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FIBRA DE CARBONO EM CARROÇARIAS 1 1 A fibra de carbono é um produto de engenharia especialmente desenvolvido no campo dos materiais compostos, que se caracteriza pela sua alta qualidade, baixa densidade, assim como grande resistência mecânica e durabilidade Foi o material escolhido para os chassis e para as carroçarias dos carros de Fórmula 1, exactamente devido a estas qualidades, cuja conjunção é extremamente rara. Estando mais do que comprovado, este material é pretendido desde muito pela indústria automóvel, para uma utilização mais ampla em carros de utilização corrente. Até ao momento, o custo de produção relativamente elevado tem atrasado o processo, mas a força da razão acaba por vencer e a fibra de carbono está finalmente a chegar ao consumidor final. Com efeito, desde 2010 que um número crescente de construtores está a utilizar a fibra de carbono em peças da carroçaria, dentro da sua estratégia global de tornar os carros mais leves e mais eficientes do ponto de vista energético. Como é lógico, quanto maior for a escala de produção do material, maiores reduções de custos se poderão obter. Enquanto isso não alcança o limiar da rentabilidade padrão da indústria automóvel, o uso da fibra de carbono está ainda limitado, sendo mais evidente o avanço nos veículos eléctricos, como forma de aumentar a sua autonomia, um dos grandes obstáculos à vulgarização do conceito de mobilidade eléctrica. De facto, um carro fabricado com materiais compostos pode pesar menos 40% do que outro construído com materiais convencionais, o que faz toda a diferença, em termos de eficiência energética. Pioneiros em 1879, o célebre inventor da lâmpada Thomas Edison tinha realizado algumas experiências com filamentos de carbono, a fim de testar o seu uso no fabrico de lâmpadas. muito mais recentemente, em 1958, é que estudos mais consistentes permitiram demonstrar a excepcional resistência à tracção de muitos fios de carbono unidos em forma de cordão. Desde logo, o nome fibra de carbono marcou as

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FIBRA DE CARBONOEM CARROÇARIAS

1 1 A fibra de carbono é um produto de engenharia especialmente desenvolvido no campo dos

materiais compostos, que se caracteriza pela sua alta qualidade, baixa densidade, assim como granderesistência mecânica e durabilidade

Foio material escolhido para os chassis e

para as carroçarias dos carros de

Fórmula 1, exactamente devido a estas

qualidades, cuja conjunção é extremamente

rara. Estando mais do que comprovado, este

material é pretendido desde há muito pela

indústria automóvel, para uma utilização

mais ampla em carros de utilização corrente.

Até ao momento, o custo de produção

relativamente elevado tem atrasado o

processo, mas a força da razão acaba por

vencer e a fibra de carbono está finalmente a

chegar ao consumidor final.

Com efeito, desde 2010 que um número

crescente de construtores está a utilizar a

fibra de carbono em peças da carroçaria,

dentro da sua estratégia global de tornar os

carros mais leves e mais eficientes do pontode vista energético. Como é lógico, quantomaior for a escala de produção do material,

maiores reduções de custos se poderãoobter. Enquanto isso não alcança o limiar da

rentabilidade padrão da indústria

automóvel, o uso da fibra de carbono está

ainda limitado, sendo mais evidente o

avanço nos veículos eléctricos, como forma

de aumentar a sua autonomia, um dos

grandes obstáculos à vulgarização do

conceito de mobilidade eléctrica. De facto,

um carro fabricado com materiais

compostos pode pesar menos 40% do queoutro construído com materiais

convencionais, o que faz toda a diferença,

em termos de eficiência energética.

