Expansão ultramarina e a economia europeia

download Expansão ultramarina e a economia europeia

of 10

Transcript of Expansão ultramarina e a economia europeia

  • 5/14/2018 Expans o ultramarina e a economia europeia

    1/10

    . : II .: . ! I

    I

    I': I i i :I .

    .r .! I

    A EXPANSAO U L TR AMARI NA E A E CONOM IA EUROP EI A 73 II~I;I .

    1 1I I ! I ,

    4" ,}.J l;~ .l lU;)'1 f " 00

    t

    da terra para 0 plantio da cana era 0 rnovel burgues, continuar a re-conquista seria 0 obje to da nobreza, buscar cereal seria 0 estimulobasico do Estado, encontrar ouro seria "0mobil de todos".' Avancan-do mais nas motivacoes lusitanas, P . Vilar vai adicionar a "sede de Duro"e ao "deficit de graos", a busca da goma, a extcnsao da area pesquei-ra, 0 dinamismo da economia acucareira no reino e nas ilhas, a de-manda de braces escravos, e a desvalorizacao monetar ia que "arruinaos cavaleiros e os empurra a s aventuras"."

    Enfirn, e uma conjuminancia de interesses diversificados que estana base da aventura marit ima. A difusao dos europeus no globo esco-rava-se numa associacao de motivacoes, responsavel pelo exi to de um aempresa de tal porte . Cada ator social tern urn desfgnio especffico-os comerciantes buscam produtos e mercados, a nobreza busca terrase a riqueza dos saques, a Coroa seu fortalecimento porem todosconfluem para 0empreendimento comum. Como observa P . Anderson,a expansao ultramarina engrandecia 0Estado e beneficiava a burgue-sia, gerando urn s istema que art iculava numa mesma dinamica exer-cito, colonia e comercio,"

    Postas as motivacoes genericas, cabe . tambem em linhas gerais- datar 0 processo em sua genese e em seus momentos. Em primei-rissimo lugar, destaca-se 0 empreendimento lusitano.? Urn primitivo

    )IIII

    :I

    Capitulo 3A EXPANSAO ULTRAMARINA,E A ECONOMIA EUROPEIA

    I I

    A expansao ultramarina europeia inaugura 0 longo seculoXVI. Seria van discutir se 0 marco de tal processo estar ia, como ad-mite P . Chaunu, na passagem do cabo Bojador em 1434. Mais impor-tante e avaliar, com e le, que este movimento oeorre como uma "ger-minacao de frorite i ra" , urn "caso de margem" envolvendo duas pe-ninsulas: a Iberica e a Escandinava. E mais, que "os descobr imentosrespondiam aos longos tempos de dificuldades".'

    Eram as carencias daEuropa que alimentavam a expansao, Maisdo que 0 "espfrito de Cruzada", 0 "gosto de aventura" ou a "busca deglorias", fo i a necessidade de cerea is e os baixos niveis dos estoquesmeta licos da Cristandade, que impeliram alguns pafses europeus aavancar "por mares nunca dantes navegados". 0 deficit de metais pre-ciosos, sobretudo, exponencial izava-se por uma balanca comercialnegativa.A carencia de graos era tambern significativa.'

    Falando da expansao iberica, e ainda P . Chaunu que avalia: a busca

    I

    1 Ver P . Chaunu. A exponsao eu rope i a , p. 44 e 77.2 Segundo H. Miskimin a carencia de meta is leva a expansao: "Nao foi pO T acaso

    que 0 seculo XV assis tiu ao desmantelamento da velha geografia , com a humani-dade ocidental a atingir os confins do plane ta e a i sso levada em parte pela busca

    Ide ouro" (A economia do r ena scimen to europ eu, p. 219). Sobre a demanda cerealifera,ver Wallerstein. E I m o de r no s is te m a mundiol, v. I, p. 60-1.

    72

    3 P. Chaunu. Op. cit ., p. 84. P . Vilar concorda com esta avaliacao; diz ele que esteobjetivo "desencadeou a conquis ta e determinou seu carater ativo, disperso e vas-to" ( Ou r o e moeda no his toria, p. 83). Ver tambern: P. Kriedte. Feudal ismo tardio ycap i ta l mercan t il , p. 60-1.

