Extensão Rural - Livro IDAM

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Assistência Técnica

e Extensão Rural:

Construindo o Conhecimento

Agroecológico

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Presidência da RepúblicaLuis Inácio Lula da Silva

Governo do Estado do AmazonasCarlos Eduardo de Sousa Braga

Ministério do Desenvolvimento AgrárioMiguel Soldatelli Rossetto

Secretaria da Agricultura Familiar do MDAValter Biachini

Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural do MDAArgileu Martins da Silva

Coordenação Geral de Assistência Técnica e Extensão Rural do MDAFrancisco Roberto Caporal

Secretaria de Produção RuralJosé Maia

Instituto de Desenvolvimento AgropecuárioEdimar Vizolli

Projeto Desenvolvimento Local Sustentável do AmazonasAntônio Jandir Contente Morais

Agência de AgronegóciosRaimundo Valdelino Cavalcante

Universidade Federal Rural de PernambucoValmar Correia de Andrade

Departamento de Educação da UFRPEPaulo de Jesus

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Assistência Técnica

e Extensão Rural:

Construindo o Conhecimento

Agroecológico

Presidência da RepúblicaGoverno do Estado da Amazonas

Ministério do Desenvolvimento AgrárioSecretaria de Agricultura Familiar

Secretaria de Estado de Produção RuralInstituto de Desenvolvimento Agropecuário do Amazonas

Organização:

Jorge TavaresLadjane Ramos

Manaus • 2006

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Coordenação EditorialAntônio Jandir Contente Morais

Ladjane Ramos

Organização:Jorge Roberto Tavares

Ladjane Ramos

RevisãoPeta Teixeira

FotosArquivo ProVárzea/L.C. Marigo

Dania Lolah

Projeto gráfico e capaÁttema Design Editorial - www.attema.com.br

I 18 a IDAM. Assistência técnica e extensão rural: construindo o conhecimentoagroecológico/por Jorge Roberto Tavares e Ladjane Ramos. –Manaus: 2006. 128 p.1.Extensão Rural. 2. Agroecologia. 3. Desenvolvimento RuralSustentado. I. TAVARES, Jorge Roberto. II. RAMOS, Ladjane. III.GTZ.CDU 631.588.9+63.001.8(042)

Instituto de Desenvolvimento Agropecuário do Amazonas – IDAMAv. Buriti, 1850, Distrito Industrial, Manaus, AM, CEP 69.075-000Telefone/FAX: (0..92).3613.6926 • Email: [email protected]

Catalogação na Fonte

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Sumário

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

Política Nacional de Ater: Primeiros passos de sua implementaçãoe alguns obstáculos e desafios a serem enfrentados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9Francisco Roberto Caporal

Desenvolvimento local e territorialidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35Guilherme Soares

Estratégias de comunicação em contextos populares: Implicaçõescontemporâneas no desenvolvimento local sustentável . . . . . . . . . . . . . . 53Angelo Brás Fernandes Callou

A metodologia científica e o quotidiano daextensão rural: Algumas relações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67Paulo de Jesus

O grande desafio da educação empreendedora cooperativa . . . . . . . . . . . . . 81Jymmy Peixe Mc Intyre

Cooperativismo e desenvolvimento local . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85Maria Luiza Lins e Silova Pires

Região amazônica e economia solidária: Uma perspectivade desenvolvimento integrado sustentável . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93Ana Maria Dubeaux Gervais

Desenvolvimentos, uma perspectiva plural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .103Jorge Roberto Tavares de Lima

Da contradição do sujeito na extensão rural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .117Ladjane de Fátima Ramos

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Apresentação

A história da extensão rural no Brasil passou por várias crises desdeo seu surgimento até os dias atuais. Neste aspecto o papel doextensionista sempre esteve atrelado aos modelos de desenvolvimentoe interesses vigentes em cada uma dessas etapas.Com a crise econômica, política e ambiental do modelo da revoluçãoverde, o insucesso do estado desenvolvimentista na década de 80 e oavanço do neoliberalismo nos anos 90, o modelo institucional e técnicoda extensão entrou em crise, conseqüentemente o papel e intervençãodos técnicos da Ater também sofreram os ventos desta mudança.Decorrente disso, é que chegamos ao século XXI com uma indefiniçãodo papel do extensionista. Os métodos antes apreendidos, de difusão detecnologia, perfeitamente adaptado ao processo de modernização daagricultura já não atendem às exigências do meio rural, que avançou noprocesso de democratização e na busca de eqüidade social.Em meados de 2003 surge a Política Nacional de Assistência Técni-ca e Extensão Rural (PNATER), como resposta às necessidades doagricultor familiar, e mais uma vez interroga o papel do extensionistae preconiza o fortalecimento de processos participativos e a constru-ção de relações dialéticas entre os atores sociais.Com essa visão, proporcionou o estabelecimento de uma relaçãoforte com a sociedade civil, em favor do fortalecimento e da integraçãode todos os programas de inclusão social, de combate a pobreza, dereforma agrária e da agricultura familiar.Na mesma esteira, estabeleceram-se formas objetivas de apoio à tran-sição Agroecológica na Agricultura familiar, estimulando a produçãode alimentos sadios, de forma ambientalmente sustentável, econo-micamente viável e culturalmente adaptada.Reconhecendo a importância do movimento a partir da mobilizaçãogerada pela implementação da PNATER e acreditando na constru-

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ção de processos democráticos pela equidade e pela inclusão socialnão só das populações rurais, mas dos extensionistas envolvidos,que o Projeto de Desenvolvimento Local Sustentável -DLS-AM(Sepror/GTZ/IDAM) em parceria com a Secretaria da AgriculturaFamiliar (SAF/MDA) e Departamento de Educação da UniversidadeFederal Rural de Pernambuco tomou a iniciativa de realizar o Cursode “Metodologia em Extensão Rural, com enfoque Agroecológico”.Os textos reunidos nesta publicação resumem as apresentações feitaspelos professores e pesquisadores durante o curso. Além desses, foiincluído um artigo de Francisco Roberto Caporal, Coordenador Geralde Ater (Dater/SAF/MDA), que trata sobre a implementação da novaPolítica Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural que vemsendo realizada pelo Dater - Departamento de Assistência Técnica eExtensão Rural, em parceria com entidades governamentais e não go-vernamentais e cujo conteúdo está intimamente relacionado ao esfor-ço de capacitação do Projeto de Desenvolvimento Local Sustentável.O projeto de Desenvolvimento Local Sustentável (DLS-AM) é exe-cutado pelo Instituto de Desenvolvimento Agropecuário do Amazo-nas (IDAM) e pela Agência de Cooperação Técnica Alemã (GTZ),que executa, pelo Ministério de Cooperação Econômica e Desenvol-vimento da Alemanha (BMZ), Programas de Cooperação Técnicaem diferentes países, inclusive no Brasil.

Edimar VizolliPresidente do Instituto de Desenvolvimento

Agropecuário do Estado do Amazonas

Argileu Martins da SilvaDiretor do Departamento de Assistência

Técnica e Extensão Rural

Paulo de JesusUniversidade Federal Rural de Pernambuco

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Política Nacional de Ater: primeirospassos de sua implementação e algunsobstáculos e desafios a serem enfrentados

Francisco Roberto Caporal1

Introdução

Em 2003, o Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA passoua ser responsável pelas atividades de Assistência Técnica e ExtensãoRural – Ater, como estabelece o Decreto Nº 4.739, de 13 de junhodaquele ano. Por delegação da Secretaria da Agricultura Familiar –SAF, um grupo de técnicos coordenou a elaboração da nova PolíticaNacional de Assistência Técnica e Extensão Rural - Pnater, promo-vendo um amplo processo de consulta, a partir de audiências, en-contros e seminários envolvendo representações dos agricultoresfamiliares, de movimentos sociais e de prestadoras de serviços deAter governamentais e não governamentais. Este processo, demo-crático e participativo que envolveu mais de 100 entidades e mais de500 pessoas, levou à construção de alguns consensos e a um con-junto de acordos e redundou no documento que sintetiza a PolíticaNacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (MDA, 2004).Desde finais de 2003, seguindo as orientações desta Política, a SAF,através do Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural –Dater, vem implementando esta nova proposta. O objetivo desteartigo é registrar alguns passos deste processo e identificar alguns

1 O autor é Engenheiro Agrônomo, Extensionista Rural da EMATER/RS, Mestre em ExtensãoRural pelo CPGER da UFSM e Doutor em Agronomia pela Universidade de Córdoba,Espanha. Atualmente desempenha a função de Coordenador Geral de Assistência Técnicae Extensão Rural, no Dater/SAF/MDA.Email: [email protected] Brasília, 14 de agosto de 2005.

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desafios que ainda precisam ser enfrentados para que o Brasil possavir a ter, de fato, um novo perfil de Assistência Técnica e ExtensãoRural – Ater, capaz de contribuir para o fortalecimento da agricultu-ra familiar, numa perspectiva de desenvolvimento rural sustentável.

As bases teóricas da nova Pnater:sobre alguns princípios norteadores

A Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural estabeleceque a Missão da Ater deve ser “Participar na promoção e animação deprocessos capazes de contribuir para a construção e execução de es-tratégias de desenvolvimento rural sustentável, centrado na expansãoe fortalecimento da agricultura familiar e das suas organizações, pormeio de metodologias educativas e participativas, integradas às dinâ-micas locais, buscando viabilizar as condições para o exercício da cida-dania e a melhoria da qualidade de vida da sociedade” (MDA, 2004).Para ser mais precisa a orientação e a implementação desta Missão,a Pnater estabelece e se baseia em 5 (cinco) Princípios, que preten-dem ser a síntese daquilo que é indispensável para se ter uma novaAter. Dados os objetivos deste texto, basta citar aqui apenas trêsdesses Princípios, como segue:

“Contribuir para a promoção do desenvolvimento rural sus-tentável, com ênfase em processos de desenvolvimentoendógeno”, visando a “potencialização do uso sustentável dosrecursos naturais”.

“Adotar uma abordagem multidisciplinar e interdisciplinar, es-timulando a adoção de novos enfoques metodológicosparticipativos e de um paradigma tecnológico baseado nosprincípios da Agroecologia”.

“Desenvolver processos educativos permanentes e continua-dos, a partir de um enfoque dialético, humanista e construtivista,visando a formação de competências, mudanças de atitudes eprocedimentos dos atores sociais, que potencializem os objeti-

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vos de melhoria da qualidade de vida e de promoção do desen-volvimento rural sustentável”. (MDA, 2004)

Como é possível observar, o estabelecimento desta Missão e destesPrincípios supõe uma mudança de rumos com respeito às práticasdifusionistas, que marcaram a história da extensão rural convencio-nal. A teoria da Difusão de Inovações (ROGERS, 1969; 1995) nãoperde sua vigência, não obstante, ela deve deixar de ser usada naperspectiva da “persuasão”, da “educação bancária”, da “alienação”,(FREIRE, 1982; 1983), da pseudo superioridade do conhecimentocientífico sobre o saber popular, para dar lugar a novas formas enovos conteúdos desta intervenção. Deve-se adotar, necessariamente,metodologias participativas que ajudem a democratizar a relação entreextensionistas e agricultores. Ao contrário dos métodos que geramdependência e alienação, deverão ser adotadas metodologias quepossam contribuir para o “empoderamento” dos atores sociais. Es-tas formas de intervenção devem favorecer o estabelecimento deplataformas de negociação entre técnicos e agricultores que permi-tam a construção de saberes novos e mais compatíveis com a vidareal das populações envolvidas. Estes novos saberes, na prática coti-diana, poderiam ser aqueles conhecimentos sobre a realidade social,ambiental, econômica, cultural e política, onde agricultores e técni-cos buscam o “desenvolvimento”2. Logo, ao contrário da visãocartesiana e tecnicista que orientou as décadas dodesenvolvimentismo, a nova Ater exige uma visão holística e o esta-belecimento de estratégias sistêmicas e não apenas métodos apro-priados para uma difusão unilinear e unidirecional de tecnologias,próprios do difusionismo. Por isto mesmo, na nova Ater, técnicosdisponibilizam seus conhecimentos e não simplesmente os difun-dem, segundo o modelo clássico e a lógica linear do princípio de“estender” da fonte ao receptor. Esta nova visão, supõe a quebra da

2 Entendemos que o desenvolvimento, em sua formulação teórica mais ampla, significariaa realização de potencialidades sociais, culturais e econômicas de uma sociedade,em perfeita sintonia com o seu entorno ambiental e com seus exclusivos valoreséticos (ESTEVA, 1996).

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hierarquia de saberes e o respeito aos conhecimentos dos agriculto-res, que devem ser considerados válidos e necessários para a cons-trução de conhecimentos mais complexos, mediados pela realidade.Do ponto de vista tecnológico, a Pnater também supõe a necessidadede mudanças, pois parte do princípio de que o padrão tecnológico eas formas de manejo dos agroecossistemas que foram instituídos emodelados no escopo das estratégias de “modernização”, centradasnos pacotes tecnológicos da Revolução Verde, não são adequadospara o estabelecimento de estilos de agricultura e de desenvolvimentosustentável que são desejados pela sociedade e que passaram a ser umimperativo deste século. Os ideais de sustentabilidade e a segurançadas condições de vida das futuras gerações, não são compatíveis commodelos que levam à exclusão social, à expulsão de massas da popula-ção rural, num verdadeiro processo de geração de pobreza, de violên-cia, de iniqüidade, de subdesenvolvimento, como ocorreu nas déca-das do desenvolvimentismo. Os esquemas “modernizadores” da agri-cultura, sequer são adequados do ponto de vista da manutenção dabase de recursos naturais que as futuras gerações vão necessitar paraque possam assegurar condições dignas de vida. Trata-se, pois, danecessidade do estabelecimento de uma nova ética sócio-ambiental.Esta “visão de mundo” deve levar à formulação de novos processossócio-econômicos, que sejam produtivos mas que não percam de vistaas dimensões sociais e ambientais do desenvolvimento sustentável.Por isto mesmo, a Pnater estabelece a necessidade de adoção dosprincípios da Agroecologia e suas bases epistemológicas, para o dese-nho de agroecossistemas sustentáveis e para o estabelecimento deestratégias de desenvolvimento rural sustentável, que sejam opostasàquelas que foram implementadas ao longo do século passado.De certa forma, poderia ser dito que o enfoque metodológico etecnológico que está proposto na Pnater, requer a implementação deuma extensão rural agroecológica ou ecossocial3. Definimos a Exten-são Rural Agroecológica como um processo de intervenção de cará-

3 Ver CAPORAL (1988) e SÁNCHEZ DE PUERTA (2004).

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ter educativo e transformador, baseado em metodologias de investi-gação-ação participante, que permitam o desenvolvimento de umaprática social mediante a qual os sujeitos do processo buscam a cons-trução e sistematização de conhecimentos que os leve a incidir cons-cientemente sobre a realidade, com o objeto de alcançar um modelode desenvolvimento socialmente eqüitativo e ambientalmente sus-tentável, adotando os princípios teóricos da Agroecologia como cri-tério para o desenvolvimento e seleção das soluções mais adequadase compatíveis com as condições específicas de cada agroecossistemae do sistema cultural das pessoas implicadas em seu manejo.(CAPORAL, 1998)

Algumas bases epistemológicasque orientam a nova Ater

Para atender os requisitos antes enunciados e as ações prioritáriasdo Dater, que veremos adiante, é necessário o estabelecimento deprocessos que estejam orientados por estratégias não convencio-nais, isto é, não difusionistas, mas que se baseiem em metodologiasparticipativas, que assegurem a apropriação de conhecimentos porparte dos beneficiários. Portanto, será necessário romper com omodelo cartesiano tanto da extensão rural como da pesquisa e doensino, pois este não é adequado para apoiar estratégias de transi-ção Agroecológica, com participação social. É necessário superar avisão tradicional da ciência, pois ela está centrada “em enfoquesreducionistas e cartesianos, nos quais a ênfase é colocada sobre asrelações de causa e efeito que surgem quando dois fatores se influ-enciam entre si” (VIGLIZZO, 2001). Tal concepção permite estudare tratar de forma isolada cada parte do problema, reduzindo a com-plexidade e perdendo-se, por conseguinte, a possibilidade de enten-der as relações e interações (especialmente as ecológicas) que ocor-rem num agroecossistema manejado pelo homem.O que ocorre é que o modelo convencional de extensão rural, depesquisa e de ensino, assim como o desenvolvimento de tecnologias,

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situam-se no campo desse paradigma cartesiano e, como lembraMorin (1998 p. 272-3), “o paradigma dispõe de um princípio deexclusão; exclui não apenas os dados, enunciados e idéias divergen-tes, mas também os problemas que não reconhece. Assim, umparadigma de simplificação (disjunção ou redução) não pode reco-nhecer a existência do problema da complexidade”.Portanto, quando se trata de buscar estratégias de desenvolvimentorural sustentável, que visam à inclusão social, o fortalecimento daagricultura familiar e novos desenhos de agroecossistemas sustentá-veis, não se pode trabalhar com base num paradigma de redução,pois o redesenho de agroecossistemas e o estabelecimento de agri-culturas sustentáveis, com inclusão social, é algo que exige um enfoquesistêmico e uma visão holística, ou seja, é necessário lidar com acomplexidade dos processos de desenvolvimento. Na agricultura,isto se manifesta pela necessidade de complexificar os sistemas agrí-colas, introduzindo biodiversidade e manejando as relações entresolos, plantas e animais, ao invés de simplificá-los, como no modeloda Revolução Verde. Ademais, trata-se, também, de entender não sóa diversidade, mas as relações entre os indivíduos e entre eles e omeio ambiente, assim como as estratégias de resistência da agricul-tura familiar e as lógicas orientadoras dos processos decisórios queocorrem nas unidades familiares de produção.Assim mesmo, quando a meta é buscar mais sustentabilidade no proces-so produtivo agrícola, é necessário partir-se do entendimento de que ainsustentabilidade dos nossos sistemas agrícolas convencionais não seresolve apenas com insumos comprados no mercado. Estes, em geral,pioram o problema. Como diz Viglizzo (2001), “as agriculturas susten-táveis têm um forte componente de tecnologias de processo, o querequer uma substituição tecnológica ...” de insumos por conhecimentosricos em informações e menos agressivos ao meio ambiente.Não obstante, estas questões aparecem, cada vez mais nos discur-sos, na prática cotidiana de agentes de extensão rural, de professo-res e de pesquisadores, o que se observa é a reprodução do modelocartesiano o que não se coaduna com a nova Pnater. Isto ocorre

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porque as ações continuam subordinadas ao paradigma convencio-nal que, embora invisível, atua “na ordem inconsciente e na ordemsupraconsciente; é o organizador invisível do núcleo organizacionalvisível da teoria, onde dispõe de um lugar invisível” (MORIN, 1988).Assim, embora não apareça explícito nos projetos e nas atividadesconvencionais de Ater, pesquisa e ensino, estes expressam a nature-za virtual do paradigma que os orienta, pois o paradigma “se mani-festa constantemente e encarna no que gera” (MORIN, 1999). Poristo, a busca do desenvolvimento rural sustentável exige o rompi-mento com o paradigma dominante, que como se disse antes, nãocoaduna com ideais e sustentabilidade, inclusão social e fortaleci-mento da agricultura familiar.4

Do mesmo modo, há que se fugir das armadilhas do modelo produtivistaconvencional, pois a construção de agriculturas sustentáveis, comopropõe a Pnater, requer outra relação entre Agronomia e Ecologia eoutro entendimento a respeito de resultados econômicos. As análisesconvencionais sobre ganhos de produtividade e resultados econômi-cos, baseadas no enfoque da economia neo-clássica não dão conta denovas abordagens. O enfoque holístico requer que se avaliem os resul-tados em termos de estabilidade, resiliência, durabilidade no tempo eprodutividade do agroecossistema como um todo (ou da unidade fa-miliar de produção) e não de um cultivo em particular. Como é sabido,os sistemas convencionais baseados na busca de maiores produtivida-des físicas de monoculturas, jamais serão sustentáveis, pois depen-dem, sempre, e cada vez mais, da degradação dos seus entorno. Elestêm alto potencial entrópico. Isto está explicado pela Segunda Lei daTermodinâmica, ou Lei da Entropia, que mostra os sistemas dinâmicosfuncionando na natureza em condições de baixo equilíbriotermodinâmico, somente se mantêm funcionando porque extraem ener-gia do seu entorno. Ou seja, requerem um permanente subsídio

4 Segundo PENA-VEJA, A. ; STROH, P. (1999) “A ecologia da ação nos ajuda a entenderque a consciência ecológica não se limita apenas às relações homem/natureza, mas sedesdobra em nossas relações com o próprio universo interior, evoca um estado deconsciência: tudo tem que ser ecologizado, até mesmo as idéias”.

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energético para alcançarem os patamares de produtividade desejados,gerando degradação ambiental.Assim, projetos inovadores, serão aqueles que não seguem a lógica daRevolução Verde, pois aquela não permite resolver os problemas sócio-ambientais, uma vez que se baseia no modelo de altos insumos – altasrespostas, desenhado a partir de uma visão utilitarista do meio ambiente,sem preocupação ecológica. A construção de agriculturas sustentáveisrequer, portanto, um marco tecnológico baseado em outro paradigma,que trate de estabelecer uma nova e qualificada aproximação entre Agro-nomia e Ecologia, que leve ao manejo integrado de sistemas complexos.Isto exige técnicas e formas de manejo que se articulem entre si, respei-tando princípios ecológicos básicos e gerando sistemas de produçãoque se assemelhem, em seu desenho e em seu funcionamento, aosecossistemas naturais onde estão inseridos. Repetimos, trata-se, portan-to, de complexificar os sistemas, ao invés de buscar sempre maior sim-plificação, como ocorre na agricultura convencional.Por estas e outras razões de natureza científica, a ciência e a tecnologianecessárias para o desenvolvimento rural sustentável, com inclusãosocial, com fortalecimento da agricultura familiar, com produção dealimentos sadios e com preservação ambiental, devem basear-se numparadigma ecossocial5, buscando alicerçar-se nos princípios e basesepistemológicas da Agroecologia6.

Algumas ações do Daterpara implementação da Pnater

Este não é o lugar para elencar o conjunto de ações do Dater paraimplementação da Pnater, ao longo dos dois anos de sua existência.

5 O paradigma ecossocial se enquadra na idéia do pensamento complexo e nos recomenda,entre outras coisas, que se deve incursionar por disciplinas circunstancialmente afastadas,buscando juntar diferentes ciências que tenham incidências interdisciplinares sobre os objetosa que debruça o cientista. A Agroecologia, como matriz científica transdisciplinar, podecontribuir, decisivamente, para este novo enfoque. Ver, por exemplo: SEVILLA GUZMÁN,E. y WOODGATE, G. (2002)

6 NORGAARD, R. B. (1989); NORGAARD, R.B. (2002).

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Devido à natureza deste artigo, não serão tratados os esforços realiza-dos e que redundaram num significativo aumento do orçamento paraapoio federal aos serviços de Ater no país. Sequer seria adequado abor-dar as ações destinadas a ampliar o espectro e fortalecer as relações doMDA/SAF/Dater com entidades executoras de serviços de Ater, entreoutros. Ainda que alguns destes aspectos venham a aparecer mais adi-ante, quando forem colocados os desafios para a nova Ater, parece ne-cessário restringir esta breve incursão, simplesmente, àqueles aspectosque visam fortalecer a transição da extensão rural convencional em dire-ção ao cumprimento dos Princípios e da Missão antes enunciados.Por enquanto, somente para deixar registrado, caberia informar duasações importantes, realizadas no final de 2004, visando recolocar aExtensão Rural na pauta da política nacional. Assim, em novembro,foi realizada, em Brasília, a Conferência Nacional de Ater, com re-presentação de quase todos os estados. Em paralelo, o Dater orga-nizou uma exposição sobre a História da Extensão Rural no Brasil(disponível na página www.pronaf.org.br), no térreo do Palácio doPlanalto. A exposição que teve duração de duas semanas, contoucom a colaboração e ativa participação de organizações de Ater go-vernamentais e não governamentais de vários estados brasileiros7.O processo de implementação da Política também veio acompanha-do do estabelecimento de parcerias com entidades de Ater e entida-des envolvidas em atividades de capacitação de agricultores familia-res8. Neste sentido, cabe salientar que, em 2004, a SAF/Dater execu-

7 Por ocasião da abertura da exposição Ministro Miguel Rossetto fez o lançamento oficialda Política Nacional de Ater.

8 A chamada para Seleção de Projetos de Capacitação de Agricultores Familiares e Técnicos,efetivada em 2004, definiu três diretrizes orientadoras para a apresentação de propostaspelas instituições: a) partir de um processo de planejamento e gestão das ações decapacitação/formação realizados de forma compartilhada com os atores sociaiscomprometidos com o desenvolvimento rural sustentável, nos âmbitos macro emicrorregional; b) incorporar as dimensões de gênero, geração, raça e etnia como temastransversais e na concepção de materiais didáticos, contemplando ainda as característicasculturais, sociais, econômicas e ambientais da região; e, c) estimular processos educativose relações de co-responsabilidade entre os agricultores familiares, suas organizações e asinstituições prestadoras de serviços, com efetivo comprometimento destas e de seustécnicos. Para atender estes objetivos a SAF/Dater firmou 59 Contratos, no valor de R$9.721.190,91.