PioneirosJá em 1879, o célebre inventor da lâmpadaThomas Edison tinha realizado algumas

experiências com filamentos de carbono, a

fim de testar o seu uso no fabrico de

lâmpadas. Só muito mais recentemente, em

1958, é que estudos mais consistentes

permitiram demonstrar a excepcional

resistência à tracção de muitos fios de

carbono unidos em forma de cordão. Desde

logo, o nome fibra de carbono marcou as

investigações. Sendo um material inovador e

de características fora do habitual, o seu valor

estratégico foi reconhecido por especialistas

em soluções militares, tendo a sua aplicação

começado nos anos 60 no fabrico de aviões,

barcos e satélites, entre outros, por iniciativa

do Ministério da Defesa britânico. Na

realidade, a fibra de carbono é em termos

comparativos mais forte e mais resistente do

que o aço, mais leve do que o alumínio e tão

rígido como o titânio.

O que é afinal?Como já referimos, a fibra de carbono é um

produto de engenharia, apresentando uma

morfologia fibrosa, que resulta de um teor de

filamentos de carbono nunca inferior a 92%.

Esses fios são obtidos a partir de produtos

derivados do petróleo, entre os quais se

podem referir o breu de alcatrão de hulha,

resinas fenólicas, poliacrinolitrilo, rayon, etc.

Só este facto deveria inspirar uma utilização

mais consequente dos produtos petrolíferos,

mas parece que a evidência ainda não

chegou às mentes efetivamente decisoras.

À matéria prima com que se realiza a fibra de

carbono, dá-se o nome de precursor, o quefaz todo o sentido. De seguida, o processo de

fabrico consiste em submeter o precursor a

vários tratamentos por etapas (estabilização,

carbonização, grafitação), recebendo no final

um tratamento de superfície, durante o qual

é aplicado um produto que garante a adesão

da resina, o outro constituinte principal do

material.

Estes processos podem demorar semanas ou

meses, obtendo-se uma fibra composta porfilamentos de carbono, chamados mechas,

de 5-10 micros entrançados. Continuando o

processo de tecelagem, obtêm-se fios com

5.000 a 400.000 filamentos, denominados

roving. De qualquer modo, destas etapas

todas, cujo custo deriva da utilização de

energia, resultam vários tipos de fibras de

carbono:

- Fibras de alta resistência;

- Fibras de módulo intermédio e

- Fibras de alto módulo, ou grafite.

Partindo dos fios de fibra de carbono ou

roving, podem ser entretecidas diversas telas

ou malhas, cuja orientação ditará a sua

resistência numa determinada direção ou em

todas as direções. Os melhores resultados são

obtidos quando as fibras são entretecidas

contando com as direções das forças queterão que suportar. Ê por essa razão que

podem aguentar impactos de muitas

toneladas deformando-se minimamente,

uma vez que as forças do choque são

distribuídas uniformemente e amortecidas

pela malha.

Materiais compostosA fibra de carbono por si tem reduzida ou

nula utilidade, sendo utilizada para reforço

de outros materiais, entre os quais as

resinas e os endurecedores ou

catalisadores, que operam a polimerizaçãoda resina. No final, obtém-se um material

chamado CFRP (plástico reforçado com

fibra de carbono, em português), que se

caracteriza, como já vimos, por alta

qualidade, baixa densidade, boa rigidez e

grande durabilidade e resistência.

Nos materiais compostos, há dois

elementos fundamentais a distinguir:- A matriz, que se apresenta em fase

contínua, atuando como ligante, a resina;

- O reforço, em base descontínua, queconstitui o elemento resistente ou fibra.

Além destes constituintes básicos, são

ainda adicionadas cargas e aditivos ao

material, que contribuem para obter a

solução final, incluindo obviamente uma

determinada coloração, de acordo com a

aplicação que será dada a esse material.

No automóvel, os compostos mais

avançados são utilizados nas peçasestruturais. Os mais habituais são os de

matriz orgânica do tipo resinas, com

reforços em forma de fibras. Os dois

materiais formam um conjunto de alta

coesão, que resiste à ruptura e aos agentes

químicos mais comuns.

Nos materiais de altas prestações são

utilizadas matrizes termo estáveis, que se

obtêm a partir de polímeros líquidos ou

semi líquidos, os quais endurecem

irreversivelmente ao polimerizar no final

do processo. A resina líquida converte-se

num sólido duro, com cadeias moleculares

entrecruzadas e estáveis.

