FORMAS TECNOLÓGICAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS - I€¦ · 99, Ren’ai Road, Dushu Lake Higher...
Transcript of FORMAS TECNOLÓGICAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS - I€¦ · 99, Ren’ai Road, Dushu Lake Higher...
FORMAS TECNOLÓGICASDE SOLUÇÃO DE CONFLITOS - I
PROFESSSORESMICHAEL CÉSAR SILVA
DAVID FRANÇA CARVALHOLUCAS JERÔNIMO RIBEIRO DA SILVA
SKEMA BUSINESS SCHOOL
SKEMA BUSINESS SCHOOLWWW.SKEMA.EDU
SKEMA CAMPUSES
Belo Horizonte CampusR. Bernardo Guimarães, 3071Santo Agostinho, Belo HorizonteMG, 30140-083, Brazil
Lille CampusAvenue Willy Brandt59777 Euralille, France
Paris CampusPôle Universitaire Léonard de VinciEsplanade Mosa Lisa - Courbevoie92916 Paris La Défense Cédex, France
Raleign Campus920 Main Campus DriveVenture II, Suite 101 RaleignNC 27606 - USA
Sophia Antipolis Campus60 rue Dostoïevski CS 3008506902 Sophia Antipolis Cédex, France
Stellenbosch CampusRyneveld Street,Stellenbosch 7 600, South Africa
Buzhou CampusBuilding A4 & A599, Ren’ai Road, Dushu LakeHigher Education Town215123 SIP SuzhouJiangsu Province, China
Global Lab in AI4200 Boulevard Saint-LaurentPorte 685, Montréal, H2W 2R2 (QC),Canada
Belo Horizonte Cape Town-Stellenbosch Lille Paris Raleigh Sophia Antipolis Suzhou
SKEM
A B
usin
ess
Scho
ol, M
arke
ting
& C
omm
unic
atio
ns d
epar
tmen
t, no
n-co
ntra
ctua
l doc
umen
t – M
ay 2
020
Raleigh, USACampus
Montreal, CanadaGlobal Lab in Al
Lille, FranceCampus
Sophia Antipolis, FranceCampus Suzhou, China
Campus
Stellenbosch, South AfricaCampus
Belo Horizonte, BrazilCampus
Paris, FranceCampus
F724
Formas tecnológicas de solução de conflitos I [Recurso eletrônico on-line] organização
Congresso Internacional de Direito e Inteligência Artificial: Skema Business School – Belo
Horizonte;
Coordenadores: Michael César Silva, David França Carvalho e Lucas Jerônimo Ribeiro
da Silva – Belo Horizonte: Skema Business School, 2020.
Inclui bibliografia
ISBN: 978-65-5648-100-5
Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações
Tema: Desafios da adoção da inteligência artificial no campo jurídico.
1. Direito. 2. Inteligência Artificial. 3. Tecnologia. I. Congresso Internacional de Direito
e Inteligência Artificial (1:2020 : Belo Horizonte, MG).
CDU: 34
_____________________________________________________________________________
CONGRESSO INTERNACIONAL DE DIREITO E INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
FORMAS TECNOLÓGICAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS I
Apresentação
É com enorme alegria que a SKEMA Business School e o CONPEDI – Conselho Nacional
de Pesquisa e Pós-graduação em Direito apresentam à comunidade científica os 14 livros
produzidos a partir dos Grupos de Trabalho do I Congresso Internacional de Direito e
Inteligência Artificial. As discussões ocorreram em ambiente virtual ao longo dos dias 02 e
03 de julho de 2020, dentro da programação que contou com grandes nomes nacionais e
internacionais da área, além de 480 pesquisadoras e pesquisadores inscritos no total. Estes
livros compõem o produto final deste que já nasce como o maior evento científico de Direito
e da Tecnologia do Brasil.
Trata-se de coletânea composta pelos 236 trabalhos aprovados e que atingiram nota mínima
de aprovação, sendo que também foram submetidos ao processo denominado double blind
peer review (dupla avaliação cega por pares) dentro da plataforma PublicaDireito, que é
mantida pelo CONPEDI. Os quatro Grupos de Trabalho originais, diante da grande demanda,
se transformaram em 14 e contaram com a participação de pesquisadores de 17 Estados da
federação brasileira. São cerca de 1.500 páginas de produção científica relacionadas ao que
há de mais novo e relevante em termos de discussão acadêmica sobre os temas Direitos
Humanos na era tecnológica, inteligência artificial e tecnologias aplicadas ao Direito,
governança sustentável e formas tecnológicas de solução de conflitos.
Os referidos Grupos de Trabalho contaram, ainda, com a contribuição de 41 proeminentes
professoras e professores ligados a renomadas instituições de ensino superior do país, os
quais indicaram os caminhos para o aperfeiçoamento dos trabalhos dos autores. Cada livro
desta coletânea foi organizado, preparado e assinado pelos professores que coordenaram cada
grupo. Sem dúvida, houve uma troca intensa de saberes e a produção de conhecimento de
alto nível foi, certamente, o grande legado do evento.
Neste norte, a coletânea que ora torna-se pública é de inegável valor científico. Pretende-se,
com esta publicação, contribuir com a ciência jurídica e fomentar o aprofundamento da
relação entre a graduação e a pós-graduação, seguindo as diretrizes oficiais. Fomentou-se,
ainda, a formação de novos pesquisadores na seara interdisciplinar entre o Direito e os vários
campos da tecnologia, notadamente o da ciência da informação, haja vista o expressivo
número de graduandos que participaram efetivamente, com o devido protagonismo, das
atividades.
A SKEMA Business School é entidade francesa sem fins lucrativos, com estrutura
multicampi em cinco países de continentes diferentes (França, EUA, China, Brasil e África
do Sul) e com três importantes acreditações internacionais (AMBA, EQUIS e AACSB), que
demonstram sua vocação para ensino e pesquisa de excelência no universo da economia do
conhecimento. A SKEMA, cujo nome é um acrônimo significa School of Knowledge
Economy and Management, acredita, mais do que nunca, que um mundo digital necessita de
uma abordagem transdisciplinar.
Agradecemos a participação de todos neste grandioso evento e convidamos a comunidade
científica a conhecer nossos projetos no campo do Direito e da tecnologia. Já está em
funcionamento o projeto Nanodegrees, um conjunto de cursos práticos e avançados, de curta
duração, acessíveis aos estudantes tanto de graduação, quanto de pós-graduação. Até 2021,
será lançada a pioneira pós-graduação lato sensu de Direito e Inteligência Artificial, com
destacados professores da área.
Agradecemos ainda a todas as pesquisadoras e pesquisadores pela inestimável contribuição e
desejamos a todos uma ótima e proveitosa leitura!
Belo Horizonte-MG, 07 de agosto de 2020.
Profª. Drª. Geneviève Daniele Lucienne Dutrait Poulingue
Reitora – SKEMA Business School - Campus Belo Horizonte
Prof. Dr. Edgar Gastón Jacobs
Coordenador Acadêmico da Pós-graudação de Direito e Inteligência Artificial da SKEMA
Business School
1 DOUTOR EM DIREITO PELA UNIVERSIDAD DEL PAIS VASCO - UPV1
A INTERNET E O ORD COMO FERRAMENTA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITO
THE INTERNET AND THE ORD AS A CONFLICT RESOLUTION TOOL
Bruno Tavares Padilha Bezerra 1
Resumo
O trabalho se refere ao estudo do sistema de resolução de conflitos online (ODR) como uma
alternativa na solução de novos tipos de conflitos devido o surgimento e desenvolvimento da
internet. Assim, seus objetivos são entender a origem e o conceito do ODR, bem como sua
aplicação e tem como metodologia o estudo bibliográfico, com Métodos discursivos dialético
e pesquisa jurídica zetética empírica pura.
Palavras-chave: Odr, Internet, Conflitos
Abstract/Resumen/Résumé
The work refers to the study of the online conflict resolution system (ODR) as an alternative
in solving new types of conflicts due to the emergence and development of the internet.
Thus, its objectives are to understand the origin and the concept of the ODR, as well as its
application and its methodology is the bibliographic study, with dialectical discourse
methods and pure empirical zetetic legal research.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Odr, Internet, Conflicts
1
4
INTRODUÇÃO
A internet na década de 90 começou a ter maior
evidência e a ser difundida pelo mundo. Contudo, ainda
lenta por ser discada.
Pode-se dizer que a internet surgiu, para o grande
público de usuários, nos anos 90. Se difundindo por todos
os países do mundo, ainda que na sua modalidade discada.
Não se imaginava que o seu uso fosse tão fortemente
realizado como hoje envolvendo relações humanas em
todas as searas, uma vez que através de sites e aplicativos é
possível fazer compras de diversos produtos, contratar
serviços, comprar e vendar imóveis e automóveis, realizar
contratos, fazer uso de redes sociais, trocar mensagens que
era algo valioso hoje já substituído por aplicativos que
permitem o envio de áudios, textos e a realização de
ligações e até chamadas de vídeo.
Contudo, o alcance atingido e a proporção do seu uso,
ao redor do mundo, não poderia ser dimensionado aquela
época. Hoje, não se concebe a vida sem a comunicação e
acessibilidade proporcionada pela internet, seja nas
relações interpessoais, bem como com o infindável número
de aplicativos.
Através da internet, pode se adquirir desde um lápis, ao
mais luxuoso veículo, ou sofisticado imóvel. Os aplicativos
revolucionaram a comunicação, que num período tão curto,
não se pode imaginar a vida como era antes.
Jamais se imaginava na década de 90 que as relações
humanas seriam totalmente transformadas. Com a
possibilidade e o fim das fronteiras, como por exemplo, na
prestação de serviços por empresas do mundo todo através
de seus sites e aplicativos a consumidores localizados em
todos os Países e nem muito menos na prestação de trabalho
5
por trabalhadores mediante trabalho remoto e aulas remotas
e virtuais.
Não se imaginaria na década de 90, a completa
transformação das relações humanas. Temos que
compreender que essa evolução tecnológica permitiu
avanços gigantes e acabou com as fronteiras e antigos
paradigmas.
Essas novas tecnologias criaram um novo tipo de
relação humana pós-moderna criando o homem pós-
humano de Direito. Assim, é fato que essas relações passam
a gerar inúmeros novos tipos de problemas.
Dessa forma, com essas novas formas de interação
entre as pessoas o Direito precisa se manter atualizado.
Passa a enfrentar novos tipos de conflitos e inclusive o
surgimento de crimes realizados através dos celulares,
aplicativos e sites.
O fato é que diante desse desenvolvimento as relações
humanas estão alcançando espaços nunca antes
imaginados. Hoje um homem em qualquer lugar do mundo
pode se comunicar com outro facilmente.
Com o aumento das novas formas de tecnologia, com a
criação de novos tipos de trabalho, comercio, negócios,
interações que passaram também na seara das relações entre
pessoas para busca de amores, como aplicativos de
interação humana. As relações humanas mudaram.
Portanto, diante dessa nova forma de relações, surgem
conflitos, e a necessidade de criação de mecanismos que
vão auxiliar na solução desses. A chamada Online dispute
resolution (ODR), seria uma forma de auxilio as novas
demandas que apareceram com essas relações.
Dessa forma, o objetivo geral desse estudo é entender
a Resolução Online de Conflitos (ODR) em relação a sua
definição e aplicação e como objetivos específicos se
6
funcionaria realmente como uma alternativa na solução
desses novos tipos de conflitos e como poderia se realizar
a sua aplicação nas demandas litigiosas que aparecem
dessas situações acima narradas.
Como metodologia aplicamos o estudo bibliográfico,
com Métodos discursivos dialético e pesquisa jurídica
zetética empírica pura.
O presente trabalho está dividido em parte introdutória
com a apresentação da justificativa, objetivos e
metodologia e logo após como primeiro capítulo o
desenvolvimento do tema apresentando inicialmente a
definição e surgimento do ODR, posteriormente a sua
aplicação como forma de solução de conflitos online e por
fim, com as conclusões e referências.
ODR SUA DEFINIÇÃO E ORIGEM
A invenção da internet data do fim dos anos 1960 e em
1969, a Advanced Research Projects Agency (ARPA) criou
a Arpanet que era uma rede de computadores e os pontos de
Internet, estavam no Instituto de Pesquisa de Stanford, na
Universidade da Califórnia em Santa Bárbara e em mais
duas. Em 1971, a rede havia sido expandida para 15 pontos
em Universidades e Centros de pesquisa (LIMA e
FEITOSA, 2016).
Depois desse desenvolvimento o passo seguinte foi
conectar a Arpanet a outras redes da ARPA (PRNET e
SATNET).
Em 1975, a Arpanet foi entregue à Defense
Communication Agency e em 83 se transformou em
MILNET, uma rede de operações militares. A antiga
Arpanet ficou com à pesquisa e passa a ser chamada de
ARPA-INTERNET (LIMA e FEITOSA, 2016).
7
No ano de 84, a Nacional Science Foundation (NSF)
montou sua própria rede de computadores, a nomeou
NSFNET e em 1988, passa a usar a estrutura física da
Arpanet (LIMA e FEITOSA, 2016).
Em 1990, a Arpanet, é desativada e sai do ambiente
militar o controle sobre a rede. Então, o governo dos
Estados Unidos transferiu sua administração para a
Nacional Science Foundation (NSF).
A NSF desejava uma rede que suportasse toda a
comunidade acadêmica e de pesquisa, além da necessidade
de expandir de forma independente do financiamento
Estatal. A NSF controlou a internet até 1995, quando foi
extinta e a operação da internet foi liberada para a iniciativa
privada, o que impulsionou seu crescimento e
popularização (LIMA e FEITOSA, 2016).
Assim, com a abertura da internet para o mercado
ocorreu uma forte ampliação dos conflitos entre as pessoas
que passaram a utilizar a internet.
Necessitava-se da criação de uma ferramenta para
auxiliar nas soluções dos conflitos.
Dessa forma, com a abertura da rede para a criação de
provedores de internet e fornecedores dessa ferramenta que
foi aberta para todos deixando de ser apenas aqueles afetos
aos usuários da academia e passaram para a sociedade
(LIMA e FEITOSA, 2016).
Assim, com os provedores de serviço de
internet (Internet Service Providers – ISPs), em 1992,
ocorre a necessidade de criação de algum método de
solução de conflitos (LIMA e FEITOSA, 2016).
Portanto, criou-se o Virtual Magistrate (VM), o
primeiro software de arbitragem em rede, baseado na
Universidade de Villanova, na Filadélfia (LIMA e
FEITOSA, 2016).
8
Com relação ao desenvolvimento da internet e de
ferramentas de ODR em 1988 Jeff Bezos lançou a Amazon,
seguido por Pierre Omidyar, que lançou o eBay (LIMA e
FEITOSA, 2016).
Conforme poderemos perceber na citação a seguir de
Lima e Feitosa (2016, p. 57),
O eBay é uma plataforma, fundada em
1995, que atua na intermediação de
compras e vendas entre indivíduos,
independentemente da localização dos
envolvidos na transação, dos produtos
e outros aspectos da transação. Hoje, a
plataforma atende 162 milhões de
compradores e abriga 800 milhões de
ofertas, espalhados pelo globo. (Apud
WHO WE ARE, online. Disponível
em: Acesso em: 25 abr. 2016)
Percebendo a necessidade de uma ferramenta que
facilitasse o tratamento de conflitos envolvendo seus
usuários, o eBay pediu que o Center for Information
Technology and Dispute Resolution da University of
Massachussets Amherst conduzisse um experimento e com
isso surge essa forma de solução conflitual (LIMA e
FEITOSA, 2016).
Segundo, Lima e Feitosa (2016, p. 60), entre 1999 e
2000, uma série de start-ups foram criadas e dissolvidas,
mas empresas como a SmartSettle e a CyberSettle,
permaneceram ativas. A SmartSettle, oferece uma
plataforma de negociação, para conflitos envolvendo duas
ou múltiplas partes (Apud SMARTSETTLE, 2016;
THIESSEN, FRASER, 2003).
ODR COMO FORMA DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
ONLINE
De acordo com Ethan Katsh e Colin Rule (2016, p.
329-344), ODR é a “aplicação da tecnologia da
9
informação e comunicação para prevenir, gerenciar e
resolver conflitos”.
Dessa forma, os conflitos surgidos na internet ou de
modo offline, podem ser resolvidos por sistemas
inteligentes, tendo respostas mais rápidas e satisfatórias
aos conflitos, sendo a tecnologia acessível para pessoas
físicas e jurídicas (FARIA, 2018).
Atualmente, no brasil se oferece o Alternative Dispute
Resolution (ADR). “Nesse caso, a sessão de conciliação,
mediação e arbitragem é feita em salas virtuais, inclusive
a contratação do terceiro neutro, como também é chamado
esse profissional” (FARIA, 2018).
A ADR e a ODR funcionam sendo as próprias partes,
com ou sem o auxílio de um terceiro neutro, que chegam
a um consenso. Esse processo também é chamado de
“autocomposição” (FARIA, 2018).
A D’Acordo Mediações no Brasil, legaltech que
surgiu em 2015, inovou ao desenvolver tecnologias como
o totem de autoatendimento, que já está disponível para
consumidores e empresas em Procons e Juizados (FARIA,
2018).
Assim, temos a realidade da existência de conflitos e
da utilização cada vez maior da tecnologia nas relações
humanas. Portanto, a ODR pode ser o mecanismo de
solução dos conflitos já que é um facilitador e vem
baratear os custos com demandas jurídicas demoradas.
CONCLUSÕES
Diante do que aqui debatemos podemos entender que
com o aumento da tecnologia e do uso das redes sociais
suguem cada vez maiores e novos problemas.
A Resolução Online de Conflitos (ODR) em relação a
sua definição e aplicação como uma ferramenta barata em
10
que podemos economizar tempo e custos processuais e que
poderá ser utilizado por qualquer pessoa, com ou sem
Advogado.
Sendo dessa forma um facilitador da comunicação
entre as partes em conflito e com o apoio ou não de um
mediador, conciliador ou árbitro.
Os acordos extrajudiciais são lícitos e previstos em
nossa legislação. Podem se transformar em títulos
executivos extrajudiciais e serem executados no Judiciário
nos termos da legislação processual civil.
Portanto, serve como mecanismo para diminuição do
número de demandas, bem como para baratear os custos
processuais.
REFERÊNCIAS
KATSH, Ethan; RULE, Colin. What We Know and Need
to Know About Online Dispute Resolution. South
Carolina Law Review, vol. 67, p. 329-344, 2016.
Disponível
em: https://www.americanbar.org/content/dam/aba/image
s/office_president/katsh_rule_whitepaper.pdf. Acesso:
03/03/2018.
LIMA, Gabriela Vasconcelos; FEITOSA, Gustavo Raposo
Pereira. Online dispute resolution (ODR): a solução de
conflitos e as novas tecnologias. Revista do Direito, Santa
Cruz do Sul, v. 3, n. 50, p. 53- 70, set. 2016. ISSN 1982-
9957. Disponível em: . Acesso em: ______.
doi:http://dx.doi.org/10.17058/rdunisc.v3i50.8360.
https://dacordo.jusbrasil.com.br/noticias/587875324/tecnol
ogia-odr-muda-forma-de-resolver-conflitos Acesso:
11/06/2020
11
1 Graduanda do 9º semestre do Curso de Direito
2 Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Pará-UFPA. Professor dos cursos de Direito do Centro Universitário do Estado do Pará - CESUPA e Faculdade Ideal- FACI/WYDEN. Advogado.
1
2
A LEI Nº 13.994/2020 E A CONCILIAÇÃO VIRTUAL NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS: A NECESSÁRIA COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE SEUS PRINCÍPIOS NORTEADORES E AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO
CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA
LAW Nº 13.994/2020 AND THE VIRTUAL CONCILIATION WITHIN THE SPECIAL CIVIL COURTS: THE NECESSARY COMPATIBILIZATION BETWEEN
ITS GUIDING PRINCIPLES AND THE CONSTITUTIONAL GUARANTEES OF CONTRADICTORY AND BROAD DEFENSE
Carolina Arrais Maroja de Souza 1Bernardo Augusto da Costa Pereira 2
Resumo
O resumo expandido realiza uma análise conjunta entre os princípios norteadores do juizado
especial, do contraditório e da ampla defesa para uma melhor interpretação da inovação
legislativa trazida pela lei n 13.994/2020. Conclui-se que é real a importância das audiências
de conciliação virtuais no âmbito dos juizados especiais civis para materialização de seus
princípios norteadores, todavia faz-se necessária uma interpretação conjunta com princípios
constitucionais, bem como com o princípio da cooperação, de modo a não se penalizar o
demandado que, justificadamente, não compareça ou se recuse em participar da tentativa de
conciliação virtual.
Palavras-chave: Juizados especiais civis, Conciliação não presencial, Acesso tecnológico à justiça, Ampla defesa, Contraditório
Abstract/Resumen/Résumé
The expanded summary performs a joint analysis between the guiding principles of the
special court, contradictory and broad defense for a better interpretation of the legislative
innovation brought by law nº 13.994/2020. It is concluded that the importance of virtual
conciliation hearings is real within the scope of the special civil courts for the materialization
of their guiding principles, however, it is necessary a joint interpretation with constitutional
principles, as well as with the principle of cooperation, not to penalize the defendant who,
justifiably, does not appear or refuses to participate in the virtual attempt of conciliation.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Special civil courts, Non-face-to-face conciliation, Technological access to justice, Broad defense, Contradictory
1
2
12
1. INTRODUÇÃO
A Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis
e Criminais, surgiu sob a ótica de ampliação do acesso à justiça, princípio constitucionalmente
assegurado pela Carta Magna brasileira em seu artigo 5º, inciso XXXV, visando combater a
litigiosidade reprimida. Por diversas circunstâncias, o cidadão carente de recursos deixava de
postular direitos em juízo. Dentre outras novidades, e na esteira do princípio em questão, a lei
permitiu que nas demandas com valor de causa até 20 salários mínimos a parte não necessite estar,
em regra, assistida por advogado (artigo 9º).
Recentemente, a Lei nº 13.994, de 24 de abril de 2020, alterou os artigos 22 e 23 da Lei nº
9.099/95 para possibilitar a conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis,
tendo a nova redação do artigo 23 disposto expressamente que “se o demandado não comparecer ou
recusar-se a participar da tentativa de conciliação não presencial, o Juiz togado proferirá sentença”.
2. OBJETIVO
Analisar como o novel artigo 23 da Lei nº 9.099/95 pode caracterizar ofensa aos princípios
do contraditório e da ampla defesa na hipótese de o demandado vir a ser penalizado em razão do
não comparecimento ou recusa em participar da tentativa de conciliação não presencial,
considerando-se que grande parte da população brasileira sequer tem acesso à internet, seja por
carência de recursos financeiros, seja por desconhecimento técnico, ou, ainda, seja por dificuldades
pelo fato de se tratar de idosos ou pessoas com deficiência.
3. METODOLOGIA
Arrolamento bibliográfico, com recurso ao método dedutivo, tendo como material de
pesquisa de doutrinas de autores especializados na temática e legislação com consultas em portais
eletrônicos, inclusive Resolução do Egrégio Supremo Tribunal Federal.
4. PRINCÍPIOS NORTEADORES DA LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS
Consoante o disposto no artigo 2º da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, “o processo
orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e
celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação”.
A oralidade representa o princípio que recomenda, para a prática de determinados atos
13
processuais, a palavra falada preferencialmente à palavra escrita. O processo do trabalho brasileiro
reserva papel de maior destaque ao princípio da oralidade. No processo civil, não se deve
considerar, mesmo nos juizados especiais, uma oralidade absoluta, uma vez que é essencial que tais
atos sejam corporificados de alguma maneira, seja reduzido a termo, seja mediante gravação.
O princípio da simplicidade é identificado pela melhor doutrina como a base para a
desburocratização de procedimentos processuais, sem a qual não se chega a formas menos
complexas na solução de litígios judiciais e, consequentemente, à pacificação social. Atualmente
busca-se uma maior desburocratização procedimental. Na área trabalhista, há o exemplo da redação
conferida ao parágrafo primeiro do artigo 840 da Consolidação das Leis do Trabalho, que trata dos
requisitos da petição inicial trabalhista, impondo a autoridade judiciária o desapego ao formalismo
exagerado. Na seara processual civil, o atual Código de Processo Civil traz o princípio da primazia
do mérito, também aplicado ao âmbito recursal (art. 4º, CPC).
Informalidade é o princípio que estabelece ao julgador um abrandamento no rigor quando
em análise o preenchimento dos ritos formais que compõem a prática de determinado ato
processual, reduzindo tais ritos ao mínimo necessário para atingir a finalidade do ato. Isan Almeida
Lima (2014, p. 5.038) leciona que:
O princípio da informalidade autorizaria o magistrado a proceder à análise e requisitaresclarecimentos das partes, em audiência, de forma que possa delimitar a extensão da lide.É uma consequência lógica da limitação ao formalismo. O juiz promoverá atos quefacilitem o julgamento célere e dirigido à primazia da realidade.
A economia processual está diretamente relacionado com a aplicação do conceito de
eficiência à ordem processual, ou seja, por este princípio os operadores do direito devem se utilizar
do processo, materialização do direito de ação, de forma a alcançar o máximo de resultados
possíveis com o mínimo de esforço.
O princípio da celeridade prega que há necessidade de uma rápida tramitação do feito. Nos
juizados especiais, os quais versam sobre litígios menos complexos, esta velocidade é importante.
Todavia, não se deve interpretar o princípio apenas pelo viés da velocidade. É necessário
compatibilizá-lo com outras normas. Por esta razão, a melhor interpretação é calcada na razoável
duração do processo, princípio consagrado no inciso LXXVIII do artigo 5º da CRFB/88, o qual
impõe a solução dos processos em tempo razoável, de modo a garantir que, ao final da lide, sejam
igualmente respeitados o contraditório e a ampla defesa. Foi introduzido no Texto Constitucional
por meio da Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, a chamada Reforma do
Poder Judiciário.
A conciliação e a transação, previstas na parte final do artigo 2º da Lei nº 9.099/1995, são
métodos de solução de conflitos. Tal disposição deve ser interpretada de forma atualizada. Apesar
14
de próximas, conciliação e mediação são estratégias distintas de solução de conflito. A conciliação é
técnica mais adequada quando não há relação anterior entre os litigantes. Por sua vez, a mediação
busca auxiliar os envolvidos a alcançar um diálogo capaz de solucionar o conflito, sendo mais útil
em casos em que há vínculo pretérito entre as partes. Segundo Scavone Junior (2016, p.10), “o
resultado útil da conciliação e mediação é a transação, ou seja, o acordo entre as partes que,
igualmente, podem transacionar sem o auxílio de um conciliador ou mediador”.
Todas estas formas de autocomposição prestigiam o princípio da cooperação, também
chamado princípio da colaboração, pelo qual o processo é visto como um produto da atividade
cooperativa triangular entre o magistrado e as partes.
O princípio da cooperação foi consagrado pelo legislador nacional no Código de Processo
Civil de 2015, nos termos do artigo 6º do diploma em questão. Gisele Leite (2016, ps. 170 e 171)
leciona que:
O art. 6º da Lei 13.105/2005 é poético. A cooperação não busca o processo civil, masconfigura um limite imposto ao exercício dos direitos processuais, notadamente, aocontraditório. Limite já tão conhecido e velho quanto nossa atual e vigente constituiçãobrasileira.(…)A parte deve ser informada e ter efetivas condições de reagir e de influenciar o julgado, masestes direitos de informação e reação somente podem ser exercidos se guardarem harmoniacom os objetivos visados pela Jurisdição.Evidentemente além das proibições da litigância de má-fé (boa-fé subjetiva), a cooperaçãoexige que o comportamento processual seja pautado nos padrões razoáveis à luz do homomedius e que levem em consideração suas legítimas expectativas estabelecidas em relaçãoaos demais sujeitos processuais (boa-fé objetiva).Por sua vez, o julgador também tem deveres a observar em sua atuação no contraditório.Tem o poder-dever de impulsionar o processo, de proferir e efetivar uma decisão, mas aofazê-lo, deve privilegiar uma comunicação clara com os litigantes e usar de modo racionalo formalismo processual.(…)
Os operadores do direito ao estudarem a Lei nº 13.994/2020, mais especificamente o
estabelecimento da possibilidade de conciliação virtual no âmbito dos juizados especiais cíveis, não
podem, sob pena de afronta às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, bases de
sustentação do Estado Democrático de Direito, conferir aos novos dispositivos caráter de imposição
sem considerar as circunstâncias próprias de cada litigante, as quais podem dificultar a participação
destes em audiência.
5. A LEI 13.994/2020 E A POSSIBILIDADE DE CONCILIAÇÃO VIRTUAL NO
ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS: PONDERAÇÕES NECESSÁRIAS
É inegável que vivemos um período de estímulo à utilização pelos órgãos do Poder
Judiciário de meios tecnológicos para a realização de atos processuais, em especial audiências,
15
como medida capaz de propiciar maior eficiência e celeridade à solução de demandas judiciais, em
consonância com o direito fundamental consagrado no inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição
Federal, qual seja, à razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação.
No momento atual, com a sociedade assolada por uma pandemia de consequências ainda
não totalmente conhecidas, esse estímulo ganha maior força pela necessidade de isolamento social
conforme recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e de diversos governos em sede
federal, estadual e municipal. Neste particular, merece destaque a Resolução nº 672 do Supremo
Tribunal Federal, de 26 de março de 2020, que permite o uso de videoconferência nas sessões de
julgamento presencial do Plenário e das Turmas da mais alta corte de Justiça do Brasil.
