Fotografia Paraibana Revista (2013)

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  • F O T O G R A F I A

    P A R A I B A N A

    R E V I S T A

    ALBERTO FERREIRA - ANTONIO AUGUSTO FONTES - ANTONIO DAVID - AUGUSTO PESSOA - DAYSE EUZBIO - FRANCISCO

    FRANA - GUSTAVO MAIA - GUSTAVO MOURA - HUDSON AZEVEDO - JOO LOBO - MACHADO BITENCOURT - MARCUS

    ANTONIUS - NUMO RAMA - REGINALDO MARINHO - SEVERINO SILVA - WALTER CARVALHO - WNIO PINHEIRO

    2013 | ANO 01 | N 01

    ISSN 2317-4579

  • F O T O G R A F I A

    P A R A I B A N A

    R E V I S T A

    ISSN 2317-4579

  • A base na qual foi concebido esse projeto a tradio e a fora que a fotogra-fia documental e autoral paraibana apre-senta ao longo de sua histria. Inspirada nos elementos da cultura, do cotidiano, do comportamento da sociedade e nas pecu-liaridades da paisagem natural, sua riqueza reside exatamente no que se capta dos gestos de um povo; no que se transcreve da alma de um lugar. Saliente-se que, em funo do imenso leque de expresses, a curadoria considerou a seguinte delimitao meto-dolgica: reunir a produo de seguidas geraes de fotgrafos paraibanos (nas-cidos ou radicados no Estado), a partir da segunda metade do sculo passado, foca-da no teor ensastico e documental. O leque de ensaios aqui reunidos s no maior devido s naturais limitaes de espao, e mesmo por questes de acessibilidade aos autores. Essa a razo da ausncia de algumas obras importantes inclusive aqui citadas cuja referncia no poderamos deixar de fazer. De forma mais abrangente, a contribuio dessas expresses descritanum artigo do pesquisador e professor da UFPB, Bertrand Lira, que faz um resumo histrico da fotografia paraibana desde o final do sculo XIX. Fotografia Paraibana Revista traz luz a obra do paraibano Alberto Ferreira (1932 2007). Desconhecido em sua terranatal (Alagoa Grande) Alberto simples-mente um dos fotgrafos paraibanos demaior projeo mundial, tendo conquistadovrios prmios importantes durante os 30anos que trabalhou no Jornal do Brasil(25 anos como Editor de Fotografia). Con-siderado por especialistas um dos melho-res do mundo em coberturas esportivas e um dos precursores do jornalismo fotogr-fico no pas, Alberto produziu registros ni-cos das manifestaes ideolgicas e cultu-

    rais da sociedade brasileira, notadamente entre as dcadas de 50 e 60. Na sequncia, contemporneo de Alberto Ferreira, o guarabirense HudsonAzevedo foi considerado o maior retra-tista do litoral paraibano e um dos mais importantes documentaristas da paisagem urbana, destacando-se em sua obra, lricas imagens de uma Joo Pessoa nos anos 50. Depois, temos Machado Bitencourt, que se faz documentarista atuando no jornalismo, e se torna um dos mais eclticos fotgrafos da Paraba a partir dos anos 60. Antnio Augusto Fontes vem em seguida, aprimorando sua verve fotogrfica em incurso pelos EUA e, posteriormente, realizando ensaios e sries para algumas das mais importantes publicaes brasileirase internacionais, como Veja, Exame, Isto ,Le Monde, entre outros. Nessa poca, Reginaldo Marinho figura com sensveis ensaios de artistas, como Z Ramalho, e um histrico registro da redemocratizao da Espanha, em 1977. Ao mesmo tempo, noutra frente, Walter Carvalho inicia-se na fotografia, como assistente nas filmagens de seu irmo (Vladimir), tornando-se mais tarde o mais cultuado fotgrafo do cinema brasileiro. Da mesma escola de Machado,surge Antnio David, com um olhar atentoaos fatos e ao cotidiano, sem perder de vista a sua perspectiva autoral, atuando como reprter fotogrfico nos principais jornais paraibanos. Entre as dcadas de 70 e 80 iden-tificamos talvez o maior fluxo de produo fotogrfica do gnero documental no Estado. Nesse contexto, alm da continui-dade da gerao anterior, apontamos o surgimento de nomes como Roberto Coura, Roberto Guedes, Gustavo Moura, Clara Lenira, Germana Bronzeado e Joo Lobo, entre as mais expressivas revelaes da poca.

    A L u z d a F o t o g r a f i a P a r a i b a n a

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  • Roberto Coura notabilizou-se pelos ensaios antropolgicos, com destaque para A Feira de Campina Grande (1978), acla-mado nacionalmente, conquistando o cobi-ado Prmio Marc Ferrez de Fotografia. Roberto Guedes, entre outras iniciativas, realiza um ensaio pioneiro sobre os grafitei-ros na dcada de 80, em So Paulo. Gustavo Moura desenvolve sua produo a partir dos anos 80 com uma obra inspirada na lumi-nosidade e no imaginrio nordestino. Sua trajetria ganha projeo nacional, notada-mente atravs de publicaes autorais como Imaginrio (2000) e, sobretudo, Do Reino Encantado (2006), baseada no universo armorial de Ariano Suassuna. E mais: o importante trabalho desen-volvido por Clara Lenira, realizando nas palavras de Bertrand Lira um inventriode movimentos, expresses e gestos de atores, bailarinos, cantores e msicos que atuaram nos palcos da Fundao Espao Cultural da Paraba, ao longo de mais de duas dcadas. Destaque-se tambm o relevanteacervo realizado por Germana Bronzeadoque, durante 15 anos, documentou a res-taurao do patrimnio histrico de Joo Pessoa, atravs do projeto Oficina Escola,vinculado ao Instituto do Patrimnio Histri-co e Artstico Nacional. E a trajetria experi-mentalista de Joo Lobo, sobretudo na utili-zao de recursos estticos que transcen-dem os padres e suportes utilizados, numa versatilidade que se expande com a utiliza-o dos mecanismos digitais. A ltima dcada do sculo XX marcada pelo surgimento de coletivos foto-grficos, que congregam a maior parte dos chamados fotgrafos autorais paraibanos. O grupo pioneiro chama-se Traficantes de Imagens, que tem como propsito bsico a promoo de iniciativas voltadas para a re-flexo sobre a fotografia. Um dos integrantes do Traficantes de Imagens Marcus Veloso (1950 2000), cujas imagens do serto paraibano, seriam expostas na Biennale Internacional dArt d Groupe, um importante evento arts-tico da Europa, realizado em 1995, na Frana. Juntamente com Ricardo Peixoto e

    Mano de Carvalho, em 1994 Veloso cria a Agncia Ensaio, responsvel por impor-tantes projetos relacionados fotografia paraibana contempornea. Mais frente, a retomada de inicia-tivas focadas na ao coletiva de formao e difuso se d atravs do projeto Setembro Fotogrfico (2011 e 2012), promovido pela Fundao Cultural de Joo Pessoa, com a coordenao de Gustavo Moura, um dos mais atuantes membros do Traficantes de Imagens. Dos anos 90 pra c, despontam tambm na cena fotogrfica paraibana trajetrias em grande parte forjadas no ambiente jornalstico. o caso de Francisco Frana, Gustavo Maia, Marcus Antnius e Augusto Pessoa. Desse gnero, destaca-mos ainda a atuao impar de Severino Silva, cuja trajetria profissional se alicera no Rio de Janeiro, transitando de maneirafantstica entre os conflitos urbanos e o afeto da cidade maravilhosa. Mas, alm do fotojornalismo, h excees relevantes, a exemplo de Numo Rama, paraibano radi-cado no Rio Grande do Norte que faturou o conceituado Prmio Porto Seguro de Fotografia em 2004 na categoria Brasil. E mais frente, a novssima gerao, representada aqui por Deyse Euzbio e Wnio Pinheiro. A despeito da riqueza dos acervos criados ao longo das dcadas por esses profissionais, a carncia de mecanismos de difuso dessa produo resulta no descon-hecimento acerca de seu valor e, conse-quentemente, de nossa prpria realidade. A criao de um produto, que funcione como veculo de informao e conhecimento sobre o patrimnio fotogr-fico documental paraibano, o propsito essencial desta Revista. Essa a nossa contribuio num processo que requer a unio de esforos honestos e inestimveis para a revalori-zao do que temos de mais precioso: o patrimnio cultural que expresse a criativi-dade e a alma de nosso povo.

    Elinaldo RodriguesJornalista e Documentarista

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  • A emblemtica foto da bicicleta de Pel, feita pelo paraibano Alberto Ferreira em 1965.

  • Coordenao editorial / Produo:Gustavo Moura

    Edio fotogrfica:Gustavo Moura e Wnio Pinheiro

    Coordenao literria / Assessoria de imprensa:Elinaldo Rodrigues

    Projeto grfico:Gustavo Moura e Wnio Pinheiro

    Foto da capa:Gustavo Moura

    Textos:Bertrand Lira

    Elinaldo Rodrigues

    Reviso:Elinaldo Rodrigues

    Editora:Eliro Produes

    Elinaldo Jos Rodrigues MERua Joo Alfredo Cajueiro, 133, Portal do Sol - Cep: 58.046-660

    Joo Pessoa/PB

    Impresso:Grfica Santa Marta

    Fotografias:Alberto Ferreira

    Antonio Augusto FontesAntonio David

    Augusto PessoaDayse Euzbio

    Francisco FranaGustavo Maia

    Gustavo MouraHudson Azevedo

    Joo LoboMachado Bitencourt

    Marcus AntoniusNumo Rama

    Reginaldo MarinhoRoberto Guedes

    Severino SilvaWalter CarvalhoWnio Pinheiro

    Colaboradores:Brulio Tavares, Clarissa Garcia,

    Gonzaga Rodrigues, Joo Roberto Ripper,Rita Luz, Rosely Nakagawa, Simoneta Perschetti.

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    Gustavo Moura.

  • E ento houve um diaem que por acaso

    no mesmo momentose fez uma pausase fez um silncio.Nenhuma pessoafalou nem buliu.

    Nenhum passarinhoa asa bateu.

    Criou-se no espaoum cristal to fininho...

    e tudo mudoue tudo caloue tudo parou

    e tudo foi seu.Nenhuma tremura

    nas nuvens, na relva,nos grilos, nos sapos,nos carros, nos bois.

    Foi s um minutosuspenso do mundo,

    e nele o silnciose pde escutar...

    Depois, de repente,o tempo se abriu,

    as fontes correram,o vento passou;a planta cresceu,

    fumaa subiu,a fruta caiu,

    a tarde voltou.E cada um continuou

    na sua vida,s que agora se lembrando.

  • ALBERTOFERREIRA

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    Inaugurao de Braslia, a festa, 1960.

