Farmacologia Endócrina do Pâncreas

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Farmacologia do Pâncreas Endócrino 29 Aimee D. Shu, Martin G. Myers, Jr., e Steven E. Shoelson Introdução Caso Bioquímica e Fisiologia Anatomia do Pâncreas Homeostasia Energética Estado Pós-Prandial Jejum Insulina Bioquímica Secreção Ação nos Tecidos-Alvo Glucagon Somatostatina Peptídio Glucagon-Símile-1 (GLP-1) Fisiopatologia Diabetes Melito Diabetes Tipo I Diabetes Tipo II Morbidade e Mortalidade Hiperinsulinemia Classes e Agentes Farmacológicos Terapia do Diabetes Estratégias da Terapia Inibidores da Absorção Intestinal de Glicose: Inibidores da -Glicosidase Reposição de Insulina: Insulina Exógena Secretagogos da Insulina: Sufoniluréias e Meglitinidas Sensibilizadores da Insulina: Tiazolidinedionas e Biguanidas Agonistas do GLP-1 e Compostos Miméticos Terapia de Combinação Terapia de Hiperinsulinemia Glucagon como Agente Terapêutico Conclusão e Perspectivas Futuras Leituras Sugeridas INTRODUÇÃO Este capítulo trata da fisiologia e da farmacologia dos hor- mônios pancreáticos insulina, glucagon e somatostatina. Como o diabetes melito — causado pela ausência ou insuficiência funcional de insulina — constitui, clinicamente, a doença mais comum desses eixos endócrinos, a maior parte deste capí- tulo está dedicada à fisiologia e à farmacologia da insulina. Os estudantes de medicina poderão ter interesse em observar que Charles Best, um estudante de quarto ano de medicina no Canadá, desempenhou um papel significativo na identificação da insulina. Juntamente com seu mentor, Frederick Banting, Best isolou um extrato pancreático de cães capaz de reduzir o nível de glicemia em cães e seres humanos diabéticos. Embora o Prêmio Nobel de medicina ou fisiologia de 1923 tenha sido conjuntamente outorgado ao cirurgião Frederick Banting e ao fisiologista J. J. R. MacLeod, Banting compartilhou o seu prê- mio com Best. n n Caso Em seu checkup anual, a Sra. S, de 55 anos de idade, queixa-se de fadiga e micção freqüente (poliúria), mesmo à noite. Relata também que está ingerindo grandes quantidades de água (polidipsia) para saciar a sede. Embora esses sintomas já estejam ocorrendo há algum tempo e agora estejam se agravando, a Sra. S tem dificuldade em lembrar com precisão o momento exato de seu início. Nega outros sintomas urinários, como dor durante a micção, presença de sangue na urina, gotejamento e incontinência. A história clínica pregressa é notável pela hiperlipidemia de 10 anos de duração. Ambos os pais da Sra. S morreram de coronariopatia no início da sexta década de vida. Ao exame físico, a Sra. S está moderadamente obesa, porém com aparência normal sob os demais aspectos. Detecta-se a presença de glicose na urina, porém as proteínas e cetonas estão ausentes. O exame de sangue revela níveis elevados de glicose (240 mg/dL), aumento do colesterol total (340 mg/dL) e nível de HbA1c, uma medida da glicose ligada de modo covalente à hemoglobina, de 9,2%. O médico explica à Sra. S que ela tem diabetes melito do tipo II. Nessa doença, o corpo não consegue responder normalmente à insulina (resistência à insulina) e é incapaz de produzir uma quanti- dade de insulina suficiente para superar essa resistência. O médico discute com a Sra. S a importância de diminuir a ingestão de calorias e aumentar os exercícios físicos para melhorar o estado metabólico. O médico também prescreve metformina (uma biguanida) para o diabetes. QUESTÕES n 1. Quais as ações celulares e moleculares da insulina? n 2. Qual a etiologia do diabetes melito e em que aspectos o diabetes melito Tipo I difere do diabetes melito Tipo II?

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Farmacologia do Pâncreas Endócrino

29

Aimee D. Shu, Martin G. Myers, Jr., e Steven E. Shoelson

IntroduçãoCasoBioquímica e Fisiologia

Anatomia do PâncreasHomeostasia Energética

Estado Pós-PrandialJejum

InsulinaBioquímicaSecreçãoAção nos Tecidos-Alvo

GlucagonSomatostatinaPeptídio Glucagon-Símile-1 (GLP-1)

FisiopatologiaDiabetes Melito

Diabetes Tipo I

Diabetes Tipo IIMorbidade e Mortalidade

HiperinsulinemiaClasses e Agentes Farmacológicos

Terapia do DiabetesEstratégias da TerapiaInibidores da Absorção Intestinal de Glicose:

Inibidores da �-GlicosidaseReposição de Insulina: Insulina ExógenaSecretagogos da Insulina: Sufoniluréias e MeglitinidasSensibilizadores da Insulina: Tiazolidinedionas e BiguanidasAgonistas do GLP-1 e Compostos MiméticosTerapia de Combinação

Terapia de HiperinsulinemiaGlucagon como Agente Terapêutico

Conclusão e Perspectivas FuturasLeituras Sugeridas

INTRODUÇÃO

Este capítulo trata da fisiologia e da farmacologia dos hor-mônios pancreáticos insulina, glucagon e somatostatina. Como o diabetes melito — causado pela ausência ou insuficiência funcional de insulina — constitui, clinicamente, a doença mais comum desses eixos endócrinos, a maior parte deste capí-tulo está dedicada à fisiologia e à farmacologia da insulina. Os estudantes de medicina poderão ter interesse em observar que Charles Best, um estudante de quarto ano de medicina no Canadá, desempenhou um papel significativo na identificação da insulina. Juntamente com seu mentor, Frederick Banting, Best isolou um extrato pancreático de cães capaz de reduzir o nível de glicemia em cães e seres humanos diabéticos. Embora o Prêmio Nobel de medicina ou fisiologia de 1923 tenha sido conjuntamente outorgado ao cirurgião Frederick Banting e ao fisiologista J. J. R. MacLeod, Banting compartilhou o seu prê-mio com Best.

nn Caso

Em seu checkup anual, a Sra. S, de 55 anos de idade, queixa-se de fadiga e micção freqüente (poliúria), mesmo à noite. Relata também que está ingerindo grandes quantidades de água (polidipsia) para saciar a sede. Embora esses sintomas já estejam ocorrendo há

algum tempo e agora estejam se agravando, a Sra. S tem dificuldade em lembrar com precisão o momento exato de seu início. Nega outros sintomas urinários, como dor durante a micção, presença de sangue na urina, gotejamento e incontinência. A história clínica pregressa é notável pela hiperlipidemia de 10 anos de duração. Ambos os pais da Sra. S morreram de coronariopatia no início da sexta década de vida.

Ao exame físico, a Sra. S está moderadamente obesa, porém com aparência normal sob os demais aspectos. Detecta-se a presença de glicose na urina, porém as proteínas e cetonas estão ausentes. O exame de sangue revela níveis elevados de glicose (240 mg/dL), aumento do colesterol total (340 mg/dL) e nível de HbA1c, uma medida da glicose ligada de modo covalente à hemoglobina, de 9,2%. O médico explica à Sra. S que ela tem diabetes melito do tipo II. Nessa doença, o corpo não consegue responder normalmente à insulina (resistência à insulina) e é incapaz de produzir uma quanti-dade de insulina suficiente para superar essa resistência.

O médico discute com a Sra. S a importância de diminuir a ingestão de calorias e aumentar os exercícios físicos para melhorar o estado metabólico. O médico também prescreve metformina (uma biguanida) para o diabetes.

QUESTÕESn 1. Quais as ações celulares e moleculares da insulina?n 2. Qual a etiologia do diabetes melito e em que aspectos o

diabetes melito Tipo I difere do diabetes melito Tipo II?

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n 3. O que os níveis de glicemia e de HbA1c revelam sobre o diabetes da Sra. S? Existem circunstâncias nas quais um dos parâmetros pode estar elevado, enquanto outro pode estar normal?

n 4. Além de aliviar a poliúria e a polidipsia, por que é importante controlar o diabetes da Sra. S (isto é, quais as complicações agudas e crônicas que podem surgir)?

n 5. Quais os mecanismos de ação dos vários agentes farmaco-lógicos utilizados no tratamento do diabetes: inibidores da �-glicosidase, sulfoniluréias, meglitinidas, tiazolidinedionas, biguanidas e compostos miméticos do GLP-1? A metformina constitui um tratamento apropriado para a Sra. S?

BIOQUÍMICA E FISIOLOGIA

ANATOMIA DO PÂNCREASO pâncreas é um órgão glandular que contém tecido tanto exó-crino quanto endócrino. A porção exócrina — que constitui 99% da massa pancreática — secreta bicarbonato e enzimas digestivas no trato gastrintestinal (GI). Espalhadas dentro do tecido exócrino, encontram-se pequenas ilhas de tecido endó-crino que secretam hormônios diretamente no sangue e cujo número atinge quase um milhão. Essas minúsculas glândulas endócrinas, coletivamente denominadas ilhotas de Langer-hans, incluem vários tipos celulares diferentes, que secretam hormônios diferentes. As células � liberam glucagon; as célu-las � liberam insulina; as células � liberam somatostatina e gastrina; e as células PP liberam polipeptídio pancreático.

HOMEOSTASIA ENERGÉTICAO armazenamento de nutrientes para posterior liberação na cir-culação permite que a vida prossiga na ausência de ingestão contínua de alimentos. A insulina e o glucagon constituem os principais hormônios envolvidos no controle da captação, uti-lização, armazenamento e liberação desses nutrientes. A insu-lina promove a captação e o armazenamento da glicose e de outras pequenas moléculas que contêm energia. Os hormônios “contra-reguladores” — glucagon, catecolaminas (isto é, norepinefrina e epinefrina do sistema nervoso simpático e da medula supra-renal), glicocorticóides (isto é, cortisol do cór-tex da supra-renal) e hormônio do crescimento (da hipófise) — antagonizam a ação da insulina e promovem a liberação de nutrientes (ver Quadro 29.1). O nível de glicemia é facilmente medido e proporciona uma orientação acurada sobre o equilíbrio da insulina e dos hormônios contra-reguladores. Esse equilí-brio normalmente mantém os níveis de glicose dentro de uma faixa estreita (70–120 mg/dL), independentemente da ingestão recente de alimentos. A hipoglicemia é perigosa, visto que os órgãos do corpo — particularmente o cérebro — dependem de um suprimento constante de glicose para o seu funcionamento apropriado. Por outro lado, a hiperglicemia crônica é tóxica para numerosas células e tecidos.

O hormônio leptina recém-identificado regula o balanço energético a longo prazo e a resposta neuroendócrina ao arma-zenamento de energia. A leptina é secretada pelos adipócitos, e a sua concentração no plasma é proporcional à massa total de gordura. Por conseguinte, a leptina sinaliza ao sistema nervoso central a quantidade de energia — na forma de tecido adiposo — que é armazenada no corpo. A leptina promove a anorexia

QUADRO 29.1 Efeitos de Hormônios Selecionados sobre a Homeostasia Energética

HORMÔNIO FONTE TECIDOS-ALVO AÇÃO

Glucagon Célula � (pâncreas) Fígado (tecido adiposo, músculo esquelético)

Promove a glicogenólise e a gliconeogênese no fígado

Insulina Célula � (pâncreas) Fígado (tecido adiposo, músculo esquelético)

Promove a captação de glicose, de aminoácidos e de ácidos graxos do sangue para o interior das células, onde são armazenados na forma de glicogênio, proteínas e triglicerídios

Somatostatina Célula � (pâncreas)Trato GIHipotálamo

Outras células das ilhotas, trato GI, cérebro e hipófise

Diminui a liberação de insulina e de glucagonDiminui a motilidade do trato GI e a liberação de hormôniosDiminui a secreção de hormônio do crescimento

Epinefrina Medula da supra-renal Numerosos Promove a glicogenólise no fígadoLipolítica através da ativação da lipase sensível a hormônio

Cortisol Córtex da supra-renal Numerosos Antagoniza a ação da insulina nos tecidos-alvoPromove a gliconeogênese no fígado e a degradação da proteína no músculo

GLP-1 Íleo Pâncreas endócrino, estômago, cérebro, coração

Aumenta a massa de células � e a secreção de insulinaRetarda o esvaziamento gástricoDiminui a ingestão de alimento e a secreção de glucagon

Leptina Adipócitos SNC (hipotálamo basomedial)

Sinaliza a suficiência das reservas de energia do corpo, diminui a ingestão de alimentos, permite funções neuroendócrinas que consomem energia

Do ponto de vista fisiológico, a insulina e o glucagon constituem os dois hormônios mais importantes que controlam a homeostasia da glicose. A insulina promove o armazenamento de energia nos tecidos-alvo. O glucagon, a epinefrina, o cortisol e o hormônio do crescimento—os hormônios “contra-reguladores”—atuam no sentido de elevar o nível de glicemia e, portanto, reverter os efeitos da insulina. Ao atuar como “sensor de gordura”, a leptina sinaliza as reservas corporais totais de energia e regula o balanço energético a longo prazo. GI, gastrintestinal; GLP-1, peptídio glucagon-símile-1.

