FIchamento Familia

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE DIREITO – DPTO. DE DIREITO PRIVADO TURMA T-04 – DIREITO DE FAMÍLIA FILIPE ALMEIDA CAMPOS MOTA FICHAMENTO DO LIVRO “DIREITO DE FAMÍLIA – UMA ABORDAGEM PSICANALÍTICA”.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO – DPTO. DE DIREITO PRIVADO

TURMA T-04 – DIREITO DE FAMÍLIA

FILIPE ALMEIDA CAMPOS MOTA

FICHAMENTO DO LIVRO “DIREITO DE FAMÍLIA – UMA

ABORDAGEM PSICANALÍTICA”.

Salvador, novembro de 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO – DPTO. DE DIREITO PRIVADO

TURMA T-04 – DIREITO DE FAMÍLIA

FILIPE ALMEIDA CAMPOS MOTA

FICHAMENTO DO LIVRO “DIREITO DE FAMÍLIA – UMA

ABORDAGEM PSICANALÍTICA”.

Salvador, dezembro de 2013

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CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO.

1. REVISANDO CONCEITOS

“A partir do princípio irrefutável, ou seja, da lei natural de que a família é a

célula básica de toda e qualquer sociedade, desde as mais primitivas, torna-se

necessário revisitar alguns conceitos que, especialmente em Direito, devem ser

retrabalhados, para que possamos entender melhor a regulação jurídica, e para

onde ela aponta neste século XXI.”

“Clóvis Beviláqua definia a família como: Um conjunto de pessoas ligadas

pelo vínculo da consangüinidade, cuja eficácia se estende ora mais larga, ora mais

restritamente, segundo as várias legislações. Outras vezes, porém, designam-se por

família, somente os cônjuges e a respectiva progênie.”

“Orlando Gomes, citando Mazeaud e Mazeaud dizia que somente o grupo

oriundo do casamento deve ser denominado família, por ser o único que apresenta

os caracteres de moralidade e estabilidade necessários ao preenchimento da sua

função social.”

“É importante observar que o estudo da família, em Direito, esteve

sempre estritamente ligado ao casamento, que a tornava legítima ou ilegítima,

segundo os vínculos da oficialidade dados pelo Estado ou mesmo pela religião.

Grande parte dos juristas confundiu o conceito de família com o de casamento.”

“A idéia de família, para o Direito brasileiro, sempre foi a de que ela é

constituída de pais e filhos unidos a partir de um casamento regido e regulamentado

pelo Estado. Com a Constituição de 1988 esse conceito ampliou-se, uma vez que o

Estado passou a reconhecer “como entidade familiar a comunidade formada por

qualquer dos pais e seus detscendentes, bem como a união estável entre homem e

mulher”.

2. A FAMÍLIA NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

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“Os movimentos sociais e a revolução dos costumes das décadas de

1960 e 1970 foram absorvidos pelo Texto Constitucional de 1988. Foi somente a

partir daí, como já se disse anteriormente, que o Estado, constitucionalmente,

passou a dar proteção às famílias que não fossem constituídas pelo casamento.

Então podemos vê-la como gênero que comporta várias espécies. É o

reconhecimento de que a família não é mais singular, é plural.”

“A primeira Constituição do Brasil, outorgada em 1824, pelo Imperador D.

Pedro I, não fez nenhuma referência à família ou ao casamento”.

“A segunda Constituição da República (1934) dedicou um capítulo à

família, no qual, em quatro artigos, estabelecia as regras o casamento indissolúvel”.

“As Constituições de 1937, 1946, 1967 e 1969, seguindo a mesma linha

de pensamento, traziam em seu texto o casamento indissolúvel como única forma

de constitui família”.

“A Constituição de 1988 abriu e ampliou as formas de constituição em seu

texto:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção

do Estado.

§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a

união estável entre o homem e a mulher como entidade

familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a

comunidade formada por qualquer dos pais e seus

descendentes.”

