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  1 EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E INCLUSÃO SOCIAL: a experiência de intervivência entre a academia e os assentamentos de Reforma Agrária em região do Submédio São Francisco UNIVASF   Universidade Federal do Vale do São Francisco Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira Praça da República, 33    Bairro Dom Tomaz   CEP 48.907-180 Juazeiro   Bahia/ Telefones: (74) 3611-2687/ 9979-8406 E-mail: [email protected]/  [email protected]  Instituto Federal de Educação Tecnológica do Sertão de Pernambuco Luciana Souza de Oliveira Quadra E, 23   Bairro Tancredo Neves CEP 48900-000   Juazeiro-Bahia E-mail: [email protected] Telefone: (74) 9979-7071 UNEB   Universidade do Estado da Bahia Júlio Jose Torres da Silva Avenida Dr. Edgard Chastinet, S/N CEP 48900-000 Juazeiro-Bahia E-mail:[email protected] Telefone: (87) 3862-1211/9998-2 939 Responsáve l pela correspondên cia: Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oli veira

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EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E INCLUSÃO SOCIAL: a experiência de

intervivência entre a academia e os assentamentos de Reforma Agrária em região

do Submédio São Francisco

UNIVASF –  Universidade Federal do Vale do São Francisco

Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira

Praça da República, 33 –  Bairro Dom Tomaz –  CEP 48.907-180

Juazeiro –  Bahia/ Telefones: (74) 3611-2687/ 9979-8406

E-mail: [email protected][email protected]  

Instituto Federal de Educação Tecnológica do Sertão de Pernambuco

Luciana Souza de Oliveira

Quadra E, 23 –  Bairro Tancredo Neves

CEP 48900-000 –  Juazeiro-Bahia

E-mail: [email protected] 

Telefone: (74) 9979-7071

UNEB –  Universidade do Estado da Bahia

Júlio Jose Torres da Silva

Avenida Dr. Edgard Chastinet, S/N

CEP 48900-000 Juazeiro-Bahia

E-mail:[email protected]

Telefone: (87) 3862-1211/9998-2939

Responsável pela correspondência: Lucia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira

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RESUMO

Essa experiência foi vivenciada na região do submédio São Francisco, nos municípios

de Juazeiro, Casa Nova e Sobradinho no Estado da Bahia; e Petrolina no Estado de

Pernambuco, no período de 2008 a 2011, com o objetivo de formar jovens agricultores

das áreas de Reforma Agrária para atuarem como Agentes de Desenvolvimento

Sustentável em suas comunidades. A intervivência dos selecionados com os alunos da

UNIVASF, do IF Sertão de Pernambuco e da UNEB deu-se através do Núcleo

Temático “Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável”, com funcionamento de

oito horas semanais aos sábados, para possibilitar sua participação sem prejuízos de

outras atividades educacionais e de trabalho. A formação foi teórico-prática e as

oficinas foram realizadas nos assentamentos e nos campos experimentais do IF Sertão.

A base humanística teve como pressupostos a antropologia, a sociologia, a política, a

cultura e a organização coletiva, fundamentos necessários para a compreensão da

sociedade. As tecnologias de convivência com o semiárido apoiaram as atividades

 produtivas para a geração de trabalho e renda.

Palavras Chave:Agentes de Desenvolvimento Sustentável-Meio Ambiente –  Formação

ABSTRACT

This practice has been deeply experienced in the region of sub-medium São Francisco

River, in the municipalities of Juazeiro, Casa Nova and Sobradinho, in the State of

Bahia, and the municipality of Petrolina, in the State of Pernambuco, in the period of

2008 thru 2011, with the goal of training young farmers in the areas of Agrarian Reform

so that they may become active Agents of Sustainable Development amongst their own

communities. The interleaving of selected students from the UNIVASF, the IF Sertão of

Pernambuco and the UNEB is processed through the Thematic Nucleus "Environment

and Sustainable Development", in operation eight hours per week on Saturdays, in order

to enable their participation without prejudice to other educational and labor activities.

The training has been theoretic-practical and the workshops have been conducted in the

settlements and in the experimental fields of IF Sertão. The humanistic basis has been

 built upon the assumption that anthropology, sociology, politics, culture and collective

organization, are grounds necessary to understand the society. The technologies of

coexistence with the semiarid have supported the productive activities in order to

generate jobs and income.

Keywords: Agents of Sustainable Development - Environment - Training 

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RESUMEN

Esa experiencia ha sido experimentada en la región del sub-medio del río São Francisco,

en las municipalidades de Juazeiro, Casa Nova y Sobradinho, en el Estado de Bahía; y

en la municipalidad de Petrolina, en el Estado de Pernambuco, durante el período del

2008 al 2011, con la finalidad de formar jóvenes agricultores en las áreas de la Reforma

Agraria para actuaren como Agentes del Desarrollo Sustentable en sus comunidades. La

intervivencia de los seleccionados con los alumnos de la UNIVASF, del IF Sertão de

Pernambuco y de la UNEB se ha procesado a través del  Núcleo Temático “Medio

Ambiente y Desarrollo Sustentable”, con funcionamiento de ocho horas semanales en

los sábados, para posibilitar su participación sin perjuicios de otras actividades

educacionales y de trabajo. La formación ha sido teórico-práctica y los talleres han sido

realizados en los asentamientos y en los campos experimentales del IF Sertão. La base

humanística ha tenido como presupuestos la antropología, la sociología, la política, la

cultura y la organización colectiva, fundamentos necesarios para la comprensión de la

sociedad. Las tecnologías de convivencia con el semiárido apoyaran las actividades

 productivas para la generación de trabajo e renta.

Palabras Clave: Agentes del Desarrollo Sustentable - Medio Ambiente –  Formación. 