Não obstante, cumpre ressaltar que, diante da inegável e comprovada dificuldade de acesso
à internet por parcela considerável da população brasileira, faz-se necessário que a regra prevista no
artigo 23 da Lei nº 9.099/95, com redação dada pela Lei nº 13.994/20, seja interpretada à luz do
princípio do contraditório e da ampla defesa, previstos no inciso LV do artigo 5º da Constituição
Federal, de modo a não se penalizar o demandado que, justificadamente, não compareça ou se
recuse em participar da tentativa de conciliação.
Com efeito, deve o magistrado, com prudência e bom senso, consultar previamente as
partes quanto à realização de audiência não presencial para tentativa de conciliação, alertando-as
acerca da necessidade de terem acesso à internet de qualidade, bem como estarem familiarizadas
como o manejo dos recursos tecnológicos, especialmente quando atuarem desassistidas por
advogado, com vistas a evitar eventual nulidade na hipótese de as partes serem injustamente
penalizadas. Trata-se de respeitar princípios como o contraditório, a ampla defesa e a cooperação.
Não se pode olvidar da dimensão territorial brasileira e que cada região do país possui suas
peculiaridades. Não é possível comparar, por exemplo, a qualidade de internet de São Paulo, centro
comercial do país, com o interior de um estado da Região Norte. Apesar de termos juizados
especiais civis em ambos os casos, a qualidade e os recursos tecnológicos são bastante distintos.
Da mesma maneira, um jovem tem muito mais intimidade com as ferramentas tecnológicas
que um idoso. E os deficientes visuais e auditivos terão acesso a um sistema tecnológico que
considere suas situações? A presença de advogado é facultativa em vários casos, de modo que o
jurisdicionado talvez não possua computador. Como ele participará da audiência virtual?
Interpretar a legislação sem considerar tais fatos desprestigia o acesso à justiça e o devido
processo legal. Cumpre ressaltar que a Lei nº 9099/95, desde sua entrada em vigor no ordenamento
jurídico nacional, teve o objetivo de aproximar o jurisdicionado do Estado-Juiz, estabelecendo
procedimento mais simples, menos formal, e baseado na oralidade, a teor do disposto no artigo 2º
do diploma, de modo que os meios tecnológicos não podem ser utilizados na contramão desta
16
orientação legal, sob pena de total desvirtuamento da mens legis.
6. CONCLUSÕES
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a inafastabilidade do poder jurisdicional no rol
dos direitos e garantias fundamentais (artigo 5º, XXXV) e, como tal, esta deve ser entendida em
sentido amplo, de modo a abarcar não apenas o direito à instauração de um processo como
materialização do direito de ação, como, também, a um processo justo, equânime, que levam em
considerações as particularidades de cada litigante, de modo a considerar a situação de cada um
diante dos deveres processuais, situações esta à luz das condições sociais e econômicas de cada
indivíduo.
Assim sendo, revela-se imperativo sob pena de afronta aos direitos protegidos no inciso LV
do mesmo dispositivo constitucional, bem como do princípio da cooperação, prestigiado pela nova
ordem processual vigente no país desde a edição do CPC de 2015, que aos litigantes com
dificuldade de acesso à internet por motivos justificados, sejam questões econômicas ou sociais, não
sejam impostas sanções em face do não comparecimento à audiência virtual de conciliação
designada.
7. REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis eCriminais e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano CXXXIII,n. 186, p. 1-5, 27 set. 1995.
BRASIL. Lei nº 13.994, de 24 de abril de 2020. Altera a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995,para possibilitar a conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis. DiárioOficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano CLVIII, n. 79, p. 1, 27 abr. 2020.
LAVADO, T. Uso da internet no Brasil cresce, e 70% da população está conectada. G1, 28 ago.2019. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2019/08/28/uso-da-internet-no-brasil-cresce-e-70percent-da-populacao-esta-conectada.ghtml. Acesso em: 1º mai. 2020.
LEITE, G. Novo CPC. Comentários às principais inovações do novo direito processual civil.Campo Grande: Contemplar, 2016.
LIMA, I. A. Disciplina jurídica do princípio da informalidade no processo do trabalho. Disponívelem: http://www.cidp.pt/revistas/ridb/2014/07/2014_07_05011_05048.pdf. Acesso em: 13 jun. 2020.
ROCHA, F. B. Manual dos juizados cíveis estaduais teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2017.
SCAVONI JUNIOR, L. A. Manual de arbitragem, mediação e conciliação. 7 ed. Rio de Janeiro:Forense, 2016.
17
STF – Supremo Tribunal Federal. Resolução nº 672, de 26 de março de 2020. Permite o uso devideoconferência nas sessões de julgamento presencial do Plenário e das Turmas. Diário da JustiçaEletrônico/Supremo Tribunal Federal, n. 75, p. 1, 27 mar. 2020. Disponível em:http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/Resolucao672.pdf. Acesso em: 1º mai.2020.
18
1 PROFESSOR DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM PROTEÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIVERSIDADE DE ITAÚNA. DOUTOR E MESTRE EM DIREITO PROCESSUAL - PUCMINAS. PÓS-DOUTOR EM EDUCAÇÃO - UFMG.
2 DOUTORANDA E MESTRE EM PROTEÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS PELA UNIVERSIDADE DE ITAÚNA. PROFESSORA UNIVERSITÁRIA DE CURSOS DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM DIREITO. PESQUISADORA.
1
2
A MASSIFICAÇÃO DA RATIO DECIDENDI FACE A UTILIZAÇÃO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL: UM NOVO
MECANISMO DE UNIFORMIZAÇÃO DE PRECEDENTES
THE THE MASSIFICATION OF RATIO DECIDENDI FACE THE USE OF ARTIFICIAL INTELLIGENCE IN CIVIL PROCEDURAL LAW: A NEW
MECHANISM FOR UNIFORMIZING PRECEDENTS
Fabrício Veiga Costa 1Naony Sousa Costa 2
Resumo
Objetiva-se investigar a massificação dos julgamentos de mérito em processos judicias
mediante a utilização da inteligência artificial. A escolha do tema se justifica em razão da
relevância teórica e prática, especialmente a massificação de julgados que torna inviável a
formação participada do mérito processual. Por meio da pesquisa bibliográfica e documental,
concluiu-se que a técnica procedimental decorrente da inteligência artificial robustece o
modelo de processo autocrático, inviabiliza a democraticidade do provimento e impossibilita
a participação dos seus destinatários finais na construção discursiva da decisão.
Palavras-chave: Inteligência artificial, Processo participado, Ratio decidendi
Abstract/Resumen/Résumé
The objective is to investigate the massification of merit judgments in legal proceedings
using artificial intelligence. The choice of the theme is justified due to its theoretical and
practical relevance, especially the mass of judges that make the participatory formation of
procedural merit unfeasible. Through bibliographic and documentary research, it was
concluded that the procedural technique resulting from artificial intelligence strengthens the
autocratic process model, makes the provision democratic, and makes it impossible for the
final recipients to participate in the discursive construction of the decision.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Artificial intelligence, Participated process, Ratio decided
1
2
19
INTRODUÇÃO
O presente resumo tem por objetivo propor uma análise científica acerca dos impactos
da utilização da inteligência artificial no processo civil brasileiro, em especial no que tange a
criação de uma nova técnica de uniformização e formação sumarizada de precedentes pautada
na observância de algoritmos.
Para tanto, em um primeiro momento torna-se importante mencionar o processo de
informatização do processo, expondo as principais mudanças trazidas pelo uso dos
mecanismos tecnológicos, dos dados e da inteligência artificial no direito processual civil
brasileiro. Ademais, mostra-se relevante compreender a metodologia de construção do espaço
procedimental no processo civil que deve oportunizar a construção participada da decisão
pelas partes interessadas.
Para se chegar ao escopo desta pesquisa será utilizada a técnica teórico conceitual,
haja vista a utilização de análise de conteúdo, por meio de levantamento bibliográfico, de
dados jurisprudenciais e documentais acerca do tema. De acordo com as técnicas de análise de
conteúdo, afirma-se que se trata de uma pesquisa teórica, de modo que o procedimento
adotado servirá para que se demonstre que a utilização da inteligência artificial culmina por
sumarizar a cognição na formação dos precedentes judiciais e retira o espaço processual de
participação dos interessados na construção do provimento jurisdicional.
DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA
A revolução da internet oportunizou a implementação de atividades por meio do uso
da inteligência artificial, dos dados e algoritmos. A informatização exerce, atualmente, um
papel cada vez mais expressivo nos diversos setores da sociedade e no âmbito do direito
processual isto não é diferente. Diversos tribunais do nosso país já possuem plataformas de
automação por meio da utilização da inteligência artificial. Pode-se citar à título de exemplo,
a plataforma Victor, utilizada pelo Supremo Tribunal Federal desde de 2018, tem “o objetivo
de otimizar a análise da Repercussão Geral” (ROSA; GUASQUE, 2020, p. 75-76)1. Além
disso, pode-se mencionar, ainda, a plataforma Sócrates, “sistema desenvolvido pelo Superior
1 ROSA, Alexandre Morais da; Guasque, Bárbara. Avanços da disrupção nos tribunais brasileiros. In:
NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique Santos; WOLKART, Erik Navarro. (org.) INTELIGÊNCIA
ARTIFICIAL E DIREITO PROCESSUAL: OS IMPACTOS DA VIRADA TECNOLÓGICA NO
DIREITO PROCESSUAL. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 75,76.
20
Tribunal de Justiça, (...) tem por objetivo inicial promover a automação das etapas iniciais dos
recursos que chegam ao Tribunal”.
Passa-se, portanto, para um cenário de interconectividade, um novo modelo de
capitalismo cognitivo que impacta e repercute em diversos setores, inclusive, no direito
processual:
Hoy, la economía capitalista del siglo XXI adopta un modelo cognitivo de
prosperidad sustentado en los datos, que substituirán al trabajo físico como valor
sobre el que se fundó el capitalismo tras la Revolución industrial. Los datos son ya
la materia prima de la que brota la riqueza que libera un entramado de la plataformas
que gestionan la suma de cooperación colectiva y conocimiento como fuentes de
valor de la nueva economia cognitiva.2
No que tange ao conceito de Inteligência Artificial, José Luis Bolzan de Morais
destaca que,
A inteligência artificial (IA) significa dotar computadores e softwares de capacidade
para processar imensos volumes de dados e – principalmente – para encontrar
padrões e fazer previsões sem ter sido programados para tanto, produzindo dados a
partir de dados, ou metadados, aptos a produzir conhecimentos específicos baseados
em padrões e comportamentos, bem como realizar controles.3
Já no que se refere ao conceito de algoritmo, este
nada mais é do que uma sequência ordenada de instruções que direciona comando
para o computador desempenhar certas tarefas. Desse modo, o programador, quando
arquiteta o algoritmo, estabelece um “input” (dados iniciais que alimentam o
sistema) e um “output” (objetivo desejado com o processamento dos dados que
alimentam o sistema).4
Diante deste novo cenário provocado pela Revolução da Internet, discute-se nesta
pesquisa quais serão os impactos que a adoção da inteligência artificial e dos algoritmos
poderão acarretar para o direito processual já que provocarão uma maior celeridade no que
tange a eficiência do julgamento, no entanto, sumarizarão a cognição por meio do
encurtamento do espaço de discussão e construção dialógica da decisão.
Verifica-se, nesta seara, que o grande problema da utilização da inteligência artificial
no direito processual, consiste justamente na exclusão do debate processual daqueles que
serão atingidos pelos efeitos da decisão. Ademais, exclui-se, também, a possibilidade de
conhecimento de novos argumentos das partes cuja demanda possui mesma situação de
2 LASSALE, José María. Ciberleviatán- El colapso de la democracia liberal frente a la revolución
digital.1.ed. Barcelona: Arpa, 2019, p. 33. 3 MORAIS, José Luis Bolzan. O ESTADO DE DIREITO “CONFRONTADO” PELA “REVOLUÇÃO DA
INTERNET”!. Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM. v. 13, n. 3. 2018. p.884. 4 VALE, Luís Manoel Borges do. A tomada de decisão por máquinas: a proibição, no direito, de utilização
de algoritmos não supervisionados. In: NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique Santos; WOLKART, Erik
Navarro. (org.) INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E DIREITO PROCESSUAL: OS IMPACTOS DA
VIRADA TECNOLÓGICA NO DIREITO PROCESSUAL. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 631.
21
direito já decidida. Isto ocorre porque a ratio decidendi5 do julgamento será aplicada a todos
os processos com mesma fundamentação de direito, por meio de aplicação criada por um
algoritmo.
Importante destacar, neste momento, que o modelo de processo adotado no estado
brasileiro é democrático e oportunizar a criação de um espaço que garanta as partes uma
ampla participação e, principalmente, a possibilidade de influenciar no conteúdo da decisão,
conforme esclarece Humberto Teodoro Júnior e Dierle José Coelho Nunes:
Dentro desse enfoque se verifica que há muito a doutrina percebeu que o
contraditório não pode mais ser analisado tão-somente como mera garantia formal
de bilateralidade da audiência, mas, sim, como uma possibilidade de influência
(Einwirkungsmöglichkeit) sobre o desenvolvimento do processo e sobre a formação
de decisões racionais, com inexistentes ou reduzidas possibilidades de surpresa.
Tal concepção significa que não se pode mais na atualidade, acreditar que o
contraditório se circunscreva ao dizer e contradizer formal entre as partes, sem que
isso gere uma efetiva ressonância (contribuição) para a fundamentação do
provimento, ou seja, afastando a ideia de que a participação das partes no processo
possa ser meramente fictícia, ou apenas aparente, e mesmo desnecessária ao plano
substancial.6
Entende-se que a
formação de uma decisão judicial deve ser o reflexo e a consequência de tudo que
foi posto em discussão pelas partes. É certo que a vontade da maioria não reflete e
nem representa o interesse de todos os titulares do direito debatido. O provimento
jurisdicional coletivo será considerado legitimamente democrático quando todas as
questões postas em debate forem levadas em consideração no momento do juiz
decidir. Mesmo que o julgador não concorde ou não acate as teses e as alegações
suscitadas pelas partes, sabe-se que o contraditório somente se efetivará quando
houver manifestação judicial fundamentada acerca de tudo o que foi submetido ao
princípio do discurso. 7
Assim,
padeceriam de inconstitucionalidade decisões proferidas por máquinas, as quais se
resumissem a repetir um determinado padrão/modelo, sem considerar as
circunstâncias fáticas dos casos sob análise e sem que restassem evidenciados
critérios decisórios.
5 De acordo com Fredie Didier Júnior “A ratio decidendi são os fundamentos jurídicos que sustentam a decisão;
a opção hermenêutica adotada na sentença, sem a qual a decisão não teria sido proferida como foi; trata-se da
tese jurídica acolhida pelo órgão julgador no caso concreto”. (DIDIER JÚNIOR, Fredie. O Recurso
Extraordinário e a Transformação do Controle Difuso de Constitucionalidade no Direito Bras. Revista Páginas
de Direito, Porto Alegre, ano 13, nº 1080, 12 de setembro de 2013. Disponível em:
https://www.paginasdedireito.com.br/index.php/artigos/175-artigos-set-2013/4799-o-recurso-extraordinario-e-a-
transformacao-do-controle-difuso-de-constitucionalidade-no-direito-bras. Data de acesso em 07 de junho de
2020). 6 JÚNIOR THEORORO, Humberto; NUNES, Dierle José Coelho. A dimensão que urge reconhecer ao
contraditório no direito brasileiro: sua aplicação como garantia de influência, de não surpresa e de
aproveitamento da atividade processual. Revista de Processo. Ano 34. n. 168. Fev./2009, São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009, p. 109. 7 COSTA, Fabrício Veiga. Mérito Processual: a formação participada nas ações coletivas. Belo Horizonte:
Arraes Editores, 2012, p. 221.
22
Um dos principais problemas relacionados à tomada de decisão por máquinas se
refere a opacidade do algoritmo, na medida em que, atualmente, são poucas as
situações em que o algoritmo é revelado, para que se conheçam os critérios
utilizados no processo decisório. 8
Ademais, a adoção da inteligência artificial no direito processual e dos algoritmos
criará um novo mecanismo de formação de uniformização dos precedentes que exclui a
participação democrática dos interessados na construção da decisão. Torna-se necessário,
ainda, tornar público os critérios adotados pelo algoritmo para formação do processo,
especialmente na fase decisória. Nesta seara discute-se, a efetivação de um direito à
explicação, conforme preconiza Isabela Ferrari e Daniel Becker:
Muito mais de que apenas exclusivo do titular/jurisdicionado, o direito à explicação
impacta a programação, a prototipagem e a utilização de sistemas de processamento
de dados. Por isso, deve-se pensar em técnicas de garantir compreensão,
transparência e legibilidade ou, “explicação por design” (explanation by design) ou
“explicação por padrão” (explanation by default) desde o momento da concepção do
algoritmo, passando por todas as fases de sua aplicação.9
Portanto, este novo modelo de processo criado pela revolução tecnológica criaria um
novo modelo de julgamento massificado por meio da padronização produzida pelos
algoritmos que sumarizaria a cognição e retiraria os destinatários dos efeitos da decisão do
espaço discursivo de construção da decisão. Importante, mencionar ainda, a necessidade de
um prévio conhecimento dos padrões algoritmos para o exercício efetivo das garantias
processuais, como ampla defesa e contraditório.
CONCLUSÕES
A Revolução da Internet impactou de forma direta diversas áreas em nossa sociedade
e, também o direito processual civil. Conforme exposto nesta pesquisa a utilização dos
algoritmos e da inteligência artificial já é uma realidade no judiciário brasileiro. Não restam
dúvidas que a utilização destes mecanismos potencializa a eficiência e o aumento quantitativo
do número de processos finalizados no âmbito do judiciário.
No entanto, nesta pesquisa, procurou-se demonstrar que sob a perspectiva
democrática quanto mais ampla e irrestrita a participação dos interessados na construção da
8 VALE, Luís Manoel Borges do. A tomada de decisão por máquinas: a proibição, no direito, de utilização
de algoritmos não supervisionados. In: NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique Santos; WOLKART, Erik
Navarro. (org.) INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E DIREITO PROCESSUAL: OS IMPACTOS DA
VIRADA TECNOLÓGICA NO DIREITO PROCESSUAL. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 635. 9 FERRARI, Isabela; BECKER, Daniel. Direito à explicação e decisões automatizadas: reflexões sobre o
princípio do contraditório. In: NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique Santos; WOLKART, Erik Navarro.
(org.) INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E DIREITO PROCESSUAL: OS IMPACTOS DA VIRADA
TECNOLÓGICA NO DIREITO PROCESSUAL. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 221.
23
decisão maior a sua efetividade e legitimidade, o que pode não ocorrer quando utilização da
inteligência artificial e dos algoritmos. Esta culmina por sumarizar a cognição na formação
dos precedentes judiciais e retira o espaço processual de participação dialógica dos
interessados na construção do provimento jurisdicional. A utilização de técnicas processuais e
procedimentais de julgamento torna inviável a formação participada do mérito, além de
restringir o espaço processual de debate fático-racional dos pontos controversos da demanda.
Dessa forma, institucionaliza-se um modelo massificado de julgamentos, cuja fundamentação
racional quase sempre deixa de permitir uma análise pormenorizada das peculiaridades fáticas
e jurídico-legais que caracterizam cada pretensão levada ao poder Judiciário. Assim, pode-se
concluir que o uso da inteligência artificial constitui mais uma técnica de proposição de um
modelo de processo autocrático, fundado em decisões unilaterais e solipsistas, haja vista que o
seu destinatário final fica impossibilitado da construção discursivo-democrática do
provimento final de mérito.
REFERÊNCIAS
COSTA, Fabrício Veiga. Mérito Processual: a formação participada nas ações coletivas.
Belo Horizonte: Arraes Editores, 2012, p. 221.
DIDIER JÚNIOR, Fredie. O Recurso Extraordinário e a Transformação do Controle
Difuso de Constitucionalidade no Direito Bras. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre,
ano 13, nº 1080, 12 de setembro de 2013. Disponível em: https://www.paginasdedireito.com.br/index.php/artigos/175-artigos-set-2013/4799-o-recurso-
extraordinario-e-a-transformacao-do-controle-difuso-de-constitucionalidade-no-direito-bras.
Data de acesso em 07 de junho de 2020.
FERRARI, Isabela; BECKER, Daniel. Direito à explicação e decisões automatizadas:
reflexões sobre o princípio do contraditório. In: NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique
Santos; WOLKART, Erik Navarro. (org.) INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E DIREITO
PROCESSUAL: OS IMPACTOS DA VIRADA TECNOLÓGICA NO DIREITO
PROCESSUAL. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 199-225.
JÚNIOR THEORORO, Humberto; NUNES, Dierle José Coelho. A dimensão que urge
reconhecer ao contraditório no direito brasileiro: sua aplicação como garantia de influência,
de não surpresa e de aproveitamento da atividade processual. Revista de Processo. Ano 34. n.
168. Fev./2009, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
LASSALE, José María. Ciberleviatán- El colapso de la democracia liberal frente a la
revolución digital.1.ed. Barcelona: Arpa, 2019.
24
MORAIS, José Luis Bolzan. O ESTADO DE DIREITO “CONFRONTADO” PELA
“REVOLUÇÃO DA INTERNET”!. Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM. v.
13, n. 3. 2018. p.876-903.
ROSA, Alexandre Morais da; Guasque, Bárbara. Avanços da disrupção nos tribunais
brasileiros. In: NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique Santos; WOLKART, Erik
Navarro. (org.) INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E DIREITO PROCESSUAL: OS
IMPACTOS DA VIRADA TECNOLÓGICA NO DIREITO PROCESSUAL. Salvador:
Editora JusPodivm, 2020, p. 65-80.
VALE, Luís Manoel Borges do. A tomada de decisão por máquinas: a proibição, no
direito, de utilização de algoritmos não supervisionados. In: NUNES, Dierle; LUCON,
Paulo Henrique Santos; WOLKART, Erik Navarro. (org.) INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
E DIREITO PROCESSUAL: OS IMPACTOS DA VIRADA TECNOLÓGICA NO
DIREITO PROCESSUAL. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 629-640.
25
A RESOLUÇÃO DE DISPUTAS ONLINE E OS REFLEXOS ORIGINADOS PELA PANDEMIA
ONLINE DISPUTE RESOLUTION AND REFLECTIONS ORIGINATED BY PANDEMIC
Maria Clara GiassettiLeonardo Marques Vieira
Resumo
Do emprego das tecnologias de comunicações e de resolução de disputas online, verificam-se
diversos benefícios aptos à efetivação do acesso à justiça, entretanto também existem
contrapontos, como a desigualdade no acesso da população à Internet. Partindo de
questionamentos sobre a necessidade de solucionar os óbices ao acesso à justiça,
principalmente considerando o atual contexto pandêmico, quer-se demonstrar que a
efetivação do direito fundamental à Internet é essencial para se alcançar o acesso à justiça. A
metodologia adotada para desenvolvimento é a bibliográfica, pelo método dedutivo,
aplicando procedimento empírico observacional e análise quali-quanti de dados.
Palavras-chave: Resolução de disputas online, Pandemia, Desenvolvimento tecnológico, Inteligência artificial, Virtualização
Abstract/Resumen/Résumé
From the use of communication technologies and online dispute resolution, there are several
benefits suitable for effective access to justice, however there are also counterpoints, such as
inequality in the population's access to the Internet. Based on questions about the need to
resolve obstacles to access to justice, especially considering the current pandemic context, we
want to demonstrate that the realization of the fundamental right to the Internet is essential to
achieve access to justice. The methodology adopted for development is bibliographic, by the
deductive method, applying empirical observational procedure and quali-quanti data analysis.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Online dispute resolution, Pandemic, Technological development, Artificial intelligence, Virtualization
26
1. INTRODUÇÃO
O problema de pesquisa ora apresentado tange a forma como os métodos
alternativos de resolução de conflitos online (ODR) corroboram o acesso à justiça,
relacionam-se à inefetivação do direito de acesso à internet e quais são os impactos no
cenário pandêmico causado pelo COVID-19.
Os temas centrais do presente trabalho são, portanto, o acesso à justiça, o direito
à internet, a pandemia originada pelo COVID-19 e os ODR.
Posto isso, pretende-se demonstrar que o acesso à justiça, em sua concepção mais
ampla, o qual pode ser efetivado por meio da adoção de métodos alternativos de resolução
de conflitos (ADR), tem como grande aliado a Internet, por meio de ODR. Evidenciar-
se-á que adoção dos métodos alternativos online se faz ainda mais necessária no cenário
pandêmico, no qual há grande tumulto, inclusive no Judiciário. Não obstante, tendo em
vista que o cerne da discussão é a Internet, enquanto colaboradora à efetivação do acesso
à justiça, por meio dos ODR, este primeiro será analisado sob a ótica de norma de direito
fundamental.
A importância da discussão abordada é evidente, haja vista a atualidade e os
impactos que envolvem a temática. A pandemia COVID-19 produziu efeitos sérios na
vida de toda a sociedade mundial. A fim de minimizar os impactos, governos do mundo
todo estão tendo que virtualizar-se de alguma maneira, com o objetivo de fornecer uma
resposta à pandemia.
De início cumpre salientar, contudo, que o motivo da atual transformação judicial
vivida no âmbito online não está estritamente vinculado ao cenário pandêmico que
estamos vivendo. É de fácil constatação que em todo o globo os sistemas de justiça estão
em crise, haja vista a falta de estrutura e de representação da população carente. É
evidente, portanto, a existência de obstáculos ao acesso à justiça anteriores à pandemia
do COVID-19 - os quais, todavia, decerto foram agravados por ela. Tais problemas
referem-se a toda a sociedade, não sendo restritos a pessoas físicas, mas igualmente às
pessoas jurídicas.
Em meio a esse cenário caótico, os ODR apresentam soluções adequadas às lides.
O método adotado para a presente pesquisa é o dedutivo, alinhado a técnicas de
pesquisa bibliográficas, e análise de dados qualitativos e quantitativos, para uma melhor
compreensão do universo das tecnologias comunicacionais dentro da estrutura do poder
judiciário.
2. ACESSO À JUSTIÇA
27
O ano de 1689 introduziu, com o Bill of Rights, o direito de petição, qual, embora
permitisse que súditos peticionassem contra a realeza, este privilégio apenas era
assegurado aos que pudessem arcar com custos e atrasos processuais, Aqui vale
mencionar o conceito clássico de acesso à justiça, de CAPPELLETTI (1988, p. 9), o qual
leciona o acesso à justiça ser um direito natural – ou seja, anterior ao Estado – e, por isso,
não necessitar de ações estatais positivas para sua proteção - concepção esta oriunda da
primeira dimensão de direitos humanos.
É certo que esse direito veio a ser de fato consagrado, todavia, apenas no pós 2ª
guerra mundial, quando passou a ser visto como garantidor de outros direitos.
A postura estatal negativa, por sua vez, foi alterada no contexto histórico do
Welfare State, na altura da segunda dimensão de direitos humanos, ante à pressão popular
por ações que assegurassem o gozo de direitos sociais básicos. Ou seja, a igualdade formal
se tornou, em razão da conjuntura atinente à segunda dimensão de direitos humanos,
igualdade material. O conceito de acesso à justiça, entretanto, não deixou de evoluir.
Anteriormente limitado à possibilidade de o cidadão procurar o Judiciário, atualmente
expande-se a fim de que acesso à justiça também corresponda à entrega de tutela
jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva.
O acesso à justiça, portanto, não obstante se desdobrar em acesso ao judiciário, se
desdobra também na ideia de o cidadão ter um conflito solucionado - por intermédio ou
não do Estado - visto relacionar-se à busca da sociedade do valor de justiça.
Dito isso e considerando a corrente inaptidão do processo na produção dos efeitos
práticos esperados, a busca por justiça pode se dar por meio de métodos alternativos ao
Judiciário, tais quais, mediação, conciliação, arbitragem, pensamento sistêmico, justiça
restaurativa, etc., e, por isso, os ADR, cujas vantagens serão minunciadas à frente, são
compreendidos como forma de efetivação do acesso à justiça.
3. ACESSO À INTERNET
A importância da Internet atualmente é patente, a julgar pelas transformações
propiciadas nas relações sociais, comerciais, políticas e culturais. De um modo geral, a
Internet poderá ser utilizada como um recurso ou como um obstáculo ao acesso à justiça,
isto é, ao invés de apoiar-se na democratização e inclusão se converte em um mecanismo
de desigualdade.
Por consequência, ao analisarmos o nosso redor, constatamos que a maioria da
população possui acesso à rede, principalmente nas grandes capitais, dessa forma
28
tomamos como fato de que o acesso à Internet é universal. Ledo engano. Em que pese o
uso da Internet estar crescendo, a Comissão de Banda Larga da ONU divulgou um
relatório no qual estima-se que 3,9 bilhões de pessoas no mundo não possuem acesso a
rede, este valor equivale a 53% da população mundial. No Brasil, estudos realizados pelo
Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), demonstram que, em 2018, apenas 46,5
milhões de domicílios brasileiros tinham acesso à Internet e cerca de 126,9 milhões de
indivíduos estavam conectados à rede.
De acordo com Tim Berners-Lee, inventor da World Wide Web, para conectar
toda a população mundial os Governos deverão visar grupos tipicamente excluídos –
população carente, pessoas que vivem nas áreas rurais etc. Assim como a eletricidade no
século passado era considerada essencial, vemos que hoje a Internet também o é. À vista
disso, não basta o fornecimento tão somente do acesso à Internet, torna-se necessário
haver iniciativas de alfabetização digital, a fim de auxiliar as pessoas a adquirir
habilidades necessárias para sua utilização e salvaguardar o direito da população para o
exercício pleno da cidadania.
