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Janeiro/Fevereiro de 2017 . ANO XVII Nº 155 Postagens agressivas nas redes sociais, comentários ofensivos em sites de notícias, violência física e verbal nas ruas. Especialistas avaliam cenário de intolerância e apontam riscos da falta de diálogo e da aversão à política para a democracia. Quando o adversário torna-se inimigo Págs. 4 e 5 Tema ganha novos contornos após decisão do STF e anúncio do papa Pág. 8 Aborto em pauta Confira números e destaques do biênio na Assembleia Legislativa Pág. 3 Balanço 2015-2016 Índices sociais e ambientais podem garantir verba extra para municípios Pág. 6 ICMS Socioambiental Lei estadual obriga bares e restaurantes a comunicar cobrança Pág. 7 Couvert artístico FOTO:RINALDO MARQUES

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Janeiro/Fevereiro de 2017 . ANO XVII – Nº 155

Postagens agressivas nas redes sociais, comentários ofensivos em sites de notícias, violência física e verbal nas ruas. Especialistas avaliam cenário de intolerância e apontam

riscos da falta de diálogo e da aversão à política para a democracia.

Quando o adversário torna-se inimigo

Págs. 4 e 5

Tema ganha novos contornos apósdecisão do STF e anúncio do papa

Pág. 8

Aborto em pautaConfira números e destaques do

biênio na Assembleia Legislativa

Pág. 3

Balanço 2015-2016Índices sociais e ambientais podem

garantir verba extra para municípios

Pág. 6

ICMS SocioambientalLei estadual obriga bares e

restaurantes a comunicar cobrança

Pág. 7

Couvert artístico

FOTO:RINALDO MARQUES

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A Assembleia Legislativa de Pernambuco iniciou o segundo biênio da 18ª Legislaturacom um novo quadro parlamentar. Em janeiro, sete deputados tomaram posse nasvagas abertas com a saída de Aglailson Júnior (PSB), Ângelo Ferreira (PSB), Botafogo(PDT), Lula Cabral (PSB), Miguel Coelho (PSB), Professor Lupércio (SD) e Raquel Lyra(PSDB), que assumiram as prefeituras de Vitória de Santo Antão (Mata Sul), Sertânia(Sertão do Moxotó), Carpina (Mata Norte), Cabo de Santo Agostinho (RMR), Petrolina(Sertão do São Francisco), Olinda (RMR) e Caruaru (Agreste Central), respectivamente.

Durante a solenidade de posse, que ocorreu no dia 2 de janeiro, no gabinete daPresidência do Poder Legislativo, o presidente Guilherme Uchoa (PDT) destacou quequatro dos sete deputados empossados já passaram pelo Parlamento estadual: Gustavo

Negromonte (PMDB), Isaltino Nascimento (PSB), LauraGomes (PSB) e Terezinha Nunes (PSDB). Já os estreantesna Alepe são Jadeval de Lima (PDT), Paulinho Tomé (PT) eRoberta Arraes (PSB).

Diferentemente dos demais, Terezinha e Gustavoassumem como suplentes das vagas de dois parlamentareslicenciados – Nilton Mota (PSB), atual secretário estadualde Agricultura, e Alberto Feitosa (PR), à frente daSecretaria de Saneamento do Recife. Outra mudançaresultante da nova configuração foi a efetivação de AntônioMoraes (PSDB) e Marcantônio Dourado (PSB), que antesatuavam na suplência.

Não tenha ódio no verão“O ódio pega / Como planta que se rega, / Mas no peito que navega / A

pessoa fica cega. / Cabeça oca, / Sai de pau no bate-boca, / Rasga a roupa, / Gritae berra como louca.” Os versos são cantados por Tom Zé em “Não tenha ódio noverão”, do disco Tropicália Lixo Lógico (2012). A canção antecipou, de algummodo, fatos do ano seguinte (2013), quando o artista se tornou alvo decomentários coléricos nas redes sociais. O motivo: ter feito a locução docomercial de um refrigerante que patrocinava a Copa do Mundo do Brasil. A

resposta, comsarcasmo eacidez, veio no EP virtual Tribunal doFeicebuqui, em que Tom Zé senta no banco dosréus (“Defenda-se já / No tribunal doFeicebuqui”, diz a música-tema), é perseguidopor multidões enfurecidas “com pedras namão” e chega a suplicar pelo perdão do PapaFrancisco. Uma obra para curtir ecompartilhar.

EXPEDIENTE: MESA DIRETORA: Presidente, Deputado Guilherme Uchoa; 1º Vice-Presidente, Deputado Cleiton Collins; 2º Vice-Presidente, Deputado Romário Dias; 1º Secretário, Deputado Diogo Moraes; 2º Secretário, Deputado Vinícius

Labanca; 3º Secretário, Deputado Júlio Cavalcanti; 4º Secretário, Deputado Eriberto Medeiros. Superintendente de Comunicação Social: Margot Dourado. Chefe do Departamento de Imprensa: Helena Alencar. Editores: Helena Alencar e

Gabriela Bezerra. Revisão: Cláudia Lucena, Fellipe Marques e Margot Dourado. Repórteres: André Zahar, Edson Alves Júnior, Eliza Kobayashi, Gabriela Bezerra, Helena Alencar, Ivanna de Castro, Luciano Galvão Filho e Malu Coutinho

(estagiária). Gerente de Fotografia: Roberto Soares. Edição de Fotografia: Breno Laprovitera. Fotógrafos: Henrique Genecy (estagiário), Jarbas Araújo, João Bita e Rinaldo Marques. Tratamento de Imagem: Giovanni Costa. Design: Brenda Barros.