  • Considerado por especialistas um dos me-lhores do mundo em coberturas esportivas, o paraibanoAlberto Ferreira Lima venceu vrios prmios impor-tantes durante os 30 anos que trabalhou no Jornal do Brasil (25 anos como Editor do departamento de fotografia). Uma de suas fotos mais famosas, que lhe valeu o prmio Esso de fotografia em 1963, registra o exato momento em que Pel, na partida contra a Tcheco-Eslovquia, sente a contuso que o afastoudefinitivamente da Copa do Mundo do Chile, em 1962. O rei se curva ante a dor que o Brasil todo sentiu,

    ttulo da foto no JB, era o reconhecimento ao que fazia de Alberto Ferreira um profissional de alto nvel: um dos precursores do jornalismo fotogrfico no Brasil e um dos primeiros a dar fundamento ao velho chavo das redaes de que uma foto vale mais que mil palavras. Alberto Ferreira tinha a intuio que faz com que os grandes fotgrafos prevejam os fatos fraes de segundos antes que eles aconteam. Foi assim que, em uma poca de equipamentos fotogrficos inteiramente mecnicos, registrou com uma Leica

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    Construo de Brasilia, os candangos, anos 50, sc. XX.

  • M3, em fotograma isolado, o vo de Pel em sua famosa bicicleta, num jogo contra a Blgica, no Maracan, em 1965. sua foto mais famosa: deu-lhe naquele ano o prmio SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa), e depois se tornou um smbolo: esteve exposta no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio, no Maracan, no Centro Cultural da Justia Federal e no Centro Cultural Banco do Brasil, faz parte do Acervo do Museu Europeu de Fotografia como um dos 28 Instantneos de Felicidade e tambm compeas exposies LExtreme em Paris e Extremos no Instituto Moreira Sales no Rio e em So Paulo. Foi

    escolhida por Pel para representar a sntese de sua carreira. Esteve diretamente ligada a trs Copas do Mundo; tornou-se marca da do Mxico, em 1970, e o MasterCard a estampou em seus cartes, por ocasio da Copa do Japo e Corea em 2002, como um dos momentos mximos da arte do futebol. Na Copa de 2006, a foto ficou exposta em Berlim, e a Coca-Cola fez imagens ampliadas (outdoors) que cobriam fachadas de prdios, abrigos de nibus e relgios de rua, durante 24 meses, em Tquio, Paris, Londres e Nova Iorque, alm de ilustrar com ela anncios em jornais e revistas do mundo inteiro. Alberto Ferreira

    Meninos de um orfanato no Rio, 1958.

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  • As meninas de Velasquez, Museu do Prado, Madrid, 1960.

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  • participou de diversas coberturas no exterior ligadasao esporte brasileiro, no s ao futebol. Cobriu a Copa da Inglaterra, em 1966, acompanhou a Seleo Brasileira na excurso de 1968 Europa e trabalhou na Copa do Mxico em 1970. Dois anos mais tarde, passou longa temporada cobrindo o desempenho vitorioso de Emerson Fittipaldi na Frmula-1 na Europa, seguindo depois para as Olimpadas de Munique. Enviado tambm s Olim-padas de Moscou, em 1980, foi o nico fotgrafo que conseguiu fazer uma seqncia de fotos da nica queda durante uma competio da campeonssima ginasta olmpica romena Ndia Comanecci. Ganhou

    o prmio Bola de Ouro pela cobertura fotogrfica feita pelo Jornal do Brasil. Em 1982, Alberto Ferreirapartiu para o campeonato mundial de futebol na Espanha. Considerava esta fase incomparvel em termos de trabalho duro, mas compensadora porque a cobertura do Jornal do Brasil foi considerada a melhor entre todos os jornais e em 1986 esteve novamente no Mxico para a Copa do Mundo. Alberto Ferreira distinguiu-se em eventos esportivos, mas foi notvel tambm em outras reas, como a cobertura do concurso Miss Universo em Miami, em 1963, e o funeral de Bob Kennedy, em Washington, em 1968, que considerava um dos momentos mais emocionantes de sua carreira. Esteve presente

    nas principais coberturas fotogrficas durante a poca em que trabalhou e assim, atravs de suas lentes e seu olhar nico, documentou importantes momentos da histria do Brasil e do mundo. Construiu o maior e mais completo acervo autoral sobre a construo e a inaugurao de Braslia. De 1958 at sua inaugurao em 21 de abril de 1960, Alberto Ferreira esteve por diversas vezes na cidade acompanhando a Condessa Pereira Carneiro, dona no Jornal do Brasil na poca. As imagens das visitas de cortesia da Condessa ao ento Presidente Juscelino Kubitschek durante as obras e a inaugurao, foram publicadas

    pelo JB na poca. O restante do material, ou seja, o registro da colocao das pedras fundamen-tais, e, sobretudo a documentao da vida e trabalho dos candangos comearam a ser divulgados em 2003, no ano do Brasil na Frana, na mostra Braslia, uma Metfora da Liberdade, juntamente com as imagens contemporneas de Jair Lanes. Em 2005, Alberto Ferreira exps em Paris, fazendo parte da coleo da MEP (Maisom Eu-ropene de la Photographie), que revela o instantneo como parte fundamental da nossa memria pessoal e coletiva e foi considerado um dos 28 maiores fotgrafos do sculo junto com Sebastio Salgado (os dois ni-cos brasileiros) alm de Henri Cartier Bresson, Robert Doisneau, Edouard Boubat, Pierre Ver-ger e outros. Em 2010, par-

    ticipa da exposio Autour de LExtreme no MEP e em 2011 a exposio veio ao Brasil com o nome Extremos atravs da parceria entre o Instituto Moreira Sales e a Maison. Alberto Ferreira morreu em 11 de maro de 2007 aos 75 anos de idade.

    Rita LuzJornalista e Escritora

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    Construo de Brasilia, anos 50, sc. XX.

  • Barra da Tijuca, Pedra da Gvea, 1968.

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  • ANTONIOAUGUSTO

    FONTES

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  • A chegada do vero produz em mim um irresistvel impulso de volta s origens. Formosa, uma pequenina praia no litoral paraibano o lugar mais prximo do Paraso que conheo. para l que retorno em busca do aconchego da famlia e da grande me Natureza. L dei meus primeiros passos na fotografia e fui apresentado quela que seria me dos meus filhos e musa de uma vida inteira. em Formosa que volto a encontrar o puer aeternum, a criana interior que rejuvenesce o esprito apesar da passagem dos anos. Este ensaio uma pequena homenagem.

    Antonio Augusto Fontes

    Antonio Augusto Sales Fontes (Joo Pessoa,PB, 1948). Estuda engenharia na Universidade Federal da Paraba, Joo Pessoa, mas no conclui o curso. De 1970 a 1973, reside nos Estados Unidos, onde estuda fotografia, no New York Institute of Photography, 1970; e antropologia e histria da arte, no Manchester College, 1971. Fixa-se no Rio de Janeiro em 1974, e inicia a carreira como fot-grafo profissional. Na dcada seguinte, trabalha para diversas revistas informativas, entre elas Veja, Exame e Isto, antes de se decidir pela atuao independente

    no campo da fotografia documental, nos anos 90. Entre 1975 e 1980, no Rio de Janeiro, consultor tcnico do Arquivo Fotogrfico do Centro de Pesquisa e Documentao da Fundao Getlio Vargas e do Arquivo Nacional. Dedica-se tambm fotografia de expresso pessoal. Recebe o Prmio Eugne Atget, promovido pela Air France, Prefeitura de Paris e Paris Audiovisuel, em 1984; e, em 1991, o Prmio Marc Ferrez de Fotografia, para desenvolvimento do ensaio fotogrfico Rio de Janeiro: um olhar cego sobre a cidade, e a Bolsa Vitae de Arte.

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  • Formado pela Universidade Fede-ral da Paraba em l988. reprter fotogr-fico desde l975. Trabalhou no jornal O Norte (l975-l976), jornal O Momento (l985-l986) e no jornal A Unio (l977-l994). Profes-sor substituto de Fotojornalismo na Uni-versidade Federal da Paraba (l99l-l992).Membro do Sindicato do Jornalistas Profissionais do Estado da Paraba (l975-2006). Membro da Associao Paraibana de Imprensa (l975-2007). Coordenador deFotografia da Secretaria de Comunicao Institucional do Governo do Estado da Paraba (l995-2006). Gerente Executivo de Fotografia da Secretaria de Estado da Comu-nicao Institucional (2009-2010). Ganhou o Prmio Lambe-Lambe de fotografia (2002) pela Agncia ensaio no Ncleo de Arte Conte-pornea em Joo Pessoa-PB. Sua Obra Inte-gra o Acervo do Museu da Imaginao (2006). Lanou o livro Antonio David 30 anos de Fotojornalismo (2007). Vencedor do concurso nacional Leica-Fotografe Melhor (2011), na categoria cor (foto ao lado).

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  • ANTONIODAVID

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  • A mquina de David, nocomeo do seu aprendizado alipelos anos 1970 foi orientada para fixar, o mais objetivamente possvel, a realidade imediata, flagrante, recomendada pelo jornal. Assim se fez o reprter fotogrfico, portador da curiosi-dade popular e do interesse das entidades e instituies para as quais trabalhava. Mas essa realidade, com o tempo, foi depurando os ngulos para as coisas em que a luz do sol e dos flashes j no lhe diziam muito. As lentes foram se transluzindo de realidades que s a conscincia ilumina. Imagens trazidas do bero, de um sol que mais castigava que ajudava a lanar, brotar, nascer. E a essa realidade inaugural a sensibilidade social do esteta foi acrescentando a experincia do dia-a-dia, apurando o olhar menos para o encantamento do que para a denncia. Sua mquina passou a ler por outro ngulo, a chamar com

    tintas de tom negro e de foco agressivo, o que aos neutros e alienados passa despercebido. Foi o resultado do seu lbum de fotojornalismo editado sob o patrocnio da Lei de Incentivo Cultura, edio de 2006. Ali a Tragdia (assim com maiscula) quando no social da prpria condio humana, envolvendo miserveis e heris nas mesmas sombras, como quem sai do cosmo de um Augusto dos Anjos ou da triste riqueza do mundo de Z Lins. Agora estamos todos olhando para o cu. Os olhos e as mos compondo o novo discurso fotogrfico de Antnio David. Rostos lindos, rostos tristes, velhos e novos, lisos e engelhados,que no tm servido para nada mais confiante que aeternidade da f. Uns falandoverdadeiramente com o seu Deus; outros ou outras de mos juntas, postas, fechadas no peito,guardando sua nica rique-za; uns tantos vendo de olhos cerrados, todos contritos e iguais, a maioria rezando com as suas palavras o que um poeta distante das nossas ma-zelas e do nosso tempo rezava com seus versos de tom bblico: Deus quer, o homem sonha, a obra nasce : Fernando Pessoa (1888-1935) em Mensagem.