RETOMANDO A HISTÓRIA

A universidade brasileira está tradicionalmente vinculada com a concepção de

transmissora de conhecimentos, local de saber porque, foi sob sua marca que a

instituição de ensino superior se consolidou, caracterizando-se por muitos anos pelo uso

exclusivo desta função (SILVA,2000:13). Desde 1937, com a criação da União

 Nacional dos Estudantes -UNE, até o Golpe Militar de 1964 que destroçou as liberdades

democráticas e os movimentos sociais organizados, as novidades no diálogo entre a

academia e a população estiveram sempre ligadas ao Movimento Estudantil que atuou

na popularização e democratização da universidade, difundindo a cultura científica

 para o povo e preocupando-se com os problemas sociais. (GURGEL,1986:38).

A Constituição de 1988 definiu a universidade pela indissociabilidade entre ensino,

 pesquisa e extensão explicitada no seu Art. 207, mas a concepção original ainda

 permanece: o tripé ensino, pesquisa e extensão é sustentado principalmente pelo ensino.

Da mesma forma, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que entrou em

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vigor em 1996 trouxe como finalidade da educação superior a promoção da extensão

aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios da

criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.

Lamentavelmente, a despeito do suporte legal atribuído pela Constituição e pela LDB, a

desarticulação deste tripé de sustentação universitária permanece e tem desencadeado

uma série de problemas porque, centrando suas atividades apenas no ensino, a

universidade não cumpre o seu papel de instituição formadora, desvinculando- se de seu

compromisso com a produção do saber científico e se tornando alheia às questões da

sociedade onde está inserida. Pelo contrário, quando a sociedade se torna objeto das

suas pesquisas, surgem soluções e alternativas para problemas diagnosticados neste

 processo e a universidade ainda se beneficia com o prestígio e o cumprimento em

excelência do seu papel.

As atividades de extensão, portanto, quando realizadas com a devida seriedade e

qualidade associadas ao ensino e a pesquisa são uma ferramenta importante para o

desenvolvimento social. Como afirma Botomé (1996) “o significado de extensão

envolve a questão do acesso da população ao conhecimento que a universidade produz

e domina através do ensino e da pesquisa”,  sendo sua razão de ser a efetiva

contribuição para melhorar as relações das pessoas com sua realidade, as situações comque se defrontam, elevando suas qualidades de vida. A relação com a pesquisa ocorre

no momento em que a produção do conhecimento é capaz de contribuir para a melhoria

das condições de vida da população. É ela, portanto, que viabiliza a interação entre a

universidade e a sociedade, constituindo-se em elemento capaz de operacionalizar a

relação teoria/prática e promovendo a troca entre os saberes acadêmico e popular.

A ação extensionista, interdisciplinar por natureza, ao abordar a realidade em sua

 plenitude, promove a produção do conhecimento de forma integrada. Desse modo, a

extensão não pode ser vista fora do processo acadêmico, divorciada da pesquisa e do

ensino e deve dirigir seus interesses para as grandes questões sociais do país e àquelas

demandadas pelas comunidades regionais e locais. Essa compreensão é importante para

a sua valorização. Outras ações relevantes podem e devem ser exercitadas na academia,

sem serem enquadradas como extensionistas. No âmbito da Extensão é fundamental que

se possibilite ao estudante a vivência de experiências significativas que lhe dêem 

condições de refletir sobre as grandes questões da atualidade e, a partir da experiência e

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dos conhecimentos produzidos e acumulados, construir uma formação compromissada

com as necessidades nacionais, regionais e locais, considerando a realidade brasileira.

Tal pressuposto apóia-se em Freire (2002:22), que questiona o ensino bancário,

“ para o qual a educação é o ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e

conhecimentos” passiva, acrítica, na qual o educador é o detentor do conhecimento; o

que disciplina; o que deposita nos educandos, conteúdos prontos e imutáveis; que não

contribui para o resgate da consciência e compreensão do mundo e não considera o

educando como sujeito de sua educação, apontando para uma ação problematizadora;

libertadora; dialógica; mediatizada pelo mundo; por uma realidade em transformação;

na qual o educador não é mais o que educa, mas aquele que aprende com o educando ao

educar, ambos sujeitos do processo de aprendizagem.

O autor fala da importância do conhecimento do entorno ecológico, social e

econômico em que se vive e se trabalha como educador, onde o saber teórico se junta ao

saber prático da realidade concreta em que os aprendentes convivem, podendo assim

repensar os problemas de moradia, transporte, saúde, alimentação, lazer e o meio social

que envolve a todos. “Constatando, nos tornamos capazes de intervir na realidade,

tarefa incomparavelmente mais complexa e geradora de novos saberes do que

 simplesmente a de nos adaptar a ela.”(FREIRE:2002:18). A vida e a sociedade não são

realidades diferentes e distantes, estão inseridas no mesmo contexto.

A UNIVASF  –   Universidade Federal do Vale do São Francisco, com séde na

cidade de Petrolina  –   Pernambuco e campus nas cidades de Juazeiro e Senhor do

Bonfim na Bahia e São Raimundo Nonato no Piauí, tendo o Semiárido e o Vale do São

Francisco como referenciais, foi criada pela Lei Federal N° 10.473 de 27 de junho de

2002, tendo iniciado as suas ações acadêmicas em outubro de 2004, com a missão de

ministrar ensino superior, desenvolver pesquisa e fazer extensão universitária. Se

 propõe inovadora sob o ponto de vista pedagógico, por introduzir na sua concepção de

criação os Núcleos Temáticos Multidisciplinares como atividades curriculares

obrigatórias, que abordam de forma contextualizada a formação profissional dos

estudantes nos cursos de graduação, envolvendo-os nas questões do seu tempo. Sabe-se,

entretanto, que a teoria na prática nem sempre se efetiva de forma rápida e o

envolvimento da instituição com comunidades pobres ocorreu no ano de 2006, com a

implantação do COEP Municipal –  Comitê de Entidades e Pessoas no Combate à Fome

e pela Vida em Petrolina. O COEP Nacional foi criado em 1993 em meio à intensa

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mobilização da sociedade civil deflagrada pelo Movimento Ética na Política, tendo entre

seus idealizadores o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. O objetivo era reunir

empresas e pessoas para somar esforços na articulação e implementação de ações

voltadas para o combate à fome e à miséria.

