Filosofia Cl+¡nica - Caderno S - Perguntas & Respostas

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Caderno S perguntas & respostas (v ersão abril de 1998) 1 1 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

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Caderno S perguntas & respostas (versão abril de 1998)

Instituto PackterCel. Lucas de Oliveira, 1937conjuntos 301 / 302 / 303 / 304Porto Alegre - RSCEP 90 460 - 001fone / fax (051) 330 66 34http://www.filosofiaclinica.com.br

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INTRODUÇÃO

Este Caderno S, Perguntas & Respostas, não faz parte do programa de formação do filósofo clínico. É um Caderno extraordinário que surge por reivindicação de meus alunos, colegas e colaboradores.

Agrupei ordenadamente as perguntas por seqüência natural dos conteúdos do curso, e busquei responder a todas as perguntas remetidas neste primeiro trimestre de 1998. Sempre que me foi possível, usei transcrições de gravações feitas em aulas para as respostas.

Tenho a firme intenção de atualizar anualmente o Caderno S, Perguntas & Respostas.

Esta é a versão 99.

Lúcio Packter

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O que é Filosofia Clínica?(Nivaldo Alves)É a Filosofia acadêmica adaptada e direcionada à atividade clínica, realizada por

filósofos formados em faculdades de Filosofia reconhecidas pelo MEC.

A Filosofia é reflexiva, interpretativa e abstrata. Quais os argumentos considerados para levar a Filosofia da discussão acadêmica à prática? (Ian Gomes)

Após os estudos dos empiristas John Locke, George Berkeley, David Hume, e a complementação de Charles Sanders Peirce, William James, John Dewey e George Mead. Após os trabalhos de Edmund Husserl e Maurice Merleau-Ponty em fenomenologia. Após o existencialismo de Martin Buber e de Gabriel Marcel. Mas principalmente após os escritos de Bertrand Russell e G. E. Moore, Wittgenstein, John Wisdom, Gilbert Ryle e John Austin. Também Saussure, Deleuze, Derrida e Foucault... eu me surpreendo que não tenha acontecido bem mais cedo a caminhada em direção à clínica. Esse destino era urgente e se fazia anunciar. Em muitas Universidades onde fiz palestras conheci filósofos que afirmaram já esperar por algo assim; e muitos filósofos já faziam terapia, isolados e quase sempre temerosos, como se fizessem algo ilegal.

Como está a questão da regulamentação da profissão de “filósofo clínico”? (Ana Izabel Strassburger)

Os advogados e contadores do Instituto Packter, a serviço dos filósofos clínicos, estão trabalhando nos últimos aspectos do funcionamento da Associação Brasileira de Filosofia Clínica. O caminho natural é a estruturação do Sindicato, do Conselho e a continuação dos trâmites jurídicos.

Qual órgão (conselho) dá credenciamento à Filosofia Clínica para a prática clínica? (Nivaldo Alves)

A Carta Constituinte dá amparo ao trabalho exercido pelo filósofo clínico, dentro de critérios bem definidos. O Instituto Packter, após consultas ao MEC, aos cartórios e juntas comerciais pertinentes, além dos devidos aspectos contábeis (impostos, notas fiscais etc) enviou aos filósofos clínicos um parecer jurídico assinado pelos advogados Flávio Denardin Gonçalez (OAB/RS 19 454) e Tancredo Luiz Leal Dutra (OAB/RS 23 287), onde consta literalmente: “...cabe registrar a inexistência de qualquer dispositivo legal a impedir o funcionamento do curso de Especialização em Filosofia Clínica. Assim, é possível afirmar-se a respeito da inteira legalidade da pretensão do Instituto Consulente”.

Os critérios que tornam legal a clínica filosófica são muitos: atuar com autores e escritos e procedimentos da Filosofia acadêmica, não receitar drogas alopáticas, não exercer procedimentos próprios da atividade médica e para a qual o filósofo não tem habilitação - como cirurgias -, ser graduado em Filosofia por uma Faculdade reconhecida pelo MEC, e os demais critérios que estudamos durante o curso de formação.

Qual é a função social e política da Filosofia Clínica? Quais são as possibilidades, expectativas e limites da Filosofia Clínica e/ou do filósofo clínico para que ambos não tendam à neutralidade social e política? (Joaquim de Souza Lima)

A função social e política da Filosofia Clínica será direcionada conforme cada filósofo. Alguns trabalharão com menores de rua, com crianças em colégios, talvez com partidarismo político. Não me cabe definir isso. Na verdade, acho que não sei responder a essa questão. Posso afirmar apenas que não creio que um filósofo clínico consiga a neutralidade no que se refere a contextos sociais e políticos.

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Por que o filósofo clínico deve ter como partilhante apenas alguém com quem possa ter amizade, conforme o Caderno A? (Nivaldo Alves)

Conforme estudamos em Filosofia Clínica, “isso é assim para mim”. Minha EP está construída dessa maneira, de modo que somente trabalho aproximadamente assim, tendo em conta as exceções. Há filósofos que não dão qualquer relevância a essa opinião minha. Não é uma regra geral.

Como a Filosofia Clínica vai vencer o preconceito e a mentalidade enraizada no meio acadêmico de que o filósofo não deve descer ao prático, mas dar interpretações e soluções teóricas? (Aldo Antolli)

Não sei se vencerá esse tipo de preconceito ou outros preconceitos. Também não estou interessado nisso. Nunca houve um filósofo que conseguisse a unanimidade na academia ou fora dela, e penso que estou muito longe de ser o primeiro, se é que isso um dia acontecerá. Entendo que o preconceito e a crítica são parte do processo filosófico. São inevitáveis.

Será que na Itália vai pegar um projeto que vem do Brasil, país subdesenvolvido? Coloco a pergunta porque, indo à Itália, pretendo implantar a Filosofia Clínica. Mas fica a dúvida: pode ser coisa boa o que vem de um país mais conhecido por fornecer homossexuais, mulatas, jogadores de futebol? (Aldo Antolli)

Resposta categórica: não sei.

O professor Lúcio, no Caderno C, faz um comentário: “Acho que até aqui podem ter ficado com a concepção fragmentada da clínica filosófica... agora podem apostar que é parte de um caleidoscópio”. Sinto realmente que os Cadernos fazem parte do caleidoscópio, que ao folhear encontramos informações importantes - como o caleidoscópio que ao girar faz um desenho. Assim o mesmo acontece com os Cadernos. É bonito, mas um tanto complicado essa fragmentação de dados. Será que faz parte da didática da Filosofia Clínica? Ou veremos na Matemática Simbólica? (Marina Dias dos Reis)

Essa fragmentação não faz parte da didática. Se existe alguma didática nos nossos Cadernos, ela é certamente péssima. Os Cadernos são coletâneas avulsas de material, de rascunhos, de apontamentos. Eles ganham consistência com as aulas práticas. Deixo às centenas de filósofos clínicos brasileiros a tarefa de compendiar didaticamente esse material todo.

Existem alguns filósofos que desenvolveram trabalhos sobre as categorias de Aristóteles. Entre esses, li um pouco Ryle na Coleção ‘Os Pensadores’. Existem determinados trechos que se familiarizam muito com o que você expõe na Filosofia Clínica. Eu poderia dizer que a Filosofia Clínica já existia e estava teoricamente contextualizada?

O que o levou a desenvolver este trabalho? Adaptar a Filosofia à clínica e trazê-la à prática? (Veralúcia Porto)

A Filosofia Clínica é a Filosofia adaptada à clínica. É natural que se encontre fragmentos dela espalhados por muitos autores, como em Ryle, cuja leitura recomendo.

O que me levou a desenvolver este trabalho foi uma seqüência de constatações que começou a ganhar importância e urgência. Primeiro, uma ruptura irremediável com o modo tradicional de terapia. Segundo, a busca e o encontro de um novo caminho. Em minha EP senti a necessidade de compartilhar meu trabalho com todos os filósofos que quisessem saber algo sobre minha pesquisa.

A Filosofia Clínica é um juízo sintético a priori ou é um juízo analítico? (pergunta durante a palestra na PUC de Campinas)

Penso que é um juízo sintético a priori e também um juízo sintético a posteriori.

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Como ter certeza de que ao concluir o curso seremos profissionais competentes? Como ter certeza de que não estaremos brincando com a vida, com os sentimentos, as dores das pessoas que nos procuram? (Neusa Thiesen)

Certeza?! Não tenho como saber a resposta para isso.Considero um profissional competente em Filosofia Clínica quem conhece a teoria e a

prática com propriedade para fazer os Exames das Categorias, pesquisar a EP, indicar e utilizar os Submodos e, se possível, entender os desdobramentos da Matemática Simbólica. Mas é evidente que este é somente o meu critério. Acredito que outros filósofos clínicos desenvolvem outros critérios.

Certeza sobre brincar ou não com os outros, no sentido de não respeitar e não considerar a EP como ela se apresenta, é algo íntimo. Quanto a isso, posso responder apenas por mim.

“...ouvi tudo com ceticismo e quero crer que esta é mais uma semente de modismos como a Neurolingüística, o tarô, as artes de adivinhação para dar emprego a filósofos desempregados. Cheira a oportunismo.” (Afirmação feita durante palestra na Pontifícia Universidade Católica, de Minas Gerais)

Para mim, a Filosofia Clínica é linda e honesta. Isso me basta. Penso que para cada pessoa ela será uma coisa, boa ou má, certa ou errada, e às vezes será de tudo um pouco.

Aliar Filosofia à clínica parece causar “arrepios” aos “amigos do saber”. Podemos afirmar que até agora tem havido um enorme “ranger de dentes” (dos incrédulos, dos raivosos, daqueles que julgam, com isso, “sujar as mãos”). E há aqueles que se “arrepiam”, mas nem tanto. É o arrepio dos que se sentem provocados, desafiados e curiosos e esperançosos... Talvez seja essa a “clientela” dos cursos de Filosofia Clínica: nós, os bacharéis e os licenciados em Filosofia. E, fazendo parte desse grupo, tenho me perguntado:

a . O que possui essa “clínica”, de singular, que se autorize denominar Filosofia Clínica? (Angela Sousa - questão levantada também pelo coordenador do Departamento de Filosofia da Universidade Federal da Bahia, durante palestra realizada por Packter)

Clínica, na acepção dada em nosso trabalho, nada tem a ver com as questões da saúde relacionadas à medicina e à psicologia. Clínica, aqui, tem o sentido de análise (da parte ao todo); ou do todo às partes (no caso da Matemática Simbólica); tem o sentido de crítica aproximado ao mencionado por Kant, mas difere por ser uma pesquisa que a EP (do filósofo clínico) realiza de si mesma ou de outra pessoa; ainda, e talvez o principal sentido: pesquisa dos desdobramentos existenciais da pessoa.

b. Quem foi ou quais foram os precursores dessa “idéia” - da Filosofia como possibilidade clínica? (E que a tenham sistematizado.) (Angela Sousa)

(Transcrição de gravação realizada em aula) “Acredito muito que os nossos precursores foram os pré-socráticos. Gente como Protágoras, Diógenes e Heráclito. Parece que depois disso as coisas ficaram fáceis. Veio Sócrates. Muito tempo depois, filósofos como Maimônides, Spinoza, os empiristas, Kant, os analíticos e praticamente toda a Filosofia da Linguagem... em especial, Wittgenstein, claro. Desde que Sócrates emparedava a pessoa com pontos de interrogação já se pode dizer que havia algum tipo de clínica.”

c. Como, de fato, deu-se a experiência européia desta “idéia”, considerando informações trazidas pelo próprio Lúcio de que em países como França e Holanda consultórios foram abertos - até proliferaram - e em seguida foram desaparecendo sem que se tivesse notícia, no mundo acadêmico ou fora dele, de tal existência? (Angela Sousa)

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Não apenas Holanda e França, mas também Alemanha e Inglaterra. Na Europa, o que eu presenciei da filosofia de aconselhamento ou conselheira, a filosofia prática, me despertou a curiosidade. Até onde acompanhei os trabalhos, pude constatar que se tratava de um trabalho à base de aconselhamento. Cada filósofo usava seus conhecimentos acadêmicos conforme a linha filosófica que preferisse. As linhas existencialistas e fenomenológicas eram as mais usadas. Correntes metafísicas pontilhavam na Alemanha. No mundo acadêmico, na Europa, estas experiências eram comentadas com descrédito e ironia. Não imagino porque foi tão pouco noticiado na imprensa brasileira.

d. Sendo Lúcio precursor e realizador dessa “idéia” no Brasil, que experiências o inspiraram? O que o fez prestar um vestibular para Filosofia? Foi mesmo o que nos parece? - para dar legitimidade ao seu projeto filosófico? (Angela Sousa)

A experiência que mais me inspirou foi o afastamento da Psicanálise. Depois de estudos nas escolas somáticas (Ida Rolf, Reich, Lowen) e nas escolas da forma (Gestalt), voltei diretamente à Filosofia. Quanto mais me aprofundava em Hume e Locke, Russell, Wittgenstein e Merlau-Ponty mais eu sabia que não haveria outro caminho longe da Filosofia.

O que me fez prestar vestibular para Filosofia e cursá-la na academia foi exatamente a questão da legitimidade. Eu tinha um certificado anterior que não era reconhecido pelo MEC e, dessa forma, não tinha valor jurídico. Fiz a faculdade de Filosofia para poder implantar a Filosofia Clínica dentro dos critérios exigidos pela lei. Faria outras três vezes, se fosse preciso.

e. É mesmo possível tantos filósofos (haja vista o elenco de filósofos apontados como pais

da Filosofia Clínica) serem reunidos para dar sustentação ao que se está chamando de Filosofia Clínica? Ou seja, esses “caras” autorizariam isso? Autorizariam dizer que suas idéias referendam a Filosofia como possibilidade clínica? (Angela Sousa)

Se é possível a reunião de tantos filósofos para os fins da Filosofia Clínica? Penso que sim. Mas eu não saberia fazer Filosofia Clínica tendo como guia um deles apenas. Seria uma mutilação.

