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FICHA PARA IDENTIFICAÇÃO

PRODUÇÃO DIDÁTICO – PEDAGÓGICA

TURMA – PDE/2012

Título: O Conto como estratégia de incentivo à leitura.

Autor Maria Aparecida Dallabona

Disciplina/Área Língua Portuguesa / Ensino e Aprendizagem de Leitura

Escola de Implementação do Projeto e sua localização

Colégio Estadual “General Carneiro”

Município da escola Lapa

Núcleo Regional de Educação

Área Metropolitana Sul

Professor Orientador

Professor Doutor Ubirajara Inácio de Araújo

Instituição de Ensino Superior

Universidade Federal do Paraná

Relação Interdisciplinar

Resumo

Esta unidade didática foi construída pensando

nos professores de língua portuguesa, na tentativa de

contribuir para o desenvolvimento de práticas de leituras

significativas para os alunos, possibilitando-lhes o

aprimoramento de seus conhecimentos linguísticos e

discursivos, para que compreendam os discursos que os

cercam, com condições de interagir com eles,

percebendo as diversas vozes que os compõem,

conscientes de que cada ‘palavra revela-se, no momento

de sua expressão, como produto de relação viva das

forças sociais’. Apresenta-se um conjunto de atividades a

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serem desenvolvidas, dentro e fora da escola, para

oportunizar aos alunos a percepção de detalhes que

façam a diferença na sua apropriação dos textos,

aproximando-os da leitura de fruição, buscando contribuir

para a sua formação enquanto leitores eficazes.

Serão trabalhados os contos “Madrugada”, de

Orígenes Lessa e “Biruta” de Lygia Fagundes Telles. As

atividades referem-se ao ensino e aprendizagem da

leitura e o público objeto da intervenção será o aluno do

6.º ano do Ensino Fundamental.

Palavras-chave Leitura; conto; fruição

Formato do Material Didático

Unidade didática

Público Alvo

Alunos do 6.º ano do Colégio Estadual “General Carneiro” da Lapa.

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UNIDADE DIDÁTICA

O CONTO COMO ESTRATÉGIA DE INCENTIVO À LEITURA

APRESENTAÇÃO

O terceiro milênio trouxe mudanças significativas para a nossa

sociedade, ocasionadas pelos avanços tecnológicos, que se tornaram parte do

nossos espaços cotidianos, inserindo-nos em uma sociedade onde a

disseminação de conhecimentos, da arte, da informação ocorre ao tempo de um

clique, de uma acesso à rede. Essas produções chegam-nos de todas as formas,

por meio das diversas mídias que se conjugam permitindo mais acessibilidade e

usabilidade.

Entretanto, apesar do exposto, ainda nos deparamos com o fracasso,

acumulado há décadas, em relação à apropriação da língua materna pelos alunos.

O que fazer? Como reverter esse quadro?

Essas são perguntas que povoam as mentes dos professores de Língua

Portuguesa, diretamente envolvidos nesse processo. Geraldi, desde19851, aponta,

como resposta a esses questionamentos, para uma abordagem centrada nas

unidades básicas do ensino de português – leitura, produção textual e análise

linguística, que tendo por base o texto, deixe definitivamente o espaço do papel e

assuma sua posição de relevância no espaço da escola, na práxis dos professores.

Assim, esta unidade didática foi construída pensando nos professores de

língua portuguesa, na tentativa de contribuir para o desenvolvimento de práticas de

leituras significativas para os alunos, possibilitando-lhes o aprimoramento de seus

conhecimentos linguísticos e discursivos, para que compreendam os discursos que

os cercam, com condições de interagir com eles, percebendo as diversas vozes que

1 GERALDI, João Wanderlei (org.) Unidades básicas do ensino do português. In: O texto na sala de aula: Leitura e produção. 2. ed., Cascavel: Assoeste, 1985.

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os compõem, conscientes de que cada “palavra revela-se, no momento de sua

expressão, como produto de relação viva das forças sociais” (BAKHTIN/

VOLOCHINOV, 1999, p. 66)

A LEITURA E A ESCOLA

Introdução

O meu leitor não é o que me lê. É o que me relê (caso exista). Um autor lido unicamente uma vez não tem leitores, por mais retumbante que seja o seu sucesso.( Lêdo Ivo)

Esta unidade didática foi elaborada com o intuito de auxiliar os professores

de Língua Portuguesa da Rede Pública Estadual em seu trabalho com a leitura, em

sala de aula.

Ela apresenta um conjunto de atividades a serem desenvolvidas, dentro e

fora da escola, para oportunizar aos alunos a percepção de detalhes que façam a

diferença na sua apropriação dos textos, aproximando-os da leitura de fruição,

buscando contribuir para a sua formação como leitores eficazes.

Espero que sirva, também, de estímulo aos demais professores de Língua

Portuguesa para a criação de suas próprias propostas de trabalho com a leitura e

com a literatura, prazerosas e significativas.

Assim, para o desenvolvimento das atividades aqui propostas, é importante

que façamos algumas reflexões sobre leitura e a diversidade de concepções que se

apresentam sobre ela, tendo em vista ser este o foco desta unidade, para, em

seguida, apresentarmos orientações metodológicas para sua realização.

Falando sobre leitura...

