Farmoquímica Baldacci, S. A., com sede na Rua de · Graficamente, para além dos prefixos e...

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Cópias da sentença do 9.° Juízo Cível da Comarca de Lisboa e dos acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça proferidos no processo de registo de marca nacional n.°231972. Cópia dos autos de recurso de marca n.° 657/92, em que são recorrente Farmoquímica Baldacci, S.A., e recorrido o Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Farmoquímica Baldacci, S. A., com sede na Rua de Duarte Galvão, 44, Lisboa, veio, ao abrigo dos artigos 203.° e seguintes do Código da Propriedade Industrial, recorrer do despacho proferido em 6 de Novembro de 1991 pelo director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com sede no Campo das Cebolas, em Lisboa, que concedeu protecção em Portugal ao registo de marca nacional n.° 231 972, Fluxema. Na óptica da recorrente, titular do registo da marca na- cional n.° 170 332, Fluidema, concedido em 27 de Março de 1952, as marcas Fluxema e Fluidema evidenciam seme- lhança fonética e ou gráfica, reportam-se a produtos idênti- cos e ou afins, e possibilitam ao consumidor descuidado a fácil indução em erro ou confusão. Acresce que a coexistência de tais marcas possibilitaria a concorrência desleal. Daí entender a recorrente sero despacho recorrido dupla- mente ilegal por contrariar o disposto nos artigos 93.°, n.° 12.°, e 187, n.° 4.°, do Código da Propriedade Indus- trial. Deve, em conclusão, ser dado provimento ao recurso, revogando-se o despacho recorrido. Contesta a recorrida Laboratório Zimaia, L.da, alegando, em síntese, não haver in casu imitação de marca nem con- corrência desleal, concluindo que deve serdenegado provi- mento ao recurso e mantido o despacho recorrido. O INPI pronunciou-se - com alguma reserva- pela manutenção da protecção do registo novo. Cumpre apreciar e decidir. O tribunal é competente em razão da matéria, da hierar- quia e da nacionalidade. O recurso é tempestivo e legítimo - artigo 204.° do Código da Propriedade Industrial. Nada obsta ao conhecimento do mesmo. Em abono da tese da recorrente, lembremos que: Entre as palavras «Fluxema» e «Fluidema» são idên- ticasseisdas sete letrasda marca recorrida e,colo- cadas na mesma sequência, a sonoridade é muito similar por ambas as marcas terem três sílabas, com acento tónico coincidente; Ambas as palavras configuram sinais de fantasia sugestiva, sugerindo ambas a ideia de fluido ou fluxo; Ambas as marcas se destinam a assinalar os mesmos produtos (preparações farmacêuticas, preparações químico-farmacêuticas, produtos farmacêuticos, medicamentos para homens e animais e prepara- ções medicinais/produtos farmacêuticos prepara- ções farmacêuticas, produtos químico-farmacêuti- cos, preparações químico-farmacêuticas e remédios para homens e animais); A coexistência das marcas subjudice no mercado iria criar (na óptica da recorrente) a possibilidade de ocorrerem situações de concorrência desleal, inde- pendentemente da vontade do titular da marca (nova), permitindo a prática de actos susceptíveis de criar confusão com o estabelecimento, produ- tos, serviços e crédito da recorrente; Se há domínio onde o consumidor descuidado deve ser protegido é o dos produtos farmacêuticos ... Em abono da tese da recorrida lembremos que: Só poderá falar-se em «imitação de marca», para efei- tos de recusa da marca nova, quando as semelhan- ças fossem tais que induzam facilmente em erro e confusão o consumidor;

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Page 1: Farmoquímica Baldacci, S. A., com sede na Rua de · Graficamente, para além dos prefixos e sufixos, os res- tantes elementos componentes das marcas tornam-nas no conjunto distintas.

Cópias da sentença do 9.° Juízo Cível da Comarca de Lisboa e dos acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça proferidos no processo de registo de marca nacional n.° 231972.

Cópia dos autos de recurso de marca n.° 657/92, em que são recorrente Farmoquímica Baldacci, S. A., e recorrido o Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

Farmoquímica Baldacci, S. A., com sede na Rua de Duarte Galvão, 44, Lisboa, veio, ao abrigo dos artigos 203.° e seguintes do Código da Propriedade Industrial, recorrer do despacho proferido em 6 de Novembro de 1991 pelo director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com sede no Campo das Cebolas, em Lisboa, que concedeu protecção em Portugal ao registo de marca nacional n.° 231 972, Fluxema. Na óptica da recorrente, titular do registo da marca na-

cional n.° 170 332, Fluidema, concedido em 27 de Março de 1952, as marcas Fluxema e Fluidema evidenciam seme- lhança fonética e ou gráfica, reportam-se a produtos idênti- cos e ou afins, e possibilitam ao consumidor descuidado a fácil indução em erro ou confusão. Acresce que a coexistência de tais marcas possibilitaria a concorrência desleal. Daí entender a recorrente ser o despacho recorrido dupla-

mente ilegal por contrariar o disposto nos artigos 93.°, n.° 12.°, e 187, n.° 4.°, do Código da Propriedade Indus- trial. Deve, em conclusão, ser dado provimento ao recurso,

revogando-se o despacho recorrido. Contesta a recorrida Laboratório Zimaia, L.da, alegando,

em síntese, não haver in casu imitação de marca nem con- corrência desleal, concluindo que deve ser denegado provi- mento ao recurso e mantido o despacho recorrido. O INPI pronunciou-se - com alguma reserva - pela

manutenção da protecção do registo novo. Cumpre apreciar e decidir. O tribunal é competente em razão da matéria, da hierar-

quia e da nacionalidade. O recurso é tempestivo e legítimo - artigo 204.° do

Código da Propriedade Industrial. Nada obsta ao conhecimento do mesmo. Em abono da tese da recorrente, lembremos que:

Entre as palavras «Fluxema» e «Fluidema» são idên- ticas seis das sete letras da marca recorrida e, colo- cadas na mesma sequência, a sonoridade é muito similar por ambas as marcas terem três sílabas, com acento tónico coincidente;

Ambas as palavras configuram sinais de fantasia sugestiva, sugerindo ambas a ideia de fluido ou fluxo;

Ambas as marcas se destinam a assinalar os mesmos produtos (preparações farmacêuticas, preparações químico-farmacêuticas, produtos farmacêuticos, medicamentos para homens e animais e prepara- ções medicinais/produtos farmacêuticos prepara- ções farmacêuticas, produtos químico-farmacêuti- cos, preparações químico-farmacêuticas e remédios para homens e animais);

A coexistência das marcas sub judice no mercado iria criar (na óptica da recorrente) a possibilidade de ocorrerem situações de concorrência desleal, inde- pendentemente da vontade do titular da marca (nova), permitindo a prática de actos susceptíveis de criar confusão com o estabelecimento, produ- tos, serviços e crédito da recorrente;

Se há domínio onde o consumidor descuidado deve ser protegido é o dos produtos farmacêuticos ...

Em abono da tese da recorrida lembremos que:

Só poderá falar-se em «imitação de marca», para efei- tos de recusa da marca nova, quando as semelhan- ças fossem tais que induzam facilmente em erro e confusão o consumidor;

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Ora, quer gráfica quer foneticamente, as marcas Fluidema e Fluxema são perfeitamente distintas;

O utente dos produtos das marcas implicadas é o doente, consumidor especial, por via de regra vigilante e cuidadoso, pois que está em causa a sua saúde;

Acresce que são técnicos especializados - médico e farmacêutico - que intervêm na aquisição dos fármacos;

É grande a semelhança com que as marcas de pro- dutos farmacêuticos coexistem nos mercados. Neste campo especial, o afastamento de marca nova só se tem verificado quando as marcas são praticamente iguais.

Resumidos os fundamentos doutamente avançados por recorrente e recorrida, urge apreciar e decidir. Concordo com a recorrente quando afirma que a imita-

ção é a mais perigosa das fraudes. Parafraseando Pinto Coelho, in Lições de Direito Comercial, p. 396, «o imita- dor pretende aproveitar-se ilicitamente do crédito e noto- riedade de uma marca de outrem, mas, para poder defen- der-se, não a reproduz perfeitamente, limita-se a imitá-la para poder sempre alegar que a sua marca é diferente daquela que se diz ser a imitação». Mas estaremos, no caso sub judice, perante a figura jurí-

dica de imitação? A regra clássica é, de facto, que a imitação se aprecia

segundo as semelhanças e não em função das diferenças. São as semelhanças que criam a possibilidade de confu- são. Mas é preciso que semelhanças existam sobejamente. Não é líquido que, in casu, as semelhanças superam so-

bejamente (largamente) as diferenças. Graficamente, para além dos prefixos e sufixos, os res-

tantes elementos componentes das marcas tornam-nas no conjunto distintas. Foneticamente, as ditas marcas são portadoras de fonemas

distintos, que impõem, na verdade, cadências diferenciadas. Acresce que, por ser limitado o número de prefixos e su-

fixos no domínio de farmacologia, os mesmos não podem ser apropriáveis em marcas ditas farmacêuticas (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Maio de 1959, in Boletim do Ministério da Justiça, n.° 87, p. 430, e Acórdão da Relação de Lisboa de 15 de Maio de 1970, in Boletim da Propriedade Industrial, n.° 12/1970, p. 2165). Quanto ao alegado perigo de confusão, é justo reconhecer

que «no âmbito do mercado de farmácia, se o produto procurado pelo consumidor é daqueles que dependem de receita médica, não há o risco de confusão por parte do mesmo consumidor, pois que serão o médico e o farmacêutico que terão o cuidado e a responsabilidade de identificar o produto que verdadeira- mente possa interessar para cada caso concreto». Compreende-se assim a louvável posição do INPI, que,

em relação a marcas de produtos farmacêuticos, só as considera realmente confundíveis quando iguais. Pelo que vem de ser exposto, nega-se provimento ao

recurso. Custas pela recorrente. Notifique e registe. Oportunamente, envie cópia dactilografada desta deci-

são ao INPI.

Lisboa, 13 de Janeiro de 1993. - O Juiz de Direito, António Nunes Ramos.

Está conforme.

Lisboa, 23 de Agosto de 1995. - O Escrivão-Adjunto, (Assinatura ilegível.)