A Internet é considerada como meio pelo qual a participação ativa dos cidadãos
na construção de sociedades democráticas é facilitada. Assim, a Organização das Nações
Unidas (ONU) considera o acesso à Internet como um direito humano, por meio do qual
indivíduos podem exercer seus direitos de liberdade de expressão e opinião, conforme
positivado no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos do Humanos.
Verifica-se que a Internet é o principal meio de acesso à informação, além de peça
essencial para a democracia. Dessa forma, a Constituição Federal assegura o direito
fundamental da liberdade de informação, dispondo em seu em seu artigo 5º, inciso XIV
o seguinte: "é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte,
quando necessário ao exercício profissional”. Em âmbito infraconstitucional, o Marco
Civil da Internet preconiza em seu art. 7º o acesso à Internet ser essencial ao exercício da
cidadania. Entretanto, nesse país repleto de desigualdade, a Internet não é a exceção que
confirma a regra. Para que haja exercício pleno de parcela dos direitos fundamentais, é
necessário a efetivação do acesso à Internet. Nesse contexto, à título de exemplo temos o
acesso ao Poder Judiciário, através do Processo Judicial Eletrônico, sendo acessíveis
somente via Internet.
29
Dessa forma, pode-se concluir que o acesso à Internet é um direito humano, em
que pese não ter status, no Brasil, de direito fundamental, ante a sua não positivação na
Constituição Federal de 1988. Contudo, vê-se que, na época da positivação da
Constituição Federal, os direitos digitais não eram uma realidade – hoje são necessários.
Assim, é vital olharmos a Constituição com os olhos de hoje e não do passado a fim de
pensarmos que ela merece uma atualização, permitindo com isso, a plena inclusão digital.
4. MÉTODOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS
ONLINE EM TEMPOS DE COVID-19
A era digital que vivemos revela desafios únicos para a sociedade, inclusive para
o âmbito jurídico. Vê-se o progresso da comunicação e conectividade online propiciou
modos inovadores de resolver disputas.
Em termos gerais, a resolução online de disputas (ODR) é uma forma de ADR,
ou seja, resolução alternativa de conflitos, entretanto esta incorpora as tecnologias da
informação e comunicação, isto é, utiliza-se a Internet como um método mais eficiente
para as partes resolverem os litígios, através de uma pluralidade de métodos de ADR.
Dessa forma, os ODR fornecem um meio alternativo ao judiciário para resolver
os conflitos, desafogando-o de casos que poderiam facilmente ser resolvidos pelos
métodos alternativos online. O emprego destes exterioriza um novo caminho, a fim de
tentar solucionar obstáculos originados da cultura de litigância que acumula o Judiciário
brasileiro.
De acordo com o relatório intitulado “Justiça em Números” do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ), considerado como fonte de estatísticas do Poder Judiciário, no qual
organiza as informações dos 90 tribunais brasileiros, no relatório de 2019 (ano-base
2018), tem-se que o Poder Judiciário findou o ano de 2018 com 78,7 milhões de processos
em tramitação, sendo que 14,1 milhões encontravam-se suspensos, diferentemente do ano
anterior no qual haviam mais de 80 milhões de processos. Por conseguinte, os meios
alternativos de resolução de disputas online, revelam-se fundamentais, potencializando
uma nova perspectiva de acesso à justiça eficiente, com a capacidade de diminuir o
número de processos existentes em virtude desse cenário litigante.
30
A Organização Mundial da Saúde (OMS), em 11 de março de 2020, caracterizou
o COVID-19 como uma pandemia, provocando, assim, grandes impactos, inclusive nas
atividades jurisdicionais, visto que os tribunais espalhados pelo Brasil começaram a
publicar atos a fim de suspender os expedientes, restringir acesso e até mesmo suspender
os prazos processuais, gerando demasiada insegurança no âmbito jurídico.
Assim, a dissipação do COVID-19 e a determinação de distanciamento social,
fizeram com que a garantia constitucional ao acesso à justiça fosse reprimida ante a
prorrogação e a suspensão de prazos processuais em diversos tribunais brasileiros,
motivando o Judiciário a se adaptar à nova realidade. Nesse sentido, Richard Susskind
elucida sobre justice as a service. Ou seja, o tribunal deve ser um serviço e não um local.
É certo, todavia, que a virtualização das relações tem escopo delimitado tão
somente à modernização, visando, notadamente, a democratização.
Paulatinamente constata-se que adoção de cortes online e de ODR são
indispensáveis para a efetivação acesso à justiça de modo mais eficiente, célere e
econômico. No Brasil, especialmente, um país de proporções continentais e detentor de
grande desigualdade, o emprego dos recursos online para a solução de conflitos não é
uma alternativa, mas sim um imperativo a ser utilizado para que não haja segregação da
população, por exemplo, impossibilitada financeiramente de enfrentar um processo
judicial.
Não se pode olvidar, entretanto, que mesmo o acesso à internet é um privilégio de
poucos – no Brasil e no restante do mundo.
No mais, é cediço Brasil o possuir enraizada uma cultura de litigância, ou seja, de
judicialização de todo e qualquer conflito. A população, contudo, deve passar a enxergar
a via jurisdicional como último caminho, e não como meio habitual de solução dos
conflitos. Os ODR, por exemplo, oferecem grandes vantagens, como a resolução do
conflito de forma mais célere, econômica, e efetiva, além de diminuir eventuais desgastes
emocionais, facilitar problemas de distância entre as partes e possibilita o desafogamento
do Judiciário – impactando, portanto, inclusive nos processos judiciais.
5. CONCLUSÃO
Conclui-se que a pandemia alterou o Judiciário, forçando adaptações ao meio
digital, intensificando o uso massivo da Internet.
Verifica-se que a Internet é direito humano segundo a ONU, e se tornou
fundamental para a participação na vida em sociedade e para a efetivação da democracia.
Sua ausência afronta direitos humanos e fundamentais, como o acesso à justiça.
31
Os métodos alternativos de solução de conflitos online claramente corroboram o
acesso à justiça, cuja concepção não pode ser restringida ao acesso ao Judiciário.
REFERÊNCIAS
ANNONI, Danielli. Direitos humanos e acesso à justiça no direito internacional. São
Paulo: Juruá, 2006.
BARBOSA, Luciana Piazzon; OYADOMARI, Lima Winston. Internet e participação
cultural: o cenário brasileiro segundo a pesquisa TIC Domicílios. Internetlab, 2020.
Disponível em: <https://revista.internetlab.org.br/internet-e-participacao-cultural-o-
cenario-brasileiro-segundo-a-pesquisa-tic-domicilios/> Acesso em: 04 de jun. de 2020.
BERNERS-LEE, Tim. Covid-19 makes it clearer than ever: access to the internet
should be a universal right. The Guardian, 2020. Disponível em:
<https://www.theguardian.com/commentisfree/2020/jun/04/covid-19-internet-universal-
right-lockdown-
online?CMP=share_btn_fb&fbclid=IwAR3JvJgQffc6yCTI7Tx7xIl5RsS8XSesMd-
P93KMxVv4nnp8tWylPIOevy8> Acesso em: 04 de jun. de 2020.
Broadband Commission for Sustainable Development.. The State of Broadband:
Broadband catalyzing sustainable development. Disponível em:
<https://www.itu.int/dms_pub/itu-s/opb/pol/S-POL-BROADBAND.18-2017-PDF-
E.pdf> Acesso em: 07 de jun. de 2020.
CAOVILLA, Maria Aparecida Lucca. Acesso à justiça e cidadania. Chapecó, Argos,
2003.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Nortfleet.
Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1988.
GGI.BR - Comitê Gestor da Internet. (2019). TIC Domicílios 2018: principais
resultados. Disponível em
<https://www.cetic.br/media/analises/tic_domicilios_2018_coletiva_de_imprensa.pdf>
Acesso em: 04 de jun. de 2020.
32
INGLATERRA. Magna Charta Libertatum, de 1215. . Inglaterra, Disponível em:
http://www4.policiamilitar.sp.gov.br/unidades/dpcdh/Normas_Direitos_Humanos/MAG
NA%20CARTA%20-%20PORTUGU%C3%8AS.pdf. Acesso em: 07 jun. 2020.
MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. O acesso à justiça e os
institutos fundamentais do direito processual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
1993.
NIC.BR. Desigualdades Digitais no Espaço Urbano: um estudo sobre o acesso e o uso
da Internet na cidade de São Paulo. Comitê Gestor da Internet no Brasil, 2019.
Disponível em: <https://cgi.br/media/docs/publicacoes/7/11454920191028-
desigualdades_digitais_no_espaco_urbano.pdf> Acesso em: 04 de jun. de 2020.
NIC.BR; CETIC.BR. TIC para o Desenvolvimento Sustentável: recomendações de
políticas públicas que garantem direitos. Disponível em:
<https://cgi.br/media/docs/publicacoes/8/14582020190716-tic-para-o-desenvolvimento-
sustentavel.pdf> Acesso em: 04 de jun. de 2020.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Report of the Special Rapporteur on the
promotion and protection of the right to freedom of opinion and expression, Frank
La Rue. Disponível em:
<https://www2.ohchr.org/english/bodies/hrcouncil/docs/17session/A.HRC.17.27_en.pdf
> Acesso em 07 de jun. de 2020.
OPAS BRASIL. Folha informativa – COVID-19 (doença causada pelo novo
coronavírus). Disponível em:
<https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:co
vid19&Itemid=875> Acesso em: 11 jun. 2020
TERHORST, Danyelle Bezerra. O Acesso à Justiça e o Poder Judiciário. São Paulo:
XVIII Congresso Nacional do CONPEDI, 2009. P. 9002 a 9018. Disponível em:
<http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/sao_paulo/2716.pdf
>. Acesso em: 06 jun. 2020.
33
1 Graduando em Direito, modalidade integral, pela Escola Superior Dom Helder Câmara1
A TECNOLOGIA À SERVIÇO DO CRIME: MEIOS DE COMBATE A PRÁTICA DELITUOSA DENTRO DO SISTEMA CARCERÁRIO
TECHNOLOGY AT THE SERVICE OF CRIME: WAYS OF FIGHTING CRIMINAL PRACTICE WITHIN CARCERARIO SYSTEM
Sérgio Luiz Souza Ribeiro Filho 1
Resumo
Através da tecnologia, as organizações criminosas têm rompido todos os limites impostos
pelo Estado para garantir os direitos e deveres do cidadão. Entretanto, não se tem visto o uso
dessa tecnologia a favor do sistema, para fortalecer a eficácia desses limites. Portanto, essa
pesquisa disserta sobre a instabilidade das instituições responsáveis pela garantia de um
ordenamento harmônico na sociedade, apontando falhas nos mecanismos utilizados, e
propondo uma reflexão sobre as possíveis formas de desenvolver medidas favoráveis à
segurança pública, e todos os propósitos que fundamentam a necessidade dos presídios
através de medidas que sejam verdadeiramente aplicáveis no Brasil.
Palavras-chave: Tecnologia, Organizações criminosas, Segurança pública, Presídios
Abstract/Resumen/Résumé
Through the technology, criminal organizations have breached all limits imposed by State to
insure citizen’s rights and duties. However, there isn’t the use of this technology in favor of
the system, to strengthen the applicability of these limits. Therefore, this research is about the
instability of the responsables institutionsfor warrantya harmonic ordering in the society,
pointing some flaws in the used mechanisms, and proposing a thought on the possible ways
of developing favorable measures to the public security, and all intentions that justify the
necessity for prisons through of measures that are imposed in Brazil.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Technology, Criminal organizations, Public security, Prisons
1
34
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A pesquisa tem como tema principal o uso da tecnologia pelas facções criminosas
dentro do sistema presidiário brasileiro e meios de combater essa prática, uma vez que, a Lei
de Execução Penal (LEP), considera pena grave o uso desta em seu interior. É de suma
importância entender que os grupos criminosos tem uma certa autonomia dentro da maioria
dos cárceres, sendo que esta não deveria existir de forma alguma. Esse fato supracitado
acontece, devido à mínima preocupação das autoridades federais e estaduais com esse setor.
Assim sendo, a liberdade dessas associações facínoras fará com que o crime organizado seja
controlado, podendo gerar um reflexo maléfico na sociedade.
É necessário considerar que essa situação está longe de ser controlada. O que se
propõe é como as facções criminosas conseguem usufruir das tecnologias dentro das
penitenciárias, sendo que não podem como foi mencionado anteriormente. Algo de extrema
relevância, é a péssima situação em que o sistema carcerário brasileiro se encontra, pois,
principalmente o Estado não presa em dar a atenção devida a este setor, mas essa vem do
poder público, que trata as ações das facções como algo “normal” e aceitam a sua liberdade
dentro dos cárceres, sem que percam o controle de seus trabalhos.
A pesquisa que se propõe pertence à vertente metodológica jurídico-sociológica. No
tocante ao tipo de investigação, foi escolhido, na classificação de Witker (1985) e Gustin
(2010), o tipo jurídico-projetivo. O raciocínio desenvolvido na pesquisa será
predominantemente dialético.
2. AS PRINCIPAIS FACÇÕES CRIMINOSAS, A SUA INFLUÊNCIA NO AMBIENTE
CARCERÁRIO E A NEGLIGÊNCIA DO ESTADO
O Brasil é considerado um dos países maios violentos do mundo. Diante disso pode-
se imaginar sobre a violência no país, e consequentemente um de seus causadores, as facções
criminosas. Os principais e mais violentos grupos criminoso são, como aponta Campos e
Santos (2020, pg.11), a Falange Vermelha que é especializada em roubos a banco, o Comando
Vermelho que busca liberdade, paz e justiça através da violência, o Terceiro Comando tinha
componentes que discordavam da prática de crimes comuns nos lugares em que a facção
atuava, o PCC (Primeiro Comando da Capital) patrocina revoltas e atua no resgate de presos
nos estados do país, como também participam de roubo a bancos e a carros de transporte de
valor, ameaçam familiares dos presos, atuam em sequestros e no tráfico ilícito internacional, a
35
Seita Satânica tem como objetivo curar usuários de droga, solucionar problemas que
envolvem o financeiro, processos, famílias e saúde. Apoiam presos que não possuem um
auxílio, CDL (Comando Democrático pela Liberdade) que luta pelos direitos que os presos
possuem junto às autoridades administrativas das penitenciarias brasileiras, debatem sobre
empresas jurídicas nos presídios para oferecer trabalho aos sentenciados, com o intuito de
descobrir, produzir e lançar para a sociedade brasileira, infinitos talentos que vivem nas
prisões brasileiras, promove o suporte jurídico de todos, impedem opressões de presos contra
os outros, sendo assim rival do PCC, por fim, CRBC(Comando Revolucionário Brasileiro da
Criminalidade) que presa a arrecadação de mensalidades dos integrantes, para o resgate de
outros membros da facção.
Para se adentrar mais no conhecimento sobre as facções criminosas, primeiramente é
necessário entender seu conceito, e de acordo com a Lei 12.850/13:
Associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.( BRASIL, 2013).
As facções criminosas possuem dentro dos presídios, certa autonomia para agir e
impor suas regras sobre as que são estabelecidas pela constituição, dentro daquilo que se
entende sobre o objetivo principal do sistema carcerário, e das instituições federais
correlacionadas a esse contexto. Dessa forma, a função dos presídios, que é estabelecer um
processo de ressocialização para os detentos, a partir do princípio funcional da sociedade,
acaba se tornando utópico, já que toda essa autonomia obtida pelas facções concede aos
detentos envolvidos no crime organizado, o poder de exercer grande parte das suas ações
ilegais, principalmente por meio das tecnologias.
Sobre a autonomia das organizações criminosas dentro do sistema carcerário
brasileiro, segundo Antônio César Pimentel Caldeira:
Essas organizações criminosas têm capacidade de intimidar agentes penitenciários e recursos para suborná-los. Além disso, são capazes de se comunicar com o exterior, através de familiares, advogados, assistentes religiosos ou por meio de celulares e radiotransmissores. As lideranças dessas organizações impõem disciplina à massa carcerária e dispõem de poder até sobre a vida dos detentos. (CALDEIRA, 2016,pg.3).
O sistema carcerário brasileiro encontra-se comprometido em relação à situação
financeira, carecendo de apoio do Estado. Diante desse fato, de negligência por parte de
36
Estado, o controle das penitenciárias brasileiras se encontram sob comando das facções
criminosas, e devido a isso, favorece o aumento de suas ações fora das penitenciarias,
auxiliadas e efetuadas pelo o uso das tecnologias, construindo um legítimo comprometimento
da segurança pública. De acordo com Ingrid Rossana Santos de Araújo:
Existe um abandono por parte do estado e uma ‘adoção’, se assim posso dizer, por parte do poder público, que acabou aceitando as facções criminosas dentro dos presídios, o que acabou acarretando em seu fomento e fortalecimento, fazendo com que estas facções fossem algo normal e oficial, deixando-as completamente à vontade e livres para tomar decisões internas, que seriam de cunho da segurança do presídio, demonstrando completo controle interno sobre o presídio, como por exemplo: a transferência de um preso para outra galeria, ou seja, quem deveria decidir se um preso vai para outra galeria seria a administração do presidio, o que não ocorre, pois quem acaba decidindo isto, é o preso. (ARAUJO, 2013).
Diante desses fatos, conclui-se que o sistema carcerário brasileiro encontra-se
comprometido no tangente à situação financeira, carecendo de apoio do Estado, tendo as
organizações criminosas como “supremas”. Tal carência dificulta o financiamento de
mudanças positivas na infraestrutura e segurança das penitenciárias, favorecendo a
onipresença das facções criminosas.
3. QUAL O PAPEL DA TECNOLOGIA NESSE PROCESSO E COMO ELE PODE
SER REVERTIDO
A segurança pública está diretamente ligada à sanção que é imposta pelo estado, na
execução de uma sentença cuja finalidade é exclusivamente preventiva, no sentido de evitar
que o autor de uma infração penal tenha demonstrado periculosidade a delinquir novamente.
(CAPEZ, 2011,p.128). Essa finalidade é subjetiva ao infrator, e não tem sido atendida através
da sanção imposta graças à tecnologia que está sob o poder das facções criminosas dentro dos
presídios.
O contrabando de celulares é, provavelmente, o pior tipo de contrabando para as
prisões, porque permite aos criminosos continuarem praticando dentro dos presídios, as
atividades criminosas que os levaram para a prisão, e essa é uma vantagem que o celular da
aos presos, porque as linhas de telefone comuns são monitoradas pelo pessoal da prisão. (FBI,
2014)
Dessa forma, é bastante evidente que, através desse contrabando, muitos criminosos
usam o celular para comandar suas facções de dentro dos presídios e, com alguma frequência,
37
para organizar fugas. Além disso, eles usam celulares para se comunicar entre si, ordenando
retaliações entre outros presos para enviar fotos ameaçadoras às vitimas, impossibilitando
assim,a existência de um sistema carcerário idealizado para fazer cumprir a Lei de Execução
Penal 7.210 (LEP) brasileira, que dispõe em seu artigo primeiro que o objetivo da pena é
proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado.
Segundo Fábio Moreira:
O grande problema que temos hoje com organizações criminosas ameaçando o Estado e a ordem vem justamente do seu poder de comunicação. Esse poder é tão grande que impossibilita o cumprimento das regras por parte dos funcionários do sistema penitenciário e coloca toda sociedade como refém do medo de ataques coordenados. Se os líderes dessas organizações não possuírem comunicação, eles serão colocados de lado e não terão mais poder de ameaça, justamente um dos objetivos da reclusão. O mais importante é que o bloqueio de comunicação não é uma discussão técnica, e sim administrativa e sobretudo política,uma vez que a tecnologia para realizar o bloqueio é abundante e custos são baixos.” (MOREIRA,F.2012).
Para solucionar o problema da comunicação através de um mecanismo que seja
inerente à corrupção dentro dos presídios, foi elaborada uma lei em 2003 que exige a
instalação de bloqueadores de celular nas prisões para impedir que os detentos se
comuniquem com outras pessoas de forma ilegal, e comandem atividades criminosas. O
projeto de lei foi a prova com duas emendas. De acordo com o Senador Lasier Martins(PSD-
RS), “ as operadoras, por sua vez, franquearão acesso irrestrito às informações para que as
autoridades tornem mais eficiente o combate à criminalidade,uma vez que parte do interior
dos presídios a organização de diversos crimes.”(SENADO, 2018) .Segundo o Senador
Romero Jucá, “ a concessão de novas outorgas para o serviço móvel celular e a renovação das
atuais ficará condicionada à instalação, custeio e manutenção dos equipamentos.” (SENADO,
2018). Esse projeto de lei foi aprovado somente em 2018 no Senado com a autoria do ex-
presidente da casa, Eunício Oliveira(MDB/CE).
Os bloqueadores de celular foram desenvolvidos para interferir no sinal, e assim
romper a comunicação realizada entre os detentos. Entretanto, a procedência desse projeto
não surtiu grandes efeitos até os dias atuais devido aos diversos obstáculos. A instalação desse
recurso deveria ser apenas da União, com a colaboração dos estados e do Distrito Federal,
podendo ser utilizados também recursos do Fundo Penitenciário Nacional, ou seja, o projeto
sancionado apresenta modificações relevantes em comparação ao projeto original de 2003.
Essas modificações representam uma redução na verba para a instalação e manutenção dos
bloqueadores, e isso tem causado a desativação de vários bloqueadores em diversos estados
38
do país, devido à falta de remuneração, e consequentemente, impedindo a instalação de novos
bloqueadores nos presídios que estão faltando.
Dessa forma, é necessário que haja uma maior flexibilização da aplicação do Fundo de
Fiscalização das Telecomunicações (FISTEL), criado em 1996 para custear as despesas
realizadas pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), quando na verdade,
grande quantidade de dinheiro desse fundo tem sido desviado para usos que não tem nada a
ver com as telecomunicações, como o pagamento da ferrovia Norte-Sul, a compra de
remédios, e dinheiro para a marinha.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do exposto, verifica-se que há uma necessidade de reorganizar as estruturas
determinantes da funcionalidade das casas presidiárias no Brasil, de modo que seja possível
acabar de vez com o poder de comunicação dos detentos utilizando-se, principalmente, de um
recurso tecnológico capaz de enfraquecer o contrabando de celulares nas prisões em
detrimento de uma invalidez induzida dos aparelhos telefônicos, e assim reduzir a facilidade
do detento cometer novas infrações.
Dessa forma, é valido ressaltar a importância de uma mudança no aspecto
administrativo das instituições que existem para garantir a segurança pública, já que boa parte
das leis citadas durante a pesquisa foram aprovadas sem que houvesse um planejamento
eficiente para possibilitar o seu cumprimento, e consequentemente, sem possibilidade de surtir
efeito relevante na busca pelo objetivo proposto na legislação.
Portanto, pode-se concluir, que a implantação de regras no geral, sem uma
distribuição adequada de recursos para desenvolver e aplicar mecanismos capazes de manter o
ordenamento imposto pelo estado, apenas demonstra uma utopia no propósito das prisões
brasileiras que precisam ser levadas mais a serio pelas autoridades competentes. Caso
contrário, a justiça no Brasil continuará à mercê de um sistema submisso ao poder de
organizações criminosas, e não será capaz de proporcionar aquilo que é determinado na
Constituição.
5. REFERÊNCIAS
ARAUJO, Ingrid Rossana Santos de. A Formação das Facções Criminosas e seu papel no
sistema Carcerário. Uberaba, 2013. Disponível em:
39
https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/2850/a-formacao-faccoes-criminosas-seu-papel-sistema-carcerario#Sobre. Acesso em: 5 junho. 2020 BRASIL. Casa Civil, LEI Nº 11.466, DE 28 DE MARÇO DE 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Lei/L11466.htm. Acesso em: 5 junho. 2020 BRASIL, Casa Civil, LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%207.210%2C%20DE%2011%20DE%20JULHO%20DE%201984.&text=Institui%20a%20Lei%20de. Acesso em: 5 junho.2020 BRASIL. Secretária Geral, LEI Nº12.850, DE 2 DE AGOSTO DE 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12850.htm#:~:text=1%C2%BA%20Esta%20Lei%20define%20organiza%C3%A7%C3%A3o,procedimento%20criminal%20a%20se. Acesso em: 6 junho. 2020 CALDEIRA, Antônio César Pimentel. Presídio sem Facção Criminosa no Rio de Janeiro?
Estudo sobre o experimento ocorrido no presídio Hélio Gomes. Rio de Janeiro: Ministério da Justiça, 2016. Disponível em: https://www.novo.justica.gov.br/sua-seguranca/seguranca-publica/analise-e-pesquisa/download/concurso_pesquisasaplicadas/presidio-sem-faccao-criminosa-no-estado-do-rio-de-janeiro. Acesso em: 6 junho.2020 CAMPOS E SANTOS. O Crime Organizado e as prisões no Brasil. Disponível em: https://www2.mppa.mp.br/sistemas/gcsubsites/upload/60/O%20Crime%20Organizado%20e%20as%20pris%C3%83%C2%B5es%20no%20Brasil(1).pdf. Acesso em: 7 junho.2020 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Disponível em: http://unesav.com.br/ckfinder/userfiles/files/Curso_de_Direito_Penal_1_-_Parte_Geral__15_edicao%5B1%5D.pdf. 2011. Acesso em: 7 junho.2020 GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa
jurídica: teoria e prática. 3ª. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. INVESTIGATION, Federal Bureau of. 2014. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2014-mai-19/brasil-justica-eua-tambem-nao-impedir-celulares-prisao. Acesso em: 7 junho. 2020 MOREIRA, Fábio. Avaliação de alternativas para do bloqueio de comunicação em áreas
restritas. 2012. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista-140/a-utilizacao-de-tecnologias-no-sistema-carcerario-brasileiro-como-forma-de-fiscalizacao-auxiliar-no-efetivo-cumprimento-da-pena/. Acesso em: 8 junho. 2020 SENADO, Agencia. Projeto de Lei do Senado. 2018. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/noticias/materias/2018/02/07/aprovada-instalacao-obrigatoria-de-bloqueadores-de-celulares-em-presidios. Acesso em: 9 junho.2020 WITKER, Jorge. Como elaborar uma tesis en derecho: pautas metodológicas y técnicas
para el estudiante o investigador del derecho. Madrid: Civitas, 1985.
40
41
A UTILIZAÇÃO DAS FERRAMENTAS TECNOLÓGICAS NA SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS
THE USE OF TECHNOLOGICAL TOOLS IN CONTROVERSIAL SETTLEMENT
Bruno Schettini CondéDhanilla Henrique Gontijo
Resumo
O presente artigo realiza uma análise perfunctória acerca dos recursos tecnológicos utilizados
no âmbito do Poder Judiciário, como forma de garantir a observância dos ditames
processuais e constitucionais. Serão apresentados os princípios constitucionais da celeridade
processual e da razoável duração do processo. Também será objeto de estudo a sistemática
processual vigente, que trouxe medidas adequadas de composição de conflitos, de modo a
conferir maior efetividade às normas constitucionais, com objetivo de estimular a
autocomposição. As técnicas e suportes tecnológicos utilizados em processos judiciais serão
minuciosamente destacados, pois demonstram a importância desses instrumentos para
garantir maior efetividade na solução das controvérsias.
Palavras-chave: Suportes tecnológicos, Solução de controvérsias, Celeridade processual, Razoável duração do processo
Abstract/Resumen/Résumé
This article presents a perfunctory analysis of the technological resources used in the sphere
of the Judiciary, as a way of ensuring compliance with the names of constitutional processes.
The constitutional principles of procedural speed and reasonable duration of the process will
be presented. It will be the object of study with systematic procedural surveillance, which
measures of conflict composition, a way of giving greater effectiveness to constitutional
norms, in order to encourage self-composition. As technological supports used in legal
proceedings will be carefully highlighted, this demonstrates the importance of these
instruments to ensure greater effectiveness in resolving disputes.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Technological supports, Dispute resolution, Procedural speed, Reasonable duration of the process
42
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho aponta como problema a ser discutido a utilização de
ferramentas tecnológicas pelo Poder Judiciário, bem como suas implicações e consequências
no âmbito da solução de conflitos.
Para tanto, esta pesquisa utiliza como hipótese os benefícios da utilização das formas
tecnológicas como ferramentas para promoção e estímulo para a solução consensual dos
conflitos, garantindo a observância dos princípios constitucionais processuais da celeridade
processual e da razoável duração do processo.
A questão será inicialmente abordada com a apresentação dos princípios
constitucionais processuais inseridos pela Emenda Constitucional n. 45/04, que acrescentou
os princípios da celeridade processual e da razoável duração do processo, buscando promover
a solução de conflitos de maneira a garantir a observância dos direitos fundamentais
individuais estabelecidos no artigo 5º, da Constituição Federal de 1988.
Em seguida, o conceito de métodos de soluções consensuais de conflitos será
abordado, demonstrando de forma específica a importância do referido instituto no âmbito dos
Juizados Especiais e no Código de Processo Civil de 2015.
Por fim, a utilização de técnicas e suportes tecnológicos nos processos judiciais será
defendida como forma de adequar a nova lei processual aos princípios e garantias
constitucionais, tendo em vista que servirão como subsídio para fundamentar a hipótese
apresentada.
Dessa forma, mostra-se relevante o desenvolvimento deste trabalho, em que se busca
demonstrar a importância das ferramentas tecnológicas nos processos judiciais como forma de
garantir a efetividade dos princípios constitucionais processuais em consonância com os
direitos fundamentais constitucionais.