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Cremos que o primeiro passo para o trabalho desenvolvido com a leitura em

sala de aula é percebê-la

[...] como um ato dialógico, interlocutivo, que envolve demandas sociais, históricas, políticas, econômicas, pedagógicas e ideológicas de determinado momento. Ao ler, o indivíduo busca as suas experiências, os seus conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as várias vozes que o constituem (DIRETRIZES CURRICULARES DO PARANÁ, 2008, 56 )

Nesse sentido, os exercícios de leitura devem propiciar aos alunos

condições para que possam, de forma permanente e autônoma, localizar a nova

informação, pela leitura do mundo. Essa ação fundamenta-se no diálogo,

convocando o leitor a participar na elaboração dos significados do texto, a partir de

sua experiência de vida, de sua leitura de mundo.

Assim, para a leitura de um texto, é necessário mais que o compartilhamento

entre os interlocutores, no qual o leitor precisa mobilizar várias estratégias

linguísticas e cognitivo-discursivas, para levantar, validar ou não as hipóteses

formuladas participar, ativamente da construção do sentido. (KOCH e ELIAS, 2011)

Nesse sentido, no processo de leitura, segundo as autoras, autor e leitor

assumem papéis de “estrategistas” na interação que se realiza pela linguagem. Se a

concepção de língua for a interacional (dialógica), a leitura será “uma atividade

interativa altamente complexa de produção de sentidos [...]”. (KOCH e ELIAS,

2011,p. 11)

Considerando essa concepção dialógica de língua, a leitura só pode ser

entendida como produção de sentidos, podendo ser conceituada como

[...] o processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de compreensão e interpretação do texto, a partir de seus objetivos, de seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a linguagem etc. Não se trata de extrair informação, decodificando letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível a proficiência. É o uso desses procedimentos que possibilita controlar o que vai sendo lido, permitindo tomar decisões diante de dificuldades de compreensão, avançar na busca de esclarecimentos, validar no texto, suposições feitas. (PCN – LÍNGUA PORTUGUESA, 1998, p. 69-70)

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Nesse sentido, Kleiman (1995) considera ser fundamental o conhecimento

prévio para a compreensão textual. Esse conhecimento prévio constitui-se no

conjunto dos conhecimentos linguístico, textual e de mundo que o leitor possui.

Além disso, deve-se ter consciência de que

[...] a prática de leitura é um princípio de cidadania, ou seja, o leitor cidadão, pelas diferentes práticas de leitura, pode ficar sabendo quais são suas obrigações e também pode defender os seus direitos, além de ficar aberto às conquistas de outros direitos necessários para uma sociedade justa, democrática e feliz. (SILVA, 2005.p. 24)

No entanto, o sistema capitalista e consumista, no qual a escola está

inscrita, transformou a leitura de fruição em um “consumo rápido do texto, em leitura

dinâmica que, para ser lucrativa, tem de envelhecer depressa, gerando

constantemente a necessidade de novos textos” (LAJOLO, 2002, p. 105). Essa

transformação afasta os alunos da polissemia e polifonia presentes nos textos, não

ocorrendo no espaço escolar a interação entre leitor e o texto, que possibilite o

reconhecimento dos elementos da linguagem manipulados pelo texto, os quais

atribuem sentidos e dão o caráter polissêmico.

Para tanto, Lajolo (2002, p. 45) afirma que “leitor e texto precisam participar

de uma mesma esfera de cultura”, a qual “inclui a língua e privilegia os vários usos

daquela língua que, no correr do tempo, foram constituindo a tradição literária da

comunidade (à qual o leitor pertence) falante daquela língua [...]”.

Nesse universo cultural, existem várias modalidades de leitura, literárias e

não-literárias, sendo que as últimas possuem uma maior veiculação na sociedade.

Entretanto, não se pode, em busca da proficiência, descuidar da leitura literária.

Deve-se fazer a leitura de anúncios, de notícias, de música, de filmes, de obras de

arte, do hipertexto, da história, das ciências,enfim, dos muitos gêneros que circulam

socialmente, do mesmo modo que há de se ler literatura, que há de se ler o mundo,

mergulhando nas diferentes vozes que o compõem, em suas diversas instâncias

sociais.

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Pensada e praticada nessa concepção, a leitura influencia e determina a

vida dos sujeitos leitores, faz com que sintam, vejam e construam realidades. Não se

trata de ler para viver, mas sim de viver quando se lê e ler, quando se vive, no livro

da vida (FRAGO, 1993). A leitura faz com que o aluno se entenda como sujeito

social, elaborando assim o seu projeto social, a sua trajetória. Leitura é produção de

sentidos. É ser e estar no mundo.

Se ler é produzir sentido, um aluno só irá produzir sentido para o que lê com

interesse – do latim “inter esse”, que significa “estar entre”, ser envolvido. (GUEDES;

SOUZA, 2001, p. 144).

Assim, rompendo com tradição formalista, presente nas aulas de língua

portuguesa, Geraldi (1985, p. 150) aponta-nos o trato do texto como dialógico, não

somente como estrutura. Nesse sentido, deve-se, antes de se “questionar a

criatividade, a coerência, a coesão, a sequência dos episódios, a introdução, o

desenvolvimento, a conclusão, a estrutura dos parágrafos, a correção, etc.,

perguntar pelo papel desse texto no diálogo de que participa”.