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tou 96,12 % do orçamento destinado ao Fomento de Atividades eAter e Capacitação – PRONAF. Além de ações diretas, foram firma-dos 101 Convênios com entidades de Ater nos 27 estados da Fede-ração, no valor de R$ 42,1 milhões. Com isto a SAF/Dater contri-buiu, decisivamente, para que a abrangência dos serviços de Aterpudesse chegar, direta ou indiretamente, a um total aproximado de1,6 milhões de unidades familiares de produção9. Cabe destacar que,em 2004, as entidades estaduais de Ater contrataram mais de2.400 novos profissionais.Para levar adiante o processo de implementação da Pnater, foramestabelecidas algumas linhas estratégicas capazes de contribuir paraa aceleração e qualificação do processo. O eixo principal desta estra-tégia está centrado no campo do conhecimento. Para esta decisão,partiu-se do entendimento de que para levar à prática a nova Políticade Ater, o primeiro passo seria dar ampla divulgação dos principaisenfoques da Política. Isto foi feito, ao longo do primeiro semestre de2004, quando o Dater promoveu seminários em todos os estadosda federação. Além de divulgar a Política estes seminários destina-ram-se, também, a propor aos atores institucionais de Ater em cadaestado a elaboração de um Plano Estadual de Ater que pudesse bus-car a sinergia e a cooperação entre as ações das diferentes entida-des, de modo que se abrisse um caminho para a formação de futurasredes de serviços de Ater nos estados. Embora com diferenças, hou-ve maciça participação neste processo. Dele resultou a formação dealgumas redes ou o fortalecimento de redes já existentes. Do mesmomodo, alguns estados já elaboraram seus Planos Estaduais, enquan-to outros estão com esta ação em andamento. Observe-se que o

9 Como uma estratégia de resposta positiva do Governo Federal destinada a fortalecer as entidadesestaduais de Ater, o Dater vem ampliando o apoio técnico-financeiro às organizações estaduais,sempre e quando os governos dos estados tomarem iniciativas neste sentido. Espírito Santo,Minas Gerais, Paraíba e Rio Grande do Norte, foram alguns dos estados que se beneficiaramdesta estratégia, em 2004. Cabe ressaltar que, entre 2002 e 2004, as instituições estaduaisde Ater ampliaram as condições de infraestrutura, com a aquisição de mais de 2.300computadores e mais de 1.300 veículos, sendo que boa parte contou com apoio da SAF/Dater, através dos Convênios antes citados.

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Dater adotou como princípio, o respeito às dinâmicas estaduais, nãoestabelecendo obrigatoriedade nem prazos, simplesmente passandoa apoiar financeiramente a realização de centenas de eventosregionalizados e/ou estaduais que passaram a acontecer.Outra ação concretizada em 2004, foi a realização de Oficinas deNivelamento Conceitual, com a participação de mais de 270 Agen-tes de Ater vinculados a organizações governamentais e não gover-namentais e que pudessem ser multiplicadores destas basesconceituais em suas entidades e em seu entorno de trabalho, emtodos os estados. Isto visava, também, contribuir para que estestécnicos passassem a atuar mediante a adoção das bases conceituaisda nova Ater. Foram realizadas, em 2004, 8 oficinas envolvendo,em média, 10 técnicos por estado. Dada a avaliação positiva destaação, o Dater, por decisão do Grupo de Trabalho de Formação doComitê Nacional de Ater, decidiu pela realização, em 2005, de maisde 135 encontros de nivelamento sobre a Política Nacional de Ater,que deverão ser realizados de agosto a novembro, com a participa-ção de, no mínimo, 5.400 Agentes de Ater de todos os estados dopaís. Isto assegurará que, em 2006, já haverá uma importante quan-tidade de técnicos apropriados dos conceitos básicos que devemorientar as atividades da extensão rural brasileira.Neste mesmo sentido, o Dater implementou duas ações com caráterde Projeto Piloto, para avaliar a possibilidade de viabilizar outrasestratégias. A primeira delas foi a realização de convênios com esco-las agrotécnicas e universidades, num total de dez instituições deensino, visando a qualificação de 200 estudantes, com bolsas paraestágios de fim de curso e, posteriormente, a oferta de bolsas paraque estes jovens recém formados passem a atuar junto a entidadesde Ater, com garantia de bolsa por dois anos. Assim mesmo, foramestabelecidos acordos com Universidades para a realização de4 cursos de Especialização em “Extensão Rural para o Desenvolvi-mento Sustentável”. Destes cursos, três estão em fase de execução,com a oferta de 35 vagas por curso. Os cursos são totalmente finan-ciados pelo Dater, inclusive as ajudas de custo para os estudantes e

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têm por objetivo formar profissionais capazes de influir em suas en-tidades e contribuir para a ampliação de processos de capacitaçãode técnicos nos estados.10

Na linha da formação de agentes, o Dater promoveu, também, cur-sos de curta duração para Agentes de Ater que trabalham com indí-genas, extrativistas, quilombolas, pescadores artesanais, inauguran-do, assim, uma forma de contribuir para que as ações das entidadesde Ater contemplem, de forma adequada, as especificidades sócio-culturais de públicos diferenciados, que exigem uma ação de exten-são e assistência técnica que respeite estas diferenças e as caracterís-ticas de suas atividades produtivas. Participaram destes cursos cercade 200 Agentes de extensão, no ano de 2004 e início de 2005. Noprimeiro semestre deste ano, o Dater realizou dois cursos para Agen-tes de Ater que atuam no resgate de conhecimentos, produção, usoe comercialização de Plantas Medicinais, atendendo uma demandaespecífica de um campo de trabalho da extensão que vem crescendonos últimos anos e que está relacionado com outras políticas públi-cas. Do mesmo modo, realizou um curso de 40 horas para Agentesde Ater que atuam em Saúde no Meio Rural.Ao longo dos dois anos de implementação da Pnater, o Dater pro-moveu vários cursos de Agroecologia, com destaque para cursosministrados por especialistas internacionais, como Miguel Altieri, ClaraNicholls (Universidade de Berkeley – USA), Carlos Guadarrama eLaura Trujillo (Universidade de Chapingo – México). Com a colabo-ração destes professores foram realizados dois cursos em Itabuna(BA) com a participação de mais de 120 profissionais, Belém (PA) eSão Luis (MA), com cerca de 40 profissionais em cada curso. Alémda realização direta, a SAF/Dater apoiou dezenas de cursos de

10 Pesquisas têm mostrado que alunos de escolas que adotam a Pedagogia da Alternânciatendem a permanecer em suas comunidades/propriedades. Esta é uma das razões pelasquais a SAF/Dater apoiou, em 2004, as atividades destas escolas (Escolas Família Agrícola- EFAs e Casas Familiar Rural - CFRs), através de convênio com a UNEFAB (que envolvea ARCAFAR), no valor de R$ 1.200.000,00. No total serão beneficiadas,aproximadamente, 270 escolas.

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Agroecologia, em diferentes estados, além de dezenas de eventos,como encontros, fóruns, seminários e congressos de Agroecologia,investindo recursos técnicos, materiais e financeiros com vistas aacelerar o processo de socialização de conhecimentos neste novocampo de estudos, que está bastante enfatizado como eixo da Polí-tica Nacional de Ater. Destes eventos participaram milhares de téc-nicos, agricultores, estudantes e outros interessados.Cabe destacar, o apoio decisivo dado pelo MDA à realização do IICongresso Brasileiro de Agroecologia, realizado em Porto Alegreem novembro de 2004, que reuniu mais de 3.500 participantes. Domesmo modo, cabe destacar a realização, em abril de 2005,da I Semana de Agroecologia do Estado do Maranhão, que emboratenha tido uma participação menor, constitui-se num marco das açõesarticuladas de instituições e técnicos daquele estado para a atuaçãona perspectiva da transição agroecológica. Ainda como parte desteprocesso de socialização o Dater promoveu, em novembro de 2004,uma vídeo-conferência, transmitida diretamente do auditório da Sededa Embrapa, para todas as unidades descentralizadas daquela insti-tuição, criando a oportunidade para que centenas de interessadosassistissem as intervenções de dois especialistas em Agroecologiavindos da Universidade de Córdoba, Espanha e outros dois vindosdas Universidades de La Plata e Buenos Aires, Argentina.Outra iniciativa importante foi a elaboração pela SAF do Programade Apoio à Agricultura de Base Ecológica nas Unidades Familiaresde Produção, apelidado de Programa de Agroecologia. Através des-te Programa a SAF/Dater aportarão, em 2005, cerca de R$ 40 mi-lhões para ações de capacitação de técnicos e agricultores(a),disponibilização de conhecimentos e tecnologias, e para a realizaçãode diversos eventos entre os quais alguns seminários para a discus-são dos currículos das ciências agrárias, além de outras tantas ativi-dades. Dentro deste Programa, o Dater vem coordenando o “Con-curso Nacional de Sistematização de Experiências em Agroecologia”,cujos 50 melhores trabalhos serão apoiados financeiramente visan-do ao seu fortalecimento, enquanto que o material recolhido será

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publicado, objetivando a socialização do conhecimento sobre estasexperiências.Por fim, é importante citar as ações da SAF/Dater no campo dapesquisa e extensão universitária. Neste sentido, em 2004 foi reali-zado acordo entre MDA e MCT (Secretaria de C&T para a InclusãoSocial) e através de dois editais foram acolhidos projetos para adisponibilização de tecnologias adaptadas à agricultura familiar etecnologias de base ecológica. Foram financiados projetos no valortotal de R$ 5 milhões para entidades de pesquisa e outrosR$ 5 milhões para grupos de professores que atuam em extensãouniversitária11. Em 2005, foi aberto outro Edital, com a mesma par-ceria, no valor total de R$ 4 milhões destinados ao financiamento deprojetos para disponibilização de tecnologias de base ecológica. Nomomento em que este artigo está sendo escrito, mais de 450 proje-tos estão em fase de avaliação.Este breve resumo das iniciativas do Dater, especialmente naárea de formação de Agentes de Ater e socialização de conhe-cimentos necessários para a implementação da Política Nacio-nal de Ater12, pretende dá uma idéia aos leitores de uma ques-tão fundamental: para que as orientações da Pnater possam serpostas em prática é necessário que mudem as instituições esuas diretrizes e prioridades, mas também é necessário que osAgentes incorporem novos conhecimentos e novas concepçõessobre agricultura e desenvolvimento sustentável e sobre o pa-

11 Participaram dos editais entidades públicas de pesquisa, de âmbito nacional eestadual, além de pesquisadores vinculados a atividades de Extensão Universitáriadas Universidades Públicas, em ambos os casos houve articulação com entidades derepresentação dos agricultores e/ou entidades executoras de serviços de Ater. Comoresultado desta iniciativa, foram aprovados 170 projetos e firmados Contratos e Convênioscom Universidades e instituições de pesquisa. Destaque-se que a maior parte dos recursosfoi destinada às regiões Nordeste e Norte. Esta ação teve ampla e positiva repercussãonos meios científicos e acadêmicos, quer pela inovação, quer pelo conteúdo dos editais.

12 No universo das atividades da SAF/Dater, diversas ações, inclusive de Formaçãode Agentes de Ater, contaram com apoio e co-participação com o MCT, o MMA,a SEAP, a EMBRABA, a FUNAI, o NEAD, o Programa de Promoção da Igualdadeem Gênero, Raça e Etnia, além de outros orgãos da esfera federal.

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pel da Assistência Técnica e Extensão Rural diante destas novasexigências da sociedade. Igualmente, é necessário que as insti-tuições de ensino e pesquisa tratem de rever seus paradigmasadotando novas bases epistemológicas, novas metodologias,novos formatos pedagógicos e novos conteúdos, em todas assuas atividades.

Os limites e os desafios queainda devem ser enfrentados

Muitas das ações promovidas pelo MDA/SAF/Dater no sentido daimplementação da Política Nacional de Ater ainda não podem serdevidamente avaliadas, dado o curto espaço de tempo em que estãosendo realizadas. No entanto, a experiência destes dois anos permi-te identificar um conjunto de limites e desafios que precisam serenfrentados nos próximos meses e anos.O primeiro e grande desafio que está colocado diante de todos quetrabalham na perspectiva da Pnater, e que têm compromisso com ofortalecimento da agricultura familiar, está dado pelas macro orienta-ções de política de desenvolvimento do Estado, tanto do EstadoNacional como dos estados federados e municípios. Principalmenteas políticas do Estado nacional para o desenvolvimento rural podemse constituir num sério obstáculo tanto ao que preconiza a Pnatercomo à busca de sustentabilidade nas atividades agropecuárias. Acontinuidade do apoio público e do financiamento subsidiado deatividades agropecuárias notadamente insustentáveis, que seguembaseadas nos pacotes da Revolução Verde, que exigem o crescimen-to constante do tamanho do negócio agrícola empresarial, para ga-rantir competição nos mercados de commodities e que portanto for-çam a ocupação de novas áreas (como vem ocorrendo no Cerrado ena Amazônia), poderá retardar a mudança no estilo de desenvolvi-mento rural. Este modelo está na contramão das estratégias de de-senvolvimento rural sustentável que visam à inclusão social, à gera-ção de postos de trabalho no campo, à manutenção de um tecido

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social heterogêneo e à construção de uma agricultura de base ecoló-gica, mais compatível com a necessidade de produção de alimentossadios em quantidades suficientes para garantir a segurança alimen-tar de toda a população, sem descuidar da necessária proteção dosrecursos naturais. O que vemos hoje, sob a orientação de um mes-mo Governo nacional é a disputa de dois modelos de desenvolvi-mento rural e de agricultura: um modelo já velho, não sustentável,mas ainda hegemônico; e outro, em construção, que trata de buscara sustentabilidade. A solução desta contradição poderá definir osrumos futuros do nosso desenvolvimento como sociedade. No en-tanto, no momento, este é um limite objetivo que só não se tornouintransponível, até agora, porque a agricultura familiar ocupa maisde 4,1 milhões de estabelecimentos rurais, onde a mudança podeser praticada, dando uma margem de tempo até que os modelosvenham a se encontrar na expressão completa de sua contradição.Ressalvado este grande limite, cabe destacar, então, alguns dos prin-cipais desafios para a implementação plena dos conceitos da Pnater,tais como:a) A necessidade de mudança institucionalAs entidades públicas estatais de Ater foram criadas e se desenvol-veram à luz de uma perspectiva desenvolvimentista, imediatista evoltada para a “modernização do campo”13. Por esta razão, em ge-ral, as instituições estaduais foram adaptadas para isto, e suas dire-trizes e objetivos orientaram para uma ação de tipo produtivista,baseada na transferência de tecnologias, visando ao aumento da pro-dução e da produtividade na agropecuária. Isto resultou na monta-gem de uma estrutura hierárquica, tanto técnica como administrati-va, voltada para a obtenção de resultados de curto prazo. A pers-pectiva da transição Agroecológica como está proposta na Pnater,requer outros formatos organizacionais e a adoção de outros indica-dores para a medição de resultados. Neste sentido é necessário

13 Muitas das orientações de políticas estaduais para a agricultura ainda tencionam nestemesmo sentido.

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horizontalizar e democratizar os processos de gestão e de decisãodestas instituições, incluindo a possibilidade de participação dos“beneficiários”. Ao mesmo tempo, o trabalho dos agentes deve pas-sar a ser medido por resultados de médio e longo prazo, e, inclusive,a partir da observação das diferentes dimensões da sustentabilidade:econômica, social, ambiental, cultural, política e ética e não apenasdos ganhos de produção e produtividade14 .Esta não é uma tarefa direta do Dater, senão que cabe ao Departa-mento um trabalho de assessoria que contribua para que estas mu-danças ocorram. Do mesmo modo, as entidades não governamen-tais, que nasceram no vácuo deixado pelas instituições de Ater dosestados, na maioria dos casos também precisam passar pelos mes-mos processos de mudança, ainda que com natureza e alcances dife-renciados. Cabe recordar que não é por ser uma ONG que umaentidade têm, automaticamente, representação dos agricultores(as)ou participação deles na gestão das entidades. Ainda que tenhamsurgido para ocupar o espaço e combater as políticas modernizadorasda Revolução Verde e as políticas neo-liberais, muitas das ONGs eoutras entidades privadas que atuam em Ater, fazem uma disputapor recursos e espaços que não contribui para formação de redes deAter. Além disso, na maioria dos casos, não há suficiente investimen-to das entidades não governamentais na capacitação dos seus profis-sionais e, por isso, nem todas adotam metodologias compatíveis coma Pnater, ainda que muitas dominem e pratiquem completamenteestas metodologias.Ademais, cabe destacar que independente da instituição em que atuem,os profissionais de Ater são parte de uma parcela privilegiada da socie-dade. Ainda que venham de origem humilde, seu status profissionallhes coloca, queiram ou não, numa posição “pequeno burguesa”que acaba por influir no seu profissionalismo, na sua forma de ver ese relacionar com as coisas do mundo e do trabalho, o que se cons-titui em mais um risco para o sucesso de uma prática que deve ser

14 Sobre as mudanças necessárias ver CAPORAL (1991 e 1998).

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comprometida com os agricultores(as) familiares e pescadores(as)artesanais.b) Sobre a necessidade de um “novo profissionalismo”Entre os desafios de uma extensão rural para o desenvolvimento sus-tentável está a necessidade de estabelecer-se um “novoprofissionalismo”. Em efeito, como sabemos, uma das deformaçõesgeradas pelo modelo de desenvolvimento rural e agrícola ainda vi-gente, foi a transformação imposta aos modelos de educação e for-mação de profissionais das ciências agrárias e outras áreas do conhe-cimento. E, lamentavelmente, a absoluta maioria das escolas de nívelmédio e superior das ciências agrárias continuam com o mesmo per-fil de formação profissional da época dos convênios MEC-USAID.Em realidade, em vez de formar profissionais que entendam as con-dições específicas e totalizadoras inerentes aos ecossistemas eagroecossistemas, o ensino nas universidades e escolas agrotécnicasbrasileiras adotou um modelo que privilegia a divisão disciplinar, aespecialização e, por conseqüência, os profissionais egressos sabemmesmo é fazer difusão de receitas técnicas e pacotes tecnológicos.Assim, os profissionais que saem destas instituições de ensino, emgeral, não tiveram a oportunidade de chegar a uma compreensão daagricultura como uma atividade que, ademais de sua “função de pro-duzir bens”, é um processo que implica uma relação entre o homeme o ecossistema onde vive e trabalha, sem considerar também, que,para muitos agricultores e agricultoras familiares, a atividade quedesenvolvem é parte de seu modo de vida e não apenas um negócio.Em geral, durante a formação profissional não se faz sequer ummomento de integração das disciplinas. Cada uma delas é repassadaaos alunos em sua própria “gaveta”, isolada das demais e, quasesempre, alheia à realidade objetiva das pessoas e dos processos pro-dutivos concretos. Esta primeira carência na formação limita os pro-fissionais quanto à possibilidade de ter uma visão holística da reali-dade na qual vai atuar, o que minimiza sua possibilidade de ter umacompreensão da agricultura a partir dos princípios básicos dos pro-cessos naturais.

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A segunda grande deformação na formação dos profissionais dasciências rurais e agrárias está relacionada com a distância abstratacom que se trata ao homem-agricultor. Em geral, se estuda muitosobre as máquinas e os insumos, o solo como substrato para susten-tação da produção, são estudadas algumas culturas e a criação dealguns animais domésticos, mas muito pouco se estuda sobre o ho-mem e a mulher trabalhadores da agricultura e o papel decisivo queeles têm na agricultura. O ensino costuma basear-se numa visão daagricultura como um conjunto de técnicas agrícolas aplicadas e pou-co mais, sequer conseguindo integrar a agronomia com a ecologia.Além disso, não se pode esquecer que existem fortes implicaçõesideológicas e políticas no ensino, presentes na dimensão“meritocrática” e de competição (status) que conformam a concep-ção educativa das sociedades atuais e que acabam introduzindo naformação dos profissionais alguns valores éticos individualistas, quesão dominantes na sociedade, e que se reproduzem, posteriormen-te, nas atitudes individuais e na prática dos agentes.Por tudo isto, a formação determina um estilo de profissionalismo,que pode ser entendido como um “profissionalismo normal”, ou seja,como aquele que se refere ao pensamento, valores, métodos e com-portamentos dominantes em uma profissão ou disciplina, de maneiraque, como a ciência normal, o profissionalismo normal é conserva-dor, baseado numa estrutura de geração e transferência de conheci-mentos, reforçada pela educação e pelo treinamento, pela hierarquiadas organizações e por pautas de recompensa e carreiras, que ten-dem a reproduzir ações profissionais também conservadoras.Logo, a implementação da Pnater exige um amplo processo de for-mação de profissionais com outro perfil, cujas bases podem ser bus-cadas nos conceitos, princípios e objetivos estabelecidos na PolíticaNacional de Ater.c) Sobre a formação dos futuros profissionais para a AterDado o que vimos antes, pode-se afirmar que a nova extensão ruralexige um “novo profissionalismo”, que se caracterize, em primeirolugar, pela capacidade de colocar e ver as pessoas antes das coisas,

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com especial atenção aos grupos menos favorecidos. Como já sedestacou, os métodos ajudam, mas não são suficientes para cons-truir novas relações entre agentes de Ater e agricultores, de modoque os profissionais da Extensão Rural Agroecológica deveriam as-sumir novos conceitos, valores e comportamentos, ademais de no-vos métodos. Deve-se considerar que este “novo profissionalismo”é necessário, inclusive porque os métodos não são neutros, já quecorrespondem a contextos sociais, ideológicos, políticos e históri-cos, de modo que podem ser utilizados para levar a uma genuínacapacidade de construção e organização, assim como podem serutilizados apenas para satisfazer objetivos externos.Um “novo profissionalismo”, ademais, requer reconhecimento deque nem sempre o que pensamos e estabelecemos como necessida-des dos indivíduos e grupos assistidos, corresponde às necessidadessentidas por eles mesmos, de modo que o Agente deveria estar,quotidianamente, em busca dos valores próprios dos beneficiários.Por outro lado, estabelecer um “novo profissionalismo” exige que,ao contrário da especialização profissional, se adote uma formaçãomais multidisciplinar ou pelo menos se amplie a capacidade de interagircom outras profissões e disciplinas. Como destacam diversos auto-res, este “novo profissionalismo” é mais um grande desafio, de modoque os Agentes não devem se intimidar frente à complexidade eincerteza, próprios de ações que devem estar baseadas no diálogo ena participação.Portanto, ainda que não seja papel do MDA/SAF/Dater, há que secriar mecanismos capazes de influir na mudança curricular, pelo menosdas ciências agrárias, de modo que possam ser estabelecidos currí-culos capazes de formar profissionais que tenham as habilidades paraolhar a realidade com as lentes de um novo paradigma e atuar apartir de uma compreensão multidisciplinar e humanista e adotandométodos e pedagogias construtivistas. Em verdade, cabe às escolasde nível médio e às universidades, a iniciativa do processo de mu-dança curricular necessária para atender os imperativos do desen-volvimento sustentável e das novas práticas exigidas pela Pnater. Se

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não o fizerem, seguirão formando profissionais para o passado e nãopara o futuro.d) A legitimação e institucionalização da PnaterQualquer política pública corre o risco de ser alterada ou, inclusive,abandonada, dados os interesses políticos em jogo. Sabe-se que natradição brasileira, governos alteram políticas em função de seus pro-gramas partidários ou de prioridades de governo ou até mesmo emrazão de acordos ou alianças. Neste sentido, a Pnater apresenta umareconhecida fragilidade, na medida em que não foi instituída por lei.Embora tanto a Constituição como a Lei Agrícola estabeleçam a res-ponsabilidade do Governo Federal com a oferta destes serviços, ahistória dos anos 1990 a 2003 mostra que nem sempre estas deter-minações constitucionais e legais são transformadas em ação governa-mental. O fato de em 2003 o orçamento federal destinar apenas R$3,8 milhões para apoiar atividades de Ater no país é ilustrativo destaquestão. Portanto, o desafio que está colocado é, não só institucionalizara Política de Ater, senão buscar formas permanentes de alocação derecursos financeiros. Estas são ainda tarefas por fazer.Não obstante esta debilidade, a Pnater, por ter sido construída deforma participativa, como foi mencionado antes, encontra amploacolhimento entre as entidades do setor, como também entre as en-tidades de representação da agricultura familiar brasileira. Seus con-teúdos e propósitos atendem às demandas e interesses dos segmen-tos potencialmente beneficiários destes serviços. Ademais, a criaçãodo Comitê Nacional de Ater, do CONDRAF – Conselho Nacional deDesenvolvimento Rural Sustentável, composto por 31 entidades eparitário (Estado, ONGs e entidades de representação da agriculturafamiliar), onde as ações e programas do Dater são discutidas econsensadas, vem dando uma maior solidez a esta Política. Assimmesmo, o Dater, juntamente com o Comitê deverá promover, aindaem 2005 um Seminário de avaliação da Pnater e do processo de suaimplementação, de modo que todos os atores sociais envolvidospossam contribuir para a superação de eventuais dificuldades e parao aperfeiçoamento da Política.

