FAAT FACULDADES BACHARELADO EM PSICOLOGIA …
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FAAT FACULDADES
BACHARELADO EM PSICOLOGIA
ADALBERTO FARIAS DA SILVA
A INCLUSÃO ESCOLAR DE CRIANÇAS COM AUTISMO NA
EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA VISÃO DA PSICANÁLISE
ATIBAIA - 2017
FAAT FACULDADES
BACHARELADO EM PSICOLOGIA
ADALBERTO FARIAS DA SILVA
A INCLUSÃO ESCOLAR DE CRIANÇAS COM AUTISMO NA
EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA VISÃO DA PSICANÁLISE
ATIBAIA - 2017
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Psicologia pela FAAT FACULDADES, sob orientação do Prof. Dr. Geraldo Antônio Fiamenghi Júnior.
Silva, Adalberto Farias da
S578i A inclusão escolar de crianças com autismo na educação infantil: uma
visão da psicanálise. / Adalberto Farias da Silva, - 2017.
30 f.; 30 cm.
Orientação: Geraldo Antônio Fiamenghi Junior
Trabalho de conclusão de curso (Graduação) – Faculdades Atibaia,
como requisito para obtenção do título de Bacharel em Psicologia da
Faculdades Atibaia, 2017.
1. Inclusão escolar 2. TEA 3. Autismo 4. Freud 5. Psicanálise I. Silva,
Adalberto Farias da II. Fiamenghi Junior, Geraldo Antônio III. Título
CDD 150.195
A INCLUSÃO ESCOLAR DE CRIANÇAS COM AUTISMO NA
EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA VISÃO DA PSICANÁLISE
TERMO DE APROVAÇÃO
Trabalho apresentado como exigência para a conclusão do Curso de Psicologia.
Avaliado pelo professor orientador responsável, Geraldo A. Fiamenghi Júnior, que
após análise considerou o trabalho ___________________, com conceito
___________.
Atibaia, ____/____/____.
__________________________________
Prof. Dr. Geraldo A. Fiamenghi Júnior
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus e a todas as pessoas que de algum modo contribuíram para
essa conquista, em especial à minha mãe Custódia, meu pai Adabel e toda minha
família por estarem ao meu lado desde o inicio dessa fase tão importante para mim.
Agradeço o apoio de meus amigos que acreditaram e me apoiaram em todos os
momentos dessa trajetória.
Agradeço aos meus professores que tornaram possível a conquista desse
objetivo. Ao meu Professor Orientador Geraldo A. Fiamenghi Júnior, um
agradecimento especial por toda sua dedicação, atenção e compromisso que
garantiu o êxito desse trabalho.
Dedico esse trabalho aos profissionais da área da Psicologia e da Educação
Infantil, pois minha vivencia neste contexto foi o que despertou o meu desejo em
refletir e discutir sobre o presente tema, a fim de contribuir para a o êxito da inclusão
escolar das crianças com autismo da educação infantil.
A todos, de modo geral, que fizeram parte direta ou indiretamente da minha
formação, a minha gratidão.
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SILVA, A.F. A Inclusão Escolar de Crianças com Autismo na Educação
Infantil: Uma Visão da Psicanálise. Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).
FAAT (Faculdades Atibaia), Curso de Psicologia, 2017. 30 p.
RESUMO
O presente trabalho teve por objetivo discutir a inclusão escolar de crianças com TEA (Transtorno do Espectro Autista) sob o olhar da Psicanálise. A partir da observação de um aluno de uma escola particular de uma cidade do interior de SP, foi possível identificar os aspectos que semelhantes a outros estudos sobre inclusão de crianças com TEA. Os estudos revelam que o êxito no processo de inclusão só é possível por meio de um trabalho coletivo e com o apoio de alguns profissionais, professores, psicólogos, fonoaudiólogos, médicos e principalmente a família. Os estudos realizados por Freud ressaltam os desafios do processo de educação e como a palavra tem impacto na vida do sujeito que a ouve. A teoria psicanalítica pode contribuir para o êxito do processo de inclusão, pois ela compreende os desafios e seus impactos em cada faixa etária da criança, além de considerar o desejo inconsciente da criança como sendo fundamental em seu processo de desenvolvimento. Palavras chave: Inclusão Escolar, TEA, Autismo, Freud, Psicanálise
6
SILVA, A.F. School Inclusion of Autistic Children in Kindergarten: A
Psychoanalysis Framework. Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). FAAT
(Faculdades Atibaia), Curso de Psicologia, 2017. 30 p.
