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4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE FORMOSA/GO Rua Emílio Póvoa, n.º 70, Edifício Itiquira, Centro, Formosa/GO CEP 73.801-280 Fone/Fax: (61) 3631-7787 e/ou 3631-3386 Fórum: (61) 3631-7705 EXECELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DE FORMOSA/GO. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por seu representante infra-assinado, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, vem à presença de V. Exa., com fundamento nos arts. 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal; art. 25, inciso IV, letra a, da Lei 8.625, de 12.02.93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), combinado com o art. 1°, inciso II, art. 5°, caput, da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), Lei Federal n° 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e demais dispositivos legais aplicáveis à espécie, aforar a presente: AÇÃO CIVIL PÚBLICA c/c OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER, contra: ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público interno, inscrita no CNPJ com nº 01.409.580/001-38, na Pessoa do Excelentíssimo Senhor Governador Marconi Ferreira Perillo Júnior, representado pelo Procurador- Geral do Estado Alexandre Eduardo Felipe Tocantins, com sede no Palácio Pedro Ludovico Teixeira – Rua 82, S/N Setor Sul, CEP: 74088-900, Goiânia/GO, pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos:

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4ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE FORMOSA/GO Rua Emílio Póvoa, n.º 70, Edifício Itiquira, Centro, Formosa/GO CEP 73.801-280

Fone/Fax: (61) 3631-7787 e/ou 3631-3386 Fórum: (61) 3631-7705

EXECELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DE FORMOSA/GO.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por seu representante infra-assinado, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, vem à presença de V. Exa., com fundamento nos arts. 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal; art. 25, inciso IV, letra a, da Lei 8.625, de 12.02.93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), combinado com o art. 1°, inciso II, art. 5°, caput, da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), Lei Federal n° 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e demais dispositivos legais aplicáveis à espécie, aforar a presente:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA c/c OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER, contra:

ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público interno, inscrita no CNPJ com nº 01.409.580/001-38, na Pessoa do Excelentíssimo Senhor Governador Marconi Ferreira Perillo Júnior, representado pelo Procurador-Geral do Estado Alexandre Eduardo Felipe Tocantins, com sede no Palácio Pedro Ludovico Teixeira – Rua 82, S/N Setor Sul, CEP: 74088-900, Goiânia/GO, pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos:

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I - DOS FATOS:

No dia 15 de janeiro de 2014, chegou ao conhecimento da 4ª Promotoria de Justiça, por meio do ofício nº. 0516/2014/1AVCIJ, oriundo da Vara da Infância e Juventude, informações noticiando a ocorrência, no dia 11 de janeiro de 2014, de motim e incêndio nas dependências do Centro de Atendimento Socioeducativo (CASE) de Formosa-GO provocados pelos adolescentes que cumpriam medida socioeducativa no local.

No plantão do dia 11 de janeiro de 2014, conforme ATA do CASE, a Ala “A” colocou fogo em colchões e lençóis, produzindo efeito dominó que se alastrou na dispersão do foco para as Alas “B” e “C”. Na madrugado do dia 12 de janeiro de 2014, estive pessoalmente no local, sendo desde logo observado o risco à saúde dos adolescentes, pois o cheiro da fumaça tóxica ainda impregnava as paredes e teto chamuscados pelo fogo, bem como foi verificada a fragilidade do sistema de combate a incêndio, haja vista que, quando da intercorrência do incêndio na Ala “B” foram utilizados todos extintores de incêndio, sendo que este foco foi precedido pelo incêndio na Ala “A” e sucedido pelo fogo que foi ateado nos colchões na Ala “C”, não havendo outra alternativa senão o concurso dos bombeiros para debelar o fogo e entrar nas Alas.

Na ATA do CASE do plantão que se iniciou às 19h do dia 19 de janeiro de 2014 consta que a crise foi deflagrada porque os educadores desligaram os aparelhos de televisão à meia-noite como de rotina e foram surpreendidos pelo comportamento dos internos das Alas “A” e “B” que começaram a bater grade e colocar fogo nos colchões, sendo que o adolescente Diego Oliveira foi removido pelo SAMU depois de ter sofrido um ataque epilético cujo gatilho seria a intoxicação pela fumaça. O mesmo adolescente já havia sido removido para o Hospital Municipal na rebelião do dia 11 de janeiro de 2014 em razão de intoxicação pela fumaça. Na madrugada do dia 20 de janeiro de 2014, o clima de pertubação da ordem continuou e novamente foi queimado um outro colchão na Ala “A”, sendo que a intervenção da polícia militar foi solicitada porque alguns adolescentes tiveram que ser retirados dos alojamentos devido a falta de circulação de ar nos locais em houve foco de incêndio.

Na sequência, no dia 15/01/2014, o Ministério Público expediu ofício n°. 053/2014 ao Corpo de Bombeiros, requisitando a vistoria no CASE, a fim de averiguar a situação das condições dos equipamentos e materiais contra incêndio, uma vez que a unidade de internação havia informado que os educadores sociais não conseguiram cessar o fogo e controlar a dispersão da fumaça em decorrência da ausência ou deficiência dos materiais disponíveis.

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No mesmo sentido, foi expedido ofício nº. 044/2014 ao Coordenador de Apoio Técnico Pericial – CATEP, do Ministério Público, solicitando a realização de perícia no local, conforme procedimento anexo.

Em ambas vistorias foram apontadas diversas irregularidades e sugestões para adequação do local, a fim de evitar ou reduzir o risco de incêndio pelos motins provocados pelos adolescentes, cuja faísca inicial é gerada pela malfadada concepção de chuveiro elétrico e receptáculos das lâmpadas dispostas no interior dos alojamentos que permite que os adolescentes internados produzam curto circuito com a fiação, utilizando a bancada da pia como plataforma de apoio.

De acordo com a vistoria realizada pelo corpo de bombeiros, além da ausência de sinalização de locais e equipamentos, há a necessidade de modificação da localização de instalação dos hidrantes e colchões confeccionados com material antichamas e principalmente instalação de hidrantes nas Alas “D” e “E”, não servidas por esse tipo de dispositivo, para o enfrentamento com presteza de sinistros desse jaez, conforme documento anexo.

