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EXCELENTÍSSIMO IUIZ DAS VARAS DA O MINISTÉRIO PUBLICO ÍNDU3TR1A E. COMERCIO uW CAFÉ P O Ministério Público Estadual, por seu promotor de Justiça, vem, respeitosamente, nos termos da Constituição da República, artigo 129, III, e da Lei Federal n. 8.078/90, artigos 81, parágrafo único, I, e 82,1, propor a presente Acão Civil Pública com Pedido de Liminar em desproveito de Indústria e Comércio de Café Patrícia Ltda, pessoa jurídica de direito privado, registrada no CNPJ sob o n. 02.203204/0001-90, estabelecida na avenida Goiás, 170-B, bairro Carrilho, Goianésia-GO, representada legalmente por Luiz Balbino Vieira, brasileiro, comerciante, portador da cédula de identidade n. 121946-SIC-GO, registrado no CPF/MF sob o n. 088.972.801-10, e por Paulo Balbino Vieira, brasileiro, comerciante, portador da cédula de identidade n. 688.893-SSP-GO, registrado no CPF/MF sob o n. 302.366.271-87, ambos residentes e domiciliados na avenida Goiás, 170, bairro Carrilho, em Goianésia-GO, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas. 1. Fatos No dia 05 de novembro de 2.007, a Curadoria do Consumidor da comarca de Goianésia, ora requerente, determinou a abertura

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EXCELENTÍSSIMO I U I Z

DAS VARAS DA O

MINISTÉRIO PUBLICO

ÍNDU3TR1A E. COMERCIO uW CAFÉ P

O Ministério Público Estadual, por seu promotor deJustiça, vem, respeitosamente, nos termos da Constituição da República,artigo 129, III, e da Lei Federal n. 8.078/90, artigos 81, parágrafo único, I, e82,1, propor a presente

Acão Civil Pública com Pedido de Liminar

em desproveito de Indústria e Comércio de Café Patrícia Ltda, pessoajurídica de direito privado, registrada no CNPJ sob o n. 02.203204/0001-90,estabelecida na avenida Goiás, 170-B, bairro Carrilho, Goianésia-GO,representada legalmente por Luiz Balbino Vieira, brasileiro, comerciante,portador da cédula de identidade n. 121946-SIC-GO, registrado no CPF/MFsob o n. 088.972.801-10, e por Paulo Balbino Vieira, brasileiro, comerciante,portador da cédula de identidade n. 688.893-SSP-GO, registrado no CPF/MFsob o n. 302.366.271-87, ambos residentes e domiciliados na avenida Goiás,170, bairro Carrilho, em Goianésia-GO, pelas razões de fato e de direito aseguir aduzidas.

1. Fatos

No dia 05 de novembro de 2.007, a Curadoria doConsumidor da comarca de Goianésia, ora requerente, determinou a abertura

de procedimento administrativo (fls. 1/2), avista de expediente remetido pelaAssociação BrasiVeira da Indústria do Café - ABIC (fl. 4), segundo o qual aempresa requerida estava a comercializar o produto café torrado e moídoapresentando impurezas e em desacordo com a legislação pertinente.

Como consta, a empresa requerida é responsável pelobeneficiamento e comercialização dos produtos de marca "Café Goianésia" e"Café Patrícia'1, e neles mistura impurezas, como cascas e paus de árvores(documento de fl. 4).

De acordo com o laudo feito a pedido da ABIC, aempresa requerida introduzia em seu produto cascas e paus na proporção de2% do peso total da embalagem.

Tencionando ensejar oportunidade de regularização deseu comportamento, o requerente notificou a requerida a se defender dasimputações inicialmente tributadas (fl. 14/14 verso), mas esta não se dignoufazê-lo. quedando-se silente,

Na sequência, observa-se novo laudo, igualmente feito apedido da ABIC (fl. 3). Neste, o índice de cascas e paus misturados ao pó decafé aumentou para 5,5%.

A seguir, nota-se a interferência do PROCON Municipalno caso, o que, convenhamos, raramente ocorre. Pretextando desempenhar suamissão legal, o PROCON, por seu diretor, celebrou com a requerida termo deajustamento de conduta, por meio do qual esta contraiu a obrigação derecolher seus produtos, enquanto sua composição não fosse regularizada (fls.28/30).