ABSTRACT
This research aimed to discuss school inclusion of ASD (Autistic Spectrum Disorder) through a Psychoanalytical framework. Stemming from observations of a pupil in a private school in a country town in SP Estate, it was possible to identify characteristics similar to other studies on inclusion of ASD children. Studies show that the success of inclusion process is only possible via a collective action, with support of professionals such as teachers, psychologists, speech therapists, doctors and, especially the family. Freud’s studies emphasize challenges in educational process and the importance of the word in a subject-listener. Psychoanalysis can cooperate for the success of inclusion, as it understands the challenges and their impacts in each stage of development, as well as taking account of the child’s unconscious desire as adamant for his/her development. Keywords: School inclusion, ASD, Autism, Freud, Psychoanalysis.
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SUMÁRIO
RESUMO 5
ABSTRACT 6
I. INTRODUÇÃO 8
1.1. A INCLUSÃO ESCOLAR 8
1.2. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA:
CONTRIBUIÇÕES DA PSICANÁLISE
13
II. OBJETIVO 18
III. MÉTODO 19
IV. RESULTADOS 20
V. DISCUSSÃO 22
VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS 25
REFERÊNCIAS 27
8
I. INTRODUÇÃO
CAPITULO 1. A INCLUSÃO ESCOLAR
Ao longo dos anos, a Psicologia conquistou seu espaço dentro das
escolas e demais instituições educacionais. Graças ao seu olhar crítico, ela tem
promovido novas reflexões, o que por sua vez contribui para novas formas de
ação no que diz respeito à educação escolar, especificamente, a inclusão
escolar. A inclusão escolar está prevista no artigo 208 da Constituição Federal
(BRASIL, 2009), que especifica ser dever do Estado garantir atendimento
educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na
rede regular de ensino. Em resumo, a inclusão escolar significa acolher, no
sistema de ensino, todas as pessoas, sem exceção, independentemente de
cor, classe social e condições físicas e psicológicas.
O ambiente escolar é um espaço de relações e troca de informações,
que gera a construção do indivíduo. Mead (apud CAMARGO, BOSA, 2009) foi
um dos primeiros sociólogos a escrever sobre a formação de uma identidade
social por meio das interações com outro, e o ambiente escolar pode ser visto
como um espaço de grande relevância na educação, na formação e no
desenvolvimento das crianças. Por isso, é importante que a escola possua uma
estrutura adequada e profissionais qualificados para que os alunos recebam a
educação adequada de acordo com suas necessidades, garantindo um bom
desenvolvimento e êxito em seu aprendizado.
No Brasil, os movimentos de inclusão surgiram a partir da década de
1980, com o intuito de inserir as pessoas, que eram excluídas pela sociedade
9
em decorrência a suas diferenças físicas ou psicológicas, às atividades
cotidianas, como os empregos, no mercado de trabalho e a educação, nas
instituições de ensino. Nessa época, a inclusão deu-se por meio das Políticas
Públicas. Ao se referir às Políticas Públicas, seguimos a definição de Azevedo
(apud SOUTO, 2014, p.13), ao afirmar que “Política Pública é tudo o que um
governo faz e deixa de fazer, com todos os impactos de suas ações e de suas
omissões”. No âmbito da Educação, podemos pensar que as Políticas Públicas
Educacionais referem-se a tudo aquilo que um governo faz, ou deixa de fazer,
relacionado à Educação, bem como suas consequências.
