Formação de professores, saberes, reflexividade e ... · Agradeço a Deus, por me conceder a...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CENTRO DE EDUCAÇÃO AKYNARA AGLAÉ RODRIGUES SANTOS DA SILVA BURLAMAQUI Formação de professores, saberes, reflexividade e apropriação da cultura digital no Projeto Um Computador por Aluno (UCA) Natal / RN 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

AKYNARA AGLAÉ RODRIGUES SANTOS DA SILVA BURLAMAQUI

Formação de professores, saberes, reflexividade e apropriação da cultura

digital no Projeto Um Computador por Aluno (UCA)

Natal / RN

2014

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AKYNARA AGLAÉ RODRIGUES SANTOS DA SILVA BURLAMAQUI

Formação de professores, saberes, reflexividade e apropriação da cultura

digital no Projeto Um Computador por Aluno (UCA)

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Educação do Centro de Ciências Sociais Aplicadas

da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

como requisito parcial para obtenção do título de

Doutora em Educação.

Orientadora: Profª. Drª. Maria das Graças Pinto

Coelho.

Natal / RN

2014

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UFRN. Biblioteca Central Zila Mamede.

Catalogação da Publicação na Fonte.

Burlamaqui, Akynara Aglaé Rodrigues Santos da Silva.

Formação de professores, saberes, reflexividade e apropriação da cultura digital no projeto Um Computador por

Aluno (UCA). / Akynara Aglaé Rodrigues Santos da Silva Burlamaqui. – Natal, RN, 2014.

159 f.: il.

Orientadora: Profa. Dra. Maria das Graças Pinto Coelho.

Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Educação. Programa de Pós-

Graduação em Educação.

1. Saberes docentes – Tese. 2. Um Computador por Aluno (UCA) – Tese. 3. Apropriação – Educação - Tese.

4. Reflexibilidade – Educação – Tese. 5. Cultura digital – Tese. I. Coelho,Maria das Graças Pinto. II. Universi-

dade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BCZM CDU 37.026

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AKYNARA AGLAÉ RODRIGUES SANTOS DA SILVA BURLAMAQUI

Formação de professores, saberes, reflexividade e

apropriação da cultura digital no Projeto Um

Computador por Aluno (UCA)

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Ciências Sociais

Aplicadas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para

obtenção do título de Doutora em Educação pela Banca Examinadora composta pelos

membros:

BANCA EXAMINADORA

Profª. Drª. Maria das Graças Pinto Coelho

Orientadora

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Profª. Drª. Karla Rosane do Amaral Demoly

Examinador Externo

Universidade Federal de Pernambuco

Profª. Drª. Marcília Luzia Gomes da Costa Mendes

Examinador Externo

Universidade Federal da Paraíba

Prof. Dr. Adir Luiz Ferreira

Examinador Interno

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Profª. Drª. Luciane Terra dos Santos Garcia

Examinador Interno

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Natal, RN _______ de _________________ de ________.

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DEDICATÓRIA

Ao meu marido, Aquiles Burlamaqui, pelo incentivo e

atenção em todos os momentos, e ao meu filho Athos,

minha inspiração.

Aos meus pais, Akita Aglaé e Jesaías Rodrigues, e ao meu

avô, Raimundo Germano dos Santos (in memoriam), por

acreditarem e investirem sem medirem esforços em minha

jornada de eterna aprendiz.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, por me conceder a dádiva da vida e por em alguns momentos de cansaço e

desânimo me indicar o caminho da paz e da serenidade para enfrentar os obstáculos, ajudando

a superar os desafios postos.

Aos meus pais, Akita Aglaé e Jesaías Rodrigues, por me ofertarem todo amor e felicidade que

um ser necessita para manter uma vida saudável, além de me proporcionar cuidados e

ensinamentos éticos e morais, os quais eu levarei por toda minha vida. Agradeço

especialmente ao meu avô, Raimundo Germano dos Santos (in memoriam), o qual, enquanto

esteve entre nós, nunca mediu esforços para manter meus estudos, acreditando no meu

potencial enquanto estudante.

Agradeço ao meu marido, Aquiles Burlamaqui, e ao meu filho, Athos dos Santos Burlamaqui,

pessoas a quem amo e com quem divido minha vida. Reconheço e agradeço todos os

momentos de alegrias, compreensão e cumplicidade.

Aos meus tios, tias e primas, que sempre incentivaram e deram apoio para que eu

prosseguisse com meus estudos.

A todos os professores e professoras que passaram por minha vida escolar e acadêmica, cujos

ensinamentos construídos ao longo desta trajetória de aprendizado colaboraram na minha

formação de profissional da educação, carreira que admiro profundamente e que escolhi para

a minha vida.

À minha estimada Professora-orientadora Maria das Graças Pinto Coelho, por me receber

como sua orientanda, pelos ensinamentos transmitidos nesta jornada, pelas discussões

valiosas e conversas despretensiosas entre uma orientação e outra e pelas parcerias

significativas em artigos científicos apresentados durante esse tempo de convívio acadêmico.

À Professora Apuena Vieira Gomes e a Adja Andrade, por oportunizarem meu contato com o

Projeto Um Computador por Aluno. São meus exemplos profissionais por demonstrarem,

através de seus atos, serem grandes professoras-amigas - e por vezes amigas-professoras.

Agradeço pelo apoio e ensinamentos dados em todo esse tempo de convívio

acadêmico/profissional.

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À professora Marly Amarilha, pela participação em banca de seminário doutoral. Agradeço

pelas contribuições valiosas para o presente trabalho .

Aos meus queridos colegas pós-graduandos, Zoraia Assunção, Patrícia Gallo e Dalvaci Bento,

por estarmos todos juntos na Academia compartilhando objetivos comuns, trocando

experiências e contribuições teóricas, em encontros bastante significativos e motivadores para

o processo de efetivação da pesquisa. Agradeço pelas conversas, pelos momentos de lazer nas

viagens para congressos, pela cumplicidade, pelas indicações de leituras e pela amizade.

A todos que compõem a Escola Estadual Maria Cristina, lócus empírico desta pesquisa.

Agradeço pela acolhida e por acreditarem e contribuírem para a efetivação deste trabalho.

Ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRN e à CAPES, pelo apoio e

financiamento, respectivamente, deste trabalho.

Finalizo com um agradecimento a todos os amigos que, de forma direta ou indireta, me

incentivaram e apoiaram nesta jornada permeada de construções permanentes.

Muito obrigada.

Akynara Aglaé Burlamaqui

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“Produzir conhecimento por meio de uma pesquisa

sistemática é criar as possibilidades de interpretar o

mundo no seu instante de criação. Ao produzir

conhecimento, criamos o mundo, os mundos, as

interpretações, os significados, os sentidos e a própria

existência de um modo de ser.”

(PIMENTA, p. 13, 2006)

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Formação de professores, saberes, reflexividade e

apropriação da cultura digital no Projeto Um

Computador por Aluno (UCA)

RESUMO

Este estudo investiga a formação de professores e a prática cognitiva dos docentes em uma

escola de Educação Básica que adotou o Projeto Um Computador por Aluno (UCA) em seu

cotidiano escolar. Sua relevância consiste em fornecer direções para a continuação das ações

de formação do projeto e nortear o fazer e o pensar docentes junto às suas práticas

pedagógicas com uso do laptop no modelo um para um. Defende-se que a formação do

educador para uso social das mídias digitais (em especial, os laptops provenientes do UCA)

abre espaços para o estabelecimento de novas relações sociotécnicas, de novas práticas socais

e profissionais, novas pertenças identitárias e de um processo de reflexividade e reconstrução

de saberes para ensinar. Reafirmamos a importância da reflexividade e da apropriação da

cultura digital para melhor desenvolvimento da prática docente com uso das Tecnologias da

Informação e Comunicação (TICs), enfocando os aspectos de uso social e profissional da

tecnologia. O estudo alinha-se à vertente qualitativa e trata-se de um rastreamento processual

com base em princípios da pesquisa etnográfica. Como procedimentos e instrumentos

metodológicos, foram adotados: a observação intensiva dos ambientes escolares, a análise

documental, o grupo focal, questionários semiestruturados e entrevistas individuais

semiestruturadas. A pesquisa realizou-se em uma escola pública do município de Parnamirim

– RN. A amostra de sujeitos refere-se a 17 docentes, procedentes do ensino fundamental I e II,

Educação de Jovens e Adultos e Ensino Médio que passaram pelo processo de formação UCA

e que inseriram os laptops em sua prática pedagógica. O corpus da pesquisa está estruturado

com base nas mensagens construídas no processo de coleta de dados e é analisado com base

em princípios da Análise de Conteúdos, especificados por Laurence Bardin (2011). Tomou-se

como referencial teórico os estudos de Tardif (2000; 2011), Pimenta (2009), Gorz (2004,

2005), Giddens (1991), Dewey, J. (1916), Boudieu (1994; 1999), Freire (1996; 2005), entre

outros. A análise aponta um processo de reconstrução/revisão de saberes para ensinar e atuar

na cultura digital, saberes esses pautados na experiência dos sujeitos investigados. Os saberes

reconstruídos serão desvendados a partir de um processo de categorização. Os seguintes

grupos de saberes: “saberes da técnica”, “saberes didático-metodológicos” e “saberes da

profissionalização” foram construídos na premissa da apropriação da cultura digital em

contexto educacional. A análise confirma o surgimento de novas formas de sociabilidades ao

adquirirem outras formas de agir e de pensar as TICs, apesar do ambiente adverso à

reflexibilidade compartilhada entre os docentes. Revela, ainda, com base no conceito de

apropriação presente na análise dos dados, a construção de sentidos de pertencimento e de

transformação do sujeito no percurso social a partir do entrelaçamento da prática docente com

a cultura digital. Ressalta, por fim, a importância de uma formação para uso das TICs que

ultrapasse a instrumentalização, ou seja, o que denominamos “saberes da técnica”, mas que

tenha em sua base estrutural a reflexividade compartilhada, a abertura para a ressignificação e

(re)construção de saberes e fazeres e que permita realmente, ao professor, a vivência de uma

experiência capaz de propiciar transformações de suas relações sociotécnicas.

Palavras-Chave: Um Computador por Aluno (UCA), Apropriação, Reflexibilidade, Cultura

Digital, Saberes Docentes.

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Teacher training, knowledge, reflexivity and appropriation of

digital culture at the Project One Computer per Student (UCA)

ABSTRACT

This study investigates teacher training and cognitive practice of teachers in a Basic

Education school that adopted the Project One Computer per Student (OCS) in their school

routine. Its relevance consists in provide directions for the continuation of training activities

on the Project and guide the teachers with their pedagogical practices using the laptop model

one to one. The thesis defended is that the educator formation for social using of digital media

(specially the laptops from the Project UCA) gives space to establish new sociotechnical

relationships, of new social and professionals practices, new identitary components and a

process of reflexivity and knowledge reconstruction to teach. We reaffirm the importance of

reflexivity and appropriation of digital culture for the better development of teaching practice

using the Information and Communication Technologies (ICTs), giving focus to the aspects of

social and professional use of the technology. The study is part of the qualitative aspect and is

a procedural tracking based on principles of ethnographic research. As procedures and

methodological tools, were used: intensive observation of school environments, documental

analysis, focal group, semi-structured questionnaires and semi-structured individual

interviews. The research was held in a public school in the city of Parnamirim - RN. The

subject sample relates to 17 teachers, coming from the elementary school I and II, Youth and

Adult Education and High School, who went through the process of training UCA and having

entered the laptops in their teaching. The research corpus is structured based on the messages

built into the process of data collection and is analyzed based on principles of Content

Analysis, specified by Laurence Bardin (2011). Was taken as theoretical reference studies by

Tardif (2000; 2011), Pimenta (2009), Gorz (2004, 2005), Giddens (1991), Dewey, J. (1916),

Boudieu (1994; 1999), Freire (1996; 2005), among others. The analysis indicates a process of

reconstruction / revision of knowledge to teach and work in digital culture, being these

knowledges guided by the experience of the subjects investigated. The reconstructed

knowledges will be revealed from a categorization process. The following groups of

knowledges: "technical knowledges", "didactic-methodological knowledges” and

“knowledges of professionalization" were built on the assumption of ownership of digital

culture in the educational context. The analysis confirms the appearance of new ways of

sociability when acquiring other forms of acting and thinking ICTs, despite the environment

adverse to the reflexivity shared among the teachers. Also reveals, based on the ownership

concept present on the data analysis, the construction of meanings of belonging and

transformation of individuals into social routes from the interweaving of the teaching practice

with the digital culture. Emphasizes, finally, the importance of a training for use of ICTs that

exceeds the instrumentation, in other words, what we call "technical knowledges", but taking

on its structural basis the shared reflection, the opening for the ressignificance (new meaning)

and reconstruction of new knowledges and practices and that really allows, to the teacher, the

living of an experience capable of providing socio-technical transformations of their

relationships.

Keywords: One Computer per Student (UCA), Appropriation, Reflectivity, Digital Culture,

Knowledges Docents.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

EJA Programa de Educação de Jovens e Adultos

GTUCA Grupo de Trabalho de Assessores Pedagógicos

IES Instituto de Ensino Superior

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação e Cultura

NTE Núcleo de Tecnologia Estadual

NTM Núcleo de Tecnologia Municipal

OCS Project One Computer per Student

PPP Programa Político Pedagógico

RECOMPE Regime Especial de Aquisição de Computadores para Uso

RN Rio Grande do Norte

SE Secretaria Estadual

SEED Secretaria de Educação à Distância

TIC Tecnologia da Informação e Comunicação

UCA Um Computador por Aluno

UFC Universidade Federal do Ceará

UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte

UNDIME União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação

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LISTA DE FIGURAS

Figura 01 Novas salas de aula do Projeto UCA – Escola Estadual Maria Cristina -

Parnamirim – RN............................................................................................ 81

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 Domínio de conhecimento geral dos professores sobre ferramentas

da informática................................................................................................... 96

Gráfico 02 Nível de conhecimento específico.................................................................... 96

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LISTA DE QUADROS

Quadro 01 Sistemática de observação das aulas com uso dos laptops do Projeto

UCA.................................................................................................................103

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LISTA DE TABELAS

Tabela 01 Detalhamento de dados referentes às primeiras experiências do

Projeto UCA..................................................................................................... 62

Tabela 02 Tabela criada a partir de dados contidos no site do PROJETO

UCA/MEC........................................................................................................ 63

Tabela 03 Número de escolas, alunos e professores beneficiados com o UCA................ 64

Tabela 04 Municípios e escolas contempladas com a implantação do Projeto

Um Computador por Aluno no RN................................................................... 74

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 18

1.1 QUESTÕES DE ESTUDO.......................................................................................... 18

1.2 ORIGEM DO ESTUDO............................................................................................... 19

1.3 O ESTADO DA ARTE................................................................................................. 22

1.4 JUSTIFICATIVA.......................................................................................................... 25

1.5 ESTRUTURAÇÃO DA TESE.................................................................................... 31

2 NOVOS TEMPOS, NOVOS DIRECIONAMENTOS PARA A EDUCAÇÃO E

ATIVIDADE DOCENTE........................................................................................... 33

2.1 BREVE PANORAMA DAS TRANSFORMAÇÕES E MODELOS DO PROCESSO

FORMADOR............................................................................................................... 44

2.2 TICS, SABERES, APROPRIAÇÃO DIGITAL, REFLEXIVIDADE

E TRANSFORMAÇÃO NAS RELAÇÕES SOCIOTÉCNICAS............................... 48

3 O PROJETO UM COMPUTADOR POR ALUNO E O PROCESSO DE

FORMAÇÃO DE PROFESSORES......................................................................... 60

3.1 CONCEPÇÃO E FUNCIONAMENTO...................................................................... 60

3.2 O PLANO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO PROJETO UCA.................. 67

3.2.1 Princípios e organização estrutural do plano de formação e professores no Projeto

UCA............................................................................................................................. 68

3.2.2 A sistematização dos módulos de formação e dos conteúdos...................................... 70

3.3 UCA NO RIO GRANDE DO NORTE........................................................................ 73

3.3.1 A Escola Estadual Maria Cristina e o projeto de formação UCA................................ 75

3.3.2 Algumas considerações sobre o desenvolvimento do projeto um computador por

aluno na escola estadual maria cristina........................................................................ 78

3.3.3 Quanto aos conteúdos, atividades e módulo I (Apropriação Tecnológica).................. 78

3.3.4 Quanto à infraestrutura e o desenvolvimento das ações de formação.......................... 80

4 O CAMINHO TRILHADO: ASPECTOS METODOLÓGICOS.......................... 84

4.1 O DESENHO DAS ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS DA PESQUISA: A FASE

EXPLORATÓRIA E A (RE)DESCOBERTA DO PROBLEMA DA

PESQUISA................................................................................................................... 93

4.1.1 Análise documental e aplicação de questionário: Professor e sua relação com o

universo da informática................................................................................................ 94

4.1.2 O grupo focal e as trajetórias dos professores...............................................................97

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4.1.3 Observando o espaço de compartilhamento da tecnologia.......................................... 99

4.1.4 As entrevistas............................................................................................................. 107

4.2 A BASE TEÓRICA PARA ANÁLISE DOS DADOS............................................... 109

5 EM BUSCA DOS SABERES DECORRENTES DA APROPRIAÇÃO

TECNOLÓGICA DO PROFESSOR...................................................................... 111

5.1 O QUADRO DA ANÁLISE DE CONTEÚDO: OS SABERES DECORRENTES

DA APROPRIAÇÃO TECNOLÓGICA EM CATEGORIAS.............................. 111

5.2 OS SABERES ADVINDOS DA APROPRIAÇÃO DA CULTURA DIGITAL

UCA........................................................................................................................... 117

5.2.1 O saber técnico........................................................................................................... 117

5.2.2 Os saberes didático-metodológicos............................................................................ 121

5.2.3 Os saberes da profissionalização................................................................................ 124

5.3 A REFLEXIVIDADE E AS MARCAS DE TRANSFORMAÇÃO DAS

RELAÇÕES SOCIOTÉCNICAS............................................................................. 127

6 CONSIDERAÇÔES FINAIS.................................................................................. 134

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................145

APÊNDICES..............................................................................................................153

APÊNDICE 01: Questionário aplicado aos professores da Escola Estadual Maria

Cristina que aderiram à proposta do Projeto UCA.....................................................153

APÊNDICE 02: Guia utilizado para orientar as discussões do grupo focal junto aos

professores da Escola Estadual Maria Cristina...........................................................157

APÊNDICE 03: Roteiro utilizado para realização de entrevista com os professores da

Escola Estadual Maria Cristina...................................................................................159

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1 INTRODUÇÃO

A pesquisa “Formação de professores, saberes, reflexividade e apropriação da cultura

digital no Projeto Um Computador por Aluno (UCA)” enfoca a interface Tecnologias da

Informação e Comunicação (TICs), formação e saberes docentes e apropriação da cultura

digital, dentro do contexto do Projeto Um Computador por Aluno (UCA). Esse projeto foi

instituído com intuito de promover uma inclusão digital mediante a aquisição e a utilização de

laptops de baixo custo, doados a instituições públicas de ensino localizadas em diversos

Estados do Brasil.

O estudo ocorreu na Escola Estadual Maria Cristina, no município de Parnamirim, Rio

Grande do Norte. Contamos com a participação de um grupo-sujeito, composto por 17

docentes, que aderiram à proposta de utilização de um laptop por aluno em sua dinâmica de

sala de aula.

Temos como objetivo geral conhecer o plano de formação de professores no contexto do

Projeto UCA na Escola Estadual Maria Cristina, investigando se essa formação possibilita a

(re)construção de saberes para ensinar com uso das TICs, saberes estes decorrentes do

processo de reflexividade e apropriação da cultura digital.

Sua relevância consiste em fornecer direções para continuação das ações de formação do

Projeto e nortear o fazer e o pensar docentes junto às suas práticas pedagógicas com uso do

laptop, no modelo um para um.

1.1 Questões de Estudo

Traçamos a abordagem sobre o conceito de apropriação da cultura digital associada à

reflexividade e saberes para ensinar. O recorte analítico foi amparado em duas questões

norteadoras:

Observar a dinâmica abrangente do fluxo interacional envolvendo 17

professores da Escola Estadual Maria Cristina, em Parnamirim, e os novos recursos

sociotécnicos (laptops) no ambiente escolar em que se insere o “Projeto Um

Computador um Aluno” (UCA). Dentro da ambiência do projeto, questionou-se: quais

as inferências que identificam a reconstrução de saberes requeridos pela

apropriação da cultura digital no ambiente escolar? Qual a tipologia desses

saberes?

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Sabemos que a interação se confronta com a mediação, mas dela se distingue,

ao estabelecer um processo cognitivo que se manifesta em diferentes movimentos de

percepção, reflexão e pertencimento. Desse modo, como são apresentadas as marcas

de interação e transformação das relações sociotécnicas no ambiente educacional

analisado, o qual adere à cultura digital na experiência do Projeto UCA?

Podemos expor, ainda, que foi a vivência da pesquisadora, durante os últimos anos, como

formadora do Projeto Um Computador por Aluno que desencadearam as inquietações quanto

à atenção que é dada aos professores na elaboração e efetivação desse tipo de projeto, além de

nossa preocupação com a concepção de formação docente que está sendo desenvolvida nas

escolas beneficiadas pelo Projeto, especialmente em relação à redefinição e alargamento do

papel do professor no contexto de uso das TICs na escola e aos saberes para ensinar,

decorrentes da sistemática de formação realizada.

1.2 Origem do Estudo

O interesse pela temática surgiu com a inserção da pesquisadora no Projeto Um

Computador por Aluno no Rio Grande do Norte (RN), na condição de tutora. A entrada nesse

projeto despertou indagações relacionadas à maneira como os docentes compreendem e

utilizam a tecnologia, especificamente os laptops provenientes do Projeto UCA.

Acreditávamos que tais indagações estariam ligadas a uma concepção de formação continuada

pela qual os professores passariam, e uma dessas formações estaria sendo proporcionada pelo

Projeto UCA.

Nesse sentido, a concepção de formação docente dentro do Programa Governamental de

inclusão digital UCA vem sendo elemento motivador para empreendermos o estudo nesta

pesquisa.

Em nossa dissertação de mestrado, nos preocupamos com a temática da inclusão /

apropriação da cultura digital dentro de projetos que envolviam o uso da robótica educacional,

contestando a dimensão conceitual do termo inclusão dentro da proposta de uso da robótica

educacional em contexto de educação não-formal. Evidenciamos que, apesar do programa de

robótica no locus empírico analisado entender a inclusão dentro de uma visão mais

pragmática e instrumental, os alunos investigados proferiram discursos onde integraram a

tecnologia ao seu contexto social de forma harmônica, desfrutando da sua cidadania cultural

de forma plena.

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As análises empreendidas na dissertação de mestrado foram essenciais para percebermos a

dimensão do conceito de inclusão, entendida não como a simples capacitação técnica do

indivíduo para utilizar a tecnologia, mas como um processo amplo, que envolve mais do que a

dimensão técnica. São incluídas, nesse aprendizado, dimensões afetivas, sociais e

psicológicas, que resultam em uma possível mudança de habitus (BOURDIEU,1999; 2011),

de mobilidade, de novas sociabilidades e de estabelecimento de novas relações sociotécnicas.

A compreensão adquirida durante o período do mestrado acadêmico em torno do processo

de apropriação sócio-digital nos fez analisar o contexto do Projeto Um Computador por

Aluno (UCA) - lócus empírico desta tese - com uma visão aprofundada sobre o significado do

termo, pois acreditamos que todo e qualquer processo de apropriação cultural, seja ela social

ou digital, envolve a possibilidade de o indivíduo adquirir saberes (entendido aqui como um

conjunto de competências e habilidades) necessários para participação e análise crítica da

sociedade.

Tendo em vista que a formação continuada é fator importante para a atualização de

saberes docentes para ensinar ao indivíduo a atuar na sociedade, enfatizamos nesta pesquisa

que as mudanças sociais, especialmente marcadas “pela emergência de um novo paradigma

tecnológico, baseado nas tecnologias de comunicação e informação” (CASTELLS, 2013, p.

17), resultam no poder fértil da informação, capaz de concretizar uma nova estrutura social.

Compreendemos, desta forma, que essa nova estrutura social formada a partir da

influência de novas tecnologias acaba determinando, entre outros aspectos, uma metamorfose

na concepção de trabalho. Surge, nesse sentido, um “trabalho imaterial” (GORZ, 2004; 2005),

que se refere a toda e qualquer atividade que exija do profissional o uso do conhecimento.

Esse trabalho imaterial baseia-se em um “capitalismo cognitivo”, surgido de uma “Sociedade

Inteligência” (knowledgesociety). Em tal capitalismo, na visão de Gorz (2005), o(s) saber(es)

ocupa(m) uma função de destaque nas forças produtivas.

Estaríamos, portanto, na visão desse autor, conciliando dois tipos de modos de produção

no seio da sociedade capitalista. De um lado, teríamos um modo de produção baseado no

valor-trabalho, o qual tem como medida unidades de tempo de produção. Do outro lado,

teríamos um modo de produção baseado na cognição, no qual o processo de valorização do

trabalho e do profissional estaria ligado a um tipo de trabalho imaterial, a um “capital-

humano” ou “capital-conhecimento”.

Portanto, nas palavras de André Gorz (2005), o componente saber presente no modo de

produção cognitivo privilegia saberes originados da experiência, o discernimento e a

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capacidade de coordenação, de auto-organização e de comunicação, diferentemente de um

tipo de saber técnico. Esses saberes não podem ser formalizados e medidos.

Com a transformação na concepção de trabalho e ao devir da Sociedade de Informação,

baseada na produção e no uso das TICs, ou mesmo da Sociedade Inteligência, as quais

destacam o papel do capital-conhecimento, compreendemos ser imperativa a restruturação no

trabalho do profissional da educação. A (re)constituição de saberes para ensinar a atuar na

sociedade atual são premissas importantes a serem incorporadas à prática pedagógica.

Defendemos, nesta tese, que a formação do educador para uso social das mídias digitais

abre caminhos para o estabelecimento de novas relações sociotécnicas, de novas práticas

sociais e profissionais e de novas pertenças identitárias. Contudo, acreditamos que tais

mudanças ocorrem pela reconstrução de saberes, resultando em uma nova compreensão da

ordem social.

A necessidade de renovação de saberes por parte da categoria docente surge, entre outros

aspectos, pela massificação das mídias digitais. Para a renovação desses saberes, pressupõe-se

a capacitação docente contínua, o estudo, a curiosidade e o interesse em estar atualizado pois,

ensinar, aprender e agir ao mesmo tempo como professor e aprendiz são desafios e requisitos

fundamentais para os que se dedicam e querem uma restruturação no saber-fazer docente.

Nesse sentido, os saberes reconstruídos através da atividade docente com o uso dos

laptops do Projeto UCA, sob as primícias da apropriação da cultura digital e da reflexividade,

serão o problema de nossa investigação.

Os saberes pautados em nossas discussões referem-se aos saberes provenientes do caráter

dinâmico da profissão docente em sua prática social, ou seja, de sua experiência. Apesar de

reconhecermos que os saberes da docência decorrem de vários matizes (como por exemplo, os

saberes formalizados advindos da Academia, os saberes que compõem cada disciplina

curricular, etc.), defendemos um tipo de saber produzido no cotidiano profissional em um

processo que denote autorreflexividade e uma reflexividade coletiva entre educadores sobre

suas práticas, suas vivências e sobre os novos saberes/informações adquiridos por meio do

processo de midiatização por diferentes meios (colegas de profissão, recursos digitais, família,

comunidade, etc.).

Nesse contexto, acordamos com Pimenta (1997), a qual nos esclarece que estamos em um

momento de “reinventar os saberes pedagógicos a partir da prática social da educação, no

caso da formação de professores, a partir de sua prática social de ensinar.” (PIMENTA, 1997,

p.10). Assim sendo, nos ancoramos, além de Pimenta (2009; 1997), em autores como Tardif

(2000; 2011), Gauthier (1998) e Freire (2011, 2005; 1996), para estarmos discutindo e

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analisando os saberes (re)construídos através da prática com uso dos laptops no contexto do

Projeto Um Computador por Aluno.

Além de tratarmos sobre os saberes da docência, incluímos em nossas discussões o

conceito da Reflexividade (GIDDENS, 1991), (LIBÂNEO, 2010), que diz respeito a uma

nova maneira de entender as mudanças trazidas pela vida moderna.

Com base no pensamento de Giddens (1991), a Reflexividade sugere uma autorreflexão

acerca da mutação intrínseca dos processos sociais. Isso consiste no fato de que o sujeito está

constantemente examinando as práticas sociais e reformulando-a, à luz da interiorização de

saberes renovados sobre essas mesmas práticas, consequentemente alterando o caráter e a

maneira com que o ser humano enxerga determinada sociedade.

Para nos orientarmos ainda sobre conceito de Reflexividade abordado nessa pesquisa

recorremos também a Libâneo (2010), o qual entende a reflexividade como um processo de

autoanálise sobre nossas próprias ações, análise empreendida de forma interpessoal ou com

apoio de outros sujeitos. O conceito de reflexividade clarifica nossa compreensão sobre o

modo como os docentes entendem, adquirem e/ou reconstroem saberes na experiência UCA.

Evidenciamos que o conceito de Reflexividade surge ao percebemos, durante o

desenvolvimento da pesquisa, que para reconstruir seus saberes, os professores passaram por

um processo de autorreflexividade. Desta forma, observamos que os docentes, apesar de

reconhecerem a grandiosa mudança social provocada pelo devir das tecnologias digitais,

salvaguardam o direito de possuir limites pessoais de entendimento e uso dessas tecnologias,

decorrentes de sua reflexividade, preservando assim, suas individualidades.

O problema de pesquisa e conceitos teóricos apresentados foi esboçado ao mesmo tempo

em que excursionávamos sobre temáticas que abordassem o contexto apresentado nesta

investigação. Observamos que existem academicamente poucas pesquisas que evidenciam o

contexto do Projeto Um Computador por Aluno. A incipiente amostra de pesquisas que

delimitamos como nosso estado da arte não alia saberes docentes, apropriação da cultura

digital e reflexividade social ao contexto UCA, fato que nos motivou a dissertar acerca desta

problemática de pesquisa.

1.3 O estado da arte

Poucos trabalhos acadêmicos no Brasil atentaram para o desenvolvimento dos programas

de uso de laptops no modelo um para um. Na revisão bibliográfica que dimensionou o estado

da arte, observamos que os trabalhos acadêmicos, publicados a partir do ano de 2008,

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enfocaram basicamente a implantação do projeto, contemplando o impacto inicial e as

repercussões causadas pela inserção deste modelo de uso da tecnologia aos docentes, alunos e

currículo, considerando escolas específicas em cada região.

Silva (2009), em sua dissertação de mestrado, denominada “O impacto inicial do laptop

educacional no olhar de professores da rede pública de ensino”, nos revela o impacto inicial

do laptop educacional do projeto UCA no olhar dos professores da rede pública de ensino.

Como resultado, a pesquisa mostra que na escola analisada o uso do laptop favoreceu a

relação entre professores e alunos, pelas ações de respeito, colaboração e comprometimento

envolvidos nas atividades desenvolvidas com o uso da ferramenta.

Com o trabalho intitulado “Repercussões do projeto Um Computador por Aluno no

Colégio Estadual Dom Alano Marie Du Noday (Tocantins)”, Silva (2009) investiga possíveis

contribuições do projeto UCA em uma escola no Estado do Tocantins, Brasil. A autora

apresenta, em seus resultados obtidos por meio de técnicas de entrevista e observações,

mudanças em relação à organização do trabalho pedagógico advindos com a inserção do

Projeto UCA na escola, enfocando a dinamicidade das aulas e maior interação entre

professores e alunos e destes com seus pares. A autora ainda evidencia na pesquisa a

necessidade de se criarem práticas de planejamento e que esse seja fruto das reflexões das

experiências vividas pelos professores no próprio ambiente escolar.

Moreira (2010) ainda é um dos autores que foca em sua pesquisa o impacto e as

repercussões do Projeto UCA. Em sua dissertação “Análise das reações dos professores face

à introdução do computador na educação: O caso do Projeto UCA, Um Computador por

Aluno no Colégio Estadual Dom Alano Marie Du Noday, Tocantins”, Moreira (2010) analisa

as reações dos professores com a introdução do computador na educação. A pesquisa

evidencia maior interação na relação educativa entre os professores e os alunos através da

troca de conhecimentos por meio do uso dos laptops. Ressalta ainda que a inserção do projeto

na escola não se dá de forma total, devido a problemas com o suporte técnico-pedagógico e

com a estrutura física.

Ainda seguindo a mesma temática de trabalhos (impacto e repercussões do Projeto UCA),

Santos (2010) faz uma análise sobre o processo de implantação dos laptops em uma escola em

Palmas (TO), verificando ocorrências de mudanças no currículo depois da implantação do

Projeto UCA. O estudo demonstra que o currículo da escola investigada não apresentou

mudanças, contudo foram realizadas práticas isoladas que abrangiam o uso dos laptops em

algumas propostas pedagógicas. As práticas decorriam das possibilidades de interação e de

fácil acesso ao conhecimento que o laptop do Projeto UCA possibilitava.

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Encontramos, ainda, em um estudo de caso com o uso dos laptops no modelo 1:1 (um

para um, ou seja, um computador por aluno), a prática de leitura e escrita de crianças de seis

anos em processo de alfabetização (KIST, 2008). O estudo teve como objetivo investigar as

práticas de leitura das crianças, bem como as possibilidades e condições necessárias para que

o laptop fosse instrumento para inscrevê-los no mundo letrado. Verificou-se que a utilização

cotidiana do laptop permitia a exploração da língua e situações reais, construindo ambiente

propício para a compreensão da função e do sentido da língua escrita.

Há ainda um estudo que trata da construção de diretrizes e regras que devem ser seguidas

pelos elaboradores dos editais para a contratação da instalação da internet sem fio nas escolas

que possuem o Projeto UCA (GOMES, 2010).

São acrescentadas ainda duas pesquisas, as quais focalizam a formação de professores

pensada pelo Projeto Um Computador por Aluno. Um dos trabalhos destaca as impressões

dos professores sobre sua formação, revelando que o plano traçado para formação dos

docentes na escola analisada é deficiente, ou seja, se torna insuficiente para uma prática

pedagógica significativa com o uso dos laptops em sala de aula (MARQUES, 2009).

Outro trabalho trata da apropriação da Web 2.0 pelos professores por meio do Projeto Um

Computador por Aluno e as consequências pedagógicas para o campo didático (PONTES,

2011). Os resultados dessa pesquisa assinalaram que os docentes não conheciam as

possibilidades pedagógicas da Web 2.0, mas que no decorrer da investigação obtiveram

mudanças positivas no uso instrumental das ferramentas utilizadas.

O que observamos nas pesquisas que agrupamos como estado da arte, especialmente nas

duas últimas que tratam da formação de professores, as quais possuem uma filiação maior

com o presente estudo, é que ora retratam de forma panorâmica a implantação do Programa

em determinados contextos de uso dos laptops, ora expõem as consequências da apropriação

(técnica) do artefato digital para o âmbito profissional (sala de aula) do docente.

Percebemos, dessa forma, que as Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs)

revelam-se mais plásticas às práticas educacionais e às atividades do sistema de educação.

Contudo, evidenciamos que uma interação importante está acontecendo, que não se limita ao

uso do computador em sala de aula, mas que penetra em todas as atividades educativas. Para

entender o processo interativo, é necessário discutir o papel dos professores, a atividade direta

- no caso, o fazer no âmbito escolar. Tal relação direta está associada à apropriação da cultura

digital. Esse é um processo diferente do que aconteceu com os suportes técnicos que

chegaram à escola com a expansão da mídia de massa. Anteriormente, esses suportes não

conseguiram produzir saberes cognitivos ao penetrar na instituição educacional. De fato,

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reproduziam efeitos imediatos nas suas emissões a partir de um sistema de significados

ideologizados.

Nessa perspectiva, inferimos que as práticas profissionais e sociais dos professores

investigados nessa tese estão sendo transformadas, mas que somente podem ser

compreendidas criticamente e paulatinamente na experiência do cotidiano, no

acompanhamento das novas informações aprendidas com a participação no Projeto Um

Computador por Aluno.

1.4 Justificativa

O debate em curso sobre a natureza da cultura tecnológica e os seus benefícios ou

malefícios nas práticas sociais é, sem sombra de dúvidas, um dos temas mais disputados nos

campos epistemológicos da mídia e da educação. Nas análises e recomendações relacionadas

ao tema, temos visto, principalmente nas últimas décadas, várias iniciativas em políticas

públicas por parte dos governos e de outros agentes interessados na interação mídia-cognição.

Muitas iniciativas são acadêmicas, como é o caso dos estudos sobre letramento midiático

(JENKINS, 2009). Outras são intervenções políticas por parte de organizações socioculturais

que, invariavelmente, propõem a apropriação da natureza da mídia como lócus de consenso

para impulsionar reconfigurações sociais.

Ao direcionarmos o nosso olhar sobre as intervenções e políticas públicas empreendidas

com o propósito da apropriação da cultura digital pelo professor, especialmente sobre o

Projeto Um Computador por Aluno (UCA), consideramos fundamental termos em mente que

essa apropriação está intrinsecamente ligada à aquisição de saberes específicos e à

transformação das maneiras de aquisição do saber, para assim atuar e reconfigurar os

processos sociais.

Vivemos uma mutação contemporânea da relação do ser humano com o saber (LÉVY,

1993), especialmente no contento do ciberespaço, onde residem tecnologias das inteligências

individual e coletiva, criadas para propiciar o compartilhamento de saberes e sua construção

colaborativa. Ao materializarmos essas tecnologias da inteligência, temos diversificados

recursos digitais com a capacidade de amplificar e transformar numerosas funções cognitivas

humanas, como nossa memória, percepção, imaginação, etc.

Com a mudança da relação que se estabelece com o saber, especificamente no que tange a

sua aquisição, produção e disseminação/compartilhamento, a educação e a formação humana

como um todo se transfiguram. As necessidades de aprendizagem estão diferenciadas e não

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condizem mais com a construção de um currículo escolar estanque, precisamente pré-

definido. Moreira (1997) nos afirma que:

Pensar o conhecimento como produto atomizável, natural, neutro e objetivo implica

renunciar à compreensão de currículo como cultura. Entendemos cultura em seu

sentido crítico de produção simbólica, como um espaço de luta por hegemonias de

posições no âmbito social, como um terreno de manutenção ou de superação da

divisão social. Nessa acepção, a prática curricular transforma-se em um processo de

significações e ressignificações ativas dos conteúdos recebidos. Trata-se de entender

o currículo como prática social concreta, contextualizada tanto no âmbito estrutural

quanto no sociocultural. Tal contextualização torna-se impossível, à medida que o

currículo é tomado como produto e homogeneamente aplicado a diferentes grupos.

(MOREIRA, 1997, p. 45)

A contextualização curricular, nos seus âmbitos estrutural, social e cultural, como sugere

Moreira (1997), possibilita entender que o saber, dentro de uma dada proposta curricular, não

é mais hierarquizado, organizado pela definição de pré-requisitos e preso a muros e períodos

específicos. Ao contrário, ele hoje se mostra aberto, volátil e personalizado. Essa nova lógica

do saber é construída em grande parte pelo surgimento das Tecnologias da Informação e

Comunicação (TICs), que nos apresentam novos modelos e espaços de conhecimento.

Nesse sentido, entendemos que a nova conjuntura de obtenção e mobilização de saberes

também está ligada ao advento das chamadas tecnologias da inteligência, e isso nos faz inferir

que a nova sistemática do saber, em parte, relaciona-se com o nível de apropriação

tecnológica do sujeito.

Tomando como base o conjugado entre a nova sistemática de aquisição e

produção/disseminação de saberes e as TICs, surgem diversificadas iniciativas

governamentais para a inclusão digital, entre elas esta o Projeto Um Computador por Aluno,

contexto no qual se realiza nossa pesquisa. Contudo, há ainda programas/projetos que

sintonizam a perspectiva da inclusão digital, com base na obtenção de saberes através do

acesso às novas tecnologias.

O Programa de Governo Eletrônico Brasileiro (BRASIL, 2013) reúne iniciativas

governamentais que fazem uso das Tecnologias da Informação e Comunicação para

democratizar o acesso à informação, ampliar discussões e dinamizar a prestação de serviços

públicos. Inseridos nesse Programa, há diferentes iniciativas de inclusão digital. Segundo

informações do próprio Programa de Governo Eletrônico Brasileiro, as iniciativas nessa área

visam garantir a disseminação e o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação

orientadas ao desenvolvimento social, econômico, político, cultural, ambiental e tecnológico,

centrados nas pessoas, em especial nas comunidades e segmentos excluídos. (BRASIL, 2013).