O laudo da vistoria realizada pela CATEP apontou, além da necessidade de revisão do local de instalação dos hidrantes e de aquisição de colchões antichamas, a necessidade de instalação de luminárias embutidas, instalação de sistema de aquecimento solar, instalação de hidrantes nas Alas “D” e “E”, pintura das paredes dos locais atingidos pelo incêndio, implantação de circuito fechado de televisão (CFTV), bem como aumento do quadro de servidores para monitorar de forma ininterrupta o interior das alas e respectiva movimentação de adolescentes internados para a escola, cursos profissionalizante, oficinas e visita familiar.

Outrossim, de nada adiantaria o aparelhamento de infraestrutura e pessoal do CASE, se ignorássemos as questões sociológicas e culturais subjacentes a essas crises. Durante a Inspeção Anual das Unidades de Internação realizada pela equipe técnica do Conselho Nacional do Ministério Público em 17/02/2014, foi apontado que os motins ocorridos no CASE foram provenientes de insatisfação dos adolescentes internados em local distante da residência de seus familiares, fato que dificulta ou impede o acesso e participação dos familiares nas visitas semanais realizadas na unidade, conforme se depreende do Relatório anexo.

No dia 09 de maio de 2014, pela manhã, procedemos a visita acompanhado de representantes da Comissão de Direitos Humanos da OAB/Formosa, tendo em vista pertubação da ordem envolvendo emprego de fogo nos colchões nas Alas “A”, “B” e “D”, ocorrida no dia anterior (quinta-feira), turno vespertino, em razão do início da greve dos servidores do CASE, supostamente estimulada pelo receio

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dela prejudicar o dia de visita que ocorreria na véspera, sempre às sextas-feiras. Quando então este Promotor comprometeu-se com os adolescentes internados no sentido de que eles não seriam prejudicados porquanto a falta eventual dos servidores seria suprida com o apoio da Polícia Militar. Em Luziânia, por esse mesmo motivo, o Centro de Internação foi virado pelo avesso diante do quadro de convulsão dos adolescentes irresignados com a possibilidade de suspensão do direito de visita por força da paralisação dos agentes de segurança e educadores sociais.

Nessa entrevista com os adolescentes amotinados, o Ministério Público reafirmou o compromisso de velar pelo direito à convivência familiar, não apenas no dia de visita, mas também em relação aos internos deslocados de sua Regional de origem, coletando as ATAS em que houve incidentes semelhantes àquele para promover as medidas judiciais cabíveis, conforme orienta a Resolução CNMP nº 97/2013, que alterou o artigo 2º da Resolução nº 67, de 16 de março de 2011, doravante postuladas nesta ação. Evidentemente que a reação da Curadoria da Infância não se baseou em um fato isolado, mas na sucessão de incidentes em intervalos cada vez menores que vem convulsionando o CASE de Formosa paralelamente à constância do influxo de adolescentes não pertencentes à Regional.

Acrescente-se que a teor do ofício nº. 225/2014 do CASE, datado de 20 de maio de 2014, em resposta ao ofício nº. 140/2014 desta Promotoria, a Coordenação Geral da Unidade de Formosa chegou às mesmas conclusões, procedendo a um detalhado retrato do perfil criminológico de adolescentes internados, ponderando os riscos, segundo uma análise retrospectiva, da maior incidência de motins desde que o fluxo de adolescentes infratores desvinculados da Regional se tornou intermitente, senão perene (basta observar que foram mobilizados 10 adolescentes internados durante a última grande rebelião no Centro de Internação em Goiânia e transferidos, sem aviso prévio, ainda de madrugada, para a Unidade de Formosa antes das crises relatadas), disseminando uma subcultura delinquente que não existia até então.

Importante ressaltar que tem sido rotineira a não observância do Provimento nº. 05, de 14/06/2013 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de Goiás por parte dos gestores da Secretaria Estadual de Cidadania e Trabalho ao encaminhar adolescentes provenientes de cidades não abrangidas pelo Polo de Formosa, em total desencontro com o previsto no art. 29, IV, 4.1, do Provimento citado, fato que contribui para o acirramento dos ânimos e demonstração de insatisfação pelos internos por meio de motim e prática de incêndio, como retaliação à privação do direito de visitas e do direito de estar na companhia dos familiares.

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Durante a inspeção realizada pela equipe técnica do Conselho Nacional do Ministério Público, a diversidade de adolescentes é um dos fatores criminógenos que coloca em risco a segurança dos servidores, funcionários e dos próprios internos, conforme relato abaixo:

“De modo geral, apontou-se que o grande número de adolescentes vindo de diferentes partes do Estado e o pequeno contingente de funcionários, somados à falta de monitoramento por câmeras na Unidade, podem ser um fator risco para a segurança dos adolescentes e servidores da instituição (...)”.

Em razão do que mencionamos acima Formosa se tornou o desaguadouro de adolescentes de todo o Estado. Isto é, a Unidade de Formosa, não atende exclusivamente a demanda da Região Nordeste, já que as vagas estão ocupadas por adolescentes de outras Regionais, inclusive ocupadas por adolescentes de Regionais em que existem unidades de internação instaladas, mas com interdição de vagas, a exemplo de Luziânia.

Logo, em decorrência dessas insurgências, aliada a precariedade das instalações do CASE, a frequência da incidência de incêndio, motivada, não raro, pela restrição geográfica para o exercício do direito de convivência familiar, produzindo fogo e fumaça, que logo se propaga no local, torna os amotinados mais vulneráveis à asfixia e intoxicação. ao mesmo tempo em que aumenta a hostilidade contra a categoria de menores conhecida por oprimidos, normalmente subjugados pelos adolescentes não pertencentes à Regional de Formosa, cuja personalidade e perfil de atos infracionais cometidos lhes conferem ascendência sobre os demais como porta vozes privilegiados da moral do ambiente carcerário, pois ao mesmo tempo que são rejeitados e estigmatizados pela regional de origem, internamente seu prestígio é mensurado pela subcultura delinquente, levando ao paradoxo do sistema de controle e desvio funcionar como fator criminógeno.

