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7/25/2019 fernanda_gomes arquitetura.pdf http://slidepdf.com/reader/full/fernandagomes-arquiteturapdf 1/182 Fernanda Silva Gomes DISCURSOS CONTEMPORÂNEOS SOBRE MONTES CLAROS:  (RE) ESTRUTURAÇÃO URBANA E NOVAS  ARTICULAÇÕES URBANO-REGIONAIS Belo Horizonte Escola de Arquitetura da UFMG 2007 

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    Fernanda Silva Gomes

    DISCURSOS CONTEMPORNEOSSOBRE MONTES CLAROS:

    (RE) ESTRUTURAO URBANA E NOVASARTICULAES URBANO-REGIONAIS

    Belo Horizonte

    Escola de Arquitetura da UFMG

    2007

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    Fernanda Silva Gomes

    DISCURSOS CONTEMPORNEOSSOBRE MONTES CLAROS:

    (RE) ESTRUTURAO URBANA E NOVAS

    ARTICULAES URBANO-REGIONAIS

    Dissertao apresentada ao Ncleode Ps-graduao em Arquitetura eUrbanismo da Escola de Arquiteturada Universidade Federal de Minas

    Gerais, como requisito parcial obteno do ttulo de Mestre emArquitetura e Urbanismo.

    rea de Concentrao: Teoria ePrtica do Projeto de Arquitetura eUrbanismo

    Orientador: Prof. Roberto Lus de MeloMonte-Mr

    Belo Horizonte

    Escola de Arquitetura da UFMG

    2007

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    FICHA CATALOGRFICA

    Gomes, Fernanda SilvaG633d Discursos contemporneos sobre Montes

    Claros : (re)estruturao urbana e novas articulaes

    urbano-regionais / Fernanda Silva Gomes. - 2007

    181f. : il.

    Orientador: Roberto Lus de Melo Monte-MorDissertao (mestrado) - Universidade Federal de Minas

    Gerais, Escola de Arquitetura.

    1.Urbanizao 2. Crescimento urbano MontesClaros (MG) 3. Renovao urbana MontesClaros(MG) 4. Economia urbana 5. Planejamento

    urbano 6. Planejamento regional 7. MontesClaros(MG) - Histria 8. Minas Gerais, Norte I. Monte-Mr, Roberto Lus de Melo II. Universidade Federalde Minas Gerais. Escola de Arquitetura III. Ttulo

    CDD : 711.4098151

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    Agradecimentos

    Deus que sempre me deu foras para seguir em frente;

    Aos meus pais, Vanda e Geg, pelo apoio;

    vov Nair pelo carinho;

    Ao meu orientador Roberto e;

    todos que me ajudaram.

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    RESUMO

    A transformao de Montes Claros de uma Cidade Agrrio-Mercantil para

    uma Cidade Urbano-Industrial se refletiu diretamente na configurao da sua

    estrutura urbana: a expanso do tecido urbano, a periferizao do uso e ocupao

    do solo, a proliferao de assentamentos subnormais, a segregao scio-

    espacial, a descentralizao comercial do centro e o surgimento de novas

    centralidades. Montes Claros passou de uma Cidade Monocntrica a uma Cidade

    Policntrica. O processo de reestruturao urbana de Montes Claros est atrelado

    formao de uma cidade-regio e sua consolidao como plo tercirio e

    industrial da rede urbana do Norte de Minas. O objetivo deste trabalho discutir

    as tendncias de configurao scio-espacial da atual estrutura urbana de Montes

    Claros e as novas articulaes urbano-regionais da mesma.

    Palavras-chave: Montes Claros/MG - histria; urbanizao; expanso urbana

    Montes Claros; reestruturao urbana Montes Claros; Nortede Minas Gerais; rede urbana; cidade-regio; articulaes

    urbano-regionais.

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    ABSTRACT

    The transformation of Montes Claros from an Agrarian-Mercantile City to an

    Urban-Industrial City reflects directly on the configuration of its urban structure:

    the expansion of the urban tissue"; the "periphericization" of land-use and land-

    occupation; the proliferation of subnormal housing; the segregation within urban

    space; the decentralization of downtown and the emergence of new centralities.

    Montes Claros also changed from a Monocentric City to a Policentric City. The

    process of urban restructuring in Montes Claros is associated to its coming out as

    a City-Region and to its consolidation as a tertiary and industrial pole within the

    urban network of Northern Minas Gerais. The objective of this research is to

    discuss Montes Claross urban structure current tendencies of socio-spatial

    configuration and its new urban-regional articulations.

    Keywords: Montes Claros/MG - history; urbanization; urban expansion Montes

    Claros; urban restructuring Montes Claros; Minas Gerais, North;

    urban network; city-region; urban-regional articulations.

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    LISTA DE FIGURAS

    FIGURA 1 Principais ligaes rodovirias de Montes Claros............ .........................20

    FIGURA 2 Mapa das mesorregies de Minas Gerais segundo o IBGE.......................34

    FIGURA 3 Mapa das microrregies do Norte de Minas segundo o IBGE....................34

    FIGURA 4 Mapa fsico-territorial dos municpios do Norte de Minas............................35

    FIGURA 5 Delimitao do municpio de Montes Claros e da mancha urbana.............36

    FIGURA 6 Delimitao do permetro urbano de Montes Claros...................................37

    FIGURA 7 Mapa do IDH dos municpios mineiros........................................................50

    FIGURA 8 Praa da Matriz de Montes Claros no incio do sculo XX..........................62

    FIGURA 9 Ligaes rodovirias no Norte de Minas.....................................................83

    FIGURA 10 Casa da sede da Fazenda dos Montes Claros...........................................88

    FIGURA 11 A ocupao urbana de Montes Claros no incio do sculo XX....................89

    FIGURA 12 Detalhe da rea central...............................................................................89

    FIGURA 13 Bairros de Montes Claros da dcada de 1950............................................91

    FIGURA 14 Mancha urbana de Montes Claros da dcada de 1970...............................94

    FIGURA 15 A expanso urbana de Montes Claros de 1970 a 2000..............................95

    FIGURA 16 A mancha urbana atual de Montes Claros..................................................97

    FIGURA 17 Centro de Montes Claros segundo a Lei de Uso e Ocupao do Solo.....110

    FIGURA 18 Fotos do Centro de Montes Claros............................................................117

    FIGURA 19 Subcentros de Montes Claros...................................................................119

    FIGURA 20 Fotos de edificaes de comrcio e servios do bairro Major Prates.......121

    FIGURA 21 Montes Claros Shopping e entorno...........................................................123

    FIGURA 22 Fotos do Montes Claros Shopping e edificaes do entorno....................124

    FIGURA 23 Distrito Industrial de Montes Claros e o Bairro Universitrio.....................125

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    FIGURA 24 Fotos do Distrito Industrial de Montes Claros............................................127

    FIGURA 25 Fotos das faculdades localizadas na Zona Norte da Cidade....................128

    FIGURA 26 Fotos de edifcios prximo Prefeitura Municipal.....................................130

    FIGURA 27 Fotos de edificaes voltadas para a Avenida Sanitria...........................131

    FIGURA 28 Fotos de prdios voltados para a Avenida Mestra Fininha.......................132

    FIGURA 29 Bairro Ibituruna..........................................................................................133

    FIGURA 30 Fotos das edificaes voltada para a avenida Jos Correa Machado......134

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    LISTA DE TABELAS

    TABELA 1 Distribuio do PIB por setor de municpios do Norte de Minas em

    2000.............................................................................................................43

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    LISTA DE QUADROS

    QUADRO 1 rea, populao e densidade demogrfica de municpios do Norte deMinas...........................................................................................................38

    QUADRO 2 Renda mensal do chefe de famlia de Montes Claros................................45

    QUADRO 3 Evoluo do IDH de municpios do Norte de Minas em 1970, 1980, 1991 e

    2000............................................................................................................47

    QUADRO 4 Taxas anuais de crescimento da populao rural do Norte de Minas e de

    Minas Gerais - 1960/70 e 1970/80..............................................................67

    QUADRO 5 Aspectos demogrficos do municpio de Montes Claros entre 1960 a

    2000............................................................................................................68

    QUADRO 6 Os assentamentos subnormais de Montes Claros em 2001....................103

    QUADRO 7 Caracterstica dos assentamentos subnormais de Montes Claros em

    2001..........................................................................................................104

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    LISTA DE GRFICOS

    GRFICO 1 Distribuio do PIB por setor econmico da regio Noroeste de Minas e do

    estado de Minas Gerais 1970...................................................................41

    GRFICO 2 Distribuio do PIB por setor no Norte de Minas e em Minas Gerais 1985

    e 1998..........................................................................................................42

    GRFICO 3 PEA de Montes Claros distribuda por setor - 1960 e 1970........................44

    GRFICO 4 PIB e populao ocupada por setor em Montes Claros em 2003...............45

    GRFICO 5 Empresas que atuaram em Montes Claros e pessoal ocupado poratividades em 2003......................................................................................46

    GRFICO 6 Estabelecimentos por gnero de indstrias de Montes Claros 1960.......64

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    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    AMANS Associao dos Municpios da rea Mineira da SUDENEBID - Banco Interamericano de Desenvolvimento

    BIRD - Banco Internacional de Reconstruo e Desenvolvimento (Banco Mundial)

    BNH Banco Nacional de Habitao

    CDI - Companhia de Distrito Industrial

    CDL Cmara dos Dirigentes Lojistas

    CEMIG Companhia Energtica de Minas Gerais

    CODEVALE Comisso de Desenvolvimento do Vale do Jequitinhonha

    CODEVASF Companhia de Desenvolvimento do Vale do So Francisco e do Parnaba

    CNPU - Comisso Nacional de Poltica Urbana e Regies Metropolitanas

    DNOCS Departamento Nacional de Obras Contra a Seca

    FACIT Faculdade de Cincias e Tecnologia

    FINOR Fundo de Investimento do Nordeste

    FJP Fundao Joo Pinheiro

    FUNM Fundao Norte Mineira de Ensino

    FUNORTE Faculdades Unidas do Norte de Minas

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    ICMS Imposto Sobre Circulao de Mercadoria e Servios

    IDENE Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas

    IDH ndice de Desenvolvimento Humano

    IEPHA/MG - Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico de Minas Gerais

    IPEA Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

    IPI Imposto sobre Produto Industrializado

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    ISS - Imposto sobre Servios

    ONU Organizao das Naes Unidas

    PDLI Plano de Desenvolvimento Local Integrado

    PDMC Plano de Desenvolvimento de Montes Claros

    PEA - Populao Economicamente Ativa

    PECPM Projeto Especial Cidade de Porte Mdio

    PEMAS Plano Estratgico Municipal para Assentamentos Subnormais

    PIB Produto Interno Bruto

    PMDES - Plano Mineiro de Desenvolvimento

    PMDI Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado

    PMMC Prefeitura Municipal de Montes Claros

    PND - Plano Nacional de Desenvolvimento

    PNDU - Poltica Nacional de Desenvolvimento Urbano

    RAIS Relao Anual de Informaes Sociais

    SEPLAN Secretaria de Planejamento e Coordenao

    SERFHAU - Servio Federal de Habitao e Urbanismo.