A matriz mais utilizada é a resina epoxy,uma classe de polímero termo estável quese endurece com um catalisador e não se

pode voltar a fundir. Tem grande dureza,

excelente aderência, resiste à temperatura,à corrosão e aos agentes atmosféricos e

químicos habituais. O material final é

identificado pela sigla EP-FC (resina epoxyreforçada com fibra de carbono).

Técnicas de fabricoPara fabricar peças em fibra de carbono ou

qualquer outro material compósito, podem

ser utilizados diversos sistemas,

começando pelo mais artesanal, isto é, a

moldagem manual. Este processo consiste

em revestir o molde com a tela ou malha

de reforço e aplicar seguidamente as

resinas de baixa ou média viscosidade, com

um rolo ou uma brocha. Depois das fibras

estarem bem impregnadas, resta aguardar

pela reação química da resina, para esta

endurecer. No final, regulariza-se a

superfície com um disco abrasivo de corte,

a fim de preparar o terreno para aplicaçãodos produtos de pintura.Nos processos industriais, há grandevariedade de sistemas, dependendo da

quantidade de peças pretendidas e da sua

configuração.

O sistema mais económico é a pultrusão,

um método de produção contínuo,

automático e de alto volume. As fibras

impregnadas com resina são movidas a

uma velocidade constante, de modo a

obter um produto de secção pre-

determinada, geralmente placas de

diversas dimensões. Estas são

posteriormente cortadas em peças mais

pequenas, de acordo com a utilização

pretendida.Outro processo de produção muito usado

é a infusão (Fig. 1). Com este método,

podem obter-se peças de vários formatos.

Para favorecer e tornar mais rápida a

impregnação das fibras pela resina,

geralmente termo estáveis de baixa

viscosidade, é utilizado o vácuo, que retira

o ar do interior da peça.Os materiais pré-impregnados são ideais

para os processos de moldagem de peças

de várias formas, podendo a produção ser

efectuada à unidade ou de modo contínuo,

em grande série (Fig 2). A base do processo

são semi produtos laminados (fibras+resina),

ainda no estado flexível e inicial da

polimerização. Para permitir a moldagemdas peças, a resina é do tipo termo

endurecível, polimerizando apenas depoisda peça estar pronta, com um aquecimentoda ordem dos 140° C.

Outra das técnicas mais utilizadas para

produzir peças de materiais compostosconsiste na utilização de estruturas tipoSandwich. Como a denominação sugere,

neste processo é utilizado um material

como núcleo (aramida, alumínio, balsa, PVC,

cortiça, etc), que pode ter a forma de favos

de abelha (estrutura que combina a máxima

rigidez com o mínimo peso), sendo de

seguida aplicado um revestimento de fibra

de carbono de ambos os lados. O resultado

é uma peça muito leve, mas de elevada

rigidez e resistência a impactos. Este

método é utilizado, por exemplo, nos

chassis de carros de F 1e outros modelos

desportivos de alto rendimento.

Recapitulando:Sabendo como são produzidas as peças de

fibras de carbono, convém agora fazer uma

síntese das respectivas propriedades:

• Baixa densidade e peso mínimo;

• Excelente tenacidade (mantém as

características iniciais inalteráveis);

• Resistência à corrosão e ao envelhecimento

(não degradável);

• Boas propriedades anti estáticas e de

isolamento elétrico;

• Alta resistência a ácidos, substâncias

alcalinas e a alguns dissolventes;

• Boa resistência à combustão (ignífuga);

• Alta resistência a impactos;

• Elevado módulo de elasticidade;

• Elevada resistência à fadiga;

• Grande flexibilidade (com um forma

adequada, a fibra de carbono podesubstituir muito vantajosamente o aço nas

molas helicoidais ou de lâminas);

• Sem manutenção;• Fácil de reparar;• Etc.