Grande desafio para quem ainda não compreendeu que é preciso separar as

atividades sobre as estruturas linguísticas e lexicais, componentes da mecânica do

estudo sobre a língua, dos verdadeiros momentos de leitura, nos quais são

desenvolvidas estratégias de construção e desconstrução de sentidos.

Esse entendimento, da leitura enquanto atribuição de sentidos, significa uma

mudança no olhar o leitor, que deve ser visto como um sujeito ativo da e na

comunicação discursiva, para quem o texto vai além das palavras e do já posto.

Por esse motivo,

[...] talvez seja possível pensar a leitura como uma oferta de contra palavras do leitor que, acompanhando os traços deixados no texto pelo autor, faz estes traços renascerem pelas significações que o encontro de palavras e contra palavras produz (GERALDI, 2003, p. 259).

Nesse contexto, o leitor e seus conhecimentos devem ser considerados,

compreendendo-se que esses conhecimentos diferem de um leitor para outro. Isso

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implica a aceitação de uma pluralidade de leituras e sentidos relacionados a um

mesmo texto.

Entretanto, não significa que o leitor possa ler qualquer coisa, compreender

qualquer coisa em um texto, tendo em vista que

[...] o sentido não está apenas no leitor, nem no texto, mas na interação autor-texto-leitor. Por isso, é de fundamental importância que o leitor considere na e para a produção de sentido “as sinalizações” do texto, além dos conhecimentos que possui. (KOCH e ELIAS, 2011. p. 22)

ESTRATÉGIAS DE AÇÃO

A metodologia empregada para as atividades desta unidade fundamenta-se

mo método desenvolvido pelo professor Rildo Cosson, pesquisador do Centro de

Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE) da UFMG, o qual se caracteriza pelo

desenvolvimento de aulas de Literatura formadas por duas sequenciações. Nesta

proposta, utiliza-se a sequência básica, composta de quatro etapas: motivação,

introdução, leitura e interpretação.

Para uma melhor compreensão do proposto, exemplificamos essas quatro

etapas a partir do texto “Madrugada”, de Orígenes Lessa.

1.ª – Motivação

Nessa etapa, o professor deverá iniciar a aula comunicando aos alunos que

farão a leitura do conto “Madrugada”, de Orígenes Lessa. Em seguida, perguntará

sobre o que eles acham que o conto fala; o que eles conhecem por madrugada; o

que a caracteriza? Na sequência, fará uma reapresentação do gênero conto,

destacando que esse gênero textual é uma obra de ficção que, por meio da fantasia

ou da imaginação, cria um universo de personagens e acontecimentos. Esse tipo de

narrativa ficcional é definida por sua extensão, sendo mais curto que o romance ou

novela. Além disso, ele apresenta uma estrutura fechada, desenvolve uma única

história e tem apenas um clímax. Ou seja, é conciso, diferente do romance, cuja

trama desdobra-se em conflitos secundários.

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Complementando a exposição, o professor deverá ressaltar que o conto é um

gênero que apresenta grande flexibilidade, aproximando-se da poesia e da crônica e

que esse aspecto poderá ser observado no conto “Madrugada”. É importante

ressaltar, também, que muitos autores consideram o mito, a lenda, a parábola e o

conto de fadas como ancestrais do conto literário.

Finalizando a exposição, é interessante que o professor reveja com seus

alunos os elementos constituintes da estrutura narrativa: narrador, personagens,

tempo e espaço, que no conto “Madrugada” é apresentada da seguinte forma:

O narrador é um narrador-personagem. Isto significa que conto é escrito na

1.ª pessoa do discurso e que os acontecimentos nos são passados pelo ponto de

vista da personagem, que possui uma relação muito próxima com os outros

elementos da narrativa. Além disso, sua narração é marcada por características

subjetivas e emocionais, tornado-se parcial, impregnada de pontos de vista do

narrador.

“Dobrei a esquina do hotel, cansado e com sono”;

“E já me esquecera dos companheiros eventuais da noite sem importância,

quando estremeci, ao perceber, pelas pisadinhas leves, um cachorro atrás de mim.

Tenho velho horror a cães desconhecidos.”

Um aspecto interessante a ser apresentado sobre o conto é o papel exercido

pelo cão, alçado a personagem secundária, mas grande responsável pelo rumo da

trama:

”Que desejava de mim aquele cão ainda não visto, evidentemente à minha

procura?”;

“Minha primeira reação foi apressar a marcha.”;

“Passou-me pela cabeça o grave da situação. Que seria de mim, atacado por

um cão feroz numa via deserta, em plena madrugada, na cidade estranha? Como

me arranjaria? Como reagiria? Como lutar contra o monstro, sem pedra nem pau,

duas coisas tão úteis banidas pela vida urbana? Nunca me senti tão pequeno.”

“O cachorro me olhou pela primeira vez, com olhos tão doces e interrogativos,

que me comovi. Pareceu-me ver o desespero da sua incompreensão, menos pelas

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palavras que pela aspereza do tom. Parei. E foi numa tentativa de reconciliação,

envergonhado comigo mesmo, que sorri para o meu misterioso acompanhante:”

Outros dois elementos da narrativa ficcional conto também merecem ser

destacados pelo professor, em “Madrugada”. São eles, o tempo: a madrugada

(“Duas horas da manhã. Às sete, devia estar no aeroporto”); e o espaço: as ruas

desertas de cidade qualquer (“Dez ou doze quarteirões”; “Eu estava só, na rua e no

mundo.”; “Assim foi que continuamos, às vezes mais rápido, outras vezes mais lento,

metros, metros e metros, ao longo de calçadas, cruzando ruas, quadras, quadras,

quadras.”).

