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1 Tatiane Eulália Mendes de Carvalho Frei Caneca: matriz do jornalismo brasileiro Universidade Metodista de São Paulo Programa de Pós – Graduação em Comunicação Social São Bernardo do Campo – SP, 2011

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Tatiane Eulália Mendes de Carvalho

Frei Caneca: matriz do jornalismo brasileiro

Universidade Metodista de São Paulo

Programa de Pós – Graduação em Comunicação Social

São Bernardo do Campo – SP, 2011

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Tatiane Eulália Mendes de Carvalho

Frei Caneca: matriz do jornalismo brasileiro

Dissertação apresentada em cumprimento parcial às exigências do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social, da Universidade Metodista de São Paulo, para obtenção do grau de Mestre. Orientador Prof. Dr.: José Marques de Melo.

Universidade Metodista de São Paulo

Programa de Pós – Graduação em Comunicação Social

São Bernardo do Campo – SP, 2011

3

A dissertação de mestrado sob o título “Frei Caneca: matriz do jornalismo brasileiro”,

elaborada por Tatiane Eulália Mendes de Carvalho foi apresentada e aprovada em 08 de

abril de 2011, perante banca examinadora composta por Professor Dr. José Marques de

Melo (Presidente/UMESP), Professora Dra. Magali Cunha (Titular/UMESP) e Prof. Dr.

Adilson Citelli (Titular/USP).

__________________________________________

Prof. Dr. José Marques de Melo

Orientador e Presidente da Banca Examinadora

__________________________________________

Prof. Dr. Laan Mendes de Barros

Coordenador/a do Programa de Pós-Graduação

Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social

Área de Concentração: Processos Comunicacionais

Linha de Pesquisa: Processos Comunicacionais Midiáticos

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José Marques de Melo: meu mestre;

Hilton José de Carvalho: meu pai, meu herói;

Guilhermina S. M. de Carvalho: minha mãe, minha fortaleza e inspiração.

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“Cautela, união, valor constante.

Andar assim é bom andar”

Frei Caneca apud Camões

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar agradeço à Deus por ter concluído mais uma etapa de minha vida, e,

por mostrar, durante estes dois anos, seu imenso amor por mim.

À Nossa Senhora Aparecida, que me orientou por intermédio do professor Marques de

Melo, e nunca me deixou na mão (Nossa Senhora! Irei pagar todas as promessas

feitas!).

Aos meus pais, que sempre estiveram ao meu lado me apoiando nas decisões difíceis e

mostrando o caminho certo. Meu eterno agradecimento.

À CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico -, pela

bolsa de estudo.

Aos meus irmãos, que tanto amo.

Aos familiares, pelo incentivo e apoio.

Ao meu grande amor, Robson Carvalho. Obrigada por me ensinar a ser uma pessoa

melhor. Também, à sua família, que tão bem me acolheu.

Ao professor José Marques de Melo, que tenho a honra de chamá-lo de mestre, por ter

me acolhido deste o primeiro instante, inicialmente como aluna especial e depois como

sua orientanda. Obrigada pela confiança!

Às professoras Cicília Peruzzo e Magali Cunha, que ofereceram ricas contribuições para

esta pesquisa, na ocasião do exame de qualificação.

Aos demais professores do Programa de Pós-Graduação da Universidade Metodista de

São Paulo, em destaque o professor Antônio Carlos Ruótulo. E aos ex-professores do

Póscom, Isaac Epstein e Sandra Reimão.

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Ao meu amigo – irmão Raul Neto, por tantas histórias, triste ou alegre, pela amizade, e

por estar sempre presente!

Às minhas queridas amigas Márcia, Andrezza, Myrian e Bianca, incluindo seus

respectivos Thiago, Edu e Rodrigo, que me apoiaram e ajudaram quando precisei. (My

valeu, heim!!!)

À Ana Angélica. Amiga, obrigada pela sua dedicação!

Aos amigos da Metodista: Francisco de Assis, Orlando Berti, Marcos Paulo, Celena

Alves e Martin.

Em especial quero agradecer à Ranielle (na verdade, não sei nem como te agradecer por

tudo que fez) por ter me acolhido em sua casa, e ter se tornado uma grande amiga.

Também, a Alexandra, que se Deus quiser, será uma eterna amiga. Obrigada por tudo!

Ao amigo Fábio Corniani, que me incentivou a continuar os estudos, me apresentou o

professor Marques de Melo, a Metodista, e a Folkcomunicação.

Aos amigos da #máfia, pelo apoio (Oswaldo – Kbça, Agnes, Cris Valéria e Lucimara).

Ao amigo e orientador de graduação Marco Bonito, obrigada por me mostrar o caminho

do monólito (Não é fácil mesmo!). Estendendo os agradecimentos à sua linda esposa e

minha amiga, Cristina.

À equipe da Cátedra UNESCO de Comunicação, em especial a Rônia Barbosa, sempre

disposta a ajudar.

Enfim, aos que aqui liste e aos que por falha da memória esqueci: minha eterna

gratidão!

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TABELAS E ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 - Sistematização da Retórica de Barthes..........................................................53

Quadro 2 – Referente aos primeiros jornais do Brasil...................................................115

Quadro 3 – Formatos dos gêneros opinativos classificados por Marques de Melo......125

Ilustração 1 - A ideia do mundo sensível de Platão.........................................................72

Ilustração 2 - Demonstração da persuasão....................................................................144

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SÚMARIO

Introdução........................................................................................................................13

Capítulo I - Frei Caneca: História e vida........................................................................20

1.1 - O nascimento...........................................................................................................20

1.2 – Formação e Influência............................................................................................21

1.3 – Frei Caneca, o sacerdote.........................................................................................26

1.4 - O amigo, jornalista, Cipriano Barata.......................................................................33

1.5 - Revolução de 1817..................................................................................................34

1.6 - A Liberdade.............................................................................................................40

1.7 - Constituição 1823 e 1824........................................................................................41

1.8 - Confederação do Equador ......................................................................................43

1.9 - A prisão...................................................................................................................44

1.10 - A morte ..................................................................................................................46

Capítulo II – Retórica ......................................................................................................48

2.1 - História da retórica e seus primeiros personagens .................................................48

2.2 – A retórica Aristotélica............................................................................................54

2.3 – Cícero......................................................................................................................60

2.4 – Marcus Fabio Quintiliano.......................................................................................61

2.5 - O fim da Retórica....................................................................................................65

2.6 – Retórica e os estudos das Teorias da Comunicação...............................................67

2.7 – A retórica de Frei Caneca.......................................................................................86

Capítulo III – O jornalismo de Frei Caneca....................................................................98

3.1 - Breve história do Jornalismo ..................................................................................98

3.2 – O jornalismo como ciência: a contribuição de Tobias Peucer..............................105

3.3 – O início do jornalismo brasileiro: 1808................................................................109

3.4 - O Jornalismo Opinativo do século XIX: Influência retórica e conceitos..............117

10

3.5 – O jornalismo de Frei Caneca................................................................................129

3.6 - Classificação do jornalismo de Frei Caneca.........................................................141

3.7 – Frei Caneca e a Teoria do Jornalismo..................................................................143

Considerações Finais.....................................................................................................152

Referências....................................................................................................................156

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RESUMO

Analisar a retórica construída por Frei Caneca e reconstruir seu pensamento

comunicacional, argumentando que a atividade desenvolvida na imprensa o credencia

como matriz do jornalismo brasileiro, constituem os objetivos desta pesquisa. Trata-se

de estudo exploratório, apoiado em fontes bibliográficas e documentais, com a intenção

de compreender o contexto histórico da retórica e do jornalismo brasileiro na época.

Para caracterizar o jornalismo praticado por Frei Caneca foi aplicado o método misto –

quantitativo e qualitativo – da análise de conteúdo. Os resultados indicaram que Frei

Caneca, por meio da retórica, iniciou a produção de um jornalismo argumentativo

estruturado, pois seus textos tinham base teórica. Desta maneira, contribuiu para o

avanço dos estudos de Teoria do Jornalismo ao fazer uma leitura brasileira da retórica e

da eloquência.

Palavras – chave: Jornalismo. Teoria. Gêneros. Opinião. Retórica.

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ABSTRACT

Analyzing the rhetoric built by Frei Caneca and rebuild his thinking communication,

arguing that the activity developed in the press credence as array of Brazilian

journalism, are the objectives of this search. This is an exploratory study, supported by

bibliographic and documentary sources, with the intention to understand the historical

context of the rhetoric an the Brazilian journalism the. To characterize

the journalism practiced Frei Caneca was applied mixed methods - qualitative and

quantitative - of the content analysis. The Results indicate that Frei Caneca, by

the rhetoric, began producing a structured argumentative journalism, because his writing

had a theoretical basis. In this way, contributed to the advance of studies of

the Journalism Theory to make reading a Brazilian rhetoric and eloquence.

Key - words: Journalism. Theory. Genres. Opinion. Rhetoric.

