Experiências obtidas a partir da utilização de um terrário ...

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eISSN 2179-426X 10.26843/rencima.v12n4a02 Recebido em 01/03/2021 | Aceito em 07/05/2021 | Publicado em 13/07/2021 Experiências obtidas a partir da utilização de um terrário de planárias durante monitoria de Zoologia Manoel Celestino de Pontes Filho 1 Jéssica Prata de Oliveira 2 Resumo: O ensino de zoologia requer a aplicação de recursos didático-pedagógicos para manter os discentes interessados diante conteúdos extensos. Nesse contexto, este estudo relata a experiência da utilização de um terrário de planárias pelos monitores e discentes da disciplina Organismos Unicelulares e Metazoários Não Celomados, do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba, como recurso didático-pedagógico para favorecer o processo de ensino-aprendizagem. O terrário foi aplicado nas aulas práticas do Filo Platyhelminthes, durante os semestres letivos 2018.2 e 2019.1, para cinco turmas, tanto da modalidade bacharelado quanto licenciatura. Durante o monitoramento do terrário, foram observados diversos comportamentos das planárias, como a reprodução sexuada que possui relevância científica, apesar de pouco observada e descrita na literatura. A aplicação do terrário promoveu maior compreensão sobre os platelmintos por meio da observação, investigação e descrição de aspectos morfológicos e comportamentais desses animais, despertando a curiosidade científica nos discentes e contribuindo para a formação de futuros professores de Ciências e Biologia. Palavras-chave: Biologia. Ensino-aprendizagem. Aula Prática. Invertebrados. Platyhelminthes. Experiences obtained from the use of a planary terrary during Zoology monitoring Abstract: Teaching zoology requires the application of didactic-pedagogical resources to keep the students interested in face of the extensive content. The study aimed to report the experience of using a planarian terrarium by the monitors and students of the Unicellular Organisms and Non-Coelomate Metazoans discipline of the Biological Sciences course of the Federal University of Paraíba, as a didactic-pedagogical resource to facilitate the teaching-learning process. The terrarium was applied in the practical classes on Phylum Platyhelminthes during the semesters 2018.2 and 2019.1, to five classes. During monitoring of the terrarium, different planarians behaviors were observed, such as sexual reproduction, which has scientific relevance, although little observed and described in the specialized literature. The application of the terrarium promoted a greater understanding about the flatworms by observing, investigating, and describing the morphological and the behavioral aspects of these animals, stimulating the scientific curiosity in students, and contributing to the training of future Sciences and Biology teachers. 1 Graduando em Ciências Biológicas. Estagiário do Laboratório de Invertebrados Paulo Young (LIPY). Departamento de Sistemática e Ecologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Paraíba, Brasil. [email protected] https://orcid.org/0000-0002-1909-3273 2 Doutora em Ciências Biológicas (Zoologia). Técnica de laboratório do Departamento de Sistemática e Ecologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Paraíba, Brasil. [email protected] https://orcid.org/0000-0002- 0954-5459

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eISSN 2179-426X

10.26843/rencima.v12n4a02

Recebido em 01/03/2021 | Aceito em 07/05/2021 | Publicado em 13/07/2021

Experiências obtidas a partir da utilização de um terrário de planárias durante monitoria de Zoologia

Manoel Celestino de Pontes Filho1

Jéssica Prata de Oliveira2

Resumo: O ensino de zoologia requer a aplicação de recursos didático-pedagógicos para manter os discentes interessados diante conteúdos extensos. Nesse contexto, este estudo relata a experiência da utilização de um terrário de planárias pelos monitores e discentes da disciplina Organismos Unicelulares e Metazoários Não Celomados, do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba, como recurso didático-pedagógico para favorecer o processo de ensino-aprendizagem. O terrário foi aplicado nas aulas práticas do Filo Platyhelminthes, durante os semestres letivos 2018.2 e 2019.1, para cinco turmas, tanto da modalidade bacharelado quanto licenciatura. Durante o monitoramento do terrário, foram observados diversos comportamentos das planárias, como a reprodução sexuada que possui relevância científica, apesar de pouco observada e descrita na literatura. A aplicação do terrário promoveu maior compreensão sobre os platelmintos por meio da observação, investigação e descrição de aspectos morfológicos e comportamentais desses animais, despertando a curiosidade científica nos discentes e contribuindo para a formação de futuros professores de Ciências e Biologia.

Palavras-chave: Biologia. Ensino-aprendizagem. Aula Prática. Invertebrados. Platyhelminthes.