Os chamados (adolescente internados) oprimidos são obrigados a ceder os respectivos colchões para servirem de combustível nas rebeliões coletivas incendiárias. Como se não bastasse o agravamento da pertubação endógena da ordem, essas crises tornam-se cíclicas porque a legitimação da classe de oprimidos, tal como ocorre no sistema carcerário, revela-se sob o pressuposto de opressão dos novos egressos no CASE pelos outrora oprimidos, doravante veteranos no cumprimento de medida socioeducativa de internação, cujo status é medido e definido pelos critérios da subcultura delinquente dominante, imune a qualquer pauta axiológica de conformidade com padrões sociais. Essas mazelas do sistema socioeducativo tendem a se perpetuar de forma consciente ou inconsciente por força da internalização da cultura marginal em que os adolescentes internados passam a se identificar com as expectativas de

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comportamento do grupo, ou seja, interagindo com o rótulo de oprimidos e opressores (role-engulfment).

O cerne da teoria da subcultura criminal reside não só na análise das formas de aprendizado, mas também da dependência dessa aprendizagem das várias associações diferenciais que o indivíduo estabelece com grupos e outros indivíduos. O comportamento aberrante1 não é muito diferente dos modelos que geram e mantêm o comportamento conforme as normas sociais, à medida que constitui um comportamento aprendido e adquirido, em grande parte, na interação com outros indivíduos.2 Esse aprendizado ocorre por meio de um mecanismo de reação-formação (reaction-formation) que leva o indivíduo a adotar atitudes de hostilidade em relação àqueles que não compartilham a subcultura para afirmar seu status.3 Como a concessão de status ao delinquente remete a um critério que só vale para os outros se eles estiverem reciprocamente preparados para serem reconhecidos pelas mesmas atitudes, ele se torna cada vez mais dependente do grupo.4

Essa abordagem encara o comportamento aberrante como uma atitude evasiva do indivíduo em relação à sociedade, degradada a cultura tradicional dos excluídos à visão subcultural, isto é, não utilitária ou hedonista, limitada à expressão de desconformidade – negativismo e rechaço da sociedade dominante, ressaltando o niilismo desses grupos sociais: signos elípticos e sem referência cuja lógica não é a da mediação, mas a da imediatez que faz com que esse padrão de comportamento seja tão sedutor.5 A malícia (malice) aparece ínsita ao ato como motivação da subcultura delinquente, em que se busca o prestígio e se foge do isolamento ou do opróbio por meio de atitudes refratárias e versáteis ao repositório de normas da sociedade.6

A recorrência dessas manifestações coletivas de vandalismo fazem com que os educadores sociais tenham que empregar força física para contenção da situação e remanejamento dos adolescentes para outras alas da unidade de internação ainda não comprometidas pela desordem que, por sua vez, tornam-se alvo da próxima rebelião à proporção que o prestígio do adolescente privado de liberdade passa ser aferido em conformidade com o grau de ousadia da transgressão e não pelo comportamento resignado, por isso a violência da repressão apenas retroalimenta o

1 Cohen compreende como comportamento aberrante não apenas o crime e a delinqüência, mas qualquer comportamento que infrinja regras amplamente aceitas de conduta. Por isso, a terminologia foi preservada no texto. (COHEN, Albert K. In: PARSONS, Talcott (Org.). A sociologia americana, p. 277.

2 COHEN, Albert K. In: PARSONS, Talcott (Org.). A sociologia americana, p. 277. 3 COHEN, Albert K. Delinquent boys, p. 137.4 COHEN, Albert K. Delinquent boys, p. 136-137.5 […] la logique n’est pas celle de la mediation, mais celle de l’immédiateté de tout signe [...].

(BAUDRILLARD, Jean. De la sédution, p. 106.) 6 COHEN, Albert K. Delinquent boys, p. 27-29.

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ambiente cultural criminológico, conferindo status aos pivôs das rebeliões sob a ótica do grupo de adolescentes em conflito com a lei.

Segundo Gresham M. Sykes e David Matza, enquanto o indivíduo está supostamente comprometido com o sistema aberrante da subcultura delinqüente, ele reconhece a legitimidade e a validade moral do sistema normativo dominante em muitas instâncias.7 Ocorre que essas normas que fundamentam a sociedade não tomam a forma de imperativo categórico, comparecendo como orientações qualificadas para a ação cuja aplicação é limitada em termos de tempo, lugar, indivíduo e circunstâncias sociais, como se fossem extensões, não reconhecidas pela lei, do rol das causas justificantes do delito.8

Nesse sentido, ainda sob o pano de fundo da teoria criminológica da subcultura delinquente, qualquer pretexto, supostamente baseado em valores morais, se torna argumento para rebeliões, sendo que a justificativa para a última rebelião foi “solidariedade” para com os amotinados no CASE de Luziânia; a anterior foi atribuída ao educador que exigiu o cumprimento da rotina, determinando o desligamento dos aparelhos de televisão, o que afinal rendeu acusações, concertadas ou não, contra os educadores de abuso de toda sorte, deixando-os vulneráveis e acionando o estopim da reação coordenada dos amotinados; já, outras insurreições pretéritas, ocorridas no ano de 2013, foram atribuídas à greve dos servidores do CASE que suspendeu episodicamente a visita, nesse caso a regra moral quanto ao prejuízo do exercício do direito de convivência apenas se revelou legítima para os adolescentes vinculados à Regional, mas na maioria das vezes os adolescentes, como os pertencentes a outras Regionais, privados de qualquer modo do convívio familiar, dela se apropriam como justificativa para desempenhar transgressões, seja com o propósito de angariar prestígio junto ao grupo de cujo reconhecimento dependem para ascensão da categoria de oprimidos para opressores, seja para manterem o status de opressores conforme os escalões na hierarquia definida pela subcultura delinquente que viceja dentro das Unidades de Internação.

Assim, sucessivamente, tanto a resiliência da já combalida estrutura arquitetônica do CASE, recuperada sempre de forma paliativa para atender a crescente demanda de vagas de internação, vinda de fora da comarca-polo, como a serenidade do quadro de servidores da unidade, cuja moral e autoestima são depreciadas pelo discurso de supostos abusos, absolutamente contornável com o monitoramento de câmaras, vem sendo progressivamente minadas.

7 SYKES, Gresham M.; MATZA, David. In: WOLGANG, Marvin E.; SAVITZ, Leonard; JOHNSTON, Norman (Coord.). The sociology of crime and delinquency, p. 293.

8 SYKES, Gresham M.; MATZA, David. In: WOLGANG, Marvin E.; SAVITZ, Leonard; JOHNSTON, Norman (Coord.). The sociology of crime and delinquency, p. 295.