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INTRODUÇÃO

Este trabalho originou-se através dos estudos do professor José Marques de

Melo ao descrever Frei Caneca como precursor da teoria da comunicação brasileira, sua

hipótese era baseada no fato do carmelita ter se dedicado aos estudos retóricos,

produzindo textos didáticos, discursando em praças públicas e ter redigido o jornal

Typhis Pernambucano, com o objetivo de persuadir e convencer a população da época

sobre suas ideias e pensamento. Esta pesquisada foi publicada em seu livro História do

Pensamento Comunicacional: cenário e personagens (2003), e no anuário da Cátedra

UNESCO Metodista de Comunicação Matrizes Comunicacionais Latino – Americano

(2002).

Passado alguns anos, o professor refaz suas reflexões e apresenta uma outra

hipótese sobre o personagem: a de que ele faz parte do jornalismo “embrionário” da

nossa história, ou seja, o religioso também contribuiu para o surgimento da imprensa no

Brasil. Marques de Melo descreve o pensamento do frade como “encarcerado” (2009,

p.08).

Inspirado nos postulados iluministas franceses, Frei Caneca exercita um jornalismo radical que exacerba os ânimos dos detentores do poder monárquico. Ele robusteceu o pensamento jornalístico de matiz republicano, em função do qual foi encarcerado e fuzilado durante as insurreições que ameaçaram os alicerces do nascimento do Império Brasileiro (CABRAL DE MELLO, 2001 apud MARQUES DE MELO, 2009, p.08).

E, assim, chega-se ao objetivo desta pesquisa, com propósito dar continuidade

aos estudos do professor Marques de Melo, que é reconstruir o pensamento

comunicacional de Frei Caneca, apoiando-se em suas publicações, averiguando o

sentido das suas expressões e conceitos jornalísticos, a fim de conhecer as

circunstâncias históricas e ambientais de seu pensamento.

Por que pesquisar o pensamento comunicacional de Frei Caneca? Frei Joaquim

do Amor Divino Rabelo Caneca foi um personagem de destaque da História do Brasil,

devido sua participação política, religiosa, educativa e comunicacional no contexto

sócio – cultural de sua época.

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No campo da comunicação, foco da investigação, o personagem atuou através da

ciência da retórica, se baseando em Fabio Quintiliano e Aristóteles, escreveu textos

didáticos sobre o ensino da retórica e eloqüência, gramática da Língua Portuguesa,

oração, política, direitos dos cidadãos, etc. Também foi redator do jornal Typhis

Pernambucano, entre os anos de 1823 e 1824, período durante o qual ganhou a

confiança e o respeito da população ao relatar os acontecimentos da época e críticas ao

Governo, contribuindo para construção do jornalismo. E, ainda, realizou discursos em

praças públicas.

Seu pensamento comunicacional pode ser encontrado em cincos textos: Breve

Compreendido de Grammatica Portuguesa, Tratado de Eloqüência, Taboas Synopticas

do Systema Rhetorico de Fabio Quitiliano, Dissertação e Oração, e, também, no jornal

Typhis Pernambucano. Estas obras podem ser localizadas no livro Obras Políticas e

Literárias de Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, publicado no ano de 1917, por

Antonio Joaquim de Melo.

Por esta trajetória do carmelita, que instigou o professor José Marques de Melo a

pesquisar sobre sua vida e obra, que buscamos dar continuidade à investigação,

averiguando nova hipótese e vertentes do jornalismo produzido por Frei Caneca.

Com esta pesquisa pretende-se contribuir para a construção da História da

Imprensa do Brasil, revisando os fatos que descreveram a época em que o jornalismo

começou a ter voz no país, pois Dom Pedro I havia acabado de outorgar a Liberdade de

Imprensa e Frei Caneca fez dessa outorgada sua maior força para escrever os primeiros

manifestos. Também pretende-se contribuir para novas discussões aos estudos de Teoria

do Jornalismo, acrescentando informações e revendo conceitos já aplicados.

Diante de tais pretensões fica o questionamento: Quais características podem ser

consideradas como marca do pensamento comuncacional de Frei Caneca? E, para

responder a questão lançamos novos objetivos, que são:

• Construir o perfil biográfico de Frei Caneca no campo comunicacional.

• Identificar o pensamento comunicacional de Frei Caneca por meio dos

cinco textos - Tratado de Eloqüência, Taboas Synopticas do Systema

Rhetorico de Fabio Quitiliano, Breve Compreendido de Grammatica

Portuguesa, Dissertação e Oração – e do jornal Typhis Pernambucano.

• Identificar o jornalismo elaborado por Frei Caneca e como ele se utilizou

da retórica para expressar suas idéias e atuações como jornalismo.

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• Analisar o conteúdo jornalístico expresso por Frei Caneca, a fim de

categorizar a presença jornalística.

Logo de início, foi demarcado o ângulo a ser estudado sobre o pensamento do

carmelita, pois o leque de opção era amplo e, sendo assim, poderíamos perder o foco da

pesquisa e de um trabalho bem feito. A primeira tarefa a ser realizada foi um

levantamento bibliográfico sobre as obras relativas ao assunto, com referências ao

personagem Frei Caneca, a retórica, a história da imprensa (no Brasil e no mundo), o

jornalismo opinativo, e os conceitos do jornalismo brasileiros.

Procuramos conhecer a trajetória do jornalismo desde o seu início até os dias

atuais para que, assim, possamos-se compreender a direção do pensamento de Frei

Caneca, que teve um papel fundamental na história da imprensa brasileira no século

XVIII. Neste período a maioria dos jornais começavam a desenvolver o jornalismo

opinativo, e Frei Caneca não hesitou em fazer o mesmo, discursava em praças públicas

e escrevia artigos expressando suas idéias a respeito do governo ganhando a confiança e

respeito da população.

O pesquisador Antônio Carlos Gil (1996) classifica as fontes bibliográficas em:

livros de leitura corrente como sendo as obras referentes aos diversos gêneros literários;

livros de referência (ou consulta) como as que têm por objetivo possibilitar uma rápida

obtenção das informações requeridas, ou a localização das obras que as contém. Esta

classificação subdivide-se em livros de referência informativa, que contém a informação

que se busca (ex: dicionários, enciclopédias, anuários e almanaques) e livros de

referência remissiva, ou seja, que remetem a outras fontes (ex: catálogo). Outra

classificação, são as publicações periódicas que editadas em fascículos, podem ter

intervalos regulares ou irregulares e contam com a colaboração de vários autores sendo

as principais publicações os jornais e revistas. As revistas são consideradas mais

importantes fontes bibliográficas por tratarem os assuntos de forma mais profunda e

elaborada do que os jornais que se caracterizam pela rapidez.

Deve-se considerar também que a pesquisa bibliográfica torna-se relevante em

estudos históricos, pois em muitas situações não há outra maneira de conhecer os fatos

passados se não com base em dados bibliográficos (GIL, 1996, p.28).

Após este estágio, procuramos levantar os documentos históricos,

principalmente as obras didáticas e o jornal Typhis Pernambucano, no qual

conseguirmos ter aquisição através de um sebo em Pernambuco. A pesquisa documental

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teve como objetivo resgatar o material elaborado por Frei Caneca, e buscar relatos de

historiadores e documentos oficiais sobre sua vida, acusação e morte.

A pesquisa documental tem por finalidade reunir, classificar e distribuir os

documentos dos mais diferentes gêneros buscando a racionalização do trabalho

intelectual. Sobre a pesquisa documental, Triviños explica que é uma pesquisa que

“vale-se de materiais que ainda não receberam um tratamento analítico, ou que podem

ser reelaborados de acordo com os objetos de pesquisa” (1990, p.51).

Outro autor que relata sobre o assunto é Trujillo, que de acordo com a natureza

de sua importância os documentos levantados podem ser considerados fontes primárias

ou fontes secundárias, “sendo as primárias de natureza inédita, que foram recolhidas,

organizadas e formuladas pelo pesquisador e as secundárias são provenientes da

documentação já analisada e publicada”. (1973, p.225).

Na terceira etapa da pesquisa foi realizada uma análise de conteúdo, por unidade

completa, das cinco obras didáticas: Tratado de Eloqüência, Taboas Synopticas do

Systema Rhetorico de Fabio Quitiliano, Breve Compreendido de Grammatica

Portuguesa, Dissertação e Oração – e do jornal Typhis Pernambucano. Primeiramente

foi executada uma análise exploratória do material.

Gil (1996) diz que na pesquisa exploratória é necessário trabalhar com as

perspectiva de esclarecer ou delimitar o tema. O autor, ainda, ressalta que este tipo de

pesquisa precisa de uma ampla revisão bibliográfica, e é realizada de acordo com o

tema em discussão.