    SUDENE Superintendncia de Desenvolvimento do Nordeste

    SUDENOR - Superintendncia de Desenvolvimento do Norte de Minas

    SUS Sistema nico de Sade

    TELEMIG - Telecomunicaes de Minas Gerais

    UNIMONTES Universidade Estadual de Montes Claros

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    SUMRIO

    INTRODUO 15

    1 - A CIDADE NA REGIO: MONTES CLAROS NO NORTE DE MINAS GERAIS 30

    1.1 UM ESTUDO SOCIOECONMICO DA REGIO DO NORTE DE MINAS 31

    1.1.1 Um conceito de regio 311.1.2 Aspectos fsico-territoriais e populacionais do Norte de Minas 331.1.3 Um perfil econmico de Montes Claros e do Norte de Minas 401.1.4 Crescimento x Desenvolvimento do Norte de Minas 47

    1.2 O FENMENO URBANO E AS TRANSFORMAES DE MONTES CLAROS 52

    1.2.1 Um breve histrico: da polis ao urbano 521.2.2 Montes Claros: da cidade agrria cidade plo de servios 561.2.3 Do curral cidade 581.2.4 Da estrada de ferro aos mercados 601.2.5 O processo de industrializao e de urbanizao de Montes Claros 631.2.6 O urbano: a terciarizao e novas formas de consumo 70

    1.3 MONTES CLAROS NA REDE URBANA DO NORTE DE MINAS 75

    1.3.1 Um estudo sobre rede urbana 751.3.2 Um conceito de cidade-regio 801.3.3 As articulaes de Montes Claros no Norte de Minas 82

    2 - A REGIO NA CIDADE: O PROCESSO DE URBANIZAO E DEREESTRUTURAO URBANA DE MONTES CLAROS 86

    2.1 O PROCESSO DE URBANIZAO DE MONTES CLAROS 87

    2.1.1 A cidade monocntrica 882.1.2 A cidade setorizada 922.1.3 A expanso urbana de Montes Claros 942.1.4 A segregao scio-espacial de Montes Claros 982.1.5 O processo de periferizao de Montes Claros 1002.1.6 A Questo Habitacional de Montes Claros 102

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    2.2 O PROCESSO DE REESTRUTURAO DE MONTES CLAROS 107

    2.2.1 Um conceito de centro, subcentro e centralidade 1072.2.2 O centro de Montes Claros e sua descentralizao comercial 1112.2.3 Os subcentros de Montes Claros 1182.2.4 A expanso do comrcio de bairro e o caso do bairro Major Prates 1202.2.5 Novos padres de consumo e o Montes Claros Shopping Center 1222.2.6 A refuncionalizao da rea do Distrito Industrial e da zona norte da cidade 1252.2.7 A renovao urbana de centralidades lineares de Montes Claros 129

    3 A CIDADE-REGIO: MONTES CLAROS NO CENRIO URBANO-REGIONAL 136

    3.1 ALGUNS PLANOS E PROGRAMAS DESENVOLVIDOS PARA MONTES CLAROS 137

    3.1.1 Os Planos e Programas de Montes Claros da dcada de 1970 1373.1.2 O PDMC (1991) e os Planos Diretores de Montes Claros de 1995 e 2001 1433.1.3 Os planos da atual gesto 150

    3.2 OS DISCURSOS CONTEMPORNEOS SOBRE MONTES CLAROS 152

    3.2.1 Montes Claros como Lugar Central 1553.2.2 Montes Claros como cidade mdia na rede urbana 1563.2.3 O Urbano em Montes Claros e a questo cultural do Norte de Minas 1603.2.4 Montes Claros como cidade policntrica 1623.2.5 Montes Claros como cidade-regio: um Projeto Regional para o Norte de Minas 165

    CONIDERAES FINAIS 171

    REFERNCIAS 175

    ANEXOS 181

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    INTRODUO

    As atuais transformaes scio-econmicas do Brasil foram marcadas

    pelos processos de globalizao e de reestruturao econmica e produtiva.

    Segundo Diniz (1996), as tendncias de reestruturao produtiva, seja da

    desconcentrao da economia, seja da reverso da polarizao, com relativa

    disperso da indstria e reconcentrao regional, provocaram a insero de plos

    ou regies de crescimento, que tiveram capacidade de capturar novas atividades

    econmicas. Essas transformaes levaram a uma redefinio da rede urbana

    brasileira.O estudo sobre rede urbana advm do significado que o processo de

    urbanizao passou a ter no desenvolvimento nacional, ao condicionar mudanas

    cruciais na sociedade e na formao do espao urbano. As cidades deixam de ser

    vistas de forma isolada e passam a ser analisadas a partir das articulaes

    funcionais que estabelecem entre si. Atravs da rede urbana e da crescente rede

    de comunicao, transporte e informao a ela vinculada, distantes regies

    puderam se articular, estabelecendo assim, uma economia mundial.

    Com as redes aprimora-se a viso dos desdobramentos espaciaiscausados por fenmenos polticos, sociais e econmicos, sejamos desencadeados pelas transformaes estruturais dadas pelaformao da sociedade urbano-industrial em vrias partes domundo, sejam aqueles associados, mais recentemente, s novasmaterialidades e virtualidades advindas de processosglobarizadores (MATOS, 2005: 111).

    Para o filsofo Henri Lefebvre (1999), o urbano e a formao de umasociedade urbana so resultados do processo de industrializao das cidades.

    Para explicar o fenmeno urbano e a formao da sociedade urbana, Lefebvre

    (1999), no seu livro A Revoluo Urbana, traa um eixo espao-temporal do 0%

    ao 100% no qual posiciona de forma evolutiva: a Cidade Poltica, a Cidade

    Mercantil, a Cidade Industrial e o Urbano.

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    Monte-Mr (2005), com base em Lefebvre, no se refere ao urbano como

    o adjetivo que qualifica a cidade, mas ao substantivo que surge como o terceiro

    elemento (sntese e extenso) na oposio dialtica cidade-campo. O urbano,

    para Monte-Mr, a manifestao material do espao social integrado,

    (re)definido pela urbanizao que se estende virtualmente por todo o territrio e

    caracteriza a sociedade urbano-industrial contempornea. Pode-se deduzir, ento,

    que o urbano marca o fim da dualidade campo-cidade nas sociedades urbano-

    industriais, a partir do momento que aborda a totalidade, seja ela a regio, o pas

    ou o mundo.

    importante destacar que, ao contrrio do perodo atual, at a dcada de

    1960, as opes internacionais de comrcio surtiam pouco efeito nos mercados

    nacionais. A pequena diviso territorial do trabalho, a baixa integrao nacional e

    as atividades industriais ainda no tinham adquirido a expresso econmica que

    tm hoje. Dessa forma, a rede urbana brasileira estava associada a um padro de

    interao espacial predominantemente regional, ou seja, o pas estava estruturado

    em torno de metrpoles regionais consolidadas ou em formao (CORRA,

    2001).

    De acordo com Rosa Moura (2004), at os anos 1970, a indstria imps

    uma lgica aglomeradora como condio bsica produo e reproduo do

    capital, que erigiu metrpoles como centralidades fundamentais ao

    desenvolvimento desse processo. Alm de So Paulo e Rio de Janeiro,

    consolidaram-se tambm outras metrpoles brasileiras como Belo Horizonte,

    Porto Alegre, Salvador, Recife e Curitiba, num processo entendido como

    metropolizao.

    Para Preceleille (1994), as diferentes formas de abordagem da globalizao

    levam a deduzir duas hipteses distintas no que se refere s conseqncias

    espaciais: uma supe a concentrao das funes centrais nas chamadas cidades

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    mundiais1e a outra se refere mudana no padro de urbanizao, que se d a

    partir do relativo esvaziamento econmico e reduo das taxas de crescimento

    populacional nas grandes metrpoles, num processo de desmetropolizao.

    Santos (1993) discute a questo da desmetropolizao, em pauta desde os anos

    90, reforando a chegada de novas aglomeraes categoria de cidades mdias.

    Ainda a respeito da desmetropolizao, Diniz (2000) esclarece que o

    crescimento das economias externas, derivado da expanso da infra-estrutura e

    da oferta de servios urbanos, promoveu em conjunto, o processo de

    desconcentrao regional da indstria, a partir da dcada de 70. O resultado

    desse processo foi o crescimento das cidades mdias em vrias partes do

    territrio nacional e a maior diferenciao espao-temporal da rede urbana

    brasileira, que passa a apresentar padres mais complexos (CORRA, 2001).

    Diniz (2000) ressalta que, nas ltimas dcadas, teve incio um processo de

    desconcentrao econmica com reduo das desigualdades regionais do Brasil,

    que, no entanto, ainda se mantm elevadas. Houve uma reverso da polarizao

    industrial nas reas metropolitanas do Rio de Janeiro e So Paulo, em funo

    tambm da queda do emprego formal nas indstrias. Neste sentido, novos plos

    industriais dinmicos vm sendo implantados nas metrpoles no-primazes, ou

    nas cidades mdias da regio centro-sul, combinando a reverso da polarizao

    das reas metropolitanas primazes Rio de Janeiro e So Paulo com a

    reaglomerao metropolitana nestas regies.

    O espao geogrfico brasileiro assumiu a forma de um mosaico econmico

    o que foi determinante na configurao regional brasileira, at os dias de hoje

    (DINIZ, 2000). De acordo com Corra (2001), a rede urbana brasileira no

    alvorecer do sculo XXI, tem sido marcada pela contnua criao de novos

    1De acordo com Friedmann (1986), a cidade mundial caracterizada por: ser sede de grandesempresas nacionais e/ou multinacionais; ser um centro de comando na organizao da economiamundial; e dispor de um parque manufatureiro inovador em escala internacional. Para o autor, asnicas cidades mundiais que no esto localizadas em pases de primeiro mundo so Cingapura,que articula o conjunto de pases do sudeste asitico, e So Paulo, que exerce similar funo naAmrica Latina.

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    centros; pela complexidade funcional dos centros urbanos; e pela crescente

    articulao entre centros e regies.

    O estudo da relao entre cidade e sua regio (complementar), no contexto

    das atuais transformaes da economia mundial, suscitou o debate sobre cidade-regio. O conceito de cidade-regio global, desenvolvido primeiro pelos

    gegrafos econmicos Allen Scott e Michael Storper, a partir do conceito de

    cidade global de Saskia Sassen, derivado do estudo das transformaes

    urbano-regionais causadas pelo processo de globalizao. Para Scott (2001), a

    cidade-regio global funciona como um motor regional da economia global, isto ,

    como uma rede local dinmica de relaes econmicas, inseridas em telas

    estendidas em escala mundial de troca inter-regional.