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II – LEGITIMIDADE ATIVA

Estabelece a Constituição Federal de 1988, competir ao Ministério Público a defesa de diversos direitos e interesses, dentre os quais os sociais e individuais indisponíveis.

“Art. 127 - O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”

A legitimidade do Ministério Público para promover ação civil pública em defesa de interesses coletivos é indeclinável, nos exatos termos dos dispositivos localizados nos artigos 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal.

A Legislação infraconstitucional dá ao Ministério Público legitimidade para propor ação em diversas esferas, a exemplo da proteção ao meio ambiente, ao consumidor, ao idoso, ao portador de necessidades especiais, ao patrimônio público, e também a CRIANÇA E AO ADOLESCENTE, como se percebe da leitura do Estatuto da Criança e do Adolescente:

“Art. 201. Compete ao Ministério Público:V – promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no art. 220, §3º inciso II, da Constituição Federal;”

Diz ainda o Estatuto da Criança e do Adolescente:

“Art. 210. Para as ações cíveis fundadas em interesses coletivos ou difusos, consideram-se legitimados concorrentemente: I - o Ministério Público;”

Segundo ainda a Resolução CNMP nº 97/2013, que alterou o artigo 2º da Resolução nº 67, de 16 de março de 2011, caberá ao Ministério Público verificar as condições das unidades socioeducativas de internação e semiliberdade, durante as inspeções bimestrais e anual, cujo relatório conterá dados sobre:

I. classificação, instalações físicas, recursos humanos, capacidade e ocupação da unidade

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inspecionada;II. perfil dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, assistência,atividades pedagógicas e educacionais e observância dos direitos fundamentais dos socioeducandos;III. medidas administrativas e judiciais adotadas para a promoção do funcionamento adequado da unidade socioeducativa;IV. considerações gerais e outros dados reputados relevantes.

Ora, à medida que o direito fundamental à convivência é sistematicamente violado pelo cumprimento da medida de internação fora da Regional a que se vincula o adolescente infrator, fragiliza-se o protagonismo da família no processo de ressocialização, que concorre para a elaboração do PIA (Plano Individual de Atendimento), documento de registro e acompanhamento da execução da medida de privação de liberdade, como baliza necessária para “a promoção do funcionamento adequado da unidade socioeducativa”, nos termos do art. 52 e segs. da Lei nº 12.594/2012. Confira-se o eixo metodológico da Lei nº. 12.594/2012:

Art. 1. Esta Lei institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) e regulamenta a execução das medidas destinadas a adolescente que pratique ato infracional. § 2o Entendem-se por medidas socioeducativas as previstas no art. 112 da Lei n o 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), as quais têm por objetivos: I – omissis ...; II - a integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais, por meio do cumprimento de seu plano individual de atendimento;III – omissis ...;

§ 3o Entendem-se por programa de atendimento a organização e o funcionamento, por unidade, das condições necessárias para o cumprimento das medidas socioeducativas.

Portanto, não resta dúvida da legitimidade ativa do Ministério Público para defender direitos e interesses de crianças e adolescentes, nesta hipótese, de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de INTERNAÇÃO nas Unidades de Formosa/CASE, direito a um ambiente que não esteja superlotado e com instalações seguras.

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III - COMPETÊNCIA

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que para as ações em que são defendidos interesses e direitos de crianças e adolescentes, difusos ou coletivos, a competência absoluta é da JUSTIÇA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE, do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão.

“Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para:(...);IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209;”V - conhecer de ações decorrentes de irregularidades em entidades de atendimento, aplicando-se as medidas cabíveis;(...)".

Sendo assim, a presente ação deve tramitar perante a Justiça da Infância e Juventude. Existem duas Varas no Juízo da Infância e Juventude, uma destinada a causas cíveis e procedimentos administrativos afins, e outra para causas infracionais e procedimentos administrativos afins. A presente ação deve tramitar perante a Vara destinada a causas cíveis, até porque, trata-se de ação de natureza cível. Entretanto, considerando que o juízo infracional é responsável pela inspeção e fiscalização das Unidades de Internação, com maior proximidade com o tema, maior conhecimento dos sucessos e das barreiras do processo socioeducativo, deveria ser o competente para conhecer o processo e julgá-lo.

Da mesma forma, a presente ação não deverá ser processada pelo juízo da Vara da Fazenda Pública, com atribuição para conhecimento de ações que envolvam os entes federados, e neste caso o Estado de Goiás, por ser tratar de vara com procedimento especial e moroso.

Sendo assim, requer seja declinada a competência pelo juízo da Infância e Juventude por afinidade da matéria com o órgão julgador.

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IV - DO DIREITO:

De acordo com o Provimento nº 05, de 14 de junho de 2013, que editou normas sobre a execução das medidas socioeducativas, houve uma distribuição de cidades a serem atendidas pelo polo de Formosa, levando-se em consideração as proximidades das cidades com a cidade polo, a fim de facilitar e viabilizar o cumprimento de medida socioeducativa pelos adolescentes em local mais próximo de sua residência ou de seus familiares, conforme informação abaixo:

"Art. 29. A gestão do sistema socioeducativo, com o estabelecimento de regionalização de comarcas pólos, dentro do Estado de Goiás, obedecerá a seguinte estruturação:(...)IV - REGIÃO NORDESTE - COMARCA POLO - FORMOSA 4.1 MUNICÍPIOS COMPONENTES: Água Fria de Goiás, Alto Paraíso de Goiás, Alvorada do Norte, Buritinópolis, Cabeceiras, Campos Belos, Cavalcante, Damianópolis, Divinópolis de Goiás, Flores de Goiás, Formosa, Guarani de Goiás, laciara, Mambai, Mimoso de Goiás, Monte Alegre de Goiás, Nova Roma, Padre Bernardo, Planaltina, Posse, São Domingos, São João D'Aliança, Simolândia, Sitio D'Abadia, Teresina de Goiás e Vila Boa".

Sobre gerenciamento do sistema de vagas, o provimento citado assim mencionou:

"Art. 14. Efetuada a solicitação de vaga, nos termos do art. 6º, o órgão gestor de atendimento socioeducativo, a Secretaria Estadual de Cidadania e Trabalho ou órgão estadual com específica atribuição, deverá, em 24 (vinte e quatro) horas, comunicar ao juízo de conhecimento a respectiva resposta.