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(diminuição do apetite) e permite ao sistema endócrino desem-penhar funções que consomem energia, como crescimento, reprodução e manutenção de uma alta intensidade de metabo-lismo. Alternativamente, a ausência de leptina nos estados de inanição resulta em aumento do apetite e comprometimento das funções que consomem energia.

Estado Pós-PrandialDepois de uma refeição, os carboidratos complexos são decom-postos a monossacarídios (por exemplo, glicose, galactose e frutose) na luz do trato GI e transportados nas células epiteliais GI por uma combinação de transportadores ativos e passivos

da membrana apical. A seguir, os açúcares são transferidos por transportadores da membrana basal do citosol das células epite-liais para os espaços intercelulares, a partir dos quais os açúcares prosseguem nos capilares. Quando a glicose no sangue é cap-tada pelas células � do pâncreas, as células liberam insulina nos ca pilares, que acabam drenando na veia porta. Por conseguinte, o fígado recebe as maiores concentrações de insulina, juntamente com os nutrientes que foram absorvidos do trato digestório. O fígado e os outros tecidos de armazenamento de energia, como o músculo esquelético e o tecido adiposo, constituem os princi-pais alvos teciduais da insulina (Fig. 29.1). As ações locais da insulina nas ilhotas de Langerhans também suprimem a secreção de glucagon pelas células � pancreáticas.

Carboidratos complexos

da dieta

Glicosidases

Inibidores da α-glicosidase

Trato GI

Outros tecidos Sangue

Metabolismo

Glicose

Glicose (do trato GI e do fígado)

Para os tecidos Para os tecidos

Insulina endógena (das células β) ouInsulina exógena

Tiazolidinedionas

Célula adiposa

Glicose Triglicerídios

PPARγ

Insulina

Célula muscular

Glicose Glicogênio

Sulfoniluréias,meglitinidas

Diazóxido

Glicose Metabolismo

Célula β

ATPSecreção de insulina

Célula hepática

Glicose Glicogênio

GlucagonGlicose

Gliconeogênese

Biguanidas

Insulina Insulina

Fig. 29.1 Regulação fisiológica e farmacológica da homeostasia da glicose. Os carboidratos complexos da dieta são degradados a açúcares simples no trato GI, sob a ação de glicosidases. A seguir, os açúcares simples são absorvidos pelas células epiteliais GI e transportados no sangue. A glicose no sangue é captada por todos os tecidos metabolicamente ativos do corpo. Nas células � do pâncreas, o metabolismo da glicose aumenta os níveis de ATP citosólico, que estimula a secreção de insulina. Em seguida, a insulina atua sobre receptores de insulina na membrana plasmática dos tecidos-alvo (músculo, tecido adiposo, fígado), aumentando a captação de glicose e o seu armazenamento na forma de glicogênio ou triglicerídios. A glicose também é captada por outras células e tecidos para suprir o metabolismo. Nas células musculares, a insulina promove o armazenamento da glicose sob a forma de glicogênio. Nas células adiposas, a insulina promove a conversão da glicose em triglicerídios. O receptor � ativado pelo proliferador peroxissômico (PPAR�) também promove a conversão da glicose em triglicerídios nas células adiposas. Nas células hepáticas, a insulina promove o armazenamento da glicose sob a forma de glicogênio. O glucagon promove tanto a gliconeogênese quanto a conversão do glicogênio em glicose; a glicose gerada pela gliconeogênese ou a partir do glicogênio é transportada da célula hepática para o sangue. Observe que a glicose proveniente dos carboidratos complexos da dieta e a insulina secretada pelas células � do pâncreas chegam ao fígado em altas concentrações através da circulação porta (não ilustrada). As intervenções farmacológicas que diminuem os níveis de glicemia incluem: inibição das �-glicosidases intestinais; administração de insulina exógena; uso de sulfoniluréias ou meglitinidas para aumentar a secreção de insulina pelas células �; e uso de biguanidas ou tiazolidinedionas para aumentar a ação da insulina no fígado e nas células adiposas, respectivamente. Os compostos miméticos do GLP-1 diminuem os níveis de glicemia através de vários mecanismos complementares (não indicados). O diazóxido inibe a secreção de insulina pelas células � do pâncreas.

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Jejum À medida que a concentração plasmática de glicose diminui, as células � do pâncreas passam a liberar quantidades crescen-tes de glucagon, enquanto as células � secretam quantidades decrescentes de insulina. Ao contrário da insulina, que promove a captação celular da glicose no estado pós-prandial, o glucagon mobiliza a glicose do fígado ao estimular a gliconeogênese e a glicogenólise. À medida que o jejum prossegue, os níveis de catecolaminas e de glicocorticóides também aumentam, pro-movendo a liberação de ácidos graxos do tecido adiposo e a degradação das proteínas a aminoácidos no músculo.

INSULINA

Bioquímica A insulina é uma proteína de 51 aminoácidos, constituída por duas cadeias peptídicas ligadas por duas pontes dissulfeto. Seu nome provém do latim insula (que significa “ilha”, refe-rindo-se às ilhotas de Langerhans. O pâncreas humano contém aproximadamente 8 mg de insulina, dos quais 0,5 a 1,0 mg são secretados diariamente (e substituídos através da síntese contínua do hormônio). A insulina é inicialmente sintetizada nas células � do pâncreas na forma de pré-pró-insulina, que é clivada a pró-insulina e, a seguir, processada em insulina e peptídio de conexão (C) livre (Fig. 29.2).

Secreção As células � do pâncreas em repouso suspendem a secreção de insulina, que é pré-formada e armazenada em vesículas secre-toras logo abaixo da membrana plasmática. A baixa taxa basal de secreção de insulina aumenta drasticamente com a exposição das células à glicose. O metabolismo da glicose aumenta a rela-ção ATP/ADP intracelular, que estimula a secreção de insulina (ver adiante).

A glicose plasmática difunde-se ao longo de seu gradiente de concentração para o interior da célula �, através de um trans-portador específico da membrana plasmática, o GLUT2. Na presença de níveis plasmáticos elevados de glicose (por exem-plo, no estado pós-prandial), uma maior quantidade de glicose sofre difusão na célula, onde é fosforilada a glicose-6-fosfato pela hexocinase, seguindo, portanto, pela via glicolítica. Atra-vés da glicólise e do ciclo do ácido cítrico, o metabolismo da glicose gera ATP e aumenta a relação ATP/ADP na célula �. A relação ATP/ADP modula a atividade de um canal de K+ sen-sível ao ATP (canal de K+/ATP) que atravessa a membrana. Quando aberto, esse canal hiperpolariza a célula permitindo um efluxo de K+ e impulsionando o potencial de membrana para o potencial de Nernst para o K+; quando fechado, a célula sofre despolarização. Como o ATP inibe o canal, enquanto o ADP o ativa, a presença de uma elevada relação ATP/ADP intracelu-lar determina o fechamento do canal de K+/ATP. A conseqüente despolarização da célula ativa os canais de Ca2+ regulados por voltagem, que medeiam o influxo de Ca2+ extracelular. O aumen-to do [Ca2+] intracelular estimula a exocitose das vesículas que contêm insulina. Em contrapartida, em condições de concentra-ções relativamente baixas de glicose extracelular (por exemplo, em jejum), a célula � apresenta uma baixa relação ATP/ADP. Nessa situação, os canais de K+/ATP permanecem abertos, e a célula � é mantida em um estado hiperpolarizado, que impede o influxo de Ca2+ e a secreção de insulina (Fig. 29.3).

NH2

Sítio de clivagem

dipeptídico

Sítio de clivagem

dipeptídico

COOHPró-insulina

Cys

Cys

CysAsn

CysCys

Cys

Arg

Arg Arg

Lys

Lys

Pro

Inversão nainsulina lispro

Substituição por glicina nainsulina glargina

Dois resíduos adicionais de argininana insulina glargina

NH2

NH2

NH2

COOH

COOH

COOH

Insulina

Cadeia B Cadeia A

Peptídio C

Cys

CysAsn

Cys

Cys Cys

Cys

Lys

Pro

Fig. 29.2 Processamento da insulina humana. A pré-pró-insulina é sintetizada e exportada no retículo endoplasmático, onde o peptídio de sinalização (não ilustrado) é clivado, gerando a pró-insulina (painel superior). As pontes de dissulfeto intramoleculares (cys–cys) ajudam no dobramento correto da pró-insulina. A pró-insulina é transportada para vesículas secretoras, onde convertases do pró-hormônio atuam sobre sítios de clivagem dipeptídicos na pró-insulina (boxes), produzindo insulina e peptídio de conexão (C). Duas pontes de dissulfeto ajudam a manter as cadeias A e B da insulina unidas. A insulina e o peptídio C são secretados pela célula � do pâncreas (painel inferior). Na lispro, uma insulina artificial desenvolvida para sofrer absorção mais rápida após a sua injeção, há transposição de um resíduo de prolina e de lisina na extremidade terminal COOH da cadeia B da insulina; essa pequena alteração não afeta a capacidade da molécula de ligar-se ao receptor de insulina ou de mediar a ação da insulina. Na insulina glargina, uma asparagina da cadeia A é substituída por glicina, e são acrescentadas duas argininas à extremidade terminal COOH da cadeia B. Essas modificações retardam a absorção da insulina glargina em relação à insulina regular.

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Os canais de K+/ATP são estruturas octaméricas que contêm 4 subunidades de Kir6.x e 4 subunidades de SURx, onde “x” indica uma de várias isoformas. O tetrâmero Kir6.x forma o poro do canal de K+/ATP, enquanto as moléculas SUR asso-ciadas regulam a sensibilidade do canal ao ADP e a agentes farmacológicos. Ambas as subunidades Kir e SUR precisam ser expressas para inserção de um canal funcional na membrana plasmática. O canal da célula � do pâncreas é composto de subunidades Kir6.2 e SUR1. Os canais de K+/ATP constitu-ídos de isoformas Kir6.2 e SUR1 também são expressos em

alguns neurônios, enquanto os canais encontrados no músculo cardíaco e no músculo liso expressam isoformas SUR2. Além disso, alguns canais das células musculares lisas contêm Kir6.1 em lugar de Kir6.2. A ocorrência de mutações em Kir6.2 ou SUR1 pode resultar em hipoglicemia hiperinsulinêmica, visto que a célula � é continuamente despolarizada na ausência de atividade do canal K+/ATP. No futuro, a elucidação dos meca-nismos que regulam a expressão tecidual específica das dife-rentes isoformas Kir6 e SUR poderá levar ao desenvolvimento de agentes farmacológicos mais específicos para o tratamento do diabetes melito Tipo II.

Kir6.2 liga-se diretamente ao ATP (embora os modelos de ligação de nucleotídios relevantes não tenham sido identifica-dos), e essa ligação do ATP inibe a condutância de K+ do canal. SUR1 aumenta a sensibilidade do canal Kir6.2 ao ATP; SUR1 também confere sensibilidade do canal ao ADP e à maioria dos fármacos que regulam a atividade do canal de K+/ATP. SUR1 contém duas dobras de ligação de nucleotídios que coor-denam o ADP complexado com Mg2+ (Mg2+-ADP). A ligação Mg2+-ADP a SUR1 ativa o canal e, portanto, inibe a ligação de insulina quando a relação ATP/ADP está baixa.

Além da glicose plasmática, os estimuladores da liberação de insulina incluem diversas substâncias energéticas que atu-am no sentido de aumentar a relação ATP/ADP intracelular, incluindo alguns açúcares diferentes da glicose, aminoácidos e ácidos graxos. A atividade do sistema nervoso parassimpáti-co e os hormônios GI, o peptídio glucagon-símile-1 (GLP-1) e o polipeptídio insulinotrópico dependente de glicose (GIP) também diminuem a atividade do canal de K+/ATP (e, con-seqüentemente, estimulam a secreção de insulina) através de vias mediadas pela proteína G. A exposição das células � a nutrientes promove não apenas a secreção de insulina, como também a sua transcrição, tradução, processamento e acondi-cionamento.

