FOLHA 01-09-2014

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FOLHA 01-09-2014 Luiz Fernando Vianna Verdade tropical RIO DE JANEIRO - A coluna de hoje poderia conter um ato de contrição em relação a algo que foi escrito neste mesmo espaço na sexta-feira. Mas Marina Silva não permitiu. Falou-se aqui de temas sobre os quais ela, agora favorita na disputa presidencial, deveria se manifestar. Um dos citados foi o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Na tarde da mesma sexta, Marina lançou o seu programa de governo. O capítulo LGBT era dos mais audaciosos, espanando qualquer dogmatismo evangélico e indicando que ela, em detrimento dos próprios valores, optaria pelo avanço da cidadania. A ilusão não durou 24 horas. Por convicção pessoal ou por medo de perder os votos dos eleitores evangélicos, Marina disse no sábado que não era bem assim. Apoia apenas o que já está previsto em lei. Avançar mais, inclusive endossando o projeto de criminalização da homofobia, não está em pauta. Também sobre o direito ao aborto, nada muda. Sobre pesquisas com células- tronco e legalização da maconha, outros assuntos citados aqui, nem uma palavra. Apesar do recuo constrangedor (ela não leu o que estava divulgando?), não há dúvida de que há no programa ideias para o país. Só faltou dizer como realizá- las. Janio de Freitas apontou ontem, na Folha, os riscos do discurso da candidata contra o pré-sal e, por extensão, contra a Petrobras. Reportagem do jornal "O Globo" calculou em R$ 95 bilhões o aumento de despesas anuais para dar conta dos planos de Marina. E quase tudo precisaria passar pelo Congresso. Hoje, os partidos da coligação (PSB, PPS e quatro nanicos) têm 30 deputados num total de 513. E quatro dos 81 senadores. Falando em português claro: ela precisará governar com o PT ou com o PSDB e/ou com a enorme bancada fisiológica liderada pelo PMDB. É a dura e triste verdade tropical. Leandro Narloch

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  • FOLHA 01-09-2014

    Luiz Fernando Vianna

    Verdade tropical

    RIO DE JANEIRO - A coluna de hoje poderia conter um ato de contrio em relao a algo que foi escrito neste mesmo espao na sexta-feira. Mas Marina Silva no permitiu.

    Falou-se aqui de temas sobre os quais ela, agora favorita na disputa presidencial, deveria se manifestar. Um dos citados foi o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

    Na tarde da mesma sexta, Marina lanou o seu programa de governo. O captulo LGBT era dos mais audaciosos, espanando qualquer dogmatismo evanglico e indicando que ela, em detrimento dos prprios valores, optaria pelo avano da cidadania.

    A iluso no durou 24 horas.

    Por convico pessoal ou por medo de perder os votos dos eleitores evanglicos, Marina disse no sbado que no era bem assim. Apoia apenas o que j est previsto em lei. Avanar mais, inclusive endossando o projeto de criminalizao da homofobia, no est em pauta.

    Tambm sobre o direito ao aborto, nada muda. Sobre pesquisas com clulas-tronco e legalizao da maconha, outros assuntos citados aqui, nem uma palavra.

    Apesar do recuo constrangedor (ela no leu o que estava divulgando?), no h dvida de que h no programa ideias para o pas. S faltou dizer como realiz-las.

    Janio de Freitas apontou ontem, na Folha, os riscos do discurso da candidata contra o pr-sal e, por extenso, contra a Petrobras.

    Reportagem do jornal "O Globo" calculou em R$ 95 bilhes o aumento de despesas anuais para dar conta dos planos de Marina.

    E quase tudo precisaria passar pelo Congresso. Hoje, os partidos da coligao (PSB, PPS e quatro nanicos) tm 30 deputados num total de 513. E quatro dos 81 senadores.

    Falando em portugus claro: ela precisar governar com o PT ou com o PSDB e/ou com a enorme bancada fisiolgica liderada pelo PMDB. a dura e triste verdade tropical.

    Leandro Narloch

  • Proposta de conciliao

    Roger poderia admitir que condena os torturadores da ditadura e Marcelo Rubens Paiva, que a ideologia que seu pai defendia era um equvoco

    Seria possvel haver uma conciliao entre Roger e Marcelo Rubens Paiva? Nas ltimas semanas, o cantor e o escritor se apunhalaram pelo Twitter e pela imprensa por causa de opinies sobre a ditadura militar. Marcelo disse na Flip que Roger faz "uma confuso" ao chamar Dilma de terrorista; Roger respondeu que o jornalista "sofreu uma lavagem cerebral".