§ 3o. O gestor responsável pelo gerenciamento das vagas do sistema regionalizado, deverá viabilizar a execução da medida preferencialmente na unidade mais próxima ao domicílio dos pais ou responsáveis pelo adolescente ".

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Tal disposição vem em consonância com o previsto nos artigos 124, VI, do Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 49, II, da Lei nº. 12.594/2012, respectivamente:

Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes: VI - permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável;

E ainda:

Art. 49. São direitos do adolescente submetido ao cumprimento de medida socioeducativa, sem prejuízo de outros previstos em lei: II - ser incluído em programa de meio aberto quando inexistir vaga para o cumprimento de medida de privação da liberdade, exceto nos casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa, quando o adolescente deverá ser internado em Unidade mais próxima de seu local de residência;

Todavia, o Estado de Goiás frequentemente deixa de observar a legislação, quando, por meio do órgão gestor - Secretaria de Cidadania e Trabalho -, encaminha adolescentes para cumprir medida socioeducativa de internação em polo de internação diverso do previsto no provimento, obstando o direito do adolescente de cumprir a medida em local mais próximo de sua residência, desviando do propósito originário da ideia de regionalização prevista no art. 88, I, do ECA que nasceu da dissociação do juízo de conhecimento e do juízo de execução.

Em cumprimento às novas diretrizes constantes dos arts. 24/25 da Resolução n.º 165/2012 do Conselho Nacional de Justiça, o Provimento CGJ n.º 12/2011 foi revogado pelo art. 35 do Provimento n.º 05, de 14 de junho de 2013, que passou regular prazos e forma de cumprimento das medidas mediante a expedição de Guias de Internação provisória e definitiva, abolindo o encaminhamento do adolescente infrator a outra comarca por carta precatória (art. 4º, § 5º .) afastando a possibilidade de ingresso do adolescente infrator pela mera apreensão por força do flagrante da autoridade policial (art. 4º).

Segundo ainda a dinâmica do Provimento CGJ n.º 05/2013, a Guia de Internação, provisória ou definitiva, deverá ser instruída pelo Juiz do Processo de Conhecimento com atestado acerca da existência da vaga no CASE, o

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qual caberá informar em 24 horas a disponibilidade da vaga, devendo o adolescente ser encaminhado sucessivamente no prazo de 24 horas, sob pena de perda da vaga eventualmente reservada pelo Órgão Gestor. Portanto, a exigência de Guias de Execução foi determinante para a gestão centralizada da existência de vagas para internação. Porém, em contrapartida fragilizou o sistema à medida que desviou os adolescentes apreendidos em flagrante para as repartições policiais cuja contingência exerce enorme pressão sobre os CASEs à medida que as reavaliações são antecipadas para acomodar essa demanda represada já que as unidades de internação operam sem nenhuma capacidade ociosa.

A brevidade dos prazos concorre com a regra prevista no art. 14,

§ 3º, do Provimento CGJ n.º 05/2013 que, ao estabelecer a preferência da execução da medida de internação ocorrer na unidade mais próxima do domicílio dos pais ou responsável pelo adolescente, na verdade criou um mecanismo engenhoso de multiplicar as vagas dos CASEs, muito além da abrangência do território das Comarcas-Polos, generalizando a exceção. Desde então Formosa-GO tornou-se a maior Unidade de Internação do Estado de Goiás, recebendo adolescentes em conflito com a lei de outras partes do Estado, chegando a suprimir a ala feminina para acomodar essa demanda, para, após a reforma, comprimi-la, a fim de atender a sobrecarga de demanda, doravante redimensionada, deixando de ser intermitente à medida que se tornou rotina o fluxo de adolescentes infratores pertencentes a outras regionais.

A consolidação dessa situação, que deveria ser absolutamente transitória, contraria os objetivos da Lei nº 12.594/2012 que elenca, como regra matriz e instrumental, “a integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais” (art. 1º, § 2º, II), dentre os quais ressaltamos que “o adolescente deverá ser internado em Unidade mais próxima de seu local de residência”. Por outro lado, a lei admite que, se inexistir a vaga para cumprimento da medida de privação de liberdade na unidade mais próxima do domicílio dos pais ou responsável, o adolescente deverá ser colocado em meio aberto (art. 49, II), cujo cumprimento ao menos atende a diretriz de municipalização, garantindo efetivamente os desígnios do modelo de cogestão em que a família se compromete no sucesso da medida socioeducativa à proporção que a lei fomenta sua participação na formulação e execução do Plano Individual de Atendimento do reeducando, priorizando a convivência familiar e comunitária como estratégia para reingresso à sociedade do adolescente internado (art. 53 e 54, IV).

Por outro lado, o funcionamento de um Centro de Atendimento Socioeducativo, que opera no limite de sua capacidade, como o de Formosa não é tão tranquila, sendo que do regular funcionamento dele depende a dinâmica do SINASE. A

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generalização da exceção, quando ela se torna regra, pode levá-lo ao colapso, sobretudo considerando que o remanejamento de adolescentes de outras regionais não decorre ordinariamente de rebeliões, mas antes atende à insuficiência de vagas/discricionariedade das respectivas regionais onde atos infracionais violentos foram cometidos por adolescentes de perfil agressivo, maior compleição física, contaminando, senão corrompendo, a proposta pedagógica e ambiente cultural da Unidade de Internação. Mesmo uma simples reforma na unidade de internação é precedida de medidas judiciais para compelir o Poder Público a executá-las e, mesmo depois de ser obrigado a fazê-la, como a que se iniciou no dia 10/07/2013, houve necessidade de pedido incidental cautelar na execução de obrigação de fazer para viabilizar a desocupação de alguns alojamentos para que a reforma fosse feita.

Por ocasião do referido pedido cautelar recebemos os Ofícios 196 e 197/2013 do CASE, de cujo teor obtivemos informação atualizada de que a unidade possui 77 (setenta e sete) de seus alojamentos ocupados por adolescentes do sexo masculino, já que em virtude da superlotação, os alojamentos da ala feminina foram cedidos para internação de adolescentes do sexo masculinos, impedindo a internação de adolescentes do sexo feminino, com consequente internação das mesmas nas Delegacias Regionais e, posterior, recambiamento para Goiânia. Ou seja, a redução do espaço destinada às adolescentes infratoras não foi para atender a demanda da regional de Formosa, mas para acomodar demanda externa. Sua posterior reabertura, após a reforma, com retração das vagas femininas como contraponto à expansão das vagas para adolescentes do sexo masculino, revela-se desnecessária se considerarmos o retrospecto de ocupação do CASE pelos adolescentes vinculados à Regional de Formosa e apenas confirma que a solução paliativa tem sido prestigiada em detrimento de novos investimentos e dos fundamentos epistemológicos do microssistema protetivo da infância e juventude.