    4 P . Vilar .Op. c it. , p. 6S . P. Anderson comenta: "Portugal, no extrema atlantico daPeninsula Iberica, foi a ultima monarquia feudal importante a surgir na Europa Oci-dental", e al i "nao surgiu uma hierarquia intersenhorial estruturada e 0 separatismodos nobres foi debil" i P a ss a g en s d o a n ti g ui d ad e 00feudal ismo, p. 190-2). Miskiminconclui ser 0Estado portugues 0 primeiro a "atuar como Estado", no sentido mo-derno (op. cit., p. 159). A discussao sobre asparticularidades do precoce expansionismoportugues constitui 0 objetivo central da segunda parte deste estudo,

    S Ve r R Anderson. Linhagens do Es tado absolutista, p. 65. A f or ma de organizacao doempreendimento marlt imo une diferentes motivacoes, quase sempre capitanea-das ou estimuladas pelas Coroas. "Rotas, espacos e homens. 0 processo de difusaodo extrema ocidente cristao atraves do mundo resulta necessariamente em umaconstrucao politica, 0 Estado esta presence no momenta da exploracao e da con-quista (P. Chaunu. C o n qu is ta e ex p1 0 rOf 00 do s nooos mundos , p. 231).

    6 Na opiniao de P . Chaunu, 0 seculo XV "confunde-se com Portugal", e este se-cu lo termina com uma promessa que coube ao seculo XVI realizar (A expansdo . . . ,p. 279-80),

    ,I IiI :I .

    I, . I

  • 5/14/2018 Expans o ultramarina e a economia europeia

    2/10

    74 A EXPANSAO ULTRAMARINA E A ECONOMIA EUROPEIAmomento da expansao europeia e eminentemente portugues, apesarde basicamente financiado por capitais italianos, Este pals, por razoesque serao vistas nos pr6ximos capitulos , adianta-se na aventura ocea-nica, antecipando a pr6pria recuperacao europeia . .Seu papel nao podeser minimizado . '

    A cxpansao por tuguesa, inaugurada com a campanha de Ceuta em1415, e lenta e sistematica avancando gradativamente em direcao aosuI, tendo como meta imediata a captura das fon tes do ouro de Tom-buctu. Com este proposito, ja em 1445, os portugueses constroem afortaleza de Arguim, e em 1482 esta pronto 0castelo de Sa o Jorge daMina ponto de escoamento de escravos e do ouro da Guine. 0avanco pela costa africana prossegue, assim como 0adentramento no"Mar Tenebroso", num movimento que incorpora os arquipelagos daMadeira e dos Acores e que acaba por esbarrar nas terras do Bras il . Aofinal do seculo Xv, osportugueses navegam no oceano Indica. Domi-nam as tres bordos do Atlantico sui: a "volta da Guine", a "volta doBras il" e a "volta do Cabo"." Em meados do seculo XVI ja comandamo trafego inte rno do Indico, em 15.13 estabe lecem uma feitoria emMacau e em 1543 negociam no japao (at ingindo 0extrema oriente: alendaria Cipango de Marco Polo).o imperio portugues e essencialmente maritimo, estruturado como"uma rede de bases mercantis atraves do mundo"." Urn imperio "fi-liforme", preso aos litorais, cuja imensidao tornava dificil e caro 0empreendimento. Urn imperio mantido milita rmente fruto de uma,"conquista talassocrat ica" , que abarcava cerca de cinqi ienta fortale-zas e uma signif icat iva forca naval , sem envolver urn claro des igniode efetiva dorninacao territorial? (excecao feita ao Brasil); na verdade,era urn controle de rotas oceanicas . Um imperio que consti tui sua basenuma epoca ainda de crise da economia europeia (0 f inal de uma faseB, nos termos de P.. Chaunu) e que abre a aventura maritima comouma perspectiva de sua superacao,

    No ultimo quartel do seculo Xv, 0 outro Estado iberica vern se

    7 V er Pierre Chaunu. A e xpan sdo . . . , p. 81. Sobre a expansao p or tu gu es a v er a biblio-grafia dos Capitulos 5 e 6.

    8 R. Romano & A. Tenenti. Los f undamen to s de!mundo moderno, p. 194. Estes autoresargumentam tratar-se de u rn imperio " fe it o n a surdina ... de penetracao lenta embases isoladas sobre a s f ra n ja s maritimas'' (p. 261).