Feito a exploração do material, partimos para análise de conteúdo quantitativa. O

objetivo desta quantificação é averiguar quais as características dos gêneros jornalísticos

e dos formatos foram produzidos por Frei Caneca. A pesquisa foi realizada por unidade

completa com nove edições do jornal, e foram selecionado estes exemplares por

indicação da banca de qualificação, pois em discussão acharam que analisar os 28

jornais era muito. Sendo assim, foi escolhido o primeiro exemplar de cada mês.

Bardim (1977, p. 75) explica que a análise de conteúdo é divida em três pólos

cronológicos: 1) pré-análise; 2) exploração do material; e 3) tratamento dos resultados.

Conforme a autora, a análise de conteúdo

É um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo da mensagem, obter indicadores quantitativos ou não, que permitam a

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inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção das mensagens (BARDIN, 1977, p. 21).

Porém, segundo a autora, a análise de conteúdo pode ser quantitativa ou

qualitativa:

[...] Na medida em que a análise de conteúdo é utilizada como um instrumento de diagnóstico, de modo a que se possa levar a cabo inferências especificas ou interpretações causais sobre um dado aspecto da orientação comportamental do locutor, o seu procedimento não é obrigatoriamente quantitativo [...] A abordagem não quantitativa recorre a indicadores não freqüências susceptíveis de permitir inferências [...] Em conclusão, pode-se dizer que o que caracteriza a análise qualitativa é o facto de a inferências – sempre é realizada – ser fundamentada na presença de índice (tema, palavra, personagem, etc), e não sobre a freqüência da sua aparição em cada comunicação individual (BARDIN, 1977, p; 115 e 116).

Deste modo, foi descrito os procedimento metodológicos, nos quais foram de

estrema importância para se concluir e atingir os objetivos desta pesquisa.

Como norte da investigação, trabalhamos com duas hipóteses, nas quais se

diferem da problemática do professor José Marques de Melo:

1 – Os estudos sobre Teoria do Jornalismo apontam como característica desta

ciência a objetividade, veracidade, atualidade, periodicidade, universalidade, exatidão,

entre outros. Neste contexto, ao descrever a retórica, Frei Caneca faz diversos

apontamentos sobre a forma de redigir textos e se comunicar e essas exposições do

personagem podem ser consideradas como o alicerce da teoria do jornalismo produzido

nos dias atuais.

2 – A dedicação aos estudos de retórica faz com que Frei Caneca, ao redigir o

jornal e os textos, consiga atingir o objetivo de expressar suas ideias e opiniões sobre o

absolutismo da Corte. Escreve textos para que toda população – proletariados e

burgueses - entenda o que se passa naquela circunstância. Iniciando a produção do

jornalismo opinativo.

E isso é que se procura evidenciar a decorrer desta dissertação.

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Estrutura

Esta dissertação é estrutura em três capítulos, além da introdução e

considerações finais. No primeiro capítulo buscou-se apresentar a história de vida de

Frei Caneca, suas origens, influências, o contexto histórico em que viveu, as evoluções,

sua prisão e morte. É um tópico breve, com relatos de importância para a vida, e obra do

carmelita, para, assim, entendermos melhor seu pensamento.

O capítulo 2 tem por objetivo dar início ao resgate do pensamento

comunicacional de Frei Caneca relacionando-o com os estudos retóricos, ensinando-a

para aqueles que quisessem aprender, e praticando-a em grandes discursos em praças

públicas, Assembléias e Igrejas, além de exercê-la em seu jornal Typhis Pernambucano.

Para entender o seu pensamento, foi feito uma revisão da história da retórica, e quais

foram os primeiros filósofos. Aristóteles como alicerce de todo o ensinamento e como

ele a classificou. Cícero também deu sua contribuição. Quintiliano, que além de

contribuir com o pensamento aristotélico deu a disciplina o caráter pedagógico, e a

incluiu “como a arte de escrever bem” – incluindo regras gramaticais.

Outro objetivo deste capítulo foi relacionar os estudos retóricos com a

comunicação, averiguando que os principais conceitos das Teorias de Comunicação

originaram-se da retórica. Enfim, buscou-se entender o pensamento de Frei Caneca,

como ele aplicou seus conhecimentos perante a sociedade de sua época, e, para isso,

teve-se apoio na pesquisa de análise exploratória de suas publicações.

Já o capítulo 03, e último, tem a finalidade de apresentar o jornalismo produzido

por Frei Caneca sob influência da retórica. Inicialmente, foi realizada uma vasta revisão

sobre a história do jornalismo, e como esta atividade tornou-se importante para a

sociedade, tendo como complemento a importância dos estudos de Tobias Peucer.

Relatar a história da imprensa brasileira merece destaque para que se possa

entender e compreender as atitudes de Frei Caneca, a imprensa do século XIX era

argumentativa, e o jornalismo do carmelita não foi diferente, porém seu destaque se

deve à retórica, no qual soube tão bem aplicá-la, e, com isso, construiu um jornalismo

opinativo estruturado. Este capítulo, ainda, apresenta a análise do jornalismo produzido

pelo religioso e suas características, classificando os gêneros e formato.

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Por fim, o último capítulo tem por objetivo apresentar a ciência do jornalismo,

sua história, os conceitos aplicados e estudos sobre suas Teorias, comparando o

jornalismo com as discussões de retórica de Frei Caneca.

Sem qualquer tipo de pretensão, espera-se que esta pesquisa possa esclarecer

dúvidas e contribuir para os avanços da história da imprensa no Brasil.

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CAPÍTULO I

FREI CANECA: HISTÓRIA E VIDA

1.1 - O nascimento

Joaquim do Amor Divino Rabelo era o nome inicial de Frei Caneca. Filho de

Domingos da Silva Rabelo e Francisca Alexandrina de Siqueira. A data de seu

nascimento foi reconhecida somente pelos documentos do inquérito militar: Recife,

1779. Naquela época, o documento equivalente à certidão de nascimento era o do

batismo e os registros de Frei Caneca nunca foram encontrados, nem por pesquisadores.

Sobre sua ascendência pouco se sabe. Frei Caneca chegou a fazer sua árvore

genealógica, conseguiu descobrir até sua trisavó, em 1694, que se chamava Maria das

Estrellas e era ascendente de escravos. Seu pai era filho de portugueses. Sua mãe de

brasileiros e europeus.

A Maria, sua trisavó, se casou com João Baptista Ferreira, natural de Porto, que

constrangido pela crise econômica e pela pobreza do Reino de Portugal, partiu para os

territórios americanos chegando à capitania de Pernambuco, morando em Olinda. Uma

das filhas do casal, Maria Pereira de Assunção, casou-se com Antonio Alves da Costa

Dantas, português do Alentejo, tio de frei Antonio da Natividade Dantas (carmelita

turonense). Maria Pereira e Antonio tiveram uma filha chamada Clara Alves Torres, que

foi a avó materna de Frei Caneca. O avô de Frei Caneca chamado Pedro era filho de

Francisca Alexandrina. Clara e Pedro tiveram uma filha que colocaram o nome de

Francisca Alexandrina de Siqueira, a mãe de Frei Caneca, que herdou os cabelos ruivos

da avó.

O pai de Joaquim, Domingos, era um modesto tanoeiro, que sobrevivia graças à

oficina onde fabricava artesanalmente tonéis e caneca.

Sua infância e juventude aconteceram dentro do contexto do Brasil – Colônia e

sobre sua vida, nesta época, nada se sabe. Sua biografia começa a ser notória quando

21

Joaquim do Amor Divino Rabelo entra para o seminário dos carmelitas1. E,

transformou-se em uma figura de referência para os estudos da história do Brasil entre

os anos de 1817 e 1824, principalmente em Pernambuco, através de sua atuação

política.

1.2 - Formação e Influência

Ao se ordenar como frade carmelita, em 1801, aos 22 anos mudou seu nome

para Joaquim do Amor Divino Rabelo Caneca. O nome escolhido foi em homenagem

ao seu pai. Frei Caneca, em 1803, foi nomeado professor de retórica, filosofia e

geometria. Mostrando sua vocação para o ensino.

Naquela época o iluminismo filosófico e o enciclopedismo da Europa, o

naturalismo rousseaniano, o igualitarismo e liberalismo da Revolução Francesa, como

também o constitucionalismo derivado das leis de Montesquieu, e o modelo de

Independência dos Estados Unidos, fez com que consolidassem novas ideias e

doutrinas. No Brasil, começaram a surgir novos caminhos aumentando o conhecimento

e a ambição, desde a Colônia, a fundação do Seminário de Olinda por Dom José

Joaquim da Cunha de Azevedo Coutinho até as Sociedades Secretas lançaram as ideias

dos patriotas.

E, com Frei Caneca não pode ser diferente. Ao iniciar seus estudos no Seminário

de Olinda2, foi inflamado pelas ideias liberais. Os filósofos Jean – Jacques Rosseau,

Robinet, Montesquieu, Condorcet, Benthan, Hobbes, Voltaire, etc. contribuíram para o

seu pensamento libertador.