Finalizada a exposição, o professor deverá entregar aos alunos uma cópia do

texto “Madrugada” e realizar junto com eles uma leitura prévia, corrida, do começo

ao fim, para verificar a extensão do texto, as linhas gerais da história, a linguagem

utilizada pelo autor; ou seja, para sentir o tom do texto.

2.ª – Introdução

Nessa etapa, serão apresentados aos alunos o autor – Orígenes Lessa – e

sua obra, em forma de uma conversa. Nela, o professor deverá informá-los de que

Orígenes Lessa graduou-se em Educação Física, tendo atuado como professor

dessa disciplina, mas que a abandonou para ser jornalista, contista, romancista e

ensaísta. Além disso, deverá ser destacada sua linguagem polissêmica, muitas

vezes marcada pela presença de traços impressionistas. Outro fato a ser destacado

é sua inserção na literatura infanto-juvenil, já escritor maduro.

Em seguida, o professor solicitará a seus alunos uma pesquisa sobre a vida e

a obra desse autor, verificando a que período literário ele pertenceu e em que obra o

conto “Madrugada” se insere. Realizando a pesquisa, os alunos também verificarão

que Orígenes Lessa é um autor muito próximo a eles e que “Madrugada” faz parte

de um conjunto maior intitulado Balbino, Homem do Mar – livro publicado pela

primeira vez em 1960.

Após a apresentação dos resultados da pesquisa pelos alunos, será feita uma

“pré-leitura” coletiva, em que serão discutidos os aspectos principais do texto: como

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temática (Qual é o tema do texto? Por que o título é “Madrugada”?); as personagens

(como pode ser descrita a personagem principal? O que caracteriza o cão?); tempo

(De que modo é marcado o tempo dessa narrativa?); e espaço (O que caracteriza o

espaço da narrativa? Pode-se dizer que ele é um espaço definido?). Nessa

discussão, o professor deverá levantar hipóteses sobre o texto, questionando os

alunos (O autor está falando sobre a madrugada, ou ele se utiliza dela para abordar

outros temas? Quais seriam esses temas? Por que a presença do cão nessa

narrativa?) e incentivando-os a buscar meios de comprová-las ou refutá-las.

3.ª – Leitura

Os alunos realizarão a leitura do conto “Madrugada”, que será acompanhada

pelo professor, sem policiamento. Por ser tratar de um conto, ela deverá se realizada

em sala de aula.

Madrugada2

Orígenes Lessa

Dobrei a esquina do hotel, cansado e com sono. Caminhara o dia inteiro, tomando contato com a cidade, olhando vitrinas, examinando tipos, lendo tabuletas e painéis, admirando mulheres, ouvindo frases soltas, de diálogos alheios, procurando reconstituir, pela frase mal ouvida, o rumo da conversa, o drama, a intriga, o mexerico, os interesses que uniam aquela gente cheia de gestos e abraços.

Duas horas da manhã. Às sete, devia estar no aeroporto. Foi quando me lembrei de que, na pressa daquela manhã, ao sair do hotel, deixara no banheiro o meu creme dental. Examinei a rua. Nenhuma farmácia aberta. Dei meia volta, rumei por uma avenida qualquer, o passo mole e sem pressa, no silêncio da noite. Alguma haveria de plantão... Rua deserta. Dois ou três quarteirões mais além, um guarda. Ele me daria indicação. Deu. Farmácia Metrópole, em rua cujo nome não guardei.

— O senhor vai por aqui, quebra ali, segue em frente.

Dez ou doze quarteirões. A noite era minha. Lá fui. Pouco além, dois tipos cambaleavam. Palavras vazias no espaço cansado. Atravessei, cauteloso, para a calçada fronteira. E já me esquecera dos companheiros eventuais da noite sem importância, quando estremeci, ao perceber, pelas pisadinhas leves, um cachorro atrás de mim. Tenho velho horror a cães desconhecidos. Quase igual ao horror pelos cães conhecidos, ou de conhecidos, cuja lambida fria, na intimidade que lhes tenho sido obrigado a conceder, tantas vezes, me provoca uma incontrolável repugnância.

Senti um frio no estômago. Confesso que me bambeou a perna. Que desejava de mim aquele cão ainda não visto, evidentemente à minha procura? Os meus bêbados haviam

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LESSA, Orígenes. Balbino, Homem do Mar. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1960.

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dobrado uma esquina. Estávamos na rua apenas eu e aqueles passos cada vez mais próximos. Minha primeira reação foi apressar a marcha. Mas desde criança me ensinaram que correr é pior. Cachorro é como gente: cresce para quem se revela o mais fraco. Dominei-me, portanto, só eu sei com que medo. O bicho estava perto. Ia atacar-me a barriga da perna? Passou-me pela cabeça o grave da situação. Que seria de mim, atacado por um cão feroz numa via deserta, em plena madrugada, na cidade estranha? Como me arranjaria? Como reagiria? Como lutar contra o monstro, sem pedra nem pau, duas coisas tão úteis banidas pela vida urbana?