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São exemplos dessas iniciativas o Projeto Banda Larga nas Escolas, o qual tem como

objetivo conectar escolas públicas urbanas à internet, por meio de tecnologias que propiciem

qualidade, velocidade e serviços para incrementar o ensino público no País; o Projeto

Computadores para Inclusão, que visa à inclusão digital através da oferta de oficinas, cursos,

treinamentos e outras atividades formativas, com foco no recondicionamento e manutenção de

equipamentos de informática a jovens de baixa renda. Esse Projeto atende apenas nas regiões

metropolitanas de Porto Alegre, Brasília, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Belém e

Recife; o Projeto Cidadão Conectado – Computador para Todos, instituído no ano de 2005,

com o intuito de promover a inclusão digital mediante a aquisição em condições facilitadas de

computadores, programas de computador (softwares) neles instalados e de suporte e

assistência técnica necessários ao seu funcionamento.

Faz parte ainda das iniciativas de Inclusão Digital do Governo Brasileiro o Programa de

Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais. Que foi iniciado no ano de 2005 para

disponibilizar aos sistemas públicos de ensino equipamentos de informática, mobiliários,

materiais pedagógicos e de acessibilidade, com vistas a apoiar a ampliação da oferta do

atendimento educacional especializado. No ano de 2008, esse Programa atingiu a marca de

4.300 salas com recursos multifuncionais disponibilizados;

Além desses, há ainda o Programa Telecentros Comunitários, que são espaços públicos

providos de computadores conectados à internet em banda larga, onde são realizadas

atividades com uso das TICs, com o objetivo de promover o desenvolvimento social e

econômico das comunidades atendidas, reduzindo a exclusão social.

O Programa de Inclusão Digital do Governo Brasileiro ainda conta com o Projeto

Territórios Digitais, o qual oferece gratuitamente o acesso à informática e à internet para

populações rurais, por meio da implantação de Casas Digitais. As Casas Digitais são

escolhidas pela própria comunidade para se tornar um ponto de acesso comunitário gratuito.

Elas devem dispor de energia elétrica e de segurança adequada para receber computadores,

servidor, antena via satélite, roteador wireless, projetor multimídia e mobiliário.

Além desses programas, há ainda o PROINFO Integrado (Programa Nacional de

Formação Continuada em Tecnologia Educacional). Esse programa concentra suas atividades

na formação de professores para o uso didático-pedagógico das Tecnologias da Informação e

Comunicação no cotidiano escolar, articulado à distribuição dos equipamentos tecnológicos

nas escolas e à oferta de conteúdos e recursos multimídia e digitais oferecidos pelo Portal do

Professor, pela TV Escola e DVD Escola, pelo Domínio Público e pelo Banco Internacional

de Objetos Educacionais.

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O PROINFO Integrado oferta cursos como: Introdução à Educação Digital (60 horas),

Tecnologias na Educação (60 horas), Elaboração de Projetos (40 horas) e Redes de

Aprendizagem (40 horas). Além desses cursos, este Programa também é responsável pelas

ações de formação do Projeto Um Computador por Aluno, com vistas a propor atividades que

proporcionem um melhor entendimento de suas potencialidades.

Todos os programas apresentados fazem parte de um Programa Geral de Inclusão Digital

do Governo Brasileiro (BRASIL, 2013) e estão reunidos, como mencionado no Programa de

Governo Eletrônico do Brasil.

No breve mapeamento que fizemos sobre as iniciativas governamentais mostradas,

podemos constatar dois seguimentos de ações nos programas analisados: o primeiro segmento

refere-se a iniciativas que buscam oferecer espaço público de uso coletivo das tecnologias e

facilidades para aquisição delas, como é o caso dos programas: Projeto Banda Larga nas

Escolas, Projeto Cidadão Conectado, Programa de Implantação de Salas de Recursos

Multifuncionais, Programa Telecentros Comunitários e Projeto Territórios Digitais.

O segundo segmento diz respeito a iniciativas que, além de propiciarem acesso, investem

em recursos humanos para a capacitação de pessoal. O Projeto Computadores para Inclusão e

o PROINFO Integrado são exemplos de iniciativas de formação/instrução de jovens e

profissionais de educação para uso das TICs, de forma orientada e sistematizada para a

mobilização de saberes, a fim de atuar na sociedade digital.

A análise que fazemos desses programas nos faz observar que a lógica que subjaz a

concepção de algumas dessas intervenções políticas em torno da temática da cultura

tecnológica e inclusão/apropriação digital pouco tem se dedicado à formação de caráter

reflexivo do sujeito para sua participação ativa nos processos socais que envolvem as novas

tecnologias. Os discursos de iniciativas governamentais enfatizam apenas o acesso por meio

da supervalorização do saber técnico e instrumental, em detrimento de uma formação

conscientizadora- libertadora, reflexiva, participativa, e crítica da ambiência digital.

Acreditamos que, desse modo crítico-reflexivo, a formação será integradora, fazendo com que

o sujeito se torne parte da sociedade contemporânea de forma significativa.

Martins e Lucas (2009) trazem duas visões acerca do processo de inclusão digital. As

autoras discutiram acerca da concepção de inclusão informacional e inclusão digital presentes

nos programas de inclusão digital do Governo Brasileiro nos últimos dez anos e analisam que

parte desses programas segue a premissa da inclusão digital focada no desenvolvimento de

saberes puramente mecânicos. Nestes, a competência informacional, com ênfase nas TICs, é

obtida através do oferecimento de uma infraestrutura tecnológica e de um processo de

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aprendizagem voltado basicamente ao entendimento do funcionamento de hardware e

software.

Em detrimento disso, Martins e Lucas (2009) dialogam acerca de programas de inclusão

que seguem a perspectiva do que as autoras denominam “inclusão informacional”. Nessa

perspectiva, elencam programas governamentais que, incorporados à sociedade do

conhecimento, prezam pela competência informacional, ou seja, uma inclusão na qual existe a

preocupação com a “construção do saber, abrangendo conteúdos informativos com mais

profundidade, englobando habilidades e conhecimentos de busca e uso da informação para a

realização de tarefas e tomada de decisão”. (MARTINS; LUCAS, 2009, p. 87).

Corroboramos com Martins e Lucas (2009), uma vez que apresentam a inclusão

informacional como parte de uma apropriação cultural do sujeito através da reflexão e da

construção de saberes para atuar no mundo tecnológico.

Dentro desse contexto, observamos que parte desses programas de inclusão digital

também adentra as escolas em busca de unir forças para contribuir no processo de apropriação

da cultura digital, como é o caso do Projeto Um Computador por Aluno e do PROINFO

Integrado. Nesse ponto, a escola se coloca como uma das instâncias sociais em que as

intervenções políticas de inclusão digital se fazem presentes, justamente pelo fato de que é

nessa instância que o cidadão será “preparado” para sua participação social.

Apesar de alguns programas de inclusão digital colocarem em evidência uma lógica de

formação instrumental, entendemos que a escola e seus agentes precisam direcionar suas

ações de modo a construir e lidar com a multiplicidade de saberes e suas relações, dentro de

um contexto em que envolva as TICs. Até porque é também na escola que encontramos um

público que opera com lógicas temporais diferenciadas e com múltiplos processamentos de

informações.

Nesse processo, o professor é um agente essencial para proporcionar aos educandos

habilidades que os possibilitem lidar de forma seletiva e crítica com a quantidade, a

velocidade e a diversidade de saberes advindos de uma nova estrutura social, esteada pelas

Novas Tecnologias da Informação e Comunicação.

Para tanto, é importante frisarmos que para lidar com as novas situações educativas, onde

as formas de conhecimento têm se alterado fortemente pela inserção cada vez maior das TICs,

o professor precisa se atualizar, repensar sua prática e seu contexto de trabalho. Nesse sentido,

Pretto (2006) acrescenta que:

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Intensifica-se dessa forma o trabalho do professor, já que a escola e todo o sistema

educacional passam a funcionar com outros tempos e em múltiplos espaços,

diferenciados. Não deixa de ser, no entanto, esse um rico momento para

repensarmos as políticas educacionais na perspectiva de resgatar a dignidade do

trabalho do professor, com a retomada de sua autonomia e, com isso, experimentar

novas possibilidades com a presença de todos os novos elementos tecnológicos da

informação e comunicação. (PRETTO; PINTO, 2006, p. 24)

Pretto e Pinto (2006) nos fazem pensar a existência da necessidade de atualização da

prática docente e compreender que experimentar as novas possibilidades que decorrem do uso

dos elementos tecnológicos da informação e comunicação é de fato imperativo no contexto de

aprendizagem atual. Propiciar a democratização do acesso ao conhecimento, à produção e a

interpretação das tecnologias, suas linguagens e consequências faz hoje parte do papel do

professor e da escola como um todo.

Para isso, torna-se necessária uma postura aberta e uma motivação por parte do professor

para enfrentar os desafios de aprender a lidar com novas situações de aprendizagem,

especialmente ao introduzir as TICs em sua prática pedagógica. Estar aberto a mudanças

significa ter convicção da “necessidade de não temer e, sim, dominar a máquina e aproveitar o

potencial da tecnologia em proveito de um ensino e uma aprendizagem mais criativa,

autônoma, colaborativa e interativa” (FARIA, 2004, p. 04).

Para aproveitar todo o potencial das tecnologias em sala de aula, segundo Sampaio (1999),

o educador deve se preparar para utilizá-la pedagogicamente e assim contribuir de fato na

formação de cidadãos que deverão produzir e interpretar as novas linguagens do mundo atual

e futuro, e isso resulta, portanto, na mudança do saber-fazer do professor.

Entendemos que a compreensão desse novo saber-fazer docente deveria permear de forma

efetiva os pressupostos das iniciativas governamentais de inclusão digital que se preocupam

com a formação do educador para atuar com as TICs na escola. Entendemos ser primordial

que essas iniciativas tenham abarcadas em sua sistemática de desenvolvimento de projetos

tempos e espaços de formação diversificados, adaptáveis às necessidades do educador e do

contexto de uso das tecnologias na escola.

Serão esses momentos diversificados de formação que propiciarão a construção e/ou a

redefinição de saberes docentes para ensinar na ambiência tecnodigital. Acrescentamos, ainda,

que a (re)construção ou (re)definição de saberes para ensinar se solidificam na experiência, na

prática pedagógica de cada dia e no diálogo e compartilhamento de saberes entre pares, e não

apenas em discussões teóricas, pautadas em uma visão mecânica de uso da tecnologia.

A inclusão digital que buscamos descobrir no Projeto UCA relaciona-se não só a saberes

provenientes da manipulação do hardware utilizado e dos recursos digitais nele disponíveis,

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mas também envolve a aprendizagem de saberes que possibilitem ao sujeito analisar

criticamente a sociedade e seu contexto digital, como também seu papel, enquanto cidadão

que tem direitos de usufruir desse contexto.

Como se trata de um projeto de inclusão destinado não só a alunos, mas também a

professores de escolas públicas, acreditamos que esse entendimento sobre inclusão – ou até

mesmo de apropriação – da cultura digital cabe também aos docentes. Nesse sentido, a

apropriação da cultura digital propicia ao professor compreender e utilizar as tecnologias e

suas diferentes linguagens, com o intuito de entender e atingir o universo do alunado e suas

necessidades para, assim, transformá-los em cidadãos também capazes de compreenderem as

mensagens veiculadas pelas Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) a que estão

expostos.

O presente estudo sobre a formação de professores no contexto do Projeto Um

Computador por Aluno compreende o processo de apropriação da cultura digital e os saberes,

para ensinar com uso dos laptops decorrentes dessa apropriação e reflexividade.

1.5 Estruturação da tese

Como forma de expor brevemente a presente tese, faremos a apresentação dos cinco

capítulos e das considerações finais da pesquisa. O presente capítulo constitui-se o primeiro

da tese. Nele evidenciamos a problemática e objeto de estudo, o objetivo da pesquisa, as

questões norteadoras, a justificativa da escolha desse objeto, o estado da arte, bem como

apresentamos a sistematização da tese, que ora discorremos.

O segundo capítulo expõe uma concisa visão acerca das transformações sociais no âmbito

do trabalho, especialmente no momento em que encontramos a massificação das Tecnologias

da Informação e Comunicação, e as consequências dessas alterações para formação, atuação

profissional e saberes do professor. Incide sobre o ser e fazer docentes em seu âmbito social e

profissional a mudança de cognição, a reflexividade e a apropriação da cultura digital.

Discutimos, ainda, a transformação das relações sociotécnicas deste professor quando se faz

uso de tecnointerações1.

No terceiro capítulo, será exposto o funcionamento do Projeto UCA no seu âmbito

estrutural, tomando como base alguns dos seus documentos oficiais, destacando a proposta de

1

Silogismo que remete ao letramento digital, que permite aos sujeitos se apropriarem dos significados da cultura digital e dos

artefatos tecnológicos, produzindo interações socialmente compartilhadas.

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formação de professores. Apresentamos o modelo de formação de professores UCA para uso

dos laptops no molde “um laptop para um aluno”, destacando a forma de organização

curricular e a sistematização de conteúdos, especialmente no que tange a sua aplicação na

escola-alvo desta investigação. Em seguida, trataremos dos dilemas dos professores enquanto

participantes da formação de professores do UCA, na Escola Estadual Maria Cristina.

O quarto capítulo diz respeito à metodologia da pesquisa, cuja abordagem é qualitativa, na

qual foi realizado um “rastreamento descritivo” (LATOUR, 2008) e processual, com base

etnográfica. Nosso objetivo foi desenvolver o que Geertz (1973) chama de “descrições

densas”, as quais detalham o modo como os professores investem no significado do próprio

mundo e negociam e competem por outros sistemas de significados, quando produzem

interações midiatizadas. Como procedimentos metodológicos, foi feito o uso de aplicação de

questionários, entrevistas individuais, grupo focais e observações do contexto escolar, no qual

o Projeto UCA estava sendo desenvolvido. Por fim, será destacado o modo como será o

tratamento dos dados.

O quinto capítulo se refere à análise dos dados. Através da análise de conteúdo é feito um

apanhado dos discursos dos professores analisados, que são enquadrados em categorias de

saberes que foram (re)construídos na premissa da apropriação da cultura digital. Os discursos

dos docentes refletem uma nova forma de pensar e agir com as Tecnologias da Informação e

Comunicação no contexto profissional e social. Além disso, o capitulo mostra que a

reconstrução de saberes, decorrente do processo de apropriação da cultura digital, foi

configurada por meio de um processo de autorreflexividade dos professores investigados.

No último capítulo são apresentadas as considerações finais, destacando os aspectos

fundamentais que a pesquisa mostrou serem relevantes na análise do curso de formação de

professores do Projeto Um Computador por Aluno, entre esses a necessidade tanto de

autorreflexividade como de um processo de reflexividade comunitária, em prol da

socialização das práticas/experiências dos docentes, ao utilizarem os laptops em sala de aula e

da aprendizagem e compartilhamento de saberes que estão sendo construídos nessa ambiência

digital. Além disso, são apontadas algumas possibilidades para trabalhos futuros, dentro da

temática da pesquisa.

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2 NOVOS TEMPOS, NOVOS DIRECIONAMENTOS PARA A EDUCAÇÃO E

ATIVIDADE DOCENTE

O presente capítulo tem como intuito apresentar um breve panorama acerca das

transformações sociais no âmbito do trabalho, especialmente no momento em que

encontramos a massificação das Tecnologias da Informação e Comunicação e as

consequências dessas alterações para a formação, atuação profissional e saberes do professor.

Incide sobre o ser e fazer docentes em seu âmbito social e profissional o habitus, a

reflexividade e a apropriação da cultura digital. Discutimos, ainda, a transformação das

relações sociotécnicas deste professor quando fazem uso de tecnointerações.

As transformações sociais que colocamos em destaque decorrem do entrelaçamento das

tecnologias com as relações sociais. Essas transformações sociais advindas por um processo

de tecnização, informatização e globalização desencadearam uma restruturação no sistema

econômico, afetando formas e meios de produção, distribuição e consumo. De acordo com

Castells (1999), essa restruturação decorre do desenvolvimento e da repercussão da revolução

da tecnologia da informação, a qual foi projetada pela lógica e interesse do sistema capitalista.

Criou-se, então, um ambiente propício para a formação de uma nova economia, sociedade e

cultura.

Essa revolução, denominada por Castells (1999) de Revolução da Tecnologia da

Informação, tem origem na Segunda Guerra Mundial e no seu período seguinte, com o

advento das principais descobertas tecnológicas em eletrônica. Contudo, o marco da

Revolução Tecnológica ocorre a partir da década de 1970, onde ocorre de fato a disseminação

ampla e acelerada das tecnologias da informação.

Contudo, o que podemos observar é que dentro de toda premissa do avanço tecnológico o

que está em jogo é o papel do conhecimento e da informação. Nesse sentido, a mente humana

está diretamente conectada à produção de bens e serviços na sociedade atual.

Corroborando com o exposto, Castells (1999) acrescenta que:

O que caracteriza a atual revolução tecnológica não é a centralidade de

conhecimentos e informação, mas a aplicação desses conhecimentos e dessa

informação para a geração de conhecimentos e de dispositivos de

processamento/comunicação da informação, em um ciclo de realimentação

cumulativo entre inovação e seu uso. (CASTELLS, 1999, p. 69)

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É com esse quadro teórico que Castells (1999; 2013) evidencia uma nova estrutura social.

Com ela, um novo modo de desenvolvimento econômico se agrega, o qual caracteriza-se por

ser informacional, global e em rede. O autor nos informa que:

É informacional, porque a produtividade e a competitividade de unidades ou agentes

nessa economia (sejam empresas, regiões ou nações) dependem basicamente de sua

capacidade de gerar, processar, e aplicar de forma eficiente a informação baseada em

conhecimentos. É global, porque as principais atividades produtivas, o consumo e a

circulação, assim como seus componentes (capital, trabalho, matéria-prima,

administração, informação, tecnologia e mercados) estão organizados em escala

global, diretamente ou mediante uma rede de conexões entre agentes econômicos. É

rede, porque nas novas condições históricas, a produtividade é gerada, e a

concorrência é feita em uma rede global de interação entre redes empresariais.

(CASTELLS, 1999, p. 119)

Observamos, desta forma, que essa nova estrutura que subjaz à ação e às instituições

sociais denota um mundo multicultural, interconectado, globalizado. Mundo este que exerce

total influência nas formas de configuração do trabalho e na qualificação do trabalhador.

Portanto, a estruturação dessa Sociedade da Informação ou Sociedade em Rede para

Castells (1999), ou ainda, Sociedade do Conhecimento na visão de Gorz (2005), requerem um

novo perfil profissional. As mudanças no perfil do profissional estão relacionadas à aquisição

de novas habilidades, as quais devem dar conta das recentes demandas sociais, econômicas e

culturais geradas pelo avanço das tecnologias e das ciências.

Marshall Berman (1982) expõe esse momento de transição social comparando-o a um

“turbilhão da vida moderna”. Nesse turbilhão, encontramos um mundo em contínua

transformação nas ciências, na industrialização da produção, na expansão demográfica, no

desenvolvimento das comunicações de massa e em outros aspectos que interferem

intrinsecamente na maneira de ser e de atuar no mundo.

São estabelecidas novas relações, novas necessidades pautadas em um ambiente instável.

Estamos diante de uma sociedade que gera oportunidades inovadoras e que abre espaço para

possibilidades e perigos relacionados à má utilização da ciência e das tecnologias. Segundo

Berman (1982), vivenciamos a modernidade, um conjunto de novas experiências decorrentes

de processos sociais que dão sustentação a esse turbilhão da vida moderna, conservando um

ininterrupto estado de vir-a-ser. Para o autor, somos:

(…) todos movidos, ao mesmo tempo, pelo desejo de mudança – de

autotransformação e de transformação do mundo em redor – e pelo terror da

desorientação e da desintegração, o terror da vida que se desfaz em pedaços. Todos

conhecem a vertigem e o terror de um mundo no qual “tudo o que é sólido

desmancha no ar”. (BERMAN, 1982, p. 07)

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Berman (1982), em sua obra “Tudo que sólido desmancha no ar”, sintetiza a era moderna.

Revela-nos um mundo em transformação contínua onde vivenciamos situações de incertezas.

A obra nos faz refletir acerca da brevidade dos processos sociais e do imperativo de

atualização e melhoramentos, nos incutindo uma dinâmica de renovação contínua.

Acreditamos que as transformações que assistimos na contemporaneidade trazem consigo

características peculiares que marcam a constituição de “um novo mundo” - um mundo capaz

de romper paradigmas que estavam a priori estabelecidos, desfazendo antigos moldes de

organização social. Isso gera um apelo de mudança, sugere a busca do novo e ainda a

qualificação do ser humano para acompanhar a nova ordem social. O mundo do trabalho e das

profissões não está ileso a essa metamorfose social.

Como resultado desta metamorfose social, podemos pensar que, hoje em dia, o

conhecimento ocupa lugar de destaque na força produtiva, o que coloca o capital humano na

atualidade como a mola propulsora da economia. Nesse sentido, o capitalismo moderno que

tem como base a valorização de capital fixo material, está cada vez mais sendo sobreposto por

um capital “imaterial”, segundo Gorz (2005), qualificado também como “capital humano”,

“capital conhecimento” ou “capital inteligência”. Estamos, então, inseridos em uma economia

do conhecimento, pois todo trabalho, seja em termos de oferta de produtos ou em serviços,

abarca o componente do saber, cuja relevância se intensifica cada vez mais.

O processo de mutação econômica também desencadeia mudanças no trabalho. Ao invés

do trabalho de produção material mensurável, temos o trabalho imaterial, em que o

conhecimento é base de sustentação econômica. Nesta forma de trabalho, os padrões de

medida não podem ser aplicados, pois estamos tratando de aquisição de saberes para melhor

desempenho de produção e de oferta de serviços.

Entre os saberes adquiridos para e na inserção no trabalho, evidenciamos a importância

do saber prático, adquirido na experiência profissional, por compreendermos que hoje não

será o conhecimento técnico, especificamente formalizado, que garantirá o êxito profissional.

Não duvidamos de sua importância. Entretanto, o saber construído na vivência profissional e

o investimento para qualificação do trabalhador serão base para o desenvolvimento e a

sustentação do “capital-humano”, pois o que está em jogo não é a quantidade de saberes, mas

sim a forma de coordená-los.

Observamos que junto às transformações sociais, especialmente por vivenciarmos a

modernidade, foram empreendidas as informatizações dos sistemas. Essa informatização foi

um acontecimento importante na restruturação dos tipos e das formas de transmissão de

saberes, como veremos adiante na próxima seção. Hoje, a experiência, o discernimento, a

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improvisação, a capacidade de coordenação e de gerenciamento, a organização, a

colaboração, a comunicação e a instrumentalização para uso dos recursos da informática

formam um saber vivo adquirido no cotidiano, nas especializações e nas atualizações que o

trabalhador empreende no decorrer da vida laboral.

São esses saberes pontos decisivos no processo de construção da profissão e desempenho,

gerando o diferencial do trabalhador, pois:

O trabalhador não se apresenta mais apenas como o possuidor de uma força de

trabalho hetero-produzida (ou seja, de capacidades predeterminadas inculcadas pelo

empregador), mas como um produto que continua, ele mesmo, a se produzir.

(GORZ, 2005, p. 19).

De acordo com o pensamento de André Gorz (2005) - a preeminência do trabalho

imaterial, baseado no contínuo progresso do “capital inteligência” -, a evidência já não está

mais essencialmente no valor medido pelo tempo de trabalho e sim no proveito do valor que é

produzido pelo trabalho cooperativo, que se torna cada vez mais presente através do

compartilhamento de informações e de conhecimentos nas redes sociais.

Portanto, ao vivenciarmos a “Sociedade em Rede” (CASTELLS, 1999), surgem novas

formas de pensar e agir no mundo do trabalho e isso faz com que o oficio de professor

também seja repensado, transformado; ressignificado à luz de um novo modelo de cultura e de

sociedade. Segundo Castro (2013):

Essas transformações provocaram mudanças nos padrões de intervenção estatal que

resultou na emergência de novos mecanismos e novas formas de gestão,

redirecionando as políticas públicas e, particularmente, as educacionais. Nessa

perspectiva, importantes mudanças vêm ocorrendo na política educacional brasileira,

principalmente no que se refere à formação dos profissionais da educação, no

sentido de adaptá-la às novas exigências do mercado de trabalho. (CASTRO, 2013,

p. 03)

Podemos dizer, desta forma, que tais mudanças no mundo do trabalho docente foram

consideradas e nos últimos vinte anos os estudos sobre o ofício de professor ganharam mais

destaque no meio das pesquisas acadêmicas, sobretudo, quando relacionamos a formação

docente aos saberes para ensinar (BORGES, 2001). Os estudos sobre a temática docente

nascem a partir da problemática da profissionalização do ensino e desenvolvem-se sob a

necessidade de renovação dos fundamentos epistemológicos do ofício de professor.

Nesse sentido, verificamos cada vez mais uma preocupação quanto ao aperfeiçoamento

profissional do docente. É possível perceber que as modificações socioeconômicas foram

sentidas também pelos órgãos federais que regem a educação nacional. A Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional, a LDB 9.994/96, a qual regulariza o sistema de educação

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brasileiro, no seu artigo 62º, determina que os docentes tenham curso superior para atuar na

educação básica:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em

curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores

de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na

educação infantil e nos 5 (cinco) primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida

em nível médio na modalidade normal. (BRASIL, 2013, Art. 62)

A LDB9.394/96 é apenas um dos determinantes para que o profissional da educação

conscientize-se da necessidade de restruturação da categoria. Há ainda outros incentivos

governamentais para qualificação do professor. A instauração da Universidade Aberta do

Brasil, a qual abre oportunidade para professores de Ensino Básico se qualificarem por meio

de especializações na modalidade à distância, a estruturação do plano de carreira e a

implantação da lei 11.738/98, que institui o piso salarial profissional nacional para os

profissionais da Educação Básica – uma luta histórica dos educadores brasileiros –, são

exemplos de iniciativas que conjecturam uma nova fase de desenvolvimento e sustentação da

economia. Isso tudo reflete a preocupação governamental em acompanhar as mudanças de

paradigmas sociais, investindo, assim, na formação de “capital-humano” também no âmbito

da educação.

O fato é que estamos imersos em um processo acelerado de desenvolvimento das ciências

e tecnologias e essa condição requer saberes peculiares para lidar com a situação. Mas, como

explicitamos, tais saberes superam o conhecimento instrumental, técnico e especializado. O

que está em jogo é o saber adquirido no cotidiano profissional, na experiência do dia a dia e

na desenvoltura do cidadão para gerenciar e/ou coordenar uma gama de conhecimentos

necessários à sua atuação profissional, especialmente ao educador que pode estar diante de

situações imprevistas diariamente. Segundo Morin (2003), “o desenvolvimento de aptidão

para contextualizar e globalizar os saberes torna-se um imperativo na educação” (MORIN,

2003, p. 24).

São mudanças substanciais que, pouco a pouco, são agregadas ao contexto educacional.

Elas exigem que a escola proporcione ao aluno uma sólida formação cultural, conhecimentos

que permitam inserção, adaptação e permanência no mercado de trabalho. Além disso,

esperam alunos participativos, críticos e reflexivos, que sejam coautores de sua aprendizagem

e não apenas receptores passivos. São demandas educacionais da nova era, as quais o

professor precisa acompanhar e buscar ininterruptamente sua educação continuada.

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A qualificação permanente do educador / trabalhador está relacionada à preparação para

um fazer multifacetado, ágil, reflexivo e criativo, capaz de responder aos anseios do mundo

moderno:

O perfil do trabalhador vem sofrendo alterações, e em pouco tempo a sobrevivência

no mercado de trabalho dependerá da aquisição de novas qualificações profissionais.

Cada vez mais torna-se necessário que o trabalhador tenha conhecimentos

atualizados, iniciativa, flexibilidade mental, atitude crítica, competência técnica,

capacidade para criar novas soluções e para lidar com a quantidade crescente de

novas informações, em novos formatos e com novas formas de acesso. A tendência

mundial é a de que tarefas mecânicas sejam realizadas por máquinas. (BRASIL,

1998, p.138)

Sendo assim, um novo leque de saberes entra em campo. O entendimento que tínhamos

sobre aluno, professor, escola e ensino ganharam novos contornos, principalmente com a

informatização, o acúmulo de informações e a velocidade de desenvolvimento de novas

tecnologias. Atravessamos mudanças constantes e velozes. São situações decorrentes da

modernidade, as quais influenciam profundamente o trabalho do profissional da educação e

trazem desafios contínuos, o que acaba estimulando o educador a repensar sua atuação.

Acompanhando tais modificações, surgem novas maneiras de produzir conhecimento, novas

condições de trabalho e de vida. Conhecer, capacitar-se, torna-se, portanto, primordial para

acompanhar as transformações no campo de trabalho.

Dentro dessa perspectiva, a concepção de aluno também sofre mudanças. Se existe a

necessidade de um professor atualizado com conhecimentos a par do tempo em que estamos

vivendo, é porque existem alunos com novas necessidades educacionais.

O mundo muda rapidamente e os alunos também. A ideia de aluno passivo, observador e

obediente não é mais aclamada na escola contemporânea. Está em evidência o aluno

questionador, curioso, imerso em uma cultura digital, ou seja, que cresce usando os múltiplos

meios tecnológicos.

Salvaguardando exceções, os alunos de hoje lidam com informações descontinuadas, por

meio do uso de hipertextos; têm acesso a uma infinidade de informações, permutam entre

comunidades reais e virtuais, estabelecem comunicação em rede, etc. Convém imaginar que a

escola, nos moldes tradicionais de ensino, torna-se defasada para atender aos novos processos

cognitivos dos alunos.

Desta feita, a educação, na atualidade, alinhada com os avanços tecnológicos, segue

exponencialmente o ritmo da contextualização, da globalização, da multidimensionalidade e

da complexidade (Morin, 2006), e não mais dos saberes compactados, fragmentados, de

caráter conteudista. O objetivo é alcançar uma formação que fuja do modelo bancário,

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libertando e conscientizando o aluno para sua atuação nas esferas sociais. Freire (1993) nos

coloca que:

Há uma pluralidade nas relações do homem com o mundo, na medida em que

responde à ampla variedade dos seus desafios. Em que não se esgota num tipo

padronizado de resposta. A sua pluralidade não é só em face dos diferentes desafios

que partem do seu contexto, mas em face de um mesmo desafio. No jogo constante

de suas respostas, altera-se no próprio ato de responder. Organiza-se. Escolhe a

melhor resposta. Testa-se. Age. Faz tudo isso com a certeza de quem usa uma

ferramenta, com a consciência de quem está diante de algo que o desafia. (FREIRE,

1993, p.40)

Nesse sentido, acreditamos que o perfil do aluno na atualidade converge para formação de

um ser plural, que saiba discernir, escolher o melhor caminho a seguir e que tenha consciência

do seu eu e de sua relação dialética com o mundo que o cerca. Ao agregar as Tecnologias da

Informação e Comunicação em sua formação, ampliam-se as possibilidades de atuação social

e cobra-se do aluno conhecimentos que o amparem e o orientem dentro dessa cultura digital.

A escola também é um órgão em transformação. A modernização, além de afetar o

processo de trabalho do educador, alavancou profundas discussões acerca da escola que temos

na atualidade. Nessa perspectiva, podemos pensar se realmente o formato tradicional em que

concebemos a escola hoje é suficiente para atender as demandas educacionais insurgidas pelo

advento da era digital.

Corroboramos com Freire e Guimarães (2003) no sentido de que a escola precisa aceitar e

incorporar o tempo histórico em que vivemos, revolucionar-se em função do surgimento dos

instrumentos tecnológicos. Para eles, a escola obriga-se:

A deixar de ser um espaço preponderantemente fabricador de memórias repetitivas,

para ser um espaço comunicante e, portanto, criador. E, para isso, então, ela não

poderia jamais deixar de ter, como auxiliares extraordinários, todos os meios de

comunicação. (FREIRE e GUIMARÃES, 2003, p. 37)

Manter-se intacta e passiva às demandas de um novo tempo não é a função da escola. Esta

precisa congregar em suas ações pedagógicas as exigências sociais e históricas que

vivenciamos.

Observamos que, de uma forma geral, tal questão vem sendo intensificadamente alvo de

grandes discussões entre gestores, pesquisadores e educadores. Notamos uma mobilização em

torno de compreender o significado e as consequências da utilização das Tecnologias da

Informação e Comunicação no âmbito escolar, especialmente no que tange ao ensino e à

aprendizagem.

O ato de ensinar, portanto, sofre alterações. Criam-se novas formas de construir o

conhecimento, além de oportunizar a integração dos alunos à cultura sociodigitalizada. A

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internet, os recursos da informática, os ambientes virtuais de aprendizagem e a educação à

distancia, entre outras potencialidades advindas da computação, são exemplos de recursos que

alargam as possibilidades de ensino e motivam os alunos a aprenderem, despertando a

interação entre professores e alunos.

O que estamos falando, então, é de um conhecimento adquirido pela interação, mediado

pelas Tecnologias da Informação e Comunicação. Interação essa entre aluno e professor, com

conteúdo curricular, com pessoas distantes, etc., e essa interação nos remete à participação e

ao envolvimento do aluno, à dinamicidade, e não a uma indiferença nas partes que compõem

o processo de ensino.

Consideramos, ainda, que as Novas Tecnologias chegaram para incrementar a educação e

contribuir para o ensino de caráter participativo, indagador, curioso e pesquisador.

Acreditarmos que:

A grande tarefa do sujeito que pensa certo não é transferir, depositar, oferecer, doar

ao outro, tomando como paciente de seu pensar, a inteligibilidade das coisas, dos

fatos, dos conceitos. A tarefa do educador que pensa certo é, exercendo como ser

humano a irrecusável prática de inteligir, desafiar o educando com quem se

comunica e a quem comunica, produzir sua compreensão do que vem sendo

comunicado. (FREIRE, 1996, p. 38)

No processo de ensino com uso das TICs, o professor exerce uma função importante e

precisa estar capacitado para mediar o aprendizado. Neste caso, falamos de um aprendizado

que se torna diferenciado, por agregar novos recursos em sala de aula. O professor, nesse

sentido, passa a situar-se como um facilitador/mediador, tendo como função integrar o

conteúdo curricular às Novas Tecnologias.

Ao integrar as Novas Tecnologias ao seu trabalho, o docente necessita se apropriar de um

novo saber, de uma nova técnica, e isso significa mudança de prática. Acreditamos que antes

da efetivação de qualquer transformação está a vontade de mudar, de acompanhar o ritmo de

um novo tempo. Os referencias pedagógicos tendem a se desatualizar pela mutação das

práticas sociais. Para educar de forma significativa na atualidade, o professor precisa

acompanhar tais variações sociais. Nas palavras de Antonio Nóvoa, “o docente deve ser capaz

de sentir o presente e de se sentir presente” (NÓVOA, 2007).

Sendo assim, para sentir e atuar no presente é necessário que o professor se aproprie dos

processos de midiatização, entendida aqui como uma ordem de mediações socialmente

realizadas, inserindo as Novas Tecnologias como um tipo particular de interação, a qual afeta

a comunicação e a sociedade.

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Para apreendermos melhor esse processo, a apropriação à qual nos reportamos não abarca

apenas o domínio instrumental das Novas Tecnologias. Referimo-nos a um tipo de

apropriação tecnológica de caráter emancipatório e transformador, uma forma de inserir o

indivíduo na cultural atual, possibilitando ampliar a fluência digital do sujeito para interagir

em ambientes virtuais/digitais. “A apropriação, tal como entendemos, visa a uma história

social dos usos e interpretações dos objetos, referendados nas práticas sociais e inscritos nas

práticas específicas que as produzem” (COELHO AND FREIRE FILHO, 2011, p.144).

Nesse sentido, observamos uma mobilização por parte das próprias escolas em introduzir

e inserir em definitivo as TICs nas práticas pedagógicas. As tecnologias chegam às escolas

por meio de políticas publicas de inclusão digital. Contudo, são escassas as instituições que

criam condições para que os professores possam se apropriar tecnologicamente desses novos

recursos. São experiências que relatam tecnointerações na ambiência educacional e que

apresentam tal fenômeno como sendo protagonizado pela representação da técnica e não

validam o empoderamento dos sujeitos sociais nesse percurso.

Entendemos que quando os professores se aventuram no processo que chamamos de

“apropriação tecnológica”, ou mesmo de letramento digital, como afirma Magda Soares

(2002), também estão vivenciando preceitos ideológicos e pertenças identitárias que se

impõem na apropriação da cultura digital nos meios tecnológicos. Eles reafirmam seus laços

nas relações cotidianas criando novas existências, que produzem subjetividades e mobilidade

social. Vivenciam um contexto onde habitam metanarrativas transmidiáticas, que projetam a

força de trabalho qualificada e as demandas da economia presente como sendo uma

responsabilidade ímpar e única do sujeito contemporâneo. Tais metanarrativas, que circulam

em canais de comunicação midiáticos e interpessoais, fabricam valores estéticos, técnicos,

simbólicos e sociais, os quais colocam o capital humano no centro das forças produtivas. O

professor carrega seu próprio capital – imaterial; fruto das experiências e dos saberes vividos

– que o projeta como a principal substância nas mudanças dos processos societários atuais

(GORZ, 2005).

Tendo em vista o exposto, é possível observar que os modelos de apropriação tecnológica,

comumente adotados em instituições de ensino que inserem as TICs em contexto pedagógico,

são meramente técnicos e descritivos e não levam em consideração aspectos relacionados ao

sentido que será produzido a partir da experiência dos usuários docentes com os meios. Dar,

desse modo, atenção às condições e aos processos que, muito concretamente, conduzem as

operações de construção de sentidos de pertencimento, às formações sociocognitivas e às

subjetividades desses atores é parte do processo de reflexividade na presente pesquisa.

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Desta forma, acreditamos que a apropriação da cultura digital possibilita ao profissional

da educação estabelecer tecnointerações na vida social – entendidas como interações

mediadas pela tecnologia, que vai representar a midiatização como um processo amplo e

imperativo na vida social de nosso tempo – e, assim, com a prática e sua vivência em sala de

aula, perceber o significado pedagógico que poderá dar a determinada tecnologia. As

tecnointerações proporcionam, ainda, novas formas de trabalho e de vida, com base na

construção e religação de saberes diversos que conectam o meio social, a educação e as novas

tecnologias.

Com isso, entendemos que ao acoplarmos as tecnointerações ao mundo vivido e às

sociabilidades tradicionais, extrairíamos do professor a capacidade de operar com resoluções

de problemas, muito dos quais já estão consoantes com suas vivências e com as relações intra

e interpessoais as quais partilham. Consente também que o professor encontre outros mundos

em contextos diversos, o que o arremessa para os múltiplos modos de operar na sociedade

atual. A união da sociabilidade tradicional com as tecnointerações também o faz conhecer um

agrupamento de vários tipos de saberes e inteligências na ação socioeducacional. (COELHO,

2011).

Deste modo, ao reagrupar/adquirir vários tipos de saberes pertinentes às necessidades do

mundo atual, a escola, como principal instituição de ensino da sociedade, deverá prover

condições para a discussão de formas de utilização das TICs, discutindo propostas de

integração das TICs com disciplinas curriculares, incluindo também formas de avaliar o uso

com vistas à reflexão e (re)planejamento de ações - estas são atividades imprescindíveis para

a qualificação profissional do docente nos tempos atuais.

Todavia, isso precisa de um começo. É necessária a criação de uma cultura acadêmica que

estimule o futuro professor a buscar auxilio pedagógico nas Novas Tecnologias, não só para

adentrar e se apropriar da cultura digital, mas também para utilizá-la didaticamente.

Observamos que a maior incidência de pesquisas e trabalhos na área das Novas

Tecnologias e Educação concentram-se nos estudos de pós-graduação, reunindo trabalhos a

nível de especialização, mestrados e doutorados, muito embora saibamos que os cursos de

formação de professores (Licenciaturas) em todo Brasil estão passando por uma

reorganização em suas estruturas curriculares, abarcando conhecimentos relacionados à

instrumentalização e à administração de novas tecnologias no contexto de sala de aula.

Mas, para que o curso de formação de professores logre êxito, com as reestruturações

curriculares que sofrem, também se faz necessário maior empenho dos docentes, no sentido

de criar uma prática educativa efetiva com uso significativo das TICs, ou seja, devemos

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extrapolar a teorização e a mecanização e utilizar as Novas Tecnologias com viés crítico-

reflexivo.

Nesse sentido, corroboramos com Sampaio (1999), ao compreendermos que:

O papel da educação deve voltar-se também para democratização do acesso ao

conhecimento, produção e interpretação das tecnologias, suas linguagens e

consequências. Para isto, torna-se necessário preparar o professor para utilizar

pedagogicamente as tecnologias na formação de cidadãos que deverão produzir e

interpretar as novas linguagens do mundo atual e futuro. É esse o sentido de

defender a necessidade de alfabetização tecnológica para o professor e, para alcançá-

la, é necessário esclarecer o significado pedagógico deste conceito. (SAMPAIO,

1999, p. 15)

Entretanto, é importante compreender que todo o processo que envolve a apropriação da

cultura digital de aquisição de novas competências para ensinar na era digital demanda tempo

e, principalmente, motivação pessoal e coletiva para mudar, para aprender e para se apropriar

do novo. Extrair, portanto, uma nova postura do professor para uma apropriação significativa

da cultura digital requer uma base formadora que proporcione reflexão acerca das novas

demandas educacionais e dos novos saberes, para agir na conjuntura atual.