1 A vida de Frei Caneca como sacerdote carmelita será relatada, ainda neste capítulo, nas próximas páginas. 2 Quando as ideias iluministas começaram a se alastrar, a Igreja tomou a iniciativa de investir no ensino, enriquecendo o quadro de disciplinas, com aulas de história, geometria, latim, grego, francês, geografia e, com maior dedicação à retórica. A Igreja já não via vantagens em enviar os futuros sacerdotes para estudar na Universidade de Coimbra. E, com a reforma educacional do Marques de Pombal, no ano de 1800, o, então, bispo de Pernambuco, D. José Joaquim da Cunha Azeredo Coutinho, funda o Seminário de N.S. da Graça de Olinda (Seminário de Olinda, aonde Frei Caneca atuou como professor e aprofundou seus estudos). O ensino no Seminário de Olinda eram cursos de primeiras letras, “aritmética, doutrina e canto, português, francês, grego, latim, retórica e poética, história universal, geografia, lógica, filosofia, filosofia, física experimental, histórica natural, química, geometria, trigonometria, álgebra, teologia e história eclesiástica” (RIZZINI, 1957, p.58).

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A erudição de Caneca despertava a atenção de quantos com eles mantinham contato direto, ou liam suas produções literárias ou doutrinárias, ou ouviam os seus magistrais sermões, todos eles apoiados nos melhores modelos de eloquência (MONTENEGRO, 1978, p. 27).

O carmelita esgotou as fontes da cultura clássica, seguindo as perspectiva do

enciclopedismo e das demais correntes racionalistas da Europa do século XVIII. O

religioso, também, inspirava seus estudos nos 10 volumes de História philosofica e

política dos estabelecimentos e do commercio dos europeus nas Índias, de Guillaume –

Thomas Raynal, que trazia críticas às monarquias absolutistas e a violência. E, com

destaque, consegui transmitir toda essa cultura para diferentes circunstâncias.

Muitas formas se apresentam no acervo doutrinário que pesa na formação de

Frei Caneca. Porém, a filosofia do Iluminismo está na base de seu pensamento

enraizado num processo de libertação do homem de todas as dependências ideológicas,

políticas e sócio-econômicas que inibem nos anseios de progresso.

Sobre este pensamento, o carmelita observa a existência de um crescimento

político – social, que se penetra nas teorias das correntes filosóficas européias, através

dos filósofos Locke, Adam Smith, Voltaire, Montesquieu e Rousseau3, completando nas

exigências do liberalismo e se ligava na “Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão” 4, da Revolução Francesa de 1789.

Com Locke aceitava-se a posição de Hobbes, em partes, e a dos jusnaturalistas da teoria dos dois estados: o estado natural como fundamento do estado social. Entretanto, se para Hobbes o estado social é um estado absoluto, baseado no dever da contenção dos males do

3 Estes são os principais filósofos da Revolução Francesa, no qual Frei Caneca inspirou suas ideias e pensamentos. John Locke foi médico, filósofo inglês e ideólogo do liberalismo, é considerado o principal representante do empirismo britânico e um dos principais teóricos do contrato social. Adam Smith lançou a base do iluminismo. Um dos teóricos mais influentes da economia moderna, responsável pela Teoria do Liberalismo Econômico. Já Voltaire foi escritor, ensaísta, filósofo iluminista, e ficou conhecido pelo seu dinamismo e espiritualidade em defesa da liberdade civil, inclusive da liberdade religiosa e do livre comercio. Montesquieu ficou conhecido pela Teoria da Separação dos Poderes; teve uma formação iluminista com padres oratorianos. Era contra absolutismo; fez diversas críticas ao clero católico; defendia aspectos democráticos de governo e o respeito as leis; e defendia a divisão do poder em três: Executivo, Legislativo e Judiciário. Por fim, Rousseau foi quem fundamentou os principais conceitos da Revolução Francesa.

4 Este documento foi aprovado, no dia 26 de agosto de 1789, pela Assembléia Constituinte, no contexto inicial da Revolução Francesa. Seus princípios iluministas tinham como base a liberdade e igualdade perante a lei, a defesa inalienável à propriedade privada e o direito de resistência à opressão. (http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=180, acessado no dia 24/03/2010).

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egoísmo dos indivíduos, em Locke, o homem que no estado de natureza é bom, na sociedade torna-se ainda melhor, porque aí se encontram unidos por um pacto. E, então, a forma de Estado é liberal e tutelar, tem como objetivo o desenvolvimento dos direitos naturais: a liberdade e propriedade (MIRANDA, 1975, p.122).

Há uma persistência dupla na visão do dever político, baseado no acordo

constituído pelos indivíduos. E o Estado, como tutelar dos direitos naturais e individuais

é legitimo ao mesmo tempo em que é limitado em suas autoridades. Este é o destaque

dado ao pensamento de Adam Smith, no qual diz que à seriedade da natureza humana

compreendida empiricamente a moral se torna independente da relação, e a natureza

humana certifica-se como um dado, e não como valor, permitirá que a filosofia coloque

sua fé na razão humana, capaz de iluminar a ignorância e da superstição, imposta,

segundo se acreditava, pela tradição e pela autoridade.

Ao mesmo tempo em que Adam Smith força sobre a crença e a fé, Condorcet diz

que a crença, no progresso do ser humano, torna-se teoria e dogma, como um impulso

para atrair os sábios a serem os missionários do progresso e da cultura, e propagadores

das luzes da inteligência, e mesmo benfeitores da humanidade, contribuindo para a

perfeição indefinida.

O iluminismo baseado na natureza do homem torna-se naturalista e otimista, e é

com Voltaire, e com os outros enciclopedistas, que o iluminismo, tido como uma

missão, se fez alastrar a nova filosofia da cultura libertadora, e da importância de

conhecimento do espírito dos homens de uma determinada época.

Rousseau diz que a bondade natural do homem e a necessidade da organização

da sociedade precisar respeitar e potencializar a ordem natural, “uma vez que sendo o

homem bom por natureza, todos os males lhe advêm da sociedade” (MIRANDA, 1975,

p.123). Somente pelo contrato social, o pacto social, que o homem consegue seus

direitos civis: a liberdade e a igualdade.

Aos indivíduos incube, portanto, a construção da sociedade que lhes garanta os

bens naturais5. E só pelo contrato social6 todos os indivíduos contemporizam livremente

à comunidade os bens naturais da liberdade e da igualdade, os quais se tornam, então,

bens civis. (FORTES, 1993). E os indivíduos não são senão súditos deles mesmo na

coletividade. 5 Dentro do iluminismo os bens naturais são considerados com os bens úteis – necessários – para a sociedade. 6 E o contrato social é baseado na igualdade democrática.

24

A união do povo é tida como uma soberania. E a soberania é também invisível,

essencial ao povo, como a liberdade é essencial ao individuo. E as leis são vontade do

povo, incumbindo ao governo de realizá-las, sendo o responsável diante da coletividade

imperante como designado de sua administração. Decorrem, em conseqüência natural,

os dogmas democráticos: pacto social, soberania popular, autoridades com mandato

executivo, e estabelecem-se a critica e fundamenta da derrota do absolutismo

(MIRANDA, 1975, p.24).

Os representantes do povo francês apóiam-se em Montesquieu, com um governo

amenizado pela vivência de poderes intermediários, - a constituição, e em Rousserau,

com elevação do Terceiro Estado, e com igualitarismo contra os privilégios dos

aristocratas. Montesquieu, com visão realista e mesmo pragmática, contrário as

abstrações, lembrava desde certo tempo que as leis derivam da natureza das coisas e são

regras invariáveis.

E o homem sempre está submisso a leis, seja às que ele mesmo se dá, seja às que

não são originadas de sua natureza individual. Há as “leis possíveis” anteriores às “leis

positivas” que são fixadas pelos homens. As que derivam da própria natureza do

homem são “leis naturais”, as quais são anteriores às “leis positivas”, que são leis da

sociedade (MIRANDA, 1975, p.124).

E este questionamento político – social que a Liberdade democrática da França

conheceu serviu também para o conhecimento da experiência político – social do Brasil.

E Frei Caneca, utilizou-se de tais conceitos, estudos e acontecimentos como propósito

de vida, em prol do ideal: a Pátria independente e soberana.

Toda sua obra, direta ou indiretamente, reflete sobre os grandes acontecimentos

históricos do país, consolidados nos projetos de fundação do Estado, na criação de um

sistema político vazado no Liberalismo, excluindo as correlações autoritárias ou

absolutistas, voltado para um desenvolvimento de igualdade, sem privilegio de classes,

para comunidade nacional. Toda a sua atividade, teórica e prática, vinha de uma

grandeza ética e responsabilidade social.

A pesquisadora Mariana Ribeiro (2005) diz que a cultura do religioso era vasta e

notória, compunha-se de aspectos do liberalismo clássico, principalmente com ideias de

liberdade e igualdade, a um liberalismo mais racional, com pensamento soberano,

autoridade, ordem e obediência.