    Gonzaga RodriguesJornalista

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  • AUGUSTOPESSOA

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  • Jornalista e fotgrafo, natural de Campina Grande, Augusto Pessoa fotografa profissionalmente desde a dcada de 1990, tendo integrado as equipes de fotojornalistas de diversos jornais nordestinos. Pessoa vencedor de alguns prmios nacionais e intermacionais, entre eles o Prmio Abril de Jornalismo 2008, o Prmio Prsio Galembeck e o Prix Web de 2010. autor das publicaes: Nordeste Desvelado, em parceria com a banda paraibana Cabrura, a srie Capital Iluminada e o catlogo INTI, Uma Travessia, parte integrante de um trabalho de documentao na Cordilheira dos Andes inicia-do em 2000. Atualmente trabalha como reprter e fotgrafo free-lancer para as Revistas National Geographic Brasil, Vida Simples, Continente e Horizonte Geogrfico, entre outras.

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  • Fotgrafos so capazes deinvadir o intriuer, e capturar a alma das gentes. De criar anima em alguns seres e tambm vida, mesmo breve, em meia-dzia de utenslios. Sustento pela fotografia o mesmo fascnio dos astecas de Montezuma pelos cavalos dos espanhis. Dos primeiros ndios pelos espelhos. No tanto ao /nos deram espelhose vimos um mundo doente/, do Legio Urbana, e mais ao tom dos versos anteriores, onde eles acerta-ram: Que o mais simples fosse vis-to/ Como o mais importante. A fo-tografia em Augusto cavalga nesse estgio. Talvez as pessoas no aguentem mais tanta realidade, como disse Eliot, ou alguma aura haja se perdido, como anunciou Walter Benjamin, por conta do nosso valor ao culto e espetacu-larizao, onde esttica e poltica se misturam. Mas, realidade, aura, esttica e poltica quase nada significam perante a potncia do Tempo e, no enquadramento de Augusto Pessoa tenho certeza no da condensao do momento, mas dessa fluncia quase reencarnatria da imagem no tempo, e a confir-mao pela f na imagem, na capa-cidade de narrar pela imagem. Tem sido cansativo ver artistas contemporneos com tanta obsesso por certa originalidade. V-los acreditar na tcnica to sepa-rada da arte. Perseguir engajamen-tos, identificaes, alterits. E como

    resultado desses eus partidos e estereotipados, s obras fragmen-trias e lugares-comuns. Ai, ai, a contemporaneidade. Pessoa j venceu esse estgio. No persegue nada, creio. Contudo, se pousa o olhar na moa da felicidade de Areia, ou nas som-bras carnais em Amsterd, ou nos lampies de rua da Europa, arte e tcnica (re)produzem justo a busca dos outros: o original; porque ser original somente voltar s origens. O resto palavreado da semitica. Papo sobre Deleuze e Debois. Mas, note porque alguns so danados para confundir , a origem no o passado. Para Augusto, o passado-passou: est morto. E nesse Pronto, passou, quando clica, igual ao Pronto, passou, do farmacutico nos vuco-vucos do algodo no brao do menino-choro, um segundo depois da agulha, Augusto solidrio com suas origens, no sentido prefervel da palavra: slido. Por isso, vai mais leve, joga fora a pose acadmica, pula pra longe do formidvel da etnografia e do ramerro fotojornalstico e, de onde vejo e de onde no vejo , no fcil sabermos onde sua alma vai capturar a nossa amanh. Uma experincia esttica, simples, importante, da qual no sabemos se estamos a uma distn-cia segura da lgrima. Ou do riso. crer pra ver.

    Sidney RochaEscritor

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  • Dayse Euzbio, 27 anos, natural de Joo Pessoa. Formada em Comunicao Social Jorna-lismo pela UFPB, foi co-editora da revista eletrnica de cultura e arte Cult PB, reprter fotogrfica no jornal Correio da Paraba e atualmente atua como gerente de fotografia da Secretaria de Comunicao de Joo Pessoa. Realizou a exposio individual Vernissaids em 2007, em comemorao ao dia Mundial de Combate AIDS. Conquistou o 1 lugar no concurso Paraba Dos Seus Olhos, categoria Amador em 2008. Participou da exposio O Desejo O Mote, na Mostra Puta Arte em 2009, organizada pela Agncia Ensaio em comemorao ao dia internacional das prostitutas

    e, no mesmo ano, da exposio coletiva Coletnea Paraibana, na Estao Cabo Branco - Cincia, Cultu-ra e Artes. Conquistou o 3 Lugar no Prmio AETC de Jornalismo - 2009, fez parte da Exposio Pano-rama da fotografia brasileira produzida na Paraba Novssimos, na Galeria Archidy Picado em 2010 e integrou, como artista convidada, a II Bienal do SESC -PB de Pequenos formatos, 2010. Em 2011 participou da mostra coletiva do Setembro Fotogrfico e teve seu ensaio Por favor bata na porta publicado na 6 edio da revista eletrnica Foto Grafia. Em 2012 fez parte da exposio coletiva Parahyba A Nosso Gosto no Ateli Multicultural Elioenai Gomes.

    DAYSEEUZBIO

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  • Terminal de Integrao, Joo Pessoa, 2010.

    Desfile de 7 de setembro, Joo Pessoa, 2001.

  • Francisco Rodrigues de Frana natural de Patos, PB. Comeou a fotografar em 1987 no foto Alarcon em Patos, registrando eventos sociais. Foi para Joo Pessoa em 1989, quando em maio desse mesmo ano comeou a carreira de fotojornalista no Jornal Correio da Paraba. Em 1994 trabalhou na campanha do governador Antonio Mariz. Em 1995 ingressou no Jornal O Norte, onde assumiu a editoria

    de fotografia em 1997. Em 2005 foi trabalhar no Jor-nal da Paraba onde permanee at hoje. Foi vence-dor do Prmio AETC-JP de Jornalismo (2005, 2006, 2008, 2010, 2012). No ano de 2012 foi finalista do Prmio ESSO de Jornalismo e vencedor do Prmio Jornalistico Vladimir Herzog de Direitos Humanos (com a foto acima).

    FRANCISCOFRANA

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    Moradora de rua encontrada morta em carro de mo, Joo Pessoa, 2012.

  • GUSTAVOMAIA

  • Gustavo consegue perceber situaes nas quais as formas, cores e objetos se encontram em harmonia e sabe estar l no momento exato em que os raios de sol elevam o cenrio ao sublime. O tempo, por um segundo, se detm, e o colecionador de instantes transforma uma experincia pessoal e efmera em uma imagem-matria, uma obra tangvel, abertaao compartilhamento com todos. E assim acontece, atravs da fotografia, a mgica transcendncia do tempo e do espao. Duas fotografias exemplares: O olhar sobre a intimidade de um quarto que parece estar no meio de um sonho e onde, entretanto, a matria, em silncio, aflora. um instante de acordar iluminado. E uma cozinha/sala em Santa Catarina, onde encon-tramos vestgios do quarto de Van Gogh. A cadeira, igual, est no mesmo lugar, mas banhada de azul, assim como as paredes. A janela est no mesmo lugar, mas, aqui, aberta para o mundo exterior, permitindo um banho de luz no ambiente. As tbuas do piso e do forro nos encaminham na mesma perspectiva. No lugar da cama, fogo, e armrio. O fogo o elemento central da casa; alimenta e aquece, agregando a famlia. O clima das duas fotos, que pertencem mesma casa, nos proporciona uma sensao de aconchego, acentuado pelo azul tranquilizante e pelo rosa amoroso semelhante inteno declarada por Van Gogh, de sensao do perfeito repouso, atravs do amarelo, no seu Quarto em Arles.

    Clarissa GarciaMestre em Antropologia e artista plstica

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  • GUSTAVOMOURA

  • Nascido na capital paraibana, em maro de 1960, Gustavo Moura fotografa desde o inciodos anos 80, transitando entre o documental eo autoral. Em sua trajetria ganhou evidcia aateno ao universo ambiental e cultural doNordeste brasileiro. Da surgiram vrias publicaes, como o livro Imaginrio (Editora Tempo dImagem,2000) e o 1o Caderno da fotografia brasileira (sobre a Guerra de Canudos), publicado pelo Instituto Moreira Salles. Seu envolvimento com esse universo tem-

    tico foi ampliado quando da realizao do projeto Do Reino Encantado, resultando em exposio e livro nos quais aborda o universo da vida e obra do escritor Ariano Suassuna. Participou do projeto O Brasil passa pelo Sesc (2011) e publicou o ensaio Serto Gonzagueano no livro O Rei e o Baio, em comemorao ao centenrio de Luiz Gonzaga. Gustavo Moura tem fotografias na Coleo Pirelli/MASP, Museu da Imagem e do Som - SP, Instituto Moreira Salles e Coleo FNAC/Brasil.

    Perceber a sntese do olhar; quando memria e imaginao se unem para recriar a geografia em paisagem, a sombra em vulto, o ridoem frtil, o branco e preto em cores. Gustavo Moura fantasia a paisagemdo serto, registrando o que est nas entrelinhas, nas bordas, nas sombras,no no dito; indo alm do que v. A sua paisagem considera a ao do homem que transforma o que o rodeia, incluindo a si mesmo.

    Rosely Nakagawa

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  • HUDSONAZEVEDO

  • Nascido em Guarabira, em 1923, HudsonAzevedo chegou a Joo Pessoa em 1937, e logo comeou a trabalhar com fotografia comos dois grandes mestres na Paraba: Gilberto Stuckert e Jos Lyra. Colaborou por dez anos com os Stuckert, at que aceitou o convite do Foto Lyra. Contratado para servios que iam da lim-peza do estdio entrega de fotografias, logo ficou fascinado pela magia que envolve a atividade fotogrfica. Seu aprendizado aconteceu esponta-neamente, por interesse prprio, porque os patres no precisavam de mais um fotgrafo ou labora-torista. Da experincia com Lyra, aps quatro anos, abriu seu prprio atelier na rua Guedes Pereira, onde permaneceu por 32 anos. Em 1948 foi convidado para exercer a funo de fotgrafo oficial do Governodo Estado. Hudson deixa o Foto Lyra para dividir seu tempo entre o Palcio e o seu pequeno ateli fotogrfico. Tinha verdadeira paixo por paisagens, o

    que o fez ser considerado o maior retratista do litoralparaibano e um dos mais importantes documenta-ristas da paiagem urbana, na dcada de 1950, tendo massificado a sua produo por meio de colees de postais. Com imagens das praias paraibanas, organizou, em 1953, sua primeira exposio indivi-dual (Prefeitura Municipal de Joo Pessoa). Com es-sas obras, representou a Paraba na I Exposio do Nordeste Brasileiro (Teatro Municipal, Rio de Janeiro, 1953). Durante os anos 80 coordenou o laboratrio de fotografia da UFPB. Em 1993, participou, ao lado de Marcos Veloso e Gustavo Moura, da mostra Cidades invisveis (Centro Cultural So Francisco). Atualmente, o detentor dos direitos do pequeno acervo que restou de sua vasta produo, o fotgrafo paraibano Gustavo Moura, que, em 2011, publicou parte desse material no livro Cidade em Movimento.