    O processo de desmetropolizao, a reestruturao regional e a

    redistribuio da populao nos diferentes setores econmicos do pas so fatores

    que vm provocando alteraes na articulao entre as cidades da rede urbana

    brasileira. Tais alteraes influenciam o crescimento populacional e a maior

    diversidade funcional nas cidades mdias, conferindo-lhes maior importncia na

    hierarquia da rede urbana.

    De acordo com Santos (1993), a maior diversidade funcional e aespecializao dos servios nas cidades mdias criam um ambiente tcnico-

    cientfico-informacional propcio atrao de investimentos que contribuem para

    dinamizar o seu setor econmico. O questionamento acerca do futuro das cidades

    mdias, na rede urbana brasileira, procura reforar sua centralidade junto s

    regies circundantes, funcionando como centros de comando do desenvolvimento

    regional. Esse , por exemplo, o caso da cidade de Montes Claros, localizada na

    regio Norte de Minas Gerais.

    Com uma populao estimada em 348.991 habitantes2, Montes Claros

    uma cidade mdia, tanto em termos populacionais como funcionais, sendo o mais

    importante plo da regio do Norte de Minas, que uma regio que se destaca no

    2Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) - Populao estimada em 01 dejulho de 2006.

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    mbito estadual e nacional por apresentar baixos indicadores socioeconmicos. A

    posio central e hierarquicamente superior de Montes Claros na rede urbana do

    Norte de Minas se consolidou ao longo do seu processo de formao.

    A ocupao efetiva do territrio norte-mineiro ocorreu a partir do sculoXVII, com a expanso das atividades agropecurias. Em 1926, a chegada da

    ferrovia em Montes Claros permitiu uma maior articulao da cidade com outros

    centros do pas, impulsionando as atividades comerciais e financeiras e atraindo

    um significativo fluxo de pessoas. A cidade comeou a se destacar no cenrio

    regional como um importante entreposto comercial.

    A base econmica de Montes Claros, at a dcada de 70, era apoiada na

    agropecuria e nas atividades mercantis, no entanto, aps esse perodo, asituao se modificou. A regio do Norte de Minas passou a ser foco de polticas

    desenvolvimentistas da Unio, sendo incorporada, em 1965, Superintendncia

    de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), que foi criada pelo governo federal,

    em 1959, com o intuito de fomentar o processo de industrializao da regio

    Nordeste do pas e, por conseguinte, reduzir as desigualdades macro-regionais do

    pas, visto que as indstrias se concentravam nas cidades de So Paulo e Rio de

    Janeiro.

    A partir da dcada de 70, Montes Claros passou, ento, por um processo

    de industrializao, incentivado pelos recursos fiscais e financeiros da SUDENE,

    que provocou modificaes substanciais na economia e estrutura do municpio,

    determinando fluxos intra-regionais de pessoas, capital e tecnologias. Por

    apresentar uma melhor infra-estrutura em relao s demais cidades do Norte de

    Minas, Montes Claros foi priorizada pela SUDENE para receber os investimentos

    no setor industrial.

    Concomitantemente ao processo de industrializao, houve uma melhoria

    da infra-estrutura urbana da cidade (nos setores de saneamento, comunicao,

    transporte e circulao) e tambm a ampliao das atividades de comrcio e

    servios. A expanso da rede rodoviria, sobretudo a partir da dcada de 1970,

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    permitiu uma maior articulao do municpio de Montes Claros com a regio do

    Norte de Minas e com os principais centros econmicos do Brasil.

    FIGURA 1 - Princ ipais li gaes rodovirias de Montes ClarosFonte: mapa fornecido pela Prefeitura Municipal de Montes Claros (PMMC) em meiodigital

    Em meados da dcada de 1960, a populao do municpio de Montes

    Claros tornou-se predominantemente urbana. O grau de urbanizao do municpio

    passou de 40,66%, em 1960, para 73,10%, em 1970, e chegou a 87,60%, em

    1980 (Dados IBGE). A industrializao, a mecanizao do campo, o xodo rural e

    os movimentos migratrios intra-regionais contriburam pra acelerar o processo deurbanizao de Montes Claros. O contingente populacional que se instalou em

    Montes Claros era constitudo, sobretudo, por imigrantes pobres, atrados pela

    possibilidade de emprego nas fbricas e pela busca de uma melhor qualidade de

    vida.

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    As conseqncias do processo de urbanizao de Montes Claros, advindas

    da posio da cidade como plo regional, foram: expanso da malha urbana,

    periferizao, formao de assentamentos subnormais, maior demanda por

    servios pblicos (habitao, infra-estrutura, transporte, saneamento) e

    degradao do meio ambiente.

    Um quadro de conflito urbano instaurou-se na cidade, provocando

    questionamentos sobre o futuro esperado, ou mesmo, desejado para Montes

    Claros, trazendo tona o discurso sobre a orientao do planejamento urbano na

    cidade. Para Farret (1985), o planejamento urbano deve, de forma sistemtica,

    prever e controlar o desenvolvimento da cidade, sendo o conhecimento o corpo

    terico do prprio objeto, e condio necessria ao planejamento urbano. Se o

    conhecimento for limitado, o planejamento urbano ser ruim.

    Planejar significa tentar prever a evoluo de um fenmeno ou,para diz-lo de modo menos comprometido com o pensamentoconvencional, tentar simular os desdobramentos de um processo,com o objetivo de melhor precaver-se contra provveis problemasou, inversamente, com o fito de melhor tirar partido de provveisbenefcios (SOUZA, 2002: 46).

    A elaborao da Lei Federal 10.257, aprovada em 2001, conhecida como

    Estatuto da Cidade, fomentou o debate sobre o processo de planejamento

    urbano das cidades brasileiras, bem como, dos instrumentos de Poltica Urbana,

    tais como, os Planos Diretores, Planos de Desenvolvimento Econmico e Social,

    entre outros. A obrigatoriedade, prevista na Lei 10257, para que as cidades

    brasileiras com mais de 20.000 habitantes3tivessem um Plano Diretor aprovado

    at outubro de 2006, foi um convite a se pensar as cidades.

    3De acordo com o Estatuto da Cidade, outros municpios brasileiros foram tambm obrigados aaprovar um Plano Diretor, como exemplo, os municpios integrantes de regies metropolitanas eaglomeraes urbanas, os que esto situados em reas de influncia de empreendimentos ouatividades com significativo impacto ambiental na regio ou no pas, ou ainda, os que sointegrantes de reas de especial interesse turstico.

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    Os planejadores urbanos4 so instigados a refletir sobre os possveis

    rumos, desejveis ou no, a serem seguidos pelas cidades brasileiras e tambm,

    a buscar solues que possam mitigar seus problemas urbanos. O desafio de

    planejar as cidades diante de um quadro de crises e incertezas necessrio para

    elaborar as leis, planos, programas e projetos que orientaro o processo de

    desenvolvimento urbano dos municpios e das regies brasileiras.

    O planejamento urbano-regional importante para o entendimento da

    problemtica urbana das cidades sob a dupla tica global e local. Global, por se

    tratar de uma conjuntura econmica maior, que transpe os limites fsico-

    territoriais das cidades que esto articuladas funcionalmente a outras cidades,

    formando uma rede urbana, em que as transformaes externas podem refletir

    internamente e vice-versa.E local, pois necessrio aprofundar no conhecimento

    dos problemas e potenciais da cidade, para ento, propor alternativas que

    garantam o ordenamento do solo urbano e o cumprimento da legislao

    urbanstica, tal como esto previstos no Estatuto da Cidade.

    Os atuais estudos sobre rede urbana no Brasil tm dado maior nfase

    estruturao dos sistemas urbano-regionais de produo, circulao, consumo e

    diversificao funcional. A partir do momento em que as cidades comeam a

    abrigar servios mais especializados, elas adquirem vantagens locacionais

    diferenciadas que lhes atribuem uma maior centralidade na rede urbana. Parece

    pertinente, em tese, adotar o estudo sobre a diferenciao funcional das cidades

    na rede urbana, para um conhecimento sobre Montes Claros e sua articulao

    com a regio do Norte de Minas. Desse estudo, pode-se extrair duas dimenses

    do sistema urbano: a estrutura econmica e a estrutura urbana.

    O conceito de estrutura urbana apresenta diferentes acepes. De acordo

    com Souza (2002), a estrutura urbana o resultado de um determinado arranjo

    territorial da articulao de diferentes formas e objetos, que se reproduzem

    4 Os planejadores urbanos se referem aos profissionais responsveis por pensar as cidades,incluindo pesquisadores, tcnicos, governantes e outros. O planejamento urbano engloba umcampo do conhecimento interdisciplinar, o que rene a viso de gegrafos, socilogos, urbanistas,economistas, ambientalistas e outros profissionais.

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    refletindo as relaes sociais, econmicas e polticas que constituem uma

    sociedade. A estrutura urbana est em constante processo de transformao,

    sendo constituda de elementos que relacionam entre si de tal forma que a

    alterao de um elemento ou de uma relao, altera todos os demais elementos e

    todas as demais relaes.

    Para Villaa (1998), o que comumente se chama de estruturao urbana

    a estruturao (ou reestruturao) regional que aborda o componente urbano do

    espao regional. Aps a dcada de 1990, observa-se que o termo estruturao

    urbana tem sido, usualmente, substitudo por reestruturao urbana, que se refere

    mais especificamente aos estudos que buscam compreender os processos de

    valorizao capitalista do espao, enquanto movimento dinmico de renovao de

    usos ou reutilizao dos espaos da cidade (SPSITO, 2001).

    Nesta pesquisa, o termo (re)estruturao urbana se refere s atuais

    transformaes urbanas ocorridas nas cidades, fruto do urbano e dos processos

    de globalizao e reestruturao econmica. Nesse contexto, a partir de meados

    da dcada de 1990, tem-se observado em Montes Claros a expanso e

    especializao das atividades do setor tercirio, especialmente dos servios,

    implicando uma nova lgica na configurao do seu espao urbano, como:

    renovao dos usos do tecido urbano, descentralizao das atividades de

    comrcio e servios do ncleo central e o surgimento de novas centralidades

    formando subcentros.

    Assim, as modificaes econmicas e scio-espaciais que ocorreram ao

    longo do processo de formao de Montes Claros, a saber, a industrializao, a

    urbanizao, e mais recentemente, a expanso do urbano associada ao

    processo de globalizao, permitiram-lhe assumir uma liderana no processo de

    desenvolvimento regional e a consolidar-se como o maior plo industrial e de

    servios do Norte de Minas.

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    Questes

    Algumas questes foram suscitadas no incio desta pesquisa:

    Por qu Montes Claros se tornou um plo regional?