2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E
DA CELERIDADE PROCESSUAL
Os direitos e as garantias fundamentais são prerrogativas constitucionais que
funcionam como proteção dos cidadãos contra as arbitrariedades cometidas pelo Estado.
Enquanto os direitos exprimem a existência legal dos benefícios conferidos
constitucionalmente, as garantias traduzem-se no direito de exigir dos poderes públicos a sua
proteção, utilizando-se dos meios processuais adequados à finalidade pretendida.
43
Dentre as garantias constitucionais elencadas no artigo 5º, os princípios da razoável
duração do processo e da celeridade processual estão previstos no inciso LXVIII e foram
incluídos pela Emenda Constitucional n. 45 de 2004, também conhecida como Reforma do
Poder Judiciário.
Uma das ideias norteadoras constantes da referida Emenda Constitucional foi
garantir maior satisfatividade para os litigantes de modo a assegurar uma efetiva prestação
jurisdicional para aqueles que necessitarem do Poder Judiciário.
Branco e Mendes (2018, p. 603/604) explicitam a importância da Emenda
Constitucional n. 45/2004 e relacionam os princípios da razoável duração do processo judicial
e da celeridade processual com o princípio da dignidade da pessoa humana:
A EC n. 45/2004 introduziu norma que assegura a razoável duração do processo
judicial e administrativo (art. 5º, LXXVIII). Positiva-se, assim, no direito
constitucional, orientação há muito perfilhada nas convenções internacionais sobre
direitos humanos e que alguns autores já consideravam implícita na ideia de
proteção judicial efetiva, no postulado da dignidade da pessoa humana e na própria
ideia de Estado de Direito. A duração indefinida ou ilimitada do processo judicial
afeta não apenas e de forma direta a ideia de proteção judicial efetiva, como
compromete de modo decisivo a proteção da dignidade da pessoa humana. Dessarte,
a Constituição conferiu significado especial ao princípio da dignidade humana como
postulado essencial da ordem constitucional (art. 1º, III, da CF/88). O Estado está
vinculado ao dever de respeito e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas
ou humilhações. Assim, tendo em vista a indissociabilidade entre proteção judicial
efetiva e prestação jurisdicional em prazo razoável, e a ausência de autonomia desta
última pretensão, é que julgamos pertinente tratar da questão relativa à duração
indefinida ou desmesurada do processo no contexto da proteção judicial efetiva. O
reconhecimento de um direito subjetivo a um processo célere – ou com duração
razoável – impõe ao Poder Público em geral e ao Poder Judiciário, em particular, a
adoção de medidas destinadas a realizar esse objetivo. (BRANCO e MENDES,
2018, p. 603/604):
Para garantir a concretização dos referidos princípios e efetivar a celeridade na
prestação jurisdicional, o Poder Judiciário vem utilizando vários instrumentos e ferramentas
para concretizar o princípio da razoável duração do processo.
Moraes (2018, p. 477) destaca que “o direito à razoável duração do processo indica
a necessidade de aceleração do processo, em razão de técnicas extraprocessuais,
extrajudiciais e judiciais”.
As referidas técnicas foram evidenciadas pela alteração na legislação, bem como
pelo investimento e promoção de conteúdo tecnológico no âmbito do Poder Judiciário, o que
tem garantindo maior efetividade e agilidade na tramitação dos processos judiciais.
3 MÉTODOS CONSENSUAIS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
44
As formas alternativas de solução de conflitos foram incorporadas ao processo judicial
como fase obrigatória, tanto na legislação processual comum (art. 3º, §3º, Código de Processo
Civil), como nas legislações especializadas dos Juizados Especiais Estaduais e Federais (art.
3º, Lei n. 9.099/1995; art. 3º; Lei n. 10.259/2001) e da Justiça do Trabalho (art. 652,
Consolidação das Leis do Trabalho).
Nesse contexto, os Juizados Especiais são de extrema importância para democratizar
o acesso ao Poder Judiciário, pois foram responsáveis por oferecer uma solução mais rápida e
efetiva aos conflitos de menor complexidade, garantindo a possibilidade de acesso a pessoas
de menor poderio aquisitivo, que tinham maior dificuldade de solucionar os seus conflitos, em
virtude da complexidade reservada à justiça comum.
A obtenção de uma providência jurisdicional efetiva, mediante um processo justo,
acessível e realizado em tempo razoável é, na atualidade, o principal foco de interesse da
processualística civil moderna. Daí a preocupação do legislador em modernizar a sistemática
processual, com normas e regras devidamente pautadas nos princípios da celeridade
processual, da simplificação dos procedimentos e o do estabelecimento de um procedimento
comum a ser adotados nos processos judiciais que tramitarem perante os Juizados Especiais.
Dentre os seus princípios norteadores, encontram-se os princípios da simplicidade,
da informalidade, da oralidade, da economia processual e da celeridade, que juntos, buscam
garantir a todos o acesso à justiça de forma efetiva, o que concretiza a ideia de
democratização da justiça.
O sistema inovador trazido pela Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, foi
decisivo para romper com o modelo jurídico previsto nas legislações anteriores, na medida em
que se deu maior ênfase à composição amigável dos conflitos intersubjetivos, utilizando de
métodos e procedimentos efetivos para sua concretização, estando prevista sua criação no
artigo 98, da Constituição Federal de 1988.
Segundo Bruno (2012, p. 185), “a partir da carta republicana de 1988, o acesso à
justiça ganhou posição de direito fundamental - com status de cláusula pétrea, o que motivou
o implemento de uma visão mais instrumental do referido instituto”
Devido à grande satisfação gerada com a Lei nº 9.099/95, nos anos seguintes foram
criados Juizados no âmbito da Justiça Federal, com a Lei nº 10.259/2001, e o Juizado Especial
da Fazenda Pública, com a Lei nº 12.153/2009, para compor o microssistema dos Juizados
Especiais.
45
Em 16 de março de 2015, a Lei nº 13.105, inaugurou as novas regras do sistema
processual civil brasileiro e, de forma contraposta, revogou os ditames legais do Código de
Processo Civil de 1973, trazendo uma série de mudanças que buscam conferir uma nova
dinâmica para o processo civil brasileiro, adaptando-o à realidade moderna.
Dentre as diversas alterações promovidas pelo legislador, destaca-se a criação de
novos mecanismos de solução de conflitos, que foram colocados à disposição dos litigantes,
apresentando regras que privilegiam o sistema de composição não coercitiva dos conflitos,
como forma de solução consensual para o litígio, tornando obrigatória audiência de
conciliação, na fase inicial, em discussões que envolvam direitos disponíveis, nos termos de
seu artigo 3º.
Nas modalidades de autocomposição, a participação das partes é de suma
importância, visto que a solução que virá, com o auxílio de terceiros, depende da atuação
ativa dos próprios litigantes, em prol da solução da controvérsia objeto da discussão judicial.
É importante ressaltar que o Código de Processo Civil também garante respaldo aos
meios heterônomos de solução de conflitos, trazendo destaque para o instituto da arbitragem,
que foi expressamente mencionada em diversos dispositivos constantes da sistemática
processual.
Todos os métodos e instrumentos alternativos capazes de auxiliar na resolução do
conflito serão estimulados, buscando a negociação entre as partes para alcançar uma
composição amistosa ou menos gravosa, ao invés de uma decisão judicial proferida por um
juiz.
4 SUPORTES TECNOLÓGICOS UTILIZADOS EM PROCESSOS JUDICIAIS
No esteio do cumprimento dos princípios constitucionais processuais da celeridade e
da razoável duração do processo, os suportes tecnológicos são considerados instrumentos
capazes de garantir a consecução dos direitos fundamentais dos cidadãos.
A Emenda Constitucional n. 45 de 2004 introduziu os referidos princípios no texto
constitucional e garantiu a busca por métodos, ferramentas e instrumentos que pudessem
assegurar a efetividade dos princípios constitucionais, permitindo a regulamentação dos
processos judiciais.
No que se refere à implementação de tecnologias, um marco relevante corresponde à
Lei n. 11.419/2006, cujo escopo foi materializar a disciplina do processo judicial eletrônico,
trazendo disposições gerais sobre a informatização, dentre as quais se evidencia o uso do meio
46
eletrônico indistintamente para todas as ramificações processuais (cível, penal, trabalhista,
fazenda pública, etc.), a transmissão e comunicação eletrônica dos atos processuais via
Internet e a assinatura digital.
Moraes (2017, p. 86) destaca que o advento da citada lei estabeleceu a “possibilidade
de utilização do meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e
transmissão de peças processuais, indistintamente, aos processos civil, penal e trabalhista,
bem como aos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição”.
Na referida lei do processo judicial eletrônico estão definidos os principais termos e
condições para a implementação da informatização dos processos judiciais, prevendo uma
metodologia a ser utilizada pelos tribunais brasileiros, preservando as prerrogativas dos
advogados e garantindo a segurança dos magistrados e dos demais usuários.
A partir disso, a legislação processual brasileira passou a admitir a utilização da
tecnologia nas diversas fases e modalidades processuais. Alguns exemplos são a possibilidade
de realização de interrogatório e de outros atos processuais por sistema de videoconferência
(Lei n. 11.900/09); citação e intimação por aplicativos de mensagens instantâneas; a
realização de audiências e de sessões virtuais; e, até mesmo, o cumprimento de medidas
expropriatórias, como penhora, avaliação e leilão/praça, por meio digitais.
No âmbito do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça implantou um
laboratório de inovação e um centro de inteligência artificial como meio de garantir a
tramitação mais célere e efetiva dos processos judiciais.
Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal lançou uma ferramenta de inteligência
artificial – PROJETO VICTOR – cujo objetivo inicial era processar os recursos no âmbito do
Tribunal e aumentar a velocidade na tramitação dos processos.
Os tribunais, em âmbito regional e estadual, passaram a utilizar as ferramentas
tecnológicas como aliadas para oferecer a prestação jurisdicional com a qualidade esperada,
garantindo a efetividade das medidas, com a redução do espaço de tempo, o que
consubstancia com os princípios constitucionais processuais da celeridade e da razoável
duração do processo.
5 CONCLUSÃO
O tema da utilização de técnicas e ferramentas tecnológicas nos processos judiciais é
de suma importância, tendo em vista a necessidade de garantir a observância dos preceitos
47
constitucionais, servindo a pesquisa como auxílio para o aprofundamento do debate acerca do
tema.
Para garantir a observância dos princípios da celeridade e da duração razoável dos
processos, a legislação processual vem sendo alterada, de modo a assegurar a promoção dos
métodos consensuais de solução de conflitos, permitindo, inclusive, a utilização de métodos
tecnológicos como forma de garantia a observância dos princípios constitucionais processuais.
A Lei n. 11.419/2006, cujo escopo foi materializar a disciplina do processo judicial
eletrônico, trazendo disposições gerais sobre a informatização, estabeleceu, de forma
expressa, a intenção de utilizar os meios eletrônicos indistintamente para todos as
ramificações processuais.
A legislação brasileira vem se aperfeiçoando para garantir a utilização de novas
tecnologias, tais como a possibilidade de oitiva de réus por videoconferência, assim como a
citação e intimação por aplicativos de mensagens instantâneas, assim como a realização de
audiências e sessões de julgamento virtuais.
Dessa forma, a utilização dos recursos tecnológicos como ferramentas essenciais
para promoção dos métodos consensuais de solução de conflitos é de extrema importância
para garantir a consecução dos princípios da celeridade processual e da razoável duração do
processo, além de permitir a efetividade das normas processuais, em consonância com os
direitos fundamentais constitucionais.
REFERÊNCIAS:
BACELLAR, Rodrigo Portugal. Mediação e Arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2012.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
_______. Código de Processo Civil de 2015. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
_______. Código Civil de 2002. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
_______. Lei nº 9.099 de 25 de setembro de 1995. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
_______. Lei nº 11.419 de 19 de dezembro de 2016. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
BRAGA NETO, Adolfo. Alguns Aspectos Relevantes sobre a Mediação de Conflitos. In:
GRINOVER, Ada Pelegrini; WATANABE Kazuo; LAGRASTA NETO, Caetano (coords.).
Mediação e gerenciamento do processo: revolução na prestação jurisdicional: guia
prático para a instalação do setor de conciliação e mediação. São Paulo: Editora Atlas,
2007. p. 63-70.
48
BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira; Curso de direito
constitucional. – 13. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
BRUNO, Susana. Conciliação: prática interdisciplinar e ferramentas para a satisfação do
Jurisdicionado. 1ªed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2012.
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 5ª ed. rev. atual. São
Paulo: Atlas, 2019.
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. A Era da informação: Economia, Sociedade
e Cultura. Vol. 1. Tradução Roneide Venancio Majer. 18ª Edição, revista e ampliada. São
Paulo: Paz e Terra, 2017.
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1: Introdução ao Direito
Processual Civil e Processo de Conhecimento. 17ª ed. Salvador: Juspodivm, 2015.
FERNANDES, Sônia Caetano. O novo modelo multiportas de solução dos conflitos e a no
vidade trazida pelo código de processo civil Câmaras de mediação e conciliação. Disponí
vel em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/257653/o-novo-modelo-multiportas-de-
solucao-dos-conflitos-e-a-novidade-trazida-pelo-codigo-de-processo-civil-camaras-de-
mediacao-e-conciliacao>. Acesso em: 11 de jun. de 2020.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 33. ed. rev. e atual. até a EC nº 95, de 15
de dezembro de 2016. São Paulo: Atlas, 2017.
MORAES, Guilherme Peña de. Curso de Direito Constitucional. 10ª ed. rev., atual. e ampl.
São Paulo: Atlas, 2018.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil – Volume Único.
12ª ed. rev. atual. Salvador: Editora JusPodivm, 2020.
RELATÓRIO justiça em números traz índice de conciliação. Conselho Nacional de Justiça,
2016. Disponível em:<https://www.cnj.jus.br/relatorio-justica-em-numeros-traz-indice-de-
conciliacao-pela-1-vez/>. Acesso em: 11 de jun. 2020.
SCAVONE JÚNIOR, Luiz Antônio. Manual de arbitragem: mediação e conciliação. 8ª ed.
rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Volume I. 61ª ed.
rev. atual. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2020.
49
1 Docente efetiva de Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável UEMG/Ituiutaba. Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais pela FDV. Especialista em Gestão e Direito Ambiental UNESA. Advogada. e-mail: [email protected].
2 Docente efetivo de Teoria do Processo e Direito Processual Civil UEMG/Ituiutaba. Mestre pela UFES. Especialista em Direito Processual Civil pela FDV. Advogado. e-mail: [email protected].
1
2
ACESSO À JUSTIÇA EM TEMPOS DE PANDEMIA: UMA ANÁLISE DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO NESSE PERÍODO
ACCESS TO JUSTICE IN PANDEMIC TIMES: AN ANALYSIS OF THE CONCILIATION HEARING IN THIS PERIOD
Jackelline Fraga Pessanha 1Marcelo Sant'Anna Vieira Gomes 2
Resumo
Nesse tempo de pandemia pela COVID-19 ocorreu a paralisação das atividades
jurisdicionais. Essas atividades começam a ser retomadas. Contudo, esse seguimento do
processo perpassa pela realização de audiências, que não conseguem ter a participação da
parte envolvida, justamente pela regra do distanciamento social. Por isso, o objeto do
presente texto é verificar se a audiência poderá acontecer sem as partes. Para isso, usar-se o
método dialético de solução dos conflitos, para verificar se as audiências de conciliação
realizadas por via eletrônica, sem a participação das partes, atendem aos preceitos do Acesso
à Justiça efetivo ao jurisdicionado.
Palavras-chave: Acesso à justiça, Pandemia, Audiência de conciliação
Abstract/Resumen/Résumé
In this pandemic time by COVID-19, jurisdictional activities were paralyzed. These activities
are beginning to resume. However, this follow-up of the process involves audiences, which
are unable to have the participation of the party involved, precisely by the rule of social
distance. Therefore, the object of this text is to verify if the hearing can take place without
the parties. To do this, use the dialectical method of conflict resolution to verify that the
reconciliation hearings held electronically, without the participation of the parties, meet the
precepts of Access to Justice effective for the jurisdicted.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Access to justice, Pandemic, Conciliation hearing
1
2
50
INTRODUÇÃO
Há tempos a doutrina se debruça sobre o tempo do acesso à justiça. Muito se discute
sobre suas disposições, se estariam relegadas a tratar, apenas, da possibilidade de provocar o
Poder Judiciário, ou se sua terminologia seria muito mais ampla para abarcar as resoluções que
ocorrem de maneira não institucionalizada. É esse o foco do presente manuscrito, ao buscar
entender o acesso à justiça, sob o viés da audiência de conciliação ocorrido durante o período
da pandemia do COVID-19. De antemão já se percebe que a forma pela qual vem sendo adotada
essa sistemática apresenta falhas.
A despeito das falhas, será possível observar o ponto e o contraponto do tema, a ponto
de se chegar a uma perspectiva mais adequada ao atual cenário e, em que medida, os
jurisdicionados possam estar sendo prejudicados com as medidas que vem sendo adotadas pelo
Judiciário Nacional. Para tanto, utilizar-se-á como ponto nodal o debate, no primeiro tópico,
sobre o que vem a ser acesso justiça para que, na sequência, possa ser tratado da audiência de
conciliação e, por fim, em que medida as ações do Judiciário tem afetado a ritualística do
processo, na atualidade. Tudo isso, com a finalidade de responder ao seguinte questionamento:
as audiências de conciliação realizadas por via eletrônica, sem a participação das partes,
atendem aos preceitos do Acesso à Justiça efetivo ao jurisdicionado?
Para tanto, se utilizará do método dialético de discussão, a fim de estabelecer uma
perspectiva contemporânea sobre o tema e analisar criticamente o fenômeno. Os grandes
expoentes sobre o debate são Mauro Cappelletti e Bryant Garth, que bem dispuseram sobre o
acesso à justiça na Itália, na década de 1980, que até hoje são lembrados por suas investigações,
pois os mesmos problemas ocorridos há mais de 30 anos no estrangeiro, ocorrem na atualidade,
em território nacional.
A AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO E A (DES)NECESSIDADE DE PARTICIPAÇÃO
DAS PARTES EM TEMPOS DE PANDEMIA: UMA ANÁLISE À LUZ DO ACESSO À
JUSTIÇA
A discussão que permeia o acesso à justiça acaba gerando confusão por parte daqueles
que não se debruçam sobre o tema. Quando no cotidiano se ouve a expressão de que não houve
respeito ao acesso à justiça, no caso concreto, logo há alusão ao Acesso ao Poder Judiciário.
Mas, essa é apenas uma das vertentes. Não se nega que o art. 5º, inciso XXXV, do diploma
constitucional estabeleça que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito” (BRASIL, 1988, p.1), mas da mesma forma, deve ser percebido que não é
apenas o Poder Judiciário aquele que tem condições de resolver todos os problemas.
51
Tem-se presente que a principiologia do Código de Processo Civil vigente deu um
novo ar à sistemática da vida do operador do direito. O art. 1º do Código de Processo Civil já
deixa bem claro a necessidade dos valores constitucionais, que inspiram toda a legislação
processual. Da mesma forma, entre os arts. 1º e 12, é possível extrair numerosos artigos que
influenciam todo o sistema e que estabelecem quase que uma norma de conduta adequada ao
profissional que lidará com ele.
Mas, a grande inovação exsurge do art. 3º, §2º, no qual consta que “o Estado
promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos” (BRASIL, 2015, p. 1).
Isso quer dizer que, aqueles valores constitucionais de aplicação imediata e que influenciam
todo o diploma processual, também estão atrelados aos preceitos de levar justiça ao caso
concreto.
E é esse o presente foco: fazer compreender que acesso à Justiça, não necessariamente
é acesso ao Poder Judiciário. Pelo contrário, ele é apenas uma das formas de justiça. A palavra
justiça é absolutamente polissêmica, estando enquadrada em cada contexto, com sua respectiva
percepção. Muito mais que apenas dizer que todos a possuem, o adequado é garantir a resolução
do conflito que lhe é posto.
Assim, consigna-se que a justiça a qual esse manuscrito se remete, é a justiça efetiva,
ou em outras palavras, aquela que além de respeitar a latência do conflito, a fim de fazê-lo
cessar, ela respeita os direitos básicos e fundamentais do indivíduo. Tanto é assim, “o acesso à
justiça pode, portanto, ser encarado como requisito fundamental – o mais básico dos direitos
humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas
proclamar os direitos de todos” (CAPPELLETTI e GARTH, 1988, p. 12).
Diante disso, a constatação o que se evidencia é que, desde que haja um processo de
garantia de direitos, por outros meios, estes devem ser utilizados, inclusive, a fim de evitar um
superaquecimento da máquina estatal, ao insufla-la de tantos processos judiciais. Parte-se,
então, da desjudicialização processual.
Esse movimento pela desjudicialização, portanto, parte da premissa de que é
necessário dar uma solução ao problema do Judiciário em dar uma resposta, em especial, no
que tange à demora e aos custos do processo, o que o torna, sobremaneira, dificultoso à
coletividade (PINHO e STANCATI, 2016, p. 24). Assim, a disposição do art. 3º é de suma
importância na atual sistemática do Direito Processual Civil, por se tratar de uma tentativa do
legislativa de resolver o problema da morosidade processual e da credibilidade do Judiciário
perante a coletividade.
Toda essa concepção é respaldada por princípios que dão sustentáculo e base à
52
manutenção de um sistema fluido. Esse protagonismo ocorre tanto na seara judicial, como na
extrajudicial. Em ambos os casos, os métodos autocompositivos acabam sendo admitidos, com
o intuito de se chegar a melhor solução ao caso concreto. A imposição por um terceiro, através
de uma heterocomposição, sempre resvala na ideia de ganhador e perdedor, tornando o conflito
um ringue de disputa, onde um irá se sobrepor ao outro.
Se o processo for tratado como disputa, seu escopo de harmonia e pacificação social,
jamais será atingido. Nesse sentido, “é de se afirmar que o Judiciário nem sempre corporifica,
por seus atos, a Justiça tão decantada desde Aristóteles até os tempos hodiernos, pois está sujeito
a ser ilaqueado e destarte incorrer em injustiças” (OLIVEIRA NETO e Viana, 2015, p. 178),
motivo pelo qual a solução pode partir da chamada justiça multiportas, o que quer dizer, em
minúcias formas alternativas ao Judiciário para a solução dos problemas (SANDER, 1976, p.
267)
Só que, essa justiça multiportas, mesmo tendo como escopo retirar do Poder Judiciário
os casos que envolvem situações conflituosas, influenciou o próprio procedimento processual.
Tanto é assim que, além do art. 3º informar a necessidade de se tentar a solução consensual dos
conflitos, houve a inserção, expressa de um dispositivo no qual torna obrigatória a realização
de uma audiência de conciliação, antes mesmo da apresentação de contestação pelo réu.
É dessa audiência que a discussão acaba por partir, pois diante dos fundamentos que
respaldam sua utilização, resta investigar se momento atual de convivência com a pandemia do
COVID-19 é possível utilizar de sistemas eletrônicos de forma a preservar a manutenção do
acesso à justiça. É fato público e notório que o mundo passa por uma pandemia de números
catastróficos. Diante disso, cada setor da sociedade civil tem se adequado com o objetivo de
garantir maior segurança à saúde da coletividade, permitindo que vários dos atos comuns da
rotina diária sejam realizados de forma eletrônica e/ou remota.
Para se adequar a toda essa sistemática, o Poder Judiciário teve que se adequar à nova
realidade. Isso porque, ante a necessidade de manutenção de distanciamento social, conjugada
à prestação do serviço jurisdicional, meios alternativos de participação em atos processuais
foram necessários. É nesse contexto que o Conselho Nacional de Justiça disponibilizou uma
Plataforma Emergencial de Videoconferência denominada de Cisco Webex Meet1, sistema que
permitirá aos advogados a sustentação oral perante tribunais, bem como participação em atos
processuais orais nos juízos de piso.
Ocorre que, esses sistemas podem ser observados como excelentes fontes para que seja
1 Para maiores informações sobre o sistema, as informações constam no sítio eletrônico: https://www.cnj.jus.br/plataforma-videoconferencia-nacional/
53
cumprido o desígnio da continuidade do processo judicial, contudo, grave problema vem à tona,
quando se está a tratar com o jurisdicionado. É sabido que o acesso à informatização pela
população é extremamente deficitário. Da mesma forma, tem-se presente que as empresas
concessionárias de serviço público nem sempre prestam um serviço de qualidade, a ponto de
atestarmos sua confiabilidade de acesso quando e onde houver a necessidade: aqui o grande
problema.
O Conselho Nacional de Justiça, ao disponibilizar a ferramenta, deixa claro que é dever
dos usuários ter condições de acesso à plataforma por meio de conexão de internet. E então, o
jurisdicionado mais uma vez acaba sendo relegado ao segundo plano. Mas, como assim chega-
se a essa afirmação? Perceba-se que o art. 334, do Código de Processo Civil, estabelece que
cabe ao juiz a designação de audiência de conciliação, para que as partes consigam solucionar,
consensualmente, seus conflitos.
Dessa forma, pautado no referido dispositivo, às partes deve ser conferida a
possibilidade de serem ouvidas e dialogarem para poderem chegar a uma solução que atenda
aos seus interesses. Contudo, diante de um sistema eletrônico, no qual muitos não possuem
acesso, difícil acaba sendo a consolidação desse preceito e, por consequência, do dever
constitucional de acesso à justiça.
Isso porque, se não são conferidos meios para que as partes possam dialogar, não há
como afirmar que aquela situação seja a mais adequada ao caso concreto. Muito pelo contrário,
passa-se a falsa percepção de que há uma preocupação com o jurisdicionado, mas na prática,
tem-se demonstrado que o sistema se preocupa, tão-somente, com o caminhar do processo e
com a necessidade de não congestionar as varas por todo o Brasil, com processos represados, a
ponto de prejudicarem a prestação jurisdicional.
Como solução, muitos magistrados estão adotando a postura de, ainda que não de
forma regulamentada por portaria ou instrumento normativo, dar seguimento às ações judiciais,
ainda que sem a participação das partes. Como o advogado em suas procurações possuem
mandato no qual lhes conferem, na grande maioria das vezes, a possibilidade de transigir, o
Judiciário, em certas Comarcas, está se utilizando dessa abertura para poder realizar as
audiências de conciliação, mesmo sem a participação de autor e réu.
Daí porque, nesse ponto, é preciso observar se agir dessa forma é garantir acesso à
justiça, pois ela determina “duas finalidades básicas do sistema jurídico: - o sistema pelo qual
as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do
Estado” (CAPPELLETTI e GARTH, 1988, p. 8). Em outras palavras, não parece adequado
cercear o direito da parte de participar da audiência de conciliação, simplesmente porque o
54
Estado resolveu não lhe garantir conectividade.
Ademais, a parte sabe o que seria transigir e suas consequências? A parte quando
assinou a procuração realmente foi explicitado, expressamente, cada poder que estava sendo
conferido? Ou será que somente assinou? Das dúvidas anteriores, ousa-se dizer que a maior
probabilidade é a última, isto é, a parte simplesmente assinou a procuração para que o advogado
“entre na justiça”, sem saber o sentido da procuração.
Ao agir dessa forma, o Judiciário fere, frontalmente, o princípio do devido processo
legal, além de poder gerar transtornos de ordem grave no transcorrer no processo. Faz-se essa
afirmação, pois a depender da pactuação que for realizada pelo patrono da causa, sem a presença
da parte, poderá vir a ser questionada sob o ponto de vista legal, por desrespeito à ausência de
devido processo legal, contraditório, ampla defesa, entre outros. O Judiciário se utilizar de uma
procuração com poderes para transigir sem que a parte tenha conhecimento desse poder não
gera acesso à justiça, pelo contrário, só afronta mais o primado de garantia de direitos.
Não se trata apenas de um benefício que está sendo conferido à parte, pelo contrário,
em muitos casos pode refletir um grave problema ao seu direito material. Em verdade, falta
informação, cultura e acesso à tecnologia e isso é refletido aos advogados e, sobremaneira, às
partes. Por óbvio, o processo “tem potencial para ser muito mais do que mera infraestrutura de
TI para o processo tradicional. Não se reduz, tampouco a simples procedimento judiciário
digital e, muito menos, concebe-se tão somente como autos de papel digitalizados” (CHAVES
JR., 2010, p. 430), mas para que atinja o escopo de garantir acesso à justiça, é necessário uma
maior facilitação de acesso à população.
Mesmo em tempos de pandemia, outras estratégias são necessárias, nem que a parte
seja ouvida por intermédio de uma chamada de whatsapp ou Skype, encaminhe um vídeo
gravado, ou mesmo seja ouvida por uma ligação telefônica, é preciso pensar em estratégias
diversas, para que possa garantir acesso à justiça pleno e justo (em tempo razoável e de maneira
efetiva). Em outra oportunidade, já foi possível defender que “para que o paradigma mude, de
fato, é necessário uma maior instrução da população, dos operadores do direito e dos demais
profissionais” (GOMES, 2019, p. 1434), pois na atualidade, tem-se presente que o processo
eletrônico, apesar de importante, ainda acaba sendo um entrave ao acesso à justiça.
CONCLUSÕES
Diante de tudo acima exposto, constata-se que a expressão acesso à justiça deve ser
compreendida sob um viés multiportas, englobando tanto o Poder Judiciário, como os
instrumentos extrajudiciais, ou como denominados de instrumentos de desjudicialização.