    Avenida Guedes Pereira, anos 60, sc. XX.

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    Praia de Tamba, anos 60, sc. XX.

  • Nascido no interior da Paraba, mais espe-cificamente em Brejo do Cruz, a vida de Joo Lobo mudou quando comeou a se interessar por imagens aos 20 e poucos anos, na dcada de 80. Inquieto e curioso, o trabalho no fotojornalismo a primeira de suas escolhas na rea fotogrfica no o satisfez. Sua vontade era ir alm do fato, da imagem-notcia,da narrativa de um evento. Sua agitao pedia mais: o que ele queria era experimentar, ir alm do registro e mostrar que a fotografia era, sim, capaz de produzir arte.

    Essas experincias o levaram para a Univer-sidade, onde aprofundou conhecimentos tericos e, tambm, a lecionar, para que seu trabalho no fosse to solitrio como se apresentava: A Universidade foi conseqncia do meu aprendizado. O meu estudo de fotografia sempre foi solitrio. Assim como a de um cientista, sua aprendizagem foi a experincia, pura tentativa e erro. Experincia essa que o levou a sair do Brasil e a levar seus trabalho para diversos pases, como Portugal, Argentina, Espanha, Frana, Holanda e Chile.

    JOO LOBO

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  • As imagens de Joo Lobo buscam descons-truir o real e servem como suporte e estmulo ao trabalho sempre inovador que o caracteriza. um experimentalista no sentido mais amplo. Trabalha com a luz, com diferentes filmes, quebrando regras de exposio e processamento, obtendo resultados que quase sempre nos surpreendem e acabam produzindo imagens que nos causam um descondicionamento do olhar. Nada visto da forma que realmente . Isso s possvel de ser feito com sucesso, porque sua base tradicional e acadmica na fotografia bastante consistente. Nada, nele, por acaso. Os riscos so calculados e ele conhece muito de regras e padres a ponto de quebr-los e, novamente, como qualquer cientista, ser capaz de reproduzir a experincia, obtendo os mesmos resultados. Estes quase 30 anos em que vem transitando entre a prtica e a teoria, permitiram-lhe desenvol-ver um olhar crtico e um conhecimento da produo contempornea, especialmente quando o assunto arte, uma rea em que muitos ainda patinam e se eximem de comentar. O sangue paraibano de Joo

    Lobo no lhe permite a iseno. Ele categrico ao afirmar: a fotografia est no pice de seu reconheci-mento como arte. A gama de possibilidades que o digital proporcionou, induziu o fotgrafo a mostrar suas produes mais abertamente e em maior escala. Nisso ele tambm tem razo. E, como bom crtico, no fica apenas num discurso saudosista ou criti-cando novas tecnologias. Ele consegue compreender a transformao de visualidade que o digital trouxe no s para a fotografia, mas para a arte de uma maneira geral: Outro aspecto salutar a maior inte-ratividade entre fotografia e artes visuais. De um modo geral, isso facilita o aprendizado e define uma melhor contextualizao no ambiente artstico..

    Simonetta Persichetti,do livro Joo Lobo

    Coleo SENAC de Fotografia

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  • Nasceu em Piracuruca, Piau, em 3 de setembro de 1942. Adoles-cente, mudou-se com a famlia para Campina Grande, Paraba, onde cursou, durante trs anos, a Faculdade de Direito. Em 1969 teve sua matrcula cancelada, depois de ter seus direitos polticos e civis cassados pela ditadura militar. Em 1968 recebeu uma das mais importantes premiaes da fotografia mundial, a medalha de prata no XX Salo Internacional de Arte Fotogrfica de Bordeux. No incio dos anos 70 j atuava profissionalmente como jornalista. Em 1975 fundou a Cintica Filmes, nica empresa de cinema genuinamente paraibana, na qual realizou centenas de produes, entre filmes, reportagens e documentrios. Machado Bitencourt percorreu os mais diversos recantos do Brasil, atravessou as fronteiras sul-americanas e registrou especialmente as paisagens naturais e humanas do nordeste brasileiro. Seu acervo (com cerca de 180 mil imagens em diversos suportes e formatos) compreende uma vasta diversidade temtica, que transita pela cultura popular, monumentos ambientais e arqueolgicos, cidades, personalidades e etc.

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  • MACHADOBITENCOURT

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  • MARCUSANTONIUS

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  • Nascido em Joo Pessoa, iniciou sua carreira em 1981 como fotgrafo de eventos sociais em Presidente Prudente (So Paulo). Na Paraba, comeou atuando na Sucursal do jornal A Un-io, em Patos, PB, e depois nos jornais Correio da Paraba (Joo Pessoa, 1989) e O Norte (Joo Pessoa). Trabalhou em empresas de publicidade e jornais (Start Promoes, Denver Marketing Polti-co, jornal Correio da Paraba, Joo Pessoa). Premiado em vrios concursos, como o Prmio Ayrton Senna de Fotojornalismo (2001), Paraba dos seus olhos/TV Cabo Branco (2008-2009) e Prmio AETC de Jornalismo (Joo Pessoa, 2007). Participou de exposies de fotografia e do concurso internacional Word Press Photo. Publicou fotos no portal da National Geographic Brasil, jornais Folha de So Paulo, O Globo, e nas revistas Air Press, Nova Escola e Isto.

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  • J foi dito que certas fotos falam por mil palavras. A do ex-senador Jarbas Barbalho de pulsos algemados a caminhoda priso deve valer por toda uma literatura de cincia e desociologia poltica juntas num momento dado de decadncia. A imagem de maior signifi-cao histrica do fim do sculo XIX e comeo do XX, dizendomais que uma fotografia, no es-pocou da mquina fotogrfica,mas do pincel de Aurlio deFigueiredo, reproduzida em todosos compndios de Histria do Brasil tendo como legenda O Baile da Ilha Fiscal. Essa sno comoveu mais que a imagemlvida de Getlio vencido, afinal,pelo suicdio. evidente que, para isso, o grande peso o fato, o feitoextraordinrio como a chegada do homem lua ou uma ao estpida como a exploso doRio-Center. O fotgrafo, nessescasos, no precisou de tantaacuidade, precisou de presena,coragem e ngulo. J uma foto como esta de Marcus Antonius (foto ao lado, Jornal O Norte, 2001, Prmio Ayrton Senna de Fotojornalismo)

    revela-nos a cena da mais atroz guerra na mais indesejada paz. A sim, precisa-se de sensibi-lidade artstica, sensibilidade social e capacidade de instigar milhes de palavras com umnico clic. Reuna-se a ONU inteira,com todos os seus departamen-tos ligados sorte da famlia humana, e o que ela dir ou pro-testar que no esteja implcito e explcito nessa foto?! O mais grave, o que chegaa meter medo nas pessoascivilizadas o olhar de sustoque nos atira a inocente quese ampara atrs dos andrajosda me. Meter medo no naespinha dos gestores conven-cionais da vida e do mundo, mas em pessoas como Sartre, Exupery, Helder Cmara, para quem no h mundo feliz enquanto existir uma s crianafaminta. Pessoas que pensamna outra. Uma foto dessa se guarda at que se cessem os seusmotivos.

    Gonzaga RodriguesEscritor e Jornalista

  • NUMORAMA A trajetria de Numo Rama denota um teor humanista dos mais consistentes e poticos no cenrio fotogrfico contempo-rneo nordestino. A motivao ideolgicanorteia o uso dessa arte, que para ele mais um meio que dispe para est na vida. Numo Rama utiliza a linguagem da fotografia com o intuito de reavaliar uma ver-dade que acredita ser vulnervel, mutvel e reinterpretvel. Essa motivao foi se construindo na sua vivncia com as variadas paisagens humanas dos diversos lugares onde morou,desde a adolescncia, quando saiu de Araruna-PB, sua cidade natal, para viver na Amaznia e, posteriormente, em pases como Portugal, Sucia, Emirados rabes, Indonsia e Timor Leste. Como retirante nor-destino, seguiu por necessidade de uma vida melhor; no no sentido puramente econmi-co, mas tambm de compreenso da prpria vida, seguida de muita curiosidade e busca do conhecimento. O encontro com a fotografia se deu de forma autodidata em 1994, quando mo-rou em Portugal, onde comprou sua primeira cmera e viveu como fotgrafo de rua. Dois anos depois, um ensaio sobre o Timor Leste, ganharia exposio no museu Etnogrfico de Estocolmo, na Sucia, com direito a ilus-tre visita de Jos Ramos Horta e do bispo Carlos Felipe Ximenes Belo, ganhadores do prmio Nobel da Paz. Definitivamente, foi no retorno ao Brasil, em 1999, que Numo Rama redesco-briu a fotografia enquanto linguagem capaz de registrar a fora caracterstica de sua terra, destacadamente, o nordeste brasileiro. E a ocorre tambm o reencontro com um povo que, apesar das intempries sociais e ambientais, detm a nobreza atestada por Euclides da Cunha, para quem o sertanejo , sobretudo, um forte.

    As incurses em sua prpria terra lhe valeram inmeras exposies pelo Bra-sil e exterior (Repblica Checa, Dinamarca, Paris, Blgica, Madrid, entre outros), inclu-indo o prmio Porto Seguro de Fotografia 2004 pela srie Humanos, um longo projeto voltado para a reflexo do prprio ser sobreseu papel no contexto eco-social, tendo como tema o nordeste brasileiro. preci-so reavaliar o que est humano, filosofa Numo, ao defender uma abordagem uni-versal dos seres que habitam essa regio: preciso fotografar o nordeste com sua fora prpria. O nordeste idlico para mim no interessante. A abordagem HUMA-NOS sobre o nordeste o lana numa pers-pectiva mais ampla. Sai da sua condio de alma derrotada, brasileiro de terceira, e se lana numa escala mais interessante, de um ser mais planetrio. Na concepo de Numo Rama, para-doxalmente, a imagem, a fotografia em si, no o essencial. A arte fotogrfica lhe atraiespecialmente pela versatilidade que ela detm como instrumento de comunicao. Gosta dela como meio e no como fim. Acredita que preciso ir alm da prpria fo-tografia para que ela tenha um sentido: S imagem no basta. necessrio pensar, ir um pouco mais adiante, e s depois foto-grafar. Com um esprito libertrio de refle-xo sobre a arte, em meio s paisagens do parque Pedra da Boca, na zona rural de Araruna-PB, onde mora, atualmente Numo orienta o movimento Alumiar, que tem o intuito de discutir fotografia de forma mais livre. A despeito do desprendimento que confessa em relao prpria fotografia, Numo faz uso dela com toda fora de viver. Para ele, a forma como o autor se posicio-na perante o tema e como ele expe esse contedo ao pblico so os elementos mais nobres de um artista. Os demais elementos podem est inerentes ou no, podem ser provocados, mas a conduta tem que est acima da prpria obra, conclui.