Essa base formadora além de ser adquirida por meio de uma formação inicial, através das

agências formadoras, estaria também atrelada às experiências de vida social e profissional do

professor. Entendemos a experiência como base para a formação de saberes – estes advêm

através do processo de apropriação tecnológica do professor. Seriam, então, as

tecnointerações galgadas no meio social/profissional, responsável pela consolidação do

aprendizado inicial e de novos saberes, decorrentes dessa midiatização.

A partir dessas constatações, percebemos a necessidade de edificação de um novo perfil

docente, comprometido não só com seu espaço de sala de aula, mas também antenado às

mudanças do seu meio, especialmente as ocasionadas pela massificação de uso das Novas

Tecnologias. É importante que o professor se aproprie deste contexto, pois além de construir

novas sociabilidades e mobilidades sociais, essa apropriação tecnológica proporciona a

aquisição de novos saberes para ensinar, refletindo, assim, no melhor uso didático dos

artefatos tecnológicos.

Para tanto, é necessário apresentar espaços para formação desses professores, seja na

graduação, pós-graduação, em cursos de atualização em serviço ou até mesmo em seu próprio

ambiente de trabalho, de forma que tenham no centro das suas discussões a inserção das

Novas Tecnologias na educação, sob um ponto de vista critico, reflexivo e transformador.

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2.1 Breve panorama das transformações e modelos do processo formador

Como falamos, a formação de professores é um dos campos de pesquisa que, nos últimos

vinte anos, vem gerando grande interesse entre pesquisadores da área da educação

(RAMALHO et al, 2003). Grande parte desse interesse surge a partir das demandas sociais

decorrentes da restruturação das formas de economia e produção de bens e da necessidade de

qualificação do trabalhador.

Sendo assim, podemos considerar que tanto a escola como o ensino são produtos das

renovações das funções sociotécnicas. De modo geral, tais renovações foram sentidas pelos

órgãos oficiais que regem a educação. Estes manifestam, por meio de documentos norteadores

dos processos inicial e continuado de formação de professores, a preocupação com as

transformações da função do profissional da educação. Tais documentos inserem em suas

discussões um outro olhar acerca da prática docente sobre as transformações na formação do

educador, sugerindo mudanças com reflexos na atuação dos mesmos.

Os Referenciais para Formação de Professores, as Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Formação de Professores da Educação Básica e a própria Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB nº 9.394/96) são alguns desses documentos.

Os Referenciais são fruto de discussões de todos os Estados brasileiros entre diversos

profissionais. Esse documento nasceu com o intuito de provocar e orientar professor em sua

atuação, na busca da construção de um novo perfil docente, interligando-se às demais ações

das políticas educacionais. Tendo em vista que:

Há uma enorme distância – e não apenas no Brasil – entre o conhecimento e a

atuação da maioria dos professores em exercício e as novas concepções e trabalho

do professor que esses movimentos vêm produzindo. Trata-se, portanto, não apenas

de realizar melhor a formação, mas de realizá-la de uma maneira diferente. Tais

mudanças exigem, dentre outras questões, que os professores reconstruam suas

práticas e, para isso, é preciso ‘construir pontes’ entre a realidade de seu trabalho e o

que se tem como meta. (BRASIL, 2002, p. 16)

Portanto, o grande desafio da formação de professores na atualidade está em interligar, em

construir essas “pontes” entre as reais condições de atuação docente e a realidade social,

econômica, política e cultural de nosso país. Nesse sentido, para que haja essa interligação de

forma satisfatória, o próprio Referencial aponta elementos para uma formação inicial

adequada e de qualidade.

Um desses elementos refere-se à elaboração de políticas de formação continuada mais

articuladas e planejadas, de acordo com a vivência diária da profissão e com as necessidades

educacionais do alunado. O documento orienta que a formação continuada, a qual é destinada

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à melhoria do trabalho do professor, não se resuma a eventos pontuais que de uma maneira

geral pouco correspondem às necessidades pedagógicas mais imediatas dos professores.

Além disso, o Referencial aponta que o modelo de formação de professores deve ter a

intencionalidade pedagógica de formar o educador como pessoa, como professor e como

cidadão. Essa concepção de desenvolvimento global do educador precisa estar imersa nos

objetivos da formação, na eleição de conteúdos, na metodologia usada, na criação de distintos

espaços e tempos para os professores e na organização da escola.

Consideramos a concepção de formação global do educador necessária para sua atuação

significativa nos espaços escolares. Até porque, corroborando com as palavras de Nóvoa

(2007), acreditamos que o processo de formação é tomado não só como uma “atividade de

aprendizagem situada em tempos e espaços limitados e precisos, mas também como a ação

vital de construção de si próprio, onde a relação entre os vários pólos de identificação é

fundamental” (NÓVOA, 2007, p. 114).

É essa formação global, interligada às condições reais de trabalho que poderão dar mais

abertura para o professor decidir acerca de seu fazer pedagógico e aprender a exercer o poder

de intervir e transformar a realidade que o permeia.

Seguindo a mesma concepção de orientação para formação e atuação do professor em seu

âmbito de trabalho, dispomos ainda de Diretrizes Curriculares Nacionais para Formação de

Professores do Ensino Básico. Esse documento direciona a ação dos professores sugerindo

princípios, fundamentos e procedimentos norteadores.

Entre as orientações recomendadas, as quais são importantes para uma boa atuação

docente e para o seu preparo para o exercício da profissão, evidenciamos o trato com a

diversidade, o aprimoramento de práticas investigativas, a colaboração e o trabalho em

equipe, a avaliação como processo de formação, a pesquisa com foco no processo de ensino-

aprendizagem e o uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação e de metodologias,

estratégias e materiais de apoio inovadores (BRASIL, 2013).

Tendo em vista as discussões e orientações expostas em ambos os documentos, fica

perceptível que a finalidade dos mesmos está em redimensionar o papel do professor, sua

prática e sua formação. Deixa claro que a preocupação dos órgãos oficiais que regem o

sistema de educação brasileiro é a idealização de maneiras de intervir nas práticas

pedagógicas dos professores por meio de uma educação continuada.

É importante acrescentarmos que as discussões presentes nestes documentos originam-se

da promulgação da Lei 9.394/96, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Artigo

62), que além de explicitar ações de referência para o sistema de ensino básico brasileiro,

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projeta a formação inicial do professor para educação superior. Nesse sentido, fica

estabelecido que a formação docente para atuar em nível de educação básica se fará em nível

superior, gerando, portanto, toda uma política de complementação da formação do educador

por meio de estratégias de formação continuada.

Houve, dentro desse contexto de atualização na formação do educador, uma revisão dos

cursos de formação inicial, com vistas a tornarem-se adequados às novas demandas

educacionais, preparando, assim, um professor de novo perfil. Exige-se, agora, baseado no

possível perfil traçado dos referidos documentos, uma formação rápida e flexível com ênfase

na formação pela prática, norteada pela constituição de saberes profissionais com vistas à

resolução de situações-problema e a um saber-fazer que incentive aprendizagens específicas e

necessárias à atuação profissional para a imprevisibilidade intrínseca do contexto escolar. O

que está presente nesse contexto atual de formação é o professor que adota a reflexão sobre a

prática e o desenvolvimento profissional contínuo como princípios.

Porém, é importante lembrarmos que o modelo de formação inicial ao qual as atuais

políticas de formação de professores se opõem (formação conteudista, distanciada da prática e

não reflexiva) decorre da concepção de professor como “aplicador de propostas acabadas”,

produzidas por especialistas de instâncias superiores da educação. É para esse modelo de

professor que as práticas tradicionais de formação estavam voltadas.

A partir de tais mudanças no enfoque da formação docente, apreendemos que o ensino e a

postura do professor em sala de aula são históricos e temporais. Os ideais de eficácia e a

necessidade de resultados são concepções tradicionais de ensino antigas e que até hoje

permeiam o âmbito educacional e refletem na prática do professor. Na verdade, são

concepções de ensino baseadas em um contexto técnico industrial, nas quais se misturam

tendências próprias do racionalismo técnico e de uma formação academicista tradicional.

Inserido nesse contexto, o trabalho docente passa a ser minimizado, tendo em vista que ele

ocupa um lugar subordinado a instâncias superiores.

Ao contrário desta concepção tradicionalista de formação, acreditamos no educador como

um profissional construtor de sua identidade, capaz de desenvolver suas competências e

saberes por meio de suas vivências profissionais. A experiência docente aliada à carga teórica

de formação mune o professor para atuar em sua prática, dando possibilidades para

transformar sua realidade educacional.

Acompanhando esse processo de mudança nos moldes da formação docente, Ramalho et

al (2003) nos apresenta um estudo sobre modelos formativos, traçando um contraponto entre

os modelos de formação de professores do tipo emergente e homogêneo. Os autores afirmam

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que no Modelo Hegemônico da Formação de Professores surge um modelo formativo baseado

no treinamento de habilidades, em conteúdos descontextualizados da realidade profissional,

no distanciamento do objeto de profissão – a escola. Assim sendo, os professores pouco ou

não refletem sobre sua prática, como também não priorizam o conhecimento adquirido em

experiência em sala de aula.

Contudo, o modelo de formação defendido por Ramalho et. Al. (2003) segue uma

proposta teórica inovadora. Coloca-se o Modelo Emergente de Formação no centro das

atenções, o qual tem como ponto chave a discussão sobre o processo de profissionalização do

professor. Nesse modelo formativo, a reflexão, a crítica e a pesquisa se constituem elementos

essenciais na formação do educador, consolidam-se como um sistema amplo da atividade

docente, mobilizados no seu dia-a-dia de trabalho. Para os autores, esse Modelo conecta

ideias intrínsecas de um processo pautado na superação de “esquemas antigos e hoje

limitados” do fazer docente e sua formação (RAMALHO et al., 2003, p. 24).

Com o aparecimento e inserção das Tecnologias da Informação e Comunicação na escola,

a atuação do professor, de acordo com Tardif e Lessard (2011), pauta-se em um racionalismo

técnico. Os autores esclarecem que com a inserção das TICs na escola (internet, multimídias,

computadores, etc.), o ensino se assemelha a um processo de “tratamento da informação” e é

empregado a ele padrões de racionalização extraídos do trabalho tecnológico. Dentro desse

contexto, o professor com uma formação pautada no tecnicismo acaba não dando a devida

preocupação ao questionamento da eficácia das TICs e, sobretudo, não avalia seu impacto

sobre a escola, o ensino e a aprendizagem.

Resumidamente, podemos inferir que os documentos apresentados assinalam a

importância de renovação no processo de formação do educador. Vem à tona um educador

reflexivo, no qual parte para um novo entendimento de sua profissionalidade, por meio da

atualização de seus saberes.

Não se pode descartar que o advento das Novas Tecnologias da Informação e

Comunicação, fruto das rápidas mudanças econômicas e sociais, tem também papel

determinante para o surgimento de um novo perfil profissional docente. As TICs também

influenciam a perspectiva de revisão de saberes dos professores, bem como nas mudanças dos

seus modelos formativos.

Ao incorporar esses novos recursos à formação e à atividade prática, saberes emergem

e/ou são reconstruídos pelos professores e o nascimento desses saberes, originados a partir do

uso de um ambiente informatizado, proporcionará espaço para novas reflexões e construções

didáticas. Ou seja, o professor terá a possibilidade de pensar e fazer, conhecer e agir de uma

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outra maneira. Nesse sentido, o computador – e em geral o ambiente de informática

educacional – mostra-se como uma possibilidade de complementação, de atualização de

conhecimentos e mudança de qualidade de vida social e profissional do educador.

É nesse ponto que agora pretendemos desenvolver nossa pesquisa, onde a informática e os

recursos que ela propicia tornam-se um ponto a ser discutido na educação e especialmente na

formação e atuação do professor, em busca da renovação de seus saberes para ensinar e atuar

em sua vida social.

2.2 TICS, saberes, apropriação digital, reflexividade e transformação nas

relações sociotécnicas

Após explicitarmos brevemente as transformações sofridas no processo formativo do

educador, com base em alguns documentos oficiais que regem o sistema de educação

brasileiro no que tange a atuação docente, pretende-se, nessa seção, mostrar a influência das

TICs na restruturação das relações sociais do professor, bem como a influência da

reflexividade para ao processo de apropriação digital e reconstrução de saberes na vida social

deste educador.

Tomamos como saber o conjugado de relações do indivíduo com o mundo social e com

ele mesmo. Nesse sentido, o saber se (re)constrói a partir da interação indissociável entre o

social e o sujeito, no amadurecimento das nossas estruturas cognitivas, buscando uma melhor

adaptação ao mundo, por meio de equilibrações e acomodações constantes (Piaget, 1971).

Desta forma, na interação sociocognitiva, o sujeito amplia saberes, cria novas estruturas

de assimilação e assim, como em outros meios sociais, experimentam o uso de artefatos

digitais, percebendo-os e comunicando-se nestes ambientes. É na relação

dialógica/interacional com o outro através de práticas sociais historicamente construídas

(Vigotski, 2007) que se constroem os saberes que irão dar suporte à vida profissional e social

do sujeito.

Acrescenta-se a isso a compreensão de que os saberes se (re)constroem na vivência, na

experiência, no fazer de cada dia. Entendemos que a atividade docente não está na reprodução

de práticas/saberes pensados e/ou construídos por outros (no caso, pesquisadores

especialistas). Os saberes, nessa perspectiva, são “retalhos da realidade desconectada da

totalidade em que se engendram e em cuja visão ganhariam significação”. Nessa situação, se

“esvazia da dimensão concreta que deveria ter” (FREIRE, 2005, p. 65).

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Acreditamos que o fazer docente possui saberes próprios e personalizados, pois estão

ligados a um contexto específico, de alunos, de condições de trabalho, de vida e até de

personalidade do próprio profissional. Assim, o saber profissional que orienta a atividade

docente é múltiplo, no sentido de que o profissional necessita trabalhar com um repertório de

conhecimentos, competências, habilidades, metodologias, teorias, etc., para dar reposta a

determinadas situações que envolvem o ensino-aprendizagem. Portanto, o saber docente

origina-se de vários matizes, cuja função essencial é educar os sujeitos aprendentes.

Evidenciamos, ainda, que o saber tem sua origem social, por ser elaborado, refletido,

compartilhado por um grupo que divide os mesmos interesses. O saber se modifica de acordo

com o tempo, evoluem mediante as mudanças socais e a sua aquisição vem com a troca,

através do diálogo com seus pares, ou seja, com a socialização profissional.

Os professores, portanto, ao estarem “abertos” para adquirirem novos saberes, são capazes

de realizar a “complexa operação de, simultaneamente, transformando o mundo através de sua

ação, captar a realidade e expressá-la por meio de sua linguagem criadora” (FREIRE, 1993, p.

107).

Assim sendo, entendemos que é através das experiências do sujeito que se dá a relação

com o saber, na singularidade de sua história e nas atividades que ele realiza (CHARLOT,

2005). É também na interação homem-ambiente, mediado por instrumentos e signos, que o

individuo constrói significados, adquire saberes necessários para transformação de si, e assim,

modifica a forma social e o seu nível de desenvolvimento cultural. Ancoramos-nos em

Vigotski (2007) quando compreendemos que a transformação individual, em virtude da

apreensão de novos saberes, tem sua raiz na sociedade e na cultura. (VIGOTSKI, 2007).

A experiência construída pelo professor, ao longo de sua caminhada social e profissional

é, portanto, o núcleo vital da construção do saber docente, edificado entre contradições da

realidade em espaços de influências e condições básicas do/no cotidiano pelos professores.

Nesse contexto, os saberes advindos da experiência em ambientes informatizados com o

uso das TICs dão margem à revisão dos saberes pelos professores na atividade docente. Esses

saberes surgem na situação de aprendizagem de novos formatos de apreensão da realidade

com o uso dos artefatos digitais e são (re)traduzidos e edificados pelos professores e postos

em prática em ambientes informatizados.

Tardif (2000) refere-se aos saberes como competências, habilidades (ou aptidões) e

atitudes, isto é, aquilo que muitas vezes foi chamado de saber, saber-fazer e saber-ser.

Defende que o saber tem sua origem social, por ser elaborado, refletido e compartilhado por

um grupo que divide os mesmos interesses. Para o autor, o saber se modifica de acordo com o

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tempo, evoluem mediante as mudanças socais e sua aquisição vem com a troca, através do

diálogo com seus pares, ou seja, com a socialização profissional.

A ideia central é que os saberes dos professores (esquemas, regras, hábitos,

procedimentos, etc.) não são inatos, mas produzidos pela socialização. São classificados por

Tardif (2011) em saberes da formação profissional (conjunto de saberes transmitidos pelas

instituições de formação de professores), saberes disciplinares (saberes sociais definidos e

selecionados pela instituição universitária, integrados à prática docente através da formação

dos professores em diversas disciplinas), saberes curriculares (discursos, objetivos, conteúdos

e métodos a partir dos quais a escola categoriza e apresenta os saberes sociais por ela

definidos e selecionados como modelo de cultura erudita e de formação para cultura erudita) e

saberes da experiência (saberes baseados no trabalho cotidiano do professor e no

conhecimento do seu meio). (TARDIF, 2011).

Já para Gauthier e seus colaboradores (1998), os saberes subjacentes ao ato de ensinar

correspondem ao conjunto dos conhecimentos, competências e habilidades que servem de

base para a prática docente e devem estar em íntima relação com as condições concretas do

exercício do magistério. Assim, os autores partilham uma visão de ensino na qual vários

saberes são mobilizados pelo professor, de modo a instituir um reservatório, no qual tal

profissional se abastece para dar respostas às situações concretas do ensino. Os saberes devem

estar em intima relação com as condições concretas do exercício do magistério.

Para os autores, identificar esses saberes constitui uma condição fundamental para

avançarmos rumo à profissionalização do oficio do professor. Eles esclarecem que a pesquisa

sobre o desvelamento do repertório de conhecimentos do ensino deve ultrapassar dois

obstáculos: o do próprio oficio do professor, o qual exerce sua função sem mesmo identificar

os saberes que são inerentes à sua profissão, e o das ciências da educação, por produzirem

saberes que não levam em conta a realidade concreta do trabalho docente.

Assim, buscando superar tais obstáculos, o autor lança saberes necessários ao ensino,

objetivando conhecer em que sentido e de que forma os docentes mobilizam esses saberes

(GAUTHIER et al, 1998). São eles: saberes disciplinares (saberes produzidos por

pesquisadores e cientistas nas diversas disciplinas científicas), curriculares (saberes do

programa de ensino, que exigem uma transformação dos saberes produzidos pelas ciências),

das ciências da educação (conhecimentos profissionais, que, embora não ajudem diretamente

a ensinar, informam a respeito de várias facetas do ofício ou da educação de modo geral), da

tradição pedagógica (representações sobre a profissão de professor, adquiridas durante a

vida), experienciais (a experiência é pessoal e privada, confinada nos segredos da sala de

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aula) e, por fim, da ação pedagógica (o saber experiencial dos professores a partir do

momento em que se torna público e é testado através das pesquisas realizadas em sala de

aula).

Podemos inferir que os autores são unânimes ao colocar em destaque a experiência como

parte importante na construção de saberes para ensinar e dar identidade docente, além de

considerarem o saber do professor como resultado de uma produção social, resultado de

interações entre os que compõem o seu meio.

É com base nesse saber adquirido na experiência do Projeto UCA, vivida pelos

professores, tanto no âmbito profissional como também em seu contexto social que focamos a

análise deste trabalho. Assim, cremos que é na experiência e nas múltiplas formas de uso das

Novas Tecnologias da Informação e Comunicação que se pode construir o imaginário social e

novas sociabilidades, bem como o ensino e a aprendizagem, a prática docente e formas

peculiares de uso das TICs.

Acreditamos, ainda, que a construção de saberes é fruto do entrelaçamento de

experiências. Consiste em tomar como base experiências anteriores para alçar novos

aprendizados. Desta forma, a presença do ambiente produzido pelo Projeto Um Computador

por Aluno possibilita esse novo aprendizado, permitindo o cruzamento entre as práticas

docentes e a cultura digital de forma a dar continuidade à formação e ao desenvolvimento dos

professores.

Nesse contexto, Dewey (1978) apresenta a experiência como base para aprendizagem

humana. O autor reflete a experiência como vínculo entre o ser vivo e seu ambiente, na

dimensão física e social. Para ele, a experiência e os saberes que dela decorrem revelam-se

através de formas de interação, nas quais os dois elementos que nela entram - a situação e o

agente - são modificados. O autor ainda elucida que essas duas existências, o agente do

conhecimento e a coisa conhecida, modificam-se, “porque se modificaram as relações que

existiam entre elas”. (DEWEY, 1978, p.14)

Portanto, adquirir saberes está intrinsecamente ligado ao aspecto dinâmico da experiência

dos professores inserido no Projeto UCA. Com base no pensamento de John Dewey (1978), a

educação é uma contínua reconstrução da experiência, uma vez que o professor pode

estabelecer uma multiplicidade e uma variedade de relações com o seu meio natural e isso, na

visão do autor, obriga o ser humano a estar em uma perene transformação.

Assim sendo, ao vivenciarem a experiência do UCA, os docentes além de aprenderem

novas habilidades especificas do meio da informática, estão também estabelecendo

significados através da interligação de saberes anteriores, buscando, assim, a melhor forma de

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internalizar e mobilizar os novos saberes. A partir disso, transformam sua maneira de usar e de

compreender as TICs, revelando uma reconstrução em seus saberes para ensinar.

É importante destacarmos que os saberes reconstruídos por meio da experiência adquirida

no UCA não são necessariamente novos no sentido inovador da palavra, mas são saberes

considerados novos para um determinado contexto de uso e entendimento das TICs. São

saberes decorrentes de um processo de conexões de continuidades, propiciado por

permanentes recriações do sujeito.

Freire (1996) nos revela um viés da experiência relacionado a um movimento de educação

para emancipação do sujeito. Assim, pensar o sujeito como parte da realidade é dar

possibilidade de promover o enfrentamento cotidiano com as questões complexas que

envolvem seu contexto de vida. É inegável o poder de penetrabilidade que as tecnologias

imprimem na nossa realidade social. Nesse sentido, o enfrentamento das questões complexas

do nosso cotidiano também deve abarcá-las.

Contudo, acreditamos que esse enfrentamento deve superar a deificação tecnológica,

evitando que o indivíduo torne-se refém dos aparatos tecnológicos. Habermas (1968), em sua

obra “Técnica, Ciência como Ideologia”, diferencia a “racionalização” da “racionalidade”.

Para o autor, a racionalidade refere-se a uma forma de atividade econômica capitalista

liderada pela burguesia e dominação burocrática. Nesse sentido, a “racionalidade” estaria

imbuída de uma intencionalidade e de um discurso político, o qual segue premissa de um

conformismo lógico e de uma reprodução de uma determinada ordem social.

Já a racionalização significa a ampliação das esferas sociais submetidas a um critério de

decisão racional, sendo essa racionalização dependente da institucionalização do progresso

técnico e científico. Contudo, vale salientar que Habermas (1968) acredita que no processo de

racionalização, à luz de uma possível razão técnica, também esta inscrita certa dominação

política, de forma oculta. Em seu íntimo, a razão técnica também está carregada de um

conteúdo político e intencional. O autor complementa:

O conceito de razão técnica é talvez em si mesmo ideologia. Nãosó a sua aplicação,

mas já a própria técnica dominação metódica, cientifica, calculada e calculante

(sobre a natureza e sobre o homem). Determinados fins e interesses da dominação

não são outorgados à técnica apenas «posteriormente» e a partir de fora se inserem

já na própria construção do aparelho técnico; a técnica é, em cada caso, um projeto

histórico-social; nele se projeta o que uma sociedade e os interesses nela dominantes

pensam fazer com os homens e com as coisas. Um tal fim de dominação é

«material» e, neste sentido, pertence a própria forma da razão técnica.

(HABERMAS, 1968, p. 47)

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Assim sendo, a racionalização desencadeia a não liberdade do indivíduo e uma dificuldade

no seu pensar autônomo. Ele estaria, desta forma, sempre vinculado e dependente de um

sistema.

No progresso das técnicas/tecnologias, apesar de alargar formatos e possibilidades sociais,

seu pensar e disseminação estão imbuídos de um pensamento de manipulação, ou melhor, de

uma racionalidade dominadora.

Há uma submissão acentuada aos aparatos tecnológicos que precisa ser sobrepujada por

meio de uma educação que inspire a experiência autônoma, indagadora e reflexiva do sujeito,

fundada nos princípios de liberdade, adquirida dia a dia na e pela práxis.

Paulo Freire, em sua obra Educação como Prática da Liberdade (1993), enfatiza a atitude

dos educadores para com a formação emancipadora dos indivíduos. A formação de atitudes

ingênuas nos alunos reforça a falta de atitude e reflexão do sujeito, forçando a perpetuação de

uma lógica social estabelecida por quem “está no poder”, de modo que pouco do que é

discutido em ambiente de ensino/aprendizagem leva o sujeito a ter posições mais indagadoras

e criadoras.

Tratar a questão da práxis na educação é interligá-la à afirmação do diálogo, das

discussões e das reflexões acerca das questões sociais. Para tanto, é de fundamental

importância que os momentos de diálogo e compartilhamento de ideias não tenham um

caráter periférico dentro do processo de formação do sujeito, ou seja, que as vivências e

questões sociais não se firmem no senso comum. A inexistência do diálogo leva à passividade,

à memorização do conhecimento e falta de (re)elaboração do mesmo. Isso “nos deixa em

posição de inautêntica sabedoria” (FREIRE, 2001, p. 104). Freire ainda nos elucida que “a

educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise

da realidade. Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa.” (FREIRE,1993,

p. 104).

Portanto, é essa educação dialógica e emancipadora que possibilitará o desenvolvimento

da responsabilidade, da liberdade e do discernimento que fará o sujeito compreender e

participar critica e ativamente das decisões sociais/profissionais que envolvem seu contexto.

Para Freire (1996), a experiência e a capacidade de apreensão de saberes advindos da mesma

não convêm apenas para adaptar o ser humano ao seu contexto social, mas sim para

“transformar a realidade, para nela intervir, recriando-a.” (FREIRE, 1996, p. 69).

Então, podemos inferir que os saberes para ensinar e atuar na sociedade emergem de um

contínuo de experiências, as quais o educador vivenciará em seu cotidiano. O professor

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estaria, portanto, ainda nos valendo das palavras de Dewey (2010), vivenciando o princípio da

continuidade da experiência, o qual significa que “toda experiência tanto toma algo das

experiências passadas quanto modifica de algum modo a qualidade das experiências que

virão” (DEWEY, 2010, p. 36).

Sendo a experiência contínua a base para a (re)construção de saberes, podemos, então,

compreender que o professor, com o tempo, acaba entrando em contato com uma gama de

saberes que são internalizados por eles, servindo de base para sua atuação social e

profissional. A internalização desses saberes e a recorrência com que os usam em seu

cotidiano acabam sendo incorporados com um habitus. Deste modo, ao interiorizar um

conjunto de esquemas de classificação do mundo, o professor passa a incorporar esses

esquemas em seu imaginário e os reproduzem em suas práticas sociais.

Por habitus entendemos como um conceito que interliga, de forma dialógica, a oposição

aparente entre a realidade social e as realidades individuais. São dois mundos - o objetivo e o

subjetivo - que estão em constante interação. Nesse sentido, podemos entender que o habitus

constitui-se de um conjunto de esquemas pertencentes ao sujeito e que são constituídos

socialmente.

Bourdieu (2011) nos esclarece que o habitus é uma subjetividade socializada, pois afirma

que o ser individual, particular e subjetivo foi estruturado a partir de uma coletividade

organizada. Nesse sentido, o conjunto de saberes socialmente estabelecidos a serem

adquiridos, quando apreendidos, são postos em prática seguindo um campo (espaço social de

múltiplas dimensões de relações entre agentes que partilham interesses em comum) que

estimula a experiência do sujeito. Contudo, a internalização e as experiências originadas

desses saberes socialmente construídos se manifestam instintivamente. Nas palavras de

Bourdieu (2011), o habitus:

Não é um calculo teórico semelhante uma balizagem sistemática do espaço teórico

[...], mas sim uma estratégia prática do habitus científico, espécie de sentido de jogo

que não tem necessidade de raciocinar para se orientar e se situar de maneira

racional num espaço. (BOURDIEU, 2011, p. 62)

Podemos considerar, assim, que a restruturação do habitus de um professor está

relacionado ao que denominamos de processo de apropriação da cultura digital. Por

apropriação entendemos um processo que visa uma “história social dos usos e interpretações

dos objetos, referendados nas práticas sociais e inscritos nas práticas específicas que as

produzem” (COELHO AND FREIRE FILHO, 2011, p.144).

A apropriação da cultura digital, tal como a entendemos, resulta no empoderamento dos

sujeitos sociais quando fazem uso de tecnointerações e leva em consideração aspectos

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relacionados ao sentido que será produzido em sua vida profissional e social, a partir da

experiência dos usuários docentes com os meios digitais.

Dentro desse contexto, é importante darmos atenção às condições e aos processos que,

muito concretamente, conduzem as operações de construção de sentidos de pertencimento e

formações sociocognitivas, quando os professores fazem uso das TICs, consequentemente,

compartilhando de uma cultura tecnodigitalizada. É esse contexto de apropriação que

oportuniza o professor a se qualificar, permitindo assim a interação sociotécnica e as

apropriações dos artefatos digitais em suas ambiências sociais, ou em tecnointerações no

ambiente tecnológico.

Além disso, vale destacar que as subjetividades dos atores docentes também estão

envolvidas em um processo de reflexividade. Para tanto, nos ancoramos no conceito de

autorreflexividade de Giddens (1991), que explica as mudanças nas práticas sociopolíticas

contemporâneas, incorporando a categoria reflexividade.

Para Giddens (1991), esta nova autorreflexividade na modernidade tardia seria um

movimento imanente do próprio processo de modernização na vontade livre do sujeito. Sendo

o processo de autorreflexão de natureza essencialmente cognitiva, entende-se que este sujeito

contemporâneo tanto supera o “destino” como também as forças do determinismo nas práticas

sociais interativas.

As instituições sociais modernas tendem a ser dinâmicas e globalizadas, e por isso geram

mudanças nos contextos locais de interação. Em sua natureza, encontramos descontinuidades

em relação às culturas tradicionais. Assim também acontece na ambiência escolar. O advento

de novas formas de ensinar e dos novos recursos didáticos, especialmente os proporcionados

pela informatização, afetam o curso normal das atividades, fazendo com que os atores

escolares passem por um processo de novas apropriações e reconstruções de saberes. A

subjetividade subjacente ao processo de apropriação tecnológica é desencadeada pela

reflexividade do professor.

O professor, desta forma, estaria passando por uma espécie de desajustamento das

estruturas cognitivas ao se apropriar de uma cultura digital. A reordenação das estruturas viria

posteriormente, através das tecnointerações estabelecidas à luz de contínuas entradas (inputs)

de novos saberes, causando, assim, transformação nas relações sociotécnicas que os

professores estabelecem em seu meio.

Para Giddens (1991),

A reflexividade da vida social moderna consiste no fato de que as práticas sociais

são constantemente examinadas e reformadas à luz de informação renovada sobre

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essas próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter. (GIDDENS,

1991, p. 49)

No entanto, é importante salientar que essa reflexividade não pode ser entendida de forma

reducionista e assim, considerar a mesma dentro de uma visão pragmática como a única que

explicaria o processo de reflexividade dos professores que se aventuram nas tecnointerações

propiciadas pelo ambiente informatizado. Para Libâneo (2010), esses reducionismos tendem a

ser elucidados, em boa parte, pela instabilidade do pensamento pedagógico brasileiro nas

últimas décadas, pois se submete com facilidade aos modismos e às oscilações teóricas, ou

seja, o pensamento pedagógico estaria flutuando entre uma ou outra perspectiva do fenômeno

educativo - a psicológica, a sociológica, a econômica, a filosófica, entre outras perspectivas.

A reflexividade a qual nos referimos refere-se, de modo óbvio, a uma conduta reflexiva, a

uma atividade de reflexão sobre ações de naturezas múltiplas. Além disso, consideramos a

reflexividade um estado de espírito, nascido da experiência, que nos servirmos para desvendar

as condições subjetivas necessárias para chegarmos a esboçar conceitos sobre o meio que nos

rodeia.

Deste modo, podemos inferir que a reflexividade tem uma intima ligação entre a reflexão

e as práticas sociais e, neste caso, a reflexividade não é somente introspecção, mas também

uma atitude inerente à ação humana, bem como uma autoconfrontação da realidade,

incorporada por um processo de apropriação do meio no qual o sujeito vive princípios

ideológicos e relações identitárias, premissas necessárias no percurso da apropriação da

cultura digital.

Tomando como base as ideias expostas sobre a restruturação de habitus e dos saberes, a

apropriação da cultura digital e da reflexividade que está por trás de todo o processo da

mudança de estrutura cognitiva do professor, logo compreendemos, que a experiência em um

ambiente informatizado para os professores constitui-se em um novo campo de interação e um

espaço fecundo para impulsionar a reflexividade do profissional. As tecnointerações

desenvolvidas neste campo possibilitam ao docente a revisão de suas ações e pensamentos,

tendo em vistas os saberes que decorrem da apropriação desse novo contexto que se

apresenta.

Podemos, também, nos referir a esse processo de ampliação da cognição a partir do

contato com as TICs, como letramento digital. O letramento refere-se a uma condição do

indivíduo de exercer, efetivamente, práticas sociais de leitura e escrita, ou seja, trata-se de

munir o individuo de saberes necessários para uma participação ativa e competente em

situações de interação com o ambiente letrado, por meio da leitura e da escrita. Para Soares

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(2002), a massificação das mídias digitais na sociedade induz a refletir sobre um novo olhar

sobre o conceito de letramento. A autora afirma:

O momento atual oferece uma oportunidade extremamente favorável para refiná-lo e

torná-lo mais claro e preciso. É que estamos vivendo, hoje, a introdução na

sociedade de novas e incipientes modalidades de práticas sociais de leitura e de

escrita, propiciadas pelas recentes tecnologias de comunicação eletrônica – o

computador, a rede (a web), a Internet. É, assim, um momento privilegiado para, na

ocasião mesma em que essas novas práticas de leitura e de escrita estão sendo

introduzidas, captar o estado ou condição que estão instituindo: um momento

privilegiado para identificar se as práticas de leitura e de escrita digitais, o

letramento na cibercultura, conduzem a um estado ou condição diferente daquele a

que conduzem as práticas de [...] letramento na cultura do papel. (SOARES, 2002, p.

146)

Soares (2002) nos coloca que a situação de incorporação de diferentes práticas sociais de

leitura e escrita, inserindo-se nesse contexto o uso das TICs, faz surgir um conceito de

letramento plural, histórico e contemporâneo. São tipos de letramento distintos, os quais

exigem condições e saberes específicos, uma vez que diferentes tipos de tecnologias da escrita

e da leitura, com diferentes formas de produção, reprodução e difusão da língua,

proporcionam um uso social diferenciado e um processo de reflexividade diferenciado,

convergindo assim para a formação do habitus de um indivíduo ou de um grupo social.

Portanto, através do processo de letramento digital, os professores têm a possibilidade de

se apropriarem da cultura digital, de forma a vivenciarem preceitos ideológicos, aprendizagem

de novos saberes e pertenças identitárias que se impõem na apropriação da cultura digital nos

meios tecnológicos.

Nesse ponto queremos frisar a possibilidade de reafirmação de seus laços nas relações

cotidianas, criando novas existências que produzem subjetividades e mobilidade social. Seria,

portanto, o nascimento de um novo homem, um novo profissional da educação, com novas

existências, diante de possibilidades de mudança de vida, renascido por meio de uma maior

conscientização de sua condição social e do papel das TICs nesse contexto. O

autoconhecimento, a reflexividade, a compreensão e a conscientização permitirão sua

inserção crítica na sociedade letrada.

Deste modo, corroborando com a visão de Freire (1993), vivenciaríamos um processo de

descodificação da sua situação existencial, e isso implica um reconhecimento do sujeito no

objeto (situação existencial concreta) e do objeto como situação em que está o sujeito. Freire

(1993) nos diz que no processo de aquisição de um conhecimento compreendido como

transformador,

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O movimento de ida e volta, do abstrato ao concreto, que se dá na análise de uma

situação codificada, se bem-feita a descodificação, conduz a superação da abstração

com percepção critica do concreto, já agora não mais realidade espessa e pouco

vislumbrada. (FREIRE, 1993, p. 113)

Considerando o contexto de uso e apropriação das TICs, é revelado, portanto, a

possibilidade de “nova” realidade vislumbrada pelo educador, refletindo um contexto onde

residem ideias que tencionam a força de trabalho qualificada e as demandas da economia

presente como sendo uma responsabilidade exclusiva do homem moderno. Essas ideias são

comunicadas por meio das mais diversas mídias e nas relações interpessoais que se

estabelecem. Produzem valores estéticos, técnicos, simbólicos e sociais que colocam o

“capital humano” ou mesmo o “capital inteligência” no cerne das forças produtivas. O

professor, neste caso, carrega seu próprio “capital inteligência”, de cunho imaterial, fruto das

experiências e dos saberes vividos no dia a dia. Esse tipo de capital o projeta como a principal

autoridade nas mudanças dos processos societários atuais (GORZ, 2005).

Os saberes vindos da experiência, quando perpassam o empoderamento das TICs pelos

professores, podem ser traduzidos em maior complexidade nas experiências vividas e com

maior sofisticação e abrangência tecnológicas nas configurações da vida cotidiana. Mas,

principalmente, apresentam-se como uma modalidade de apropriação capaz de enfrentar

algumas mudanças requeridas aos novos desafios que lhes são colocados nas relações das

práticas educativas, que também exigem práticas sociais tecnointerativas na

contemporaneidade.

Os professores, portanto, ao estarem “abertos” para adquirirem novos saberes, são capazes

de realizar a “complexa operação de, simultaneamente, transformando o mundo através de sua

ação, captar a realidade e expressá-la por meio de sua linguagem criadora.” (FREIRE, 1993,

p. 107).

Acreditamos que os saberes advindos da experiência são base para a (re)construção dos

saberes e a apropriação da cultura digital pelos professores inseridos no Projeto Um

Computador por Aluno. A experiência, a reflexividade e a apropriação da cultura digital,

adquiridas por meio do trabalho pedagógico com uso dos laptops educacionais do UCA

podem gerar saberes que transformaram a vida social e profissional dos educadores,

determinando novas sociabilidades e novas formas de interações sociotécnicas.

Com base nisso, procuramos identificar os saberes decorrentes das relações

sociocognitivas estabelecidas pelos professores ao experienciar o Projeto UCA. Portanto, para

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identificar tais saberes, faz-se necessário excursionar sobre a proposta de implantação do

Projeto, especialmente no que tange ao seu plano de formação de professores.

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3 O PROJETO UM COMPUTADOR POR ALUNO E O PROCESSO DE

FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Neste capítulo, será exposto o Projeto Um Computador por Aluno (UCA) no seu âmbito

estrutural, tomando como base alguns dos documentos oficiais do mesmo, destacando a

proposta de formação de professores. Apresentamos o modelo de formação de professores

UCA para uso dos laptops no molde um laptop para um aluno, destacando a forma de

organização curricular, e sistematização de conteúdos, especialmente no que tange ao módulo

de apropriação tecnológica na escola-alvo desta investigação.

Investigamos o documento “Formação Brasil: Planejamento das Ações do Projeto Um

Computador por Aluno” (2009), a lei 12.249/2010 - a qual estabelece a criação do Projeto

UCA, objetivando refletir sobre as suas orientações quanto à organização e aplicação das

ações de formação aos professores, complementando, assim, as informações colhidas através

de outros procedimentos metodológicos utilizados na pesquisa.

Desta forma, objetivamos no presente capítulo, analisar o envolvimento do conteúdo e

aplicação desta formação, especialmente no que tange ao módulo de apropriação tecnológica,

com a perspectiva de uma formação voltada para a (re)construção de saberes, apropriação da

cultural digital e da reflexividade, ajuizando, dessa maneira, se a formação de professores

oferecida pelo Projeto UCA resulta em um amadurecimento crítico do professor. Investigamos

o plano de formação na tentativa de perceber se o mesmo exerce influência na prática

pedagógica dos professores investigados quando fazem uso dos laptops.

3.1 Concepção e funcionamento

O UCA (Projeto Um Computador por Aluno) é um projeto oriundo do Governo Federal e

tem sua criação através da Lei 12.249/11 de junho de 2010. Essa lei trata, dentre outros

assuntos, da criação do UCA, bem como institui o Regime Especial de Aquisição de

Computadores para Uso Educacional – RECOMPE. O projeto nasce, de acordo com o artigo

7º da presente lei, com o objetivo de “promover a inclusão digital nas escolas das redes

públicas de ensino federal, estadual, distrital, municipal ou nas escolas sem fins lucrativos de

atendimento a pessoas com deficiência, mediante a aquisição e a utilização de soluções de

informática, constituídas de equipamentos de informática, de programas de computador

(softwares) neles instalados e de suporte e assistência técnica necessários ao seu

funcionamento.” (Lei 12.249/2010, p.03, 2010).