O ofício nº. 225/2014 do CASE, ao fazer um diagnóstico da situação retratada, delineia o perfil dos internos bem como o ato infracional cometido, conforme sua origem e sua vinculação com a regional de Formosa, apresenta gráficos atualizados, para uma melhor visualização, de modo a demonstrar com maior clareza as distorções, compreendendo o período de 2013 a 2014, quando se inciaram atos de vandalismo com princípio de incêndio envolvendo internos veteranos e adolescentes oprimidos.

A engrenagem do SINASE não permite a existência de vagas ociosas, de forma que a saída de um adolescente é seguida do imediato ingresso de outro adolescente no CASE, porque, por força do disposto no artigo 4º, da Lei 12.594/2012, cabe à Secretaria de Cidadania e Trabalho a gestão e coordenação dos Centros de Internação até porque as repartições policiais utilizadas para os

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adolescentes apreendidos em flagrante não podem represar a demanda por mais do que 5 dias (ECA, art. 185, § 2º) . Ou seja, a absorção da demanda de outras Comarcas fora da Regional é uma realidade que concorre de forma conflituosa com a demanda vinculada à Regional de Formosa, porque as vagas do CASE já estarão ocupadas por outros adolescentes deslocados de outra Regional não permitindo brechas para a operação da unidade de internação na área de influência para a qual está vocacionado a funcionar.

Pois bem, durante o período de 2013, 49% dos adolescentes que cumpriram medida socioeducativa de internação em Formosa pertenciam a regionais diversas daquela abrangida pelo Provimento de nº 05/2013 da Corregedoria Geral de Justiça, conforme se depreende pelos gráficos abaixo.

Segundo o ofício citado, apenas 51% das vagas existentes no CASE estão sendo ocupadas por adolescentes que compõem a regional de Formosa, sendo que a lotação complementar é formada por adolescentes pertencentes a outras Regionais muito além da distribuição prevista no Provimento 05/2013 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Goiás, limitada à 28 municípios, conforme se depreende dos gráficos abaixo elaborados pelo CASE em percentagens de acordo com o perfil e origem dos internos. Observa-se que essa demanda inoficiosa do CASE não representa mais solução transitória, uma vez que a gestão do Sistema pelo Estado não permite a

51%

49%

Adolescentes recebidos por Regionais em 2013

Adolesc. que pertencem Regional de Formosa

Adolesc. que não pertencem Regional de Formosa

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existência de vagas ociosas, determinando seu funcionamento sempre no limite de sua lotação e rejeitando a demanda superveniente vinculada à Regional de Formosa para outras Regionais e, não raro, liberando o adolescente apreendido domiciliado nos municípios abrangidos pela comarca-polo por falta de vagas ou induzindo uma progressão inoportuna de adolescente internado no CASE para receber a demanda retida nas delegacias, normalmente por força da apreensão em flagrante, quando do vencimento do prazo de 5 dias, cuja manutenção revela-se muitas vezes prioritária, tendo em vista que o caráter pedagógico da internação provisória reside na consecutividade da sanção ao ato infracional.

O CASE de Formosa recebeu durante o ano de 2013, cerca de 93 adolescentes oriundos de outras Regionais, contemplando socioeducandos de diversas localidades e distâncias, das quais destacam-se Goiânia, Aparecida de Goiânia, Santo Antônio do Descoberto, Novo Gama, Luziânia, Valparaíso, Águas Lindas de Goiás, entre outras.

A idade dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação pertencentes a Regional de Formosa, varia entre 13 a 19 anos, com grande presença de socioeducandos de 16 a 18 anos de idade, normalmente de estatura mediana e baixa compleição física.

2% 5% 2%

67%

16%

2%

5%

1%

Adolesc. recebidos pelo CASE de Formosa por cidades que pertencem a Regional de Formosa GO em 2013

Padre Bernardo Posse Flores de Goiás Formosa

Planaltina Alvorada do Norte Alto Paraíso Campos Belos

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Já a idade dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação decorrentes de outras regionais que NÃO compõem a Regional conforme Provimento 05/2013 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Goiás, durante o período de 2013, varia entre 13 a 19 anos, com grande incidência na faixa-etária compreendida entre 15 a 18 anos, normalmente com maior porte e estatura físicos.

Em relação ao perfil dos adolescentes, de acordo com os dados constantes dos arquivos do centro de atendimento socioeducativo, cerca de 52% dos socioeducandos pertencentes a regional de Formosa incorreram na prática de ato infracional análogo ao crime de roubo, compreendendo a maior incidência; 15% tentativa de homicídio, 12% furto e 8% homicídio consumado.

2

19

41

18

11

1 1

19 anos 18 anos 17 anos 16 anos 15 anos 14 anos 13 anos

Número de dolescentes por idade acautelados no CASE de Formosa em 2013 que não pertencem a

regional

Idades dos adolescentes não pertencentes a Regional de Formosa internados em 2013.

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Vale lembrar que o índice de maior agressividade e conflitos persiste entre os adolescentes pertencentes a outras regionais, onde avulta histórico de atos infracionais cometidos com uso de violência devido ao engajamento em carreiras criminosas, cuja subcultura delinquente é alimentada pela dinâmica do SINASE que na mesma medida que recusa a manutenção do adolescente internado na regional de seu domicílio, estigmatiza-o, contradizendo não apenas suas próprias bases metodológicas como as diretrizes do Estatuto da Criança e do Adolescente que se esmera no sigilo como forma de preservar a incolumidade da esfera de desenvolvimento da personalidade do adolescentes livre da indiscrição alheia e rotulações de qualquer espécie.

15%

52%

12%

8%

1%

2%2% 3% 2%

2%

1%

Atos infracionais praticados por adolescentes pertencentes a regional de Fomosa GO em 2013.