Acordam na Relação de Lisboa:

O presente recurso de apelação vem interposto por Farmoquímica Baldacci, S. A., da douta decisão do 9.° Juízo, 2.' Secção, do Tribunal Cível de Lisboa, que, apreciando o recurso apresentado por esta do despacho do Ex.mo Director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que concedeu protecção em Portugal ao registo da marca Fluxema requerido pelo Laboratório Zimaia, L.da, julgou o recurso improcedente e confirmou o referido despacho recorrido. Em douta alegação, formula a recorrente Farmoquímica

Baldacci, S. A., as conclusões seguintes: a) A douta sentença recorrida é ilegal, porquanto não

discrimina os factos considerados provados nem contém a fundamentação suficiente da decisão, contrariamente ao dis- posto pelo n.° 2 do artigo 659.° do Código de Processo Civil; b) Além disso, a sentença proferida pelo tribunal a quo,

ao confirmar o despacho da autoridade recorrida que con- cede o registo da marca Fluxema, faz errada interpretação e aplicação dos preceitos constantes nos artigos 93.°, n.° 12.°, 94.°, 74.°, 187.°, n.° 4.°, e 212.°, n.° l.°, todos do Código da Propriedade Industrial; c) Ambas as marcas destinam-se a produtos idênticos e

da mesma classe 5.ª da classificação internacional; d) Os elementos distintivos a comparar são puramente

nominativos e consistem na designação «Fluidema», na marca registada da apelante, e na designação «Fluxema», no caso da marca cujo registo se impugna; e) A imitação não é identidade, só podendo a primeira

ter lugar em face de elementos diferentes e elementos comuns nos sinais constitutivos das marcas; f) No caso das marcas Fluidema e Fluxema, as seme-

lhanças suplantam - e muito - as diferenças, havendo assim uma elevada probabilidade de indução em erro ou confusão no consumidor; g) As semelhanças gráficas advêm do facto de «Fluxema»

contar seis letras (em sete) que se repetem na marca da apelante colocadas na mesma sequência, pois coincidem precisamente com as três primeiras e as três últimas letras; h) À semelhança da grafia junta-se a semelhança dos

sons, porquanto ambas as designações são trissílabos, com o mesmo assento tónico, coincidindo as vogais dominan- tes de cada si'laba («u», «e», «a»), o que lhes imprime uma sonoridade muito similar; i) Acresce a semelhança ideográfica, que deve também

complementarmente ser considerada em sede de aplicação do artigo 94.° do Código da Propriedade Industrial, já que ambas as marcas sugerem conceitos sinónimos (fluido e fluxo); j) A este conjunto de factos/semelhanças, o M.mo Juiz a

quo contrapõe asserções subjectivas, omitindo a concretiza- ção da respectiva fundamentação fáctica; 1) Com efeito, nas designações «Fluidema» o «Fluxema»

não há prefixos nem sufixos que indiquem a utilização ou composição dos produtos ou que alberguem um significa- do específico na farmacologia e que sejam, por essa ra- zão, inapropriáveis; m) O M.mo Juiz a quo omite ainda a indicação dos fac-

tos que tornam as marcas foneticamente distintas; n) Ao sufragar a tese de que em marcas de produtos

farmacêuticos só há confundabilidade quando elas sejam iguais, a recorrida sentença viola não só os artigos 93.°, n.° 12.°, e 94.°, como também o artigo 74.° do Código da Propriedade Industrial, pois estas disposições conferem tutela da marca registada, tanto em caso de identidade (contrafacção) como em caso de semelhança (imitação);

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o) Nada justifica uma tal capitis diminutio dos titulares das marcas de produtos farmacêuticos; p) A coexistência das marcas em questão induziria o

erro ou confusão fáceis no mercado entre os consumido- res, pois assinalariam produtos iguais, vendidos no mes- mo estabelecimento e, eventualmente, destinados ao mes- mo estado mórbido, devendo a apreciação do erro ou confusão ser tanto mais rigorosa quanto são idênticos os produtos a que as marcas se aplicam; q) Aliás, médicos, farmacêuticos e doentes (estes tam-

bém no caso de automedicação) não estão imunes ao erro ou confusão, respectivamente, nos actos de receita, avia- mento na farmácia ou utilização final; r) Para defesa do consumidor cumpre evitar que os doen-

tes, farmacêuticos ou médicos, confundidos pelas seme- lhanças das denominações, recorram a um medicamento impróprio para certa doença ou cuja aplicação possa ser prejudicial à saúde, tanto mais que a lei tutela o consumi- dor distraído ou descuidado; s) A sentença recorrida viola ainda o artigo 187.°, n.° 4.°,

conjugado com o artigo 212.°, n.° 1.°, ambos do Código da Propriedade Industrial, pois a coexistência das marcas sub judice possibilitará a prática de actos susceptíveis de gerar confusão com o estabelecimento, produtos, serviços e crédito da apelante, tanto mais que, nesta sede, o legis- lador não estabelece o requisito adicional da facilidade de confusão; t) O risco de associação no mercado entre a apelante e

um produto (Fluxema) cuja produção e circulação não lhe são imputáveis e cuja qualidade, em consequência, a ape- lante não controla pode causar-lhe sérios prejuízos. Termina requerendo a revogação da sentença recorrida

por violação do artigo 659.°, n.° 2, do Código de Processo Civil e dos artigos 93.°, n.° 12.°, 94.°, 74.°, 187.°, n.° 4.°, e 212.°, n.° l.°, todos do Código da Propriedade Industrial e ordenada a recusa do registo da marca nacional n.° 231 972, Fluxema. Em não menos douta contra-alegação, a recorrida La-

boratório Zimaia, L.da, sustentou o acerto da decisão ape- lada e, em vista que teve nos autos, o Ex.mo Representante do Ministério Público junto deste Tribunal da Relação emitiu mui douto parecer no sentido de o recurso não merecer provimento. O primeiro reparo da apelante à decisão recorrida é o

de esta não discriminar os factos considerados provados. Salvo o devido respeito, a recorrente não tem razão. Embora na sentença recorrida os factos provados não

apareçam alinhados em epígrafe própria, como seria dese- jável, não deixa, porém, a decisão apelada de conter dis- seminada, mas amplamente, a matéria factual provada. A sentença neste domínio não será tecnicamente isenta

de censura, mas, contrariamente ao sustentado pela ape- lante, não poderá dizer-se com razão que não discrimina os factos considerados provados e que, por este motivo, seja a decisão recorrida ilegal. Assim, e como resulta da douta sentença apelada, consi-

deram-se provados os seguintes factos:

1.° Por despacho do Ex.mo Director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade In- dustrial de 6 de Novembro de 1991 e a requeri- mento da ora apelada Laboratório Zimaia, L.da, foi concedida protecção em Portugal ao registo da marca nacional n.° 231 972, Fluxema;

2.° A aqui apelante Farmoquímica Baldacci, S. A., é titular do registo da marca nacional Fluidema, concedido em 27 de Março de 1952;

3.° Ambas as marcas destinam-se a assinalar os mes- mos produtos (preparações farmacêuticas, prepara- ções químico-farmacêuticas, produtos farmacêuti- cos, medicamentos para homens e animais e preparações medicinais/produtos farmacêuticos, preparações farmacêuticas, produtos químico- -farmacêuticos, preparações químico-farmacêuti- cas e remédios para homens e animais);

4.° Entre as palavras «Fluxema» e «Fluidema» são idênticas seis das sete letras da marca recorrida e colocadas na mesma sequência, tendo as duas marcas três sílabas com acento tónico coincidente;

5.° Ambas as palavras configuram sinais de fantasia sugestiva, sugerindo ambas a ideia de fluido ou fluxo;

6.° No domínio dos produtos farmacêuticos, o con- sumidor descuidado deve ser particularmente defendido;

7.° O utente dos produtos das marcas em questão é o doente, consumidor especial, por via da regra vigilante e cuidadoso, pois que está em causa a sua saúde;

8.° São técnicos especializados - médico e farma- cêutico - que intervêm na aquisição de fármacos;

9.° É grande a semelhança com que as marcas de pro- dutos farmacêuticos coexistem nos mercados; neste campo especial o afastamento da marca nova só se tem verificado quando as marcas são prati- camente iguais.

A esta factualidade recolhida da douta decisão apelada há apenas a acrescentar, embora sem particular relevân- cia dado o já constante do n.° 3.° supra, que, como cons- ta dos documentos junto aos autos e vem alegado pela recorrente:

10.° Ambas as marcas em causa pertencem à classe 5.ª

E há a esclarecer que no n.° 4.° supra foi retirada a frase «a sonoridade é muito similar» por tratar-se de matéria de direito (conclusiva/opinativa) que extravasa manifestamente a matéria de facto e que, aliás, em nosso entender, cons- titui conclusão opinativa incorrecta. A segunda crítica da apelante dirige-se também à insufi-

ciente fundamentação da decisão. Mas se, como se viu, improcede a censura no concer-

nente à falta de indicação da matéria de facto, desprovida totalmente de razão é a acusação da insuficiência da fundamentação legal. Que a motivação apresentada pelo M."'° Juiz do tribunal a quo não tenha logrado convencer a apelante, admite-se (até porque é o que sucede normal- mente relativamente a quem fica vencido), mas afirmar que «a sentença recorrida [...] nem contém a fundamentação suficiente da decisão» é não querer ver o que é evidente. Aliás, nunca a insuficiência da fundamentação acarretaria a arguida ilegalidade da sentença, já que, como é sabido, só a falta absoluta de motivação constitui nulidade - cf. alínea b) do n.° 1 do artigo 668.° do Código de Processo Civil. Afastadas as críticas formais, entremos na apreciação

da questão de fundo. Não sofre contestação dever ela ser apreciada e decidi-

da à luz dos critérios constantes das normas legais invocadas pela apelante: artigos 93.°, n.° 12.°, 94.°, 74.°, 187.°, n.° 4.°, e 212.°, n.° 1.°, todos do Código da Pro- priedade Industrial.

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Concordamos também que as marcas em causa - Flui- dema e Fluxema - se destinam a produtos idênticos e da mesma classe, são ambas exclusivamente nominativas, existem entre elas as semelhanças gráficas, fonéticas e ideográficas apontadas pela recorrente e é apodítico que imitação não é identidade - é, como diz a lei (artigo 94.° referido), afinidade; supõe a existência de elementos dife- rentes a par de elementos comuns -, e, como é entendi- mento pacífico e resulta claramente das normas dos men- cionados artigos 93.°, n.° 12.°, 94.°, n.° l.°, e 187.°, n.° 4.°, o conceito de imitação aqui em causa dispensa a intenção de imitar, de fazer conconrência desleal por banda do titu- lar da marca mais recente, basta que exista a possibilidade de confusão, a possibilidade de vir a ocorrer situação de concorrência desleal independentemente da existência dessa intenção. Simplesmente e como é entendimento dominante, a

apreciação da imitação de marcas deve ser apreciada me- nos pelas semelhanças ou dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores, ou segmentos, ou sílabas isoladamen- te do que pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem cada uma das marcas. Ou, como se escreveu no douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Novembro de 1981, in Boletim do Minis- tério da Justiça, n.' 311, p. 401, citando Köhler, «é por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação». Ora, globalisticamente consideradas, as duas marcas em