3. ORIGEM E ESTRUTURAÇÃO DA FAMÍLIA

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“Em algumas tribos e em variados lugares, elas se apresentam (as

famílias primitivas) de forma poligâmica ou monogâmica, patriarcal ou matrilinear.

Seja no estado de natureza ou no estado de cultura, em qualquer tempo ou espaço,

sempre como um grupo natural de indivíduos unidos por uma dupla relação

biológica: por um lado a geração, que dá os componentes do grupo; por outro, as

condições de meio, que postulavam o desenvolvimento dos mais novos, enquanto

os adultos garantem a reprodução e asseguram a manutenção do grupo.”

“Jacques Lacan, em 1938, escrevendo para o tomo VIII da Encyclopédie

Française”, em seu texto A Família, vem eatamente marcar a diferença, mostrando

que a família não é um grupo natural, mas cultural. Ela não se constitui apenas por

homem mulher e filhos. Ela é, antes de tudo, uma estruturação psíquica, onde cada

um de seus membros ocupa um lugar, uma função.”

“Exatamente por ser uma questão de lugar e função, que é possível, no

Direito que se faça e que exista o instituto da adoção”.

4. A PROMISCUIDADE

“Até o início do século XIX acreditava-se que existiu uma época primitiva em que

imperava o comércio sexual promíscuo de maneira que cada mulher pertencia a

todos os homens e cada homem a todas as mulheres”

“Esta é uma idéia já ultrapassada. Havia, sim, desde o início, impedimentos e tabus”.

5. O INCESTO – A RIMEIRA LEI: LEI DE DIREITO DE FAMÍLIA

“A investigação antropológica de Freud permitiu-lhe concluir que ‘os começos da

religião da moral, da sociedade e da arte convergem para o Complexo de Édipo’. E o

complexo de Édipo nada mais é do que a “Lei do Pai”.

“O incesto é a base de todas as proibições. É então a primeira lei. É a lei fundante e

estruturante do sujeito e, consequentemente, da sociedade e, portanto, do

ordenamento jurídico.

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“Constitui o passo fundamental graças ao qual, pelo qual, mas sobretudo no qual se

realiza a passagem da natureza para a cultura”.

“Por isso podemos afirmar que a primeira lei, aquela que estrutura todos os

ordenamentos jurídicos, é uma lei do Direito de Família”.

6. A LEI DO PAI E O FUNDAMENTO DA LEI EM KELSEN E FREUD.

“Assim, Kelsen e Freud, ao investigarem a origem das leis, parecem da mesma

forma ter se deparado com o mesmo referencial, a primeira lei, que é a base da

cultura, da linguagem e da possibilidade das relações entre homens, ou seja, uma lei

que é fundante de nossa estruturação psíquica”.

7. FAMÍLIA E CASAMENTO

“O Código Civil de 2002 em seu artigo 1511 diz que ‘o casamento estabelece

comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos

cônjuges’”.

“Após a decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da União Estável, não permitir

o casamento entre pessoas do mesmo sexo é defender uma completa incoerência

no sistema jurídico brasileiro.”

“A redução do número de casamentos não significa que as entidades familiares

estão em decadência. Ao contrário, temos a reafirmação de que o casamento não é

a única hipótese para consagração da configuração familiar”.

CAPÍTULO 2 – OUTRAS FORMAS DE FAMÍLIA

“O casamento deixou de ser um instituto preordenado à reprodução para se

constituir essencialmente em espaço de companheirismo e de camaradagem, era

natural que se definisse a demanda pelo reconhecimento legal da união entre

parceiros do mesmo sexo”.

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“Os profissionais do Direito não têm o direito de tratar as questões que envolvem a

sexualidade de forma moralista. Quem vê o desejo sexual do outro como uma

patologia é sempre moralista.”

“Imperiosidade da interpretação não reducionista do conceito de família como

instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil.”

“Segundo Moura Bittencourt, a expressão concubinato tem duplo sentido. Um é o

sentido analógico à “união livre”, que é toda ligação de homem e mulher fora do

casamento. Um sentido mais específico é o que se refere ao semimatrimônio, à

posse do estado de casado, ao entrosamento de vida e de interesses numa

comunhão de fato. É um casamento de fato. É a convivência more uxório...”