O COEP Municipal de Petrolina surgiu com a finalidade de agregar pessoas e

instituições locais comprometidas com o desenvolvimento social para executarem

 projetos que impactassem as populações marginalizadas, integrando-as aos contextos

educacional, econômico, político, mas sobretudo, na geração de trabalho e renda. A

EMBRAPA Semiárido e a UNIVASF assumiram a administração da instituição por um

ano, com a responsabilidade de escolher uma comunidade para implantar o seu primeiro

 projeto. A Cacimba do Baltazar, uma comunidade rural pobre distante

aproximadamente 30 Km do centro de Petrolina foi a selecionada, tanto pelo fato da

EMBRAPA já estar ali desenvolvendo atividades agropastoris, quanto pelas suas

características de enquadramento aos objetivos do COEP. Eram setenta famílias ligadas

 por vínculos de parentesco, cujas terras foram herdadas dos seus antepassados, mas sem

documentos que comprovassem a sua posse. Os lotes individuais em área de sequeiro,

 pelo tamanho, não permitiam a criação sustentável de caprinos, que é uma cultura

regional. A maioria dos agricultores familiares da comunidade, mais de 70% era

analfabeta e a renda fixa dos que a possuíam provinha de aposentadoria ou do Programa

Governamental Bolsa Família. Não havia água para os consumos humano e animal,

ficando a população dependente do carro pipa para sobreviver; 87% dos domicílios

liberam os dejetos humanos a céu aberto, entretanto, pelo trabalho realizado pela

EMBRAPA Semiárido em agroecologia, 75% das residências já utilizavam o lixo

orgânico para adubo ou ração.A cacimba que dá nome ao local, por ficar na terra do

ancestral Baltazar, seca no período mais crítico pela falta de chuva, obrigando os

moradores a alugar a sua mão de obra para os proprietários da circunvizinhança, a fim

de não sucumbirem à fome. Também não havia energia, escola para os seus filhos e

nenhuma forma de organização que possibilitasse aos agricultores transformar as suas

 poucas possibilidades em oportunidades de trabalho e renda.

Detectados os problemas, um plano de ação foi realizado com definição de

responsabilidades de cada parceiro no processo, ficando a UNIVASF com a atribuição

de empoderar e energizar a comunidade pela organização da sua população, por integrar

essa temática o currículo de vários dos seus cursos de graduação. As ações ali

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exercitadas funcionavam como um modelo circular: o ensino subsidiando a prática

extensionista e a pesquisa no processo investigando as causas dos fenômenos

observados e orientando as alternativas de soluções para os problemas. Tudo num ir e

vir permanente, onde o ensino, a pesquisa e a extensão compunham faces

tridimensionais de uma mesma realidade, uma não existindo sem a outra, nem uma

separada da outra.

O trabalho era feito aos domingos, por ser o único momento disponível que os

trabalhadores possuíam.Esta é uma outra questão importante na extensão. É a academia

que deve se adaptar às condições da população que se pretende apoiar e não o inverso,

daí que estabelecer dias e horários convencionais para tais ações, é negar a possibilidade

desse aprendizado conjunto, onde alunos e professores encontram nas comunidades

ricos laboratórios de possibilidades para o encaixe das teorias mais complexas e difíceis

de serem assimiladas, ao tempo em que as populações marginalizadas passam a ter

acesso a informações possíveis de modificar a sua realidade. Isto requer compromisso e

responsabilidade com o outro, que no caso do extensionista não se constitui mérito, mas

a condição “ sine quae non” para a sua qualificação como tal. As ações desenvolvidas na

Cacimba do Baltazar, foram: organização comunitária; capacitação para o

associativismo; capacitação em atividades agropastoris; construção de barreiro para

acumulação de água de chuva para os animais; construção de cisternas para captação de

água de chuva, a fim de dar sustentação às famílias nos períodos mais críticos de seca;

construção de barragem subterrânea para garantir a segurança alimentar das famílias;

implantação de horta comunitária agroecológica; implantação de sala de alfabetização

 para jovens e adultos; atividades de arte –  educação para crianças e jovens; gestão junto

à CODEVASF para trazer água e energia para a comunidade; visita técnica à

COOPERCUC  –  Cooperativa de Pequenos Agricultores de Uauá, Curaçá e Canudos,

 para a troca de experiências; atividades de recreação e lazer para as crianças.

Apesar das dificuldades naturais para a assimilação de novos conceitos de

 produção baseados no respeito ao meio ambiente e na escolha de culturas mais

adaptadas às condições climáticas, a população foi muito receptiva às mudanças. O

gargalo impeditivo de maiores transformações foi a ausência do poder público na

disponibilização de infraestrutura básica, como água e energia. No ano de 2008, A

UNIVASF assumiu a presidência do COEP em Petrolina tendo a CODEVASF  –  

Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco como co-gestora e novo

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espaço social foi incluído nas ações de combate à pobreza, desta feita o Assentamento

de Reforma Agrária Mandacaru, tendo o Núcleo Temático “Meio Ambiente e

Desenvolvimento Sustentável”, como executor das ações. 