55
Ocorre que, influenciado por esse viés consensual, o Código de Processo Civil estabeleceu a
necessidade da realização de audiência de conciliação, a fim de que as partes pudessem resolver
suas contendas, sem que houvesse a necessidade de um provimento jurisdicional final, do ponto
de vista heterocompositivo.
Essa audiência existe na legislação, mas no momento de pandemia, muitos
magistrados estão deixando de realizar a oitiva das partes, ao argumento de que tendo os
advogados poderes para transigir a participação dos envolvidos no conflito tornam-se
desnecessárias. Entretanto essa percepção é equivocada. Se o processo é democrático e as partes
devem ser ouvidas, para a formação do convencimento do magistrado, ou mesmo para
externarem seus interesses e se conciliarem, não pode a prática se sobrepor à teoria e à
Constituição, com o objetivo de dar seguimento aos processos a qualquer custo.
É preciso pensar no agravante de que boa parte da população não possui acesso à
instrumentos tecnológicos para se utilizar do sistema do Conselho Nacional de Justiça. A
proposta de utilizar o Cisco Webex Meet é super válida, mas não no formato como vem se
desenvolvendo na atualidade, pois a interpretação que é conferida ao formato de utilização, em
cada Comarca do Judiciário, pode torna-lo um entrave ou empecilho á solução do conflito. Cabe
ao Judiciário a utilização de todas as tecnologias possíveis para oitiva da parte, não somente
uma. A escolha do aplicativo deve ser pela parte e não pelo judiciário, afinal de contas, os
servidores do judiciário devem servir ao público (jurisdicionados) e não ao contrário.
Assim sendo, entende-se que essa prática é absurdamente ilegal, devendo o Judiciário
garantir alternativas outras para que, mesmo em meio ao distanciamento social, as partes
possam participar da audiência de conciliação. Ao assim proceder, estaremos diante de um
efetivo acesso à justiça.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 6 jun. 2020. BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil Brasileiro) Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 6 jun. 2020. CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1988. CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. O processo em rede. In:________ (coord.). Comentários à lei do processo eletrônico. São Paulo: Ltr, 2010. GOMES, Marcelo Sant’Anna Vieira. O amplo acesso ao processo eletrônico: verdade ou
56
ilusão?. Lisboa, Revista Jurídica Luso-Brasileira, ano 5, n. 6, p. 1.419-1.436 OLIVEIRA NETO, Emérito Silva de; VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Acesso à Justiça e o Novo Código de Processo Civil: um olhar crítico. In: TAVARES NETO, José Querino; ÁVILA, Flávia de; OLIVEIRA NETO; PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio (coord). Acesso à justiça. Florianópolis: CONPEDI, 2015, p. 170-201. PINHO, Humberto Dalla Bernardina de.; STANCATI, Maria Maria Martins Silva. A ressignificação do princípio do acesso à justiça à luiz do art. 3º, do CPC/2015, São Paulo, Revista de Processo, v. 254, p. 17-44, abr. 2016. SANDER, Frank. The Multi-Door Courthouse: Settling Disputes in the Year 2000. HeinOnline: 3 Barrister 18, 1976. THEODORO JÚNIOR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco; PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC - Fundamentos e Sistematização. Rio de Janeiro: Forense, 2015
57
1 Juiz de Direito no TJPE. Graduado pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito do Estado pelo Instituto de Educação Superior UNYAHNA.
1
ADOÇÃO DO PROCESSO NEGOCIAL ELETRÔNICO COMO MÉTODO PERMANENTE E PARALELO AO PROCESSO JURISDICIONAL PARA GERENCIAMENTO E SOLUÇÃO DO CONFLITO: UM CANAL (ODR)
MULTIPORTAS DE ACESSO À JUSTIÇA.
ADOPTION OF THE ELECTRONIC NEGOTIAL PROCESS AS PERMANENT AND PARALLEL METHOD TO THE JURISDICTIONAL PROCESS FOR CONFLICT
MANAGEMENT AND SOLUTION: A MULTIDOOR CHANNEL (ODR) OF ACCESS TO JUSTICE.
Vallerie Maia Esmeraldo de Oliveira 1
Resumo
Trata-se de projeto conceitual que vem sendo desenvolvido através da implementação, por
meio eletrônico, de práticas consensuais no exercício da jurisdição civil, em prol de um
tratamento mais adequado das disputas jurisdicionais (Política Nacional institucionalizada
pela Resolução nº 125/2010 do CNJ). Neste intuito, tem sido adotado o processo negocial
eletrônico (PNe) como método permanente e paralelo ao processo heterocompositivo judicial
(PJe) para um gerenciamento cooperativo e soluções autocompositivas dos conflitos,
estimulando as partes à celebração de negócios jurídicos materiais e/ou processuais, por meio
do diálogo e de modelos pré-formatados, ambos acessíveis em uma plataforma eletrônica
(ODR).
Palavras-chave: Processo negocial eletrônico, Pne, Online dispute resolution, Canal multiportas de acesso à justiça
Abstract/Resumen/Résumé
This is a conceptual project that has been developed through the implementation, by
electronic way, of consensual practices in the exercise of civil jurisdiction, in favor of a more
adequate treatment of jurisdictional disputes (National Policy institutionalized by Resolution
nº 125/2010 of CNJ). To this intent, the electronic negotial process (eNP) has been adopted
as permanent and parallel method to the judicial heterocompositive process (eJP) for a
cooperative management and self-composing solutions of the conflicts, stimulating the
parties to the celebration of material and/or procedural legal agreements, by through dialogue
and pre-formatted models, both accessible on an electronic platform (ODR).
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Electronic negotial process, Enp, Online dispute resolution, Multidoor channel of access to justice
1
58
1 Introdução
Mesmo após o modelo de Justiça Multiportas obter contornos notórios no Brasil
com a institucionalização da Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de
interesses – Resolução do CNJ nº 125/2010 – acompanhada da Resolução do CNMP nº 118/2014,
Lei da Mediação n° 13.140/2015, e do Novo Código de Processo Civil (art. 3°, §§2° e 3°), o índice
de autocomposição tem se revelado estacionário entre 2015 e 2018, e com tendência a queda
conforme relatado pelo Conselho Nacional de Justiça1.
Neste contexto, alguns problemas de ordem prática e questões de ordem teórica têm
sido identificados e analisadas no monitoramento desta pesquisa, mormente: a ineficiência das
audiências de conciliação presenciais (art. 334 do CPC/2015) na autocomposição de algumas
demandas, o uso e regulamentação ainda incipientes da tecnologia pelos tribunais para as referidas
sessões; e a ausência de uma plataforma eletrônica customizada para abrigar o processo negocial
como canal permanente de diálogo - mais perene que a simples audiência do art. 334 do CPC - e
paralelo ao processo heterocompositivo judicial PJe (preferencialmente integrada a este) em busca de
soluções autocompositivas dos conflitos (negócios materiais) e/ou dos processos (negócios
processuais).
Por conseguinte, vem sendo desenvolvido o projeto conceitual de um processo
negocial eletrônico (PNe2), através da implementação, no exercício da jurisdição civil, de práticas
consensuais eletrônicas, em prol de um tratamento mais adequado das disputas jurisdicionais.
2 Metodologia
Por decorrer o presente trabalho teórico de práticas consensuais eletrônicas
implementadas no exercício da jurisdição civil, utiliza-se, além do método clássico de pesquisa sobre
os temas abordados em obras doutrinárias e em artigos científicos publicados na Internet, uma
metodologia empírica de monitoramento de casos práticos em que foram e ainda são adotados o
projeto conceitual (PNe) – inclusive no cenário de enfrentamento do COVID-19 - em comparação
1 Análise da série histórica do referido índice divulgado no relatório “Justiça em números 2019” do CNJ.
Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/judiciario-homologou-44-milhoes-de-acordos-em-2018/> Acesso
em: 12 de março de 2020. 2 Sigla utilizada no referido projeto conceitual, por meio de despachos/decisões, em alusão proposital ao PJe
e didática às partes, para que estas possam compreender o paralelismo do processo negocial em relação ao
processo jurisdicional, uma das características que se pretende explanar.
59
analítica com outras plataformas eletrônicas (ODR3) consolidadas tanto no âmbito privado (i.e.
MercadoLivre, ReclameAqui, Aliexpress e Amazon) quanto no público (SNE4 e Consumidor.gov).
3 Objetivos
Como o próprio termo - projeto conceitual - sugere, tem a dupla pretensão de
demonstrar a utilidade prática do “PNe” para um tratamento mais adequado das disputas
jurisdicionais, e de inaugurar o debate acadêmico sobre um (novo5) método de gerenciamento e
solução dos conflitos: o processo negocial eletrônico.
Objetiva-se, paralelamente ao exercício do case management – numa visão mais
abrangente (court management) - exortar todos integrantes do Sistema de Justiça – Judiciário,
Advocacia, pública e privada, Defensoria e Ministério Público - a atuarem como agentes de ADR
(alternative dispute resolution) dentro deste novo ambiente multiportas de acesso à justiça - as ODR´s
– em concretização da norma do art. 3º, §3º, do CPC.
Vale frisar a versatilidade e a capilaridade do processo negocial eletrônico como
atributos (infra explanados) que têm tornado sua adoção essencial, quiçá necessária, no atual cenário
de enfrentamento da COVID-19 através da quarentena.
4 Desenvolvimento da pesquisa
"Para quem só sabe usar martelo, todo problema é um prego". A máxima do martelo
de Maslow6 serve perfeitamente, inclusive pela simbologia da ferramenta7, ao conceito de Tribunal
3 Online Dispute Resolution (ODR) é uma espécie de método alternativo de resolução de disputas (ADR)
que se utiliza das tecnologias de informação e comunicação por meio de plataformas digitais. 4 Sistema de Notificação Eletrônica: plataforma do DENATRAN que viabiliza concessões recíprocas entre o
particular e órgãos autuadores, dentre elas o desconto de 40% em multas decorrentes de infrações de trânsito.
Disponível em: <https://sne.denatran.serpro.gov.br/#/> Acesso em: 12 de março de 2020. 5 O referido método pode ser concebido pela intersecção de conceitos gerais da teoria do processo e do
Sistema Multiportas, este último especialmente das ODR´s (online dispute resolution). 6 Expressão utilizada por Abraham Maslow, psicólogo norte-americano considerado um dos fundadores da
psicologia humanista, em sua obra pioneira The Psychology of Science. Disponível em: <
https://en.wikipedia.org/wiki/Law_of_the_instrument> Acesso em: 12 de março de 2020. 7 Também chamado de malhete, o martelo do juiz, todo em madeira, é, juntamente com a deusa Thêmis e a
balança da justiça comutativa, um dos mais fortes e conhecidos símbolos do direito e da justiça. Disponível
em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=bibliotecaConsultaProdutoBibliotecaSimboloJustica
&pagina=martelo> Acesso em: 12 de março de 2020.
60
Multiportas (Multidoor CourtHouse), pioneiramente apresentado pelo professor Frank Sander, da
Harvard Law School, em 1976, na palestra de abertura da Pound Conference.
Em verdade, o termo original utilizado pelo renomado professor de Harvard foi
“centro abrangente de justiça8”, idealizado como uma espécie de central de recebimento e tratamento
de conflitos, cujos casos, após passarem por uma triagem preliminar realizada por um profissional
capacitado (DSR – Disput Resolution Specialist), são encaminhados para o fórum mais adequado de
resolução, de acordo com as especificidades de cada controvérsia.
Neste ponto, vale evocar a parábola “diante da lei”, extraída da obra “O processo”
de Franz Kafka (2016, p. 246-247) – deveras contemporânea - em que um homem do campo não
consegue passar pela grande porta que dava acesso à lei, guardada por um sentinela, representativo
aqui de um sistema processual hermético, autoritário e suficientemente burocrático para repelir a
entrada do homem comum.
No campo teórico, como premissas básicas para a concepção do processo negocial
eletrônico, propõe-se analisar: (i) a evolução do Sistema Multiportas de acesso à justiça, a relevância
e transversalidade das ODR´s para o Direito, e sua inovação disruptiva para o conceito tradicional de
jurisdição; (ii) os conceitos gerais do processo enquanto método e linguagem, e a existência de um
processo negocial9 decorrente de uma processualística moderna indutora da consensualidade na
construção de soluções e/ou metasoluções dos conflitos: a negociação como processo10.
Por fim, apresentar-se-ão a gênese do processo negocial eletrônico - prática do
projeto conceitual “PNe” - seus atributos e possíveis aplicações em uma plataforma tecnológica
integrada ao processo jurisdicional eletrônico (PJe).
No monitoramento desta pesquisa, a audiência de conciliação prévia, obrigatória
(art. 334 do CPC/2015) e presencial, tem se revelado, , ineficiente (CPC, art. 8º), quiçá inadequado,
para o tratamento de certas demandas – em especial as repetitivas decorrentes de contratos de
8 Conforme explica Frank Sander em: Diálogos entre os professores Frank Sander e Mariana Hernandez
Crespo: explorando a evolução do Tribunal Multiportas, in Investindo no capital social para maximizar o
sistema de solução de conflitos no Brasil. (Org.) CRESPO, Maria Hernandez. Rio de Janeiro: FGV Editora,
2012, p. 32. 9 Segundo o Professor Fredie Didier Jr, em sua tese de livre docência discorrida na obra Sobre a Teoria Geral
do Processo, Essa Desconhecida (2016, p. 79), “É possível, ainda, conceber o processo negocial, método de
criação de normas jurídicas pelo exercício da autonomia privada”. 10 Paráfrase da tese “a obrigação como processo” do Professor Clóvis V. do Couto e Silva, a qual este
trabalho pretende estudar para introduzir a teoria da negociação como processo.
61
consumo em massa11, ora pela ausência nas comarcas de um CEJUSC12 ou de conciliadores
capacitados (art. 167, §1º, CPC), ora pelo fato dos advogados e prepostos correspondentes dos
grandes litigantes, que comparecem às referidas sessões, raramente são de fato autorizados a
negociar/transigir.
Adotaram-se, então, sessões permanentes e paralelas de mediação/conciliação
online, por meio da criação, para cada processo jurisdicional, de sala virtual em plataforma digital do
CNJ (de 07/2017 a 05/2018) ou grupo de whatsapp (a partir de 05/2018), funcionando como método
de processo negocial eletrônico.
Além de ser um método de resolução de disputas online (ODR), ressalte-se a
perenidade do PNe como característica imanente do processo enquanto método, já que o grupo/canal
continua ativo/disponível até a solução definitiva e integral (consensual ou judicial) do conflito (= até
o arquivamento), perpassando (paralelamente) todas as fases do processo jurisdicional, inclusive a de
execução/cumprimento, se necessário.
As partes podem livremente ingressar, sair e entrar novamente no grupo em respeito
ao princípio da autonomia da vontade (art. 166, CPC e art. 2º, V, da lei de mediação13), interrompendo
o diálogo, mas o canal permanece aberto para as partes, inclusive com o Estado Juiz, em concretização
da Política Pública de promoção das soluções autocompositivas dos conflitos e dos procedimentos
(inteligência das normas dos artigos 3º, §§2º e 3º, 139, V, 190, 334 do CPC, que consagram uma
processualística moderna indutora da consensualidade). Não se restringe, pois, ao ato do art. 334 do
CPC (audiência prévia de conciliação), mas maximiza a norma do art. 139, V, CPC, posto veicular
(i) um processo [enquanto método de exercício do poder autocompositivo (autonomia da vontade)
assistido, impulsionado por mediador)], (ii) e ser eletrônico (a virtualização do processo negocial, ao
torná-lo multiciente, viabiliza a conciliação a todo e qualquer tempo, não impedindo, ademais, a
prática de sessões presenciais, ao revés, facilita-lhes a organização).
Outro importante atributo é o paralelismo do PNe em relação ao PJe, de modo que
a adoção do primeiro não interfere no fluxo processual do segundo, como sucede com a audiência
prévia do art. 334, CPC, nem suspende o seu andamento, exceto pela vontade das partes. Tal
característica decorre do próprio conceito do processo negocial eletrônico como método alternativo
11 Caracterizada pela impessoalidade das relações interprivadas típicas dos contratos de consumo em massa,
cujos conflitos podem ser autocompostos por método virtual, gerando redução de custos, maior celeridade,
menor animosidade e desgaste emocional e maior autonomia dos interessados (CPC, art. 166, §§ 3° e 4°). 12 Centro Judiciário de Solução de Conflito e Cidadania (CEJUSC), reputado pelo CNJ como “células” de
funcionamento da Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos (Resolução do CNJ nº
125/2010). Disponível em <https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao/perguntas-
frequentes-7/politica-judiciaria-nacional-nupemecs-e-cejuscs/> Acesso em: 12 de março de 2020. 13 Lei nº 13.149/2015.
62
(ADR) ao processo jurisdicional que usa plataforma própria, o que não impede de ser integrada ao
PJe (as salas virtuais da plataforma do CNJ tem essa possibilidade), dada a relevante relação de
coordenação entre tais métodos para a solução da disputa.
5 Conclusões
No campo experimental desta pesquisa, salienta-se a versatilidade do PNe para a
teoria do conflito. Qualifica-se como “grupo multiportas de acesso à justiça14” (=portal), pois viabiliza
diferentes métodos autocompositivos: negociação direta ou assistida por negócios processuais pré-
formatados e disponíveis no portal (passível de uso de inteligência artificial), mediação, conciliação,
inclusive possibilita que os conflitantes solicitem sessões presenciais, e compartilharem, sob sua
responsabilidade e conveniência, o link/grupo com conciliador (es) de sua preferência.
Apresenta, outrossim, versatilidade para a espiral do conflito, podendo ser usado na
fase pré-processual (= pré-heterocomposição) para prevenir a disputa arbitral ou jurisdicional (PJe),
ostentando, quanto a este, relação de independência. Se acionado durante o processo
heterocompositivo judicial, se mantém, em regra, paralelo a este, dada a relação de coordenação
(autonomia), ou subordinação caso as partes, em algum momento, assim o requeiram, em respeito à
primazia do autoregramento do procedimento negocial consoante inteligência das normas dos art.
166, §4º, e 190 do CPC. Pode ainda ser adotado depois do processo heterocompositivo, para o fim de
evitar a execução estatal do título executivo formado (sentença judicial ou arbitral), ou para
renegociá-lo em face de caso de força maior (i.e. pandemia).
Outra possível aplicação deste projeto é conferir capilaridade ao “sistema
CEJUSC”, permitindo a organização de sessões de conciliação à distância nas comarcas desprovidas
da referida estrutura física, e à própria Política Pública de promoção das soluções consensuais dos
conflitos (art. 3º, §2º, do CPC e Resolução nº 125/2010 do CNJ).
Por fim, merecem destaque algumas técnicas negociais e procedimentais (art. 166,
§§ 3º e 4º do CPC) utilizadas no âmbito do processo negocial eletrônico: saneamento/organização em
perspectiva eletrônico-cooperativa (analogia do art. 357, §3º, CPC), através de prognose judicial, em
estímulo à autocomposição do conflito ou ao autoregramento do processo pela delimitação
consensual das questões de fato/direito (art. 357, §2º, CPC) e/ou distribuição convencionada do ônus
probatório (art. 373, §3º, CPC); acordo de procedimento para negociação da melhor escolha possível
através de “lances secretos no privado do conciliador/administrador”, e outros negócios processuais
14 Expressão utilizada na criação dos referidos grupos de whatsapp.
63
tais como a calendarização procedimental com prazos automatizados por fórmulas em excel; todas
disponíveis no catálogo da respectiva conta funcional da vara no whatsapp business.
No atual cenário de enfrentamento do COVID-19 através da quarentena, o presente
projeto conceitual (processo negocial eletrônico_PNe), tem sido ampliado para convencionar com as
partes: (i) a digitalização colaborativa de autos físicos e/ou virtualização (modular) do processo
jurisdicional para restabelecer seu andamento; (ii) atendimento via audiência (bilateral)
calendarizada, audiências de saneamento e de instrução, todos por videoconferência convencionada;
mantendo, através deste canal permanente/paralelo (PNe), o diálogo diuturno com advogados/partes,
para a concepção de (meta)soluções alternativas, quiçá mais adequadas às disputas jurisdicionais em
andamento ou paralisadas pela suspensão.
6 Referências
BETANCOURT, Julio César; ZLATANSKA, Elina. Online Dispute Resolution (ODR): What is it,
and is it the Way Forward? International Journal of Arbitration, Mediation and Dispute
Management, Issue 3, 2013. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=2325422> – Acesso em: 12
de março de 2020.
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 12 de
março de 2020.
________. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Lei da Mediação. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm> Acesso em: 12 de
março de 2020.
Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Judiciário homologou 4,4 milhões de acordos em 2018.
Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/judiciario-homologou-44-milhoes-de-acordos-em-2018/>
Acesso em: 12 de março de 2020.
________. Justiça em números 2019. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf> Acesso em: 12 de
março de 2020.
________. Política Judiciária Nacional, NUPEMECs e CEJUSCs. Disponível em:
<https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao/perguntas-frequentes-
7/politica-judiciaria-nacional-nupemecs-e-cejuscs/> Acesso em: 12 de março de 2020.
Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP. Resolução Nº 118 de 01/12/2014. Disponível
em: < https://www2.cnmp.mp.br/portal/images/Resolucoes/Resolu%C3%A7%C3%A3o-118.pdf>
Acesso em: 12 de março de 2020.
________. Resolução Nº 125 de 29/11/2010. Disponível em:
<https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/atos-normativos?documento=156> Acesso em: 12 de março de
2020.
64
CRESPO, Maria Hernandez. et. al. (Coord.). Tribunal Multiportas – Investindo no capital social
para maximizar o sistema de solução de conflitos no Brasil. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2012.
Departamento Nacional de Trânsito - DENATRAN. Sistema de Notificação Eletrônica – SNE.
Disponível em: <https://sne.denatran.serpro.gov.br/#/> Acesso em: 12 de março de 2020.
DIDIER Jr., Fredie. Sobre a teoria geral do processo, essa desconhecida. 3. ed. Salvador: Jus
Podivm, 2016.
DIDIER Jr., Fredie; ZANETI JR., Hermes. Justiça Multiportas e Tutela Constitucional Adequada:
Autocomposição em Direitos Coletivos. In: Hermes Zaneti Jr.; Trícia Navarro Xavier Cabral.
(Org.). COLEÇÃO GRANDES TEMAS DO NOVO CPC - V.9 - JUSTIÇA MULTIPORTAS
Mediação, Conciliação, Arbitragem e outros meios de solução adequada de conflitos. 1.ed.Salvador:
JusPodivm, 2016.
FRANZ, Kafka. O Processo, Porto Alegre: L&PM Pocket, 2016.
SILVA, Clóvis V. do Couto e. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: FGV, 2006.
Supremo Tribunal Federal – STF. Símbolos da Justiça: martelo. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=bibliotecaConsultaProdutoBibliotecaSimbo
loJustica&pagina=martelo> Acesso em: 12 de março de 2020.
WIKIPEDIA CONTRIBUTORS. The Free Encyclopedia. Law of the instrument. Disponível em:
<https://en.wikipedia.org/w/index.php?title=Law_of_the_instrument&oldid=958555283> Acesso
em: 12 de março de 2020.
65
1 Pós-Graduada em Processo Cível pela Faculdade Kennedy de Minas Gerais; Pós-Graduada em Direito e Tecnologia pela Faculdade Arnaldo; Graduada em Direito pela Faculdade Kennedy; Advogada atuação focada em Startups.
2 Advogada Sócia no escritório de advocacia Lage & Oliveira, atuando com Direito para Startups. Mestra em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos. Coordenadora e professora na Pós-graduação.
1
2
ANÁLISE DA APLICAÇÃO DE ODRS EM PLATAFORMAS DIGITAIS E A IMPLEMENTAÇÃO DA MEDIAÇÃO PARA SOLUÇÃO DE LITÍGIOS ONLINE
ANALYSIS OF THE APPLICATION OF ODRS IN DIGITAL PLATAFORMS AND THE IMPLEMENTATION OF THE MEDIATION TO SOLVE ONLINE DISPUTES
Ana Flavia De Souza Corgosinho 1Lorena Muniz e Castro Lage 2
Resumo
O presente trabalho tem por objetivo, através de uma pesquisa empírica com métodos
qualitativos indutivos, analisar a utilização de novas práticas extrajudiciais de resolução de
conflitos no meio digital. Será abordada a questão da massificação de contratações no
ambiente virtual gerado pela falta de compreensão do usuário sobre estes contratos. A partir
das análises realizadas, conclui-se que a judicialização excessiva pode ser consideravelmente
mitigada se disponíveis métodos auto compositivos simples e ágeis no ambiente virtual. A
Mediação online através da aplicação da Online Dispute Resolution (ODR) nas plataformas
digitais são opções que se mostram eficazes nesse sentido.
Palavras-chave: Mediação online, Online dispute resolution, Métodos autocompositivos de resolução de conflitos, Judicialização excessiva, Plataformas digitais, Litígios online
Abstract/Resumen/Résumé
This paper aims, through empirical research with inductive qualitative methods, to analyze
the use of new extrajudicial conflict resolution practices in the digital space. It will be
analyzed the issues of mass hiring in the virtual environment generated by the user's lack of
understanding of these contracts. From the analyzes, it is concluded that excessive
judicialization can be considerably mitigated if simple and agile self-compositing methods
are available at the virtual spaces. Online Mediation through the application of Online
Dispute Resolution (ODR) on digital platforms are options that are effective.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Online mediation, Online dispute resolution, Self-composed conflict resolution methods, Excessive judicialization, Online litigation
1
2
66
1 INTRODUÇÃO
A ascensão das novas tecnologias nos diferentes âmbitos da sociedade contemporânea
e a inclusão digital da sociedade vem transformando a maneira como os negócios são feitos e,
por consequência, contribuem para o avanço constante do comércio eletrônico.
A partir do aumento de contratações no ambiente virtual, é possível notar que há uma
certa incompreensão por parte dos usuários de que, apesar da forma facilitada, um negócio
jurídico está sendo formalizado e que é necessário que certos pontos devam ser observados no
intuito de se evitar problemas futuros. (LAGE, 2019)
As diversas formas de contratações online, aliada à falta de conhecimento dos usuários
que a utilizam, contribuem para que o Brasil seja um dos países mais litigantes do mundo, sendo
que muitas dessas demandas judiciais poderiam ser resolvidas de forma extrajudicial.
Os objetivos gerais desta pesquisa são, portanto, apresentar a necessidade de aplicação
de institutos simples e ágeis a fim de mitigar problemas advindos das contratações na internet.
O estudo propõe a exploração do instituto de “Online Dispute Resolution”, das
plataformas digitais e de formas extrajudiciais de resolução de litígios capazes de fornecer
soluções nas relações realizadas em ambientes digitais, bem como a aplicabilidade e benefícios
de sua utilização e a respectiva análise desta utilização para a redução de processos judiciais.
2. RELAÇÕES MASSIFICADAS NO AMBIENTE DIGITAL E A JUDICIALIZAÇÃO
EXCESSIVA
Tendo em vista a popularização da internet, a facilidade e praticidade por ela
proporcionada, cada vez mais cresce o número de usuários conectados. Só no ano de 2017,
conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2018), já contabilizavam
116 milhões de usuários ativos na internet.
A utilização crescente da internet ocorre por objetivos diversos, sendo que a maior parte
destes acessos acaba por ser a realização algum tipo de contratação realizada ambiente
online. Diante disso, com aumento de contratações no ambiente digital, nota-se uma
incompreensão por parte das pessoas de que um negócio jurídico está sendo feito e que é
necessário que cláusulas e condições devem ser analisadas a fim de evitar problemas futuros.
São diversas os tipos de contratações realizados no mundo virtual, como por exemplo
contratos de Prestação de Serviços, Compra e Venda, Termos de Uso, e outros, que tem feito
parte do dia a dia das pessoas que não entendem que estão os contratando, o que gera grandes
67
desafios sendo o principal deles a insegurança jurídica, o que consequentemente recai sobre
judiciário. (LAGE, 2019)
Nesse sentido, o Brasil é um dos países com maior número de processos no mundo.
Com base em dados apresentados pelo CNJ (2019), em 2019 o Brasil contava com quase oitenta
milhões de processos no judiciário que levam, em média, oito a nove anos para serem julgados.
Independentemente se é no mundo físico ou digital, as relações advindas nesse contexto,
possuem as mesmas implicações, porém, observa-se uma lacuna entre eles que envolvem
regulamentações incapazes de acompanhar a evolução digital, uma realidade que necessita de
atenção e aprofundamentos.
3. ONLINE DISPUTE RESOLUTIONS, MEDIAÇÃO E PLATAFORMAS DIGITAIS
3.1 – Online Dispute Resolutions e a Mediação
Como respostas à problemática enfrentada pela insegurança jurídica que causa a
judicialização excessiva, bem como diante da nova realidade afetada pela tecnologia, surge a
necessidade de transformações basilares na maneira como lidamos com os litígios.
A massificação destas novas formas de comunicação desaguou em circunstâncias
propícias para o surgimento do modelo de Online Dispute Resolution (ODR) (ou, em português,
Métodos de Solução de Conflitos em Rede) em países como EUA e Canadá e a importação
deste conceito para o Brasil, trazendo uma realidade extremamente propícia para o nosso
cenário, diante dos aprendizados havidos nestes outros países. (LIMA; FEITOSA, 2016)
Gabriela Lima e Gustavo Feitosa (2016), conceituam e explicam o modelo das ODRs:
A chamada ODR consiste na utilização da tecnologia da informação e da comunicação
no processo de solução de conflitos, seja na totalidade do procedimento ou somente
em parte deste.