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Reflexões finais

A Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural come-çou a ser implementada em fins de 2003, portanto, qualquer avalia-ção de seus resultados e dos avanços na aplicação dos novos enfoquespropostos seria prematura. As ações já realizadas mostram, entre-tanto, que além da vontade política do Governo Federal e do MDA,em particular, estão sendo levadas à prática muitas iniciativas con-cretas que já mostram alguns impactos. O principal deles, talvez sejaa internalização dos novos conceitos orientadores desta Política noâmbito das instituições governamentais e não governamentais de Atere, inclusive, de ensino e pesquisa. Este, que é um elemento central,foi alvo de grande esforço do Dater, até porque era necessário fazerchegar às entidades o conhecimento de que o País volta a ter umaPolítica para o setor e volta a aportar recursos financeiros para apoiaras ações de Ater. Este processo permitiu, ainda, identificar algumasresistências quanto a algumas das bases conceituais da nova Ater, especi-almente entre algumas poucas entidades governamentais.Neste curto período, observou-se que a maioria das entidades go-vernamentais de Ater investiu muito na capacitação de seus recursoshumanos, seja em conhecimentos sobre Agroecologia, seja sobreMetodologias Participativas ou sobre outras bases conceituais daPnater. Cabe destacar o esforço da EMATER-PA, da EMATER-MG,da SEATER-AC, do IDAM-AM , EMATER-RN e da CEPLAC. Inclu-sive, é importante registrar que concursos públicos para contrataçãode Agentes de Ater passaram a incorporar a exigência de conheci-mentos sobre as bases teóricas da Pnater, como foi o caso do con-curso realizado, em 2004, pelo INCAPER, do Espírito Santo.No âmbito das ONGs, cooperativas de técnicos e outras entidadesnão governamentais que realizam serviços de Ater, observou-se umavanço quanto à Pnater, especialmente na capacitação deagricultores(as), assim como no fortalecimento de algumas redes deserviços, onde se destacam a Articulação Mineira de Agroecologia –AMA, a Rede Ecovida, a Rede ASA, a Rede de Serviços de Ater do

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Nordeste, e a formação de outras, como por exemplo a Rede deTécnicos em Agroecologia do Estado do Maranhão. Cabe salientarque o menor avanço em termos de capacitação de técnicos paraatuarem com base nas orientações da Pnater ocorreu no âmbito dasprestadoras de serviços de Ates contratadas pelo INCRA para pres-tar assessoria aos assentados da reforma agrária.A articulação do Dater com algumas universidades e escolas de nívelmédio vem demonstrando que há, no interior das instituições deensino, núcleos de alunos e professores que já atuam ou queremadotar em suas ações de formação as orientações contidas na Pnater.O tema da Agroecologia, por exemplo, tem sido objeto de seminári-os e cursos realizados dentro de instituições de pesquisa e de ensi-no, alguns deles motivados, diretamente pelas ações do Dater, comoestá ocorrendo na UFBA, nas escolas da CEPLAC, entre outras, ouem cursos específicos como vem ocorrendo na UFPR15. No momen-to, lamentavelmente, o Dater não conta com a estrutura de pessoalque seria necessária para contribuir mais decisivamente no avançodeste processo, de modo a acelerar as mudanças no ensino e napesquisa. Este é um limite que precisa ser enfrentado.Ao longo destes dois anos, a SAF/Dater firmou convênios com asentidades estatais dos 27 estados da federação, ao mesmo tempo emque apoiou financeiramente dezenas de entidades não governamen-tais que atuam em Ater e em capacitação de agricultores(as) familiares,como vimos antes. Todos os Termos de Referência, chamadas de Pro-jetos e Editais lançados nestes dois anos estabeleceram as bases para aelaboração de projetos que seguissem os princípios, diretrizes, objeti-vos e orientações metodológicas da Pnater. Isto assegurou certo avan-ço no caminho do que recomenda a nova Política, e embora se identi-fiquem muitas imitações, o Dater parte do princípio de que é necessá-rio que exista um período de transição, para que Agentes de Ater esuas instituições internalizem e se apropriem dos novos conceitos, se

15 Observe-se que a Universidade Federal do Paraná acaba de abrir concurso para contratarprofessores de Agroecologia, Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente, o que é umainiciativa pioneira que deve abrir uma nova história do ensino universitário brasileiro.

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capacitem para uma atuação diferenciada, de modo que possam porem prática um novo modo de fazer extensão rural.Antes de finalizar este artigo, é importante deixar registrado o apoiode algumas entidades estatais, como a EMATER-RS, Centros daEMBRAPA de Belém, de Bagé, de Pelotas, convênio EMBRAPA-Epagri,NEAF-UFPA, UFRPE e tantas outras que, ao longo destes dois anos,têm liberado profissionais de seus quadros para participarem comofacilitadores em cursos de capacitação promovidos pelo Dater. Alémdestas, destacamos o apoio de muitas ONGs que contribuíram tantona facilitação de etapas como na apresentação de suas experiênciasnestes mesmos eventos de capacitação. A todos os profissionais quecolaboraram, inclusive, sem cobrar honorários, simplesmente com oobjetivo de ajudar na implementação da Pnater, assim como aosagricultores(as), pescadores(as), e suas entidades representativas, éfundamental que se registre os agradecimentos do Dater. Da mesmaforma, deve ser registrada a participação e contribuição dos membrosdo Comitê Nacional de Ater e do Fórum de Apoio à Gestão do Pro-grama de Agroecologia, sem cuja colaboração não teria sido possívellevar adiante os propósitos de implementação de uma nova Política deAter no nosso País. Uma Política que se destina a fortalecer a agricul-tura familiar e ajudar o Brasil a construir um modelo de desenvolvi-mento rural sustentável, com participação da cidadania, com inclusãosocial, com proteção ao meio ambiente e produção de alimentos sadi-os e acessíveis para todos.

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Desenvolvimento local e territorialidade

Guilherme Soares1

Introdução

Historicamente a abordagem do desenvolvimento instiga debatesacerca de sua abrangência e significados econômicos e sociais. Noatual contexto das relações globais, desenvolvimento tem recebidoos qualificativos local, integrado e sustentável que agregam ao dis-curso a tendência de enfoque dada a esse processo. A globalizaçãocomo fenômeno multidimensional – econômico, social, cultural – ede natureza contraditória, suscita movimentos de reação as tentati-vas de homogeneização diante da diversidade da criação humana.Os processos globais são contraditórios à medida que inclui e excluipessoas, cidades e países, cria e recria atividades econômicas, res-saltando ainda que tais processos não ocorrem igualmente nos vári-os locais. Tal fato impõe condições diferenciadas às localidades, al-gumas dessas restritivas ao alcance do desenvolvimento. Portanto, aglobalização, longe de ser um fenômeno mundial de homogeneizaçãocontribui para acentuar ainda mais as diferenças entre nações e regi-ões, ressaltando assim, aspectos que lhes são singulares. Nesse sen-tido, o fenômeno da globalização suscita dinâmicas locais, agoratomadas como foco dos processos para promoção do desenvolvimen-to. Assim, a abordagem do desenvolvimento na atualidade ensejamovimentos locais com perspectivas de inserção nas relações globais.Nesse contexto, o território também assume um significado amploalém daquele de realização das atividades produtivas e/ou apenas deli-mitação geográfica, como sendo uma trama de relações sociais com-

1 Mestre em Administração e Comunicação Rural do Departamento de Educação daUniversidade Federal Rural de Pernambuco.

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plexas formadoras de identidades culturais, econômicas e sociais, res-ponsáveis por diferenciações importantes no âmbito global.Diante da complexidade das relações global e local a nova aborda-gem conferida ao desenvolvimento tem como condição precípuapara sua consecução, a participação ativa dos atores locais, de modoparticular, a sociedade civil em suas várias formas de representa-ção. O esgotamento do modelo desenvolvimentista de planificaçãocentralizada no qual o estado era promotor e provedor de recur-sos, dá lugar ao modelo horizontal de promoção do desenvolvi-mento no qual a sociedade civil é chamada a responder às ques-tões que lhe afligem através de sua influência na formulação depolíticas públicas. No Brasil, o processo de redemocratização temavançado nessa direção e vemos nos mais diversos recantos dopaís iniciativas para promover o desenvolvimento local. Então, atu-almente, o desenvolvimento tem um forte apelo à participação so-cial, seja nos vários tipos de conselhos municipais, seja nos fórunse espaços públicos de discussão e deliberação política, no qual asociedade, juntamente com o poder local, assume o papel de pro-tagonistas desse processo.

Referências conceituais: Desenvolvimento,globalização e território.

Desenvolvimento

É recorrente a discussão conceitual do termo desenvolvimento e,não rara, polêmica devido as interpretações das várias correntes depensadores acerca de sua abrangência e significado. Fischer (2002.p.17) atribui ao termo uma polissemia conceitual, ou seja, abrigavárias acepções, significados, dizendo que ‘desenvolvimento’ com-preende mesmo uma rede de conceitos. A confrontação inevitávelque acontece comumente se dá entre os termos desenvolvimento ecrescimento por vezes aplicados de forma confusa e equivocada aalguns fenômenos socioeconômicos.

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Portanto, a abordagem conceitual de desenvolvimento e crescimen-to é ainda pertinente, pois trata daqueles assuntos que não apresen-tam uniformidade de tratamento e, por conseguinte, consensos.Para Furtado, (apud PREVOST 1997) a noção de desenvolvimento:

implica aumento de bem-estar com mudança naestrutura econômica e social; envolve a sociedadeinteira, em todos seus aspectos. O crescimento éuma noção mais simples. Se refere ao aumentodas atividades de produção de bens e serviços,porém não forçosamente implica uma mudança daestrutura, não envolve a sociedade inteira em to-dos os seus aspectos. O conceito de desenvolvi-mento contém em si a idéia de crescimento”.

Para este autor o desenvolvimento abriga uma multiplicidade de fatoresque envolvem aspectos econômicos, sociais e políticos entre outros quedevem ter em conta os valores e atitudes de uma população especifica.Essa percepção considera atributos diversos para alcançar-se o está-gio de desenvolvimento pleno e nesse sentido, a via para alcançá-locompreende a inclusão de critérios não exclusivamente econômicos.Ao contrário, a corrente que defende que crescimento econômico éigual a desenvolvimento, reconhece de forma simplista que o país de-senvolvido cresceu mais que o subdesenvolvido. Neste sentido, a ausên-cia de crescimento econômico é o que caracteriza o subdesenvolvimen-to. Dowbor (1997, p.13) quando fala da transformação estrutural dotrabalho, afirma que o desemprego já não resulta da ausência do cresci-mento econômico, mas do próprio efeito do crescimento econômico.Nessa concepção, a modernização dos meios de produção não émais um referencial único para denotar desenvolvimento, pois a de-sagregação da base social refuta o conceito, face que se impõe comocondição que o desenvolvimento seja referente ao ser humano.A relação crescimento econômico e desenvolvimento como causa eefeito embora ainda válida para engajamento no contexto vigente, éinsuficiente para sua interpretação e análise. A ocorrência de fenô-

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menos de natureza sócio-econômicas que vivenciamos e presencia-mos atualmente, ainda não totalmente entendidos em sua real di-mensão, tem causado perplexidade no meio acadêmico, talvez por-que não esteja ainda consolidada a perspectiva de desenvolvimentointegral e multidimensional (cultural, econômico, político).Nessa perspectiva, a multidimensionalidade do desenvolvimento apre-senta o imperativo ambiental como uma nova vertente desse processo,de modo que os objetivos gerais são claros: precisamos de um desenvol-vimento justo, economicamente viável e ambientalmente sustentável.A seguir os marcos históricos da trajetória do significado do termodesenvolvimento:

• Origem: Já sugeria uso de estratégias para produzir mudanças

• Tomado inicialmente da biologia: sentido de evolução(Charles Darwin)

• Aplicação para a área social – final do século XVIII: designaprocesso gradual de mudança social;

• No início de século XX desenvolvimento representa intervençãoem áreas periféricas para criação de espaços industriais modernos;

• Até a década de 40 – representa passagem da sociedadetradicional para a sociedade moderna (ocidentalização);

• Onda do modelo desenvolvimentista no terceiro mundo apartir da década de 1950 – cooperação internacional paraajuda aos países subdesenvolvidos. Características:

– Natureza prescritivista – recomenda a replicação de mode-los de outros países;

– O governo como ator estratégico central e agente de mudanças;

– Relações verticalizadas (de cima para baixo) com a sociedade;

– Abordagem unificada do planejamento – integração de pro-gramas econômicos e sociais;

– Estado provedor de recursos.Esse modelo no Brasil teve como referencias de cooperação internacio-nal: a Aliança para o Progresso, USAID (agricultura) - 1940/1970. Os

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exemplos desse tempo podem ser: a rodovia Transamazônica; SUDAM,Projeto RONDON, Projeto JARI, Zona Franca de Manaus entre outros.

• Desenvolvimento integrado - Meados da década de 70,século XX: processo multirrelacional que inclui todos os as-pectos da vida de uma coletividade.

• Desenvolvimento Endógeno – contrapõe a replicação demodelos. Considerar as especificidades locais - país, regiões,cidades etc, (SACHS,2001). O território deixa de ser marcode atividades econômicas ou sociais e passa a referência im-portante no desenvolvimento econômico.

“O território como entorno inovador depende de “estratégias dedesenvolvimento articuladas”, especificidade cultural e relaçõessociais de cada lugar, (SACHS,2001) Apud (FISCHER, 2002);

• Década de 1980 (década perdida) – modelo desen-volvimentista entra em xeque pelo ajuste econômico;

• Década de 1990 – Reforço do qualificativo INTEGRADO –incorporando as dimensões sociais e ambientais à enaltecidadimensão econômica. No dizer de (SACHS,1990), apud(FISCHER, 2002): “prudência ecológica, eficiência econômi-ca e justiça social” – tripé da Agenda 21.

• Desenvolvimento integrado é localizado espacialmente no territó-rio – cidades, regiões. É LOCALIZADO TERRITORIALMENTE.Programas de desenvolvimento devem ser duradouros (dimensãotemporal) – e sustentáveis – (noção de sustentabilidade) - continuida-de e manutenção do potencial dos recursos naturais pela via ambiental.

• Desenvolvimento local integrado e sustentável – agrega osqualificativos como reforço do discurso e lança a nova pers-pectiva de desenvolvimento atual.

Apresentaremos a seguir duas definições de desenvolvimento local.

• “Processo de crescimento descentralizado, baseado nos municípiose comunidades, cimentado em uma nova institucionalidade que possatraduzir-se em articulação e parcerias criativas entre Estado, municípios

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e sociedade civil organizada, preocupado com a melhoria da qualidadede vida da população, principalmente dos grupos mais pobres e margi-nalizados, que busque o pleno aproveitamento dos recursos epotencialidades locais, comprometido com a geração de empregos ede ocupações produtivas e com a sustentabilidade”. JARA, (1998).

• A organização para a cooperação e desenvolvimento econô-mico – OCDE define o nível local como sendo “ o meio ambi-ente imediato no qual a maior parte das empresas (micro e pe-quenas, cooperativas etc) se formam e se desenvolvem, encon-tram serviços e recursos dos quais dependem o seu dinamismoe dentro do qual se ligam às redes de troca de informações e derelações técnicas ou comerciais... Pode-se dizer que é uma co-munidade de atores públicos e privados... oferece um potencialde recursos humanos, financeiros e físicos, de infra-estruturaseducativas e institucionais de onde a mobilização e a valoriza-ção geram idéias e projetos de desenvolvimento”.

Características:

– Concertação (PREVOST,1995) e articulação estratégica(FISCHER,2002) são os pontos focais do conceito;

– Compreende processos compartilhados e resultados atingidos;

– Visões de futuro construídas por coletivos organizacionais eações concretas de mudanças;

– Há uma racionalidade processual e contextual (MARTINELLI,2003);

– Envolve simultaneamente visão de futuro (UTOPIA) epragmatismo (ação prática).

Na abordagem do Desenvolvimento local outros conceitos estão pre-sentes, entre os mais importantes estão: pobreza e exclusão; partici-pação e solidariedade; produção e competitividade. Tais dimensõesse articulam e se reforçam mutuamente ou se opõe frontalmente(FISCHER, 2002). Os processos de desenvolvimento local se dãoem várias instâncias do território, podendo ser num bairro, num dis-

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trito, em uma vila, na área rural de uma cidade, numa microrregião,numa região ou ainda na própria cidade. Assim, o termo local nãodeve ser confundido com o município, ou seja, desenvolvimento lo-cal não é sinônimo de desenvolvimento municipal.Um aspecto interessante dessa dinâmica de desenvolvimento é o seucaráter participativo e democrático, construído nas várias modalida-des de discussão pública – conselhos, fóruns entre outros. Embora odiscurso dos vários atores atuantes no processo denote uma certaconvergência na direção dos qualificativos do desenvolvimento, suasvisões de mundo todavia, apontam para trajetórias diferentes no quetange à operacionalização dos objetivos do processo de desenvolvi-mento. Assim, o desenvolvimento local pode ser orientado por doissentidos e significados:

• Da Competição – discurso totalizante (local, integrado esustentável), mas a ênfase é econômica.

• Da Cooperação e solidariedade – inspiram-se nos valoresda qualidade de vida e cidadania – inclusão de setores margi-nalizados na produção e usufruto dos resultados – economiasolidária.

Diferenças entre os valores de fundo que norteiam as duas vertentesdo desenvolvimento local.

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A diferença básica também está no peso e no papel dos atores envol-vidos nas formas de gestão.FATORES IMPACTANTES DAS ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVI-MENTO LOCAL INTEGRADO E SUSTENTÁVEL.Fischer, (2002), tratando dos processos de gestão do desenvolvi-mento destaca os aspectos que colocam em risco o discurso do de-senvolvimento local e conseqüentemente podem contribuir para seuesvaziamento:• Desgaste conceitual;• Desgaste dos métodos participativos e consensos vazios;• Frustração de esbarrar em limites concretos de poder, nas faláciasde despolitização das iniciativas e na exarcebação das potencialidadese virtualidades locais;• Descontinuidade política;• Dificuldades de articulação dos agentes do desenvolvimento;• Construção externa das estratégias de desenvolvimento local;• Fragilidades metodológicas – modismos e mimetismo metodológico;• Superposição de programas e projetos de diferentes instituições;• Estruturas de interesses para promoção do DL que criam depen-dência nas comunidades apoiadas;• Avaliação insuficiente.Ressalte-se ainda o risco de isolamento e desarticulação com as opor-tunidades do mundo global em função de uma sobrevalorização dosvalores locais, e que por razões ideológicas podem estar presentenas estratégias de desenvolvimento local:“Reificação da comunidade e da cultura local” – variável a ser manipuladapor “boas estratégias”, em detrimento de uma visão mais ampla e cosmo-polita do desenvolvimento (BOAVENTURA, apud FISCHER, 2002).Nesses termos o autor defende estratégias de desenvolvimento localque se articulem com as relações globais e propõe:“localismo cosmopolita” e plural – estratégias multiescalares quearticulem ações locais com estratégias alternativas em escala regio-nal, nacional e global.PENSAR GLOBALMENTE E AGIR LOCALMENTE

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Globalização

A globalização é um processo multidimensional envolvendo diversasvariáveis simultaneamente, e que resulta em mudanças significativasnas relações entre estado, sociedade civil e a esfera produtiva repre-sentada pelo mercado. As definições são também várias, a seguirapresentaremos duas definições.Uma primeira delas define como sendo um fenômeno “...resultantede um conjunto de forças dinâmicas – econômicas, políticas, ideoló-gicas, culturais e religiosas – que estão modelando e remodelando adivisão internacional do trabalho, favorecendo ou dificultando a acu-mulação de capital, e acelerando ou refreando a homogeneidade deconsumo e comportamento humanos (Moreira, 1994: p.85) apud(CAMPANHOLA, SILVA,2000).Outra definição interpreta o fenômeno como sendo promotor de uma“...reorganização do espaço das relações sociais, bem como à redefiniçãodas relações entre as esferas política e econômica, que resultam emmudanças na governança dos espaços democráticos e no papel do Esta-do (Bonanno et al., 1999) apud (CAMPANHOLA, SILVA,2000).Ao mesmo tempo em que as sociedades contemporâneas se vêematravessadas por processos globais, abrigam dinâmicas locais que sepropõem a solucionar problemas gerados tanto dentro como fora deseus limites (Navarro Yáñez, 1998) apud (CAMPANHOLA, SILVA,2000). Por isso, há a necessidade de se buscar novos pontos deequilíbrio entre o global e o local. Nesse sentido, o foco não deve serapenas no local, mas também nas relações e interações que ocorrementre localidades e regiões. O que tem se observado é que forçasglobais requerem e estimulam respostas nas esferas local e regional(Jentoft et al.,1995) apud (CAMPANHOLA, SILVA, 2000)Nos países em desenvolvimento, a globalização acelera o processode exclusão social dos pequenos produtores agrícolas, dos trabalha-dores e dos consumidores mais pobres, Bonanno et al. (1999) apud(CAMPANHOLA, SILVA, 2000)Desse modo, há nações, regiões e locais que vão sendo incluídosnas cadeias de produção, e outros excluídos. Portanto, a globalização,

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longe de ser um fenômeno mundial de homogeneização na distribui-ção de capital, contribui para acentuar ainda mais as diferenças entrenações e regiões.Nas cadeias agroalimentares os varejistas assumem um papel de co-ordenação dos fluxos de informações por estarem mais próximos doconsumidor, e por conseguinte, afinal de contas serão os responsá-veis pelas mudanças ao longo da cadeia de produção. Desse modo,a suposta ação dos consumidores, através das redes varejistas, temcontribuído para redefinir os mercados, fazendo surgir novos pa-drões culturais de qualidade de nutrição e de meio ambiente (Marsden1995; Marsden, 1998) Apud (VILELA, 2000). Esse autor explicaque as redes de alimentos têm conexões horizontais e verticais comos espaços nos quais elas estão situadas. A soma social das duasconexões começa a remodelar o espaço rural a partir de dentro e dainteração com outros espaços. Assim, são criados espaços depen-dentes e espaços dominantes.Por essa razão, a globalização de mercados tende a ampliar a dife-renciação territorial do que a sua homogeneização (Saraceno, 1998),apud (VILELA,2000). Os chamados “nichos” de mercado, que sereferem a demandas por produtos com características específicas ede alto valor – por exemplo alimentos livres de resíduos químicos ouque não tenham causado degradação ambiental no processo de pro-dução - geralmente estão vinculadas às classes sociais mais afluen-tes, já que a população de renda mais baixa ainda demanda alimen-tos baratos, pouco diferenciados, obtidos por processos de produ-ção em massa.

Território

Inicialmente ressaltemos que a abordagem conceitual do território é ampla,conforme as diversas linhas de pensamento. Assim, não pretendemosnesse momento seguir o itinerário das diferentes abordagens conceituais,porém trataremos de apresentar aquelas que poderão promover a me-lhor compreensão dos fatores presentes na concepção de territorialidadee de sua relação com a promoção para o desenvolvimento.