Experiences obtained from the use of a planary terrary during Zoology monitoring

Abstract: Teaching zoology requires the application of didactic-pedagogical resources to keep the students interested in face of the extensive content. The study aimed to report the experience of using a planarian terrarium by the monitors and students of the Unicellular Organisms and Non-Coelomate Metazoans discipline of the Biological Sciences course of the Federal University of Paraíba, as a didactic-pedagogical resource to facilitate the teaching-learning process. The terrarium was applied in the practical classes on Phylum Platyhelminthes during the semesters 2018.2 and 2019.1, to five classes. During monitoring of the terrarium, different planarians behaviors were observed, such as sexual reproduction, which has scientific relevance, although little observed and described in the specialized literature. The application of the terrarium promoted a greater understanding about the flatworms by observing, investigating, and describing the morphological and the behavioral aspects of these animals, stimulating the scientific curiosity in students, and contributing to the training of future Sciences and Biology teachers.

1 Graduando em Ciências Biológicas. Estagiário do Laboratório de Invertebrados Paulo Young (LIPY). Departamento de

Sistemática e Ecologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Paraíba, Brasil. [email protected] https://orcid.org/0000-0002-1909-3273 2 Doutora em Ciências Biológicas (Zoologia). Técnica de laboratório do Departamento de Sistemática e Ecologia da

Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Paraíba, Brasil. [email protected] https://orcid.org/0000-0002-0954-5459

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Keywords: Biology. Teaching-learning. Practical Class. Invertebrates. Platyhelminthes.

Experiencias obtenidas del uso de un terrario planario durante el seguimiento Zoologico

Resumen: La enseñanza de la zoología requiere aplicación de recursos didáctico-pedagógicos para mantener el interés de los estudiantes frente a un contenido extenso. En este contexto, este estudio reporta la experiencia del uso de un terrario de planarias por parte de monitores y estudiantes de la disciplina Organismos Unicelulares y Metazoos No-Coelomados del curso de Ciencias Biológicas, de la Universidade Federal de Paraíba, como recurso didáctico-pedagógico para favorecer el proceso de enseñanza-aprendizaje. El terrario se aplicó en las clases prácticas del Filo Platyhelminthes durante los semestres académicos 2018.2 y 2019.1, para cinco clases. Durante el seguimiento del terrário se observaron diferentes comportamientos de las planarias, como la reproducción sexual, que tiene relevancia científica, aunque poco observado y descrito en la literatura. La aplicación del terrario promovió una mayor comprensión de los gusanos planos a través de la observación, investigación y descripción de los aspectos morfológicos y de comportamiento de estos animales, estimulando la curiosidad científica en los estudiantes, y contribuyendo a la formación de los futuros profesores de Ciencias y Biologia.

Palabras clave: Biología. Enseñanza-aprendizaje. Clase Practica. Invertebrados. Platyhelminthes.

Introdução

A diversificação e a inovação das práticas pedagógicas aplicadas em sala de aula

são fundamentais no estímulo à participação dos alunos como sujeitos ativos no processo

de ensino-aprendizagem, assim como preconizado na Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional Nº 9.394/96 (BRASIL, 1996). Tal afirmação abrange tanto a educação

básica quanto a superior, tendo em vista a necessidade de reestruturar o modelo de

educação, de modo que ele não seja maçante e improdutivo.

O processo de ensino e aprendizagem deve ser considerado uma prática pedagógica

que requer, acima de tudo, interação entre o docente e os discentes, já que a comunicação

entre ambos promove uma melhor compreensão por parte dos alunos quanto ao conteúdo

aplicado. Tais conteúdos precisam ser repassados de modo prático, didático e

esclarecedor; entretanto, muitas vezes isso não acontece, prevalecendo o ensino

essencialmente teórico, descontextualizado e baseado em memorização (SCHEID;

FERRARI, 2006). Contudo, Siqueira, Vilaça e Frenedozo (2018) asseveram que a

qualidade da educação está diretamente ligada ao processo de formação e educação dos

professores; ou seja, para que essa situação aconteça, os educadores devem ser bem-

preparados ao longo de sua formação (nesse caso, enquanto licenciandos).

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O programa de monitoria na graduação é uma atividade voltada ao aperfeiçoamento

do processo de ensino e aprendizagem, bastante disseminada e dotada de um papel

relevante no ensino superior (ORTOLAN; ALTEFF; TIBURZIO, 2020). Nessa atividade,

discentes de graduação têm a oportunidade de participar ativamente no ensino de colegas

de turmas posteriores às suas como monitores, desenvolvendo atividades como elaboração

de questões, atendimento para tirar dúvidas e discussão sobre elementos próprios da

disciplina e do fazer pedagógico (ORTOLAN et al., 2019; LIRA et al., 2015).

A Zoologia é uma disciplina que apresenta uma carga de conteúdos bastante

densos, sendo considerada difícil devido à grande quantidade de “termos complicados” e a

somatória de assuntos a serem abordados. No curso de Ciências Biológicas da

Universidade Federal da Paraíba (UFPB), a Zoologia é dividida em três disciplinas, de modo

que cada uma seja aplicada no período subsequente, a fim de facilitar a compreensão por

parte dos alunos. Inicialmente, é abordada a disciplina “Organismos Unicelulares e

Metazoários Não Celomados” (na qual foi executado o presente trabalho); na sequência,

vem “Metazoários Celomados Não Deuterostomados”; em seguida, “Metazoários

Deuterostomados”, respectivamente.