Diagramação e Editoração Eletrônica: Alécio Nicolak Júnior. Endereço: Palácio Joaquim Nabuco, Rua da Aurora, nº 631 – Recife-PE. Fone: 3183-2126. PABX: 3183.2211. E-mail: [email protected]

O Jornal Tribuna Parlamentar é uma publicação de responsabilidade da Superintendência de Comunicação Social da Assembleia Legislativa - Departamento de Imprensa.

02 Janeiro/Fevereiro de 2017

“É a terceira vez que

venho à Alepe. Sou

ativista na luta

pelos direitos das

pessoas

soropositivas.

Considero muito

importante a abertura

do espaço para esse tipo de

evento.”

Salmir FreireAposentado, durante o Grande Expediente Especial realizadopara marcar o Dia Mundial de Luta contra a Aids, em 1º dedezembro de 2016.

“Falar sobre assuntos

relevantes para a

população abre o

olhar da sociedade.

A terapia

ocupacional é uma

profissão muito

necessária, mas está

sendo desvalorizada no

Estado.”

Mariana NeryTerapeuta ocupacional, ao participar de audiência públicapromovida pela Comissão de Cidadania, no último dia 5 dedezembro, para debater a importância social da atividade.

“A Alepe é um fórum

deliberativo. Este é

o momento em que

os deputados

tomam ciência da

situação da saúde e

podem liberar

recursos para

realizarmos as ações

necessárias na área.”

Yara MeloSanitarista, no dia 12 de dezembro, quando houve aapresentação do Relatório de Gestão em Saúde referente ao 2ºQuadrimestre de 2016 à Comissão de Saúde da Casa.

Confira no Facebook do artista o vídeocom a música “Não tenha ódio no verão”,gravado no festival Guaiamum TrelosoRural, em 4 de fevereiro, no Recife:

Novos parlamentares tomam posse na Alepe

Terezinha Nunes (PSDB)Laura Gomes (PSB) Roberta Arraes (PSB)Paulinho Tomé (PT)

Gustavo Negromonte (PMDB)

Jadeval de Lima (PDT)Isaltino Nascimento (PSB)

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Momento de intensas mu-danças na conjunturaeconômica e política do

País, os anos de 2015 e 2016 cor-responderam ao primeiro biênioda 18ª Legislatura da AssembleiaLegislativa de Pernambuco. Noperíodo, foram criadas 644 leis,emendas constitucionais e reso-luções, e realizadas 382 ReuniõesPlenárias. Além disso, foramapresentadas 1.245 proposições,entre projetos de resolução, delei ordinária, de lei complementare propostas de emenda à cons-tituição (PEC). A maioria delas –cerca de 75% – de iniciativa par-lamentar.

“Com repercussões no nossoEstado, o cenário nacional exigiude nós, legítimos representantesdo povo pernambucano, pondera-ção e esforços para sermos maiseficientes nestes tempos deausteridade. Em contrapartida, coma mesma postura demonstrada aolongo de seus 181 anos de história,a Casa se mostrou proativa nadefesa dos direitos conquistadospor nosso povo”, observou o pre-sidente da Alepe, deputado Gui-lherme Uchoa (PDT), em pronun-ciamento na última Reunião Ple-nária do biênio.

A atuação com foco na pessoacom deficiência foi outro aspectoressaltado pelo chefe do Legis-lativo Estadual. “Destacamos alegislação que dispõe sobre aproteção e os direitos das pessoascom Transtorno de Espectro Au-tista”, citou. De iniciativa da Me-sa Diretora, a sanção da Lei Es-tadual nº 15.487/ 2015, que tratado autismo, foi acompanhadapelo lançamento de uma cartilhasobre o tema.

A Alepe também aprovou amedida que concede o benefício dameia-entrada para pacientes comcâncer em espetáculos artístico-culturais e esportivos. A Lei Es-tadual nº 15.724/2016, em vigordesde março passado – teve origemem projeto de lei do deputadoRogério Leão (PR).

Além das proposições aprova-das, o lançamento do Portal daTransparência da Alepe, em 2015,foi apontado como ação para apro-ximar o Poder Legislativo da po-pulação pernambucana. “Notamos,ainda, um salto de qualidade nodesempenho da atividade parla-mentar com a chegada dos novos

concursados, que estão perfeita-mente integrados às atividades daCasa”, complementou Uchoa.

O trabalho dos deputados emcolegiados também mereceu des-taque, como na Comissão Parla-mentar de Inquérito (CPI) das Fa-culdades Irregulares e na ComissãoEspecial de Acompanhamento dosCasos de Microcefalia. “Encerramoso primeiro biênio da 18ª Legislaturacom a plena sensação de devercumprido. No entanto, temos acerteza de que ainda há muito maispor fazer, e de que Pernambucoconta com cada membro desta Casapara, juntos, sairmos fortalecidosdeste cenário de crise econômica e

social que assola o País”, declarouo presidente da Alepe.COMPROMISSOS

Para 2017, a Assembleia pre-tende trabalhar na elaboração deum projeto de lei estadual an-ticorrupção, por meio de umaComissão Especial presidida pelodeputado Rodrigo Novaes (PSD).Também discutirá o tema da Pre-vidência Social em Frente Parla-mentar sob a coordenação dolíder da Oposição, deputado SílvioCosta Filho (PRB). “Outra amos-tra da missão que temos pelafrente é que, dos 1.245 projetosapresentados entre 2015 e 2016,419 se encontram em tramitação

nas Comissões da Casa”, conta-bilizou Uchoa.