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Uma primeira compreensão sobre o território é aquela que diz queterritório é a parte do espaço ocupada e apropriada pelo homem,através de suas atividades produtivas, culturais e sociais. Percebe-sea existência de um primeiro elemento de confrontação entre territó-rio e espaço. O Dictionary of human Geography (1994), define ter-ritório: “termo geral utilizado para descrever uma porção do espaçoocupado pela pessoa, grupo ou estado” (RIBAS,2004). O territórioaparece também como aquela porção que está apropriada pelas açõeshumanas. O conceito de território aparece associado também aoestado, e neste particular a concepção de território apresenta duasconotações, conforme apresenta RIBAS et al., (2004 p.17): “ a pri-meira refere-se a soberania territorial algo que tem a ver com asreivindicações pela posse e controle legítimos e exclusivos sobre umadada área. A segunda conotação é aquela que se refere a uma deter-minada área que ainda não está incorporada inteiramente na vidapolítica de um estado. Podemos citar como exemplo, os casos dosoutrora territórios de Rondônia, Roraima, Amapá ainda na décadade 70 e meados de 80.Sob o ponto de vista social a geografia define território como sendo“espaço social definido, ocupado e utilizado por diferentes grupossociais como conseqüência de suas práticas de territorialidade” .Para Raffestin (1993), apud (RIBAS,2004) espaço e território não sãotermos equivalentes. E explica sua afirmação: “o espaço é anterior aoterritório, pois o território se forma a partir do espaço, é o resultadode uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza umprograma) em qualquer nível”. Ao se apropriar de um espaço, concre-ta ou abstratamente (...), o ator territorializa o espaço (p.143).Os conceitos de território incorporam também outras categoriasanalíticas além de estado e sociedade, tais como poder e mercado.Tais categorias preservam suas autonomias analíticas individuais, masapresentam entre si interfaces dinâmicas na construção do território.Essa perspectiva se coaduna com o que defende FISCHER (2002),que a gestão do desenvolvimento é afinal de contas uma gestão depoderes. Portanto, não se pode deslocar do entendimento de terri-

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tório essas instâncias analíticas, pois constituem elementos cruciaisno entendimento das dinâmicas territoriais contemporâneas, sobre-maneira em tempos de globalização. Para finalizar, recorremos a duasreflexões sobre poder e mercado relacionado ao território, a partirde dois importantes autores, Raffestin(1993) e Badie(1995) Apud(RIBAS,2004).Raffestin diz que a ação das pessoas ou grupos, no exercício do poder“pode ser uma interação política, econômica, social e cultural que resul-ta de jogos de oferta e de procura, que provém dos indivíduos e/ou dosgrupos. Isso conduz a sistemas de malhas, de nós e redes que se impri-mem no espaço e que constituem, de algum modo, o território”.No que concerne a relação do mercado com o território Badie (1995)estudando a formação territorial da Europa, afirma que o mercado sozi-nho não suscita a criação de uma nova territorialidade, mas é sim, aforma de como ele (mercado) se articula e se integra a diversidade social.Como se pode perceber as abordagens articulam dimensões e cate-gorias importantes no processo de construção do conceito de terri-tório, superando a idéia de território vinculado apenas ao local derealização das atividades econômicas. O território hoje se caracteri-za, então, como uma trama de relações complexas envolvendo esta-do, sociedade e mercado, sendo por isso incorporado hoje aos dita-mes do desenvolvimento local.

A dinâmica do meio rural na perspectivade desenvolvimento local.

A partir da dinâmica da relação global e local podemos entendermelhor como se articulam as relações rural e urbano. É cada vezmais difícil conceber o meio rural apenas por uma análise setorial,enfocando atividades econômicas que historicamente o caracterizamcomo meio da produção agrícola. A complexidade das relações pro-dutivas e a reorganização do espaço rural pela globalização torna-ram o espaço rural com uma nova dinâmica, marcada pelarevalorização da natureza e pela interligação econômica entre os

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setores econômicos. Nesse contexto, tomam relevância as atividadesnão-agrícolas que passam a compor parcela significativa da renda domeio rural. Nessa perspectiva, o meio rural torna-se multifuncional earticulado ao meio urbano e por isso tem sido denominado de novorural. Todavia, como todo fenômeno, as interpretações podem in-correr em exageros e criação de novos mitos. A seguir apresentaalguns dos velhos mitos do meio rural e também alguns novos mitoscriados com a emergência das atividades não-agrÍcolas.

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O que convencionalmente vem sendo chamado de novo rural brasi-leiro na verdade se trata de uma reconfiguração produtiva e políticaem andamento nos espaços rurais, já bastante conhecida em paísesdesenvolvidos, portanto, não é propriamente um processo original einovador em si. Semelhantemente ao que ocorre com a globalização,esse fenômeno não ocorre igualmente em todos os espaços rurais,sendo essa dinâmica mais intensa e freqüente em algumas regiões doque em outras.A reorganização do espaço rural se trata propriamente de uma mu-dança do papel e função do meio rural no contexto das relaçõesglobal e local, particularmente, em relação a forma como o meiorural se articula com o meio urbano, suscitando a criação e recriaçãode novas atividades produtivas, descritas por Silva, Grossi,Campanhola (2002) como:

• Uma agropecuária moderna, baseada em commodities eintimamente ligada às agroindústrias;

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• Um conjunto de atividades não-agricolas, ligadas à mora-dia, ao lazer e a várias atividades industriais e de prestação deserviços;

• Um conjunto de “novas” atividades agropecuárias, impulsi-onadas por nichos especiais de mercados.

Portanto, muitas destas atividades foram recriadas a partir de de-mandas diferenciadas surgindo os chamados nichos de mercado, al-gumas a partir da valorização do meio rural como espaço de mora-dia e lazer (turismo rural) e outras como decorrência de atividadesde proteção da natureza. Nesse processo o meio rural deve se apro-ximar de uma dinâmica territorial que enseje modelos e/ou arranjosprodutivos que valorize a identidade local, os recursos naturais, ocapital humano e social existentes. Dessa forma o desenvolvimentorural não significa necessariamente a urbanização do rural – que nãodeve ser confundido com revalorização do espaço rural - e muitomenos a implantação somente de uma agricultura moderna. Depen-de sim, de como se insere nos processos de integração local e globale de sua articulação com o meio urbano. Não existe um modelopronto para alcançar o desenvolvimento rural, mas sabe-se que adiversidade desse meio constitui um de seus pilares, que pode serrepresentada, por exemplo, pela cultura local e pela biodiversidade.Neste particular o Amazonas tem os elementos diferenciadores deseu território, próprios para construção de um modelo de desenvol-vimento rural sustentável, como apontam algumas das experiênciasnessa direção: turismo ecológico, manejo florestal sustentável, re-servas extrativistas, beneficiamento de frutas exóticas, aqüicultura,farmacologia fitoterápica entre outros.Sintetizando, a perspectiva do desenvolvimento rural a partir da noçãoterritorial e das novas ruralidades compreende as seguintes características:

• O desenvolvimento rural não significa urbanização do meiorural;

• O dinamismo rural depende das relações de interdependênciacom o meio urbano;

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• Desenvolvimento rural pressupõe planejamento de açõespara aproveitamento dos atributos particulares voltados paramercados que valorizem a paisagem, a biodiversidade, a qua-lidade e a cultura local.

Diferenciação territorial: A sócio-biodiversidadeamazônica como estratégia parao desenvolvimento rural sustentável

Os meios e fins da sustentabilidade variam conforme as condiçõesecológicas, econômicas, sociais e culturais, tanto no âmbito regionalcomo local (Brooks, 1992). apud (CAMPANHOLA, SILVA, 2000)Para que o planejamento do uso do espaço ou local seja efetivo éimprescindível que os métodos e estratégias incluam e integrem aodesenvolvimento as variáveis ambientais, sociais, econômicas e depolíticas públicas. Nesse sentido, o desenvolvimento local requerum planejamento territorial e não estritamente setorial dos proces-sos econômicos e sociais para avaliar a competitividade, as mudan-ças com o tempo e o delineamento de políticas (Saraceno, 1998)apud (CAMPANHOLA, SILVA, 2000). Entre os princípios a seremobservados estão a participação da comunidade local no encaminha-mento das decisões, a introdução de mecanismos públicos que pos-sibilitem a igualdade de acesso aos benefícios gerados e o compro-misso com a conservação dos recursos naturais e recreativos e daqualidade ambiental.Os atributos do território e sua contribuição ao processo de desen-volvimento rural estão estreitamente vinculados, sem dúvida, a qua-lidade ambiental que por extensão, podem vir a contribuir paramelhoria da qualidade de vida da população local. A biodiversidadepresente num dado território, constitui hoje elemento de diferencia-ção em relação a outras regiões do planeta, por se tratar, entre ou-tras coisas, de um banco de recursos genéticos ainda pouco conhe-cido. Historicamente, tem-se aplicado intensamente os recursos bi-ológicos e genéticos em diversas áreas da vida humana, tais como:

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alimentação, agricultura e medicina ALBAGLI (2003). Abiodiversidade hoje é vista como fator estratégico não apenas sob oaspecto econômico, na perspectiva de desenvolvimento de medica-mentos futuros, mas como suporte a vida haja vista que a “diversida-de da vida é fundamental ao equilíbrio ambiental” ALBAGLI (2003).Nesses termos, os processos de desenvolvimento local não devemprescindir da contribuição do conhecimento das populações tradici-onais em relação ao uso dessa biodiversidade. A combinação dovalor social dessas populações locais junto com a disponibilidadedos recursos da biodiversidade assume um diferencial estratégicopara as regiões que lhes abrigam. A sócio-biodiversidade, ou seja, oconhecimento das populações tradicionais acerca dos múltiplos usosdos recursos da flora e fauna existente constitui fator estratégico deum dado território, com papel fundamental na promoção do desen-volvimento rural sustentável.

Considerações finais

O desenvolvimento enseja uma trajetória de mudanças estruturais enão apenas conjunturais, ou seja, é necessário transformar a longoprazo a educação, o modelo econômico dependente e subordinadoao capital internacional, melhorar a qualidade de vida das pessoasatravés do saneamento básico, da saúde, moradia, segurança entreoutros. Desenvolver é alcançar uma condição de equilíbrio social,político, econômico e ambiental enraizado na sociedade de tal ma-neira que seja capaz de assegurar sua continuidade independente devariações contingênciais negativas. O desenvolvimento local se inse-re nessa perspectiva trazendo consigo a premissa da participaçãoefetiva da sociedade civil, diretamente ou através de suas represen-tações que juntamente com o poder público e as instancias econô-micas-produtivas podem debater seus problemas e soluções. Essa éa principal característica que diferencia a abordagem do desenvolvi-mento local própria desse momento de institucionalidade democrá-tica e descentralização política, do modelo desenvolvimentista verti-

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cal que predominou durante décadas no Brasil. Nesse contexto, ofator território aparece associado ao desenvolvimento não apenascomo um lócus físico das atividades produtivas, mas por envolveraspectos inerentes a dinâmica das relações sociais, consideradosimportantes na construção de identidades e territorialidadesdiferenciadoras no âmbito econômico. A região do Amazonas se ca-racteriza por apresentar territorialidades estratégicas e diferenciadorasde forma particular, relacionadas às populações tradicionais, àbiodiversidade e à cultura. A valorização do ambiente natural impõereflexões acerca do uso e proteção da natureza, o rural passa de umacondição apenas de supridor de alimentos e matérias-primas primá-rias, para ser então, local valorizado pelo meio urbano pelacomplementaridade econômica, social e ambiental. Desse modo, essesaspectos em conjunto e convergindo ações equilibradas tendem aalcançar um modelo de desenvolvimento rural sustentável.

Bibliografia

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Estratégias de comunicação emcontextos populares: Implicaçõescontemporâneas no desenvolvimentolocal sustentável

Angelo Brás Fernandes Callou1

Introdução

É recorrente, no campo da Comunicação, evocar a participação po-pular como estratégia de inserção democrática nos processos de in-tervenção para o desenvolvimento, particularmente no meio rural.Desde os anos de 1980, com a redemocratização do país e a conso-lidação da crítica à teoria rogeriana de Difusão de Inovações, setornou consenso, entre os pesquisadores pós-paulofreirianos, de quea comunicação participativa ou horizontal é ponto de partida paraconstrução de qualquer política socioeconômica e ambiental nas or-ganizações governamentais e não governamentais que lidam com oscontextos populares. Internalizada essa concepção, parece necessá-rio, entretanto, redimensionar os limites das estratégias de comuni-cação participativas frente aos cenários socioambientais contempo-râneos. Nesse sentido, partimos do terreno da Comunicação Ruralpara discutir alguns aspectos teóricos das estratégias de comunica-ção para a participação de comunidades em processos de Desenvol-vimento Local. Partimos, mais exatamente, de dois lugares: um quediz respeito à utilização da Comunicação como estratégia de Difu-são de Inovações na Agricultura dos anos de 1970/80, sobre a qual

1 Professor e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural eDesenvolvimento Local (POSMEX), do Departamento de Educação da UniversidadeFederal Rural de Pernambuco (UFRPE); doutor em Ciências da Comunicaçã[email protected]

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faremos um breve histórico; o outro relacionado aos desafiosvivenciados na atualidade pela Comunicação Rural em contextospopulares. A preocupação com essa abordagem é a de chamar aatenção para os resultados sociais e ambientais negativos provoca-dos no passado pela “modernização da agricultura” como vetor dedesenvolvimento, para que, no presente, as estratégias de comuni-cação na instância do desenvolvimento local não representem maisuma “romaria a um novo santo”.

Difusão de inovações e suas estratégiasde comunicação: Um breve histórico

Como sabemos, o modelo americano de Difusão de Inovações naAgricultura, capitaneado por Everett Rogers, obteve, no Brasil, par-ticularmente nos anos de 1970/80, uma considerável aceitação porparte tanto das agências governamentais de extensão agrícola, quan-to pelos pesquisadores de Comunicação Rural e Extensão Rural. Éimportante salientar, de imediato, que apesar dos estudos realizadospela Difusão de Inovações terem sinalizado as estratégias mais efica-zes de intervenção para a adoção tecnológica, o decantado desen-volvimento dos contextos populares do meio rural não ocorreu. Aocontrário, foram observados, fundamentalmente, além dos prejuízosambientais, o aumento da concentração de terra e as migrações cam-po-cidade, na medida em que os “pacotes tecnológicos” desarticu-lavam as relações de trabalho no campo e endividavam os pequenosprodutores rurais2.Cabe lembrar aqui a observação de Juan Díaz Bordenave, de queforam as abomináveis “resistências conservadoras” de algumas po-pulações rurais à adoção de tecnologias agropecuárias, ou a sua “ado-ção retardatária”, como diria Rogers, que contribuíram comocontraponto à desarticulação social e econômica e à depredação domeio ambiente com o advento da “modernização da agricultura”.

2 Vide GRAZIANO DA SILVA, José. A modernização dolorosa, estrutura agrária, fronteiraagrícola e trabalhadores rurais no Brasil. Rio de Janeiro : Zahar, 1981.

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Entretanto, essas “resistências” parecem não ter obtido repercussãosuficiente, pelo menos no Rio Grande do Sul, quando levamos emconsideração o desmatamento da cobertura florestal nativa do Esta-do, no período em questão. Segundo Ferreira e Gausmann, citadopor Francisco Caporal, a cobertura florestal original passou dos 40%para 5,6%. Dizem eles que dos 10.764.000 hectares restavam ape-nas, em 1983, 1.585.731 hectares da cobertura florestal. Hoje,entretanto, segundo ainda esses autores, o Estado já possui 17,52%de florestas nativas3.Não podemos exigir, entretanto, que, àquela época, os pesquisadorestivessem uma leitura crítica do que significaria a modernização da agri-cultura em termos de impactos socioculturais e ambientais, pois, afinalde contas, a crítica à Difusão de Inovações ainda tateava, por assimdizer, o seu poder de corrosão. Essa crítica acontecera muito lenta-mente e só fora consolidada em meados dos anos de 1980. No quediz respeito à questão participativa e à questão cultural das popula-ções rurais no cenário da modernização da agricultura, é interessanteobservar que, em nível do discurso, as instituições governamentais, aexemplo das EMATER, incorporavam a participação como estratégiapara se comunicar e planejar atividades com as populações rurais4.Mas as práticas extensionistas não correspondiam aos preceitosdialógicos propostos por Paulo Freire, já em vigor, à época. Tratava-se,na verdade, de uma espécie de boutade para fazer valer as políticaspúblicas verticais de desenvolvimento da agricultura pela via da mo-dernização, agora sobre o manto da “participação”.A cultura dita popular, através das suas expressões mais tradicionais,foi também utilizada como estratégia de comunicação persuasiva paraviabilizar o caráter modernizador da agricultura. A Folkcomunicação

3 CAPORAL, Francisco Roberto. Superando a revolução verde: a transição agroecológicano estado do Rio Grande do Sul. Santa Maria (RS), março de 2003, p. 5-6. Textodigitado, 30 p.

4 Vide CANUTO, João Carlos. Capital, tecnologia na agricultura e o discurso da EMBRATER.Santa Maria, 1984. 137 p. Dissertação (mestrado em Extensão Rural) – UniversidadeFederal de Santa Maria, 1984.

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praticamente inaugurou esse encontro com o difusionismo tecnológico,ao oferecer munição teórica pelo seu mais ilustre representante e cri-ador da matéria: Luiz Beltrão. Diz ele, segundo José Marques de Melo,em 1971, se referindo a manifestações da Folkcomunicação, no livroComunicação e Folclore 5, que “o alto grau de credibilidade e suanatureza lúdica permitiam uma aceitação popular espontânea” das ino-vações6. Estão aí incluídos como instrumentos facilitadores da adoçãotecnológica os folhetos de cordel, almanaques, teatro de fantoches,entre tantos outros meios de comunicação popular presentes no meiorural. E agenda seguidores. Roberto Benjamin, citado também porJosé Marques de Melo, comenta, no início dos anos de 1970, que ofolheto popular e o almanaque

“refletem a opinião pública matriz do meio socialonde se acham integrados os poetas, quase sempreo meio mais conservador e retardatário no desen-volvimento sócio-cultural e econômico. Tanto napolítica, como na religião e na moral, os folhetosrefletem idéias gerais e conservadoras, refratáriasaos novos usos, novas práticas, novas ideologias.”7

A crítica desenvolvida por Walmir Barbosa no âmbito daFolkcomunicação versus Difusão de Inovações, em 1986, na sua tesede doutoramento, é uma síntese de todo esse processo. Diz ele:“Uma reflexão (...) nos revela o quanto de esforço estava sendo feitopara facilitar a adoção de um modelo cujas conseqüências não esta-vam sendo avaliadas. Da mesma forma que a lógica do capital jácomeçava a atuar de modo concreto sobre o campesinato, pela ex-propriação dos meios de produção, a reflexão intelectual se debru-

5 Esse livro é parte da sua tese de doutoramento apresentada à Universidade de Brasília,em 1967. Sobre isso vide BENJAMIN, Roberto. Itinerário de Luiz Beltrão. Recife : AIP/UNICAP, 1998.

6 BELTRÃO, Luiz apud MELO, José Marques de. Comunicação, opinião, desenvolvimento.3.ed. Petrópolis : Vozes, 1977. p. 104.

7 BENJAMIN, Roberto apud MARQUES DE MELO, José, op.cit., p. 104-105.

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çava sobre a cultura do povo, para propor aos agentes do capitaltambém a expropriação dos meios de produção cultural. E o maisgrave, expropriação dos meios de produção cultural, para reelaborarcom eles novas formas de intervenção.”8

O que é importante reter dessa digressão é que tanto a noção departicipação, quanto a questão da «valorização» das culturas popu-lares do período da Difusão de Inovações, se mantém implícita eexplicitamente na pauta das discussões das políticas e estratégias decomunicação para o desenvolvimento dos cenários socioeconômicose ambientais contemporâneos.

Estratégias de comunicação contemporâneas

Para abordar esse tema lançamos mão do interessante estudo publi-cado recentemente por Desirée Rabelo, Comunicação e Mobilizaçãona Agenda 21 Local9. Com o objetivo de «identificar algumas estra-tégias de comunicação consonantes com a mobilização pró-sustentabilidade»10, Rabelo se debruça sobre a implantação, em 1996,da Agenda 21 local em Vitória do Espírito Santo, refazendo e bus-cando compreender o funcionamento de todo o processo demobilização social e suas estratégias de comunicação. O estudo re-vela-se como uma cartografia do planejamento comunicacional alidesenvolvido, no qual ela acrescenta, ainda, duas outras experiênci-as – Operação Rodízio (de automóveis), em São Paulo, e Pastoral daCriança, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).11

Sem a pretensão de desenvolver estudos comparativos, a autora apre-senta, através dessas experiências, a complexidade que envolve osdiversos processos de participação dos atores sociais envolvidos nasmobilizações e a importância das estratégias de comunicação paraflexibilizar e desobstruir canais de comunicação.

8 BARBOSA, Walmir de Albuquerque, op. cit., p. 161-162.

9 RABELO, Desirée Cipriano. Comunicação e mobilização na agenda 21 local. Vitória :FACITEC, 2003. 203 p.

10 Idem, p. 14.

11 Idem, p.167-178.

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Para desenvolver essa pesquisa, Rabelo se estrutura teoricamente apartir dos estudos de Bernardo Toro, que vê os processos de partici-pação e mobilização como um “ato de comunicação”12. Para esteautor, segundo Rabelo, são três os atores principais necessários parainiciar um processo de mobilização: a) o produtor social. Trata-se de“pessoa ou instituição com legitimidade e capacidade de criar condi-ções econômicas, institucionais, técnicas e profissionais para que umprocesso de mobilização ocorra.”13; b) o reeditor social. Neste casoé uma “pessoa que, por seu papel social, ocupação ou trabalho temcapacidade de readequar mensagens, segundo circunstâncias e pro-pósitos, com credibilidade e legitimidade.”14 O reeditor para Toro,segundo Rabelo, pode ser desde um professor até os média e seusprofissionais, passando por um cabelereiro, um padre, ou seja, qual-quer pessoa “que tem o poder de negar, transmitir, introduzir e criarsentidos. É alguém capaz de modificar as formas de pensar, sentir eatuar de seu público.”15; e c) o editor. Este, para Toro, segundoainda Rabelo, pode ser uma instituição ou também uma pessoa quetem como tarefa “estruturar informações em códigos pertinentes àmobilização...”16 Cabe ao editor, talvez, a tarefa mais complexa, doponto de vista da comuncição para mobilização, na medida em que,segundo o autor citado17, enfrenta os seguintes desafios: 1) “cons-truir e divulgar imagiários”. Ou seja, criar estratégias que possibili-tem reunir, mobilizar, diferentes atores em prol de um objetivo co-mum, ou, como ele próprio sintetiza, através de Rabelo, “somarsingularidades”. Rabelo traz, entre outros exemplos, as campanhasQue nenhuma família passe fome neste Natal e Para que todas ascrianças tenham vida.; 2) “identificar e instrumentalizar reeditores”;e 3) “gerar processos de coletivização”, isto é, tornar público os

12 TORO, Bernardo apud RABELO, op. cit., p. 63

13 Idem.

14 Idem.

15 Idem.

16 Idem, p. 64.

17 Idem.

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trabalhos que estão sendo desenvolvidos e os apoios institucionaisou individuais recebidos. Daí a importância, segundo a autora, dosmeios de comunicação de massa, pois, em última instância, a divul-gação dos resultados podem criar um sentimento de auto-estimaentre os atores sociais envolvidos na mobilização, animando, porseu turno, os processos de participação18 .Com essa perspectiva teórica, o estudo de Rabelo oferece pistasmetodológicas para os produtores sociais, reeditores sociais e edito-res, ou seja, a todos aqueles que se interessam pela participação/mobilização comunitária e social em prol do desenvolvimento sus-tentável. Além disso, realça a importância do planejamento da co-municação, diga-se de passagem ainda tão pouco contemplado pe-las agências de desenvolvimento dos contextos populares. Entretan-to, o seu trabalho não aborda algumas questões que consideramoshoje como fundamentais nos estudos de Comunicação Rural e Ex-tensão Rural. A temática da participação popular/mobilização nãodeve ser pensada, a nosso ver, apenas como um problema no âmbitodas estratégias de comunicação. Isso implicaria, tão somente, emdesafios de registrar, dissecar, revelar, aquelas estratégias mais pro-missoras, em termos de comunicação popular, para apoiar diferentestipos de campanhas e público. Investir nessa direção é tratar os con-textos populares como um produto, cujo preceito teórico seria o deMichael Porter, em que “Agir com estratégia é deixar alguns clientesinsatisfeitos para que outros possam ficar verdadeiramente conten-tes.”19 Como vimos, isto foi feito no passado com repercussões ne-gativas sobre as populações rurais e o meio ambiente. É bem verda-de que as preocupações atuais com as estratégias de comunicaçãose distinguem daquelas realizadas pela Difusão de Inovações eFolkcomunicação, na medida em que pretendem abrir/desobstruircanais à inserção cidadã dos contextos populares nos processos de

18 Idem, p. 65-67.

19 PORTER, Michael. A nova era da estratégia. In: Estratégia e planejamento. São Paulo :Publifolha, 2002, p. 31.

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desenvolvimento. Portanto, essa discussão tem o seu lugar deimportânica. Mas o que parece relevante e instigante é pensar asculturas populares na contemporaneidade a partir dos estudos deComunicação Rural para analisar até que ponto vale a pena se deternas estratégias e participação comunitária de forma específica à re-cuperação/preservação ambiental. Se não vejamos.

