. 37 http://www.webartigos.com/articles/1783/1/a-eutanasia-no-direito-brasileiro/pagina1.html

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Contudo, a tutela da integridade física não é direito recente. Em Ulpiano, na Lex

Aquilia, encontramos a máxima "directam enim non habet, quoniam dominus membrorum

suorum nemo videtur", o que significa que o indivíduo possui, em seu nome, o direito de ação

por meio da Lex Aquilia, por não ter a direta, pois a ninguém se considera dono de seus

membros.

Pode-se concluir, pois, que já na antiga Roma, não se considerava o direito ao próprio

corpo como um direito de propriedade, tutelando-se, porém, o corpo do indivíduo contra as

agressões alheias.

Hoje, encontramos sob a denominação de direito à integridade física, diversos outros

direitos como subtipificações dos direitos de personalidade, a saber: direito à vida, à

integridade corporal, e à saúde.

O direito de integridade corporal se situa logo atrás do direito à vida.

O direito à vida diz respeito à própria existência do indivíduo, enquanto o de

integridade corporal, ou simplesmente, de integridade física, consiste na incolumidade física

da pessoa e em sua saúde.

Incide na espécie o princípio do primado do direito mais relevante, no dizer de Pontes

de Miranda.

Ao de leve, dizemos, para completar, que o direito à integridade física não se reduz à

simples incolumidade anatômica e externa do corpo humano.

Esse direito é abrangido também pelo direito à saúde ou o direito de não ser

contagiado por outrem. ( É o direito ao pudor, denominado por Messineo, uma vez que deve

ser garantida e preservada a personalidade humana.) Saúde, doença e medicina constituem a

tríade que invade nosso direito na atualidade.

Quanto à natureza do direito em pauta, muito se discutiu. Chegou-se mesmo a dizer

que esse direito constituir-se-ia em um direito de propriedade.

Ultimamente, este ponto de vista não vem encontrando apoio entre os autores, que não

mais aceitam a idéia de que cada um de nós possui um direito de propriedade sobre o próprio

corpo. Ihering, em seus ensinamentos, já o negava.

Um dos principais argumentos dos opositores à teoria da propriedade sobre o próprio

corpo está no fato de que o proprietário de uma coisa tem o poder de disposição sobre a

mesma, amplamente.

Assim, na qualidade de proprietário de seu corpo, teria o indivíduo amplo poder de

disposição sobre o mesmo, podendo mutilá-lo, ou destruí-lo, estando também, 39

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conseqüentemente, autorizada a extrema diminuição permanente da integridade física que se

traduziria na perda da própria vida. Estaria desse modo, autorizado o suicídio. E também a

eutanásia.

Não se confunde, pois, o direito à integridade física com o poder de disposição que o

proprietário possui em relação à coisa que lhe pertence, objeto de seu direito. Não possui o

indivíduo, em relação ao próprio corpo, um ius utendi, um ius fruendi e um ius abutendi como

possuiria em relação a um bem de sua propriedade.

Queremos, ainda, lembrar que, ao contrário do direito à vida, que é um direito

indisponível, o direito à integridade do homem pode, dentro de certos limites, ser disponível,

apesar de ser um direito absoluto. Obviamente, desde que essa disponibilidade não resulte

uma diminuição permanente na integridade física ou que não seja contrária à lei e aos bons

costumes. Essa disponibilidade chegou a tal abuso, que Josserand, já em 1932, afirmava

lucidamente que a disponibilidade do indivíduo sobre seu corpo chegava ao ponto de

transformá-lo em matéria de transação.

Dentro do que nos interessa - para não fugirmos demais ao tema proposto - existem

atos ilícitos em relação ao que afirmou Josserand.

Esses atos ilícitos dizem sempre respeito ao corpo vivo, não se aplicando ao corpo

morto. E dentre eles, constituindo-se atentados à integridade física do indivíduo, estão aqueles

que comprometem a conservação do ser humano, a exemplo dos duelos, dos contratos que

permitem a eutanásia (sobre os quais falaremos mais adiante) ou que causem mutilação,

resultante na diminuição permanente da integridade física.

Conforme vimos, existe o elo entre o direito à vida e o direito à integridade física, no

que concerne ao tema de nosso trabalho - a eutanásia.

Assim, mesmo que o indivíduo enfermo em estado terminal decida, conscientemente,

pela eutanásia, pelo exposto, percebemos que o ato será ilícito, dentro do nosso Direito. O que

dirá se autorizado por terceiros.

A vida é um direito indispensável, feitas as observações preliminares, comecemos por

lembrar a Constituição Federal de 88, no seu artigo 5º, que se refere justamente à

inviolabilidade.

De forma concreta, essa tutela desdobra-se:

a- no campo penal: pela tipificação das figuras relativas ao homicídio; infanticídio; aborto;

induzimento, instigação e auxílio ao suicídio; e ainda pela instituição da legítima defesa como

excludente da antijuridicidade ; 40

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b- no campo civil: o ressarcimento dos danos e o direito aos alimentos (embora se deva

admitir que seu objeto imediato seja a saúde).

Desfruta daqueles caracteres comuns ao gênero em que se insere: essencialidade,

inatismo, superioridade hierárquica, oponibilidade absoluta, interioridade,

extrapatrimonialidade, intransmissibilidade e indisponibilidade. Quando surge o direito à

vida?

Segundo o Dr. Erik Frederico, em obra já citada, esse direito surge no instante da

concepção, visto que, formado o zigoto, este já apresenta o número de cromossomos

indicador da espécie humana.38

Tal critério, segundo ele, lastreado nos dados da ciência biológica, afigura-se como

indiscutível.