    Qual foi o reflexo das principais modificaes econmicas na configurao do

    espao urbano da cidade?

    De que forma a posio de Montes Claros como cidade plo regional interferiu

    no seu processo de urbanizao?

    Quais so as tendncias do processo de reestruturao urbana da cidade?

    Qual a viso que os principais Planos e Programas elaborados para Montes

    Claros tm da cidade?

    A questo central que se colocou em debate e que talvez sintetize a idia

    de todas acima elencadas foi: de que forma tem se manifestado a atual estrutura

    urbana de Montes Claros discutida no cenrio urbano-regional?

    Objetivo

    Dessa forma, o objetivo desse trabalho discutir o atual processo de

    (re)estruturao urbana de Montes Claros e suas articulaes urbano-regionais.

    Para isso, foi necessrio antes, construir um conhecimento acerca da cidade de

    Montes Claros, baseado na anlise das principais transformaes econmicas

    ocorridas na cidade (em um contexto regional) e seus reflexos na estruturao do

    seu espao urbano, e baseado tambm, na anlise dos principais planos e

    programas elaborados para Montes Claros.

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    Hiptese

    Os discursos contemporneos de Montes Claros devem contemplar a

    cidade no contexto regional, considerando suas complexidades e peculiaridades:

    Montes Claros uma cidade mdia; apresenta uma populao de porte

    significativo; plo (industrial e de servios) de uma regio vasta e pobre; foco

    de atrao da populao do campo e de outras cidades da regio; possui uma

    posio central e hierrquica em relao rede urbana do Norte de Minas; e

    ainda apresenta uma diversidade funcional e econmica que lhe atribui vantagens

    diferenciadas.

    O objeto de estudo

    Para melhor delimitao do objeto de estudo desta pesquisa - a cidade de

    Montes Claros - foi feito um recorte espao-temporal. A relao intrnseca que

    Montes Claros estabelece com o Norte de Minas motivou um estudo sob uma

    escala, micro (local), meso (regional) e macro (global). No entanto, a regio do

    Norte de Minas mostrada nesta pesquisa apenas como um pano de fundo, ou

    como um cenrio, para apresentar os acontecimentos relativos cidade de

    Montes Claros.

    O conhecimento do processo de desenvolvimento da regio do Norte de

    Minas, ao longo da histria, foi fundamental para a compreenso das

    transformaes urbanas que se refletiram diretamente em Montes Claros, como

    por exemplo, os processos migratrios, o xodo rural, a expanso do tecido

    urbano, o aumento da periferizao, o surgimento de novas centralidades

    (subcentros), entre outros.

    Cabe ainda esclarecer que o Norte de Minas no a nica rea polarizada

    pela cidade de Montes Claros. O sul da Bahia, parte da regio do Vale do

    Jequitinhonha/Mucuri e da regio Noroeste de Minas podem ser consideradas

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    tambm reas de abrangncia de Montes Claros. No entanto, focou-se neste

    estudo apenas o Norte de Minas como recorte regional da rea de influncia de

    Montes Claros.

    Em relao ao recorte temporal, este foi mais extenso, pois, embora oobjetivo deste estudo seja discutir o atual processo de reestruturao urbana de

    Montes Claros, fez-se necessrio para tal, desenvolver um breve resgate histrico

    das principais transformaes econmicas ocorridas na cidade, iniciando-se do

    seu processo de povoamento, no sculo XVII, at os dias atuais. Procurou-se

    simplificar este longo perodo histrico atravs de um eixo espao-temporal,

    baseado em Lefebvre (1999) - da cidade agrria cidade plo de servios.

    Organizao dos captulos

    O desenvolvimento deste trabalho foi divido em trs captulos. O Captulo

    1, denominado A Cidade na Regio: Montes Claros no Norte de Minas

    subdivido em trs itens (ou sub-captulos). No item 1.1, caracteriza-se a cidade de

    Montes Claros e a regio do Norte de Minas sob os aspectos fsico-territoriais,

    populacionais e econmicos, comparando-se os dados socioeconmicos de

    Montes Claros com outros municpios do Norte de Minas, para traar um perfil da

    cidade em relao regio.

    No item 1.2, procura-se, inicialmente, apropriar-se do conhecimento terico

    sobre o processo de urbanizao das cidades, que resultou na formao de uma

    sociedade urbano-industrial. Posteriormente, desenvolve-se uma reflexo crtica

    sobre as principais transformaes econmicas da cidade de Montes Claros, no

    cenrio urbano-regional, atravs do eixo espao-temporal (da cidade agrria

    cidade plo de servios), identificando ao longo dele, os principais atores sociais

    ou agentes responsveis por engendrar este processo.

    No item 1.3, desenvolve-se um estudo sobre rede urbana e sobre cidade-

    regio, relacionando-os atual configurao da rede urbana do Norte de Minas,

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    de forma apenas referencial, j que este no o objetivo central da pesquisa,

    buscando uma compreenso da posio assumida por Montes Claros como o

    principal plo de servios do Norte de Minas.

    O Captulo 2, denominado A Regio na Cidade: o processo deurbanizao e de reestruturao urbana de Montes Claros subdivido em dois

    itens (ou sub-captulos). No item 2.1, analisa-se o processo de urbanizao de

    Montes Claros, focando-se, mais especificamente, duas fases - a fase anterior

    dcada de 70 e a fase seguinte, da dcada de 1970 at meados da dcada de

    1990. No item 2.2, analisa-se a atual dinmica urbana ou reestruturao urbana

    de Montes Claros, iniciada a partir da segunda metade da dcada de 90,

    destacando-se dois elementos marcantes da atual configurao da sua estrutura

    urbana: o centro principal e os subcentros secundrios.

    O Captulo 3, denominado A cidade-regio: Montes Claros no cenrio

    urbano-regional subdivido em dois itens (ou sub-captulos). No item 3.1,

    desenvolve-se um estudo sobre os principais planos e programas elaborados para

    Montes Claros, verificando-se em que medida eles contemplaram o papel regional

    de Montes Claros e a viso que tm da cidade. No item 3.2 busca-se, a partir do

    estudo do processo de reestruturao urbana de Montes Claros, discutir, sob

    forma de um prognstico, como tende a se manifestar a estrutura urbana da

    cidade no cenrio urbano-regional.

    Metodologia

    Para desenvolver essa pesquisa foram desenvolvidas as seguintes

    atividades:

    1. reviso bibliogrfica - pesquisa em livros, revistas, sites especializados e

    jornais, assuntos sobre a temtica estudada;

    2. anlise de dados scio-econmicos - levantamento de dados e informaes

    sobre Montes Claros e o Norte de Minas (tais como, crescimento

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    demogrficos, grau de urbanizao, IDH, PIB, renda per capita, taxa de

    analfabetismo e outros) junto a rgos pblicos e instituies de ensino e

    pesquisa como IBGE, IPEA, Fundao Joo Pinheiro, Prefeitura Municipal de

    Montes Claros, UNIMONTES e outros;

    3. anlise dos mapas urbanos da cidade a partir dos mapas urbanos,

    disponibilizados pela Prefeitura Municipal de Montes Claros, foi possvel

    estudar a expanso da mancha urbana da cidade, a articulao do sistema

    virio e tambm, identificar as centralidades ou os locais da cidade onde h

    concentrao de atividades econmicas (comrcio, servio, indstria) e scio-

    educativas;

    4. estudo de Planos e Programas desenvolvidas para Montes Claros incluindo:o Plano Diretor de 1970, o primeiro aprovado em Montes Claros; o Programa

    de Aplicaes em Desenvolvimento Urbano de 1974, desenvolvido pela

    Fundao Joo Pinheiro; o Plano de Desenvolvimento Local Integrado (PDLI)

    de 1977, desenvolvido pela PRODAX (empresa de Belo Horizonte); o Projeto

    Especial Cidade de Porte Mdio (PECPM) de 1980; o Plano de

    Desenvolvimento de Montes Claros, elaborado em 1991 pela Prefeitura

    Municipal de Montes Claros (PMMC); o Plano Diretor elaborado em 1995 pela

    Secretaria de Planejamento e Coordenao (SEPLAN) da PMMC, que no

    chegou a ser aprovado na Cmara Municipal; o Plano Diretor em vigor,

    aprovado em 2001; e os Programas da atual gesto;

    5. pesquisa exploratria de campo anlise in loco e levantamento fotogrfico,

    especialmente, do centro e subcentros estudados na pesquisa;

    6. coleta de informaes junto Prefeitura Municipal de Montes Claros foram

    feitas visitas prefeitura e conversas/entrevistas com tcnicos da SEPLAN edemais funcionrios da prefeitura para obter informaes sobre: evoluo dos

    loteamentos, infra-estrutura urbana, diagnsticos e os atuais programas

    desenvolvidos para a cidade;

    7. anlise dos resultados obtidos confrontou-se os dados e informaes

    obtidos com as anlises e observaes desenvolvidas.

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    Resultados Esperados

    Espera-se que as questes discutidas ao longo desta pesquisa possam

    apontar caminhos, ou nortear o processo de planejamento urbano do municpio de

    Montes Claros, sob uma dupla tica local e regional, servindo como base para a

    elaborao da Legislao Urbanstica da cidade, como exemplo o Plano Diretor,

    ou demais Planos de Gesto e Aes que concorram para alcanar o

    desenvolvimento urbano da cidade e da regio do Norte de Minas. A viso

    prospectiva deste estudo uma tentativa de reflexo sobre as tendncias de

    desenvolvimento urbano-regional de Montes Claros.

    Espera-se ainda, que este debate possa instigar os planejadores urbanos e

    a populao em geral, a refletir sobre os rumos seguidos por nossas cidades, bem

    como sobre os consensos, dissensos e premissas do urbanismo contemporneo.

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    CAPTULO 1

    A CIDADE NA REGIO:

    MONTES CLAROS NO NORTE DE MINAS

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    1.1 - UM ESTUDO SOCIOECONMICO DA REGIO DO NORTE DE MINAS

    O objetivo deste item caracterizar a cidade de Montes Claros e a regio

    do Norte de Minas sob os aspectos fsico-territoriais, populacionais e econmicos,

    e comparar os dados socioeconmicos (como PIB e IDH) do municpio de Montes

    Claros com outros municpios do Norte de Minas5, para traar um perfil da cidade

    em relao regio.

    1.1.1 - Um conceito de regio

    Para uma melhor compreenso da regio do Norte de Minas, pesquisou-se

    o conceito de regio, que tem diferentes acepes sejam advindas da geografia,

    da economia ou da sociologia. Primeiramente, apresenta-se o conceito de regio

    econmica, desenvolvido pelos economistas Franois Perroux e Jacques

    Boudeville.