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Apesar de ter sua criação com base na Lei Federal no ano de 2010, o Projeto Um

Computador por Aluno já vinha sendo desenvolvido em sua fase “pré-piloto” desde o ano de

2007. Mas foi no ano de 2005 que o Governo Federal, na época do então presidente Luiz

Inácio Lula da Silva, tomou conhecimento das ideias do Projeto.

Segundo uns dos documentos da Diretoria de Produção de Conteúdos e Formação em

EaD, da extinta Secretaria de Educação à Distância (SEED/MEC), a proposta UCA

compreende aspectos como (UCA, 2012):

Mobilidade/Portabilidade: Uso dentro de fora da escola pelos envolvidos no

projeto;

Integração das mídias: Hardware permite a convergência de mídias. Vídeos,

redes, áudio integrado, câmeras fotográficas, etc.: integrados, possibilitam efeitos de

mudança na atividade pedagógica;

Conectividade sem fio: Cria redes locais e as conecta a outras redes;

Imersão na cultura digital: Por meio do modelo 1:1 (um computador para cada

aluno), o projeto afirma uma maior imersão na cultura digital.

Analisando o documento sobre o projeto-base UCA, o qual estabelece as primeiras

diretrizes para implantação do mesmo, observamos que há uma maior amplitude dos

pressupostos que o regem. Além de aspectos como mobilidade, o qual permite romper com a

utilização pedagógica de equipamentos fixos de informática em um único ambiente e

conectividade - pressuposto que comunga com a mobilidade, ocasionando a expansão de uso

do computador dentro e fora de sala de aula -, o projeto base UCA acrescenta mais 05

pressupostos base (SEED, 2007):

Baixo custo dos equipamentos: Condição primordial para aquisição de uma

grande quantidade de unidades, contribuindo para o conceito de um computador por

aluno;

Utilização para atividades pedagógicas: os equipamentos deverão ser utilizados

para atenderem atividades pedagógicas e de gestão escolar;

Acessibilidade: Segundo o presente documento, no projeto UCA deverão ser

observados aspectos sobre acessibilidade em conformidade com o Decreto 5.296 de

02/12/2004, permitindo a adaptação ou instalação de recursos (softwares e periféricos)

que garantam a facilidade de uso por portadores de deficiência;

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Uso de software livre: De acordo com a política do Governo Federal que incita

o uso de software livre, tanto o sistema operacional quanto os aplicativos que estão

inseridos nos equipamentos devem ser livres e com código aberto;

Idioma em Português do Brasil: Sendo os equipamentos destinados à utilização

em escolas brasileiras, torna-se fundamental que o idioma utilizado nas interfaces de

hardware e software e demais materiais do projeto sejam em português do Brasil.

No mesmo ano de publicação deste documento base do Projeto UCA, em 2007, foram

lançadas as primeiras experiências. Houve, portanto, a seleção de 05 escolas públicas

localizadas em cinco Estados do Brasil para participarem da fase pré-piloto do projeto. Foram

realizados experimentos iniciais nos Estados de São Paulo - SP, Porto Alegre - RS, Palmas -

TO, Piraí-RJ e Brasília-DF (UCA, 2013). Abaixo especificamos com mais detalhes alguns

dados sobre os primeiros experimentos UCA:

Estado RS SP RJ TO DF

Escola Luciana de

Abreu

Ernani Silva

Bruno

Ciep Rosa

Guedes

Dom Alano M.

Du Naday

Centro de EF

nº 01

(Paranoá)

Rede Estadual Municipal Municipal Estadual Estadual

Alunos 400 1200 400 911 1000

Professores 50 50 26 34 76

Níveis de

Ensino

Ens.

Fundamental/

EJA

Ens.

Fundamental/

EJA

Ens.

Fundamental

Ens.

Fundamental/

Ens. Médio

Ens.

Infantil/Ens.

Fundamental e

EJA.

Laptops

Recebidos

275 275 400 400 40

Tabela 01: Detalhamento de dados referente às primeiras experiências do Projeto UCA.

Fonte: Readaptação de tabela reproduzida em: http://www.uca.gov.br (2012).

No ano de 2010, levando em consideração as avaliações realizadas, chega ao início a

segunda fase do Projeto UCA, denominada fase “piloto”. Nesta fase, além das 05 instituições

já contempladas com o projeto, foram acrescentadas cerca de 300 escolas espalhadas por todo

o Brasil. Contudo, segundo informações do próprio site do projeto, as escolas inseridas nessa

nova fase foram escolhidas com base em critérios pré-estabelecidos pela equipe do projeto.

Ou seja, coube às Secretarias de Educação Estadual ou Municipal dos Estados e à União

Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), eleger as escolas que iriam

receber o UCA, somente se as mesmas contemplassem os seguintes critérios (UCA, 2012):

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Critérios Detalhes

Nº de alunos e nº de professores

Cada escola deverá ter entorno de 500

(quinhentos) alunos e professores;

Estrutura das escolas

As escolas deveriam possuir, obrigatoriamente,

energia elétrica para carregamento dos laptops e

armários para armazenamento dos

equipamentos.

Localização das escolas

Preferencialmente, deveriam ser pré-

selecionadas escolas com proximidade a

Núcleos de Tecnologias Educacionais - NTE -

ou similares, Instituições de Educação Superior

públicas ou Escolas Técnicas Federais. Pelo

menos uma das escolas deverá estar localizada

na capital do Estado e uma na zona rural;

Assinatura do termo de adesão

As Secretarias de Educação Estaduais ou

Municipais de cada uma das escolas

selecionadas deverão aderir ao projeto através

do envio de ofício ao MEC (Ministério da

Educação) e assinatura de Termo de Adesão, no

qual manifesta-se solidariamente responsável e

comprometida com o projeto.

Anuência do corpo docente

Para cada escola indicada, a Secretaria de

Educação Estadual ou Municipal deverá enviar

ao MEC um ofício, onde o (a) diretor (a) da

escola, com a anuência do corpo docente,

aprova a participação da escola no projeto. Tabela 02: Tabela criada a partir de dados contidos no site PROUCA/MEC, 2012,

referente aos critérios para seleção de escolas.

Fonte: (http://www.uca.gov.br/institucional/criteriosEscolha.jsp)

Dentro da fase piloto, alguns municípios brasileiros inseriram-se na proposta UCA Total.

Nessa proposta, seis municípios brasileiros são atendidos de forma total, ou seja, todas as

escolas daquelas localidades estão com o Projeto UCA funcionando.

Hoje tal projeto atende a todos os Estados brasileiros. Alguns, como os mencionados

anteriormente, estão inseridos na proposta do UCA Total.

Buscando sistematizar e quantificar o Projeto UCA em números, construímos o quadro

abaixo, com base em dados contidos no site oficial do UCA (2012), onde expomos, em dados

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atuais, a quantidade de escolas inseridas no projeto e o total de professores e alunos

beneficiados de acordo com cada Estado brasileiro.

Estado Escolas Professores Alunos

1. Acre 11 180 3682

2. Alagoas 13 134 3079

3. Amapá 10 126 2577

4. Amazona

s

11 263 4341

5. Bahia 16 155 3346

6. Ceará 15 150 3719

7. Distrito

Federal

8 134 2688

8. Espírito

Santo

19 202 3394

9. Goiás 10 217 3945

10. Maranhã

o

19 373 6249

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11. Mato

Grosso do Sul

29 517 7137

12. Mato

Grosso

12 208 3331

13. Minas

Gerais

25 607 8515

14. Paraná 17 408 5458

15. Paraíba 16 208 3935

16. Pará 25 281 5666

17. Pernamb

uco

58 567 10275

18. Piauí 14 220 3639

19. Rio

Grande do

Norte

10 230 3819

20. Rio

Grande do Sul

24 577 6387

21. Rio de

Janeiro

24 394 6102

22. Rondônia 12 141 2878

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23. Roraima 9 220 3114

24. São Paulo 29 384 5924

25. Santa

Catarina

18 391 5580

26. Sergipe 23 432 8045

27. Tocantins 16 204 4235

Tabela 03: Tabela com número de escolas, alunos e professores beneficiados com o UCA, com base em dados

contidos no site oficial do Projeto.

Fonte: http://www.uca.gov.br/institucional/escolasBeneficiadas.jsp. Acesso: Junho/2012.

Das primeiras experiências do Projeto UCA - da fase pré-piloto e da fase piloto -, foram

sistematizadas avaliações acerca do desenvolvimento do projeto. No documento-base da

formação UCA, encontramos um item denominado “Suporte”, no qual encontramos

conclusões gerais do projeto, oriundas de relatos individuais de usuários

(professores/gestores). Encontramos, além das dificuldades enfrentadas, orientações de uso

importantes a serem consideradas. São relatos de experiências vivenciadas em cada uma das

escolas onde o Projeto foi inicialmente desenvolvido. Resumimos e sistematizamos as

principais impressões e necessidades. São elas:

Embora os laptops sejam doados, deve haver um contrato no qual se assegure

uma garantia dos equipamentos por no mínimo três anos;

Necessidade de contato com as empresas que doaram os equipamentos, a fim

de sanar problemas relacionados à parte técnica do equipamento;

Necessidade de um suporte técnico vinculado à escola que possa dar conta dos

computadores em manutenção;

Importância de formação e apoio à implantação de um grupo de monitores nas

escolas, a fim de minimizar situações de dificuldades técnicas, bem como ajudar na

conscientização dos demais alunos sobre o cuidado no uso dos laptops;

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O corpo docente da escola deve contar com o apoio das Universidades, mas

necessita de liberdade para agir, intervir e planejar as suas próprias ações de formação;

É importante que os estudantes levem os laptops para casa. Esta ação

possibilitará a aproximação projeto/família/comunidade;

Necessidade de agrupar profissionais de diversas áreas do conhecimento,

formando equipes multidisciplinares compostas por professores visando à instauração

de um suporte pedagógico.

A avaliação das ações iniciais do Projeto UCA é importante para se pensar em ações

futuras para o seu desenvolvimento. São questões que devem consideradas, pois perpassaram

por todas as escolas beneficiadas.

3.2 O Plano de Formação de Professores do Projeto UCA:

Na fase piloto do Projeto UCA, a formação dos professores foi um ponto importante a ser

implantado, no intuito de fornecer aos docentes determinados conhecimentos necessários para

a atuação dos mesmos em sala de aula, com uso dos laptops provenientes do projeto.

A partir dessa necessidade, foi posto em ação um plano de formação, pensado por

professores doutores, representantes de algumas universidades nacionais.

O plano de formação de professores é um dos pontos principais de análise deste trabalho,

tendo em vista que a formação oferecida aos docentes para uso das TICs, representada pelos

laptops, é o elemento fundamental para o seu uso didático de forma significativa no âmbito

escolar, além de ser a atividade que irá propulsar a reconstrução de saberes, de modo que

esses saberes estejam consoantes com o novo contexto social e didático que se apresenta com

o Projeto UCA.

Através do documento intitulado “Formação Brasil: projeto, planejamento das

ações/cursos”, do Projeto Um Computador por Aluno, documento oficial da formação

oriundo do Governo Federal, elaborado pela Secretaria de Educação à Distância (SEED) -

Ministério da Educação, buscamos interpretar e refletir o plano de formação de professores do

Projeto.

O intuito da análise é perceber como ocorre a formação, especialmente no que tange ao

módulo de apropriação tecnológica, ressaltando seus conteúdos e sua aplicação prática, além

de analisarmos a sistematização da mesma no contexto investigado na pesquisa.

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3.2.1 Princípios e organização estrutural do plano de formação e professores no

Projeto UCA:

O plano de formação de professores foi desenvolvido com o objetivo de “criar uma rede

de apoio às comunidades escolares na implementação do Projeto UCA, de forma inovadora e

sustentável.” (MEC, 2009, p. 02). Esse plano envolve as escolas da Rede Pública de Ensino,

as Universidades (Institutos de Ensino Superior - IES), as Secretarias Estaduais e Municipais

de Educação (SE) e os Núcleos de Tecnologias Educacionais (NTEs).

De acordo com o esquema acima, podemos verificar que coube ao Grupo de Trabalho de

Assessores Pedagógicos (GTUCA) - equipe composta por 10 professores universitários do

Projeto Um Computador por Aluno - representar a SEED/MEC, a organização, o

planejamento e a coordenação de toda a estrutura da formação UCA.

O Grupo de Formação e Acompanhamento, orientado pelo GTUCA, é formado por 06

consultores especialistas em TICs e educação, mais um representante da SEED/MEC. Estes

são responsáveis pela formação dos representantes dos IES Globais, formado por

professores/pesquisadores, mais professores-assistentes que atuam diretamente na formação

dos representantes dos IES Locais.

Os Institutos de Ensino Superior Globais são responsáveis pela capacitação da equipe

formadora dos Institutos de Ensino Superior Locais, equipe composta por

professores/pesquisadores e tutores de universidades localizadas onde o projeto está

implantado, além de representantes de NTEs e NTMs (Núcleo de Tecnologia Educacional

Estadual e Núcleo de Tecnologia Educacional Municipal). Aqui no Estado do Rio Grande do

Norte, o IES responsável pela formação dos professores nas escolas que aderiram ao Projeto

UCA é a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

O IES Local, ou seja, a equipe composta pelos pesquisadores da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, por sua vez, ficam responsáveis pela formação do pessoal das escolas

da rede pública de ensino, juntamente com o NTE ou NTM, com apoio das Secretarias de

Educação (Estadual/Municipal).

Paralelo à organização estrutural, o plano de formação de professores do Projeto UCA tem

como princípios norteadores:

O reconhecimento do papel das tecnologias digitais na sociedade e suas

implicações no modo de pensar e agir;

O comprometimento com a dimensão pública da escola pública como espaço

de aprendizagem e provedor de inclusão digital;

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O aproveitamento da pluralidade cultural;

O respeito à autonomia na organização curricular;

A importância da articulação entre professores, currículo, experiências

individuais e coletivas, estratégias pedagógicas e mídias nas distintas etapas ao longo

da formação;

Necessidade de relacionar teorias e práticas pedagógicas,

Visão da instituição escolar como uma organização aprendente que se

desenvolve e se reestrutura como resultado do movimento reticulado dos seus

diferentes segmentos.

Segundo o documento oficial sobre a formação de professores do Projeto UCA, tais

princípios garantem uma formação significativa e completa para o profissional da educação,

norteando as ações de formação. Tais princípios devem perpassar todas as experiências de

formação, nas diversas escolas beneficiadas, independente do contexto no qual que essa

formação ocorra.

Além dos princípios norteadores, são necessárias condições físicas e organizacionais para

a efetivação do plano de formação docente do Projeto UCA. Assim sendo, para assegurar o

desenvolvimento da formação e garantir a viabilização das práticas pedagógicas com o uso do

laptop educacional, foram criadas condições necessárias para a efetivação do plano de

formação do Projeto. São eles: garantia de laptops para formadores das Instituições de Ensino

Superior (IES) Global e Local, bem como para representantes dos Núcleos de Tecnologias

Educacionais dos Estados e Municípios; existência de infraestrutura de conectividade wireless

que garanta o acesso simultâneo dos alunos à internet; envolvimento efetivo das diversas

instâncias do sistema de ensino para viabilizar a restruturação dos tempos e espaços escolares;

garantia de tempo para planejamento e formação dos professores para inserir os laptops no

contexto de ensino; formadores à disposição para colaborar e disponibilização de um

ambiente virtual de aprendizagem para mediar a formação e a aprendizagem dos professores -

neste caso, é utilizada a plataforma do e-proinfo para gestão do curso de formação.

As condições físicas e organizacionais do projeto para receber a formação de professores

UCA são necessárias, pois refletem nas tomadas de ações de formação e efetivação das

atividades. São essas condições que irão subsidiar a atuação do formador e assim permitir o

andamento do projeto.

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70

3.2.2 A sistematização dos módulos de formação e dos conteúdos

A formação do Projeto UCA ocorre de forma semipresencial. Existem,

concomitantemente, duas formas de exposição, acompanhamento das atividades e

atendimento aos professores. Uma é pela plataforma de aprendizagem e-proinfo, onde os

formadores interagem virtualmente com os professores-multiplicadores, como também os

professores podem se comunicar com outros professores de uma outra escola. Nesta

plataforma, os docentes recebem e enviam atividades referentes às ações de formação.

Em outra vertente, ocorrem encontros de forma presencial nas escolas. Nesses encontros,

os “professores-multiplicadores”, representantes do NTE do Estado, ministram aulas com o

intuito de transmitir aos professores os conhecimentos previamente planejados e estabelecidos

pelo Grupo de Trabalho de Assessores Pedagógicos do Projeto UCA. Ao final da formação, a

qual tem duração de um ano, serão certificados aqueles professores que cumprirem uma carga

horária estabelecida pelo projeto, a qual corresponde à realização de todas as atividades

previstas no plano de formação.

Desta forma, para o professor estar certificado, precisa-se cumprir uma carga horária e um

conteúdo programático específico. Ainda que os “professores-multiplicadores” façam

adaptações ao conteúdo estabelecido pela equipe especializada do UCA, trata-se de um

conteúdo fechado, pré-definido, construído fora do contexto real da escola onde o projeto está

sendo aplicado.

Os conteúdos estão organizados de forma modular. Ao todo, o plano de formação UCA

contempla cinco módulos, que propõem: a apropriação tecnológica dos recursos do laptop, a

inovação pedagógica do uso das tecnologias digitais e a atualização do Projeto Política

Pedagógica da escola, com o propósito de incluir as tecnologias digitais e a socialização da

proposta UCA na escola.

O módulo referente à apropriação tecnológica ganha relevância em nossa investigação,

pois se busca verificar se a apropriação tecnológica que a formação de professores do Projeto

UCA propõe abarca momentos de estímulo à reflexividade e à criticidade do docente.

Entendemos esse módulo introdutório como sendo decisivo para a continuidade do

aprendizado pedagógico de uso da TIC no contexto de sala e na vida social do professor.

Acreditamos que é nesse módulo que o professor, enquanto partícipe de uma cultura

tecnológica, precisa compreender tal cultura e ter consciência sobre sua participação na

mesma.

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O módulo de apropriação possui 40 horas de duração, ministrado na modalidade

presencial e à distância. Neste módulo, os professores são convidados a conhecer as

ferramentas presentes no laptop do projeto. Para efeito de apresentação dessas ferramentas, o

plano de formação UCA subdividiu este módulo em três temáticas, quais sejam: Temática I:

Conhecendo o Linux e o Koffice; Temática II: Ferramentas Educacionais - nessa temática, é

apresentado um pacote com ferramentas do próprio sistema Linux feitas especialmente para

uso didático, como o TuxPaint, TuxTyping, TuxMath, Logo, entre outras. Por fim, a última

temática do módulo I da formação UCA, Temática III: Navegadores e Ferramentas de Busca.

Permeando a Temática II, Ferramentas Educacionais, há ainda um espaço aberto para a

discussão da Teoria do Construcionismo, desenvolvida pelo educador Seymor Papert, com o

objetivo de construir uma análise teórica acerca da utilização das ferramentas educacionais

apresentadas neste módulo. Além disso, o módulo de apropriação tecnológica abre espaço

para expor aos professores em formação alguns portais educacionais, como o Portal do

Professor, Portal do Domínio Público e TV Escola. Esses são alguns exemplos de sites que

ilustram a apresentação da Temática III do plano de formação - Navegadores e Ferramentas de

Busca.

O que presenciamos neste módulo, portanto, é um modelo técnico descritivo de

apropriação tecnológica. Há um afastamento quanto às significações/sentidos que serão

produzidos por meio da experiência do professor com o universo tecnodigital que é

apresentado no módulo de apropriação.

O desenvolvimento do módulo de apropriação tecnológica, tal como está proposto no

documento analisado, não nos permite perceber como os docentes se empoderam das

tecnologias nesse percurso de formação. Acreditamos que a forma como os docentes se

apoderam das TICs está estritamente vinculada à forma com a qual o professor lida com os

esses artefatos nas suas relações cotidianas.

Dentro desse contexto, entendemos que a apropriação tecnológica deve estar associada ao

letramento digital, ou seja, ao uso social que o professor faz das TICs, à construção de saberes

e ao ativismo pedagógico na ação educativa pois, ao herdar saberes, consciência crítica e

momentos de reflexividade, com a experiência adquirida, o docente tem a possibilidade de

criar e recriar o seu mundo.

Além do módulo de apropriação tecnológica, a formação UCA conta com um segundo

módulo de formação, chamado Recursos da Web 2.0, o qual tem duração de 30 horas e é

efetuado nas modalidades à distância e presencial. Neste módulo, o conteúdo programático foi

estruturado visando familiarizar os professores com o uso de algumas ferramentas interativas

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presentes na Web 2.0, como correio eletrônico (email), listas de discussão e blogs,

favorecendo a cooperação em rede.

Em seguida vem o módulo III. Este é subdividido em mais dois submódulos, o módulo 3A

e módulo 3B. O módulo 3A é composto por conteúdos específicos para os professores e o 3B

composto por conteúdos destinados à formação da gestão escolar. Ambos os submódulos

possuem 40 horas. O objetivo do módulo 3A é desenvolver práticas pedagógicas com o uso

inovador das TICs em sala de aula, favorecendo a estruturação dinâmica de redes sociais entre

alunos, professores e alunos/professores. Não há pré-definição de conteúdos conceituais nesse

módulo, contudo objetivos, atividades e prazos para execução são estabelecidos no plano de

formação.

Já o módulo 3B, destinado aos gestores, visa desenvolver a formação continuada de

equipe gestora (diretor, vice-diretor, coordenadores, supervisores, orientadores, pedagógicos,

etc.) das escolas e de profissionais da Secretaria de Educação. Esse módulo pode ocorrer em

paralelo com o módulo 3ª e incide também nas modalidades à distância e presencial, com um

total de 40 horas de curso. Tal como no módulo 3A, no módulo 3B não há conteúdos

conceituais específicos, mas sim objetivos e atividades a seguir.

Ao final deste terceiro módulo, segundo o documento analisado, espera-se que tanto

professores quanto a gestão escolar, como um todo, integre de forma inovadora os recursos do

laptop educacional no cotidiano escolar. A culminância deste módulo ocorre com a

socialização formal dos resultados em um seminário regional ou nacional.

Em seguida, surge o quarto módulo de formação, denominado Módulo Elaboração de

Projetos, também com 40 horas de duração presenciais e à distância. Neste módulo, o intuito é

propiciar aos “professores-multiplicadores”, gestores e professores de escolas beneficiadas o

aprofundamento teórico sobre o conceito de projeto e suas especificidades no contexto

escolar, bem como a articulação das práticas pedagógicas baseadas em projetos com aspectos

relacionados ao currículo e à convergência de mídias e tecnologias de educação existentes na

escola. O módulo IV é apresentado em três eixos conceituais – Projeto, Currículo e

Tecnologias –, que se integram durante a realização das atividades propostas ao longo do

curso de formação de professores.

Dentro do programa de conteúdos apresentados no módulo IV, temos: o “conceito de

projeto”, “projeto e suas características”, “um pouco da história de projetos”,

“interdisciplinaridade”, “projeto e tecnologia” e “projeto e tecnologias: algumas implicações”.

Além desses conteúdos, estão expostas algumas atividades a serem implementadas no curso

de formação. As atividades referem-se à elaboração de um projeto pessoal/profissional dos

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professores e uma elaboração conjunta, professores e gestão, de um projeto que envolva a

participação de toda escola.

Para finalizar o curso de formação há o módulo V, que é um módulo criado para

socialização da proposta de implementação do Projeto Um Computador por Aluno na escola.

O objetivo deste módulo é:

Contribuir com a construção da proposta político pedagógica das escolas,

aproveitando as possibilidades do laptop educacional, as estratégias pedagógicas

inovadoras, o respeito à diversidade das comunidades e a consciência do papel da

escola no desenvolvimento da inteligência dos seus membros, com consequentes

mudanças em sua participação crítica e ativa na sociedade. (MEC, 2009, p. 4)

Portanto, neste módulo são sugeridas ações que resultam na (re)construção do Projeto

Político Pedagógico da escola, de forma a incluir em sua discussão objetivos referentes à

reflexão crítica e uso das TICs na prática escolar.

Detemo-nos até agora a descrever o contexto mais amplo de nossa pesquisa,

contemplando a caracterização do Projeto Um Computador por Aluno. Descrevemos, com

base em documentos e sites oficiais do Projeto, aspectos que consideramos essenciais para o

entendimento do seu funcionamento. Deter-nos-emos, agora, a expor o desenvolvimento do

referido projeto no Rio Grande do Norte, expondo acerca da sua implantação no Estado,

especialmente na escola lócus da empiria.

3.3 UCA no Rio Grande do Norte

O Estado do Rio Grande do Norte está inserido no Projeto Um Computador por Aluno

desde o ano de 2010. Nesse período, teve início a constituição da equipe que atuaria no

processo de formação dos professores-multiplicadores e nas escolas beneficiadas. Nesse

período, segundo Gomes (2011), foi “instituída uma parceria com as referidas secretarias

(Estadual e Municipal), de forma a definir a participação de dois membros de cada Núcleo de

Tecnologias Estaduais e Municipais (NTEs/NTMs) do Estado do RN e um profissional

integrante de cada escola, no intuito de auxiliar a institucionalização do projeto, totalizando

30 formadores/multiplicadores.” (GOMES, 2011, p. 04).

Como já mencionamos, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte corresponde à

Instituição de Educação Superior Local. Desta forma, a UFRN está ligada a Universidade

Federal do Ceará (UFC), no sentido de que a mesma consiste na Instituição de Educação

Superior Global, responsável pela formação da equipe formadora da UFRN, que por sua vez,

formará os professores multiplicadores, representantes dos NTEs e NTMs.

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A equipe de formadores da UFRN conta com 11 profissionais, os quais assumem as

funções de coordenadores, professores formadores e tutores. Esses são responsáveis por

executar o projeto de formação, encaminhar e viabilizar os trâmites do curso de formação na

UFRN, programar os encontros de trabalho, trabalhar os módulos que compõem o curso,

apresentar um calendário de trabalho do curso com os formadores e com os professores das

escolas, acompanhar e avaliar as ações no ambiente virtual de aprendizagem e cooperar com

os professores multiplicadores em suas ações nas escolas, além de ser a entidade certificadora

do curso de formação de professores do Projeto UCA.

O Projeto no Rio Grande do Norte atende a 10 escolas da Rede Pública de Ensino

(Estaduais e Municipais), como por exemplo a Escola Estadual Maria Cristina, a qual que

elegemos para o desenvolvimento da pesquisa. Abaixo especificamos as escolas contempladas

e suas localidades:

Municípios do RN Escola

Ceará-mirim Escola Estadual General João varela

Extremoz Escola Estadual Manual Carneiro da Cunha

Ipanguaçu Escola Municipal Profª. Maria Rizomar de Figueiredo Barbosa

Jardim do Seridó Escola Estadual Antônio de Azevedo

Natal Escola Estadual Professora Josefa Sampaio

Escola Municipal Professor Herly Parente

Parnamirim Escola Estadual Maria Cristina

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Santa Cruz Unidade Escolar VII João de Oliveira Confessor

São Paulo Potengi Escola Municipal Professora Francisca Azevedo

Assú Escola Municipal Janduis I

Tabela 04: Municípios que foram contempladas com a implantação do Projeto Um Computador por Aluno no

Estado do Rio Grande do Norte e suas respectivas escolas.

Fonte: Secretaria de Educação à Distância da UFRN (SEDIS/UFRN) – Dados Projeto UCA. Disponível em:

http://www.sedis.ufrn.br/blog/uca/?page_id=24 Acesso em: Junho de 2012.

3.3.1 A Escola Estadual Maria Cristina e o projeto de formação do UCA

Entre as escolas contempladas, a Escola Estadual Maria Cristina foi eleita como lócus

empírico na presente pesquisa. A eleição desta escola se deu pela participação da pesquisadora

como tutora do Projeto UCA.

A escola localiza-se em um bairro periférico do município de Parnamirim – RN e atende

em média 300 alunos de diferentes graus de ensino, em faixas etárias que variam dos 10 aos

17 anos no ensino básico (Ensino Fundamental II e Ensino Médio) e alunos desnivelados com

idades entre 17 a 70 anos no Programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA). A escola

possui um total de 22 professores atuantes nos três turnos. No entanto, a presente pesquisa

tem como corpus empírico um grupo de 17 professores. Esses 17 professores têm mais de 30

anos de idade e possuem em média 10 a 20 anos de serviço público como educadores.

Segundo o Projeto Político Pedagógico (PPP) da instituição, constam 15 projetos sendo

desenvolvidos atualmente, entre o Projeto UCA. Os dados deste projeto apontam que foram

doados 480 laptops educacionais para a escola e 340 alunos beneficiados. O Projeto UCA está

inserido nos 03 níveis de ensino disponíveis na escola (Ensino Fundamental II, Ensino Médio

e EJA).

Em 2010, o Projeto UCA foi iniciado nessa escola. Neste ano, deu-se início a formação de

professores para uso pedagógico dos laptops educacionais, como também as práticas em sala

de aula, utilizando o laptop no modelo um para um (1:1), como suporte didático a conteúdos

curriculares.

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O primeiro conteúdo a ser apresentado aos docentes no curso de formação foi o módulo de

apropriação tecnológica. O conteúdo deste módulo foi desenvolvido junto aos docentes

durante quatro encontros. Nesses quatro encontros, foram ministrados conteúdos referentes à

apresentação do projeto, seus objetivos e a metodologia que iria ser aplicada nesses encontros

de formação. Além disso, foram trabalhados os conceitos de mídia e tecnologia e os

professores foram convidados a conhecer alguns recursos básicos do laptop, como: teclado,

mouse, tela, ícones, etc. Em outros encontros deste módulo, os formadores do UCA

ministraram conteúdos referentes ao sistema operacional Metasys Classmate, sobre o software

Kpresent, que dá possibilidade à construção de slides para apresentação, e sobre o KSepread,

software que possibilita a construção de planilhas eletrônicas e gráficos no laptop UCA.

A intenção curricular do Projeto UCA de trabalhar com o processo de apropriação

tecnológica permitiu que o conceito de apropriação fosse elevado à categoria estrutural no

entendimento das tipologias dos saberes requeridos aos docentes na aprendizagem para o uso

dos laptops na escola.

No caso da Escola Estadual Maria Cristina, os conteúdos que compõem os quatro

módulos foram transmitidos na formação de professores. As ações de formação iniciaram-se

ainda no ano de 2007, estendendo-se até o ano de 2012, com um total de 20 encontros entre

professores e gestores da instituição e a equipe de formadores do UCA.

Para a escola Maria Cristina, foram destinados três representantes do Núcleo de

Tecnologia Educacional do Estado, que atuaram como professores multiplicadores. Eles

executam a formação dos professores, gestores e demais funcionários da instituição que se

interessaram em participar do projeto. Uma vez que, segundo documentação da SEDIS

(2012), o objetivo do Projeto UCA é promover a inclusão digital não só de alunos, mas de

todo o contexto escolar e familiar deste aluno (SEDIS, 2012).

Esses três representantes do NTE que atuam na Escola Estadual Maria Cristina passaram

pela formação oferecida pela UFRN (IES Local), ou seja, são representantes capacitados para

repassar os conhecimentos contidos no plano de formação de professores.

Podemos acrescentar, ainda, que a efetivação da formação se deu em um contexto de

precariedade de infraestrutura tecnológica, mesmo sendo esse um pré-requisito para inserção

do UCA na escola. A realidade precária comprometeu o andamento dos objetivos do projeto,

gerando desafios ao saber-fazer dos professores, como a apropriação sociotécnica do uso da

tecnologia.

Além disso, de acordo com nossas observações e entrevistas, o escasso tempo para

formação, estudo, planejamento de aulas e a precária qualidade da internet na escola geraram

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desconforto no andamento do programa, influenciando na tomada de decisões e no processo

de apropriação tecnológica pelos professores. Estas dificuldades são pontos que desfavorecem

o uso didático do recurso e são mais significantes do que a insegurança gerada na introdução

dos novos saberes técnicos e pedagógicos requeridos para uso da tecnologia.

No entanto, mesmo no ambiente adverso à reflexividade dos docentes, mantivemos o

conceito de apropriação na análise de nossos dados como elemento que conduz à construção

de sentidos de pertencimento e de transformação do sujeito no percurso social, a partir do

entrelaçamento da prática docente com a cultura digital. Foi na premissa da apropriação

tecnológica em contexto educacional que retiramos as tipologias de saberes, a reflexividade e

as transformações das relações sociotécnicas dos professores.

Warschauer (2006) nos remete a apropriação significativa às TICs. Essa abrange muito

mais do que somente fornecer computadores ou demais recursos tecnológicos ligados à

internet. Ao contrário, existe um complexo conjunto de elementos que devem ser

considerados, como os relacionamentos físicos, digitais, humanos e sociais que surgem como

consequência da apropriação dos artefatos digitais. Assim, ao se apropriar significativamente

das novas tecnologias, “o conteúdo, a língua, o letramento, a educação e as estruturas

comunitárias e institucionais devem ser levados em consideração.” (WARSCHAUER, 2006,

p. 21).

Apesar do caráter conteudista da formação de professores, especialmente na efetivação do

módulo de apropriação tecnológica, os envolvidos apresentaram ganhos cognitivos de novos

saberes e mudanças de atitudes em seu meio social, especificamente no âmbito do uso dos

artefatos digitais na escola.

A escola finalizou as atividades contidas no plano de formação no ano de 2012. Ao

contrário do que apresenta o plano de formação do projeto, foi permitido à equipe de

formadores do Rio Grande do Norte estender o período de formação dos professores. Essa

prorrogação de prazo para conclusão da formação de professores não se deu apenas na Escola

Estadual Maria Cristina, mas também em mais duas outras escolas entre as dez beneficiadas

pelo UCA no Estado do RN.

3.3.2 Algumas considerações sobre o desenvolvimento do Projeto Um

Computador por Aluno na Escola Estadual Maria Cristina

Acreditamos que existem elementos no processo de formação de professores,

especialmente quando entra em jogo o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação,

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que devem ser considerados. A formação com vista apenas à capacitação técnica não supre

efetivamente a necessidade crítica reflexiva que o trabalho com as TICs requer. Nesse sentido,

entendemos que momentos de reflexividade, de aprendizagem colaborativa e de diálogos

sobre as vivências pedagógicas com o uso dos laptops em sala de aula são meios essenciais

para se chegar a uma compreensão crítica acerca do contexto tecnológico que a sociedade

transita na atualidade, ou seja, uma afetiva apropriação da cultura digital.

É preciso estar atento a essas atividades fundamentais durante a efetivação de qualquer

atividade que objetive formar educadores. Pensando a formação por esse ângulo, ao fazermos

a descrição do Projeto UCA, aliando isso às observações intensivas que realizamos na escola

analisada, identificamos algumas situações que julgamos necessárias de serem comentadas

nessa pesquisa.

O UCA, apesar de ser um grandioso projeto de inclusão digital, traz em seu âmago

fragilidades na infraestrutura e nas ações de formação docente. Sobre essas fragilidades,

discutimos, enfocando aspectos relacionados aos conteúdos, atividades e período de

efetivação dos módulos de formação e aspectos da infraestrutura do projeto na Escola

Estadual Maria Cristina, aspectos esses que influenciaram nas ações de formação do projeto.

3.3.3 Quanto aos conteúdos, atividades e módulo I (Apropriação Tecnológica)

Como vimos, a organização da formação docente no contexto do projeto UCA é realizada

de forma modular. São ao todo cinco módulos de conteúdos com objetivos delineados. O que

fica bastante evidente é que, no geral, a intenção curricular do Projeto UCA é trabalhar o

processo de apropriação tecnológica junto aos professores. Contudo, é interessante

evidenciarmos que o termo e a amplitude do conceito de “apropriação”, utilizado no plano de

formação docente, revela especialmente um caráter instrumental, um saber-fazer técnico, em

que mune o professor da técnica que subjaz cada um dos recursos digitais explorados no

laptop.

Na concepção que norteia o documento da formação UCA, a apropriação vista no módulo

inicial (módulo I) refere-se à aprendizagem de conteúdos (tecnológicos) ,separados de uma

intencionalidade didática pedagógica – salvo o conteúdo prescrito na temática II, Ferramentas

Educacionais e a sua aplicabilidade.

O conceito de “apropriação” que construímos nesta tese reporta-se a um aprendizado que

remete a incorporação, uso e interpretação dos objetos, neste caso, das mídias digitais em

geral, referendados nas práticas sociais. Assim sendo, a consequência dessa apropriação é a

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transformação das relações sociotécnicas do professor, estando presentes construções de

sentidos, de pertencimentos e desenvolvimento da subjetividade do educador.

Portanto, na análise que fazemos deste módulo de apropriação tecnológica, podemos

considerar uma diferença de abordagem quanto ao que ajuizamos acerca do processo de

apropriação, uma vez que a transitividade do sujeito e a modificação de suas relações com o

mundo não estão inscritas nos objetivos da formação no que tange a este módulo.

O tempo de duração do curso - e dos módulos especificamente - tem tempo determinado

para ocorrer. A formação, segundo dados do Projeto UCA, deve ocorrer em um ano, por via

de regra. Contudo, ainda existem escolas que extrapolam o período de um ano de formação. À

luz do conceito de Apropriação Tecnológica que defendemos, o período determinado para

efetivação da formação é insuficiente, tanto é que até no ano de 2013 apenas três das dez

escolas contempladas com o UCA conseguiram “finalizar” a formação. Alertando que,

finalizar, na visão do UCA, significa cumprir uma carga horária específica, diferente de

construir um sólida reflexão e saberes necessários para atuar com as TICs na escola.

Acreditamos que esse processo de formação e apropriação tecnológica das TICs demanda

um tempo considerável para serem refletidas e incorporadas ao dia-a-dia dos professores. E

esse tempo está intimamente ligado à necessidade de aquisição de saberes do professor, ao seu

ritmo de aprendizagem e à sua experiência de vida.

Em relação à estruturação dos conteúdos e atividades apresentadas no módulo de

apropriação tecnológica e no plano de formação em geral, observamos a construção de um

currículo (entendido aqui de forma ampla como toda e qualquer experiência de aprendizagens

planejadas e patrocinadas por uma instituição de ensino, a qual possui um conjunto de

conhecimentos a serem ministrados em determinado curso) desvinculado do contexto social e

cultural onde a práxis opera pela e nas interações entre os envolvidos no processo de

aprendizagem.

Embora o professor-multiplicador de cada escola beneficiada pelo UCA fizesse

modificações nas atividades, o currículo já se apresenta estruturado, com etapas e conteúdos

já definidos. Isso nos remonta a uma visão descontextualizada de currículo, uma construção

que não envolve a parceria de todos que fazem parte do contexto local. Sacristán (2000)

acrescenta que não se pode esquecer que o currículo supõe a concretização de fins sociais e

culturais e de socialização. Para tanto, ele deve ser uma construção coletiva, envolvendo os

atores de uma dada realidade escolar.

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3.3.4 Quanto à infraestrutura e o desenvolvimento das ações de formação

Como mencionado anteriormente, a implantação do UCA nas escolas públicas estava

condicionado a critérios de escolha e condições de infraestrura para receber o projeto. Não

obstante, as escolas que foram beneficiadas aqui no Estado do Rio Grande do Norte não

supriam totalmente os critérios para escolha, nem mesmo as condições físicas para bom

funcionamento das atividades.

Mesmo sem uma estrutura física adequada, o projeto UCA adentrou as escolas do RN.

Segundo Gomes (2011), “todas as escolas contempladas no Estado foram visitadas e a partir

destas visitas foram elaborados relatórios de sua configuração inicial. Nenhuma das escolas

possuía estrutura física adequada para início do projeto.” (GOMES, 2011, p.04). Este também

era o caso da instituição investigada, a Escola Estadual Maria Cristina, em Parnamirim - RN.

O atraso na organização física da escola para receber o projeto acabou influenciando no

andamento das atividades de formação.

Segundo o site do UCA, “as escolas deveriam possuir, obrigatoriamente, energia elétrica

para carregamento dos laptops e armários para armazenamento dos equipamentos.” (BRASIL,

UCA, 2012).

Apesar de ser constatada a falta de estrutura física, o projeto foi começado, inicialmente,

envolvendo apenas os representantes do NTE e NTM, com o apoio das Secretarias, sendo as

atividades efetivas apenas à distancia, por meio da plataforma e-proinfo. No final de 2011, os

professores já estavam levando os laptops para sala de aula para que os alunos tivessem

contato com a tecnologia, ao mesmo tempo em que estavam participando da formação.

Na Escola Estadual Maria Cristina, algumas partes da infraestrutura exigida só ficaram

prontas no final do ano de 2011. De acordo com o diário de campo, elaborado no dia 28 de

fevereiro de 2012, na oportunidade da observação do campo investigado, foi diagnosticado

que a escola recebeu, com apoio das Secretarias de Educação, novas cadeiras e mesas de

estudo, ar condicionado e pinturas no final do ano de 2011. Já os armários para hospedagem e

carregamento dos laptops em cada sala só ficaram prontos em janeiro de 2012.