O prolongamento dá-se até morrer, expressão, por sua vez, difícil de definir, pois não

ocorre num átimo, senão mediante processo desorganizador. São sinais abióticos

imediatos: a inconsciência, a insensibilidade, a imobilidade, a abolição do tônus muscular, os

colapsos respiratórios e os circulatórios. Certeza, no entanto, dá-nos os fenômenos

consecutivos: perda de peso e pergaminhamento da pele gerados pela evaporação tegumentar;

resfriamento; manchas de hipóstase e a rigidez cadavérica.

Quando se fala em extra patrimonial idade, nem por isso se quer dizer que a vida não

esteja protegida por sanções de caráter civil. Trata-se apenas de deixar claro que a utilidade

econômica é mediata, segundo o convincente critério lembrado por Adriano de Cupis.

Grosso modo, o direito que é mais veementemente nuclear é o direito à vida.39

_________________________________________________________________________ 38 http://www.webartigos.com/articles/1783/1/a-eutanasia-no-direito-brasileiro/pagina1.html acessado no dia 15/08/2008 39 http: // www.google,com.br acessado no dia 13/07/2008

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CONCLUSÃO

O estudo tem como escopo questionar qual o conceito jurídico mais adequado para a

eutanásia. Tendo em vista sua complexidade, a eutanásia não encontra ainda previsão legal no

Brasil. Diante disso, abre-se caminho para questionamentos sobre quais as posturas a serem

adotadas nesse caso.

No ordenamento jurídico pátrio, a prática da eutanásia não está elencada, não de forma

explícita e objetiva, no Código Penal. Entretanto, aplica-se a tipificação prevista no art. 121,

ou seja, homicídio, simples ou qualificada, sendo considerado crime a sua prática em qualquer

hipótese. Dependendo as circunstâncias, a conduta do agente pode configurar o crime de

participação em suicídio (art. 122 do Código Penal) (GUERRA FILHO, 2005).

Diante do exposto, deve-se compreender que a dignidade da pessoa humana não é um

conceito objetivo, absoluto, geral, possível de ser abstraído em padrões morais de conduta e a

serem impostos a todas as pessoas. Não é crime deixar de manter a vida de alguém por meio

artificial, se previamente atestada por dois médicos à morte como iminente e inevitável e

desde que haja consentimento do paciente ou, em sua impossibilidade, de cônjuge,

companheiro, ascendente, descendente ou irmão. Pessoa ligada por estreito vínculo de afeição

à vítima não poderá suprir-lhe a anuência. Pode ocorrer também que o agente induza, instigue

ou auxilie ao suicídio, por exemplo, o portador de uma doença infecto-contagiosa, cuja terapia

ainda não esteja ao alcance da medicina. Neste caso, o agente estará incurso no art. 122 do

Código Penal. A pena é de 2 a 6 anos. A pena é duplicada se o crime é praticado por motivo

egoístico, ou se a vítima é menor ou tem diminuída por qualquer causa, a capacidade de

resistência. A grande maioria da sociedade concorda com o direito de morrer dignamente.

Entretanto quando a utiliza a palavra eutanásia para designar tal acontecimento, surge uma

grande polêmica.

Diante disso, surge o respectivo questionamento: se a eutanásia é realmente uma

doença incurável ou de sofrimentos cruéis seria justificativa para conceder a pessoa o direito

de morrer ou se a eutanásia configura uma atitude piedosa que põe fim ao sofrimento de um

paciente em fase terminal, a denominada morte digna ou seria uma forma de auxilio ao

suicídio.

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Sem a consideração da tolerância, ignorando-se a pluralidade e a complexidade da

sociedade atual, o uso do princípio da dignidade humana pode ser usado para a negação da

pessoa, para a homogeneização dos indivíduos e para a negação da dignidade.

O homem questiona sobre a sua dignidade, mas nega-se a aceitar a forma e quando ela

ocorrerá, tentando abrandá-la o máximo possível, uma vez que a característica da vida é

nascer, viver e conseqüentemente, morrer.

Sem o intuito de emitir uma opinião definitiva sobre o instituto em questão deixo

registradas as argumentações acima expostas para uma minuciosa análise visando uma

possível tomada de posição por parte daqueles que se interessam pelo assunto.

Assunto por demais atual e inerente à condição de ser humano na medida em que o

direito à vida, ou à morte, põe-se sob a ótica de bens indisponíveis. Até que ponto valores

éticos, morais, jurídicos e religiosos poderão influenciar na manutenção da "vida" de um

moribundo de quadro irreversível?

Por outro lado, será sempre injusto punir, indistintamente, quem pratica eutanásia, sem

se observar a análise das peculiaridades que envolvem, em cada caso concreto, o

comportamento típico, antijurídico e culpável.

Neste contexto é importante dizer que a todos é assegurado o direito a vida, o que de

fato é consagrado em nosso ordenamento jurídico. Ademais, a vida humana é protegida desde

a concepção ate a morte. Assim, o que se coloca em discussão é a disponibilidade da vida

humana. a eutanásia não tem sido vista apenas como a simples possibilidade de ocasionar a

morte a alguém que esta sofrendo em função de determinada moléstia. Pode-se observar que a

eutanásia é um termo de grande amplitude e pode ter diferentes interpretações; é importante

salientar que permitir a supressão da vida de um ser humano, mesmo doente e irremediável e

a pedido próprio, é um ato de muito risco.

Enfim, o que na verdade ocorre é que há um medo coletivo da morte, ou como se vai morrer,

associado à idéia da dor que comumente antecede os últimos instantes da vida, todos

consideram preferível a morte súbita, imprevista, uma morte sem dor, sem sofrimento.

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