Segundo Serra (2004), a inclusão escolar pode ser entendida como um
movimento de rompimento de antigos paradigmas e reformulação do sistema
de ensino, ou seja, é um processo de mudança quanto ao olhar para o aluno
com necessidades e atenções especiais dentro do contexto escolar.
Ao falar de inclusão escolar são necessários alguns cuidados, pois
falamos do futuro de um sujeito que necessita de um suporte especial no
tocante à Educação. Por esse motivo, é importante ter claramente
estabelecidas todas as metas e finalidades desse processo inclusivo do aluno,
antes mesmo de sua inclusão no âmbito escolar, destacando todos os
benefícios e vantagens resultantes desse trabalho. No atual contexto social
brasileiro, a inclusão escolar é vista como uma educação a pessoas com
necessidades especiais, como é o caso de crianças autistas, deficientes
auditivos, visuais, mentais e motores.
Quando falamos sobre Educação, consideramos que se trata de uma
relação em que ocorre a troca de saberes e experiências, onde educador e
educando são coparticipantes nessa relação, em que o processo de Educação
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não está implícito somente nos conteúdos pedagógicos ou nas informações
passíveis de serem aprendidas, mas sim nos diálogos e nos relacionamentos
desenvolvidos entre si. Nesse sentido Freire é expressamente claro ao afirmar
que
A educação libertadora, problematizadora, já não pode ser o ato de depositar, ou de narrar, ou de transferir, ou de transmitir “conhecimentos” e valores aos educandos, meros pacientes, à maneira da educação “bancária”, mas um ato cognoscente. (FREIRE, 1987, p.39)
Em outras palavras, nesse contexto a Educação é entendida como um
processo em que a relação entre educador e educando é fundamental para o
êxito e o desenvolvimento do aluno, e que assim como o educador, o aluno
também tem algum conhecimento a ser compartilhado por conta de sua
subjetividade. Partindo desse ponto, podemos dizer que no processo de
inclusão escolar, a relação torna-se ainda mais importante, levando em conta
que o aluno inclusivo necessita de uma atenção especial e que também é um
sujeito portador de uma forma singular de ver o mundo, capaz de compartilhar
algum saber que detém.
Considerando que a inclusão escolar é um processo dinâmico e flexível,
dependente das relações com o outro, afirmamos que seu principal objetivo
deve ser o de possibilitar, ao aluno inclusivo, interagir socialmente, decidir suas
ações e desenvolver suas potencialidades.
A escola deve ser compreendida como um espaço livre para os mais
variados tipos de pessoas, e a inclusão escolar deve ser vista como uma
estratégia de apoio e suporte aos alunos que necessitam atenções e cuidados
especiais. Por esse motivo Carvalho ressalta alguns fatores relevantes no
tocante a esse tema:
11
A vivência escolar tem demonstrado que a inclusão pode ser favorecida quando observam as seguintes providencias: preparação e dedicação dos professores; apoio especializado para os que necessitam; e a realização de adaptações curriculares e de acesso ao currículo, se pertinentes (BRASIL, 1999, p.52).
Levando em conta que inclusão escolar trata-se de uma ação educativa
e uma ação política, torna-se importante lembrar que, infelizmente, o cenário
em que as escolas no Brasil vivem atualmente, é repleto de injustiças e
desigualdades, que necessitam ser revistas. Em decorrência disso a inclusão
escolar necessita uma atenção especial que consiga superar os desafios
dessas desigualdades do cenário atual da educação brasileira. Em outras
palavras, a inclusão escolar não pode ser o simples ato de matricular um aluno
com necessidades especiais em uma escola e deixá-lo sob os cuidados de
apenas um professor, mas é necessário que todo o processo inclusivo seja
acompanhado de perto, e ações políticas devem promover e garantir uma
formação mais sólida e adequada aos profissionais que estarão frente ao aluno
inclusivo.