Penso também que muitos dos filósofos que freqüentam a Filosofia Clínica com seus escritos não autorizariam o uso que emprestei de suas obras e o que desenvolvi a partir dali. Acredito que alguns seriam meus inimigos declarados.

f. A propagação dessa “idéia” e dessa “prática” não estará acelerada demais? Não estará atraindo “profissionais” ou “graduados” de segunda classe, dispersos no mercado de trabalho? Tais profissionais atraídos por essa “nova esperança” ou “impensada possibilidade”, até então, de aplicar conhecimentos adquiridos em cursos com pouco “status”, alguns com muita razão (por serem péssimos)? Por enquanto, são muitos os alunos. Em breve serão muitos os “profissionais” ávidos por clinicar e, portanto, à mercê da mídia, dos opositores naturais, dos clientes insatisfeitos e de si mesmos - pelo deslumbramento inicial e por uma “inconsistência” conceitual, intelectual, cultural etc, comum àqueles que não têm por hábito o exercício intelectual e o respeito ao “humano”- concomitantemente. (Angela Sousa)

A propagação da Filosofia Clínica está acelerada, demais mesmo. Independente do meu desejo, grupos se formam, copiam cadernos e disquetes, elaboram programas de estudo, grupos de discussões e trabalhos de pesquisa estão surgindo por toda a parte, nas Universidades e fora delas (monografias, teses de mestrado e de doutorado).

Sim, a Filosofia Clínica também está atraindo filósofos de diferentes formações, lugares etc. Se está atraindo “graduados de segunda classe”, como dizes, acho que só com o trabalho e os resultados poderemos saber. Mas acho que não sei o que é “segunda classe” em Filosofia. Segunda classe seria o doutor em Kant que vive numa redoma de vidro ou o filósofo que

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desconhece a Filosofia acadêmica, mas que vive em meio à floresta realizando pesquisas filosóficas empíricas, como alguns dos filósofos clínicos de Manaus, na Amazônia?

Não tenho como saber até o momento o que faz com que os filósofos procurem a Filosofia Clínica: “nova esperança”, nova opção ou outra razão.

Penso que os “opositores naturais”, os “clientes insatisfeitos”, nós mesmos e a “mídia”, conforme me perguntas, são inevitáveis. Fazem parte de uma enorme estrutura. Tenho acompanhado isso e outras manifestações curiosas. Quanto aos opositores, há de tudo um pouco: os que não leram e não sabem nada a respeito mas que têm opiniões fundamentadas sobre isso que não conhecem; os que fizeram um estudo torto e maledicente para poderem ser maledicentes; os que gostariam de ter tido essa “idéia” mas não tiveram; os distraídos, os invejosos, os acomodados, os justos, os que respeitam e conhecem e não concordam, os debatedores, os teóricos, os franco-atiradores, os incomodados com os resultados do meu trabalho, os incomodados com o resultado do trabalho deles mesmos, os polêmicos, os interessados, os que gostam e querem ajudar etc etc.

Os “clientes insatisfeitos”, que bom, são pouquíssimos!A exposição à mídia considero uma loteria que gira conforme os ventos.Quanto às expectativas que cada um tem quando se deslumbra e depois quando deixa de

se deslumbrar, simplesmente somente posso dizer: sinto muito. Faço o meu trabalho com toda a minha dedicação, com todo o meu esforço e o meu coração. Acho que esta é a minha parte.

g. Por que não fazer seleções para ingresso? Por que permitir ingresso livre, portanto,

que o pretendente percorra ‘um certo caminho’, para “empacar” num estágio e transformar-se num detrator da “Filosofia Clínica”?(Angela Sousa)

Este tipo de detrator freqüenta muito a Filosofia Clínica. Já pedi o afastamento de alunos por atitudes anti-éticas, já afastei sumariamente outros, outros se desligaram sem deixar a menor saudade, alguns chegaram apenas para apedrejar de perto - já que de longe as pedras pareciam cair no próprio quintal. Não tenho qualquer ilusão quanto a universalidade do discurso. A mensagem de meu trabalho não é para todos. Muitos chegam e muitos vão. Alguns estão apenas de passagem e acabam ficando. Outros vêm com promessas e certezas que vão estar juntos conosco por toda a vida, e isso dura por apenas poucos dias. Ainda outros filósofos apreciam somente um pedaço do caminho, optando por algum outro em meio à jornada. Alguns querem participar apenas olhando. Há filósofos que entendem a mensagem mas não concordam com ela. Há filósofos que concordam e não conseguem vivê-la ou aplicá-la e então se voltam contra si mesmos, contra o professor ou contra o mundo, mas também podem encontrar a paz em si mesmos exatamente por serem assim. Penso que isso é parte inevitável do trabalho. A exigência que faço como seleção é ter o diploma de graduação em Filosofia ou ser graduando.

O tempo estipulado para a duração do curso de Especialização é suficiente para formar um filósofo clínico competente? (Neusa Thiesen)

Na minha opinião, não. Por isso, a maioria somente adquire o Certificado A meses e meses após o término das aulas regulares. O problema vai além do tempo, o problema é como o tempo é utilizado. Para ser filósofo clínico, o estudante leva em torno de cinco anos e meio, sendo quatro desses anos o período de graduação em Filosofia. Ocorre que no Brasil, com pouquíssimas exceções, o ensino da Filosofia nas faculdades é muito deficiente. Os alunos se habituam a ler comentadores e resumos de obras e de filósofos. Quando então chegam à Especialização em Filosofia Clínica, perde-se um precioso momento que poderia ser aplicado à clínica porque os alunos precisam estudar o que infelizmente não viram na faculdade. Em muitas ocasiões precisei simplesmente parar as aulas para trabalhar os escritos de Merleau-Ponty, Wittgenstein e Kant com os filósofos, coisas que eles deveriam ter muito bem fresco na cabeça! O curso de Especialização, em Filosofia Clínica, dos meus sonhos, seria assim: 9h00 até

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12h00 - aulas teóricas; 14h00 até 18h00 - prática de submodos; 19h30 até 21h00 - acompanhamento de casos clínicos. O aluno teria aulas o dia inteiro, de segunda à sexta-feira, por um período de dois anos. Espero em breve realizar isso com a abertura de uma turma para filósofos do exterior, em Porto Alegre - dependendo dos convites que estamos remetendo e recebendo deles. As aulas serão proferidas em inglês a filósofos que virão com bolsas de estudo integrais de instituições estrangeiras. Mas quanto ao Brasil, acho que para a nossa realidade isso ainda vai demorar a acontecer.

Por que os filósofos (clínicos ou não) do exterior não vêm até aqui? Por que ainda não há este intercâmbio? (Ana Izabel Strassburger)

Um eufemismo vai bem aqui: porque a Filosofia no Brasil é ainda criança, por assim dizer. Sugiro o contrário como pergunta: por que nós ainda não fomos ao exterior? Resposta: porque ainda estamos nos preparando muito para isso, muito mesmo. Não jogaria um aluno meu a uma arena acadêmica que o devorasse, ainda mais tão longe de casa.

Cansei de ouvir de colegas, amigos, conhecidos... formados em Filosofia - sobre a Filosofia Clínica: “falta fundamentação teórica”. Como a Filosofia Clínica responderia a esta questão da “fundamentação”? (Edimarcio Testa) Qual o método da Filosofia Clínica? (Gilberto Espíndola)

Fundamentação teórica e métodos:- Historicismo e Logicismo Formal.- Empirismo inglês.- Analítica da Linguagem.- Epistemologia.- Matemática Simbólica.Logicismo formal e historicidade, nos exames categoriais; depois, empirismo inglês,

analítica da linguagem, epistemologia e matemática simbólica. Quanto aos métodos: historicista; fenomenológico; epistemológico. O filósofo clínico inicia com os Exames Categoriais, pesquisa a Estrutura de Pensamento e então utiliza os submodos (conforme orientação dos exames anteriores).

A Filosofia Clínica reconhece a existência da esquizofrenia ou a existência de patologias mentais graves? (Carlos Michaelis)

No Caderno O, dedicado às questões médicas, estudamos termos como a esquizofrenia. A Filosofia Clínica reconhece a existência das patologias graves quando consideradas do ponto de vista da medicina psiquiátrica, longe de um parecer filosófico.

A Filosofia Clínica não é mais uma linha de psicologia revestida por uma nomenclatura filosófica? Os psicólogos não poderão alegar isso e se apropriarem dos submodos? Não poderão alegar o fato de que o sistematizador, o codificador da Filosofia Clínica, antes de ser filósofo formado era profissional do campo psicológico-psicanalítico? (Carlos Michaelis)

Acho que a Filosofia Clínica é um puro exercício filosófico nas questões existenciais. Essas questões vão muito adiante das psicologias. Elas não se limitam a problemas comportamentais, mas abrangem aspectos axiológicos, epistemológicos, éticos etc - próprios da Filosofia.

Quanto a apropriação de profissionais de outras áreas do uso dos submodos, penso que isso é inevitável. Vai acontecer de um jeito ou de outro, como já se anuncia aos poucos. Acredito que isso contribuirá com a nossa pesquisa. Seria horrível trancarmos nossos ensinamentos em um cofre. Quanto às alegações sobre minhas influências, sinceramente, podem dizer o que quiserem. À vontade.

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Quando a Filosofia Clínica é um mal ou um bem ao cliente? (Antonio Carlos Reis)É um mal quando feita de modo irresponsável ou incompetente; é um bem quando

realizada de modo responsável e competente - eticamente. Mas há variações que devem ser consideradas. As complexidades nas quais a pessoa se encontra podem se agravar diante de um exame clínico, e o filósofo talvez não tenha como saber disso até ser tarde demais. Pode acontecer também de existir qualidades de interseção que não sejam propícias ao trabalho em clínica, levando a um mal-estar por parte da pessoa. De um modo geral, não se trata de colocar a avaliação entre “bem” e “mal”, mas entre trabalhar as combinações tópicas à EP e verificar os resultados dessa atividade.

O que um filósofo clínico pode realmente afirmar sobre o método da Filosofia Clínica? (Roberto Maciel)

Tenho ouvido muitas afirmações: que é lento, que é rápido demais, que considera o todo, que não considera o todo, que é muito difícil, que é fácil. O método está aí para ser discutido e desenvolvido cada vez mais.

Quais os grandes terrores epistemológicos da Filosofia Clínica? (Roberto Maciel)Posso apenas falar de um temor meu, talvez o maior com relação à Filosofia Clínica: o

medo do dogma, do encerramento de nossos estudos em um corpo fechado e avesso às pesquisas dos filósofos do futuro. Epistemologicamente, seria lamentável.

Como fundamentar a escolha de Protágoras como fundamento da Filosofia Clínica sem ser simplesmente dogmático ou sem formar um círculo (petição de princípio)? (César Schirmer)

Sem ser dogmático? É simples: basta oferecê-lo como opção, como assunto de discussão e não como algo pronto e fechado. Aliás, há filósofos clínicos que simplesmente não gostam e não concordam com Protágoras. Quando cito Protágoras estou colocando que “isso é assim para mim”, não sei se é também para as centenas de filósofos clínicos.

Quais os principais autores trabalhados na Filosofia Clínica? (Sheldon Mattos)Protágoras, Sócrates, Aristóteles, Schopenhauer, Locke, Hume, Nietzsche, Kant, Spinoza,

Merleau-Ponty, Ricoeur, Gadamer, Kuhn, Gabriel Marcel, Levinas, Mounier, Bergson, Husserl, Wittgenstein e o pessoal do Círculo de Viena, Chomsky, Foucault, Lévi-Strauss, principalmente. Outros autores são trabalhados em menor escala.

O que é a pessoa para a Filosofia Clínica? (Elídio dos Santos Neto)Pelos nossos escritos, uma criatura plástica cuja identidade se molda conforme sua EP se

forma e evolui.

Até que ponto está completa a Filosofia Clínica? (César Schirmer)(Transcrição de gravação realizada em aula) “...antes de filósofos clínicos, vocês são

filósofos. Quero, então, pedir um favor, um grande favor, para mim: não tomem os ensinamentos que passo como dogmas; eles não são fórmulas perfeitas. Acredito que os próximos filósofos clínicos terão a tarefa de revisar e aprimorar muitas coisas. Ouçam o que passo e critiquem duramente minhas posições. A Filosofia Clínica precisa seguir crescendo.”

Já que a Filosofia Clínica tem como base a aplicação de uma técnica de colheita de material, como não deixar os significados conceituais pré-existentes no cliente interferir com os do filósofo clínico? (Maria de Lourdes Monteiro)

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Sem que exista interferência, não haverá clínica. A questão principal é como trabalhar os conteúdos do cliente e do filósofo que estão em interseção. Em alguns casos o trabalho clínico pode ser deturpado, torcido ou impedido de continuar. O filósofo clínico passa por pré-estágio e estágio supervisionado exatamente para colocar na ordem do dia questões como esta.

Muita coisa que a gente vê na teoria não fecha com a prática. (Nichele Paulo)Concordo e assino junto. A relação entre teoria e prática nas humanas é em ampla escala

algo problemático. Na Filosofia Clínica estamos tentando tornar tais laços mais amistosos colocando os alunos na prática clínica o quanto antes! No segundo ou terceiro mês, dependendo do desenvolvimento de cada um, já é possível entrar em pré-estágio. Explico nas aulas que os 18 Cadernos são apenas apontamentos e não servem como um documento amplo o suficiente para fotografar a atividade clínica, eles servem apenas de suporte. É necessária a prática em aula e em especial muita prática de submodos.

Eu estou deixando a Filosofia Clínica porque não acredito nela, não acredito no teu trabalho, não acredito no que tu falas. (R. O .- comunicando por telefone que estava deixando o curso)

Entendo que a qualidade e a intensidade de interseção entre as pessoas e suas Eps determinam as relações. Não posso ir magicamente além do meu trabalho e das condições que me acompanham. Creio que para algumas pessoas são muitos os caminhos. A Filosofia Clínica talvez seja apenas mais um deles. De minha parte, amo e acredito no trabalho que faço.

Quais as diferenças entre a Filosofia Clínica e as disciplinas: Psicologia, Psicanálise e Psiquiatria? (pergunta feita durante palestra na Universidade Federal de Minas Gerais)

(Packter, em palestra proferida na Universidade Católica de Pelotas) “Em princípio: fundamentação e método. A Filosofia Clínica usa quase que exclusivamente os escritos e autores da própria Filosofia acadêmica; não contém tipologia; não usa termos como normal X patológico; não utiliza drogas medicamentosas alopáticas; não usa procedimentos clínicos a priori. A Filosofia Clínica é construída a começar da pessoa.”