Na avaliação deste novo biênio(2017-2018), o presidente ressaltao empenho da Mesa Diretora emgarantir melhores condições detrabalho, acessibilidade e trans-parência com a inauguração doPlenário Governador Miguel Arraes,a conclusão da reforma do EdifícioSenador Nilo Coelho, o início darestauração do Museu Palácio Joa-quim Nabuco e a retomada da TVAlepe. “O processo de instalaçãoda TV já está em fase de conclusão.É uma reivindicação que garantiráainda mais transparência aos nos-sos trabalhos”, afirmou.

Estão definidos, desde o últimodia 12 de dezembro, os nomes dosparlamentares que vão dirigir ostrabalhos legislativos e administra-tivos da Casa Joaquim Nabuco entre1° de fevereiro de 2017 e 31 de ja-neiro de 2019. A eleição da MesaDiretora para o segundo biênio da18ª Legislatura reconduziu ao cargoo atual presidente, deputado Gui-

lherme Uchoa (PDT), escolhido pelasexta vez consecutiva após conquis-tar 42 dos 49 votos em disputa.

A reeleição também foi ga-rantida para o atual primeiro-se-cretário, deputado Diogo Moraes(PSB), que conseguiu 46 votos. Jáo atual 1° vice-presidente da MesaDiretora, deputado Augusto César(PTB), foi substituído pelo de-

putado Pastor Cleiton Collins (PP),escolhido por 45 pares. AugustoCésar (PTB) ficou como primeirosuplente da próxima Mesa. Únicoconcorrente à Presidência comUchoa, o deputado Edilson Silva(PSOL) obteve dois votos no pleito.

Mais disputada, a eleição parao cargo de segundo vice-presiden-te – vencida pelo deputado Romá-

rio Dias (PSD) – ocorreu em doisturnos, pois nenhum dos candi-datos atingiu os 25 votos (maioriaabsoluta) necessários para se elegerem pleito único. Na primeira vo-tação, Romário teve cinco votos amenos que seu concorrente, o de-putado Claudiano Martins Filho(PP). No segundo turno, no entan-to, o social-democrata conseguiu

virar o placar e obter 25 votos, con-tra 22 de Martins.

Júlio Cavalcanti (PTB) e Eriber-to Medeiros (PTC) elegeram-se, res-pectivamente, para as 3ª e 4ª Secre-tarias.O petebista é o único novo com-ponente da Mesa eleita. Socorro Pi-mentel (PSL), Henrique Queiroz (PR)e André Ferreira (PSC) ocupam, nes-sa ordem, as 2ª, 3ª e 4ª suplências.

03Janeiro/Fevereiro de 2017

BALANÇO

Das 1.245 proposições apresentadas no período, 75% foram de iniciativa parlamentar.Em 2017, Casa quer discutir lei anticorrupção e previdência social

Uchoa, acompanhado dos novos membros da Mesa: “Cenário nacional exigiu do Parlamento ponderação e eficiência em tempos de austeridade”

HENRIQUE GENECY

Eficiência e diálogo marcam biênio 2015-2016 na Alepe

Eleitos integrantes para a Mesa Diretora

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04 Janeiro/Fevereiro de 2017

“Começou em 2015, quandofiz um vídeo contra EduardoCunha (então presidente daCâmara dos Deputados,

cassado em setembro do ano pas-sado) sobre a redução da maioridadepenal. Fui atacada por grupos po-líticos e religiosos que sempre per-petuam o mesmo discurso. Pareceque está se buscando que todo mundopense igual, isso é um perigo”, relataa nadadora pernambucana JoannaMaranhão.

Ao ser eliminada na fase classi-ficatória dos 200 metros borboletanos Jogos Olímpicos do Rio deJaneiro, em agosto de 2016, a atletafoi novamente alvo de cerca de 250comentários em suas redes sociaiscom insultos e mensagens de ódio.As postagens revelavam desde odesejo de que ela morresse ao debo-

che com as denúncias feitas por elasobre abusos sexuais sofridos quandocriança.

“Aquilo me chocou. Tive medo deir para a rua um dia depois”, narraJoanna, que prestou queixa à políciacontra as agressões virtuais. “Desdeos protestos de 2013, que começaramdemocráticos, pessoas que tinhamvergonha de manifestar posiçõesracistas, homofóbicas e a favor doRegime Militar se encontraram epassaram a expressar um discurso deódio. São essas as que me atacam”,acredita.

O episódio se soma a outros queextrapolaram o ambiente virtual,com xingamentos, pichações etentativas de agressão física a figuraspúblicas em ambientes privadoscomo restaurantes, hospitais, aviõese livrarias. No Congresso Nacional,insultos, vaias, empurrões e, mesmo,troca de cusparadas foramtelevisionados ao longo de 2016.Durante a votação do impeachment

da então presidente Dilma Rousseff,em 31 de agosto, o muro erguido nogramado do Congresso Nacional paraseparar manifestantes contra e afavor do afastamento da petista setornou símbolo da polarização emtorno do tema.

Naquele mesmo dia, a estu-dante da Universidade Federal doABC (UFABC), em Santo André (SP),Deborah Fabri foi ferida por umabomba da Polícia Militar duranteuma manifestação no Centro deSão Paulo. O ferimento lhe causoua perda da visão do olho esquerdo.Ao postar em uma rede social umamensagem de agradecimento peloapoio recebido, tornou-se alvo decomentários ofensivos e violentos.“Me impressiona as pessoas quedizem e acreditam que tudo é umafarsa, até hoje, apesar das evidên-cias”, comenta.