Ainda acerca da inclusão escolar, é importante ressaltar a Declaração de
Salamanca, um documento produzido pela UNESCO, em 1994, sendo um
grande marco no que se refere à educação inclusiva, e que até hoje tem
norteado as Políticas Públicas de diversos países para a educação dos alunos
com necessidades educacionais especiais. Dentre as inúmeras orientações
apresentadas na Declaração de Salamanca destacamos que:
• toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem, • toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicas, • sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais características e necessidades, • aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades,
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• escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos; além disso, tais escolas proveem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional (UNESCO, 1994, p.8).
Dessa maneira, acredita-se que a inclusão escolar além de ser uma
ação que insere o aluno com necessidades especiais educacionais na rede
regular de ensino, é também uma forma de se combater o preconceito, e com
isso romper as limitações criadas historicamente pela cultura social
(BEZERRA, 2009).
Sendo assim, podemos dizer que a inclusão escolar é um processo de
ressignificação social, e para que ela de fato aconteça, é necessário que o
sistema educacional esteja em constante atualização e adequação, em
parceria com a comunidade em sua maneira de olhar essa temática, e os
Órgãos Políticos promovendo ações políticas que favoreçam o ensino de cada
aluno, para garantir a promoção de melhores qualidades aos diversos graus de
necessidades especiais educacionais (BEZERRA, 2009).
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CAPITULO 2. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: CONTRIBUIÇÕES
DA PSICANÁLISE
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é considerado um transtorno
que causa o retardamento ou o atraso no desenvolvimento da criança,
comprometendo a sua interação e socialização com outras pessoas, sua
comunicação e suas tomadas de decisões. Em geral, o TEA é diagnosticado
em crianças logo nos seus primeiros anos de vida, mas a maioria dessas
crianças nascem sem qualquer disfunção aparente, e os sintomas revelam-se
ao longo dos anos no desenvolvimento da criança, e podem ser percebidos
pela maneira com que a criança com TEA relaciona-se com os pares, e seu
diagnóstico se dá através de exames e avaliações clinicas. O TEA é um
transtorno presente no mundo inteiro e nos mais diferentes tipos de modelos
familiares, por conta disso não possível afirmar que esse transtorno deriva-se
de uma causa psicológica ou ambiental específica. (ALVES, LISBOA, LISBOA,
2010).
Segundo a Classificação Internacional de Doenças (CID-10) de 1991, o
autismo recebe a classificação F84-0, sendo considerado como um Transtorno
Invasivo do Desenvolvimento anormal e comprometido, manifesto antes dos 3
anos de idade. A criança com TEA apresenta um funcionamento anormal das
habilidades, dentre elas, interação social, comunicação e comportamento
restrito e repetitivo.
No presente trabalho, o TEA é classificado de acordo com a 5° edição
do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (Diagnostic and
Statistical Manual of Mental Disorders – DSM-V), que classifica o TEA como:
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O transtorno do espectro autista caracteriza-se por déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, incluindo déficits na reciprocidade social, em comportamentos não verbais de comunicação usados para interação social e em habilidades para desenvolver, manter e compreender relacionamentos. Além dos déficits na comunicação social, o diagnóstico do transtorno do espectro autista requer a presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. (APA, 2014)
Calazans e Martins (2007, p.144) afirmam que o transtorno pode ser
entendido como uma perturbação da ordem a ser seguida, entretanto, se existe
uma ordem é necessário que cada individuo possa adaptar-se a ela. Em
relação ao transtorno, os autores ainda afirmam que “o transtorno é alguém
que sofre um déficit de competências em relação aos outros sujeitos que se
adaptaram a essa ordem” (CALAZANS, MARTINS, 2007, p.144).