Comunicação rural e desenvolvimentolocal sustentável

Os estudos de Comunicação Rural/Extensão Rural no Brasil vêmpassando, nesses últimos 10 anos, por transformações teórico-metodológicas consideráveis. Pelo menos três vetores contribuírampara o surgimento dessas tranformações: a influência dos estudosem desenvolvimento local, aqui compreendido como um processode concertação/orquestração dos diferentes atores sociais empenha-dos no desenvolvimento sustentável das potencialidades econômi-cas endógenas20.; a disseminação dos Cultural Studies ingleses naspesquisas em Comunicação da América Latina; e as novas concep-ções sobre o rural brasileiro que enlaçam atividades agrícolas e nãoagrícolas num mesmo território agrário.No que diz respeito especificamente à Comunicação Rural e Desen-volvimento Local, publica-se, em 1995, o texto Desafios da Comu-nicação Rural em Tempo de Desenvolvimento Local 21, no qual arti-cula-se, pela primeira vez, essa temática aos estudos de Comunica-ção Rural no Brasil. Nesse momento, a perspectiva de desenvolveros contextos populares a partir de políticas governamentais mais am-plas perde estatura na Comunicação Rural em virtude da fragmenta-

20 São vários os textos que abordam o assunto. Vide especialmente FRANCO, Augusto de.Desenvolvimento local, integrado e sustentável: dez consensos. Proposta, ano 27, n.78,p. 6-19, 1998; Idem, Por que precisamos de desenvolvimento local integrado e sustentável.Brasília : Instituto de Política, 2000; e JARA, Carlos. As dimensões intangíveis dodesenvolvimento sustentável. Brasília : IICA, 2001.

21 TAUK SANTOS, Maria Salett; CALLOU, Angelo Brás Fernandes. Desafios da comunicaçãorural em tempo de desenvolvimento local. Revista Signo, Revista de ComunicaçãoIntegrada. UFPB, Ano II, N. 3, setembro/1995.

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ção do espaço pelos atuais processos de reestruturação da econo-mia mundial e sua repercussão contraditória sobre as culturas locais,ou seja, exclui/inclui, desorganiza/organiza, pulveriza/localiza. Cou-be à Comunicação Rural nesse novo cenário envolver-se com oscontextos populares como facilitadora/gestora dos processoscomunicacionais na concertação para o desenvolvimento local.22As noções de participação e de cultura popular se mantêm aindacoladas nessa nova abordagem, mas dentro de uma leitura distintadaquela do passado e, talvez, da que se vê embutida no estudo deDesirée Rabelo, que abordamos.À medida em que a Comunicação Rural lançou mão dos estudosculturais latino-americanos da Comunicação para compreender osprocessos de recepção de mensagens pelas culturas populares domeio rural, aspectos novos apareceram para instrumentalizar a suaação no Desenvolvimento Local. Espelhada, principalmente, na con-cepção de Néstor García Canclini e Jesus Martín-Barbero sobre asculturas populares no capitalismo, que as reconfiguram como cul-turas híbridas e ressignificadoras dos produtos midiáticos, a Co-municação Rural tem hoje uma outra leitura no âmbito da partici-pação comunitária. Salett Tauk Santos, por exemplo, lastreada prin-cipalmente na categoria “consumo”, de Canclini, chega à conclu-são, na sua pesquisa de doutoramento, de que a participação depequenos agricultores no programa de desenvolvimento rural ana-lisado - Serviços de Tecnologias Alternativas (SERTA) - se configu-ra de maneira ambivalente e refuncionalizada. Ou seja, num movi-mento pendular entre as possibilidades de consumo ao nível desua existência, acenadas pelo SERTA, e as aspirações simbólicasconstruídas a partir de estímulos da cultura hegemônica, em geralvia meios de comunicação de massa, os pequenos produtores ru-

22 Vide TAUK SANTOS, Maria Salett. Gestão da comunicação no desenvolvimento regional.Comunicação e Educação. São Paulo : Editora Moderna, n 11 : 29 a 34, jan./abr., 1998;e CALLOU, Angelo Brás Fernandes; TAUK SANTOS, Maria Salett. Extensão pesqueira egestão da comunicação no desenvolvimento local. In: PRORENDA RURAL-PE (Org.).Extensão pesqueira no Brasil: desafios contemporâneos. Recife : Bagaço, 2002.

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rais dão significados incompatíveis com a noção de participaçãoconcebida pelo programa. Em lugar de restringirem sua participa-ção à questão política e produtiva, como deseja o SERTA, a mes-clam, afirma a autora, com aspectos da vida cotidiana como o lazere a religião23. Portanto, por mais bem intencionados que sejam osprodutores sociais, reeditores sociais e editores de que fala DesiréeRabelo na construção de estratégias de comunicação paramobilização comunitária, é preciso levar em consideração que asculturas populares atuam num terreno de ambigüidades perma-nentes, nem sempre captadas (ou cooptadas) pelas estratégias decomunicação.Somam-se a esses aspectos os desafios enfrentados pelas popula-ções rurais com o impacto da mundialização dos mercados no meioagrícola brasileiro. Esse impacto tem exigido redefinições no con-ceito de território agrário, na medida em que as atividadesagropecuárias vêm se reunindo às atividades não agrícolas. As pro-posições de incluir as atividades produtivas já existentes no meiorural brasileiro (lazer, turismo, artesanato, indústrias, trabalho emdomicílio, entre outras) nas políticas públicas de desenvolvimento

23 SANTOS, Maria Salett Tauk. Comunicação e consumo: espaço das mediações da culturatransnacional e das culturas populares. Revista Brasileira de Comunicação - INTERCOM,São Paulo, vol. XIX, N. 2, jul./dez., 1996, p. 43, 46 e 47 apud CALLOU, Angelo BrásFernandes. Comunicação rural e era tecnológica: tema de abertura. In: CALLOU, AngeloBrás Fernandes (org.) Comunicação rural, tecnologia e desenvolvimento local. Recife :Bagaço, 2002, Coleção GT Intercom, n.13. (Reprodução literal e parcial da nota derodapé 41, p.21); Vide também PASSOS, Aída Lúcia Mello. Comunitário: espaço simbólicode encontros e desencontros. (o caso Pintadas/BA). Dissertação de Mestrado emComunicação Rural, Recife, UFRPE, 1998, 193 p.; MELO, Maria de Fátima Massena.Mulher e consumo: a recepção das mensagens do programa de apoio ao desenvolvimentocomunitário (PRODEC) da Caixa econômica Federal, pelas mutuárias da Cila de Chã deMarinheiro, em Surubim/PE. Dissertação (Mestrado em Administração Rural eComunicação Rural), Recife : UFRPE, 2001, 144 p.; SÁ BARRETO, Carmem Virgínia M.Comunicação e reforma agrária: estudo de recepção das políticas do MEPF-INCRA pelosassentados de Gaipió – PE. Dissertação (Mestrado em Administração Rural e ComunicaçãoRural), Recife : UFRPE, 2000, 345 p.; e LIMA, Conceição Maria Dias. Comunicação edesenvolvimento local: estudo de recepção das propostas da incubadora tecnológica decooperativas populares – INCUBACOOP pelas mulheres da cooperativa de costura deAbreu e Lima – COOPECAL-PE. Dissertação (Mestrado em Administração Rural eComunicação Rural), Recife : UFRPE, 2003, 188 p.

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rural, bem como a reivindicação de uma reforma agrária não es-sencialmente agrícola24, vêm exigindo que se pense de maneiradiferenciada as estratégias de Comunicação Rural. Por outro lado,estão no bojo dessas novas ruralidades questões relativas ao meioambiente, ao desenvolvimento local e à sociedade tecnológicaemergente. Mais complexa essa questão se torna, quando sabemosque os contextos populares do meio rural hoje são mais amplos doque se imaginava. Estudos recentes mostram que o Brasil possuimais de 70% dos seus municípios no meio rural25. E são nessesterritórios onde se localizam as principais questões ligadas ao meioambiente. Diante desses aspectos, concordamos com ClaytonCampanhola e José Graziano da Silva ao incluírem a gestão ambientaldas atividades num processo mais amplo e integrado de desenvol-vimento local para não restringir as estratégias de mobilização aosrecursos naturais ou ao meio ambiente26. Noutras palavras, as es-tratégias para participação de comunidades em processos de recu-peração/preservação ambiental, como pretendemos que sejam dis-cutidas e pesquisadas, perdem suas singularidades para encontrarseu sentido mais dinâmico num cenário de desenvolvimento localsustentável. Cenário este onde as culturas populares também per-dem o caráter romântico desejado pelos folcloristas27 para serempensadas no substantivo plural, hibridizadas, transnacionalizadas,excluídas, em reordenação permanente, em várias direções etemporalidades.

24 Sobre isso vide GRAZIANO DA SILVA, José. Por uma reforma agrária não essencialmenteagrícola, p. 2, Internet; GRAZIANO DA SILVA, José. Entrevista, Revista ops, Salvador, v.2, n. 7, 1997; e GRAZIANO DA SILVA, José. O novo mundo rural, Nova Economia,UFMG, Belo Horizonte, v. 7, n. 1, maio, 1997, p. 43-81.

25 Sobre o assunto veja-se VEIGA, Eli da. Cidades imaginárias: o Brasil é menos urbano doque se calcula. Campinas (SP) : Editora Autores Associados, 2002. 304 p.

26 CAMPANHOLA, Clayton; GRAZIANO DA SILVA, José. Diretrizes de políticas públicaspara o novo rural brasileiro: incorporando a noção de desenvolvimento local. In:CAMPANHOLA, Clayton; GRAZIANO DA SILVA, José (edit.). O novo rural brasileiro:políticas públicas. Jaguariúna (SP) : EMBRAPA, Meio Ambiente, v. 3, 2000, p. 66.

27 Sobre isso vide ORTIZ, Renato. Românticos e folclorista, cultura popular. São Paulo :Olho d’Água, s.d.

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Por último, podemos arriscar dizer, considerando os três vetoresacima abordados – desenvolvimento local, estudos culturais da Co-municação e novas ruralidades – que o planejamento da comunica-ção e suas estratégias de mobilização comunitária podem se tornarrarefeitas diante das ambivalências e das ressignifações que os con-textos populares apresentam nos processos de participação das pro-postas de desenvolvimento local.

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A metodologia científica e o quotidianoda extensão rural: Algumas relações

Prof. Dr. Paulo de Jesus1

O trabalho do Extensionista Rural e da Extensionista Rural tem pas-sado por diferentes orientações paradigmáticas, todas elas com re-flexo, seja na formação profissional, seja no quotidiano do campo.Pretende-se aqui suscitar algumas reflexões em torno de possíveisrelações entre o domínio de princípios básicos da metodologia cien-tífica e a atuação profissional de alguém enquanto extensionista ru-ral, buscando contribuir com elementos de resposta para as seguin-tes questões, entre outras: qual a compreensão do extensionista ru-ral e da extensionista rural em torno de ciência, em torno de conhe-cimento e em torno de pesquisa? Como tal compreensão pode tam-bém condicionar o desempenho do extensionista rural e daextensionista rural no seu trabalho de escritório e de campo?Este texto sistematiza, em parte, discussões empreendidas junto a umgrupo de extensionista rurais efetuadas no Estado do Amazonas2, ten-do por base pesquisa bibliográfica e as próprias vivências do autor.

A prática de extensionista rural ea diversidade de conhecimentos

Qualquer que seja o paradigma dominante num sistema de extensãorural, a interação extensionista rural – agricultor, extensionista rural –pecuarista, por exemplo, fazem parte do quotidiano. Nesse processo deinteração, uma diversidade de tipos de conhecimentos está presente.

1 Professor Adjunto no Departamento de Educação da Universidade Federal Rural dePernambuco.

2 Curso de Aperfeiçoamento em Extensão Rural promovido pelo PROJETO DEDESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL DO ESTADO DO AMAZONAS(SEPROR / IDAM E GTZ – Amazonas) em outubro / novembro de 2004, na cidade dePresidente Figueiredo - AM.

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Antes, contudo, de caracterizar os diferentes tipos de conhecimen-to, uma reflexão se impõe: o que é conhecimento? Qual o entendi-mento do extensionista rural e da extensionista rural em torno dosignificado de conhecimento e como se processa a sua produção?De forma simplificada e inspirada em Ruiz (1996) pode-se formularum entendimento sobre conhecimento baseado em três elementos:a) o sujeito cognoscente, isto é, alguém que tem a capacidade deconhecer; b) o objeto cognoscível, isto é, algo que pode ser conhe-cido e c) a imagem, ou seja, o resultado, o que fica da relação entreo sujeito e o objeto.Galliano (1986:17) assim se expressava:

Em linhas gerais, conhecer é estabelecer uma re-lação entre a pessoa que conhece e o objeto quepassa a ser conhecido. No processo de conheci-mento, quem conhece acaba por, de certo modo,apropriar-se do objeto que conheceu. Dessa for-ma, ‘engole’ o objeto que conheceu. Ou seja,transforma em conceito esse objeto, reconstitui-o em sua mente.

Ilustrando, um extensionista rural ou uma extensionista rural é desig-nado para trabalhar num município amazônico em que existem algu-mas comunidades predominantemente indígenas. Imagine-se que oextensionista rural ou a extensionista rural, por mais absurdo quepareça, tem conhecimentos muito elementares e talvez estereotipa-dos sobre comunidades predominantemente indígenas. Então, umdia se programa uma visita a uma dessas comunidades. O que vaiacontecer: o sujeito (o extensionista rural ou a extensionista rural) vaiinteragir, ao vivo, com a comunidade predominantemente indígena(situação a ser conhecido ou situação cognoscente), resultando daíum conjunto de impressões, de sensações, de imagens sobre a co-munidade, suas condições de vida e de produção e decomercialização; sua composição etária e por sexo; seus valores re-ligiosos, culturais; suas formas de lazer; suas relações com outras

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etnias etc., ou seja, tem-se um resultado dessa relação estabelecida,tem-se um conhecimento. As imagens, as sensações, as impressõessão captadas e armazenadas no cérebro e depois serão, por exem-plo, ou consolidadas, ou reconstruídas com acréscimos ou substitui-ções. Tal relação, como se sabe, é condicionada por diversos fatores(DEMO, 1995), assim como condiciona o comportamento, a atua-ção, a relação do extensionista rural ou da extensionista rural, porexemplo, com a comunidade predominantemente indígena e outras.Também aquele resultado (imagens, sensações, informações) podeser sistematizado, escrito, registrado. Mas, se o extensionista rural oua extensionista rural, do exemplo acima, escrever um texto sobre acomunidade predominantemente indígena visitada, esse texto será umresultado da experiência de interação vivenciada. Os livros, os artigosde revista científica, por exemplo, são conhecimentos sistematizadosque resultaram da interação sujeito – objeto, interação vivenciada sobdiversas formas, inclusive em situações de laboratórios.Parece explicado o sentido de conhecimento e a forma como eleé produzido. Isso favorece a compreensão daquilo que distingueos diferentes tipos de conhecimento: é, de um lado, a forma e,de outro lado, são os condicionamentos sob os quais a relaçãoentre o ser cognoscente e o cognoscível, ou seja, entre o sujeitoe o objeto se processa. No exemplo acima apresentado, são asformas e os condicionamentos presentes na relação doextensionista e da extensionista com a comunidade predominan-temente indígena que podem caracterizar o tipo de conhecimen-to resultante dessa interação.Muito freqüentemente distingue-se o conhecimento pela adjetivação:conhecimento popular, conhecimento científico, conhecimento reli-gioso, por exemplo.Muitos autores apresentam tipologias de conhecimento e suas ca-racterísticas (RUIZ, 1996; DEMO, 1995; CERVO, 1996; ALVES,2004, entre outros). A seguir, apresenta-se uma classificação sobreconhecimento que distingue pelo menos quatro tipos de conheci-mento:

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A) Conhecimento do senso comum ou conhecimento ordinário ouconhecimento empírico ou conhecimento vulgar ou ainda conheci-mento intuitivo

Uma primeira observação sobre esse tipo de conhecimento diz respei-to à adjetivação freqüentemente utilizada pelos autores: senso comum,ordinário, vulgar, por exemplo, são adjetivos que podem refletir umaatitude de desvalorização. No entanto, como afirma Ruriz (1996:91)todo homem, no decorrer da existência, “vai acumulando conheci-mentos daquilo que viu pessoalmente, daquilo que ouviu de terceiros;vai acumulando vivências, vai interiorizando as tradições dacoletividade”.E aí está a forma como é produzido esse tipo de conhe-cimento: espontaneamente, sem regras formais, como se vê seguir:

• quase sempre baseado na percepção sensorial, na busca dasolução para problemas imediatos;

• é elaborado de forma espontânea e instintiva, portantoametódica, assistemática;

• tem caráter utilitário e é repassado de um indivíduo a outroe de geração a geração;

• visão fragmentada e subjetiva, subordinada ao envolvimentoafetivo e emotivo de quem o elabora, e, condicionada aosinteresses, crenças, convicções pessoais e expectativas do su-jeito cognoscente, que não valoriza o esforço da busca deprovas e evidências;

• incapaz de se submeter a uma crítica sistemática e isenta deinterpretações baseadas apenas nas crenças pessoais;

• expresso em linguagem diversificada e vaga, dificultando ouimpossibilitando o controle e avaliação experimental;

• condições de produção e de uso que podem permitir aemergência do caráter dogmático;

• intuição dos primeiros princípios lógicos, primeiros princí-pios éticos e intuição estética.

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Como se afirmou anteriormente, todos estamos impregnados desse tipode conhecimento, todos recorremos a ele. Assim, o extensionista ruralou a extensionista rural é também detentor ou detentora desse tipo deconhecimento e está constantemente interagindo profissionalmente compessoas que detém ou produzem esse tipo de conhecimento e conse-qüentemente suas atitudes, seus comportamentos, seus valores são tam-bém condicionados pelo conhecimento do senso comum.B) Conhecimento filosóficoA compreensão do sentido e da forma de construção do conheci-mento filosófico passa pela compreensão de que a Filosofia:

• tem como objetos, idéias, relações conceituais, exigênciaslógicas não redutíveis a realidades materiais, portanto nãopassíveis de observação sensorial;

• utiliza o método racional onde prevalece o processo deduti-vo, que antecede à experiência, e se centra na coerência lógica;

• está sempre à procura do mais geral, das leis mais univer-sais, se interessando pela formulação de uma concepçãounificada e unificante do universo;

• objetiva questionar as certezas, as conclusões, procurandosentido ou interpretação mais ampla em resposta às grandesindagações do espírito humano;

• tem como fundamento a evidência lógica.

Deduz-se com certa facilidade que a construção desse tipo de conhe-cimento tem regras próprias. Mas, ao mesmo tempo, parece ser fácildeduzir também que freqüentemente a pessoa está em estado de filo-sofar. E no quotidiano de seu trabalho, o extensionista rural ou aextensionista rural interage com agricultores familiares, com indígenas,com pecuarista que, como ele ou ela, se aproximam também das ca-racterísticas do conhecimento filosófico, quando, por exemplo, umagricultor familiar pergunta: E por que tem que ser assim, Doutor?C) Conhecimento religiosoEsse tipo de conhecimento supõe uma compreensão sobre Teologia,como se vê a seguir:

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• não se distingue da Filosofia e das outras ciências pelo ob-jeto de estudo que é ou pode ser o mesmo (Ex.: Teoria daEvolução das Espécies; origem do mundo);

• utiliza princípios operativos (razão iluminada, elevada pelo Domsobrenatural e gratuito da fé), diferentes da Filosofia e demaisciências (sentidos corporais, inteligência e razão natural);

• utiliza como princípio operativo a fé religiosa que é de or-dem místico-intuitiva e não de ordem racional-analítica;

• tem uma esfera de valor completamente autônoma, portan-to uma epistemologia autônoma;

• supõe e exige a autoridade divina, nela se fundamentando esó a ela atendendo.

Parece que as características do conhecimento religioso ficaram claras.Aqui também se pode afirmar que os comportamentos, as atitudes hu-manas são muito influenciadas pelo conhecimento religioso: os técnicose as técnicas, os professores e professoras, os agricultores e agricultoras,os índios e as índias, todos e todas, até aqueles e aquelas que, contradi-toriamente, se dizem ateus ou atéias, quando bem analisados, seus com-portamentos tem também a influência do conhecimento religioso. Outrareflexão importante refere-se ao fato de professar, de praticar, de serinfluenciado ou determinado pelo conhecimento religioso não impede ainfluência de outros tipos de comportamento, de atitudes. Neste senti-do, alguém pode ser profundamente religioso (católico, batista,presbiteriano, budista, cultos afro-brasileiros, por exemplo) e ser umgrande cientista. Claro, às vezes surgem grandes conflitos.D) Conhecimento científicoPara entender o conhecimento científico, faz-se necessário situá-lono tempo. Assim, até o Renascimento, o conhecimento científico secaracterizava como:

• certo, pela condição de explicar os motivos da certeza;

• geral, porque conhecia no real o que há de mais universal eválido para todos os casos da mesma espécie;

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• metódico, sistemático, objetivo e crítico, resultante da de-monstração e da experimentação.

Hoje, como afirma Cervo (1996:8).

(...) a concepção de ciência é outra. A ciência nãoé considerada como algo pronto, acabado ou de-finitivo. Não é a posse de verdades imutáveis. Atu-almente a ciência é entendida como uma buscaconstante de explicações e soluções, de revisão ereavaliação de seus resultados e tem a consciênciaclara de sua falibilidade e de seus limites.

Nem sempre se pensa assim. Quase sempre, nos processos deescolarização se incutem visões exatamente diferentes: a ciência é averdade e é imutável, o que a aproxima muito do conhecimento reli-gioso, como se viu acima.A relação sujeito – objeto, no contexto da produção do conheci-mento científico, que, como se viu, se processa de forma metódica,sistemática, é regida por regras claras e conhecidas de todos. Taisregras configuram o chamado método científico. No exemplo acimaapresentado, o conhecimento resultante da relação do extensionistaou da extensionista rural com a comunidade predominantemente in-dígena, para ter o caráter científico, precisaria atender a certascondições. Assim, o contacto do extensionista ou da extensionistateria que ser mais planejado, ser precedido de leituras sobre o que jáse estudou e publicou em torno de comunidade predominantementeindígena na Amazônia, por exemplo. Ou seja, teria que ser precedi-do de uma apropriação do conhecimento já existente em torno dotema. Também deveriam ser formuladas questões que sintetizassemas inquietações do extensionista ou da extensionista em torno dacomunidade predominantemente indígena, isto é, o que é mesmoque ele ou ela quer conhecer, qual o problema a esclarecer ou expli-car? Outra decisão no planejamento do estudo da comunidade a servisitada: o contato vai ser feito com todos os integrantes da comuni-dade? como vai se dar esse contato com todos? ou se vai estabelecer

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uma amostra, isto é, vai ser feito contato apenas com um certonúmero de habitantes, incluindo nesse conjunto, homens, mulheres,adultos, jovens e crianças, por exemplo. Depois, teria que se definircomo registrar as impressões, as informações e como analisá-las pos-teriormente, inclusive comparando-as com impressões produzidas eregistradas por outras pessoas. Por fim, formular sinteticamente con-clusões e, neste caso, até hipóteses a serem investigadas posterior-mente, numa perspectiva de aprofundar o conhecimento.Feita essa breve caracterização dos tipos de conhecimento, pode-se possivelmente afirmar que hoje o extensionista ou a extensionista,por exemplo, começa a perceber a diversidade de tipos de conhe-cimentos, a caracterizá-los, e valoriza-los, sem preconceitos, coma consciência de que não se trata de considerar um tipo de conhe-cimento melhor ou superior a um outro tipo de conhecimento.Trata-se de considerá-los como eles são: diferentes. Tal consciên-cia pode favorecer à interação extensionista – agricultor,extensionista – indígena, extensionista – pecuarista, por exemplo.A consciência das diferenças entre tipos de conhecimentos com osquais se interage no cotidiano pode contribuir para a adoção deatitudes de valorização dessas diferenças e de aprendizagens a partirdas diferenças.Como se tentou evidenciar, as diferenças entre tipos de conhecimen-tos são resultados dos processos diferentes de produção de cadatipo de conhecimento.Pelos objetivos desse texto, a seguir se tentará apresentar elementosque favoreçam a compreensão do processo de produção do conhe-cimento científico.

Conhecimento Científico e Método Científico

Importa ter bem claro que a compreensão em torno do método cien-tífico aponta pelo menos para três finalidades: a)compreendê-lo comoprocesso de produção diferenciador de outros tipos de conhecimen-to; b)contribuir para compreensão e crítica do conhecimento siste-

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matizado a que se tem acesso e c) instrumentalizar-se para sua prá-tica, para seu exercício.Antes da adjetivação, convém definir ou apresentar um sentido deMétodo.Lungarzo (1989), por exemplo, assinala que “uma das diferençasentre a ciência e as outras formas de conhecimento é a existência deuma organização lógica entre as afirmações que constituem uma te-oria científica e a possibilidade de justificá-la”. Ele assim conclui:Uma das características da ciência, que permite organizar, compararseus enunciados, testar suas verdades, é a existência de um método.A ciência tem um conjunto de procedimentos organizados para ob-ter, compilar e testar seus resultados.(LUNGARZO, 1989:42).Eis o sentido de método: procedimentos organizados em uma se-qüência lógica, de forma a poder, inclusive, assegurar a repetição daexperiência, da situação de pesquisa, da interação sujeito – objeto.Em se falando de método científico, para os objetivos desse texto,destaca-se a importância e a caracterização da etapa de observação,identificação e formulação do problema de pesquisa.