Acrescentamos que toda essa estrutura foi adquirida também com empenho do NTE junto

às Secretarias de Educação. A estrutura da E. E. Maria Cristina extrapola as exigências do

Projeto UCA e, no final, o resultado foi satisfatório. Abaixo, seguem imagens que retratam a

estrutura das salas de aula depois da chegada do Projeto UCA.

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Figura 01: Escola Estadual Maria Cristina (Parnamirim - RN). Novas salas de aula para recepção do Projeto

UCA. Novas mesas e armários para carregamento dos laptops.

Fonte: Imagens registradas pela pesquisadora.

Contudo, no que se refere às condições necessárias para a efetivação das atividades de

formação docente, destacamos a precária conectividade wireless. O acesso simultâneo à

internet é um dos assuntos mais polêmicos nas escolas onde o projeto atende, inclusive na

Escola Estadual Maria Cristina.

A difícil conectividade simultânea à rede torna-se um problema, pois limita as

possibilidades de uso dos laptops educacionais. Atividades como a pesquisa e o acesso à

funcionalidade da Web 2.0 (como, por exemplo, a utilização e produção de vídeos on-line) são

exemplos de funcionalidades citadas pelos professores que ficam prejudicadas, por não haver

internet para todos simultaneamente.

A infraestrutura de conectividade wireless disponível, tanto na escola de Parnamirim - RN

como nas demais escolas do UCA – RN, é a chamada “internet social”, oferecida pela

empresa “Oi”, implantada por meio de um acordo de cooperação técnica entre MEC e

Secretaria de Educação, para atender às demandas do Projeto Um Computador por Aluno.

Contudo, a qualidade da internet oferecida não garante conectividade wireless de forma

satisfatória. A internet é de baixa qualidade, gerando problemas na formação e na execução de

aulas elaboradas pelos professores com uso dos laptops educacionais.

Outra condição necessária para o funcionamento da formação é o que fragilizou o

desenvolvimento da mesma na escola, referente à garantia de tempo para planejamento e

formação dos professores para serem inseridos os laptops no contexto de ensino.

A falta de tempo para formação e planejamento de aulas com uso dos laptops é uma

constante na escola analisada. Poucos são os momentos destinados aos estudos de apropriação

tecnológica e para elaboração de planos de ação em salas de aula. Na escola Maria Cristina,

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são reservados encontros mensais. A cada mês, é tido um encontro entre os professores-

multiplicadores e professores da instituição.

Esse seria mais um aspecto que interfere, de forma efetiva, no desempenho dos

professores em sua formação. Para ser estruturado e desenvolvido de forma eficaz o projeto

em que se faz uso de um novo aparato para ensinar, faz-se necessária a dedicação ao estudo,

não só sobre apropriação da tecnologia (Entendida aqui apenas como o conhecimento da

técnica que subjaz a tecnologia), mas também tempo e espaço para refletir, pesquisar, agir,

construir e reconstruir saberes e práticas. Além do que, os longos espaços entre um encontro

de formação e outro acabam influenciando na motivação dos professores para fazerem uso da

tecnologia. Os conhecimentos adquiridos, por não estarem sendo constantemente revisitados,

acabam se “perdendo”, ficando escassas as práticas com uso dos laptops em sala de aula.

Desse modo, o refletir sobre a ação fica prejudicado, uma vez que poucas ações pedagógicas

de uso do laptop são realizadas.

Considerando o exposto, entendemos que os espaços de formação devem ser ampliados.

Acreditamos que a formação do Projeto UCA não deve se restringir a um momento e a um

horário pré-determinado, como ocorre no modelo desenvolvido na escola investigada.

Entendemos que as discussões sobre a prática pedagógica, com o uso dos laptops, devem

ultrapassar os encontros mensais já determinados, migrando também para os demais espaços

de convivência entre os professores, por meio do diálogo critico e colaborativo sobre as ações

que estão sendo estabelecidas com o apoio do Projeto UCA.

Com relação a isso, Nóvoa (1992) evidencia que a formação docente é um processo

pessoal e singular, uma vez que ela não ocorre apenas em espaço e tempos específicos, mas é

um processo que abarca uma construção vital de si própria, onde a relação com os mais

variados polos de identificação desde professor é fundamental. Ele acrescenta que formar-se

supõe troca, experiência, interações sociais, aprendizagens, um sem fim de relações (NÓVOA,

1992, p. 115).

Com a necessidade de aprender sobre um novo recurso, a docência torna-se mais

complexa, uma vez que novos conhecimentos devem ser integrados ao seu saber-fazer. O

professor está, desse modo, “incorporando/integrando competências intelectuais, afetivas,

técnicas e éticas, que em outros tempos eram menos integradas e visíveis nos processos

formativo-profissionais dos sujeitos.” (FERREIRA, 2009, p. 88).

Ao passar o conflito cognitivo inicial, resultado da incorporação de um novo recurso da

prática pedagógica do professor e da necessidade de conhecer esse recurso para redimensionar

o seu saber-fazer docente, instaura-se um processo de apropriação do conhecimento.

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Corroboramos com Freire (1977) quando conclui que a “prática ganha uma significação nova

ao ser iluminada por uma teoria da qual o sujeito que atua se apropria lucidamente.”

(FREIRE, 1977, p. 41).

Portanto, inferimos que a formação oferecida pelo Projeto Um Computador por Aluno,

apesar das fragilidades encontradas (precária conectividade à rede, atraso na entrega da

infraestrutura e falta de tempo para formação e planejamento de atividades) e incorporando

uma nova forma de concepção de formação, tem o potencial de propiciar ao profissional da

educação um novo tipo de saber-fazer e a possibilidade de inovação de sua prática docente,

refletindo assim, no seu modo de ver e entender o seu entorno, este hoje midiatizado pelas

“novas tecnicidades”. (BARBERO, 2006).

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4 O CAMINHO TRILHADO: ASPECTOS METODOLÓGICOS

O ato da pesquisa, especialmente a pesquisa em educação, carrega em sua essência a

responsabilidade política e social. Para nós, além da sua natureza social e comprometimento

político, o processo de criação da investigação tem um valor subjetivo e individual. É por

meio da pesquisa que exercitamos nossa reflexividade, que questionamos e interpretamos o

que está posto, intervimos no mundo e, assim, apreendemos e aprendemos com esse.

É por meio dessa troca entre o mundo a ser investigado, traduzido em um objeto de

pesquisa, e nosso eu-pesquisador, que experimentamos “um modo de ser que nos permite, na

turbulência do tempo, encontrar uma direção para dizer ao mundo e a nós mesmos [...] o que

somos numa trajetória que não se percorre isolada de cada tempo.” (PIMENTA, p.11, 2006).

Deste modo, consideramos que no desenrolar da investigação, no desequilíbrio e nas

dúvidas que o próprio processo de construção da pesquisa gera é que adquirimos experiência

e elaboramos um poder ser pelo saber, pois a pesquisa está para constatar, para intervir, e

intervindo nos educamos, conhecemos e anunciamos a novidade (FREIRE, 1996).

Nessa direção, entendemos o trabalho de pesquisa como um processo dinâmico,

comprometido, crítico, reflexivo e autoformativo. Corroboramos com Bachelard (1996),

quando afirma que o homem movido pelo espírito científico deseja saber para, imediatamente,

melhor questionar.

Assim, o fato de estarmos, durante nossa imersão investigativa, questionando o mundo,

criando, recriando e descobrindo faz da pesquisa uma aliada na nossa formação como

educadores. A pesquisa se traduz desta forma, como ferramenta para reflexão contínua sobre

nossas ações.

Freire (1996) nos diz que o professor que assume a formação permanente tem como

momento fundamental o da reflexão crítica sobre a prática. Segundo o educador, “é pensando

criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática.”

(FREIRE, 1996, p. 39). Nesse sentido, podemos compreender que o processo de construção

do saber científico de traduz também em um instrumento de formação para o professor.

Sendo assim, estabelecemos uma relação de aprendizado e de nascimento do pesquisador.

Adquirimos, ao pesquisar, nosso projeto emancipatório, nosso poder critico sobre a sociedade

e não deixamos de incorporar, também, uma função política, pois a produção de

conhecimentos está estritamente ligada à transformação e aprimoramento de práticas diárias,

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portanto, a interesses sociais. A construção da ciência é um fenômeno social por excelência

(LUCKE, ANDRE, 2012).

Com essa proposição, tomamos como objeto para nossa investigação a formação do

professor, os saberes que dessa formação decorrem e as mudanças nas práticas sociais e

profissionais após a inserção dos mesmos no Projeto Um Computador por Aluno (MEC,

Brasil).

Assumimos, então, um desafio investigativo complexo, no qual a reflexão crítica dos

professores sobre sociedade, escola, saberes docentes e novas tecnologias permeiam nossas

discussões. Nesse sentido, a pesquisa abarca aspectos educacionais, sociais e políticos que se

entrelaçam na busca por respostas a nossas inquietações.

Considerando essa perspectiva, desenvolvemos nossa investigação adotando estratégias

metodológicas abertas a uma lógica complexa, na tentativa de abarcar o fenômeno social

investigado. É evidente para nós o caráter dinâmico do fenômeno estudado. Lucke e Andre

(2012) nos esclarecem afirmando que:

À medida que avançam os estudos da educação, mais evidente se torna seu caráter

de fluidez dinâmica, de mudança natural de todo ser vivo. E mais claramente se nota

a necessidade de desenvolvimento de métodos de pesquisa que atentem para esse

seu caráter dinâmico. (LUCKE, ANDRE, 2012, p. 5)

Compreendendo esse processo, preferimos definir nosso método de pesquisa no caminho,

no desenrolar da nossa investigação. A cada momento que entrávamos em contato com o

campo empírico, encontrávamos novos movimentos, novos contornos. Assim sendo, novas

reflexões eram feitas e ideias e ações eram desconstruídas e ressignificadas.

Deste modo, construímos uma trajetória investigativa flexível, tentando definir uma

metodologia adequada a um trabalho que deseja retratar os saberes e as novas práticas sociais

dos professores, por meio de uma experiência de formação para a incorporação das Novas

Tecnologias em sua profissão, percebendo as mudanças cognitivas, bem como das práticas

socais dos professores. Tentamos entender suas representações de mundo, a forma como

compreendem essas mudanças e o porquê delas ocorrerem.

Assim sendo, o fato de assumirmos um objeto dinâmico e complexo nos exigiu a

aplicação de diferentes instrumentos metodológicos durante a investigação. Nossas decisões

quanto aos métodos utilizados decorrem de um trabalho crítico reflexivo continuo, o qual

permeou nossa investigação incessantemente.

A busca por métodos eficazes para o tratamento da nossa pesquisa é resultado também de

um movimento próprio de produção de conhecimentos. Reestruturações de métodos e recortes

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de objetos investigados foram realizadas durante nosso trabalho. Buscávamos, por meio de

nossas angústias, um modelo que pudesse responder às necessidades de nosso campo

epistemológico.

Boa Ventura de Sousa Santos (2010), quando nos fala sobre a ecologia de saberes, nos

esclarece acerca das variadas formas de produção de conhecimento científico, nos situando

sobre uma relação dialética entre os múltiplos saberes, enfocando que a lógica da monocultura

do saber e do rigor científicos tem de ser confrontada com a identificação de outros saberes e

de outros critérios de rigor que se estabelecem nas práticas sociais. Essa afirmativa deve ser

considerada suficiente para que o saber em causa tenha legitimidade para participar de debates

epistemológicos com outros saberes.

Portanto, essa postura teórica de Santos (2010) com relação ao intercâmbio entre saberes

nos ampara em relação a um possível diálogo entre as metodologias de pesquisa que

estejamos adotando, bem como a novas formas de olharmos e de nos envolvermos com o

nosso campo epistêmico.

Todo o envolvimento com a pesquisa surge em decorrência de já estarmos inseridos no

campo epistêmico, por meio da oportunidade de participação da pesquisadora do trabalho

como tutora no Projeto Um Computador por Aluno (UCA), do Ministério da Educação. Desta

forma, estabelecemos contato com o plano de formação de professores para uso dos laptops

educacionais, além de participarmos de ações de formação que envolve o projeto nas escolas.

A necessidade de perceber o que permeia esse projeto fez imergir nosso objeto de estudo.

Nossa preocupação estava em analisar o todo, ou seja, o contexto em que ações do programa

se entrecruzam com as práticas diárias do professor em sala de aula e em sociedade. Isso nos

favorecia, pois não estávamos lançando nosso olhar de forma fragmentada, mas sim

contextualizada e globalizada, pois, como afirma Morin (2010), todos os problemas

particulares só podem ser posicionados e pensados corretamente em seus contextos, e o

próprio contexto desses problemas deve ser posicionado, cada vez mais, no contexto

planetário. (MORIN, 2010, p.14).

Do contato direto com os professores nas escolas, especialmente na escola alvo de nossa

pesquisa (Escola Estadual Maria Cristina, em Parnamirim – RN), suscitaram nossos primeiros

questionamentos. As interrogações sobre o possível delineamento da pesquisa e as dúvidas

sobre nosso tipo de envolvimento com o campo de investigação faziam parte da nossa

caminhada, a qual entendemos como uma fase exploratória da pesquisa.

Foi nesta fase exploratória, nos primeiros meses de contato com os atores escolares que

faziam parte do Projeto UCA que foi possível analisar, refletir e começar a delinear nosso

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objetivo e métodos de pesquisa. Tínhamos em mente que nosso estudo iria imergir do contato

que estava sendo estabelecido, por meio do ambiente natural do fenômeno investigado.

Considerando o exposto, compreendemos que esse período exploratório foi decisivo para

o entendimento, a incorporação e o delineamento do nosso objeto. Como afirmam Bogdan e

Bicken (1994), as ações que compõem a investigação podem ser mais bem compreendidas

quando são observadas no seu ambiente habitual de ocorrência, uma vez que as ações

humanas estão significativamente influenciadas pelo contexto em que ocorrem.

Deste modo, percebemos que para entender o objetivo que estabelecemos para nosso

estudo, ou seja, os possíveis saberes construídos e/ou transformados pela formação UCA e as

mudanças nas práticas sociais dos professores, teríamos que conhecer as consequências desta

formação, não de forma fracionada e afastada da complexidade que envolve o objeto

estudado, mas sim na concretude desta prática de formação, por meio de situações cotidianas

que nos tornasse visível a realidade experienciada por esses professores.

Nesse sentido, Bogdan e Bicken (1994) fortalecem nosso posicionamento ao afirmarem

que é por meio do estudo e da compreensão da realidade investigada, sobretudo, quando

próximo da dinâmica complexa que envolve as ações cotidianas, que iremos apreender o

modo como diferentes pessoas dão sentido a suas ações. Destarte, o que nos importa é estudar

e conhecer como os professores, sujeitos de nossa pesquisa, experimentam as novas

tecnologias, representadas pelo laptop educacional do UCA, além do modo como eles

interpretam e estruturam as suas experiências permeadas pelo universo digital.

A compreensão e as preocupações expostas, aliadas a outras intrínsecas da própria

pesquisa educacional, nos levou a escolher uma abordagem qualitativa para conduzir/teorizar

nosso estudo.

Assim sendo, na nossa perspectiva qualitativa de pesquisa, buscamos conhecer e descrever

o plano de formação do Projeto UCA e como este foi aplicado junto aos professores,

associando as consequências dessa formação a uma possível mudança da prática social desses

docentes. Com isso, a pesquisa a qual nos referimos surge não apenas com o objetivo de

responder ao nosso questionamento central, mas também de fazer dessa investigação uma

experiência, pois acreditamos que:

É justamente a experiência que nos permite a reflexão crítica. Isto ocorre porque ela

não é nem pensamento e nem ação, mas a possibilidade de pensar duplamente sobre

nossas formas de agir e instituir as práticas que nos constituem. (PIMENTA, 2006,

p. 11)

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Em nosso caso, em especial, a experiência adquirida na e pela pesquisa assume duas

vertentes. Ao mesmo tempo em que nos inserimos no nosso campo epistêmico para

descortinar os objetivos do nosso estudo, nos colocamos também nesse campo como

integrante da equipe UCA. Nossa função no projeto é contribuir na formação de “professores-

multiplicadores”, que irão atuar como formadores dos professores nas escolas de rede pública.

Assim sendo, o olhar que lançamos para nosso objeto necessitou de um exercício contínuo

de distanciamento entre a pesquisadora e a integrante da equipe UCA. Apesar do exercício de

se distanciar, refletir e objetivar o objeto da investigação, inerente ao campo das pesquisas

qualitativas, é importante lembrar, como nos alerta Ludke e André (2012), que, como

atividade humana e social, a pesquisa carrega intrinsecamente a carga de valores,

preferências, interesses e princípios que orientam as ações do pesquisador.

Nesse sentido, compreendemos que, ao teorizar nosso objeto de investigação, estamos

analisando-o à luz de nossa subjetividade. Esse é o ganho epistemológico que alcançamos ao

desenvolver nosso estudo de forma qualitativa, ao invés de tratar objetividade e subjetividade

de forma dicotômica: estabelecemos um pensar junto, uma relação de complementaridade, ou

seja, a subjetividade “permite alcançar a objetividade. É a subjetividade que vai permitir graus

diferentes de objetividade”. O que significa que a “subjetividade, nesta abordagem, não é

evitada, mas desejada, pois tudo o que é objetivo foi antes subjetivo.” (ALMEIDA, 2004, p.

03).

A lógica que envolvia nosso processo de inserção, de tratamento e de diálogo com nosso

campo empírico nos aproximava cada vez mais de uma pesquisa etnográfica, pois a

investigação estava sendo feita de dentro, vivida junto aos sujeitos. A etnografia é uma

decorrência dessa construção epistemológica que estava se delineando.

Contudo, escrevemos nossa pesquisa de cunho etnográfico como um modelo de

investigação em educação. Nesse sentido, nos ancoramos em Álvarez (2008), a qual nos

coloca que a pesquisa etnográfica corresponde a uma modalidade alternativa de investigação

em educação, sendo uma perspectiva teórico-metodológica que tem apontado modelos para

compreender a dinâmica escolar e explorado as perspectivas, estratégias e culturas de

professores e alunos.

A autora acrescenta que a teoria etnográfica aplicada à educação refere-se tanto a um

método concreto como a um conjunto de métodos e que:

As etnografias não devem ficar exclusivamente em sua dimensão descritiva,

mas, como modalidade de investigação educativa que são, devem contribuir

também a sugerir alternativas, teóricas e práticas, que envolvam uma

investigação pedagógica melhor (tradução nossa). (ALVAREZ, 2008, p.01)

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Assumimos, deste modo, a etnografia como um conjunto de métodos a serem

desenvolvidos (ALVAREZ, 2008), e não como um padrão, como um método concreto. André

(1995), ao discutir as contribuições dos estudos do tipo etnográfico voltados para o cotidiano

escolar, nos esclarece afirmando que o que se tem feito é uma adaptação da etnografia à

educação. A autora expõe que o que se tem realizado são estudos do tipo etnográfico, e não

etnografia no seu sentido estrito.

Valemos-nos, portanto, da pesquisa etnográfica como base das estratégias de investigação

que deram respostas às nossas necessidades metodológicas. Não obstante, é importante

salientar que durante nosso percurso nos distanciamos desta base teórica, em um caminho

experiencial, com o intuito de suprir as demais necessidades metodológicas, de forma

dialógica, flexível e aberta.

Com a ajuda de Chizzotti (2011) e André (1995), elencamos aspectos da abordagem de

pesquisa etnográfica importantes para o delineamento da nossa investigação. Entre eles,

evidenciamos o trabalho de campo, base da pesquisa etnográfica. Dentro da investigação do

tipo etnográfica, o pesquisador aproxima-se das pessoas, das situações e dos locais em que os

sujeitos da pesquisa se encontram, mantendo um contato direto e prolongado.

Essa premissa foi fundamental no referido estudo. Ao longo de quase um ano,

estabelecemos contato direto com a escola e com os professores investigados, além dos

demais atores escolares e eventuais encontros de formação que a escola estabeleceu para

estudo dos docentes. Observamos, conversamos e colaboramos técnico e pedagogicamente

nas práticas com uso dos laptops educacionais, de maneira formal e informal também, na

tentativa de sermos bem aceitos no grupo e de nos familiarizarmos com o universo novo que

se apresentava.

Na medida em que estávamos tentando ser bem quistos no campo estudado, buscando

participar dele como um membro natural e assim, sendo um a mais na comunidade,

buscávamos por em prática nossa intuição, reflexividade e afinidade com os professores

investigados, como nos alerta Alvarez (2008):

(...) por ser mais um na comunidade estudada, são fundamentais três qualidades:

intuição, reflexão e empatia. O etnógrafo, em sua viagem, tem uma bússola que lhe

ajuda a se localizar: em alguns momentos, a intuição o leva a surgirem umas

hipóteses, e em outras ocasiões, a reflexão o leva a questionar se estas ou a construir

outras, e outras vezes, os afetos o permitem idealizar novas tentativas de explicação

(tradução nossa). (ALVAREZ, 2008, p. 05)

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A cada afastamento que precedia um novo encontro com o grupo estudado, refletíamos

acerca das ações e diálogos presenciados, além de pensarmos em novas estratégias de

observação.

Outro aspecto relevante da pesquisa etnográfica para nosso estudo, o qual vai de encontro

ao próprio processo de trabalho de campo, é o papel do pesquisador. Na investigação do tipo

etnográfica, o pesquisador permanece em campo envolvido, durante um período durável, na

vida cotidiana dos membros do campo epistêmico. Ele tem um papel fundamental no processo

da investigação, é o instrumento principal na coleta e na análise dos dados (ANDRÉ, 1995, p.

28).

Ao conquistar um contato próximo com os professores, estamos alcançando um

conhecimento amplo sobre o grupo. Apreendemos sobre como os docentes entendem o

Projeto Um Computador por Aluno e a forma com que utilizam os laptops educacionais.

Desta maneira, somos nós, pesquisadores, que no dia-a-dia da pesquisa estamos colhendo

significados contextualizados sobre o objeto de estudo. Respondemos ativamente as situações

que se apresentam, alterando instrumentos de coleta, modificando questões e ressignificando

nossa metodologia durante o desenvolvimento do estudo.

Como vemos, o que importa durante a realização de uma pesquisa do tipo etnográfica é o

processo, e esse é mais um aspecto da abordagem com o qual nos identificamos. Para nós, o

que estava em jogo na referida investigação era o desenrolar da trama que nos apresentava a

cada dia. Nossas indagações durante o período em que estivemos em campo colhendo os

dados foram de fundamental importância para as decisões metodológicas adotadas no

percurso.

Outra característica da etnografia levantada por Chizzotti (2011) e André (1995) é acerca

dos instrumentos de coleta dos dados. Segundo os autores, as técnicas que tradicionalmente

estão vinculadas à pesquisa etnográfica são a observação participante, a entrevista intensiva e

a análise de documentos. Tais instrumentos metodológicos estiveram presentes em nossa

pesquisa. Valemos-nos da análise de documentos oficiais do Ministério da Educação (MEC),

referentes ao plano de formação do Projeto Um Computador por Aluno (UCA), com o intuito

de identificar aspectos da formação para uso dos laptops pensada para os professores das

escolas públicas de ensino básico, tentando relacionar os aspectos desta formação com o que

estava realmente sendo efetivado a nível local, especialmente na Escola Estadual Maria

Cristina, em Parnamirim - RN, nosso campo de investigação.

Além da análise documental, fizemos uso da observação participante, com foco na

dinâmica da formação e da prática com uso do laptop educacional em sala de aula, tentando

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entender o ponto de vista dos sujeitos investigados, ou seja, a forma como os professores

compreendem e atribuem significados às práticas com as Novas Tecnologias, buscando extrair

dessa experiência saberes docentes construídos e/ou reconstruídos pela formação e uso

didático dos laptops do Projeto UCA.

As entrevistas, que precederam o período de observações, também estiveram presentes no

referido estudo com o intuito de compreender a opinião dos professores de forma mais

aprofundada, considerado a subjetividade do sujeito investigado quanto à temática abordada

na pesquisa.

Além de nos ancorarmos na metodologia da pesquisa etnográfica, recorremos a outros

métodos de coleta de dados. Um deles foi a aplicação de questionário, além da realização de

grupo focal. O emprego dessas técnicas não vão de encontro ao que tradicionalmente é

utilizado no âmbito dos estudos etnográficos.

Com isso, efetivamos na referida pesquisa intervenções que foram se (res)significando e

se (re)construindo com a própria dinâmica do estudo, em busca de responder aos nossos

objetivos da forma mais fidedigna possível. Sendo assim, nossa preocupação não estava em

legitimar um método de pesquisa, pois, corroborando com Gonzaga (2011), descobrimos que

não há receita para a eficácia de uma boa construção científica, mas sim determinação e

diálogos com as teorias, relacionado-as a uma prática contínua de reflexão.

Além de nossa investigação estar estruturada de acordo com uma pesquisa de cunho

etnográfico, nos ancoramos também em conceitos advindos da etnometodologia, com o

intuito de fundamentar conceitualmente nossas ações e formas de pensar o campo epistêmico.

Da etnometodologia tomamos empréstimo o conceito de indicialidade, a fim de nos nortear

sobre a maneira como compreendemos os significados de palavras e expressões de nossos

sujeitos, pois as ações e os diálogos dos mesmos só ganham sentido quando colocadas em seu

contexto de produção.

Sobre isso, Coulon (1995) acrescenta que podemos definir a indicialidade como todas as

determinações que estão relacionadas a uma palavra, a uma situação. Isso significa que,

embora uma palavra tenha uma:

Significação transituacional, tem igualmente um significado distinto em toda

situação particular em que é usada. Sua compreensão profunda passa por

características indicativas e exige dos indivíduos que vão além da informação que

lhes é dada. (COULON, 1995, p. 33)

Partindo dessa proposição e do reconhecimento do caráter inicial na pesquisa, nossa

preocupação estava em encontrar meios de verificar in loco a significação de diálogos e ações

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manifestados pelos professores. Isso justifica a necessidade do nosso período de permanência

em campo, interagindo e socializando com os sujeitos da pesquisa, buscando entender o

significado da linguagem cotidiana dos docentes no próprio contexto em que surgem. Assim

sendo, entendemos que a indicialidade denota que o sentido das ações e da linguagem é

sempre local e peculiar de cada lugar e tempo.

Além da característica da indicialidade que configura a etnometodologia, nos servimos da

descrição do meio cultural. Esse princípio da etnometodolgia também é comum na pesquisa

do tipo etnográfica, tendo em vista que ambas as teorias metodológicas permitem explorar a

pesquisa qualitativa. Coulon (1995), discorrendo a respeito da característica da descrição,

atesta que a mesma tem como objetivo “mostrar os meios utilizados pelos membros para

organizar a vida social em comum; a primeira tarefa de uma estratégia de pesquisa

etnometodológica é descrever o que fazem os membros.” (COULON, 1995, p.111).

Nesse sentido, a descrição de um meio cultural inclui as práticas e os comportamentos dos

sujeitos investigados, buscando revelar comportamentos e significados a partir das interações

sociais entre os membros do grupo estudado.

Nesse delineamento metodológico, adquirido na própria trajetória do referido estudo,

buscamos deixar para trás um formalismo metodológico e empreender nossa independência

em relação a isso, tendo a abordagem qualitativa em destaque e tomando empréstimos de

métodos/conceitos das pesquisas etnográfica e etnometodológica, a fim de nortear nosso olhar

e nossas ações frente ao campo empírico à procura de repostas aos objetivos da investigação.

Para nos respaldar quanto a esse fazer metodológico-independente recorremos a Mills

(2009), quando esse discorre sobre a ideia de “artesanato intelectual”, o qual vê o cientista

social como um artesão que detém um ofício intelectual e precisa eleger um caminho para se

chegar a algum ponto. Nesse sentido, o autor explica que no trabalho do artesão intelectual

não haveria fórmulas, leis e receitas, e sim méthodos (sentido grego da palavra), ou seja,

caminho, rota, via para se chegar a um destino. Para o autor, o artesão intelectual deve estar

“atento para combinações não-previstas de elementos, evitando normas de procedimentos

rígidas que levem a um fetichismo do método e da técnica.” (MILLS, 2009, p. 15).

Portanto, é como artesão intelectual que nos sentimos ao construir nosso próprio método

em busca de compreender os significados imbuídos no contexto escolar, especialmente no que

tangem aos professores e a sua relação com as novas tecnologias, travestidas pela inserção do

Projeto Um Computador por Aluno na escola.

Enfatizamos que, com esse estudo, pretende-se revelar o significado que a formação UCA

teve para os docentes, com vistas ao novo (ou não) professor cidadão que surgirá a partir desta

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experiência. De modo específico, tentamos identificar transformações nas práticas sociais e

nos saberes que são mobilizados para ensinar com as Novas Tecnologias, respeitando a

individualidade de apropriação tecnológica de cada ator que compõe o estudo.

Com base no exposto, estaremos, agora, contemplando o lócus da nossa investigação: o

campo pesquisado, os sujeitos, o contexto que permeia nosso objeto (neste caso, o Projeto Um

Computador por Aluno), desenhando as estratégias metodológicas adotadas, as quais foram

organizadas em etapas.

4.1 O desenho das estratégias metodológicas da pesquisa: A fase exploratória e

a (re)descoberta do problema da pesquisa

A fase de exploração do campo pesquisado é fundamental na pesquisa etnográfica. É neste

momento que podemos construir nossos primeiros questionamentos e reflexões sobre a

temática estudada. Em nosso caso, especialmente, foi por meio desse período inicial de

inserção na Escola Estadual Maria Cristina, beneficiada pelo Projeto Um Computador por

Aluno, que selecionamos e (re)definimos o nosso objeto de pesquisa. Ludke e André (2012) já

afirmavam que, na abordagem etnográfica, o problema da pesquisa é redescoberto no campo,

sendo necessário o “mergulho” na situação, havendo então, a partir disso, o aprimoramento

inicial da pesquisa. Foi nesse sentido que o problema de pesquisa surgiu para nós.

O período gasto explorando o ambiente e o contexto da pesquisa coincidiram com o

momento de entrada no Projeto UCA, como tutora da formação dos professores

multiplicadores. Por meio dessa função no projeto, foi possível o contato com os atores

escolares, sendo esse momento a primeira etapa da pesquisa. Foi então que houve a

negociação da entrada na instituição, também como pesquisadora, e isso foi imprescindível

para a entrada no campo de investigação.

Nessa ocasião, foram apresentados os objetivos de estudo à gestão da escola. Consentida a

permissão para transitar na instituição, deu-se o encontro com os professores, profissionais de

interesse para o estudo. Assim sendo, na presença dos professores, foram expostas a

investigação e o caminho a ser adotado para responder às questões de estudo, tendo a

aceitação dos docentes e, só a partir de então, dando inicio à pesquisa.

No inicio do processo havia algumas ideias em mente, com proposições acerca do

universo que se apresentava. Contudo, nos primeiros contatos e à medida que eram

conhecidos os professores e suas expectativas, o envolvimento e as aprendizagens com a

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formação UCA, foi possível refinar as conjecturas, refletindo sobre os caminhos que a

dinâmica institucional revelava.

Com ajuda também de leituras sobre trabalhos relacionados, de documentos oficiais do

projeto e de alguns outros documentos contendo dados da instituição analisada, inferimos que

identificar saberes docentes construídos/transformados a partir de conhecimentos gerados pelo

contato com o projeto e novas tecnologias seria um diferencial.

Na etapa exploratória o objeto de pesquisa já estava delineado, mas sempre sabendo da

possibilidade de ressignificação dele. Entendendo que mudar a rota da investigação durante o

processo é uma estratégia comum ao tipo de pesquisa proposto, no próprio caminhar da

investigação, foi vista a necessidade de ampliar-se o estudo com vistas também a identificar

mudanças nas práticas sociais e profissionais dos professores. Tais mudanças seriam, portanto,

consequências dos próprios saberes construídos/transformados pelos sujeitos no decorrer da

formação e uso pedagógico dos laptops.

Depois de conseguido convivência com os professores e a instituição no geral e o

delineamento da pesquisa, deu-se, então, a caminhada, que ainda seria longa e cheia de

surpresas, em busca de métodos que auxiliassem no desenrolar desta trama.

4.1.1 Análise documental e aplicação de questionário: Professor e sua relação

com o universo da informática

Para descrever o capitulo II acerca do Projeto Um Computador por Aluno e sua formação

de professores, foi feita uma análise de documentos oficiais do Ministério da Educação e

Cultura (MEC), referentes ao UCA. Essa foi a primeira atividade de pesquisa em busca de

angariar dados sobre como ocorreu a implantação do projeto em diversos Estados do Brasil,

especialmente no Estado do Rio Grande do Norte.

Portanto, foram analisados documentos referentes ao plano de formação de professores,

denominado “Formação Brasil: Projeto, planejamento das ações/curso”, do ano de 2009,

elaborado pelo MEC. Esse é o documento norteador de ações de formação dos professores nas

escolas beneficiadas pelo UCA. Além disso, foram analisados documentos digitais presentes

no site do UCA, referentes aos módulos de formação que compunham a estrutura curricular

do curso de formação oferecido pelos professores-multiplicadores aos profissionais que fazem

parte das escolas.

Os documentos elegidos para serem analisados foram essenciais para adquirir

conhecimento estrutural e funcional acerca da formação desenvolvida pelo Projeto UCA. Eles

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95

nos apontaram a “perspectiva oficial” do programa, bem como as variadas maneiras que o

programa pode ser comunicado (BOGDAN e BIKLEN, 1994).

Assim sendo, para chegarmos ao objetivo da análise dos documentos referidos e, portanto,

aos dados que nos interessam, foi realizado, como orientam Laville e Dionne (1999), uma

triagem sobre os conteúdos que compunham os documentos, extraindo apenas o que

interessava à investigação. Foi adotada uma perspectiva critica de análise, julgando suas

qualidades em função das necessidades da pesquisa.

Para a dinâmica da análise documental, nos ancoramos em Laville e Dionne (1999), os

quais afirmam que a coleta da informação “resume-se em reunir os documentos, em descrever

ou transcrever eventualmente seu conteúdo e talvez em efetuar uma primeira ordenação das

informações, para selecionar aquelas que aprecem pertinentes.” (LAVILLE; DIONNE, p. 168,

199). Portanto, foi com base nessa concepção de análise que foram extraídos os dados

necessários ao entendimento das funcionalidades da formação de professores UCA.

Ao final desta etapa, partimos para nossa inserção em campo. Observamos que a formação

de professores inseridos no Projeto Um Computador por Aluno havia iniciado há poucos dias

e que estavam dando andamento ao primeiro módulo da formação, o de apropriação

tecnológica. Nesse módulo, os professores conheceram os recursos presentes no laptop,

instrumentalizando os docentes para o uso do equipamento.

Nesta oportunidade, houve a aplicação do questionário com o intuito de conhecer os

professores investigados e como eles estavam inseridos no universo digital.

As questões abordadas, as quais prezavam pela uniformização das perguntas, referiam-se

à experiência desses professores com o universo da informática. Deste modo, a preocupação

estava em que cada professor compreendesse as questões formuladas da mesma maneira, na

mesma ordem e acompanhadas das mesmas opções de repostas, uma vez que facilitaria a

compilação das respostas escolhidas em um aparelho estatístico no momento da análise

(LAVILLE; DIONNE, 1999).

O questionário refletia aspectos sobre domínio de conhecimentos sobre informática. Nesse

sentido, aspectos como domínio de editores de textos, planilhas eletrônicas, criadores de

apresentações, Google e outras ferramentas de busca, e-mail, redes sociais e videocast foram

as ferramentas citadas no questionário para verificar-se a relação dos professores com elas.

Esquematizou-se o resultado com base em dois gráficos: o primeiro relaciona os níveis

gerais de conhecimento em ferramentas X professor; o segundo refere-se ao nível de

conhecimento específico X ferramentas. Seguem os gráficos sistematizados abaixo:

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96

Gráfico 01: Domínio de conhecimento geral dos professores sobre ferramentas da informática.

Fonte: Elaborado pela pesquisadora.

Gráfico 02: Nível de conhecimento de específico, ou seja, de cada professor sobre as ferramentas indicadas no

questionário. Fonte: Elaborado pela pesquisadora.

Para podermos ajuizar sobre os gráficos apresentados, foi estipulado que o conhecimento

de cada ferramenta é avaliado em cinco níveis: 1 - Nenhum conhecimento; 2 - Pouco

conhecimento; 3 - Conhecimento mediano; 4 - Conhece bem e 5 - Especialista.

Como são sete tipos de ferramentas, o máximo seria 35 e o mínimo 7. A média geral foi

20,53, o que gera uma média de 2,93 para cada ferramenta, significando que, em média, os

professores entrevistados possuem um conhecimento mediano inferior (foi considerado que

mediano seria a média 3, como classificado acima: 3 = mediano). Se considerarmos as

ferramentas individualmente, notamos que a média das ferramentas - Editor de Texto, Buscas

na Internet e E-mail - mostram que os professores, em média, têm conhecimento mediano

superior com elas, atingindo respectivamente 3,18; 3,47 e 3,29 de média. Interessante notar

que os professores mostraram-se mais conhecedores de ferramentas como Redes Socais,

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Buscas na Internet e E-mail do que editores de texto, que é uma ferramenta que antecede o

surgimento da internet. Logo seguido dos editores vem o uso das redes sociais, com 2,94 de

média geral.

Com isso, podemos inferir que grande parte dos docentes investigados possui domínio

considerado mediano acerca das ferramentas da informática.

Como mencionamos anteriormente, o questionário realizado com uma amostra de 17

docentes possibilitou o conhecimento dos sujeitos de pesquisa - saber quem são eles e sua

familiaridade com a ambiência digital. Essa estratégia, a qual foge dos instrumentos utilizados

tradicionalmente da pesquisa do tipo etnográfica, oportunizou a realização de um panorama

de como estava a relação do professor, tanto profissionalmente como em sua prática social

cotidiana, a respeito de sua relação com os mais variados meios tecnológicos.

4.1.2 O grupo focal e as trajetórias dos professores

O grupo focal foi a estratégia utilizada logo após a aplicação dos questionários. Sabendo-

se, portanto, sobre a relação do professorado com a tecnologia em seu cotidiano e também em

contexto de sala de aula, era necessário ampliar o entendimento dessa relação. Pensou-se no

grupo focal como estratégia metodológica para ser entendido o significado que as novas

tecnologias tinham na vida do professor, identificando com mais profundidade como se

estabelecia essa relação, bem como compreendendo a relação da construção da carreira de

professor e o papel que as novas tecnologias tiveram nesse processo.

Perpassando esse universo de construção da carreira docente e sua relação com o uso das

tecnologias, objetivou-se também reconhecer o papel da formação dos professores, promovida

pelo Projeto UCA, para uso dos laptops educacionais. Assim sendo, o intuito era coletar os

dados reunindo o grupo de sujeitos em uma situação de interação mais próxima da vida

cotidiana.

Ao reuni-los na própria sala dos professores, foi estabelecido um diálogo sobre temas

como: a escolha da profissão, o porquê de se tornar professor, contribuições da Universidade

para a docência, familiarização com artefatos tecnológicos e contribuições da formação UCA

para o dia-a-dia em sala de aula com o uso dos laptops educacionais.

Desta maneira, o grupo focal foi uma estratégia adotada para:

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98

Conseguir, pela introspecção de diferentes sujeitos, informações sobre a vida diária e

como cada indivíduo é influenciado por outros em situação de grupo e de que

maneira ele próprio influencia o grupo de indivíduos selecionados pelos

investigadores, tendo em vista um tópico de pesquisa. A finalidade principal desta

modalidade de pesquisa é extrair das atitudes e respostas dos participantes de grupo,

sentimentos, opiniões e reações que resultariam em um novo conhecimento.

(GOMES, 2005, p. 279)

Vislumbramos a técnica de grupo focal como instrumento de investigação, pois

consideramos o método eficaz para apreensão da realidade, levando em consideração as vozes

do universo pesquisado. Deste modo, foram obtidas “perspectivas diferentes sobre uma

mesma questão, permitindo também a compreensão de ideias partilhadas por pessoas no dia-

a-dia e dos modos pelos quais os indivíduos são influenciados pelos outros.” (GATTI, 2005,

p. 11).

Algumas razões levaram a decidir pela utilização desta estratégia metodológica junto aos

docentes inseridos no Projeto Um Computador por Aluno. Um dos fatores foi o fato de que os

professores, como participantes ativos do projeto, poderiam fornecer informações mais

esclarecedoras sobre o processo de desenvolvimento do plano de formação UCA e, assim,

contribuir para um melhor entendimento do processo, dialogando e refletindo junto aos seus

pares.

Outra razão para ser utilizado o grupo focal como método de pesquisa seria pelo fato de

compreendermos que o mesmo possui dois propósitos - o de se constituir como o instrumento

de coleta de dados, bem como o de haver um objetivo pedagógico, ou seja, o de estar

relacionado ao fato de entendermos que essa técnica também poderia ser utilizada com o

propósito de contribuir para a ressignificação da identidade do professor.