NÚCLEO TEMÁTICO MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL: espaço pedagógico multirreferencial, intercolegial e

interinstitucional

O Núcleo Temático de Estudos Interdisciplinares sobre Desenvolvimento

Sócioambiental Sustentável no Semi-Árido objetiva construir proposta pedagógica

diferenciada de ensino, pesquisa e extensão, onde o conceito de educação seja ampliado,

não ficando restrito na universidade ao interior de cada curso, mas possa ser transposto

 para os espaços do trabalho, do associativismo, do cooperativismo, dos assentamentos

de reforma agrária, dos movimentos sociais, dos sindicatos, das colônias de pescadores

e outros, por ser hoje vital que a diversidade histórico-cultural e o reconhecimento do

outro sejam metas na formação dos sujeitos enquanto cidadãos. No mundo

contemporâneo, mais do que capacitar os aprendizes para o exercício de atividades

consideradas tradicionais, a universidade precisa torná-los aptos para a aquisição de

novas competências em função de novos saberes que se produzem e que passam a

demandar um novo tipo de profissional para assimilá-las.

A concepção de currículo que fundamenta o Núcleo inclui no seu bojo questões

da atualidade e práticas de significação pessoal para os aprendizes, onde as informações

tanto podem se referir ao aperfeiçoamento da sua atividade produtiva, como ao conjunto

de representações que eles têm da sociedade e das relações que mantêm com outros

grupos sociais, influenciando a formação de identidades e a consolidação de valores

éticos.No trabalho com as comunidades, a proposta é estabelecer conexão entre os

saberes da academia e os saberes populares outrora marginalizados, subvertendo as

convenções antes estabelecidas porque, a compreensão de desenvolvimento sustentável

que norteia o Núcleo está assentada em teóricos como Zapata (2000:29), para quem o

desenvolvimento local sustentável pressupõe um novo paradigma de valorização do

humano que orienta os resultados nas dimensões econômica, capacidade de usar e

articular fatores produtivos endógenos para gerar oportunidades de trabalho e renda,

fortalecendo as cadeias produtivas locais e integrando redes de pequenas empresas;

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sociocultural, maior participação do cidadão nas estruturas de poder, tendo como

referência a história, os valores e a cultura do território; político-institucional,

construção de políticas territoriais negociadas entre agentes governamentais, do

mercado e da sociedade civil para as transformações da sociedade; ambiental,

compreensão do meio ambiente a partir do princípio da sustentabilidade em qualquer

opção transformadora. Foi nessa perspectiva que o Núcleo atuou nos assentamentos,

 buscando o desenvolvimento através de um conjunto de ações interdependentes que se

articulam e reforçam-se mutuamente, de forma que o capital humano influia no capital

social, ampliando a participação e a transformação, com respeito ao meio ambiente.

Miranda & Miranda (2001:37), apontam que o conceito e as práticas de

Desenvolvimento Sustentável buscam tanto responder aos danos, como criar possíveis

oportunidades no contexto econômico e social definido pela globalização. Na

compreensão de Buarque (1994:11), o Desenvolvimento Sustentável contém três

grandes conjuntos interligados e com características diferentes: a elevação da qualidade

de vida da população.; a eficiência e o crescimento econômico como pré-requisitos para

a construção da sustentabilidade; a conservação e a manutenção ambiental, para

assegurar a qualidade de vida das gerações futuras. Na operacionalização das atividades

do Núcleo Temático, trabalhou-se atitudes, valores e, fundamentalmente o

desenvolvimento da pessoa humana, aumentando as suas potencialidades através de

melhores condições de educação e informação, na crença de que as próprias

comunidades encontrarão formas de suprir as suas necessidades pela ampliação das

oportunidades na geração de trabalho e renda.

A INTERVIVÊNCIA NO ASSENTAMENTO DE REFORMA AGRÁRIA

MANDACARÚ: perspectivas, desafios e aprendizado 

Localizado nas cercanias do Projeto de Irrigação Senador Nilo de Souza

Coelho, distante aproximadamente 15 Km do centro de Petrolina, o Assentamento de

Reforma Agrária Mandacaru, possui setenta famílias e aproximadamente trezentas

 pessoas, oriundas dos municípios de Floresta, Cabrobó, Orocó em Pernambuco e

algumas cidades do Rio Grande do Norte e do Ceará, além de desempregados da área

urbana de Petrolina. Os adultos possuem idades entre 35 e 60 anos e a escolaridade da

maioria não ultrapassa quatro anos de estudo, sendo 75% analfabetos e apenas uma

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assentada com curso de nível médio completo em agropecuária, o que a diferencia dos

demais. Nenhum, à época, possuía renda fixa, já que o seu trabalho nas fazendas era

como diarista sem garantias trabalhistas não ultrapassando um salário mínimo,

entretanto, dado o caráter sazonal da produção, menos de 30% conseguiam tal

rendimento, o que caracterizava aquela população como muito pobre.

 No assentamento não havia água potável, serviço de abastecimento de água para

consumo humano e animal, escola e posto de saúde. As crianças se deslocavam até o

 Núcleo Habitacional do Projeto Senador Nilo Coelho para freqüentarem a escola,

correndo riscos no trajeto. Para atendimento médico, os doentes se dirigiam até o centro

de Petrolina por vários dias até conseguirem uma ficha e o abastecimento de água se

dava através de carro pipa. Cada assentado recebeu um lote com 3,8 hectares, com a

explicação de que ali seria um projeto irrigado. A partir dessa crença, a representação

social de todos em relação à terra era cultivar uva e manga, a exemplo dos seus

vizinhos, grandes produtores dessas culturas para exportação. Portanto, o sonho da

riqueza estava presente nos seus imaginários. Fazer pequenos cultivos, criar pequenos

animais, estava fora das suas expectativas de vida e de trabalho.