Observação, identificação e formulaçãodo problema de pesquisa.

Esse é o primeiro passo, num processo de produção do conheci-mento científico. Começa-se uma pesquisa pela inquietação produ-zida a partir da observação. É a observação do real, da prática, doempírico que suscita a necessidade de pesquisa para explicar, paracompreender, para resolver um problema de pesquisa.E o que é problema de pesquisa? Considerem-se algumas definições.Ferreira, por exemplo, assim se expressa:

Um problema caracteriza-se pela proposição deuma dificuldade a ser resolvida. Pode ser de or-dem prática - problemas empíricos -, ou teórica,problemas relativos a revisões ou validaçõesconceituais, confronto entre teorias, etc. Estas

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dificuldades inviabilizam o conhecimento de fa-tos ou fenômenos, de importância significativa,para a qual busca-se uma solução. O problemase constitui na pergunta fundamental que nortearátodo o trabalho a ser desenvolvido na pesquisa,cuja conclusão final deverá apresentar uma res-posta à pergunta colocada no princípio. Consi-deramos que, em função do problema a ser for-mulado, o trabalho posterior pode ser facilitadoou dificultado. Um problema, portanto, deve ser:1. formulado como pergunta;2. claro e preciso;3. não deve partir de valores explícitos do pes-quisador;4. deve ser passível de verificação;5. deve ser viável, passível de ser solucionado(FERREIRA, 1998:133).

Outro autor, Lacasse (1991:252) chama a atenção para as caracte-rísticas do enunciado do problema, quais sejam:

• em por finalidade estabelecer uma relação entre dois oumais elementos ou variáveis

• deve ser claro e sem ambigüidade

• deve ser formulado sob a forma de questões

• deve ser verificável, observável empiricamente.

• não deve apresentar julgamento ou posição moral

Já Goldemberg (1997:71), respondendo a pergunta: como formularum problema específico que possa ser pesquisado por processoscientíficos, afirma ser o primeiro passo tornar o problema concreto eexplícito através:

• da imersão sistemática no assunto;

• do estudo da literatura existente;• da discussão com pessoas que acumularam experiência prá-tica no campo de estudo.

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E completa: “a boa resposta depende da boa pergunta. O pesquisa-dor deve estar consciente da importância da pergunta (...)”.Acima, falando do conhecimento científico, recuperou-se o exemploda relação do ou da extensionista com uma comunidade predomi-nantemente indígena na Amazônia. Agora, se privilegiou a caracteri-zação do que pode ser indicado como primeira etapa do métodocientífico. Não se quer, como foi afirmado na introdução, dar contade todo o processo de formação do pesquisador, mesmo sabendo-se que o extensionista ou a extensionista rural também pode desen-volver pesquisa científica em seu quotidiano de trabalho. A preten-são está em alertar profissionais de extensão rural para a diversidadede tipos de conhecimentos e de seus processos de construção.Tal objetivo sugere reflexões ou considerações na perspectiva enun-ciada inicialmente de contribuir para a compreensão de como o sen-tido de ciência, o sentido de conhecimento e de pesquisa científicapodem também condicionar o desempenho do extensionista rural eda extensionista rural no seu trabalho de escritório e de campo. Paraisso, parece oportuno considerações em torno do chamado espíritocientífico, que se apresentam a seguir:

Atuação e quotidiano de extensionistarural e espírito científico.

Recuperam-se aqui contribuições de um autor já citado (RUIZ, 1996)em torno do que ele qualifica espírito científico. A atuação e o quo-tidiano de profissionais de extensão rural, como se afirmou no pre-sente texto, são marcados pela convivência com a diversidade desaberes, de conhecimentos que se distinguem, igualmente como setentou caracterizar no presente artigo, pelos seus processos de pro-dução. Ora, sabe-se que a missão de tais profissionais não estáprioritariamente ou predominantemente direcionada para o desen-volvimento de pesquisa científica, ou, se se preferir, para a produçãode conhecimento científico. No entanto, tal atuação deve ser carac-terizada por atitudes e comportamentos de vigilância epistemológica

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que pode se concretizar pelo exercício do espírito científico caracte-rizado por Ruiz (1996). Para esse autor:

Espírito científico, mentalidade científica, ou ati-tude científica é um estado de espírito, é umadisposição subjetiva adequada à nobreza e à se-riedade do trabalho científico. Esse estado subje-tivo resulta do cultivo de uma constelação de vir-tudes morais e intelectuais; não bastará, pois,conhecê-las; é preciso vivê-las, reduzí-las à práti-ca, cultivá-las. (RUIZ, 1996:132).

Ele apresenta, pois, as seguintes características do espírito científico:a) espírito crítico – lembrando que criticar é “antes de tudo, analisar,questionar, submeter a exame, julgar a validade, a fundamentação dassoluções estabelecidas” o autor parece querer dizer aos profissionaisda extensão rural, no caso do segmento profissional a quemprioritariamente se destina esse texto, que é preciso ter cuidado, épreciso apropriar-se criticamente do conhecimento, das tecnologias,dos contextos para se assegurar uma atuação consistente e coerente.Para isso o autor acima citado faz também a distinção entre espíritocrítico (atitude amadurecida de alguém que busca com seriedade averdade, ponderando razões, confrontando motivos, por exemplo) quedeve ser cultivado, estimulado, e espírito de crítica (espírito de contra-dição, indício de desorganização mental, de superficialidade irrespon-sável, demolidor e pernicioso) que deve ser banido (p.133);b) espírito de confiança na ciência – a confiança na ciência significa oconjunto de atitudes que implica em distanciar-se de dois extremos:o ceticismo e a submissão passiva a dogmatismos;c) busca de evidências – “O homem comum vê a natureza, ouve anatureza. O cientista a interroga, quer explicações pela linguagem elo-qüente dos fatos. Só evidência dos fatos sacia seu desejo de conhecero ‘como’ e os ‘porquês’ dos fenômenos” (p. 134), em liberdade, comautenticidade e com rejeição de toda sorte de autoritarismo, não sesatisfazendo com o simples conhecimento dos fatos, mas procurandosua compreensão, sua justificativa e sua demonstração;

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d) espírito de análise – entendida análise como a decomposição, odesdobramento, a segmentação de um todo complexo em seus com-ponentes ou elementos mais simples, operação que pode contribuirpara a compreensão do fenômeno em estudo;e) espírito positivo de apego à objetividade – o autor lembra que é aevidência dos fatos, de forma objetiva e irrefutável, que assume a fun-ção de critério da verdade. Os fatos frente à hipóteses pré-concebidascomo possível explicação ou resposta à pergunta do problema podemcomprová-las, ou negá-las. Como afirma Ruiz, “o cientista não preci-pita conclusões sem evidência suficiente oriunda dos fatos, e não deseu engenho criativo. Ciência não é literatura de ficção” (p.135).f) espírito criativo – a criatividade se manifesta na formulação das hipóte-ses, na definição de instrumentos de coleta e análise de dados, por exem-plo, assim como na concepção de outros processos de pesquisa.g) espírito indagador – a ciência não é um ponto de chagada, fixo edefinitivo. O conhecimento científico está sempre sendo reconstruído,a partir das novas indagações que a observação, a análise vão susci-tando. Nunca aceitar, em termos de ciência, uma resposta, umatecnologia como definitiva, pois ela é sempre provisória.Tais considerações sobre espírito científico, aqui apresentadas, sem-pre inspiradas em Ruiz (1996:132-135) parecem contribuir muitopara a (re)construção de atitudes, de comportamentos do extensionistae da extensionista rural em seus processos de interação com agricul-tores e agricultoras familiares, com índios e índias, com pecuaristas etambém com trabalhadores e trabalhadoras assalariadas.

Considerações finais

No início do presente texto, declarou-se a pretensão de suscitar algumasreflexões em torno de possíveis relações entre o domínio de princípiosbásicos da metodologia científica e a atuação profissional de alguémenquanto extensionista rural esperando contribuir esclarecer questões,tais como: qual a compreensão do extensionista rural e da extensionistarural em torno de ciência, em torno de conhecimento e em torno depesquisa? Como tal compreensão pode também condicionar o desem-

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penho do extensionista rural e da extensionista rural no seu trabalho deescritório e de campo? O autor desenvolveu todo o texto com tais obje-tivos e espera que de alguma forma o seu resultado possa ajudar aquelese aquelas que estão com a mão na massa no campo, em contextosrurais. Sobretudo, o autor tentou evidenciar que a compreensão sobreconhecimento, suas formas de construção e sua diversidade pode favo-recer a uma melhor e, possivelmente, mais eficaz interação de profissio-nais de extensão rural com os atores sociais com os quais esses profissi-onais lidam no seu cotidiano de trabalho profissional.Uma última consideração, no entanto, se impõe, na tentativa de síntese:tudo parece nos levar a afirmar que ninguém pode fugir da diversidade detipos de conhecimentos, que têm processos de produção (resultado da rela-ção sujeito-objeto) diferentes; ninguém está autorizado a classificar este ouaquele conhecimento como superior ou inferior. Trata-se apenas de tiposdiferentes de conhecimento. O extensionista rural e a extensionista rural, porexemplo, como qualquer outro profissional, certamente, são detentores des-sa diversidade de conhecimentos e em suas relações profissionais interagemcom tal diversidade que está presente em cada ator social.

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O grande desafio da educaçãoempreendedora cooperativa

Jimmy Peixe Mc Intyre1

M. Sc. Gestão de Cooperativas

A partir de cenários globalizados economicamente que se con-trapõem às demandas de desenvolvimento e de fortalecimentolocal, qualquer empreendedor cooperativo se depara com os de-safios de conjugar a ação empresarial de competitividade com anecessidade de se articular e cooperar tanto no micro cenário deatuação local, como no macro cenário constituído por vários se-tores de atividades. Assim, enquanto empreendedor, precisa-semanter um olho centrado em uma luneta e um outro olho nomicroscópio. Neste aspecto, a princípio, esta parece ser umamissão difícil, mas não impossível de ser realizada, pois ela de-pende basicamente de um conjunto de habilidades e de métodospara a sua execução.É justamente com desafios como este que o empreendedor cotidia-namente se depara no processo de gestão: onde as decisões maissimples passam por exigências complexas de reflexão e deposicionamento por conta de diversos fatores, tanto de caráter inter-no como externo à organização.Neste aspecto, quanto maior for a amplitude do conhecimento emais amplo for o campo de visão do empreendedor, maior será aprobabilidade de acerto nas decisões estratégicas. Assim, para a ele-vação das probabilidades de acerto, uma das alternativas que se apre-senta é a educação empreendedora articulada com o contexto decooperação a partir da formação de parcerias e de redes de aprendi-zagem permanente.

1 Doutor e lotado no Departamento de Educação da Universidade Federal Rural dePernambuco.

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Portanto, a educação empreendedora consiste em uma atividadecontínua composta de três dimensões e estruturada por princípiosbásicos, cuja finalidade é permitir ao empreendimento alcançar van-tagens competitivas que o consolidem em um ambiente de negóciosque passa tanto pelo local, como pelo global e vice-versa. Este pro-cesso, enquanto instrumento estruturador de competitividade é váli-do para todo tipo de cooperativa.No caso das cooperativas agropecuárias, inicialmente, a educaçãoempreendedora visa a autocompreensão. Esta etapa consiste emuma descoberta ou redescoberta das vocações e expectativas indi-viduais enquanto empreendedor. Nesta perspectiva, as habilida-des, competências, desejos e aspirações, consistem em atributosintangíveis relativos à dimensão pessoal que torna o indivíduo, sin-gular, único e diferente dos demais a partir de características quepodem ser canalizadas e recristalizadas pelo empreendedor em proldo seu negócio. Este processo de autoconhecimento possibilitaque o empreendedor tenha uma idéia mais clara da estrutura socialem que se encontra inserido, permitindo identificar quais os seusdiferentes papéis na sociedade local, regional e global, para poderse relacionar e intervir com competência no seu campo de atua-ção. Por conseguinte, este processo pautado em métodosconstruídos leva o empreendedor ao entendimento das diferentesformas de funcionamento das relações políticas e econômicas dasociedade, de modo que se delineiem mudanças e transformaçõessociais. Nesta direção, o foco tradicional e meramente econômico,cede espaço, para se integrar com outras áreas do conhecimentotais como a psicologia e a sociologia das organizações, a geografiaeconômica, a engenharia de processos, a gestão e auto-gestão donegócio, dentre outras, numa perspectiva de um novo processo deformação educacional cooperativo.A segunda dimensão da educação empreendedora consiste em iden-tificar fragilidades e oportunidades do negócio para se poder efetuarum mapeamento do ambiente em que a empresa vai atuar, permitin-do então o posicionamento do empreendimento perante o cenário

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traçado. Neste caso, o mapeamento do ambiente, a partir de umavisão analítica sobre o campo econômico, social, político, ambientale tecnológico, vai nos apontar as principais variáveis que poderápotencializar ou obstaculizar o negócio. Assim, o empreendedorenquanto sujeito da construção do seu conhecimento irá traçar vári-os roteiros que lhe permita identificar qual o melhor caminho a per-correr com probabilidades de sucesso com menor risco. Ainda nestadimensão educativa empreendedora os métodos adotados devemfavorecer a visualização de como otimizar as oportunidades pelacooperação, de modo a que, nas relações estabelecidas, não hajaapenas um ganhador e sim ganhadores, mútuos.Por fim, a terceira dimensão da educação empreendedora consisteem uma análise do ambiente interno do empreendimento, detec-tando aspectos tangíveis e intangíveis. Neste aspecto, o empreen-dedor, não deve estar apenas atento para a infra-estrutura disponí-vel como: instalação, máquinas, equipamentos, quantidade de fun-cionários, tipo de produto, os quais são partes mensuráveis. Eledeve também se preocupar com um desafio maior sobre aquiloque não podemos mensurar objetivamente, e que passa pela empatiae a satisfação dos cooperados empreendedores, pelas atividades,pelas rotinas, pelos processos e pela satisfação dos clientes. Essesaspectos, na educação empreendedora, não podem ser negligenci-ados, pois enquanto conteúdos a serem trabalhados eles se consti-tuem em vetores de inovação, tanto de processos como de produ-tos, como também, de alicerces para a formação da cultura dacooperação na organização.Todavia, deve ficar bem claro que estas dimensões da educaçãoempreendedora, somente surtirão o efeito desejado se vierem acom-panhadas de ações complementares. Isto implica em dizer que aeducação empreendedora deve estar imersa em conceitos e valo-res culturais que valorizem a transparência, a confiança e os valo-res democráticos, os quais são os princípios fundamentais enorteadores do bom funcionamento das relações tanto das pesso-as como das cooperativas.

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Cooperativismo e desenvolvimento local

Maria Luiza Lins e Silva Pires1

Que local é esse?

Hoje, todo mundo fala em desenvolvimento local e pode-se até mes-mo admitir que esse assunto virou moda nos meios acadêmicos. Maspor que tanta preocupação em torno do desenvolvimento local? Oque esse conceito revela? Por que se fala em desenvolvimento localao invés de apenas desenvolvimento como no passado? Que local éesse?Trata-se de uma idéia de desenvolvimento diferente? Vamos,então, tentar responder por partes. Em primeiro lugar, é possíveladmitir que a expressão “local” não surge à toa no atual contexto. Olocal traz sempre associado uma idéia de proximidade, vizinhança,identidade, raízes comuns, expressando, de um modo geral, laçosmais fortes entre as pessoas. Se a gente diz: “eu e Adriana somos deBezerros”. Mesmo para os que não nos conhecem bem, são capazesde admitir que nós duas temos referenciais comuns, e talvez atétenhamos, quem sabe, algum grau de parentesco se investigarmos anossa árvore genealógica. No mínimo, haveremos de conhecer al-guns festejos comuns à nossa cidade como a “Festa do Papangu”,por exemplo, entre outros acontecimentos que marcam a nossa vidasocial. Já Paulo, André e Cristina são de Caruaru. Com toda certeza,eles conhecem a “Feira de Caruaru”, o “Alto do Moura” e a “Feira daSulanca”. Claro que se os três amigos estiverem dispostos a conver-sar mais atentamente, vão descobrir muito mais pontos em comum,não resta dúvida. São esses pontos em comum que revelam a ex-pressão cultural de um povo de um dado lugar. O fato de sentir

1 Maria Luiza Pires é doutora em sociologia do Departamento de Educação da UFRPE.

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compartilhando com o outro representações culturais semelhantesimprime, em cada um, uma identidade - de povo de Bezerros ou deCaruaru. É como se fosse uma “marca registrada”, que alimenta emcada um de nós um sentimento de pertencimento. É com orgulhoque a gente escuta muitas vezes: “eu sou filho de Bezerros; “eu soufilho de Caruaru”.Se é possível associar o local a uma idéia de similaridade entre os seresno viver juntos, na igualdade, na idéia, portanto, de comunidade, olocal também revela, paradoxalmente, uma idéia de diferença, de di-versidade cultural e multiplicidade de arranjos que fazem com queCaruaru e/ou Bezerros tornem-se únicas cidades, sui generis, em rela-ção a todas as outras cidades do mundo. A idéia de local guarda tam-bém uma íntima relação com algumas questões complexas da atualida-de, como: globalização, sustentabilidade, crise do Estado, desempre-go, violência entre tantas outras. Isso revela que o assunto local nãodiz respeito tão somente a um “local” específico, mas revela as articu-lações de um local, com o todo, isto é, com o global.Mas o local é apenas um município como Bezerros ou Caruaru? Não.O local pode ser um continente, um país, uma região, um estado, umacidade, um bairro ou até mesmo uma rua ou uma escola. Em todosesses lugares pode-se perceber elementos comuns que unem os maisdiversos indivíduos. De alguma forma, cada um desses locais, imprimeuma condição de pertencimento, uma identidade específica.Se já sabemos que local é esse, podemos agora partir para respon-der o porque de se ter despertado para a questão local nas propos-tas de desenvolvimento. Pode-se dizer, nesse sentido, que a idéiade desenvolvimento local, ao contrário de apenas desenvolvimen-to, traz uma forte referência aos diversos atores locais, na sua ca-pacidade de ação e de articulação, especialmente num momentohistórico em que se vive a chamada “Crise do Estado”. Isso signi-fica que preocupações que antes eram típicas do Estado como:desemprego, violência, atendimento aos desamparados (crianças,velhos e enfermos) passam a ser também discutidos e assumidospelos diversos atores sociais.

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Tal perspectiva traz presente a idéia de que somos co-autores e co-responsáveis pelo destino de todos nós. Tal perspectiva traz tambémpresente idéias como democracia, autonomia, autogestão, participa-ção. “Arregaçar as mangas” ou “mãos a obra”, envolvendo todos osatores sociais em um projeto coletivo, define a filosofia de trabalhoque está por trás do conceito de desenvolvimento local.Mas, finalmente, quem são os atores sociais ou atores locais? Osatores locais somos todos nós, trabalhadores e trabalhadoras dosmais diversos ramos – agricultura, construção, fábrica, escritório,comércio, escolas. E o padre é um ator social? Claro. O prefeito, overeador também são? Com toda certeza. O associado da coopera-tiva, a própria cooperativa, o médico, a professora, o artista, o pa-deiro, todos são atores importantes dentro da idéia de desenvolvi-mento local. Isso porque, cada um a sua maneira, pode trazer bené-ficos para a sua comunidade. Isso, naturalmente, se essas pessoastiverem compromisso com a sua comunidade, com o local a quepertencem e dessa forma, se dispuserem a “arregaçar as mangas”.Potencialmente, portanto, todos somos atores sociais.Para os propósitos desse curso, vamos situar a cooperativa (atravésdos seus associados) enquanto um ator importante no desenvolvi-mento local. Para isso, é preciso que a gente situe o cooperativismona sua capacidade de trazer respostas aos desafios contemporâneosde globalização de desemprego e de crise do Estado.O cooperativismo, nessa perspectiva, traz à tona a discussão sobre aidéia de pertencimento, de participação, de autonomia, de solidarie-dade que imprimem, junto com a capacidade de “arregaçar as man-gas”, o sucesso da “fórmula cooperativa”.

Cooperativismo e globalização

De uma forma simplificada, identifica-se a globalização da economiaa partir de três características principais: - o crescimento de impor-tância dos agentes do mercado global (empresas transnacionais) so-bre os agentes locais, - a quebra de poder do Estado na condução

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de questões macroeconômicas e - o grande avanço tecnológico quecaracteriza as últimas décadas.Todas essas questões implicam uma nova divisão internacional dotrabalho, redefinindo o jogo de forças entre os diversos atores locais/globais, indicando, inclusive, a partir da forma de inclusão ou exclu-são, quem são os vencedores e perdedores dessa acirrada disputa(Bonanno, 1994).Aproximando-se da idéia de diferentes correlações de força, Santos(1994) nega o caráter homogêneo da globalização, refutando, as-sim, a idéia de uma única globalização; para ele, há globalizações noplural. No seu entendimento, essas globalizações expressam proces-sos singulares de relações sociais movidos por dinâmicas locais; oque tende a revelar os vencedores e os vencidos a partir de relaçõesde conflito. Tal concepção expressa a mútua influência que existeentre o global e o local, como duas instâncias de um único processo.“Pensar globalmente e agir localmente” vem se tornando um chavãocada vez mais popularizado. O fato é que dificilmente as discussõessobre os desafios do cooperativismo podem prescindir de uma avaliaçãomais sistemática da relação entre global e local - duas extremidades deum mesmo processo - a partir de uma relação de mútua influência.Necessário também é considerar o caráter concentrado e excludenteda globalização, o que dificulta enormemente a estabilidade da rela-ção entre local e global. Nesse sentido, alguns estudos têm procura-do demonstrar a importância do cooperativismo enquanto um ins-trumento eficaz de ligação entre os pólos. Dito de outra forma, tan-to no que diz respeito à produção quanto à comercialização a viacooperativa tem se revelado capaz de atender às demandas globais apartir da organização de atores locais.Vale ressaltar, que essa capacidade de atender às exigências de umdado momento histórico não é nova. Se nos voltamos ao passadopercebemos que, desde o advento da Revolução Industrial, ocooperativismo vem demonstrando grande capacidade de adaptaçãoàs realidades distintas, revelando-se, do mesmo modo, como umaalternativa de inclusão dos trabalhadores ao modelo produtivo.

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Hoje, principalmente, quando a globalização tem levado um grandenúmero de pessoas ao desemprego, o cooperativismo ganha uma im-portância particular. De um modo geral, as práticas associativas estãosendo identificadas como uma alternativa frente ao desemprego cres-cente. E o cooperativismo, pelo seu caráter de associação econômica,vem sendo particularmente ressaltado como uma alternativa de inclu-são para enfrentar esse período marcado pela grande exclusão social.As manchetes de jornal são prósperas em associar o cooperativismoà criação de emprego e renda. Vejamos alguns exemplos:“Profissionais voltam ao mercado de trabalho” (Diário de Pernambuco,24/08/1997); “Autogestão contra o desemprego” (Folha de SãoPaulo, 22/06/97);“Saiba como as cooperativas estão driblando o desemprego” (Diáriode Pernambuco, 29/09/96);“Mulheres se unem para multiplicar renda” (Jornal do Commercio,02/01/2000)Intimamente relacionada à criação de empregos, constata-se, habi-tualmente, uma forte ênfase no conceito de “autogestão”, conformepode-se observar nas manchetes abaixo:

• “Cooperativas discutem qualidade e autogestão” (Jornal doCommercio, 26/01/96)

• “Autogestão ‘salva’ 6.000 empregos até 97" (Folha de SãoPaulo, 03/11/96);

• “Autogestão recupera empresas quebradas” (Folha de SãoPaulo, 28/09/97);

• “Autogestão é experiência inédita na Região” (Jornal doCommercio, 05/10/97)

De um modo geral, todas essas manchetes revelam as mais diversasestratégias de sobrevivência que podem se abrigar sob a “fórmulacooperativa”. Tais estratégias englobam desde atividades artesanaisaté aquelas que necessitam de maiores conhecimentos na área cien-tífica e tecnológica.