Nunca me senti tão pequeno. Efeito do uísque de má sorte, ingerido naquela boate encontrada ao acaso, tomou-me uma descontrolada sensação de desamparo. Eu estava só, na rua e no mundo. Ou melhor, a rua e o mundo estavam cheios, cheios daqueles passos cada vez mais vizinhos. Sim, vinham chegando. Não fui atacado, porém. O animal já estava ao meu lado, teque-teque, os passinhos sutis. Bem... Era um desconhecido inofensivo. Nada queria comigo. Era um cão notívago, alma boêmia como tantos homens, cão sem teto que despertara numa soleira de porta e sentira fome. Com certeza, saindo em busca de latas de lixo e comida ao relento.

Um doce alívio me tomou. Logo ele estaria dois, três, dez, muitos passinhos miúdos e leves cada vez mais à frente, cada vez mais longe... Não se prolongou, porém, a repousante sensação. O animal continuava a meu lado, acertando o passo com o meu – teque-teque, nós dois sozinhos, cada vez mais sós... Apressei a marcha.

Lá foi ele comigo. Diminuí O bichinho também. Não o olhara ainda. Sabia que ele estava a meu lado. Os passos o diziam. O vulto. Pelo canto do olho senti que ele não me olhava também, o focinho para a frente, o caminhar tranquilo, muito suave...

4.ª – Interpretação

Após o desenvolvimento das atividades propostas nas etapas anteriores, o

professor poderá solicitar uma das seguintes atividades:

Elaboração de um rap, a partir da interpretação do texto (para tanto, o

professor deverá abordar e exemplicar esse gênero musical);

Elaboração de um texto, no qual o aluno, a partir de sua interpretação,

crie diálogos entre o cão e o homem;

Elaboração de um texto-análise da personagem (como se o aluno

fosse uma analista), expondo suas características psicológicas.

Essa abordagem, em quatro etapas, será o norte para as atividades a serem

desenvolvidas, apresentadas a seguir.

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ATIVIDADES

As atividades aqui apresentadas, seguem a metodologia do professor Rildo

Cosson, pesquisador do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE) da

UFMG, como já observado anteriormente. Nesse sentido as atividades 1 e 2

correspondem à etapa de motivação dos alunos; 3 e 4 à de introdução; 5 à leitura e

as atividades 6 a 10 à interpretação.

1. Conversando sobre gêneros textuais

Nessa atividade, o professor deverá fazer a (re)apresentação dos gêneros

textuais aos alunos, explorando seus elementos constituintes e as vozes que os

permeiam, focando de modo mais específico o gênero conto.

Objetivo: (Re)apresentar o gênero textual conto e seus elementos constituintes

Número de aulas: 4 h/aulas

Orientações metodológicas:

Inicialmente, o professor conversará com os alunos sobre o gênero conto,

ressaltando as características desse gênero como a brevidade, explicando que o

conto é uma narrativa menor que o romance e a novela, tendo, por isso, menos

complexidade. Deverá abordar, também, que esse tipo de narrativa possui uma

estrutura fechada, tendo apenas um clímax, ressaltando que o conto se caracteriza

pela concisão.

Em seguida, entregará a eles o texto ‘Conto’ de Ana Paula de Araújo

solicitanto a eles que façam sua leitura.

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Conto

Araújo, Ana Paula

“Quem conta um conto, aumenta um ponto.”

Foi dessa forma que esse tipo de texto surgiu. Não sendo por acaso seu nome, o conto teve início junto com a civilização humana. As pessoas sempre contaram histórias, reais ou fabulosas, oralmente ou através da escrita. O conceito de conto, hoje em dia, foi ampliado em relação a este citado acima. Isto se dá porque escritores passaram a adotar esse tipo de texto como uma forma de escrever, e essa tentativa tem sido promissora. Além de utilizar uma linguagem simples, direta, acessível e dinâmica, o conto é a narração de um fato inusitado, mas

possível, que pode ocorrer na vida das pessoas embora não seja tão comum.

Essa praticidade tem atraído leitores de todas as idades e níveis intelectuais. Inclusive aqueles que não têm o costume de ler ou que ainda estão começando a adquirir este hábito. Não é um texto denso, que exija grande esforço intelectual para ser compreendido, e por isso mesmo

é tão bem aceito em diversos tipos de meios de comunicação, não somente através dos livros.

Como narrativa oral, o conto surge no Brasil trazido pelos portugueses, e até hoje é fortemente propagado, em diversas regiões do país. São as chamadas “estórias de Trancoso”.

Como narrativa escrita, o conto surge na literatura Brasileira durante o início do Romantismo, mas os autores românticos não conseguiram se destacar através desse tipo de texto. O primeiro grande contista brasileiro, Machado de Assis, iria surgir no início do Realismo, e seu nome se tornaria consagrado pelo brilhantismo com que dominava as palavras.

Há algumas características que podem nos ajudar a identificar ou até mesmo a produzir um conto:

- É uma narrativa linear e curta, tanto em extensão quanto no tempo em que se passa.

- A linguagem é simples e direta, não se utiliza de muitas figuras de linguagem ou de expressões com pluralidade de sentidos.

- Todas as ações se encaminham diretamente para o desfecho.

- Envolve poucas personagens, e as que existem se movimentam em torno de uma única ação.

- As ações se passam em um só espaço, constituem um só eixo temático e um só

conflito.

- A habilidade com as palavras é muito importante, principalmente para se utilizar de alusões ou sugestões, frequentemente presentes nesse tipo de texto.