    Perroux (1967), a partir do conceito matemtico de espao abstrato, define

    trs categorias de regio econmica: a regio homognea constituda por

    elementos que apresentam caractersticas semelhantes; a regio polarizada

    heterognea e as diversas partes que a compem so complementares e mantm

    trocas, especialmente com o plo dominante (ou foco de desenvolvimento) de

    uma maneira mais intensa do que com os outros pontos (que so centros ou

    cidades de diversos tamanhos); e a regio definida por um plano ou programa

    corresponde s reas onde suas vrias partes so dependentes de uma deciso

    central.

    Perroux no faz uma correlao entre espao econmico e geogrfico (ou

    vulgar). De acordo com Ferreira (1989), Perroux e Boudeville referem-se ao

    espao geogrfico como o solo, o clima, o relevo, o lugar onde o homem habita.

    5Devido dificuldade de obter dados relativos s microrregies do Norte de Minas, o que permitiriauma anlise mais representativa da regio, procurou-se, ento, utilizar para uma anlisecomparativa, os dados dos municpios de mesmo nome das microrregies do Norte de Minas.

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    Essa viso elementar, tratando a regio como uma superfcie esttica, tem sido

    contestada pelos gegrafos.

    Para Ann Markusen (1981), os conceitos de regio e regionalismo tm

    assumido um lugar controvertido na teoria marxista. No se pode falar de regio,abstratamente, numa anlise marxista, mas ela pode ser sempre identificada

    pelas relaes sociais que as caracterizam num dado momento, ou seja, seu

    contexto histrico precisa ser apresentado. Markusen sugere usar o adjetivo

    regional no lugar da palavra regio, subordinando o espacial ao social, para evitar

    o fetichismo do espao, isto , o tratamento de regies como se fossem sinnimos

    de classe econmica ou de grupos culturais.

    Milton Santos (1996) define o espao atravs de categorias comoconfigurao territorial ou geogrfica que se define como um conjunto de sistemas

    naturais existentes numa dada rea, associado aos acrscimos que os homens

    superimpuseram a esses sistemas naturais. A configurao territorial

    substituda, com o passar do tempo, por uma natureza humanizada. Neste

    sentido, a regio vista, por Santos, como o lcus das relaes existentes na

    sociedade em um dado momento.

    J Corra (1987), observa a evoluo do conceito de regio, destacandotrs tipos de acepes: a Regio-Natural, cujo conceito vem da Geografia

    Clssica e identificada pela combinao de elementos da natureza como clima,

    relevo, e vegetao; a Regio-Paisagem, que se ope a esse determinismo

    ambiental e se refere a uma rea com presena de uma mesma paisagem

    cultural; e, por fim, a Regio-Planejamento, que o recorte espacial de uma rea

    com o propsito especfico de estudo do pesquisador.

    Para Souza (2002), o conceito de regio no um recorte espacialqualquer, definido apenas em funo de particularidades objetivas, como tipo de

    paisagem ou economia predominante, mas , primeiramente, um espao vivido6.

    Essa a mesma viso de Fremont (1980), que trata o espao, enquanto lugar

    6A regio como espao vivido e percebido rica em valores culturais, imagticos, simblicos ehistricos.

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    vivido, como palco das relaes sociais e culturais (construo de identidades).

    Para Fremont, a regio pode ser construda a partir da inter-relao de vrios

    componentes, tais como: elementos do meio fsico, atividades econmicas,

    composio demogrfica da populao, grupos sociais, organizao poltica e

    dimenses culturais.

    Por fim, preciso considerar que, com o processo de urbanizao das

    cidades, a definio dos limites da regio se torna ainda mais difcil, pois o

    crescimento das cidades para alm dos seus limites fez estreitar ainda mais a

    relao entre campo e cidade e entre cidade e regio. O espao regional ,

    portanto, o resultado do processo de urbanizao que se estende virtualmente por

    todo o territrio, englobando cidade e regio num processo de globalizao.

    1.1.2 - Aspectos fsico-territoriais e populacionais do Norte de Minas

    A nova regionalizao desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e

    Estatstica (IBGE), para fins de planejamento,divide o estado de Minas Gerais em

    12 mesorregies

    7

    : Norte de Minas, Jequitinhonha, Vale do Mucuri, Vale do RioDoce, Zona da Mata, Campos das Vertentes, Sul/Sudoeste de Minas, Oeste de

    Minas, Metropolitana de Belo Horizonte, Central Mineira, Tringulo Mineiro/Alto

    Paranaba e Noroeste de Minas (ver FIG. 2).

    A regio do Norte de Minas possui sete microrregies formadas por Montes

    Claros, Bocaiva, Pirapora, Janaba, Januria, Salinas e Gro Mogol (ver FIG. 3)

    e abrange uma rea territorial de 128.602 km2, o equivalente a 21,86% do estado

    de Minas Gerais. A regio composta por 89 municpios (ver FIG. 4 e anexo 1).

    7 O critrio utilizado pelo IBGE para a delimitao destas mesorregies foi o processo social, oquadro natural e a rede de comunicao como elemento de articulao espacial. A regionalizaodo Estado de Minas adotada pelo IBGE, nas dcadas de 1980 e 1990, inclua apenas 10mesorregies (Central, Doce, Mata, Sul de Minas, Centro Oeste, Alto Paranaba, Tringulo,Noroeste de Minas, Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha/Mucuri), no entanto, a Regio doNorte de Minas, manteve a mesma delimitao da atual.

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    FIGURA 2 Mapa das mesorregies de Minas Gerais segundo o IBGEFonte: mapa elaborado pela autora - base de dados da FJP

    FIGURA 3 Mapa das microrregies do Norte de Minas segundo o IBGEFonte: mapa elaborado pela autora - base de dados da FJP

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    FIGURA 4 Mapa fsico-territorial dos munic pios do Norte de MinasFonte: mapa elaborado pela autora - base de dados da FJP

    A rea da unidade territorial do municpio de Montes Claros de 3.582, 03

    km (IBGE - Diviso Territorial, 2001) e a rea urbana que corresponde rea

    interna ao permetro urbano 97,0 Km (ver FIG. 5). Essa rea est delimitada no

    mapa da Lei de Uso e Ocupao do Solo Urbano do Municpio de Montes Claros

    (ver FIG. 6), aprovada em 2002. Esse dado mostra que o municpio de MontesClaros possui uma vasta rea rural. No h conturbao da rea urbana de

    Montes Claros com os municpios vizinhos.

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    FIGURA 5 - Delimi tao do municpio de Montes Claros e da mancha urbanaFonte: mapa elaborado pela autora com base em mapa urbano fornecido pela PMMC /Secretaria de Planejamento e Coordenao SEPLAN

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    FIGURA 6 - Delimi tao do permetro urbano de Montes ClarosFonte: Montes Claros, 2002 (Anexo 2 da Lei de Uso e Ocupao do Solo).

    Vivem, na regio do Norte de Minas, aproximadamente 1.599.119 de

    habitantes (IBGE, estimativa 2006), que no esto distribudos de forma regular

    entre seus 89 municpios. O municpio de Montes Claros o que apresenta o

    maior nmero populacional, 348.991 habitantes (o que corresponde a

    aproximadamente 21,82% da populao da regio). O municpio de Janaba

    aparece em segundo lugar, com uma populao de 70.093 habitantes (IBGE,estimativa 2006). A maior parte dos municpios do Norte de Minas possui uma

    populao total inferior a 20 mil habitantes.

    A densidade demogrfica da regio variada, sendo que mais de 50% dos

    municpios do Norte de Minas possuem uma densidade mdia inferior a 10

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    38

    hab/km (IBGE, 2000), o que aponta para o fato da regio ser pouco populosa.

    Montes Claros e Pirapora so os municpios que possuem maior densidade

    demogrfica, 97,43 hab/km e 92,55 hab/km, respectivamente.

    QUADRO 1

    rea, populao e densidade demogrficade municpios do Norte de Minas

    A regio do Norte de Minas est situada na Bacia do Alto Mdio So

    Francisco e o clima dominante o tropical semi-mido, com chuvas concentradas

    no vero e temperaturas elevadas. A vegetao predominante o cerrado8com

    ocorrncia de rea de transio entre cerrado e caatinga. O Municpio de Montes

    Claros pertence Bacia Hidrogrfica do Rio Verde Grande, afluente do Rio So

    Francisco e est a 638 metros de altitude com temperatura mdia anual de

    24,20oC. Sua topografia de planalto, sendo suavemente plana.

    O Norte de Minas uma regio de fronteira ou de transio, pois apesar de

    estar localizado na regio Sudeste do pas, possui traos scio-econmicos e

    fisiogrficos semelhantes regio Nordeste. De acordo com os conceitos de

    regio-paisagem e regio-natural, apresentados por Corra (2000), o Norte de

    Minas visto como uma regio-serto, por apresentar baixa explorao

    econmica, aridez da vegetao e do clima (longos perodos de secas), baixa

    8A paisagem do cerrado caracterizada por apresentar terra calcinada, pelas secas espordicas,rios intermitentes e veredas de buritizais.

    Municpios rea (Km) Populao 2006 Densid. Demog.

    Bocaiva 3.233 45.349 14,03Gro Mogol 3.890 15.624 4,02Janaba 2.189 70.093 32,02Januria 6.691 62.516 9,34

    Montes Claros 3.582 348.991 97,43Pirapora 575 53.219 92,55Salinas 1.897 37.954 20,01

    Fonte: IBGE, 2007.

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    densidade demogrfica, concentrao fundiria e pobreza da populao

    (OLIVEIRA, 2000).

    A questo da seca que um fenmeno de natureza fsica, social e

    econmica foi uma das primeiras manifestaes governamentais sobre oproblema econmico9e sobre as disparidades regionais que se firmavam no pas.

    Desde a dcada de 1930, o governo federal incentivou o processo de

    industrializao da regio Sudeste, especialmente da cidade de So Paulo e Rio

    de Janeiro, criando no pas um centro econmico e financeiro desenvolvido

    (regio Sudeste) e uma periferia subdesenvolvida (regio Nordeste).

    A ocorrncia da seca, associada ao atraso econmico da regio Nordeste,

    que era considerada em mbito nacional uma regio problema, levou o GovernoFederal a criar em 1959, uma autarquia federal, a Superintendncia de

    Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), vinculada ao Ministrio da Integrao

    Nacional. Em 1965, a regio do Norte de Minas, por possuir caractersticas fsico-

    climticas e sociais semelhantes regio Nordeste e por fazer parte do chamado

    Polgono das Secas 10, foi incorporada SUDENE11como parte da rea Mineira

    da SUDENE, com a criao de seu Escritrio de Representao na cidade de

    Montes Claros.

    A SUDENE representou a primeira experincia de Planejamento Regional

    do pas. A principal ao prevista para alcanar o desenvolvimento das regies

    que a integram era fomentar o processo de industrializao atravs de incentivos

    9 Para combater seca, o governo federal criou o DNOCS (Departamento Nacional de ObrasContra a Seca) que visava prevenir, combater, ou pelo menos atenuar os efeitos da seca.