A disciplina Organismos Unicelulares e Metazoários Não Celomados engloba os

conteúdos referentes aos grandes grupos dos seres vivos, sendo apresentados os

diferentes reinos existentes, a origem e evolução do grupo Archaea, Eubactéria, linhagens

de protistas e metazoários não celomados, sendo estes representados pelos organismos

dos filos Porifera, Cnidaria, Ctenophora, Platyhelminthes e Nematoda em uma abordagem

comparativa, apresentados na disciplina nesta mesma sequência em termos de estrutura

celular e/ou corpórea, elucidando os padrões estruturais estabelecidos e a diversidade

resultante.

Sobre o Filo Platyhelminthes, esta disciplina aborda suas classes, morfologia e

modos de vida dos seus representantes, sua diversidade e importância tanto ecológica

quanto médica, uma vez que alguns indivíduos podem ser vetores de doenças. As planárias

são fazem parte deste filo, inseridos na Classe Turbellaria (Ordem Tricladida); pela

etimologia da palavra (platy = “achatado”; helminth = “verme”) significa vermes com corpos

achatados. Os turbelários têm duas divisões: os macroturbelários, com 1cm a 30cm de

comprimento, e os microturbelários, menores que 1cm de comprimento (GIRIBET;

EDGECOMBE, 2020; BRUSCA et al., 2018).

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No que diz respeito ao Bauplan dos Metazoários, as planárias são organismos

triblásticos e bilatérios, representando o plano corpóreo básico a partir do qual os

protostômios finalmente se originaram. Além disso, esses animais possuem um sistema

nervoso centralizado, formado por um gânglio cerebral na extremidade da região anterior,

e cordões nervosos longitudinais, com comissuras transversais (esquema semelhante a

uma escada), seguindo pelo restante do corpo; há tendências à cefalização, embora não

possuam uma ‘cabeça’ propriamente dita (GIRIBET; EDGECOMBE, 2020). Segundo

Brusca et al. (2018), a partir dessas características, surgiram algumas vantagens

evolutivas, como os movimentos unidirecionais e um estilo de vida mais ativo que o

demonstrado pelos animais com simetria radial (cnidários, por exemplo).

Além dessas características inovadoras, a presença da mesoderme permite a

formação de um mesênquima fibroso e muscular, oferecendo sustentação estrutural,

permitindo uma locomoção que não era possível aos animais diploblásticos radiados.

Sistemas reprodutivos sofisticados desenvolveram-se nos platelmintos, possibilitando a

fecundação interna e o aumento da produção de vitelo e ovos encapsulados (BRUSCA et

al., 2018). Externamente os turbelários são ciliados e o comprimento do corpo é diretamente

proporcional à quantidade de cílios presentes no animal, tendo em vista que os mesmos

entrarão em contato com o substrato, favorecendo a locomoção (PECHENIK, 2016); são

cilíndricos, mas há várias espécies com o corpo achatado, especialmente as que possuem

um maior tamanho; em relação à coloração, o dorso pode ser amarelado, acinzentado,

marrom ou preto na maioria dos microturbelários e nos tricladidos aquáticos, ao passo que

nos policlados e tricladidos terrestres, as cores podem ser vivas e/ou ter padrões mais

contrastantes (FRANSOZO, 2016).

A morfologia interna desses organismos é formada por um epitélio relativamente

simples, composto por células cilíndricas ou cúbicas ciliadas apoiadas sobre uma lâmina

basal. A epiderme recebe secreções produzidas por glândulas unicelulares localizadas no

mesênquima; essas secreções de composição variada podem auxiliar na locomoção, na

adesão, na homeostase e/ou na captura de presas, ou ainda atuar na defesa contra

predadores (FRANSOZO; NEGREIROS-FRANSOZO, 2018). Não possuem um sistema

circulatório nem respiratório e utilizam toda a superfície corporal para desempenhar esta

atividade metabólica, motivo este pelo qual esses organismos são encontrados apenas em

locais úmidos, quando terrestres (BRUSCA et al., 2018).

Apesar de as planárias serem pouco mencionadas na literatura quanto ao ensino de

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Ciências e Biologia, por vezes lembradas como sendo apenas um mero representante do

Filo Platyhelminthes, elas devem ser levadas em consideração devido ao seu papel

ecológico, pois são organismos bioindicadores, tanto de ambientes aquáticos quanto

terrestres, além de muito sensíveis às mudanças no habitat (BOLL; MARQUES; LEAN-

ZANCHET, 2020). No ensino básico, o estudo dos platelmintos é abordado na disciplina de

ciências e abrange desde as características gerais dos vermes até a importância sanitária,

social e ambiental (JÚNIOR, 2018).

