faces da extincao

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FACES DA EXTINÇÃO UMA EXPEDIÇÃO FOTOGRÁFICA EM TERRITÓRIO INDÍGENA PARESI DIEGO MIGOTTO - KADU SCHIAVO

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expedicao fotografica

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  • FACES DAFACES DAEXTINO

    UMA EXPEDIO FOTOGRFICA EM TERRITRIO INDGENA PARESIdiego migotto - Kadu scHiavo

  • 10 11Faces da extino Faces da extino

    Ao desembarcar, sentimos um ar quente e pesado, era o forte calor de Cuiab que parecia estar acima dos 30C anunciados pelo comandante da aeronave.

    Pela informao que tnhamos, o ltimo nibus para Tangar da Serra, cidade mais prxima da reserva in-dgena que pretendamos documentar, tinha acabado de partir. Aps pegar as malas e chegar no saguo do aeroporto tentamos contato com a rodoviria na es-perana de ter alguma outra linha de nibus para l.

    Tnhamos em mos uma lista com mais de 10 conta-tos em Cuiab, e o telefone de um albergue em caso de precisarmos passar a noite na cidade. enquanto ligvamos incessantemente para esses nmeros um senhor loiro de culos, alto e bem vestido, com cara de estrangeiro, fi cou nos olhando e logo perguntei se a rodoviria fi cava perto do aeroporto, ento ele, identifi cando-se como bispo de Juna, uma cidade um pouco mais para o norte de Tangar da Serra, no s deu a dica para pegarmos um taxi mais barato at a rodoviria, como tambm ligou para a empresa que conhecia para reservar nossas passagens ainda naquela noite.

    As coisas comearam a melhorar, chegando na

    Dia 01 19/07/2011 So Paulo x Brasilia x Tangar da Serra

    ATenO SenHOReS PASSAGeiROS, PRePARAR PARA O

    POuSO nO AeROPORTO inTeRnACiOnAl MAReCHAl ROn-

    dOn de VRZeA GRAnde, MATO GROSSO. SO 18 HORAS,

    O TeMPO eST BOM e A TeMPeRATuRA lOCAl de 30C

    rodoviria e j com as passagens compradas, foi a hora da cerveja. naquele calor infernal com pouco mais de 25 quilos de bagagem de cada um, entre mochilas e malas de mo, uma lata de cerveja desceu to bem quanto um copo dagua no deserto. Fizemos ali nossa ltima refeio do dia, alguns pastis e mais algumas latas de cerveja.

    Chegou o nibus, e com ele mais uma surpresa, era mais confortvel que os dois avies juntos que anteriormente tnhamos voado. estvamos to cansa-dos que as quatro horas de viagem passaram como se fossem em segundos. Chegamos em Tangar da Serra por volta da meia noite e meia, ento pegamos mais um taxi e fomos para um hotel prximo sede da FunAi. no era cinco estrelas, por sinal, acho que nem estrelas tinha, a televiso do quarto no funcio-nava assim como a descarga do banheiro, sem falar no calor matogrossense que fazia o quarto parecer uma sauna, no poderamos esperar nada melhor pelo preo de 45 reais por um quarto para duas pes-soas com caf da manh incluso, tambm j era uma preparao para quem iria passar as prximas noites em ocas, redes e barracas.

    legendA descrevendo As distnciAs-resserni tAberioris, sente, quos hos, ommoenimus et; hos, que remus. cAtuus FActArb iturnim mo niumenAtAm dis Ad

    rentebeFFre, duciortAbem hAchuid porA

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    Aps uma cansativa noite, pois ainda no estva-mos preparados nem acostumados a dormir em re-des, amanheceu, e os raios de sol estavam entrando diretamente pela pequena porta da oca, galos canta-vam, enfim, era hora de levantar.

    Resolvemos montar nossa barraca de acampa-mento, pois ainda no sabamos onde iramos dormir as prximas noites, ela seria nosso abrigo garantido nos prximos dias. Foi quando surgiu uma camionete azul, grande, era outra Toyota Hilux, parou prximo a ns, e um senhor de idade com uma voz cansada e fa-lando pausadamente, com os olhos quase fechados, estatura baixa, com uma calvice que avanava at o meio de sua cabea, mas com os poucos cabelos que lhe restavam compridos, vestia uma camisa azul com apenas alguns botes abotoados, uma cala social velha e mal fechada presa por um cinto de couro, que mostrava parte de sua roupa ntima, desceu e veio em nossa direo j nos questionando sobre quem ra-mos e o que estvamos fazendo ali. J imaginando que seria o cacique Joo, pai de Carlito, ficamos in-timidados, e explicamos cautelosamente que estva-mos l para realizar nosso trabalho de concluso de curso da faculdade e que iramos passar alguns dias na aldeia. Tambm nos perguntou se Carlito tinha conhecimento de que estvamos ali, dissemos que sim, que havia sido ele quem nos acomodou l.

    Tendo compreendido que estaramos ali para fazer nosso trabalho, cacique Joo, com um portugus bem confuso e pausado, aparentando que pensa muito mais do que fala, comeou a nos contar al-gumas histrias do tempo da colonizao, de como os ndios foram dizimados por eles, homem branco chegava, levava nossos antepassados para trabalhar, ai ndio era difcil de obedecer e muitas vezes era morto. J fiquei sabendo de histria de portugueses que pegavam ndio no lao, que nem animal. Con-tou tambm diversas histrias sobre Marechal Ron-don, por incrvel que parea at mesmo de quando ele instalou a linha de telgrafo no noroeste do Brasil em meados de 1910, o que nos despertou curiosi-dade sobre a idade de Joo, e quando perguntado, disse no saber ao certo sua idade, mais acredita que ter mais de cem anos.

    Por alguns minutos o cacique nos contou algumas histrias do povo Pares e entre elas citou diversas vezes a Ponte de Pedra, que pela lenda, origem do povo Pares-Haliti, e segundo ele, fonte do comeo do mundo. Todas as vezes que ele referia-se ao lo-cal demonstrvamos interesse sobre o lugar, sempre questionando mais.

    perto daqui? Seria muito bom para nosso trabal-ho se consegussemos conhecer este lugar, pergun-tou Kadu na esperana de um convite.

    Cacique Joo olhou para o Sol e disse se sairmos agora, chegaremos l antes do meio dia. Sem perder tempo, Kadu completou, Pena que no temos carro para ir, se tivssemos a oportunidade ns pagaramos o combustvel inclusive.

    Joo no tm muita expresso facial, ficou um tem-po calado e disse vou falar com Carlito, quem sabe ele leva vocs l. O cacique geral saiu e alguns minu-tos depois retornou com a melhor notcia da viagem, vamos esperar o Carlito e vamos para l.

    Percebemos que o cacique geral ficou empolga-do com a ideia, no mais que a gente, claro. Mal comeou o dia j conseguimos a simpatia do cacique geral dos ndios Paresis e o passaporte para um local sagrado da cultura deles.

    Ficamos to empolgados com a oportunidade que corremos para montar os equipamentos de ilumina-o e separar somente o essencial. Afinal, ainda es-tava tudo nas malas, desmontado e de forma com-pacta para no ocupar muito espao. Testamos a luz dos flashes rapidamente, foi o tempo de trs cliques para que o cacique chegasse com o motorista e mais dois rapazes nos apressando. Carlito no chegava e teramos que partir sem ele, talvez encontremos ele no meio do caminho, ai ele vai com a gente comen-tou o cacique Joo.

    Foi quando conhecemos Salomo, motorista da ca-mionete, um ndio da aldeia de Kottico, seus traos aparentavam uns 35 anos, talvez um pouco mais velho por conta do bigode. Vestia cala jeans, camiseta e bon, falava um portugus fluente e cantado, assim como todos os outros Paresis. Salomo j chegou co-brando a nossa autorizao:

    Dia 03 21/07/2011 - Cacique Joo ArrezomaePonte de Pedra e a Origem do Mundo - Pedgio

    ReClAMO e FAlO O que SinTO PORque TenHO BOCA PARA

    FAlAR. VeAdO e eMA nO POdeM FAlAR PORque SO BixOS

    Joo ArrezomAe, mAis conhecido como Joo gArimpeiro, cAcique gerAl do povo pAres-hAliti

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    - qual o seu objetivo aqui? Vocs esto com a au-torizao da Funai?

    - estamos sim - respondeu diego. Vou pegar ali na barraca.

    Salomo professor das sries iniciais na aldeia em que vive e foi o nosso motorista durante todo este dia.

    enquanto diego explicava a proposta do nosso tra-balho e mostrava a autorizao ao ndio, eu estava fechando as mochilas e separando o material.