“O nosso texto constitucional denominou concubinato de ‘união estável’, numa

expressão que traduz, na atualidade uma melhor idéia desta instituição tão antiga e

tão atual”.

“Em síntese, União Estável é a relação afetivo-amorosa entre duas pessoas com

estabilidade e durabilidade, vivendo sobre o mesmo teto ou não, constituindo família

sem vínculo civil. E concubinato é a relação conjugal, seja simultânea ao casamento

civil ou uma União Estável”.

“A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão ‘família’, não limita sua

formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou

liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída

entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária

relação tricotômica.

“... as pessoas solteiras ou descasadas, que vivem sozinhas com seus filhos, sem a

permanência do parceiro amoroso. São as famílias chamadas monoparentais”.

“O essencial para a constituição e a formação do ser, para torná-lo sujeito capaz de

estabelecer laço social, é que alguém ocupe, em seu imaginário, lugar simbólico de

pai e mãe”.

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CAPÍTULO 3 – O GOVERNO DA FAMÍLIA

“Assim, podemos dizer que o mundo é masculino. Até mesmo uma mulher, quando

ascende ao poder, quando exerce uma função de autoridade, apresenta-se com um

discurso masculino. É o que Freud nomeia de discurso “fálico”. Aquele que advém

de uma força que, supostamente, é masculina”.

“O que a nova ordem mundial nos traz é um redirecionamento de papéis, na

estruturação da família, em que se questiona e redimensiona o lugar do homem e da

mulher”.

“Embora a mulher estivesse no centro do simbolismo primitivo, as mulheres de fato

eram impotentes. Nem um fiapo de prova apóia a existência do matriarcado em

parte alguma do mundo, em qualquer época. Matriarcado, domínio político das

mulheres, não deve ser confundido com matrilinhagem, transmissão passiva de

autoridade ou propriedade pelo lado feminino”.

“O nosso Código Civil de 1916, sob grande influência napoleônica, veio substituir leis

esparsas de origem portuguesa. Naquela época (1916), significou um grande

avanço, se comparado com a legislação anterior, quando designou à mulher o direito

de assumir, com o casamento, os apelidos do marido e a condição de consorte e

companheira, além de conferir a ela o direito de dispor livremente do produto do seu

trabalho”.

“... introduzindo a regra humilhante de seu art. 6º., que colocava a mulher casada ao

lado dos reativamente incapazes. Também tirava da mãe que contraísse novas

núpcias o pátrio poder sobre os filhos do primeiro leito. Essa incapacidade era

minorada quanto a determinados atos pois tanto a mulher quanto o marido

precisavam da anuência um do outro para legitimar a prática destes atos, como por

exemplo, para a alienação de bens”

“A Lei 4.121/62 – Estatuto da Mulher Casada – incorporado ao Código Civil de 1996,

corrigiu algumas aberrações. Outras ainda permaneceram, como a que considerava

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erro essencial sobre a pessoa o defloramento da mulher, ignorado pelo marido,

como causa para anulação do casamento”.

“Da mesma forma, aquele estatuto não revogou o artigo que autorizava o pai a

deserdar a filha que vive sobre o seu teto, por desonestidade, entendendo-se por

desonesto o comportamento sexual em desacordo com a moral paterna”.

“A Constituição de 1998 não concede ao marido qualquer privilégio e as decisões

que interessam à família deverão ser tomadas por ambos os cônjuges”.

“A igualdade dos cônjuges deságua em território novo, atingindo o Código Civil, com

reflexos práticos de profundo alcance”.

“Com a evolução do pensamento, especialmente o surgimento da psicanálise,

associado aos movimentos sociais liderados pelas próprias ‘incapazes’, foi-lhes

concedido um pouco a mais: a capacidade”.

“A tendência de todo o mundo ocidental apontou para a igualização de direitos entre

o gênero masculino e o feminino”.