Ademais, a utilização de um terrário de planárias, além de favorecer a observação

de comportamentos, promove um ensino mais lúdico, criativo e investigativo, por ser um

recurso didático mais atrativo, como mencionado por Sena Silva (2014). Corroborando com

Magalhães e Pastorini (2016), essa metodologia possibilita uma aprendizagem mais

significativa, favorecendo a apreensão de conteúdos abordados de maneira satisfatória,

despertando nos discentes o interesse pelo aprender.

Utilizar atividades investigativas como ponto de partida para desenvolver

compreensão de conceitos é uma forma de levar o aluno a participar de seu processo de

aprendizagem, sair de uma postura passiva e começar a perceber e agir sobre o seu objeto

de estudo, relacionando o objeto com acontecimentos e buscando as causas da relação,

procurando, portanto, uma explicação causal para o resultado de suas ações e/ou

interações (CARVALHO, 2004).

Nesse contexto, o presente estudo teve como objetivo relatar a experiência da

construção, apresentação, monitoramento e manutenção de um terrário de planárias pelos

monitores e discentes da disciplina Organismos Unicelulares e Metazoários Não

Celomados, do curso de Ciências Biológicas da UFPB, a fim de favorecer o processo de

ensino-aprendizagem. Buscou-se ainda incentivar o interesse dos alunos, bem como dos

monitores da disciplina, pelo estudo desses organismos estimulando-os a compreender

conceitos básicos, incluindo aspectos morfológicos e ecológicos, sobre as planárias durante

as aulas práticas com base na observação, investigação e confirmação dos procedimentos

realizados. O uso desse tipo de ferramenta como recurso didático contribui para a formação

dos futuros professores de ciências e biologia que irão atuar na educação básica e/ou

superior, além de encorajar a pesquisa científica de grupos taxonômicos ainda

negligenciados, com poucos especialistas no Brasil, a exemplo do filo Platyhelminthes.

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Procedimentos metodológicos

Durante os meses de abril a julho de 2019, foram realizadas, ao todo, seis coletas

de planárias terrestres em um fragmento de Mata Atlântica localizado dentro da

Universidade Federal da Paraíba, Campus I, João Pessoa-PB, pertencentes ao antigo

biotério do Departamento de Sistemática e Ecologia / CCEN / UFPB (Figuras 1, 2, 3 e 4).

Para isso, foram averiguados visualmente cupinzeiros, troncos de árvores caídas e

serrapilheira, locais onde possivelmente oferecessem fonte de alimentação às planárias.

Além disso, foram analisadas áreas bastante úmidas, pois são mais favoráveis para a

presença desses animais, devido às suas próprias limitações fisiológicas.

Figuras 1, 2, 3 e 4: Local da coleta

Fonte: Elaborado pelos Autores

As planárias foram coletadas com o auxílio de pinças, de modo que facilitasse a

coleta do animal; por serem organismos muito sensíveis ao toque, as planárias foram

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retiradas de seu habitat natural da forma mais delicada possível. Foram utilizados potes de

plástico com as tampas perfuradas (viabilizando a entrada de ar no pote) para armazená-

las durante a coleta, até serem transportadas ao laboratório; esses recipientes também

contavam com a presença do substrato do local (terra e serrapilheira), para que os

organismos não fossem submetidos a uma mudança brusca de ambiente. Antes de

abandonar o local, todo o material virado foi retornado à posição original para diminuir o

impacto ocasionado (CARBAYO, 2005).

Os potes foram colocados dentro de bandejas plásticas, contendo também um pouco

mais do solo, folhas secas e rochas do local de coleta; tais bandejas possibilitaram um

melhor transporte do material até o Laboratório de Ambientes Recifais e Biotecnologia com

Microalgas (LARBIM/UFPB), onde as planárias foram transferidas para o interior de um

aquário de vidro – com dimensões aproximadas em 35cm de comprimento, 17cm de largura

e 20cm de altura, preenchido com os demais materiais coletados os quais foram

transportados nas bandejas plásticas – e posteriormente vedado com plástico filme com

algumas perfurações, para que houvesse troca de gases dentro do terrário (figura 5);

semanalmente, o terrário também era umidificado com água, preferencialmente da chuva,

de modo que evitasse prejuízos às planárias devido alterações no ph ambiente, tendo em

vista que água tratada da torneira contém cloro.