É fato não existir normal e patológico em Filosofia Clínica. O que você tem a dizer sobre uma pessoa que aprecia matar outras pessoas? (Maria da Soledade)

Que esta pessoa está estruturada de tal maneira que é esse um dos comportamentos resultantes de sua EP. Que apreciar matar os outros não é bom nem mau, certo nem errado, normal ou patológico, mas que é assim que ocorre quando na EP a determinação é essa. Acontece que dependendo do contexto social, político, histórico, humanístico, cultural, religioso e outros, matar pode ser crime. Levinas explora isso ao tratar do rosto. Matar em guerra é heroísmo, matar em tempos de paz é crime; às vezes, a diferença esta na época e no lugar onde está a pessoa.

É também evidente que se aparecer em meu consultório uma pessoa que aprecia matar outras pessoas, eu devo tomar imediatamente providências legais e éticas da época e do contexto em que vivo. Particularmente, não acho que deve andar livremente em nossas ruas pessoas que apreciem matar outras pessoas, independente da maneira que elejam para matar: de fome, através de balas de revólver ou de mentiras políticas, por traição amorosa, por roubo, e por outras maneiras.

Lúcio, o que pode ser mais grave para o ser humano entre os itens a seguir: violência sexual, fome, falta de amor ou outras coisas? (Maria da Soledade)

Acredito que cada item desses será mais ou menos grave conforme a EP onde ocorra e da maneira como acontecer.

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Sabendo o filósofo clínico que a pessoa que veio até ele já passou por vários outros especialistas, não seria bom e necessário para montar a EP ter os diagnósticos realizados por esses? Não seria um ato de virtuosidade da Filosofia Clínica querer começar do zero e podendo até levar a pessoa a um cansaço mental? (Joaquim de Souza Lima)

Faz parte da cooperação multidisciplinar conferir os diagnósticos de outros colegas. Depois, o filósofo deve começar os Exames Categoriais para montar a EP. Há meios eficazes de se evitar o cansaço mental demasiado e desnecessário.

Por que não temos as aulas do Caderno Psiquiátrico com um psiquiatra, como manda a lei? (César Schirmer)

Até onde eu sei, a lei não manda isso.

Qual o procedimento de atendimento usual em Filosofia Clínica? (pergunta feita na Universidade Federal do Pará, durante palestra realizada por Packter)

O filósofo inicia realizando os Exames Categoriais. Depois, elabora a Estrutura de Pensamento da pessoa. Em seguida, recorre aos submodos.

A quem é indicado o atendimento? (Maria de Lourdes Almeida - pergunta feita também durante palestra na Universidade Federal do Amazonas)

A qualquer pessoa que busque pelos serviços do filósofo e que não esteja impedida legalmente de ter um trabalho com ele. A Filosofia Clínica se ocupa do modo de existência humana, da maneira como a pessoa existe.

O que quer dizer que a Filosofia Clínica vai além das causas comportamentais das psicologias? (Nivaldo Alves)

Significa que vai às questões existenciais: aborto, suicídio, solidão, angústia, manifestações vividas e não nomeadas, entre outras causas, como por exemplo as questões de violência urbana, conflitos armados, assuntos da alma etc. A ênfase comportamental é apenas um aspecto entre muitos outros na Filosofia Clínica.

Quem o filósofo clínico não poderá atender? (pergunta feita em palestra nas Faculdades Claretianas, em Batatais)

Pessoas que estejam impedidas socialmente, judicialmente, ou que não desejam o tratamento, ou que resolvam interrompê-lo em seu andamento; além disso, há outros casos mencionados no Código de Ética.

Se a pessoa já passou por vários especialistas e nada... e seu caso, somaticamente, não tem solução, como a Filosofia Clínica poderá acompanhá-la e minorar o sofrimento? Ela por acaso é algum ópio consolador? Quais são essas possibilidades? São apenas a presença afetiva do filósofo? (Joaquim de Souza Lima)

Se o caso, somaticamente, não tem solução, como um câncer terminal, o filósofo pode fazer os Exames Categoriais por aproximação (entrevistando-se com pessoas muito próximas a quem está em tratamento), ou, ainda, tirar por aproximação a EP da pessoa, com as evidentes limitações neste caso. Aqui, o filósofo trabalhará sob condições desfavoráveis; a clínica tem o caráter de acompanhamento. Os submodos realmente procurarão minorar o sofrimento da pessoa, procurarão algum tipo de acomodação junto à EP que possibilite algum conforto, ou desfecho, ou busca existencial que seja possível. Dependendo do estado do organismo, quase nada é possível ao filósofo fazer. Mas, ainda assim, acredito que se deve tentar.

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Se a Filosofia Clínica não trabalha com os conceitos de “cura” e “patologia”. Qual é a função dela no processo clínico? (Dildo Brasil)

A função é acompanhar as diferentes formações tópicas da EP e suas relações com os submodos, estudar as interseções de Eps, quando relevante, e trabalhar estas sobreposições dentro das circunstâncias existenciais da pessoa. Isso nada tem a ver com cura e com patologia. Tem a ver com o que se faz com os dados da existência da pessoa.

Se Lúcio Packter é psiquiatra, por que ele diz que a Filosofia Clínica não deve tê-la em conta? (Dildo Brasil)

Se eu disse isso, errei. Deve tê-la em conta e trabalhar com ela. Em muitos casos o filósofo vai precisar que o psiquiatra medique a pessoa que ele, o filósofo, está atendendo. A Psiquiatria tem muito a contribuir com o nosso trabalho, principalmente na área de pesquisa.

O filósofo clínico poderá desenvolver seu potencial, ao fazer o pré-estágio, com alguém devidamente orientado (no caso, um aluno do curso)? Isso de certa forma não compromete a análise final da avaliação? (Ian Gomes)

O programa básico de curso, que pode variar muito de aluno para aluno, é o seguinte: teoria; teoria e estudo em literatura e vídeo; treinamento com música, relatos e escritos gerais; pré-estágio feito entre os filósofos clínicos em formação com supervisão do filósofo clínico; teoria e estudo de casos clínicos; estágio feito entre filósofos clínicos em formação com supervisão do filósofo clínico; atendimento externo supervisionado. Acredito que esta opção é melhor que uma outra que exponha o aprendiz diretamente a um atendimento externo.

Sobre o comprometimento da avaliação, creio que na maioria dos casos é irrelevante - para efeito de aprendizagem - que é o nosso objetivo.

O filósofo clínico pode e/ou deve direcionar para o aconselhamento quando solicitado

pela pessoa? (Joaquim de Souza Lima)Nem sempre. O que a pessoa solicita nem sempre é o caminho que descobrimos em sua

EP. O aconselhamento, em Filosofia Clínica, somente tem lugar quando faz sentido e encontra acolhida na EP da pessoa. Muitas Eps não toleram conselhos, ainda que a pessoa os peça.

O filósofo clínico poderá atender à mulher, uma filha, mãe, irmão, namorada? (pergunta em palestra na Universidade Católica de Santos)

Depende da EP do filósofo e da interseção que se estabelece. Alguns filósofos poderão fazer esse tipo de atendimento; outros, não. Da mesma maneira, às vezes um filósofo pode fazer uma auto-análise com excelentes resultados, e muitas vezes nem mesmo tentará fazer algo assim.

Quais os critérios práticos para se avaliar o aluno de Filosofia Clínica? (Gilberto Espíndola)

Avaliações escritas; estudo das interseções feitas em aula com os colegas, com as exposições em vídeo, com os estudos de casos clínicos; pré-estágio e estágio supervisionados.

Desaconselhar a leitura de, por exemplo, Sartre, não seria um pré-juízo do professor que pode prejudicar o senso crítico do filósofo, sobretudo o que está em formação? (Gilberto Espíndola)

Sim, concordo. Por isso, peço que me perdoe por ter dito algo que depois me causou arrependimento. Seria um absurdo desaconselhar isso.

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Supondo uma rápida evolução da informática (aparecimento de emoções na máquina), como adaptá-la de forma que ela, em seus raciocínios exatos, passe a não direcionar as atitudes e as ações dos seres humanos? (Erasmo Cericatto)

Os estudos com robótica e inteligência artificial, com lógica simbólica, mostram que em breve teremos criaturas perfeitamente mais desenvolvidas que o ser humano, levando-se em conta a maturação de nosso sistema nervoso. O que está para acontecer é maravilhoso e revolucionário. Seria muito pobre querer prever como serão tais relações com os seres humanos porque até o momento a única voz a ser ouvida é a nossa.

A Filosofia Clínica tem registros dos trabalhos realizados, como Freud fazia? (pergunta de professor da Universidade Estadual do Ceará durante palestra de Packter)

Sim, registros gravados, filmados e escritos. Esses registros são autorizados pelas pessoas e usados unicamente para estudos clínicos. Cuidamos de trocar nomes e referências que possam identificar as pessoas envolvidas.

Gostaria de saber: quem não obtiver o Certificado A, e sim o B - que função poderá exercer? (Sandra Mara Coelho)

Pesquisa e ensino teórico dos aspectos didáticos.

O que são os Exames Categoriais?(Nivaldo Alves)São exames iniciais cujo objetivo é o de localizar existencialmente a pessoa. Exemplo:

onde mora, qual o idioma, como é a situação política e histórica em seu país, e assim sucessivamente.

Ontem fiz o relato de boa parte de minha vida. Bem, à noite, acordei chorando, lembrei de momentos bem tristes, de fatos dolorosos e quase esquecidos. Isso me causou mal-estar, náusea, enjôos, nó na garganta. Não falo da insônia porque já é algo comum, mas estes sintomas em Filosofia Clínica são normais? Significa que a clínica está tendo resultado ou deve ser suspensa? (Veralúcia Porto)

Durante o pré-estágio, que é o seu caso, o filósofo tem uma primeira aproximação ao que de fato será a atividade prática. Ao relatar sua história por si mesmo, muitas coisas ocorrem, como o que houve com você. A pessoa pode sentir alívio, dor, medo, tristeza, alegria, surpresa, um pouco de cada coisa, pode querer parar, parar e refletir, simplesmente continuar. Às vezes, a pessoa pode ter encontrado trechos dolorosos ou trechos que ela não quer relatar.

É cedo para verificar os resultados clínicos ou para suspender a atividade clínica. Em geral, diante de um desconforto da pessoa durante o histórico, os dados divisórios, os Exames das Categorias, o que o filósofo clínico faz é evitar ao máximo o afrontamento de representação - quando possível. Para isso, poderá trocar os dados de Semiose (canais de expressão), recorrer a submodos de apoio (ainda que correndo riscos necessários), optar por Reconstrução, ir adiante para retomar o assunto quando tiver alguns dados divisórios complementares, e ainda outros recursos que podem ser utilizados conforme o caso.

O que é Estrutura de Pensamento?(Nivaldo Alves)É o modo como a pessoa está neste planeta. Aquilo que a pessoa é. Todos os dados que a

habitam e estão nela interrelacionados: dados cognitivos, espirituais, abstratos, emocionais etc...

O filósofo clínico deve pesquisar sua própria EP? (pergunta feita na PUC de Campinas durante palestra de Packter)

Se quiser ou julgar necessário ou, ainda, se seu coordenador assim avaliar, sim. Mas não se trata de algo fundamental. É um absurdo ter como imperativo querer se “conhecer” para

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poder trabalhar com as pessoas! Em alguns casos isso pode ser essencial, em muitos outros casos pode ser desnecessário e até desastroso.

[aula realizada em Ribeirão Preto] “...talvez pareça difícil. Vamos ilustrar isso. Olhem, às vezes a pessoa se estruturou de modo a viver predominantemente em recíproca de inversão, e tem uma existência aprazível sob os aspectos éticos e cognitivos, ajudando a si mesma e aos outros sendo assim. É, e tem mais. Ela pode ser ignorante sobre a própria EP, e, ao mesmo tempo, é uma especialista na pesquisa da EP de outras pessoas! Por que não?! E já que estamos sendo atrevidos, quero dizer que o contrário é também verdadeiro. Sim senhores. Ser um grande entendido - seja lá o que é isso - na própria EP não garante nenhuma eficácia e eficiência no atendimento a outras Eps. Sinto muito se estou desmoronando sonhos antigos... a prática clínica provavelmente vai ensinar estas e outras coisas a vocês, podem saber que sim...”

O que é submodo? (Nivaldo Alves)É o modo informal que uma pessoa utiliza para expressar ou dar vazão ao que vai em sua

EP. Em clínica, é o modo que o filósofo utiliza para trabalhar as questões principais da pessoa. O submodo é composto com os dados colhidos junto à EP da pessoa - somente assim tem sentido.

Cultos religiosos, macumba, carnaval etc podem ser chamados de submodos informais coletivos? (Benedito Machado)

Acredito que sim. Na Matemática Simbólica estudamos os conjuntos mais que as partes. Nesse sentido, é admissível esta expressão cunhada por Benedito Machado: “submodo informal coletivo”. Evidentemente, conforme o logicismo formal, que a extensão sendo maior a compreensão será menor.

Quando é que um tópico da EP se confunde com um submodo a tal ponto que o filósofo clínico não consegue identificar um e outro? (Paulo Sérgio Rodrigues da Silva)

São muitas as ocasiões em que algo assim pode acontecer. E há centenas de situações limites, quando o filósofo não tem como averiguar se está diante de um conceito ou de um termo. Um exemplo é quando temos dor de barriga e fazemos caretas por causa da dor; como delimitar o quanto exatamente temos de EP e de submodos nisso? Em critérios gerais, tudo o que está na pessoa é parte da EP dela, e tudo o que ela expressa é parte dos submodos. Mas há acontecimentos limites. Em muitas ocasiões o filósofo clínico não conseguirá identificar, restando o dado descritivo. Outras vezes, nem mesmo isso ele terá.

Na maioria das vezes, a diferenciação é simples.As dúvidas, quando ocorrerem, podem ser resolvidas - quase sempre - da seguinte

maneira:a . Descrevendo o fato, e não nomeando.b. Estudando os movimentos autogênicos.c. Observando criteriosamente o histórico.

É possível a uma pessoa usar os submodos somente como conceito? Explique como. (Paulo Sérgio Rodrigues da Silva)

Nos Cadernos avançados da Matemática Simbólica (P, Q, R) estudaremos que os submodos e a EP são intimamente relacionados, quando não são apenas aspectos de um todo. Nesse caso, os submodos podem ser usados como conceitos, unicamente. Um exemplo é fazer um Esquema Resolutivo apenas em pensamento, com um mínimo de interferência externa.

Qual a necessidade de textos em inglês no Caderno G? Em que isso contribui para o aprendizado do aluno? Não parece um tanto pedante? (Pedro Aparecido Arruda)

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Sempre que possível, procuro usar textos em português, principalmente considerando a qualidade da tradução. Em alguns casos não há tradução ou não tenho tempo para traduzir textos extensos, o que aconteceu com o Caderno G.