CAPÍTULO 4 – PATRIARCALISMO

“Foi assim, nesse contexto, na evolução do pensamento ocidental que o Direito,

transformando sua linguagem, evoluindo sua casuística, desenvolveu-se em uma

estrutura patriarcal. Foram ou doutores e sacerdotes, os pater familiae, o reforço e o

modelo de um sistema calcado na autoridade paterna”.

CAPÍTULO 5 – IGUALDADE: FALÁCIA DO NOSSO TEMPO

“Desde a Carta da ONU, em 1948, ficou declarada a igualdade de direitos entre

todos os seres humanos”.

“A questão da igualização de direitos, entre os gêneros não se resolve simplesmente

por meio de textos legislativos. No Brasil, por exemplo, a Lei Maior, mais que

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esclarecer, afirma essa igualdade. Entretanto, não há de fato tal igualdade. Há uma

distância entre o fato e o Direito”.

“Apesar da proclamação da igualdade pelos organismos internacionais e pelas

Constituições democráticas do fim deste século, não está dissolvida a desigualdade

dos gêneros”.

“A mulher continua sendo objeto de igualdade enquanto o homem é o sujeito e o

paradigma desse pretenso sistema de igualdade. Isto, por si só, já é um paradoxo

para o qual o Direito ainda não tem resposta: qualquer tentativa e normatização

sobre essa igualdade terá como paradigma, inexoravelmente, um discurso

masculino.”

“No campos específico do Direito das Famílias essas ações afirmativas viriam

reconhecer diferenças não só biológicas, mas principalmente as de ordem cultural.

Maternidade e paternidade, pelo menos até que estes valores sejam repensados ou

restabelecidos em nossa cultura, são exercidos de formas completamente

diferenciadas.”

“Estas discriminações são positivas, pois constituem, na verdade, preceitos

compensatórios como soluções para superar as diferenças”. (Aqui, o autor se refere

a Lei Maria da Penha e outras ações afirmativas”.

“Ao que se deve atentar não é a igualdade perante a lei, mas ao direito à igualdade

mediante a eliminação das desigualdades, o que impõe que se estabeleçam

diferenciações específicas como única forma de dar efetividade ao preceito

econômico consagrado na Constituição.”

CAPÍTULO 6 - A PARTE DA MULHER E A MÃE

“A história da mulher no Direito, ou o lugar dado pelo Direito à mulher, sempre foi um

não lugar. Na realidade, a presença da mulher é a história de uma ausência, pois ela

sempre existiu subordinada ao marido, sem voz e marcada pelo regime da

incapacidade”.

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“Podemos apontar pontos avanços na História do Direito contemporâneo em direção

à inclusão da cidadania jurídica da mulher. O ponto de partida talvez tenha sido

mesmo a Revolução Francesa com sua idéias libertárias.”

“O Código Civil Brasileiro de 1916, como a maioria dos códigos ocidentais europeus

e os da América Latina, continuou reproduzindo a “ausência” da mulher na cena

pública e excluída a cidadania jurídica. Ela nunca aparecia sozinho e só existia na

cena jurídica em relação ao pai ou ao marido. Era quase um não sujeito.”

“No Brasil, foi somente em 1962, com o Estatuto da Mulher Casada, que lhe foi

permitido praticar atos jurídicos. Alguns Tribunais começaram, a partir daí, a

interpretar o Código Civil de 1916 em direção à igualdade de direitos e gêneros”.

“E, finalmente, com a Constituição de 1988, em seu art. 5º, declarou a igualdade

entre homens e mulheres”.

“Esses dispositivos constitucionais são, na verdade, enunciados de que a regra

jurídica, no sistema do contexto patriarcal, forçosamente, tem alterado suas

concepções sobre sexualidade feminina, autorizando à mulher uma cidadania”.

“Mas esse lugar conquistado, em que a mulher era emoldurada e confinada à

reprodução e produção privada, só foi possível graças à aliança de interesses com o

próprio homem e um repensar na divisão sexual do trabalho. Afinal, para esse

sistema a mulher também é força produtiva”.