Dentre os procedimentos que podem adotar o modelo da ODRs, estão a arbitragem, a
mediação, a conciliação ou a negociação, que o fazem por intermédio de ferramentas
automatizadas (total ou parcialmente). Essa solução representa uma forma de
virtualização plena, em que um procedimento nasce e morre no ambiente virtual, sem
necessidade de passar por etapas presenciais ou no espaço forense. (LIMA;
FEITOSA, 2016)
Neste sentido, as ODRs são, basicamente, uma forma de solução para resolução de
conflitos, a partir dos procedimentos alternativos de solução de conflitos, utilizando-se da
tecnologia para que sejam viabilizados.
68
Isso posto, convém mencionar também o case da implementação de uma ODR no
popular Mercado Livre, uma plataforma de comércio online relevante que vendeu via internet,
cerca de 337 milhões de produtos, no ano de 2018. (STARTSE, 2019)
O método utilizado pelo Mercado Livre é chamado de ODR (resolução de disputas
online). A primeira iniciativa é chamada de “Compra Garantida”. “Se o comprador
utilizou o Mercado Pago (meio de pagamento do Mercado Livre), cumpriu os requisitos
e fez a reclamação dentro do tempo propício, nós desenvolvemos o dinheiro a despeito
da responsabilidade ou não do vendedor”, contou Marques. Este recurso é um meio do
Mercado Livre ganhar ainda mais a confiança dos clientes. (STARTSE, 2019)
Ao observar os resultados da implementação da ODR no Mercado Livre, verifica-se o
sucesso de 98,9% de redução de judicialização contra a empresa. É uma forma inovadora de
solução de controvérsias totalmente online. Uma experiência através da qual aumenta a
construção da relação de confiança entre compradores e vendedores e que diminui o risco das
transações comerciais bem como, o custo, em caso de desavenças após a contratação.
O termo mediação vem do latim mediare, que significa mediar, colocar-se no meio ou
intervir e pode ser compreendida como um Meio Alternativo de Solução de Conflitos,
conhecido internacionalmente pela sigla ADR (Alternative Dispute Resolution).
Caracteriza-se como alternativa consensual de resolução de disputas, onde a preparação
para a solução do conflito dá-se de maneira autônoma e consensual entre as partes, não havendo
qualquer imposição por parte de terceiros que atuem como interventores no processo de
resolução do conflito, ou seja, a mediação prima pela autocomposição, proporcionando a
participação das partes na resolução do conflito.
Conforme artigo 165 do CPC (2015), o mediador atuará preferencialmente nos casos
em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as
questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da
comunicação, identificar, por si próprias, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.
Dessa forma, é possível observar que o mediador não intervém para trazer soluções para
o litígio, podendo ser qualquer indivíduo, dotado de conhecimento acerca de determinado
assunto, devendo sempre ser imparcial no auxílio para dirimir a controvérsia.
A Mediação Online por sua vez, surge com a finalidade de tornar o processo da
mediação mais ágil e menos formal através da utilização da tecnologia. Possui as mesmas
definições da mediação, contudo, todo o processo é realizado no ambiente virtual.
Diante disso, novas soluções, como as trazidas por Startups, estão surgindo exatamente
com essa finalidade: de promover negociação de conflitos. Conforme consta no radar da
69
Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs - AB2L (2020), já existem 19 empresas que
atuam nesse setor e que são associadas à referida entidade.
Ricardo Vieira e Angelo Carvalho (2018) destacam que as ODRs são, inclusive, uma
das tecnologias que tem potencial real de disrupção no meio jurídico. O caso da Startup “MOL
- Mediação Online” é um exemplo, que surgiu em 2015 e foi a primeira plataforma de mediação
online do Brasil, sendo que a Startup atua como uma plataforma especializada na resolução de
conflitos no ambiente 100% online. (MOL, 2020)
A MOL (2020) destaca em sua página que, a partir da análise do cenário dos casos
mediados utilizando a sua plataforma, comparado com o judiciário, consegue soluções com até
30 vezes mais agilidade, 50% de economia e um resultado com 2 vezes mais acordos.
Este tipo de cenário nos prova o quanto este formato é promissor e pode ser uma saída
extremamente interessante para desafogar o judiciário, trazendo maior celeridade para as
resoluções de conflitos e viabilizando a continuidade da massificação de contratações no
ambiente digital.
3.2 – Plataformas Digitais
Conforme David Rogers (2018) explica, a plataforma pode ser compreendida como um
negócio que cria valor e facilita interações diretas a partir da capacitação destes, dispensando
certos intermediários de uma cadeia de fornecimento de determinado produto ou serviço, sendo
que para ser uma plataforma é necessário ter, no mínimo, dois lados distintos de clientes, tais
como vendedores e compradores por exemplo.
Existem quatro tipos de plataformas, quais sejam: i) Marketplaces, ii) Sistema de
Transação, iii) Mídia Sustentada por Anúncios; iv) e, Padrão de Hardware/Software.
(ROGERS, 2018)
As plataformas possuem como característica principal o efeito de rede, que quer dizer
que há um aumento do seu valor à medida em que mais e mais pessoas a utilizam, permitindo
a escalabilidade e alto alcance de quem permanece nesta cadeia de fornecimento intermediada
ou aproximada por ela.
Diante desta realidade e dos seus efeitos, as plataformas merecem especial atenção para
que, diante de crescimentos exponenciais e contratações massificadas, possam ter soluções
ágeis para eventuais conflitos que venham a surgir em sua evolução.
70
4. APLICAÇÃO DE ODRS EM PLATAFORMAS E A IMPLEMENTAÇÃO DA
MEDIAÇÃO COMO ALTERNATIVA EXTRAJUDICIAL À SOLUÇÃO DE LITÍGIOS
A ascensão das novas tecnologias nos diferentes âmbitos da sociedade contemporânea
e com o crescimento da Era Digital, impõe-se transformações necessárias a fim de se obter
soluções mais ágeis e efetivas nos conflitos ocorridos no ambiente digital.
Novas práticas, como a aplicação de ODRs em Plataformas Digitais, são um caminho
norteador que tem se mostrado eficaz como meio de resolução de conflitos realizados em um
ambiente completamente digital, pois fornece soluções extrajudiciais a essas relações.
A negociação online pode ser realizada através da plataforma, onde as propostas são
colocadas em aplicativo, link, ou site, para que a outra parte acesse de uma forma simples e
rápida de qualquer lugar onde estiverem.
Desta forma, a plataforma, de forma imparcial diante do seu interesse em ambos os
polos do negócio que aproxima ou intermedeia pode já disponibilizar sobre o regramento
norteador para o caso de litígios que podem vir a ocorrer entre os usuários, principalmente a
partir do seu aprendizado no negócio, detalhando, além dos problemas, as possíveis soluções.
E, caso, ainda assim, as partes entrem em desavença, podem acionar a plataforma para que
através da ferramenta de ODR disponibilizada, a decisão sobre a melhor atitude sobre o caso
possa ser tomada dentre os envolvidos que acabarão por cumprir de forma espontânea a fim de
seguir utilizando a plataforma, evitando-se, assim, novos processos judiciais.
As ODRs e a Mediação em si possuem inúmeras vantagens vez que de forma prática
têm poder de restaurar o diálogo e confiança da relação entre as partes. Além do poder de
restabelecer o vínculo de confiança, as partes possuem maior controle da solução, não
dependendo de uma sentença que pode não ser exatamente aquela desejada pelas partes,
obtendo uma maior satisfação na resolução do conflito, pois estas participam da decisão,
diminuindo assim o risco das transações comerciais e, principalmente, o custo, caso a
experiência de consumo não saia como o planejado.
A mediação online como alternativa extrajudicial à solução de litígios mostra benefícios
adicionais na medida em que podem eliminar um número alto de potenciais ações judiciais,
antes mesmo do seu nascimento, tendo uma economia considerável do valor movimentado pela
máquina estatal para prover uma resposta às partes.
Oportuno mencionar que uma boa alternativa também acerca do instituto da mediação,
é adquirir por prática a inserção da Cláusula Compromissória referente a Mediação na
elaboração destes contratos no ambiente digital. Entretanto, faz-se necessário fazer menção à
71
cláusula cheia de forma que de maneira expressa se faça referência a todas as regras que
conduzirão um eventual desacordo surgido do contrato. Essa cláusula pode indicar de maneira
específica uma Câmara de Mediação e seu regulamento ou regras particulares para guiar a
resolução de eventual conflito.
Desta forma, antes de se definir o foro para discussões judiciais, definir-se-á os esforços
conjuntos das partes que utilizam aquela plataforma digital para a negociação, conciliação,
mediação e, apenas se for inevitável diante do infrutífero sucesso nos formatos anteriores, haja
o prosseguimento para a ação judicial.
A facilidade nas contratações massificadas precisam gerar às partes a responsabilidade
sobre estas avenças e a consequente responsabilidade para a solução dos litígios que venham a
surgir, a partir do que fora inicialmente acordado entre os envolvidos.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do exposto nesse estudo, foi possível perceber que a partir das transformações
tecnológicas vivenciadas pela sociedade e o acesso cada vez mais facilitado no ambiente virtual,
há necessidade de, em um primeiro momento, através da cooperação, fomentar uma mudança
comportamental nas pessoas que utilizam a internet, no sentido de adquirir hábito de buscar
conhecimento, lendo os contratos eletrônicos disponibilizados pelas plataformas, bem como
compreendendo as formalizações adquiridas a partir de seus acessos.
Assim, no que diz respeito aos desafios que causa a judicialização excessiva, impõe-se
transformações basilares na maneira como o judiciário funciona bem como as normas jurídicas
incidem no mundo digital.
Por consequência, as plataformas digitais, devem oferecer meios alternativos de
resoluções extrajudiciais promovendo e aplicando a Mediação online e ODRs, a fim de obterem
vantagens competitivas, na medida em que eliminam um número alto de potenciais ações
judiciais, podendo desenvolver, investir em inovação de novos produtos, ou aperfeiçoamento
destes.
Desta forma, aos poucos será possível realizar a alteração da mentalidade dos usuários
do ambiente digital para que possam compreender melhor as relações que formalizam neste
ambiente e o valor agregado das tentativas de solução de conflitos extrajudiciais, antes de se
recorrer ao judiciário por quaisquer embates; a autocomposição poderá se tornar o novo normal,
desde que as práticas adotadas pelas empresas neste mercado compreendam estes benefícios.
72
REFERÊNCIAS
AB2L. Radar de Lawtechs e Legaltech, versão Maio-2020. [2020] Disponível em
<https://www.ab2l.org.br/radar-lawtechs> Acesso em 14 jun. de 2020.
BRASIL. Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015. Institui o Código de processo Civil. Disponível
em: <BRASIL. Lei .13.140 de 26 de junho de 2015. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm> Acesso em 19
de junho de 2020.
BRASIL. Lei nº 13.140 de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares
como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da
administração pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2015/Lei/L13140.htm> Acesso em 19 de junho de 2020.
CNJ. Justiça em números. [2019] Disponível em <https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>. Acesso em
19 jun. 2020.
FERNANDES, Ricardo V. de Carvalho; CARVALHO, Ângelo Gamba Prata. The Future:
análise da curva de adoção das tecnologias disruptivas jurídicas (legaltech) e governamentais
(govtech), onde estamos e para onde queremos ir. In: FERNANDES, Ricardo V. de Carvalho;
CARVALHO, Ângelo Gamba Prata. Tecnologia Jurídica & Direito Digital. II Congresso
Internacional de Direito, Governo e Tecnologia. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 29-44.
START SE. Como o Mercado Livre atingiu 98,9% de “desjudicialização” na resolução de
conflitos. [2019] Disponível em: <https://www.startse.com/noticia/nova-economia/mercado-
livre-odr-resolucao-conflito>. Acesso em 14 jun. 2020.
IBGE. [2019] Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/trabalho/17270-
pnad-continua.html?edicao=27138&t=resultados> Acesso em: 14 jun. 2020.
LIMA, Gabriela Vasconcelos; FEITOSA, Gustavo Raposo Pereira. Online Dispute Resolution
(ODR): A solução de Conflitos e as novas tecnologias. Revista do Direito. Santa Cruz do Sul,
v. 3, n. 50, p. 53-70, set./dez. 2016.
LAGE, Lorena Muniz e Castro. Uma análise do Cenário de Contratações Eletrônicas
Envolvendo Estabelecimentos Empresariais Virtuais. Dissertação de Mestrado - Faculdade de
Direito Milton Campos de Nova Lima, Minas Gerais. 2019.
MOL. Mediação Online. [2020] Disponível em: < https://www.mediacaonline.com/> Acesso
em: 14 jun. 2020.
ROGERS, David L. Transformação Digital: repensando o seu negócio para a era digital. São
Paulo: Autentica Business, 2018.
73
1 Doutora em direito civil pela USP. Docente do programa de mestrado e doutorado em Direito Negocial da UEL.
2 Graduando em Direito pela Universidade Estadual de Londrina - UEL, membro do projeto de pesquisa "contratualização das relações familiares e sucessórias".
1
2
AS FUNÇÕES DO AMBIENTE DIGITAL NA SOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES DE GUARDA E CONVIVÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA
THE ROLE OF THE DIGITAL ENVIRONMENT IN RESOLVING FAMILY DISPUTES REGARDING CHILD CUSTODY AND VISITATION IN PANDEMIC
TIMES
Daniela Braga Paiano 1Bruno Poliseli 2
Resumo
O objetivo deste trabalho é analisar o atual cenário das famílias no contexto da pandemia da
COVID-19 e identificar uma alternativa viável para a convivência entre pais separados e seus
filhos em um período de isolamento social, considerando os fins da guarda, o princípio do
melhor interesse e a necessidade de se evitar a fragilização dos vínculos afetivos. Trouxe
uma breve contextualização da temática, e delimitou-se os impactos da pandemia sobre as
relações de convivência. Concluiu-se que o ambiente digital seria um meio de mitigar
prejuízos nessas relações. Como metodologia utilizou-se o método dedutivo e pesquisa
bibliográfica.
Palavras-chave: Covid-19. guarda e convivência, Solução consensual de conflitos, Plataformas digitais
Abstract/Resumen/Résumé
The objective of this paper is to analyze the current scenario of families during the COVID-
19 pandemic and to identify a viable option for keeping in touch separated parents and their
children in a period of social isolation, considering the purposes of the child’s best interest
and the need to avoid weakening affective bonds. A contextualization was offered and an
attempt was made to set out the impacts of the pandemic on coexistence relations. It can be
concluded that the digital environment would be a way of mitigating the losses. As a
methodology, it was used deductive method and bibliographical.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Covid-19, Child custody and visitation, Consensual dispute resolution, Digital platforms
1
2
74
1 Introdução
O atual cenário global no que se refere à pandemia, atinge profundamente todas as
esferas da sociedade e a esfera jurídica não é exceção. Pelo contrário, é possível notar um
grande impacto em diversos ramos do Direito, a exemplo das relações jurídico-econômicas,
contratuais, administrativas, e, dentro do que se discute, familiares.
O presente trabalho, portanto, trata da questão das relações familiares inseridas no
contexto da pandemia provocada pela COVID-19, principalmente no que diz respeito à
guarda e à convivência familiar na hipótese de pais separados.
Neste sentido, nota-se que o Direito das Famílias é altamente suscetível aos impactos
provocados pelas medidas de saúde adotadas no mundo todo. No que diz respeito à guarda e à
convivência, há de se observar que, quando do exercício do “direito de visita”, a criança fica
exposta ao contágio, uma vez que é transportada de um ambiente ao outro constantemente,
com o fim de que esteja ao cuidado de ambos os pais.
Assim, tem-se que a imposição do isolamento social inviabiliza, em grande parte, a
execução dos regimes de convivência estabelecidos em um momento anterior à pandemia e
coloca a estrutura afetiva das famílias em risco, de modo que a busca por soluções se torna
imperativa. Para tanto, essa pesquisa busca verificar se os meios digitais, com destaque à
possibilidade de solução consensual de conflitos em plataformas eletrônicas, proporcionam
estrutura suficiente para mitigar as consequências negativas do isolamento social nas relações
de convivência entre filhos e pais separados.
A falta de solução para pandemia não será eterna, mas os prejuízos provocados ao
vínculo afetivo nas famílias podem ser. Dessa forma, a doutrina e a jurisprudência se veem
obrigadas a buscar soluções rápidas e que atendam ao melhor interesse da criança e do
adolescente, ponto em que se apoia esse trabalho.
Quanto à metodologia, a pesquisa que segue é de cunho teórico, predominantemente
dedutivo. O desenvolvimento tenta se valer de premissas básicas, avançando à adequação do
problema aos limites impostos pelos conceitos gerais inicialmente abordados, e busca dar
soluções às indagações identificadas. Para isso, conta com análise bibliográfica, promovendo
reflexão sobre os acontecimentos atuais sob a luz do que dispõe o Direito das Famílias.
2 Da Guarda de Filhos – uma breve contextualização
Para que se faça entender a discussão proposta no presente trabalho, é imperativo
que, em um primeiro momento, sejam compreendidos os conceitos centrais que permeiam o
problema abordado: a guarda e a convivência familiar.
75
O Art. 33 da Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), trata da
guarda como uma espécie de posse sobre o filho, à qual está atrelada a obrigação de prover
sua subsistência e seu desenvolvimento. Nas palavras de Gustavo Tepedino (2004, p. 36), o
termo evoca “[...] um sentido de guarda como ato de vigilância, sentinela que mais se
aperfeiçoa ao olho unilateral do dono de uma coisa guardada, noção inadequada a uma
perspectiva bilateral de diálogo e de troca, na educação e formação da personalidade do
filho”.
A reflexão do autor se torna mais importante quando considerada no contexto de
separação dos genitores. O significado conferido à guarda pelo texto normativo se torna
inadequado na hipótese de afastamento dos pais, momento em que surgem dúvidas acerca do
exercício da autoridade parental.
Note-se que o Art. 1.634 do Código Civil impõe que o poder familiar seja exercido
com unicidade, independentemente da situação conjugal. Neste sentido, é possível argumentar
que a unidade familiar é persistente, de modo que, “o fim da conjugalidade não afeta nem os
direitos e nem os deveres de ambos [os pais] com relação à prole. O rompimento do
casamento ou da união estável dos genitores não pode comprometer a continuidade dos
vínculos parentais” (DIAS, 2016, p. 877).
Em outras palavras, em uma situação de relativa normalidade, marcada pela
convivência entre os pais e a criança no mesmo espaço, o poder familiar tem condições de ser
exercido de forma ideal, em conjunto, com ambos os genitores o exercendo de forma
relativamente harmoniosa, influenciando o desenvolvimento do filho. Significa dizer, na
hipótese, que a guarda “se encontra subsumida ao poder familiar” (SIMÃO, 2015) e, de certo
modo, nele se dilui. No mesmo sentido explica MADALENO (2017) que a guarda é atributo
do poder familiar, embora existam guardiões sem poder parental; nesse sentido, explica o
autor que pelo fato dos filhos serem pessoas incapazes, são sujeitos naturalmente frágeis e
indefesos, em situação de vulnerabilidade e que merecem uma especial proteção.
Em um contexto de separação, por outro lado, a guarda é exercida separadamente,
mesmo que compartilhada, e, não raro, há preponderância na posse ou vigilância do filho por
um dos pais (SIMÃO, 2020).
Conforme dispõe o Art. 1.583 do Código Civil, a guarda será unilateral – atribuída a
um dos genitores (lembrando que a guarda poderá ser atribuída a terceira pessoa) enquanto o
outro terá direito de visita, ou compartilhada (atribuindo-se um sistema de cogestão nas
decisões, responsabilidades e deveres).
Um regime de convivência torna-se, portanto, essencial para os fins do poder
76
familiar, na medida em que permite que ambos os genitores exerçam influência no
desenvolvimento do filho, mesmo no caso de separação. A visita do pai ou da mãe, melhor
denominada de convivência (PEREIRA, 2020), mitiga os efeitos da separação através da
identificação de períodos em que a criança estará sob os cuidados de cada um dos genitores.
Em uma apertada síntese, a espécie de guarda a ser fixada terá como princípio
norteador, o do melhor interesse da criança/adolescente. Em situações de “normalidade”, já é
difícil o fator de adaptação para os filhos em situações em que seus genitores não vivem sob o
mesmo teto. O que se pretenderá discorrer a seguir é a questão da guarda de filhos em tempos
de isolamento social, em que as pessoas têm restrições de convivência por conta da pandemia
que afeta o mundo inteiro. Como então minimizar esses efeitos levando em consideração o
melhor interesse de crianças e adolescentes, é o que se pretende desenvolver na sequência.
3 O impacto da COVID-19 nas relações de convivência
Os tempos são de pandemia. Se a convivência já é dificultosa diante da simples
separação dos genitores, o problema se agrava quando são impostas medidas mais severas.
As recomendações emitidas pelo Ministério da Saúde (coronavirus.saude) envolvem,
entre outras ações, o afastamento de locais de grande circulação e, se possível, a permanência
em casa, de modo a evitar o contato físico com pessoas de fora. Vive-se em um período
delicado e a possibilidade de contágio representa risco ao bem-estar de toda a população.
Trazendo essa noção ao ambiente das relações familiares, o compartilhamento da
guarda sofre restrições e as formas de convivência acordadas em um período de pré-pandemia
podem não ser mais aplicáveis. Sobre o assunto, ANGELO (2020) explica que o direito de
visita no contexto da COVID-19 ainda é uma questão mal resolvida, esclarecendo que juízes e
tribunais têm imposto cautelas adicionais para atender às recomendações de segurança na
saúde.
Dentre as medidas praticadas atualmente, destaca-se a possibilidade de suspensão da
convivência, além da pactuação extrajudicial de novas formas de convívio, com intervalos
maiores entre os períodos em que cada genitor exerce a guarda. As referidas medidas são
adotadas como forma de evitar o contágio entre a criança e os genitores e, de consequência,
previnem que a doença se espalhe a outros ambientes. No entanto, nota-se uma deficiência
das medidas tomadas com relação à manutenção do vínculo afetivo.
Ao se estabelecer o “melhor” modelo de guarda para o caso em concreto, leva-se em
conta o princípio do melhor interesse da criança, primando sempre pela guarda compartilha,
porque se entende que haveria um envolvimento igualitário dos genitores no que se refere aos
77
cuidados com a criança/adolescente. Alterações nos acordos firmados, sempre levam em
conta mudanças na vida particular daquele que almeja a alteração ou do outro genitor.
Demandam sempre que os filhos não fiquem privados do contato com seus genitores,
tentando, em nome do princípio mencionado, encontrar uma melhor solução.
Ocorre que, em tempos de pandemia, em que se exige um isolamento social, o
acordo de guarda possa eventualmente sofrer alterações. Como então alterar o modo de
convivência sem prejudicar os filhos? O que seria melhor aos filhos nessa situação
excepcional, a fim de não se ferir o princípio do melhor interesse? Seria manter o acordo
firmado colocando-se em risco a vida do próprio filho ou seria encontrar meios em que essa
presença física fosse de algum modo substituída pelo contato via internet ou telefone,
tentando-se garantir, assim, evitar o contágio pelo vírus?
Suspender o contato físico ou submetê-lo à divisão de períodos maiores no tempo são
medidas eficazes para evitar o contágio e, por conta disso, atendem ao princípio do melhor
interesse da criança/adolescente neste particular. Por outro lado, destaque-se que também é do
interesse da criança/adolescente a convivência com ambos os pais, que encontra barreiras
impostas pelo isolamento social.
Assim, torna-se indispensável a busca de soluções que promovam a mitigação dos
efeitos da pandemia por meios alternativos.
4 O papel dos meios digitais na mitigação das consequências negativas
Tendo em vista a situação exposta nesse trabalho, passa-se a pensar, como forma de
solução para o problema, a adoção de plataformas digitais como uma alternativa e meio para
amenizar consequências negativas do afastamento das partes envolvidas.
Como já foi dito, é evidente que o isolamento dificulta a comunicação e a
convivência no seio das famílias separadas. Assim é que têm ocorrido revisões dos acordos de
guarda para a adequação ao momento atual, contudo ainda persiste a questão concernente à
forma de fazê-lo. Desse modo, em um momento de rígido retraimento, as plataformas digitais
podem promover a aproximação das partes por meio do diálogo virtual.
LARA (2014, p. 31) defende que os meios extrajudiciais de solução consensual de
conflitos, “por facilitarem o diálogo e a negociação entre os conflitantes, [...] detêm maior
probabilidade de êxito de atingir a composição das partes e, por conseguinte, a pacificação
entre elas”.
Nesse sentido, destaque-se que a solução consensual de conflitos é essencial às
relações familiares na medida em que, por ela, a aproximação dos interesses se dá de forma
78
voluntária. A autocomposição permite maior equilíbrio entre as partes na divisão da
convivência, além de prevenir insatisfações, significando que, ao não ser possível o diálogo
presencial, é necessário promovê-lo virtualmente.
Deve-se destacar que, não se pode excluir, contudo, os meios judiciais. Estes sempre
são formas viáveis caso as partes pretendam rever seus acordos.
O contato direto entre advogados, juízes e promotores, no que diz respeito ao Direito
das Famílias é essencial. Tanto o é, que o IBDFAM-SC solicitou, recentemente, o
atendimento via videoconferência (2020).
Assim, tem-se que as peculiaridades de cada caso, quando em discussão judicial, não
podem prescindir da correta instrução pelo juízo. Nesse sentido, destaque-se a disposição de
alguns tribunais, como o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, que, por meio do Decreto
Judiciário 227/2020, em conformidade com a Resolução 314/2020 do CNJ, permite a
realização de audiências por videoconferência no período em que os atos presenciais se
encontram suspensos, de modo que ainda é possível a conciliação judicial das relações
familiares por meios digitais.
Deste modo, o que se propõe aqui, pensando na mitigação das consequências do
afastamento da convivência entre pais e filhos, é que, neste momento, a utilização de
plataformas digitais, seja para rever os acordos – audiências por videoconferência, seja para
aproximar as partes envolvidas – ligações por chamada de vídeo ou voz, seriam meios
adequados para evitar o conflito e não gerar maiores danos nem para os filhos nem para os
genitores.
5 Conclusão
Diante de tudo o que foi exposto, foi possível concluir, em um primeiro momento,
que a guarda dos filhos não se limita à posse fática. A detenção da vigilância do filho,
implica, também, na formação de sua personalidade e no fornecimento de educação. Ademais,
verificou-se que a unidade familiar, mesmo no contexto da separação dos pais, é persistente,
de modo que os deveres impostos pelo poder familiar não cessam com o rompimento da
união.
Apesar disso, viu-se que, mesmo que a guarda seja compartilhada, muitas vezes há
favorecimento a um dos pais, o qual exerce maior influência sobre o filho. Por conta disso, já
é difícil que, em contexto de relativa normalidade, um regime de convivência atenda ao
melhor interesse da criança/adolescente de modo adequado, situação que se agrava quando sé
imposto o isolamento social.
79
A seguir, foi possível observar que diversas medidas são tomadas para atenuar os
efeitos negativos do isolamento sobre a guarda com o fim de evitar o contágio, tais como a
suspensão do contato e períodos mais longos de convivência intercalados. Contudo, notou-se
que as soluções apontadas não levam em consideração a manutenção do vínculo afetivo e
negligenciam, em parte, o melhor interesse da criança, uma vez que excluem ou limitam
severamente a convivência entre pais e filhos.
Assim é que se chamou atenção para a alternativa proporcionada pelos meios
digitais. O diálogo é indispensável nas relações familiares e, se não é possível
presencialmente, deve ser feito virtualmente. Portanto, concluiu-se que plataformas
eletrônicas proporcionam alternativa viável para a manutenção da harmonia das relações entre
pais separados e seus filhos, tanto no que diz respeito a acordos extrajudiciais quanto na
realização de conciliação em juízo. O contato é feito à distância, mas de modo a aproximar as
partes na medida do possível.
Por fim, observou-se que, além da solução consensual de conflitos, as plataformas
digitais se prestam também ao exercício da própria convivência, aproximando o contato dos
filhos com os genitores sem sujeitá-los a longos períodos de distanciamento. Por mais que o
contato físico permaneça prejudicado, concluiu-se que uma espécie de “convivência virtual”
pode ser eficaz para a manutenção da unidade familiar.
REFERENCIAIS TEÓRICOS
ANGELO, Tiago. Sem marco legal para guarda dos filhos na epidemia, pais devem priorizar
acordos. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-abr-20/fica-guarda-compartilhada-
tempos-coronavirus. Acesso em: 04.06.2020.
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. (versão eletrônica). 4. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2016.
IBDFAM. IBDFAM-SC envia ofício ao Poder Judiciário solicitando atendimento aos
advogados que atuam no Direito das Famílias. Disponível em:
http://www.ibdfam.org.br/noticias/7333/IBDFAM-
SC+envia+of%C3%ADcio+ao+Poder+Judici%C3%A1rio+solicitando+atendimento+aos+adv
ogados+que+atuam+no+Direito+das+Fam%C3%ADlias#:~:text=O%20Instituto%20Brasileir
o%20de%20Direito,o%20per%C3%ADodo%20de%20isolamento%20social. Acesso em:
10.06.2020.
LARA, Fernanda Corrêa Pavesi. Os meios consensuais de conflitos: caminhos para o
desenvolvimento de uma cultura de paz. 2014. 119 f. Dissertação (Mestrado) – Mestrado em
Direito Negocial, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2014. Disponível em:
www.bibliotecadigital.uel.br/document/?code=vtls000207586. Acesso em: 10.06.2020.