Algum tempo depois, o mesmo PROCON municipal fezjuntar aos autos uma fotocópia de má qualidade de um laudo que teria sidofeito a pedido da ABIC, o qual concluiu que requerida teria reduzido a níveisinsignificantes a quantidade de paus e cascas da composição de seus produtos

(fl. 33), levando Ministério Público, num primeiro momento, a determinar oarquivamento do procedimento (fls. 36/37).

Ocorre que, alguns dias após, e antes de o procedimentoser remetido, para os fins da Lei Federal n. 7.347/85, artigo 9°, § 1°, aoConselho Superior do Ministério Público, a Curadoria do Consumidorrecebeu nova documentação, desta feita da lavra da Superintendência Estadualde Vigilância Sanitária e Ambiental, que também examinou os produtosvendidos pela requerida. Desta vez, foram detectados em sua composição apresença de coliformes a 45° acima do limite permitido (fls. 40, 43), e cascase paus na proporção de 3,71%, razão pela qual foi revogada a promoção dearquivamento (fl. 39).

Por mesmo motivo, a requerida passou a responder aprocesso administrativo (fls. 40/48) perante a Secretaria Estadual da Saúde e,surpreendentemente, sua defesa foi patrocinada pelo diretor do PROCONMunicipal (fls. 56/65 e 71/76). Ato de improbidade administrativa que levouesta Promotoria a recomendar ao prefeito municipal a exoneração do diretordo PROCON e a determinar a remessa de cópia do procedimento ao órgão doMinistério Público com competência para a defesa do património público(fls. 95/96 e 98/100).

Outrossim, determinou-se a realização de contraprova, acargo da Superintendência Estadual de Vigilância Sanitária, tendo esta,novamente, detectado quantidade de paus e de cascas em proporção superior àtolerável (fls. 107/113).

A toda evidência, a requerida, podendo, no prazosuperior a um ano, ajustar seu comportamento, de molde a não ferir alegislação de regência, não o fez, insistindo em manufaturar e comercializarprodutos que contêm impurezas em sua composição, não sobejandoalternativa outra ao Ministério Público senão provocar o Poder Judiciário, aointento de salvaguardar os interesses da coletividade de consumidores destacomarca

2. Fundamentos jurídicos

2.1. Ofensa ao direito de informação do consumidor

Nos termos do Código de Defesa do Consumidor, artigo6°, III, consubstancia direito básico do consumidor "a informação adequada eclara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta dequantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobreos riscos que apresentem".

Trata-se, sem dúvida alguma, do dever de informarbem o público consumidor sobre as característicasimportantes de produtos e serviços, para queaquele possa adquirir produtos, ou contratarserviços, sabendo exatamente o que poderá esperardeles.'

Regra olvidada pela requerida, que se abstém de noticiarao consumidor que, juntamente com o café, irá consumir cascas e paus, comoelementos de sua composição.

2.2. Impropriedade ao consumo do produto beneficiado pela requerida

Estipula o Código de Defesa do Consumidor, artigo l 8, §6°, II, que são inapropriados ao consumo os produtos deteriorados, alterados,adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vidaou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normasregulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação.

Exatamente como sucede na espécie em testilha.

De fato, adicionando paus e cascas no café, a requeridapromove a adulteração do café torrado e moído, nele introduzindo elementos

José Geraldo Brito Filomeno ei ai. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelosAutores do Anteprojeto. Rio: Forense Universitária. 2001, p. 125.

estranhos, sem que disso dê ciência aos consumidores, que adquirem oproduto pensando se tratar de café puro.

Não se perca de vista que o acréscimo de paus e cascasno café representa desmazelo da requerida com o teor da Resolução deDiretoria Colegiada n. 277, de 22 de setembro de 2005, da Agência Nacionalde Vigilância Sanitária, que admite, em sua constituição, além do grãobeneficiado do fruto maduro de espécies do género Coffea, apenas aroma eresquícios do próprio endosperma (item 2. l).

Com isso, bem se observa que o produto beneficiado ecomercializado pela requerida apresenta-se em desacordo com as normasregulamentares de fabricação. Mais um motivo para ser reputado impróprio aoconsumo.