Figura 5: terrário de planárias finalizado

Fonte: Elaborado pelos Autores

Além das planárias, foram coletados semanal e quinzenalmente pequenos

gastrópodes (caracóis; figuras 6 e 7), isópteros (cupins) e oligoquetas (minhocas), no

mesmo fragmento de mata em que foram coletadas as planárias, esses organismos

serviram de alimento para as planárias. Foi criado um terrário à parte para manter os

caracóis vivos e para que se reproduzissem, não necessitando coletá-los com tanta

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frequência; foram utilizadas cenouras cortadas em rodelas para a dieta, assim como terra,

folhas e rochas, proporcionando um ambiente semelhante ao das planárias, com condições

normais de temperatura e umidade favorável à sobrevivência de ambos. Minhocas e cupins

não foram armazenados em um terrário à parte, apenas coletados e colocados diretamente

no terrário das planárias para alimentação das mesmas.

Figuras 6 e 7: caracóis utilizados para alimentação das planárias

Fonte: Elaborado pelos Autores

Tanto o terrário de planárias quanto o de caracóis foram transportados para

residência após algumas semanas em que estavam mantidos no LARBIM, pois requeriam

mais tempo de observação e cuidados no geral enquanto estavam no laboratório. Somado

a isso, o ambiente climatizado poderia comprometer a sobrevida das planárias, tendo em

vista que estaria com um clima mais ameno do que o seu ambiente natural, as quais estão

adaptadas, além de que mantê-las em laboratório reduziria o quantitativo de estudos sobre

seus comportamentos (BOLL, 2019).

As planárias coletadas foram apresentadas durante as aulas práticas de laboratório

sobre o Filo Platyhelminthes, na disciplina Organismos Unicelulares e Metazoários Não

Celomados, com as turmas dos semestres 2018.2 e 2019.1 (tanto da modalidade

licenciatura quanto bacharelado), e mantidas no terrário por aproximadamente sete meses,

de modo que elas continuassem vivas até o semestre seguinte, para serem apresentadas

para as próximas turmas (nesse caso, as do semestre 2019.1).

Para a condução das aulas práticas, foram utilizadas placas de petri, pinças, pincetas

com água, e microscópios estereoscópicos (lupa). Em um primeiro momento, o monitor

explanou sobre a experiência de coleta e análise comportamental desses organismos até

momentos antes das aulas, assim como esclarecimentos acerca do grupo do qual as

planárias fazem parte, os turbelários (Classe Turbellaria), quanto à biodiversidade, habitats,

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modos de vida (endo e ectoparasitas e organismos de vida livre) e reprodução.

Em um segundo momento, os discentes foram convidados a retirar do terrário alguns

exemplares de planária com auxílio de pinça. Os espécimes foram transferidos para placas

de petri com um pouco de água, para manter a umidade do tegumento, as quais foram

dispostas em microscópios estereoscópicos para serem analisadas. Os discentes foram

orientados a observar e descrever a morfologia externa do animal, bem como aspectos

comportamentais sempre que possível. Ao longo dessas etapas, os discentes foram

incentivados a aplicar a metodologia científica para posterior discussão do tema no final da

aula.

Resultados e discussão

Coleta, construção do terrário e observações comportamentais das planárias

As planárias foram coletadas com o intuito de serem apresentadas durante as aulas

práticas de laboratório sobre o Filo Platyhelminthes. As atividades de coleta e de

manutenção do terrário foram de grande importância para a formação dos monitores e para

a disciplina, sobretudo em relação à observação dos aspectos morfológicos e

comportamentais das planárias mantidas em cativeiro; corroborando com Sousa & Cesar

(2017), a construção do terrário amplia as possibilidades do processo de ensino-

aprendizagem. Ao todo, dentre os meses de abril a julho de 2019, foram coletadas 8

planárias, 3 no período com menos chuvas, entre abril e maio, e 5 no período mais

úmido/chuvoso, entre junho e julho (figuras 8 e 9).

Figuras 8 e 9: algumas planárias coletadas

Fonte: Elaborado pelos Autores

Segundo Andrade e Santos (2004), as planárias podem ser facilmente criadas e

armazenadas em larga escala em pequenas salas de criação. Entretanto, o terrário requer

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uma demanda na manutenção por se tratar de um local úmido, o que torna propício o

crescimento de fungos e demais agentes possivelmente patogênicos tanto para planárias

quanto para os humanos. Dessa forma, foi necessário fazer a troca mensal da terra e da

serrapilheira, evitando possíveis prejuízos (figuras 10 e 11).

Figuras 10 e 11: terrário de planárias após manutenção, no Laboratório Didático de Zoologia do Departamento de Sistemática e Ecologia (UFPB)

Fonte: Elaborado pelos Autores

Em uma das coletas realizadas, duas planárias foram flagradas se reproduzindo

sexuadamente (reprodução cruzada; figuras 12 e 13). Esse comportamento é pouco

descrito na literatura, principalmente no ambiente natural. Os dois espécimes foram

coletados, de modo que pudessem ser acompanhados por mais tempo dentro do terrário.