    9 Ve r Pierre Chaunu. Conqu i s ta . . . , p. 1 98 e D av id A rn ol d. A epoca dos descobrimentos(1400/1600), p. 55 e ss.

    A E XP A NS AO U LT RAM AR IN A E A E CONOM IA EUROP EI A 7 5juntar a Portugal nas descobertas. 0expansionismo hispanico inicial-

    . ;mente volta-se para 0norte da Africa, apresentando os "aspectos feu-dal e militar da continuacao da Reconquista'' .10 A descober ta da Ame-r ica, em 1492, anima e acelera 0movirnento atraindo-o para 0 oeste.Nas primeiras decadas do seculo XVI, os espanh6is ja transitam pela"Terra Firme": em 1512 De Le6n explora a Florida, no ano seguin-te Balboa avista 0 Pacifico, em 1521 Cortes toma definitivamente .Tenochtitlan, em 1533 Pizarro esta em Cusco, em 1539 e fundadaAssuncao, Enfim, 0 ritmo da conquista e rapido e em meados do se-eulo as contornos do imper io espanhol na America ja estao definidos.E mais, a par ti r de bases americanas, continuam a difusao no sentido

    ,;latitudinal, atravessando a Pacifico e atingindo 0 Indico pe la ro ta donascente . Em 1564 a rota Mexico Fil ipinas ja esta estruturada tor-nando estas ilhas urn "prolongamento da Nova Espanha"."

    A expansao hispanica apresenta particu la ridades em relacao aoempreendimento portugues. Aqui 0carater de conquista territorial emais demarcado, a anexacao de espacos comom6vel de urn processoque semanifesta no interior de uma estrutura imperial. A Coroa, maisenvolvida com urn projeto de hegemonia na Europa. ideixa a aventu-ra ultramarina maisna mao de particulares . .A nobreza, notadamente,vai comandar a conquista "organizada e conduzida no seio de estru-turas notavelmente senhoriais" .12 Na America ha claramente a tenta-tiva de "implantar uma extensao da economia metropolitana no ul-

    t

    to Pierre V i la r . O p . cit ., p. 76. Segundo este autor, 0avanco portugues e mais comer-c ia l, e 0 espanhol mais militar. Entretanto, como aponta P . C ha un u, a presenceestatal e aqui menor que no empreendimento lus itano (Conquista . . . , p. 236).

    11 Ibidem, p. 175.0 rastreamento detalhado d a e xp an sa o e sp an ho la e da instalacaohispanica na America serao objeto especifico do Capitu lo 7. Sobre 0avanco para 0oriente, consultar a coletanea: Ernesto T. Villar (cornp.), La e x pa n s io n h i sp a n oam e -ricana e n A s ia . SiglosXVI y XVII.

    iz Perry Anderson. L inhagens . . . , p. 66. R. Romano & A. Tenenti vao alem, dizendoque a nobreza ten ta recuperar sua forca noNovo Mundo, onde a d i s tanc i a p ropi c iacerro retorno a "autonomia feudal" (op. cit ., p. 185). J. H. Elliott tambern reafirmaque 0 padrao da Reconquista comanda 0 inicio da c ol o ni z ac a o h is pa n ic a , s ob r et u -do na America, 0que propiciou a f or ma ca o d e u ma a ri st oc ra ci a f eu da l n o u lt ra ma r(La Espana imperial, p. 66 e 69). Porem, ele destaca que 0 poder real acaba porenquadrar este segmento, 0 que se expressa bem na vinculacao patr imonial dascolonies diretamente a Coroa (p. 7.5 e 7 8) . E m outra obra, Elliott reforca que acolonizacao fortaleceu, a ss im , a consolidacao da monarquia e d o p o de r absoluto (0velho mundo e 0 novo , p. 109).

  • 5/14/2018 Expans o ultramarina e a economia europeia

    3/10

    :

    .i

    .,.r.1..1.._..._.

    . .. . .. -. . . _ . .. - ._ . _ .