    Colocamos o softbox (equipamento usado para iluminar juntamente com o fl ash) na caamba, onde estava ao lado um arco e fl echa e uma sacola, que por um buraco conseguimos perceber que guardava couro de uma Ona Pintada.

    A viagem foi longa e cansativa, samos pela BR 365 (trecho da transamaznica) e fomos em direo a ci-dade de Campo novo dos Paresis. Chegando l mais uma estrada de terra, bem acidentada e empoeirada, entre as lavouras de gros.

    no meio do caminho uma surpresa. em meio a tanta correria, havamos esquecido a carteira na aldeia. Mas felizmente, diego, aps muita conversa, convenceu o pessoal do posto que passaramos outro dia para pagar o total de R$ 127,00 de leo diesel que foi pre-ciso para encher o tanque da camionete.

    durante a viagem tivemos a oportunidade de con-versar melhor com o cacique Joo Arrezomae, mesmo com seu portugus cantado e pausado, e de difcil compreenso. Como de costume entre todos os n-dios Paresis, eles s conversam entre si em Aruak sua

    lngua me. Mas a infl uncia do homem branco j est presente inclusive quando comunicam-se em seu dia-a-dia, j que em meio seus dilogos sempre perce-bamos algumas palavras em portugus, foi quando perguntamos ao professor Salomo, que estava dirig-indo o carro, por que essas palavras em portugus, algumas palavras no existem em nossa lngua, so coisas de homem branco explica Salomo.

    durante a viagem conseguimos a confi ana do caci-que geral e assim conhecemos um pouco mais sobre a cultura Paresi.

    - existe alguma aldeia na Ponte de Pedra? per-gunta Kadu.

    - Aytio! este o nome da aldeia. Ponte de Pedra o nome que vocs (brancos) deram para ela, conta Salomo.

    Chegando na trilha que da acesso a aldeia Aytio, uma vegetao mais densa, muitas rvores em uma mata mais fechada, to densa que praticamente tn-hamos que parar o carro. durante o caminho conse-guimos avistar algumas emas, porco do mato e at mesmo veado do campo. A estrada tinha pouca ma-nuteno. Muitas rvores, buracos e eroses que com

    descuido poderia encalhar inclusive a camionete que estvamos.

    Ao chegarmos, avistamos uma aldeia somente de hatis e sem energia eltrica, infelizmente no foi pos-svel fazer fotos deste lugar, pois o cacique da aldeia, Walter, no estava presente para nos autorizar. Assim que chegamos fomos convidados por duas mulheres para entrar em uma das ocas e tomar caf. A aldeia habitada por 7 pessoas, todos fi lhos de ndios. en-quanto tomvamos caf preto, eles expunham suas difi culdades para que cacique Joo tomasse alguma providncia, conversando em portugus, j que ne-nhum dos ndios presentes na aldeia falava em Aruak devido a forte aculturao daquela aldeia.

    depois do caf, descemos de camionete at perto da ponte. de longe, j era possvel ouvir o barulho de uma cachoeira. Ao aproximar, um barulho semel-hante ao de troves que aumentava conforme nos aproximvamos das corredeiras. um rio enorme, com grande volume de gua limpa e transparente caia de uma cachoeira com vrios metros de altura formando um spray dagua no ar.

    Joo tenta nos mostrar algumas marcas no cho, e diz que onde estamos pisando era um cemitrio in-dgena. Algo realmente impressionante. uma ponte inteira de pedra macia por cima de um rio com corre-deiras muito fortes e um volume imenso de gua. O cacique nos avisa que ao lado desta ponte existia

    outra semelhante, mas a fora das guas acabou der-rubando-a.

    Joo nos detalhou a histria da ponte e nos mostrou a fenda, por onde se teve a origem do mundo, se-gundo sua cultura. ndio tem prova do surgimento do mundo afi rmava o velho cacique apontando para a fenda.

    Subimos um pouco mais no rio para tomar um ban-ho e fazer mais algumas fotos, a gua lmpida permi-tiu imagens incrveis.

    Aps entrarmos no rio, ouvimos a histria da ponte e fotografamos o cacique Joo Arrezomae, quando ele nos permitiu. Realmente foi um privilgio conhec-er aquele lugar, que com certeza foi um dos grandes pontos fortes da viagem.

    na volta encontramos com outra camionete no meio da estrada. Como de costume, os ndios param o carro ao lado para reconhecer quem estava pas-sando pelas terras indgenas. era um homem, que segundo A mitologiA pAresi, A vidA no mundo teve origem A pArtir de umA FendA nestA ponte

    corredeirAs do rio sAcuri-in conhecido tAmbm como rio ponte de pedrA

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    Antigamente no existia ningum, s enor, que tinha uma filha e um filho. quando seus filhos foram buscar gua para ele, escutaram um barulho e a terra estremeceu.

    eram os Pares-Haliti querendo sair de dentro de uma rocha nas proximidades de uma ponte natural de pedra, localizada no Rio Sucuruna.

    O primeiro Pares estava ali, danando com as flau-tas sagradas, at que um pequeno pssaro voou para fora da pedra por uma fenda, retornando mais tarde para dizer aos outros como era bonito l fora.

    ento Wazre, o heri mtico, persuadiu vrios pssaros e animais para que aumentassem a fenda para que todos pudessem sair. um grupo de irmos saiu do interior da terra por uma abertura na rocha, transportando-se do mundo subterrneo onde vivia para outro, situado acima, que viria a constituir-se no mundo Haliti.

    esses irmos contriburam, de formas diversas, para a conformao desse mundo. eram eles: Wazre, Kamazo, Zaklo, Zalya, Zaolore, Kno, Tahe, Ka-maihiye.

    Halti. Mas havia um homem, chamado Kuytihor, que no arrancou todos os seus pelos corporais. este homem era rico: tinha gado, cavalos e ferramentas de ao, que ofereceu para compartilhar com Wazre.

    ele deixou Wazre zangado, e este disse: eu no quero gado, porque eles vo sujar o espao em fr-ente s casas dos meus filhos. no quero ferramentas porque elas so envenenadas e vo matar meus fil-hos. Vocs vo para o outro lado da ponte de pedra, e no se misturem com os Pares. Kuytihor foi para longe e ficou com os brancos e teve muitos filhos.

    Ao final do processo de transformao, os irmos sados da pedra se tornaram aptos a manter relaes sexuais e procriar. Wazre e seus irmos encontraram as filhas do rei das rvores (Atyhiso) e com elas se casaram.

    essas, por sua vez, tambm no se encontravam completas, isto , seus corpos no estavam prontos para copular e conceber. O processo de humaniza-o das mulheres se fez atravs dos maridos, que detinham os instrumentos necessrios para torn-las halti (ser humano do sexo feminino).

    Ponte de Pedra - Mito da Criao

    O primeiro a sair foi Wazre, o mais velho dos ir-mos, que orientou a sada dos mais novos e cuidou de sua instalao em diversos locais do novo mundo que descortinavam.

    O mito revela que esse mundo existia antes de Wa-zre chegar, mas que foi por seu intermdio que pode ser apreendido cognitivamente e, portanto, habitado pelos Halti. As cabeceiras, os rios, os pssaros, as r-vores e as flores estavam l, mas foi Wazre quem as denominou.

    quando saram da pedra, os irmos tinham uma aparncia singular: eram peludos, possuam rabos, tinham dentes compridos e membranas entre os de-dos das mos e dos ps sugerindo que estivessem em um estado quase humano.

    Acontecimentos diversos ocorreram para a transfor-mao da aparncia dos irmos, num processo gra-dativo que contou com o auxlio de seres do mundo animal (cutia, mutuca e formiga), que moldaram os corpos dos ancestrais para que atingissem a forma

    utilizando-se de um dente de paca, os homens modelaram a vagina das mulheres, tornando-se seus criadores. As mulheres tambm participaram da hu-manizao dos seres mticos, uma vez que foram elas que ordenaram s mutucas que modificassem o rgo sexual masculino, de forma a adequ-lo ao ta-manho de suas vaginas.

    Os frutos destas unies foram os halti Kozrini (filhos de Kamzo), os Kazniti (filhos de Zolore), os Warre (filhos de Kno), os Kwali (filhos de Tahe) e os Wimare (filhos de Zkalo e Zalya). Wazre no gerou filhos e Kamaihye tambm no deixou descen-dentes; os Wimare so filhos de dois irmos que mantiveram relaes sexuais com a mesma mulher.