    Reunies de conciliao do certo quando cada parte reconhece uma ou outra razo do adversrio e abre mo de pontos em disputa. A discusso entre os dois tem muito espao para isso.

    Roger poderia comear admitindo que sim, condena a morte de Rubens Paiva e os torturadores da ditadura militar. fcil perceber o tamanho da injustia. Imagine que voc tem 11 anos e feriado com sol no Rio de Janeiro. De repente chegam uns homens com metralhadoras e levam seu pai para a delegacia. Voc nunca mais o v. Cresce sem notcias, sem poder reclamar. Os homens que mataram seu pai mandam no pas.

    A tortura execrvel at mesmo em casos de guerrilha, que hoje tambm envolveria represso do governo federal. Pessoas envolvidas em luta armada devem ser presas por porte de armas ou incitao violncia: no est na lei que podem ser torturadas ou mortas depois de capturadas.

    Por fim, Roger poderia criticar a ditadura por erros econmicos similares ao do governo atual. A ditadura infestou o Brasil de estatais, adotou um protecionismo que fechou o Brasil para o mundo, descuidou das contas pblicas e da inflao. Mas melhor deixar isso de lado: talvez Marcelo no goste de ver na ditadura semelhanas ao governo que ele defende.

    Marcelo Rubens Paiva tambm teria muito a reconhecer --mas nada que j no seja bvio e estabelecido. O principal que a ideologia que seu pai defendia era um equvoco tremendo. O jornalista poderia admitir ser ingenuidade acreditar que um governo comunista no Brasil no resultaria em fome, desabastecimento e represso. Pois foi o caso de todas (sim, todas) as experincias socialistas do sculo 20.

    Ou que, em caso de um governo comunista no Brasil, veramos boa parte da populao brasileira fugir para os pases vizinhos, como aconteceu da Coreia do Norte para a Coreia do Sul, da China para Hong Kong, da Alemanha Oriental para a Ocidental, de Cuba para os EUA, do Laos e do Camboja para a Tailndia, de Moambique para a frica do Sul (em pleno apartheid).

    Com essa atitude, Marcelo Rubens Paiva participaria de um grupo de nobres pessoas que tiveram generosidade para admitir equvocos do passado sem deixar de reprovar a ditadura, como fizeram Fernando Gabeira, Ferreira Gullar e tantos outros. Dar graas a Deus que o Brasil escapou do comunismo no

  • implica defender torturadores e assassinos. Do mesmo modo, condenar a morte de Rubens Paiva e as torturas da ditadura no far de Roger um esquerdista.

    Estamos de acordo? Ento bola pra frente, pois j faz algumas dcadas que estamos discutindo esse assunto.

    LEANDRO NARLOCH, 35, jornalista e autor de "Guia Politicamente Incorreto da Histria do Brasil" e coautor de "Guia Politicamente Incorreto da Histria do Mundo" (ambos pela editora LeYa)

    Ricardo Melo

    De bagre a tubaro: a nova Marina

    Nesta fase, a candidata do PSB tenta nos convencer de que desapareceram interesses em conflito

    Marina Silva construiu sua carreira associada a um discurso ambientalista, de luta contra transgnicos, crtica ao desmatamento, defesa dos pobres e intransigncia de "princpios" --embora nunca se soubesse direito quais eram exatamente estes. A seu favor, contou ainda com uma histria de vida repleta de sofrimento e superaes. Se esta trajetria deixou sequelas em sua sade, ao mesmo tempo esculpiu uma imagem bem ao gosto de marqueteiros.

    Esse capital, que sempre impulsionou a candidata e angariou a simpatia de milhes, agora est sendo jogado no lixo. A nova poltica, como os fatos tm demonstrado, o rtulo que batiza no uma mudana de valores, mas a transformao da prpria Marina. Um caso pensado de autodesconstruo.

    As propostas da personagem repaginada so, no mnimo, desalentadoras. No campo da economia, repete sem nenhuma originalidade o estribilho do trip estabilidade cambial, controle da inflao e equilbrio fiscal. Acrescentou a independncia do Banco Central, uma cantilena que soa como msica entre o pessoal da banca.