Não seria oportuno um dicionário de Filosofia Clínica, especialmente quando algum termo tem significado mais amplo ou até diferente do usual? Exemplo: Armadilha Conceitual. (Pedro Aparecido Arruda)

Sim, oportuno, necessário. Fica como sugestão aos filósofos clínicos.

Quais as atitudes características básicas de autocrítica que a Filosofia Clínica deverá ter diante do questionamento das outras áreas da ciência e da sociedade em geral? (Ademir Kreling)

Gostaria que a Filosofia Clínica recebesse estas críticas e as estudasse, caso a caso. Penso que seria uma perda enorme se simplesmente as críticas fossem rebatidas sem qualquer reflexão mais profunda a respeito. Nós, filósofos, passamos a maior parte de nossas vidas acadêmicas criticando tudo e todos; é interessante que agora estejamos em uma situação não muito habitual. Tenho acompanhado críticas bem fundamentadas, inteligentes, que somente ajudam a aprimorar o meu trabalho. As críticas tolas servem para distrair o humor.

Na fundamentação da Filosofia Clínica, o decisivo me parece ser a experiência, a prática. Quais os parâmetros da experiência e qual a prática satisfatória para se superar um autor ou para se acrescentar um tópico à EP? (José Ismar Petrola)

Acho que esse é o caminho natural do desenvolvimento do nosso trabalho. Tenho conferido que muitos filósofos, hábeis, têm se juntado à Filosofia Clínica. Esses, e os que virão depois deles, levarão os nossos trabalhos aonde sequer podemos hoje imaginar. Acredito que terão por nós o mesmo carinho e respeito que temos por Protágoras, Sócrates e pelos outros. A experiência clínica levará a isso, mas qual a experiência precisa, isso eu não sei.

O que se pretende com a Filosofia Clínica? O bem-estar? O livrar de uma situação incômoda? Tornar o cliente um filósofo? (José Ismar Petrola)

Num primeiro momento, localizar os choques principais, as formações tópicas problemáticas à EP, e trabalhar com elas usando os submodos. A Filosofia Clínica não busca a “cura”, mas sim um modo de ser no mundo que esteja em conformação com a EP da pessoa, considerando-se, é claro, todas as objeções: legais, de saúde, existenciais etc.

Qual a importância do estudo da Matemática Simbólica para o estágio de Filosofia

Clínica? (Vera Schneider)O entendimento do todo e dos todos em interceção. A Matemática Simbólica propicia a

apreensão do conjunto. Nós estudamos a Filosofia Clínica a começar das partes, de cada tópico isoladamente, de cada submodo; depois estudamos as combinações e associações possíveis e prováveis. Aos poucos vamos considerando conjuntos cada vez maiores, até que enfim chegamos ao todo.

Se é a EP da pessoa quem decide, Deus tem algum significado para a Filosofia Clínica? (Antonio Barbon)

Para mim, Deus tem um significado importante. Para muitos filósofos clínicos ele apenas não existe. A EP de cada pessoa identificará essa questão.

Segundo Freud (psicanálise) é impossível ser feliz na civilização, ou seja, dentro do contexto social. E o mal-estar gerado faz com que os indivíduos sigam alguns caminhos que os farão amenizar a infelicidade (mal-estar), como por exemplo: a religião; as artes; as drogas e o

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amor. Como a Filosofia Clínica pode se posicionar ou criticar estes dogmas formados pela psicanálise no sentido de (talvez) desmistificar ou fazer paralelos em relação a isso? (Yochabel Moitas)

Não sou um filósofo indicado para criticar o trabalho de Freud. Particularmente, sinto gratidão pelo que o trabalho dele fez ao abrir portas até então inacessíveis ao humanismo.

Como filósofo clínico não posso concordar com o que esse médico postulou. Entendo que é possível estar bem, muito bem, subjetivamente, em meio à sociedade; isso depende das interceções da EP do indivíduo e da própria EP em si mesma. A religião e o amor podem ser instrumentos de sublimação, mas nem tanto e nem sempre.

Como filósofo acredito na plasticidade da pessoa, sei que ela pode ser muitas coisas longe de toda classificação possível. É honesto dizer que algumas pessoas, no entanto, são tão previsíveis quanto um relógio digital.

Como explicar que os submodos são formas sem conteúdo se ao mesmo tempo os submodos são as maneiras com as quais as pessoas exercitam o que está nelas? (Adão de Souza)

Vejamos o submodo Em Direção ao Termo Singular, por exemplo. Nós sabemos sua forma: um receptáculo apropriado para dados celulares, específicos, unitários em seus entendimentos. Mas não sabemos qual a natureza, o caráter, o conteúdo que terão. Serão toques, aromas, um termo verbal, um termo proprioceptivo? Nesse aspecto, forma e conteúdo lembram muito as orientações de Kant quanto a Tempo e Espaço, no sentido de constituírem o invólucro de recepção.

Por que os itens que compõem a lista de submodos não são chamados de tópicos, como os itens que compõem a lista da EP? (Lígia Quevedo)

Tópicos referem-se a lugar e relação. Usualmente, os tópicos estão associados de um jeito ou de outro. Raramente um tópico encontra-se ilhado e incomunicável. Quanto aos submodos, é habitual verificar que podem estar perfeitamente isolados. Refiro-me especificamente à identificação: fazer (submodo) é corriqueiramente mais fácil de identificar do que ser (dados da EP) - do ponto de vista do clínico.

Por que, ao serem explanados os tópicos da EP e os submodos, não são indicados em todos a procedência, a fonte? Durante as aulas, alguns têm referência à fonte, mas em outras não! (Ana Izabel Strassburger)

Penso que um filósofo que domine os ensinamentos passados na Universidade, mais seu esforço pessoal em estudos posteriores, pode facilmente identificar a maneira como adaptei a Filosofia clássica à terapia. Pode identificar a origem de cada tópico e de cada submodo. Ainda assim, no Caderno Q - Matemática Simbólica II - essa questão é minuciosamente pesquisada.

Como não afrontar a EP de uma pessoa? (Sandra Mara Coelho)Pode-se reduzir o risco de afrontamento cuidando de entender a EP da pessoa. Mas não

há garantia de não afrontar! Às vezes o filósofo somente se dá conta do afrontamento quando ele já aconteceu.

O sujeito se anestesiar, ir para dentro de si mesmo, mergulhar em si mesmo como um submodo, é realmente tão ruim para ele mesmo? Será que realmente ele está se sentindo mal... que precise reverter esse quadro? E se para ele, dentro dele mesmo, estiver bem? (Sandra Mara Coelho)

De fato, também me faço estas perguntas. Acredito que algumas vezes mergulhar em si mesmo e fechar umas tantas portas para o exterior não é exatamente ruim à pessoa. Pode ser uma resposta ao que está sendo vivido.

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Talvez o maior problema aqui não seja a situação da pessoa, mas sim o modo como as demais pessoas lidam com ela. Principalmente, o que se pode constatar é que há uma ruptura na maneira usual de comunicação. Isso leva a desentendimentos graves como por exemplo procurar fazer com que a pessoa seja como era anteriormente - utilizando drogas medicamentosas e outros recursos. É oportuno lembrar que a Medicina trata a Esquizofrenia como doença, ao contrário de nós filósofos.

Quem é o filósofo clínico? (pergunta habitual nas entrevistas às TVs)É o filósofo, graduado em uma faculdade reconhecida pelo MEC, que cursou (e,

portanto, obteve o Certificado A ou o Certificado B) a especialização em Filosofia Clínica em algum dos centros autorizados.

Quais as limitações da Filosofia Clínica? (Janes F. Tomelin)No meu entender, as limitações principais da Filosofia Clínica, neste momento, são as

que seguem: formação precária dos filósofos nas Universidades, formação precária do filósofo clínico nos Institutos de Filosofia Clínica, o modo de ser da Filosofia para com ela mesma e para com as outras disciplinas, o difícil entendimento de que algumas fantasias acadêmicas funcionam apenas como exercício de abstração, as dificuldades econômicas e educacionais do nosso país, a falta de pesquisas para desenvolver submodos e tópicos da EP. No meu entendimento, as limitações são muitas: falta de recursos e de disponibilidade de material para a formação do filósofo clínico; há também limitações da própria Filosofia Clínica enquanto teoria, fundamentação, método. Por exemplo: é necessário termos mais pesquisas em torno dos Exames das Categorias; precisamos identificar outras maneiras de fazê-los, desenvolver maiores precisões, e, principalmente, procurar diminuir o tempo de oito entrevistas para apenas duas ou três. Na EP e nos submodos tenho feito pesquisas usando a Matemática Simbólica para ajustar algumas questões: maior aproximação entre tópicos anômalos e os usuais, maior facilidade no estudo da Autogenia, desenvolvimento dos critérios de verificabilidade, entre outras. Muitos filósofos clínicos estão também desenvolvendo pesquisas na área da educação, da saúde, da consultoria política.

Quais as principais críticas feitas à Filosofia Clínica? (Janes F. Tomelin)Quanto às críticas à Filosofia Clínica, já acompanhei muitas: não se pode levar a

Filosofia a uma atividade clínica; o que é feito no Brasil, em Filosofia, não tem validade; a Filosofia Clínica deveria seguir uma linha única de pensamento e não ter várias linhas; filósofo é um sujeito incapaz de exercer a clínica porque vive nas nuvens; os filósofos deveriam ser clinicados e proibidos de clinicar; Filosofia não serve para nada, e Filosofia Clínica serve menos ainda etc.

Como um professor poderia aplicar os assuntos da Filosofia Clínica às matérias escolares, ao corpo docente e ao corpo discente?(Alberto Thomal)

Seria necessário conhecer a EP da matéria! Assim como uma pessoa, uma sociedade, uma cultura, uma matéria escolar também porta fragmentos ou um modelo de EP. Por exemplo: quais os pré-juízos, as paixões dominantes, os dados axiológicos e epistemológicos contidos no ensino da disciplina História do Brasil, no segundo grau? Também seria necessário conhecer as Eps dos professores e alunos, da escola, e de outros fatores determinantes (às vezes, a política vigente etc). A partir daí, estabelecer as interseções determinantes e traçar uma trajetória de planejamento e pesquisa.

Como se processa, em Filosofia Clínica, o trabalho em grupo? (Yara Varela De Camargo)

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Inicialmente, o filósofo faz uma pesquisa de cada pessoa do grupo, em caso de grupos pequenos. Depois estuda as interseções de Eps. Mas quando o grupo é grande, contendo dezenas de pessoas, esta tarefa é feita de outra maneira: o filósofo realiza uma pesquisa de aproximação procurando tirar a EP do grupo. Em muitas situações, é evidente, tal procedimento não é indicado.

Como é realizada a formação do filósofo clínico? (pergunta durante palestra realizada na Universidade São Judas Tadeu)

O filósofo recebe aulas por um mínimo de 14 meses. Recebe 18 cadernos; realiza um pré-estágio e um duplo estágio supervisionado. Ao término, recebe Certificados A (capacitação à clínica e à pesquisa) ou B (capacitação à pesquisa).

Como são feitos os estágios? (pergunta comum dos filósofos durante a inscrição)O filósofo clínico em formação realiza os exames categoriais, monta a EP e indica os

submodos. Todo o processo é gravado (ou filmado) e transcrito literalmente.

Quando termina o estágio de um aluno do curso de Filosofia Clínica? (Yochabel Moitas)Quando foram feitos os Exames Categoriais, foi elaborada a EP, e foram indicados os

submodos; eventualmente, o aluno recebe autorização para ir adiante, usando os submodos.

Saliento a importância da supervisão continuada nos estágios para maior aproveitamento dos mesmos. (Vera Schneider)

Isso está sendo feito. Estamos tentando implantar no Instituto o acompanhamento consulta a consulta. A supervisão é onerosa, demorada e requer tempo.

Como estão distribuídos os cadernos? (pergunta típica em aula) Cadernos A até G: Exames categoriais e EP. Cadernos H até M: Submodos. Caderno N:

Planejamento Clínico. Caderno O: Neurofisiologia, psiquiatria e farmacologia. Cadernos P, Q, R: Matemática Simbólica I, II, III. A partir do Caderno S: cadernos especiais.

O que é agendamento mínimo? (pergunta típica em aula)É o modo usual de continuidade utilizado durante os Exames das Categorias.

Por que o agendamento mínimo na colheita das categoriais em Filosofia Clínica? (Paulo Rodrigues)

Para procurar ter a história da pessoa contada por ela mesma com um mínimo de interferência por parte do filósofo. A intervenção aqui objetiva a continuação da história até o seu final - com termos como: “e depois, e daí, e então etc”.

Há outras maneiras de se fazer os Exames das Categorias? Quais? (Yara Varela De Camargo)

Há muitas maneiras. Acompanhe:a . Usando primeiro os Submodos, antes dos Exames Categoriais: quando a pessoa chega

tumultuada demais! Neste caso, o filósofo clínico poderá iniciar a clínica usando Esteticidade, Esteticidade Seletiva, Tradução, Atalho - ou uma mescla de vários Submodos. Os riscos existenciais são realmente enormes em tais casos.

b. Por fotografias. A pessoa associa os fatos por imagens.c. Por sons (música, ruídos). A pessoa associa os acontecimentos por sons.

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d. Por intermédio de uma terceira pessoa. Esta reporta a história do cliente, que por algum motivo pode estar impossibilitado de fazê-lo. Em casos assim, os cuidados redobram porque a precisão histórica sofre grande redução.

e. Em casos de pessoas com problemas terminais (câncer, acidentes), às vezes, não se tem como fazer os Exames Categoriais. Quando isso acontece, o filósofo clínico tem sua ação redefinida para um acompanhamento não clínico. Deve-se fazer os Exames Categoriais de pessoas próximas e explorar as circunstâncias que limitam a pessoa existencialmente.

Além desses itens, outros podem ocorrer em nosso trabalho mostrando toda a beleza e a plasticidade desta atividade. Na prática, os caminhos não são iguais, mesmo que assim pareçam.

O que fazer em caso de choques entre as Eps do filósofo clínico e do cliente? (Alberto Thomal)

É bastante comum que isso ocorra. Na maior parte dos casos, isso pode perfeitamente acontecer durante o trabalho clínico devido a incidentes de afrontamento de representações; tais ocorrências são contornáveis na maioria das vezes. No entanto, choques fortes de Eps podem ocorrer inviabilizando a atividade clínica. Sugiro que em situações assim, o filósofo clínico busque orientação com um colega; mas nem sempre é necessário. Certos antagonismos decretam o fim da interseção por incompatibilidade de Eps, e o filósofo pode ter todo o conhecimento dos motivos e conseqüências.