Alves, Lisboa e Lisboa (2010, p.10) destacam algumas orientações
referente a maneira de elaborar um trabalho eficaz com crianças com TEA,
enfatizando que “para ajudar os autistas, é fundamental que a família e amigos
os tratem normalmente, tentando entendê-los em sua forma de ser e assim
tentar ajudá-los, propiciando tratamento em todas as áreas que precisem”.
As mesmas autoras afirmam que o êxito no trabalho com crianças com
TEA requer o apoio de diversos profissionais atuando em conjunto para o
desenvolvimento da criança, como psicólogos, terapeutas ocupacionais,
fonoaudiólogos, pedagogos, fisioterapeutas e médicos (ALVES, LISBOA,
LISBOA, 2010).
No tocante à Educação, a Psicanálise baseia-se nos trabalhos
desenvolvidos por Freud (FREUD, 1937 / 1996), especialmente, em seus
textos ‘Prefácio à Juventude Desorientada de Aichorn’ e ‘Análise terminável e
interminável’, nos quais ele menciona três profissões impossíveis: educar,
governar e curar. A afirmação de Freud resulta do impacto que a palavra
15
poderá causar na vida do outro, ou seja, a fala emitida por um sujeito está
submissa aos desejos do inconsciente do individuo que a recebe. Portanto, no
âmbito da Educação, o educador é o sujeito que possui um saber e o transmite
por meio da palavra, porém ele não terá controle sobre os efeitos que essa
palavra causará em seu aluno. Freud (FREUD, 1925 / 1996) declarou que é
praticamente impossível que o mesmo método educativo possa ser
uniformemente bom para todas as crianças.
A afirmação anterior reforça ainda mais a necessidade de estabelecer
uma Educação que requer uma atenção especial às crianças com TEA. No
caso de tais crianças, a Educação torna-se um processo mais desafiador
ainda, uma vez que a comunicação e as interações sociais se mostram
comprometidas. Com base nas afirmações de Freud e nas necessidades
especiais da criança com TEA, acerca da inclusão escolar, podemos nos
apoiar na afirmação de Ávila (1997, p.12), que expressa que “o autismo
representa um desafio triplo: para a psicanálise, para a educação e para as
práticas sociais”. Ao se referir a inclusão escolar de crianças com TEA, o olhar
crítico da Psicanálise acredita que a criança com TEA também é um sujeito
portador de um desejo, e que esse desejo, que é inconsciente, manifesta-se
por meio de algumas ações, como, por exemplo, o brincar, e que leva a criança
à busca de um prazer, e consequentemente ao aprendizado.
Referente a isso Freud afirma:
Na teoria da psicanálise não hesitamos em supor que o curso tomado pelos eventos mentais está automaticamente regulado pelo princípio de prazer, ou seja, acreditamos que o curso desses eventos é invariavelmente colocado em movimento por uma tensão desagradável e que toma uma direção tal, que seu resultado final coincide com uma redução dessa tensão, isto é, com uma evitação de desprazer ou uma produção de prazer. (FREUD, 1920/1996, p.17).
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Bastos e Kupfer (2010), em um trabalho clínico numa instituição com
crianças psicóticas e autistas, ressaltam que as tentativas de manter as
crianças na escola regular nunca foi uma tarefa de fácil execução, e que por
isso, tiveram que desenvolver um trabalho que pudesse acompanhar a
escolarização das crianças atendidas na instituição em que atuaram. Segundo
as autoras, a inclusão escolar pode ser considerada um trabalho de educação
terapêutica, ou seja, um trabalho estruturado por meio de práticas
interdisciplinares com o objetivo de retomar seu desenvolvimento ou retomar a
estruturação psíquica interrompida decorrente do transtorno.
No que diz respeito à inclusão escolar de crianças com TEA, em um
estudo realizado durante um trabalho interventivo, Lemos, Salomão e Agripino-
Ramos (2014) enfatizam alguns fatores importantes durante o processo de
inclusão do aluno na rede regular de ensino. Os resultados apontaram para a
escola como sendo um dos espaços que mais favorecem o desenvolvimento
infantil, devido à oportunidade de convivência com outras crianças e pela
importância dos professores, que atuam como mediadores favorecendo a
aquisição de diferentes habilidades nas crianças.