    As restries a doadores eleitorais "impuros" tambm so coisas do passado. Agora, vale tudo, desde que jorre dinheiro na campanha. O combate aos transgnicos encontra-se devidamente engavetado. Quando se trata de costumes, nem se fale. Deu origem at a um fato indito: uma errata de ltima hora num programa pronto h meses.

    Na esfera da poltica, uma embromao atrs da outra. "Democracia transversal", "adensamento do programa" e prolas do gnero por enquanto s produziram uma coalizo capenga, um avio-fantasma e a busca frentica por aliados de qualquer natureza. Nada mais velho e conhecido.

    Junto a isso, surge mais um embuste. Vamos governar com os "melhores". Que diabo isso? Francis Fukuyama, historiador americano, teve seus 15 minutos de fama quando decretou o fim da histria. O marco seria a queda do

  • Muro de Berlim. Os acontecimentos de l para c trataram de desmenti-lo redondamente. Ou seja, a diferena entre classes sociais, a desigualdade na distribuio da riqueza e o abismo entre ricos e pobres esto a, vivinhos da silva.

    Nesta fase em que passou de bagre a tubaro, Marina tenta nos convencer de que desapareceram interesses em conflito. Chegou ao cmulo de colocar no mesmo patamar Chico Mendes, o dono da Natura e o pessoal do Ita, um dos lderes em demisses no setor financeiro. S faltou incluir fazendeiros que armaram com xito o assassinato do lder sindical.

    Ocorre que o melhor para um banqueiro certamente no ser o melhor para um endividado, assim como o certo para um evanglico pode ser errado para um catlico ou ateu. A democracia autntica, at onde se sabe, prev um jogo poltico capaz de fazer valer a vontade da maioria --sem nunca impedir a expresso e os direitos das minorias. A viso messinica, to ao gosto de Marina, caminha no sentido contrrio. Geralmente tem como eplogo a minoria dos "melhores" sufocando a maioria mais humilde.

    Retomando algo j escrito outras vezes. O que o brasileiro quer saber muito simples: o que os candidatos tm a oferecer para ampliar conquistas j obtidas. Haver mais empregos ou uma onda de demisses? A aposentadoria vai mudar? O preo do pozinho subir? E o salrio mnimo? Vem a um tarifao? A gasolina ir aumentar? Os juros cobrados pelos banqueiros continuaro nas alturas? As grandes fortunas sero taxadas? Quais medidas concretas sero tomadas para resolver questes como essas?

    Como hoje dia de debate presidencial, eis a uma boa oportunidade para Marina e seus rivais esclarecerem o eleitor.

    Eleies 2014

    Decidindo com a f

    Evanglica desde o fim da dcada de 90, Marina Silva costuma recorrer Bblia para tomar decises em momentos difceis, como quando virou vice de Campos

    NATUZA NERYRANIER BRAGONANDRIA SADIDE BRASLIA

    Em momentos difceis, a presidencivel Marina Silva (PSB) costuma recorrer em seu processo decisrio orientao de uma companheira que esteve ao seu lado em boa parte de seus 56 anos de vida, a Bblia.

    Catlica que quase se tornou freira na adolescncia, ela converteu-se f evanglica no fim da dcada de 1990. Adotou o pentecostalismo, corrente que professa a interveno direta do Esprito Santo na vida das pessoas, aps receber de mdicos "a terceira sentena de morte" devido a problemas de sade.

  • Curada, segundo diz, graas a uma mensagem divina, Marina Silva , desde 2004, missionria da Assembleia de Deus do Plano Piloto (Novo Dia), na capital federal. Antes, pertenceu Assembleia Bblica da Graa, de Braslia.

    Em pelo menos dois momentos serviu-se da chamada "roleta bblica" para tomar decises. Trata-se de uma escolha aleatria de versculos das escrituras para obter orientao espiritual.

    Uma delas, conforme um auxiliar prximo, foi na madrugada de 4 de outubro de 2013, horas antes de surpreender o mundo poltico com o anncio da adeso ao projeto presidencial de Eduardo Campos (PSB).

    O ento governador de Pernambuco, morto em um acidente areo no ltimo dia 13, tambm relatou Folha, na ocasio, que a unio decorrera de uma inspirao bblica.