    Os Kozrini, Kazniti, Wimare, Kwali e Warre nasceram completamente humanos, o que est claramente expresso na noo de Haliti (gente gnero humano), que aplicada para a totalidade de seus descendentes. Wazre destinou a cada irmo um territrio determinado, dando surgimento a grupos sociais especficos.

    JAo ArrezomAe mostrAndo A FendA dA ponte de pedrA.

    ndio tem prova do comeo do mundo, homem

    branco diz que tem, mas no tem, Joo Arrezomae

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    guiava alguns turistas at a Ponte de Pedra. Salomo conversou um pouco com ele e pediu uma ajuda para colocar combustvel em seu carro, o homem hesitou mais no final acabou dando R$ 50,00 para o professor. Perguntamos quem era, mas desconversaram. disse que era um ndio que casou com uma mulher branca e foi viver na cidade. depois disso muitas conversas em Aruak, nas quais a palavra haliti e mahaliti que sig-nificam definies para homem branco apareciam com frequncia.

    no caminho de volta, aproveitamos para tirar algu-mas dvidas com o professor e o cacique:

    Como surge um cacique? perguntamos. Caci-que o dono da aldeia, o fundador. ele quem cuida de lutar pelos interesses de seu povo. respon-deu Joo. Reclamo e falo o que sinto porque tenho boca para falar. Veado e ema no podem falar porque so bixos. completa.

    Joo Arrezomae foi reconhecido pelo estado como o primeiro Pares a lutar pelos direitos de terras ind-genas. quando Marechal Rondon saiu, disseram que o Pares tinha acabado. eu fui de nibus at o Rio de Janeiro, duas vezes, para falar com a filha do Marechal e lutar pelos direitos da nossa terra.

    - e o futuro do ndio Pares? - questionamos.

    Antes que o cacique respondesse, Salomo se an-tecipou, se o ndio no se preparar vai ficar muito difcil a sobrevivncia, porque a cada ano que passa acontecem muitas coisas, nosso territrio, por exem-plo, se deixarmos, com certeza o governo vai querer lotear, e a sobrevivncia vai ficar mais difcil porque nos no temos mais caa, no temos mais pesca, os impactos ambientais j esto complicando cada vez mais o nosso meio, tanto quanto impacto ambiental quanto o impacto social, ento isso poder dificul-tar, desabafa.

    Antes de saber que iramos passar pelo pedgio, resolvi soltar uma pergunta que estava entalada na ponta de nossas lnguas desde a conversa com Ara-jo, motorista da Funai.

    - Vocs tm um pedgio? - Perguntou Kadu, com receio de estar fazendo a pergunta no momento er-rado.

    - Temos sim respondeu o cacique em um tom um pouco alterado Mais o pedgio nosso direito, a estrada passa no meio de nossas terras, nos trouxe muitos problemas. Se resolverem tirar o pedgio de l, ns derrubamos a ponte que d acesso a rodovia que corta a reserva.

    Mesmo sem entender muito o que ele queria dizer com essa historia de pedgio e ponte, continuamos perguntando.

    - Mais esse dinheiro da arrecadao, vai todo para os ndios?

    - Sim, cada aldeia tem um dia e horrio no pedgio, com esse dinheiro que investimos na educao dos ndios, pagamos faculdade. uma parte desse dinheiro vai para a associao, para melhorias em nossa aldeia.

    Por muita coincidncia, alguns minutos depois desta conversa, chegamos ao pedgio. Paramos de pergun-tar para que os ndios pudessem conversar e tomar um caf. Como de costume as conversas so sempre em Aruak. enquanto isso tivemos a oportunidade de fotografar, de forma discreta e com nossas cmeras compactas, o tal pedgio. usamos as cmeras com-pactas para no correr o risco de intimid-los e causar desconforto com as cmeras profissionais.

    A estrada, de mo dupla e estreita, porm asfaltada e aparentemente em timas condies, passa bem no meio da reserva indgena. logo no comeo da estrada ela passa sobre o Rio Verde, o mesmo que corta a aldeia em que estvamos instalados, alguns metros pra frente um barraco de madeira com uma varanda, dentro dele algumas redes. no existe nen-huma cancela que obrigue o motorista parar, apenas um sonorizador no cho e uma placa de sinalizao alertando para o pedgio.

    O cobrador ficava sentado em uma cadeira de praia beira da estrada, com um colete e um bloco de re-cibo em mos. Assim que avista um veculo cruzando a ponte que antecede o pedgio, ele se levanta rap-idamente e vai para o meio da rua para fazer a ar-recadao.

    Somente os carros que entram pagam pedgio, Se-gundo o cacique Joo, existe outro pedgio em outro ponto da estrada para os veculos que transitam em sentido contrario.

    A cobrana no pedgio funciona da seguinte forma:

    Motos R$ 10,00

    Carros R$ 20,00

    Caminhes R$ 30,00

    Seguimos viagem e mesmo sem perguntar mais nada, o cacique reclamou. dificil, esses fazendeiros no pagam o pedgio, e quando pagam do mixar-ia.

    - Mas eles no so obrigados a pagar? insistimos

    - Sim, mais no so todos que pagam lamentou Joo.

    Mesmo assim, durante os 5 minutos que ficamos por l, passaram trs caminhes e um carro. Fiquei atento para ver se todos pagavam, e pela pequena amostra que observamos, no vimos nenhuma re-sistncia taxa cobrada.

    Mais a frente o cacique aponta uma placa enorme

    O pedgio nosso direito, a estrada passa no meio de nossas terras,

    isso nos trouxe muitos problemas - Joo Arrezomae

    Se resolverem tirar o pedgio de l, ns derrubamos

    a ponte, afirmou o cacique geral

    cAdA AldeiA tem direito A um diA e horrio de ArrecAdAo no pedgio, segundos eles, esse dinheiro revertido pArA A educAo dos pAress e pArA melhoriAs nAs AldeiAs

    ponte que pAssA sobre o rio verde guAritA de cobrAnA do direito de pAssAgem em terrA indgenA

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    que corta a rodovia empolgado e diz meu nome, a estrada que passvamos tinha seu nome, Rodovia Joo Arrezomae. Sinal de reconhecimento pelos direitos ind-genas batalhados pelo velho ndio.

    em uma entrada a esquerda, poucos quilmetros depois do pedgio, entramos em uma rua de terra com destino a aldeia quatro Cachoeiras, que antigamente se chamava Trs Cachoeiras, mas descobriram outra recentemente. nesta aldeia o cacique narciso Kazoezae, irmo mais novo de Joo Garimpeiro.

    Paramos a camionete em frente a oca do cacique. era uma hati tradicional, grande, com algumas redes, bancos de madeira e fogo. Sentamos em um banco perto da porta enquanto os ndios conversavam em sua lngua mais para dentro da oca.

    um cheiro de fritura tomou conta do local, uma das ndias presentes estava fazendo uma fritada de lambari para servir aos visi-tantes.

    narciso tem xx anos, possui traos semel-hantes aos de Joo e fala muito bem o por-tugus. Com uma voz empostada comeou logo o seu discurso, expondo e reclamando incessantemente sobre o que o homem branco estava ocasionando na reserva ind-gena, falava muito sobre o pedgio e sobre ajudas negadas.

    impressionante como os ndios gener-alizam quando falam do homem branco, do jeito que narciso falava, parecia at que a culpa de estarem querendo tirar o pedgio era minha e do diego.

    Apesar de seu discurso meio bravo, quando pedi-mos para tirar algumas fotos, narciso foi muito pres-tativo. no gosto de tirar foto assim, ndio tem que tirar foto vestido que nem ndio frizou o cacique, fazendo com que diego e eu ficssemos empolgados quando avistamos um cocar de penas de arar azul pendurado na parede.

    Samos da hati para montar as coisas e testar a luz, enquanto o cacique narciso se trocava. Para nossa sorte, era fim de tarde e tnhamos a luz do pr-do-sol ao nosso favor.

    Com os equipamentos a postos, narciso saiu da hati como quem iria caa. Vestia um cocar de penas de arara na cabea, um cinto com penas de ema na cin-tura e o que mais chamava a ateno era um casco de tatu que cobria seu peito, tudo isso contrastando com um relgio de pulso que usava no brao esquerdo.

    Perguntas feitas, imagens registradas, era hora de partir. quando nos despedimos narciso, ele pergun-tou, no vo querer levar nada? um artesanato ou um cocar?

    Vontade no nos faltou, mais havamos esquecido nossa carteira na aldeia Rio Verde. Por curiosidade perguntamos o preo de um cocar de penas de Ara-ra, saia por R$ 175,00.

    na volta demos carona para um velho ndio que fi-cou na aldeia Chapada Azul, caminho de volta para a aldeia que estvamos instalados.