    Elinaldo RodriguesJornalista e Documentarista

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  • De natureza inquieta e talentos diversifica-dos, Reginaldo Marinho ingressou na Escola de Engenharia da UFPB em 1967, e no mesmo ano foi convidado para atuar como assistente do ento professor Argemiro Brito, notvel engenheiro calculista, na disciplina de Geometria Descritiva do Colgio Universitrio da mesma UFPB. No ano seguinte, em 1968, assumiu, por notrio saber, a titularidade da disciplina. Desistiu da Escola de Engenharia e foi para Braslia, em 1969, estudar Arquitetura na Universi-dade de Braslia (UnB). Em 1972, com outros cole-gas egressos da UnB, fundou a primeira produtora de publicidade de Braslia. Em 1974, ingressou no Jor-nalismo e foi editor de fotografia do Jornal de Braslia. Em 1977, trabalhou na imprensa espanhola como reprter fotogrfico da revista Intervi.

    Voltou ao Brasil e trabalhou no InstitutoJoaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, atual Fundao Joaquim Nabuco. Em 1980, retornou a Braslia e trabalhou na revista OCB da Organiza-o das Cooperativas Brasileiras. Foi selecionado para participar da exposio inaugural da Galeria de Fotografia da Funarte, j extinta. O olhar jornalstico, associado linguagem matemtica da geometria, se destaca nas fotografias de Reginaldo Marinho como imagens limpas, precisas e de comunicao objetiva. Atualmente, escreve para o portal Wscom e diretor de Imprensa e Cultura do Sindicato dos Jornalistas da Paraba. No campo da engenharia, sendo um pesqui-sador vocacionado e permanente, um inventorlaureado. Ele criou o sistema construtivo Construcell, com o qual foi premiado com medalhas de ouro em

    REGINALDOMARINHO

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  • sales europeus de tecnologia, em Genebra e Lon-dres e foi selecionado em primeiro lugar no edital Prime da Finep/MCT para apoiar empresas nascentes de base tecnolgica. Construcell introduz dois novos paradigmas engenharia: ser a primeira estrutura do mundo em resina plstica e ser a primeira cons-truo inteiramente transparente, quando os mdulos tambm o forem. Publicou dois lbuns fotogrficos. Espanha: Via Democrtica, sobre a redemocratizao espan-hola e Verde Que Te Quero Ver, sobre a Cidade de Joo Pessoa. Alm da exposio coletiva da Funarte, fez a exposio individual Arte e Vida Nordestina,

    na Galeria A da Fundao Cultural do Distrito Federal; Espanha: Via Democrtica, no Instituto de Arqui-tetos do Brasil/So Paulo, e no Salo Negro do Congresso Nacional, por ocasio da visita oficial do primeiro-ministro espanhol Felipe Gonzalez; Mosaicus no Hotel Tamba e Verde Que Te QueroVer, no Centro Cultural Zarinha e no Instituto de Arquitetos do Brasil/Paraba. Fez uma homenagem a Alosio Magalhes com a exposio Telecarte-mas Tributo a Alosio Magalhes, na Cmara dos Deputados.

    Gilberto Freyre, Acervo Fundao Joaquim Nabuco.

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  • Um dos mais importantes fotojornalistas de hard news em atividade no Brasil, Severino Silva tem uma das trajetrias mais bem sucedidas no fotojornalismo carioca dos ltimos vinte anos. Nascido em Pipirituba, no brejo paraibano, o fotgrafo de 53 anos tem nas questes sociais, na tica e no respeito ao prximo, a matria prima de sua docu-mentao no trabalho jornalstico. Com passagens pelos jornais O Flu-minense, A Notcia, O Povo, O Globo e, atualmente, no O Dia, Severino Silva reconhecido no Brasil e na Europa como um dos mais impor-tantes profissionais no registro de conflitos armados urbanos.

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  • SEVERINOSILVA

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  • Severino Silva, nosso bravo Severo, um fotgrafo admirvel, que consegue transi-tar entre o conflito e o afeto deuma maneira fantstica. Suafotografia sua vida. Trata-se de um artista operrio, um crticopopular, que mesmo desprovidoda formao acadmica tradi-cional, nos ensina extraordinriaslies de vida todos os dias,extradas das ruas, dos becos,das favelas e da dor daqueles que sofrem diante de seus olhos,durante os muitos conflitos urba-nos que documenta. Severino consegue ser, ao mesmo tempo, um artista enga-jado e um elo de bem querer entreas pessoas fotografadas e aque-les que vem suas imagens.Por entre luzes e sombras, dorese ternuras, atitudes covardes e gestos de coragem, ele vem conseguindo desenvolver uma densa narrativa fotogrfica sobre os injustiados do nosso tempo e sobre a violncia asfixiante que recai sobre todos ns. Suas fotos revelam a bele-za do Po de Acar e a ameaa da polcia carioca que, sozinha, mata mais do que toda a polcia norte-americana junta; mostrama criana que brinca numa reali-

    dade que no tem mocinho, correndo entre os policiais, com a esperana dividida de quem observa o conflito ao lado doco companheiro de brinquedo.Imagens que mostram as aesde represso, com o brao armado do Estado emergido entre fumaas e fogos. O olhar do fotgrafo Severino Silva no alimenta uma histria nica. Podemosobservar o soldado que protege,meio sem jeito, uma criana; lado a lado com aquele que ma-ta mecanicamente, emoldurado entre a pintura da paz e o vo da pomba. Severo veio da Paraba e, portanto, conhece o interior e os espaos mais pobres do Brasil. Talvez por isso, ele entre coma maior humildade na casa das pessoas que fotografa, cumpri-mentando, pedindo licena e escutando histrias. Essa postu-ra traz para sua fotografia um profundo respeito pelo fotogra-fado, enaltecido por uma alma bonita e por um olhar iluminadoe afetuoso.

    Joo Roberto RipperFotgrafo

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  • Cineasta e fotgrafo. Graduao em DesignGrfico (ESDI, Rio de Janeiro), onde foi aluno de Alosio Magalhes, Zuenir Ventura, Renina Katz, D-cio Pignatari. Trabalhou como Programador Visual, quando comeou sua atividade de fotgrafo (still), conquistando prmios como o da revista Realidade (1972) e est inserido na Photographers Encyclopae-dia International (Sua, 1983). Herdeiro do Cinema Novo, comeou no cinema ajudando o irmo o tam-bm cineasta Vladimir Carvalho como fotgrafo. E logo foi assumindo outros projetos de fotografia em cinema at se tornar, ele prprio, tambm diretor de cinema. Sua apurada fotografia cinematogrfica tem a marca inconfundvel do cinema brasileiro da se-gunda metade do sculo 20. Exposies: III Bienal In-ternacional de Desenho Industrial (1972); VI Salo de Vero (MAM Rio, 1974); I Trienal de Fotografia (MAM So Paulo, 1980); Bienal de Fotografia de Curitiba (1996). Individual no Centro Cultural Banco do Brasil com a exposio Intervalos de filmagem (1997). Foi assistente dos diretores de Fotografia: Jos Medei-ros, Dib Lufti e Fernando Duarte e logo passou a cate-

    goria de diretor. Estudou Cinematografia Eletrnica (TV Globo). Em 1982 comeou a atuar em TV, reali-zando o documentrio Krajcberg O poeta dos vest-gios; a srie Amrica, o Blues [Joo Moreira Salles], e a novela Pantanal [Washington Novaes]. Realizou os especiais Caetano Veloso, 50 Anos [Walter Salles Jr.], e Chat O Rei do Brasil [Walter Lima Jr.]. No cinema realizou mais de 50 filmes entre curta, mdia e longa metragens, alm de comerciais para TV. Fez a Direo de Fotografia dos filmes: O amor est no ar (Festival de Gramado, 1997); Pequeno dicionrio amoroso [Sandra Werneck] (1997); Central do Brasil (Urso de Ouro, Festival de Berlim, 1998); Villa Lobos uma vida de paixo [Zelito Vianna] (1998); Lavoura arcaica [Luiz Fernando Carvalho] (2000); Migran-tes [documentrio, de Isabel Jaguaribe]; Janela da alma [documentrio, de Joo Jardim e Walter Car-valho] (2000); Amores possveis [Sandra Werneck] (2000). Como fotgrafo de cinema, conquistou deze-nas de prmios em festivais de cinema nacionais e internacionais.

  • WALTERCARVALHO

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  • Durante as filmagens do documantrio Incelncia para um Trem de Ferro (1971), de Vladimir Carvalho, na madrugada de uma vila da Usina Santa Helena, na Vrzea do Rio Paraba (PB), presenciei a cena iluminada por apenas um bico de luz, am-parada por uma tapera de duas guas do abate de um boi. Essa imagem brutal ficou guar-dada na memria e registrada num nico filme de 36 poses, na minha cmera 35mm. Assisti transido o encar-regado da matana, um homem de chapeu de massa, de gestos secos e certeiros moldados sua funo, atingir a nuca do animal magro num golpe s, de toureiro, com um chucho afiado, capaz de cortar at o silncio que se esparge na noite. Aps o golpe, o boi desmo-rona no cho, mas estrebucha e tenta resistir, a respirao ofegan-te e os olhos arregalados, antes da fixidez derradeira, como se fora

    um espectador de sua prpriamorte. Aos poucos, perdendoas foras, tenta inutilmente se levantar. O homem se prepara para o prximo ataque e agora, com a destreza do gesto definitivo, sangra a jugular do animal que a j no reage. O sangue aparado por uma velha bacia de gata des-cascada. Como um cirurgio experiente, o homem inicia a retirada do couro, desnudandoa pele do boi, deixando sua carne e seu tecido muscular mostra e ainda trmulo pelosespasmos dos nervos vivos e das veias mortas. Depois, o esquartejamento. A faca afiada corta e recorta o boi em pedaos e em poucos minutos seu corpo

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  • apenas fragmentos, que sero expostos e vendidos nos aou-gues e feiras da regio. Vi e, sem me conter, foto-grafei at a ltima cena que me marcou fundamente e depois de todo esse tempo continuo procurando fotografar, nos mais remotos recantos do pas, esse confronto, essa peleja da vida e morte em que j sabemos quem ser o vencedor daquele duelo secular. Muda o dcor, porm as ferramentas e os objetos de cena permanecem: o machado de ferro para romper os ossos e as facasamoladas em limato para man-ter o fio impecvel da lminaque recorta o corpo do animal sem machucar os retalhos da carne. Por fim sua cabea dece-pada junta-se aos midos do

    prprio corpo, jogados em um canto, mas os olhos continuam arregalados, observando as par-tes separadas de sua matria e sentem o ar impregnado do cheiro do seu sangue. O que recolhi aqui nesta exposio apenas uma parte do documentrio fotogrfico que pretendo continuar buscando em outras matanas, em outros cenrios, sob o Sol inclemente, embaixo de uma rvore ou no interior de uma construo rudi-mentar, na beira da estrada, num matadouro pblico ou no prprio curral onde vivem mansamente os bichos que sero condenados ao sacrifcio.