“A partir da filosofia iluminista, que a mulher começou a reivindicar acesso à cena

pública. Com a Revolução Industrial, ela sai da ordem doméstica para ajudar na

produção em série”.

“Após as duas grandes guerras mundiais, estava quebrado um dos pilares da

submissão da mulher, que era a impossibilidade de seu acesso direito ao mercado

de trabalho”.

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“Na década de 1950, quando a sociedade produtiva tornava-se uma sociedade de

consumo, é lançado em Paris (1950) o livro da jovem filósofa Simone de Beauvoir,

sob o título de O Segundo Sexo. Foi o primeiro livro consistente sobre a condição da

mulher no patriarcado. Mas foi somente em 1963, com o lançamento da Mística

Feminina, de Betty Friedan, saindo dos meios acadêmicos, que surgiram os

movimentos feministas que, em pouco tempo, espalharam-se pelo mundo

Ocidental”.

“Para que o Direito posso apreender a noção mais profunda daquilo que é justo e

afinal cumprir sua função primeira, que está na idéia de justiça, torna-se necessário

compreender um outro campo; o da subjetividade feminina”.

“Freud explica: não encontrando em seu próprio corpo, o órgão fálico socialmente

valorizado, as mulheres se identificam com a falta. E como tal, procurarão nortear a

sua vida na posição daquela que não tem e precisa receber de quem tem”.

“Portanto, a gravidez, a maternidade, segundo a Psicanálise, é como uma forma de

virilização, em que a mulher, sentindo a “plenitude”, esbarra nos sinais e símbolos

da cultura falocêntrica.”

“Embora a Psicanálise engendre sua teoria a partir da cultura falocêntrica, ela não

desvaloriza o feminino. Ao contrário, ela traz esse “enigma” para o seu centro.

“A feminilidade ocupa um lugar-mestre através da sua própria exclusão, tão longe

quanto remontam as reminescências, as lembranças e as construções da infância.”

“Freud revela isso quando constrói a sua teoria a partir das sexualidades, em que o

feminino é simbolizado como aquele que não tem, ou melhor, a partir daquele que

sabe que tem a falta”.

“Marcar as diferenças talvez seja o primeiro passo para apontar a submissão de um

gênero ao outro”.

CAPÍTULO 7 – A PARTE DO PAI – A IDENTIDADE MASCULINA

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“Alteradas a definição e certeza dos papéis masculino e feminino, não há ainda uma

redefinição que se adapte ao psiquismo masculino e feminino”.

“A História, a Psicanálise, o Direito e até mesmo as religiões asseguraram ao

homem, principalmente como pai, um lugar mais que fundamental: fundante.”

“Para Lacan, a lei básica é o tabu social do incesto, e a figura do pai ou nom-du-

père, como autor dessa lei, simboliza a repressão do desejo criminoso,

especialmente da forma de desejo libidinal latente da criança em manter relação

sexual com a mãe.”

“A representação do pai é então o primeiro encontro da criança com a lei, no sentido

de que ele representa efetivamente uma proibição libidinal do filho com a mãe,

sendo que esse desejo edípico da criança é necessariamente submerso no

inconsciente”.

“Para Deleuzei e Guatari, o Estado tem um inconsciente que, segundo Lacan, deve

ser sujeito em relação à lei. Nesse sentido, o Estado pode ser visto como

constituinte da figura do pai que autoriza e promulga essa lei”.

“Para o Direito, pai é aquele que empresta seu nome na certidão de nascimento do

filho”.

“Uma vez estabelecida a paternidade por meio do registro civil, decorrem daí direitos

e obrigações, com o sustento, de guarda e de educação.”

“A lei 8.069/1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente, trouxe

novos elementos sobre a concepção do pátrio poder (poder familiar, na expressão

do Código Civil Brasileiro de 2002) e paternidade. Ao estabelecer sobre famílias

naturais e substitutas, essa lei introduz inovações ao referir-se aos “pais sociais”. É

na compreensão social do pai e da mãe, desprendendo-se do fator meramente

biológico, que esse estatuto vem ampliar o conceito de pai, realçando a sua função

social”.