Além de fecundo na diversidade temática, os contos brasileiros são fecundos na produção. Talvez isso aconteça porque os contos produzidos no Brasil, principalmente a partir do Modernismo, tem adquirido identidade própria e se manifestado das mais diversas maneiras, de modo que dificilmente são fiéis às características acima citadas.

Podemos até arriscar falar sobre alguns tipos de contos, como os contos alegóricos, os contos fantásticos, os contos satíricos, os contos de fadas, entre outros, mas não podemos traçar características fixas para eles, justamente devido a essa liberdade que os autores têm de imprimir

novas características a cada conto que produzem.

Realizada essa leitura, o professor entregará o conto ‘Madrugada’, já

apresentado nessa unidade, para que coletivamente identifiquem seus elementos

constituintes, respondendo às seguintes questões:

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1. Qual é a temática do texto? Que elementos do texto justificam sua

resposta?

2. Por que o título é “Madrugada”?

3. Quais são as personagens do texto?

4. Como podemos descrever a personagem principal, física e

psicologicamente?

5. O que caracteriza o cão?

6. Qual é o tempo dessa narrativa? De que modo ele é marcado?

7. O que caracteriza o espaço da narrativa? Pode-se dizer que ele é um

espaço definido? Por quê?

8. Nesse texto, o autor está falando sobre a madrugada, ou ele se utiliza dela

para abordar outros temas? Quais seriam esses temas?

9. Por que a presença do cão nessa narrativa? Comente-a.

2. Leitura na Biblioteca

Nessa atividade, o professor convidará os alunos a uma visita à biblioteca

da escola para a leitura de contos diversos, a fim de que observem suas

especificidades.

Objetivo: Oportunizar aos alunos momentos de leitura de fruição

Número de aulas: 4 h/aulas

Orientações metodológicas:

O professor deverá pré-selecionar os livros e orientará os alunos na

percepção das diversas possibilidades de construção de narrador e personagens

bem como da apresentação do tempo e do espaço da narrativa.

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No entanto, o foco principal dessa atividade é a oferta de um espaço/tempo

para a realização de uma leitura descompromissada com análises literárias ou

estruturais. Ler pelo prazer, apenas observando o modo como o texto frui.

Sugestões de textos para leitura: Baleia, de Graciliano Ramos; O cão Achado, de

José Saramago; Osso, o cão bandoleiro, de Ciro Alegria; O cachorro canibal,de José

J. Veiga; Cão carioca, de João Labrador; Tentação, de Clarice Lispector; As

formigas, Natal na barca, As cerejas e O menino, de Lygia Fagundes Telles.

3. Navegando nas ondas da leitura hipertextual

Essa atividade será realizada extraclasse.

Objetivos: Oportunizar o contato com contos de autores diversos e o conhecimento

sobre a vida e a obra de contistas nacionais.

Número de aulas: Essa atividade ocorrerá extraclasse e terá carga horária

equivalente a 10 h/aula.

Orientações metodológicas:

Inicalmente, o professor solicitará aos aos alunos que formem grupos com,

no máximo, 4 participantes. Em seguida, deverá propor-lhes a seguinte atividade:

Pesquisar na internet:

1. Os principais contistas brasileiros e as principais temáticas abordadas por ele;

2. Vida e a obra dos contistas pesquisados, incluindo a de Lygia Fagundes Telles.

O professor poderá auxiliá-los na pesquisa, indicando-lhes sites confiáveis.

Nesta atividade, é importante informar aos alunos que devem pequisar, ler e

cada grupo deverá elaborar seu texto, para ser apresentado à classe.

4. Construindo coletivamente

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Nessa atividade, o professor, a partir dos textos apresentados pelos alunos

sobre os contistas nacionais, deverá focar a obra e a vida de Lygia Fagundes Telles.

Objetivo: Construir um texto coletivo sobre os contos nacionais e outro sobre os

contistas brasileiros, focando a vida e obra de Lygia Fagundes Telles.

Número de aulas: 2h/aulas

Orientações metodológicas:

Após a realização da pesquisa, leitura do material selecionado e elaboração

do texto em grupo, os alunos farão a leitura, em sala de aula, dos seus textos. Em

seguida, o professor proporá a escrita coletiva de dois textos: um sobre os contos

nacionais e outro sobre os contistas, com os dados mais relevantes apresentados

pelos grupos.

Caso nas leituras não seja abordada a vida e a obra de Lygia Fagundes

Telles, o professor deverá introduzi-la no contexto da aula, comentando e reforçando

sua importância para a literatura nacional. Além disso, deverá acrescentar esses

aspectos, referentes a essa autora, nos textos em construção, pois neles se dará

relevância para sua vida e sua obra.

5. Quebra-cabeça de texto

Para iniciar essa atividade e instigar a curiosidade dos alunos, o professor

deverá iniciar uma conversa com os alunos sobre os animais de estimação que

estão sem suas casas, pedir para falarem sobre eles, suas características etc.

Em seguida, o professor apresenta ao alunos quadros (feitos em cartolina)

com imagens retratando a história do conto “Biruta”. O professor deverá entregar os

quadros com as imagens aos alunos. Os alunos deverão reconstruir a sequência

das ações montando o texto da forma que acharem mais coerentes.

Quando todos já tiverem realizado a atividade, o professor colocará as

imagens no quadro e junto com os alunos irá organizá-las, até que o texto seja

finalizado com coerência. Em seguida, pedirá para que façam a comparação com a

montagem que cada grupo fez.