    A outra experincia descrita em sua biografia autorizada, "Marina, a Vida por uma Causa", de Marlia de Camargo Csar (Editora Mundo Cristo, 2010).

    Antes de concordar com o livro, Marina precisou "ouvir a opinio de outra pessoa". "Levantou-se do sof e foi buscar uma Bblia", descreveu a autora. O aval para o projeto veio aps "um recado pessoal de Deus", expresso no salmo obtido na abertura aleatria.

    "Ela, para tomar uma deciso, santo Deus, demora, porque, alm de consultar a terra, ela tem que consultar o cu. Tem de ouvir todo mundo, a amadurece", afirma a pastora Valnice Milhomens, da Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo, amiga de orao h mais de uma dcada. "Ela nunca [misturou f e poltica], no faz parte da bancada evanglica."

    Apesar da forte religiosidade, Marina sofre resistncia de setores da igreja por no se posicionar firmemente em questes como aborto e casamento gay. Entretanto, desidratou sua proposta para a comunidade LGBT em meio a crticas do pastor Silas Malafaia na internet no sbado (30).

    Nos tempos de ministra do Meio Ambiente (2003-2008), alm de frequentar cultos junto a servidores nas dependncias do ministrio, costumava levar pastores para orar pelo ento presidente Lula.

    Sobre o acidente de Eduardo Campos, atribuiu "providncia divina" o fato de no ter embarcado no avio.

    REVELAO

    A relao de Marina com a religio comeou no catolicismo, pelas mos da av paterna, quando vivia no pauprrimo seringal Bagao (AC), a 70 km de Rio Branco.

    Vtima seguidas vezes de malria, hepatite, leishmaniose e contaminao por metais pesados (como mercrio) que a levam at hoje a ter uma dieta bastante

  • restrita, a presidencivel diz ter tido a epifania que a levaria a se tornar evanglica aps mais um problema de sade, em 1997.

    Foi seu mdico quem a colocou em contato telefnico com um jovem pastor da Assembleia de Deus, Andr Salles. "Achava que aquilo era uma coisa fora do prumo para um mdico", relatou Marina em um vdeo de pregao disponvel na internet. "A o pastor Andr falou para mim: Olha, eu tenho o dom de revelao do Esprito Santo'."

    O pastor Andr Salles hoje est em uma igreja de So Paulo, a Plenitude do Trono de Deus, que tem como um de seus principais pregadores convidados o deputado Marco Feliciano (PSC-SP), protagonista de polmicas com ativistas LGBT na Comisso de Direitos Humanos.

    Marina ento se converteu Assembleia de Deus e, dois anos depois, ainda doente, disse ter tido uma revelao divina na fila da uno para os enfermos da igreja.

    Veio sua mente as letras "DMSA". Lembrou-se mais tarde se tratar de um remdio dos EUA que se recusara a tomar anos antes. Ela tomou a droga, e o mercrio em seu corpo foi reduzido.

    O atual pastor presidente da igreja de Marina, Hadman Daniel, afirma que a ex-senadora no precisa de guia espiritual. "Ela tem o relacionamento dela com Deus, ela conhece Deus."

    Segundo ele, Marina recorre igreja em momentos difceis, como quando aceitou ser vice de Campos e quando um incndio se abateu sobre a regio Norte ainda na gesto dela no ministrio. "Ns oramos. Choveu no mesmo dia, em um tempo que no era de chuva", conta Daniel.

    No uso minha f com fins polticos, afirma candidata

    DE BRASLIA

    A candidata Marina Silva afirmou Folha, por meio de sua assessoria de imprensa, que nunca instrumentalizou sua f com fins polticos.

    "No fao de palanques plpitos nem de plpitos, palanques. Minhas decises polticas so elaboradas, discutidas e implementadas nos espaos da institucionalidade da poltica. [...] Nunca instrumentalizei minha crena religiosa para um fim poltico."

    Marina afirmou ainda que, para as pessoas de f, "a vida uma orao, um processo constante e intenso de relacionamento com Deus".

    Acrescentou: "Para os cristos de qualquer corrente teolgica, a Bblia a base de sua f. O exerccio da f um direito de ordem pessoal, assegurado pela Constituio do Brasil. Apenas aqueles que se pautam pela intolerncia

  • religiosa encaram esse direito como elemento que conspira contra o Estado laico e o Estado de Direito".