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“Se procurarmos na etnologia e na antropologia, poderemos encontrar as inúmeras

facetas das relações de parentesco e os elementos determinantes da paternidade.

Em seu núcleo constata-se que a relação paterna não repousa em um dado natural”.

“Embora os ordenamento jurídicos ocidentais em geral determinem a paternidade

biológica como fonte de responsabilidade civil, a verdadeira paternidade só se torna

possível a partir um ato de vontade ou de um desejo”.

“Outra contraprova do ‘fantasma’ dos laços de sangue como legitimador da

paternidade, ou maternidade, é o próprio instituto milenar da adoção”.

“É essencial como estruturante na formação psíquica dos filhos, para ser um terceiro

na relação mãe-filho. É exatamente este terceiro (pai) que vem separar a mãe do

filho, possibilitando que ele se torne um sujeito”.

“Mesmo na ausência, o pai se faz presente pelo discurso da mãe. Esta fala da mãe

é decisiva para a criança e marca o referencial de lei”.

“A relação do filho com o pai, por uma questão cultural advinda da ideologia

patriarcal, sempre foi marcada, como já se disse, por uma ausência no aspecto

afetivo, assim considerada em relação à mãe”.

“Judicialmente, a recusa se explica por serem os juízes também inseridos no

contexto da ideologia patriarcal, embora a lei determine que os filhos ficarão com

quem melhor tiver condições para educá-los”.

“Pelo lado da mãe, mesmo aquelas que trabalham fora o dia inteiro sabem que as

crianças são uma carga pesada. Para algumas, as compensações afetivas valem o

preço”.

“Bem no fundo, elas sentem sua preeminêcia materna como um poder que não

querem dividir, mesmo que seja à custa de seu esgotamento físico e psíquico”.

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“A função paterna se desdobra em três funções. Uma função biológica, ligada à

reprodução. Uma função educativa, psicopedagógica. Uma função social, de

transmissão do nome e patrimônio. Para Lacan, essas funções derivam da função

básica de um pai – que é interditar a simbiótica relação mãe-filho, sendo o outro que

possibilita ao filho o acesso à cultura”.

“No pós-feminismo, o pai divide com a mãe os cuidados com as crianças e os

afazeres domésticos, daí a idéia de guarda compartilhada, hoje traduzida em nosso

ordenamento jurídico pela Lei 11.698/2008.”

“Mas interessa-nos trazer para o Direito o que a Psicanálise já desenvolveu em sua

teoria, principalmente após Lacan. O pai pode exercer todas essas funções mas elas

constituem, na verdade, uma conseqüência, ou um derivado, da função básica de

um pai e que está na essência de toda cultura e de todos os tempos: o pai, ou

melhor, ‘um’ pai que exerça a função de representante da lei básica e primeira,

essencial para que todo ser possa humanizar-se por meio da linguagem e tornar-se

sujeito. Esse pai, como já se disse, não é necessariamente o pai-genitor, mas

aquele que empresta o seu para interferir e interditar a simbiótica relação mãe-filho.

Ele é o outro que possibilita ao filho o acesso à cultura.”

“Filhos ilegítimos são aqueles nascidos fora da relação matrimonializada, como os

adulterinos, incestuosos, ou mesmo os ‘naturais’. Legítimos são aqueles nascidos do

casamento”.

“No §6º do art. 227 da Constituição Federal, proibiu qualquer discriminação aos

filhos havidos ou não da relação do casamento ou por adoção”.

“Em 1977, a Lei 6.515, mais conhecida como Lei do Divórcio, em seu art. 51,

modificou a Lei 883, permitindo o reconhecimento da paternidade ainda na

constância do casamento, desde que em testamento cerrado.”

“Em 1984, a Lei 7.250 permitiu o reconhecimento do filho adulterino, se o pai

estivesse separado de fato de seu cônjuge por mais de cinco anos”.

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“Em 1989, a Lei 7.841 revogou expressamente o art. 358 do Código Civil brasileiro,

embora ele já estivesse tacitamente revogado por força da Constituição de 1988”.