Como corolário lógico, o próprio Código de Defesa doConsumidor, artigo 39, VIII, peremptoriamente proíbe que se coloque, nomercado de consumo, qualquer produto em desacordo com as normasexpedidas pelos órgãos oficiais competentes, recebendo tal conduta o rótulode prática abusiva.

2.3. Obrigação da requerida de indenizar, independentemente de culpa -responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos

O artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor, emseu capuf, anuncia que "O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ouestrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência deculpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitosdecorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas,manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem comopor informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos1'.

Desenganadamente, acolheu o Código a teoria daresponsabilidade objetiva, bastando, para que exsurja a obrigação deindenizar, o concurso de três eventos, a saber, o defeito do produto - radicadona ausência de segurança ofertada aos consumidores, que consomem paus e

cascas, junto ao café, fato que, em última análise, representa riscos à saúde -,o evento danoso - os prejuízos de que são vítimas os consumidores dosprodutos da requerida -, e o nexo causal havido entre o defeito do produto e oresultado lesivo, que é manifesto no caso em comento.

Não se pode ignorar, porém, que os lesados são, naexpressão cunhada por NELSON NFRY JÚNIOR e ROSA MARIA nr. ANDRADE NHRY.pessoas indeterminadas? e que o dano experimentado por cada consumidorque adquiriu o produto manufaturado pela requerida é de pequena dimensão,desestimulando os interessados a intervirem no processo, na condição delitisconsortes.

Para contemplar situações assim, o Código de Defesa doConsumidor, artigo 100, importou da jurisprudência norteamericana oinstitituto da fluid recovery, pelo qual, mesmo que colelivo, o dano aoconsumidor é indenizável e deve ser reparado de forma integral.

A esse respeito, cumpre reproduzir o inexcedívelmagistério ministrado por ADA PELLEGRINI GRINOVER:

Todavia, o legislador brasileiro não descartou ahipótese de a sentença condcnatória não vir a serobjeto de liquidação pelas vítimas, ou então de osinteressados que se habilitarem serem em númeroincompatível com a gravidade do dano. A hipóteseé comum no campo das relações de consumo,quando se trate de danos insignificantes em suaindividualidade mas ponderáveis no conjunto:imagine-se, por exemplo, o caso de venda deproduto cujo peso ou quantidade não correspondaaos equivalentes ao preço cobrado. O danoglobalmente causado pode ser considerável, masde pouca ou nenhuma importância o prejuízosofrido por eada consumidor lesado. Foi para

2 Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: RT. 1999. p. 1805.

casos como esse que o capul do art. 100 previu afluid recovery?

Nessa conformidade, em não havendo habilitações deinteressados, ou sendo estas em número incompatível com a gravidade dodano, resulta índefectível a obrigação que tem a requerida de indenizar acoletividade de consumidores lesada por sua prática comercial abusiva,indenização esta que, nos exatos termos do Código de Defesa doConsumidor, artigo 100, parágrafo único, poderá ser revertida ao Fundocriado pela Lei Federal n. 7.347/85.

3. Pedido de antecipação de tutela

Além do poder geral de cautela que a iei processual lheconfere (Código de Processo Civil, artigos 798 e 799), o Código de Defesa doConsumidor, iluminado pelo escopo de conferir maior efetividade àjurisdição, dispensando pedido do autor e excepcionando, assim, o princípiodispositivo, autoriza o magistrado a antecipar o provimento final,liminarmente, e a determinar de imediato medidas satisfativas ou queassegurem o resultado prático da obrigação a ser cumprida (artigo 84, § 3°),tais como a busca e apreensão (artigo 84, § 5°).

In casu, é premente a necessidade de concessão demedida liminar com esse conteúdo inovador, para compelir a requerida aajustar seu comportamento ao ordenamento jurídico, máxime à disciplinaprotetiva insculpida no Código de Defesa do Consumidor, na exata medida emque estão perfeitamente caracterizados os seus pressupostos, quais sejam: ofumus bom júris e opericulum m mora.

Na espécie, há prova inequívoca dos fatos alegados,hospedada nas inclusas peças de informação, mormente os documentos -dotados de fé pública - de fls. 43/48, e 107/113, confeccionados pelaSecretaria Estadual da Saúde, segundo os quais o produto fornecido pelarequerida contêm impurezas, sem que tal circunstância seja levada ao

3 Ob. cit., p. 823.

conhecimento dos consumidores.