Após algumas semanas, o surgimento de filhotes de planárias foi observado dentro do

terrário. Não foi assistido o evento de bipartição (reprodução assexuada), e esse

procedimento não foi realizado pela ação humana em nenhum momento. Dessa forma, os

filhotes nasceram a partir da reprodução sexuada (figuras 14 e 15).

A reprodução sexuada consiste na fecundação cruzada com troca mútua de esperma

de duas planárias e postura de casulos (RIBEIRO, 2012). Ao serem cultivados de forma

controlada em laboratório, os organismos chegam à fase adulta em aproximadamente três

meses após o nascimento. As planárias se reproduzem sexuadamente durante todo o ano,

gerando casulos com um curto período de incubação (BUENO-SILVA E FISCHER, 2005;

KNAKIEVICZ et al., 2006). A reprodução sexuada de planárias também foi observada e

descrita em trabalhos como os de Melo, Macedo e Andrade (1996), Bueno-Silva e Fischer

(2006), Ribeiro (2012) e Kobayashi et al. (2012).

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Figuras 12 e 13: planárias se reproduzindo sexuadamente no local da coleta

Fonte: Elaborado pelos Autores

Figuras 14 e 15: filhotes de planárias

Fonte: Elaborado pelos Autores

Durante os meses em que as planárias se encontravam estabelecidas no terrário, foi

possível constatar alguns comportamentos expostos na literatura, possibilitando a

comparação dos aspectos observados com os dados da literatura. Segundo Boll e Leal-

Zanchet (2018), as planárias terrestres possuem uma anatomia simples e um conjunto de

comportamentos básicos em relação à maioria dos animais bilaterais, o que os torna

adequados para o estudo de processos biológicos.

Carbayo (2005) afirma que, durante o dia, as planárias permanecem em repouso sob

galhos caídos, troncos, pedras e no folhiço, enquanto à noite tornam-se ativas e saem dos

refúgios à procura de presas para se alimentarem. Isso pôde ser constatado,

acompanhando minuciosamente o terrário ao longo do dia; as planárias eram mais ativas

à noite. Carbayo (2005) também esclarece que algumas espécies podem ser canibais. Esse

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comportamento, entretanto, não foi observado nos organismos monitorados neste trabalho.

As planárias são capazes de caçar aranhas, caracóis, lesmas, minhocas, cupins,

opiliões e isópodos, graças à ação combinada de um corpo musculoso, envolvido por uma

camada mucosa pegajosa, e uma faringe evaginante, provida de abundantes células

glandulares digestivas (CARBAYO, 2005). Brusca et al. (2018) resume a dieta apenas para

minhocas, caramujos terrestres e insetos.

Cseh, Carbayo e Froehlich (2017) afirmam que espécies de planárias podem ter uma

dieta generalista possuindo até 13 espécies como presas, distribuídas em 3 filos

(Platyhelminthes, Nemertea e Mollusca). Boll (2019) explicita que esse comportamento se

dá ao se alimentar de diversas presas (ou, ao menos duas, como foi o caso em seu estudo).

Foram ofertados caracóis, cupins, minhocas e isópodes às planárias; contudo, foi

observado que estas tinham preferência em consumir pequenos caracóis, seguido de

cupins (ofertado apenas duas vezes), mas não consumiram minhocas e isópodes. Os

espécimes coletados e mantidos no terrário podem ser considerados generalistas, por

terem consumido dois tipos de presas.

O comportamento de digestão observado nas planárias foi o mesmo descrito por Boll

e Leal-Zanchet (2018), denominado “prey crushing”, que significa “esmagamento de

presas” (figura 16), no qual a planária cobre totalmente a presa com o corpo; a faringe da

planária é então fixada na superfície da presa e a esmaga, transformando a presa em

fragmentos menores que podem ser sugados para o intestino. Esse comportamento é

frequentemente realizado para ingerir caracóis, lesmas grandes e minhocas grandes. Um

estudo focado na biologia e ecologia do animal poderia esclarecer essa relação bem como

fornecer a identificação da espécie. Atualmente, há poucos pesquisadores especialistas no

filo Platyhelminthes no Brasil.

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Figura 16: planária, inserida no terrário, se alimentando de caracol a partir da técnica “prey crushing”

Fonte: Elaborado pelos Autores

As planárias sobreviveram, em condições de laboratório (com temperatura por volta

dos 20ºC), por aproximadamente um mês e cerca de 6 meses, albergadas em residência

com condições de temperatura ambiente (variando entre 28ºC a 32ºC, padrão para a região

litorânea do Nordeste brasileiro), totalizando cerca de 7 meses. É um tempo

consideravelmente longo, tendo em vista que Cseh, Carbayo e Froehlich (2017)

mantiveram planárias, apenas em condições de laboratório, por 150 dias. Além disso, Boll,

Marques e Leal-Zanchet (2020) afirmam que a alternância constante da dieta configura ter

efeitos adversos, talvez relacionados a alterações fisiológicas na digestão de diferentes

alimentos, incluindo a sobrevida das planárias.