    Ela tambm argumenta que mesmo "o presidente tem direito de vivenciar espaos de sua vida num ambiente restrito sua pessoalidade sem a obrigatoriedade de compartilhar essa experincia com a chamada opinio pblica".

    Ela ressaltou que Eduardo Campos tambm era um homem de f. "Esse elemento de sua persona era mais um dos tantos dos quais tnhamos grande identidade. Atribuir-lhe agora a autoria de uma declarao sobre nosso relacionamento, sem que ele tenha o direito de confirm-la ou refut-la, um desrespeito sua memria."

    Aliados de Marina afirmam ainda que foi Lula quem chamou pastores evanglicos para orar por ele no Planalto, durante a crise do mensalo.

    Acusada de desviar verbas da sade, Cruz Vermelha acumula processos

    Problemas em vrios Estados interligam-se; sumio de doaes humanitrias exps atual crise

    Entre atual e ex-direo h ru com bloqueio de bens, dono de empresa suspeita e condenado a ressarcir condomnio

    REYNALDO TUROLLO JR.DE SO PAULO

    Em meio maior crise de sua histria, desencadeada pelo sumio de doaes para vtimas de desastres, a Cruz Vermelha (CV) no Brasil e seus dirigentes acumulam processos pelo pas sob acusao de desviar recursos da sade.

    H problemas em vrios Estados, que se interligam. Autoridades de cada Estado ainda no sabem o total desviado nos vrios casos, mas tm compartilhado informaes.

    Neste ms, uma comisso da Federao Internacional da Cruz Vermelha vir ao pas para implementar mudanas.

    Como a Folha revelou em julho, uma auditoria encomendada pelo rgo internacional apontou que ao menos R$ 2,3 milhes doados para ajudar Japo, Somlia e Rio foram desviados para uma ONG.

    O Instituto Humanus, no Maranho, da me do ex-vice-presidente nacional da CV, Anderson Choucino. Aps a reportagem, a filial maranhense da CV, que estava no centro do escndalo, fechou.

    Mas a maior parte das verbas que a CV movimenta vem de hospitais, no de doaes.

  • No ano passado, a Justia de Santa Catarina bloqueou bens da CV nacional e das filiais do RS e do MA, acusadas de desviar ao menos R$ 2,5 milhes de um hospital municipal de Balnerio Cambori, controlado pela filial gacha.

    A quebra de sigilo descobriu que o dinheiro teve destino igual ao das doaes: vrias entidades no Maranho.

    "Pulverizaram os recursos do hospital para dificultar o rastreamento", disse o promotor Jean Forest. Choucino, ex-vice-presidente da CV, tambm foi acusado neste caso e teve bens bloqueados.

    No Distrito Federal, a Justia condenou a filial de Petrpolis da CV a devolver ao governo R$ 3,2 milhes que recebera em 2010 para gerir duas UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) em Braslia.

    O valor foi pago adiantado, o dinheiro sumiu e o servio no foi prestado. A CV de Petrpolis ficou proibida de contratar com o poder pblico.

    EMPRESA

    J em Joo Pessoa (PB), a filial gacha da CV --a mesma que atuou no hospital de Cambori-- investigada por administrar o Hospital de Trauma, o maior do Estado, ao custo de R$ 9,8 milhes por ms.

    O caso virou alvo da oposio nestas eleies, porque o governador Ricardo Coutinho (PSB) renovou com a CV at 2016, apesar de os tribunais de contas do Estado e da Unio apontarem problemas.

    Segundo a promotora Gardnia Galdino, a contratao da CV em 2011, sem licitao, est agora na mira do Ministrio Pblico da Paraba.

    A gesto do hospital em Joo Pessoa comeou com o empresrio Daniel Gomes da Silva, diretor nacional da CV.

    Silva era dono de uma empresa de aluguel de ambulncias, a Toesa, que ficou famosa em 2012 aps o "Fantstico", da Globo, flagr-la oferecendo propina para fechar contrato com hospitais no Rio.

    Ru numa ao em Natal (RN) --acusado de chefiar um esquema que usava uma ONG para favorecer a Toesa--, Silva foi reeleito para o Conselho Diretor da CV em julho.