Ação nos Tecidos-AlvoA insulina liga-se a receptores presentes na superfície das célu-las alvo. Apesar de praticamente todos os tecidos expressarem receptores de insulina, os tecidos que armazenam energia (fígado, músculo e tecido adiposo) expressam níveis muitos mais elevados de receptores de insulina e, por conseguinte, constituem os principais tecidos-alvo da insulina. O recep-tor de insulina (Fig. 29.4) é uma glicoproteína constituída por quatro subunidades ligadas por dissulfeto, incluindo duas su bunidades � extracelulares e duas subunidades �. Cada uma das subunidades � é composta de um curto domínio extracelu-lar, um domínio transmembrana e uma cauda intracelular que contém um domínio de tirosinocinase. A ligação da insulina à porção extracelular do receptor de insulina ativa a tirosinoci-nase intracelular, resultando em “autofosforilação” da tirosina na subunidade � adjacente e em fosforilação de várias outras proteínas intracelulares — entre as quais as mais importantes são as proteínas-substrato do receptor de insulina (proteí-nas-IRS). As proteínas-IRS com tirosina fosforilada recrutam uma variedade de segundos mensageiros protéicos, que contêm domínios de homologia 2 src (SH2) de ligação de fosfotirosina. A fosfatidilinositol 3�-cinase (PI3-cinase) Tipo IA é um desses segundos mensageiros protéicos que parecem ser importantes em muitos aspectos da ação da insulina.

Embora os detalhes que ligam esses segundos mensageiros dos receptores de insulina aos efeitos metabólicos da insulina ainda continuem sendo objeto de pesquisa, os efeitos metabó-licos da ação da insulina já estão bem estabelecidos: a insulina

Vesículas de insulina

Ca2+

Influxo de Ca2+

Glicose

Transportador de GLUT2

Canal de K+/ATP

ATP

Inibidores

Sulfoniluréia/meglitinida

SUR1 Kir6.2

Ativadores

Mg2+-ADP

Diazóxido

ADP

Metabolismo

ATP

Secreção de insulina

Célula β do pâncreas

Despolarização da membrana

Condutância do K+

Fig. 29.3 Regulação fisiológica e farmacológica da liberação de insulina pelas células � do pâncreas. No estado basal, a membrana plasmática da célula � encontra-se hiperpolarizada, e a taxa de secreção de insulina da célula é baixa. A glicose, quando presente, penetra na célula através de transportadores GLUT2 na membrana plasmática e é metabolizada, gerando ATP intracelular. O ATP liga-se ao canal de K+/ATP da membrana plasmática, inibindo-o. A inibição do canal de K+/ATP diminui a condutância de K+ da membrana plasmática; a conseqüente despolarização da membrana ativa os canais de Ca2+ regulados por voltagem e, portanto, estimula o influxo de Ca2+. O Ca2+ medeia a fusão das vesículas secretoras que contêm insulina com a membrana plasmática, resultando em secreção da insulina. O canal de K+/ATP, um octâmero composto das subunidades Kir6.2 e SUR1, constitui o alvo de diversos reguladores fisiológicos e farmacológicos. O ATP liga-se a Kir6.2 e inibe essa subunidade, enquanto as sulfoniluréias e as meglitinidas ligam-se a SUR1, inibindo-a; todos esses três agentes promovem a secreção de insulina. O composto mimético do GLP-1, exenatida, que atua como agonista nos receptores de GLP-1 acoplados à proteína G na membrana plasmática da célula � pancreática, também estimula a secreção de insulina dependente de glicose. Essa ação da exenatida parece ser mediada por um aumento do AMP cíclico intracelular e pode envolver um efeito indireto sobre o canal de K+/ATP (não ilustrado). O Mg2+-ADP e o diazóxido ligam-se à subunidade SUR1 e a ativam, inibindo, assim, a secreção de insulina. (Para maior clareza, apenas quatro das oito subunidades do canal de K+/ATP estão ilustradas.)

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constitui o hormônio anabólico (de armazenamento de energia) clássico (Fig. 29.1). No fígado, a insulina aumenta a atividade da glicocinase, mediando, dessa maneira, a fosforilação e o seqüestro da glicose nos hepatócitos. Esse suprimento aumen-tado de glicose nos hepatócitos fornece a energia necessária para a síntese de glicogênio, a glicólise e a síntese de ácidos graxos. A ativação das glicogênio e ácido graxo sintases pela insulina e a inibição da glicogênio fosforilase e das enzimas gliconeogênicas combinam-se para intensificar ainda mais os processos anabólicos.

No músculo esquelético e no tecido adiposo, a insulina esti-mula a translocação do transportador de glicose responsivo à insulina, GLUT4, das vesículas intracelulares para a superfície celular. Por sua vez, a translocação do GLUT4 facilita o movi-mento de glicose para o interior das células. No músculo, a insulina também aumenta a captação de aminoácidos, estimula o mecanismo de síntese de proteínas ribossômicas e promove a atividade da glicogênio sintase e o armazenamento subseqüente do glicogênio. No tecido adiposo, a insulina promove a expres-são da lipoproteína lipase, que hidrolisa os triglicerídios a partir das lipoproteínas circulantes para captação nos adipócitos. Uma vez no interior da célula adiposa, a glicose e os ácidos graxos são armazenados predominantemente na forma de triglicerídios. Esse processo é potencializado pela ativação de outras enzimas lipogênicas, incluindo piruvato cinase, piruvato desidrogenase, acetil-CoA carboxilase e glicerol fosfato aciltransferase, bem

como pela desativação da lipase sensível ao hormônio, que degrada os triglicerídios. A insulina é rapidamente degradada por enzimas, denominadas insulinases, no fígado e no rim; sua meia-vida circulante é de 6 minutos.

GLUCAGONO glucagon — um polipeptídio de cadeia simples de 29 ami-noácidos — é um hormônio catabólico (de liberação de ener-gia), secretado pelas células � do pâncreas. Quando os níveis plasmáticos de glicose estão baixos, o glucagon mobiliza a glicose, a gordura e a proteína dos locais de armazenamento para uso como fontes de energia. Além dos baixos níveis de glicose e dos níveis elevados de insulina, os estímulos para a secreção de glucagon incluem a atividade do sistema ner-voso simpático, o estresse, o exercício e a presença de níveis plasmáticos elevados de aminoácidos (visto que estes últimos indicam um estado de inanição). A ligação do glucagon a seu receptor acoplado à proteína G na membrana plasmática das células-alvo aumenta o cAMP intracelular e ativa a proteino-cinase A, uma serina/treonina cinase. O principal local de ação do glucagon é o fígado, onde promove a glicogenólise e a gliconeogênese (Fig. 29.1). O glucagon também promove a lipólise no tecido adiposo. O fígado e os rins degradam o glucagon; à semelhança da insulina, a sua meia-vida circu-lante é de cerca de 6 minutos.

SOMATOSTATINAA somatostatina — um peptídio de 14 aminoácidos — é pro-duzida em múltiplos locais, incluindo células � do pâncreas, trato gastrintestinal e hipotálamo. A somatostatina exerce vários efeitos inibitórios. Em primeiro lugar, diminui a secreção tanto da insulina quanto do glucagon. Em segundo lugar, inibe a motilidade do trato GI. Em terceiro lugar, inibe a secreção do hormônio tireoestimulante, do hormônio do crescimento e de diversos hormônios GI. Os estímulos para a liberação de somatostatina assemelham-se àqueles para a liberação de insulina: níveis plasmáticos elevados de glicose, aminoácidos e ácidos graxos. A liberação local de somatostatina permite ao hormônio atuar de modo parácrino. A meia-vida circulante da somatostatina é de apenas 2 minutos.

PEPTÍDIO GLUCAGON-SÍMILE-1 (GLP-1)O peptídio glucagon-símile-1 (GLP-1, glucagon-like pep-tide-1) é um hormônio produzido primariamente nas células enteroendócrinas (células L) da parte distal do intestino del-gado (íleo). O GLP-1 é codificado pelo gene do glucagon; o pró-glucagon é alternativamente processado em glucagon nas células � do pâncreas ou em GLP-1 e outros peptídios nas células L intestinais. As formas bioativas do GLP-1 têm um comprimento de 29 ou 30 aminoácidos. O GLP-1 é libe-rado das células L durante a absorção de nutrientes no trato GI. GLP-1 exerce uma variedade de efeitos fisiológicos em vários tecidos-alvo diferentes. No pâncreas, o GLP-1 aumenta a secreção de insulina e suprime a do glucagon. O GLP-1 atua no estômago, retardando o esvaziamento gástrico; além disso, diminui o apetite através de sua ação no hipotálamo. O GLP-1 possui meia-vida curta na circulação (1–2 minutos), devido à sua degradação enzimática pela dipeptidil peptidase IV (DPP-IV).

P P

P P

Mitogênese Síntese de proteínas

Síntese de glicogênio

Insulina

GLUT4

Transporte da glicose

GLUT4

Translocação

Receptor de insulinaGlicose

Glicose

Shc

Grb-2

SOS

Proteínas IRS

Grb-2 SHP-2

?SOS

p85 p110

PI3-cinase

Glicose-6-fosfato

Hexocinase

Metabolismo/armazenamento

Fig. 29.4 Efeitos distais da ativação dos receptores de insulina. O receptor de insulina é um heterotetrâmero de superfície celular, composto por duas subunidades � e duas subunidades �. As subunidades � são totalmente extracelulares, enquanto as subunidades � contêm domínios extracelular, transmembrana e intracelular. A ligação da insulina à porção extracelular do receptor ativa domínios de tirosinocinase nas regiões intracelulares das subunidades �. Esses domínios de tirosinocinase medeiam a “autofosforilação” do receptor (na verdade, cada subunidade � fosforila a outra) e a fosforilação da tirosina de substratos protéicos citoplasmáticos, incluindo Shc e proteínas-substrato do receptor de insulina (IRS). A Shc fosforilada promove a mitogênese. As proteínas IRS fosforiladas interagem com muitas outras proteínas de sinalização (Grb-2, SHP-2, p85 e p110), produzindo alterações na função celular. A interação de IRS com p85 e p110 recruta a fosfatidilinositol 3�-cinase (PI3-cinase). A PI3-cinase ativa cascatas de sinalização que controlam numerosos aspectos da ação celular da insulina, incluindo transporte de glicose (através da translocação dos transportadores de glicose GLUT4 para a superfície celular), a síntese de proteínas e a síntese de glicogênio. A glicose que penetra na célula sofre rápida fosforilação pela hexocinase e, subseqüentemente, é utilizada para metabolismo ou armazenada na célula, sob a forma de glicogênio ou triglicerídios.

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Farmacologia do Pâncreas Endócrino | 499

FISIOPATOLOGIA

DIABETES MELITOJá no ano 200 d.C., o médico grego Areteu observou que certos pacientes tinham sede insaciável e micção excessiva. Deu a essa doença o nome de “diabetes”, cujo significado, em grego, é “sifão” ou “que passa através de”. Posteriormente, os médi-cos acrescentaram “mellitus” (do latim, “melado, doce”) ao nome da doença após verificarem que os pacientes diabéticos produziam uma urina contendo açúcar. A designação diabetes mellitus também diferencia essa doença do diabetes insipidus (ver Cap. 25), em que a desregulação da resposta ao hormônio antidiurético (ADH) inibe a reabsorção de água nos ductos coletores do néfron, resultando na produção de quantidades copiosas de urina diluída.

A síndrome do diabetes melito resulta de um grupo hete-rogêneo de distúrbios metabólicos caracterizados por hiper-glicemia (Quadro 29.2). A hiperglicemia pode resultar de uma ausência absoluta de insulina [diabetes melito Tipo I, também denominado diabetes melito insulino-dependente (DMID) ou diabetes de início juvenil] ou de uma insuficiência relativa de produção de insulina na presença de resistência à insulina [diabetes melito Tipo II, também denominado diabetes melito não-insulino-dependente (DMNID) ou diabetes de início no adulto].