    10Faz parte do Polgono das Secas, as regies do Brasil que so castigadas pelo problema daseca, compreendendo reas semi-ridas que apresentam irregularidades pluviomtricas anuais. ONorte de Minas foi includo no polgono das secas em 1946.

    11A rea de atuao da SUDENE compreende os Estados da regio nordeste (Cear, Maranho,Piau, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Paraba, Sergipe, Alagoas, Bahia), 27 municpios doNorte do Esprito Santo e 165 municpios de Minas Gerais, (88) localizados no Norte de Minas, (54)no Vale do Jequitinhonha e (23) no Vale do Mucuri. A rea Mineira da SUDENE totaliza 201.246Km e uma populao de 2.590.080 habitantes, correspondendo a uma rea bem maior que osEstados de Sergipe, Alagoas e Paraba.

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    fiscais e financeiros para alavancar a economia, evitando assim a grande

    disparidade regional que se firmava no pas.

    A SUDENE nasceu num perodo de fortes discusses ideolgicas no Brasil,

    em que se definiam duas correntes desenvolvimentistas: uma delas visava aintegrao nacional,o fortalecimento do mercado interno, maior equidade social e

    regional; a outra tinha como intuito acelerar o crescimento econmicoatravs da

    industrializao que foi concentrada principalmente nas cidades de So Paulo e

    Rio de Janeiro.

    Verificou-se, ento, um certo atraso do estado de Minas Gerais em relao

    aos estados de So Paulo e Rio de Janeiro, o que levou o governo de Minas a

    concentrar recursos e investimentos em Belo Horizonte, onde se teria maiorretorno, para que a cidade pudesse competir com os mercados de So Paulo e

    Rio de Janeiro. O resultado disso foi o surgimento de uma grande desigualdade

    entre as regies do estado mineiro.

    Por outro lado, havia uma poltica de integrao econmica cuja estratgia

    do governo federal era integrar a economia Norte Mineira nacional, atravs da

    industrializao, modernizao agrcola (projetos agropecurios, reflorestamento e

    projetos de irrigao), melhoria da infra-estrutura e polticas sociais. Na dcada de1970, principalmente, o governo federal elaborou vrios planos, programas e

    projetos que viabilizaram tais propostas, que sero apresentados no item 3.1.

    1.1.3 - Um perfi l econmico de Montes Claros e do Norte de Minas

    A regio do Norte de Minas heterognea em relao sua economia epopulao. A base econmica da regio esteve at a dcada de 70, calcada na

    agropecuria (com destaque para a bovinocultura de corte) e, em menor

    proporo, nas atividades comerciais.

    O grfico 1 apresenta a diviso por setor econmico da regio Noroeste de

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    agropecuria indstria servios

    NM

    MG

    indstria16%

    servios39%

    agropec.45%

    indstria37%

    servios44%

    agropec.19%

    Minas12na dcada de 1970. O setor agropecurio contribuiu com 45% do PIB, o

    setor de servios (mais especificamente as atividades mercantis) com 39% do PIB

    e j as atividades industriais, ainda pouco expressivas pra a economia da regio,

    representou 16% do PIB. Comparando os dados do PIB do Noroeste de Minas

    com o do estado de Minas Gerais, percebe-se a relevncia das atividades ligadas

    agropecuria para a regio. No entanto, o setor industrial aparece bem atrs, o

    que esclarece que o seu processo de industrializao foi tardio em relao ao

    estado.

    Noroeste de Minas Minas Gerais

    GRFICO 1 - Distribuio do PIB por setor econmico da regio Noroeste de Minase do estado de Minas Gerais - 1970Fonte: grfico elaborado pela autora com base em dados da FJP - PIB, 1982.

    Apesar da importncia da agropecuria para a regio do Norte de Minas,

    preciso considerar que, de acordo com Oliveira (2000), ela esteve associada aos

    seguintes fatores: forma de ocupao e prtica extensiva com alta concentrao

    12 Esse grfico se refere regio Noroeste de Minas, e no regio do Norte de Minas, issoporque na dcada de 60, as regies de planejamento utilizadas pelo IBGE e pela FJP eramdiferentes da atual. A regio Noroeste de Minas inclua, alm da regio Oeste de Minas, parte dosmunicpios da atual regio do Norte de Minas, inclusive Montes Claros. A partir da dcada de 80,houve uma nova regionalizao desenvolvida pelo IBGE em que a Regio do Norte de Minas sedesvincula da regio Oeste e passa a apresentar a mesma delimitao da atual regionalizao.

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    Indst.35%

    Agr op.32%

    Servi.33% Servios

    45%

    Indstria41%

    Agropec14%

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    Agropec. Indstr ia Servios

    Indst.35%

    Agrop.32%

    Servi.33%

    de terra; distribuio de renda afetada pela posse da terra; rigidez das relaes

    sociais patriarcais com a submisso do empregado em relao ao patro;

    caractersticas geo-climticas desfavorveis, marcadas por longos perodos de

    seca; e uso de tcnicas agrcolas rudimentares. Alm da agropecuria, outras

    atividades do setor primrio so importantes para a economia do Norte de Minas,

    como o reflorestamento13e o carvoejamento14.

    A partir da dcada de 1970, com o advento da SUDENE, deu-se incio no

    Norte de Minas a chamada era da industrializao, quando se verificou um

    incremento das atividades industrias em detrimento das atividades do setor

    agropecurio, como aponta o grfico 2.

    GRFICO 2 - Distribuio do PIB por setor no Norte de Minas e em Minas Gerais -1985 e 1998Fonte: grfico elaborado pela autora com base em dados da FJP, 2000 e 2001.

    13

    Houve um aumento das empresas reflorestadoras na regio, a partir da dcada de 60, devidoaos seguintes fatos: proximidade com siderurgias na regio central, ligao ferroviria e rodoviriaaos centros consumidores, topografia favorvel, baixo preo das terras e abundncia de mo-de-obra a baixo custo.

    14O carvoejamento considerado uma atividade predatria, pois limita o efeito multiplicador local,utiliza mo-de-obra mal remunerada e se destina ao abastecimento de outras regies. Essasatividades geram tambm problemas ambientais como destruio pela queima da mata nativa docerrado e formao de macios de floretas artificiais, destruindo o banco biogentico e aprodutividade do solo.

    1985 1998

    Norte de Minas - 1985 Norte de Minas - 1998

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    De 1985 a 1998, o PIB da regio cresceu a taxas superiores as da

    economia brasileira e do Estado de Minas Gerais. Neste perodo, a taxa mdia

    anual de crescimento do PIB brasileiro foi de 2,28%, de Minas Gerais foi 2,45% e

    do Norte de Minas foi 3,70%.

    Analisando a tabela 1, percebe-se que h uma diferena em relao ao

    setor predominante da economia nos municpio da regio. V-se que o municpio

    de Gro Mogol tem 40% do PIB originado na agropecuria e apenas 3% na

    indstria. J o municpio de Bocaiva possui 82% do PIB concentrado na indstria

    e apenas 3% na agropecuria.

    TABELA 1

    Distribuio do PIB por setor de municpiosdo Nor te de Minas em 2000

    Apesar do incremento da atividade industrial no Norte de Minas, o processo

    de industrializao da regio no foi comum a todos os municpios da regio. A

    maior parte das indstrias se concentram apenas em quatro municpios: Montes

    Claros, Pirapora, Bocaiva e Vrzea da Palma (este pertencente microrregio

    de Pirapora).

    A SUDENE investiu nos mais diversos projetos: agrcolas, agroindustriais,agropecurios, de turismo, de telecomunicaes e de energia eltrica. Os

    municpios da Jaba, Janaba e Pirapora so os principais exemplos da

    modernizao agrcola na regio, viabilizada atravs da implantao dos projetos

    de irrigao do solo.

    Desde a implantao da SUDENE, foram aprovados, na rea Mineira da

    Municpios PIB Agropec. % PIB Indstria % PIB Servio %

    Bocaiva 3 82 15

    Gro Mogol 40 3 57

    Janaba 13 27 60

    Januria 13 13 74

    Montes Claros 3 53 44

    Pirapora 4 68 28

    Salinas 9 35 56

    Fonte: FJP, 2000.

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    SUDENE, 228 projetos nos diferentes setores, gerando 57.000 empregos diretos e

    225.256 empregos indiretos15. Os incentivos fiscais (iseno, reduo e

    reinvestimento do imposto de renda) e incentivos financeiros atravs do Fundo de

    Investimentos do Nordeste (FINOR) foram os instrumentos de poltica de

    desenvolvimento econmico, utilizados pela SUDENE.

    De acordo com dados do IGBE e FJP (censo 2000), a maior parte da

    populao dos municpios do Norte de Minas est ocupada em atividades do setor

    tercirio (comrcio e servios) e, em seguida, no setor primrio (especialmente na

    pecuria). A populao ocupada em atividades do setor secundrio tem maior

    expressividade nos municpios de Montes Claros, Pirapora, Bocaiva e Vrzea da

    Palma (que como j foi dito, so os mais industrializados da regio), entretanto,

    esse setor ocupa um menor nmero de pessoas quando comparado com o de

    servios.

    Uma anlise da evoluo da participao da Populao Economicamente

    Ativa (PEA) por setor, do municpio de Montes Claros, mostra que na dcada de

    60 (perodo anterior ao seu processo de industrializao), ela se concentrava

    predominantemente na agropecuria. Uma dcada depois, verifica-se um

    aumento da participao da PEA no setor industrial e, concomitantemente, nos

    servios, que foram ampliados e diversificados.

    GRFICO 3- PEA de Montes Claros dis tribuda por setor - 1960 e 1970Fonte: grfico elaborado pela autora com base em dados da FJP, 1982.

    Apesar de Montes Claros apresentar uma maior diversidade produtiva e o

    maior PIB da regio do Norte de Minas, sua distribuio de renda bastante

    15Dados fornecidos pelo escritrio da SUDENE, localizado em Montes Claros.

    Indstri6%

    Servio27%

    Agropec67%

    Agropec34%

    Indstria16%

    Servios50%

    1960 1970

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    desigual. Os 50% mais pobres da cidade possuem uma renda total de 12,20%, j

    os 10% mais ricos possuem 45,45% da renda (IBGE, 2000). Alm disso, 76% dos

    chefes de domiclios da cidade possuem rendimento de at3 salrios mnimos, o

    que demonstra o baixo poder aquisitivo e de consumo da populao.