    Chegamos na aldeia Rio Verde exaustos, foram praticamente 350 quilmetros percorridos, foi o tem-po de baixar as fotos no computador, escrever um pouco e sermos vencidos pelo sono. Muitas vezes dormamos com cadernos e computador nas mos, ficvamos escrevendo noite a dentro apenas com a luz de uma lanterna presa no topo da barraca aperta-da em que passamos algumas noites.

    nArciso sAiu dA hAti como quem iriA cAA. vestiA um cocAr de penAs de ArArA nA cA-

    beA, um cinto com penAs de emA nA cinturA e o que mAis chAmAvA A Ateno erA um cAsco

    de tAtu que cobriA seu peito, tudo isso contrAstAndo com um relgio de pulso que

    usAvA no brAo esquerdo

    nArciso KAzoezAe, cAcique dA AldeiA trs cAchoeirAs e irmo mAis novo de Joo ArrezomAe

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    Resolvemos acordar cedo e tentar pegar a primeira carona para a aldeia, at ento indefinida. estvamos preocupados, j que nossa autorizao havia sido negada pelo cacique da aldeia Formoso, que inicial-mente seria nosso destino. durante o caf manh, ai-nda no hotel, apareceram dois sujeitos com traos in-dgenas que aparentavam ter entre 30 e 40 anos. eram 6h20 da manh e ambos estavam de culos escuros. um deles estava com uma camiseta laranja cheia de estampas por dentro da cala jeans apertada, e um cinto de cowboy, o outro, com a mesma vestimenta s que com uma camiseta preta, com estampas um pouco mais discretas. enquanto serviam-se para o caf, conversaram em uma lngua que acreditvamos que seria Aruak (lngua dos ndios da etnia Pares-Haliti). Os senhores sentaram-se na outra ponta da mesa. durante uma rpida conversa descobrimos que ambos eram ndios Paresis, da aldeia Kottico, e tiveram que passar a noite na pousada j que a ofi-cina mecnica no conseguiu entregar o carro deles no horrio prometido no dia anterior.

    Continuamos a conversar com os dois ndios e fo-mos descobrindo mais coisas, como por exemplo que a aldeia Rio Verde, onde provavelmente iramos pas-sar os prximos dias, j era civilizada e possuia at energia eltrica.

    esse foi nosso primeiro contato com os ndios da regio. Confesso que no foi nem um pouco anima-dor.

    Ao chegar na Funai, por volta das 7h30 da manh, mais um imprevisto. Ainda dependamos de mais uma autorizao, a do cacique Carlito, liderana da aldeia Rio Verde, que s retornaria depois do almoo.

    Retornamos sede Funai mais tarde, por volta das 11h, j com as malas em mos para tentar demonstrar que estvamos prontos. Tivemos contato com mais dois ndios na sala de espera, um de Formoso e outro de Rio Verde. Ambos de cala jeans e camiseta, fa-lando um portugus fluente.

    Dia 02 20/07/2011 - Tangar da SerraPrimeiros contatos com ndios Pares-Haliti

    cAcique cArlito, em Frente de suA gArAgem e cAminhonete. Ao Fundo, A hAti de seu Filho ednelson, onde pAssAmos A primeirA noite nA AldeiA rio verde.

    fotografava o mapa da reserva indgena, daniel retor-nou e disse que o cacique estava nos esperando na sala do Aldenir, diretor desta sede regional da Funai, para conversar.

    quando imaginvamos um ndio, nos vinha em mente um povo que andava pelado e caava para comer, at agora, as impresses que tivemos foram bem diferentes.

    A expectativa para conhecer o cacique era grande, j que nosso ingresso na terra indgena dependia ape-nas da aprovao dele. entrando na sala encontramos um sujeito bem vestido, com camisa social azul, cala jeans e sapato, com os culos escuros pendurados na camisa. As nicas caractersticas que nos faziam reme-ter a figura de um ndio era seu rosto, cabelo preto escuro, sua pele escura e uma pulseira de artesanato indgena amarela, verde e azul no brao direito.

    A conversa foi tranquila e acabamos descobrindo que um dos motivos que estava causando rejeio de nossa entrada em terras indgenas era o nome do

    projeto, a palavra extino estava causando uma m impresso nas nossas intenes, ainda mais que toda a etnia estava em luto devido ao falecimento de alguns ndios da reserva.

    depois de explicar detalhadamente nossos obje-tivos com o trabalho, conseguimos aval para viajar at a aldeia Rio Verde s 16h. A viagem nos custou 40 litros de leo diesel para a camionete da Funai e alguns fios de cabelo a menos pela espera, demora e ansiedade.

    O caminho para aldeia foi tranquilo porm o cansao inevitvel, cerca da 150 km de estrada, sendo metade deles na BR 365, tambm conhecida como trans-amaznica, uma estrada de terra, sinuosa e de mo nica em meio a imensas plantaes cereais, que se perdiam no horizonte. Vrios quilmetros mais tarde e depois de passar por muitos buracos no apertado banco de trs da camionete, Arajo apontando para uma ponte, disse que a aldeia era logo depois dela. Se j estivesse de noite, daria pra enxergar as luzes

    Perguntei ao que aparentava ser mais novo, nel-sinho, o que ele fazia e ele sorriu dizendo eu? in-dagou Voc ainda pergunta? eu moro la! Talvez incomodado pelo fato de no termos percebido que havia uma liderana/cacique por trs daquele senhor de bigodes grisalhos.

    O outro, um senhor bem mais velho, com o rosto j caracterizado pela idade, que aparentava ter cerca de 70 anos, nos disse em um portugus embaralhado por sua falta de dentes, que foi para a cidade para conseguir dinheiro para arrumar um carrinho.

    Foi quando conhecemos o Sr. Arajo, motorista da Funai, um senhor bem humorado e prestativo, de ca-belos ralos e brancos, que preferia ser chamado so-mente de Arajo. ele nos levou at um restaurante para fazermos nossa ltima refeio antes de ingres-sar em terras indgenas. durante a carona, Arajo nos contou algumas coisas que nos deixou um pouco mais desanimados. Sinceramente, se eu fosse fazer um trabalho para uma universidade, eu escolheria uma aldeia de Rondnia. lembrando mais uma vez que a aldeia que iramos era civilizada, possuia ener-gia eltrica e carros. eles tm 4x4, aquela Hilux que parou na porta da Funai do Cacique completou.

    Arajo nos deixou em frente a um restaurante no centro de Tangar da Serra, sem saber quando e onde seria nossa prxima refeio, comemos feitos mortos de fome.

    Mais tarde, de volta sede da Funai, enquanto es-pervamos o cacique Carlito, conhecemos mais um ndio, daniel, um senhor com barba rala e branca, que tem por funo intrprete bilngue da Fundao nacional do ndio, simptico e prestativo, logo nos convidou para conversar em sua sala. ele nos esclare-ceu muitas dvidas, alm de nos contar um pouco das histrias do povo Pares, entre elas a lenda da Ponte de Pedra, que contaremos no prximo captulo.

    depois de uma longa conversa, daniel saiu da sala e foi ver se o cacique j tinha chegado, enquanto diego

    quAndO eu iMAGinAVA uM ndiO, Me VinHA eM MenTe uM

    POVO que AndAVA PelAdO e CAAVA PARA COMeR, AT AGORA,

    AS iMPReSSeS que TiVeMOS FORAM BeM diFeRenTeS.

  • 14 15Faces da extino Faces da extino

    de longe J erA possvel AvistAr umA ocA, ou hAti em AruAK, que contrAstAvA com

    AlgumAs cAsAs de mAdeirA e AlvenAriA.

    plAcA dA FunAi nA entrAdA dA reservA indgenA.

    de longe completou o motorista, nos desanimando ainda mais.

    Ao cruzarmos a ponte do Rio Verde, entramos em uma entrada direita, onde havia uma placa da Funai, enferrujada e queimada, onde dizia Terra indgena Pares - Acesso interditado a pessoas estranhas, de longe j era possvel avistar uma oca, ou hati, na ln-gua Aruak, que contrastava com algumas casas de madeira e alvenaria.

    descemos do carro com as pernas moles devido ao aperto que passamos no banco de trs; cinco malas mais dois fotgrafos e um bocado de comida, soma-dos a uma estrada de cho batido, sinuosa, cheia de buracos entre lavouras que pareciam no ter fim.

    Chegamos na aldeia junto com o cacique Carlito em sua camionete prata, uma Toyota Hilux 4x4 turbo diesel. Paramos em frente sua casa, feita madeira e al-venaria, toda pintada de verde escuro e com as jane-las azuis.