O filósofo clínico pode fazer agendamentos massivos ou máximos? (pergunta freqüente

em aulas iniciais)Pode, e em muitas ocasiões ele realmente deve fazê-lo. Após a montagem da EP é comum

o surgimento cada vez maior de agendamentos máximos.

A psicanálise afirma que a estrutura psicológica do indivíduo é algo que após formado (concluído) não pode ser alterado. O que é possível é que nós aprendamos a conviver com o que eles chamam de traumas. Na Filosofia Clínica o indivíduo possui uma Estrutura de Pensamento (única) que não deve ser criticada ou condenada, e sim compreendida e respeitada. Qual o paralelo que poderíamos formar entre estas duas “correntes” destacando o que há de comum? (Yochabel Moitas)

Da maneira como foi colocado, não consigo destacar o que há de comum. Filosofia Clínica e Psicanálise são diferentes em métodos, fundamentação teórica, princípios, concepções humanas.

O que são saltos lógicos? (Mariza Zambom) São quebras de discurso lógico formal, epistemológicos (de conteúdo) ou ambos. Os elos

de causa e efeito, contigüidade, semelhante, justificação entre conceitos e termos, tudo isso sofre um abalo na continuação.

Os saltos lógicos e temporais são ruins à EP ou à pessoa? (pergunta de Packter aos alunos)

Não! Às vezes constituem o modo informal da pessoa resolver ou lidar com os eventos e lembranças de sua vida. São ruins apenas ao pesquisador que se utiliza dos métodos histórico e fenomenológico no início de sua pesquisa.

Então, o filósofo clínico, ao usar seus métodos de Exames das Categorias, pode estar prejudicando a pessoa, caso ela use dos saltos lógicos e temporais como submodos informais e, mais, essenciais - do ponto de vista existencial? (pergunta de Packter aos alunos)

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Sim, conforme o caso. Quando o filósofo constata isso durante os Exames Categoriais ele deve, necessariamente deve, recuar imediatamente! Nesse caso, o filósofo colherá as categorias aceitando os saltos lógicos e temporais, fará os dados divisórios. Esse procedimento requer experiência e conhecimentos clínicos sólidos por parte do filósofo. Tal atendimento não deve ser feito por filósofos clínicos iniciantes.

O que fazer, em geral, diante de um salto lógico ou temporal durante os Exames Categoriais? (pergunta em palestra na Universidade Católica de Pelotas)

Em geral, procurar trazer a pessoa de volta à parte da narrativa que estava sendo tratada, com a maior proximidade possível.

Como evitar saltos temporais em uma pessoa que distribui os eventos de sua vida de um modo pouco cronológico, e, mais, que não possibilite ao filósofo se localizar quanto ao tempo em que se passam os eventos? (pergunta de Packter aos alunos)

O filósofo fará uma localização por aproximação, considerando que nesse caso ela será imprecisa. Depois tentará precisar melhor as informações através dos dados divisórios. Isso pode ser trabalhoso demais.

Como evitar saltos lógicos quando a pessoa associa eventos de modos inusitados e confusos? (pergunta de Packter aos alunos)

Outra vez, por aproximação. O filósofo deixará passar muitos lapsos lógicos, no entanto conseguirá uma certa ordenação à medida em que a história avança. Poderá também forçar muitos dados divisórios.

A pessoa traz algumas dezenas de fotos ao filósofo durante os Exames Categoriais. O que fazer com esse material em clínica? (pergunta em palestra na Universidade Federal de Minas Gerais)

Fotos, canções, poemas, pinturas, trechos de diário, são habituais durante o trabalho. O filósofo deve contextualizar o quanto antes tais manifestações - por exemplo: se o trecho do diário foi escrito aos 15 anos de idade, é aí que sua localização categorial estará. Se as fotos seguem uma linha cronológica qualquer, elas se somarão ao histórico verbal. Em suma, o filósofo vai localizar a época, a circunstância, os assuntos, os dados que estão contidos no material trazido. Ele dará uma existência histórica a esses dados.

Como lidar com histórias paralelas? Ou seja, primeiro a pessoa conta sua “vida emocional”, depois conta sua “vida profissional” etc... (pergunta em palestra na Universidade Federal do Pará)

Neste caso, é comum que o filósofo somente perceba que está lidando com histórias paralelas quando acabou de ouvir a primeira delas: “a vida emocional”, por exemplo. O jeito é conhecê-las, todas, torcendo para que não sejam muitas... Se forem, o filósofo pode pedir à pessoa para que as sintetize em uma apenas (um risco considerável, uma vez que está utilizando o Atalho - submodo - antes de ter os Exames Categoriais completos.

Por que não deixar a pessoa contar a história dela do jeito que ela quiser, permitindo saltos temporais, lógicos e de toda a espécie, já que o filósofo está mesmo interessado na história dela por ela mesma? A história dela por ela mesma certamente é diferente da história que ela conta sob condição de não haver saltos lógicos, temporais etc...(pergunta de Packter aos alunos)

De fato! O filósofo abre espaço para essa história informal nos momentos iniciais da clínica, quando então observa o Assunto Imediato. Mas os Exames Categoriais objetivam localizar existencialmente a pessoa dentro de parâmetros que possam ser também entendidos

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pelo filósofo clínico, para que assim haja interseção propícia à clínica. Ao permitir um livre depoimento histórico, a pessoa pode se prender ao Assunto Imediato, falando apenas dele, levando o filósofo a considerá-lo determinante - quando na verdade pode ser tudo diferente. Outra coisa: uma história relatada sem fundamentação e método provavelmente deixaria o filósofo clínico tão desorientado quanto a pessoa, no que se refere ao Assunto Último. É como tentar compreender um livro através de uma leitura de páginas que foram previamente embaralhadas.

Quais os critérios básicos para se fazer os Exames Categoriais? (pergunta em palestra na Universidade Federal do Amazonas)

Agendamentos mínimos; evitar saltos temporais e lógicos.

O que são os dados divisórios? Para que servem? Como se faz?(pergunta em palestra na Universidade Católica de Santos)

São os dados que começam a ser colhidos logo após o término da narrativa da pessoa buscando os acontecimentos ordenados entre dois fatos determinados. Servem para documentar com maiores minúcias elementos que ficaram pouco conhecidos.

Considere a reta abaixo, mas especialmente o segmento A até B. 0 A B 60

Vamos supor que em A tenha ocorrido um desses eventos, nomeados pela pessoa:- Aos 22 anos, casei com Maria.- Naquela época eu tinha decidido casar e trabalhar mais.- Foi uma época atribulada em minha vida.

E vamos supor que em B tenha ocorrido:- Aos 40 anos me divorciei de Maria.- Nessa época eu tinha pensando em me aposentar.- Foi um período de esperança.

Pois bem, basta agora buscar por informações que estejam entre as proposições A e B. Por exemplo: “Quero que você me fale o que houve entre seus 22 anos, quando você se casou com Maria, e a época em que você tinha pensado em se aposentar”.

O que é “termo” e o que é “conceito” na Filosofia Clínica? (Adão de Souza)Termo é tudo o que se encontra expresso: som, frase, dados escritos, atos mecânicos como

dançar etc. Conceito é tudo o que está na pessoa mas que ainda não é ou foi manifestado.

O filósofo clínico deve usar as palavras da própria pessoa? Se ela disse “automóvel”, ele deve também dizer “automóvel” - ao invés de dizer “carro, veículo, viatura”?(pergunta em palestra na Universidade São Judas Tadeu)

Em princípio, sim - já que tais termos estão agendados no intelecto na pessoa. No entanto, muitos empecilhos podem ocorrer:

a . A pessoa pode não querer que outros se utilizem se seus termos.b. A pessoa pode se sentir afrontada entendendo tal uso como uma espécie de persuasão,

algo que ela condena.c. A pessoa pode preferir que o filósofo use termos novos e não os mesmos que ela utiliza.d. Os termos que a pessoa usa podem ser um impedimento quando usados como

submodos por perfazerem uma Armadilha Conceitual.

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e. Os termos escolhidos pelo filósofo podem ter pouco peso subjetivo em relação aos termos mais propensos (subjetivamente determinantes) ao uso do submodo indicado.

f. Além desses motivos, há certamente dezenas de outros.

As cinco categorias, oriundas dos trabalhos de Aristóteles e Kant, são usadas conforme aqueles filósofos as usavam? (Valério Hillesheim)

Não. A Filosofia Clínica adaptou à clínica tais termos. Tal adaptação implicou em modificações, às vezes extensas; no entanto, alguns nomes originais foram mantidos principalmente para que os filósofos clínicos saibam de onde se originaram e o autor da pesquisa. O mesmo ocorre com a maioria dos termos utilizados em Filosofia Clínica. Por exemplo: deslocamento (diferente do uso dado por Merleau-Ponty); paixão (diferente do uso dado por Spinoza); semiose e significado (diferente do uso da maioria dos analíticos); verdade (longe dos ensinamentos de Platão, de onde o tiramos); intencionalidade (John Searle). Isso é muito usual em Filosofia! Se você abrir um bom dicionário filosófico e consultar algum termo caro à Filosofia, note as variações que os termos encontram - não apenas de filósofo para filósofo como também de época para época. Quando sugiro aos alunos a leitura dos filósofos e de suas obras quero exatamente que os alunos constatem como os termos surgiram e se modificaram até alcançarem a Filosofia Clínica.

A Filosofia Clínica se assemelha a outras formas de clínicas? O que a Filosofia Clínica absorveu das outras escolas terapêuticas? (Paulo Sérgio Rodrigues da Silva)

Não. A Filosofia Clínica apresenta uma personalidade própria que a diferencia das demais escolas, desde a fundamentação e o método até os procedimentos clínicos.

Por que o assunto imediato pode nada ter a ver com o que será tratado posteriormente em Clínica? (Paulo Rodrigues)

A febre pode ser somente o sinal de um câncer em adiantado andamento. Nesse caso, o médico certamente terá como ocupação o câncer, e não a febre - que é apenas um sinal a indicar o que ocorre. Em nossa clínica, tal analogia serve de paralelo.

É possível trabalhar com um partilhante que nos conte uma história falsa? Por quê? (Paulo Rodrigues)

Sim, é possível que a história falsa seja o submodo informal que ele encontrou para lidar com determinada questão; pode ser que ela cumpra uma Função importante na malha intelectiva etc. Mesmo que a história falsa, deliberada ou não, ultrapasse os Exames Categoriais, a montagem e pesquisa da EP, sem ser detectada, ela certamente não passará incólume pelos Submodos. Os Submodos são a prova dos nove em Filosofia Clínica.

Como, em clínica, eu sei quais os segmentos relevantes para o processo clínico? Como eu sei qual tópico é mais importante na relação da EP? (Paulo Rodrigues)

Se eu te perguntasse quais os fatos relevantes na história do Brasil, provavelmente tu me responderias com dez ou vinte fatos marcantes. Ainda que haja variação entre historiadores, a maioria dos fatos é comum a quase todos. O mesmo ocorre em clínica: tendo o histórico bem pesquisado, o filósofo conhecerá com grande margem de aproximação os segmentos de maior e de menor relevância à vida da pessoa.

O processo é praticamente o mesmo quanto às relações tópicas da EP. A maior parte das ciências contemporâneas tem uma visão mecanicista da vida. Como a

Filosofia Clínica aborda a saúde individual hoje? (Zuleica Marinho de Moura)

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Inicialmente como única e singularizada ao máximo; em seguida, via Matemática Simbólica, dentro de um conjunto. A saúde individual requer um estudo da EP da pessoa para se saber como ela funciona no ambiente onde vive.

Percebo a Filosofia Clínica fundamentada numa “colcha de retalhos” teóricos. Pinça idéias de vários autores sem seguir nenhum deles no todo. Creio ser esta diversidade importante, mas talvez como está muito pulverizada pode ficar sem consistência filosófica. ( Hilda Maria Warken)

Não penso assim. A Filosofia é rica em exemplos de teorias fechadas em torno do pensamento muitas vezes obscuro de um autor; raras vezes a isso se considerou inconsistente. E isso está longe de ser o nosso caso. No entanto, as tentativas de ecletismo - que é o nosso caso - acabam esbarrando repetidamente em paredes fechadas que preferem ouvir o eco das próprias vozes. A Filosofia Clínica é sólida, consistente, coerente - no horizonte das humanas, onde está inserida. Cabe agora aos filósofos clínicos que continue assim.

Por que o filósofo clínico não pode trabalhar com uma pessoa que seja diagnosticada pelo psiquiatra como psicótica e que esteja internada em um hospital recebendo medicação como antipsicóticos? (pergunta em palestra na Universidade Católica de Pelotas)

Por questões da carta constituinte do país. Em tais casos, a pessoa está legalmente interditada, e não pode exercer muitos de seus direitos e deveres na sociedade, como o de transitar e de escolher livremente certas ações (como guiar um carro), além de não ser mais considerada responsável por seus próprios atos. Na verdade, o único impedimento ao filósofo clínico é de natureza legal. Do ponto de vista clínico, poderia perfeitamente dar o atendimento à pessoa.

É possível, em Filosofia Clínica, trabalharmos com paralisias cerebrais - diversas síndromes? (Yara Varela De Camargo)

Sim, em parceria com neurologistas e demais médicos.

Durante as aulas de Filosofia Clínica, os professores costumam usar vídeos (filmes clássicos, por exemplo), música, toques, trabalhos manuais com pincéis e massas, além de explicações teóricas. Isso não distancia o aluno da realidade clínica? (pergunta de Packter aos alunos)

Não mais do que a distancia que o filósofo já vinha tendo da clínica. Em minha opinião, como não tenho a EP de uma turma de 30 alunos..., resta-me procurar fazer uma transição suave e segura entre o academicismo e a prática clínica. E nem sempre isso é possível. Contudo, pelo que tenho acompanhado, quando o filósofo clínico chega ao estágio supervisionado ele já não considera o ser humano como uma coisa ou uma mecanismo metafísico qualquer; na maior parte dos casos.

O que existe primeiro: a pessoa ou a EP? (Nivaldo Alves)Em minha opinião, a pessoa. Suponho que um filósofo clínico que admita fenômenos

como a transmigração das almas já não considere a mesma resposta.