25

Sua erudição deveu-se provavelmente às intensas leituras absorvidas na biblioteca da Ordem do Carmo, seus contatos com o Seminário de Olinda e com as reuniões informais na Academia Literária do Paraíso. Além de conhecer a teologia filosófica de São Tomás de Aquino (1224-1274), notadamente na obra De Regno, que era um verdadeiro tratado sobre política, Caneca tinha grande familiaridade com os filósofos iluministas das épocas Moderna e Contemporânea, sendo uma das características mais marcantes de seus escritos, o grande número de citações de Charles-Louis de Secondat Montesquieu (1689-1755), de quem muito o inspirou a obra O Espírito das Leis, baseada na teoria dos três Poderes independentes e eqüipotentes, convivendo num regime estável e moderado. Estas idéias foram de importância notória para a fundamentação das críticas ao projeto constitucional outorgado em 1824 por D. Pedro, que instituiu o Quarto Poder (ou Poder Moderador), com direitos de intervenção sobre os demais Poderes. As Cartas de Pítia a Damão, por exemplo, podem ser consideradas bem similares às cartas persas de Montesquieu, pois denota um gênero de análise crítica da sociedade, sob influências muito claras deste pensador (RIBEIRO, 2005, p.17).

Exemplos, deste pensamento regado pelo iluminismo, são as obras didáticas

produzidas por Frei Caneca. Nos textos Tratado de eloqüência extraídos dos melhores

escriptores divididos em três partes, e Taboas synopticas do systema rethorico de Fabio

Quintiliano segundo o compendio de Jeronymo Soares Barboza, o carmelita expressa

todo seu espírito intelectual e político, no qual inspirou-se na retórica de Fabio

Quintiliano para o ensinamento da arte de argumentar e escrever bem.

Nesta tarefa, o carmelita colocou-se como componente da República Literária,

recriminando os “charlatões e pedantes”, que não crêem nas faculdades da inteligência,

e muito menos valorizam a eloquência como capacidade de significar com “deleite os

pensamentos por palavras, para convencer e persuadir; enquanto a retórica, para ele, é a

arte que dirige as disposições naturais do ser humano no uso da eloquência” (MOREL,

2000, p.25).

Expressando-se dessa maneira, Frei Caneca situava-se na esfera pública que transformava o Brasil. A retórica passaria por significativa mudança nesse período, rompendo com a tradição escolástica caracterizada pelos excessivos ornamentos estilísticos e pelo uso e abuso de citações que pretendiam ostentar erudição, tão marcantes no direto e no bacharelismo. A nova tendência definia a retórica como poder de persuasão, sendo associada ao exercício do magistério e, mais ainda, à pedagogia política cultural, visando esclarecimento da humanidade. Dessa forma, retórica e eloqüência eram pontos-chave para a formação das elites ao mesmo tempo XIX. E assim é possível fazer a ligação entre a imprensa de opinião que surgia com força no Brasil do anos 1820-30,

26

com considerável peso na cena pública na nacionalidade, e as duas disciplinas ministradas pelo professor Frei Caneca – que desse modo se identificava com o Brasil (MOREL, 2000, 25).

O carmelita, também, tinha a perspectiva de defender a “catequese do gentio”,

numa referência ao trabalho desenvolvido junto aos índios ao longo do período colonial

por carmelitas e franciscanos. Defensor do equilíbrio dos poderes, sobretudo do

fortalecimento da civilização através da educação, do esclarecimento e da propagação

do saber.

1.3 - Frei Caneca, o sacerdote

Traçar o perfil sacerdotal de Frei Caneca não é uma tarefa fácil, a documentação

histórica é escassa, faltam documentos para retratar com total fidelidade este período da

vida do religioso. O que não falta são referências que falem sobre sua vida política.

Como já citado, Frei Caneca era filho de Domingo da Silva Rabelo e Francisca

Alexandrina de Siqueira. Sua avó materna, Clara Alves de Torres, era filha de Antônio

Alves da Costa Dantas e Maria Pereira de Assumpção. Antonio Alves da Costa Dantas,

bisavô de Frei Caneca, por sinal, tio do padre José Dantas, e de Frei Antônio Alves da

Natividade Dantas, carmelita turonense bem conhecido nas praças de Recife.

Como pode-se observar, entre os antepassados de Frei Caneca há dois padres:

padre José Dantas, e de Frei Antônio Alves da Natividade Dantas. A presença de um

carmelita turonense no seu passado induz à suposição que sua vocação como carmelita

tivesse influência familiar.

Também existem registros que seu pai, Domingos Caneca, era um homem de

muita fé. Em sua casa havia um local sagrado, com vários santos de prestigio, com

expressões de religiosidade e centro de devoção familiar.

(...) Que tormento d’alma sofreu o velho tornoeiro nas horas cruciantes do destino cruel de seu filho amando, carmelita e sacerdote. Alucinado recebeu a notícia da morte horrenda de filho predileto, e, num acesso de desespero, “atirou à rua as imagens do seu santuário, quebrou os móveis e partiu rápido para o convento do Carmo. Apenas tinha chegado o corpo inanimado e ensangüentando do seu filho. Atira-se sobre o

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esquife para beijar o filho dilacerado pelas balas cruéis do inimigo feroz. Neste momento, assoma à porta rei Carlos, que tenta confortá-lo (HUCKELMANN, 1975, p. 55).

Frei Caneca tomou o hábito carmelita no dia 08 de outubro de 1796, no convento

de Nossa Senhora do Carmo, em Recife. Partir de então passou a se chamar Frei

Joaquim do Amor Divino Caneca. O nome Caneca foi em homenagem ao seu pai.

No ano seguinte de sua ordenação, o carmelita fez a solene profissão religiosa,

quando o padre Provincial procedeu a sua entrada definitiva a Ordem do Carmo. Foi

preciso uma licença especial do núncio de Portugal, cardeal Pacca, para que Frei Caneca

se ordenasse em 1801, pois tinha apenas 22 anos. No ano de 1803, foi nomeado

professor de retórica e geometria, exerceu ainda cargos internos, como o de definidor e

o de secretario do visitador frei Carlos de São José, quando desempenhou tal função no

convento carmelita em 1809.

Frei Caneca era, portanto, homem da Igreja Católica, enquanto instituição. Era um católico em sua profissão de fé, jamais acusando de heresia ou blasfêmia pelas autoridades eclesiásticas de sua ordem, nem pelo Santo Oficio (Inquisição), apesar dos embates políticos da Igreja Católica, mas não consta que tenha tido experiência mística marcante, de revelação de Deus, à maneira de São João da Cruz ou Santa Teresa d’Avilla, por exemplo, ou vivenciado um processo de conversão lento e racial até a transparência espiritual, à maneira de Santo Agostinho. Na verdade, Frei Caneca era um homem que tinha familiaridade com a teologia, com textos Bíblicos (Antigo e Novo Testamentos) e com autores iluministas e filosóficos das épocas Moderna e Contemporânea (MOREL, 2000, 24).

Frei Caneca tentou se matricular na Universidade de Coimbra, onde se formou a

grande parte da elite luso-brasileira que assumiria o poder no Brasil após a

Independência, mas foi impedido. Seus estudos aconteceram no Seminário de Olinda,

fundado pelo bispo Azevedo Coutinho, local em que adquiriu todo seu conhecimento.

Os estudos no Seminário lhe deram os diplomas de professor de retórica, filosofia e

geometria, passando a lecionar no Convento do Carmo.

Ao se formar, Frei Caneca foi considerado um homem letrado – os Republicanos

das Letras – por ensinar a ciência das palavras, e, com isso, transformava a consciência

28

da sociedade através de suas pregações e da imprensa. No Brasil, a atividade letrada, no

período colonial, foi um atributo quase que exclusivo dos religiosos. A inquisição, a

censura prévia e a perseguição às ideias após a Revolução Francesa reforçaram ainda

mais o papel da Igreja como formado de intelectuais letrados (MOREL, 2000). Porém, a

Igreja não tinha poder absoluto e exclusivo sobre as atividades letradas no Brasil,

principalmente no final do século XVIII, quando surgiram as primeiras bibliotecas

privadas em poder de leigos. A própria Igreja fazia parte da sociedade, não estava imune

as suas contradições e passaria a abrigar e formar homens letrados identificando-se com

as novas idéias.

O Seminário de Olinda foi um dos principais centros de educação das novas

ideias políticas e culturais da Igreja no Brasil. Frei Caneca foi parte integrante dessa

educação, passando da esfera literária para a política. O frade lembrava com respeito

seu mestre Antonio Francisco Bastos, a quem o chamava de “primeiro geômetra do

Brasil”, com quem estudou e aprendeu mecânica e cálculo e de quem se tornou o maior

adversário.

As atividades de letras, no Brasil colonial, estavam concentravam em grande

parte nas mãos da igreja, comportando-se como entidade de formação dos intelectuais.