Para a universitária, esse tipo dereação parte de grupos que colocama ideologia política acima da condição

DEMOCRACIA

Em 2016, durante um períodode três meses (de abril a junho), oprojeto ComunicaQueMuda, daagência de comunicação paulistaNova/SB, monitorou dez tipos deintolerância na Internet. A partirdos dados – cerca de 543 mil postsextraídos de Facebook, Twitter,Instagram, blogs e comentários desites –, o dossiê Intolerâncias Visíveise Invisíveis no Mundo Digital concluiuque a modalidade de maior au-diência, em números de postagens,é a política, com cerca de 274 milmenções.

Na pesquisa, racismo e políticaaparecem praticamente empatadosno topo dos temas com maiorpercentual de menções negativas,ou seja, aquelas que expõem in-tolerância, preconceito ou dis-criminação: 97,6% e 97,4%, res-pectivamente. No caso da política,apenas 0,8% foram positivas e1,8%, imparciais.

“O efeito disso é a negaçãocompleta do lado oposto, que deixade ser visto pelo que é (um grupo

que tem uma posição políticadiferente da sua) para ser encaradocomo inimigo, um erro clássico dequem ainda não aprendeu a brincarde democracia”, aponta o estudo.

Coordenadora da iniciativa, apublicitária Stephanie Jorge ressaltaque as redes funcionam como uma“válvula de escape”, na qual aspessoas se sentem protegidas parafalar coisas que não expressariamcara a cara. O efeito disso é quepreconceitos restritos a círculos pe-quenos passaram a ter um alcancemaior. Ela acredita, porém, nacapacidade da comunicação parareverter o quadro. “Quando veicula-mos mensagens informativas sobreintolerância, percebemos que osjovens têm mais capacidade dealterar a percepção. Entre as pessoasmais velhas, alguns preconceitossão mais difíceis de mudar”, observa.

Titular da Delegacia de Políciade Repressão aos Crimes Ciber-néticos (DPCRICI) do Recife, odelegado Derivaldo Falcão explicaque opiniões difamatórias,

injuriantes, de cunho racista ou dequalquer forma discriminatóriasconfiguram crimes, e o fato deacontecerem pela Internet não livraos agressores de punição. Ele alertaainda para o risco desses discursosse converterem em violência forada rede.

“Não é muito comum, mas háhistórico de pessoas que seconhecem nas redes sociais, for-mam grupos e, em algum mo-mento, reúnem-se para praticaratos violentos”, diz. O policialressalta a importância da coleta deprovas (capturas de telas comidentificação do endereço do site edo perfil do agressor, por exemplo)por aqueles que se sentiremofendidos, caso queiram registrarocorrência para entregar às auto-ridades.

Integrante do ObservatórioPermanente de Discursos de Ódiona Internet, a pesquisadora daUniversidade Federal de SantaMaria (UFSM/RS) Anna ClaraLehmann Martins assinala que as

decisões judiciais nesses casoscostumam ter caráter punitivo-retributivo ou indenizatório, emvez de medidas de reparaçãosimbólica ou direito de resposta.Por isso, segundo ela, não sãosuficientes para enfrentar o prejuízocausado. "O dano advindo dodiscurso permanece. A vítimapersiste silenciada, discursivamenteposta como inferior ante uma gamaincontrolável de usuários do meiovirtual", aponta.

"Os julgamentos de casosparadigmáticos como o da estu-dante paulista que pediu a mortede nordestinos via Twitter, apósas eleições presidenciais de 2010,embora sejam relevantes parachamar atenção da população paraesse problema, não parecem su-ficientes no enfrentamento dosdanos causados", exemplifica. Parasuprir essa lacuna, a pesquisadorasugere legislações e políticas pú-blicas que adotem disposições deprevenção e valorização da dife-rença no meio virtual.

DEMOCRACIA

André Zahar

Como o acirramento ideológico e o uso das redes sociais digitaiscontribuem para um ambiente de intolerância no Brasil

Política lidera ranking da intolerância na web

Ódio compartilhado

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humana. “Os insultos dizem maisdo outro do que de mim. São pessoasque se baseiam na emoção e nãoconseguem sustentar ideias utili-zando a razão”, afirma Deborah,frisando que recebeu também muitoscomentários machistas, com piadase ofensas. “Fora isso, sou grata aosque mandaram mensagens de forçae apoio. É para essas pessoas quedireciono minha atenção”, ressalva.

Para o cientista político JulianoDomingues, professor da Univer-sidade Católica de Pernambuco, essetipo de comportamento, no Brasil,relaciona-se com a cultura políticaautoritária do País. Segundo ele, oódio na política ganhou forçaespecialmente no contexto acirradodas eleições de 2014. O autor depesquisas sobre a relação entredemocracia e mídia ressalta tambémque o ambiente das redes sociaisestimula o fenômeno. “Ao não sesentir só, ao ter a percepção de quemuitos compartilham da sua visãode mundo, o intolerante se senteincentivado a se manifestar”, ob-serva.

Domingues avalia que a co-municação mediada pelo computadorreduziu o custo de manifestação,encorajando pronunciamentos naforma de postagens em detrimentode ações presenciais nos ambientestradicionais de ações políticascoletivas, como sindicatos e partidos.“Ganha a disputa pela visibilidade

nas mídias sociais o discurso quemais se propagar. Como temos umacultura política autoritária em váriossetores da sociedade, o discursointolerante leva vantagem”, explica.

A deputada Teresa Leitão (PT)indica que o fenômeno aponta para

“um caminho perigoso de crimi-nalização da política”. A parlamentaratribui as ocorrências à “insatisfaçãode setores conservadores da socie-dade com o nível de politização eorganização do povo” e afirma queo direcionamento dessas ações é dadopela mídia. Para ela, os políticos

precisam agir com cuidado redobradopara não insuflar o ódio na popula-ção: “Nossas posturas precisam sermuito pensadas, para não corroborarcom esse tipo de movimentação”.