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O cooperativismo entre o local e o global

A relação entre cooperativismo, globalização e desenvolvimento localé fortemente estimulada pelo fato de que, a partir da organização daprodução e de sua comercialização sob as exigências da globalização,as cooperativas vêm contribuindo para a potencialização dos locais emque estão inseridas. Observa-se, com isso, um aumento do poder debarganha dos produtores, do crescimento do emprego e renda, con-firmando a perspectiva presente na literatura que identifica as coope-rativas, ao lado de outras iniciativas empresariais, como uma estratégiaimportante dentro da perspectiva de desenvolvimento rural (Prévost,1996; Pires, 1999; Pires & Buendía, 1999).Mas a questão não se encerra aí, pois, através de uma forma de orga-nização local – instituída através de uma empresa cooperativa - oscooperados podem articular uma rede de relações que não se limita aoâmbito local, redefinindo as relações entre forças locais e globais.Vale lembrar, nesse sentido, que não apenas as cooperativas, mastodo o empreendimento econômico capaz de gerar emprego e ren-da é capaz de promover o florescimento ou o desenvolvimento deuma dada localidade, desde, evidentemente, seja uma prática eco-nômica de reconhecido sucesso. Nesse aspecto, podemos afirmarque o que define o sucesso ou insucesso das práticas econômicasestá associado à sua capacidade de adequação permanente às trans-formações produtivas.É possível constatar, finalmente, que a sobrevivência e crescimentodas organizações econômicas - sejam elas empresas cooperativas ouempresas capitalistas - depende das estratégias usadas para respon-der aos desafios da acirrada competição que tem lugar na economiaglobalizada.

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Região amazônica e economia solidária:uma perspectiva de desenvolvimentointegrado sustentável

Ana Maria Dubeux Gervais1

Os anos 90 representaram para todos os países de economia capita-listas o marco da consolidação de uma série de transformações es-truturais provocadas pelo capitalismo que produzem impactos naforma de organização social e econômica dos mesmos. E como nãopoderia deixar de ser, num contexto de economia globalizada, é tam-bém nesta época que o Brasil é atingido em cheio por tais transfor-mações. Em termos globais, a humanidade avança no conhecimentotecnológico, mas apesar disso, todas as sociedades do planeta en-frentam o desafio de definir e implementar vias de desenvolvimentocapazes de conciliar prudência ecológica com viabilidade econômicae justiça social. Trata-se de um desafio que, antes de tudo, é político,uma vez que a sua aceitação depende da vontade consciente de umadeterminada coletividade.Neste texto, tentaremos indicar alguns dos aspectos a serem consi-derados mais especificamente quando tratamos do desenvolvimentoda região norte de nosso país. Considerada o pulmão do mundo, aAmazônia é hoje o centro de preocupações de todos os países quecompõem a chamada aldeia global. E, de uma maneira geral, o Bra-sil, país que detém uma enorme biodiversidade sofre pressões exter-nas e internas importantes a respeito do uso e da conservação dabiodiversidade da região.No entanto, nem todos os ecologistas e chefes de governo do mun-do inteiro que clamam pela preservação da Amazônia, como garan-

1 Professora da Universidade Federal Rural de Pernambuco, doutora em Sociologia pelaUniversité de Paris I, Coordenadora da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Popularesda UFRPE.

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tia de uma sobrevida mais longa às populações do planeta, reconhe-cem que parte do problema está relacionado às relações desiguaisque estabelecem os hermisférios norte e sul deste mesmo planeta.Para bem dizer, o efeito estufa, o buraco ozônico e a erosãobiogenética indicam, com clareza, que durante o século XXI a con-servação e as formas de aproveitamento dos recursos naturais setornarão questões-chaves dentro de uma aldeia global que, do pon-to de vista social, está profundamente dividida. Convém lembrar que,entre 1960 e 1991, os 20% mais abastecidos da população mundialaumentaram a sua parcela de toda a riqueza produzida de 70% para85% enquanto, no mesmo período, os 20% mais pobres viram a suaparte reduzida de 2.3% para 1.4% (Hauchler,1995). Neste sentido,é óbvio que a maneira pela qual os moradores dos diversos “bairrosda aldeia global” encaram e tratam o ambiente natural está direta-mente dependente de sua condição sócio-econômica.Como afirma IBIRIBA (2004), “pode-se dizer que, se de um lado,ecologistas radicados nos países da Comunidade Européia ou nosEstados Unidos (dispondo, geralmente, de condições de segurançasocial da data do seu nascimento até o momento de sua morte)destacam, com toda a razão, que a proteção das florestas tropicais e,conseqüentemente, de sua incomparável biodiversidade é um insumode fundamental importância para a sobrevivência das futuras gera-ções da espécie humana na “aldeia global”, por outro lado, campo-neses na Amazônia ou nas partes africanas e asiáticas do cinturãotropical, que praticam o sistema de corte-e-queima da agriculturaitinerante, provavelmente terão problemas para entender e aceitaressas preocupações. Diante da pressão externa, que insiste em umarigorosa dieta econômica, apequena-se o Estado, transferindo-se aosgrupos econômicos, de qualquer origem, setores importantes daeconomia nacional, através da privatização. Porém, diante das impo-sições externas pela conservação ambiental, os países periféricos, namaioria dos casos, não conseguem responsabilizar todo o sistemapolítico global por essa conservação, e, também, pela reproduçãoeconômica das massas populacionais pobres ou miseráveis que, de

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uma maneira ou de outra, sobrevivem utilizando, predatoriamente,esses mesmos recursos.”Para pensar alternativas de desenvolvimento para a região que impli-quem em conservação de sua rica biodiversidade, temos que tomarcomo ponto de partida que esta questão não pode ser pensada iso-ladamente. Ao contrário, temos que ter claro que devemos enfrentá-la de forma holística, vendo que articulações e interfaces a regiãoestabelece com o país e o mundo. O desenvolvimento da regiãodeve então ser pensado na perspectiva do desenvolvimento susten-tável, que tem como premissa o atendimento das necessidades dageração atual sem comprometer a habilidade de gerações futuras ematender as suas necessidades. Além disso, temos que entender quediferentes dimensões perpassam a discussão da temática do desen-volvimento sustentável da região norte, tais como a política, a eco-nômica, a social, a cultural, a ambiental, entre outras. É fundamentalentão salientar que um projeto de desenvolvimento sustentável paraa Amazônia, tem que estar sobretudo calcada sobre uma propostade desenvolvimento humano que tenha como eixo a inclusão sócio-econômica de milhares de trabalhadores que lá habitam e que histo-ricamente (desde a época da colonização) têm sido proibidos de seapropriar de seu próprio território. Uma proposta que se preocupecom a redução dos índices de pobreza, proporcione uma maior arti-culação de atores - sociedade civil, governo, iniciativa privada - parao desenvolvimento sócio-econômico e apresente como eixo centralo estabelecimento de políticas articuladas de conservação ambiental.É nesta perspectiva de articulação que queremos apontar a econo-mia solidária, como um novo paradigma para se pensar políticas dedesenvolvimento sócio-econômico para a região. É importante res-saltar que uma tal análise, não pode ser feita à partir de um olharmeramente econômico, mas um olhar plural onde os elementos an-tropológicos, sociológicos, etnológicos entre outros são imprescin-díveis para uma compreensão do econômico. Esta perspectiva, influ-enciada particularmente pela pesquisa de Karl Polanyi (1983) sobrea origem política e econômica de nosso tempo, que tem inspirado

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múltiplos trabalhos nas mais diversas áreas do conhecimento, distin-gue quatro princípios básicos no comportamento econômico, cadaum entre eles associado a um modelo institucional. Segundo FrançaFilho & Laville (2004, p. 32 e 33), tais princípios são:

• O princípio da domesticidadedomesticidadedomesticidadedomesticidadedomesticidade, que “consiste em produzirpara seu próprio usufruto, ou seja, a prover as necessidadesdo seu grupo (...) (...)O modelo da domesticidade é o grupofechado. O que determina o núcleo institucional é indiferente,pode ser o sexo (como em relação à família patriarcal), o lugar(como em relação ao vilarejo), ou o poder político (como emrelação ao poder senhorial)”.

• O princípio da reciprreciprreciprreciprreciprocidadeocidadeocidadeocidadeocidade, que corresponde “à relaçãoestabelecida entre várias pessoas, por meio da seqüência du-rável de dádivas. A reciprocidade é por consequência fundadasobre a dádiva como fator social elementar – a existência dadádiva ligada a uma contra-dádiva. O aspecto essencial dareciprocidade é que as transferências são indissociáveis dasrelações humanas”.

• O princípio da redistribuiçãoredistribuiçãoredistribuiçãoredistribuiçãoredistribuição, segundo o qual “a produçãofica a cargo de uma autoridade que tem a responsabilidade dedistribuí-la, o que supõe um momento de armazenamento entreaqueles da recepção e repartição. Ele supõe uma autoridade euma divisão do trabalho entre os representantes desta autori-dade e os outros membros do grupo humano. Entretanto, sejaela a tribo, a cidade-Estado, o despotismo ou a feudalidade, ochefe, o templo, o déspota ou o senhor estarão no centrodeste modelo e a maneira como praticam a redistribuição émuitas vezes um meio de aumentar o seu poder político”.

• O princípio do mermermermermercadocadocadocadocado, que “se caracteriza como um lugarde encontro entre a oferta e a demanda de bens e serviçospara fins de troca. O mercado possui, então a particularidadede funcionar segundo o registro de um modelo institucionalque lhe é próprio: a troca, repousando sobre um equilíbrio

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entre oferta e demanda. (...) A troca pode assumir a forma depagamento em espécie quando o demandante não paga o preçofixado em moeda mas em bens ou serviços. A troca pode as-sumir a forma de escambo quando a troca de bens e serviçosnão passa pelo intermédio de um equivalente geral, mas seopera através de uma relação de equivalência simplesestabelecida entre dois conjuntos considerados pelodemandante como do mesmo valor.”

No entanto, historicamente, pouco a pouco, os seres humanos, nasociedade capitalista, foram esquecendo que existem outros princí-pios econômicos e transformaram o mercado, que nos primórdios daexistência humana servia como lugar de encontro entre oferta e de-manda, num mito. A partir daí, o princípio do mercado passa a ser odominante, e por conseguinte, é ele quem baliza a maior parte dasrelações econômicas existentes. E, paradoxalmente, isto é às vezesverdade mesmo para aqueles que de uma maneira ou de outra foramexcluídos da participação neste mesmo mercado.Se partimos da aceitação destes princípios como sendo a base dasrelações entre economia e democracia, nós podemos então reco-nhecer na sociedade contemporânea três pólos de análise: a econo-mia mercantil ou de mercado, a economia não mercantil (Estado) e aeconomia não monetária, onde observamos uma enorme pluralidadede trocas; pólo onde o trabalhador se coloca na perspectiva de trocagratuita e desinteressada que se baseia principalmente nas relaçõesque consolidem seus vínculos com a sociedade; pólo que é extrema-mente importante na construção da própria economia de mercado.Assim, a economia solidária define-se como uma economia pluralque se baseia na hibridação dos principios econômicos dadomesticidade, da reciprocidade, da redistribuição e do mercadoque reconcilia o econômico e o social que se move a partir de umimpulso reciprocitário entre individuos e se consolida na sociedadeatravés da construção de espaços públicos autônomos. E o que seri-am estes espaços públicos autônomos no caso brasileiro ? A partirdos anos 80, no mundo inteiro, mas mais especificamente nos países

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periféricos, o processo de globalização da economia se acelera, e osimpactos da reestruturação produtiva são cada vez mais fortes, ex-cluindo milhares de trabalhadores do mercado formal de trabalho.Estes trabalhadores, à exemplo do que aconteceu anteriormente naEuropa do século XIX, se organizam para descobrir caminhos para oenfrentamento destas mudanças, através da criação de cooperativaspopulares, que se distanciam do sistema formal do cooperativismobrasileiro vinculado à OCB e se organizam em sistemas próprios; degrupos informais de produção, de empresas autogestionárias, entreoutros. Como afirma Gaiger (2001, p. 109),

“Num verdadeiro polimorfismo, os empreendi-mentos organizam-se hoje das mais diversas for-mas, como associações informais ou grupos deprodução de caráter seguidamente familiar e co-munitário ou, ainda, cooperativas de trabalhado-res e empresas de pequeno e médio porte. Nalinha de frente, perfilam-se hoje empresasautogeridas vinculadas à ANTEAG2, cooperati-vas de produção e prestação de serviços e cente-nas de grupos e cooperativas agropecuárias, im-plantadas nos assentamentos da reforma agrária,sob a batuta do MST.”

Nós acreditamos que, embora com contornos próprios e diferencia-dos dos países desenvolvidos, a economia solidária no Brasil aconte-ce a partir da articulação política de diferentes polos da economia,mas talvez, a nossa grande diferença seja que o motor do seu cresci-mento seja o fato de que quantitativamente, o número de indivíduosexcluídos de um ponto de vista sócio-econômico seja muitas vezesmaior que nos países desenvolvidos. Assim, numa perspectiva de umnovo sentido de vinculação entre o econômico e o social, a econo-mia solidária assume em nosso país uma multiplicidade de formas

2 Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Autogestão e ParticipaçãoAcionário; em 1999 congregava 52 empresas e 15 mil trabalhadores.

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que no nosso entender se organizam em três grupos principais deatores, todos importantes na sua consolidação:

• O grupo de organizações que apoiam os trabalhadores emsuas iniciativas de economia solidária, constituído por ONG’s,associações, universidades, igrejas, associações de trabalha-dores autogestionários, entre outros.

• O grupo de organizações criadas pelos trabalhadores elesmesmos com o objetivo de encontrar novas alternativas deinserção sócio-econômica. Neste grupo, encontramos princi-palmente as cooperativas, as empresas autogestionárias, osgrupos produtivos rurais e urbanos, de pequeno porte, quenem sempre possuem um estatuto jurídico, como por exem-plo alguns dos desenvolvidos pelo MST, entre outros.

• O grupo de gestores públicos que tem se consolidado cadavez mais, por um lado, através da criação da Secretaria Naci-onal de Economia Solidária (SENAES) e por outro através doaumento significativo (principalmente em prefeituras vincula-das ao partido dos trabalhadores) de criação de diretorias ousecretarias municipais de economia solidária.

No caso da região norte, por exemplo, vários são os atores que vêmde uma maneira ou de outra trabalhando na direção da construçãode uma proposta de desenvolvimento integral para a região. Umaproposta que não vise apenas um desenvolvimento econômico da-queles que detém o capital, mas que seja inclusiva daqueles quehistoricamente têm sido colocados à margem de tal sistema. Pensaro desenvolvimento da região significa em construir coletivamentecom os diferentes atores que podem possibilitar a ampliação, forta-lecimento e consolidação das iniciativas de economia solidária umnovo caminho. Um caminho que traga novas perspectivas de desen-volvimento que visem a recuperação e o respeito aos ecossistemasnaturais (floresta, várzea e cerrado) da região para, através de umaproposta de desenvolvimento sustentável, planejar a reinserção só-cio econômica de milhares de amazonenses (onde incluímos os po-

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vos da floresta) excluídos de um ponto de vista social e econômico.Uma proposta onde a interconexão entre consumidores, poupado-res e produtores seja possível com vistas ao estabelecimento de re-des sociais que dêem suporte ao estabelecimento de novas relaçõeseconômicas entre os povos da região.Para concluir, apontamos nesta reflexão apenas alguns elementospara a real necessidade de não mais pensar a região amazônica ape-nas do ponto de vista da sua biodiversidade natural, mas também dasua biodiversidade humana. O paradigma da economia solidária secoloca então como uma possibilidade, uma vez que o mesmo, pou-co a pouco já se manifesta na prática cotidiana dos trabalhadoresexcluídos do mercado formal de trabalho. A partir deste paradigma,poderíamos talvez pensar na construção de um verdadeiro desenvol-vimento integral sustentável para a região.

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Desenvolvimentos, uma perspectiva plural

Jorge Roberto Tavares de Lima1

Sem pretensão, mais ousando. Uma abertura.

Este artigo tem a pretensão de registrar algumas observações dealguém encantado com a Amazônia e suas potencialidades. De umsonhador que decepcionado com os rumos do modelo de desenvol-vimento hegemônico, procura saídas. De um inquieto e atrevido quesem um conhecimento profundo da Amazônia, ousa indicar possibi-lidades. De um agrônomo e de um homem que acredita no reencon-tro do homem com natureza e percebe a agroecologia como umaestratégia desta reunificação. Para isso parte de uma constatação járealizada por muitos, da existência de uma crise global, que Capra(1982) identifica como uma crise de percepções. Porém, ousandosair do diagnóstico e da constatação da existência da crise, para umaperspectiva propositiva, de construção na linha defendida por Garri-do Peña (1996) de um pacto social pela vida.

Questão ambiental

Atualmente, a questão ambiental é um tema presente em todos osespaços. Na imprensa internacional e nacional registra-se catástrofesambientais. O ser humano redescobre a importância da saúde e,portanto, de um meio ambiente saudável. Rediscute-se a questão daalimentação, fazendo-se uma distinção entre comida e alimento. Tal-vez a maior e mais importante discussão seja a questão dostransgênicos ou alimentos geneticamente modificados de formamassiva. Um aspecto deve ser destacado. De maneira geral, os mo-vimentos ecologistas não defendem uma volta ao passado. Não se

1 Professor do Departamento de Educação da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

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posicionam contra o avanço da tecnologia. Pelo contrário, têm-se aciência como aliada para uma vida de qualidade.A agricultura exige um repensar na direção da sustentabilidade. Adiscussão sobre o meio ambiente ganha contornos nítidos não sóem relação à produção, mas também, na conservação e manejo domeio ambiente.O Brasil vive um momento especial. Após o processo deredemocratização, se alcançou no momento uma estabilidade eco-nômica que se deseja permanente. Mas as contradições sociais sãomuito fortes para serem ocultadas ou ignoradas. Amplia-se a consci-ência que a questão não se localiza somente no crescimento ou de-senvolvimento. Exige-se uma qualificação neste processo e que estetenha como princípio a inclusão social e o resgate da marginalidadede parte significativa da população brasileira. O desafio não é so-mente crescer, desenvolver, mas crescer incorporando e incluindopessoas, de forma que se tenha para a população, qualidade de vida.

Correções de estratégias e de conceitos

Este repensar sobre políticas públicas implica em estabelecer res-ponsabilidades que não podem e não devem se circunscrever apenasno âmbito do aparelho governamental seja federal, estadual ou mu-nicipal. O desafio é da sociedade e não apenas a brasileira, mas amundial. Exige-se redesenhar, inclusive, o papel do estado e dosorganismos internacionais neste processo, de forma que eles sejam,principalmente, formuladores de políticas participativas e com fortecaráter de inclusão. Sendo um desafio mundial, a sociedade devepressionar para mudanças urgentes nos organismos internacionais.O mundo mudou e são necessárias correções enérgicas, não apenasde estratégias, mas de conceitos.Na agricultura não poderia ser diferente. Depois de várias revo-luções no campo, a começar pela “intensificação dos sistemasrotacionais, com plantas forrageiras e pela fusão da atividade agrí-cola e pecuária” Ehlers (1999:139) no século XVIII. Segue-se as

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transformações com a introdução de uma série de conhecimen-tos científicos e principalmente no início do século XX com o usodo combustível fóssil. A agricultura vai se transformando no se-tor de fornecimento de matéria prima para a indústria,notadamente depois da segunda guerra mundial, com o que sedenominou chamar de revolução verde, que no Brasil se intensi-fica a partir de 1970.

Afastamento da natureza

Vários elementos podem ser elencados para uma análise. Destaque-se dois, para efeito de análise neste texto. O primeiro é o progressivoafastamento do homem da natureza neste processo. Surge uma novacrença. A certeza que a tecnologia resolve tudo. A segunda, a nega-ção dos conhecimentos tradicionais. De repente, descobre-se amodernidade e esta é entendida também como contrária aos conhe-cimentos tradicionais. O que é tradicional é atrasado, não é moder-no. Moderno é a competitividade, é o uso de alta tecnologia, é anegação de uma identidade e o assumir outra forma de vida. Dosoutros. É a importação de valores. É ser do “primeiro mundo”.É a agricultura de escala, de grandes produções. Para atender a lógi-ca da industria, necessita-se da especialização, perde-se a diversida-de, pela priorização de monocultivos. Ampliam-se a produção degrãos, não somente para alimentar a população, mas e principalmen-te, para alimentar os animais. As galinhas, os porcos, o gado passama serem confinados e se necessita de alimentos para estes. A agricul-tura se especializa e torna-se um setor totalmente dependente capi-tal financeiro e industrial.Em realidade este não é um processo iniciado recentemente, comoparece. Ele tem seus fundamentos, em 1535, quando Portugal deci-de colonizar o Brasil. Acrescente-se. Forçado por Holanda e Françaque contestavam o “direito divino” da posse destas terras. Quais osprincípios adotados então? A agricultura em grandes áreas (latifún-dio) e especialização (monoculturas). Surgem inicialmente os enge-

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nhos de açúcar e depois as usinas. Lançam-se as bases de uma agri-cultura industrial, onde inclusive se precisa importar a mão de obra(escravidão). Em 2004, percebem-se as mesmas bases, impera olatifúndio2, a monocultura e a exclusão. Mas surge uma novidade, abiotecnologia. Uma continuação da “revolução verde”. Que contri-bui para alimentar a ideologia de que a técnica encontra soluçãopara tudo. Mas na realidade não resolve a exclusão, a perda dabiodiversidade, a crise ecológica.Mas não foi uma caminhada tranqüila. Surge a resistência dos índios.As lutas dos negros. A insubordinação dos excluídos. Lutas e maislutas, contestando o “modelo” implantado e que as elites continuama reafirmá-lo. Pensam que é possível ajustar, conceder aqui e ali, queestá tudo bem. As lutas e a organização popular sinalizam o contrá-rio. Indica de forma clara a urgência por alterações. Há necessidadede mudanças de rumo e de modelo. Porque a crise chegou forte e oplaneta agoniza.

Crise de civilização

O progresso da humanidade se a princípio é lento, o mesmo seacelera a partir da segunda metade do século XX e em apenastrinta anos, se alcança uma crise de civilização, que se materializapor um desequilíbrio na natureza, perda de solos, contaminaçãode lençóis freáticos, perda da diversidade, perda de referenciaisteóricos. Enfim, uma crise de grandes proporções, por isso umacrise da civilização. Crise que se pode até ignorar a miséria, produ-zida pelo nosso modelo, mas não pode ignorar o perigo da conta-minação ambiental. Os ricos podem ignorar a miséria, mas nãopodem ignorar a contaminação. Porque queiram ou não, atinge a

2 Latifundio não significa apenas concentração de terras. Significa acumulação, violencia,desrespeito e manutenção de privilegios. Shiva procura mostrar, analisando o sistema desaber enquanto sistema de poder, ”que as monoculturas ocupam primeiro a mente edepois são transferidas para o solo. As monoculturas mentais geram modelos de produçãoque destroem a diversidade e legitimam a destruição como progresso, crescimento emelhoria.” (Shiva, 2003:17).

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todos. (Beck 1998). Isto em apenas trinta anos. É a velocidade datecnologia intensificando processos, derrubando conceitos, esta-belecendo novos paradigmas.

Novos conceitos ou novos discursos

Surgem novos conceitos. Desenvolvimento sustentável.Ecodesenvolvimento. Agroecologia. Desenvolvimento local. Mas atéque ponto estes são novos conceitos? Até que ponto estes não sãoapenas novas expressões de velhas situações ou de velhos desejos?Será que efetivamente se buscam mudanças? Até que ponto quere-mos enfrentar os privilégios? Estamos mesmos preparados e nos pro-pomos a enfrentar e construir um processo novo? Estamos compro-metidos com outro desenvolvimento?3

Para continuar esta reflexão, considere-se que sim. Queremos avan-çar. Queremos um desenvolvimento que seja duradouro e includente.Queremos que os netos de nossos netos tenham um planeta ondepossam viver.Quais seriam nossos caminhos? Que estratégias deveriam ser percorri-das? Que princípios norteariam esta construção? Existem muitos estu-dos, muitas pesquisas, muitas avaliações e indicações sobre estas ques-tões. Também existem poucas coincidências sobre estas respostas.Vamos agrupar em duas grandes linhas. Uma, considerando umareaproximação do homem com a natureza. Outra mantém o domíniodo homem sobre a natureza, ou seja, sua separação. Neste segundo

3 Alonso Mielgo e Sevilla Guzmán (1995), discutem esta questão na perspectiva doentendimento da crise ecológica na perspectiva dos organismos internacionais. Afirmamque a construção teórica ecotecnocrata transmite uma mensagem que o planeta estáem perigo, não porque os paises ricos e industriais desenvolveram uma forma deprodução e de consumo com alto desperdício de energia e recursos, contaminante edestruidora dos equilíbrios naturais. Mas, porque, os paises pobres tem um grandecrescimento populacional e por isso destrói florestas, destroem o meio ambiente, tocamfogo etc. Na realidade estes organismos internacionais, com um falso discursoecotecnocrático, defendem um falso ecologismo em um também falso desenvolvimentosustentável por eles propugnado. Os diagnósticos são distorcidos e as soluções sãoindicadores de boas intenções sem nenhum comprometimento com sua execução eimplementação.