Diabetes Tipo IO diabetes melito Tipo I, que é responsável por 5 a 10% dos casos nos Estados Unidos, resulta da destruição auto-imune das células � no pâncreas. Na ausência de células �, a insulina

não é sintetizada nem liberada, e a concentração de insulina circulante aproxima-se de zero. Na ausência de insulina, os tecidos sensíveis à insulina não conseguem captar e arma-zenar glicose, aminoácidos e lipídios, até mesmo na presença de níveis plasmáticos circulantes elevados dessas substâncias energéticas. A ação dos hormônios contra-reguladores, sem qualquer oposição, induz uma resposta semelhante à inanição pelas células e tecidos do corpo. Assim, a glicogenólise e a gliconeogênese prosseguem sem qualquer regulação no fígado, liberando glicose na circulação, mesmo quando os níveis de glicemia estão elevados. O tecido muscular degrada as proteí-nas e libera aminoácidos, que são transportados até o fígado como substâncias energéticas para a gliconeogênese. No tecido adiposo, os triglicerídios também são degradados e liberados na circulação. Além disso, o fígado efetua a degradação de ácidos graxos para uso como substâncias gliconeogênicas e para exportação na forma de corpos cetônicos, passíveis de serem utilizados pelo cérebro como combustível. Essas cetonas consistem em �-hidroxibutirato e acetoacetato. A presença de concentrações excessivamente altas desses ácidos pode causar depleção do bicarbonato sérico, resultando finalmente em um estado de acidose metabólica, denominada cetoacidose diabé-tica (CAD). A CAD é uma emergência médica grave e poten-cialmente fatal, que exige tratamento agressivo imediato.

Nos pacientes diabéticos, os níveis de glicemia ultrapassam a capacidade do rim de reabsorver a glicose a partir do filtrado glomerular, e a glicose que permanece na urina produz diu-rese osmótica, bem como urina “adocicada”. Esse fenômeno provoca a poliúria e subseqüente polidipsia apresentadas por muitos pacientes diabéticos. Apesar de o apetite ser estimulado — resultando em fome excessiva ou polifagia —, os pacientes perdem peso, visto que os nutrientes da dieta não podem ser armazenados.

QUADRO 29.2 Diabetes Melito Tipo I e Tipo II

TIPO I TIPO II

Etiologia Destruição auto-imune das células � do pâncreas

Resistência à insulina, com função inadequada das células � para compensação

Níveis de insulina Ausentes ou insignificantes Tipicamente mais altos do que o normal

Ação da insulina Ausente ou insignificante Diminuída

Resistência à insulina Não como parte da síndrome, embora possa estar presente (por exemplo, em pacientes obesos)

Sim

Idade de início Tipicamente <30 anos de idade Tipicamente >40 anos de idade

Complicações agudas CetoacidoseConsunção

Hiperglicemia (podendo resultar em convulsões e coma hiperosmóticos)

Complicações crônicas NeuropatiaRetinopatiaNefropatiaDoença vascular periférica Coronariopatia

Iguais às do Tipo I

Intervenções farmacológicas Insulina Dispõe-se de várias classes de fármacos, incluindo insulina se outras formas de terapia não tiverem sucesso

Tanto o diabetes melito Tipo I quanto o Tipo II estão associados a níveis elevados de glicemia, porém as duas doenças resultam de vias fisiopatológicas distintas. No diabetes melito Tipo I, observa-se uma ausência absoluta de insulina secundária à destruição auto-imune das células � do pâncreas. A etiologia do diabetes Tipo II não está tão bem elucidada, mas parece envolver uma redução da sensibilidade à insulina e um nível inadequado de produção compensatória de insulina pelas células � do pâncreas. Embora tanto o diabetes Tipo I quanto o Tipo II tenham complicações agudas diferentes (ver o texto), compartilham complicações crônicas semelhantes. A insulina constitui a intervenção farmacológica primária para o diabetes Tipo I, enquanto o diabetes Tipo II pode ser tratado com diversos fármacos diferentes.

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O início da doença clínica no diabetes Tipo I é habitualmente súbito e, com freqüência, ocorre na infância ou na adolescência. A destruição efetiva das células � ocorre de modo gradual, porém as células � remanescentes são capazes de proporcionar uma quantidade suficiente de insulina até que aproximadamente 85% da população total de células � seja destruída, resultando no início súbito dos sintomas. Como 15% das células � ainda se encontram presentes nesse estágio, muitos pacientes apre-sentam uma fase de “lua-de-mel” de sua doença, com períodos intermitentes de produção adequada de insulina endógena até a ocorrência de perda completa e final de produção de insulina. Em muitos casos, observa-se uma síndrome “de tipo gripal” prodrômica algumas semanas antes da instalação do diabe-tes sintomático. Embora algumas hipóteses aventadas tenham sugerido que essa síndrome representa uma doença viral que deflagra uma reação auto-imune em indivíduos geneticamente predispostos, é possível que esses pacientes estejam, na realida-de, reagindo a níveis aumentados de mediadores inflamatórios produzidos por uma reação auto-imune já iniciada.

A predisposição genética ao diabetes Tipo 1 está mais estrei-tamente mapeada em certos alelos do cromossomo 6. Esses ale-los codificam antígenos leucocitários humanos (HLA), também denominados proteínas do complexo de histocompatibilidade principal (MHC), envolvidos na apresentação de antígenos no sistema imune. Outros loci genéticos também podem contri-buir para o desenvolvimento do diabetes Tipo I. Na maioria dos pacientes com diabetes Tipo I, é possível detectar auto-anticorpos dirigidos contra proteínas das células �. Os fatores ambientais também influenciam o desenvolvimento da doença; se um membro de gêmeos idênticos for afetado, a incidência de diabetes Tipo I no outro gêmeo é de cerca de 50%.

Como os pacientes com diabetes melito Tipo I produzem pouca ou nenhuma insulina endógena, a terapia consiste em reposição com insulina exógena.

Diabetes Tipo IIO diabetes melito Tipo II, que responde por cerca de 90% dos casos nos Estados Unidos, afeta tipicamente indivíduos com mais de 40 anos de idade. A obesidade constitui o único fator de risco mais importante para o diabetes Tipo II, e 80% de todos os pacientes com diabetes melito Tipo II são obesos. Tipica-mente, a doença desenvolve-se de modo gradual, sem qualquer sintoma óbvio no início. Com freqüência, o diabetes Tipo II é diagnosticado pela detecção de níveis de glicemia elevados em testes de triagem de rotina ou, como no caso descrito na introdução, após a doença se tornar grave o suficiente para causar poliúria e polidipsia.

Acredita-se que a progressão para o diabetes Tipo II comece com um estado de resistência à insulina. Os tecidos que antes eram normalmente responsivos à insulina tornam-se relativa-mente refratários à ação do hormônio e necessitam de níveis aumentados de insulina para responder de modo apropriado. Em muitos casos, a resistência à insulina resulta de obesidade ou de um estilo de vida sedentário, embora a predisposição molecular não esteja bem caracterizada nesses pacientes. Os pesquisadores descreveram defeitos no receptor de insulina, bem como defeitos de sinalização pós-receptores. Todavia, não se sabe ao certo se esses defeitos, se houver algum, possam constituir o evento primário na resistência à insulina. No iní-cio, a resistência à insulina é compensada por um aumento da produção de insulina pelas células � do pâncreas. Com efeito, muitos indivíduos com obesidade e resistência à insulina nunca evoluem para o diabetes franco, visto que as células � con-

tinuam compensando através de uma secreção aumentada de insulina. Todavia, em alguns pacientes, como no caso da Sra. S, as células � acabam perdendo a sua capacidade de acompanhar o ritmo das demandas de insulina.

Embora os pacientes com diabetes Tipo II geralmente tenham níveis circulantes elevados de insulina, esses níveis não são suficientes para superar a resistência à insulina nos tecidos-alvo. A incapacidade final de compensação pelas célu-las � pode resultar da perda dessas células através de aumento da apoptose (morte celular programada), ou de uma renovação diminuída dessas células. Os níveis de insulina, que são inade-quados para compensar a resistência à insulina, estimulam uma resposta inapropriada nos tecidos-alvo, resultando em dese-quilíbrio entre as ações da insulina e aquelas dos hormônios contra-reguladores. Esse desequilíbrio leva à hiperglicemia e dislipidemia, visto que o fígado e o tecido adiposo mobilizam inapropriadamente substâncias energéticas a partir dos tecidos de armazenamento.

A base genética do diabetes Tipo II consiste, provavelmente, numa combinação de predisposição à obesidade, resistência à insulina e deficiência das células �. Os pacientes com diabetes Tipo II que são magros (e sensíveis à insulina) geralmente exi-bem uma forte predisposição à deficiência das células �. Com efeito, uma forma de início precoce do diabetes Tipo II — dia-betes de início na maturidade no jovem (MODY) — resulta de uma predisposição à deficiência precoce das células �; em muitos casos, a base molecular dessa predisposição consiste numa mutação herdada em um dos fatores de transcrição espe-cíficos das células �. O diabetes Tipo II leve ou precoce pode manifestar-se em indivíduos predispostos em decorrência de estados em que surge subitamente uma resistência à insulina, como no caso de tratamento com glicocorticóides (ver Cap. 27) ou gravidez (diabetes gestacional).

Não parece haver qualquer contribuição auto-imune no desenvolvimento do diabetes Tipo II, embora existam raras síndromes de resistência à insulina associadas a auto-anticor-pos dirigidos contra a insulina ou o receptor de insulina. Outras mutações raras no receptor de insulina também podem resultar em resistência grave à insulina. Em algumas situações, esses indivíduos nunca evoluem para o diabetes franco, visto que as suas células � são capazes de compensar através de uma produção excessiva de insulina.

A capacidade de pacientes com diabetes Tipo II (como a Sra. S) de produzir insulina sugere que esses indivíduos podem ser tratados com agentes disponíveis por via oral que: (1) contro-lam os níveis de glicemia ao diminuir a velocidade de absorção dos açúcares pelo trato GI; (2) aumentam a secreção de insulina pelas células � do pâncreas; ou (3) sensibilizam as células-alvo à ação da insulina. Os pacientes com diabetes Tipo II que per-deram uma grande quantidade de função das células � podem assemelhar-se clinicamente aos pacientes com diabetes Tipo I, podendo exigir insulinoterapia exógena.

Morbidade e MortalidadeTanto o diabetes Tipo I quanto o Tipo II estão associados a morbidades agudas específicas de cada tipo e a complicações crônicas comuns. No diabetes Tipo I não-controlado, a ação dos hormônios contra-reguladores, sem qualquer oposição, leva à cetoacidose, que pode evoluir rapidamente para o coma e a morte. Com efeito, o diagnóstico de diabetes Tipo I é freqüente-mente estabelecido na sala de emergência em um paciente que chega pela primeira vez com cetoacidose diabética. Mesmo na ausência de cetoacidose grave, a ausência de insulina no

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diabetes Tipo I, se não for tratada, leva à consunção tecidual e à morte no decorrer de um período de várias semanas a meses. Em geral, não ocorre cetoacidose no diabetes Tipo II, visto que esses pacientes produzem habitualmente insulina endógena. Entretanto, a ocorrência de hiperglicemia extrema no diabetes Tipo I ou Tipo II pode causar uma síndrome hiperosmótica, que resulta em alterações do estado mental e que pode evoluir para convulsões, coma e morte.

Tanto o diabetes Tipo I quanto o Tipo II estão associados a patologia vascular a longo prazo. Essas complicações crônicas consistem em aterosclerose prematura, retinopatia, nefropatia e neuropatia. Embora os mecanismos exatos ainda não estejam esclarecidos, parece que essas complicações podem resultar de uma combinação de hiperglicemia, hiperlipidemia e aumen-to da sinalização inflamatória no decorrer de muitos anos. Os objetivos no tratamento do diabetes da Sra. S não consistem apenas em melhorar a polidipsia e poliúria e em normalizar os valores laboratoriais como propósito final, mas também em evitar essas complicações crônicas graves.

Como o diabetes não controlado apresenta complicações muito graves, é de suma importância avaliar acuradamente o nível de controle obtido com qualquer terapia. Os resultados do estudo clínico de referência Diabetes Control and Compli-cations Trial (DCCT), um estudo clínico multicêntrico (1983-1996) envolvendo pacientes com diabetes Tipo I, e do estudo United Kingdom Prospective Diabetes Study (UKPDS, 1998), envolvendo pacientes com diabetes Tipo II, sugerem que a terapia intensiva para manter uma normoglicemia contínua diminui radicalmente a incidência das complicações a longo prazo do diabetes.