Líder do PSDB na Alepe, o de-putado Antônio Moraes consideraque “qualquer tipo de agressão é la-mentável e deve ser repudiado”. Ci-tando casos de perfis falsos e “blogssem responsabilidade com a notícia”,o parlamentar defende uma regula-ção que permita o acompanhamentodas postagens, embora não se possaproibi-las. “É preciso diminuir a ten-são criada no País, para haver umdebate sóbrio de ideias no campopolítico. Esse agravamento só fazenfraquecer as instituições políticas”,avalia.

Em seu livro Como Conversar comum Fascista, a filósofa e professorada Universidade PresbiterianaMackenzie Marcia Tiburi chamaatenção para a irrupção do ódio nasociedade civilizada, emoção cadavez menos evitada e mais “auto-rizada”. Em entrevista por e-mail aoTribuna Parlamentar, a autoraacrescenta que não se trata de umsentimento natural, mas de um “afe-to manipulado”. “As pessoas pensamque sentem ódio porque não há comonão sentir, mas não sabem que estãosendo ‘co-movidas’ a sentir isso”, dizela, que sublinha o caráter antipolíticopor trás das ações (saiba mais naentrevista abaixo).

05Janeiro/Fevereiro de 2017

Das artes

plásticas à

filosofia, da

televisão às

salas de aula,

a gaúcha

Marcia Tiburi

transita por

vários

ambientes

para discutir

questões

éticas e

estéticas. AoTribuna

Parlamentar,

ela falou da

disseminação

do ódio nas

ruas e nas redes sociais, sobre a qual vaticina: “a covardia é a

postura inerente ao fascismo”.

Tribuna Parlamentar - Ataquesverbais e até agressão física afiguras públicas, por seusposicionamentos políticos, têmsido observados. Além disso, asmensagens de ódio proliferam nasredes sociais. Para onde apontamesses fenômenos? Marcia Tiburi - O ódio, comoqualquer outro afeto, pode sermanipulado. E também as emo-ções, tornadas mercadorias,podem entrar ou sair da moda.Os discursos midiáticos e reli-giosos usam amor e ódio con-forme necessidades. Nesse ce-nário, a política é aniquilada,porque depende de afetos po-sitivos que criem relações cons-trutivas. Na destruição das ins-tituições e das relações humanas,falar de antipolítica faz sentido.Ao mesmo tempo, essa é a po-lítica que nos resta.

TP - De onde partem os discursosque movimentam o que você chamade "máquina movida pelo ódio”?

MT - O próprio Estado acionacom facilidade essa máquina au-toritária. Os poderes estabele-cidos — sobretudo, o poder mi-diático, responsável, junto comas religiões, pela manipulaçãodos afetos — dependem do usoda violência, e o ódio é justa-mente o afeto que move à vio-lência. O ódio é apenas o com-bustível dessa máquina.

TP - Qual o papel das redes sociaispara a disseminação do ódio?MT - As redes sociais são meiosde reprodução de mentalidades.Elas funcionam gerando ideiase sentimentos. Como são meios,podem ser usadas para o que forpreciso. Se quisermos disseminaródio ou amor, a escolha é dosusuários. Como todas as redesacionam o narcisismo maisbanal, só quem tem muita cons-ciência de si e do outro será ca-paz de escapar ao encanto datentação populista que lhes éprópria.

TP - Na sua avaliação, vivemos“tempos fascistas”. Fala-se muitode que o contexto de polarizaçãopolítica no País está por trás deuma radicalização de posicio-namentos. Isso procede? Ou os“tempos fascistas” também sãoobserváveis em outros países?MT - Épocas diversas produzemfascismos diferentes. O que euchamo de fascismo é uma ope-ração imaginária, de linguagem,na qual os preconceitos são ex-postos de uma maneira que, emmomentos não fascistas, causa-riam vergonha. Uma espécie devale-tudo em que a lei anti-democrática do mais forte entraem vigência. Aqueles que sãoconsiderados fracos são mal-tratados, rechaçados, humilha-dos de um modo ostentatório epublicitário. No Brasil atual,usam-se principalmente as redese a agressividade possível paramanifestar força. Fácil ver queé a covardia a postura inerenteao fascismo.

Para Marcia, ódio pode ser manipulado

FOTO: SIMONE MARINHO/CORTESIA

HENRIQUE GENECY

Para especialistas, anonimato

encoraja posicionamentos

radicais na Internet

“Os insultos dizem mais

do outro do que de mim”((DDeebboorraahh FFaabbrrii))

CORTESIA

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06 Janeiro/Fevereiro de 2017

APrefeitura de São Bento doUna (Agreste) enfrentouem 2015 um problema no

tratamento de lixo, quando oaterro sanitário utilizado pelacidade perdeu a licença de fun-cionamento. Para a população lo-cal, não se tratava apenas de umaquestão ambiental e legal, masfinanceira: por não ter acesso aum sistema regulamentado dedescarte de resíduos sólidos, omunicípio deixou de receber umadotação que chegou a R$ 581 milno ano anterior.

O valor é referente à parcela doImposto sobre Circulação deMercadorias e Serviços (ICMS)distribuída pelo Governo do Estadoentre as localidades com bomdesempenho em educação, saúde,segurança pública e meio am-biente. “Tivemos que correr paraajudar a regularizar a licença evoltar a receber os repasses”, re-lata a prefeita Débora Almeida,que conseguiu resolver a situaçãono ano seguinte. Com a verba dochamado ICMS Socioambiental,previsto no artigo 2º da Lei Esta-dual nº 10.489/1990, seria possívelpagar – com folga – os R$ 350mil anuais para a utilização doaterro, pertencente à cidade vizi-nha, Lajedo.