    !I!II:

    instalacao. Ao final do"longo" seculo XVI, as novos participantes dacorrida colonial estao alojados em muitos pontos do globo. Os holan-deses estao no nordeste brasileiro, em Angola, e ja disputam 0 con-

    ~trole do comercio no Indico." Os ingleses buscam 0dominio do Atlan-tico setentrional, e a partir de 1584 iniciam a ocupacao da America doNorte. Os franceses tambern iniciam suas investidas nauticas. 0 se-gundo seculo XVI assis te a inda a urn predominiohispanico , porern jacom a diversificacao dos participes na exploracao do ul tramar. Para-le la a este processo oeorre, ja ao longo de perfodo seguinte, a pro-gressiva diminuicao da riqueza oriunda das colonias. A queda do

    . lucro colonia l antecipando a crise do seculo XVII.18Em meados do seculo XVII escasseiam as fontes de ingresso ultra-

    marino. Cai vertiginosamente a quantidadc de metais preciosos de-sembarcados em Sevilha ap6s 1630. A superoferta faz tambern baixarv iolentamente a lucra tividade do comercio de especiarias , Ap6s 1650o circuito do aciicar entra igualmente em crise. A estrutura montadapela expansao iberica desmorona-se, acossada pela concorrencia e pelo

    " ..exaurimento. Como lembra Anderson, neste momento 0 comerciointercolonial tambem ja se organizou implicando cerro nivel de inter-nalizacao dos capitais gerados nas colonias." Todavia, 0 principal fa-tor e a perda de poderio da Espanha na Europa. A migracao de poderno centro e , em grande parte , expl ica tiva do rearranjo das domina-s;oes na per iferia, sendo tambern urn de seus efeitos.

    Assim, 0 longo seculo XVI encerra apontando para uma nova di-visao do mundo colonial e para n O V Q S metodos de su a exploracao.Como avalia Hobsbawm, a "principal realizacao do seculo XVII foi acriacao de urn novo t ipo de coloniali smo", urn t ipo que releva 0 "mer-cado colonial" .2A expansao torna-se p l e namen t e mercantil, -emerge

    76 A EXPANSAO U LT RA MA RIN A E A E CO NO MIA E UR OP EIA A E XP AN SA O U LT RA MA RIN A E A ECONOMIA EUROPEIA 77,.jJi~ tramar" .13 Existe urn sentido de instalacao (de interiorizacao e de pos-

    se), apesar do carater de pilhagem das primeiras expedicoes, que seacentua com a descoberta das minas ainda na primeira metade do se-culo XVI.

    Na passagem do primeiro para 0 s egundo seculo XVI, a expansaoeuropeia em torno da Terra esta completa. Em meados do seculo, aslinhas gerais da geografia do novo continente sao conhecidas, os can-tatos com a Asia e a Africa sao regulares, os oceanos sao atravessadostambem com regularidade. Isto nao significa que todas as porcoes doplaneta estejam integradas num movimento unico, pais, como avaliaChaunu, a conquista forrnou "redes de relacoes", eixos de circulacaoentremeados por grandes vazios." Porern, a visao europeia do mundo..........-.ue no seculo XV era muito vaga em 1600 e quase perfeita (0que pode ser atestado na cvolucao da cartografia do periodo). 0 con-torno dos cont inentes , a extensao real das terras, os regimes predomi-nantes de ventos oceanicos, sao elementos ja bastante conhecidos,

    . Enfim, completa-se a "Epoca dos Descobrimentos", "uma epoca dereconhecimento e exploracao dos oceanos, aber tura de novas rotascomerciais e de inlcio dos irnperios ultramarinos" .15

    A incorporacao de Portugal pelo imperio espanhol, em 1580, poe 0monopolio iberica do alern-mar sob dominio dinastico unico. Tal mo-nopolio, amplamente sancionado pelas bulas papais, 16 comeca con-tudo a ser seriamente solapado na virada para 0 seculo XVII. Novospaises entram na aventura oceanica, animados pela riqueza que as pos-sessoes ultramarinas fornecem para a Espanha. A reforma protestantequestiona a soberania iberica, e fornece legit imacao para 0 corso (apiratarialegalizada pelos Estados). A Franca, a Holanda e a Inglaterraent ram na aventura marit ima, atacando as frotas e as feitorias portu-guesas e espanholas. Inicia-se urn novo momenta na expansao euro-peia que prenuncia uma nova partilha do mundo colonial.-Da mesma forma que na fase anterior , da pi lhagem passa-se para a

    .

    "

    I

    ,