Os níveis de glicemia podem ser avaliados de duas manei-ras: de modo agudo, através da determinação da glicemia com monitor de glicose, e cronicamente, pela determinação da hemoglobina glicosilada (HbA1c). Em geral, obtém-se um “controle estrito”, ou manutenção de uma glicemia quase nor-mal, através da determinação dos níveis de glicemia três vezes ao dia, com modificação da dieta e das doses de insulina para manter os níveis de glicemia dentro da faixa normal. Para obter uma estimativa do nível médio de glicemia nos vários meses precedentes, o médico pode determinar a HbA1c. A glicose no sangue glicosila não-enzimaticamente proteínas sangüí-neas; a glicosilação não-enzimática da hemoglobina nos eri-trócitos gera a HbA1c. Como a glicosilação não-enzimática ocorre numa velocidade proporcional ao nível de glicose no sangue, e o tempo de sobrevida dos eritrócitos é de cerca de 120 dias, o nível de HbA1c fornece uma estimativa do nível médio de glicemia no decorrer dos vários meses precedentes. Em conseqüência, o valor da HbA1c pode estar elevado em um paciente que, ao mesmo tempo, apresenta níveis normais de glicemia — o que significa que, embora o nível de glicemia esteja agudamente normal, havia elevação crônica dos níveis de glicose nos vários meses precedentes. O nível de HbA1c da Sra. S de 9,2% é objeto de preocupação, visto que a incidên-cia de complicações diabéticas crônicas aumenta drasticamente com níveis de HbA1c superiores a 7,5%. Os níveis de HbA1c podem estar enganosamente baixos em pacientes com redução do tempo de sobrevida dos eritrócitos (por exemplo, pacientes com anemia hemolítica).

HIPERINSULINEMIA A hiperinsulinemia é uma das várias condições passíveis de resultar em hipoglicemia. A hipoglicemia é problemática, visto que o cérebro necessita de um constante suprimento de glicose

e não é capaz de utilizar substâncias energéticas alternativas tão facilmente quanto os tecidos periféricos podem fazê-lo. A hiperinsulinemia tem várias causas, das quais a mais comum é iatrogênica (isto é, overdose de insulina exógena durante a insulinoterapia em pacientes com diabetes Tipo I ou Tipo II). Um desafio central na terapia do diabetes (Tipo I ou Tipo II) consiste em normalizar adequadamente os níveis de glicose e evitar, ao mesmo tempo, um tratamento excessivo e a ocor-rência de hipoglicemia. Outras causas raras de hipoglicemia incluem insulinomas (tumores secretores de insulina das célu-las � do pâncreas), mutações no canal de K+/ATP das células � (por exemplo, mutações em Kir6.2 ou SUR1, que resultam em despolarização constitutiva) e auto-anticorpos de ativação dirigidos contra o receptor de insulina.

CLASSES E AGENTES FARMACOLÓGICOS

TERAPIA DO DIABETES

Estratégias da Terapia O principal objetivo da terapia farmacológica no diabetes con-siste em normalizar os parâmetros metabólicos, como a glice-mia, para reduzir o risco de complicações a longo prazo. Para pacientes com diabetes Tipo I, a estratégia farmacológica con-siste na administração de uma quantidade suficiente de insulina exógena para obter normoglicemia, sem induzir hipoglicemia. O tratamento apropriado de pacientes com diabetes Tipo I não apenas produz normoglicemia, como também reverte a resposta de inanição metabólica mediada pela ação dos hormônios con-tra-reguladores sem qualquer oposição. Por exemplo, o trata-mento com insulina reverte a degradação dos aminoácidos no músculo e a cetogênese no fígado.

O tratamento do diabetes Tipo II é multifacetado. Em pri-meiro lugar, os pacientes obesos devem empenhar-se para reduzir o peso corporal e aumentar os exercícios físicos, a fim de melhorar a sensibilidade à insulina. Alguns pacientes com diabetes Tipo II podem conseguir um bom controle da doença ao modificar a sua dieta e hábitos de exercícios físicos; o dia-betes da Sra. S com certeza melhoraria notavelmente com essas mudanças no estilo de vida. Os tratamentos farmacológicos incluem agentes disponíveis por via oral que atuam no sentido de retardar a velocidade de absorção da glicose no intestino (inibidores da �-glicosidase), aumentar a secreção de insulina pelas células � (sulfoniluréias, meglitinidas e compostos mimé-ticos do GLP-1) ou aumentar a sensibilidade à insulina nos tecidos-alvo (tiazolidinedionas e biguanidas). Em geral, esses agentes são ineficazes para pacientes com diabetes Tipo I. Os pacientes com diabetes Tipo II são freqüentemente tratados com associações desses fármacos e, por conseguinte, utilizam múltiplas estratégias; entretanto, alguns acabam necessitando de tratamento com insulina exógena. Os diversos agentes uti-lizados são discutidos adiante dentro de uma estrutura que irá ressaltar seus locais e mecanismos de ação, acompanhando a via de metabolismo da glicose desde a sua absorção intestinal até a secreção de insulina e o metabolismo e armazenamento da glicose nos tecidos-alvo (Fig. 29.1).

Inibidores da Absorção Intestinal de Glicose: Inibidores da �-GlicosidaseOs inibidores da �-glicosidase — apelidados de “bloqueadores do amido”— são análogos de carboidratos que se ligam 1.000

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vezes mais avidamente do que os carboidratos da dieta às enzi-mas �-glicosidases da borda em escova intestinal. As glicosi-dases — maltase, isomaltase, sacarase e glicoamilase — ajudam no processo de absorção através da clivagem dos carboidratos complexos, produzindo glicose. Ao inibir reversivelmente essas enzimas, os inibidores da �-glicosidase aumentam o tempo necessário para a absorção de carboidratos como amido, dex-trina e dissacarídios. Esses fármacos também aumentam a área de superfície intestinal para absorção, visto que os carboidratos que teriam sido absorvidos na parte superior do intestino sofrem absorção — em quantidades menores — em toda a extensão do intestino delgado. Por conseguinte, esses fármacos ajudam a reduzir o pico pós-prandial da glicemia. Os inibidores da �-glicosidase são efetivos quando tomados nas refeições, porém não são efetivos quando administrados em outros momentos. O aumento do nível de glicemia em jejum da Sra. S sugere que, no seu caso, a monoterapia com inibidor da �-glicosidase provavelmente seria ineficaz.

A acarbose foi introduzida nos Estados Unidos em 1996, e o miglitol, em 1999; esses dois agentes são igualmente efetivos. Quando utilizados como monoterapia, ambos reduzem o nível de glicemia em jejum em 25 a 30 mg/dL (1,3 a 1,7 mmol/L), o nível de glicemia pós-prandial em 40 a 50 mg/dL (2,2 a 2,8 mmol/L) e a HbA1c em 0,7 a 0,9%, e a sua administração não está associada a nenhum risco de hipoglicemia. Os inibidores da �-glicosidase também são úteis como terapia adjuvante. Esses fármacos têm maior utilidade para pacientes com hiperglicemia predominantemente pós-prandial, bem como pacientes com início recente que apresentam hiperglicemia leve. Os efeitos adversos comuns consistem em flatulência, distensão e descon-forto abdominal, que resultam do gás liberado por bactérias que atuam sobre carboidratos não-digeridos que alcançam o intesti-no grosso. Em geral, o desconforto gastrintestinal diminui com o uso contínuo do inibidor da �-glicosidase; esses fármacos estão contra-indicados para pacientes com doença intestinal inflamatória. Os níveis séricos de aminotransferase devem ser monitorizados durante o tratamento; esses fármacos estão asso-ciados a uma elevação dependente da dose nos níveis de ami-notransferases, que é reversível com a interrupção do fármaco. Além disso, os inibidores da �-glicosidase são associados a um aumento moderado dos níveis plasmáticos de triglicerídios. O uso desses agentes não está associado a qualquer alteração do peso corporal.

Reposição de Insulina: Insulina ExógenaA insulina constitui o único tratamento para pacientes com diabetes Tipo I. A insulina também é utilizada em pacientes com diabetes Tipo II se a dieta e outras formas de terapia não forem efetivas o suficiente para controlar a hiperglicemia. As preparações de insulina são classificadas de acordo com o seu início de ação, duração de ação e origem (isto é, humana, suína ou bovina). Foram empregadas técnicas de DNA recombinante para produzir insulina humana in vitro, tornando essa forma do fármaco uma escolha cada vez mais popular em relação a outras preparações (suína ou bovina) que podem transgredir certas restrições religiosas e/ou provocar resposta imune.

Como a insulina é uma proteína sujeita a rápida degradação no trato GI, não é efetiva como agente oral. Com efeito, a insu-lina é administrada por via parenteral, tipicamente com injeção subcutânea com agulha de calibre fino, que cria um pequeno depósito do hormônio no local de injeção. A velocidade de absor-ção desse depósito de insulina depende de uma variedade de fatores, incluindo a solubilidade da preparação e a circulação

local. Quanto mais rápida a absorção de determinada preparação, mais rápido também o seu início de ação e mais curta a dura-ção de ação. A variabilidade entre pessoas e a variabilidade de um local de injeção para outro podem produzir grandes diferen-ças na velocidade de absorção e, portanto, no perfil de ação da insulina injetada. O Quadro 29.3 fornece uma classificação das preparações de insulina mais comumente utilizadas em quatro categorias, com base no início, pico e duração de ação.

A insulina regular, uma preparação de ação curta, é estru-turalmente idêntica à insulina endógena, porém com adição de íons zinco para obter estabilidade. A insulina regular tende a agregar-se em hexâmeros, e a dissociação desses hexâme-ros em monômeros constitui a etapa que limita a velocidade no processo de absorção. A insulina lispro, uma insulina de ação ultra-rápida, foi desenvolvida para manter a molécula em uma forma monomérica para acelerar a sua absorção. A insulina lispro assemelha-se estruturalmente à insulina regular, com exceção de uma seqüência de dois aminoácidos (lisina e prolina) próximo à extremidade carboxi-terminal da cadeia B, que teve a sua posição invertida (ver Fig. 29.2). A insuli-na lispro oferece flexibilidade e conveniência para o pacien-te, visto que pode ser injetada poucos minutos antes de uma refeição, enquanto o uso correto das insulinas de ação mais longa exige um intervalo de tempo entre a injeção da insulina e o consumo de uma refeição. Na insulina NPH (protamina neutra Hagedorn), uma preparação de ação intermediária, a insulina é combinada com protamina — uma proteína isolada do esperma da truta arco-íris — em uma suspensão de zinco. A protamina prolonga o tempo necessário para a absorção da insulina, visto que permanece complexada com o hormônio até que a protamina seja clivada da insulina por enzimas proteo-líticas. A insulina ultralenta, uma preparação de ação longa, é uma suspensão cristalina de insulina e zinco em tampão de acetato. Essa formulação retarda o início de ação da insulina. A insulina semilenta é semicristalina ou “amorfa” e de ação curta. A insulina lenta é uma combinação de insulina cristalina (isto é, ultralenta) e semicristalina (isto é, semilenta) e zinco em suspensão em tampão de acetato. Essa formulação é de ação mais lenta do que a insulina semilenta, porém de ação mais rápida do que a insulina ultralenta; por conseguinte, é classi-ficada dentro da categoria de ação intermediária. A insulina glargina é uma insulina regular em que uma glicina substitui uma asparagina na cadeia A, com adição de duas argininas na extremidade carboxi-terminal da cadeia B (Fig. 29.2). Essas modificações tornam a pKa da insulina mais neutra, diminuin-do, assim, a velocidade de sua absorção no ambiente neutro do sangue. A glargina tem a vantagem de uma longa duração de ação e liberação uniforme sem produzir um pico (imitando a denominada secreção “basal” de insulina).

Os esquemas de insulina — incluindo a preparação, a dose e a freqüência de administração — são individualizados para cada paciente. Além disso, os esquemas são, com freqüência, ajustados ligeiramente a cada dia, de acordo com a atividade do paciente, o tamanho e a composição das refeições e os níveis de glicemia. Por exemplo, alguns pacientes injetam insulina de ação curta antes das refeições, e insulina de ação longa para proporcionar níveis basais de insulina durante a noite. Continua havendo progressos na insulinoterapia. As empresas farmacêuticas continuam desenvolvendo preparações que irão imitar mais estreitamente os níveis sangüíneos pós-prandiais fisiológicos de insulina. Os pesquisadores também estão pro-curando obter preparações de ação mais longa com velocida-de de absorção mais uniforme. Além disso, novas técnicas de liberação de fármacos estão sendo testadas para criar alterna-

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Farmacologia do Pâncreas Endócrino | 503

tivas para a injeção subcutânea (ver Cap. 54), como formas intranasais e pulmonares, bem como bombas miniaturas para liberação contínua.