Tentativa de Homicídio

Roubo

Furto

Homicídio

Tentativa de Latrocínio

Estupro

Traf. de Drogas e porte ilegal de armas de fogo

Tráfico de ilegal de drogas

Porte de arma de fogo

Tentativa de estupro

regressão

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A par do conhecimento dos dados compreendendo o período de outubro e dezembro de 2013, bem como, elucidado alguns dados inerentes ao referido ano, conveniente se faz esclarecer o perfil dos internos em relação ao ato infracional cometido, sua origem, e sua vinculação com a regional de Formosa durante o corrente ano, especificamente a partir do mês de janeiro até os dias atuais.

Tendo isso em vista, consta do mês de janeiro de 2014 até a presente data que apenas 44% dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa de internação no Centro de Atendimento Socioeducativo de Formosa-GO pertencem a regional de Formosa, e 56%, pertencem a regionais diversas daquela prevista pelo Provimento de nº 05 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Goiás, conforme se depreende pelos gráficos abaixo.

68%

16%

4%1% 3%

1% 2% 1% 3% 1%

Atos infracionais praticados por adolescentes que não pertencem a regional de Formosa GO internados no

CASE em 2013

Roubo

Homicídio

Tentativa de estupro

Roubo e homicídio

Estupro

Furto

Tentativa de homicídio

Prática de atos libidinosos

Tráfico de drogas

Homicídio e Fomação de Quadrilha

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A idade dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação decorrentes de outras regionais, durante o período de 2014, varia entre 13 a 18 anos, com grande incidência na faixa etária compreendida entre 15 a 17 anos, normalmente com grande porte físico e estatura elevada. Já o número de adolescentes pertencentes à regional de Formosa, varia entre 14 a 19 anos, com grande presença de socioeducandos de 14 a 17 anos de idade, normalmente de estatura mediana e baixa compleição física. Segue abaixo os gráficos demonstrativos referentes aos dados mencionados.

44%

56%

Adolescentes recebidos por Regionais em 2014

Adolesc. que pertencem a Regional de Formosa Adolesc. que não pertencem a Regional de Formosa

16%

68%

3%7%

3% 3%

Adolesc. recebidos por cidades que pertencem a regional de Formosa GO em 2014

Planaltina Formosa Cabeceiras Alto Paraíso Posse Padre Bernardo

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Referente ao perfil dos adolescentes inerente à gravidade do ato infracional cometido, durante o ano de 2014, consta dos arquivos do centro de atendimento socioeducativo, que cerca de 58% dos socioeducandos pertencentes a regional de Formosa incorreram na prática de ato infracional análogo ao crime de roubo, compreendendo a maior incidência; 16% em tentativa de homicídio, configurando em relação ao ano anterior um aumento de 1%; 03 % furto e 10% homicídio consumado, com aumento de 2% comparado ao ano anterior;

3

2010

4 2 1

18 anos 17 anos 16 anos 15 anos 14 anos 13 anos

Número de dolescentes por idade acautelados no CASE de Formosa em 2014 que não pertencem a

regional

Quantitativo por idades dos adolescentes não pertencentes a regional de Formosa internados em 2014.

19 anos 18 anos 17 anos 16 anos 15 anos 14 anos

13

9 10

4 4

Número de adolescentes por idade pertencentes a regional de Formosa GO acautelados no CASE em

2014

Quantitadivo dos adolescentes por idade pertencentes a regional de Formosa GO

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Não obstante, em relação aos adolescentes pertencentes a outras regionais, consta dos arquivos que 55% incorreram no ato infracional análogo ao crime de roubo; com significativo aumento em relação ao ano anterior, 22% cometeram atos infracionais análogos ao crime de homicídio consumado, 5% ato equivalente a estupro, 5% tráfico de drogas e entorpecentes e 8% tentativa de homicídio, conforme gráfico abaixo.

Imprescindível reforçar que o índice de maior agressividade e problemas persiste entre os adolescentes pertencentes a outras regionais, onde o numero de atos infracionais praticados mediante violência se revela significativamente elevado.

16%

58%

10%

4%

3% 3% 3%

3%

Atos infracionais praticados por adolescentes pertencentes a regional de Fomosa GO em 2014.

Tentativa de Homicídio

Roubo

homicídio

Estupro

Ameaça/homicídio

roubo/porte ilegal de arma de fogo

furto

tráfico de drogas

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Registre-se que o CASE, à vista dos dados acima, atualmente abriga aproximadamente metade dos adolescentes em conflito com a lei fora do âmbito da regional de Formosa e se nivela com esse quantitativo de internos às Comarcas do porte de Goiânia. A arquitetura monumental de sedes de CASE regionalizado, como o de Formosa, destinadas à demanda dos municípios que fazem parte da comarca-polo, não atende somente a 28 municípios, como se observou dos gráficos, mas progressivamente vem agregando à sua capacidade a demanda de outros municípios. Ou seja, muito além do que se imaginou e isso decorre tanto da dimensão espacial do CASE de Formosa como da gestão híbrida por parte da Secretaria de Cidadania e Trabalho e das Varas da Infância, conforme o novo marco regulatório inaugurado pela Lei nº 12.594/2012 e pelo Provimento CGJ n.º 05/2013.

A Constituição de 1988 consagrou o princípio da prioridade absoluta como direito fundamental da criança. No mesmo sentido, o ECA, no art. 4., identificou na prioridade absoluta quatro subprincípios, repetindo a norma de eficácia plena constante do art. 227 da Constituição e lhe dando densidade normativa:

2%

55%

5%

22%

8%5%

3%

Atos infracionais praticados por adolescentes que não pertencem a regional de Formosa GO

acautelados no CASE em 2014

Agressão e dano material

Roubo

Estupro

Homicídio

Tentativa de homicídio

Tráfico de drogas

Latrocínio

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Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Da fundamentalidade do princípio da prioridade absoluta decorrem o princípio da proibição da proteção insuficiente, que significa que ao Estado (Procuradoria Geral de Justiça) não é lícito atuar de forma deficiente na proteção e promoção de direitos fundamentais, e o princípio da proibição do retrocesso em matéria de direitos sociais, que implica uma obrigação negativa do Estado, no sentido de se abster de condutas que acarretem a supressão de normas e condutas anteriormente adotadas para a concretização de direitos fundamentais previstos na Constituição da República.