De acordo com a ConstituiçãoFederal, 25% do repasse de ICMSdevido aos municípios podem serdefinidos por legislação estadual.Em Pernambuco, o uso de critériossociais e ambientais para a distri-buição desse montante começouem 2002. Atualmente, 12% do ICMS– quase R$ 500 milhões – pre-miam o desempenho de políticasem áreas específicas (ver quadro).

“Estamos enfrentando duas cri-ses: a queda de arrecadação e a seca.Qualquer dinheiro a mais é impor-tante para custear os nossos pro-gramas”, complementa Débora. Agestora destaca que, em 2014, SãoBento do Una recebeu também R$835 mil pela baixa mortalidade in-fantil (o quinto maior valor do Es-tado) e R$ 367 mil pela nota obtidano Índice de Desenvolvimento daEducação Básica (Ideb). Somandoos itens socioambientais, o muni-cípio alcançou R$ 2,2 milhões emarrecadação somente naquele ano.

“Pernambuco reúne tantoregiões com déficit histórico dedesenvolvimento quanto impor-tantes polos. O critério econômicobeneficia desproporcionalmentealguns municípios, como Ipojuca,que conta com o Polo de Suape”,constata o deputado RodrigoNovaes (PSD). Na avaliação dele, oICMS Socioambiental é uma ma-neira de equalizar problemas re-gionais. “É justamente onde hádificuldades que se deve estimular

a capacidade dos gestores de su-perá-las”, argumenta.OPORTUNIDADES

Artigo produzido pela Consul-toria Legislativa da Alepe e pu-blicado na Revista de Estudos Le-gislativos da instituição revela,ainda, outras chances para os pre-feitos aumentarem os ganhos como ICMS. O estudo reúne locais doEstado que têm “importância bio-lógica alta”, segundo o Atlas daBiodiversidade da Agência Estadualde Meio Ambiente (CPRH), masainda não possuem áreas de prote-ção ecológica. “Municípios do Ser-tão como Parnamirim, Petrolândiae Triunfo têm potencial para cria-ção de Unidades de Conservação”,expõe. Situados na Região Me-tropolitana do Recife, Itapissumae Itamaracá, por exemplo, chega-ram a receber mais de R$ 3 milhões(cada) pela existência de reservasem seus territórios.

“Outro instrumento interes-sante para os novos gestores é aReserva Particular do PatrimônioNatural (RPPN), em que uma pro-priedade privada recebe selo depreservação ambiental do PoderPúblico”, indica o economista LuizHonorato Jr., da Universidade deBrasília (UnB). “É uma iniciativaquase sem custo que é remuneradapelo ICMS Socioambiental, inclu-sive com a possibilidade de teratividade econômica no local”,acrescenta.

Recentemente modificada pelaLei Estadual nº 15.929/2016, anorma que regula o ICMS So-cioambiental prevê, para 2018,a retirada de dois critérios: oque diz respeito à proporção dapopulação e o utilizado paracompensar as perdas que osmunicípios possam ter de umano para o outro, chamado de“Diferença Positiva” (ver qua-dro). O objetivo é ampliar aindamais os recursos destinados àeducação e ao meio ambiente.

A mudança deveria ter entradoem vigor desde 2013, mas foi adiadaa pedido do Poder Executivo esta-dual, devido aos impactos financei-ros estimados nas contas dos mu-nicípios. “A análise de dados eco-nômicos dos dois últimos anos ser-virá para decidir sobre a manuten-ção da norma atual ou a aplicabili-dade de novos indicadores”, in-formou, em nota, a Secretaria daFazenda de Pernambuco (Sefaz).

O incentivo pelo desempenhoem educação é o que sofrerá maior

impacto, com aumento de 3 para10% – ou de cerca de R$ 74 milhõespara R$ 248 mi, considerando osdados de 2014. O número de matrí-culas de alunos no Ensino Funda-mental vai responder, sozinho, por5% de todo o valor distribuído. Aavaliação do conhecimento dos es-tudantes no 3º ano do Fundamental,o número de matrículas na EducaçãoInfantil (creches) e a nota no Índicede Desenvolvimento da Educaçãode Pernambuco (Idepe, similar aoIdeb) também serão considerados.

Edson Alves Jr.

Índices sociais e ambientais positivos garantem mais

recursos do ICMS para municípios pernambucanos

Incentivo para a boa gestãoFINANÇAS PÚBLICAS

Critérios deverão sofrer mudanças em 2018

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07Janeiro/Fevereiro de 2017

Ir a um restaurante, ser sur-preendido por uma apre-sentação artística não anun-

ciada e, depois, pela cobrança delaé uma prática que pode constrangeros clientes e violar os direitos doconsumidor. Para coibi-la, a As-sembleia Legislativa aprovou, emjunho do ano passado, a LeiEstadual n° 15.842/2016, que obrigabares, lanchonetes e restaurantesdo Estado a disponibilizar, de ma-neira ostensiva e acessível, in-formações referentes à cobrançado couvert artístico. A norma jáestá em vigor.

De acordo com a medida, pro-posta pelo primeiro-secretário daCasa, deputado Diogo Moraes (PSB),os estabelecimentos comerciais queoferecerem atrações pagas deverãoafixar cartazes que mostrem os diase horários das apresentações, valora ser cobrado do cliente e o percen-tual destinado ao artista. As infor-mações têm que constar, inclusive,nos cardápios.

A lei também faz restrições àcobrança do couvert: fica proibidoexigir o pagamento da taxa nos casosde mera reprodução de músicaambiente ou de jogos em telões. Alémdisso, o pagamento só pode serexigido de consumidores que estejamem ambientes onde seja possívelusufruir integralmente da atraçãoartística.