A afirmação citada anteriormente confere com o que afirmam Bastos e
Kupfer (2010, p. 117)
“o trabalho de inclusão escolar não pode ser realizado sem a inclusão dos professores, já que eles são uma das ferramentas mais importantes na sustentação desse lugar social que se pretende oferecer à criança psicótica: o lugar de aluno”.
Podemos pensar que os objetivos educacionais estão voltados a
promover ao aluno habilidades básicas, desenvolver a comunicação e sua
autonomia por meio das atividades pedagógicas e psicológicas no âmbito da
escola.
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Porém, no caso de crianças com TEA, a educação deve estar atrelada
ás compreensões psicológicas e psiquiátricas, e deve-se desenvolver
estratégias e técnicas para a promoção da educação da criança com o
transtorno.
As Políticas Públicas e as demais ações sociais ainda precisam avançar
muito, a fim de promover um melhor atendimento educacional, com muito mais
qualidade e que assegurem a formação e o devido preparo dos professores
para a realização de uma pedagogia mais firme e consistente.
Consideramos o que diz Serra (2010, p.164) acerca da inclusão escolar
de crianças com TEA
“A inclusão não é o único modelo de educação para os indivíduos com autismo e a decisão de incluir deve ser bastante criteriosa. O sujeito não pode ser o único elemento a ser considerado na escolha do programa educacional, mas o ambiente escolar e a família também devem ser considerados e devidamente orientados e principalmente, é importante verificar se a equipe pedagógica está devidamente preparada”.
A Psicanálise e seus estudos podem contribuir à inclusão escolar de
crianças com TEA, pois afirma que a suspensão de suas crenças e valores
frente ao outro é capaz de perceber nele as potencialidades e desafios a serem
superados, sem que haja um julgamento preconceituoso. Em outras palavras o
olhar da psicanálise para a inclusão escolar está voltado para as condições
subjetivas de cada aluno, diferentemente de um olhar jurídico que delimita
condições objetivas para a inclusão. (VOLTOLINI, 2004).
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II. OBJETIVO
O objetivo desse trabalho foi discutir a temática da inclusão escolar de
crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) na Educação Infantil à luz
da Psicanálise.
19
III. MÉTODO
Para a realização desse trabalho foram utilizados textos de pesquisas
cientificas, que abordaram os temas sobre a inclusão escolar e o Transtorno do
Espectro Autista (TEA), estudos de casos com base na teoria Psicanalítica e a
observação de um aluno de uma escola particular de uma cidade do interior do
Estado de São Paulo
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IV. RESULTADOS
O aluno observado é uma criança do sexo masculino, com 6 anos de
idade, que frequenta uma escola da rede privada em uma cidade do interior de
São Paulo. Foram realizadas cinco observações durante as atividades
escolares do aluno, dentro e fora da sala de aula.
Nas atividades dentro da sala de aula, o aluno apresentou
comprometimento em sua comunicação, interação, socialização e tomada de
decisões. Além disso, também foi possível observar repetições de movimentos,
sons vocais e falas. Em algumas ocasiões, o aluno levantava-se de sua cadeira
e corria em círculos pela sala de aula, voltava ao seu lugar, sentava-se
novamente e, pouco tempo depois, voltava a correr pela sala de aula. Esse
conjunto de atividades foi percebido em todas as observações realizadas
dentro da sala de aula.
Os demais colegas da classe dificilmente interagiram com esse aluno,
pois encontraram impedimentos ao aproximar-se dele, por não conseguirem
estabelecer uma comunicação adequada. Na maior parte do tempo, os colegas
da classe não conversaram com o aluno observado e a professora raramente
incentivou os colegas a comunicarem-se com ele.