Nesse sentido, por meio das narrativas compartilhadas acerca de experiências, de

revelações, de angústias, dificuldades e sucessos ali colocados, foi possível proporcionar um

momento rico de reflexão. Essa inferência vem a ser ratificada por Domingues (2006), quando

expõe sobre grupos dialogais, cuja conceptualização e aplicação da técnica se assemelham

muito ao grupo focal. A mesma declara que a técnica promove o exercício da reflexão

coletiva, causando uma corresponsabilização dos professores pela melhoria da prática, tendo

em vista as necessidades docentes e uma profissionalidade desejada pela categoria.

O fato de estarmos dividindo vivências fez do nosso grupo focal um meio para que os

professores ali se conhecessem em profundidade, consolidando opiniões e pensamentos em

relação à reconstrução do fazer docente. Assim, compreendemos que os discursos

pronunciados foram motivadores para um possível refazer da prática pedagógica do professor.

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99

É importante deixar claro que foram efetivados dois grupos focais. Havia uma amostra

inicial de 17 docentes, distribuídos em três turnos de atividades. Sendo assim, foi possível

dividir essa amostra em dois subgrupos de professores. Obtivemos, desta forma, dois grupos

heterogêneos e distintos um do outro. Cada grupo focal realizado seguiu uma dinâmica de

exposição de temas, embora os mesmos estivessem inseridos em um roteiro de

questionamentos comum para os dois grupos. Flick (2009) expõe que fatos como esse são

comuns na condução deste método. Ele afirma que durante a interpretação dos dados, muitas

vezes podemos encontrar problemas devido a essa diferença nas dinâmicas dos grupos.

Apesar das dificuldades na aplicação do método referentes à difícil conciliação

operacional envolvendo espaço e tempo, à incorporação no grupo focal e às discussões que

não faziam parte de nossos objetivos – como reclamações sobre más condições de trabalho do

professorado –, foi possível identificar aspectos comuns nas discussões, especialmente no

momento em que se discutia o funcionamento do Projeto UCA na escola e os encontros de

formação de professores. Dentro desse recorte tido como polêmico, no desenrolar dos grupos

focais, muitas questões e posicionamentos foram debatidos, os quais foram reproduzidos nas

próximas seções da presente tese.

4.1.3 Observando o espaço de compartilhamento da tecnologia

A realização do grupo focal nos instigou ainda mais a procurar entender a fundo de que

maneira os professores incorporavam as novas tecnologias em seu cotidiano profissional. A

observação do contexto geral de trabalho e dos professores em sala de aula foi o método que

enxergamos ser mais significativo naquele momento para estar revelando as atitudes dos

professores frente ao uso dos laptops educacionais.

Buscava-se, com apoio da técnica da observação, atender às especificidades do objeto

referente aos saberes docentes e às transformações em suas práticas sociais, advindas da

inserção do UCA, além da dinâmica complexa o que o envolvia. Portanto, julgou-se que o

próprio lócus da investigação exigia uma atitude observacional participativa para a

compreensão do grupo-sujeito, pois como nos apresentam Laville e Dionne (1999):

A observação revela-se certamente nosso privilegiado modo de contato com o real: é

observando que nos situamos, orientamos nossos deslocamentos, reconhecemos as

pessoas, emitimos juízos sobre elas. Sem alongar inutilmente essa lista,

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100

convenhamos que, em nossas atividades quotidianas, não há quase exemplos que

não deixem espaço à observação. (LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 176)

Assim sendo, ao elegermos a observação do tipo participante, estaria sendo construído um

contato real e significativo com o objeto da pesquisa, pois se trata de um estudo de campo que

ultrapassa a exploração reflexiva do ambiente investigado. A nossa participação entra em jogo

no intuito de promover os objetivos da pesquisa, uma vez que “ser-se investigador significa

interiorizar-se, á medida que se recolhem os dados no contexto, assim conforme se vai

investigando, participa-se com os sujeitos de diversas formas.” (BOGDAN e BIKLEN, 1994,

p. 128).

Nesse sentido, com o intuito de principiar o processo de observação, foi adotada uma

postura de integração com os sujeitos da investigação, postura essa iniciada sem objetivos

definidos, na fase de exploração da pesquisa. Logo após de realizado o grupo focal, foi feito

um distanciamento do campo de investigação por um determinado período, para interpretação

e análise dos dados obtidos com a aplicação do método, retornando, depois de alguns meses, o

contato com os investigados. O intuito foi estabelecer uma relação mais amigável, e desse

modo, lançar um olhar reflexivo investigativo as sobre as ações no contexto de trabalho.

Estabeleceu-se, portanto, uma organização para o processo de observação. A intenção

inicial na aplicação do método foi compreender como se estruturava o lócus da pesquisa,

sobretudo o funcionamento da escola em geral, especialmente em relação à sistematização de

uso dos laptops do Projeto UCA ou qualquer outra sistemática de uso de Novas Tecnologias

no contexto escolar. Com isso, foi possível identificar onde estavam localizados os sujeitos da

pesquisa, ou seja, em que estrutura/organização administrativo-social nosso grupo-sujeito

estava imerso. Após conhecer o contexto local da pesquisa, foi possível reconhecer as

condições oferecidas pela escola para trabalhar com uso das Novas Tecnologias em geral.

Depois dessa etapa, foi possível colocar em prática o lado participante da observação.

Valendo-se também da participação da pesquisadora no Projeto UCA como tutora, houve a

tentativa da mesma de se inserir nos espaços de conversas entre professores, gestores e/ou

coordenadores. Os assuntos abordados nas rodas de conversas informais sempre envolviam o

UCA e suas dificuldades de aplicação em sala de aula. Compartilhávamos ideias e, só aos

poucos, nossas considerações foram sendo bem aceitas. A partir desse momento é que foi

possível perceber uma abertura para solicitar a inserção em sala de aula, com o objetivo da

observação da prática do professor ao fazer uso dos laptops educacionais.

Entretanto, alguns dos professores investigados ainda não se sentiam à vontade para

abrirem suas salas de aula para observação. Era uma intimidade que, por motivos particulares,

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101

não pudemos adentrar. Dos 17 docentes que compunham nosso grupo-sujeito, apenas quatro

deles nos concederam permissão para adentrar seu universo de trabalho, a sala de aula.

Portanto, acertamos que seriam observadas duas aulas de cada docente com uso dos laptops.

Deste modo, foi possível considerar que a observação do lócus da pesquisa ocorreu de

forma progressiva, no sentido de serem extraídas informações iniciando a observação/reflexão

de fora do espaço de sala de aula para dentro deste espaço, por meio de uma participação

conquistada dia a dia e do desenvolver da confiança entre os professores.

Toda a preocupação no processo de observação estava em ter objetivos definidos ao ser

inserida em sala de aula como observadora. Almejava-se que esse método se tornasse

eficiente para responder ao objetivo da pesquisa. Nesse sentido, nos ancoramos em Ludke e

Andre (2012), pois para eles a observação apenas se tornará um instrumento válido e

fidedigno de investigação científica quando for controlada e sistematizada. Isso implica a

existência de um planejamento cuidadoso do trabalho e uma preparação rigorosa do

observador. (LUDKE e ANDRE, 2012, p. 25).

Em momento anterior à observação, buscou-se traçar objetivos com a utilização deste

método. Era sabido que um deles seria identificar o conteúdo abordado na aula, bem como

identificar objetivos para aprendizagem dos alunos, ou seja, o que o professor gostaria que os

alunos aprendessem, utilizando a tecnologia - neste caso, os laptops do UCA -, como um meio

para ensinar o conteúdo.

Outro objetivo refere-se à forma como os professores estariam fazendo uso do laptop

educacional. Sabendo que nem sempre a tecnologia é tida como um recurso didático, ou seja,

como um meio para mediar/auxiliar o processo de ensino e aprendizagem dos alunos, e sim

como um fim em si mesmo, onde os aparatos tecnológicos muitas vezes são utilizados de

forma instrumental e restrita às possibilidades técnicas do equipamento.

Ao definir tais objetivos para iniciar o processo de observação, foi evidenciada uma visão

acerca do uso das Novas Tecnologias em sala de aula, a qual preza pelo alinhamento dos

aparatos tecnológicos às necessidades de aprendizagem dos alunos, bem como com as

questões relativas à interação crítica/reflexiva entre as pessoas e os recursos tecnodigitais.

Nossa preocupação, nesta etapa da pesquisa, foi a de encontrar meios para que

conseguíssemos respostas aos objetivos definidos para a observação participante. Procurava-

se “ver longe”, levar em consideração as variadas facetas da situação observada sem isolá-las

umas das outras, resultando em uma observação do todo objetivado.

Torna-se importante deixar claro que o principal instrumento para realizar o registro da

aplicação da técnica da observação participante foram algumas notas descritivas e analíticas

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102

da observadora. Nessas notas, buscou-se fazer relatos descritivos, no sentido de detalhar

determinados aspectos que estavam sendo relevantes para a investigação, como por exemplo,

a disposição da sala, a distribuição dos laptops para os alunos, as condições de

armazenamento e carregamentos dos mesmos, os passos metodológicos das aulas observadas,

entre outros.

Além disso, foram registradas notas analíticas, nas quais expomos reflexões pessoais

sobre os fatos observados, ideias, dúvidas, encaminhamentos para a pesquisa, entre outros

apontamentos. Tais registros analíticos nos respaldaram quanto a ações teórico-metodológicas

do estudo, bem como complementaram e ampliaram a compreensão acerca do objeto

analisado.

Considerando o exposto, organizou-se a observação de oito aulas, sendo duas para cada

professor, conforme especificado no quadro abaixo:

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103

QUADRO 01:

SISTEMATICA DE OBSERVAÇÃO DAS AULAS COM USO DOS LAPTOPS PROJETO UCA

PERÍODO

DA

OBSERVAÇ

ÃO

ANO /

DISCIPLINA

RECURSOS

UTILIZADOS SEQUENCIA DIDÁTICA OBSERVAÇÕES

Novembro /

2012

6º Ano / Ciências

(Tema: Poluição

Ambiental)

Livro didático

Caderno

Laptops PROJETO

UCA (Programa

KWord – Editor de

Texto)

Projetor Multimídia

1. Ligar laptops; 2. Professor

digita situação problema usando

o Kword; 3. Apresenta a situação

problema aos alunos usando

projetor multimídia; 4. Orienta

os alunos a responderem a

situação-problema consultando

livro didático; 5. Digitar resposta

no Kword; 6. Recomenda enviar

atividade por email.

O projetor multimídia não foi montado pelo

professor e sim pelo técnico do laboratório

de informática da escola.

Os alunos não tinham e-mail, e precisava-se,

portanto, fazer o cadastro dos mesmos em

algum e-mail, o que não foi dado

importância pelo professor.

Alunos disseram que não tinham como

entregar a atividade, pois não tinham como

enviar.

Novembro /

2012

7º Ano / Ciências

(Tema: Evolução da

Biodiversidade)

Livro didático

Caderno

Laptops PROJETO

UCA (Programa

KWord – Editor de

Texto)

Projetor Multimídia

1. Ligar laptops; 2. Professor

digita situação problema usando

o Kword; 3. Apresenta a

situação-problema aos alunos

usando projetor multimídia; 4.

Orienta os alunos responderem a

situação problema consultando

livro didático; 5. Digitar resposta

no Kword; 6. Recomenda enviar

atividade por e-mail.

Repetem-se as mesmas observações da aula

anterior. Inclui-se o fato de que alguns

laptops nesta aula já estavam descarregados,

tendo em vista que a turma do 7º ano utilizou

os mesmos laptops da turma do 6ª ano.

Novembro /

2012

5ª ano / Professora

Polivalente - Aula de

Língua Portuguesa

(Pontuação)

Texto

Laptops PROJETO

UCA

1. Entrega do texto; 2. Leitura do

texto pela professora; 3.

Digitação do texto impresso no

KWord (editor de textos)

Não houve leitura compartilhada e nenhum

momento foi destinado ao trabalho de

interpretação do mesmo. Não foi

oportunizado aos alunos se posicionarem e

refletirem sobre o texto. Alguns alunos,

ainda com dificuldades de leitura, não

conseguiam reproduzir o texto no

computador, pois não reconheciam

determinadas letras. Alguns laptops

descarregaram no meio da realização da

atividade. A professora não soube instruir

para salvamento do arquivo com o

documento digitado pelos alunos.

Novembro /

2012

5ª ano / Professora

Polivalente - Aula de

Língua Portuguesa

Continuação da Aula

(Pontuação)

Texto

Laptops PROJETO

UCA

1. Continuação

da digitação do texto

no KWord (editor de

textos)

Foi escolhido um texto longo, e isso

demandou muito tempo dos alunos na

digitação, o que fez ocupar outra aula. Nessa

aula, 2 alunos mais experientes no editor de

texto acabaram a digitação antes dos demais

e pediram a professora para formatarem o

texto, utilizando recursos da barra de

ferramentas do KWord. A professora não

permitiu que os alunos realizassem a

formatação. Inferimos que o fato de não

deixar os alunos formatarem o texto se

traduz em uma autodefesa da professora,

pois não sabia mexer na barra de ferramentas

e, portanto, não saberia sanar possíveis

dúvidas dos alunos.

Novembro /

2012

6º ano / Língua

Portuguesa

(Tema: História em

Quadrinhos)

Laptops PROJETO

UCA

Pesquisa na internet

sobre Ziraldo e

Maurício de Sousa Cadernos

1. Ligar laptops, uso de duplas;

2. Fazer buscas na internet sobre

a vida e obra dos autores Ziraldo

e Maurício de Sousa; 3. Escrever

os resultados da pesquisa no

caderno.

As atividades realizadas fazem parte de um

projeto maior da professora sobre “Histórias

em quadrinho”. Ganharam destaque no

projeto os autores citados. A professora,

prevendo dificuldades com a conexão

simultânea da internet, resolveu diminuir o

número de computadores conectados,

fazendo os alunos trabalharem em duplas ou

trios. Desta forma, o uso da internet para

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104

pesquisa foi satisfatório, e todos

conseguiram resultados para apresentar à

professora na aula seguinte. Houveram

momentos de dúvidas da professora quanto

ao procedimento exigido para conectar os

laptops na rede wireless. A pesquisadora

auxiliou nesse momento com vista a dar

continuidade ao desenvolvimento da aula.

Novembro /

2012

6º ano / Língua

Portuguesa

(Tema: História em

Quadrinhos)

Laptops PROJETO

UCA

Caderno

Discussão sobre os

resultados da

pesquisa

1. Discussão junto com a

professora sobre os resultados

obtidos na pesquisa, com

participação de todos os alunos;

2. Entrega do texto produzido em

folha de caderno para correção

ortográfica.

Houve participação na discussão de quase

todos os alunos. Vimos que todos haviam

tido oportunidade de ter pesquisado na

internet e tinham orgulho de socializarem os

resultados obtidos. A professora também fez

alguns questionamentos sobre a vida e obras

dos autores eleitos para serem pesquisados;

muitos responderam. Ao final da aula, os

alunos entregam textos produzidos com base

nas pesquisas realizadas para correção

ortográfica.

Dezembro/

2012

EJA _I Ciclo

(Tema: Gêneros

Textuais _

Propaganda)

Laptops PROUCA

KPresent (Criador de

Apresentações-

Slides)

Caderno

1. Retomada de

conceitos/conteúdos vistos em

aula anterior; 2.

Apresentação/Exposição do

conteúdo da aula; 3. Atividade:

Desenvolver uma propaganda

com imagem e texto no

KPresent; 4. Distribuem e ligam

laptops; 5. Abrem o programa

KPresent; 6. Professora explica o

passo a passo com auxilio de

desenhos das telas no quadro; 7.

Alunos repetem no laptop o

passo a passo para abertura do

programa ao mesmo tempo em

que a professora explica; 8. No

caderno, estruturam e escrevem

frase de efeito como forma de

vender um produto

(propaganda); 9. Correção

individual do texto pela

professora.

Professora dedicada e com profundo

conhecimento acerca da manipulação dos

recursos presentes no laptop PROJETO

UCA. Alunos em fase de alfabetização, em

sua maioria, nunca haviam manipulado um

computador e/ou laptop. O PROJETO UCA

é um elemento motivador na aprendizagem.

Participaram ativamente da aula.

Dezembro/

2012

EJA _I Ciclo

(Tema: Gêneros

Textuais-

Propaganda)

Laptops PROJETO

UCA

KPresent (Criador de

Apresentações-

Slides) Caderno

1. Uso do

KPresent para

elaboração do “cartaz”,

por meio da criação

slides; 2. Pesquisa de

imagens (ilustrações)

na internet com uso de

ferramenta de busca

para compor a

propaganda criada; 3.

Finalização do slide

com propaganda; 4.

Socialização das

propagandas criadas no

KPresent.

Aula animada. Alunos desinibidos e

empolgados para mostrar aos demais suas

propagandas. À medida que os alunos iam

terminando de fazer os slides, a professora

realizava uma correção individual,

orientando a forma correta da escrita das

palavras. Alunos satisfeitos com as

atividades realizadas.

O processo de observação participante durou dois meses (de Novembro a Dezembro do

ano de 2012), pois elas eram feitas de acordo com a disponibilidade do professor e

agendamento prévio. Foi observado que, em algumas aulas, os objetivos estavam indefinidos

e o conteúdo a ser ensinado com apoio do laptop acabou ficando em segundo plano. As

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105

maiores preocupações dos professores durante as aulas estavam na manipulação do

equipamento e na conexão à internet.

Aulas que exigiam digitação de textos ganharam destaque, e foram identificados, ainda,

objetivos que conflitavam entre os que foram apreendidos por meio da observação e os

objetivos que os professores nos passavam como sendo os da aula.

As observações realizadas serviram para ratificar o entendimento acerca das aulas com

uso dos laptops UCA, pois sabíamos que as mesmas não ocorriam com frequência e que os

docentes haviam “se preparado” para a ocasião, além de compreendermos que muitos deles

tinham dificuldade em manipular os recursos do laptop.

Um fato que surpreendeu foi o caso do professor de ciências, o qual lecionava para turmas

do 6º ao 9º ano do ensino fundamental. Ao acordamos nossa observação, combinamos de

observar as turmas do 6º e 7º ano do professor. Observamos e fizemos notas acerca da

primeira aula observada, no 6º ano, tomando o cuidado de procurar repostas para os objetivos

destinados à observação. Contudo ao adentrarmos a sala para observar a segunda aula, no 7ª

ano, o professor repetiu a mesma sequência didática da aula anterior, ou seja, estávamos

observando a mesma aula readaptada para o 7º ano.

Além do fato relatado, no decorrer das aulas, o professor solicitou nossa ajuda algumas

vezes com o intuito de sanar algumas dúvidas com relação à manipulação do próprio laptop. É

importante destacar que esse fato não se tornou um empecilho no processo de observação e as

ajudas foram essenciais para o prosseguimento da aula.

Diante disso, foi possível entender que foi por meio da observação das aulas dos

professores que conseguimos ampliar a compreensão acerca de dois pontos discutidos na

aplicação do grupo focal, referentes a: falta de tempo para estudo e planejamento de aulas e

falta ou pouco conhecimento sobre a manipulação do laptop educacional UCA.

A aula do professor de ciências foi usada para exemplificar a real situação das aulas que

foram observadas e com isso estabelecer uma ponte entre o discorrido pelos professores no

grupo focal e suas ações concretas em sala de aula.

É possível citar como exemplo o próprio discurso do professor de ciências na

oportunidade do desenvolvimento do grupo focal. O mesmo, em um contexto no qual

falávamos sobre as dificuldades na aplicação do Projeto Um Computador por Aluno no

cotidiano da escola e da sala de aula, expõe: “A falta de estrutura na alimentação elétrica, falta

de tempo para planejar, isso a gente teria que ver aqui na escola. A escola tem que se adaptar a

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isso.” (PROFESSOR CRAVO2, Ensino Fundamental II, EJA). O mesmo professor ainda nos

coloca: “Tem também a questão tempo. Nós terminamos de lecionar pela manhã, às

11h30min, temos que almoçar e ir para outra escola e nós não temos tempo de planejar, de

sentar, de baixar um vídeo”.

Ainda a título de ilustração desta questão, podemos destacar discursos de docentes

participantes do grupo focal e observados durante a execução de sua aula. Uma delas nos

coloca: “O problema dele [do laptop] é que o sistema é muito difícil. Trabalhar no KWord dele

é semelhante, a ferramenta do desenho é boa, a câmera também é boa. Agora, quando a gente

passa para a ferramenta de slides, eu não consegui ainda aprender.” (Professora Rosa, Ensino

Fundamental II, Ensino Médio). Por fim, a professora Angélica, do 5º ano de ensino

fundamental I, acrescenta: “Em casa eu tenho computador, eu digito minhas provas, eu tenho

Orkut, eu tenho e-mail. Agora, na hora de usar o UCA é muita coisinha, é muito difícil de usar

ele.” (PROFESSORA ANGÉLICA, Ensino Fundamental I).

Se anteciparmos uma análise aprofundada sobre o que presenciamos na observação,

fazendo uma ponte com o grupo focal realizado, seria possível afirmar que esses discursos, os

quais não tratamos como generalizantes, traduzindo uma visão global que resume a condição

de todos os professores submetidos à investigação, e sim como casos peculiares, ilustram e

reafirmam as notas descritivas de nossa observação participante. Os mesmos denotam uma

relação conflituosa com o Projeto Um Computador por Aluno, especialmente com o uso

pedagógico dos laptops provenientes do UCA, os quais são utilizados de forma esporádica e

com outros propósitos pedagógicos - ou apenas técnicos - que não relacionam a referida

tecnologia com os objetivos da aula e da aprendizagem, acabando por deixar o conteúdo da

aula em segundo plano.

Além disso, evidenciamos problemas de infraestrutura, como dificuldade de conectividade

simultânea à internet, laptops com problemas técnicos e alguns em más condições de

armazenamento e carregamento. Tais fatos interferiam no desenvolvimento das aulas. Sempre

havia, nos momentos de observação, laptops mal carregados e alunos sem acesso à internet,

problemas esses contornados pelo professor da forma como o mesmo entendia ser a correta.

Contrariando essa relação de conflito que se estabelecia entre professores e uso dos

laptops em sala de aula e, apesar do foco da pesquisa ser os docentes, nos deparamos com

alunos ansiosos e felizes por participarem da aula com uso do laptop. A característica do

2Para preservar a identidade dos docentes investigados, foram estabelecidos nomes fictícios aos mesmos.

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alunado em geral era bastante diversificada. Havia aqueles com mais entendimento sobre a

máquina e outros que iniciavam o processo de inclusão digital por meio delas - alunos que

nunca tinham visto um laptop e que ficaram maravilhados com o que o UCA estava

oferecendo de tecnologia –, bem como alguns que achavam o laptop com poucos recursos,

pouca memória e obsoletos.

Enfim, são professores que ainda estão se apropriando dos recursos que o laptop

disponibiliza - bem mais que isso, estão começando a se inserir digitalmente. Além de estarem

ainda em fase de aprendizado e de uma inclusão digital, os professores têm que lidar com uma

turma com níveis de inclusão digital diferentes, com conhecimentos e expectativas diversas

acerca das aulas e do uso que se faz dos laptops.

Em síntese, a ida a campo e o período de observação das aulas se fez necessário para

descobrirmos com que tipos de alunos e de aprendizagens os professores estavam lidando,

como era a sistematização de uso, a organização e o armazenamento dos laptops, os objetivos

(claros ou não) das aulas com uso dos mesmos, etc. Esses aspectos exprimiram uma

experiência produtiva no sentido de agora ser possível compreender o contexto de trabalho

com o UCA para os professores, suas as dificuldades e anseios.

Ressaltamos que todos os sujeitos investigados na pesquisa foram devidamente

comunicados sobre o tempo e sobre as possíveis estratégias metodológicas tomadas pela

pesquisadora, de modo que sabiam que, além do grupo focal e das observações, outras

técnicas para coleta de dados poderiam ser adotadas.

4.1.4 As entrevistas

Ao final da etapa anterior, composta pela realização de grupo focal e observações, houve

um distanciamento por um período de quatro meses da escola. A intenção foi sistematizar os

dados obtidos e analisar se os mesmos respondiam as inquietações da pesquisa, além de

continuarmos, agora com mais fôlego, com o estudo e a ampliação da fundamentação teórica.

Após análises e estudos, percebeu-se que os dados precisavam ser complementados.

Resolvemos voltar a campo, em Março de 2013, e realizar entrevistas individuais com os

docentes, acreditando que a adoção das mesmas, nesse caso, permitiria o “aprofundamento de

pontos levantados por outras técnicas” (LUDKE e ANDRÉ, 2012), além de termos a

oportunidade de interagir com os sujeitos de forma individual, com abertura para correções e

maiores esclarecimentos acerca dos assuntos tratados.

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Foi feito o uso da entrevista do tipo semiestruturada, onde abarcamos uma série de

perguntas abertas, feitas verbalmente em uma ordem prevista, mas na qual podíamos

acrescentar perguntas de esclarecimento (LAVILLE; DIONNE, 1999). Os temas da entrevista

realizada com os professores foram pré-definidos, contudo, passiveis a modificações durante a

execução da técnica. Tínhamos como temas: UCA e cotidiano profissional do professor, UCA

e ações em sala de aula, mudanças em sua prática social, o plano de formação UCA e os

encontros para estudo e planejamento de ações, entre outros aspectos.

Contudo, ao reencontramos nosso campo de pesquisa, nos deparamos com um novo

quadro docente. Alguns professores que participaram da pesquisa desde seu início não mais

estavam na instituição, pois eram professores temporários. Nesse sentido, nossa amostra

representativa sofreu pequenas alterações, pois realizamos as entrevistas com 10 docentes.

Outros não responderam, pois não se encontravam na escola no período destinado à aplicação

do método, ou estavam afastados da instituição.

Todas as entrevistas foram realizadas buscando a compreensão dos mundos de vida dos

entrevistados e de grupos sociais especificados, pois a entrevista qualitativa nos fornece a

possibilidade de adquirir dados básicos para o desenvolvimento e entendimento das relações

entre o grupo sujeito e a situação investigada (GASKELL, 2012). Assim sendo, introduzimos

nossas questões no anseio de descobrir de que forma o professor passou a agir e que tipo de

saberes foi apreendido por eles, quando houve sua inserção no Projeto UCA.

Ao final desta etapa, onde foi realizada uma análise documental, além do grupo focal, de

observações e das entrevistas individuais, foi possível construir o corpus do estudo, entendido

na visão de Bauer e Aarts (2012) como uma coleção finita de materiais (textos, imagens ou

sons), determinada de antemão pelo pesquisador, com inevitável arbitrariedade, e com a qual

se irá trabalhar durante o desenvolvimento da investigação.

É importante ressaltar que todo o resultado da aplicação dos instrumentos de coleta de

dados - sendo eles: entrevista, grupos focais e observações - foram utilizados para compor a

análise de nossa pesquisa (capítulo V). Os resultados da aplicação desses instrumentos

constituem o corpus da investigação. Sendo assim, de posse do corpus da pesquisa,

estruturado com base em mensagens/discursos dos professores, buscou-se desvendar os

saberes (re)construídos na premissa da apropriação tecnológica, na ambiência do Projeto

UCA.

Portanto, após a aplicação dos instrumentos metodológicos, nos ausentamos do lócus de

pesquisa em busca de, por fim, sistematizarmos nossos dados e analisá-los à luz das

perspectivas teórico-metodológicas adotadas no estudo.

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4.2 A base teórica para análise dos dados

A metodologia da pesquisa não se constitui apenas de um caminho, uma estratégia ou um

percurso a seguir. Estão intrínsecas, também nessa caminhada, escolhas e também, por parte

do pesquisador, uma interação com o objeto investigado e com os dados colhidos, mediante a

construção deste percurso metodológico. Nesse sentido, consideramos justa a necessidade de

refletirmos também sobre o tratamento de nossos resultados e a forma como eles foram

discutidos, considerando, assim, o trajeto geral da investigação.

A análise dos dados não está dissociada das demais fases metodológicas da pesquisa.

Esta fase tem como intuito fazer com que compreendamos o que foi coletado, refutando ou

não os pressupostos da investigação.

Em nosso trabalho, foi privilegiada como forma de tratamento de dados a análise de

conteúdo sob o foco da abordagem qualitativa. A análise de conteúdo, segundo Bardin (2011),

trata-se de um conjunto de técnicas de análise das comunicações tendendo a obter, por

procedimentos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores que permitam a

inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens

(BARDIN, 2011).

Sendo assim, nos valemos das técnicas de análise de conteúdo como forma de

procurarmos o significado das interações provenientes da inserção dos professores no Projeto

UCA e os saberes que permeiam essas interações sociais. Para isso, foram analisados

documentos e as falas/discursos dos professores, provenientes da aplicação de nossos

instrumentos de coleta de dados.

Vale ressaltar que o pressuposto dos saberes construídos ou reconstruídos pelos

professores está totalmente imbricado ao contexto analisado. O que queremos elucidar é que

alguns saberes que dizemos novos, nesta pesquisa, são saberes reconstruídos, revistos e/ou

reelaborados na experiência UCA. Constituem-se novos para a situação educativa investigada,

de forma específica daquele contexto de professores e de estrutura escolar.

De acordo com Minayo (1998), há diferentes tipos de análise de conteúdo: de expressão,

das relações, de avaliação, de enunciação e categorial temática. Em nosso trabalho, foi dado

destaque à análise de conteúdo do tipo categorial temática, ou seja: a partir dos dados,

buscamos descobrir núcleos de sentido cuja frequência com que surgem traz uma significação

para o objeto analítico apontado na pesquisa.

Nesse sentido, as palavras e sentenças retiradas das entrevistas e grupos focais nos

nortearam na criação das unidades analisadas, concretizando, assim, o processo de

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categorização. É importante destacar que essa categorização foi desenvolvida de forma não-

apriorística, pois emergiram totalmente do contexto das respostas dos sujeitos da pesquisa

(Bardin, 2011).

Para a categorização temática, as etapas de análise foram imperativas, de forma que

empreendemos um desmembramento dos discursos dos docentes em unidades e em

categorias, para posteriormente reagrupá-las e formar, assim, as categorias temáticas.

É importante destacarmos que a categorização do conteúdo analisado evidencia a

ordenação da realidade investigada nessa pesquisa. Mediante a apreensão dessa realidade por

meio das técnicas de coleta de dados, extraíamos a essência das interações simbólicas

construídas pelos professores na ambiência do Projeto UCA. Efetivamos, assim, a tipificação

de saberes localizados no contexto de uso das tecnologias, no momento da formação UCA.

Inferimos que as vivências dos professores junto ao UCA resultaram no aprimoramento do

capital cultural, que os sujeitos adquiriram em suas trajetórias sociais dentro do Projeto

(BOURDIEU, 1999).

Assim sendo, a análise de conteúdo nos auxiliou a ordenar saberes provenientes do

processo de formação de professores no Projeto Um Computador por Aluno. Foram retiradas

inferências no discurso dos professores que revelam saberes requeridos às apropriações

tecnológicas no ambiente escolar analisado. São apresentadas, por meio das categorias

temáticas, tais marcas no ambiente educacional analisado, o qual adere à cultura digital na

experiência do Projeto UCA.

Desta forma, as categorias que assumimos como tipologias de saberes se referem aos

saberes: técnicos, didático-metodológicos e da profissionalização. Esses temas foram

extraídos dos dados coletados partindo de um “núcleo de sentido”: a apropriação tecnológica

do grupo sujeito investigado. As tipologias de saberes mencionados foram categorizados de

acordo com o agrupamento de palavras e expressões dos discursos dos professores que se

assemelhavam em termos de significados. Foram ilustradas essas tipologias de saberes através

da descrição analítica dos conteúdos das mensagens.

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5 EM BUSCA DOS SABERES DECORRENTES DA APROPRIAÇÃO

TECNOLÓGICA DO PROFESSOR

Investigar o processo de apropriação da cultura digital é identificar nos discursos dos

docentes afirmações que revelem novas formas de compreender e usar as Novas Tecnologias.

Nossa intenção é buscar inferências que apresentem novas competências e habilidades

requeridas pelo processo de apropriação sociocognitiva de novos saberes no ambiente escolar,

dentro do contexto do Projeto Um Computador por Aluno (UCA).

Nesse sentido, toda a descrição feita do processo que envolve a formação de professores

do Projeto UCA - seus aspectos estruturais, conteúdos e sistematização das ações de formação

- foi organizado no intuito de direcionar nossa análise. A tensão analítica acerca da formação

de professores UCA foca a apropriação tecnológica. O que nos interessa é identificar a forma

como os professores internalizam os conhecimentos advindos dos módulos de formação e os

traduzem em forma de significações/interações sociotécnicas, a partir de um bloco de

conhecimentos técnicos, especialmente adquiridos no módulo de apropriação tecnológica, que

leva o sujeito a se instrumentalizar e a (re)criar saberes para atuar na sociedade, em seu

âmbito profissional.

Para tanto, recorremos ao método de análise de conteúdo. Este método nos possibilitou o

tratamento das informações contidas nas mensagens proferidas pelos sujeitos da nossa

investigação. Desenvolvemos, portanto, uma análise de significados especificamente para o

campo empírico investigado (Bardin, 2011).

Nesse sentido, procuramos o significado das interações simbólicas provenientes da

inclusão dos professores no Projeto UCA e os saberes que permeiam essas interações. Vale

ressaltar que o pressuposto dos saberes construídos ou reconstruídos pelos professores está

totalmente imbricado com o contexto analisado. O que queremos elucidar é que alguns

saberes que dizemos novos, nesta pesquisa, constituem-se novos para a situação educativa

investigada, de forma específica daquele contexto de professores e de estrutura escolar.

5.1 O quadro da análise de conteúdo: Os saberes decorrentes da apropriação

tecnológica em categorias

Os dados coletados foram organizados em unidades de análise. Ou seja, palavras e

sentenças retiradas das entrevistas e grupos focais nos nortearam na criação das unidades

analisadas, concretizando assim, um processo de categorização. A natureza das unidades de

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análise surgiu por meio da repetição de termos, frases e palavras que traduziam determinados

sentimentos dos professores em relação ao uso dos laptops em sala de aula ou mesmo fora

dela, uma vez que a inserção no Projeto UCA oportunizava a alguns educadores usarem e

compreenderem as mais variadas mídias digitais de uma nova forma.

Assim sendo, foi feita uma leitura e análise atenta dos dados coletados nas entrevistas

individuais e dos grupos focais realizados. É importante frisarmos que as observações

intensivas realizadas foram essenciais para o entendimento global do processo de apropriação

dos professores, pois auxiliaram na compreensão da forma como os docentes usam e

entendem a tecnologia que estava sendo utilizada em seu cotidiano escolar e social. Além dos

discursos, recorremos ao quadro (Quadro 01) de sistemática de observações para esclarecer a

apreensão desses saberes pelos professores.

Desta forma, buscamos separar todo o conteúdo em pequenas unidades. Identificamos

imediatamente na análise dos dados palavras e/ou termos que remetiam ao aprendizado e as

dificuldades de aprendizado da técnica que subjaz o uso dos laptops UCA. Frases como:

“Hoje eu pesquiso na internet”, “eu não sei fazer slides no laptop do UCA, mas estou

aprendendo”, “eu tive realmente certa dificuldade em mexer no laptop”, “eu uso a internet nas

aulas”, “sei digitar textos e uso planilhas”, “eu trabalho usando o KWord e a ferramenta de

desenhar é boa”, “vou dizer para você que não foi fácil usar o laptop”, “eu vou ter que

enfrentar isso [laptop UCA]?”, “instalei programas no computador”, “aprendi a usar o

scrath.”, “eu não sei baixar um vídeo!” e “eu aprendi a usar o gravador de voz”, constituíram

a essência de uma de nossas unidades de análise, unidade esta na qual sobressaíam discursos

onde os docentes colocavam a técnica necessária para manusear o laptop e os saberes

adquiridos do aprendizado desta técnica como destaque.

Embora essa unidade temática apresente a técnica e a tecnologia como elementos de

destaque, acreditamos que a experiência do professor, ou seja, o seu dia-a-dia em sala de aula,

com o uso dos laptops, será decisivo na melhoria das estratégias de ensino aprendizagem. A

técnica, por si só, não garante a transformação social e/ou profissional do educador. De acordo

com Freire (1977):

[...] o messianismo tecnicista... Opõe a modernização das estruturas. Segundo essa

concepção (messiânica), a passagem da estrutura arcaica à nova, modernizada, se dá

do mesmo modo como quando alguém transporta uma cadeira de um lugar para o

outro. [...] Na modernização de caráter puramente tecnicista, o centro da decisão da

mudança não se acha na área em transformação, mas fora dela. A estrutura que se

transforma não é sujeito de sua transformação [...], pelo contrário, o ponto de

decisão se encontra no ser que se transforma e seu processo não se verifica

mecanicamente. Desta maneira, se bem que todo desenvolvimento seja

modernização, nem toda modernização é desenvolvimento. (FREIRE, 1977, p. 57)

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De acordo com as palavras de Freire (1977), é a partir da aprendizagem da técnica e de

uma apropriação da cultura digital de forma significativa, que se pode haver a transformação e

desenvolvimento do sujeito. Isso não é um processo mecânico, demanda uma reflexividade e

um ativismo por parte do professor, que resulta em novas formas de agir e pensar com uso das

TICs.

Paralelo a esta unidade, houve ainda outras falas que nos impulsionaram a criar uma nova

unidade temática. Nesta unidade, estão inseridas mensagens que refletem um significado

específico. Elas convergem em uma mudança de atitude pedagógica, no sentido da renovação

de metodologias de ensino, ou seja, novas formas de ensinar e de planejar aulas. Acreditamos

que estes discursos revelam a reconstrução de saberes para ensinar e para planejar aulas.

Sentenças como: “eu vejo que nos planejamentos nós precisamos melhorar, ter objetivos

mais definidos, de um projeto maior que norteie o uso desse computador”, “quero usar o

laptop para dinamizar as aulas”, “quero uma ferramenta de trabalho que possa contribuir para

aprendizagem dos alunos”, “trabalhamos Luiz Gonzaga semestre passado, com uso da

internet”, “é preciso planejar. Apesar de dominar bem a informática, existem programas novos

no laptop UCA que a gente precisar estar sempre buscando se aperfeiçoar”, “é necessário

tempo de planejar e estudar par usar o UCA em sala” e “é fundamental o planejamento para

que dê certo o ensino como gente deseja.”

Analisando especificamente esta unidade temática, inferiremos que a experiência UCA,

apesar de ter se apresentado como um ambiente pouco propício à reflexividade dos docentes,

devido à precária infraestrutura e escasso tempo para estudo e planejamento, possibilitou uma

nova maneira de pensar as tecnologias a partir do uso dos laptops UCA, tirando-as de um

contexto de lazer e entretenimento e colocando-as em um contexto educacional/pedagógico.

Percebemos que a reflexividade, apesar de não estar configurada como um processo

coletivo de (re)análise das atividades desempenhadas no contexto escolar analisado e do

projeto UCA, devido ainda aos empecilhos estruturais que o projeto atravessa na Escola

Estadual Maria Cristina (conectividade, carregamento e armazenamento dos laptops e escasso

espaço/tempo para planejamento e estudo), apresenta-se, nesse contexto, como um processo

individual, ocasionando - mesmo que timidamente - o despertar de um novo olhar sobre a

tecnologia e sobre a forma de atuar em sala de aula.

Observamos, nos discursos, que colocam o planejamento das atividades e a maneira de

ensinar como elementos a serem considerados quando se leva o laptop para sala de aula.

Dessa forma, acreditamos que a reflexividade é apresentada como um esforço consciente e

voluntário que leva o professor a questionar suas ações e descobertas. Percebemos que a

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inserção no projeto UCA proporciona ao professor fazer “um ativo, prolongado e cuidadoso

exame de toda espécie hipotética de conhecimento, exame efetuado à luz dos argumentos que

a apoiam e das conclusões a que chega.” (DEWEY,1959, p.18).

Ao relatar, portanto, falas em que colocam a importância de planejar as aulas quando se

usa as TICs, os docentes colocam como fator central a necessidade da solução de uma

situação problemática (como usar o laptop UCA em contexto de ensino-aprendizagem) e é a

partir daí que nasce a reflexividade individual do docente. Ela se inicia quando há a

necessidade de investigar formas de solucionar um dado obstáculo na ação docente - neste

caso, o uso dos laptops em sala de aula, como bem exemplifica um dos professores

entrevistados:

[...] Quando a gente encontra dificuldade, especialmente em relação ao uso de um

novo recurso como o laptop, é natural que você parta para encontrar outras formas

de sair dessa dificuldade, e isso acabou me estimulando a buscar esses novos

conhecimentos. Houve realmente uma transformação mesmo da minha prática.

(PROFESSOR CRISÂNTEMO, Ensino Fundamental II)

Assim sendo, o que percebemos ao construir essas duas unidades temáticas com falas dos

professores imersos na experiência UCA foi que o uso dos recursos tecnológicos,

especificamente os laptops oriundos do projeto, ganharam um sentido pedagógico por não

haver apenas uma superposição de uma nova metodologia ou didática por uma velha forma de

ensinar, mas sim, uma comunhão entre o novo e antigo significado que os docentes possuem

sobre as TICs.