    CNPJ LIMPO

    Apesar dos problemas com administrao de hospitais, a CV nacional acaba de fundar um instituto, com CNPJ limpo, para tentar firmar novos contratos pelo Brasil afora.

    Segundo o secretrio-geral da CV, Paulo Roberto Costa e Silva, o instituto uma forma de levantar fundos para saldar as dvidas da instituio.

  • Um dos entusiastas do projeto, segundo Costa e Silva, o presidente do Conselho Fiscal da CV, Fernando Antunes.

    Hoje no alto escalo da CV, Antunes foi investigado na operao Caixa de Pandora, em 2009, suspeito de corrupo como subsecretrio de Sade do Distrito Federal. No foi denunciado nesse caso.

    Mas, no DF, Antunes ru em ao de improbidade junto com a empresa de seu colega da CV, a Toesa --contratada sem licitao quando ele era subsecretrio da Sade. Tambm j foi condenado a devolver R$ 200 mil a um condomnio do qual foi sndico.

    Em dez anos, milcias passam de 6 para 148 favelas na cidade do Rio

    Em todo o Estado, quadrilhas dominam 195 comunidades, apesar de prises e represso policial

    Grupos formados por agentes do Estado vendem servios e indicam candidato para morador votar

    MARCO ANTNIO MARTINSDO RIO

    Em 2011, durante o julgamento que condenou trs homens por um assassinato na zona oeste do Rio, a juza Simone Ferraz resumiu a situao de moradores de favelas:

    "H um novo cncer social. Somos hoje um povo doente, em especial a cidade do Rio, somos pacientes terminais de um tumor chamado milcia."

    Ao olhar para o mapa hoje, entende-se o que queria dizer a juza. Em 2004, seis favelas na capital eram controladas por milcias. Dez anos depois, so 148 em 28 bairros, segundo a Secretaria de Segurana.

    O fenmeno, ento restrito capital, cresceu e hoje est em 23 dos 90 municpios do Estado, em 195 comunidades. Esse crescimento mostra que a priso de 864 milicianos desde 2007 no Rio no freou a expanso desses grupos.

    Se h uma dcada as milcias "vendiam" a ideia de comunidades sem traficantes, o passar do tempo revelou a explorao dos moradores.

    Policiais militares, bombeiros, ex-policiais, militares e moradores das comunidades, que formam as milcias, descobriram que favelas so lugares para se ganhar dinheiro e at investir em eleies.

    No incio, milicianos candidatavam-se --entre 2007 e 2010, trs se elegeram vereadores, foram presos e perderam seus cargos, assim como o deputado estadual Natalino Guimares, criador da Liga da Justia, a maior milcia do Rio.

  • Hoje, os criminosos preferem apoiar candidatos. H denncias de que as favelas so "vendidas" ao candidato que pagar para ser o nico a fazer campanha no local.

    "O Rio igual Chicago dos anos 1930, em que agentes do Estado estavam envolvidos na corrupo. L, a soluo foi chamar policiais de fora da cidade. Aqui, precisamos encontrar uma", diz o promotor Jorge Magno Vidal.

    As quadrilhas comeam cobrando por segurana. Depois, moradores so obrigados a comprar botijes de gs, TV a cabo, internet.

    Numa comunidade em Nova Iguau, na Baixada Fluminense, por exemplo, os milicianos cobram R$ 10 de cada casa que quiser ter gua. O registro aberto por meia hora.

    REPRESSO INEFICAZ

    Ao utilizar a ttica de prender milicianos --j utilizada para tentar reprimir o trfico--, a polcia se mostrou incapaz de inibir esses grupos.

    A diferena que, neste caso, o crime praticado por agentes do Estado, com acesso a informaes privilegiadas das aes da polcia.

    "A substituio do comando segue a hierarquia do trfico: prendeu um, j tem outro para substitu-lo", diz o socilogo Paulo Storani, ex-instrutor do Bope, da PM.

    Exemplo disso est em Campo Grande. Pouco mais de 20 dias aps a priso de 21 membros da Liga da Justia, a milcia --que usa o smbolo do Batman-- reestruturou-se. No lugar do ex-PM Marcos Jos Gomes, o Go, entraram o ex-preso Jaime Soares Filho, o Mo de Seda, e Carlos Braga.

    A dupla j foi vista indicando candidatos para os moradores votarem. Na sexta (29), foi preso Pablo Moraes, suspeito de fazer cobranas em nome dos milicianos.