Tais regras já são parcialmentecumpridas pelo restaurante e pizzariaAtlântico. Na unidade do bairro dasGraças, no Recife, que conta comdois andares, o estabelecimentocobra o couvert apenas dos clientesque estejam no salão do primeiropiso, onde Maestro Abelha faz suasapresentações ao piano.

O restaurante ainda informa, noscardápios e em placas, que o pa-gamento da taxa é opcional. “A ideiaé tornar o ambiente mais agradávelpara o cliente fazer sua refeição. Noentanto, ele só contribui se tiverinteresse”, explica o gerente da casa,Leonildo Alves, informando que faráas adequações necessárias para oatendimento total da norma.

Gerente de Fiscalização daCoordenadoria Estadual de Proteção

e Defesa do Consumidor (Procon-PE), Roberto Campos explicou queantes de começar a fiscalizar ocumprimento da prática, o órgãoprogramará ações educativas paraorientar os comerciantes sobre anova lei. Após esse momento, osestabelecimentos que descumpri-rem as determinações ficarão sujeitosàs penalidades administrativasprevistas no Código de Defesa doConsumidor (Lei Federal n° 8.078/1990), como pagamento de multase, até mesmo, a cassação da licençade funcionamento.

“A iniciativa veio, sem sombra dedúvidas, beneficiar o consumidor,garantindo a ele seu direito básico àinformação. O comunicado deve serostensivo, permitindo que o clientesaiba da atração e tenha a opção deacompanhá-la ou não”, avaliouCampos. Além de evitar surpresas econstrangimentos para o cliente como valor final da conta, o deputadoDiogo Moraes destaca outra van-tagem: “A classe artística tambémserá beneficiada, uma vez que a leitorna obrigatória a divulgação dopercentual destinado ao profis-sional”.

Ivanna de Castro

RINALDO MARQUES

Cobrança está restrita à área da apresentação. Na Atlântico, contribuição é optativa

Conciliar, julgar pequenas demandas, evitar a formação dequilombos e, até, obrigar “vadios e mendigos a viver de trabalho ho-nesto”. Essas eram algumas das atribuições dos juízes de paz no iníciodo século 19. Sentindo, por mais de um ano, a ausência dessa figuraresponsável pela “manutenção da ordem” na então Freguesia deSão Lourenço de Tejucupapo (localizada no município de Goiana, MataNorte), o padre Antônio Julião encaminhou à Assembleia LegislativaProvincial de Pernambuco uma petição solicitando a eleição de ummagistrado para a igreja paroquiana.

De acordo com o abaixo-assinado, desde janeiro de 1841, os ha-bitantes do distrito viam-se “forçados a mendigar justiça entre osjuízes vizinhos”. No documento, datado de 26 de fevereiro de 1842,o vigário ainda apontava a infração da Lei Imperial de 15 de outubrode 1827, a qual estabelecia a presença de um juiz de paz e de um su-plente em cada uma das freguesias e das capelas filiais curadas.

Abaixo-assinado de1842 cobrava

presença de juiz depaz em São Lourenço

de Tejucupapo

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

Superintendência de Preservação do Patrimônio Histórico do

Legislativo. Petição de Antônio Julião, de 26 de fevereiro de

1842. Acervo do Arquivo Geral da Assembleia Legislativa do

Estado de Pernambuco. Coleção de Leis do Império do Brasil -

1827, Página 67, Vol. 1 pt. I (Publicação Original). Acervo da

Câmara dos Deputados.

Sem surpresas na hora de pagar a contaBares, lanchonetes e restaurantes são obrigados a informarsobre o serviço de couvert artístico em cartazes e cardápios

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Um aborto por minuto. Essa éa realidade no Brasil, deacordo com a Pesquisa Na-

cional do Aborto (PNA) 2016. Rea-lizado pela Anis - Instituto de Bio-ética, em parceria com a Universi-dade de Brasília (UnB) e o Ministérioda Saúde, o estudo foi divulgado emdezembro do ano passado, quandocoincidiu com dois fatos inéditos quereacenderam o debate sobre o tema:a decisão do Supremo TribunalFederal (STF) de descriminalizar aprática até o terceiro mês de gestaçãoe a autorização do Papa Franciscopara ampliar o perdão às mulheresque provocaram a interrupção dagravidez indesejada.

Apesar de proibido pela legislaçãobrasileira (Decreto-Lei nº 2.848/1940) – exceto nos casos de estupro,risco de vida para a mãe e feto anen-céfalo –, mais de meio milhão demulheres recorreram ao procedi-mento ilegal em 2015, segundo aPNA. A Organização Mundial daSaúde (OMS) estima que cerca de 47mil morram todos os anos no mundopor complicações relacionadas a

abortos clandestinos. No Brasil, umrelatório elaborado pelo GovernoFederal aponta que essa é a quintacausa de morte materna.

Para o obstetra Olímpio Moraes,gestor executivo do Centro Integradode Saúde Amaury de Medeiros(Cisam) – uma das mais tradicionaismaternidades públicas do Recife –,a maior parte dessas mortes poderiaser evitada se a prática não fossecriminalizada. “A mulher não abremão de fazer um aborto só porqueé crime. Ela apenas deixa de procurarajuda especializada, ficando maisvulnerável a complicações e a umanova gravidez indesejada”, observa.

O especialista ressalta ainda que,por medo de serem hostilizadas oudenunciadas, muitas pacientesacabam omitindo a informação parao médico quando precisam recorrerao hospital após um procedimentoclandestino malsucedido. “Com odiagnóstico errado, o tratamentoacaba não sendo eficaz e a mulherpode até morrer”, adverte Moraes.