Se o importante na Filosofia Clínica é saber fazer clínica, então não se deveria partir mais para essa aplicação prática? (Nivaldo Alves)

Sim, é o que penso. Estou tentando levar os ensinamentos cada vez mais nesse aspecto. Somente é preciso cuidar muito, caso a caso, a passagem das teorizações puras à prática clínica. Habitualmente, o filósofo precisa de muitos meses para fazer esta transição.

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Os resultados clínicos são sempre verificáveis? (pergunta de Packter aos alunos) Não. Muitas vezes eles são vivenciados de tal modo pela pessoa que o filósofo não tem

como averiguar; outras vezes os resultados podem ser verificados apenas durante os anos subseqüentes à terapia. Estamos na área de humanas, não da de exatas.

Pode haver casos em que o filósofo clínico, mesmo conhecendo muito bem a EP da pessoa e os submodos informais que ela usa, ao usar os submodos muito bem pesquisados não resolver os choques da EP (levando-se em conta que o cliente, na linguagem da Psiquiatria, não tem algum transtorno mental sério)? (Paulo Sérgio da Silva)

Sim, isso pode acontecer muitas e muitas vezes. Depende do tipo de formação e associação tópica, depende das interseções de Eps, depende da natureza dos choques tratados.

Como chamar de “filósofo acadêmico” um terapeuta que fica massageando as costas dos seus clientes? Por que chamar de Filosofia Clínica a mania de os filósofos clínicos serem bondosos, de gostarem de musiquinhas suaves, de terem o a priori de serem agradáveis? Por que não chamar isso de psicologia barata? (César Schirmer)

Cada um que chame como quiser, não me interessa.Tenho a dizer que quando um filósofo toca a pessoa em algum trabalho somático, ele já

tem apurada a EP e sabe como, onde, o motivo e as prováveis conseqüências dos toques. Quanto à bondade e “musiquinhas suaves”, sei que muitos filósofos clínicos não usam música em clínica, e são muito pouco bondosos para o meu gosto. .

Por que a EP se subdivide em 30 tópicos, e não 10, 40 ou 60? (pergunta de Packter aos alunos)

O número não importa. Os tópicos da EP procuram entender a experiência humana enquanto existência. (gravação de aula proferida em São Paulo, em 1996) “...é natural que um homem pré-histórico tenha uma EP estranha a alguém de nossa época. Acho que ele tinha tópicos que deixaram de existir, assim como hoje a gente tem tópicos que seriam inimagináveis ao homem das cavernas. Entendo que a EP é plástica. Ela muda de pessoa para pessoa, ela muda de época para época, ela muda na própria pessoa durante a vida. Na minha opinião seria inadmissível que um de nós tivesse a pretensão de construir uma EP rígida! De jeito nenhum! Os tópicos que usamos na EP são plásticos. Eles certamente mudarão, novos tópicos serão acrescentados e outros cairão velhos... porque essas coisas são assim mesmo. Isso é da vida. Com os avanços da robótica, da inteligência artificial, dos cérebros de silício, bem cedo nós vamos vivenciar experiências nunca constatadas, como se fôssemos astronautas em deslocamento no vácuo, mais ou menos isso.”

Os tópicos da Ep não são similares? (Hilda Warken)Dependendo da informação contida na EP da pessoa, os tópicos podem sofrer uma

combinação tal que desaparecem da forma original e formam novos e inusitados tópicos. Nesse sentido, podemos considerar tópicos similares, díspares, avessos, complementares etc.

A pessoa ao tomar consciência de sua EP faz com que ela resolva seu problema? (Hilda Warken)

Isso varia conforme a EP. Para algumas pessoas, o simples conhecimento do que as incomoda é suficiente para um desfecho ou para uma resolução qualquer; para outras, isso é apenas motivo para mais sofrimento. Tem gente que é especialista nos próprios problemas e deles sabe tudo e isso pode levá-la exatamente a nada. Para outras pessoas, um décimo disso basta para a resolução das coisas.

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Se algum tópico da EP se chocar com ele mesmo, ele pode se anular? (Idalina Krause)Sim. Considere que tu amas e odeias uma pessoa quase na mesma proporção subjetiva.

Vamos considerar também que isso é o bastante para que, na tua EP, esse movimento de informações no mesmo tópico (Emoções, tópico 4) seja o suficiente para anular e excluir este tópico; então, assim será. Mas isso não é regra; para algumas pessoas, amor e ódio não são mutuamente excludentes e antagônicos, mas, às vezes, complementares, ou mesmo harmoniosos.

O que é sensorial, em Filosofia Clínica? (pergunta usual dos alunos)É o que está diretamente relacionado aos sentidos e a dados proprioceptivos. Exemplo:

tocar, ver, sentir etc.

O que é abstrato, em Filosofia Clínica? (pergunta usual dos alunos)É o que está indiretamente relacionado aos sentidos, e diretamente ligado a conceitos.

Exemplo: entender que um aroma é diferente de outro por suas naturezas distintas. Não se trata apenas da universalização das idéias particulares, como em Locke.

Como ocorre quando alguém somente consegue ser sensorial quando está em abstração? (Silvia Helena)

Pense no gosto de uma maçã suculenta, por exemplo.

É possível à pessoa ser totalmente sensorial? (pergunta de Packter aos alunos)Sim. Na experiência de um orgasmo, ao sentir a brisa, ao bater com o martelo no dedo

etc, pode ocorrer assim.

É possível à pessoa ser totalmente abstrata? (pergunta de Packter aos alunos)Sim. Em raciocínios matemáticos, em considerações metafísicas etc, pode ocorrer assim.

O que são emoções? (pergunta de Packter aos alunos)São composições subjetivas de dados sensoriais e abstrato que resultam em estados

afetivos. Exemplo: amor, ternura, ódio etc. Pode ocorrer também de as emoções terem origem em dados somente sensoriais. Exemplo: a mãe ao amamentar a primeira vez e a se emocionar. O mesmo ocorre quanto às abastrações, como na experiência do numinoso ou da revelação.

Quando uma emoção não é um pré-juízo? (Alexandre Bueno)Quando ela é vivenciada como uma construção inusitada, sem base em verdades

subjetivas anteriores. Exemplo: tu descobres que estás apaixonado por sua amiga.

Uma experiência do momento, construída, pode ser um pré-juízo também? (Júlio Trindade)

Sim. Quando sua natureza é tautológica. Exemplo: diante de perguntas que a pessoa considera inoportunas, ela reage sendo também inoportuna. Embora haja em tal experiência o componente do novo, ela também tem componentes de pré-juízos.

É possível vivenciar algo que não tenha vínculo de espécie alguma com os pré-juízos? (Marcos Scussel)

Sim. Certas reações do Sistema Nervoso, intoxicações alimentares, e toda uma série de reações orgânicas podem ter nada a ver com os pré-juízos. Da mesma maneira, certas manifestações comportamentais podem ser distintas e isoladas dos pré-juízos. Exemplo: reações de surpresa ou de espanto. Em outras ocasiões, o peso subjetivo de um pré-juízo em uma experiência é tão ínfimo que sequer há um mínimo de participação daquela parte.

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Quais os pré-juízos usados na Filosofia Clínica, ainda que distintos dos pré-juízos habituais? Quais os pré-juízos da Filosofia Clínica? (Lilhane Hack)

São muitos: o homem como parâmetro e medida das coisas; o mundo como representação pessoal; a EP como maneira de entendimento da pessoa; a plasticidade da criatura humana; a ênfase na individualidade; o estudo e execução dos modos de ação da pessoa; as verdades subjetivas e as convencionadas; a ausência de tipologias prontas; a ausência de procedimentos clínicos prontos; o uso da Filosofia clássica adaptada à clínica, e dezenas de outros pré-juízos que serão mais ou menos importantes conforme a circunstância e o entendimento de cada filósofo clínico.

Quais os critérios de preenchimento tópico quanto à EP? (pergunta usual em aula)Dado padronizado; dado atualizado e dados do Assunto Imediato. (Transcrição de

gravação realizada em aula) “É claro que alguns eventos fogem entre os dedos quando achamos que nossos três critérios de preenchimento tópico apanham tudo. Eles não apanham... porque seria como tentar pegar o próprio ar com as mãos! Os critérios pegam um máximo de informação por aproximação. É bom cuidar muito vivências isoladas que a pessoa teve...ãh, coisas relevantes. Quero dar um exemplo tipo água de poço: um super amor abrasivo, daqueles de incendiar lareira, que veio à noite e se foi antes de amanhecer o dia. Coisas assim isoladas podem ter um grande significado e conseqüência na vida da pessoa. Agora, tudo bem, vocês podem chegar a tais vivências tranqüilamente tendo os milhares de dados divisórios... mas ainda assim essas coisas aparecerão como desdobramento das associações tópicas ou nos submodos.”

Os tópicos da EP e os submodos são originários de filósofos e de escritos filosóficos. Quais deles correspondem a cada tópico e a cada submodo? (Alberto Thomal)

Esta pergunta está respondida, do início ao fim, no Caderno Q, Matemática Simbólica II. A reprodução da mesma aqui tornaria este texto longo em demasia para os propósitos do momento.

É possível discernir e distribuir as informações pelos tópicos da EP como quem separa as roupas que vão nas prateleiras de um armário? Meias em um lugar, calças em outro lugar, camisas e camisetas em outra parte etc? (pergunta feita por Packter aos alunos)

(Transcrição de gravação realizada em aula) “Curioso... sabe que eu não penso a EP como sendo uma casa e suas dependências... quartos, garagens, prateleiras... acho que não é assim. Bem, vou usar figuras de linguagem também para explicar. Eu acho que a EP mistura diversos materiais em diferentes critérios. Assim que eu penso. Talvez vocês encontrem partes da EP de uma pessoa onde as emoções e os valores, por exemplo, encontram-se tão nitidamente separados quanto as meias e as camisas em um armário. Mas acredito também que há partes na EP em que certas combinações, certas manifestações e misturas se encontram tão indistintamente mescladas umas as outras que é praticamente impossível separá-las ou entendê-las separadamente. Olha, isso não é difícil de se entender. Tu podes viver certas emoções que te deixam confuso pela composição que apresentam. Por exemplo: há emoções que agregam juízos, dados epistemológicos, raciocínios pessimamente estruturados de um jeito que não se tem como saber exatamente o que são. Há de tudo um pouco nas Eps.”

Quando uma informação não pode ser definida pelo filósofo como um dado de valor, uma emoção, uma busca, uma intuição, como esta informação será entendida na EP, já que ela não se encontra em algum tópico? (pergunta durante palestra na Universidade Federal de Minas Gerais)

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(Transcrição de gravação realizada em aula) “... quando às vezes um dos senhores se deparar com uma informação qualquer que não seja uma emoção, um valor, um elemento de juízo ou qualquer outra coisa, não é preciso incomodar o professor às 03h00 de uma madrugada bem fria. Primeiro porque o professor não vai gostar. E segundo porque a coisa é bem simples. Quando a pessoa trouxer elementos emaranhados da vida dela, difíceis de compreender devido à estruturação, como esta droga de time do Inter, os senhores me façam o favor de registrar descritivamente essas manifestações, entendem? E depois coloquem esses dados diretamente na Autogenia para que lá eles possam ser considerados em relação aos demais que sejam significativos. E agora que expliquei vou repetir tudinho de novo. Olhem aqui! Vocês simplesmente vão anotar à margem e depois vão pesquisar esses dados com os outros retirados dos tópicos. Esses dados não são nomeados, mas eles são descritos como se manifestam e com suas relações. Meu Deus do céu, mas que coisa mais fácil do mundo, hein?”

No reconhecimento e enquadramento dos tópicos e submodos da EP, até que ponto é possível isolar e verificar uma intromissão da subjetividade do filósofo clínico, e os possíveis desvios provenientes disso? (Maria de Lourdes Almeida)

A atividade clínica resulta da qualidade da interseção entre o filósofo clínico e a pessoa. Por isso, durante o pré-estágio, o estágio e o estudo da própria EP, o aluno tem o acompanhamento do filósofo clínico, precisamente para considerar questões importantes como essa que levantas. Mas ainda assim, às vezes é difícil precisar a interferência da EP do filósofo nas considerações subjetivas da pessoa.

Existindo interseção, a intromissão já é intensa.De um modo geral, o filósofo clínico, após trabalhar e ser trabalhado em clínica, pode

pesquisar suas “intromissões” com boa segurança; pode também recorrer ao trabalho de um colega filósofo.

“Certas manifestações são vividas mas nem sempre são contadas depois ao filósofo durante a clínica. A pessoa pode não se lembrar, ou julgar que não são importantes, ou sentir-se envergonhada ou amedrontada demais para contá-las. Neste caso, como o filósofo terá acesso a tais informações, principalmente se elas forem fundamentais ao trabalho?” (pergunta de Packter aos alunos)

Quando uma vivência é de fato determinante à EP da pessoa, quando uma vivência ou certos conceitos na malha intelectiva têm determinação quanto aos rumos existenciais da pessoa, isso normalmente aparece das seguintes maneiras:

a . Nominalmente, em algum tempo, a pessoa os cita. Exemplo: ter amor, saudade, desejo.

b. Como corolário de associações tópicas. Exemplo: a pessoa sente amor e ódio por uma pessoa, ao mesmo tempo, mas tem como pré-juízo que deve gostar dela; como corolário, sente-se paralisada - quase que literalmente - diante daquela outra.

c. Como submodo. Exemplo: ao não conseguir dizer o que sente, a pessoa pode ter convulsões e vômitos (Esteticidade).

d. Como dado indicativo ou denotativo. Exemplo: agir de uma tal forma com alguém que revele amor, embora jamais se diga verbalmente isso ou o equivalente disso (palavras amorosas etc).