    J na aldeia, ainda tivermos a oportunidade de ver o sol se pr no horizonte. O cacique saiu de sua casa um pouco mais a vontade, sem a camisa azul e o sapa-to social, nos acomodou em duas redes que ficam em

    um quiosque, ao lado de sua casa. J devidamente acomodados comeamos uma conversa informal na qual Carlito contou alguns dos pontos positivos e negativos da influncia do homem branco na vida in-dgena. Para ele, hoje inevitvel no ter acesso aos mesmos recursos que o homem branco tem, mesmo que o ndio quisesse se isolar, no conseguiria mais, no existem mais as caas fartas como antigamente, os rios esto um pouco mais secos e contaminados com agrotxicos, desabafa o cacique referindo-se as lavouras das fazendas da regio que avanaram pelas matas onde havia fartura de animais para caar. nos-so espao est cada vez mais reduzido, temos apenas essa reserva delimitada em tamanho para vivermos completou.

    Ainda tnhamos algumas curiosidades em relao as tradies indgenas, ou ainda quando, e se, os n-dios pintavam-se para a caracterizao. Carlito, ainda na rede em baixo do quiosque com teto de palha, nos contou que as caracterizaes acontecem em al-gumas celebraes apenas, como quando a menina menstrua pela primeira vez, que tambm celebrada a festa da Menina Moa por exemplo.

    Tambm h um jogo tpico dos Pares-Haliti, o ca-beabol, um jogo de futebol que ao invs de serem usados os ps para jogar, usada apenas a cabea, sen-do que para chutar necessrio se arremessar no cho. este esporte praticado somente durante as festas.

    Carlito se comprometeu em nos apresentar ao seu pai, o cacique geral do povo Pares, Joo Arrezomae mais conhecido como Joo Garimpeiro, que mais tarde iria nos surpreender chegando na aldeia Rio Verde bem no momento que o cacique Carlito, seu filho, estaria ausente.

    enquanto conversvamos sobre a influncia do homem branco dentro da aldeia, algumas vezes fomos interrompidos por uma msica alta, vinda de uma casa de madeira distante, dentro da aldeia. Fato que apa-rentemente incomodava tambm o cacique Carlito, que dizia ns orientamos eles para no fazerem isso, para colocarem a msica apenas para que eles mesmos ouam, mas dificil lamentou o cacique enquanto a msica alta contrastava com algumas falas do cacique.

    J era noite e o sol tinha acabado de dar um espetcu-lo de cores enquanto desaparecia no horizonte, quando Carlito nos deixou e foi para sua casa, nos acomodamos nas redes do quiosque e deixamos as malas dentro da

  • 16 17Faces da extino Faces da extino

    esquerdA, hAti de ednelson, Ao centro quiosque onde FicAmos AcAmpAdos durAnte A expedio. direitA A cAsA do cAcique cArlito.

    hati do seu filho ednelson. Cerca de uma hora depois, Carlito retornou e nos ofereceu arroz, aceitamos, en-trando em sua casa, um cheiro bom de carne refoga-da, vimos que nas panelas havia muito mais do que arroz para comer, eram 3 panelas grandes, as duas maiores com arroz e feijo e a menor com um pouco de carne, foi quando Carlito foi at o fogo e disse que aquela carne era comida tpica deles, carne de ema, sem pensar duas vezes, esperimentamos e apro-vamos, saborosa, ela tem aparncia mais escura que carne de vaca e um sabor mais forte tambm.

    Aps nos servir, sentamos nos bancos que haviam em frente a televiso e ficamos observando os detal-hes da casa. em cima da estante da televiso tinham vrios trofus e ao lado um smbolo do flamengo, per-guntamos sobre aquilo tudo e Carlito disse que eram trofus de torneio de futebol da aldeia e que grande parte de sua famlia flamenguista, talvez por infun-

    cia da Tv Globo do Rio de Janeiro, que passa naquela regio. Aps terminarmos nossa refeio pergunta-mos onde poderamos lavar a loua suja, j que no vimos pia nem torneira dentro da casa, Carlito disse que poderamos deixar em cima da mesa dando a en-tender que suas filhas iriam lavar mais tarde.

    estvamos montando as redes para passar a noite no quiosque quando o cacique ofereceu a hati de seu filho para dormir, uma oca grande, sem divisrias, feita de madeira com folhas secas e tranadas de Guarir-ba, uma rvore semelhante a uma palmeira, tpica da regio. Pensando que seria a nica chance de dormir numa oca no hesitamos em aceitar, dormimos em redes presas nas colunas de sustentao da hati e por mais calor que fosse no Mato Grosso durante o dia, passamos um pouco de frio, embora a hati e as redes estivessem nos protegendo.

    Fontes de renda do povo paresi Haliti- Funcionrios pblicos - a maioria so fun-cionrios do governo. existem trs categorias municipal, estadual e federal. eles trabalham den-tro da aldeia como enfermeiro, professores, na area da sade e educao- trabalHadores rurais - trabalham nos arren-

    damentos de terras ou em fazendas vizinhas.- arrendamento de terras - arrendam terras para fazendeiros, onde tem direito a uma porcent-agem em cima dos lucros- pedgio - cada aldeia tem dia e horrio na ar-

    recadao em dos dois pedgios localizados na rodovia Joo arrezomae - mt 237. esse dinhei-ro administrado pela associao haliti e con-vertido para melhorias para o povo parasi-haliti.

    - O a vida no mundo surgiu a partir de uma fenda em na Ponte de Pedra;

    - A aldeia possui energia eltrica e gua de poo artesiano;

    - Possui escola e posto de sade;

    - Internet na sala de aula;

    - possum carros e camionetes;

    - esto em contato com a civilizao h mais de 300 anos;

    - falam sua lngua me aruak, mas grande parte tambm fala o portugus.

    hAti de ednelson, Filho do cAcique cArlito, As redes e Acessrios indgenAs contrAstAm com A cAmA box e A televiso

    Curiosidades sobre os ndios Pares

  • 18 19Faces da extino Faces da extino

    Sexta- feia 23/7/20011 entrevista CarlitoO que ser ndio hoje?

    O ndio hoje busca estudar, ter conhecimento, influncia homem branco.

    Porm o ndio quer se especializar e continuar na aldeia, at mesmo para que a cultura e a prpria tribo Paresi continue existindo.

    qual o papel do ndio dento da aldeia?

    Hoje em dia mudou tudo, porque no passado cada aldeia tinha sua liderana que era uma pessoa mais antiga e muito respeitada por todos os membros daquela localidade. no tabalho eram todos unidos, tanto no tabalho de plan-tio, como na caa, pesca e colheita de frutas.

    naquela poca no existia a preocupao da aproximao do povo no-indgena. Portanto o ndio tinha uma vida saudvel e sem preocupao. Se houvesse algum problema, no importando a hora que acontecesse, o mem-bro da aldeia podia procurar sua liderana.

    Hoje, com o aproximamento do homem branco, objetos e meios de comu-nicao, a nao indgena em geral est passando por um momento onde h aculturao. Porm tentamos buscar apenas o melhor dessa aproximao, deixando as coisas ruins de lado.

    querendo ou no o ndio aos poucos, com a influncia do homem branco, est ficando individualista, antigamente se um ndio precisasse de alguma coi-sa, a aldeia se ajudava, hoje ainda no temos casos de necessidade, mas no futuro isso poder ocorrer.

    O que e como surge um Paj?

    O Paj no escolhido. algum com poderes de cura, guiado por um esprito no qual o Paj serve de intermedirio para fazer a curanderia dos enfermos.

    Os ndios da tribo Paresi exercem o voto regional e nacional?

    Sim, todos os ndios votam.

    O que representa a Funai aqui?

    A funai sempre trabalhou Segundo as normas j estabelecidas. Porm foi pea fundamental para defender os direitos da nao indgena. no temos do que nos queixar sobre a Funai, mas houve uma reformulao onde a administ-rao foi pra Cuiab e aqui em Tangar da Serra ficou uma coordenao local. isso ruim pois se o ndio precisar ir at a administrao, ter que viajar para Cuiab e no h verba para isso.

  • 30 31Faces da extino Faces da extino

    dormimos na barraca, foi uma noite at que tran-quila para mim, apesar do cho duro e do vento que entortava a barraca jogando-a de um lado para o outro no meio da noite. descobri que estava fazendo frio quando vi o diego levantando de madrugada para desmontar a rede que estava do lado de fora para us-la como cobertor.