    Walter Carvalho

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  • Wnio Pinheiro Arajo, 29 anos, natural de Campina Grande, PB. artista visual e cursa licenciatura em Artes Visuais pela UFPB. Em 2008foi selecionado no X Salo de Novos Artista Paraibanos (Sesc/PB) e finalista no concurso Leica-Fotografe. Em 2009 publicou o livro Nao Jaguaribe (Editora LocalFoto), ensaio fotogrfico sobre a arquitetura e o cotidiano do bairro de Ja-guaribe, em Joo Pessoa, Paraba, pelo Fundo Municipal de Cultura (FMC). Participou da Mostra

    Coletiva dos Artistas Paraibanos na Estao Cabo Branco (2009). Em 2010 fez sua primeira expo-sio individual de fotografias, Ns por um de Ns, no Hall da Reitoria (UFPB), durante a I Semana de Cincia Tecnologia e Arte. As fotografias apresentadas aqui fazem parte do ensaio Vestiginoso, que aborda a questo da presena humana nos espaos de modo sim-blico, a partr de seus vestgios.

    WNIO PINHEIRO

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  • H instantes em que a vida que pulsa ao nosso redor inspira a certeza de que as maravilhas da existncia se expressam nas mais simplrias atitudes e fenmenos da natureza. Quando cri-anas, vislumbramos no quintal, por en-tre orvalhos e estrelas, ou no mximo, entre as ondinas do rio, um universo que nem mesmo os modernos aparatos eletrnicos conseguem alcanar. Viven-ciamos de fato a experincia da vida. Nesse tempo, a imaginao, muito mais do que qualquer outro mecanismo, nos torna soberanos de um territrio sem fronteiras. E no so delrios onricos, j que nos mantemos senhores dos destinos; coisa que o sonho no permite, a imaginao sim. Falo da imaginao criadora, aquela que conduz o movimento do artista, seja na humildade ldica de um brin-cante ou na genialidade matemtica de um maestro.

    Numa sociedade escrava da rotina, do dinheiro, da iluso do mundo, dos sonhos de consumo, no quintal, parece s existirem muros; e nas correntezas do rio, as sobras dessa rotina selvagem. E no meio de tudo, ns, sonmbulos. Nem digo das maze-las que a mdia sensacionalista celebra, com toda sua selvageria e ignorncia. Basta sair rua. Onde havia um jardim, h um estacionamento; onde havia um rio, h um lixo ou uma favela; e o cine-ma e o circo perderam lugar para uma cracolndia ou um shopping center. Talvez seja prudente contem-plar os instantes de nossa histria, a partir da tica dos artistas. Num tempo de descrdito at com a reverncia s grandezas da alma, a arte ainda um veculo dos mais oportunos para guiar nosso olhar alm dessa selvageria co-tidiana, sem o risco da indiferena.

    D d i v a s d o O l h a r

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  • Se h uma atitude que nos salve, ou que contribua para isso, talvez seja o retorno s nossas origens, onde a criatividade flui guiada pelo poder da imaginao e da vontade criadora. Esse o segredo dos grandes artistas, mesmo diante da degradao que se encontra o mundo; mesmo diante de tantos que preferem a perdio. Da mesma forma que a criana contempla o universo a partir do jardim, propomos contemplar a nossa gnese fotogrfica, considerando o recorte su-gerido nesse trabalho. Os fotgrafos documentaristas que esta obra celebra no so pan-fletrios ou engajados, no sentido dos que exercem uma atividade artstica em defesa de uma causa especfica. Mas, acima de tudo, eles cumprem sua misso com a responsabilidade que a profisso requer, e assim talvez con-tribuam para o alcance de uma utopia: a construo de um mundo melhor. Fazem-no simplesmente ao exercerem sua arte com grandeza de esprito, com a humanidade que todo verdadeiro artista deveria ter. O segredo de seus acertos reside no equilbrio entre mente e corao, entre a tcnica e a potica, razo e intuio; e at na transcendn-cia das dimenses sensoriais do saber. Do que se v, alm do reflexo de um objeto invertido; alm das miragens de um mundo guiado to somente pelos cinco sentidos - e s vezes menos que isso -, nesse territrio de relaes mer-cadolgicas ultramodernas, ainda to arcaicas. A essncia do ato fotogrfico como o despertar do sono perptuo que a vida impe. magia. Ou deveria ser. As oportunidades so ddivas. H instantes cujo alcance depende da objetividade para decidir, mas tambm da sensibilidade para perceber, experi-mentar, vivenciar os caminhos, sentir o valor das alternativas. Afinal, cada momento carrega em si inumerveis contradies. Trevas so necessrias

    para que percebamos a luz. Decises nos livram da morte, ou nos privam da sorte. Lgrimas sinceras so menos trgicas que o riso falso. a fotografia, com seus contrastes de luz e sombra. E o senhor de tudo parece ser o tempo. Parece. Como um passo a nos livrar da tragdia. Como o instante em que a bala atinge o corpo; o drama que Robert Capa foi capaz de perpe-tuar, ao registrar o exato momento em que o soldado atingido nas trincheiras da guerra. necessrio quebrar paradig-mas, verdades ditas absolutas, inclu-sive sobre essa entidade que parece fora de controle: o tempo. Pensemos no valor do instante guiado por atos cuja durao pouco importa. Mesmo equipado com a tec-nologia dos novos tempos, o que de-termina as aes do grande fotgrafo a intuio. A sabedoria que o coloca no lugar certo, na hora certa; inspira a apertar o gatilho no instante preciso. Claro, h outros conceitos no dispen-sveis; comportamentos fotogrficos forjados no acelerado processo miditi-co dos tempos modernos, tambm so relevantes para a composio de nossa imagem, para a expresso documental de nossa existncia. Mas, quando tudo parece dominado pelas engrenagens do relgio, o mais valioso certamente so as sensaes verdadeiramente hu-manas. Alis, imprescindvel o senso de humanismo para captar o brilho do olhar, o gesto inusitado, um fragmento de sorriso, a poesia das coisas, a alma dos seres. Ento, preciso reconhecer a grandeza desses garimpeiros da luz, que alm da misso de retratar as transformaes do mundo, produzem lies que transcendem as horas. Seja mostrando corpos dilacerados, para denunciar a imbecilidade da violncia, ou compondo poesias visuais, com a esperana que resta, em meio s ma-zelas nossas de cada dia.

    Elinaldo RodriguesJornalista e Documentarista

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  • Olvio Pinto, dcada de 30, sc. XX.

  • No longnquo ano de 1842, trs anos depois do anncio da inveno da fotografia em Paris, o daguerreotipista J. Evans anunciava no Dirio de Pernam-buco, para os interessados numa cpia fiel de si mesmo, que o procurassem o quanto antes pois j estava de partida.Com certeza Evans j partiria em busca de uma nova clientela. Talvez tivesse se dirigido Provncia da Parahyba do Norte, cuja capital Parahyba no passava de um aglomerado de ruas malajambradas, tortuosas e iluminadas por nada mais que 50 lampies e que por isso, no dizer de Walfredo Rodriguez,os paraibanos do Segundo Imprio, jamais teriam os benefcios da luz do gs incandescente, estando fadados, at 1884, a viverem sob os bruxulentose amarelados raios das candeias de azeite. Nesse cenrio, nada alvissarei-ro, poucos fotgrafos se aventuraram a viajar de um centro economicamente efervescente, a exemplo da vizinha capital pernambucana da segunda metade do sculo XIX, para retratar em poses estereotipadas a pequena elite local com seus daguerretipos assim eram chamadas, de uma s vez, a cmera fotogrfica e as chapas fotogr-ficas por elas produzidas. O nome foi uma homenagem ao inventor do apara-to, o francs Louis Jacques Mand Dagurre. Embora o daguerretipo fosse a tcnica fotogrfica a mais popu-lar, outras tcnicas existiam: um ann-cio de 1856, no jornal A poca (talvez o primeiro em um peridico paraibano),o fotgrafo oferece o cristaltipo (ou ambrtipo) para imortalizar sua cliente-

    la. O mesmo fotgrafo que se identi-fica como FV, que acreditamos ser Joo Ferreira Vilela estabe-lecido em Recife desde 1855 , dois meses depois, diz que trabalha com o daguerretipo por ser um sistema mais aperfeioado e definido. Pelos anncios publicados nos anos de 1857 e 1858 (jornal A Imprensa), de 1861 e 1863 (Jornal da Parahyba), e de 1865 (jornal O Tempo), constatamos a presena do daguerreotipista Rocha Athayde, que incluiu por diversas vezes a capital da Provncia da Parahyba do Norte no seu roteiro de itinerante. No ano de 1865, a visita de Alfred Metzger amplia a oferta de servios fotogrficos na cidade. Onze anos depois, no ano de 1876, j atuava na rua da Virao, n 17, o fotgrafo Joo Firpo com sua Photographia Italiana. At 1885, Joo Firpo continuou atuando na Provncia da Parahyba do Norte, certamente por ter encontrado uma demanda de seus servios que no se resumiam apenas ao retrato. Firpo se dedicou a fotografar as vistas urbanas e as obras da es-trada de ferro Conde dEu. Um italiano, dois alemes e uma mulher fotgrafa foram os ltimos itinerantes no final do sculo XIX. Um dentista italiano com alma de artista visionrio, aporta na Parayba do Norte no ano de 1889. Nos seus bas, Nicola Maria Parente no trazia apenas frceps e botices para suas atividades de dentista prottico: oferecia tambm servios mais artsticos do que a con-feco e colocao de dentaduras. Na rua da Areia, 73, a cidade ficou conhe-cendo suas habilidades de retratista com a sua Photographia Vesuvio. Foi Parente tambm que mostrou pela primeira vez Paraba a grande ma-ravilha do final do sculo, o cinemat-grafo, impressionando a gente daqui com a projeo de imagens em movi-mento em 1897, um ano e meio depois da clebre exibio dos irmos Lumire em Paris. O ano de 1889 traz Para-