questão não se nos afiguram susceptíveis de fácil confu- são, mesmo para o consumidor médio, que é sabido ser menos atento e prevenido. Com efeito, para além da palavra «Fluidema» ser mais

comprida que «Fluxema», as presenças do «i» naquela e do «x» nesta conferem, em nossa opinião, a cada um dos vocábulos características gráficas e fonéticas indivi- dualizadoras suficientemente fortes que as tornam marcas obviamente distintas, obstando a que o consumidor seja induzido facilmente em erro ou confusão e afastando a possibilidade de ocorrer situação de concorrência desleal. Acresce que, como é notório e resulta da factualidade

considerada provada (cf., supra, n.°S 7 a 9), no campo dos produtos farmacêuticos a necessidade de uma cabal distin- ção entre as marcas dos diversos medicamentos não se faz sentir com tanta premência como no restante comércio em geral. Nos produtos farmacêuticos a aquisição pelo consumi-

dor nunca é feita pelo sistema do self-service. Não é o consumidor quem vai buscar o medicamento à prateleira ou ao armário da farmácia. Normalmente o medicamento nem está à vista do comprador. E se a compra do fármaco é feita sem receita - o que actualmente já raramente acon- tece, quer por razões económicas (redução no preço por efeito de comparticipação e possibilidade de auferir bene- fícios fiscais por desconto no IRS) quer porque a automedicação tem efeitos perversos já bem conhecidos da generalidade da população, mesmo a menos culta - ou a aquisição é sob parecer do farmacêutico, que é um técnico e sabe distinguir perfeitamente os medicamentos e as res- pectivas características ainda que haja similitude nas mar- cas, ou trata-se de medicamento cujo nome o doente já bem conhece, pelo que afastada está a possibilidade de se deixar sugestionar e confundir com medicamento de nome parecido ou até muito semelhante. Aliás, é também facto notório que o doente reconhece

o medicamento muitas das vezes mais pela embalagem que pela respectiva denominação (marca).

E a defesa do consumidor de produtos farmacêuticos descuidado ou menos atento passa mais pela diferenciação das embalagens dos medicamentos e das advertências que nestas sejam inseridas que nas acentuadas diferenças das respectivas denominações; até porque só muito excepcio- nalmente poderá ocorrer a situação de o doente ver-se confrontado simultaneamente com as duas marcas em questão. E, salvo o devido respeito pela opinião da recorrente,

não vemos que possa razoavelmente admitir-se em rela- ção a qualquer médico ou farmacêutico medianamente atento a possibilidade de confusão entre as duas marcas em causa. Como também discordamos da recorrente no que tange

às suas afirmações de que a coexistência das duas marcas sub judice possibilitará a prática de actos susceptíveis de gerar confusão com o estabelecimento, produtos, serviços e cré- dito da apelante e poderá causar-lhe sérios prejuízos. Ne- nhum facto provado o confirma e nem a apelante alegou factos que o confirmassem. Não alegou sequer a reputação da sua marca, que não reconhecemos como marca notória, nem por outro lado vemos que tenha posto em causa a ido- neidade técnica da recorrida, que, esta sim, notoriamente é uma empresa da indústria farmacêutica sobejamente conhe- cida e reputada no mercado farmacêutico nacional. Em suma: sem irmos tão longe quanto a douta sentença

recorrida, para a qual a especificidade do mercado da indús- tria farmacêutica parece justificar que em relação a mar- cas de produtos farmacêuticos só devam considerar-se realmente confundíveis quando iguais, consideramos inexistir possibilidade de erro ou confusão relevante entre as marcas Fluidema e Fluxema. Termos em que, julgando improcedente a apelação, con-

firma-se a douta decisão recorrida. Custas pela apelante.

Lisboa, 9 de Dezembro de 1993. - (Assinaturas ilegí- veis.)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1 - Relatório. Laboratório Zimaia, L.da, obteve, por despacho do

Ex.mo Director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, o registo da marca Fluxeina. Farmoquímica Baldacci, S. A., reclamou contra a con-

cessão, porque era titular do registo da marca Fluidema, para produtos iguais ou manifestamente afins, e que com aquela se podia confundir. Não tendo obtido ganho de causa, interpôs recurso para

o Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, que lhe negou provimento. Levou novo recurso para o Tribunal da Relação que

manteve a decisão da 1.ª instância. Recorre finalmente de revista para este Supremo Tribu-

nal, insistindo em que deve ser recusado o registo da marca Fluxema. Na sua alegação, formula as seguintes conclusões:

a) O douto acórdão recorrido é ilegal porquanto, ao confirmar a sentença da 1.ª instância e o despacho da autoridade recorrida que concede o registo da marca Fluxema, não obstante o registo anterior da marca Fluidema, da recorrente, faz errada interpre- tação e aplicação dos preceitos constantes nos ar- tigos 93.°, n.° 12.°, 94.°, 187.°, n.° 4 °, e 212.°, n.° 1.°, todos do Código da Propriedade Industrial;