A preocupação imediata foi tentar compreender a trajetória percorrida pela

 população, os seus (des) caminhos, as suas dificuldades e os seus ganhos, a fim de que o

 planejamento coletivo das atividades fosse desenhado. Respostas às seguintes

indagações eram necessárias. Por que as mulheres e os homens ali assentadas e

assentados, após a luta e a conquista pela terra, continuavam depois de oito anos sendo

mão de obra alugada nas fazendas que produzem uva e manga para exportação? Por

que não se tornaram agricultoras e agricultores, já que eram beneficiários da Reforma

Agrária? Após serem assentadas/assentados, quais os apoios dados pelo Estado para que

eles se fixassem na terra? Quais as suas expectativas de vida?

A fim de iniciar o planejamento coletivo em bases racionais, os atores da

UNIVASF buscaram os órgãos públicos INCRA, CODEVASF e EMBRAPA, para

conferir os ideais presentes no imaginário da população. O INCRA, por ser responsável

 pela Reforma Agrária, foi o primeiro a ser consultado e negou qualquer possibilidade de

irrigar as terras do assentamento. Dele, foram solicitados os documentos memoriais para

a compreensão de como, em área de sequeiro, os assentados podem ter recebido lotes

tão pequenos, absolutamente incompatíveis com atividades agropastoris possíveis de ali

serem realizadas. Os documentos não foram fornecidos, sob a alegação de, quando da

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operação, os técnicos do escritório serem outros. Reconheciam a ilegalidade em relação

aos módulos, já que no Estado de Pernambuco o módulo para área de sequeiro é em

torno de 60 hectares no mínimo, mas recusaram o diálogo. Inconformados, docentes e

discentes da UNIVASF foram à CODEVASF  –   Companhia de Desenvolvimento do

Vale do São Francisco a fim de resgatar a história, já que as terras distribuídas no

Assentamento Mandacaru ficavam nas cercanias do projeto de irrigação por ela

administrado. Mapa pedológico da área foi localizado, tendo a área pertencido antes a

uma empresa produtora de manga para exportação, de quem o Governo Federal

desapropriou as terras para distribuição aos assentados. A surpresa é que, dessa área,

apenas a ocupada pelos assentados era inadequada para irrigação, razão pela qual foi

vendida. Ali, os solos são pobres, arenosos, rasos, pedregosos, inadequados para

agricultura e os lotes muito pequenos para a caprinocultura extensiva, que é uma

tradição na região.

De posse dessas informações, assembléia foi marcada pela UNIVASF com todos

os atores envolvidos, a fim de socializar os resultados dos contatos. Foi um evento

grande, com 100% dos assentados presentes e mais alunos e professores integrantes do

 projeto. Após as explicações, a reação de todos os assentados foi de indignação e

inconformismo com os informantes. Nas suas compreensões, tudo aquilo era fruto do preconceito da universidade com eles por serem oriundos do MST  –  Movimento dos

Trabalhadores sem Terra e perguntavam: “Como pode no meio de todas essas terras

onde tudo é irrigado, só a nossa terra não ser própria para irrigação? Vocês acham

que a gente vai acreditar nisso? A gente achou que podia acreditar em vocês, mas pelo

visto, vocês são iguais aos outros, que só querem nos prejudicar. Não pensem que

vamos desistir do nosso sonho. Só vivemos até agora por ele e vamos conseguir. Nem

vocês nem ninguém vão matar anos de desejo da comunidade”. 

Ouvimos tudo e ao final dos seus desabafos, informamos que eles tinham sido

ludibriados, mas a universidade não se prestaria para reproduzir um comportamento não

ético, onde a verdade fosse escamoteada. Ficou claro que continuar trabalhando com a

UNIVASF era uma opção que eles podiam descartar, mas a proposta da instituição era a

realização de um grande seminário, onde outras alternativas de produção seriam

analisadas coletivamente a fim de que eles passassem a produzir na sua terra, atendendo

ao princípio fundamental da Reforma Agrária, o que foi acatado.

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O Seminário foi realizado na UNIVASF no dia 05 de maio de 2008 durante um

dia inteiro e ali os técnicos das várias áreas apresentaram alternativas de produção,

considerando a pouca terra e as suas possibilidades de solo e de falta de água. Um novo

exame de solo demonstrou a presença de uma mancha de 30 hectares possível de ser

irrigada, que pela proximidade com o canal da CODEVASF, conseguiu-se autorização

 para irrigá-la usando água a custo zero, sob a condição de que o plantio fosse coletivo,

ficando 0,5 hectare para cada família. Além dessa possibilidade, grupos foram formados

 para trabalharem na criação de galinha caipira, de caprino em sistema de confinamento

e uma horta agroecológica, cujos canteiros passaram a ser irrigados manualmente com

água do canal. Para o início das atividades, capacitações foram feitas em gestão

 participativa, desenvolvimento comunitário, cooperativismo/associativismo,

empreendedorismo, gestão de conflitos, mutirão, economia solidária, administração da

 produção, gestão financeira, manejo de culturas dependentes de pouca água, além de

visitas técnicas em locais diversos, como mecanismos de aprendizagem.

Essas ações viabilizaram a interação universidade/sociedade, promovendo a troca

de saberes entre os seus atores e reafirmando a crença de que a extensão universitária é

 processo educativo que ao abordar a realidade na sua plenitude promove a produção do

conhecimento de forma integrada. Esta é a grande novidade trazida pelo Núcleo

Temático porque, apesar da necessidade da interdisciplinaridade entre as áreas, a

realidade da universidade é a convivência cotidiana com uma organização de ensino

fragmentada e desarticulada, em que os currículos são constituídos por compartimentos

estanques e incomunicáveis, que produzem uma formação humana e profissional de

alunos e professores insuficiente para o enfrentamento das práticas sociais que exigem

formação mais crítica e competente (MANACORDA, 1991; ALMEIDA FILHO, 1997).