    F i a n d oo T e m p oc o m a L u z

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  • hyba do Norte, alm de Nicola Parente, dois fotgrafos alemes. Um deles, Bruno Bourgard, iria se estabelecer definitivamente no estado e deixar o carimbo de sua Photographia Allem nos retratos de muitos paraibanos. Rosa Augusta, uma das raras mulheres fotgrafas da Amrica Latina no sculo XIX, cuja nacionalidade desconhecemos, teria chegado capitalem 1895 e aberto sua Photographia Minerva rua da Areia, n 72. A presena de uma mulher exercendo uma atividade tipicamente mascu-lina deve ter surpreendido os paraiba-nos. No sabemos quanto tempo mais Rosa Augusta se demorou na Parahy-ba, como foi recebida e se percorreu outras cidades da provncia antes de partir definitivamente. A Paraba s

    voltaria a ver uma mulher no ofcio da fotografia em 1932, quando Tereza de Jesus Medeiros presenteada com uma cmera-caixo e a cidadede Santa Luzia ganha uma retratista. A intensa itinerncia que caracterizou a atividade fotogrfica no sculo XIX na Parahyba do Norte, prati-camente desaparece no incio do novo sculo. Como Bourgard, Eduard Ludolf Stuckert casa-se com uma paraibana e se radica na cidade da Parahyba. O velho Stuckert, como depois ficou sendo chamado Eduard Stuckert, talvez para diferenciar dos seus trs filhos fotgrafos (Gilberto, Manfredo e Roberto), foi o responsvel pela formao de toda uma gerao de fotgrafos no estado. Os fotgrafos que aprenderam o ofcio na Paraba (Pedro Tavares, Walfredo Rodrguez e Frederico Fal-co), iniciaram suas atividades com a fotografia desde as primeiras dca-das do sculo XX e tinham estreitas ligaes com a arte pictrica. Frederico Falco foi mais festejado pela impren-sa por sua exmia habilidade com os pincis do que como fotgrafo. Nas d-cadas seguintes, outros pintores, como Olvio Pinto e J. Serrano Lyra, vo as-sociar seus nomes fotografia. Uma grande parte da memria visual da Paraba chegou aos dias atuais graas ao empenho e dedicao de Walfredo Rodrguez, o mais polivalente dos nos-sos fotgrafos. Pintor, fotgrafo, cin-easta, cronista e historiador, contribuiu de forma singular para a memria iconogrfica da cidade. Outros profissionais vo se formando no estado nas dcadas de 20, 30 e 40, na maioria das vezes pelas mos daqueles j solidamente estabelecidos ou vindos de outros estados como aconteceu com Ariel Farias e J. Serrano Lyra. Os fotos dos Stuckert, de Ariel Farias e J. Serrano

    Bruno Bourgard, dcada de 80, sc. XIX.

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  • Lyra foram os maiores responsveis pela formao de novos profissionais da fotografia que, amide, se iniciavam no mtier como simples ajudantes de servios gerais, passavam a auxiliar de laboratrio e finalmente fotgrafos.

    O fotoclubismo: a fotografia como meio de expresso artstica

    A fotografia na Paraba, na d-cada de 50, foi marcada por dois fen-menos: o movimento fotoclubista e o surgimento dos primeiros reprteres fotogrficos como entendemos hoje. O fotoclubismo paraibano surge da mobi-lizao de um grupo de fotgrafos, na sua maioria amadores, que via na fo-tografia um veculo de expresso arts-tica. O primeiro e nico fotoclube de que se tem notcia no estado foi fundado ofi-cialmente no dia 30 de maio de 1953. O Foto Clube da Paraba, assim bati-zado, funcionou, durante mais de dez anos de sua existncia, rua Visconde de Pelotas, 149, no centro da cidade, prdio que hoje abriga a Associao Paraibana de Imprensa. Uma vertente da fotografia abraada pelos fotgrafos da dcada de 50, com o fotoclubismo, tem eco nos anos 60 com uma fotografia de aspirao autoral evidenciando a reali-dade social como sua maior referncia. Machado Bittencourt (1942-1999), jor-nalista, fotgrafo e cineasta piauiense radicado na Paraba, d incio a uma longa trajetria profissional de docu-mentao da realidade nordestina em cujas fotografias identificamos um cunho autoral. A fotografia, neste con-texto, busca sua afirmao no universo das artes plsticas, distanciando-se do mero registro e emergindo como um meio de expresso artstica. A fotografia da Amrica Latina pura realidade, com forte engajamento cultural e social, constatou um dia a

    historiadora alem Erika Billeter. Com Bittencourt, a partir do final da dcada de 60, a fotografia paraibana vai se im-pregnar de crtica e denncia social. As-suntos especficos so tratados dentro do amplo leque que a fotografia social abrange: a pobreza no mbito do rural e do urbano, o Serto, as condies de trabalho, as festas, o lazer, os cultos, a religiosidade etc. Os fotgrafos vo se influenciar por esse sentimento de bra-silidade, de descoberta do pas e de sua realidade plena de desigualdades. Um sentimento que os anos de represso s fizeram fomentar e que explode com a volta ao regime de direito a partir de 1979. Na dcada de 70, dois nomes, Antonio Augusto Fontes e Walter Car-valho, vo colocar a fotografia paraiba-na no cenrio nacional ao encetar suas carreiras noutras plagas sem, no entan-to, se desvincular afetivo e profissional-mente da terra natal. Eles vo beber em outras fontes, mas a Paraba con-tinuar alimentando de beleza as suas imagens. Fontes vai estudar fotografia, histria da arte, antropologia e filosofia em Nova York e Hartford (EUA) e volta ao Brasil para uma slida e premiada carreira como fotgrafo no Rio de Janeiro. Como Walter Carvalho, que tambm troca a Paraba pelo Rio, sua fotografia prima pela inventividade.

    Integrantes do Foto Clube da Paraba, dcada de 50, sc. XX.

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  • Designer grfico de formao, Walter Carvalho envereda no cinema pelas mos do zeloso irmo Vladimir e se torna um dos mais notveis di-retores de fotografia e realizadores cine-matogrficos do pas. Vivendo no Rio desde 1968, j v seu trabalho reconhecido pela revista Realidade quatro anos depois de sua chegada a cidade. A partir da, so inmeras as exposies e prmios, cujo reconheci-mento partilhado com o cinema. Vez por outra, o arteso das imagens fixas e em movimento cruza o olhar com seus conterrneos Antonio Augusto Fontes e Gustavo Moura nos brindando com belos ensaios, a exemplo de Varadouro Soneto em Preto e Branco, publicado em livro em 2002. Gustavo Moura de uma gerao posterior dos dois par-ceiros e se deixou fisgar pela fotografia bem cedo. No teve dvidas sobre que profisso seguir. Autodidata, devorou com olhos vidos todas as fotografias de Cartier-Bresson e de outros mes-tres; em troca, nos devolveu um reino encantado de imagens de um nordeste cheio de poesia. Gustavo faz parte dos fotgrafos, que articulando cosmos e ego, trabalham uma dramaturgia que vai alm da realidade que se encontra no quadro ou fora dele, deixando assim um vasto lugar ao imaginrio testemu-nha o fotgrafo e crtico de arte francs Pierre Devin. A contribuio de Gustavo Moura fotografia vai alm do seu me-ticuloso trabalho autoral iniciado nos anos 80 e que se prolonga dcada a-tual com o mesmo vigor de outrora. Gus-tavo um militante da causa, envolven-do amadores e profissionais na batalha pela consolidao da atividade no esta-do. fruto de sua cachola a ideia de unir os fotgrafos Fbio Gusmo Passarini (o Bita), Giselma Franco, Mano de Car-valho, Marcos Veloso, Alberto Paiva e Ricardo Peixoto em torno de um grupo,

    o Traficantes de Imagens, para pen-sar e vivenciar a fotografia atravs da troca de idias e reflexes sobre o ver e o fazer fotogrficos. Uma mobilizao que geminou eventos como I Semana Paraibana de Fotografia, em 1994, no mbito da primeira edio do Fenart Festival Nacional de Artes da Fundao Espao Cultural da Paraba. A Semana de Fotografia com suas exposies, palestras e oficinas foi um marco na tomada de conscincia e no contato do pblico local com o mundo da fotografia brasileira e do prprio estado. Uma se-mente plantada e que s viria a brotar quase duas dcadas depois no Setem-bro Fotogrfico de 2011 e 2012. Gustavo Moura contempor-neo de Roberto Coura, um nome fun-damental da fotografia paraibana dos anos 70, 80 e 90. Artista plstico, Coura abandona as artes plsticas em 1972, optando definitivamente pela fotografia. de 1978, seu mais clebre ensaio: A feira de Campina Grande, exposio que repercutiu pas afora, rendeu-lhe um livro e o Prmio Marc Ferrez de Fotografia. Em parceria com Gustavo Moura, documentaram, no incio dos anos 80, a triste realidade dos bordis pelo interior da Paraba, cujo ensaio rendeu vrias pginas na revista Iris,a mais importante e duradoura publi-cao dedicada fotografia no Brasil.Segundo o cientista social Mauro Koury, a fotografia de Coura cons-

    Reunio dos Traficantes de Imagens, 1993.