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b) Ambas as marcas destinam-se a produtos idênti- cos e da mesma classe 5.ª da classificação internacional;

c) Como ficou apurado pelo acórdão recorrido, en- tre as marcas Fluxema e Fluidema existem semelhanças gráficas, fonéticas e ideográficas, que, aliás, são manifestas;

d) As semelhanças gráficas entre «Fluxema» e «Fluidema» não resultam da circunstância de con- terem quaisquer prefixos ou sufixos que indiquem o destino terapêutico, a composição dos produtos ou um significado específico no domínio farmaco- lógico, pelo que os elementos coincidentes «flu» e «ema» não devem considerar-se inapropriáveis;

e) Ao sufragar a tese de que, em marcas de produ- tos farmacêuticos, só há confundibilidade quando elas sejam praticamente iguais, o acórdão recor- rido, salvo o devido respeito, não atende às ad- vertências da doutrina nacional e estrangeira que repudia vivamente tal tese;

f) A nossa jurisprudência e em particular a do Su- premo Tribunal de Justiça, no domínio das mar- cas de produtos farmacêuticos, tem aplicado o critério «clássico» segundo o qual é o erro ou confusão do consumidor, e não de peritos, que se pretende evitar (por exemplo, o Acórdão de 18 de Novembro de 1975, no caso das marcas PantelminlPantergin);

g) Segundo o critério dito «clássico», é a confusão ou erro do consumidor médio, o qual, normal- mente, não tem ambas as marcas debaixo dos olhos para exame atento ou confronto;

h) Se é certo que o consumidor de medicamentos, ao contrário do consumidor vulgar, é aconselha- do por peritos que por dever de ofício são vigi- lantes, não o é menos que, em contrapartida, um erro ou uma confusão, sempre possíveis, poderão ter consequências muito mais graves, por se tra- tar da sua saúde;

i) Tanto médicos e farmacêuticos como doentes estão expostos ao erro ou confusão, respectiva- mente, nos actos de receita, aviamento na farmá- cia ou utilização final;

j) Aliás, estão também à venda nas farmácias os me- dicamentos de venda livre, não dependentes de receita médica, e que, por consequência, devem ser tratados como os outros produtos;

1) Para defesa do consumidor cumpre evitar que os doentes, farmacêuticos ou médicos, confundidos pela semelhança das denominações, recorram a um medicamento impróprio para certa doença ou cuja aplicação possa ser prejudicial à saúde, tan- to mais que a lei tutela o consumidor distraído ou descuidado;

m) A sentença recorrida viola ainda o artigo 187.°, n.° 4.°, conjugado com o artigo 212.°, n.° 1.°, ambos do Código da Propriedade Industrial, pois a coexistência das marcas sub judice possibilitará a prática de actos susceptíveis de gerar confusão com o estabelecimento, produtos, serviços e cré- dito da recorrente, tanto mais que, nesta sede, o legislador não estabelece o requisito adicional da facilidade de confusão.

Pede, em suma, com o provimento do recurso, a recusa do registo da marca Fluxema.

A recorrida Zimaia, L.da, pugna em defesa da decisão. O Ex.mo representante do Ministério Público junto deste

tribunal emitiu douto parecer no sentido de o recurso não merecer provimento. Colhidos os vistos, cumpre decidir. 2 - Fundamentos. A Relação deu como provada esta matéria de facto:

1.° Por despacho do Ex.mo Director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade In- dustrial de 6 de Novembro de 1991, e a requeri- mento da ora recorrida Laboratório Zimaia, L.da, foi concedida protecção em Portugal ao registo da marca nacional n.° 231 972, Fluxema;

2.° A recorrente Farmoquímica Baldacci, S. A., é titu- lar do registo da marca nacional Fluidema, conce- dido em 27 de Março de 1952;

3.° Ambas as marcas destinam-se a assinalar os mes- mos produtos (preparações farmacêuticas, prepara- ções químico-farmacêuticas, produtos farmacêuti- cos, medicamentos para homens e animais e preparações medicinais/produtos farmacêuticos, preparações farmacêuticas, produtos químico- -farmacêuticos, preparações químico-farmacêuti- cas e remédios para homens e animais);

4.° Entre as palavras «Fluxema» e «Fluidema» são idênticas seis das sete letras da marca recorrida e colocadas na mesma sequência, tendo as duas marcas três sílabas com acento tónico coincidente;

5 ° Ambas as palavras configuram sinais de fantasia su- gestiva, sugerindo ambas a ideia de fluido ou fluxo;

6.° No domínio dos produtos farmacêuticos, o con- sumidor descuidado deve ser particularmente defendido;

7.° O utente dos produtos das marcas em questão é o doente, consumidor especial, por via de regra vigilante e cuidadoso, pois que está em causa a sua saúde;

8.° São técnicos especializados - médico e farma- cêutico - que intervêm na aquisição dos fárma- cos;

9.° É grande a semelhança com que as marcas de pro- dutos farmacêuticos coexistem nos mercados; neste campo especial o afastamento da marca nova só se tem verificado quando as marcas são prati- camente iguais;

10.° Ambas as marcas em causa pertencem à classe 5.ª

A questão em litígio respeita à eventual existência ou não de imitação de marca, que, a existir, implicará a re- cusa do registo de Fluxema, escolhida pela recorrida. A marca, como sinal distintivo de produtos ou de merca-

dorias (e de serviços), há-de ser tal que se distinga suficien- temente de outra anteriormente adoptada destinada ao mesmo produto ou semelhante, de modo a não suscitar con- fusão no mercado. É o conhecido princípio da novidade ou da especialidade da marca, consagrado na lei. De harmonia com o n.° 12.° do artigo 93.° do Código

da Propriedade Industrial (CPI), será recusado o registo de marca que em todos ou alguns dos seus elementos conte- nha reprodução ou imitação total ou parcial de marca anteriormente registada por outrem para o mesmo produto ou produto semelhante que possa induzir em erro ou con- fusão no mercado, e, segundo o artigo 94.°, considera-se imitada no todo ou em parte marca destinada a produtos inscritos sob o mesmo número do repertório ou números diferentes, mas de afinidade manifesta, que induza facil-

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mente em erro ou confusão o consumidor, não podendo este distinguir as duas senão depois de exame atento ou confronto. Daqui extraem-se os seguintes requisitos para que duas

marcas se considerem imitadas:

a) Que esteja em causa o mesmo produto ou produ- tos similares;

b) Que as marcas tenham entre si semelhanças gráfi- cas figurativas ou fonéticas;

c) Que tais semelhanças possam induzir facilmente em erro ou confusão o consumidor.