[aula em Florianópolis - Hospital de Caridade] “O que é urgente, determinante, predominante à EP encontra algum caminho de expressão, geralmente encontra. Mas nem sempre é assim. Há exceções que merecem a nossa atenção e quero falar um pouco sobre elas. Uma exceção que pode levar o filósofo a cometer enganos é quando a pessoa usa como submodo informal para algo determinante o silêncio. É como se ela abandonasse o que está acontecendo com ela à sorte, a Deus, ao acaso, e se ocupasse de outras coisas; então, aquela informação fica

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interagindo topicamente com os demais tópicos da EP, fica fazendo uma Autogenia silenciosa, até que de um modo qualquer a questão se equaciona. Isso acontece, não é raro. Pode ocorrer também uma Armadilha Conceitual. A pessoa pode expressar de um modo inusitado o que lhe passa na malha intelectiva, e o filósofo não consegue estabelecer relação entre o que ela é e o que ela faz, como se uma coisa não levasse à outra... uma direção que eu considero segura é voltar aos dados divisórios sempre que as coisas parecerem confusas”

O que uma pessoa é (EP) e o que ela faz (submodos) são coisas diferentes? (Nivaldo Alves)

(Transcrição de gravação realizada em aula) “Hoje a gente vai levar um papinho daqueles bravos. Quem sofre de indigestão é bom ficar na outra sala curtindo um som... a questão é a seguinte: o que uma pessoa é e o que ela faz são a mesma coisa ? Olhem, isso pode valer um caminhão todo de melancia! ... já dá para ver pelas caras e bocas que a discussão vai ser quente. Então, vamos lá! Às vezes, sim, são a mesma coisa! Há correspondência entre o que é vivido e o que é feito. Exemplo pequeno: eu me gosto e fico demonstrando isso enquanto acaricio minha barriga. Neste caso é complicado diferenciar as coisas. Mas quando crio uma engenhoca que em parte funciona com minha ajuda e em parte sozinha... como um ioiô, há aí uma complicação. Até onde há uma limitação evidente entre o meu trabalho e o trabalho feito pela engenhoca que é o ioiô. Entendem? A complexidade aumenta se eu perguntar a vocês coisas como se uma lente intra-ocular é parte da EP da pessoa...? As roupas que o senhor está usando fazem parte da sua EP? Ou apenas se avizinham? E, notem bem, que não se trata apenas das implicações territoriais, trata-se também de agravantes como Espacialidade e outras contingências. Um exemplo que me ocorre agora é que para algumas pessoas a roupa é mais determinante que a própria pele, enquanto que para outras é um estorvo desnecessário. Bem, eu quero insistir com vocês que é comum saber distinguir entre EP e submodo, só que em alguns casos essa diferenciação não terá cabimento algum.”

Se a moça afirma, durante a terceira consulta: “Eu amo meu marido” - o filósofo colocará esta informação no tópico 4 (Emoções)? (pergunta de Packter aos alunos)

Nenhuma informação isolada tem maiores alcances hermenêuticos. É contraproducente (e temerário!!) considerar termos isolados como tendo maiores relevâncias junto à EP! A frase acima somente pode ser considerada em algum tópico após o término dos Exames Categoriais, após dados divisórios muito bem realizados. Alguns motivos:

a . A moça pode dizer uma coisa e sentir outra até mesmo oposta.b. A expressão pode ser vazia (psitacismo).c. Um dos termos pode ter um uso incomum à cultura da época (Wittgenstein).Há ainda inúmeras alternativas.

É uma característica da Filosofia Clínica a ausência de tipologia. Mas não seria a Estrutura de Pensamento com seus 30 tópicos uma tipologia? (Antonio Renato Henriques)

(Transcrição de gravação realizada em aula) “Olhem, hoje vamos falar um pouco sobre assuntos grávidos há um tempinho. Primeiro: tipologia. A tipologia é o estudo classificado e padronizado de tipos que podem ser organizados por padrões e critérios de igualdade ou semelhança. Os tópicos da EP não permitem isso. Cada pessoa tem predominância em alguns tópicos e em outros, não; cada pessoa também às vezes não tem um determinado tópico em sua EP; e mesmo duas pessoas que tenham um mesmo tópico, como Axiologia, ainda assim o conteúdo difere, o que mais uma vez anula a tipologia. Mas a tipologia pode ser usada em Filosofia Clínica, na Matemática Simbólica. Pode, porque a Matemática Simbólica lida com conjuntos, com estruturas mais do que com partes e especificidades. Mas aí é aquele problema! Como a extensão é grande, a compreensão cai lá no fundo. Diminui a precisão. É claro que em

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alguns casos isso não fará a menor diferença, só que nem sempre a gente vai poder conferir. Não é um critério puramente estatístico, vocês sabem.”

O homem tem uma dimensão subjetiva, singular e individual, mas também tem uma dimensão objetiva, geral e coletiva. Neste sentido, a liberdade oferecida pela Filosofia Clínica ao adaptar a teoria à pessoa é ao mesmo tempo sua prisão. Encarcerada em cada corpo, em virtude de seu respeito pela alma, fecha simultaneamente suas portas para toda e qualquer universalização. Qual será então a contribuição social da Filosofia Clínica? Vejamos um caso concreto: a revisão do código penal brasileiro. Há uma proposta de supressão da classificação de crime hediondo. Usa-se a argumentação individualizante de que “cada caso é um caso”... ou “cada crime é um crime”... e... “não podemos generalizar”. Porém este tipo de crime, o hediondo, caracteriza-se, segundo a mais clássica patologia, por infligir cruel sofrimento à vítima. Exemplo: lançar combustível líquido no corpo de um ser humano e depois atear-lhe fogo; exatamente como jovens brasilienses fizeram com o índio pataxó Galdino dos Santos no dia do índio.

Nestes casos a classificação tipológica não me parece nociva, mas sim apresenta-se nociva a sua supressão. Afinal a boa Filosofia do Direito busca realizar a justiça através de princípios gerais.

Lembremos de Kant ao nos ensinar o critério de escolha da ação moral: “se queres saber se tua ação é ou não é ética, universaliza-a! Se servir a todos, servirá a ti, caso contrário lança-a fora; pois, normas particulares ou singulares não podem tornar-se leis sociais. (Carlos Michaelis)

A Filosofia Clínica não fecha a porta à universalização. Ao contrário, deixa a porta muito bem aberta. Os dados universais, as tipologias, os conjuntos, as máximas dogmáticas são todos pesquisados na Matemática Simbólica.

No exemplo citado, é evidente que como cidadão sigo leis e normas éticas, cognitivas e epistemológicas, além de outras. Como alguém poderia viver em uma cidade de um milhão de habitantes ignorando tais leis de coabitação? O próprio Código de Ética dos filósofos clínicos é outro exemplo disso.

Mas o fato de eu ter de seguir não significa minha concordância.Espero que num tempo próximo haja espaço e condições para uma ética do indivíduo,

para que tenhamos leis da subjetividade e normas singulares que considerem caso a caso. De certo modo, isso já existe em semente.

Portanto, considerando os Exames Categoriais de nossa época, reconheço como necessárias algumas das leis universalizantes. Em uma Carta Constituinte próxima, talvez com o auxílio dos filósofos, talvez tenhamos leis universais, leis particulares e leis singulares.

É possível existirem dados comuns em Eps que possuam características e histórico

sociais comuns? (Yochabel Moitas)Sim. Em algumas condições sociais e históricas é até possível se pensar em uma tipologia,

o que desaconselho - com exceção dos recursos da Matemática Simbólica.

Por que temos um tópico como Axiologia e não temos um tópico como Ética, um tópico como Religiosidade, um tópico como Sonhos? Qual o critério que elegeu alguns tópicos em detrimento de outros? E qual o critério para nomear cada um? (Exemplo: por que ao invés de “como o mundo parece” não está “universo, ambiente, planeta, meio”?) (Alberto Thomal)

(Transcrição de gravação realizada em aula) “Não é novidade para vocês o que repito sobre o perigo do dogma quanto à Filosofia Clínica. Sabem, né? Aquilo do aluno aprender e sair feito um papagaio movido à mola. Antes de filósofos clínicos, a gente é filósofo! Cada ensinamento que eu passo precisa ser debatido, questionado, confutado e até... até, se for mesmo

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para ser, azar, banido. Eu fico me perguntando por que será que nunca um aluno meu me perguntou... (as três perguntas acima). Mesmo que vocês não me perguntassem, eu me perguntaria de qualquer jeito. Por muitas razões. Talvez a principal é que sou muito crítico com a Filosofia Clínica. Bem, chega de sermãozinho e vamos às questões.

Primeiro de tudo: os tópicos são uma tentativa de interseção ampla com a existência humana, e não são de jeito nenhum uma tentativa de apreender todas os modos de existir. Exatamente por isso que eles se desdobram na Matemática Simbólica e a gente passa a considerar os tópicos anômalos, tópicos de aproximação e tópicos indicativos [esta parte da Matemática Simbólica ainda se encontra em fase de pesquisa]. Então, ora, o que são os tópicos da EP? Para mim, costumo pensar neles como um caleidoscópio, ou como um mosaico... como um enorme jardim com todas as variações de aromas, cores e seres. O que eu fiz foi o seguinte: primeiro me certifiquei que por mais que eu soubesse a respeito de qualquer coisa e a respeito de todas as coisas - eu jamais saberia o suficiente para saber às vezes até o necessário. Fora de um critério absoluto e lógico acho que não há defesa para isso. Depois, percebi a insistência de muitas escolas que procuram entender e responder as questões humanas, a quase todas as questões humanas, como se fossem donas de um saber sagrado. Bobagem. Achei que uma alternativa a essa mutilação do saber seria tomar o entendimento dessas escolas, arregimentar todo esse conhecimento e então me acalmar para não achar que isso fosse o bastante para explicar todas as coisas... porque simplesmente não é. Ao invés de unificar tudo isso em um corpo fechado, fiz o contrário. Coloquei todas essas partes em diálogo entre elas. Primeiro entre elas. Assim descobri que para algumas pessoas os dados axiológicos são determinantes, para outras os dados epistemológicos, para outras a opinião que têm de si mesmas etc e etc e etc... e descobri que tais coisas também podem se misturar de milhares de maneiras. Às vezes amigáveis, às vezes amistosas e ao mesmo tempo desconfiadas, às vezes em choques convulsivos, e fui cada vez mais me convencendo da futilidade que é achar que um modo de pensamento, uma escola, um método seria melhor ou mais eficiente, a priori, claro, que algum outro... Nesta parte dos meus estudos senti muito medo. Medo mesmo, de dar vontade de desistir. Fui respirar numa pequena praia ao norte de Portugal, Praia do Sol, eu acho que era o nome. Peguei o trem em Lisboa e subi até a cidade do Porto. Sei que precisava ficar uns dias de folga em alguma pousada, bebendo todo o vinho que pudesse e curtindo o mar até voltar imensamente para o sensorial. Tinha passado semanas naquela biblioteca dinossaura de Madrid estudando com toda a sede do mundo atrás de algumas respostas...! Bom, meu medo era exatamente aquela coisa do ceticismo nominalista. Será que todo o meu trabalho iria por água abaixo simplesmente por ter esbarrado no relativismo? Será, meu Deus? Se fosse isso, a minha idéia era me tornar pescador e viver mais ou menos como um velho pelo resto da vida.

Bom, acho que a vida é assim mesmo. Só sei que um dia estava caminhando na praia e meu pensamento foi me levando até os escritos de Aristóteles sobre o estudo do ser, que coisa! As categorias! As velhas e boas e maravilhosas e amadas categorias! Me deu uma alegria... e voltei para a pousada correndo para devorar a Crítica da Razão Pura. É claro que Kant não usa as categorias do mesmo jeito que Aristóteles, como eu também acabei não usando como eles, mas, meu Deus do céu(!), eu tinha encontrado minha resposta. Olhem só como é simples: se uma pessoa tem valores que são importantes, esses valores deixam de ser ilusórios e ganham todo o assoalho do mundo se forem localizados em seus vínculos de historicidade, circunstâncias geográficas, sensoriais, temáticas etc etc etc. Então comecei a pesquisar de que maneira as categorias aristotélico-kantianas, que é como eu passei a chamar, poderiam fazer isso. Em menos de um ano, eu já sabia como!

Tem outra coisa importante também. Eu precisaria agora agrupar dados da experiência humana, ordenadamente, ordenadamente - claro, sistematizando tudo isso para poder pesquisar, porque de outra maneira eu acabaria maluco. Eu tinha muitos dados e precisava agora dar uma organização geral a eles, sintetizar tudo, estruturar. Levei um bom tempo até chegar à EP como

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ela é hoje. Imaginem a loucura que é colocar racionalismo, empirismo, analítica de linguagem, religião, misticismos a mil, estruturalismo, ciência e tudo o mais em uma disposição em que o diálogo entre eles fosse possível! Naquela época eu pensava que se chegasse num boteco de intelectuais e contasse que estava tentando fazer algo assim o pessoal imaginaria que tipo de droga nova eu andaria tomando. Mas eu agora estava feliz demais para tomar qualquer porcaria de droga. Aos poucos, fui construindo a teoria. Primeiro imaginei como colocar certas invenções humanas sobre o mundo, as cosmogonias mais estranhas e de todas as naturezas, lado a lado. E lá fui eu colocar: tópico 1, Como o Mundo Parece. Em seguida, precisava juntar as milhões de informações, pareceres e outros dados que as pessoas têm delas mesmas em um outro tópico: tópico 2, O que Acha de Si Mesmo. Ao mesmo tempo tinha que ter muitos cuidados, muitos, muitos. Olhem só: um tópico não poderia excluir o outro, porque afinal a mesma informação poderia pertencer a mais de uma escola de pensamento, ainda que fosse diferente em cada uma delas. Entendem? Uma escola chamaria de X o que a outra chamaria de Y, e eu tinha que entender o fenômeno independente do nome que tivesse. Ah, mas tudo bem! Uma mesma informação então poderia estar ao mesmo tempo no tópico 1 e no tópico 2. Outras vezes, não poderia. Este esquematismo tinha que levar em conta que qualquer tipo de relação entre os tópicos é possível, qualquer mesmo. Foi tranqüilo constatar que desde a mútua exclusão até a união mais super bonder do mundo. Mais outra coisa: o fato de eu nomear um tópico tipo ‘Como o Mundo Parece’ tinha que deixar a informação que o preenchesse livre para transitar em qualquer outro tópico, em qualquer outra escola de pensamento... não poderia ficar ali numa ilha, sem comunicação, a não ser que fosse exatamente o caso. Quero dizer pra vocês que embora não pareça, né, ao menos à primeira vista, não há qualquer hierarquia, primazia, preferência, ordem de complexidade ou de qualquer outra natureza entre os tópicos. Para mim, o tópico 1 poderia ser trocado com o 5, o 10, ou qualquer outro. Porque o importante é a relação entre eles e os pesos subjetivos. Mais tarde isso mudou, mas no fundo a ordem não chega a causar dor a ninguém. Só o que eu fiz foi colocar os tópicos da Matemática Simbólica no final, mais nada. Se vocês prestarem atenção aos tópicos vão notar que há um chamado Dados de Matemática Simbólica, um tópico cuja função é receber novos tópicos que vão surgindo conforme o homem vai evoluindo. Entendem isso, pessoal? A EP não está fechada e acabada, ela está aberta e receptiva, conforme o caso. E, ufa!, então um tópico nomeado como Religiosidade pode estar presente ou não na EP, e isso não importa. O que importa é que o conteúdo de um tópico... assim, as manifestações religiosas, se houver na pessoa, o importante é que apareçam na EP, independente do nome que possam ter. Então, se vocês quiserem chamar um tópico como Pré-Juízos de “verdades; suposições; indicativos”, o nome não me interessa, desde que o conteúdo apareça, entendem? Outro exemplo que quero passar é quanto a Autogenia. Ora, poderia ser qualquer nome que sugerisse o estudo entre os tópicos, das relações tópicas entre elas. Eu fui lá na química buscar o nome, mas imagino que na física e na biologia também encontraria outros que seriam adequados. Então, pessoal, ainda que a gente não tenha um tópico com o nome de Religiosidade, se isso existir na pessoa, aparecerá mesmo que sobre outra denominação. Resumindo tudo isso, cada filósofo neste mundo provavelmente nomearia de uma maneira, e eu nomeei à minha. Não considero que meu trabalho tenha inventado a pólvora, considero que dei outros usos a ela, apenas isso. A maneira como a EP se ergue e se movimenta desmonta complexidades e ajuda a mostrar toda a plasticidade da criatura. Mas, olhem, sinceramente, isso é só o começo. Acredito que os alunos de vocês, e os alunos dos alunos de vocês levarão as coisas a distâncias que agora é difícil imaginar. Temos muito trabalho para fazer.”