Bueno-Silva e Fischer (2005), afirmam que o crescimento e a longevidade em

planárias mantidas aos pares ressaltam a importância da presença de um organismo

coespecífico para o desenvolvimento do animal. Um outro ponto interessante, abordado por

Boll (2019), é que algumas espécies de planárias, quando submetidas à uma dieta mista,

podem ter uma sobrevida menor do que as que se alimentam por apenas uma presa. Isso

evidencia o fato de as planárias terem sobrevivido, em média, sete meses, vivendo em

grupo num mesmo terrário, bem como se alimentando mais por caracóis.

As planárias apresentaram um outro comportamento interessante: algumas se

enterraram (figura 17). Apesar de elas possuírem essa capacidade, tal prática é pouco

observada. Geralmente esses animais permanecem sobre os folhiços e na superfície de

locais muito úmidos. Contudo, não foi possível aferir se esta ação foi uma resposta a algum

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14 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 4, p. 1-20, jul./set. 2021

fator estressante. Inoue et al. (2015), em um estudo referente ao comportamento de

planárias frente aos estímulos externos, descreveram que as planárias exibem

comportamentos estereotipados em resposta a estímulos externos, por exemplo, exibem

fototaxia (referente à luz), quimiotaxia (referente a compostos químicos), termotaxia

(referente à temperatura) e timotaxia (preferência por uma superfície lisa ou evasão de uma

superfície texturizada), haja vista que são animais delicados em diversos aspectos.

Figura 17: planárias se enterrando, no fundo do terrário

Fonte: Elaborado pelos Autores

Uso do terrário de planárias em aulas práticas de laboratório

As aulas práticas e experimentais representam uma modalidade didática de grande

importância para o processo de assimilação e construção do conhecimento, seja no ensino

básico ou no ensino superior. De acordo com Krasilchik (2004), as aulas de laboratório têm

um lugar insubstituível no ensino da Biologia, pois desempenham funções únicas: permitem

que os alunos tenham contato direto com os fenômenos, manipulando os materiais e

equipamentos, observando organismos, despertando e mantendo o interesse dos alunos,

envolvendo os estudantes em investigações científicas, desenvolvendo a capacidade de

resolver problemas, compreendendo conceitos básicos e desenvolvendo habilidades.

Ao todo, 97 discentes se matricularam no componente curricular Organismos

Unicelulares e Metazoários Não Celomados, distribuídos em 5 turmas, nos semestres

2018.2 (sendo 3 turmas: uma da modalidade bacharelado/matutino e duas da licenciatura

– turno matutino e noturno) e 2019.1 (2 turmas: uma do bacharelado e outra da licenciatura,

ambas do turno matutino). Apesar de alguns alunos terem se evadido do curso devido a

problemas pessoais, as turmas continuaram com uma quantidade significativa de alunos.

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15 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 4, p. 1-20, jul./set. 2021

Nesta fase do trabalho, o terrário de planárias vivas foi usado nas aulas práticas de

laboratório da disciplina Organismos Unicelulares e Metazoários Não Celomados. Sob

supervisão da professora e do monitor (figuras 18, 19 e 20), os alunos puderam retirar

cuidadosamente as planárias do terrário e colocá-las sobre as placas de petri, com um

pouco de água para evitar a desidratação do tegumento do organismo; os discentes

puderam observá-las com o auxílio de lupas, analisando sua forma de locomoção, o plano

corporal como um todo, assim como a região próxima da faringe, que por apresentar uma

coloração um pouco diferenciada, mais claro (figura 21), facilitava a visualização nas lupas.

Ainda sobre a faringe do animal, foram explanadas as formas de digestão, sendo possível

observar que as planárias do terrário eram capazes de utilizar a técnica “prey crushing”, na

qual ela esmaga suas presas para se alimentar. Uma outra técnica utilizada por esses

animais é a capacidade de everter a faringe para se alimentar. Tal ação, entretanto, não foi

observada nos espécimes monitorados.

Figuras 18, 19 e 20: registro das aulas práticas de laboratório

Fonte: Elaborado pelos Autores

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16 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 4, p. 1-20, jul./set. 2021

Figura 21: região da faringe mais clara, localizada na região mais central do corpo da planária, indicada pela seta

Fonte: Elaborado pelos Autores

Por se tratar de uma atividade inovadora para a disciplina, os alunos ficaram

surpresos com a prática de laboratório, tendo em vista que nunca viram uma planária viva,

nem como elas se locomoviam. A confecção e apresentação do terrário para os alunos foi

fundamental para que compreendessem os aspectos locomotores, morfológicos e até

fisiológicos dos Platyhelminthes.