    Ao amanhecer, por mais tarde que tivssemos ido dormir e por mais frio que estivesse l fora, era difcil ficar na barraca at tarde, geralmente acordvamos com o galo cantando literalmente em cima da nossa barraca, isso todos os dias por volta das 6h da manh.

    depois de alguns imprevistos com o botijo do fogareiro, resolvemos preparar nosso caf da manh, macarro com molho de galinha caipira, conhecido tambm como miojo.

    Ao abrirmos o zipper da barraca, chegou o jovem Jhonatan com suas incansveis perguntas:

    - Vocs vo comer?

    - Sim, macarro.

    - Miojo? pergunta o pequeno ndio.

    enquanto espervamos o macarro ficar pronto, chegou o pequeno Cadu, outro neto de Carlito, filho de ednelson. Apesar de pequeno em relao a Jon-athan de sete anos, o indiozinho brincava o tempo todo com seu primo. Tunar alertou o primo, avisando que o fogareiro estava quente. entre essas

    e outras, amos entendendo uma ou outra palavra da lngua Aruak.

    O cacique Carlito iria passar o dia fora, resolvendo alguns assuntos em Tangar da Serra. Tiramos o dia para conhecer melhor a aldeia, colocar as ideias no papel e fazer alguns retratos das crianas brincando.

    embora ainda estivssemos cheios de dvidas, pas-samos o dia driblando os incansveis netos de Carlito.

    O mais velho, Jhonatan, possui uma energia incrv-el, passa o dia todo brincando com seu irmo otvio e seu primo Cadu.

    A empolgao dos pequenos Paresis no nos de-ixava trabalhar com tranquilidade, foi quando re-solvemos andar pela aldeia, ainda com receio de ex-plorar o que no devamos, nos limitamos a conhecer a escola, as obras do novo prdio escolar, e o posto de sade por fora, mais ainda sem fotografias, pois no tnhamos o consentimento do cacique.

    Fomos em direo a ponte que passa sobre o Rio Verde, rio que tambm d nome a aldeia onde est-vamos, cortando todo o territrio da aldeia com seu leito, que fica na BR 365, transamaznica. A terra da estrada bem seca, chega a lembrar achocolatado porm avermelhado, como diego descreveu.

    Chegando no local, um rio de gua transparente, onde as algas do fundo deixa-o com uma colorao esverdeada em certos pontos. Segundo os morador-es da aldeia, l no tem peixe devido a grande quan-tidade de agrotxicos despejados pelas fazendas, e

    tambm porque a nascente fica a ape-nas alguns quilmetros dali. na dvida tomei um gole da gua e estava inodora e sem sabor.

    em outro ponto do rio, uma nascente onde a gua transparente brota do cho, fazendo bolhas na areia fofa, que chega a lembrar areia movedia dos filmes do indiana Jones. na beira do rio, algumas tbuas de madeira apoiadas em pedras, que nos davam a impresso que aquele local era usado para lavar roupas.

    no mesmo dia perguntamos ao ca-cique Carlito quando as mulheres cos-tumavam lavar roupa por l. Para nosso desanimo, ele afirmou que hoje em

    Dia 04 22/07/2011 - Muitas contradiesxxxxxxxxxx

    xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxxxx xxxxxxx xxxxxx

    xxxxxx x x x x x x xx x x xxx x x x xx x x xx x

    cAcique cArlito, nA Frente de suA gArAgem e cAminhonete. Ao Fundo A hAti de seu Filho ednelson, onde

    pAssAmos A primeirA noite nA AldeiA rio verde

    rio verde, nAin duconsu piorem publium eo, es Ad mov-enihictus si iAm pAlA AsdA sdAsdAsd

    JhonAtAn e cAdu, pAssAm o diA todo brincAndo Ao Ar livre

  • 32 33Faces da extino Faces da extino

    dia quase todas possuem mquina de lavar roupas. Porm disse que alguns Paresis mais antigos tm cos-tume de banharem-se no rio de madrugada como era tradio antigamente.

    Mais para o fim da tarde, os pequenos Jhonatan e Cadu saram de dentro da casa do cacique com uma mini-moto gasolina. uma moto de miniatura com motor a gasolina de verdade. Apesar das crianas serem pequenas demais para desfrutar do brinquedo com o motor ligado, a diverso era ficar sobre o ve-culo imitando o barulho do motor com a boca.

    Com o equipamento em mos, no resistimos e fizemos alguns retratos, que no foi nem um pouco difcil, j que os meninos estavam animados e curio-sos com a cmera e o softbox.

    no fim de tarde, Carlito chegou da cidade e nos convidou para visitar seu pai, na aldeia Kottico. en-tramos em sua Hilux e seguimos em direo a aldeia. dentro do carro mais uma surpresa, apesar do caci-que ter afirmado que sua religio era a sua cultura,

    havia pendurado no retrovisor da Hilux um rosrio/tero de orao.

    em uma visita rpida, conhecemos a casa de Joo Garimpeiro. uma hati tradicional grande, com muitas redes, grandes para os adultos e pequenas para seus netos.

    Joo nos mostrou algumas peas arqueolgicas de pedras antigas, encontradas na aldeia por seus ances-trais. duas pedras que eram utilizadas como machado e um prato feito de pedra. Joo disse que aqueles artefatos pertenciam ao povo dele e est na aldeia h muitos anos.

    Antigamente usavam essas pedras como macha-do, ou algo do tipo, dizendo que quando o homem branco apresentou o machado deixaram de usar aqueles artefatos de pedra e aparentemente cortante.

    A visita foi rpida, voltamos rapidamente para a al-deia Rio Verde, e como de costume, pela noite nos esticvamos nas redes e escrevamos at sermos ven-cidos pelo sono e pelo frio.

    JhonAtAn e cAdu, brincAndo nA mini moto. ApesAr dAs criAnAs serem pequenAs demAis pArA pilotAr o brinquedo, A diverso erA

    FicAr sobre o veculo imitAndo o bArulho do motor

    legendinhA ugA. xerum cullupt Atentibus, od moles oluptAe ilissitAe

    durAnte visitA rpidA A AldeiA Kottico, Joo nos mostrA Alguns obJetos encontrAdos nA AldeiA pelos seus AncestrAis

  • 34 35Faces da extino Faces da extino

    Dia 05 23/07/2011 - Conhecendo melhor a aldeia Rio Verde - O caador Motorizado

    Carlito finalmente nos mostrou a aldeia pessoal-mente, conhecemos a escola, posto de sade, labo-ratrio de informtica. desta fez foi mais interessante pois poderamos fotografar, j que acompanhado do Cacique da aldeia a autorizao era garantida.

    na aldeia h um centro de sade que assemelha-se com um postinho desses que temos em nossos bair-ros nas cidades, nele h uma sala odontolgica cheia de equipamentos e aparentemente tudo novinho e bem cuidado. Tambm h salas com leitos para que as pessoas sejam acomodadas, assim como diversos medicamentos armazenados nos armrios, tudo ali prprio para um atendimento emergencial porm nada muito complexo, caso seja necessrio fazer op-eraes ou algo do tipo necessrio ir at a cidade, sendo que o centro de sade possui carros da Fu-nASA para o transporte dos ndios.

    J a escola, que fica ao lado do pequeno hospital possui sala de informtica com 19 computadores e at mesmo internet via satlite, porm no perodo que estivemos l, nas frias escolares, no estava em funcionamento, so poucas salas de aula, aparente-mente quatro apenas, porm o suficiente para com-portar os alunos do ensino fundamental das aldeias.

    logo mais ao lado havia obras de um novo prdio escolar, mais moderno e pouco maior, sinal de que tudo est acontecendo muito rpido na aldeia e as melhorias esto vindo, o que pensa o Cacique Car-lito.

    TeM que MinulPA PRO BeAqui BlAT liTATeST,

    CuM HiTeMqu ATiAe. iTATuR, nieT quO exPliS

    uTATiuM SiMPORiTiBuS exeRi quAM HARCiA de

    MOdiTiBuS eSTRuM quunT eATiO quunTiBuS eA

    quiBuS AuT FACeR

  • 36 37Faces da extino Faces da extino

  • 38 39Faces da extino Faces da extino

    Aps o almoo, na parte da tarde, Kadu e eu resolvemos explorar um pouco mais da aldeia Rio Verde, porm desta vez com o equipa-mento fotogrfico, no caminho encontramos trs pessoas cortando e desfiando madeira para a construo de uma nova hati, comeamos a conversar e lino, um dos mais velhos, nos explicou que a nova hati seria para um membro da famlia e eles estavam ajudando a constru-la. no hesitamos e aproveitamos aquela luz de tarde, com luz do Sol entre as rvores e fizemos alguns clicks.