Se estamos tratando da EP, por que “Termos Agendados no Intelecto” e não “Conceitos Agendados no Intelecto”? (pergunta de Packter para os alunos)

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(Transcrição de gravação realizada em aula) “Certas coisas precisam ser consideradas na Filosofia Clínica. Quando a gente considera o tópico 6, olhem aí no Caderno de vocês, eu penso que o mais correto é ‘Termos & Conceitos Agendados no Intelecto’. Penso assim porque se está na EP é conceito, mas há casos em que é difícil distinguir entre termo e conceito... Mas aqui eu acredito que levadas às últimas análises, o mais acertado é usar Conceito, ainda que Termo seja defensável. A dificuldade é compreensível. Notem a implicação: ao nascer, a pessoa imediatamente começa a receber estímulos externos, que são Termos, e estímulos internos, que são Conceitos. Quero exemplificar melhor os estímulos internos. Um exemplo de estímulo interno é a sensação causada pelo sono, pela digestão, por alguma dor de estômago. Pois muito bem, os estímulos externos e internos ficam na pessoa na forma de Conceito.”

O que é um Raciocínio Bem Estruturado? (Nivaldo Alves) É uma associação de juízos, proposições e discursos que agrupam coerentemente causa e

efeito, contiguidade, semelhança, conceitos e termos justificáveis, capacidade de organização e de justificação dos juízos. O interesse do filósofo clínico é quanto à forma do raciocínio, quando considera este tópico 10.

O que é forma e o que é conteúdo quanto à Estrutura de Raciocínio? (Nivaldo Alves)Forma é a aparência móvel. Exemplo: a pessoa diz que se trabalhar muito e se for

honesta ela vai ser feliz na vida. O filósofo sabe que esse raciocínio se deve a um amontoado de experiências e verificações que a pessoa fez ao longo da vida, ou de invencionices. Não importa aqui identificar se isso é correto, sofismático, ilusório, verdadeiro. O que importa é que é assim que o raciocínio da pessoa se estruturou.

Conteúdo é o que nós estudamos na Epistemologia: a validade, a veracidade, a aplicabilidade prática. Exemplo: o conteúdo da assertiva “a pessoa que trabalha muito e é honesta é feliz na vida” pode não ser assim, tanto na vida da própria pessoa que o afirma como na vida das demais pessoas.

São muitas as maneiras de relação entre forma e conteúdo.

O raciocínio pode estar bem ou mal estruturado. Não seria esta afirmação uma questão de parâmetros sociais? (João Ronaldo Fortes)

Há parâmetros sociais para caracterizar o raciocínio. Esse não é o nosso caso. Para o filósofo clínico, um raciocínio bem estruturado apresenta relação justificável entre causa e efeito; a pessoa mostra capacidade de agendar termos e associá-los de modo que a resposta tenha relação íntima com a pergunta; os termos antecedentes e subsequentes estão relacionados logicamente; o pensamento apresenta organização - e outros quesitos.

O que é raciocínio e o que é pensamento? (pergunta usual em aula)Raciocínio é um tipo de pensamento em que os juízos levam a outros juízos

ordenadamente. Pensamento, em meu entendimento, tem muito de poesia; Platão admitia um diálogo que a alma realizava em si mesma; entendo que pensamento é qualquer atividade que reuna conceitos na pessoa: aromas (sensoriais), lembranças, devaneios, raciocínios, sensações internas etc.

Se a pessoa tem o raciocínio desestruturado em vários tópicos não determinantes, isto qualificaria o raciocínio como mal estruturado? (Adriana Pires; Ana Tripicchio; Beatriz Ferraz Costa; Mônica Aiub Monteiro; Maria Tereza Verardo; Vilma Andrade dos Santos)

Não exatamente: a pessoa então tem o raciocínio mal estruturado nesses tópicos; em outros tópicos, talvez o raciocínio seja perfeitamente bem estruturado. Na verdade, é habitual que seja assim. Também as situações que a pessoa vive podem alterar a estruturação do

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raciocínio. Por exemplo: diante de choques emocionais, o raciocínio pode sofrer abalos estruturais.

Como distinguir uma má estruturação de raciocínio simples de uma esquizofrenia? (Adriana Pires; Ana Tripicchio; Beatriz Ferraz Costa; Mônica Aiub Monteiro; Maria Tereza Verardo; Vilma Andrade dos Santos)

A estruturação de raciocínio tende a ser limitada apenas à ordenação dos juízos, das proposições, do encadeamento lógico das idéias. A esquizofrenia, na acepção médica, abrange muito mais: as sensações, as percepções, os sentimentos, grandes porções do pensamento, quando não a totalidade deste. Na maioria dos casos, a diferenciação é simples, bastando alguns minutos de conversação com a pessoa. Em casos severos, no entanto, pode ser necessário um exame mais minucioso.

Em quais situações a Busca pode ser uma Armadilha Conceitual? (Mariza Zambom)Quando a trajetória do que é almejado se revelar uma trama de conceitos que segure a

pessoa sem que ela tenha como alcançar. Nesse sentido, por exemplo, talvez buscar a felicidade, a bonança, a paz de espiríto - sejam potencialmente Armadilhas Conceituais.

Por que Semiose não é considerada submodo? (Idalina Krause)Semiose significa somente o meio, o canal, o veículo de expressão. Pintar, comer, correr,

chutar, cantar, olhar etc são dados de Semiose. Já o modo de pintar, o modo de correr, o modo de chutar etc são submodos. Semiose não é um modo de expressar a pintura; Semiose é o canal de saída que leva à possibilidade de pintar; a maneira como isso se processará é o submodo.

É importante ao filósofo clínico saber como as pessoas significam as coisas. Mas o significado pode às vezes ser mal interpretado, pois o terapeuta não o vive. Comente. (João Ronaldo Fortes)

Isso acontece com freqüência. Contudo, não é importante saber como as pessoas significam as coisas, mas sim como elas significam determinadas coisas. O filósofo poderá vivenciar aproximadamente a experiência da pessoa cognitivamente, em Recíproca de Inversão, ou compartilhando Buscas e outros dados da EP. É evidente que não há como substituir a vivência da pessoa por si mesma.

É então que se pede cuidado com os Agendamentos e com as inferências - que podem levar a erros graves de interpretação.

Dependendo da EP da pessoa, não interpretar o que ela passa pode ser uma péssima interpretação; outras vezes, interpretar erroneamente pode se constituir na solução. E existe ainda quem deseje essencialmente ser mal interpretado. É necessário que se cuide cada vez mais dos Exames Categoriais, da montagem da EP e dos Submodos, para minimizar esse risco. Acredito que o máximo a ser feito é procurar criteriosamente minimizar.

Qual a diferença entre Ação e Comportamento e Função? (Tarcísio Wickert)Ação é o movimento sequenciado do pensamento. Por exemplo: tu pensas na areia da

praia; em seguida, nos raios do sol refletindo sobre as ondas do mar; depois, imaginas o movimento macio das nuvens. A essa ordenação definimos Ação.

Comportamento & Função é uma ordenação de causa e efeito, uma relação justificada entre termos antecedentes e conseqüentes, entre um denominador A que se vincule logicamente a um denominador B.

Por que Ação e Hipótese podem ser indistintas ao filósofo clínico? (Tarcísio Wickert)

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Um dos motivos é que a própria Ação pode ser também a Hipótese, como no caso da pessoa que pensa em acontecimentos felizes (Ação) para poder lidar com uma vida difícil. Outras vezes, mas que também é ainda um pouco esse caso, pode não ser identificada a Hipótese. Por exemplo: o filósofo não consegue diagnosticar o que a pessoa faz para lidar com determinada situação. Há casos também de pessoas em coma e então não temos como saber o que é Ação e o que é Hipótese; o mesmo ocorre enquanto a pessoa dorme e em casos similares.

Como é que o filósofo clínico sabe que a Ação do cliente é contraproducente aos seus objetivos? (Tarcísio Wickert)

Vamos supor que a pessoa tenha como tópico determinante em sua EP uma Busca: quer encontrar uma pessoa querida que desapareceu. No entanto, seus pensamentos (Ação) são logicamente desordenados (Estruturação de Raciocínio) o suficiente para que tudo o que ela empreenda em sua Busca seja simplesmente caótico.

É preciso sempre existir Ação, Hipótese e Experimentação no processo de pensamento de uma pessoa? (Márcia S. e Silva)

Não. Um dos elementos, ou mais de um, pode estar ausente. Os Cadernos ilustram várias dessas alternativas.

Como se detecta a Ação num caso de psicose grave? (Tarcísio Wickert)Em grande parte dos casos, não temos como fazer isso até o momento.

Por que Intuição é um submodo e não um tópico da EP? (Sílvia Vieira Armani)Na verdade, segundo os estudos da Matemática Simbólica, a Intuição é uma espécie de

terreno limítrofe entre EP e Submodos. Pertence a tópicos anômalos, entre outros, que podem se apresentar de um jeito ou de outro. Ainda assim, na formação básica de Filosofia Clínica, optei por colocá-la entre os Submodos por sua natureza sensível (na acepção empírica).

Em qual, ou quais filósofos, é inspirada a Armadilha Conceitual? (Heloísa Duval de Azevedo)

Na verdade, a Armadilha Conceitual deriva de minha pesquisa empírica, desde o tempo em que atendia no interior de Santa Catarina. Comecei a observar que certos conceitos têm a propriedade de prender outros conceitos, outros termos, tipos específicos de vivências, e assim por diante. Percebi também que nem sempre isso poderia ter um caráter negativo ou destrutivo à EP da pessoa. Aprofundei os trabalhos e constatei que elas são de todas as naturezas: delicadas, sutis, firmes etc. À malha de conceitos que prendem porções da EP chamei de Armadilha Conceitual.

Qual a diferença entre Autogenia enquanto EP e Autogenia enquanto submodo com relação à Análise da Estrutura? (Marinei Santos)

Autogenia enquanto EP: identificar como os conceitos interagem entre eles mesmos na EP da pessoa.

Autogenia enquanto submodo: o filósofo ou a pessoa alteram a interseção entre os conceitos da EP usando de submodos.

Qual a diferença entre Análise da Estrutura e Autogenia? (Idalina Krause)Análise da Estrutura procura verificar o todo no ambiente em que ele se encontra.

Autogenia, não; procura verificar o funcionamento das partes entre elas mesmas. Por exemplo: vamos supor um corpo humano.

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Pesquisar como os rins funcionam em relação ao fígado, e assim por diante, isso é Autogenia. Agora, pesquisar como está o todo, isso é estrutural. O todo pode conter partes que a Autogenia não considerou, e certamente conterá. A Autogenia, por sua vez, pode não considerar o conjunto, mas interessar-se apenas por uma pequena parte fundamental do mesmo.

A EP pode ser considerada bem ou mal estruturada? (João Ronaldo Fortes)Sim, desde um critério lógico. Mas há outros critérios: intuitivo, emocional, religioso etc.

O que são Eps excessivamente permeáveis? (Tarcísio Wickert)Pergunta típica à Matemática Simbólica.São Eps que permitem a entrada (ou saída) de informações de modo facilitado demais, se

a compararmos com Eps de seu ambiente.

Por que existe um tópico na EP chamado Análise da Estrutura se esta é feita pelo filósofo clínico? (Evaldo Kuiava)

Porque o filósofo irá muito além disso. Ele vai considerar as interseções entre Eps, vai observar os submodos, e terá que estabelecer interseção com realidades sociais que transcendem a atividade clínica. Análise da Estrutura se refere unicamente à análise da EP da pessoa.

Qual a diferença entre Interseções de Estrutura de Pensamento e Dados da Matemática Simbólica? (Sonia Kuiava)

Interseções de Eps nos remetem ao estudo de como as Eps estão associadas. Os Dados da Matemática Simbólica estão reunidos em um tópico da EP que ainda está sendo trabalhado; as conclusões ainda se demorarão por alguns anos. Por enquanto, temos apenas as pesquisas dos Cadernos P, Q e R - Matemática Simbólica I, II, III.

A Paixão Dominante pode ser um Pré-Juízo e uma Armadilha Conceitual ao mesmo tempo? Como? (Antonio Dias dos Reis)

Sim, quando um pensamento que freqüenta assiduamente a EP é também uma verdade subjetiva e uma trama conceitual. Por exemplo: alguém que pensa muitas vezes durante o dia que será feliz se perdoar as ofensas que sofre, só que quanto mais exercita isso mais infeliz se torna.

Após o trabalho com um determinado partilhante, pode este voltar com a mesma dor existencial anterior? Por que sim? Por que não? (Paulo Rodrigues)

Sim, pode, e por diversos motivos. Há pessoas que não aprendem com certas experiências e as repetem; pode estar presente algum padrão que não tenha sido apurado; pode ter sido realizado em clínica algum trabalho que somente tivesse ação periférica e nem sequer tenha conseguido arranhar o Assunto Último; às vezes a questão trabalhada precisa se repetir para ser abolida de vez ou aceita ou contextualizada. Há ainda muitos outros motivos.

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