    QUADRO 2

    Renda mensal do chefe de famlia de Montes Claros

    O PIB do setor de servios de Monte Claros passou de 44%, em 2000, para

    54%, em 2003, o que refora a tendncia de expanso do setor tercirio da

    cidade. Mas, preciso destacar que o setor secundrio tambm teve uma

    participao significativa (42% do PIB, em 2003). J o setor primrio (agricultura e

    pecuria) teve uma baixa participao no PIB municipal. Ainda em 2003, verificou-

    se que 69% da populao do municpio estava ocupada em atividades de

    comrcio e servios, 23% na indstria e 8% na agropecuria, como mostra o

    grfico 4.

    GRFICO 4 - PIB e populao ocupada por setor em Montes Claros em 2003Fonte: grfico elaborado pela autora com base em dados do IBGE/cidades.

    Fonte IBGE, 2000.

    Renda Mensal %

    At 1 SM 42,52

    De 1 a 3 SM 33,22

    De 3 a 5 SM 8,22

    D 5 a 10 SM 7,68Mais de 10 SM 4,92

    Sem rendimento 3,44

    Total 100

    Agropec4%

    Indstria42%

    Servios54%

    Servios69%

    Industria23%

    Agropec8%

    PIB Populao ocupada

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    0%

    5%

    10%

    15%

    20%

    25%

    30%

    35%

    40%

    Empresas

    AgropecuriaIndstrias de transformaoProd. e distrib. de eletricidade, gs e guaConstruoComrcioAlojamento e alimentaoTransporte, armazenagem e comunicaesIntermediao financeiraAtividades imobiliriasAdministrao pblicaEducaoSade e servios sociais

    Outros servios coletivos, sociais e pessoais

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

    70%

    Pessoal ocupado

    AgropecuriaIndstrias de transformaoConstruoComrcioAlojamento e alimentaoTransporte, armazenagem e comunicaesIntermediao financeiraAtividades imobiliriasAdministrao pblicaEducaoSade e servios sociais

    Outros servios coletivos, sociais e pessoais

    O grfico 5 mostra os principais ramos de atividades (classificao do

    IBGE) das empresas que atuaram em Montes Claros, no ano de 2003. A maior

    parte delas esto ligadas s atividades comerciais, que tambm o setor que

    possui maior nmero de pessoas ocupadas.

    GRFICO 5 - Empresas que atuaram em Montes Claros e pessoal ocupado poratividades em 2003Fonte: grfico elaborado pela autora com base em dados do IBGE/cidades.

    preciso considerar que o setor industrial e a administrao pblica

    tambm absorvem parte considervel da populao ocupada do municpio de

    Montes Claros. O setor tercirio da cidade tem se ampliado e diversificado cadavez mais, devido crescente demanda do parque industrial e presena de um

    mercado regional em expanso. Esse assunto que ser retomado no item 1.2.

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    1.1.4 - Crescimento x Desenvolvimento do Norte de Minas

    Segundo Oliveira (2000), existe uma distino entre crescimento e

    desenvolvimento econmico. O primeiro est associado s mudanas de carter

    quantitativo, como o aumento do PIB, j o segundo, implica em alteraes

    qualitativas, verificadas atravs de indicadores que expressam o aumento da

    qualidade de vida da populao (como o IDH), melhor distribuio da renda e

    maior acesso a servios bsicos. Para o autor, o desenvolvimento s possvel a

    partir da diversificao da prpria produo interna, que, no entanto, no

    suficiente para indicar padres de qualidade de vida.

    Uma anlise do IDH - ndice de Desenvolvimento Humano, que calculado

    pela mdia simples de trs sub-ndices, referentes s dimenses de Longevidade

    (IDH-L), Educao (IDH-E) e Renda (IDH-R)16, demonstra a precariedade das

    condies sociais da populao do Norte de Minas.

    QUADRO 3

    Evoluo do IDH de municpios do Norte de Minas

    em 1970, 1980, 1991 e 2000

    Fonte: IBGE e IPEA/IPEADATA.

    16De acordo com dados do IPEA, o sub-ndice do IDH relativo educao obtido a partir da taxade alfabetizao e da taxa bruta de freqncia escola; o sub-ndice do IDH relativo longevidade obtido a partir do indicador de esperana de vida ao nascer, j o sub-ndice do IDH relativo renda o ndice usado na funo da renda, normalizada com valores extremos. O IDH varia de 0(desenvolvimento nulo) a 1,0 (maior desenvolvimento humano), de acordo com a seguinteclassificao: o IDH de 0 a 0,5 indica um baixo desenvolvimento humano; de 0,5 a 0,8 indica ummdio desenvolvimento humano; e de 0,8 a 1,0 indica um alto desenvolvimento humano.

    Municpios 1970 1980 1991 2000

    Bocaiva 0,375 0,547 0,574 0,737

    Gro Mogol 0,256 0,425 0,505 0,672

    Janaba 0,293 0,534 0,578 0,715

    Januria 0,342 0,433 0,509 0,699

    Montes Claros 0,472 0,720 0,719 0,784

    Pirapora 0,436 0,684 0,704 0,758

    Salinas 0,309 0,443 0,515 0,699

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    Como mostra o quadro 3, houve um crescimento do IDH, em todos os

    municpios da regio, nas ltimas dcadas. O IDH do municpio de Montes Claros

    se manteve, desde 1970, o mais alto da regio. De acordo com dados do IPEA

    (2002), apenas 7,86% dos municpios do Norte de Minas possuem um IDH em

    torno de 0,700. Em 80,89% dos municpios da regio, o IDH mdio ficou em torno

    de 0,600, enquanto em 11,25%, esse indicador foi inferior a 0,500. Isto quer dizer

    que nenhum municpio do Norte de Minas, nem mesmo Montes Claros,

    apresentou um alto IDH (acima de 0,8).

    O Norte de Minas foi considerado pelo Governo de Minas Gerais uma

    regio fim do mundo, pelo fato de ser isolada, e tambm, uma regio

    problema, devido baixa taxa de crescimento econmico. A fragilidade do setor

    social refletiu no atraso do setor econmico e vice-versa.

    Muitas tm sido as explicaes para o subdesenvolvimento da regio.

    Segundo Rodrigues (2000), a causa do subdesenvolvimento advm dos seguintes

    fatores: intensificao das relaes capitalistas; base econmica da regio

    permaneceu estagnada, simples e pouco diversificada; baixa integrao e

    exportao de produtos de baixo valor agregado; baixo poder aquisitivo e pobreza

    da populao; alta concentrao de renda; e organizao social e poltica que

    reflete os traos paternalistas de uma estrutura social rgida.

    Para Oliveira (2000), uma das possveis explicaes est ligada ao

    acmulo de capital no Brasil e na regio. Com o desenvolvimento do capitalismo,

    a classe dominante local conseguiu acumular os meios de produo e no houve

    espao para a formao de um mercado interno regional e de uma classe operria

    combativa.

    O que se percebe que este quadro de subdesenvolvimento da regio doNorte de Minas no se alterou muito com o passar do tempo, pois, de acordo com

    o Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI) de Minas Gerais,

    elaborado pelo Conselho de Desenvolvimento Econmico e Social (CDES) que

    constituiu o plano estratgico do Governo do Estado de Minas Gerais para o

    perodo de 2003-2007, o estado caracterizado por um quadro de desigualdades

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    regionais, em relao aos aspectos scio-econmicos e condio de vida da

    populao das diversas regies do Estado.

    Dentre as diretrizes do PMDI, esto aquelas que prevem um maior

    investimento para a regio do Norte de Minas, juntamente com o Vale doJequitinhonha e Mucuri, que so as regies mais pobres do Estado. Essas regies

    apresentam uma defasagem em relao oferta de servios de infra-estrutura

    bsica (transportes, energia, telecomunicaes, saneamento), de equipamentos

    sociais e apresentam uma organizao produtiva ineficiente e baixa

    competitividade, o que acentua o crculo vicioso do subdesenvolvimento das

    condies de vida da populao.

    De acordo com o PMDI (2003), o PIB do Norte de Minas em comparaocom o PIB das demais regies do estado estava entre os quatro piores. A Regio

    Central, onde vivem 35% da populao do Estado (que inclui o municpio de Belo

    Horizonte e a regio metropolitana) participou praticamente com metade do PIB

    estadual (45,6%). No extremo oposto, a Regio Noroeste e o Vale do

    Jequitinhonha/Mucuri tiveram participaes inexpressivas no PIB. Tal situao foi

    semelhante para o Norte de Minas que teve uma participao de 4,7% no PIB

    estadual.

    Apesar de ter sido registrado, nos ltimos anos, melhorias em relao aos

    indicadores scio-econmicos de tais regies, as mudanas no foram suficientes

    para reverter o quadro de desigualdade regional que se firma no estado. O

    analfabetismo e a mortalidade infantil, variveis que compem o IDH, ilustram a

    clivagem observada no sentido noroeste-sudeste do Estado, sendo possvel divid-

    lo em duas regies, por uma linha imaginria em formato de hiprbole. Acima

    dessa linha esto os municpios dos Vales do Jequitinhonha/Mucuri e da regio do

    Norte de Minas, que apresentam os piores indicadores de analfabetismo e de

    mortalidade infantil do Estado, que, aliados baixa renda per capita,originam um

    contrastante mapa de IDH (FIG. 7).

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    FIGURA 7 Mapa do IDH dos municpios mineirosFonte: MINAS GERAIS / CDES, 2003-2007 (base de dados IPEA)

    O PMDI foca a importncia de se criar um projeto que reconhea a situao

    de desigualdade entre as regies do Estado, implementando polticas regionais

    estruturadoras nos Vales do Jequitinhonha/Mucuri e no Norte de Minas,

    viabilizando a concretizao de uma rede de cidades mdias capazes de

    concorrer com a Regio Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), bem como,

    incentivar o desenvolvimento de arranjos produtivos que valorizem o capital social.Essa estratgia do Governo de Minas se reafirma tambm na atual gesto.

    De acordo com dados do escritrio da SUDENE (localizado em Montes

    Claros), a maior parte dos indicadores sociais da regio do Norte de Minas

    registrou uma significativa melhoria. De 1960 a 1999, a taxa de analfabetismo caiu

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    50,4%; a expectativa de vida ao nascer apresentou um incremento de 48,9%, a

    taxa de mortalidade infantil reduziu-se em 50,2% e o IDH apresentou variao de

    103,2% (enquanto que o IDH do pas cresceu 68% no mesmo perodo).

    Embora a SUDENE tenha exercido um importante papel, como agentetransformador da estrutura scio-econmica do Norte de Minas, e proporcionado

    uma melhoria dos indicadores scio-econmicos, ela no conseguiu reverter o

    quadro de subdesenvolvimento da regio, que apresenta ainda um relativo atraso

    e pobreza em relao s regies mais desenvolvidas do estado de Minas Gerais,

    como aponta o prprio PMDI (2003). Para Rodrigues (2000), a atuao da

    SUDENE contribuiu ainda mais para intensificar as desigualdades intra-regionais,

    com a estimulao da expanso capitalista na regio.