Porém, a origem deste ensino teve fiscalização e repressão por infiltrar-se nas ideias da

Revolução Francesa (com a inquisição e a censura prévia), e a Igreja, no século XIX,

também passava por mudanças e contra posições, como acontecia com o país através da

separação do sistema colonial. Assim, não se pode separar o ensino intelectual da Igreja,

nem no que se refere à crença e nem às ideias.

Seminário de Olinda se configuraria em um dos maiores centros de irradiação deste processo de mudanças culturais pelos quais estava passando a sociedade colonial e a Igreja, e de lá sairiam padres como Caneca e outros tantos, capacitados com conhecimentos laicos como naturalismo, matemática, retórica e filosofia ilustrada, que depois se rebelariam em movimentos como os de 1817 e 1824. Assim, podemos entender uma certa aproximação entre religião e modernidade político-cultural que estava em efervescência no Brasil do século XIX, como se a crença religiosa começasse a tangenciar, ou mesmo fazer parte, dos preceitos de uma nova forma de se pensar uma sociedade, fundamentada numa razão científica iluminista (RIBEIRO, 2005, p. 33).

Ao assinar documentos ou depoimentos, Frei Caneca fazia questão de mostrar

suas condições de professor, assinando como “Lente de Matemática” ou “Lente da

29

Geometria”. A geometria para o carmelita é a balança, a filosofia da vida que equilibra

a vida social e nacional e traz a ordem e bem – estar dos povos. (HUCKELMANN,

1975, p. 59). E, por meio desta ciência, ele relatava a existência do Supremo Arquiteto

do Universo, em consonância com os termos e a instrumentalidade geométrica.

O religioso, segundo MOREL (2000) e HUCKELMANN (1975), ao assinar os

documentos, não se referia nesta expressão ao simbolismo da maçonaria e tal conclusão

contraria o sentido da geometria em sua interpretação filosófica. Ele vive tanto nesta

filosofia geométrica que até usa o termo “O Supremo Arquiteto do Universo” em seus

sermões. Em seus estudos sobre “As sociedades secretas de Pernambuco” jamais se

confessa adepto de um ou outro agrupamento com os maçons.

Frei Caneca, baseado nos estudos da construção da sociedade sobre as “novas

idéias”, escreve textos eruditos, de posição política, descrevendo as associações e

sociedade que surgiam na ocasião. Foram sobre a Maçonaria, o Apostolado, a

Beneficência e a Jardineira, também conhecida como Keroptica. A Jardineira buscava a

libertação da humanidade, não especificamente de uma classe social ou grupo social,

sem embarcar em complôs ou desafios à lei. Também não se importava com a

obediência dos sócios e nem em controlar o cumprimento das regras ao “supremo autor

da natureza”, assim chamavam a Deus.

O Apostolado tratava-se de uma confraria inspirada nos grupos ibéricos –

católicos e contra – revolucionários, tinham sua sede na Corte (Rio de Janeiro). Frei

Caneca os descreve como “clube de corrompidos e estúpidos aristocratas, propagadores

da monarquia absoluta, do despotismo e da tirania, cujo objetivo era manter no poder o

ramo mais arbitrário da dinastia de Bragança” (MOREL, 2000, p. 58).

A Beneficência, também conhecida como São José, seria como uma loja, nos

dizeres da época, que não seguia de maneira rigorosa os rituais maçons. Segundo o

religioso, era um grupo novo, sem estatutos e regras definidos, copiando algumas

cerimônias maçônicas. Em seus encontros agrupavam jovens que começaram evitar a

companhia de certas pessoas consideradas por eles corruptas ou desacreditadas, e surgiu

como idéia de formar círculo fechado e com novos pensamentos, mas sem objetivos

precisos.

Por fim, a Maçonaria, que na época havia quatro lojas em torno do Grande

Oriente Provincial. Frei Caneca discorre sobre as questões políticas, organizacionais e

de poderes que envolvem a sociedade secreta. Além disso, teve fontes privilegiadas

sobre o assunto. Em 1821, o carmelita pernambucano conheceu Boissy, um francês

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representante de uma antiga loja de seu país de origem, que junto com o comerciante

português Brancfort, viajam pelo mundo estabelecendo vínculos com a maçonaria.

Ambos deram ao religioso informações que divulgou em seus textos, inclusive o nome

de seus informantes.

Sobre o assunto, Caneca tinha três preocupações: de mostrar que não havia

incompatibilidade entre as maçonarias e a religião católica, divulgar informações sobre

essa associação e mostrar que o Grande Oriente, em 1822, teve papel decisivo no

processo de independência do Brasil.

E ao se pronunciar com certo entusiasmo e conhecimento sobre a Sociedade

Secreta e de utilizar os termos dentro da geometria – “O Supremo Arquiteto do

Universo” - muitos afirmam que Frei Caneca fez parte da maçonaria e traindo sua fé.

Sabe-se que o frade também freqüentou a Academia Literária do Paraíso, uma

associação com a participação de ilustrados intelectuais, principalmente ligados ao

clero. Em seus encontros, conversavam sobre o liberalismo francês e americano, e como

absorverem destas ideias perante a sociedade.

Agremiação deste tipo eram relativamente comuns no Brasil desde o século XVIII. No que diz respeito a Pernambuco, afirma Tobias Monteiro, que “era o maior foco de liberalismo, de aspirações de autonomia e de tradição guerreira existente em todo o Brasil. Nas academias, filhas do areópago, fundado por Arruda Câmara, associações secretas - XVIII e XIX (RIBEIRO, 2005, p. 17).

O carmelita era devoto de Nossa Senhora do Carmo, que sob sua proteção

conseguiu alcançar seus objetivos religiosas e ideológicos. Por ocasião da aclamação do

Augusto Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brasil, o senhor Dom Pedro

I, realizou no dia 08 de dezembro de 1822 uma solene festa religiosa na igreja matriz do

Corpo Santo, com assistência de uma junta provisória, o governador das armas, a

relação, clero, nobreza e povo. Foi nesta solenidade que Frei Caneca fez seu sermão,

com o tema: Maria, Maria de Jesus Cristo! É festa da Imaculada Conceição! O discurso

elogiava o senado da vila pela feliz escolha do dia festivo em homenagem ao imperador.

O dia é aquele em que a esposa do Cordeiro sem mancha, quero dizer, a santa igreja, cheia de jubilo, celebra o augusto mistério da Conceição Imaculada daquela criatura venturosa, que, descendendo de Abraão e de David, foi escolhido antes de todo criado para ser mãe do Verbo Eterno,

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e nosso Redentor, Jesus Cristo. (OBRAS POLÍTICAS E LITERARIAS, 1979, p. 235).

Frei Caneca mostrou-se competente na sua missão de evangelizador e soube

conduzir sua oração e fé a quem precisava. No livro Obras políticas e litterarias – Frei

Joaquim do Amor Divino Caneca consta a parte “Orações sacro – apologéticas”, que

reúne seus dois principais textos sobre a oração e sua fé. O primeiro “Sobre a Oração”,

que proferiu no dia 14 de fevereiro de 1823, na capela da Venerável Ordem Terceira do

Carmo do Recife, foi um sermão que levantou grande repercussão, tanto que sua

publicação original foi negada e Frei Carlos de São José refez o texto para divulgar. Seu

contexto atacava aqueles que viviam sobre o fanatismo, que viviam a custa da piedade

cristã. O sermão coloca a oração sobre a vida cristã e lhe dá devido lugar na vida de fé,

livrando-a de qualquer aparência de falso pietismo ou fanatismo vulgar.

O segundo texto é o já citado sobre o dia 08 de dezembro, dia da Imaculada

Conceição.

Um duplo vínculo com os sacramentos de Deus ligava a vida de Frei Caneca: o

sacerdócio e o matrimônio. O religioso carmelita fez os votos perpétuos, entre a

castidade, e sua dignidade sacerdotal, pela qual ele ofereceu a sua vida espontaneamente

a Deus, para servir a Igreja e no claustro aos seus irmãos, sem compromissos alheios e

com a fidelidade de homem devotado a Deus. Porém, quebrou a promessa da castidade

e de uma união ilícita nasceram cinco filhos, três meninas e dois meninos.

O respeito ao celibato era quase norma entre o clero, e o número de filhos de padres muito significativo – comportamento aceito sem maiores escândalos pela sociedade e tratado com tolerância pela Igreja. Mais da metade dos padres tinham filhos nas primeiras décadas do século XIX em Salvador. E somente 25% declararam em testamento ter apenas um filho; 40% deles chefiavam famílias numerosas, com três filhos ou mais, o que descarta que tais crianças fossem frutos de relacionamentos acidentais ou de momentâneas “fraquezas da carne” (MOREL, 2000, p. 21).

Muitos autores relatam que a mulher de Frei Caneca era chamada de Aiaiá para

não ser identificada, pois naquela época não podia deixar que descobrissem sua ligação

com o religioso. Os exemplos eram muitos de mulheres estupradas ou com as mãos

estouradas à palmatória, em que o crime era apenas de serem esposas ou amigas de

revolucionários.