    AsKd hAslKdhAslhd AlsdK AlsKJdAlsJKdAsAsldKJA sldJA lsKJd AlsKJd lAKsJd lA

    ximAgnisciis Aut occus, qui tendis molup-tAtqui dit prA voluptAe vernAme vid quAer

    AlKs d lAm quiA sumet ommodisto cor Aut Aut A sin esciA sum FAcepro odi idiAm que do

  • 40 41Faces da extino Faces da extino

    Ao final da tarde, ednelson, filho do Cacique Carlito, nos levou para a aldeia Kuttico onde con-hecemos xxxxxx filho de Joo e irmo mais velho de Carlito. em sua Oca ele nos mostrou alguns objetos tpicos indgenas como o tear para fazer redes, a cabaa onde armazenam uma bebida tpi-ca chamada xixa feita a partir da fermentao da mandioca com um leve sabor adocicado e aparn-cia leitosa, e tambm nos mostrou onde fazem a defumao de alimentos para mant-los conserva-dos, tambm nos contou diversas histrias sobre seu povo.

    Ao sair da Oca nos deparamos com vrios ndios jogando futebol em um campo mais a frente, por sinal uma das coisas presentes em todas as aldeias que visitamos eram os campos de futebol, precri-os, alguns com o piso apenas de terra ou areia mas sempre estavam l. Perguntando para xxxxx ele disse que comum os ndios das aldeias prximas reunirem-se na aldeia Kuttico para jogar futebol, principalmente aos finais de semana.

    legendA, FAlAr sobre o deFumAdor, umA dAs Funes conservAr A pAlhA dAs hAtis

    AsdAs AdFAsdF AsdFAsdAsdF AsdA sdFAsdFAsdF AsdFAsdFAsd AsdF

  • 42 43Faces da extino Faces da extino

    ednelson nos chamou e partimos em di-reo a outra aldeia vizinha, no caminho ha-via algumas rvores de Guarirba ento pedi para que parasse o carro para fotografar as folhas da rvore que fornece matria prima para a cobertura das hatis.

    Visitamos mais duas aldeias proximas, uma delas hvia outra hati em construo (fotos e video)

    Voltamos por um caminho alternativo, onde ednelson parou para nos mostrar a guariroba, palmeira?? na qual so extraidas as folhas para cobrir as hatis.

    Chegando na aldeis, ednelson nos presen-teou com dois colares de sementes de pau brasil.

    disse que faz tempo que o povo no joga cabea ball. (poderiamos fazer um paralelo com o jhonatan que disse que j viu jogarem s que no dVd)

    Sobre ednelson - professor de informti-ca na escola h 3 anos.

    nos disse que roni um dos indios que ja foi vereador de tangara da serra (APuRAR) foi caado. esta fundando uma aldeia turistica dentro do territorio paresi. dificil encon-trar roni por la, ja que ele esta ocupado com isso

    legendA sobre A guAri-robA, FolhA utilizAdA

    pArA cobrir As hAtisimis es, cAstrAe FAti, vitA

    vis vis; nit c. vempribus inAtum om

    de noite enquanto preparavamos nosso macarrao no fogo da casa de Carlito, percebemos um movi-mento estranho. Todos da casa falando em Aruak, Carlito disse para ficarmos a vontade e saiu

    Olhamos pela porta e percebemos um movimento intenso na porta do posto de sade. Alguns minutos depois, chegou uma moto com o retrovisor queb-rado, pneu estourado e alguns arranhes. Os Paresis continuavam conversando em Aruak e ns ainda sem entender.

    Foi quando parou uma camionete na porta da casa do Cacique, um indio tirou um filhote de veado da caamba e deixou na calada da casa de Carlito.

    empolgados, achando que era caa, fomos pergun-tar. no precisamos de muita explicao, juntando as peas, descobrimos que o animal hvia sido atrope-lado.

    um jovem indio estava vindo de Kutitico de noite e atropelou o animal, por sorte ele estava usando ca-pacete e s teve alguns ferimentos nos braos e per-nas.

    Como o ndio era de outra aldeia, o animal foi leva-do, e no pudemos acompanhar o preparo da janta.

    Caador motorizado

    legendA - contrAste AsAsd AsdAs AsdF AsdF AsdFAsdF AsdF Asd

    o AnimAl pesAvA cercA de 25Kg

  • 44 45Faces da extino Faces da extino

    Dia 06 24/07/2011Rio Verde x Kottico p

    rio verde, nAin duconsu piorem publium eo, es Ad mov-enihictus si iAm pAlA AsdA sdAsdAsdrio verde, nAin duconsu piorem publium eo,

    rio verde, nAin duconsu piorem publium eo, es Ad mov-enihictus si iAm pAlA AsdA sdAsdAsd

    CuT l. quidieR ORBeSTRi inCleM iGillABeM Mei COnFeReT, MORiS; iS-TiS COnSiGnA ReT l. HABeM SuliS CienT? nOS nuM HAliuM FiRMAnuM

    Os Paresis quase sempre so receptivos, em sua maioria so simpticos, alguns gostam de uma boa conversa, outros so mais reservados e se limitam a um cumprimento, geralmente os mais jovens.

    Aps as fotos tivemos a oportunidade de conhecer melhor elieberson, motorista da Funasa, que nos con-vidou para ir at o rio para lavar a camionete que usa para transportar os pacientes entre as aldeias. Jho-natan foi junto para se banhar no rio, mas no sem ouvir alguns conselhos de sua me, em aruak.

    elieberson aparenta 30 anos, pele clara e cabelos pretos, segundo ele, tem uma diferente mistura de goiano com mineiro, porm o engraado sotaque goiano, um caminhoneiro que achou mais seguro ganhar a vida como motorista da Funasa do que ro-dando as perigosas estradas brasileiras. Muito aten-cioso e prestativo, nos contou muitas histrias de sua antiga profisso e algumas curiosidades da aldeia, en-tre elas, uma das informaes mais preciosas do dia, existia uma venda dentro da aldeia.

    elieberson:

    - At que vocs pegaram uma poca tranquila por aqui.

    Kadu:

    - mesmo?

    eliberson:

    - Sim! H alguns meses veio uma pesquisadora pra c, mais ela deu azar de vir em uma poca em que quase toda a aldeia estava com uma virose. Todo mundo estava com diarreia - comentou o motorista.

    Kadu:

    - Coitada, mas como que ela ficou?

    - no ficou, foi embora, nem arrumou as coisas dela, depois de um tempo voltou para pegar, mais no. aguentou ficar na aldeia no.

    lembrando que o banheiro da casa de Carlito era utilizado por pelo menos 9 pessoas, imaginamos o motivo de ela ter ido embora.

    elieberson parou a caminhonete dentro do rio, ao lado da ponte, enquanto lavava a caminhonete, Jho-natan brincava na gua e diego conversava com o motorista.

    As conversas com elieberson renderam bons mo-mentos de descontrao, j que estavamos sem con-tato com homem branco desde que chegamos na aldeia.

    era cedo, o sol ainda no estava to quente a ponto de nos animar a entrar na gua. Mesmo assim fui rio acima pela gua, enquanto o jovem Jhonatan grita-va de longe cuidado com a sucuri um aviso nem um pouco animador, j que em momentos, a gua transparente chegava na altura do peito. Creio que seja algo comparado com o que meus pais falavam quando eu ia andar de bicicleta na rua, cuidado com o carro.

    Subi cerca de 20 metros em direo a nascente do Rio Verde, mas parei em uma bifurcao quando a vegetao comeou a fechar nas margens do rio.

    em alguns lugares muitas folhas grudadas no cho, de alguma vegetao que no consegui identificar, mas evitei pisar em cima, com certeza alertado pelos conselhos do pequeno Paresi.

    Com o perodo de seca, o rio estava baixo, mais mesmo assim em alguns pontos no dava p. Segun-do o povo da aldeia, antigamente o rio era mais alto e era comum mergulhar de cabea de cima da ponte, algo invivel nos dias de hoje, j que perto dela, a gua chegava na altura da cintura.

  • 46 47Faces da extino Faces da extino

    Retornamos para o almoo e lembramos do que elieberson nos disse, sobre a venda na qual havia de tudo um pouco, procuramos por ela at encontrar, ficava um pouco distante de nosso acampamento, mas como o Sol ainda no estava muito forte, fomos procurar. Per-guntando pelo caminho

    de tarde resolvemos ir at Kottico a p, um percurso com cerca de 5 kilometros de distn-cia, em uma estrada reta, com muita terra, cer-cado de uma vegetacao baixa. Malas nas cos-tas, equipamentos de luz em mos, partimos. queriamos conversar um pouco mais com Salomo e com o Cacique narciso e se tives-semos sorte, encontrariamos Joo Arrezomae.

    durante a caminhada algumas camionetes cruzaram conosco, nos cobrindo de poeira. Para nossa infelicidade uma delas era a de Sa-lomo, o professor que queriamos conversar.