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  • tri uma realidade nova a partir do re-gistro de situaes quaisquer esco-lhidas pela relao do olhar do fotgrafo e os elementos registrados, humanos ou no. Coura ainda documentou os carnavais e as festas de rua entre 1979 e 1981, em Campina Grande, onde viveu at 1990 e quando se mudou para Joo Pessoa como professor do Depto de Arquitetura do Centro de Tecnolo-gia da UFPb. Um coletivo que tambm contribuiu muito para o fomento da ativi-dade fotogrfica na cidade foi a Agncia Ensaio, criada em 1994 por Marcos Veloso (1950-2000), Ricardo Peixoto e Mano de Carvalho, que envolveu e movi-mentou os aficionados pela imagem mecnica de Nipce, Dagurre, Talbot e Florence, inventores, a seu modo e em lugares distintos, da fotografia. A estreita sala, na Praa Rio Branco, era minscula para tamanhos projetos: ex-pedies fotogrficas, exposies, ofici-nas, palestras, publicao de postais e o clebre Festival Lambe-lambe de Fotografia que, em diversas edies, abriu espao para os novos fotgrafos foram a tnica da agncia. Marcos Veloso, mdico radiologista, nada tinha do esteretipo do fotgrafo engajado, mas nos legou imagens do Serto nor-destino que influenciaram toda uma gerao de fotgrafos. Ricardo Peixoto, Mano de Carvalho e Assuero Lima foram os idealizadores do projeto Cidado do Mundo que levou a obra desses artistas a acervos e colees do Brasil, Argen-tina, ustria e Frana. Abrimos parnteses aqui para mencionar trs profissionais renoma-dos que inscreveram seus nomes na histria da fotografia brasileira e mun-dial e que, todavia, a Paraba desco-nhece: Alberto Ferreira (1932 2007) e Severino Silva. Eles deixaram a Paraba cedo, mas em momentos diferentes, em busca de fazer a vida do Sul maravi-lha e engendraram suas carreiras num

    meio altamente competitivo. Ferreira, nascido em Alagoa Grande, tem seu trabalho reconhecido j nos anos 50 como editor de fotografia no Jornal do Brasil, sendo considerado um dos pre-cursores do fotojornalismo brasileiro e j bem locado no panteo de nomes da fotografia mundial, a exemplo de Carti-er-Bresson, Robert Doisneau, Robert Capa, Marc Riboud, Werner Bischof e Sebastio Salgado entre outros. Por sua vez, Severino Silva, 53, natural de Pirpirituba, uma prova de que a sensibilidade molda o olhar. Um olhar forjado na labuta diria de um reprter fotogrfico que tomou o cami-nho oposto ao sensacionalismo fcil. Seus registros da violncia cotidiana do Rio de Janeiro esto carregados de sentimento e transbordam poesia. O terceiro mestre paraibano das ima-gens mecnicas nasceu em Araruna, deixou a Paraba aos 16 anos e pas-sou nove visitando pases to distintos e longnquos quanto a Sucia, Emira-dos rabes, Indonsia e Timor Leste. Refiro-me a Numo Rama (nome arts-tico), nascido em 1968 e iniciado na fotografia aos 26 anos em Portugal. O talento de Rama o levou uma primeira individual, dois anos depois, no Museu Etnogrfico de Estocolmo, sobre a vida

    Identidade visual criada pelo artista Romero Cavalcanti.

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  • em Timor Leste. Numo Rama volta ao Brasil em 1999 e, desde ento, tem rea-lizado diversas exposies no pas e tambm no estrangeiro (Dinamarca, Blgica, Frana, Espanha, Repblica Checa e mundo afora). A Paraba pre-cisa urgente conhecer e reconhecer o talento desse filho prdigo. Talento que salta aos olhos nas imagens de Reginaldo Marinho (Sap, 1950) e Antonio David (Tapero, 1955), reprteres fotogrficos com trajetrias distintas. Marinho, 63 anos, deixou bem cedo a Paraba, migrando para Braslia, onde cursou arquitetura, e terminando em terras espanholas documentando a redemocratizao do pas que redun-dou no ensaio Espanha: via democrti-ca. Antonio David, por sua vez, deixou sua Tapero nos anos 60 para estudar Cincias na Universidade Federal da Paraba e daqui nunca saiu. A partir de 1975, passou a trabalhar como fotgra-fo em peridicos locais (Jornal O Norte, O Momento, A Unio). Foram mais de sete exposies individuais e 12 coleti-vas desde 2005. Um trabalho coroado com o lanamento do lbum Antonio David: 30 anos de fotojornalismo.

    Fazendo uma varredura da segunda metade dos anos 70 e incio dos 80, encontramos Roberto Guedes (in memorian) com suas inquietaes. Conhecemos poucas imagens de sua lavra, mas o pouco que chegou aos nossos olhos atesta o talento de um apaixonado pela fotografia ausente to prematuramente. Nesse perodo, marcava presena na cena fotogrfica paraibana, o professor do antigo DAC (o agitado e provocador Departamento de Artes e Comunicao da UFPB), Luiz Bronzeado com seus ensaios ins-pirados no universo do socilogo per-nambucano Gilberto Freyre. Idealizan-do a vida do Nordeste escravagista, Bronzeado realiza Engenhos e Senza-las, em 1982, reconstituindo fotogra-ficamente o cotidiano de senhores de engenhos e escravos. As dcadas de 1990 e 2000 do fotografia paraibana uma gerao in-quieta e reunida em torno da Agncia Ensaio e do grupo Traficante de Ima-gens que vai pensar o fazer fotogr-fico em suas mais dspares temticas e tendncias. A ordem experimentar. Sem pertencer a nenhum desses gru-pos, o veterano Joo Lobo busca novo

    Vrzea do Rio Parahyba, por Germana Bronzeado.

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  • rumo a cada ensaio, vide Across Lens de 2001, em que Bete Gouveia res-salta as sombras contrastantes e bru-mas difanas, onde a ausncia de luz presena constante, e o congelamento das imagens parece inexistente. Talvez influenciados pelo foto-jornalismo, nossos fotgrafos passarama apontar suas lentes para os deser- dados da sorte. Essa tendncia de do-cumentar a realidade social indigesta, marcante a partir dos anos 60, torna-se quase uma obsesso da fotografia bra-sileira. Ao incorporar o considerado so-cialmente feio e incmodo, a fotografia democratiza, segundo a crtica de arte Susan Sontag, a noo de beleza que pode a partir de agora ser encontrada em qualquer objeto ou tema. Do mes-mo modo que as pessoas que se embe-lezam para a cmara, tudo que menos atraente e desagradvel tambm tem direito sua parte de beleza, filosofa a norte-americana. Tendo a realidade como matria-prima, o fotojornalismo paraibano forjou nomes que tm con-tribudo para o reconhecimento do Brasil como um dos grandes no setor. Destacamos aqui o trabalho de Marcus Antonius, Francisco Frana e Augusto Pessoa, merecedores dos prmios mais importantes na categoria. Uma mulherse destaca nessa seleo majoritaria-mente masculina: a fotojornalista Mni-ca Cmara, que coleciona no seu nu-trido currculo prmios nacionais (Re-vista Brasileiros 2004) e internacionais

    (National Geographic 2003). Atualmen-te, fotgrafa free-lancer e designer gr-fico da UFPB, integra o Imagine Fo-tografia Ncleo de Pesquisa, Docu-mentao e Divulgao da Fotografia. A fotografia de palco, uma vertente do fotojornalismo, tem na po-tiguar Clara Lenira sua maior repre-sentante. Como fotgrafa da Fundao Espao Cultural, construiu um impor-tante acervo iconogrfico do universo da arte do espetculo na cidade, ajuda-da nessa tarefa pelos discpulos Alber-to Machado e Bertrand Lira. Quem tam-bm tangenciou esse caminho de forma autnoma foi a fotgrafa Germana Bron-zeado, irm do fotgrafo Luiz Bronzea-do que mencionamos acima. Germana documentou durante 15 anos, como fotgrafa da Oficina-Escola, os traba-lhos arqueolgicos e de revitaliza-o do patrimnio histrico-cultural da cidade. Dois eventos marcantes, reali-zados pela Fundao Cultural do Mu-nicpio de Joo Pessoa (Funjope), com curadoria de Gustavo Moura e Wnio Pinheiro, colocaram a foto-grafia na ordem do dia: o Setembro Fotogrfico 2011 e 2012. Durante uma semana de cada ano, a cidade recebeu nomes de peso da foto-grafia brasileira como Ed Viggiani,

    Abertura do Setembro Fotogrfico de 2011.

    Corpos e Flores para Yemanj, por Paulo Rossi.

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  • Romero Cavalcanti, Jos Wagner, Mar-cos Issa, Dante Gastaldoni, Marcelo Buainain, Joo Roberto Ripper, Celso Oli-veira, Paula Sampaio, Severino Silva, Eustquio Neves, Rosely Nakagawa e artistas locais como Clara Lenira e Joo Carlos Beltro para exposies, palestras, oficinas e lanamento de livros que ocuparam a Estao Cabo Branco, o Centro Cultural So Fran-cisco e o Casaro 34. Na edio de 2012, alm desses espaos, o Se-tembro Fotogrfico ocupou a Praa Alcides Carneiro, com uma exposio ao ar livre, e a Casa das Artes Visuais. A CAV foi idealizada por Ren e Manu DSouza e veio a ser um importante fomentador da arte fotogrfica na cidade, tendo tambm o fotgrafo Paulo Rossi, paulista radicado na Paraba, como seu coordenador pedaggico. No seu Dicionrio das ArtesVisuais na Paraba (2010), o artista plstico Dygenes Chaves no negli-genciou os fotgrafos do passado (remoto e recente) e nem os contem-porneos, inclusive os da novssima gerao. Esto l: Aurlio Santos (En-courados de Sonhos), Adriano Franco (Entre mundos), Antonio Gualberto (Fotografias), Ccio Murilo (Tem planta que virou bicho), Fabiana Veloso (O outro lado da Terra), Fbio Passarini (Braslia recriada em caleidosfotos), Gabriel Bechara (Rastros, Estao Lapa), Germana Bronzeado (Cidade antiga),

    Gilberto Stuckert Filho (Parahyba, capital em fotos), Guto Zafalan (Ma-king of de Sivuca, o poeta do som), Guy Joseph (Terra da gente Paraba), Hlder Oliveira (coletivas da Agncia Ensaio), Ivan Correia (Romeiros de corpo e alma), Jolisson Cunha (Son-ho de fbrica das boas partes do corpo insano), Lilia Tandaya (Uma histria de pescador), Manoel Clemente (Or-namento e forma da paisagem cons-truda), Mrcio Moraes (Os Ciganos), Mano Carvalho e Ricardo Peixoto (Festival Lambe-lambe de fotografia, Cidado do Mundo), Rizemberg Felipe (reprter fotogrfico internacional do Jornal da Paraba), Roberto Guedes Arnaud (Adrenalina), Rodolfo Athayde (Artistas Mascarados) e Wnio Pinhei-ro (Nao Jaguaribe). Essa novssima gerao, repre-sentada por Rafael Passos, Deyse Euzbio, Wnio Pinheiro, Frido Clau-dino e Thercles Silva, traz um fres-cor fotografia paraibana imprimindoinventividade e inquietao, manipu-lando sem pudor as ferramentasque a tecnologia digital nos oferece para recriar novas realidades e mun-dos imaginrios. Num contexto de overdose de imagens, com o fazer fotogrfico acessvel a qualquer um, esses novos artistas fazem a dife-rena, resgatando o sentido primordial da contemplao de uma imagem, sal-vando-a da banalidade do clique fcil e de uma fruio fast food.

    Bertrand LiraProf. Dr. do Depto de Comunicao em Mdias Digitais da UFPB e autor do livro

    Fotografia na Paraba: um inventrio dos fotgrafos atravs do retrato (1850-1950).

    gua de Meninos, por Aurlio Santos.

    80

  • Adriano Franco, [dez] lambida memria, 2011.

  • Impresso pela Grfica Santa Marta, Joo Pessoa, Paraba, julho de 2013.

    Primeira tiragem: 1.000 exemplares. Distribuio gratuita. Venda proibida.

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