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Todavia, após pesquisas realizadas em documentos históricos descobriram que a

mulher amada era Marília de seus poemas. E as filhas que tiveram eram apresentadas

como suas afilhadas, assim, seria uma maneira de esconder sua paternidade. Às

vésperas de morrer, escreveu uma carta para cada uma de suas filhas: Carlota, Joana e

Ana, se despedindo.

Eu, pelo perigo em que me acho, já nada te posso fazer. Agora só tens por ti a Deus e tua madrinha. Ela agora é tua mãe, ela te faço todo beneficio, pois bem sabes que tua Aiaiá nada pode fazer-te (Trecho da carta escrita por Frei Caneca a sua afilhada Joana, cujo à chamava de Joaninha) (CANECA, 1979, p.140).

Na hora de sua morte, Frei Caneca se preparou condignamente, assistido na

véspera por seu amigo Frei Carlos São José e foi confortado por ele pelos sacramentos.

Na manhã seguinte, foi acordado pelo mesmo, se preparou para sua via sacra ao

encontro da morte, e não houve complacência para com ele pela justiça humana.

Símbolos do poder religioso foram palco de um embate em torno do condenado.

O padre diocesano, cônegos e religiosos de todas as ordens da capital pernambucana

foram em procissão ao Palácio do Governo para pedir ao brigadeiro Lima e Silva que

suspendesse a execução para aguardar respostas do pedido de clemência enviado ao

imperador. Porém, o militar se recusou e ainda ameaçou a todos de prisão.

E, em frente a Igreja de Nossa Senhora do Terço, Frei Caneca passa pela sua

degradação eclesiástica, foi despido de suas vestes sacerdotais e declarado indigno de

ser sacerdote.

Por fim, Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo Caneca é executado. E até os dias

atuais não se tem informações corretas sobre seu sepultamento, apenas que seu corpo foi

enterrado pelo amigo frade Carlos São José, na Basílica de Nossa Senhora do Carmo.

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1.4 – O amigo, jornalista, Cipriano Barata

Cipriano Barata foi um dos primeiros redatores a exercer o jornalismo opinativo

no Brasil, no qual Frei Caneca se espelhou, tanto como jornalista quanto revolucionário.

Cipriano José Barata de Almeida, conhecido apenas como Cipriano Barata,

nasceu na freguesia de São Pedro Velho, em Salvador, concluiu seus estudos primários

na Bahia, seguindo para Europa para estudar na Universidade de Coimbra (a

Universidade tão sonhada por Frei Caneca). Lá, formou-se em filosofia e matemática.

Iniciou o curso de medicina, porém não concluiu, e ao retornar à sua cidade natal,

dedicou-se a cirurgia e à lavoura de açúcar, e ao mesmo tempo atuava com a política

entre os agricultores.

Já no ano de 1798, de acordo com Fernando Segismundo (1962), Barata tornou-

se um revolucionário, no primeiro movimento de massa do Brasil que ficou conhecido

como Revolta dos Alfaiates, e na mesma ocasião iniciou sua carreira como jornalista.

Posteriormente se envolveu com a Revolução de 1817, em Pernambuco.

Juarez Bahia (2009, p.100) o descreve como jornalista político, agitador, líder

popular, e sua atividade revolucionária na imprensa o projeta como um campeão das

liberdades públicas. Também foi precursor das lutas pela da Independência, suas ideias

cominavam com a revolução francesa, pregavam pela justiça social, e ainda iam de

acordo com pensamentos maçons.

Ao contrário dos jornalistas da época, Barata quis morar no interior afastando-se

da corte.

Criador das Sentinelas da Liberdade, a primeira Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco é apontada como segundo entre os jornais republicanos do Brasil, depois de O Maribondo, editado no Recife a partir de 25 de julho de 1822. De 1823 até 1889, Sentinelas circulam em todo o país como sinônimo de jornalismo de combate (BAHIA, 2009, p.100).

Já no ano de 1821, Cipriano foi eleito pela Bahia, deputado das Cortes de

Lisboa, e, em 1822, deputado constituinte. Todavia, após não aceitar as decisões da

Assembléia Constituinte retorna ao Brasil, precisamente à Recife, e lança seu primeiro

jornal, Sentinela da Liberdade da Guarita de Pernambuco.

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No ano seguinte, 1822, Cipriano é preso, sempre mudando de cárcere. Porém,

toda vez que retornava à sociedade sua glória aumentava. E, mesmo preso, o jornalista

continuava a editar o Sentinela. Bahia (2009, p. 107) relata que o número 66 do jornal

sai com o título de Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco, atacada e presa

na Fortaleza do Brum por ordem da força armada reunida, no qual denunciava a

violência que sofria e protestando contra o arbítrio e a ilegalidade por ser, ele, um

deputado.

E, por meio às turbulências, a Sentinela deixa de publicar por algum tempo.

Porém, nesta ocasião, surge um jornalista herdeiro de suas ideias e ações para dar

continuidade ao seu trabalho. Frei Caneca começa editar o Typhis Pernambucano, com

o objetivo de dar continuidade ao jornalismo iniciado por Barata. Já em sua primeira

edição, o carmelita ressalta:

Para desgraça deste império realisaram-se (sic) os temores dos que sabiam pesar o perigo a força armada nas mãos de um príncipe jovem, rodeado de lisongeiros sem caracter, inimigos encarniçados do Brazil; verificaram-se todas as previdências do espírito presago do Sentinella da Liberdade; e o augusto e sagrado recinto dos representantes da grande nação brazileira, as duas horas da tarde do já dito dia 12 de novembro, foi atacado pelo esquadrão de cavallaria de Minas e batalhão de caçadores de S. Paulo, duas peças de artilheria montada, postada em frente do edifício, os botafogos com murrões acesos, a cavallaria com as carabinas engatilhadas, tudo em um ar ameaçador e hostil (CANECA, 1979, p.418).

Depois de uma luta incansável por causas sociais, Cipriano Barata morre no dia

11 de julho de 1838, em Natal – RN, onde viveu na pobreza nos dois últimos anos,

sobrevivendo como professor, farmacêutico e clínico.

1.5 - Revolução de 1817

No início do século XIX, o Brasil vivia uma época de grande prestígio aos

pensadores iluministas, e isso fez o país passar por transformações. Antes de relatarmos

a Revolução de 1817, vamos fazer uma retrospectiva para entendermos a situação da

nação, naquela ocasião.

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No ano de 1808, a família Real Portuguesa chegava ao país fugida das tropas de

Napoleão, e o Brasil deixava de ser colônia de exploração e passava a ser sede do reino.

A abertura dos Portos para o capitalismo inglês criou uma euforia, que logo agravou-se

numa crise, pois matérias – primas iam saindo cada vez mais e os pequenos lucros

ficavam com a administração colonial.

A nobreza para poder sobreviver criou taxas e impostos, aumentando a carga

tributaria do país. Os escravos pagam com trabalho braçal, as classes intermediárias

perdiam as oportunidades de ascensão e os fazendeiros tinham que pagar cada vez mais

os impostos deixando os cofres portugueses ricos.

O Rio de Janeiro transformou-se na nova capital do país luso-afro-brasileiro, e

com grandes dificuldades tentou-se livrar da situação de colônia ser uma sociedade

moderna. Fundou-se o Banco do Brasil, a Biblioteca Nacional, a Imprensa Régia, e uma

rede de órgãos ligados ao governo.

A nova capital tornou-se uma sociedade com estilos mais variados de cidadãos.

Grande número de artistas, pintores, escritores, comerciantes, jornalistas, diplomatas,

escritos, entre muitos outros, invadiram o Rio de Janeiro trazendo diversas novidades e

inovando a vida política, social, econômica e artística do Brasil.

Ainda com a recente independência da América do Norte e os ecos da

Revolução Francesa traziam para o Brasil estímulos ideológicos (como citado

anteriormente): liberalismo político e econômico, democracia constitucional,

patriotismo, direito de liberdade etc. E, com isso, começou a surgir uma crise social e as

relações de produção estavam servindo de limitação para o crescimento das forças

sociais. Situação que começou a gerar conflitos.

No nordeste havia uma grande ansiedade pela revolução, todos queriam saber

das novidades e se envolverem com os conflitos, principalmente em Pernambuco.

Clubes secretos, academias maçônicas, quartéis engenhos e conventos avantajavam-se

das ideias iluministas e do desagrado social. Por meio desta situação, denunciantes

fazem chegar ao governador Caetano Pinto Montenegro7 a existência de uma

conspiração, e o próprio mandou prender todos os rebelados envolvidos. E no quartel, o

7 Caetano Pinto Montenegro foi capitão – general e governador da Província de Pernambuco entre os anos de 1804 e 1817, quando foi derrubado pela Revolução de 1817. Após, incorporou o ministério do imperado D. Pedro I, ocupando a pasta da Justiça, entre 16 de janeiro de 1822 e 17 de julho de 1823, e foi retirado o Ministério por José Bonifacio.