80
MADALENO, Rolf. Manual de direito de família. (versão eletrônica). Rio de Janeiro:
Forense, 2017.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Disponível em:
https://coronavirus.saude.gov.br/index.php/sobre-a-doenca. Acesso em: 04.06.2020.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família, coronavírus e guarda compartilhada.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-abr-08/cunha-pereira-direito-familia-
coronavirus-guarda-compartilhada2. Acesso em: 02.06.2020.
SIMÃO, José Fernando. Sobre a doutrina, guarda compartilhada, poder familiar e as girafas.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2015-ago-23/processo-familiar-doutrina-guarda-
compartilhada-girafas. Acesso em: 02.06.2020.
_____. Direito de família em tempos de pandemia: hora de escolhas trágicas: Uma reflexão
de 7 de abril de 2020. Disponível em:
http://www.ibdfam.org.br/artigos/1405/Direito+de+fam%C3%ADlia+em+tempos+de+pande
mia%3A+hora+de+escolhas+tr%C3%A1gicas.+Uma+reflex%C3%A3o+de+7+de+abril+de+
2020. Acesso em: 02.06.2020.
TEPEDINO, Gustavo. A disciplina da guarda e a autoridade parental na ordem civil-
constitucional. Revista Trimestral de Direito Civil, Vol. 17, Jan.- Maio, 2004. Disponível em:
http://www.tepedino.adv.br/tep_artigos/a-disciplina-da-guarda-e-a-autoridade-parental-na-
ordem-civil-constitucional/. Acesso em: 02.06.2020.
81
AUDIÊNCIAS VIRTUAIS DE CONCILIAÇÃO COMO FORMA MAIS RÁPIDA E ECONÕMICA DE PACIFICAÇÃO SOCIAL COM JUSTIÇA NA JUSTIÇA DO
TRABALHO
THE PROCEDURE VIRTUAIS CONCILIATION AS A FASTER AND MORE ECONOMICAL FORM OF SOCIAL PACIFICATION WITH JUSTICE IN THE
JUSTICE OF LABOR LAW
Sandra Mara De Oliveira Dias
Resumo
RESUMO: A Justiça do Trabalho com base na Portaria No. 61 de 2020 do CNJ tem usado a
plataforma CISCO WEBEX para realização de audiências virtuais de conciliação. Essas
audiências importam em redução de custos às partes, que não precisam arcar com despesas
de deslocamento, pois de suas residências ou qualquer lugar do mundo com acesso a internet
podem participar do ato processual, com economia de tempo, um único ato processual o
processo trabalhista é solucionado em observância ao princípio da razoável duração do
processo, artigo 5º, LXXVIII da CF/88, com eficiência, rapidez, trazendo pacificação social
com justiça.
Palavras-chave: Palavras-chave: audiências virtuais de conciliação, Justiça do trabalho, Pacificação social com justiça
Abstract/Resumen/Résumé
ABSTRACT: Labor Justice based on Ordinance No. 61, 2020 of the CNJ has used the
CISCO WEBEX platform to hold procedure virtual conciliation. These hearings import in
cost reduction to the litigations, who do not need to travel expenses, because of their
residences or any place in the world with internet access can participate in the procedural act,
with time savings, a single procedural act the labor process is solved in compliance with the
principle of reasonable duration of the process, Article 5, LXXVIII of CF/88, efficiently,
prompt, pacification social with justice to labor jurisdictions.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Keywords: procedure virtual conciliation, Labor justice, Social pacification with justice
82
1. Introdução
Em razão da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19), o Conselho Nacional de Justiça
através da Portaria No. 61 de 2020, adotou a plataforma Cisco Webex para realização de sessões
virtuais no período de isolamento social como forma de assegurar a continuidade da prestação
jurisdicional no Poder Judiciário por ser uma atividade essencial no Estado de Direito. O tempo
não para, a Justiça do Trabalho não pode parar, pois tutela direitos sociais fundamentais e
créditos trabalhistas de natureza alimentar cuja satisfação tem urgência, diante da necessidade
dos trabalhadores, que na maioria das vezes, ajuízam Reclamatórias Trabalhistas por se
encontrarem desempregados, uma minoria, de trabalhadores que recorrem à Justiça quando
ainda se encontram trabalhando. Este estudo tem relevância para defender a adoção das
audiências de conciliações virtuais pós-pandemia na Justiça do Trabalho com fundamento nos
princípios do acesso à justiça e duração razoável do processo, previsto no artigo 5º, incisos
XXXV, LXXVIII da CF/88. Portanto, pergunta-se as audiências virtuais de conciliação são
importantes, trazem celeridade e economia processual a Justiça do Trabalho? As audiências
virtuais de conciliação são relevantes para efetividade do Processo Trabalhista e podem ser
adotadas definitivamente na Justiça do Trabalho tanto nos CEJUSC como nas Varas do
Trabalho, como um instrumento eficaz na solução dos conflitos trabalhistas.
2.A importância das Audiências de Conciliações Virtuais para a Justiça do Trabalho
Segundo DELGADO (2002, p. 663) a conciliação trabalhista pode ser definida como “ato
judicial, mediante o qual as partes litigantes, sob interveniência da autoridade jurisdicional,
ajustam a solução transacionada sobre a matéria objeto de processo judicial. ” A conciliação é
a espinha dorsal da Justiça do Trabalho, tanto que é obrigatória, tão logo aberta a audiência
inicial, (artigo 846 da CLT/1945), nas razões finais (artigo 850 da CLT/1945), a qualquer
momento no curso do processo de conhecimento ou de execução (artigo 764 da CLT/1945), sob
pena de nulidade.
As audiências virtuais de conciliação são importantes para pôr fim ao processo trabalhista com
um único ato processual o conflito trabalhista é solucionado e extinto com resolução do mérito
nos termos do artigo 831 da CLT/1945, gerando economia de tempo, despesas processuais e
custos com deslocamento das partes para comparecerem ao fórum, pois de sua residência ou
qualquer local que tenha acesso a internet pode participar das audiências trabalhistas.
83
A conciliação por ser um método autocompositivo para solução dos conflitos trabalhistas requer
o envolvimento das partes e seus procuradores, com uma participação ativa do juiz para sua
concretização.
As audiências virtuais de conciliação também têm sido adotadas na Justiça do Trabalho para
homologação de negociação processual entre as partes, sobre ônus da prova, prova pericial,
prova emprestada e juntada de documentos, por força do artigo 190 do CPC/2015 para evitar
que o processo fique paralisado durante este período de pandemia.
Neste contexto, surge um novo processo do trabalho, cooperativo, que exige lealdade, boa-fé
das partes e procuradores. As partes têm que participar das audiências para que o processo possa
ser solucionado. Para fazer justiça precisa da colaboração dos envolvidos no processo, ninguém
consegue fazer justiça sozinho já que a jurisdição é inerte só age se provocada (artigo 2º, do
CPC) é o advogado é indispensável à administração da Justiça (artigo 113 da CF/88). O
Conselho Nacional de Justiça no procedimento de controle administrativo 3753-91- 2020,
decidiu que as audiências virtuais devem ser concordância das partes e advogados e não pode
imputar penalidades processuais as partes que não comparecerem as audiências. LA RUA
(1999, p. 109), ao tratar sobre a constituição e processo, inicia o seu capítulo com o título “El
derecho procesal al servicio del hombre”. Está é a missão mais importante do Direito
Processual: estar ao serviço do homem e da humanidade. ”
Portanto evidencia-se que as audiências virtuais de conciliação podem ser adotadas na Justiça
do trabalho sempre, tanto para pôr fim ao processo com resolução do mérito, homologando a
transação efetivada entre as partes, por força do artigo 831 da CLT/1945, ou para homologação
de questões processuais negociadas entre as partes, nos termos dos artigos 6º, e 190 do
CPC/2015. Observe-se que quando o juiz for homologar a negociação processual entabulada
entre a parte incumbe examinar se estão presentes os requisitos legais do negócio jurídico, se
possui objeto licito, forma prescrita ou não proibida na Lei, se as partes são capazes. Se restar
configurado nos autos que se trata de lide simulada é defeso ao juiz do trabalho proceder a
homologação, conforme prescreve o artigo 9º da CLT. O negócio processual também pode ser
anulado quando resultar de vicio de vontade, segundo artigo 177 do CC/2002.
Assim, reconhecida a importância das audiências virtuais de conciliação da Justiça do Trabalho,
pois além de efetivar o direito processual em tempo razoável atinge a finalidade precípua da
função jurisdicional que a pacificação social com justiça.
84
2. Pontos positivos para continuidade da realização das audiências de conciliações
virtuais na Justiça do Trabalho pós-pandemia do (Covid -19)
A pandemia do Corona vírus (Covid-19) causou uma revolução tecnológica na atividade
jurisdicional, principalmente da Justiça do trabalho. As audiências virtuais de conciliação,
embora prevista no artigo 334, § 7º do CPC/2015, que se aplica ao Processo do Trabalho por
força do artigo 769 da CLT/1945, desde 2015, somente agora com a Portaria n. 61 de 31 de
março de 2020 foi oficialmente implementada na Justiça do Trabalho com a instituição da
plataforma Cisco Weber, instituída pelo Conselho Nacional de Justiça.
As audiências virtuais tem como pontos positivos que merecem ser destacados para
demonstrar que vieram para permanecer: a)Acesso substancial a justiça previsto no artigo 5º,
XXXV da CF/88, concretizando os ensinamentos de CAPPELLETTI e GARTH (1988, p. 12),
que reconhecem o acesso à justiça como “requisito fundamental – o mais básico dos direitos
humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas
proclamar os direitos de todos.”, as partes que tem acesso a internet podem participar das
audiências em qualquer local. b) observância aos princípios do processo eletrônico, Conexão
inquisitiva e Desterritorialização as partes e seus procuradores podem participar da audiência
em qualquer lugar do mundo que tenha acesso a rede mundial de computadores, segundo
CHAVES JUNIOR (2010, p. 23), c) princípio da oralidade onde são ouvidas as partes e
procuradores, negociada uma solução rápida para o processo , inclusive a plataforma permite
a gravação das audiências, e a parte pode participar do ato processual através de uma ligação
telefônica; d) a verdade virtual torna-se real, CHAVES JUNIOR (2010, p. 29) diz“no novo
processo não vigora mais o dogma, segundo o qual o que não está no processo está fora do
mundo; o princípio é outro: o que está no google está no processo”.; d) redução de custos :
as partes, procuradores, juízes e servidores, e não precisam arcar com despesas de locomoção,
para participar das audiências; d) economia de tempo, em um ato processual o processo
trabalhista é solucionado, princípio da razoável duração do processo, artigo 5º,LXXVIII da
CF/88;
85
e) eficiência, paz social e segurança jurídica, nos termos dos artigos, 3º, I e 37 da CF/88.
PACHÁ (2011, p. 91), sobre a efetividade da justiça quando cumpre seu papel conciliador :
“As contradições e os conflitos fazem parte da natureza humana e, lamentavelmente, a vida não
é justa. Não se pretende acabar com os conflitos, e sim, afirmar uma política que solucione de
maneira simples e eficiente os litígios. Uma justiça rápida, acessível e efetiva é o que o
Judiciário quer e o que a sociedade merece. ”
f) os acordos feitos impulsionam a economia e são em benefício da própria sociedade; g)
Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, os Tribunais do Trabalho ocupa o segundo
lugar na quantidade de usuários da plataforma CISCO WEBEX, o que demonstra o relevante
trabalho que está sendo feito para atender os jurisdicionados trabalhistas neste momento de
crise econômica e desemprego. As audiências virtuais de conciliação e instrução devem
continuar pós-pandemia: 1) nos “easy cases”, 2) quando partes não possam comparecer em
juízo, em viagens, ou residindo no exterior; 3) conciliação CEJUSCS e Varas do Trabalho;
4) saneamento do processo sobre a necessidade de realização de provas, seja oral, pericial sempre
objetivando avançar em busca da resolução do mérito; 5) fim das Cartas Precatórias e
Rogatórias, o juízo deprecante pode ouvir as testemunhas em qualquer lugar.
3. Conclusão
As audiências virtuais de conciliação devem permanecer na Justiça do Trabalho pois serve para
pôr fim ao processo com resolução do mérito ensejando economia e celeridade processual
dando cumprimento aos princípios constitucionais do acesso à justiça da razoável duração do
processo e para homologação de negociação processual entre as partes nos termos dos artigos
6º e 190 do CPC. Nesta hipótese o juiz do Trabalho deve observar se estão presentes os
requisitos legais, se possui objeto licito, forma prescrita ou não proibida na Lei, se as partes são
capazes, não se trata de lide simulada, não deve proceder a homologação. A audiência virtual
de conciliação tem muitos aspectos positivos e traz um novo olhar para o futuro da Justiça no
Brasil. O mais importante traz “A paz para que para ser universal e duradoura deve assentar
sobre a justiça social” (OIT – Declaração da Filadelfia), e cumpre um dos objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil, artigo 3º da CF/88, qual seja construir uma
sociedade mais justa e solidária. No livro de ISAIAS (32:17 ), “onde há justiça a paz e
segurança para sempre.”.
86
4.Referências
ALMEIDA, João Ferreira de. A Bíblia Sagrada. Editora Vida, Florida: E.U.A.1995. CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. O processo em rede. In (Coord) Comentários à lei do Processo Eletrônico. São Paulo: LTr, 2010. CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Tradução e revisão de Ellen Gracie Northfleet, Sergio Antônio Fabris: Porto Alegre, 1988. DE LA RUA, Fernando. Teoria general do Proceso. Buenos Aires : Depalma, 1991. DELGADO. Mauricio Godinho. Arbitragem, mediação e comissão de conciliação Prévia no direito do trabalho brasileiro. Revista LTr, v. 66, n. 6. Jun. 2002, São Paulo. PACHÁ, Andrea Maciel. “Movimento pela Conciliação – O Foco na Sociedade”, in Richa e Peluzo, Conciliação e Mediação: Estruturação da Politica Judiciária Nacional, Rio de Janeiro: Forense, 2011. RENAULT, Luiz Otávio Linhares. Prefácio. In: __ CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende. Comentários à lei do processo eletrônico. São Paulo: LTr, 2010.
87
88
DESAFIOS DA INSERÇÃO DE MÉTODOS TECNOLÓGICOS PARA A RESOLUÇÃO DE LITÍGIOS E A OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DURAÇÃO
RAZOÁVEL DO PROCESSO.
CHALLENGES OF INSERTING TECHNOLOGICAL METHODS FOR LITIGATIONS RESOLUTION AND COMPLIANCE WITH THE PRINCIPLE OF
REASONABLE DURATION OF THE PROCESS.
Ana Clara dos Reis Trindade Ferrer Monteiro
Resumo
A demora na solução das demandas levadas ao Judiciário é um problema crônico da justiça
brasileira, partido desse pressuposto, se faz necessário a adoção de novas medidas para
efetivar o princípio da razoável duração do processo. Com a tecnologia cada vez mais
presente no cotidiano humano, ela se configura como uma boa alternativa para reduzir a
morosidade judiciária, mas a linha entre os eventuais benefícios e os prejuízos é muito tênue,
afinal, quais são os desafios para implementação de novas tecnologias na resolução de
conflitos.
Palavras-chave: Desafios, Novas tecnologias, Conflitos
Abstract/Resumen/Résumé
The delay in resolving the demands brought to the Judiciary is a chronic problem of Brazilian
justice, based on this assumption, it is necessary to adopt new measures to implement the
principle of reasonable duration of the process. Some resources have already been
implemented, such as special courts, but they are unable to achieve the objective. With
technology increasingly present in human daily life, it is configured as a good alternative to
reduce judicial delays, but the line between possible benefits and losses is very tenuous, after
all, what are the challenges for implementing new technologies in conflict resolution.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Challenges, New technologies, Conflicts
89
1-Introdução
O primeiro relato da aparição do princípio da razoável duração do processo se dá na
Carta Magna de 1.215, que em seu artigo 40, determina que o Estado é o responsável pela
jurisdição, sendo que este não poderia postergar o acesso à justiça, entendendo, portanto, que
era obrigação do Estado prover a justiça no tempo razoável, para que as partes não venham a
sofrer prejuízos em detrimento da espera.
Após esse marco inicial, é possível verificar o princípio supramencionado na
Convenção Européia dos Direitos do Homem, em 1950, bem como no Pacto de San José da
Costa Rica, em 1969, este último determinada que todo indivíduo possui o direito de se
manifestar em prazo razoável com o objetivo de resolver sua lide.
Na legislação interna Brasileira, o princípio da duração razoável do processo se
encontra de maneira expressa no Código de Processo Civil e de maneira implícita em
legislações esparsas que visam colocar eficiência na tramitação dos procedimentos judiciais.
Mesmo com a legislação prevendo a necessidade de celeridade processual, é evidente que os
métodos adotados não conseguem efetivar o prazo necessário para que a lide seja resolvida para
satisfação do direito.
Atualmente existem formas de resolução de conflitos extrajudiciais, como a mediação
e a conciliação, porém, é possível verificar que não existem centros de mediação e conciliação
disponível para acesso amplo de toda à população, a demanda é muito alta em relação ao
número de profissionais qualificados para resolverem determinados conflitos.
Desse modo, surge como opção, para serem implementadas no judiciário ou em vias
extrajudiciais, as novas tecnologias, visando ampliar o acesso à justiça e melhorar a celeridade
da resolução de conflitos. Em paralelo a esse avanço, que poderia ser o melhor meio de efetivar
o que já há anos, o Brasil vem tentando alcançar, surgem várias barreiras que precisam ser
colocadas em pauta para se discutir em até que ponto é possível pode potencializar e investir
nos recursos tecnológicos, não conceituando-os como isento de dificuldades e vícios ao serem
adotados no Brasil.
A pesquisa que se propõe pertence, predominantemente, ao método dedutivo. O
instrumento utilizado, de forma preponderante, é a pesquisa bibliográfica derivada de fontes
como livros, artigos e revistas científicas. O objetivo geral do trabalho é analisar como o brasil
vem se relacionando com novas alternativas para redução da morosidade do judiciário. Como
objetivos específicos do trabalho devem ser citados: os problemas que devem ser observados
90
ao tentar implantar qualquer espécie de nova tecnologia no judiciário, bem como analisar a
maneira como essa inserção deverá ser realizada para haver prejuízos mínimos.
2- Desenvolvimento
A partir do que foi exposto, é imprescindível que se analise os desafios da
implementação dessas tecnologias no Brasil, passando pelo sistema atual adotado e, em
seguida, expondo possíveis cenários nacionais com a implementação sem restrições e
planejamento.
2.1 Sistemas de resolução de conflitos que o Brasil atualmente utiliza
O conflito entre a celeridade processual e a segurança jurídica vem ganhando ainda
mais destaque com o passar dos anos, ao mesmo tempo em que se faz necessário um
procedimento especial e burocrático para satisfazer por completo a pretensão, as sequelas da
protelação judicial podem ser, muitas vezes, irreversíveis. Atualmente, o Brasil adota sistemas
extrajudiciais e judiciais para a resolução de conflitos, visando assim atender os dois objetivos
supramencionados.
O primeiro passo adotado pelos juízes que pretendiam resolver os litígios de maneiras
alternativas se refere à criação dos juizados especiais cíveis, em 1982, juntamente com os
conselhos de arbitragem e mediação, devido à grande efetividade desses meios alternativos, no
ano de 1985, entrou em vigor a Lei Federal que instaurou o procedimento em todo o território
nacional. O impacto da criação dos juizados foi tão marcante que refletiu na Constituição
Federal que em seu artigo 98, I, prevê a criação em âmbito federal e estadual de juizados
especiais.
A criação deste instituto foi uma alternativa de tratar os procedimentos simples com
maior celeridade, para as causas de menor complexidade, que são as admitidas pelos juizados
especiais, com o passar dos anos, houve também uma grande lotação de causas nos juizados,
fazendo com que a celeridade processual se encontrasse menor e, em alguns casos, as partes
sofriam perdas da apreciação de seu direito, em prol da rapidez para se alcançar a pretensão
determinada.
Como exposto anteriormente, junto com a criação dos juizados especiais, houve
também a inovação quanto aos conselhos de arbitragem e de mediação. Pela grande demanda
em face do estado pela prestação da jurisdição, foi necessário encontrar métodos que
91
diminuíssem a participação do Estado, criando assim a arbitragem, um procedimento ausente
de formalismos processuais, pela autonomia das partes é realizada a eleição do árbitro, acontece
a resolução dos litígios por profissionais especializados nesse método em específico, no entanto,
a reunião para a arbitragem, em regra, é realizada presencialmente.
Já a mediação, como um método extrajudicial de resolução de conflitos, em que o
mediador, que é um terceiro escolhidos pelas partes, atua como facilitador das interações dos
diálogos entre elas, de maneira que o diálogo das partes se faz muito importante, o que colabora
para que, pela própria autonomia das partes, elas encontrem soluções que sejam favoráveis para
ambas, ou, em certos casos, menos prejudiciais para ambas.
Ainda que tenhamos adotado esses meios alternativos de resolução de conflitos, eles
não são suficientes para atender toda a demanda da população, uma vez que a quantidade de
conselhos de arbitragem e mediação não existem em larga escala e, existem grandes chances
de não atingirem o objetivo pretendido e as partes recorrerem ao judiciário para sanarem a ide,
gerando ainda mais a saturação dos processos. Desaguando em uma necessidade de novos
meios resolutivos de conflitos, colocando como o centro das atenções, a utilização da tecnologia
para atender os objetivos.
2.2 Desafios para se inserir novas tecnologias na resolução de conflitos.
Com o período atual de isolamento social, devido à pandemia da COVID-19, muitas
áreas do direito já estão passando pela experiência de terem audiência online. Inicialmente só
eram realizadas audiências de conciliação, porém, já se admite que haja outros tipos de
audiência, o que não é o foco no momento. Com a experiência das audiências de conciliação
realizadas no âmbito online, é possível coletar dados que indicam se é possível continuar com
o sistema remoto na normalidade social, como meio de celeridade do processo.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - Tecnologia da Informação
e Comunicação (Pnad Contínua TIC) 2018, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), mostra que uma em cada quatro pessoas no Brasil não tem acesso à internet.
Em números totais, isso representa cerca de 46 milhões de brasileiros que não acessam a rede.
Os dados, que se referem aos três últimos meses de 2018, são da última pesquisa realizada até
o momento. Com esses dados, fica claro que há uma deficiência quanto à implementação de
recursos que envolvam a necessidade do acesso à internet.
A questão apresentada pode ser verificada em audiências online em áreas que uma
parte se encontra em vulnerabilidade perante a outra, como no direito do trabalho e o direito do
92
consumidor, fazendo com que nessas audiências, a parte vulnerável não consiga comparecer
justamente pela falta de recursos e, havendo prejuízo pelo não comparecimento, essas novas
tecnologias seriam usadas para diminuir a apreciação e êxito das partes menos favorecidas,
anulando o princípio da paridade de armas dentro do processo.
Sendo assim, o caminho para inserir regimes remotos, teria que ser somente para certos
atos processuais, sendo necessária a análise das condições das partes e de seus advogados,
precisaria ser em atos que não tenha prejuízo o não comparecimento da parte e seu advogado
puder estar presente, principalmente em matéria do direito que existem grande disparidade,
como supramencionado.
Apresentada a barreira para a inserção do regime remoto, tem-se então a possibilidade
de utilizar inteligência artificial para desenvolverem o papel de conciliadores e mediadores, o
que possibilitaria a criação em massa dessa inteligência artificial. O problema que gira em torno
dessa questão, é que os investimentos seriam voluptuosos, uma vez que não bastaria criar esse
novo recurso, teria que criar locais físicos para que as pessoas possam se dirigir e assim serem
atendidas, já que se esbarra novamente no problema do acesso à internet.
Junto com a eventual inserção da tecnologia na resolução dos conflitos, seria
imprescindível que o Estado provesse a educação tecnológica para as pessoas, o que não é
presente na vida dos brasileiros. Sem a devida instrução de manuseio, este novo recurso poderia
ser usado como maneira de cercear os direitos, já que as partes não iriam conseguir aproveitar
a nova alternativa para resolver seus conflitos, ou então somente uma delas conseguiria, o que
é prejudicial para o direito.
3. Considerações finais
É evidente que o sistema judiciário precisa implementar medidas alternativas para
efetivar o que há anos buscam: a celeridade e a satisfação necessária para aqueles que procuram
à justiça. Mesmo que o Brasil já tenha, na legislação, leis que determinam a implementação de
determinados meios para a duração razoável do processo, elas não se fazem suficientes para
atender o grande número de demandas judiciais.
Pelo fato do Brasil ser um país subdesenvolvido, grande parte da população não possui
acesso a tecnologias, estas que poderiam vir a ser implementadas, além disso, pela mesma
razão, não é empiricamente possível que o país construa centros de conciliação e mediação, ou
forneça centros com acesso aos novos recursos, por falta de recursos financeiros. Outra questão
a ser levada em consideração é a educação que precisa ser disponível para que os futuros
93
usuários venham a aprender utilizar novos sistemas, sendo que a educação tecnológica não se
faz presente na vida da maior parte da população brasileira.
Por fim, para que haja, de maneira correta e segura, a implementação de novas
tecnologias para a resolução de litígios, é necessário que estabeleçam restrições e
planejamentos, sendo primeiramente realizada para determinadas áreas do direito e para certas
matérias que estão sendo discutidas no momento processual, analisando as condições das partes
no caso concreto, para que não haja prejuízo do direito levado ao judiciário.
94
4. Referências
BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015. Brasília: DF.
Disponível em: . Acesso em: 10 Jun. 2020.
BRUM, Argemiro J. O desenvolvimento econômico brasileiro. 19.ed. Petrópolis: Vozes,
1998.
CASARA, Rubens; VASSAL, Mylène G. P. O ônus do tempo no processamento: uma
abordagem à luz do devido processo legal interamericano. Radicalização Democrática -
Revista do Movimento da Magistratura Fluminense pela Democracia, Rio de Janeiro: Lúmen
Juris, n. 1, 2004.
CORSI, Francisco Luiz. A questão do desenvolvimento à luz da globalização da economia
capitalista. Revista Sociol. Polit., Curitiba, 19, p. 11-29, nov. 2002.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas tendências do direito processual. São Paulo: Forense
Universitária, 1990.
IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios: número de indivíduos que possuem acesso à internet. Rio de
Janeiro, 2018.
KATSH, Ethan. ODR: a look at history. In: WAHAB, Mohamed S. Abdel; KATSH, Ethan;
RAINEY, Daniel (Ed.). Online dispute resolution: theory and practice. A treatise on
technology and dispute resolution. The Hague: Eleven International, 2012.
KATSH, Ethan; RIFIKIN, Janet. Online dispute resolution: resolving conflicts in
cyberspace. San Francisco: Jossey-Bass, 2001.
LÉVY, Pierre. O que é virtual. Tradução de Paulo Neves do original “Qu´est-ce le virtuel:”
São Paulo: 34, 1998.
PEREIRA, Clovis Brasil. Conciliação e Mediação no Novo CPC. Disponível em: <
http://www.conima. org.br/arquivos/4682 > Acesso em 10 Jun. 2020.
SANTOS e GOMES (coord.). A administração e gestão da justiça- análise comparada das
tendências de reforma. Coimbra: Observatório Permanente da Justiça Portuguesa/Centro de
Estudos Sociais. 2001.
TORRES, Jasson Ayres. O acesso à justiça e soluções alternativas. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2005.
WAHAB, Mohamed S. Abdel; KATSH, Ethan; RAINEY, Daniel (Ed.). Online dispute
resolution: theory and practice. A treatise on technology and dispute resolution. The Hague:
Eleven International, 2012.
95
1 Bacharel em direito, advogada, pós-graduanda em Civil e Processo Civil.1
DIREITO NA ERA DIGITAL E PANDEMIA: OS BENEFÍCIOS DOS MÉTODOS CONSENSUAIS DIGITAIS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS DURANTE A
PANDEMIA DO COVID-19
LAW IN THE DIGITAL AGE AND PANDEMIC: THE BENEFITS OF THE CONSENSUS DIGITAL CONFLICT RESOLUTION METHODS DURING THE
COVID-19 PANDEMIC
Thayná Medeiros Melo 1
Resumo
Este resumo científico busca analisar como a tecnologia atrelada ao Direito podem auxiliar
durante a Pandemia do Covid-19, e validar como os Métodos Consensuais Digitais de
Resolução de Conflitos são importantes instrumentos para desafogar o Judiciário, além das
vantagens como a celeridade, a economia processual , o rompimento de distâncias físicas,
características significativas em uma crise sanitária e econômica sem precedentes causada
pelo Covid-19, resultando em conflitos e demandas ao judiciário. Através de pesquisa
bibliográfica concluiu-se que os métodos consensuais são de extremo auxílio para diminuir a
alta litigância e que a tecnologia vem para popularizar a mediação e conciliação.