Com frequência, a professora chamou a atenção desse aluno devido ao
fato de ele correr pela sala e jogar-se no chão durante as atividades. Na
recreação no pátio, o aluno brincou sozinho, correndo em círculo, brincando no
gira-gira, jogando-se no chão, porém sem qualquer interação com os demais
colegas, que por sua vez não o incluíram em suas brincadeiras. Nenhum dos
21
colegas o chamou para brincar e a professora não os incentivou a convidá-lo
para suas brincadeiras.
O aluno não recebeu atenção especial de acompanhante, ou auxiliar nas
atividades escolares em período integral. Segundo a Direção, a escola não
oferece nenhum tipo de atenção especial para crianças diagnosticadas com o
TEA, porém contava com o apoio de alunos estagiários em psicologia e
pedagogia, que auxiliavam o aluno em algumas atividades em sala de aula.
Em um momento das observações realizadas, o aluno não obedeceu
algumas ordens dadas pela professora. Quando isso aconteceu a professora
ameaçou retirar o aluno da sala de aula; ao fazer isso, ele começou a chorar e
jogar-se no chão. Quando a professora tentou conter o aluno, este chorou
ainda mais alto e passou a debater-se e agarrar-se na roupa, nos braços e nos
cabelos da professora. Ao ser encaminhado para a diretoria, os pais foram
acionados e a mãe foi buscar o aluno.
Em uma entrevista realizada com a mãe do aluno, foi possível perceber
que os pais são bem presentes na educação da criança e reconhecem suas
necessidades, bem como seus desafios e habilidades. Para auxiliar no
desenvolvimento da criança, os pais contam com o apoio de
acompanhamentos psicológicos e fonoaudiólogos.
Ainda na entrevista a mãe relatou que teve muitas dificuldades na antiga
escola onde seu filho estava matriculado, pois a criança havia recebido
rotulações negativas e a mãe percebeu um descaso e despreparo profissional
da escola. Ao transferir o aluno para a atual escola, a mãe percebeu que houve
melhorias no desenvolvimento de seu filho graças ao apoio que a escola
ofereceu.
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V. DISCUSSÃO
Com base nos comportamentos observados do aluno, dentro do
contexto escolar, especialmente a maneira como se relacionou com os colegas
e com a professora, é possível levantar uma hipótese diagnóstica de que o
aluno apresenta um Transtorno do Espectro Autista – TEA (CID-10, 1991; APA,
2014) caracterizado como comprometimento em sua comunicação, interação,
socialização e tomada de decisões, repetições de movimentos, déficits em
reciprocidade social e comunicações não verbais que são utilizados em
interações sociais (APA, 2014). Uma vez que o aluno necessita de atenção
especial, é importante que ele receba todo apoio escolar e familiar possível
para auxiliar em seu desenvolvimento.
Por meio da entrevista com a mãe, foi possível perceber que o aluno
recebe o apoio familiar adequado para favorecer seu desenvolvimento. Tal
apoio enquadra-se nos estudos feitos por Alves, Lisboa e Lisboa (2010), que
ressaltam a importância de um trabalho realizado com a ajuda da família e o
apoio de outros profissionais como médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e
pedagogos. As mesmas autoras ainda destacam que, para que o trabalho com
crianças com TEA seja eficaz, é necessário que, tanto a família quanto os
amigos, tratem a criança normalmente, buscando entendê-la em toda a sua
forma subjetiva e singular de ser e, com isso, tentar ajudá-la em suas
necessidades. Durante as observações, não foi possível identificar esse
tratamento por parte dos colegas e da professora do aluno. Assim, é possível
pensar que o trabalho dentro do contexto escolar causa dificuldades em seu
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desenvolvimento escolar, uma vez que o aluno é excluído pelos demais
colegas e a professora não os incentiva a interagir com o aluno observado.
Além disso, o ambiente escolar é o local onde o aluno constrói sua
identidade e desenvolve suas relações sociais por meio da troca de
informações e interações. (MEAD, apud CAMARGO, BOSA, 2009) e também é
o espaço que mais favorece o desenvolvimento infantil com a mediação e
importância do professor (LEMOS, SALOMÃO, AGRIPINO-RAMOS, 2014).