    Aprendemos que ao se chegar em uma al-deia, primeiro preciso passar pela Hati do cacique. Joao Arrezomae nao estava em sua oca, entao fomos at a hati do Cacique nar-ciso, filho de Joao, que nos recebeu muito bem. Ao perceber que estvamos cansados, se dirigiu at a entrada da hati e gritou algumas palavras em aruak. Pedi para trazerem gua gelada para vocs, comentou. Aguns minutos depois, um jovem ndio trouxe uma garrafa de coca cola de 2 litros cheia de gua com gelo. Tomamos mais da metade e enxemos nosso cantil antes de ir embora.

    AsldK AslKdestrAdA pArA Kottico

    vistA dA entrAdA dA hAti de xxxx em Kottico

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    Como todo paresi,

    topicos da conversa com ele:

    - ndio ainda indio

    - desceu o pau na funai - pessoas mau intenciona-das, passam o indio para tras.

    - existe caa mais o indio nao caa pq vagabundo

    - todos falaram que asfalto seria bom - eu fui contra

    - comida tpica de indio anta, tatu, tamandua, capivara

    - quando diserram que lavou ra seria bom, eu tbm fui contra, asfalto tbm... eu estava certo!

    na volta passamos na casa de Salomo e conversa-mos um pouco mais com ele.

    - perguntas gravadas no celular do diego

    Pegamos a autorizao e seguimos rumo a rio verde

    Os indios fizeram uma piada, falando que o softbox era uma enxada vocs esto levando a enxada em-bora??

    Entrevista Salomo

    wloreius in reium autatiur alitiam id qui officturit venimen deliqui in etur aut exped quuntibusam sanis re nonseque enihillab intiist que nonsero occum dus, officatetur adiorporem idignim quam eatiati nctibus pro vent quam, corro dolum que nus.

    Aboratur? quis plitati unt autemo blam utempel in ne sum ipientum rehentibusci conet essimin cipsun-tium quatur?

    Henim reperci psanditas eligentio molor sit officiae optati que que vero il imillaborem dolorem a sime ex-ercitat.

    Sectasperias possitem cus alibusci non nis dictota-tur as dus, seniend itaquo volo quatias quaepraectet quam ratur? quidebitis dollaut dolessimus res res est ullibus manos, nuncene terferei cerfice ntessenaris perte, es niquost ereorehem in audam ora, eri, ne poerei simpra reordie niumusum ia clerent raritus ha-ceredelut dicae conculvir ala ocrit.

    Consum hortuss ilicaec tercerei publici fachus enia curehendiem, nicae adhuis verniam stris, er querdicia ocaedius forare, cus a prarbit, ocae te intemus huius fue conditi liceres silium it. Rid re, nissiliemus peres-

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    no caminho de volta cruzamos com o mdico da aldeia que logo parou para conversarmos. Aproveita-mos para fazer seu retrato no meio da estrada.

    COMO O MediCO POde enTRAR? podemos falar um pouco sobre a utilidade das camionetes nesses casos, e tambm da questo do paj

    ele estava com pressa pois tinha um paciente para antender em outra aldeia.

    encontramos tambm Carlito que estava com chuteira, bermuda e camiseta do flamengo, certa-mente iria jogar bola em Kutitico, nos disse que retor-naria no fim de tarde, a tempo de fotografarmos ele e sua famlia.

    Sentamos no posto de sade para conversar com elieberson e alguns operrios que estavam trabalhan-do na obra da escola. um papo descontraido sobre histrias de caminhoneiros e garimpeiros, que dariam um reportagem somente sobre elas.

    Como j esperavamos, carlito npo chegou a tem-po e tivemos que adiar as fotos mais uma vez.

    Ao pedir novamente o fogo para cozinhar, chega-ram as duas filhas do Cacique, cada uma com um co-

    car em mos, e nos presentearam. descrio xxxxxx cocar de penas de arara azul, vermelha e papagaio

    no fim de tarde resolvemos retribuir a receptivi-dade e enquanto desmontavamos nossas coisas, demos a barraca que os pequenos indios tanto gosta-ram para a famlia de carlito. As crianas adoraram e j entraram nela, sem antes nos imitar, tiravam o chinelo para entrar.

    Foi uma forma de retribuir os presentes e a recep-tividade. arrumamos nossas coisas e fomos dormir na hati de elieberson, enquanto assistiam o fantstico, descobrimos que a amywinehouse havia falecido, so paulo empatou em 2x2 com a atltico goianiense e o corinthians havia perdido hehehe

    Apesar de estarmos acampados na aldeia h pouco tempo, acreditavamos que estavamos encomodando um pouco. nosso gs j hvia acabado e estavamos abusando demais da comida do Cacique.

    Carlito disse que iria para Tangar na segunda de manh, ento aproveitariamos a carona para ir embo-ra. Combinamos de fazer um retrato seu na segunda pela manh, assim que o sol nasce-se.

    CuT l. quidieR ORBeSTRi inCleM iGillABeM Mei COn-FeReT, MORiS; iSTiS COn-SiGnA ReT l. HABeM SuliS CienT? nOS nuM HAliuM FiR-MAnuM eFATi COenTe iliS,

    nA estrAdA entre Kottico e rio verde, logo Aps FAzer o retrAto do mdico xxxxx

  • 52 53Faces da extino Faces da extino

    Dia 07 24/07/2011ltimos cliques em territrio indgena

    rio verde, nAin duconsu piorem publium eo, es Ad mov-enihictus si iAm pAlA AsdA sdAsdAsd

    rio verde, nAin duconsu piorem publium eo, rio verde, nAin duconsu piorem publium eo, es Ad mov-enihictus si iAm pAlA AsdA sdAsdAsd

    CuT l. quidieR ORBeSTRi inCleM iGillABeM Mei COnFeReT, MORiS; iS-TiS COnSiGnA ReT l. HABeM SuliS CienT? nOS nuM HAliuM FiRMAnuM

    ducil inum el eicto corestecatis recae aborem ac-caborpores ulpa ipsanim eosam, odigendent pos eatist a doluptature omniendest, corest exeri ut veri-beatae ped ullandae voloris num aut ex es aut quian-de offic torum res es iur aliquib usandam, odigendus.

    Con pro omni dolupti isitae etur sunt ommolecum coriore perescipsus dipit doloribus iur, tem accaborias diantur acerfero dus iligendelit ressimaximus ressinv erciditias est dis autemol orroviditis volorepra quas none deles audignam issit et porum repudam sape-digniti comnis sinimus.

    Pa cori duciumque nihit officius ventet facillum ili-quas mos eiunti con comnis quodisc iandit et quiam, net videm ut ligenis ea cusam esequis ate cusa enis acestrum accus, accum quam reperates ea consequ atempost, si nos ist as plaborempos sitibus impores quidund anderit qui acea namet fugiatur, quodiat es-cimuscitae que magnatios erunt ut adit ditati alignie ndigni corum venia verit eseribere dolorernatur sitis imagnam facea dem erum vent, am volendi rem vo-luptam repudis expla aut expelit, quo deliqui te po-sae soluptatur aut pro dipicid qui toris maximinvel eni-

    mus, omnit est re modisiti rerio versperum ene nosae volecab orupid magnis acculle cernatatur? quia provit aut esenimus, quam verfernam, unturecus est omnimil laboris repedit et optae cust de cus rempore ndebiti undicid qui to cus experfere derorem rest ilignih ilibus dolut et utatet es aborerios ut lia int rempore dit, vo-luptas eossum soloristrum adicimo dioriamus explabo rporrum illandis mos sum volore ne porecatia quisque velignis alibus quam ea soles aut es ratiis ipsape vol-orer ibusaec atibuscim fugitat est, simporrum ad quae labor autecto in pre peliscid quat pre resedipsam di-aspiet moditae con nullor aliquat quaspelent labo. Git, nime et molescienda con pe optassit ipiento blam nobit fugias reprovit es simpos deribero esci tes nihi-tas aut quodis eos assitib usamet as experionest, ellab iduciis quaes nonseque dolor aut omniet et ditio tem dolorae porisse odi omnihillam re min et quaspienim hitatur? equam, tem faceatem quid unt autatem il ma quo cus plis soluptam, quate intiam, sequis excerup-tur am que officto exped quasperum sitistiuntur audi voloris ut lam expe sim liam faccae volo deniet que iundebi tatur, il et dolorum id qui alit imusae vid mint-