O principal perigo da insulinoterapia é o de que a admi-nistração de insulina na ausência de ingestão adequada de carboidratos pode resultar em hipoglicemia. Por conseguinte, os pacientes — com diabetes tanto do Tipo I quanto do Tipo II — devem ser alertados para não injetar uma quantidade muito grande de insulina. Enquanto o controle estrito da glicemia, que visa manter a normoglicemia, diminui efetivamente a inci-dência de complicações diabéticas, ele também aumenta a fre-qüência de episódios hipoglicêmicos. Com efeito, é um desafio manter um delicado equilíbrio entre quantidades insuficientes e excessivas de insulina.

Em pacientes com diabetes Tipo II, como a Sra. S, a resistên-cia à insulina é tipicamente mais grave no músculo e no fígado do que nas células adiposas. Por essa razão, a insulina deposita preferencialmente calorias no tecido adiposo, e a insulinote-rapia em pacientes com resistência à insulina (particularmen-te aqueles que já são obesos, como a Sra. S) freqüentemente resulta em ganho de peso.

Secretagogos da Insulina: Sulfoniluréias e MeglitinidasSulfoniluréias Desde a década de 1950, as sulfoniluréias passaram a con-stituir os principais fármacos orais disponíveis nos Estados

Unidos para o tratamento do diabetes Tipo II. As sulfonilu-réias estimulam a liberação de insulina das células � do pân-creas, aumentando, assim, a insulina circulante para níveis suficientes para superar a resistência à insulina. Em nível molecular, as sulfoniluréias atuam ao inibir o canal de K+/ATP da célula � na subunidade SUR1 (Fig. 29.3). (A subu ni-dade SUR recebeu essa designação por ser o “Receptor de SUlfoniluréias” [SUlfonylurea Receptor].) As sulfoniluréias podem atuar ao deslocar o Mg2+-ADP endógeno, que se liga à subunidade SUR1, ativando o canal. As sulfoniluréias uti-lizadas no tratamento do diabetes Tipo II ligam-se com maior afinidade à isoforma SUR1 do que SUR2, explicando a sua relativa especificidade para as células �. A inibição do canal de K+/ATP pelas sulfoniluréias é funcionalmente semelhante aos eventos moleculares induzidos em condições fisiológicas no estado pós-prandial, em que o aumento do metabolismo da glicose produz acúmulo de ATP intracelular nas células �, despolarização da membrana, influxo de Ca2+, fusão das vesículas que contêm insulina com a membrana plasmática e secreção de insulina.

As sulfoniluréias, que são disponíveis por via oral, são meta-bolizadas pelo fígado. Em geral, esses fármacos são seguros, e o principal efeito adverso consiste em hipoglicemia devido à secreção excessiva de insulina. Por conseguinte, essas medica-ções devem ser utilizadas com cautela em pacientes incapazes de reconhecer ou de responder apropriadamente à hipoglicemia, como aqueles que apresentam comprometimento da função

QUADRO 29.3 Preparações de Insulina Comumente Utilizadas

Perfil de Ação (Horas)

TIPO DE PREPARAÇÃO CONSTITUINTES INÍCIO PICO DURAÇÃO USO

Ação Ultra-rápida Lispro (análogo humano)

Idêntica à insulina humana regular, com exceção da transposição de lisina e prolina na cadeia B

0,2–0,5 0,5–2 3–4 Para refeições ou hiperglicemia aguda

Ação CurtaRegular (humana) Solução de cristais de insulina zíncica

não modificada 0,5–1 2–3 6–8 Para refeições ou

hiperglicemia agudaSemilenta (humana) Suspensão semicristalina (amorfa) 1–2 2–5 8–12Ação IntermediáriaNPH (humana) Zíncica com protamina, tampão de

fosfato 1,5 4–10 16–24 Proporciona uma

insulina basal e cobertura durante a noite

Lenta (humana) Mistura de cristalina/amorfa, tampão de acetato

1,5–3 7–15 16–24

Ação Longa Ultralenta (humana) Suspensão cristalina, tampão de

acetato 4–6 8–30 24–36 Proporciona uma

insulina basal e cobertura durante a noite

Glargina (análogo humano)

Semelhante à insulina humana regular, com glicina em lugar da asparagina na cadeia A e duas argininas adicionais na cadeia B

4–6 Nenhuma 18–24

As modificações da insulina humana nativa consistem em (1) alterações na seqüência de aminoácidos da molécula ou (2) mudanças na forma física da molécula. Essas modificações afetam a velocidade de absorção da insulina e o perfil temporal de ação da insulina. As alterações na seqüência de aminoácidos modificam a tendência da insulina a agregar-se. A modificação na insulina lispro diminui a agregação, resultando em absorção e ação mais rápidas. Em contrapartida, a suspensão cristalina (ultralenta) retarda a velocidade de absorção da insulina de seu local de injeção subcutânea, tornando essa preparação uma forma de ação longa.

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504 | Capítulo Vinte e Nove

simpática, alterações do estado mental ou idade avançada. Os estudos conduzidos mostram que o uso de sulfoniluréias está associado a uma diminuição marginal dos lipídios circulantes. Esses agentes podem produzir ganho de peso secundariamente a um aumento da atividade da insulina no tecido adiposo. Esse efeito adverso é obviamente contraproducente em pacientes obesos, como a Sra. S. Por conseguinte, as sulfoniluréias são mais apropriadas para pacientes não-obesos. Como as sulfo-niluréias de primeira geração ligam-se com menor afinidade à subunidade SUR1 do que os agentes de segunda geração, as sulfoniluréias de primeira geração devem ser administradas em doses mais altas para obter o mesmo grau de redução da glicose. Em geral, as sulfoniluréias são fármacos efetivos, seguros e baratos (disponíveis em forma genérica), que constituem uma das bases do tratamento do diabetes Tipo II.

Meglitinidas A exemplo das sulfoniluréias, as meglitinidas estimulam a li beração de insulina através de sua ligação à subunidade SUR1 e inibição do canal de K+/ATP das células �. Embora tanto as sulfoniluréias quanto as meglitinidas atuem sobre a subuni-dade SUR1, essas duas classes de fármacos ligam-se a regiões distintas da molécula SUR1. A absorção, o metabolismo e o perfil de efeitos adversos das meglitinidas assemelham-se aos das sulfoniluréias.

Sensibilizadores da Insulina: Tiazolidinedionas e BiguanidasTiazolidinedionas As tiazolidinedionas (TZD) constituem uma classe relativa-mente recente de fármacos orais para o diabetes Tipo II; os dois agentes atualmente disponíveis nos Estados Unidos — a rosiglitazona e a pioglitazona — foram aprovados para uso pela FDA em 1999. As TZD não afetam a secreção de insulina, mas intensificam a ação da insulina nos tecidos-alvo. As TZD são agonistas do receptor de hormônio nuclear, o receptor-� ativado por proliferador peroxissômico (PPAR�). As iden-tidades dos ligantes endógenos do PPAR� ainda não foram elucidadas. O PPAR� atua como heterodímero com o receptor retinóide X (RXR, outro receptor nuclear de hormônios) para ativar a transcrição de um subgrupo de genes envolvidos no metabolismo da glicose e dos lipídios; nem todos esses genes foram identificados. O PPAR�, que é expresso primariamente no tecido adiposo, está envolvido na diferenciação dos adipóci-tos. Os estudos realizados mostraram que células que hiperex-pressam o PPAR� acumulam triglicerídios e adquirem outros marcadores de adipócitos quando tratadas com TZD. Embora o tratamento com TZD melhore a sensibilidade à insulina não apenas no tecido adiposo como também no fígado e no músculo (os principais locais de resistência à insulina no diabetes Tipo II), os mecanismos responsáveis pelos efeitos desses fármacos no fígado e no músculo continuam sendo misteriosos, particu-larmente pelo fato de o PPAR� estar expresso em baixos níveis nesses tecidos. Na verdade, o efeito das TZD sobre o fígado e o músculo é provavelmente indireto, visto que o tratamento in vitro desses tecidos isolados com TZD tem pouco efeito (exceto pela inibição da gliconeogênese nos hepatócitos). Uma teoria formulada sugere que as alterações mediadas por TZD/PPAR� na expressão dos genes dos adipócitos resultam em mudanças no metabolismo das gorduras que alteram o ambiente metabóli-co dos hepatócitos e das células musculares, aumentando, em última analise, a sensibilidade desses tecidos à insulina.

Embora nosso conhecimento dos mecanismos molecula-res através dos quais as TZD atuam permaneça incompleto, é evidente que o tratamento com TZD aumenta efetivamente a sensibilidade à insulina, resultando em diminuição dos níveis de glicemia e de insulina. Os efeitos sensibilizadores das TZD sobre a insulina são benéficos no tratamento não apenas do diabetes Tipo II, mas também de outras síndromes associadas a resistência à insulina/hiperinsulinemia, como a síndrome do ovário policístico (SOPC; ver Cap. 28).

Como as TZD constituem uma classe mais recente de fárma-cos, seu perfil de efeitos adversos ainda está sendo definido. Os efeitos como ganho de peso e diminuição dos níveis circulantes de triglicerídios e ácidos graxos livres podem ser explicados pelo efeito estimulador das TZD sobre os adipócitos. Ao con-trário dos secretagogos da insulina, as TZD não aumentam os níveis de insulina e, por conseguinte, não induzem hipoglice-mia. A TZD original introduzida nos Estados Unidos (trogli-tazona) foi associada a uma hepatotoxicidade rara, levando à sua retirada do mercado. As TZD mais recentes parecem ter menos hepatotoxicidade.

Biguanidas A exemplo das TZD, as biguanidas atuam ao aumentar a sensi-bilidade à insulina. O alvo molecular das biguanidas parece ser a proteinocinase dependente de AMP (AMPPK [AMP-depen-dent protein kinase] — que não deve ser confundida com a pro-teinocinase A). As biguanidas ativam a AMPPK, bloqueando a degradação dos ácidos graxos e inibindo a gliconeogênese e a glicogenólise hepáticas. Os efeitos secundários incluem aumento da sinalização da insulina (isto é, atividade aumentada do receptor de insulina), bem como aumento da responsivi-dade metabólica do fígado e do músculo esquelético. O efeito adverso mais comum consiste em leve desconforto gastrintesti-nal, que é habitualmente transitório e pode ser minimizado por uma titulação lenta da dose. A acidose láctica representa um efeito adverso potencialmente mais grave. Como as biguanidas diminuem o fluxo de ácidos metabólicos através das vias glico-neogênicas, pode ocorrer acúmulo de ácido láctico até níveis perigosos em pacientes tratados com esses fármacos. No caso da metformina, introduzida nos Estados Unidos em 1995 — e que constitui a única biguanida atualmente disponível naquele país —, a incidência de acidose láctica é baixa e previsível. A aci-dose láctica é mais comum quando a metformina é administrada a pacientes que apresentam outras condições que predispõem à acidose metabólica. Por conseguinte, a metformina não deve ser administrada a pacientes com doença hepática, insuficiência cardíaca, doença respiratória, hipoxemia, infecção grave, con-sumo excessivo de álcool, tendência à cetoacidose ou doença renal (visto que as biguanidas são excretadas pelos rins).

A exemplo das TZD, as biguanidas não afetam diretamen-te a secreção de insulina, de modo que o seu uso não está associado ao desenvolvimento de hipoglicemia. Além disso, ao contrário da insulina e dos secretagogos da insulina, as bigua-nidas estão associadas a uma redução dos lipídios séricos e a uma diminuição do peso corporal. À semelhança das TZD, as biguanidas também são úteis no tratamento de outras afecções, como a SOPC, que estão associadas a resistência a insulina e hiperinsulinemia.

Agonistas do GLP-1 e Compostos MiméticosOs compostos miméticos do GLP-1 constituem a mais recente classe de fármacos desenvolvidos para o tratamento do dia-

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Farmacologia do Pâncreas Endócrino | 505

betes. Como GLP-1 é um hormônio peptídico com meia-vida circulante curta, houve necessidade de efetuar modificações moleculares para aumentar a sua bioatividade. A exenatida é um análogo de ação longa do GLP-1 derivado da glândula salivar do monstro-de-gila. Atua como agonista integral nos receptores de GLP-1 humanos. A exenatida foi aprovada para uso clínico nos Estados Unidos em 2005. O fármaco deve ser injetado, tipicamente duas vezes ao dia, sendo utilizado em associação com a metformina ou uma sulfoniluréia para melho-rar o controle da glicose. Como mimético do GLP-1, a exena-tida apresenta vários modos de ação que beneficiam pacientes com diabetes: aumenta a secreção de insulina pelas células � do pâncreas, particularmente quando os níveis de glicose estão elevados; suprime a secreção de glucagon pelas células � do pâncreas, retarda o esvaziamento gástrico (e, portanto, diminui a velocidade de entrada dos nutrientes da circulação); e diminui o apetite.