FORMAÇÃO DE FORMADORES: universitários se capacitando para

capacitarem outros atores sociais

A mundialização do capital está alterando as formas de produção, exigindo

trabalhadores mais versáteis, capazes de compreender processos, dotados de autonomia

e iniciativa para resolver problemas em equipe. De outro lado, o avanço tecnológico tem

reduzido os postos de trabalho, obrigando a muitos a inserção no mercado de trabalho

 pelo empreendedorismo, organização de microempresas ou atuação no mercado

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informal. Essas formas alternativas que se apresentam, também exigem autonomia,

capacidade de iniciativa, de comunicação e reciclagem constante do trabalhador,

 portanto,  pode-se afirmar sem muitos rodeios, que hoje do trabalhador exige-se melhor

formação geral e não apenas domínios em áreas específicas. Na zona rural, os

agricultores assentados da Reforma Agrária têm poucas chances de se utilizarem das

oportunidades de aperfeiçoamento, enfrentando, assim, maiores dificuldades para se

colocarem no mercado. Com pouca terra, baixa ou nenhuma escolaridade,

desconhecimento das tecnologias modernas de produção, desassistência técnica,

ausência de crédito subsidiado e de insumos de qualidade, mas sobretudo, ausência de

cidadania, produzir torna-se uma tarefa difícil, passando a educação a assumir

importante papel na consolidação da democracia. Portanto, promover a educação de

 jovens e adultos que não tiveram a oportunidade de cumpri-la na infância foi importante

 para responder aos imperativos do presente e também para garantir melhores condições

educativas para as próximas gerações. Conhecimento e ação devem andar juntos

 porque, a teoria separada da prática não passa de enunciado verbal e a prática separada

da teoria é mero ativismo. Baseado nessa compreensão, os universitários da UNIVASF

 passaram a ser preparados pelos seus professores para atuarem na educação dos

assentados a partir do conhecimento da sua realidade, a fim de agirem em respeito à

motivação para desenvolver suas capacidades, enriquecer os seus conhecimentos,

melhorar as suas competências técnicas ou profissionais, formando pessoas para se

tornarem cidadãs e cidadãos do mundo, no mundo, para a vida, o trabalho e as suas

adversidades, reorientando-as para melhor atender as suas necessidades e as da

sociedade. Para tanto, a metodologia partiu sempre da problematização da vida

cotidiana dos aprendizes, onde os conteúdos emergiam dos seus desafios, obstáculos,

necessidades e carências. Trabalhou-se pautado na andragogia, que é o caminho

metodológico que busca compreender o jovem e o adulto nos aspectos psicológico, biológico e social, na perspectiva de que a aprendizagem desses sujeitos é orientada

 para a resolução de problemas e tarefas com os quais se confrontam na sua vida

cotidiana.

Para os alunos da UNIVASF, foi uma experiência ao mesmo tempo rica e de

muita ansiedade. No processo, os alunos formadores foram estimulados a favorecer a

autonomia dos assentados, estimulando-os a avaliarem constantemente os seus

 progressos e as suas dificuldades; e a buscarem alternativas de soluções para os seus

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 próprios problemas, na compreensão de que aqueles jovens e adultos que ali estavam,

migraram de áreas empobrecidas após experiências de trabalho duro na roça, tanto na

infância quanto na adolescência, o que os impossibilitou de uma vida mais digna. Claro

estava que ao longo do cotidiano essas pessoas acumularam conhecimentos úteis,

entretanto, continuavam excluídas de muitas possibilidades que a cultura oferece.

Assim, a orientação metodológica para os alunos é que eles deveriam valorizar esse

conhecimento existente, considerando as respostas dadas às seguintes indagações: Quais

os pontos a serem explorados nas capacitações? O que os participantes já sabem sobre o

tema? Quais são suas experiências com os assuntos?

 Nessa metodologia, formadores e assentados se constituíam uma unicidade, onde

todos aprendiam e todos ensinavam, os dois ao mesmo tempo sendo educadores e

educandos, sujeitos ativos da reelaboração do conhecimento presente, possibilitando a

síntese entre o que os assentados já traziam das suas experiências de vida e trabalho e os

novos conhecimentos que lhes foram apresentados. Enquanto os alunos do curso de

Psicologia cuidavam das questões relacionadas à organização da comunidade, das

relações interpessoais e da administração de conflitos, que se apresentavam muito

evidentes entre eles, os alunos do cursos de Administração de Empresas discutiam a

formação e o funcionamento da Associação como mecanismo de profissionalização e

empreendedorismo.Alunos dos cursos de Engenharia Agrícola e Ambiental, Zootecnia e

Medicina Veterinária, promoviam ações de Educação Ambiental e elaboração de

 projetos agropastoris para a geração de trabalho e renda. A ação dos alunos de

Engenharia Civil foi no sentido de construir o Centro de Convivência no

Assentamento orientando os mutirões como metodologia e os alunos do curso de

Enfermagem realizavam procedimentos de saúde como prática, pela valorização da vida

 plena. Em paralelo, os alunos de Engenharia da Computação ministravam cursos para

os jovens assentados, inserindo-os no mundo digital. Alunos das Engenharias da

Produção, Elétrica e Mecânica, orientavam a instalação da fabricar de vassoura com

garrafa PET, o seu processo produtivo, integrando as informações discutidas de forma

interdisciplinar, unindo os saberes populares aos acadêmicos, daí resultando um outro

saber mais rico capaz de transformar intenções em realidades.  Atividades de arte

educação passaram a ser realizadas com os jovens, filhos dos assentados, priorizando

a dança, o teatro e a música, como ferramentas educativas. Além disso, os jovens do

assentamento foram responsabilizados pela revitalização dos espaços públicos, com

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 plantio de arvores doadas por empresas locais.Visitas técnicas foram realizadas com o

intuito de favorecer a consolidação das ações pela familiaridade adquirida na prática.