Isso significa que precisamos reconhecer a experiência docente. Ela explica a forma com

que os professores entendem e usam as tecnologias. Essa forma de compreendê-las e a

tentativa de incorporá-las ao seu cotidiano passam por uma reformulação com a experiência

UCA. Compreendemos isso através da concepção de mais uma unidade temática.

Nesta nova unidade, reunimos discursos em que os professores revelam a necessidade de

qualificação docente. Eles expõem discursos que expressam a necessidade e a vontade de

aprender e a preocupação com a educação de seus alunos, considerando o contexto da

sociedade da informação e a importância do estabelecimento de tecnointerações na

aprendizagem do alunado.

Observamos discursos como: “preciso ser mais investigadora”, “preciso estudar mais,

preciso aprender mais e me preparar”, “é preciso buscar outras fontes de aprendizagem, outros

caminhos e possibilidades”, “é fundamental a nossa própria ‘reciclagem’”, “nós acabamos

vencendo os medos, porque fomos buscar novos conhecimentos, vencer e perder o medo de

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usar o laptop”, “o professor ou qualquer pessoa que não tiver essa habilidade fica meio fora de

contexto, não é verdade?” e “foi um desafio aprender a usar o UCA, não foi fácil, eu enfrentei

o desafio e estou disposta a continuar. Não quero parar, não!”.

Esses discursos constituem a base para criação de uma nova unidade temática, a qual

reflete a vontade e a compreensão da necessidade dos professores em melhorarem suas

práticas pedagógicas em prol do ensino-aprendizagem de seus alunos. Revelam a

conscientização sobre sua condição e identidade docente e como também uma reflexividade

acerca da sua formação e desenvolvimento profissional.

São discursos que nos fazem refletir acerca do impacto causado pelo Projeto UCA no

saber-fazer docente. Acreditamos que, mesmo não transformando efetivamente sua prática

pedagógica, o advento e o uso, mesmo que em poucas ocasiões dos laptops, ocasionou um

momento de reflexividade individual nos docentes investigados, reflexividade essa brotada

por meio do surgimento de novos conhecimentos - conhecimentos técnicos, que fazem o

professor pensar sobre sua formação, sobre sua postura em sala de aula.

Essa reflexividade é parte do processo de apropriação tecnológica pois, segundo Vigotsky

(1984), a educação, o ato de conhecer é parte do processo de apropriação de significados

culturais. A reflexividade, então, seria um “instrumento psicológico” que ajudaria o indivíduo

a organizar seu comportamento e suas ações, por meio de um processo de internalização.

Ressaltamos, desta forma, por meio da análise desta unidade temática, um esforço da

categoria docente em conscientizar-se e refletir sobre a necessidade de mudança de atitude

pedagógica, mudança essa requerida pelo contexto atual da sociedade. Esse esforço da tomada

de consciência em superar-se e qualificar-se exige a inserção critica do professor na realidade

social e escolar, desmistificando-a.

A importância desta reflexividade está em proporcionar momentos de autoanálise das

próprias ações. Assim sendo:

Adquirir conhecimentos, aprender a pensar e agir, desenvolver capacidades e

competências, implica sempre a reflexividade. [...] a escola é lugar da formação da

razão critica através de uma cultura crítica, para além da cultura reflexiva, que

propicia a autonomia, autodeterminação, condição de luta pela emancipação

intelectual e social. [...] penso que não chegaremos a lugar nenhum sem o

desenvolvimento de capacidades e competências do pensar – raciocínio, análise,

julgamento. Se quisermos um aluno crítico reflexivo, é preciso um professor crítico

reflexivo. (LIBANEO, 2010, p. 76)

Acreditamos, desta forma, que uma reflexividade individual constituída na experiência de

cada professor permeia a criação das três unidades temáticas constituídas nesta análise. Com a

apropriação dos significados culturais - dentre esses, o significado da cultura digital -, o

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professor pode agregar demais saberes para ensinar com uso das TICs e atuar nas demais

esferas sociais. Os conteúdos apresentados por meio dos dados coletados revelam mudanças

de pensamento, aprendizagens e reflexões sobre uma dada nova condição de trabalho e de

vida.

Após serem organizados em três unidades temáticas, os conteúdos apresentados foram

reorganizados em unidades de contexto, sendo elas: técnica e didática - metodologia e

qualificação profissional. As unidades de contexto deram abertura para criação de nossas

categorias de análise. Essas categorias de análise são resultado de um esforço de síntese em

prol de destacarmos os aspectos mais importantes da investigação.

Classificamos as unidades de contexto em saberes, pois os discursos revelam diferentes

formas de saberes aprendidos e também a necessidade de aprender tais saberes quando

integram a tecnologia em seu cotidiano. O critério inicialmente estabelecido para essa

seleção/separação de dados foi encontrar nos discursos vestígios de saberes apreendidos pelos

professores sob o ponto de vista da apropriação da cultura digital, ou seja, os saberes que

decorrem desta apropriação tecnológica.

Assim sendo, a partir deste critério de seleção e organização, sistematizamos discursos

que se assemelhavam de forma a constituímos e ilustrarmos um grupo de saberes. Portanto, ao

finalizarmos essa organização, criamos nossas unidades de contexto para cada unidade

temática e foi a partir desta unidade de contexto que extraímos nossas categorias de saberes.

Foi no processo de categorização que efetivamos a tipificação de saberes localizados no

contexto de uso dos laptops em sala de aula, no momento da formação UCA. Inferimos que as

vivências dos professores junto ao Projeto resultaram no aprimoramento do capital cultural,

de modo que os docentes interiorizavam um conjunto de recursos e competências disponíveis

na cultura digital estabelecida pelo UCA. Assim sendo, os sujeitos adquiriram em suas

trajetórias sociais dentro desta ambiência (BOURDIEU, 1999).

Portanto, as categorias assumidas como tipologias de saberes referem-se aos saberes

técnicos, saberes didático-metodológicos e saberes da profissionalização. Para responder aos

objetivos da pesquisa, os temas foram extraídos dos dados coletados, partindo de um “núcleo

de sentido”: a apropriação da cultura digital do grupo-sujeito investigado. As tipologias de

saberes mencionados foram categorizados de acordo com o agrupamento de palavras e

expressões dos discursos dos professores que se assemelhavam em termos de significados, e

ilustramos essas tipologias de saberes através da descrição analítica dos conteúdos das

mensagens.

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5.2 Os Saberes advindos da apropriação da cultura digital UCA

Identificamos, por meio da análise de conteúdo, os saberes decorrentes das relações

sociocognitivas estabelecidas pelos professores ao experienciar o Projeto Um Computador

por Aluno. A apropriação da cultura digital foi a premissa para a reconstrução desses saberes,

pelos docentes. São esses saberes sucedidos do processo de midiatização social despertado

pelo Projeto UCA. Nos discursos dos professores, na oportunidade do grupo focal e nas

entrevistas individuais, resgatamos exemplos de como a formação UCA e a utilização dos

laptops influenciam na tomada de decisões, nas relações sociais e aquisição de alguns saberes

próprios da apropriação da técnica.

A partir do desenvolvimento da apropriação tecnológica, os professores desenvolveram

saberes inerentes da experiência com o laptop UCA. A seguir, explicitamos saberes

provenientes de um processo de categorização, que tem a apropriação como eixo central.

5.2.1 O saber técnico

Apontamos, nesta categoria, que os saberes decorrentes da instrumentalização técnica

foram destacados no processo de formação dos professores que utilizaram os laptops em sala

de aula. Foram esses saberes base para atuação pedagógica do docente.

Ao conjunto de discursos que proclamavam o aprendizado instrumental, tanto para uso

pedagógico como para atuação do professor em seu meio sociodigital, denominamos “saberes

técnicos”. Dentro dessa categoria de saberes, encontramos algumas recorrências: dificuldades

no manuseio do laptop, aprendizagem e manipulação de softwares e uso da internet.

Ilustramos as recorrências da categoria – aprendizagem instrumental – com discursos dos

sujeitos:

A gente conheceu o laptop UCA e como ele funciona. O sistema operacional dele é

um pouco diferente do Windows com o qual a gente está acostumada. Temos muito

que aprender ainda, como usar o PowerPoint, a questão dos slides. Tem ainda muitas

coisas para se descobrir no laptop UCA. (PROFESSORA MARGARIDA, Ensino

Fundamental II, Ensino Médio e EJA)

Aprendi a preparar um PowerPoint, um slide, muito bacana! Eu pego um conteúdo e

preparo todo aquele material em slides. Isso é um aprendizado que na nossa época

não tinha. (PROFESSORA ROSA, Ensino Fundamental II e Ensino Médio)

O que eu aprendi bastante foi a utilizar o Audacity, gravador de voz e o scratch. Isso

eu aprendi e acho que deveria ter sido passado para os alunos da escola.

(PROFESSOR CRAVO, Ensino Fundamental II e EJA)

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Aprendi a usar o PowerPoint, baixar vídeos. Agora a gente sabe que o UCA não

possibilita a projeção dos slides... Aprendi a habilidade de buscar essas múltiplas

linguagens. Aprendi a entrar no Word e digitar textos. Fui buscando e fui adquirindo

essas competências e habilidades para trabalhar junto com os alunos. Aprendi outras

linguagens, outras formas de pensar, de agir, de planejar, de se organizar.

(PROFESSORA FLOR, Ensino Fundamental II)

Entendemos a categoria (saberes da técnica) como imprescindível ao agir docente quando

faz uso das Novas Tecnologias da Informação e Comunicação em contexto educativo. É

necessário que os professores sintam-se à vontade para fazer uso dos novos auxílios didáticos,

e sentir-se à vontade para utilizar os laptops significa conhecer a ferramenta, dominar os

principais procedimentos técnicos de cada recurso e integrar o meio tecnológico com o

processo de ensino aprendizagem. (KENSKI, 2003).

Nesse sentido, o saber técnico é uma vertente que devemos considerar na discussão sobre

a prática pedagógica e os saberes do professor. A técnica, ou melhor, a dimensão instrumental

da ação docente, ganha relevância no contexto de uso das TICs no campo educacional. Saber

manusear tecnicamente um determinado aparato tecnológico é imprescindível para se elaborar

estratégias pedagógicas com uso das TICs.

O saber técnico, por si só, não é sinônimo de mudança no processo de ensino. Deve-se

aliá-lo às demais competências em prol de uma aprendizagem significativa com uso das TICs.

Nessa aprendizagem significativa, deve-se envolver os cenários mais amplos com que os

computadores são utilizados, aliando conhecimentos específicos com habilidades críticas

sobre o recurso utilizado.

Consideramos que uma prática pedagógica feita com planejamento, objetivos bem

delimitados, juntamente com o saber técnico, apoiará o professor nas tomadas de decisões e

nas diferentes situações que emergem em sala de aula e que colocam o professor em contexto

de conflito.

Lima e Almeida (2013) acreditam que muitas vezes é dito que a “tecnologia faz a

mudança”, porém se não houver restruturação nos procedimentos adotados e não existirem

pessoas competentes e qualificadas para tal, a tecnologia não tem valia. Tratando-se das TICs

na educação, existe a necessidade da criação de estratégias que possibilitem a compreensão de

como deve ser feita essa integração, entre a técnica e a sua abordagem pedagógica.

Podemos recorrer ao nosso período de observação do contexto escolar para refletir sobre

essa afirmação. Aulas com o uso do laptop UCA foram observadas. Contudo, em algumas

delas, não revelaram de forma harmônica o conjugado planejamento, objetivos e saber técnico

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sobre o recurso que estava utilizando. Exemplo disso foi a aula de Língua Portuguesa

observada no 5º ano do Ensino Fundamental I, ministrada por uma professora polivalente em

novembro do ano de 2012 (ver quadro 01: Sistemática de observação das aulas com uso dos

laptops UCA). A docente nos comunicou que o conteúdo abordado nesta aula referia-se ao

“sistema de pontuação”.

Nesta aula, foi cedido aos alunos um texto para que os mesmos o digitassem no laptop

UCA. Contudo, o texto não foi explorado anteriormente, de forma que os alunos o

interpretassem e expressam suas opiniões sobre a temática abordada. No momento da

digitação do texto no laptop, alguns alunos, ainda com dificuldade de leitura e escrita, não

conseguiam reproduzi-lo, pois não reconheciam determinadas letras. Alguns laptops

descarregaram no decorrer da atividade e desta forma alguns alunos, por não serem orientados

a salvarem seus textos, perderam seus trabalhos.

A observação nos revela que a forma com que foi conduzida esta aula pouco condiz com o

conteúdo e objetivos que foram sinalizados pela professora. O foco estava na aprendizagem

da digitação no laptop UCA e não no texto e na pontuação existente no mesmo. Nesse sentido,

podemos perceber que a sintonia entre o planejamento, os objetivos da aula bem delineados e

o saber técnico estava fragilizada. Mais que isso, as mediações entre a abordagem do

professor, a compreensão do aluno e o conteúdo veiculado fragilizaram-se nesta oportunidade.

Corroboramos com Kenski (2007) ao acreditar que para que as TICs possam trazer

alterações no processo educativo:

(...) precisam ser compreendidas e incorporadas pedagogicamente. Isso significa que

é preciso respeitar as especificidades do ensino e da própria tecnologia para poder

garantir que seu uso, realmente, faça a diferença. Não basta usar a televisão ou o

computador, é preciso saber usar de forma pedagogicamente correta a tecnologia

escolhida. (KENSKI, 2007, p. 46).

O saber técnico fará o professor entender o funcionamento e as especificidades do laptop.

Contudo, é necessária a restruturação dos procedimentos metodológicos adotados, de forma a

garantir a qualidade da aula e uma aprendizagem eficaz. É importante frisarmos que o

conhecimento é a base do processo de aprendizagem e as tecnologias é que vão garantir o

acesso e as articulações com esse conhecimento. É essa interação que irá garantir a qualidade

da educação dada.

Por fim, ao proferirem seus discursos, percebemos que a formação UCA acrescentou aos

docentes informações sobre o funcionamento dos recursos presentes no laptop. Mesmo com

algumas dificuldades para planejar aulas, os professores conseguiram realizar suas primeiras

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experiências com o laptop no modelo de uso um para um junto aos alunos. Como ilustramos

nos discursos:

Procuramos criar situações para levar o aluno a conhecer o laptop do UCA, mas não

tivemos muito tempo para planejar. (PROFESSOR CRAVO, Ensino Fundamental II,

EJA)

Eu fiz as pesquisas no laptop UCA. Eu lembro muito bem de uma aula que fiz sobre

os “anuros”. Fiz pesquisa, coloquei diversas fotos, alguns resumos, coloquei isso no

pendrive e depois passei isso para os alunos. (PROFESSOR CRISÂNTEMO, Ensino

Fundamental II)

Na verdade nós tivemos alguns avanços, mas precisamos ainda melhorar muito, no

sentido de ter um projeto que a gente possa ampliar o uso desse laptop. Nós usamos,

mas acredito que precisaríamos planejar melhor, ter objetivos mais definidos. Na

verdade é como se nós estivéssemos conhecendo o UCA, estivesse experimentando

com os alunos, como é que ele funciona, então, nós precisamos melhorar em nível

de planejamento sim. (PROFESSOR ANTÚRIO, Ensino Fundamental II, EJA)

Observamos, nesses discursos, que apesar das dificuldades com o próprio aprendizado da

técnica, dos escassos momentos de planejamento e do pouco preparo pedagógico para usar os

laptops, os docentes se aventuram na experiência do Projeto UCA. Os discursos ainda

revelam o sentimento dos professores em querer fazer melhor e ter mais tempo para isso,

também no sentido de entender melhor o funcionamento da máquina.

Apesar do ensino e da análise das possibilidades e conveniências de uso do laptop no

processo pedagógico atravessarem obstáculos físicos e de infraestrutura, constatamos, ainda,

que a construção de “saberes técnicos” está sendo ampliada a cada dia de uso dos laptops, na

experiência diária, como afirma uma das professoras entrevistadas:

Eu acredito que a gente precisa saber o que esta fazendo, como se faz e o porquê de

estar fazendo. Precisamos nos preparar no sentido de saber que ferramentas eu usei,

como estava usando, porque se os alunos tiverem dúvidas eu tenho que saber

responder. Planejei antes como é que usava, como é que trabalhava com aquele

laptop. O ano passado foi muito importante. A gente conheceu o UCA e como ele

funciona, que é o sistema operacional. Ele é um pouco diferente do Windows que a

gente está acostumada. Temos muito que aprender ainda, como por exemplo, usar o

PowerPoint, fazer slides. Tem muitas coisas para se descobrir no UCA e isso vamos

descobrir praticando, com o tempo. (PROFESSORA ROSA, Ensino Fundamenta lI,

Ensino Médio)

Considerando o exposto, inferimos que são nas experiências diárias que se consolidarão as

práticas pedagógicas com uso dos laptops. Este é um processo de construção que dependerá

do tempo de uso. Portanto, acreditamos que o professor aprende progressivamente a dominar

seu ambiente de trabalho e os recursos didáticos que o compõe, no momento em que se insere

nele e o internaliza por meio de regras e ações que se tornam parte integrante de sua prática

(TARDIF, 2011).

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5.2.2 Os saberes didático-metodológicos

Da mesma forma que construímos a categoria de saberes técnicos, por meio da análise e

seleção de discursos que se assemelhavam entre si, delineamos uma nova categoria de saberes

decorrentes do processo de apropriação tecnológica do professor. Essa categoria se configura

na construção de saberes didático-metodológicos. Esses saberes representam o conjunto de

sentenças proferidas pelos sujeitos que ajuizavam mudanças em seus percursos didáticos e

metodológicos. Ou seja, novas metodologias estão sendo delineadas aliando conteúdos

curriculares e objetivos de aprendizagem no ambiente dos dispositivos digitais - saberes

construídos no dia-a-dia do professor, onde o mesmo a cada dia descobre e aperfeiçoa a

utilização dos recursos do laptop no processo de ensinar e aprender.

Sobre essa categoria de saberes, encontramos ocorrências referentes a: trabalhar com

diferentes linguagens, mudança na forma de planejar aulas, reconstrução da prática

pedagógica e aulas com pesquisas na internet. Para ilustrar, apresentamos falas dos

professores que inferem novas práticas metodológicas:

Eu tenho buscado melhoras no sentido de planejar melhor, de trazer aulas

diferentes, no sentido de promover essa tecnologia (laptops UCA), utilizando

os símbolos, as imagens e vídeos próprios desse recurso. Vou buscando aliar

a tecnologia, as ferramentas do laptop e os conteúdos da grade curricular.

(PROFESSORA FLOR, Ensino Fundamental II, EJA)

Minha forma de planejar aulas mudou um pouco. Hoje, pesquiso na internet

algumas aulas que tem no “Portal do Professor”. Busquei algumas aulas que

outras cidades, que outros lugares no Brasil tinham sobre projetos com o

Projeto UCA. Fui lendo e fui buscando e assim aprendi outras linguagens,

outras formas de pensar, de agir, de planejar, de se organizar. (PROFESSORA

ROSA, Ensino Fundamental II, Ensino Médio)

Os discursos revelam uma mudança na prática pedagógica de alguns professores,

decorrente de disposições acumuladas pelos docentes ao longo de um processo de interação

com os saberes técnicos, com uso dos laptops em demais ambientes e com a socialização das

experiências com o uso dos laptops.

Ao usar os laptops em contexto de sala de aula, os professores têm a possibilidade de

integrar o novo recurso tecnológico aos seus saberes, originados na experiência de sala de

aula – saberes da experiência, produzidos e internalizados ao longo de sua história de vida, em

sua prática pedagógica diária, nas relações entre professores, entre estes e os alunos, entre os

docentes, a escola e sua organização e entre os professores e os seus próprios saberes, ou seja,

aqueles saberes que são sucedidos da intervenção pedagógica do professor na escola, em suas

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turmas, na organização do trabalho pedagógico, em sua própria história ao longo de sua

vida. (PIMENTA, 2009).

Portanto, ao integrar essa experiência ao saberes advindos da técnica com uso do laptop,

os professores acabam adquirindo uma nova matriz de percepção e ação. Essa matriz, ou

mesmo um conjugado de disposições, de formas de pensar e agir fornece esquemas

necessários para a atuação na vida profissional/social do docente.

Na visão de Bourdieu (2011), os professores estariam, portanto, por meio das interações,

socializações e das experiências passadas, internalizando um novo habitus, gerado a partir da

mediação entre as experiências sociais exteriores e a subjetividade dos mesmos. Convém

ressaltar que, segundo Setton (2002), habitus é um operador, uma matriz de percepção e não

uma identidade ou uma subjetividade fixa, ou seja, o surgimento do habitus procede de um

sistema de disposições aberto, continuamente incitado por experiências novas e

ininterruptamente afetado por elas.

Bourdieu (2011) nos coloca que o habitus, “como indica a palavra, é um conhecimento

adquirido e também um haver, um capital”. O autor acrescenta: o “habitus indica uma

disposição incorporada, quase postural”. (BOURDIEU, 2011, p. 61).

Portanto, ao vivenciarem a experiência do Projeto UCA, ao começarem a adquirir novos

conhecimentos sobre o recurso tecnológico que lhes foi apresentado, o laptop; ao interagirem

com os alunos, com os demais profissionais da escola, os professores passam a incorporar e

agir de forma diferente e isso é refletido nas novas metodologias, didáticas adotadas. Uma

nova postura em sala de aula, paulatinamente, começa a ser construída em detrimento das

novas mediações que estão ocorrendo.

Os professores, por meio do curso de formação de professores do Projeto Um

Computador por Aluno, percebem, apropriam-se de uma determinada cultura e assim agem,

pondo em prática as percepções e os conhecimentos adquiridos, tendo em vista as proposições

de um campo que os estimula, no caso o contexto do Projeto UCA.

Corroboramos com Setton (2002), ao afirmar que o habitus é estruturado como um

conjunto de esquemas individuais que são socialmente construídos, adquiridos na e pelas

experiências práticas, com as quais os docentes se defrontam numa dada cultura digital

incitada pelo Projeto UCA. São essas experiências práticas que irão orientar as ações do agir

cotidiano do professor.

A aula observada no mês de Novembro do ano de 2012, em uma turma do 6º ano do

Ensino Fundamental II, é parte integrante de um projeto desenvolvido por duas professoras de

Língua Portuguesa, denominado “Histórias em Quadrinhos” (ver quadro 01: Sistemática de

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Observação das Aulas com uso dos laptops UCA). Esse projeto já existia e, depois da

experiência no Projeto UCA, as professoras sentiram a necessidade de incorporar ao projeto

novas metodologias, usando os laptops e demais recursos tecnológicos existentes na escola.

Com a adaptação feita, as professoras puderam dar uma “nova cara” ao Projeto. Foram

incorporadas ao mesmo novas práticas metodológicas, resultado de uma mudança de

compreensão das docentes em relação aos benefícios que as TICs poderiam trazer para

processo de ensino aprendizagem do alunado. Ao observar a aula, que tinha como objetivo

conhecer a vida e a obra de autores como Ziraldo e Maurício de Souza, pode-se constatar os

benefícios que o laptop proporcionou ao ensino, através das pesquisas na internet realizadas

em dupla, da organização das informações no software KWord, da socialização dos achados e

das discussões suscitadas em momento especial destinado a isso.

Além disso, foi possível constatar, como explicitado na sequência didática e nas

observações relatadas do Quadro 01, que em toda a aula as professoras se preocuparam com

as questões técnicas dos laptops. Foram distribuídos aos alunos laptops totalmente carregados.

As professoras diminuíram a quantidade de laptops (os alunos trabalharam em duplas ou

trios), de modo a não sobrecarregar a rede e garantir, assim, que a conectividade ocorresse de

forma simultânea e satisfatória para os alunos.

As atitudes descritas revelam uma preocupação das docentes em incorporar um novo agir

pedagógico com uso das TICs. Mostram, desta forma, a restruturação de um habitus,

modificado frente aos novos conhecimentos adquiridos, e as relações estabelecidas com um

determinado campo – neste caso, a escola em geral e o contexto do projeto UCA –, que as

estimulam continuamente a mudar atitudes e concepções. Constrói-se, assim, uma nova

subjetividade, marcada pela adoção de novos esquemas de apropriação e percepção das

tecnologias.

Por fim, entendemos que o empenho dos professores em experimentar e construir novas

formas de executar seu trabalho, e assim mobilizar novos saberes, é o caminho para refletir,

argumentar e experimentar novas realidades sociocognitivas. É precisamente neste

intercâmbio entre educação e Tecnologias da Informação e Comunicação, que o professor,

por meio de interações simbólicas entre sujeitos, máquinas, conteúdos e aprendizagens, cria e

recria valores e crenças e constrói sua identidade docente.

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5.2.3 Os saberes da profissionalização

Encontramos ainda nos discursos dos docentes referências de saberes construídos em

função do aperfeiçoamento da formação profissional. A esses saberes (re)construídos a partir

o processo de apropriação tecnológica e da conscientização do professor do seu ofício,

denominamos saberes da profissionalização.

Verificamos, dentro desta categoria, saberes que se reconstroem continuamente na vida

dos professores e que foram assinalados e acentuados no contexto de apropriação tecnológica

apontada pelo Projeto UCA. São eles: reflexão, transformação, novas linguagens, superação,

aprendizagem e transformação de novas práticas pedagógicas, além de conscientização sobre

a necessidade de mudança. Podemos visualizar esses saberes através de algumas falas dos

professores:

Busco sempre uma melhor interação com os alunos. Hoje em dia não dá mais para

você ser um professor que apenas ensine as matérias, você tem que buscar outras

formas de interagir com eles e a tecnologia está aí. (PROFESSORA FLOR, Ensino

Fundamental II)

O laptop é uma ferramenta a mais que a gente pode utilizar em sala de aula. Ele foi

uma ferramenta de inserção social também, motivou minha busca para aprender, de

melhorar enquanto pessoa e profissional. Ele veio como uma mola mestre para nos

dizer que precisamos melhorar. O UCA veio para refletirmos. (PROFESSORA

ROSA, Ensino Fundamental II, Ensino Médio)

O UCA trouxe renovação, a busca pelo fazer novo, pelo diferente, pela nossa

qualificação profissional. (PROFESSORA ANGÉLICA, Fundamental I)

O UCA trouxe mudanças para um ensino melhor, facilitando a aprendizagem do

aluno. Nos forçou e nos motivou a buscar mais conhecimentos na área tecnológica

para poder utilizá-los em nossa pratica pedagógica. O UCA nos deu um instrumento

para trabalharmos melhor com os estudantes. Apesar do problema que nós temos

com a conectividade (internet), nós temos um grande instrumento para facilitar o

ensino e o aprendizado. (PROFESSOR CRAVO, Ensino Fundamental II, EJA)

A necessidade e a busca pela qualificação profissional fica evidente nesses discursos. Ser

professor no contexto atual exige do profissional, além de outros aspectos, criatividade e

ousadia, aliadas à mobilização de diferentes saberes. A responsabilidade do docente em se

qualificar acentua-se na era do conhecimento, na denominada “sociedade inteligência”

(GORZ, 2005), em que se presenciam constantes mudanças sociais, avanços tecnológicos e

maior quantidade de informações para ser assimiladas e tratadas à luz da reflexividade.

Nesse contexto, a formação continuada em prol da profissionalização da categoria vem

assumindo posição de urgência (PERRENOUD, 2001), pois busca promover condições ideais

que venham garantir ao professor um exercício profissional de qualidade.

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É importante destacarmos que a própria necessidade de profissionalização da docência

incentiva a criação de políticas públicas destinadas à formação de professores. O Projeto Um

Computador por Aluno configura-se, dentro da Escola Estadual Maria Cristina, como um

elemento possibilitador desta formação e qualificação profissional.

Segundo Ramalho et al (2003), o fenômeno da profissionalização traz consigo a

necessidade de uma restruturação dos modelos formativos e das políticas de aperfeiçoamento

e fortalecimento da profissão do professor. Para os autores,

Pensar o professor como um profissional, trabalhar na perspectiva da docência como

profissão, implica reconhecê-lo como produtor de sua identidade profissional. A

preocupação de se discutir a profissionalização docente e a sua identidade enquanto

profissão implica conhecê-lo como produtor de sua identidade profissional.

(RAMALHO et al, 2003, p . 19)

Os discursos apresentados mostram professores dispostos a aprender e assim, ressignificar

sua identidade profissional, melhorando e a transformando o exercício da profissão. A busca

pela qualificação permanentemente é uma forma de melhor exercer sua habilitação

profissional, é ir à busca de sua profissionalização. Um das professoras acrescenta:

Essa experiência me possibilitou refletir e rever minha postura enquanto professora.

Eu preciso ser mais investigadora. Preciso estudar mais, preciso aprender mais e me

preparar. Eu vejo tudo isso, essa questão de você ter que investir mais em sua

formação também. A gente saiu um pouco do livro didático, saiu um pouco do

quadro, do copiar e passou a ter esse olhar mais investigativo, de buscar em outros

meios, outras fontes de aprendizagem, outros caminhos e possibilidades.

(PROFESSORA ROSA, Ensino Fundamental II)

É possível perceber no discurso o desejo da professora de investir em sua carreira, sair das

práticas habituais e buscar novos meios de mediar o conhecimento junto aos alunos. Além

disso, podemos inferir, por meio dos discursos desta categoria de saberes, que estamos diante

de uma amostra de professores abertos à inovação e à formação e receptíveis à adoção de

mudanças em suas práticas, apesar de existirem dificuldades na apreensão do saber técnico

que envolve o manuseio dos laptops do UCA e da integração deste saber com os métodos de

ensino.

Dentro do contexto do Projeto Um Computador por Aluno, na Escola Estadual Maria

Cristina, os professores revelam-se profissionais abertos ao novo conhecimento, preocupados

com a necessidade de mudanças no seu saber-fazer. Isso denota uma atitude positiva, pois

demonstram entender a profissionalização do ensino através da sistematização de novas

práticas.

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É relevante ressaltar que embora a profissionalidade do educador seja alcançada por meio

dos conhecimentos especializados e formalizados em disciplinas científicas em uma longa

formação de alto nível, os conhecimentos profissionais são essencialmente pragmáticos

(TARDIF, 2000). Dessa forma, acreditamos que é na tentativa diária e com ousadia que os

docentes estão tentando agregar o laptop à sua prática pedagógica. Aos poucos, eles vão

reinventando seu exercício, no fazer de cada dia junto a seus alunos e demais atores escolares.

Podemos observar ainda, por meio da análise, que ao formar/reformar saberes da

profissionalização, por meio de sua vivência em sala com o uso dos laptops, os professores

estão paulatinamente desconstruindo práticas tradicionais, internalizadas/consolidadas por

eles através do tempo e do contexto de trabalho, como é o caso de uma das professoras

investigadas. Ela fala:

Eu devo muito do que sei à formação do Projeto UCA. Eu sempre tive computador

em minha casa, há mais de 10 anos, mas nunca me interessei em pegar, eu tinha

medo da tecnologia, por eu ter tido uma formação “capenga”. Na verdade, eu tinha

medo, eu não queria de jeito nenhum isso para mim. Então, quando eu me vi

obrigada a ter que trabalhar com o UCA, eu me desafiei e eu estou conseguindo. Eu

planejo minhas aulas e faço os exercícios no laptop UCA. Agora ainda não consegui

desenvolver, porque tem uns probleminhas aqui que ainda preciso aprender. Mas na

hora que eu aprender, eu estou pronta para dar uma aula. Eu já pesquiso na internet

para dar minhas aulas. (PROFESSORA GIRASSOL, Ensino Fundamental II)

O Projeto UCA caracteriza-se, neste caso, como um espaço para estabelecer novas formas

de relações de produção do conhecimento, novas formas de interação entre professores,

tecnologia e contexto de sala de aula, portanto, novas relações sociotécnicas.

Ainda nessas narrativas, observamos a “desincorporação seguida da reincorporação de

formas sociais” (GIDDENS, 1991), ou seja, a incorporação de outros costumes, práticas e

consciência condizentes a um outro momento histórico cultural. Segue mais um discurso: “O

UCA veio para refletirmos, para desconstruir práticas, construir outras. A gente precisa

construir novos paradigmas de ensinar, aprender e de viver”. (PROFESSORA ROSA,

Fundamental II, Ensino Médio).

Por fim, acreditamos que a categoria de saberes da profissionalização, advindo da

apropriação tecnológica propiciada pelo projeto UCA, esteia-se como uma mola propulsora

de mudança nas práticas pedagógicas dos professores. Apesar de alguns poucos professores

levarem e experimentarem os laptops em sala de aula, visto que ainda falta segurança na

mobilização dos saberes técnicos com os saberes didáticos metodológicos, eles apresentam

em seus discursos a vontade de mudança, de reinventarem suas práticas.

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Apresentam, ainda, uma reflexividade individual que os leva a questionar suas práticas.

Contudo, para Perrenoud (2002), a verdadeira prática reflexiva pressupõe uma permanente

postura reflexiva, uma forma de identidade, um habitus, e o que observamos com o advento

do Projeto UCA e seu curso de formação de professores foi uma reflexividade que se

caracteriza como “episódica” (PERRENOUD, 2002). Ou seja, não encontramos no contexto

investigado uma reflexividade permanente, mas sim uma reflexão ocasionada pelo surgimento

de eventos/obstáculos encontrados eventualmente no cotidiano escolar.

Os discursos apresentados em cada categoria de saberes, junto com a observação da

dinâmica interacional envolvendo os 17 professores investigados, formam as inferências que

encontramos, as quais resultaram na categorização de alguns saberes (saberes técnicos,

saberes didático-metodológicos e saberes da profissionalização) que esses profissionais

passaram a pensar e a adotar ainda no processo de apropriação tecnológica propiciado pelo

ambiência do Projeto Um Computador por Aluno.

São inferências, transfiguradas em saberes, que nos proporcionaram enxergar o impacto

que o projeto UCA vem trazendo a categoria docente que aderiram à cultura digital na

experiência do Projeto UCA.

Contudo, descobrimos, ainda, que nos discursos proferidos pelos docentes foram

apresentados marcas de interação e transformação das relações sociotécnicas. São marcas que

revelam modificação de compreensão sobre a influência das TICs em suas vidas. Novas

formas de interação nasceram decorrentes de um processo de reflexividade em cada um

desses docentes.

5.3 A reflexividade e as marcas de transformação das relações sociotécnicas

O contexto tecnológico em geral, em especial a cultura digital que o Projeto Um

Computador por Aluno, propicia novas redes de relações sociotécnicas. Essas redes de

relações incitadas pelo contexto do projeto UCA ultrapassam os limites do sistema escolar e

ganham amplitude na vida cotidiana do professor:

A separação entre sujeito e objeto tão propalada na modernidade cai por terra nos

tempos atuais. Nesta época, há um congraçamento, não sem grandes preocupações,

entre o sujeito e o objeto [...]. Os novos modos de subjetivação estão contidos em

um amplo contexto que congrega máquinas, instrumentos cognitivos, afetos,

trabalho, pensamento, enfim, um grande mosaico que se amplia a cada dia com o

auxílio das tecnologias da comunicação. (MENDONÇA, CASTRO, 2013, p.158)

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Obedecendo a esse contexto entre o entrelaçamento do saber técnico e das relações

sociais, registramos alguns discursos dos docentes que retratam as transformações das

relações sociais advindas, requeridas pela apropriação da cultura digital:

Eu me sinto buscando e utilizando os meios tecnológicos que nos são

disponibilizados. Aproveitando e aplicando em tudo aquilo que existe na nossa vida.

(PROFESSORA AMARILLYS, EJA)

Eu utilizo todos os meios tecnológicos, inclusive a internet, que é o que mais

utilizamos. Uso computadores e laptops. Eu me sinto integrado a essa cultura da

tecnologia. No projeto UCA nós vamos buscar conhecimentos para poder aplicar no

nosso dia a dia. (PROFESSORA ROSA, Fundamental II, Ensino Médio)

O UCA trouxe progresso, desafios, oportunidades, confiança, autoestima para escola

e para mim enquanto pessoa e profissional. (PROFESSORA ANGÉLICA, Ensino

Fundamental I)

Minha inserção social melhorou, com certeza. Hoje tenho curiosidade pelo

aprendizado tecnológico, para que assim, haja essa inserção digital que a sociedade

exige. (PROFESSORA LUZ, Ensino Fundamental I)

O UCA fez com que eu buscasse mais a tecnologia. Porque há um acomodamento

grande do profissional e eu quebrei isso. Todo o profissional que participou da

formação UCA procurou estudar e correr atrás, porque senão ficava parado no

tempo. (PROFESSOR CRAVO, Fundamental II, EJA)

O bom são os aprendizados do dia-a-dia quando usamos os laptops. Comparo a uma

criança quando está aprendendo. O aprendizado cria autoestima. Ao ensinar os

outros, ficamos felizes. É desse jeito que ocorre! Não podemos deixar que o Projeto

UCA fique no caminho, precisamos continuar com a prática de uso dos laptops com

essas crianças, pois o UCA trouxe desenvolvimento. (PROFESSORA JASMIM,

Ensino Fundamental I e II)

Acreditamos que os discursos dos professores refletem atitudes e ações condizentes com

os saberes apreendidos com o processo de apropriação da cultura digital, estimulada pelo

Projeto UCA. São, dessa forma, espelhos de uma reflexividade, decorrentes da apropriação

das práticas sociais intercedidas pelo contexto UCA.

Ainda nos discursos acima, percebemos que os professores expõem suas emoções ao

adentrar um novo locus, formado pelo espaço virtual das redes da informática e o espaço da

vida social urbana, ou seja, entre o saber técnico e o contexto social. Desta feita, a construção

dessa relação entre o social e a técnica agrega valores sentimentais aos docentes, como o

aumento da autoestima, da confiança e felicidade.

Verificamos que a apropriação de um novo dado e contexto faz com que o professor

participe e usufrua de diferentes modos das práticas sociais, produzindo assim diferentes

formas de produção de sentido e de pertencimento. Revela ainda um empoderamento do

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professor, no sentido de que o processo de apropriação dá a ele margem para desenvolver e

potencializar sua capacidade de criar e de reinventar práticas sociais.

Para Freire (2011), o empoderamento é um processo que emerge das interações sociais nas

quais os seres humanos são construídos, à medida que, criticamente, problematiza a realidade.

Para o autor, é a partir desta problematização que os sujeitos conscientizam-se, desvendando

assim suas ideologias, seus gostos, suas formas de entender e enxergar o mundo ao seu redor.

É essa conscientização que dá poder ao sujeito para transformar suas relações sociais.

Os docentes ainda elaboram discursos onde estão presentes ideologias e pertenças

identitárias que se estabelecem na apropriação da cultura digital. Dentro do contexto do

Projeto UCA, os professores reafirmam seus laços nas relações cotidianas, criando novas

existências, surgindo desta forma uma transformação em seu meio e nas relações que

estabelecem com o social.

Podemos acrescentar que os discursos convergem para práticas sociais midiatizadas na

ambiência do professor, que demonstram a inserção dos docentes na cultura digital. Tais

narrativas revelam um novo habitus (Bourdieu, 1999), formalizado na expressão dialógica do

estar no meio social. Apresenta a troca contínua e recíproca entre o mundo objetivo e o

mundo subjetivo das individualidades dos sujeitos.

Há, nesse contexto, uma relação dialética entre o docente e a sociedade, uma relação de

troca entre o habitus individual de cada professor e a estrutura de um campo socialmente

determinado. Portanto, as transformações sociocognitivas refletidas nos discursos dos

professores são produtos do contexto a que estão vivenciando.

Observamos ainda entre os professores atitudes de reflexividade cognitiva que vão de

encontro ao conceito de auto reflexividade de Giddens (1991). Para o autor, esta reflexividade

é própria da modernidade, seria um movimento imanente do próprio processo de

modernização na vontade livre do sujeito, sendo o processo de autorreflexividade de natureza

essencialmente cognitiva.

Os discursos mostram uma reflexividade que aparece de forma isolada no contexto

analisado - individualizada, como um processo de voltar-se para si mesmo, sobre as

construções sociais, sobre as intenções, representações e estratégias de intervenção. Nessa

forma de reflexividade, está suposto a possibilidade de utilizar saberes à medida que o mesmo

vai sendo produzido, para enriquecer e modificar não somente a realidade e representações de

cada professor, mas também as próprias intenções e o próprio processo de conhecer

(LIBÂNEO, 2010).

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Nesse sentido, a reflexividade empreendida pelos professores sugere a tomada de

consciência dos próprios atos, pensando sobre os saberes adquiridos na experiência UCA,

sobre as ideias decorrentes da apreensão desses saberes, de forma a analisá-las e modificá-las

de acordo com a realidade de cada um.