Ainda sobre o uso e a eficiência das aulas práticas, Krasilchik (2008) orienta que,

entre as modalidades didáticas existentes, tais como aulas expositivas, demonstrações,

excursões, discussões, aulas práticas e projetos, como forma de vivenciar o método

científico, as aulas práticas e projetos são mais adequados. Fortalecendo esta afirmação,

Bueno et al. (2018) afirma que aulas desenvolvidas sob propostas inovadoras que se

distanciem de um cunho tradicionalista podem acentuar o interesse pelo aprendizado e

dessa forma incentivar a busca pelo conhecimento científico. Sendo assim, infere-se que é

de fácil percepção compreender o quanto a utilização de uma didática que envolva mais

práticas é necessária na construção e assimilação do conhecimento.

Durante as aulas práticas, os discentes mencionaram o quão é parecida a

semelhança do plano corporal de uma planária com o de uma lesma; para tanto, foram

explicadas a eles algumas diferenças entre os dois organismos, tais como: (i) capacidade

de regeneração da planária a partir da reprodução assexuada (por meio da bipartição)

enquanto que as lesmas se reproduzem apenas sexuadamente; (ii) as planárias são

acelomadas, ou seja, desprovidas de uma cavidade que possa abrigar os órgãos internos

(que, por sinal, não possuem sistemas completos, e que sua “simplicidade” facilita o

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17 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 4, p. 1-20, jul./set. 2021

processo de regeneração); já as lesmas são celomadas e possuem sistemas um pouco

mais integralizados, a exemplo do sistema digestório completo, e outras estruturas mais

complexas, como um par de tentáculos ópticos. Todavia, foi exposto aos alunos que ambos

os organismos são hermafroditas, ou seja, possuem a capacidade de produzir ambos

os gametas (femininos e masculinos).

Ademais, foi observado que, em todas as turmas, os alunos demonstraram interesse

pelas aulas práticas, de modo que fossem feitas as análises da morfologia externa das

planárias e apreensão do conhecimento acerca de alguns comportamentos delas, fazendo

questionamentos e discussões sobre o material e o conteúdo de forma crítica e reflexiva.

Além disso, a monitoria e as aulas práticas possibilitaram ao aluno monitor a oportunidade

de confeccionar o material a ser visto e estudado, além da liberdade de usufruir do recurso

utilizado, corroborando com os estudos de Camargo (2015), o qual afirma que as aulas

práticas precisam ser programadas e dar liberdade aos alunos para que sua criatividade

seja manifestada, de maneira que o aluno seja autor de seu próprio conhecimento.

Silva et al. (2015) evidenciaram que as aulas práticas estimulam o questionamento

e a participação ativa dos alunos, nas quais se tornam produtores do conhecimento e

sujeitos ativos do processo de ensino-aprendizagem. Os autores ressaltam, ainda, que as

aulas práticas precisam ter pontos a serem considerados sobre sua realização, como a

seleção da prática, preparação e a segurança do professor durante aplicação.

Consequentemente, atividades como a criação, monitoramento e aplicação de terrário de

planárias em sala de aula, envolvendo investigação aliada à ludicidade, além de beneficiar

os discentes estimulando-os à participação, provocam entusiasmo e encorajam futuros

monitores da disciplina a realizarem novamente esta prática com maior performance.

Considerações Finais

Todo o trabalho realizado, desde o momento da coleta de planárias até a finalização

das aulas práticas, foi extremamente significativo para incorporar a execução às

experiências adquiridas. O monitoramento do terrário possibilitou a observação de

comportamentos pouco descritos na literatura, fornecendo dados que ampliam o

conhecimento sobre a biologia das planárias terrestres e estimulando estudos científicos

sobre esse grupo.

Apesar de essas atividades terem sido realizadas no ensino superior, para uma

disciplina do curso de Ciências Biológicas, as mesmas poderiam ser aplicadas também no

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18 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 4, p. 1-20, jul./set. 2021

ensino básico como estratégia para um ensino mais didático-metodológico na disciplina de

Ciências e/ou Biologia mudando apenas o contexto. O terrário é um material de fácil acesso

e baixo custo, que possibilita a interação de todos os alunos, trabalhando em equipe, do

mesmo modo que contribui para o desenvolvimento de competências e habilidades pelos

mesmos.

Em atividades como essa, o aluno monitor tem ainda a chance de se capacitar,

desenvolvendo e experimentando, a partir de erros e acertos, metodologias de trabalho que

possam se adequar e melhor responder às necessidades dos discentes envolvidos, assim

como vivenciar as dificuldades inerentes à docência, incluindo, eventualmente, o pouco

interesse dos discentes.

Dessa maneira, o presente trabalho promoveu um ensino mais didático-pedagógico

e, por parte dos alunos, mais participativo, estimulando-os a pesquisar e a investigar mais

acerca do comportamento e ecologia dos platelmintos, sobretudo as planárias, bem como

aplicar este conteúdo em sala de aula quando se tornarem futuros professores.

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