Isto significa que, em primeiro lugar, só se coloca a ne- cessidade de protecção do consumidor quando os produ- tos são idênticos ou afins, de tal modo que possam concor- rer entre si no mercado. Já se discutiu, em relação a preparados farmacêuticos,

se fica desde logo excluída a imitação quando eles se destinem a estados mórbidos diferentes ou a fins próprios ou de utilização específica ou se, pelo contrário, não há que apreciar a sua afinidade com base em investigações minuciosas de carácter técnico ou científico, cumprindo admitir a afinidade não só entre os diversos produtos que são abrangidos na rubrica de produtos farmacêuticos da classe 5.' da tabela, como entre estes e os de diversas outras rubricas, caso dos produtos dietéticos. Mas esta questão não está aqui em causa porque nem foi suscitada nem resulta dos autos qual a aplicação ou finalidade dos dois produtos comercializados pelas partes. Em segundo lugar, é preciso ter em conta as semelhan-

ças entre as marcas, o que implica também a apreciação das dissemelhanças existentes. Mas para analisar aquela semelhança interessa menos

registar as diferenças de pormenor que possam existir nas marcas do que observar o seu conjunto, mesmo que não estejam ambas simultaneamente em presença. Em terceiro lugar, a semelhança deve ser tal que origi-

ne o erro ou a confusão no consumidor que pretenda ad- quirir uma delas, do que poderá resultar prejuízo para si próprio ou detrimento da outra. Estando o Supremo Tribunal de Justiça, na revista, limi-

tado, em princípio, a julgar de direito, o problema da imita- ção de marcas vem ainda a decompor-se, segundo jurispru- dência pacífica, em duas questões: uma, de facto, da competência das instâncias, que incide sobre a existência de semelhanças ou dissemelhanças entre as duas marcas; outra, de direito, relativa ao apuramento de eventual ocor- rência de imitação em face das semelhanças e disseme- lhanças apuradas pelas instâncias. Não vem posto em causa que se esteja em presença de

dois produtos farmacêuticos similares ambos inscritos na classe 5.' e que entre as marcas existem semelhanças. Cumpre agora averiguar em face das semelhanças encon-

tradas pela Relação se a segunda, denominada «Fluxema», constitui imitação da primeiramente registada «Fluidema», por susceptibilidade de confusão ou prática de concorrên- cia desleal. A 1.ª instância opinou que, embora a imitação se apre-

cie segundo as semelhanças, não é líquido que, in casu, estas superem largamente as diferenças, como seria neces- sário; acresce que o perigo de confusão dos produtos no âmbito do mercado farmacêutico é muito menor do que no restante, designadamente quando a sua aquisição de- pende de receita médica, pois serão o médico e o farma- cêutico a ter o cuidado e a responsabilidade de os identi- ficar, pelo que considerou não haver imitação.

A Relação decidiu que entre as marcas existem seme- lhanças mas cada um dos vocábulos tem características in- dividualizadoras suficientemente fortes que as tornam obvia- mente distintas, de tal modo que globalisticamente consideradas não se afiguram de fácil confusão, mesmo para o consumi- dor médio, a despeito de se tratarem de produtos farmacêu- ticos, e não admitiu, por outro lado, a existência de concor- rência desleal, por ausência de factos para isso idóneos. A recorrente insiste no risco de confusão, até porque o

mercado dos produtos farmacêuticos, se alguma especiali- dade tem para este efeito, é a de exigir maior rigor na dife- renciação entre as marcas, dado o perigo que de um erro pode advir para a saúde. Posição contrária, embora com reservas, é sufragada pela

direcção do Serviço de Marcas, quanto a fátmacos, cujas mar- cas normalmente só considera confundíveis quando iguais. Na imitação, a semelhança deve ser tal que induza facil-

mente em erro ou confusão o consumidor. É entendimento dominante não ser necessário para esta

apreciação que elas sejam postas lado a lado directamente em confronto, situação que normalmente não ocorre, pois o que releva é a impressão de conjunto. «Não são só as marcas muito parecidas (para cuja distinção seja necessá- rio o confronto) que se devem ter como imitadas, o que deve procurar evitar-se é que se adopte uma marca que ao olhar distraído do público possa apresentar-se como sen- do a que ele busca» - Cf. J. Gabriel Pinto Coelho, Lições de Direito Comercial, 1.° vol., 1945, pp. 399 e 401. Igual- mente, no dizer de A. Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, reimpressão, 1994, p. 188, existe imitação de uma marca por outra quando, «tendo-se à vista apenas a marca a constituir, se deva concluir que ela é susceptível de ser tomada por outra de que se tenha conhecimento». É nesta perspectiva que as semelhanças devem superar

qualitativamente as diferenças ou, dito inversamente, para haver imitação, as diferenças ou dissemelhanças devem ser marcantes apreensíveis ao simples exame de uma das mar- cas (Pinto Coelho, ibid.). O comprador não tem normalmente presente no espíri-