Por outro lado, não é razoável exigír-se que acoletividade fique exposta, até o provimento jurisdicional definitivo, aosefeitos deletérios já mencionados, dos quais decorrem sérios riscos quanto aosresultados úteis da presente demanda.

Com efeito, não se pode tolerar que a requeridapermaneça a vender, impunemente, produtos alimentícios em atrito comlegislação vigente e com padrões definidos pelos órgàos de defesa sanitária, asaber, a Superintendência Estadual de Vigilância Sanitária e a AgênciaNacional de Vigilância Sanitária, prejudicando irremediavelmente as pessoasque, ingenuamente, consomem esse produtos.

Desse modo, presentes à saciedade os requisitos do artigo273 do Código de Processo Civil e do artigo 84, §§ 3° e 5°, do Código deDefesa do Consumidor, o Ministério Público requer sejam antecipados osefeitos da tutela pretendida para:

• determinar à requerida que interrompa a comercialização dosprodutos que beneficia, enquanto não comprovar, por meio delaudo idóneo produzido por órgão de vigilância sanitária federalou estadual, que os mesmos não contêm impurezas, como cascase paus. em sua constituição;

• determinar a apreensão dos produtos fabricados pela requerida,expostos à venda nos estabelecimentos comerciais destacomarca, providência que pode ser desenvolvida pela VigilânciaSanitária e pelo PROCON municipais;

• nos termos da Lei Federal n. 8.078/90. aitigo 84, § 4°, arbitrarmulta diária, para o caso de descumprimento da liminar deferida.

4. Pedido propriamente dito

Posto isso, o Ministério Público requer:

a) o recebimento da presente ação civil pública;

b) o deferimento da medida liminar, nos termos declinados no tópicopretérito;

c) a publicação do edital aludido no Código de Defesa do Consumidor, artigo94. para que terceiros interessados e a coletividade tenham conhecimento dademanda, de natureza erga omnes:

d) a citação da requerida, na forma do Código de Processo Civil, artigo 224,na pessoa de um de seus representantes legais, para que, se quiser, ofereçaresistência à pretensão;

e) a procedência da pretensão para:

• cominar à requerida a obrigação de recolher dosestabelecimentos comerciais de venda no varejo ou atacadoprodutos de sua fabricação que estejam em desacordo com asnormas expedidas pelos órgãos oficiais competentes;

• cominar à requerida a obrigação de fazer, consistente emsomente colocar no mercado de consumo produtos que estejamde acordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiaiscompetentes;

• cominar à requerida a obrigação de não fazer, consisíenle cm seabster de introduzir impurezas no café por ela produzida,máxime paus e cascas de árvores;

• nos termos do Código de Defesa do Consumidor, artigos 95 e 97.condenar a requerida a ressarcir os danos morais e patrimoniaisque seu produto impróprio ao consumo causou às pessoas queporventura venham a se habilitar para intervir no processo comolitisconsortes (artigo 94);

• condenar a requerida ao pagamento de indenização àcoletividade de consumidores, quantia que será depositada noFundo de que trata a Lei Federal n. 7.347/85, artigo 13 (ou outraentidade designada pelo Juízo), na hipótese de decurso do prazo

de um ano sem habilitação de interessados em númerocompatível com a gravidade do dano (Código de Defesa doConsumidor, artigo 100);

• condenar a requerida ao pagamento de multa diária, em valor aser estabelecido pelo Juízo, devida se, ao término do prazofixado na sentença, suceder inadimplemento das obrigaçõesjudicialmente cominadas, quantia sujeita a correçào monetária,desde a distribuição da petição inicial até o efetivo pagamento, edestinada ao fundo de que trata o artigo 13 da Lei Federal n.7.347/85 (ou outra entidade designada pelo Juízo);

• condenar a requerida ao pagamento das custas e despesasprocessuais;

i) a produção das provas que se fizerem necessárias, nomeadamente odepoimento pessoal dos representantes legais da requerida, ajuntada posteriorde documentos, a oitiva de testemunhas, e a realização de perícias.

Nos termos do Código de Processo Civil, artigo 258, dá-se à causa ovalor de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais).

Pede deferimento.

Goianésia, 10 de março de 2009.

Arthur José Jacon Matiaspromotor de Justiça