Portanto, postergar o investimento necessário para a instalação/ampliação de Centros de Internação, tornando o que era solução provisória em definitiva, implica esvaziamento do direito fundamental à convivência familiar e comunitária, eixo metodológico das medidas de internação, e contraria a regra literal do art. 4º do ECA, do qual também deflui o princípio da proibição de retrocesso na área social e correlata proibição de proteção insuficiente em matéria de tutela da infância, cuja urgência ficará comprometida.

Ou seja, a virtude da gestão compartilhada do SINASE permite que o Juiz de Execução cuide de todos os incidentes do cumprimento da medida socioeducativa de internação, podendo até mesmo, para contrabalançar a rigidez dos critérios da Secretaria de Cidadania e Trabalho, baseado apenas no critério cronológico de precedência dos pedidos de reserva de vagas dos Juízos dos Processos de Conhecimento, reavaliar os adolescentes internados, para “criar” vagas no CASE na medida em que a Lei 12.010/09 confere certa discricionariedade ao prever como hipótese de extinção da medida socioeducativa a “realização de sua finalidade”.

No entanto, muitas vezes essa reavaliação é deliberadamente

precipitada, porque se torna a única alternativa possível para atender outras situações cuja gravidade do ato infracional ou risco social do adolescente infrator recomendem

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a privação imediata do adolescente infrator, permitindo artificialmente a assimilação de novas demandas. Por força da a cláusula geral “realização de sua finalidade”, posto que antes de expirado o prazo fixado judicialmente, a reavaliação tem sido utilizada para antecipar a liberação do adolescente privado de liberdade de forma prematura não apenas para “criar vagas”, mas também para contornar rebeliões seguidas por atos de vandalismo, que tornam frequentemente os alojamentos inabitáveis, mediante remanejamento de internos, haja vista que o CASE de Formosa sempre opera com lotação máxima, recebendo o refluxo de outras Regionais.

Sequer podemos estabelecer um conflito de prioridades para deixar de aplicar no caso concreto o princípio da proibição de retrocesso social, diante da regra contida nos artigos 124, VI, do Estatuto da Criança e do Adolescente c/c artigo 49, II, da Lei nº. 12.594/2012,. O princípio da proibição de retrocesso social, na verdade, veda o retrocesso jurídico em termos de garantia e proteção dos instrumentos de concretização dos direitos fundamentais da criança nas condições hoje existentes, para aquém das quais não devemos retroceder, o que me parece inevitável em termos de prejuízo à qualidade do trabalho.

Logo, o fato de estarem na Regional da Região Nordeste

adolescentes de diversas regionais do ESTADO gera o problema da distância entre adolescente e família. Esta distância do adolescente de sua referência familiar acarreta enormes transtornos no atendimento socioeducativo. A falta de visitas do familiar e a dificuldade de acompanhamento da situação familiar pela equipe técnica da Unidade são motivos não só prejudiciais ao processo socioeducativo, mas de revolta dos adolescentes.

Portanto, ficou claramente provado que a superlotação no CASE, bem como a pluralidade de adolescentes de diversas regionais em cumprimento de medida na referida unidade, tem provocado enormes prejuízos ao processo socioeducativo, além de facilitar a realização de motins e incêndios no local, expondo a perigo a segurança dos internos e funcionários.

Nesse ponto, é necessário que o Estado de Goiás além de ser proibido de descumprir a regionalização definida no Provimento n° 05, de 14 de junho de 2013 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Goiás, adote providências no sentido de impedir e amenizar os efeitos decorrentes de incêndios realizados durante o motim praticados pelos internos.

Para tanto, há a necessidade do Estado de Goiás adequar as instalações do CASE, conforme sugestões propostas durante a vistoria realizada pelo corpo de bombeiros e técnica de edificações da Coordenação de Apoio Técnico Pericial - CATEP - do Ministério Público.

No geral, ambas as vistorias sugeriram a necessidade modificação da localização de instalação dos hidrantes, aquisição de extintores portáteis de roupas e colchões confeccionados com material antichamas, tendo a

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CATEP sugerido ainda a instalação de luminárias embutidas, instalação de sistema de aquecimento solar, pintura das paredes dos locais atingidos pelo incêndio, bem como a implantação de circuito fechado de televisão (CFTV), este último também sugerido pela equipe do Conselho Nacional de Justiça.

Assim, deverá o Estado de Goiás ser condenado a não encaminhar adolescentes para o CASE de Formosa, quando se tratar de adolescentes provenientes de comarcas não abrangidas pela Região Nordeste, bem como deverá ser obrigado a efetuar as adequações sugeridas nas vistorias, mediante a modificação das instalações dos hidrantes e de aquisição de extintores portáteis, de roupas e colchões confeccionados com material antichamas, instalação de luminárias embutidas, instalação de sistema de aquecimento solar, pintura das paredes dos locais atingidos pelo incêndio, bem como a implantação de circuito fechado de televisão (CFTV).

V – DOS PEDIDOS

Diante de todo o exposto e comprovados de forma inequívoca, pela prova documental que instrui a presente, os fatos articulados, requer-se:

a) a citação do ESTADO DE GOIÁS, na pessoa do Procurador-Geral do Estado de Goiás, no endereço indicado na introdução desta petição inicial, para que conteste o pedido no prazo legal;

b) seja o Estado de Goiás obrigado a não encaminhar adolescentes para o CASE de Formosa, quando se tratar de adolescentes provenientes de comarcas não abrangidas pela Região Nordeste;

c) seja o Estado de Goiás condenado a fazer a reparação necessária para manter a segurança no CASE mediante a instalação de hidrantes nas Alas “D” e “E”, bem como proceder com a manutenção periódica nos hidrantes já existentes, aquisição de colchões confeccionados com material antichamas, a pintura das paredes dos locais atingidos pelo incêndio, implantação de circuito fechado de televisão com monitoramento por câmaras nas Alas, instalação de luminárias embutidas e de sistema de aquecimento solar, sem prejuízo da alteração das instalações elétricas de modo a impedir que o adolescente tenha acesso a fiação no interior do alojamento.

d) a produção de todos os meios de prova em direito admitidos, ou sejam, depoimento pessoal das partes, prova testemunhal, documental e pericial;

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e) a isenção de custas, emolumentos e honorários de sucumbência;

Dá-se a presente o valor da R$ 1.000,00 (mil reais).

Nestes termos, Pede Deferimento.

Formosa/GO, 07 de julho de 2014.

FREDERICO AUGUSTO DE OLIVEIRA SANTOS– Promotor de Justiça -