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Objetivo: Levar o aluno a perceber como interagir na sequência e sentido da

história e aproximar o aluno do texto literário, de forma lúdica.

6. Fruindo as palavras

O professor entregará aos alunos cópia do conto “Biruta” para que realizem

sua leitura, que acompanhará, sem policiamento. Por ser tratar de um conto, ela

deverá se realizada em sala de aula.

Objetivos: Oportunizar aos alunos a leitura de fruição, mostrando-lhes a capacidade

de despertar sentimentos, sensações de, muitas vezes, promover a catarse.

Número de aulas: 4 h/aulas

Orientações metodológicas:

Incialmente, o professor entregará aos alunos o texto “Biruta”, de Lygia

Fagundes Telles, explicando a eles tratar-se de um conto. Em seguida, deverá

solicitar a eles que façam sua leitura.

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Lygia Fagundes Telles3

Alonso foi para o quintal carregando uma bacia cheia de louça suja. Andava com

dificuldade, tentando equilibrar a bacia que era demasiado pesada para seus bracinhos finos.

— Biruta, eh, Biruta! - chamou sem se voltar.

O cachorro saiu de dentro da garagem. Era pequenino e branco, uma orelha em pé e a

outra completamente caída.

— Sente-se aí, Biruta, que vamos ter uma conversinha – disse Alonso pousando a bacia

ao lado do tanque. Ajoelhou-se, arregaçou as mangas da camisa e começou a lavar os pratos.

Biruta sentou-se muito atento, inclinando interrogativamente a cabeça ora para a direita,

ora para a esquerda, como se quisesse apreender melhor as palavras do seu dono. A orelha caída

ergueu-se um pouco, enquanto a outra empinou, aguda e ereta. Entre elas, formaram-se dois vincos,

próprios de uma testa franzida do esforço de meditação.

— Leduína disse que você entrou no quarto dela – começou o menino num tom brando. –

E subiu em cima da cama e focinhou as cobertas e mordeu uma carteirinha de couro que ela deixou

lá. A carteira era meio velha e ela não ligou muito. Mas se fosse uma carteira nova, Biruta! Se fosse

uma carteira nova! Me diga agora o que é que ia acontecer se ela fosse uma carteira nova!? Leduína

te dava uma surra e eu não podia fazer nada, como daquela outra vez que você arrebentou a franja

da cortina, lembra? Você se lembra muito bem, sim senhor, não precisa fazer essa cara de

inocente!...

Biruta deitou-se, enfiou o focinho entre as patas e baixou a orelha. Agora, ambas as

orelhas estavam no mesmo nível, murchas, as pontas quase tocando o chão. Seu olhar interrogativo

parecia perguntar:

"Mas o que foi que eu fiz, Alonso? Não me lembro de nada..."

— Lembra sim senhor! E não adianta ficar aí com essa cara de doente, que não acredito, ouviu?

Ouviu, Biruta?! – repetiu Alonso lavando furiosamente os pratos. Com um gesto irritado, arregaçou

as mangas que já escorregavam sobre os pulsos finos. Sacudiu as mãos cheias de espuma. Tinha

as mãos de velho...

3 TELLES, Lygia Fagundes. Venha ver o pôr-do-sol e outros contos. São Paulo: Ática, 1988.

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Após a realização da leitura desse conto, os alunos, mediados pelo professor,

extravasarão os sentimentos que lhes afloraram enquanto liam. Para tanto, o

professor fará os seguintes questionamentos:

1. O que você achou deste texto? Por quê?

2. Qual parte achou mais interessante? Por quê?

3. O que você achou de Alonso? Conhece meninos assim?

4. E de Biruta? Gostou dele? O que mais achou interessante nesse

cachorro?

5. Como você analisa a ação dos donos da casa?

Feita essa reflexão e exposição dos sentimentos aflorados, os alunos

apresentarão o resultado de suas leituras, nas quais procurarão estabelecer

relações com outros textos lidos com a mesma temática, filmes, notícias de jornais,

reportagens, possibilitando-lhes o reconhecimento da intertextualidade.

Nesse momento, o professor aproveitará para explicar que a

intertextualidade é a conversa de um texto com outro texto, os quais podem ser

verbais ou não-verbais. Importante salientar, também, ser comum encontrar ecos ou

referências de um texto em outro, até mesmo na nossa fala cotidiana, como por

exemplo no jogo do não confunda:

Não confunda "bife à milanesa" com "bife ali na mesa";

Não confunda "conhaque de alcatrão" com "catraca de canhão".

O professor deverá chamar a atenção dos alunos para uma

intertextualidade, bem conhecida, que é a realizada pela conto “Chapeuzinho

Amarelo”4, de Chico Buarque de Holanda, com o conto clássico infantil

4 Chapeuzinho Amarelo. 13 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2003.

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“Chapeuzinho Vermelho”5, descrevendo as relações presentes entre os dois textos.

Caso haja necessidade, o professor poderá apresentar aos alunos os dois textos.

Ao falar dos textos e das imagens, o professor deverá ressaltar que, quando

ocorre a intertexualidade, o autor do texto que a apresenta faz nela a sua leitura do

texto original, de modo irônico, com humor, reforçando ou refutando a mensagem

que esse texto transmite.