Em novembro do ano passado,ao julgar um caso ocorrido no Rio deJaneiro, o STF considerou que a prá-tica, quando realizada até o terceiromês de gestação, não configuracrime. Apesar de o entendimento

estar restrito a um caso específico,o veredito abre precedente para adescriminalização do aborto no País.

A posição é a mesma do ConselhoFederal de Medicina (CFM). Aentidade defende que tanto a mulherquanto o médico tenham autonomiana decisão sobre uma gravidez derisco ou indesejada. A representantedo Conselho Regional de Medicina dePernambuco (Cremepe) e presidenteda Associação de Ginecologistas eObstetras de Pernambuco (Sogope),Maria Luiza Menezes, explica que,até a décima-segunda semana degestação, a interrupção é consideradasegura, “desde que realizada em umambiente hospitalar e acompanhadapor profissionais médicos”. “Issoprotege a paciente de ter que recorrera um procedimento clandestino,podendo pagar muitas vezes com aprópria vida”, pontua.

Os argumentos enfrentam resis-tência de diversos setores no Brasil,especialmente daqueles ligados àIgreja Católica e a algumas correntesevangélicas. Para muitos cristãos, avida se forma já no momento daconcepção, e interromper a gravidezé considerado pecado grave. NaCâmara dos Deputados, parlamenta-res da chamada “bancada evangé-lica” prometeram apresentar umaProposta de Emenda à Constituição(PEC) para endurecer a legislaçãorelacionada ao tema.

Na Alepe, a decisão do STFtambém foi criticada. Em Plenário,o deputado Pastor Cleiton Collins(PP) afirmou considerar a sentençainadmissível. “Essa é uma decisãoinjusta, que vai influenciar juízes detodo o Brasil”, afirma. Para ele, essadiscussão extrapola o campo dareligião. “É uma questão da vida.Acho que os três Poderes e a socie-dade têm que trazer medidas paravalorizar a vida e o ser humano.”

Já o deputado Rodrigo Novaes(PSD) considerou equivocada adeterminação, por estipular umperíodo em que a interrupção podeser permitida. “Tecnicamente, res-peitaria a decisão se o entendimentofosse para o aborto em qualquer

situação. Mas imaginar que a vidatem prazo de validade ou tentar terdiscernimento de quando há vida nofeto é algo que supera a compreensãodo homem”, argumenta.

O parlamentar acredita que alegislação atual sobre o tema já éequilibrada, opinião que é comparti-lhada pela deputada Priscila Krause(DEM). Ela classificou a decisão doJudiciário como “usurpação depoder”. “O assunto deve ser debatidode forma ampla com toda a popu-lação, e a representação da sociedadeestá no Congresso Nacional, e não noSTF”, defende.

O tema foi abordado pelo PapaFrancisco, em dezembro, quandoconcedeu aos sacerdotes o poder deabsolver mulheres cristãs que te-nham realizado aborto, prerrogativaantes exclusiva dos bispos. O padreJosé Severino de Arruda, da Paróquiade São Judas Tadeu, no Recife, inter-preta que o ato teve como objetivoapenas simplificar o rito e não sina-liza uma flexibilização da Igreja. “Emrelação à doutrina, não mudou nada.A Igreja é defensora da vida e jamaispassaria pela cabeça de um papa serfavorável ao aborto, pois sabemosque isso significa matar um inocentesem direito à defesa”, acredita.

A coordenadora da organizaçãonão-governamental (ONG) Católicaspelo Direito de Decidir, RosângelaTalib, tem outra avaliação. Para ela,o perdão e a misericórdia são valoresque devem ser vividos na práticacristã. “É importante se colocar nolugar da mulher e compreender osmotivos que a levaram a optar peloaborto”, pondera. “Elas devem ter odireito de se utilizar da própria

consciência, bem como livre arbítriopara tomar esse tipo de decisãodifícil.”

Educadora do Instituto Feministapara a Democracia SOS Corpo, SílviaCamurça defende que a legislaçãogaranta condições iguais para todos,independentemente da fé de cadaum. Ela avalia que o País aindaprecisa passar por uma mudançacultural profunda para que a mulherconquiste a autonomia de decidirsobre o próprio corpo. “Para a genteconseguir que as mulheres tenhamuma vida inteiramente livre e sejamdonas do próprio nariz, o direito deser ou não mãe tem que estarcolocado para elas. Mas esse direitoé sempre negado”, ressalta.

No ano passado, um estudodivulgado pela OMS mostrou que,nos países onde o aborto é permitido,o número de procedimentos têmdiminuído. No Uruguai, por exem-plo, onde a prática foi descrimina-lizada em 2012, a taxa de desistênciade mães que pretendiam abortaraumentou em 30%.

Assim como a classe médica, essasorganizações defendem a educaçãosexual nas escolas e o acesso irres-trito aos métodos contraceptivos co-mo medidas para, antes de tudo,evitar a gravidez indesejada. O mé-dico Olímpio Moraes explica que umatendimento estruturado, com po-líticas públicas específicas e acom-panhamento psicológico, ajuda nadecisão. Além disso, a mulher é bemorientada para não reincidir numagestação indesejada. “É um serviçoque humaniza a relação da sociedadecom o ato da gravidez”, conclui SílviaCamurça, do SOS Corpo.

08 Janeiro/Fevereiro de 2017

Eliza Kobayashi

SAÚDE

Decisão do STF e posicionamento do Papa Franciscoprovocam novas reflexões acerca da prática querepresenta a quinta causa de morte materna no País

Lei e fé reabrem discussão sobre aborto no BrasilHENRIQUE QUEIROZ

Pesquisa indica que 500 mil mulheres recorreram ao aborto em 2015