A sitagliptina é um inibidor seletivo da DPP-IV, a enzima plasmática que rapidamente inativa os hormônios circulantes da incretina, como GLP-1. Nos estudos clínicos realizados, a terapia com sitagliptina aumentou as concentrações circulantes de GLP-1 e de insulina, diminuiu a concentração de glucagon e aumentou a responsividade da liberação de insulina a uma carga de glicose oral em pacientes com diabetes Tipo II. Com base nesses estudos clínicos, a sitagliptina foi aprovada em 2006 como adjuvante da dieta e dos exercícios físicos para melhorar o controle da glicose no diabetes Tipo II. Pode ser utilizada como monoterapia ou em associação com uma TZD ou com metformina (ver adiante).

Terapia de Combinação Conforme discutido anteriormente, os pacientes com diabetes que necessitam de insulina (incluindo diabetes tanto do Tipo I quanto do Tipo II) beneficiam-se de uma otimização individual da terapia com o uso de associações de preparações de insulina de ação curta e de ação longa. Com a disponibilidade de um maior número de agentes orais para o tratamento do diabetes Tipo II, a terapia de combinação oral também se tornou uma realidade para esses pacientes. Em geral, a terapia de combi-nação com fármacos que afetam diferentes alvos moleculares e que apresentam mecanismos distintos de ação tem a vantagem de melhorar o controle da glicemia, ao mesmo tempo que é possível utilizar uma dose menor de cada fármaco, reduzindo, assim, os efeitos adversos. Por exemplo, a associação de um sensibilizador da insulina (por exemplo, uma TZD ou met-formina) com insulina ou com um secretagogo da insulina (por

exemplo, sulfoniluréia) pode melhorar o controle glicêmico em um paciente com diabetes Tipo II mal controlado e diminuir a dose de cada fármaco necessária para obter um efeito tera-pêutico. As TZD e a metformina, que são sensibilizadores da insulina, porém com mecanismos distintos de ação, também podem ser utilizadas efetivamente em associação. Entretanto, a combinação de dois secretagogos diferentes da insulina não melhora o desfecho terapêutico.

Qual seria, então, o tratamento ideal para a Sra. S, em vista da possível escolha de numerosos agentes disponíveis? Em pri-meiro lugar, é importante promover (como em todos os casos de diabetes) uma perda de peso e um aumento dos exercícios físicos. Com freqüência, os pacientes com diabetes Tipo II — particularmente os que são de mais idade e obesos — começam com um agente sensibilizador da insulina, que não predispõe à hipoglicemia nem a um aumento de peso corporal. Como a Sra. S não parece ter doença renal nem outra contra-indicação para o tratamento com biguanidas, a metformina poderia ser uma escolha razoável. Uma TZD também seria um fármaco inicial razoável. Se a monoterapia com metformina ou com uma TZD não diminuir adequadamente o nível de glicemia e os níveis de HbA1c da Sra. S, pode-se tentar uma associação de ambos os fármacos. Alternativamente, a adição de uma sulfoniluréia ao sensibilizador de insulina poderia ser uma escolha razoá-vel. Consulte o Quadro 29.4 para uma comparação dos efeitos adversos associados ao uso a longo prazo de várias terapias diferentes para o diabetes Tipo II.

TERAPIA DE HIPERINSULINEMIA Embora a excisão cirúrgica constitua, em última análise, o tratamento de escolha para os insulinomas, o diazóxido e a octreotida são dois fármacos freqüentemente utilizados para estabilizar pacientes hipoglicêmicos no pré-operatório. O diazóxido liga-se à subunidade SUR1 dos canais de K+/ATP nas células � do pâncreas e estabiliza o estado do canal ligado ao ATP (aberto), de modo que as células � permanecem hiper-polarizadas. São conhecidos vários agentes desse tipo que abrem o canal de K+/ATP, porém a maioria é específica para isoformas SUR2 e, portanto, carece de utilidade para o canal SUR1/Kir6.2 expresso pelas células � do pâncreas. O diazóxi-do liga-se a canais que contêm isoformas SUR1 e SUR2 e, por conseguinte, é utilizado não apenas para diminuir a secreção de insulina pelas células � do pâncreas, como também para hiperpolarizar as células do músculo cardíaco e as células musculares lisas que expressam SUR2 e, ao manter essas célu-

QUADRO 29.4 Efeitos Adversos no Decorrer da Administração Durante 10 Anos: Comparação de Vários Agentes Utilizados como Monoterapia para o Diabetes Melito Tipo II

AGENTEAUMENTO DO PESO CORPORAL (EM

COMPARAÇÃO COM DIETA APENAS), kgHIPOGLICEMIA GRAVE,*

% DE INDIVÍDUOS HIPOGLICEMIA SINTOMÁTICA,**

% DE INDIVÍDUOS

Insulina 4,0 2,3 36

Sulfoniluréia 2,2 0,5 14

Biguanida 0 0 4

Como o diabetes é uma doença crônica, é importante considerar as implicações a longo prazo da terapia. Tanto a insulina quanto as sulfoniluréias são capazes de reduzir a glicemia para níveis perigosos, enquanto as biguanidas carecem desse efeito adverso. Além disso, o uso de biguanidas não está associado a um aumento do peso corporal, enquanto os pacientes em uso de insulina ou de uma sulfoniluréia tendem a ganhar peso.*A hipoglicemia grave é definida como a hipoglicemia que exige hospitalização ou outra intervenção por terceiros responsáveis. **A hipoglicemia sintomática é definida como a hipoglicemia que não necessita de hospitalização. (Dados do United Kingdom Prospective Diabetes Study [UKPDS] 1998.)

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506 | Capítulo Vinte e Nove

las num estado mais relaxado, diminuir a pressão arterial nas emergências hipertensivas. Numa forma rara de hipoglicemia hiperinsulinêmica genética, uma isoforma SUR1 mutante é relativamente insensível ao Mg2+-ADP, porém responde ao diazóxido; todavia, na maioria das formas dessa doença, o canal mutante não é transportado até a superfície da célula, e o diazóxido é ineficaz.

A octreotida é um análogo da somatostatina (ver Cap. 25) cuja ação é mais longa que a da somatostatina endógena. A exemplo da somatostatina, esse agente bloqueia a liberação hor-monal de tumores secretores endócrinos, como insulinomas, glucagonomas e adenomas hipofisários secretores de tireotro-pina.

GLUCAGON COMO AGENTE TERAPÊUTICOO glucagon é utilizado no tratamento da hipoglicemia grave, quando a administração de glicose oral ou intravenosa não é possível. A exemplo da insulina, o glucagon é administrado por injeção subcutânea. A ação hiperglicêmica do glucagon é transitória e requer um armazenamento hepático suficiente de glicogênio. O glucagon também é utilizado como relaxante intestinal antes de radiografias ou de ressonância magnética (RM) do trato gastrintestinal. O mecanismo pelo qual o gluca-gon medeia o relaxamento intestinal permanece incerto.

n Conclusão e Perspectivas FuturasOs hormônios pancreáticos insulina, glucagon e somatostatina estão envolvidos na homeostasia energética. Quando os níveis desses hormônios estão patologicamente alterados, o indivíduo pode desenvolver hiperglicemia (como no diabetes melito) ou hipoglicemia. Diversos agentes farmacológicos atuam em diferentes locais celulares e moleculares para normalizar os níveis de glicemia. Os inibidores da �-glicosidase retardam a absorção intestinal dos carboidratos. A insulina exógena, as sulfoniluréias e as meglitinidas aumentam os níveis de insu-

lina, enquanto o diazóxido os diminui. As tiazolidinedionas e as biguanidas aumentam a sensibilidade dos tecidos-alvo à insu-lina. A octreotida, uma forma sintética da somatostatina, possui amplos efeitos inibitórios sobre a secreção de hormônios. O glucagon exógeno pode ser utilizado para aumentar os níveis plasmáticos de glicose. A pesquisa futura no tratamento farma-cológico do diabetes irá enfocar uma delineação mais precisa dos mecanismos moleculares dos tratamentos atuais e uma melhor compreensão da fisiopatologia molecular e celular do diabetes melito Tipo II. Essa pesquisa também irá incluir, entre outras metas, a elucidação dos alvos de ação do PPAR�, a otimização de produtos miméticos do GLP-1 e a inibição do papel contra-regulador do glucagon. Além disso, os estudos clínicos continuarão a aprimorar o papel da terapia oral de combinação para o diabetes melito Tipo II, numa tentativa de manter a normoglicemia a longo prazo, sem qualquer episódio de hipoglicemia.

n Leituras Sugeridas DeWitt DE, Hirsch IB. Outpatient insulin therapy in type 1 and type

2 diabetes mellitus: scientific review. JAMA 2003;299:2254–2264. (Revisões das apresentações de insulina atualmente disponíveis e seus perfis farmacodinâmicos e farmacocinéticos.)

Drucker DJ. The biology of incretin hormones. Cell Metab 2006; 3:153–165. (Revisão da fisiologia básica de GLP-1 e dos hormô-nios correlatos.)

Hardie DG. Minireview: the AMP-activated protein kinase cas-cade: the key sensor of cellular energy status. Endocrinology 2003;144:5179–5183. (Revisão da função e do mecanismo de ação do provável alvo biguanida.)

Krentz AJ, Bailey CJ. Oral antidiabetic agents: current role in type 2 diabetes mellitus. Drugs 2005;65:385–411. (Revisão meticulosa da farmacologia dos agentes orais usados no tratamento do diabetes melito, com ênfase especial na terapêutica.)

Nathan DM. Initial management of glycemia in type 2 diabetes melli-tus. N Engl J Med 2002;347:1342–1349. (Abordagem terapêutica clinicamente orientada do diabetes melito, incluindo dieta, exercí-cios físicos, insulina, agentes e associações terapêuticas.)

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ão c

urta

Sem

ilent

a, d

e aç

ão c

urta

NP

H, d

e aç

ão

inte

rmed

iári

aL

enta

, de

ação

in

term

ediá

ria

Ult

rale

nta,

de

ação

lon

gaG

larg

ina,

de

ação

lon

ga

Dia

bete

s m

elito

H

ipog

lice

mia

Rea

ção

no l

ocal

de

inje

ção,

lip

odis

trof

ia

Hip

oglic

emia

N

ão d

ispo

níve

l po

r vi

a or

al;

deve

ser

adm

inis

trad

a po

r vi

a pa

rent

eral

; a

via

subc

utân

ea é

mai

s co

mum

A i

nsul

ina

lispr

o é

de a

ção

ultr

a-rá

pida

; of

erec

e fl

exib

ilida

de e

co

nven

iênc

ia,

vist

o qu

e po

de s

er i

njet

ada

pouc

os m

inut

os a

ntes

de

um

a re

feiç

ãoA

ins

ulin

a re

gula

r é

de a

ção

curt

a; r

ecen

tem

ente

apr

ovad

a pa

ra

liber

ação

pul

mon

arA

ins

ulin

a N

PH é

de

ação

int

erm

ediá

ria;

con

tém

pro

tam

ina,

que

pr

olon

ga o

tem

po n

eces

sári

o pa

ra a

abs

orçã

o da

ins

ulin

aA

ins

ulin

a ul

tral

enta

é d

e aç

ão l

onga

; a

insu

lina

sem

ilent

a é

de

ação

cur

ta;

e a

insu

lina

lent

a é

de a

ção

inte

rmed

iári

aA

ins

ulin

a gl

argi

na t

em a

van

tage

m d

e aç

ão l

onga

e l

iber

ação

un

ifor

me

sem

pic

o (i

mita

ndo

a se

creç

ão “

basa

l” d

e in

sulin

a)O

pri

ncip

al p

erig

o da

ins

ulin

oter

apia

é a

hip

oglic

emia

, qu

e po

de

resu

ltar

da a

dmin

istr

ação

de

insu

lina

na a

usên

cia

de i

nges

tão

adeq

uada

de

carb

oidr

atos

SECR

ETAG

OG

OS

DA I

NSU

LIN

A: S

ULF

ON

ILU

RÉIA

S E

MEG

LITI

NID

ASM

ecan

ism

o —

As

sulf

onilu

réia

s e

as m

eglit

inid

as i

nibe

m o

can

al d

e K

+/A

TP

das

cél

ulas

� n

a su

buni

dade

SU

R1,

est

imul

ando

, ass

im, a

lib

eraç

ão d

e in

sulin

a pe

las

célu

las

� d

o pâ

ncre

as e

aum

enta

ndo

a in

sulin

a ci

rcul

ante

par

a ní

veis

suf

icie

ntes

par

a su

pera

r a

resi

stên

cia

à in

sulin

a

Sulf

onilu

réia

s de

pri

mei

ra

gera

ção:

Ace

toex

amid

aC

lorp

ropa

mid

aTo

laza

mid

aTo

lbut

amid

aSu

lfon

iluré

ias

de s

egun

da

gera

ção:

Glim

epir

ida

Glip

izid

aG

liben

clam

ida

(Glib

urid

a)G

licla

zida

G

liqui

dona

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 2

Hip

ogli

cem

ia

Exa

ntem

a, d

iarr

éia,

náu

sea,

to

ntur

a

Cet

oaci

dose

dia

bétic

a A

s su

lfon

iluré

ias

cons

titue

m a

bas

e do

tra

tam

ento

par

a o

diab

etes

Tip

o II

; di

spon

ívei

s po

r vi

a or

al e

met

abol

izad

as p

elo

fíga

doO

pri

ncip

al e

feito

adv

erso

con

sist

e em

hip

oglic

emia

, de

vido

à

hipe

rsec

reçã

o de

ins

ulin

a; p

or c

onse

guin

te,

deve

m s

er u

tiliz

adas

co

m c

aute

la e

m p

acie

ntes

inc

apaz

es d

e re

conh

ecer

ou

de

resp

onde

r à

hipo

glic

emia

Pode

m c

ausa

r ga

nho

de p

eso

em c

onse

qüên

cia

da a

tivid

ade

aum

enta

da d

a in

sulin

a no

tec

ido

adip

oso;

por

con

segu

inte

, sã

o m

ais

apro

pria

das

para

pac

ient

es n

ão-o

beso

sC

omo

os a

gent

es d

e pr

imei

ra g

eraç

ão l

igam

-se

com

men

or

afin

idad

e à

subu

nida

de S

UR

1 do

que

os

agen

tes

de s

egun

da

gera

ção,

os

fárm

acos

de

prim

eira

ger

ação

dev

em s

er

adm

inis

trad

os e

m d

oses

mai

s al

tas

para

obt

er o

mes

mo

grau

de

redu

ção

da g

licos

e

(Con

tinu

a)

Page 16: Farmacologia Endócrina do Pâncreas

508 | Capítulo Vinte e Nove

Resu

mo

Farm

acol

ógic

o Ca

pítu

lo 2

9 Fa

rmac

olog

ia d

o Pâ

ncre

as E

ndóc

rino

(Con

tinua

ção)

Fárm

aco

Aplic

açõe

s Cl

ínic

asEf

eito

s Ad

vers

os

Gra

ves

e Co

mun

sCo

ntra

-Ind

icaç

ões

Cons

ider

açõe

s Te

rapê

utic

as

Meg

litin

idas

:N

ateg

linid

aR

epag

linid

a

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 2

Hip

ogli

cem

iaD

iarr

éia,

náu

sea,

inf

ecçã

o da

s vi

as r

espi

rató

rias

su

peri

ores

Cet

oaci

tose

dia

bétic

aD

iabe

tes

mel

ito T

ipo

1A

s m

eglit

inid

as a

pres

enta

m c

onsi

dera

ções

ter

apêu

ticas

se

mel

hant

es à

s da

s su

lfon

iluré

ias

SEN

SIBI

LIZA

DO

RES

DA I

NSU

LIN

A: T

IAZO

LID

INED

ION

AS (

TZD

)M

ecan

ism

o —

Lig

am-s

e ao

rec

epto

r nu

clea

r de

hor

môn

io, o

rec

epto

r �

ativ

ado

por

prol

ifer

ador

per

oxis

sôm

ico

(PPA

R�

), e

o e

stim

ulam

, aum

enta

ndo,

ass

im, a

sen

sibi

lidad

e da

ins

ulin

a no

tec

ido

adip

oso,

no

fíga

do e

no

mús

culo

Pio

glit

azon

aR

osig

litaz

ona

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 2

Sínd

rom

e do

ová

rio

polic

ístic

oIn

sufi

ciên

cia

card

íaca

, he

pati

te c

oles

táti

ca,

hepa

toto

xici

dade

, ed

ema

mac

ular

dia

béti

coE

dem

a, g

anho

de

peso

, au

men

to d

as H

DL

e L

DL

, di

min

uiçã

o do

s ní

veis

ci

rcul

ante

s de

tri

glic

eríd

ios

e ác

idos

gra

xos

livre

s

Hip

erse

nsib

ilida

de à

pio

glita

zona

ou

rosi

glita

zona

As

TZ

D n

ão a

umen

tam

os

níve

is d

e in

sulin

a e,

por

tant

o, n

ão

indu

zem

hip

oglic

emia

As

mai

s re

cent

es T

ZD

par

ecem

ter

men

os h

epat

otox

icid

ade

SEN

SIBI

LIZA

DO

RES

DA I

NSU

LIN

A: B

IGUA

NID

ASM

ecan

ism

o —

Ativ

am a

pro

tein

ocin

ase

depe

nden

te d

e A

MP

(A

MP

PK

), b

loqu

eand

o a

degr

adaç

ão d

os á

cido

s gr

axos

e i

nibi

ndo

a gl

icon

eogê

nese

e a

glic

ogen

ólis

e he

pátic

as;

aum

enta

m a

ativ

idad

e do

rec

epto

r de

ins

ulin

a e

a re

spon

sivi

dade

met

aból

ica

do f

ígad

o e

no m

úscu

lo e

sque

létic

o

Met

form

ina

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 2

Sínd

rom

e do

ová

rio

polic

ístic

oA

cido

se l

ácti

caD

iarr

éia,

dis

peps

ia,

flat

ulên

cia,

náu

sea,

vôm

itos,

de

fici

ênci

a de

cob

alam

ina

Insu

fici

ênci

a ca

rdía

caSe

ptic

emia

Con

sum

o ab

usiv

o de

álc

ool

Doe

nça

hepá

tica

Doe

nça

resp

irat

ória

Com

prom

etim

ento

ren

alM

eios

de

cont

rast

e io

dado

s se

hou

ver

susp

eita

de

alte

raçã

o ag

uda

da f

unçã

o re

nal,

vist

o qu

e is

so p

ode

resu

ltar

em a

cido

se

láct

ica

Aci

dose

met

aból

ica

O d

esco

nfor

to G

I as

soci

ado

ao u

so d

a m

etfo

rmin

a é

habi

tual

men

te t

rans

itóri

o e

pode

ser

min

imiz

ado

atra

vés

de

titul

ação

len

ta d

a do

seA

inc

idên

cia

de a

cido

se l

áctic

a é

baix

a e

prev

isív

el;

tipic

amen

te,

ocor

re a

cido

se l

áctic

a co

m o

uso

de

met

form

ina

em p

acie

ntes

que

apr

esen

tam

out

ras

afec

ções

que

pre

disp

õem

à

acid

ose

met

aból

ica

Não

ind

uz h

ipog

licem

iaD

imin

ui o

s ní

veis

sér

icos

de

lipíd

ios

e di

min

ui o

pes

o co

rpor

al

AGO

NIS

TAS

E PR

OD

UTO

S M

IMÉT

ICO

S D

O G

LP-1

Mec

anis

mo

— A

goni

sta

do r

ecep

tor

do p

eptíd

io g

luca

gon-

sím

ile-1

(G

LP

-1),

que

aum

enta

a s

ecre

ção

de i

nsul

ina

depe

nden

te d

a gl

icos

e, i

nibe

a s

ecre

ção

de g

luca

gon,

ret

arda

o e

svaz

iam

ento

gás

tric

o e

dim

inui

o a

petit

e (e

xena

tida)

; in

ibid

or d

a di

pept

il pe

ptid

ase

IV (

DP

P-I

V),

que

ret

arda

a v

eloc

idad

e de

ina

tivaç

ão p

rote

olíti

ca d

o G

LP

-1 e

out

ros

horm

ônio

s in

cret

ina

(sita

glip

tina)

Exe

nati

da

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 2

Hip

oglic

emia

, ná

usea

, vô

mito

s, d

iarr

éia,

ne

rvos

ism

o, t

ontu

ra,

cefa

léia

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 1

Cet

oaci

dose

dia

bétic

aA

exe

natid

a nã

o é

disp

onív

el p

or v

ia o

ral

e de

ve s

er i

njet

ada

Tip

icam

ente

util

izad

a em

ass

ocia

ção

com

met

form

ina

ou c

om

uma

sulf

onilu

réia

par

a m

elho

rar

o co

ntro

le d

a gl

icos

e

Sita

glip

tina

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 2

Infe

cção

das

via

s re

spir

atór

ias

supe

rior

es,

naso

fari

ngite

, ce

falé

ia,

náus

ea,

diar

réia

, au

men

to

disc

reto

dos

nív

eis

séri

cos

de

crea

tinin

a

Dia

bete

s m

elito

Tip

o 1

Cet

oaci

dose

dia

bétic

nec

essá

rio

um a

just

e da

dos

e em

pac

ient

es c

om d

oenç

a re

nal

mod

erad

a ou

gra

vePo

de c

ausa

r hi

pogl

icem

ia e

m a

ssoc

iaçã

o co

m s

ulfo

nilu

réia

s e

insu

lina

Os

níve

is d

e di

goxi

na d

evem

ser

mon

itori

zado

s em

pac

ient

es

em u

so d

e di

goxi

na e

sita

glip

tina

Page 17: Farmacologia Endócrina do Pâncreas

Farmacologia do Pâncreas Endócrino | 509

DIA

ZÓXI

DO

Mec

anis

mo

— L

iga-

se à

sub

unid

ade

SUR

1 do

s ca

nais

de

K+/A

TP

nas

cél

ulas

� d

o pâ

ncre

as e

est

abili

za o

est

ado

do c

anal

lig

ado

ao A

TP

(ab

erto

), d

e m

odo

que

as c

élul

as �

per

man

ecem

hip

erpo

lari

zada

s; i

sso

dim

inui

a

secr

eção

de

insu

lina

pela

s cé

lula

s

Dia

zóxi

doH

ipog

licem

ia d

evid

o a

hipe

rins

ulin

ism

oH

iper

tens

ão m

alig

na

Insu

fici

ênci

a ca

rdía

ca,

rete

nção

híd

rica

, ce

toac

idos

e di

abét

ica,

hip

erna

trem

ia

obst

ruçã

o in

test

inal

, pa

ncre

atit

e, n

eutr

open

ia,

trom

boci

tope

nia,

doe

nça

extr

apir

amid

alA

ngin

a, h

ipot

ensã

o,

taqu

iarr

itmia

, hi

rsut

ism

o,

hipe

rglic

emia

, di

spep

sia,

to

ntur

a, g

licos

úria

Hip

erse

nsib

ilida

de a

o di

azóx

ido

O d

iazó

xido

tam

bém

hip

erpo

lari

za o

s ca

nais

que

con

têm

SU

R2

nas

célu

las

mus

cula

res

card

íaca

s e

mus

cula

res

lisas

e

pode

ser

util

izad

o pa

ra d

imin

uir

a pr

essã

o ar

teri

al e

m

emer

gênc

ias

hipe

rten

siva

s

ANÁL

OG

OS

DA S

OM

ATO

STAT

INA

Mec

anis

mo

— I

nibe

a l

iber

ação

de

GH

RH

Oct

reot

ida

Ver

Res

umo

Farm

acol

ógic

o: C

ap.

25

GLU

CAG

ON

EXÓ

GEN

OM

ecan

ism

o —

Hor

môn

io p

olip

eptíd

ico,

pro

duzi

do p

elas

cél

ulas

� d

as i

lhot

as d

e L

ange

rhan

s no

pân

crea

s, q

ue e

stim

ula

a gl

icon

eogê

nese

e a

glic

ogen

ólis

e no

fíg

ado,

res

ulta

ndo

em e

leva

ção

da g

licem

ia

Glu

cago

n H

ipog

licem

iaR

elax

ante

int

estin

al a

ntes

de

radi

ogra

fias

do

trat

o ga

stri

ntes

tinal

Exa

ntem

a, n

áuse

a, v

ômito

sFe

ocro

moc

itom

a co

nhec

ido

Util

izad

o no

tra

tam

ento

da

hipo

glic

emia

gra

ve,

quan

do a

ad

min

istr

ação

de

glic

ose

oral

ou

intr

aven

osa

não

é po

ssív

elA

açã

o hi

perg

licêm

ica

do g

luca

gon

é tr

ansi

tóri

a e

depe

nde

de

uma

rese

rva

hepá

tica

sufi

cien

te d

e gl

icog

ênio