Na continuidade, deverá retomar as reflexões sobre o conto “Biruta”,

realizadas a partir dos questionamentos feitos por ele, fazendo com que os alunos

estabeleçam relações com seu cotidiano e das pessoas ao seu redor.

7.Leitura de imagens

O professor deverá levar para a sala de aula o filme ‘Sempre ao seu lado’,

de Lasse Hällstrom e assistir junto com os alunos.

Objetivos: Estimular percepção dos elementos intertextuais e desenvolver a

oralidade dos alunos.

Número de aulas: 4 h/aula

Orientações metodológicas:

Após assistirem ao filme, o professor deverá estimulá-los a exporem suas

impressões sobre ele, fazendo-os estabelecer relações com o texto “Biruta”, a partir

das seguintes reflexões:

1. O filme tem alguma relação com o conto “Biruta”? Qual?

2. Os cães apresentados no conto possuem alguma semelhança? Caso sua

resposta seja afirmativa, relacione essas semelhanças.

5 < http://meuscontosdefadas.blogspot.com.br/>

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3. O que difere os dois textos? 4. Qual deles lhe provocou mais sensações? Que

sensações foram essas? Por quê?

8. Leitura midiática

Nessa atividade, o professor solicitará aos alunos que realizem uma

pesquisa na internet sobre a lei que fala dos maus-tratos aos animais (Lei Federal

9605/98, art. 32), para que seja discutida em sala de aula.

Objetivo: Conhecer a lei sobre maus-tratos aos animais, discutindo suas aplicações.

Explorar aspectos da produção de texto oral, desenvolvida por meio do debate.

Número de aulas: 04 h/aulas

Orientações metodológicas:

Realizada a pesquisa, os alunos apresentarão seu resultado e a analisarão

junto com o professor, observando seu teor, para poderem emitir suas opiniões

sobre ela.

É interessante que o professor os incentive ao debate, realizando os

seguintes questionamentos:

Você concorda com essa lei?

Acha-a justa?

Se você tivesse que mudar alguma coisa nela, o que mudaria?

Ela está sendo cumprida? Por quê?

Ela se aplicaria à história de Biruta?

9. Leitura de mundo

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Nessa atividade, o professor solicitará aos alunos que observem e anotem

em seu caderno como são tratados os animais em seu entorno – rua, bairro e

cidade.

Objetivos: Desenvolver o senso de observação e o senso crítico dos alunos,

oportunizando-lhes a apresentação de suas ideias e o desenvolvimento de sua

oralidade.

Número de aulas: 2 h/aulas.

Para tanto, eles deverá apresentar a eles o seguinte roteiro de reflexões:

ROTEIRO DE REFLEXÕES

1. Como os animais são tratados pelos seus donos?

2. O que acontece com os animais abandonados?

3. Como o poder público trata deles? Que ações são implementadas em sua

cidade nesse sentido?

4. Como você gostaria que eles fossem tratados?

5. O que aconteceria se a história do filme ocorresse em sua cidade? como

Hachico seria tratado?

6. E Biruta? Alonso conseguiria encontrá-lo novamente?

7. Como as pessoas de sua cidade, reagem aos animais abandonados na rua?

Depois, em sala de aula, os alunos farão a apresentação de suas

observações para a classe. O professor deverá, nesse momento, comentar e

estimular a discussão entre os alunos sobre a realidade que os cerca, estimulando-

os à leitura de mundo.

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10.Criando um conto... ganhando um ponto

Essa atividade encerra a presente unidade.

Objetivo: Desenvolver o interesse pelas próprias produções e pelas diversas

linguagens expressivas (verbal e não-verbal) com as quais entrem em contato,

ampliando seu conhecimento do mundo bem como promover o desenvolvimento da

sensibilidade estética, o cuidado e o respeito pelo processo de produção e criação

de um texto.

Número de aulas: 2h/aulas.

Orientações metodológicas:

Finalizando o conjunto de atividades dessa unidade didática, o professor

solicitará aos alunos uma produção textual: a criação e a apresentação da releitura

feita por eles do conto “Biruta”, na qual eles deverão acrescentar o final que

gostariam que o conto tivesse.

Para essa atividade, os alunos deverão respeitar o título do texto/conto da

releitura: Biruta, a história continua.

Realizada as produções textuais, os alunos deverão apresentá-las para os

demais colegas.

SUGESTÕES DE ATIVIDADES

A seguir são apresentadas sugestões de atividades para complementar as

propostas nessa unidade didática.

1. Leitura de mundo: entrevista com pessoas da família sobre animais de

estimação.

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2. A partir das diversas leituras realizadas, produção de um folheto de

conscientização em relação ao modo de tratar os animais e as penalidades

previstas em caso de maus-tratos;

3. Criação e implementação da Roda Viva de Leitura, com a participação dos

alunos e da comunidade externa.

AVALIAÇÃO

A avaliação será processual, contínua e diagnóstica. Dar-se-á pela

participação dos alunos na realização das atividades propostas e na adequação de

suas elaboraçãoes ao solicitado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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GUEDES, Paulo C; SOUZA, Jane de. Não apenas o texto mas o diálogo em língua escrita é conteúdo da aula de português. In: BITENCOURT, Iara Conceição Neves et al. Ler e escrever: compromisso de todas as áreas. 4. ed. Porto Alegre-RS: Editora da UFRGS, 2001.

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