Incentivar os alunos a se relacionar com o aluno observado é um movimento
de rompimento e quebra de antigos paradigmas e preconceitos históricos
(BEZERRA, 2009) e também uma mudança na forma de olhar o aluno que
necessita uma atenção especial (SERRA, 2004). Por isso, a escola possui
papel significativo para o bom desenvolvimento escolar do aluno com TEA.
Outro fator a ser considerado é a importância da qualidade e do tipo de
relação desenvolvida entre educador e educando. O educador deve ter ciência
das necessidades especiais do aluno observado que, como os outros alunos,
possui uma subjetividade e também apresenta conhecimentos a serem
compartilhados.
Ao considerar a escola como um espaço livre para todos, como propõe
Carvalho (BRASIL, 1999), é necessário que ela possua condições físicas e
profissionais que atendam às necessidades de seu publico. O apoio de alunos
estagiários, como citado pelo relato da Direção da escola, não garante que o
trabalho com o aluno observado seja eficaz, uma vez que os trabalhos dos
estagiários estão limitados por sua qualificação e tipos de atuações permitidas
dentro do contexto escolar.
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Sob o olhar da Psicanálise, é possível considerar o aluno observado
como uma criança que possui um desejo inconsciente e que tal desejo pode
manifestar-se por meio de suas brincadeiras e ações. Em outras palavras, a
Psicanálise volta seu olhar para as condições subjetivas do aluno (VOLTOLINI,
2004), e com isso é possível compreender até mesmo seus momentos de
agressividade, observados ao ser retirado da sala de aula.
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VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Freud (1937/1996) apresenta a educação como uma das três profissões
impossíveis, pois quando o educador emite uma fala, ela está submissa aos
desejos do inconsciente do aluno que a recebe. Além disso, Freud ressalta que
um único método educativo pode não ser bom para todos os alunos. Portanto,
no caso do aluno observado essa afirmação merece ainda mais ênfase, uma
vez que o aluno necessita uma atenção diferenciada, em comparação com
seus colegas.
A Psicanálise é uma ciência que considera a palavra como um elemento
essencial para acessar o inconsciente (FREUD, 1937 / 1996), quando
acessado é possível até mesmo compreender algumas dificuldades que o
aluno possui. No contexto escolar, as palavras dos professores e demais
profissionais dirigidas ao aluno observado terão impacto significativo na vida do
aluno. Por esse motivo, a educação de crianças com TEA torna-se ainda mais
desafiadora uma vez que a comunicação da criança é comprometida e que a
palavra é um elemento importante para o êxito de sua educação.
Embora a tarefa de manter alunos com TEA seja difícil (BASTOS,
KUPFER, 2010), ao realizar um trabalho bem estruturado é possível que a
inclusão escolar também seja um processo terapêutico que beneficiará o aluno.
Quando a inclusão ocorre de maneira adequada, o professor consegue fazer
com que a criança ocupe seu devido lugar social: o lugar de aluno.
O olhar crítico e os estudos desenvolvidos por Freud são capazes de
contribuir para que a inclusão escolar seja um processo de êxito, uma vez que
ela trabalha com a suspensão de crenças e valores, volta o seu olhar para os
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desejos da criança e compreende os desafios concernentes a cada faixa etária
da criança bem como seus impactos durante o desenvolvimento infantil
(FREUD, 1920/1996).
27
REFERÊNCIAS
ALVES, M.M.C.; LISBOA, D.O. Autismo e inclusão escolar. IV Colóquio
Internacional Educação e Contemporaneidade, 2010.
APA. Manual estatístico e diagnóstico dos transtornos mentais. Porto
Alegre: Artimed, 2014.
ÁVILA, L.A. Psicanálise, educação e autismo: encontro de três impossíveis.
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