    Os dados scio-econmicos aqui apresentados levam a concluir que h

    grandes desigualdades entre os municpios da regio do Norte de Minas, sendo

    que Montes Claros apresenta um grau de desenvolvimento superior aos demais.

    O item seguinte apresentar os principais fatores ou atores sociais que

    contriburam para que Montes Claros adquirisse, ao longo do seu processo de

    formao, uma posio central no Norte de Minas, tornando-se um plo regional.

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    1.2 O FENMENO URBANO E AS TRANSFORMAES DE MONTESCLAROS

    Neste item, procura-se inicialmente apropriar-se do conhecimento tericosobre o processo de urbanizao das cidades que resulta na formao de uma

    sociedade urbano-industrial. Posteriormente, desenvolve-se uma reflexo crtica

    das principais transformaes econmicas ocorridas na cidade de Montes Claros,

    no cenrio urbano-regional, atravs de um eixo espao-temporal, baseado em

    Lefebvre (1999) - da cidade agrria cidade plo de servios - e identifica-se, ao

    longo deste eixo, os principais atores sociais ou agentes responsveis por

    engendrar este processo.

    1.2.1 - Um breve histrico: da polis ao urbano

    Lefebvre (1999), para explicar o fenmeno urbano e a formao da

    sociedade urbana, traa um eixo espao-temporal, iniciando-se do 0%, que

    representa a ausncia de urbanizao, ou seja, a vida no campo, ao 100%, que serefere ao processo de urbanizao. Ao longo desse eixo, ele posiciona, de forma

    evolutiva: a Cidade Poltica, a Cidade Mercantil, a Cidade Industrial e o Urbano.

    Lefebvre chama a ateno para alguns fenmenos que ocorrem ao longo deste

    eixo espao-temporal:

    0%_______________________________________________________________100%

    1. Inflexo do agrrio para o urbano.

    2. Imploso-exploso das cidades: concentrao urbana, xodo rural, extenso do

    tecido urbano, subordinao completa do agrrio ao urbano.

    3. Zona crtica: problemtica urbana, fruto do processo de urbanizao e da

    formao de uma sociedade urbana.

    Cidade Poltica - Cidade Mercanti l - 1 - Cidade Indust rial - 2 - Urbano - 3

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    O eixo apresentado por Lefebvre merece ser melhor analisado para se

    compreender os desgnios e complexidades que abarcam o processo de formao

    das cidades. Lefebvre designa por Cidade Poltica, a polis grega, (cidade

    oriental e arcaica greco-romana), que se caracterizava pela ordem, poder e vida

    social organizada. A Cidade Poltica exerceu seu domnio sobre o campo, a

    partir de um controle poltico.

    No sculo XIV, com o crescimento do comrcio e das relaes de troca,

    que at ento eram excludas da centralidade da Cidade Poltica, houve um

    fortalecimento dos "faubourgs"17 e da praa de mercado, que passou a ser

    essencial e central, substituindo a gora, praa de reunies e de encontros da

    cidade grega. A libertao das cidades do domnio feudal e o surgimento de uma

    classe de comerciantes e banqueiros fizeram eclodir na Europa, a Revoluo

    Comercial.

    Nesse contexto, Lefebvre (1999) chama a ateno para o surgimento da

    Cidade Mercantil ou Comercial, que nasce como smbolo do capital comercial e

    da conquista dos mercadores. A Cidade Mercantil exerceu um domnio sobre o

    campo, explorando-o a partir de uma rede de monoplios. As relaes

    econmicas entre campo e cidade se davam pelo excedente ou mais-produto

    extrado do campo, mas controlado pela cidade; concomitantemente, o campo se

    opunha a essa relao de explorao devido a sua superioridade produtiva18.

    Para Lefebvre, a Cidade Industrial surge, a partir da Revoluo Industrial,

    no final do sculo XVIII. A Cidade Industrial torna-se uma ameaa cidade

    poltico-mercantil, que sofreu significativas transformaes com a entrada da

    produo industrial, reunindo capital, trabalho, meios de produo e mercado. As

    fbricas atraam para as cidades um grande fluxo migratrio de pessoas que

    representavam mo-de-obra e consumo, indispensvel circulao do capital

    17 Os Faubourgs, que quer dizer, falsos burgos, eram centros de artesanato e comrcio queexistiam fora das muralhas da cidade medieval.

    18Neste ponto vale a pena ressaltar a viso de Monte-Mr (2006) que, apoiado em Jane Jacobs(1969) e Soja (2000), afirma que a cidade sempre foi mais produtiva do que o campo, o quegarantiu de fato seu domnio, sendo que muitas vezes ela produziu o seu espao rural aposteriori.

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    industrial.

    Segundo Singer (1973), a industrializao no representou apenas uma

    mudana das tcnicas e da diversidade da produo, mas, tambm, uma

    expanso da diviso social do trabalho, com especializao de atividades,abrangendo cidade e campo numa economia mundial, o que foi possvel atravs

    da expanso das fronteiras polticas e dos transportes.

    De acordo com Lefebvre (1999), na passagem da Cidade Mercantil

    Cidade Industrial ocorreu uma inflexo agrrio-urbana onde o campo perde sua

    primazia em relao cidade, subordinando-se a ela, devido realizao de sua

    produo nos mercados da cidade. A partir dessa nova realidade urbana, a cidade

    torna-se a centralidade poltica e mercantil da comunidade, onde se renem leis,instituies, religio, cultura, monumentos e mercado; e o campo surge como seu

    espao produtivo, mas subordinado e circundante.

    A cidade e campo, elementos scio-espaciais opostos e complementares,

    constituem, nas suas essncias, a centralidade e a periferia do poder na

    organizao moderna (MONTE-MR, 2005: 18). Para Singer (1973), seguindo

    Marx, a diviso social do trabalho entre campo e cidade a separao do trabalho

    material do intelectual.A dade campo-cidade um contexto importante para se entender a

    formao do espao e da sociedade urbana. Com a expanso urbana das cidades

    sobre o campo e, virtualmente, sobre o espao regional e nacional, a relao

    rural-urbana, ou urbana-rural, como prope Soja (2000)19, torna-se cada vez mais

    complexa: onde termina o espao urbano e comea o rural?

    De acordo com Milton Santos (1993), em decorrncia do transbordamento

    da cidade sobre o campo, o urbano e o rural devem ser analisados como um

    19 Soja (2000), prope que a cidade precede o campo assim como a Revoluo Urbana foiprecedida ou acompanhada da Revoluo Agrcola no perodo Neoltico. Para o autor, a foramotora que impulsionou o desenvolvimento dos aglomerados urbanos no foi a agricultura, comose pensava, at porque a sedentarizao era essencial para a vida agrria. Dessa forma, osprimeiros aglomerados urbanos foram formados por caadores, comerciantes, pastores e foi odesenvolvimento destas pequenas vilas, ligadas pelas atividades e trocas comerciais (alimentos,ferramentas, utenslios), que levaram consolidao de uma sociedade urbana agrria.

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    contnuo. Para o autor, a velha dicotomia urbano/rural vem sendo substituda pelo

    binmio urbano/agrcola, pois, regies agrcolas (e no rurais) contm cidades e

    as regies urbanas contm atividades rurais.

    Para Lefebvre (1999: 17), o tecido urbana prolifera, estende-se, corri osresduos de vida agrria. Segundo o autor, o tecido urbano no uma metfora

    clara, ou seja, mais que um tecido jogado sobre o territrio, uma rede de malhas

    desiguais, que no se limita sua morfologia, sendo o suporte da produo social

    do espao e do modo de viver de uma sociedade urbana. A sociedade urbana,

    segundo Lefebvre, aquela que nasce da industrializao, constituda pelo

    processo que domina e absorve a produo agrcola. Para o autor, a sociedade

    urbana se relaciona a um objeto virtual20.

    Monte-Mr, com base em Lefebvre, desenvolveu o conceito de urbanizao

    extensiva, que diz respeito ao transbordamento da cidade sobre o seu entorno,

    gerando e integrando diversas centralidades e periferias, e extenso das

    condies gerais de produo (capitalista) que se estendem ao longo das rodovias

    e sistemas de comunicao e energia cobrindo virtualmenteo territrio regional e

    nacional, carregando consigo, em maior ou menor grau, os servios urbanos e

    sociais requeridos pela sociedade contempornea.

    A urbanizao extensiva significa, tambm, para Monte-Mr (2005), a

    extenso da prxis urbana, tal como definida por Lefebvre (1999), ao espao

    total, onde o tecido urbano carrega consigo o germe da polis (poltica) e da

    civitas (cidadania) representando, portanto, a politizao de todo o espao social.

    Ainda nesse contexto, possvel falar do duplo processo de imploso-

    exploso designado por Lefebvre (1999). Simultaneamente, a cidade cresce

    sobre si mesma e sobre suacentralidade

    , com a concentrao de servios,pessoas e riquezas nas suas reas centrais e, por outro lado, h um

    20De acordo com Lefebvre (1999), o termo virtual se refere ao presente enquanto potencialidade ase concretizar. A sociedade urbana um objeto virtual, ou seja, possvel, que se relaciona a umprocesso (mediato) e uma prxis social. Assim, a sociedade urbana resulta de uma urbanizaocompleta, hoje virtual, amanh real. Dessa forma, para se formar uma sociedade urbana precisoromper os obstculos do impossvel.

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    transbordamento das cidades com a expanso do seu tecido urbano em direo

    ao campo, o que contribui para a formao de subrbios e bairros-jardins, que

    consistem em espaos de transio entre campo e cidade.

    A expanso do tecido urbano para alm dos limites das cidades representao deslocamento das classes de baixo poder aquisitivo, das reas centrais, em

    direo periferia, num processo de periferizao, como tambm, em diferentes

    tempos e sociedades, o deslocamento para a periferia das populaes ricas em

    busca de qualidade de vida e privacidade, optando por residir em loteamentos

    residncias horizontais fechados (condomnios fechados).

    Por fim, a "zona crtica" refere-se s transformaes ocorridas na sociedade

    urbana, na passagem do perodo industrial ao urbano. Essa zona crtica podeser comparada a um "campo cego" (LEFEBVRE, 1999). O campo refere-se ao

    espao de foras e conflitos, e o adjetivo cego tem o sentido de obscuro, ou seja,

    do olhar que no consegue enxergar um novo espao em construo (o urbano).

    A zona crtica resultado dos problemas oriundos do prprio processo de

    industrializao e expanso urbana que embarca as cidades e reflete a

    instabilidade da sociedade urbano-industrial diante do urbano.

    Percebe-se, portanto, que a passagem da polispara o urbano, foi marcadapor uma srie de transformaes sociais, polticas, ideolgicas e econmicas, que

    se refletiram diretamente nas relaes scio-espaciais.

    1.2.2 - Montes Claros: da cidade agrria cidade plo de serv