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caso, a natureza é para ser explorada e conquistada totalmente e paraisso se exige mais pesquisa, mais tecnologia e conquistas, inclusive denovos mundos. Continua a exclusão de homens, de animais, da natu-reza. Creio que não há necessidade de avançar muito nesta direção. Asituação do mundo hoje, já revela a impropriedade de seguir trilhandoeste caminho. As pequenas correções de rumos já revelaram que sãoinconsistentes. Aumenta a concentração de renda e de poder. Aumen-ta as catástrofes naturais, sociais e políticas. Porém, são muitos os queacreditam que a tecnologia vai trazer as soluções que se precisa. Queela é capaz de recuperar determinadas situações. Isto só revela umacosmovisão, onde a técnica é o centro do processo civilizatório e atecnologia, sua manifestação e expressão ideológica.

Mudando o rumo

Vamos mudar o ruma desta prosa. Vamos tentar trabalhar em outradireção. No encontro do homem com a natureza. Vamos buscaruma cosmovisão onde o ser, se materializa no concreto e no simbó-lico. Aliás, aquilo que chamamos de concreto é fruto de nossa per-cepção, do nosso simbólico, do nosso imaginário. (Castoriades,1982)Mas é pensar no homem nas suas múltiplas dimensões, inclusive aespiritual, que necessariamente não significa religiosidade. É traba-lhar na complexidade dos elementos que compõe a vida. Nos pro-cessos auto-organizativos e complexos através da neguentropia.(Morin, 1997). Nas cadeias tróficas. Na diversidade e complemen-tariedade. Em uma nova racionalidade ambiental. (Leff,2002).Na recuperação dos conhecimentos tradicionais. Na etnoecologiacomo expressão de uma compressão do tradicional, para avançar naconstrução de um novo, comprometido com suas raízes. (Toledo,2002). Pela co-evolução dos conhecimentos, valores, organizaçõessociais, tecnologia e sistemas biológicos (Norgaard,1989). Noentendimento de uma racionalidade camponesa ou indígena, onde areprodução de sua família é o centro de suas estratégias.(Chayanov,1974), (Shanin, 2001)

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Vamos pensar na agroecologia, como expressão de um método e deuma nova área de conhecimento, que busca uma agricultura ecoló-gica (Altieri, 2001), (Gliessman, 2002) e um desenvolvimento sus-tentável (Sevilla Guzmán e Woodgate, 2002). Ë pensar no desenvol-vimento e em uma agricultura sustentável como um processo detransição, construído social e participativamente, tendo como baseteórica, a agroecologia. (Caporal e Costabeber, 2004). Partindo dosagroecosistemas, como unidade/totalidade de análises e de inter-venções. De forma peculiar, diferente, própria. Trabalhando com asdiversas dimensões e campos das ciências. Avançando e construindoum conhecimento especifico, próprio, onde não há fórmulas pré-estabelecidas. Aceitam-se princípios e metodologias. Como cami-nhos de uma construção.

Alguns princípios

Alguns princípios poderiam ser listados para esta proposta de de-senvolvimento sustentável. A valorização do conhecimento endógenoe das potencialidades locais; o desenvolvimento local sustentável; aparticipação da família do agricultor em todas as fases e etapas doprojeto; considerar os aspectos de gênero, etnia, raça e geração; ocaráter inter e multidisciplinar da intervenção do início até o fim.Ecossistemas como unidade de análise e intervenção. O diálogo desaberes. Shiva (2003:15) recomenda que “adotar a diversidade comoforma de pensar, como um contexto de ação, permite o surgimentode muitas opções.”

Um desenvolvimento diferente?

Esta construção parece indicar a necessidade de considerar comoelemento determinante o meio ambiente. Discutir propostas de de-senvolvimento implica considerar os diferentes meios ambientes.Resulta, portanto, discutir diferentes desenvolvimentos. Nesta linha,a Amazônia é um grande desafio e uma grande oportunidade. Têm-

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se a floresta e a exigência de sua continuidade, para manter as pos-sibilidades de configurar um desenvolvimento. Oportunidade peloseu caráter único da maior floresta tropical do mundo. Em sendoassim, configura-se uma extraordinária diversidade. Diversidade ve-getal e humana. Ao mesmo tempo, em que se constitui umecossistema também singular. Região onde se concentra maior po-pulação indígena do país. O que sinaliza para aa existência de umconhecimento tradicional da floresta. Schröder (2003:42) defende“que os indígenas manipulam ativa e conscientemente o meio ambi-ente” e cita como exemplo desta complexa manipulação as “ilhas derecursos”4 dos Kayapó-Gorotire. Região, afortunadamente poucodesenvolvida. Mas com grande potencial para um desenvolvimentodiferenciado. Nesta direção é fundamental entender, compreender,analisar a “modernidade” e a crise de civilização provocada por estetipo de desenvolvimento. A crise do mundo é uma crise do capital.Cabe, neste ponto, alguns questionamentos, por que repetir o mes-mo estilo e modelo de desenvolvimento de outras regiões? Por que ocaminho é a industrialização, a devastação, o desrespeito ao meioambiente, a concentração e a exclusão? Quais são os elementosdiferenciadores que indicam possibilidades de avanços? Será que háalguma dúvida que adotando o modelo clássico de desenvolvimento,na realidade se está contribuindo para agravar a atual crise mundial?

Ambiente inadequado?

São muitas as perguntas. Porém existem umas poucas certezas. Nocaminho já iniciado de uma agricultura dita “moderna” altamentedependente de capitais externos a propriedade. O resultado a médio

4 Estes indígenas seminômades criaram dentro de suas migrações sazonais áreas produtivas,chamadas de apêtê , em analises de Andersen &Posey (1989) em uma destas ïlhas”foramidentificadas 120 especiés, com 98% delas de utilidade para os Kayapó, como (72%)planats medicinais, para atrair caças 940%), alimentícias (25%), lenhosas (12%), paraadubar (8%), para oferecer sombra a outras plantas (3%) e para outras utilidades (30%).&0% destas plantas seriam plantadas e manejadas. (Schröder:2003:43). Pode-se indicarcomo analogía hohe, os SAF’s.

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e longo prazo é a destruição da floresta e de sua biodiversidade,para implantação da monocultura. Nesta perspectiva deste desen-volvimento, pode-se entender a tese de Meggers (1954) que a flo-resta tropical é um ambiente inadequado ao sustento de sociedadesmais complexas. Pode ter razão, principalmente, se esta sociedadenão considera as peculiaridades locais do meio ambiente. Negandoesta tese está a existência de aproximadamente dois milhões de indí-genas, no século XVI, vivendo, produzindo, exportando,comercializando produtos e interagindo com a floresta de forma ati-va e conseqüente, na maioria das vezes. O desequilíbrio ocorre, coma chegada dos “civilizados”, atrás de ouro e pedras preciosas, dizi-mando, o meio ambiente. Homens, mulheres, animais, floresta sãoreduzidos à mercadoria e ocidentalizados, na perspectiva do capitale da cultura dos europeus. É este o desenvolvimento que se temcomo referência?A Amazônia, no mundo, é sinônima de meio ambiente. Turistas depaises que destruíram suas florestas vêm conhecer as nossas. Expe-dições de pesquisadores, oficiais ou não, adentram na floresta nabusca de suas preciosidades. Hoje, não somente minérios, ouros,mas também da biodiversidade. A exportação de peixes ornamen-tais, pássaros, animais e tantas outras coisas é uma constante. Legal-mente ou não. Madeira de lei que revestiram palácios, no passado,no presente continuam sendo contrabandeadas para decorar casasde outras pessoas fora da região. Reconheça-se, “eles” conhecem aAmazônia, bem mais que nós. E aí, surge um enorme desafio: anecessidade de se conhecer e conhecer bem este magníficoecossistema. Conhecer não apenas para identificar onde existem mi-nas de metais preciosos. Mas, conhecer sua fisiologia, sua cultura,seu manejo. É imprescindível uma aproximação com o conhecimen-to tradicional. É fundamental o estabelecimento de um diálogo desaberes. Sem preconceitos. Com respeito às diferenças e às distintascosmovisões. Com o intuito de construir um conhecimento coletivoa partir das experiências e das vivências locais. Que, diga-se de pas-sagem, não são poucas. Existem SAF’s, as experiências com

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Permacultura. Os consórcios vegetais. Manejo da floresta com pou-co impacto ambiental. Uso medicinal e extrativista. Experiências depesca e de manejo de pescado. Conhecimentos, vários, que funda-mentam um desenvolvimento diferenciado.

Turismo e biodiversidade

Um projeto de desenvolvimento diferente, onde políticas públicas se-jam formuladas para estrategicamente fortalecer duas direções. Uma,o turismo e outra, a biodiversidade. Estas dimensões têm inúmerosdesdobramentos. Um turismo que não seja simplesmente a oferta debons hotéis com programas de incursões ecológicas. Mas um turismoque alie, hotéis, incursões ecológicas, com apresentação de distintasmanifestações culturais e serviços, seja através da dança, do artesana-to, da comida, da biodiversidade. Vale salientar que não é de hoje quea cultura na Amazônia desperta admiração. Carvajal (1941:47), assimrelata sua impressão sobre a cerâmica. “... a melhor que já se viu nomundo, porque a ela nem a de Málaga se iguala. É toda vidrada eesmaltada de todas as cores, tão vivas que espantam e, além disso, osdesenhos e pinturas que fazem nela são tão compassados que comnaturalidade eles trabalham tudo em romano.”Quando se fala da biodiversidade, têm-se visões múltiplas de suaspossibilidades. Captação de carbono. Indústria farmacêutica. Indús-tria de cosméticos. Patenteamento de espécies raras e exóticas.Extrativismo. O pescado e sua indústria. Doces e sucos. Orquídeas.Animais e plantas que não conhecemos e que não existem em outraparte do mundo. Uma diversidade de opções. Porém, estas alterna-tivas exigem uma floresta.Mas, possibilidades diferentes do modelo convencional. Por isso, comamplas perspectivas de fundamentar um desenvolvimento efetivamen-te sustentável cujo resultado, seja a inclusão social e o envolvimentoativo da população no manejo adequado de seus ecossistemas.Qual a novidade destas propostas? Por que não existem políticaspúblicas nesta direção? A população quer um desenvolvimento nes-

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ta direção? Esta proposta é absurda? Inconseqüente? Quantos já fi-zeram, com mais competência e mais detalhes propostas nesta dire-ção e não foram sequer escutados? Estas propostas são contra umprojeto de desenvolvimento? Estas propostas significam uma voltaao passado e voltar a viver em malocas e não ter acesso à tecnologiae às inovações?

Necessidade de conhecimentos

Claro que não. Esta é efetivamente uma proposta de desenvolvimen-to. Aonde se necessita cada vez mais de tecnologia. Exigem-se maisconhecimentos. Alias, este é um fator de desenvolvimento e comamplas perspectivas de exportação. Conhecimento do manejo ade-quado e apropriado da floresta amazônica. Esta proposta traz em siuma necessidade de avanço cientifico, porém a partir de outrosparadigmas. Morin (1991:17) diz que “todo conhecimento, incluin-do o conhecimento cientifico, está enraizado, está inscrito em e édependente de um contexto cultural, social, histórico. Porém o pro-blema consiste em saber quais são estas inscrições, enraizamentos,dependências e perguntar-se se pode haver, e em que condições,uma certa autonomia e uma relativa emancipação do conhecimentoe da vida”. Qual o conhecimento amazônico? Qual o conhecimentoque reflete e responde ao contexto cultural, social, histórico e natu-ral da Amazônia? Este conhecimento poderá apontar para um de-senvolvimento sustentável. Mas, com certeza o conhecimento pro-duzido em outro contexto cultural, social, histórico e natural seimplementado na Amazônia poderá concorrer para uma catástrofe enão para um desenvolvimento.

Para concluir

O mundo muda a cada instante porque é formado por entes vivos.Assim, na dinâmica do processo não se pode analisar em uma pers-pectiva estática. As mudanças acontecem seguidamente. Algumas para

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melhor e outras para pior. Por se pensar que o mundo é uma matériaprima para o capital, chega-se a esta situação de esgotamento. Há umenfraquecimento e um estado débil de vida, com um aumento cadavez maior e mais presente de mortes. Esta separação do homem danatureza nos leva a uma crise de civilização. Configura-se depois demuitos anos nesta caminhada a constatação que muitas estratégiasforam equivocadas. Talvez a maior delas, foi a opção por acumularriquezas e a estratégia antropocêntrica de dominação da natureza.Schumacher, (1981) alerta que é um equivoco pensar que está re-solvido a questão da produção e destaca a batalha do homem contraa natureza. Registra-se, porém, que não há crise para o capital. Esteestá cada vez mais bem remunerado, cada vez mais concentrado,cada vez mais excludente. E, as pessoas na Universidade, nos órgãosde desenvolvimento, nas agências de cooperação técnica têm umaenorme responsabilidade. Precisa-se assumir uma postura favorávelna direção de contribuir para efetivas mudanças. Precisa-se repensara maneira de agir em casa, no trabalho, nas relações pessoais e pro-fissionais. Precisa-se olhar a volta e analisar efetivamente que mundose quer construir. Analisar e aprofundar os conhecimentos sobre aproposta agroecológica e criticando-a, reconstruindo-a, reelaborando-a, identificando-a se pode ser uma ferramenta, uma metodologia euma epistemologia. Que permita subsidiar e fundamentar o cami-nhar para mudança de paradigmas e de reafirmação de sonhos, queimplantados, leve a construção de outro modelo de sociedade. Quepode ser em uma comunidade, em um grupo, ou individualmente.Marx-Neef (1994:147) diz que “só temos o poder de modificar anós mesmos, porém o ponto fascinante é que se eu mudo, podeocorrer algo em conseqüência que pode conduzir a uma mudançano mundo”. Pode ser pequeno, simples. Mas, que seja na direçãocontrária aos caminhos que levaram a esta crise. Que seja contrária àacumulação, à monocultura, ao enfrentamento, à competição, àpretensa dominação da natureza e à exclusão social. Seja dereafirmação da cooperação, da diversidade, da distribuição e a acu-mulação comunitária, da inclusão. Seja nos integrando com a natu-

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reza, cooperando, aprendendo, observando, entendendo o mistériode sua reprodução em sua complexa auto-organização, promoven-do radicalmente a vida. Novamente, reafirma-se, necessita-se damanutenção dos ecossistemas. Necessita-se da floresta, até porquefloresta, em última instância significa vida. Inclusive e principalmentepara os que vivem fora dela. Retomando a Schumacher(1981:12)que lembra que a batalha do homem contra a natureza se vencidapelo primeiro, significa simplesmente a ameaça de “continuidade daexistência do gênero humano”, pelo menos neste planeta.

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Da contradição do sujeitona extensão rural

Ladjane de Fátima Ramos1

“tu és a floresta das contradições”Rainer Maria Rilke

Ao ser solicitada para discorrer sobre construtivismo e o enfoque daparticipação no meio rural, para extensionistas, deparei-me com o desa-fio, por um lado, dialetizar diferentes conceitos da teoria da aprendiza-gem, harmonizando técnicas e instrumentos, participação, desenvolvi-mento, dentre outros aspectos sobre o tema. Por outro lado, dissertarna condição de estrangeira, uma vez que não sou profissional das ciên-cias agrárias e nosso campo de conhecimento nem sempre se equivale.Por esta razão tomei o caminho de, principalmente, levar reflexões einquietações, que me dominam, ao invés de discursar sobre teorias econceitos, apontando assim a interrogação acerca do papel de“extensionista” e de sua missão frente à realidade da qual faz parte e temuma ação de influência. Como ensina Paulo Freire... deste ser que “comoeducador, se recusa a “domesticação” dos homens, cuja sua tarefacorresponde ao conceito de comunicação, não ao de extensão” 2.Neste sentido, assistimos no decorrer da história da extensão rural emais fortemente na atualidade a reedição da dicotomia presente nanomeação deste individuo que ao ser denominado de extensionistadeve ter sua prática pautada em processos comunicacionais, emborasua formação não responda a esta exigência. Isto não significa negar

1 Perita da Agência de Cooperação Técnica Alemã (GTZ) no Projeto de DesenvolvimentoLocal Sustentável –AM, email: [email protected]

2 Paulo Freire, extensão ou comunicação?, pág. 24. 12a. edição, Ed. Paz e Terra, 2002,São Paulo.

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a este profissional um saber que produz a liberdade de si, a suainteração e a dos agricultores familiares. Ao longo de décadas assis-timos focos de reações à prática demandada pela revolução verde,por parte de muitos desses técnicos que buscavam muito mais umapostura de educador-educando, do que mesmo uma atitude de al-guém que estende seus conhecimentos a um outro.No entanto isto não foi hegemônico, na verdade constituia-se maisem focos de resistência de alguns sujeitos sociais e, principalmente,das organizações da sociedade civil, dos movimentos de igreja, degrupos de extensionista das empresas estatais e de agricultores quefaziam frente a ação desenvolvimentista das políticas agrárias e àformação universitária dos profissionais da área.Resistência à falsa nomeação “extensionista” que o colocava e ainda põeem evidência o dilema que vai incidir principalmente sobre sua forma derelação com os agricultores/as, ou seja: ser educador ou transmissor deconhecimento?; apoiar a apropriação de processo de transformações oulevar pacotes tecnológicos?. O que é exigido ou demandado? Que pos-tura tomar? Tratamos aqui de mudanças, de modificar a forma de atua-ção, mas principalmente de alterar as crenças, valores e conceitos queaté então eram tidos como válidos. Mas, como fazer este processo demudança? O que pode impulsionar a reflexão?O novo papel do extensionista está contido no Plano de Desenvolvi-mento Sustentável do Brasil, que assim define “Ater deve ser instru-mento capaz de contribuir decisivamente para: (a) colocar o agricul-tor familiar e todos os atores envolvidos na condição de sujeito doprocesso; (b) promover a organização dos agricultores familiares emformas associativas e cooperativas; (c) reduzir a dispersão social; e(d) estimular o exercício da prática solidária como argamassa de umanova consciência coletiva”3

Neste aspecto o caminho apontado pelo discurso da política brasileira, éo da participação, deslocando os atores sociais envolvidos no desenvol-vimento sustentável do lugar de “objeto” ao de “sujeito” do processo.

3 Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável do Brasil Rural – PNDRS, p. 41.

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Se por um lado esta participação não pode ser considerada “a caixade pandora” da assistência técnica e extensão rural, onde estão de-positadas as soluções e tudo se transformará, por outro lado, enten-de-se que atuar com um enfoque participativo significa recolocar ohomem no centro do processo, e aqui falamos tanto do extensionistacomo do agricultor, da agricultora, do consumidor, da consumidorae de todos aqueles que integram este universo.O enfoque participativo, aqui é entendido como a possibilidade deresgatar a cidadania e presentificar a ação política, social, econômi-ca, cultural dos diferentes atores, construindo e reeditando novoslaços e pactos sociais de solidariedade e de contribuição voluntária,permitindo o crescimento do espírito cooperativo sem que isto sig-nifique o desaparecimento da individualidade, mas também propor-cionando uma (re)leitura do coletivo.O privilégio da participação e de processo dialético permitiria a cria-ção de espaço de esperança na construção de novos arranjos derelações sociais. É principalmente o privilégio do ser humano sobre atecnologia. Assim seria possível que “algo mais” se construa e con-seqüentemente, que o sujeito social se presentifique, ampliando as-sim a governabilidade sobre “as coisas” públicas.A resignificação do rural impõe revisões teóricas e mudanças dosprofissionais e das organizações que atuam neste meio. Cabe, por-tanto, entender que o enfoque de atuação humanista necessita mui-to mais de uma conduta mediadora de diferentes saberes do queuma atitude de persuasão junto aos agricultores. Conduta mediado-ra significa permitir que os agricultores familiares possam, através deprocessos comunicacionais, ampliar sua capacidade de análise e de-cisão. E aqui se coloca algumas interrogações: como se reconhece edialetiza o saber e como se legitima a posição de sujeito? E especial-mente como alimentar, na mente humana, a idéia de viabilidade deum projeto de mundo com mais eqüidade e participação?.Como afirmamos anteriormente, os processos comunicacionais per-mite, através da dialética, que técnicos e agricultores possam interagire encontrar signos comuns, como também ampliar a compreensão

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sobre crenças, valores, atitudes, conhecimentos e comportamento.Isso implica numa compreensão do contexto desses dois mundosque interagem. No entanto há dissonâncias e/ou contradições, poisos processos de comunicação humana estão condicionados aos as-pectos socioculturais e a forma como cada um deu sentido a suahistória. O processo dialógico, através da problematizacão da reali-dade e da ação-reflexão é o caminho encontrado pelas técnicas emétodos que priorizam a participação.Esse conceito significa, dentre outras definições, correr o risco deexperimentar novas formas de relação e soluções criativas, para ve-lhos problemas sociais, econômicos, ambientais e culturais. É a opor-tunidade de reescrever a história. Este desafio é colocado pela Polí-tica Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER) quede uma forma muito audaciosa, tenta reescrever a Agroecologia comoimpulsionadora de mudanças nas relações sociais, políticas, cultu-rais, econômicas e ética na sociedade, com a agricultura sustentávelou mais diretamente, no contexto do desenvolvimento sustentável.O avanço da humanidade se escreve nos desafios, nas idéias de li-berdade e igualdade, na luta, assumindo-se riscos. É assim que ossujeitos mudam sua realidade e influenciam o entorno. Este é o de-safio para os agentes da extensão: decidir ousar e reinventar as rela-ções sociais no Brasil.Mas até que ponto os técnicos ou agentes de Ater estão optando poristo? Quantos podem ser capazes de sair de seu espaço de confortorelativo e se responsabilizarem pelo fato de que podem fazer a histó-ria? Estas são interrogações que escutamos no discurso, constante-mente. Quais são os limites? Pois estamos falando aqui de se fazerpresente no mundo, e isto implica em adotar-se uma postura ética ereflexiva que vai ao encontro da democracia e ao respeito pelo outro.Também significa se colocar enquanto sujeito, e não enquanto objetodas políticas e das relações institucionais nos quais estão inseridos.Não podemos deixar de considerando que processos de mudançassó ocorrem por um desconforto que mobiliza a energia para a buscade alternativa, de um fazer diferente e daí para a tomada de decisão

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e, conseqüentemente para uma nova situação de conforto e domí-nio. A nossa presença no mundo implica escolha e decisão.Como afirma Paulo Freire (...)

“se alguém me pergunta... se acho que, paramudar o Brasil, basta que nos entreguemos aocansaço de constantemente afirmar que mudar épossível e que os seres humanos não são purosespectadores, mas atores também da história, direique não. Mas direi também que mudar implicasaber que fazê-lo é possível”(...)

É a partir da consciência de que mudar é difícil, mas não impossível,que se constroem a democracia e o ato de liberdade, ou como afirmaPaulo Freire é parte de “...nossa ação política-pedagógica”. Assim aPNATER aponta para o caminho da democratização e liberdade dosatores, a crença de que é possível mudar e, especificamente, nestecaminho, é preciso inventar e praticar novos saberes.A mudança não tem sentido em si mesma. A configuração de um pro-cesso de mudança precisa sempre de situações específicas. Ela implicanecessariamente a focalização de um objetivo, a saída de uma situação aoutra. Neste caso a PNATER aponta este foco de mudança, ou seja, abusca de um modelo de desenvolvimento mais sustentável, onde aAgroecologia aparece como a orientação para a dialetização dos atores.Neste contexto as instituições estatais ou não governamentais têmum papel importante para a concretização destas mudanças. Impor-tante ressaltar que não existem fórmulas, mas como abordamos an-teriormente, há diferentes possibilidades que devem ser pautada pelacapacidade criativa e por soluções locais, priorizando e construindoformas de atuação que considerem a participação e saberes dosmembros das organizações de Ater, dos agricultores familiares edemais atores sociais que integram este sistema de relações ligadasao desenvolvimento do meio rural.Os processo de mudanças impulsionam para a aprendizagem coleti-va e individual e, claro, para processo de aprendizagem organizacional,implicando em novos modelos de relação e numa ação libertadora.

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Sendo assim, estes processos são impulsionados por sonhos, quesão projetos pelos quais se lutam, a luta de um e a luta de muitos,sejam seres engajados em organizações, sejam coletivos ou individu-almente. A busca de realização de desafios implica avanços, recuos,resistência, medos, mas principalmente a tomada de consciência quemudar é possível, que se pode reescrever a história e a relação hu-mana no mundo rural e deste com o urbano, construindo assim odesenvolvimento sustentável. Como afirma Freire: “ O que o sonhoaspira é um ato político”.E em meio a tudo isto, temos um sujeito que tem que se presentificarcom todas as suas contradições de estar em um mundo globalizadoe que deve ir em busca de seus sonhos e lutas. Se resignificando ereinventando enquanto sujeito emergente, político, coletivo. Crian-do novas formas de vida e buscando acima de tudo uma relação maissolidária com os seus. Seja estes sujeitos, técnicos, agricultores ouconsumidores. Este é o maior desafio que nos coloca a PNATER,transformar o modo de relações sociais em busca de uma melhorforma de viver, e para dizer mais claramente, um modo de ser maisfeliz, dentro do limite possível da felicidade e da realidade.

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