    Juca Kfouri

    O pas do autoengano

    No somos mais nem o pas do "jogo bonito", que dir o "pas do futebol", como dizem os ufanistas

    Ns, brasileiros, adoramos um autoengano.

    Dizemos que somos o "pas do futebol", embora jamais tenhamos sido.

    Fomos durante cerca de 40 anos, entre mais ou menos os anos 50 e 90, o maior produtor de talentos do futebol mundial, o pas do "jogo bonito", o que, tambm, h dcadas, deixamos de ser.

  • Nosso principal campeonato, o Brasileiro, tem mdia de pblico na casa dos 15 mil torcedores por jogo.

    O da Alemanha tem mdia trs vezes maior.

    A segunda diviso alem tem mdia maior. A inglesa idem.

    O futebol turco tem mdia superior e o dos Estados Unidos tambm.

    Alis, os americanos tm gostado tanto do jogo, tm progredido a tal ponto que no ser surpresa se muito antes do que se imagina ganharem uma Copa do Mundo.

    A audincia do futebol por aqui est em queda.

    Outra coisa: o dirio "Lance!" acaba de publicar sua quinta pesquisa com o Ibope sobre o tamanho de nossas torcidas.

    No h maiores surpresas, como no surpreendeu que os marineros tenham posto os tucanos a escanteio e ameacem os petistas.

    Os rubro-negros seguem frente com 16,2% da preferncia nacional, embora tenham cado um ponto percentual, seguidos pelos corintianos, que cresceram, e foram os nicos, com 13,6%, exatamente o dobro dos so-paulinos, com 6,8%.

    Mas, mais uma vez, e pela quinta vez, o contingente dos que declaram no se interessar por futebol maior do que a maior das torcidas, a do Flamengo: 23,4 x 16,2.

    Sim, 23,4 dizem no ligar nem para a seleo brasileira.

    Na Argentina o mesmo tipo de pesquisa mostra que o primeiro contingente o de torcedores do Boca Juniors (41,5%) e o segundo de torcedores do River Plate (31,8%). Para no falar do Borussia Dortmund que tem mdia de 80 mil torcedores por jogo em sua casa.

    Some-se a isso a reverncia que os ingleses tm pelo jogo --uma visita ao Old Trafford, em Manchester, escancara o sentimento--, e, por favor, deixemos para os bonifcios patriotas esta bobagem de "pas do futebol".

    Porque a primeira medida para comear a resolver os problemas do futebol brasileiro identific-los sem subterfgios, coisa que a maioria da cartolagem avestruz se recusa a fazer. Vai ver, at agradece que no sejam solucionados porque quanto menos torcedores, menor presso, j que o contingente que existe suficiente, com sobras, para atender seus mesquinhos interesses.

    Os que podem resolv-los, os profissionais engajados na ideia do futebol-empresa, ocupariam o espao dela, tudo que mais teme.

  • Acabamos de ver uma nova leva de clubes aderindo a mais um Refis, o que pode diminuir o interesse pela Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte.

    Enquanto Marin beija Havelange na CBF, o futebol definha e a Alemanha, bem..., a Alemanha, 7 a 1!

    Gregorio Duvivier

    Terezinha

    Disse que era governista Disse que era oposio Mas no afirmava nada E assustada, eu disse no

    A PRIMEIRA me chegou Como quem vem do PV Trouxe um bicho meio-extinto Neotucano ps-PT

    Me enganou que era verde Trouxe um vice ruralista Disse que Deus criou Darwin E Ado era darwinista

    Disse que era governista Disse que era oposio Mas no afirmava nada E assustada, eu disse no

    -

    O segundo me chegou Como quem chega de um bar Trouxe um litro de Absolut Na Lei Seca no soprou

    Candidato mais famlia Fez aeroporto pro av Governou Minas Gerais L da praia do arpoador

    Apesar dos aeroportos Ele contra a corrupo, Mas no me convence nada E assustada, eu disse no

    -

    A terceira me chegou Ou melhor: j estava l

  • Prometeu continuidade Ao que ela comeou

    Ela j foi guerrilheira Hoje s PMDB No entendo o que ela fala Quando fala na tv

    S faz ler o teleprompter E at isso ela faz mal Ela fala e no diz nada E assustada, eu disse tchau.