Palavras-chave: Conflitos, Consensual, Covid-19, Digital
Abstract/Resumen/Résumé
This scientific summary seeks to analyze how technology linked to Law can assist during the
Covid-19 Pandemic and validate how the Digital Consensual Methods of Conflict Resolution
are important instruments to challenge the Judiciary, in addition to the advantages such as
speed, a procedural economy, or disruption physical distances, characteristics applicable in
an unprecedented health and economic crisis caused by Covid-19, resulting in conflicts and
legal demands. Through completed bibliographic research, consensual methods are extremely
helpful in reducing high litigation and the technology that comes to popularize mediation and
conciliation.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Conflicts, Consensual, Digital, Covid-19
1
96
INTRODUÇÃO
A China foi surpreendida ao final do ano de 2019 com o surgimento do Covid-19, já
no início do presente ano, tomou proporções mundiais e deu início a maior crise sanitária do
Século. Consequentemente, sem tempo hábil para criação da vacina, o isolamento social é até
o momento o maior remédio para evitar o contágio do vírus. Com isso, a crise até então sanitária
tornou-se também econômica, com o comércio não essencial fechado, devido ao isolamento
social, o poder de compra caiu, o dinheiro parou de circular, aumento do desemprego e o
judiciário parou. Os conflitos não pararam de ocorrer e possíveis demandas judiciárias não
pararam de surgir. Então, foi necessário criar alternativas para conter o aumento da morosidade
e possibilitar o acesso à justiça. A solução não é nenhuma novidade, mas sua implementação
ainda era tímida no Brasil, são eles os métodos digitais de solução de conflitos, instrumentos
que encurtam distancias, promovem a celeridade, economia processual, a eficiência e o acesso
à justiça. A pandemia do Covid-19 parece mudar o direito para sempre e implementar de vez a
tecnologia na resolução de conflitos.
OBJETIVOS
Demonstrar como os métodos autocompositivos e heterocompositivos são importantes
instrumentos para resolução de conflitos em um país com alta taxa de litigância como o Brasil
e validar as vantagens da escolha pelos métodos consensuais de conflitos para o judiciário,
principalmente através das tecnologias digitais que vem encurtando distâncias e fazendo com
que a justiça não pare, mesmo em tempos de distanciamento social devido a pandemia do
Covid-19.
METODOLOGIA
A metodologia utilizada na pesquisa científica que deu origem a este resumo
expandido, ocorreu através de uma pesquisa bibliográfica em artigos científicos, leis, códigos
e teses.
DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA
97
(LUPOLI, 2020, p. 4) aduz que no ano de 2019 segundo o CNJ apurou que a média de
tempo do processo na fase de conhecimento no 1º grau é de três anos e três meses, vale destacar
também sobre a quantidade de processos novos distribuídos são 19.597.314 milhões e os
pendentes 62.988.042 milhões sem sentença. Ainda de acordo com (LUPOLLI, 2020), foram
distribuídas milhões de demandas em uma situação dita como normal, é possível um aumento
na quantidade de processos devido a COVID- 19, visto que a renda do brasileiro diminuiu cerca
de 45% dos brasileiros em março de 2020, impacto direto no poder de compra e pagamento.
Desta feita, com fundamento em (HOLLIDAY, 2017, p.13), a doutrina especializada,
ao sistematizar os meios consensuais, diferencia os institutos da autocomposição, quando o
conflito é solucionado pelas partes, sem a intervenção de outros agentes no processo de
pacificação da controvérsia e a heterocomposição, quando a disputa é solucionada através da
intervenção de um agente exterior à relação conflituosa original.
(NETTO, 2020, p. 6), A Lei de Mediação, em seu artigo 46, inova ao trazer a
possibilidade de a mediação se realizar de forma virtual, pela internet ou meio de comunicação
que viabilize a transação à distância, em havendo anuência mútua das partes.
Com fulcro no (CNJ, p. 1), o instrumento da mediação digital permite que as partes
construam acordos de forma autônoma. A plataforma é gratuita, segura e fácil de usar com
intuito de facilitar a comunicação entre pessoas interessadas em solucionar seus conflitos.
De acordo com (CNJ, p. 1), é realizada por iniciativa do cidadão que queira solucionar
alguma demanda com empresa já cadastrada no sistema. Se o cidadão estiver satisfeito com a
proposta, o acordo poderá ser homologado por juiz, com força de decisão judicial. Nesse caso,
o acordo passa a ter valor de sentença judicial, constituindo título executivo judicial.
(RODRIGUES, p. 8), traz à baila o fato de que o NCPC prima pela celeridade
processual, visto que o código atual presa por uma resolução consensual de conflitos não
contenciosa de forma alternativa como a mediação e, ainda, busca tornar os procedimentos
processuais de maneira eletrônica a fim de acompanhar a era digital, atuando como um
facilitador ao acesso à justiça.
Argumenta (FERNADES,GILBERTO L.,2020):
Que o presente momento de pandemia global do corona vírus onde o isolamento social
tornou-se um dos principais meios de combate à sua disseminação, empresas privadas,
comércio, escolas e órgãos de governo testam e implementam modelos de
teletrabalho, de forma a minimizar a paralização de atividades. Muitas dessas
instituições estão sendo positivamente surpreendidas com a adoção do teletrabalho,
em desacordo às suas expectativas iniciais, pelo fato de serem mantidos os índices
normais de produtividade, ou mesmo superados. De fato, a pandemia por corona vírus
constituiu uma alavancagem para a economia 4.0, acelerando ainda mais os processos
de transformação digital. Dificilmente, após o término das restrições de contato social,
as instituições retornarão inteiramente ao modo de operação anterior à essa pandemia.
98
Com fulcro em (FERRAZ, 2020, p. 4), devido aos impactos da pandemia, muitas
empresas terão que renegociar uma série de contratos e negócios, com o fim de restabelecer o
equilíbrio nas relações jurídicas que sofreram alterações. Partindo-se da premissa que no mundo
dos negócios “tempo é dinheiro”, os métodos consensuais de resolução de disputas serão de
extrema importância para que as organizações solucionem e gerenciem os seus conflitos e
litígios de forma estratégica, econômica e ágil.
(NETTO, 2020) diante da pandemia do Corona vírus, a ampliação da realização
eletrônica da audiência preliminar:
Torna-se imprescindível à manutenção do efetivo acesso à ordem jurídica, já que as
partes que possuam acesso aos meios digitais, conhecendo minimamente as
ferramentas necessárias e possuindo interesse mútuo, deverão ter à sua disposição a
possibilidade de realização eletrônica da audiência inaugural.
Nesta feita, (NETTO, 2020, p. 7) complementa:
Para garantir o acesso contínuo à justiça em meio ao isolamento social, se faz
necessária a introdução dos modelos de tribunais remotos, audiências realizadas por
meio do telefone, vídeo, por meio do Skype, Zoom e WhatsApp, por exemplo, e em
papel, por intermédio da submissão de artigos, dentre outras diversas técnicas que
podem ser desenvolvidas.
Ainda segundo (NETTO, 2020, p. 5):
As vantagens que as ODR`s oferecem, ainda mais, no momento em que a população
se encontra, em relação a pandemia do COVID-19. Visto que é de grande estima, não
está sendo possível o contato físico entre os indivíduos, neste viés, a ODR vem com
o papel para que sejam realizadas as audiências de mediação e conciliação, de forma
online, dando um efetivo acesso à justiça para as partes nesse momento histórico.
Entretanto, há um empecilho enfrentado pela ODR, especialmente no Brasil, que
possui taxas de desigualdade social no que tange a utilização da internet, pois parte
considerável da população vive em zona rural. Porém, é possível que essa taxa,
diminua com o avanço da internet.
(FERNADES,GILBERTO L, 2020, p. 5) fundamenta que para tentar diminuir a
morosidade nos julgamentos e reduzir o estoque de processos:
Alguns órgãos do judiciário brasileiro têm implementado soluções de Inteligência
Artificial que identificam e eliminam gargalos, otimizando os procedimentos judiciais
e melhorando a produtividade dos tribunais. Caso esse mesmo tipo de iniciativa seja
implementada no Poder Executivo, nos âmbitos Federal, Estadual e Municipal,
auxiliaria tanto na recuperação de créditos como na redução de ações de execução
fiscal enviadas ao Sistema Judiciário.
(FERNADES,GILBERTO L, 2020, p. 29), acerca do presente momento em que
vivenciamos:
Situações de desgaste em diversas áreas de relacionamento tanto entre instituições
quanto entre indivíduos, causadas pela Covid-19, já se prevê um aumento
considerável de casos judiciais, seja na área trabalhista, devido a impossibilidade das
empresas manterem seus contratos de trabalho, ou pela quebra de outros tipos de
contratos entre empresas, pelo não cumprimento do pagamento de dívidas e títulos
99
tanto por empresas quanto por pessoas físicas, e até mesmo um aumento no número
de divórcios.
(FERNADES,GILBERTO L, 2020, p. 2).
O impacto desse aumento de casos no Sistema Judiciário Brasileiro, já no limite da
capacidade de atendimento da demanda atual, representaria uma reversão na tendência
de melhorias dos índices, apresentada nos últimos três anos. O incentivo à realização
de acordos, seja por mediação, conciliação ou arbitragem, pela utilização de
aplicações de Inteligência Artificial, como aquelas citadas ao longo do presente texto,
certamente poderiam aliviar tal impacto.
CONCLUSÃO
O presente resumo expandido conclui pela aplicabilidade dos métodos consensuais
digitais de conflitos como alternativa de acesso à justiça durante a pandemia do COVID-19,
sob a justificativa de diversas vantagens do método em relação ao processo, tais como:
celeridade, eficiência, economia processual, e em especial no momento que a sociedade se
encontra, permite que seja mantido o isolamento social e ao mesmo tempo que o judiciário
continue atuando.
REFERÊNCIAS
CNJ. RESOLUÇÃO Nº 125, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2010. Disponível em:
https://www.cnj.jus.br/wpcontent/uploads/2014/04/resolucao_125_29112010_230420141908
18.pdf . Acesso em: 12/06/2020 .
FERNADES, GILBRETO.L. DIREITO & CIÊNCIA DE DADOS: TENDÊNCIAS E
IMPACTOS DA QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. 2020. Disponível em:
https://www.academia.edu/42657405/Direito_and_Ci%C3%AAncia_de_Dados_tend%C3%A
Ancias_e_desafios . Acesso em 12/06/2020.
FERRAZ, Jose Gabriel. Os Métodos Autocompositivos e os Benefícios que estes Meios de
Resolução de Conflitos podem oferecer as Empresas em Tempos de Pandemia. 2020.
Disponível em: https://joseferraz1996.jusbrasil.com.br/artigos/838220588/os-metodos-
autocompositivos-e-os-beneficios-que-estes-meios-de-resolucao-de-conflitos-podem-
oferecer-as-empresas-em-tempos-de-pandemia?ref=feed . Acesso em : 12/06/2020.
HOLLIDAY, Pedro Alberto Calmon. OS MÉTODOS CONSENSUAIS E SUA CULTURA
EVOLUTIVA: REDUÇÃO DA LITIGIOSIDADE E CONCRETIZAÇÃO DE
DIREITOS . 2017 Disponível em: https://portal.trf1.jus.br/dspace/handle/123/164840 . Acesso
em: 12/06/2020.
100
LUPOLI, Dayane.Covid-19 e os meios consensuais de solução de conflitos.Disponível em:
https://www.enfoquems.com.br/noticias/brasil-mundo/covid-19-e-os-meios-consensuais-de-
solucao-de-conflitos . Acesso em : 12/06/2020.
NETTO, José Laurindo De Souza; Fogaça, Anderson Ricardo; Garcel, Adriane. MÉTODOS
AUTOCOMPOSITIVOS E AS NOVAS TECNOLOGIAS EM TEMPOS DE COVID-
19: online dispute resolution – ODR. Acesso em : 12/06/2020.
RODRIGUES, Alexsandra Gato; LORENZI, Bianca Cassiana; ROSA, Felipe Luiz.
MEDIAÇÃO DIGITAL: A SOCIEDADE MODERNA A UM CLIQUE DA JUSTIÇA
DIGITAL MEDIATION: THE MODERN SOCIETY TO A CLIQUE OF JUSTICE. 2017. Disponível em: http://www.ufsm.br/congressodireito/anais. Acesso em : 12/06/2020.
101
DIREITO, ÉTICA SOCIAL E A BIOÉTICA DIANTE DA PANDEMIA DO NOVO CORONAVÍRUS: A ESCOLHA DE SOFIA E A LUTA PELO USO DOS
RESPIRADORES ARTIFICIAIS
LAW, SOCIAL ETHICS AND BIOETHICS IN THE PANDEMIC PERIOD OF CORONAVIRUS DISEASE: SOPHIE'S CHOICE AND THE FIGHT FOR
ARTIFICIAL RESPIRATORS
Annie Dante de MesquitaGabriella de Souza lima
Resumo
Esta pesquisa analisa questões relacionadas ao Direito, a moral e aos paradigmas do campo
da bioética diante da pandemia do novo coronavírus. Com a crise que assola os Sistemas de
Saúde, profissionais da área precisam fazer escolhas difíceis – a chamada “Escolha de Sofia”:
quando mais de um paciente necessita do uso de respiradores artificias e não há número
suficiente para todos. O presente trabalho objetiva expor como funciona esta tecnologia e
porque é essencial, a partir da vertente metodológica jurídico-sociológica. Quanto à
investigação, pertence à classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-
interpretativo. Predominará o raciocínio dialético.
Palavras-chave: Bioética, Constituição federal, Escolha de sofia, Respiradores artificiais, Ventilação mecânica
Abstract/Resumen/Résumé
This academic survey consists in the law studies, ethics and bioethic’s paradigms in the
period of coronavirus disease. Because of the helthcare crisis, professionals have to make
difficult choices – Sophie’s choice – when a person who is infected needs the artificial
ventilation but there aren’t enough for everybody. This introductory study shows how this
technology works and why It’s so important. In addition, the project is based on a legal-
sociological view and when It comes to investigation, is based on Witker and Gustin’s
classification: legal-interpretative and dialectic logic.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Bioethics, Federal constitution, Sophie's choice, Artificial respirators, Mechanical ventilation
102
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A presente pesquisa tem como foco principal analisar questões relacionadas ao
Direito, a Moral social e aos paradigmas que envolvem o campo da bioética, sobretudo, diante
da pandemia ocasionada pelo novo coronavírus. Observa-se que o Covid-19, muitas vezes,
provoca infecções respiratórias, desde as mais brandas, às mais graves que exigem o uso dos
respiradores artificiais. Contudo, considerando o cenário brasileiro, não há ventiladores
mecânicos suficientes para atender a toda população, o que leva ao colapso dos Sistemas de
Saúde.
À vista disto, o projeto objetiva pontuar as formas tecnológicas dispostas, na atual
conjuntura, que contribuem para a melhora clínica dos indivíduos infectados. A primeira delas
apoia-se no uso de cateteres ou máscaras respiratórias ligadas a uma máquina. Já a segunda,
respalda-se em tubos invasivos que entram no interior do corpo e atingem à traqueia. Os
amparos citados são os mais comuns; mas a modernidade ainda conta com um sistema de
oxigenação mais avançado, o ECMO, embora sejam de difícil alcance, uma vez que são muito
caros.
O trabalho também busca aprofundar o impasse denominado como “A
escolha de Sofia” que, neste âmbito, é uma expressão que exterioriza a imposição de se adotar
uma decisão difícil e baseando-se em um enorme sacrifício (JUNIOR; MOUSINHO, 2020).
Desse modo, verifica-se que a escolha fundamenta-se na ideia de qual paciente poderá utilizar
da tecnologia disponível, obrigando os profissionais a optarem entre duas ou mais vidas.
Assim, abre-se margem para os debates, que vão desde o apoio aos protocolos
médico/hospitalar adotados, à desaprovação.
Neste sentido, o tema em questão aborda a problemática da falta de respiradores a
partir do código doador de sentido do Direito: a Justiça. A pesquisa que se propõe pertence à
vertente metodológica jurídico-sociológica. No tocante ao tipo de investigação, foi escolhido,
na classificação de Witker (1985) e Gustin (2010), o tipo jurídico-interpretativo. O raciocínio
desenvolvido na pesquisa será predominantemente dialético.
103
2. O FUNCIONAMENTO DOS AMPAROS TECNOLÓGICOS PARA
COMBATE AO NOVO CORONAVÍRUS
Segundo Matsuoka (2020), Yuval Noah Harari – escritor do best-seller “Homo Deus
– Uma breve história do Amanhã” – foi um dos primeiros autores que manifestou sua
percepção acerca do atual contexto pandêmico. Em uma de suas assertivas, presente no artigo
“Na batalha contra o coronavírus faltam líderes à humanidade”, Harari pontua sobre o
problema da falta de confiança das pessoas, principalmente no que diz respeito à Ciência, alvo
de críticas e descrédito. Essa dogmática baseada no senso comum é uma das causas que
colaboram para o aumento vertiginoso do Covid-19.
Conforme afirma o autor:
Hoje, a humanidade enfrenta uma crise aguda não apenas por causa do coronavírus,
mas também pela falta de confiança entre os seres humanos. Para derrotar uma
epidemia, as pessoas precisam confiar nos especialistas, os cidadãos precisam confiar nos poderes públicos e os países precisam confiar uns nos outros. Nos
últimos anos, políticos irresponsáveis solaparam deliberadamente a confiança na
ciência, nas instituições e na cooperação internacional. (HARARI, 2020).
Caracterizado por causar infecções respiratórias, em 26 de fevereiro de 2020, foi
confirmada a primeira ocorrência do agente patogênico no Brasil: tratava-se de um homem,
61 anos, que esteve na Itália (AMORIM; MARINS, 2020). Assim, de acordo com a
reportagem feita pelo Correio do Povo (2020), em função da alta taxa de propagação e
contaminação do Covid-19, além do pouco estoque de equipamentos e leitos, o Ministério da
Saúde destacou a preocupação com a sobrecarga dos Sistemas de Saúde brasileiro,
especialmente no que tange os respiradores artificiais: “chave na luta contra a covid-19”
(WALLACE, 2020).
Mas nem mesmo os sistemas de saúde dos países mais ricos do mundo estão
equipados com a quantidade de respiradores que a pandemia da covid-19 pode exigir [...] E, na corrida desesperada para suprir o déficit de respiradores, governos de todo
o mundo tem exigido que indústrias de todos os tipos — de montadoras a fabricantes
de aspiradores de pó — coloquem toda a sua capacidade de produção para fabricar o
produto. (WALLACE, 2020).
Nesse trecho, Arturo Wallace, da BBC News Mundo, salientou sobre a carência
dessa tecnologia e como ela tem sido requisitada e indispensável em todo cenário hospitalar
mundial, uma vez que alguns pacientes sofrem com a chamada Síndrome do Desconforto
Respiratório Agudo (SDRA) – uma inflamação excessiva nos pulmões, que são responsáveis
104
pela oxigenação do sangue e eliminação do gás carbônico (CO2).
Fábio de Oliveira (2020), da Agência Einstein, explica como funcionam os
respiradores artificiais: os médicos recorrem ao auxílio da ventilação mecânica para ajudar no
fornecimento de oxigênio (O2), baseando-se em critérios bioquímicos objetivos. Desse modo,
os especialistas analisam o nível de saturação sanguínea, isto é, a quantidade de oxigênio
transportada na circulação, e dependendo da situação clínica do paciente, é preciso o uso de
tais equipamentos. Oliveira ainda complementa a respeito do oxímetro – tecnologia
empregada para captar a tonalidade das hemoglobinas, proteínas localizadas dentro das
hemácias e que transportam o oxigênio:
É que as hemoglobinas [...] ficam com uma tonalidade de vermelho mais brilhante
quanto estão carregadas de oxigênio. Um sensor com luz infravermelha no oxímetro
capta essa mudança de cor. O ideal é que a saturação seja maior do que 94%.
(OLIVEIRA, 2020).
Ademais, ressalta-se a existência de dois tipos de respiradores. O primeiro é
considerado não invasivo, amparando-se apenas no fornecimento de O2, por meio dos
cateteres ou máscaras, ambos conectados a máquinas. “Esse equipamento gera um fluxo de ar
com pressão positiva a cada inspiração” (FERRAZ, 2020 apud OLIVEIRA, 2020), ou seja,
ele impulsiona o ar oxigenado para o interior dos pulmões na inspiração e elimina o CO2 na
expiração.
Contudo, nem todos os pacientes respondem a essa estratégia, necessitando de uma
ventilação mecânica invasiva. Esta se apoia no uso de um tubo, colocado dentro da boca e
alcança a traqueia. O intuito é procurar descansar o pulmão, para que ele restabeleça suas
funções primordiais:
A pessoa fica sedada em un nível suficiente para se sentir minimamente confortável
[...]. Ao ventilador cabe a tarefa de auxilar o pulmão a retirar o gás carbônico da
circulação e oxigenar o sangue. Há ainda uma opção pra lá de moderna, porém
menos acessível. Se há um agravemento do caso, pode-se optar pelo sistema de
oxigenação extracorpóreo, o ECMO. Nele, uma bomba retira o sangue venoso e o
oxigena através de uma membrana, além de eliminar o gás carbônico, como se fosse
um pulmão artificial. (OLIVEIRA, 2020).
Embora sejam relevantes para os infectados pelo Covid-19, Rollim Ferraz, médico e
gerente do Departamento de Pacientes Graves do Hospital Israelita Albert Einstein, afirma
que o ECMO é um amparo tecnológico muito caro e complexo. Logo, seu emprego é restrito,
de maneira que seja necessária uma triagem cautelosa dos pacientes que dele se beneficiarão,
adentrando no campo da bioética e questões judíricas.
105
3. DIREITO, MORAL SOCIAL E A BIOÉTICA POR TRÁS DA ESCOLHA DE
SOFIA DIANTE DA PANDEMIA DO CORONAVÍRUS.
De acordo com Cury (2020), é provável que o primeiro caso do novo coronavírus
tenha ocorrido antes mesmo da data estabelecida como início da pandemia, 31 de dezembro
de 2019. Contudo, uma vez que não se havia muitos registros, as autoridades de saúde de
Wuhan – cidade chinesa epicentro da doença – não associaram os casos manifestados com a
possibilidade de um novo vírus ter surgido. Uma nova reportagem, ainda não conclusiva,
indica que, em 17 de novembro de 2019, nove casos foram registrados e parecem estar ligados
ao novo coronavírus. (MA, 2020 apud CURY, 2020).
Desse modo, segundo OPAS Brasil (2020), em 30 de janeiro de 2020, a Organização
Mundial de Saúde (OMS) declarou o surto da doença como Emergência de Saúde Pública
Internacional, o que levou à adoção de medidas nas esferas estadual, municipal e federal.
Entre as providências, a do isolamento social; que restringiu a circulação de pessoas e limitou
a manutenção da rotina diária. O objetivo era diminuir a transmissão e assegurar que os
hospitais não fiquem superlotados para, assim, prestar o atendimento médico/hospitalar aos
infectados que necessitam de internação, sobretudo, com o uso dos respiradores.
Porém, apesar das reiterações dos órgãos de saúde e profissionais da área com
relação ao respeito à quarentena, muitos indivíduos estão relutantes, tanto pela
indispensabilidade de trabalhar quanto pela vontade de sair e organizar encontros. Ademais,
considerando a autonomia dos Entes Federados na tomada de decisões, dentro dos limites
impostos pela Constituição Federal brasileira, nota-se uma multiplicidade de decisões e
orientações isoladas, as quais dividem as opiniões: enquanto o governo federal propõe a
flexibilização do isolamento, com base na chance de um colapso econômico, algumas
instâncias estaduais e municipais mantêm o distanciamento social e o fechamento dos
comércios e setores considerados não-essenciais.
Sendo assim, ressalta-se o dilema ético e moral que respalda a questão: qual direito
deve sobressair durante a crise, se o direito à vida, o de ir e vir ou o direito à livre iniciativa da
ordem econômica; todos garantidos, respectivamente, nos Artigos 5°, inciso XV do mesmo
Artigo, e 170 da Constituição:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...].
106
XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer
pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da
justiça social. (BRASIL, 1988).
À vista disso, cidades nas quais a quarentena não foi tão restritiva – como São Paulo
e Manaus – em razão dos motivos supracitados e nos direitos legais, o Sistema Único de
Saúde (SUS) já é incapaz de atender e fornecer respiradores a todos, o que introduz a
dubiedade da bioética.
Segundo afirma Felipe Braga Netto, membro do MPF:
Transportando isso para o mundo jurídico e para o campo da bioética, a “escolha de
Sofia” quer dizer ‘escolhas difíceis’ e na prática isso significa fazer “escolhas
trágicas” de acordo com a chance de sucesso de tratamento de cada paciente,
considerando a idade do paciente, doenças preexistentes, a gravidade do seu estado e
a possibilidade de reverter esse quadro. (NETTO, 2020)
Nesse trecho, Netto pontua a problemática: precisa-se de leitos com respiradores
para atender às vítimas do Covid-19, mas os hospitais não mais dispõem suficientemente de
ambos. Destarte, indaga-se qual paciente o profissional deve priorizar para o tratamento e,
neste momento excepcional, a Sociedade Espanhola de Terapia Intensiva (SEMICYUC)
frisou específicas recomendações: foca-se naqueles que são mais prováveis de viver. Embora
este seja o protocolo, não se nega a existência de deliberações tangentes a isso, uma vez que a
saúde é direito de qualquer cidadão; inclusive dos idosos e portadores de doenças crônicas,
que tendem a não responder bem ao tratamento (NETTO, 2020). Portanto, foi em função
disso, que a expressão “Escolha de Sofia” voltou a ser utilizada com mais frequência; tanto no
cenário bioético, quanto no corpo social.
Desta maneira, a justificativa dada pela SEMICYUC com relação a essas instruções,
se alicerçou na ideia dos princípios primordiais para a gestão de situações como essa, sendo
eles: a justiça e o dever de cuidar e de administrar os recursos, fundamentando-se na
transparência, consistência, proporcionalidade e responsabilidade; no intuito de selecionar os
pacientes que terão acesso aos cuidados médico/hospitalar e potencializar a proteção do bem
comum, sob uma ótica baseada no princípio da justiça distributiva, e não na concepção de
quem chega primeiro, é quem receberá a assistência. (NETTO, 2020).
107
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do exposto, verifica-se a gravidade da atual situação vivida no Brasil. As
secretarias estaduais de saúde confirmam que, no mês de junho de 2020, o país ja alcançou
700.000 casos confirmados de Covid-19 e quase 40.000 mil mortes. Posto isto, ressalta-se que
essa conjuntura foi decorrente, principalmente, das resistências às reiterações da Organização
Mundial de Saúde (OMS), tanto no que se refere aos comportamentos sociais, quanto às
posições das autoridades políticas. Assim, o colapso dos Sistemas de Saúde foi a
consequência que abarcou a população brasileira.
No que tange às deliberações de qual paciente deve ser priorizado e qual protocolo
deve-se seguir, não há recomendações do Ministério da Saúde quanto a isso. No entanto, a
Sociedade Espanhola de Terapia Intensiva (SEMICYUC) estabeleceu que procurassem
antepor aqueles que possuíssem mais chances de viver. Em função disso, os hospitais e
especialistas adotam seus próprios regulamentos, fazendo jus à “Escolha de Sofia”.
Com relação aos amparos tecnológicos para o combate ao novo coronavírus, conclui-
se que a necessidade de tê-los e adquiri-los é mundial, e não somente do Brasil. Portanto,
observa-se que a inexistência de um Estado dirigente perante as grandes crises pode dificultar
no enfrentamento da pandemia; principalmente quando este prioriza apenas os próprios
nacionais e cidadãos. Ademais, destacam-se os dilemas morais que permeiam a vida social e
como a falta de solidariedade global influencia diretamente no rumo pandêmico.
5. REFERÊNCIAS
AMORIM, F.; MARINS, C. Governo confirma 1º caso de coronavírus no país e coloca 20
sob suspeita. Notícias UOL, São Paulo, fev. 2020. Saúde. Disponível em:
https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2020/02/26/ministerio-da-saude-
coronavirus-brasil-primeiro-caso-contraprova.htm. Acesso em: 6 jun. 2020.
GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensando a pesquisa
jurídica: teoria e prática. 3ª. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010.
HARARI, Yuval Noah. Na batalha contra o coronavírus, faltam líderes a humanidades. São
Paulo: Schwarcz S.A, 2020.
JUNIOR, Joaquim; MOUSINHO, Paulo. O coronavírus, o Direito Penal e a “Escolha de
Sofia”: medicina de catástrofe. Meu site jurídico, 2020. Disponível em:
https://meusitejuridico.editorajuspodivm.com.br/2020/03/25/o-coronavirus-o-direito-penal-e-
escolha-de-sofia-medicina-de-catastrofe/. Acesso em: 7 de jun de 2020.
108
MATSUOKA, N. A crise do Coronavírus, por Yuval Harari. HSM, mar. 2020. Blog.
Disponível em: https://www.hsm.com.br/o-que-yuval-noah-harari-pensa-sobre-o-
coronavirus/. Acesso em: 6 jun. 2020.
MINISTÉRIO da Saúde revela preocupação com reposição de EPIs no combate ao
coronavírus. Pasta alertou para a importância da manutenção do isolamento social para evitar
sobrecarga do sistema no país. Correio do Povo, Porto Alegre, abr. 2020. Geral. Disponível em:
https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/geral/minist%C3%A9rio-da-
sa%C3%BAde-revela-preocupa%C3%A7%C3%A3o-com-reposi%C3%A7%C3%A3o-de-
epis-no-combate-ao-coronav%C3%ADrus-1.409749. Acesso em: 7 jun. 2020.
OLIVEIRA, F. Coronavírus: quando o respirador mecânico é usado no tratamento. Agência
Einstein, maio 2020. Veja Saúde. Disponível em:
https://saude.abril.com.br/medicina/coronavirus-quando-o-respirador-mecanico-e-usado-no-
tratamento/. Acesso em: 3 jun. 2020.
WALLACE, A. Coronavírus: como funcionam os respiradores e porque eles são chaves na
luta contra o covid-19. BBC, Brasil, mar. 2020. Internacional. Disponível em:
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52101349. Acesso em: 6 jun. 2020.
WITKER, Jorge. Como elaborar uma tesis en derecho: pautas metodológicas y técnicas para
el estudiante o investigador del derecho. Madrid: Civitas, 1985.
109