Os depoimentos dos alunos formadores são reveladores da significação dessa

atividade para eles:

“Confesso que não entendia o que alunos do curso de Engenharia Civil estavam

 fazendo num Assentamento de Reforma Agrária. Quando me matriculei no Núcleo

Temático, queria apenas me ver livre da exigência, mas não achava que poderia

aprender algo útil para a minha vida e a minha profissão.Com o passar das

atividades, fui me envolvendo e me apaixonando pelo trabalho, de forma que bastava

eu ver algo que poderia ser interessante para aquela realidade, eu já ficava

interessado em levar para lá. Aprendi muito e me tornei melhor como gente. Minha

 família possui fazenda de cacau e sempre ouvi dizer na minha região que o MST era

 formado por um grupo de vagabundo que não quer trabalhar, mas se apossar das

terras de quem lutou para consegui-las. Hoje sei que esta é apenas uma parte da

verdade. Conheci no assentamento trabalhador honesto, gente de bem” ( M.S.F. Aluno

de Eng. Civil).

“Nas duas primeiras semanas de reuniões na comunidade estive a ponto de desistir .

Os assuntos privilegiavam o agrícola e o desenvolvimento sustentável, nada se falava

da saúde. Por mais esforço que fizesse, não conseguia ver a articulação da saúde

com a proposta do Núcleo Temático. A descoberta veio com a técnica da paisagem,

onde fomos levados a andar pela comunidade, anotar tudo que ali existia. Ao redor

das moradias e no seu interior, constatamos animais de estimação no convívio

direto com as pessoas, comendo no mesmo prato restos de comida, dormindo no sofá

e na cama, defecando no quintal e fuçando dejetos humanos, impactando na saúde

humana e sendo pelos humanos impactados. Naquele momento, tudo ficou claro

 para mim e passei a ver a relação direta da saúde com a zootecnia, com a medicina

veterinária e com o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. Já voltei da

técnica dinâmica sabendo o que a área de enfermagem poderia fazer para melhorar

as condições de saúde da população. Para mim foi das experiências mais

importantes na universidade ( M.T.S.Aluno de Enfermagem ).

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AS DIFICULDADES: estímulo para a luta pela democratização da universidade

A atividade extensionista deve reduzir a distância que separa a atividade

acadêmica dos interesses concretos da população, na compreensão de que é da

comunidade que tudo emerge e é para ela que tudo deve retornar. Como fazer isso com

educadores da universidade que tiveram formação dentro de uma concepção tradicional,

fragmentada? Como vencer os obstáculos dos territórios do saber construídos numa

visão cartesiana e pragmática? É possível desenvolver uma atitude dialógica entre atores

variados, para que juntos construam aprendizagens mútuas? Como elevar a auto-estima

de indivíduos que historicamente foram massacrados pelo preconceito e mantidos à

margem no processo de integração social? Como fazê-los acreditar que a universidade

 pode com eles abrir novas picadas para a construção de um outro caminho? Respostas

 prontas para essas indagações não existiam, mas havia a vontade de todos em encontrar

soluções para os problemas. Ainda no ano de 2008, atendendo ao edital 23/ 2008

MCT/CNPq/CT, foi aprovado o Projeto “FORMAÇÃO DE AGENTES DE

DESENVOLVIMENTO: Sustentabilidade para comunidades de assentados jovens em

áreas de Reforma Agrária nos municípios de Juazeiro –  Bahia e Petrolina - Pernambuco,

cujo foco era a Intervivência Universitária, tendo como objetivos gerais: a) Formar

Agentes de Desenvolvimento Sustentável, potencializando a inclusão social e o

fortalecimento da cidadania por meio da alfabetização científica e ações integradas, que

levassem em conta a dimensão ética, social, política, cultural, econômica e ambiental

sustentável. b) Participar da promoção e animação de processos capazes de contribuir

 para a construção e execução de estratégias de desenvolvimento, centradas na expansão

e fortalecimento da agricultura familiar e das suas organizações, por meio de

metodologias educativas e participativas, buscando a melhoria da qualidade de vida da

 população, tendo como eixo orientador os princípios da agroecologia.

A partir da experiência vivenciada no Assentamento Mandacaru, foram incluídos

os assentamentos de reforma agrária Terra da Liberdade, Mansueto de Lavor, Água

Viva, acampamento Divisa no estado de Pernambuco, e o Força da Terra na Bahia,

além dos pescadores artesanais e seus filhos dos municípios de Juazeiro, Casa Nova e

Sobradinho que foram atingidos pela construção da Barragem de Sobradinho, ficando

sem terras para plantio. Das ações participaram docentes e discentes da UNIVASF, do

IF Sertão de Pernambuco e da UNEB  –   Universidade do Estado da Bahia, com

quem estabeleceu - se parcerias para a execução dessa proposta.

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 No Assentamento Terra da Liberdade são cem famílias e aproximadamente

quinhentas pessoas, cujas características são semelhantes às verificadas no

Assentamento Mandacaru. Baixa escolaridade da população assentada, falta de água

 para consumo humano e animal e ausência de renda fixa. Lá, por indefinição pelo

INCRA da área individual para plantio, nenhuma produção estava sendo realizada. A

importância atribuída ao espaço estava na casa que construíram com recursos da

Reforma Agrária. Diferentemente da realidade de outros assentamentos, a população ali

é majoritariamente oriunda de desempregados urbanos da cidade de Petrolina que viram

na causa da luta pela terra a possibilidade de um lar e de sobrevivência. A maioria

trabalha como mão de obra alugada nas fazendas de produção de frutos para exportação.