Contudo, Libâneo (2010), ao refletir sobre o papel da reflexividade na formação de

professores, afirma que este processo reflexivo deve tomar proporções maiores. Para ele, a

reflexividade deve abarcar uma visão crítica da realidade. Isso significa considerar:

Determinantes políticos e socioculturais, não apenas no sentido externo de que as

decisões tomadas na escola e nas salas de aula são decisões políticas, mas também

no sentindo interno de que as próprias práticas de ensino, de gestão, de convivência,

são políticas. Nesse sentido, para além de uma reflexividade cognitiva, é preciso

reflexividade comunitária, a reflexividade compartilhada. (LIBÂNEO, 2010, p. 77)

Libâneo (2010) pensa em uma formação de professores pautada na reflexividade

comunitária e compartilhada. A formação proporcionada pelo Projeto UCA, especialmente no

que tange ao módulo de apropriação tecnológica, pouco incitou momentos de auto

reflexividade e de reflexividade entre professores. A troca de experiências e a convivência

pautada na construção de significados e experiências compartilhadas entre os docentes a partir

de visões diferentes pouco ficam evidentes nos discursos apresentados. Questionados sobre o

impacto da formação UCA na prática pedagógica, de forma a realizarem uma autocrítica e

uma autorreflexão, os professores expõem:

Minha experiência foi péssima. Foi um ano muito corrido para mim, então, a

avaliação que eu faço é minha mesmo junto aos meus alunos. Eu não tive como

render mais, porque não foi dado tempo para dividir experiências e planejar. Então,

tive que improvisar aulas e quando eu planejei não deu certo. A minha avaliação não

é boa. Eu podia render mais, só que o fator tempo/oportunidades atrapalhou

bastante. (PROFESSOR CRAVO, Ensino Fundamental II, EJA)

Nós temos certeza que a escola não está tão atraente como era naquela época. Hoje,

até com a tecnologia, a escola deixou de ser atraente para o aluno, mas nós estamos

tentando implantar, trazer a tecnologia para a escola com o Projeto UCA. Só que

falta estrutura, falta apoio, falta tempo para planejar e oportunidade de trocar

experiência. Um exemplo está aqui nesse Projeto UCA. Nós utilizamos

pouquíssimo. Quando a gente levou para sala de aula não conseguia usar a

ferramenta porque a internet não prestava. Falta estrutura para esse projeto!

(PROFESSOR CRISÂNTEMO, Ensino Fundamental II)

A formação ficou um pouco a desejar. Não se pensou em um grupo de professores

para dialogarem entre si. Professores que não estavam preparados na questão do

conteúdo, não se pensou em fazer oficinas. Eu acho que faltou troca de práticas. Pelo

menos, nos momentos que eu vim, nós não fizemos isso, simplesmente discutimos

algumas coisas do projeto, mas não isso. Deveriam ter pensando nesses professores

com mais de 20 anos de profissão e nesses que estão vindo agora que não sabem

nem ligar o computador direito, como vão ligar o computador, como vão digitar um

texto. (PROFESSORA MARGARIDA, Ensino Fundamental II, Ensino Médio ,

EJA)

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Observamos de fato uma reflexividade individual na categoria de docentes, como

analisado anteriormente, mas percebemos ainda que os discursos acima denotam a fragilidade

do projeto em não mediar encontros para compartilhamento de informações e práticas. Pelo

que percebemos, para alguns professores o fato de não haver sistemática para encontros de

compartilhamento de experiência faz com que a formação de professores pautada pelo Projeto

UCA sofra críticas por parte de alguns docentes.

O momento de compartilhamento de experiências com uso do laptop UCA é um passo

importante no processo de formação dos professores, pois acreditamos que são nesses espaços

que se desvendam redes de significados produzidos nas relações que os professores

estabelecem entre os alunos, os laptops, o contexto escolar e o de ensino-aprendizagem como

um todo.

Um espaço para partilhar experiências pedagógicas com uso do laptop UCA abre

caminhos para que se possam criar momentos de reflexão sobre as práticas pedagógicas

efetivadas com este recurso tecnológico, pois “cada professor tem o seu modo próprio de

organizar aulas, de se movimentar na sala, de se dirigir aos alunos, de utilizar os meios

pedagógicos.” (NÓVOA, 2007, 16).

Portanto, ao partilhar o seu modo próprio de agir em contexto de sala de aula, inclusive o

seu modo de agir pedagógico com uso dos laptops, como também ao exercitar sua escuta,

compreendendo e internalizando as práticas dos demais profissionais, o professor pode

aprender, refletir e ressignificar conceitos, de modo que essa reflexão - e ressignificação -

resulte em transformações em seu modo de agir e estar no mundo. Tais transformações se

refletem também em sua prática docente.

Instaura-se, assim, um processo de reflexividade, onde os docentes, ao dialogarem sobre

as práticas pedagógicas efetivadas com o UCA, narrando e escutando as experiências dos

demais professores, constroem e partilham de novos saberes. Ao redefinirem coletivamente

tais saberes, práticas são reinventas e criadas à luz da aquisição de novas informações.

Para Giddens (1991), a reflexividade é base para reprodução de um dado sistema, entre

eles o sistema escolar, onde os atos de pensar e agir estão constantemente refratados entre si.

Assim sendo, as práticas sociais, até mesmo as estabelecidas no âmbito escolar, podem ser

reconstruídas por meio de novas informações/saberes sobre as próprias práticas. Portanto, o

diálogo/compartilhamento dessas práticas é um incentivo à pratica da reflexividade, tanto

individual como comunitária.

A reflexividade, desta forma, estimula o processo de transformação das relações sociais do

indivíduo ao fazer com que ele seja levado a uma situação de conflito cognitivo, onde novos

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saberes da vida social dividem o mesmo espaço com antigas formas de enxergar o mundo.

Dessa forma, as relações que estabelecemos com o meio e em especial com as TICs,

modificam-se por meio do processo de apropriação, resultando assim em novas relações

sociotécnicas.

Quando traçamos as categorias de saberes, mostramos discursos onde são apresentadas

marcas das interações e de transformações das relações sociotécnicas. Nesses discursos, foram

percebidas, por meio da interação dos professores com os recursos digitais do Projeto UCA,

mudanças com relação ao comportamento do docente quanto à sua atuação em sala de aula,

que denota atitude de conscientização sobre a necessidade desta mudança. Expõe, ainda,

marcas de transformações advindas da aprendizagem de novas habilidades para buscar

múltiplas linguagens, além de expor transformações relacionadas a novas formas de agir,

planejar e se organizar.

Pesquisas na internet, uso das TICs para fins educacionais, busca pela melhoria da

interação aluno, professor e tecnologias, inserção social, buscar ser melhor como pessoa e

como profissional da educação, renovação do saber-fazer e a busca pela qualificação

profissional por meio da introdução das TICs no processo de formação são, em síntese, as

marcas de interação e transformação das relações sociotécnicas no ambiente educacional

analisado, o qual adere à cultura digital na experiência do Projeto UCA.

Inferimos, portanto, que essas marcas de interação do professor com a tecnologia e destes

com o processo de ensino-aprendizagem, bem como as transformações das relações advindas

dela, estão impregnadas nos discursos dos professores. São marcas desenvolvidas a partir de

uma auto reflexividade, individual e personalizadas, que resultam em saberes apreendidos

decorrentes também do processo de apropriação tecnológica estimuladas no contexto UCA.

Observamos que a ambiência do Projeto UCA, especialmente a formação de professores

empreendida pelo mesmo, possibilitou ao professor se tornar sujeito da ação. Fato este que fez

os professores irem além do que estava posto, ou seja, procurar ou mesmo entender que é

preciso se transformar e crescer como pessoa e profissional. Isto se constitui em um dos

primeiros passos na busca pela transformação de suas relações sociais, em que as TICs se

tornam cada vez mais presentes.

Desta forma, compreendemos que as marcas de transformações das relações sociotécnicas

surgem para mostrar que os professores, e até mesmo a Escola Estadual Maria Cristina como

um todo incorporaram algumas das possibilidades oferecidas pelos recursos digitais da

ambiência UCA, incitando a construção de novas subjetivas e novas práticas sociais.

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As mudanças estruturais na educação, dentre elas as que ocorrem por meio da inserção de

políticas públicas na área da inclusão digital e formação de professores, como no caso do

Projeto um Computador por Aluno, parece evidenciar conflitos e dilemas, mas também

apresentam oportunidades de recuperação de valores positivos, como os da autonomia, da

criatividade, da reflexividade, de compartilhamentos e da necessidade de melhoria do

desempenho profissional, especialmente quando tais valores passam a ser percebidos

associados às práticas da vida cotidiana.

Neste sentido, os novos saberes, (re)construídos no contexto específico da nossa

investigação, podem ser compreendidos como decorrentes de uma determinada apropriação

ideológica da tecnologia, resultando em um novo ativismo pedagógico fundamental para a

renovação da ação educativa.

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6 CONSIDERAÇÔES FINAIS

As Tecnologias da Informação e Comunicação exercem cada vez mais influência nas

ações da vida humana. Emprego, saúde, entretenimento e educação, entre outros âmbitos da

sociedade, trazem a tecnologia em seu cerne. Surge, nesse contexto, o entrelaçamento do

espaço virtual, propiciado pelas redes da informática, e o espaço da vida urbana, resultando,

numa cultura digital na qual se mescla a técnica e o social. Tal cultura nos faz repensar

diversos domínios da sociedade, dentre eles a educação.

Assim sendo, buscamos compreender como a conjuntura tecnodigital intervém na

(re)construção do contexto educacional, especialmente no que tange ao oficio do profissional

da educação. Sinalizamos que a chegada da “Sociedade do Conhecimento” (Gorz, 2005), ou

mesmo da “Sociedade em Rede” (Castells, 1999), ocasiona o surgimento de novas

necessidades educacionais. Dessa forma, a escola, o ensino, o aluno e o professor têm seus

papéis reestruturados. Destacamos, nesse sentido, o papel do professor, por entendermos que

as mudanças no perfil do profissional da educação estão relacionadas à aquisição ou à

reconstrução de saberes para ensinar, os quais precisam dar conta das recentes demandas

sociais, econômicas e culturais.

Contudo, evidenciamos que a (re)construção desses saberes não implica apenas introduzir

a tecnologia na sala de aula, mas sim, trata-se de uma verdadeira transformação no ato de

ensinar. Essa transformação vai além de mudanças no espaço físico onde as TICs são

incorporadas. A nova situação didática requer, antes de tudo, uma revisão da prática e saberes

para ensinar com uso das tecnologias. O professor precisa ser preparado, pois é figura de

destaque na mediação conteúdo, TICs e alunos.

Apontamos que o quadro de formação de professores no Brasil, a partir da LDB 9.394/96,

artigo 62, sofre mudanças ao ser gerada uma política de complementação da formação do

educador, por meio de ações de formação continuada e capacitação dos profissionais do

magistério, inclusive através do auxilio de recursos e tecnologias à distância.

A promulgação desta lei gerou implicações na formação dos educadores brasileiros,

inclusive, decorreu-se a partir dela, a instituição de mais alguns documentos norteadores

como, por exemplo, os Referenciais para Formação de Professores e as Diretrizes

Curriculares Nacionais para Formação de Professores da Educação Básica, ambos no ano

de 2002.

Os documentos citados inserem no bojo de suas discussões um outro olhar acerca da

formação de professores. Acreditamos que o intuito de tais documentos é permear discussões

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e ações políticas que propiciem pensar e efetivar o redimensionamento da profissão,

edificando, assim, maneiras de intervir e melhorar a ação docente por meio de uma educação

continuada.

Seguindo esse movimento de educação continuada, juntamente com a ampliação das

relações sociotécnicas provocadas pelas TICs, surgem projetos e programas governamentais

que visam integrar as tecnologias à educação, em busca da inclusão digital dos atores

escolares. Contudo, destacamos que, diante de tal contexto, torna-se imperativo pensar

também em uma formação de professores para uso das TICs nas escolas. Sendo assim,

inferimos que políticas públicas de qualificação profissional voltadas para os educadores são

indispensáveis aos projetos de inclusão digital nas escolas.

Detemos-nos a analisar o Projeto Um Computador por Aluno (UCA), uma das iniciativas

políticas de integração tecnologia e educação que constitui em uma ação afirmativa do

Governo de incentivo à inclusão digital. Aspectos como mobilidade, conectividade sem fio,

integração das mídias digitais e imersão na cultura digital são basilares na constituição do

projeto.

No processo de concepção do Projeto UCA, foi pensada também uma política de

qualificação profissional. Assim sendo, foi desenvolvido um plano de qualificação docente

para uso das TICs em sala de aula, com ênfase no uso dos laptops de baixo custo provenientes

do projeto.

O plano de formação de professores foi desenvolvido com o intuito de criar uma rede de

apoio às escolas que implementaram o Projeto UCA. A formação foi pensada de forma a

ocorrer na modalidade semipresencial, sendo os conteúdos organizados em forma de módulos

de formação. São ao todo cinco módulos que se propõem a efetivar: a apropriação tecnológica

dos recursos digitais, atualização do Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola, de forma a

inserirem as TICs e em especial o Projeto UCA nas discussões implementadas neste

documento, além de fazer com que os professores elaborem planos de aulas com o uso dos

laptops.

Dentre esses módulos de formação, lançamos um olhar mais atento ao de apropriação

tecnológica, por entendermos que este é um aspecto importante em uma formação que

possibilite o uso didático das tecnologias na educação. Acreditamos que o módulo de

apropriação tecnológica, além de propiciar que os professores aprendam a lidar com técnica,

deve também ser um momento inicial para que o docente principie a tomada consciência

como partícipe de uma cultura digital.

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Assim sendo, consideramos o plano de formação de professores o ponto principal de

análise deste trabalho, pois inferimos que a formação oferecida aos docentes para uso dos

laptops de baixo custo é o elemento inicial para impulsionar o uso didático das TICs, além de

ser a atividade que irá propulsar a aquisição e/ou reconstrução de saberes para ensinar, pois

estamos diante de uma nova conjectura de obtenção e mobilização de saberes.

Dentro desse contexto de obtenção de mobilização de saberes para ensinar, discutimos a

perspectiva de Tardif (2000, 2011), Pimenta (2009) e Gauthier et al (1998), com a intenção de

mostrar que os saberes do professor não repousam na reprodução de práticas construídas por

determinados especialistas em educação, distantes do contexto real do processo de ensino. O

professor possui saberes próprios, personalizados e interligados a um contexto específico de

escola, de sala de aula, de alunos, de vida. Ressaltamos, ainda, que os saberes docentes

possuem uma origem social, por estarem sendo apreendidos por meio das interações e

compartilhamentos, além de se modificarem/evoluírem com o passar do tempo considerando

as mudanças socais advindas.

Dedicamos-nos a apontar ainda que a experiência tem papel fundamental no processo de

construção de saberes do professor, expondo que a experiência construída pelo docente ao

longo de sua caminhada profissional e social configura-se como um núcleo vital para

consolidação de saberes. Ancoramos-nos em Vigotski (2007) para explicar que é no processo

de interação homem-ambiente, mediados por instrumentos e signos, que o indivíduo constrói

significados e adquire saberes e desenvolvimento cultural. Além disso, recorremos a John

Dewey (1978), pois o autor defende a experiência como base para aprendizagem humana.

Realçamos em nossa tese que a aquisição e reconstrução de saberes para ensinar está

intrinsecamente interligada ao aspecto dinâmico da experiência dos professores. Além disso,

acrescentamos que é na internalização dos saberes apreendidos e na recorrência da

mobilização desses saberes na experiência como educador que existe a possibilidade de

incorporação de um novo habitus (Boudieu, 2011), ou seja, ao internalizar um conjunto de

competências e habilidades o professor pode incorporá-las em seu imaginário e as reproduzir

em suas práticas sociais/profissionais.

A possibilidade de assunção desse novo habitus e a reconstrução dos saberes para ensinar

advém de um processo de apropriação cultural - neste caso, a cultura digital que o Projeto

UCA está proporcionando aos docentes. Sobre o conceito de apropriação, recorremos a

Coelho e Freire Filho (2011), os quais entendem a apropriação como uma história social de

uso e interpretação dos objetos referendados nas práticas sociais. Acrescentamos ainda que o

processo de apropriação da cultura digital leva em consideração o sentido que as TICs trarão

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para a vida social e profissional do educador, a partir da experiência deste com os meios

digitais.

Sobrepomos em nossa tese que a reconstrução e mobilização de saberes para ensinar,

construídos na experiência dos professores, com vistas a impulsionar a descoberta de novo

habitus, nascem a partir de um processo de reflexividade. Entendemos que as subjetividades

dos professores ao adentrar um novo universo de saberes e aprendizados estão sendo

reestruturadas de forma a acomodar um novo dado, ou uma nova informação. Valemos-nos do

conceito de reflexividade de Giddens (1991), o qual afirma que a reflexividade consiste no

exame contínuo das práticas sociais à luz de uma informação renovada sobre essas próprias

práticas sociais, alterando, desta forma, o caráter das relações sociais estabelecidas com meio.

Além de Giddens (1991), recorremos a Libâneo (2010) para explicar que o processo de

reflexividade não pode ser entendido de forma reducionista. Para o autor, uma formação de

professores deve ser pautada na reflexividade comunitária e compartilhada, em que se

pressupõe a troca de experiências e o diálogo. Nesse sentido, para além de uma reflexividade

cognitiva, é preciso uma reflexividade comunitária, a reflexividade compartilhada.

Ressaltamos a conceptualização em torno dos saberes docentes, da experiência, da

apropriação da cultura digital e da reflexividade, para examinarmos a concepção e o

desenvolvimento do plano de formação de professores do Projeto Um Computador por Aluno.

Com o delineamento desses conceitos, nossa intenção foi compreender como se estabelece o

processo de apropriação da cultura digital e (re)construção de saberes para ensinar no

contexto de uso das tecnologias, especialmente no que tange à utilização dos laptops UCA.

Ao desenvolver o capítulo 03, que trata da caracterização do Projeto UCA, sua concepção

e funcionamento, o plano de formação de professores, bem como as ações de formação na

Escola Estadual Maria Cristina, vimos que a infraestrutura para implantação do projeto na

escola, os conteúdos que compõem o módulo de apropriação tecnológica e o (não)

desenvolvimento de algumas ações de formação denotam fragilidade no desenvolvimento do

Projeto UCA.

Especificadamente sobre o conteúdo e módulo de apropriação tecnológica, módulo I do

plano de formação, demonstramos que a significação por trás do termo de apropriação,

impressa no plano de formação UCA, diferencia-se da amplitude do conceito de apropriação o

qual nos ancoramos nesta tese. A dimensão expressa no módulo de apropriação tecnológica

denota um caráter meramente instrumental, uma vez que o conteúdo abarcado envolve apenas

o aprendizado relacionado ao manuseio dos recursos digitais presentes no laptop. Na maioria

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do conteúdo programático, há uma separação do conteúdo técnico da intencionalidade

educativa que deve ter uma tecnologia educacional.

Há desta forma, um descompasso quanto à amplitude de significação do termo em questão

e na sua essência. O módulo de apropriação tecnológica não se deteve nas linguagens

midiáticas e na sua aplicabilidade na prática pedagógica. Dessa forma, entendemos que

faltaram elementos para que o conhecimento técnico fosse relacionado à prática.

Além disso, ajuizamos que a estruturação do currículo do plano de formação UCA está

desprendida do contexto social e cultural da Escola Estadual Maria Cristina. Embora o

professor multiplicador realize as adaptações necessárias, o conteúdo que compõe o currículo

da formação já foi previamente desenhado. Inferimos que esse modelo de currículo não

envolve a parceria de todos que fazem parte do contexto escolar local e que para a formação

dos professores logre êxito e seja participava e motivacional para os docentes, precisa-se do

empenho e da participação de todos no processo de construção e/ou adaptação de conteúdo do

plano de formação.

Acrescentamos que inicialmente as condições de infraestrutura do Projeto UCA na Escola

Estadual Maria Cristina não estavam condizentes com os critérios do MEC para escolha das

escolas que foram beneficiadas com o UCA. Durante os anos 2010 e 2011, período em que o

Projeto estava sendo implantado na escola, não havia ainda a infraestrutura adequada -

faltavam armários para carregamento dos laptops e a conectividade via wireless de forma

simultânea -, ou seja, estava ainda em processo de implantação.

Existiu ainda a falta de tempo para estudo e planejamento de aulas com o uso dos laptops.

Os encontros de formação entre os professores da escola e os multiplicadores ocorrem apenas

uma vez ao mês. São poucos encontros de formação, além de serem em tempos espaçados.

Acreditamos que, se os docentes não adotarem o laptop em seu cotidiano e não se

aventurarem pedagogicamente a experimentá-lo, os conhecimentos adquiridos no único

encontro mensal de formação acabarão se “perdendo”, e as práticas com o uso do laptop

poderão ficar escassas.

Expomos que a presença de tais impasses na execução do projeto nos leva a enxergar no

UCA um contexto adverso à reflexividade e à (re)construção de saberes para ensinar com uso

da tecnologia, representando prejuízos à formação daqueles professores que estão

participando do projeto.

Em nosso capítulo de análise (capitulo 5), nos detemos a investigar, através dos discursos

dos professores e com na base na análise de conteúdo, as inferências que identificam a

reconstrução de saberes requeridos pela apropriação da cultura digital no ambiente escolar, e

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quais as tipologias dos saberes encontradas. Além disso, buscamos investigar também como

são apresentadas as marcas de interação e a transformação das relações sociotécnicas no

ambiente educacional analisada.

A análise do conjunto de mensagens proferidas pelos professores, coletadas por meio de

entrevistas individuais, grupos focais e observações de algumas aulas onde o uso dos laptops

se fazia presente, fez possível identificarmos um conjunto de discursos que guardavam entre

si semelhanças quanto ao seu conteúdo. O método de análise de conteúdo nos auxiliou na

sistematização desses discursos e na transformação dos mesmos em categorias de saberes,

saberes estes mobilizados pelos professores a partir da premissa da apropriação tecnológica,

propiciada pelo contexto do Projeto UCA.

A análise revelou que foi a partir do processo de apropriação construído a cada encontro

de formação UCA e pela experiência de uso do laptop em sala de aula que os professores

desenvolveram saberes inerentes a um contexto particular de uso das TICs. Os saberes

mobilizados, reconstruídos pelos docentes, surgem a partir de uma forma particular de uso e

compreensão das tecnologias. Nesse sentido, a experiência de cada professor, como também a

reflexividade que cada um deles empreendeu foram decisivos no processo de revisão de

saberes para ensinar.

É importante frisarmos que compreendemos a tipologia de saberes revelados neste

trabalho, através do método de análise de conteúdo, como habilidades e competências com as

quais os professores de alguma forma já são familiarizados - seja pela experiência deles como

educadores, seja por já mobilizarem tais saberes na prática pedagógica ou até mesmo por

entenderem a importância dessas tipologias de saberes para o contexto de ensino

aprendizagem -. Contudo, o surgimento do Projeto UCA, bem como a inserção dos

professores em um curso de formação para uso das TICs na educação, os fez ampliar a

significação desses saberes. Ou seja, acreditamos que esses saberes foram ressignificados à

luz das novas informações apreendidas e colocadas em um determinado grau de importância

quando se introduz em seu ofício um ambiente informatizado, como o propiciado Projeto.

A análise mostrou que, dentro da ambiência UCA na Escola Estadual Maria Cristina, os

professores destacaram conteúdos referentes à instrumentalização técnica para uso do laptop,

à didática e aos procedimentos metodológicos, bem como à profissionalização do ofício do

professor. Assumimos esses conteúdos como categorias de saberes e os tipificamos como:

saberes técnicos, saberes didático-metodológicos e saberes da profissionalização.

Em relação aos saberes técnicos, encontramos inferências que se referem à manipulação

do laptop (hardware), às aprendizagens (e dificuldades de aprendizagem) de softwares e ao

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uso da internet. Sobre essa tipologia de saberes, foram apresentados alguns discursos que

ilustram como os professores mobilizaram esses saberes.

Mostramos, ainda, que nessa tipologia de saberes o aprendizado da técnica se torna

imprescindível ao docente, quando é feito o uso das TICs em sala de aula. Compreendemos

que saber manusear tecnicamente um recurso digital, o qual você se dispõe a usar em sala de

aula, torna-se indispensável para se elaborar estratégias pedagógicas significativas com uso

das tecnologias. Ademais, afirmamos que, da mesma maneira que o professor respeita as

peculiaridades do ensino, é necessário que ele também perceba e respeite as peculiaridades da

própria tecnologia, entre elas esta a sua técnica. É interessante que o professor se questione da

seguinte forma: “como vou manipular o recurso? Como usar determinado software? Quais a

possibilidades que esse recurso oferece? O que ele tem de diferente? Irá agregar valor ao

ensino?”. Esse tipo de reflexão prévia poderá garantir que o uso das TICs realmente faça a

diferença, de modo que o ensino se torne eficaz e motivador. Portanto, o saber técnico é uma

vertente que devemos considerar no processo de ensino aprendizagem que utilizam as TICs

como um elemento mediador.

Além dos saberes técnicos, os professores enfatizaram uma tipologia de saberes que se

referem às mudanças empreendidas ou pensadas pelos educadores, a respeito de métodos de

ensino e didática. Encontramos inferências que acenam para o trabalho pedagógico com o uso

de diferentes linguagens, para mudanças na forma de planejar e executar aulas, à revisão da

prática pedagógica e à elaboração de aulas com o uso da internet. Alguns discursos foram

apresentados para ilustrar essa tipificação de saberes decorrentes do processo de apropriação.

Esses discursos revelaram mudança de compreensão e na própria forma de ensinar e

refletem habilidades e competências acumuladas pelos professores ao longo de um processo

de formação e interação com os saberes técnicos. Assim sendo, exteriorizam novas formas de

ensinar, novos métodos e novas maneiras de compreender o ensino, estando os laptops

influenciando nas ações pedagógicas assumidas. Portanto, a assunção dos saberes didáticos

metodológicos nos faz perceber que os professores estão ressignificando sua prática

pedagógica e, assim, construindo uma nova subjetividade, marcada pela escolha de novos

esquemas de apropriação e percepção das tecnologias.

Há ainda discursos que se remetem a saberes que foram redimensionados em função do

aperfeiçoamento da formação dos professores investigados. São saberes que denotam

conscientização do educador acerca da necessidade de aprimorar seu exercício. Para esse

grupo de saberes, encontramos inferências relacionas à reflexão sobre a prática, a

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transformação de atitudes e de práticas pedagógicas, além de conscientização sobre a

necessidade de mudança.

Ressaltamos, nesse contexto, que ser professor no contexto atual exige do profissional,

além dos saberes curriculares, a mobilização de saberes para lidar com as

imprevisibilidades/desafios do cotidiano escolar. Acrescenta-se ainda a necessidade de

adquirirem competências que os façam lidar com um ambiente ou recurso informatizado, pois

estamos diante de um cenário social mutante, onde presenciamos avanços significativos nas

ciências e nas tecnologias.

Profissionalizar-se é capacitar-se, é aprofundar conhecimentos na área de atuação, e isso

foi possível de identificar nos discursos dos professores. Estamos diante de uma amostra de

professores dispostos a inovar, receptíveis à adoção de novas práticas, apesar de existirem no

contexto do Projeto UCA obstáculos em relação à precária infraestrutura e ausência de tempo

para planejamento de ações com uso dos laptops UCA.

Inferimos, portanto, que os saberes da profissionalização, sucedidos pelo processo de

apropriação da cultura digital, surgem como uma mola propulsora para a estruturação de

transformações nas práticas pedagógicas dos professores e, apesar das experiências com o

laptop UCA serem tímidas, visto a falta de segurança com o saber técnico que envolve a

manipulação do laptop, os professores revelam em seus discursos uma vontade de mudar e de

reinventar-se.

Para além das tipologias dos saberes encontrados, evidenciamos discursos que denotam

reflexividade e transformações das relações sociais dos docentes. São discursos que expõem a

subjetividade dos professores as adentrarem no contexto do projeto UCA. São mensagem em

que se destacam ideologias que se solidificam à medida que eles se apropriam do contexto

digital.

Nesses discursos, evidenciamos uma reflexividade que surge de forma isolada e peculiar,

por não haver espaço/tempo para um compartilhamento desta reflexividade. A reflexividade

empreendida pelos docentes resulta de uma tomada de consciência sobre os próprios atos,

refletindo sobre os saberes apreendidos por meio da inserção do UCA, de forma analisá-los e

internalizá-los de acordo com a realidade de cada um desses professores.

Deste modo, ponderamos que é a autorreflexividade empreendida pelos docentes que

estimula o processo de transformação das relações sociais. Isso foi ilustrado por meio de

algumas falas. Dessa forma, o uso da internet para realização de pesquisas, o uso das TICs

para fins educacionais, a busca para melhoria da interação aluno, professor e TICs, a inserção

social, o qualificar-se profissionalmente e a renovação de saberes são, em suma, resultado das

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marcas de interação entre os docentes e a ambiência UCA, como também das transformações

sociotécnicas estabelecidas.

As ações de inclusão social e o aprimoramento da formação do docente, propiciados pelo

Projeto Um Computador por Aluno, foram importantes para a capacitação dos profissionais,

movimentando transformações na Escola Estadual Maria Cristina em termos de melhoria da

estrutura física da escola. Foram apresentadas aos professores novas opções de recursos para

uso didático: os laptops e seus aplicativos. Aos alunos, foi dada a oportunidade de acesso aos

meios digitais, de ingresso a novas linguagens, de novas formas de se comunicarem e toda

uma motivação para aprenderem e até mesmo irem à escola. Apesar das dificuldades já

apresentadas, o UCA propiciou mudanças na forma de ensinar e de interagir com as TICs a

alunos e professores

O Projeto Um Computador por Aluno, enquanto iniciativa política de inclusão digital

dentro de escolas públicas, deve contribuir para a construção do conhecimento de alunos e

professores. Destacando, nesse contexto, o processo de formação de professores, é preciso ter

o entendimento de que dentro de um processo de educação continuada devem ser

proporcionados momentos para uma reflexividade compartilhada junto ao processo de

autorreflexividade entre os envolvidos no projeto.

Para que se alcancem valores universais comuns na escola, bem como para se conhecer e

compreender os saberes docentes envolvidos no contexto de uso dos laptops UCA, é preciso

ouvir os discursos dos próprios educadores, concebendo os mesmos como produtores de

conhecimento. Para tanto, é necessário que haja momentos de troca, de diálogo e de

planejamento conjunto sobre a premissa de uma reflexividade compartilhada. A

autorreflexividade do professor não resolve os problemas universais do Projeto UCA na

escola. É preciso ir além disso: é necessário empreender estratégias, procedimentos e uma

cultura geral para melhor realizar o trabalho do professor dentro do projeto, aperfeiçoando,

assim, a capacidade reflexiva sobre o que e como mudar.

Desse modo, promover espaços para que os professores possam se mostrar, assumindo a

autoria de seus saberes e de seus discursos é imperativo na execução do Projeto UCA. Essa

iniciativa poderia ampliar a significação das tecnologias para a vida do professor, sanar

dificuldades de manuseio da máquina, motivar e reconstruir práticas pedagógicas com uso dos

laptops, etc., ou seja, refletir não apenas sobre o que está acontecendo no Projeto UCA, mas,

sobretudo, sobre como resolver os obstáculos que estamos enfrentando, internalizando as

novas informações juntos e analisando-as de forma coletiva, com ajuda mútua.

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Por tudo o que foi mostrado aqui, inferimos que as considerações desta pesquisa devem

ser levadas em conta pelas escolas atendidas pelo Projeto Um Computador por Aluno, no

sentido de aprimorar os encontros de formação de professores. A relevância desta tese

consiste em trazer direções para a continuação de ações de formação e nortear o fazer e o

pensar da gestão escolar e dos professores que se aventuram na experiência UCA.

Afirmamos que nosso intuito é colaborar para a inclusão digital de alunos e professores

inserido no UCA, bem como contribuir para a qualidade da formação oferecida aos

professores que se prontificam a participar do projeto. Assim sendo, acreditamos que esta

pesquisa pode vir a ter desdobramentos. Apresentamos algumas sugestões que possam

desencadear novas investigações ou ações, no sentido de disseminar, mas também de estender

as discussões realizadas neste trabalho:

Realização de estudos que possam qualificar o envolvimento e a inserção

digital dos alunos que participam do projeto.

Maior aproveitamento das ferramentas do ambiente virtual e-proinfo. O curso

de formação de professores do Projeto UCA é na modalidade semipresencial. O uso do

ambiente hoje, nas escolas no Rio Grande do Norte atendidas pelo UCA, limita-se à

realização de uploading de atividades. Nesse processo, o ambiente e-proinfo passa a

não ser utilizado de forma a aproveitar todas as ferramentas de comunicação e

aprendizagem nele existentes. Essa questão merece nossa atenção, pois favorece a

dinâmica pensada para a formação de professores, propiciando assim a ampliação de

espaços para discussão, interação e compartilhamento de experiências.

Desenvolvimento de investigação que possa (re)pensar a atuação dos

professores-multiplicadores nas escolas. Acreditamos que são estes formadores os

responsáveis por criarem estratégias de ações para reorganizar o conteúdo do plano de

formação, de forma a atender às especificidades da escola e às necessidades de

aprendizagem dos professores. Essa investigação é importante, pois acreditamos que o

professor-multiplicador, formador do Projeto UCA, é a figura que motivará e auxiliará

o professor a despertar o interesse para a utilização das TICs em seu cotidiano escolar.

Por fim, com a efetivação desta pesquisa, acreditamos que fica evidenciada a importância

de abrirem-se espaço e tempo para ouvir a voz, as dificuldades, as aprendizagens e o os

saberes (re)construídos e mobilizados pelos professores no contexto da experiência UCA.

Além disso, acreditamos que cabe tanto à gestão da escola beneficiada quanto aos

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professores-multiplicadores e demais formadores UCA a sistematização desses momentos de

troca e compartilhamentos.

A abertura de momentos para reflexividade cognitiva e compartilhada sobre as

diversidades do projeto devem ser colocadas em prática nas formações de professores do

Projeto UCA. Tais ações alargaram o processo de apropriação da cultura digitalizada e o

redimensionamento dos saberes para ensinar com uso das Tecnologias da Informação e

Comunicação.

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153

APÊNDICES

APÊNDICE 01: Questionário aplicado aos professores da Escola Estadual Maria

Cristina que aderiram à proposta do Projeto UCA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CURSO DE DOUTORADO EM EDUCAÇÃO

TELEFONE DA PESQUISADORA: 9109-9093 / EMAIL: [email protected]

QUESTIONÁRIO DOCENTES – PROJETO UCA

Prezados (as) Professores (as);

O presente questionário é parte integrante da pesquisa doutoral da pesquisadora Akynara

Aglaé R. S. Silva. A pesquisa tem como objetivo investigar os saberes docentes mobilizados

na prática pedagógica com uso dos laptops educacionais oriundos do UCA - Projeto Um

Computador Por Aluno, do Governo Federal. O intuito do questionário é conhecê-lo e

perceber a sua compreensão acerca de conhecimentos de informática, prática pedagógica

com uso de tecnologias e Projeto UCA.

Agradecemos sua participação e rica contribuição.

Atenciosamente, Akynara Aglaé.

DADOS PESSOAIS:

NOME

COMPLETO:________________________________________________________________

EMAIL:_____________________________________________________________

NATURALIDADE: _____________________________________________________

ENDEREÇO:________________________________________________________________

SEXO:

( ) Masculino ( ) Feminino

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ESTADO CIVIL:

( ) Solteiro ( ) Casado ( )Viúvo ( ) Outro.

FAIXA ETÁRIA:

( ) de 20 a 25 anos ( )de 26 a 35 anos ( ) de 36 a 45 anos ( ) de 46 a 55 anos

( ) mais de 55 anos.

ESCOLA EM QUE TRABALHA:

_____________________________________________________________

TEMPO DE SERVIÇO COMO DOCENTE:

( ) Abaixo de 5 anos ( ) de 5 a 10 anos ( ) de 15 a 20 anos ( ) de 20 a 25 anos

( ) mais de 25 anos

DADOS SOBRE FORMAÇÃO:

MAGISTÉRIO:

( ) Sim ( ) Não

Em caso afirmativo, onde concluiu o magistério?

_____________________________________________

CURSO DE GRADUAÇÃO:

ONDE CONCLUIU A GRADUAÇÃO: __________________________________________

CURSO:____________________________________________________________________

MODALIDADE DO CURSO:

( ) Presencial ( ) À distância ( ) Semipresencial ( ) Outro

INÍCIO DO CURSO:

_____________________________________________________________________

TÉRMINO DO CURSO:

___________________________________________________________________

DURAÇÃO DO CURSO:

__________________________________________________________________

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PÓS-GRADUAÇÃO:

( ) Especialização ( ) Mestrado ( ) Doutorado

CURSO:____________________________________________________________________

INSTITUIÇÃO FORMADORA: _______________________________________________

MODALIDADE DO CURSO DE PÓS:

( ) Presencial ( ) Semi - presencial ( ) À distância ( ) Outro

INÍCIO DO CURSO: _________________________________________________________

TÉRMINO DO CURSO:_______________________________________________________

DURAÇÃO DO CURSO:_____________________________________________________

DADOS PROFISSIONAIS:

CARGA HORÁRIA DE TRABALHO:

( ) menos de 20 horas ( ) 20 horas ( ) 40 horas ( ) mais de 40 horas

EM QUANTAS ESCOLAS VOCÊ TRABALHA:

( ) 01 ( ) 02 ( ) 03 ( ) mais de 03 escolas

Quanto tempo lecionando em escola da rede pública:

_________________________________________

Qual o nível de ensino em que leciona:

_____________________________________________________

EXPERIÊNCIA COM INFORMÁTICA:

EM RELAÇÃO ÀS SEGUINTES FERRAMENTAS, VOCÊ SE CONSIDERA:

Editores de texto:

( ) Nenhum conhecimento ( ) Pouco conhecimento ( ) Mediano ( ) Bem ( ) Especialista

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Planilhas Eletrônicas:

( ) Nenhum conhecimento ( ) Pouco conhecimento ( ) Mediano ( ) Bem ( ) Especialista

Criadores de Apresentação:

( ) Nenhum conhecimento ( ) Pouco conhecimento ( ) Mediano ( ) Bem ( ) Especialista

Google e outras ferramentas de busca:

( ) Nenhum conhecimento ( ) Pouco conhecimento ( ) Mediano ( ) Bem ( ) Especialista

E-mail:

( ) Nenhum conhecimento ( ) Pouco conhecimento ( ) Mediano ( ) Bem ( ) Especialista

Redes Sociais:

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Videocast (Youtube):

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USO DE FERRAMENTAS TECNOLÓGICAS EM SALA DE AULA:

QUE TIPO DE RECUSOS TECNOLÓGICOS VOCÊ COSTUMA USAR EM SALA DE

AULA:

( ) TV ( ) Rádio ( ) Projetor Multimídia ( ) Computador ( ) Internet ( ) Outros

Considerando o seu entendimento, no que você acha que o Projeto UCA irá ajudar na sua

formação e na educação de seus alunos?

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APÊNDICE 02: Guia utilizado para orientar as discussões do grupo focal junto aos

professores da Escola Estadual Maria Cristina

GUIA PARA GRUPO FOCAL

1. Relação do professor com o universo tecnológico: Vivências com as

tecnologias anteriores até chegar a ser inserido no PROJETO UCA.

2. Como e porque vocês escolheram ser professor? Quais foram os caminhos que

os levaram a escolher essa profissão?

3. A Universidade trouxe contribuições efetivas para sua formação e para seu

desempenho em sala de aula? Houve a alguma lacuna na sua formação?

4. Vamos discutir agora quais conhecimentos ou saberes foram esses que a

Universidade proporcionou e os ajuda na sala de aula. Que saberes foram esses?

5. Podemos dizer que com esses saberes adquiridos na Universidade você se sente

preparado para elaboração de aulas com uso de recursos tecnológicos? E com o uso do

uquinha, você se sente suficiente preparado para o desenvolvimento de aulas?

6. Como você constrói e ministra suas aulas com uquinha? Como são suas aulas?

Dê exemplos.

7. Vocês podem dizer que saberes são mobilizados quando desenvolvem aulas

com uquinhas? Que conhecimentos são utilizados para pensar e efetivar uma aula?

Sobre o Projeto UCA:

1. Para vocês, quais as contribuições que o UCA está proporcionando em termos

de aquisição de saberes/aprendizados?

2. Quais os conhecimentos da formação UCA estão sendo úteis na sua prática

pedagógica com o uquinha?

3. Só o conhecimento do Projeto UCA está ajudando na elaboração das aulas?

Que outros saberes você usa quando dá aula com uquinha?

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4. Nas suas aulas, no que o uso do uquinha proporcionou de melhor? Houve algo

de negativo com o uso?

5. Quais as dificuldades enfrentadas nessas aulas com uso dos laptops?

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APÊNDICE 03: Roteiro utilizado para realização de entrevista com os professores da

Escola Estadual Maria Cristina.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

DOUTORADO – PROJETO UCA

ROTEIRO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA (INDIVIDUAL)

1. Diga-me sua opinião sobre suas aulas com o uso dos uquinhas.

2. Por que o UCA entrou em seu cotidiano?

3. Considerando as aulas que você deu nesse ano e nesse semestre, como foi sua

preparação para colocar aula com uquinha para essas crianças?

4. Houve mudança na sua identidade como professora com uso do UCA? Mudou

o seu fazer pedagógico?

5. Se a gente fosse idealizar uma aula boa com o UCA, o que você acha que seria

preciso?

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6. Você usou nas suas aulas esse conhecimento que você aprendeu na formação

UCA?

7. Quando você planejou a suas aulas, você recorreu a esses conhecimentos da

formação?

8. Hoje você se sente à vontade para estar usando o UCA em sala de aula?