    Luiz Felipe Pond

    O homem no tem salvao

    Imagine que insuportvel se ela for mais inteligente, mais gostosa, mais rica, mais humilde e mais generosa!

    O homem no tem salvao. O que viria a ser essa "salvao"?

    Para muitos, falar de "salvao" implicaria em supor alguma forma de "maldio".

    Claro, no mbito de muitas religies, uma coisa implica na outra: pecado, desequilbrio energtico (isso eu no levo muito a srio, principalmente quando envolve posies de sofs na sala e de espelhos no hall de entrada), carma, destruio da me natureza, Gaia, enfim, qualquer narrativa que justifique a fria em que estamos.

    No creio em nenhuma dessas "maldies". Mas acho sim que buscamos salvao de alguma forma. Talvez, pelo fato de que engordamos quando comemos, que adoecemos, que trabalhamos demais (porque queremos sucesso) e viramos "coisa" por isso, ou de menos (porque no rola trabalho) e ficamos pobres, porque somos feios ou porque a busca da beleza nos escraviza achando que os belos so mais amados (o que pode ser uma iluso levando-se em conta o nmero de inimigas que as mais bonitas e gostosas tm e o tdio que escorre dos seus rostos).

    Enfim, porque no somos plenos em nada. Sei que alguns gostam de dizer que a "imperfeio em si uma beleza", mas no cola. No cola no porque eu no ache que se faz necessrio combater de alguma forma a mania de perfeio (pelo contrrio, acho que sim, devemos resistir ditadura da perfeio na vida, tpica desse mundo brega que o mundo contemporneo).

    A reao ditadura da perfeio no um pseudoculto da imperfeio porque a imperfeio di muito na realidade.

  • A imperfeio falta de beleza, rugas, medo, morte, doena, pobreza, frustrao, fraqueza, traio. o simples fato de que conviver com algum melhor do que voc sempre insuportvel. Imagine se ela for mais inteligente, mais bonita, mais gostosa, mais rica, mais humilde, mais generosa! O rosto de Caim brotar em sua face.

    Eu sei que est na moda dizer que todos somos iguais, mas isso conversa para boi dormir, ou filosofia barata, ou marketing poltico "solidrio". A tentativa de dizer que a imperfeio seja uma soluo coisa de medroso, ingnuo ou mentiroso.

    Nos ltimos 300 anos padecemos de outro tipo de culto salvacionista: a f na poltica como redeno da vida e do mundo, graas a gente como Rousseau, Marx e Foucault.

    Quando ouo a propaganda poltica (sempre sem querer, claro, porque a lei da propaganda poltica no Brasil uma das maiores provas de "democracia autoritria" em que vivemos, esculhambando a grade da TV e do rdio ao bel prazer da "festa da democracia") e escuto algum falar em "alternativa socialista" sinto algo como "algum est falando em alternativa neandertal?"

    Talvez seja justamente esta "falta ontolgica" (falta ser em ns, somos mortais em todos os sentidos, como estava escrito no orculo de Apolo), como dizia o historiador romeno de religies Mircea Eliade (sculo 20). Esta falta gera contnua busca de solues por parte dos humanos.

    E as religies so o melhor produto no mercado para isso. E depois da Revoluo Francesa temos que aturar os tarados da "justia social".

    Sei que muitos pensam que, porque acreditam na cincia ou na poltica, o tema est resolvido, mas nunca est. A prova a autoajuda corporativa e individual, a "f na nutricionista", a crena no sexo como salvao (coisa de gente que faz pouco sexo).

    Penso aqui no grande Freud e seu "Mal-Estar na Civilizao" e no sofisticado socilogo Norbert Elias e seu grandioso "Processo Civilizador".

    Devido balada brega em que o mundo virou, saiu de moda lembrar que para sair da pr-histria tivemos que ficar neurticos, obcecados pelo que pensam de ns, comendo com garfos por vergonha de sujar os dedinhos e de que achem que somos pobres e sem educao. Fazendo cursos de vinhos pra fingir que somos gente fina. O custo da represso da pr-histria em ns implicou um mal-estar contnuo e sem soluo.

    Gente "bem resolvida" gosta de fingir que no teme o mal-estar na civilizao, vivem como se Freud no tivesse existido. Tudo se resolveria numa dieta com bike e numa espiritualidade que uiva pra lua.