to senão uma impressão ou ideia geral da marca que não tem sob os olhos, pelo que as diferenças secundárias são na maioria dos casos irrelevantes. No caso, encontra-se provado que ambas as marcas são

exclusivamente nominativas; nas palavras «Fluxema» e «Fluidema» são idênticas seis das sete letras que as com- põem e colocadas na mesma sequência; é idêntico o princí- pio e o fim de ambas, visto que se iniciam pela si'laba «flu» e terminam pela sílaba «ema»; são constituídas por três sílabas com acento tónico coincidente na vogal «e», sendo muito similar a sonoridade delas; ambas configuram sinais de fantasia sugerindo a ideia de fluido ou fluxo. Destinam- -se a produtos idênticos e da mesma classe. As coincidências gráficas e fonéticas, bem como as ideo-

gráficas, são não só patentes como consideráveis. As dissemelhanças concretizam-se, segundo a Relação,

em que a palavra «Fluidema» é mais comprida que «Fluxema», e em que as presenças naquela do «i» e nesta do «x» lhes conferem características individualizadoras; mas isto não resiste à esmagadora maioria dos elementos semelhantes, até porque, como se tem dito variadas vezes, citando Kõhler, «é por intuição sintética e não por disse- cação analítica que deve proceder-se à comparação». Acontece, contudo, diz-se ainda, que no âmbito do mer-

cado dos produtos farmacêuticos uma cabal distinção en- tre as marcas não se faz sentir com tanta premência como no restante comércio em geral. Há que entender esta ideia nos seus devidos termos.

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É certo, por um lado, que pode deparar-se a situação de os fármacos só deverem ser adquiridos mediante receita médica, o que coloca entre o utilizador e o medicamento dois técnicos especializados cada um no seu campo - o médico e o farmacêutico -, capacitados para ter um es- pecial cuidado no fornecimento dos produtos, além de que o doente é por via de regra cuidadoso com a sua saúde. Mas não se pode esquecer também nem os medicamentos e outros produtos farmacêuticos de venda livre, nem a possibilidade de engano daqueles, mormente em receitas manuscritas, nem a subsequente fase da utilização pelo consumidor, o qual, a ser descuidado, deve ser particular- mente defendido nesta matéria. Vai mais longe J. Gabriel Pinto Coelho quando afirma

que os produtos farmacêuticos não podem encarar-se ape- nas como medicamentos mas também como mercadorias cuja colocação e expansão se pretende assegurar, pelo que é critério vicioso afastar o conceito de imitação com base em que não haverá perigo para o consumidor por esses produtos serem geralmente fornecidos por receita médica, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 94.', p. 166, citado por Justino Cruz, Código da Propriedade Industrial, 2.ª ed., 1985, p. 221, com aplauso. E a verdade é que manuseiam medicamentos para além

de médicos e farmacêuticos ainda veterinários e seus aju- dantes, enfermeiros, analistas, delegados de informação mé- dica, comerciantes do sector e também os próprios doen- tes, seus familiares e empregados, designadamente nos lares onde eles eventualmente se encontrem instalados. É compreensível, por outro lado, considerada a nature-

za das substâncias de que são compostos e os efeitos dos produtos farmacêuticos, que muitos radicais e afixos usa- dos em cada uma das marcas possam apresentar similitude, sendo menos fácil obter uma diferenciação. Mas isto nem pode aproveitar-se como argumento para se evitar um esforço de originalidade na criação da marca nem deve servir para esquecer as regras legais que impõem para qualquer produto, incluindo os farmacêuticos, a aplicação dos mesmos princípios legais, acima salientados. Em atenção ao carácter distintivo, que é a função prima-

cial das marcas, quanto maior for a afinidade dos produ- tos, maior deverá ser a dissemelhança entre elas. Ora, não ficou provado que aqueles produtos tenham aplica-

ção ou finalidade específica diversa - com se referiu - nem que só devam ser adquiridos mediante receita médica (se é que a isto se deva atribuir relevo); por outro lado, não pode deixar de se reconhecer a forte semelhança gráfica e fonética, além de ideográfica, entre as ditas marcas, que, superando claramente as diferenças, levam facilmente a induzir em engano ou confusão o consumidor ou utilizador menos atento e prevenido, que é quem deve ser mais protegido. Destas premissas, a conclusão a extrair só pode ser a

de que Fluxema representa imitação de Fluidema. Considera-se prejudicado e como tal desnecessário en-

trar no conhecimento da subsequente questão da existên- cia ou não de concorrência desleal a que se reportam os artigos 187.°, n.° 4.°, e 212, n.° 1.°, do Código da Proprie- dade Industrial. 3 - Decisão. Em face do exposto, concede-se a revista e revoga-se o

acórdão recorrido, bem como o despacho do Ex.mo Director do Serviço de Marcas, a fim de que esse despacho seja substituído por outro que indefira a pretensão de Labora- tório Zimaia, L.da Custas nas instâncias e neste tribunal pela recorrida.

Lisboa, 24 de Outubro de 1994. - (Assinaturas ilegí- veis. )

Declaração de voto

Vencido; muito em resumo e salvo o devido respeito, diria que não se verifica imitação e que tal perspectiva deve valorar a interposição de técnicos médicos e ou farmacêuti- cas e os consumidores; outrossim, o facto de não se eviden- ciar que se trate de medicamentos para as mesmas doen- ças concorre para injustificar a recusa do registo em causa. - Cardona Ferreira.