Este conjunto de características torna a fibra

de carbono muito útil em praticamente todas

as indústrias. No caso da indústria automóvel,

a carroçaria e muitas outras peças poderiam

ser fabricadas integralmente em fibra de

carbono, resolvido o problema ainda em

aberto dos custos de produção, embora a

relação custo/benefício seja já muito

favorável, porque não há custos diferidos ou

são muito reduzidos.

Fibra de carbono em veículosO melhor certificado de qualidade da fibra de

carbono para a indústria automóvel é a sua

muito larga utilização na Fórmula 1. Essa

opção garante níveis muito elevados de

eficiência energética, de eficiência dinâmica e

de segurança ativa e passiva. Há também a

considerar os menores custos de

manutenção das equipas de Fl. Não será pois

de estranhar que hoje em dia muitos

modelos desportivos recorram em grandemedida à fibra de carbono, o mesmo

acontecendo com as motos e com as

bicicletas. Nos veículos de grande série, tanto

em carros de passageiros, como em

comerciais ligeiros e veículos industriais, são

já inúmeras as peças em fibra de carbono,

embora passem despercebidas, porque não

estão obviamente identificadas. Depois de

pintada, uma peça de metal, plástico ou fibra

de carbono tem exatamente o mesmo

aspecto exterior.

Um dos construtores que apostou forte na

fibra de carbono foi a BMW, cuja clientela é

especialmente receptiva aos argumentos de

que as vantagens compensam largamente o

custo, sem esquecer a imagem de marca

exclusiva. A fibra de carbono está presente

em menor ou maior grau em todos os

modelos atuais da BMW e a marca fabrica já

modelos eléctricos com a carroçaria

totalmente em fibra de carbono (Fig. 3). Em

2013, a BMW terá já uma unidade de

produção específica para o fabrico de

carroçarias de fibra de carbono em larga

escala.

ReparabilidadeSe a fibra de carbono tivesse muitas

vantagens, mas fosse muito difícil de reparar

nunca seria uma opção, porque o risco de

colisão em veículos é uma quase

inevitabilidade. Mas estamos justamente no

caso oposto, ou seja, a fibra de carbono sofre

menos danos, tem menos manutenção e é

mais fácil de reparar (Fig. 4).

O centro de investigação automóvel

CESVIMAP é uma das entidades que tem

acompanhado de perto os processos de

reparação de fibra de carbono, mantendo

um labor de investigação constante em

peças como os pára-choques, tampas do

compartimento do motor (capot), tectos de

automóveis, carenagens de motos e quadros

de bicicletas.

Os danos possíveis estão classificados em

riscos superficiais, fissuras no material e faltas

de material, tendo os técnicos da CESVIMAP

desenvolvido técnicas e processos de

reparação adequados a cada caso, tendo em

vista uma reparação de alta qualidade (Fig. 5).

No seu modelo eléctrico Í3, a BMW utilizou o alumínio para o módulo da carroçaria,

denominado "Drive" Entretanto, o construtor testou uma versão do mesmo

módulo em fibra de carbono ("Life") e os resultados foram mais do que concludentes,

a favor da última versão: menor peso, maior autonomia, melhores prestações, maior

resistência estrutural, melhor comportamento dinâmico e maior segurança.

O estudo da reparabilidade de carroçarias em fibra de carbono passanaturalmente pela realização de testes, a fim de avaliar a extensão dos danos porefeitos de forças de choque e/ou pressão. Na imagem, vemos uma carroçaria de

fibra de carbono a ser submetida a um teste de colisão lateral simulada.

Nestas imagens,

vemos a sequênciade reparação de um

quadro de bicicleta

em fibra de carbono,

com falta de material

no garfo frontal.

O processo de

reparação inclui as

fases de preparaçãoda superfície, para

posterior aplicação

de reforço e resina.

Após a secagem da

resina, a superfícieé lixada e o quadro

pode ser pintadonovamente.