Dista 15 Km do Centro de Petrolina. Não possui escola, nem posto de saúde.

O Assentamento Mansueto de Lavor localiza-se a aproximadamente 60 Km do

centro de Petrolina e possui cem famílias assentadas. Trata-se de local privilegiado com

infraestrutura de irrigação. Possui escola, água encanada e posto de saúde. As casas são

confortáveis e atendem às necessidades básicas das famílias. A despeito de todas essas

favorabilidades, apenas 40% dos assentados estavam produzindo nos seus lotes, que são

de 8,0 hectares; 60% nada produziam, por estarem inadimplentes com o Banco do

 Nordeste que financiou o primeiro plantio há dez anos atrás. Como não recebem

assistência técnica, a produtividade das culturas é baixa, impactando na renda familiar.

Todos vieram de experiências com agricultura de sequeiro, dependente de chuva,

 portanto, cultivos irrigados são para eles uma novidade.

Os Assentamentos Água Viva I e II, distam 45 Km de Petrolina e apresentam

dificuldades com água para os cultivos, mas possuem escola. Não têm postos de saúde e

a população tem baixa escolaridade e nenhuma formação técnica sobre agropecuária.O

acampamento Divisa está em processo de regularização e a situação da população é de

absoluta precarização. Os acampados não possuem casa, água para consumo, e nem a

 posse da terra. Ainda estão em acampamentos de lona, mas já produzem hortaliças com

água do canal da CODEVASF, de forma clandestina.

Os assentados do Força da Terra no Estado da Bahia, já produzem hortaliças e

frutas irrigadas. Para operacionalizar o projeto, os alunos das três instituições passaram

a ser orientados pelos seus docentes para trabalharem com os assentados e pescadores

na perspectiva da sua organização, objetivando a administração dos conflitos presentes e

 buscando o empoderamento das famílias através do fortalecimento dos capitais humano

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e social. A opção pela formação de agentes locais como mecanismo de sustentabilidade,

decorreu da compreensão de que, como afirma Lacki (2002), “entre os agricultores

 familiares, a ineficiência do fator de produção mais abundante que é a mão de obra,

incide negativamente na produtividade dos demais fatores que geralmente são escassos,

como a terra, os animais, os insumos, as máquinas”, apresentando-se a educação como

a ferramenta com maior potencial para empoderar as suas famílias, por contemplar

valores como cidadania, autonomia, solidariedade, democracia e respeito ao meio

ambiente.

SABER FAZER –  o processo da construção coletiva

A metodologia de ação para operacionalização das atividades propostas teve

caráter educativo, baseado nas competências da alfabetização científica e com ênfase na

 pedagogia da prática, promovendo a geração e a apropriação coletiva de conhecimentos,

a construção de processos de desenvolvimento sustentável e a adaptação e adoção de

tecnologias voltadas para a formação sustentável, onde o ponto de partida foi sempre a

realidade e os saberes locais. Isso foi traduzido na prática, pela animação e facilitação

de processos coletivos capazes de resgatar a história, identificar problemas, estabelecer

 prioridades e planejar ações para alcançar objetivos compatíveis com os interesses,

necessidades e possibilidades dos resultados e do potencial de replicabilidade das

soluções encontradas para situações semelhantes em diferentes ambientes.Para tanto, foi

oferecida uma formação básica em humanidades como estratégia para a construção de

uma visão clara da realidade, e um instrumental de pesquisa social aplicada, para

estimular o potencial reflexivo, criativo, técnico e organizativo, a fim de que as

comunidades envolvidas pudessem responder ativamente às demandas e, mais do que

isso, subsidiar o poder público na definição de políticas sociais que melhorassem a

qualidade de vida da população rural assentada.

CONCLUSÕES

A proposta de contribuir para a troca de conhecimentos e tecnologias na direção

do desenvolvimento sustentável,exigiu dos atores envolvidos a desconstrução de

 paradigmas e a construção de espaços de convívio que facilitou o enfrentamento das

adversidades vividas pelos assentados e os pescadores. A intervivência entre docentes e

discentes das instituições de ensino superior e os atores das classes populares,

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contemplou valores como autonomia, democracia, dignidade da pessoa humana,

solidariedade e respeito ao meio ambiente, priorizando um novo modo de pensar o

desenvolvimento, onde as próprias comunidades passaram a encontrar formas de suprir

as suas necessidades investindo na sua vocação, fomentando o intercâmbio externo

através da cooperação e integração das cadeias produtivas e das redes econômicas e

sociais, ampliando assim, as oportunidades locais de geração de renda e de trabalho.

Essa experiência possibilitou a criação de significados culturais e políticos, pela

forte participação dos docentes, discentes e da comunidade, onde o diálogo não foi

apenas um procedimento metodológico, mas uma força do próprio educar, no sentido de

uma permanente confrontação dos atores consigo mesmos. Foi isso que permitiu um

amadurecimento de todos sem a perda das suas identidades, privilegiando as diferenças

e as contradições, na lógica do conhecimento coletivamente apropriado. A partir dos

indicadores definidos para acompanhamento e avaliação do projeto, que foram: criação

de instituição associativa em cada assentamento envolvido; sistematização de reuniões

comunitárias; utilização das tecnologias de convivência com o semiárido; utilização da

informática como ferramenta de inclusão; inserção de oito assentamentos em sistemas

 produtivos de geração de trabalho e renda, além de três colônias de pescadores, pode-se

concluir que os objetivos do projeto foram totalmente atingidos. Da mesma forma, o

movimento de flexibilização e de abertura no projeto permitiu que alunos e professores

se abrissem para a construção de novos saberes, desenvolvendo uma postura

interdisciplinar, com um olhar mais atento no cotidiano.

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