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capitão José Barros Lima, conhecido como “Leão Coroado”, resistiu à prisão, matou os

oficiais e o movimento se antecipou.

Em dois dias a situação tomou conta do Nordeste, os rebeldes continham a

cidade, expulsando as autoridades, e no dia 06 de março de 1817 iniciou-se a Revolução

Pernambucana.

“Viva Nossa Senhora! Viva a liberdade! Morram os aristocratas!”, dizia o padre

João Ribeiro, assim, que confirmou a expulsão dos governantes coloniais da província.

A revolução durou dois meses e meio e foi o mais extenso e significativo acontecimento

antes da independência do Brasil. De início criaram um governo Provisório com

representantes de todas as classes: padre, fazendeiro, comerciante, juiz e militar.

Também foi criada uma bandeira, um hino e um decreto que pretendia estabelecer a

igualdade entre todos. Aquele momento, Republicano, todos queriam ser chamados de

patriotas ou de vós. Isto é, um escravo chamaria seu senhor de patriota ou vice – versa.

O movimento foi uma resposta de setores a população da América portuguesa a esse agravamento da centralização política, com consequências sociais e econômicas, sobre tudo o aumento da carga de impostos sobre as propriedades rurais (MOREL, 2000, p. 37).

Os novos republicanos fazem a tentativa de levar o movimento para Bahia, mas

foram frustrados. Ao chegarem – na Bahia - o conde dos Arcos havia abafado os

rumores da inquisição e organizou expedição militar, por terra e mar, com

aproximadamente cinco mil homens, que rapidamente acabaram com os revoltados. E,

no Rio de Janeiro, Dom João VI tomou iniciativa e coordenou a regulamentação de

mais de sete mil soldados, que foram a Pernambuco para derrotar a República.

“A República fora derrotada por armas” (MOREL, 1987, p.25). Diversos líderes

foram mortos, entre eles o padre João Ribeiro, 350 pessoas morreram nos combates e as

prisões ficaram lotadas.

Porém, nesta grande confusão onde se encontra Frei Caneca? De acordo com os

estudos do professor Marco Morel (2000), Frei Caneca não participou da Revolução de

1817, ao contrário do que muito afirmam, embora tenha sido um dos presos com derrota

do movimento. De acordo com os documentos e testemunhos da época, não se

encontram registros que ele tenha participado de reuniões, redigido textos ou tido algum

envolvimento partidário.

37

Diferentes explicações podem ser relatadas para recorrente afirmação de que o

carmelita não teria sido um dos expoentes de 1817, escritores que testemunharam os

episódios trazem informações importantes sobre o assunto, como por exemplo, os

relatos do comerciante Tollenare, que assistiu de perto os acontecimentos, até mesmo

sendo mediador entre os republicanos e os legalistas, não se refere a Frei Caneca nem

uma única vez.

Os principais relatos são escritos pelo próprio religioso. Em fevereiro de 1817,

dias antes da explosão do movimento, Caneca solicitou ao governador da capitania,

Caetano Pinto de Miranda Montenegro, a vaga de catedrático de geometria das Aulas

Régias. E, o então governador, respondeu relatando que o professor nomeado ao cargo

não havia aparecido para assumir sua cadeira e se esperasse um mês o cargo seria de

Caneca. Porém, a Revolução acabou com seus planos.

Frei Caneca foi preso, arrancado do convento. De maneira humilhante, desfilou

pelas ruas de Recife acorrentado, conduzido por soldados e acompanhado por uma

banda militar que tocava, chamando a atenção de todos para ver o espetáculo. Esse

acontecimento gerou tamanha tensão em Pernambuco que as autoridades tiveram receio

de outra revolução. Ele e os outros presos foram mantidos no porão de um navio e

transferidos para Salvador, Bahia. E durante a viagem todos permaneceram

acorrentados ao chão, sem poderem se levantar ou conversar.

Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo Caneca havia sido preso e acusado por ter

participado de treinamentos de guerrilha, marchado juntos com tropas de rebeldes em

direção ao Norte, de ser amigo do padre João Ribeiro e de ter ligação direta com o

movimento de 1817.

Quando estava preso, Caneca chegou a enviar dois pedidos para que fosse solto:

um para d. João VI e outro para frei Inocêncio Antônio das Neves Portugal. E nesses

pedidos ele faz sua defesa e esclarece seu envolvimento na revolução. Sua defesa vinha

nos seguintes termos (MOREL, 2000, p.47).8

8 Esses escritos foram retirados do livro do professor Marco Morel “Frei Caneca, Entre Marília e a Pátria”, 2000, p. 47. “Trecho livremente extraídos de dois documentos. Officio que Frei Joaquim do Amor Divino Rabello e Caneca da Bahia, a 24 de julho de 1820, dirige ao p.m. dr. Frei Antonio das Neves Portugal (...) Acompanha-o sua defesa, a que o auctor allude no officio, defendendo-se da acusação de comparticipar na revolta de Pernambuco de 1817. Copia auth., com assinatura autografada do autor. E ainda: Petição de frei Joaquim do Amor Divino Rabello Caneca e frei José Maria do Sacramento Braimme a S.M. d. João VI, suplicando que sejão soltos sem mais delonga declarando devem ser incluídos no mencionado Decreto de 06 de fevereiro de 1818. Ambos encontram-se na Divisão de Manuscritos da Fundação da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, contando o primeiro do Catálogo de Expedições Históricas do Brasil da Biblioteca Nacional n.º 6.781. estes documentos são sistematicamente ignorados pela maioria dos historiadores que estudam Frei Caneca.

38

Sou um homem que, pela profissão religiosa, voltei-me para uma vida de mansidão e recolhimento na Ordem do Carmo da Província Reformada Turonense, onde, além de exercer cargos eclesiásticos, sou professor de Filosofia, Retórica História e Geometria. Todos sabem que não só não participei de nenhum dos atos revolucionários de 1817 como no convento sempre declarei contra eles. Mas o que me faz saltar as barreiras do acanhamento religioso e pedir minha liberação destes cárceres onde tenho padecido é minha pobre e numerosa família. Tenho feito grande falta às minhas três irmãs solteiras e duas sobrinhas órfãs, que não acham o necessário arrimo em meu pai, com o peso de 67 anos. Prostro-me com a maior submissão diante do Trono, confiando na Humanidade de nossos governantes.

Em outro pedido, o carmelita continua suas explicações:

Nunca participei de nenhum tipo de exercício militar, não sou soldado nem tenho condições de ser. Apenas, certo dia, passando pó acaso no quintal da Ordem Terceira do Carmo, ouvi movimentação fora do comum, fiquei curioso e entrei para olhar, durante algum tempo vi o que se passava lá, onde vários pessoas exercitavam-se em armas numa tremenda confusão. É verdade que acompanhei o corpo militar de rebeldes como capelão. Mas fiz isso constrangido. Foi no dia 20 de abril, quando recebi ordens expressas de meu superior, Prior do convento, frei Antonio São José Holanda, que não queria se comprometer com nenhum dos dois lados do conflito. Ao ser procurado pelos chefes revolucionários, frei Antonio designou-me, sem direito a excusas, como capelão das ditas tropas. Fiquei constrangido no meio da tropa onde os homens já estavam, insensatos pelo terror e logo em Olinda desliguei-me do grupo, escondendo-me inicialmente na casa de um amigo e depois no Convento da Ordem na cidade de Goiana.

Continua, então, Frei Caneca:

As calunias de meus encarniçados inimigos são têm limites. Conheci padre João Ribeiro pelo fato de sermos da mesma cidade e religião. Mas era apenas um relacionamento de urbanidade e nunca o procurei durante a rebelião, estive com ele só quando me tornei capelão da tropa. As duas testemunhas de acusação contra mim foram frei José de Santa Tereza e frei Antonio, ambos carmelitas. O primeiro quis vingar-se porque reprovei-o em gramática latina quando foi meu aluno. O segundo, que é Caixa da Ordem, ambicionava o cargo de Secretário Visitador, para qual eu deveria ser indicado no próximo Capítulo Provincial. Ambos uniram-se e denunciaram-se como cabeça da

39

Revolução. É da disputa por este emprego que nasceu a denúncia. Minha prisão resulta de intriga da comunidade.

O carmelita ficou preso durante quatro anos, entre 1817 e 1821. Os primeiros

anos na prisão decorreram de terríveis sofrimentos e castigos, passou fome, sede,

desconforto e ficou sem comunicação com outras pessoas.

Após meses o conde dos Arcos, que era responsável pela prisão, foi substituído.

Com isso, mudou-se o tratamento com aqueles que estavam presos. Puderam se

alimentar melhor, receber tratamento humano e, também, estudar e praticar diversas

leituras.

Passaram, então, os encarcerados a obter conhecimentos doutrinários de livros

que ganhavam. No inicio eram folhetins romances, depois passaram aos livros de

direito, história, poesia e línguas estrangeiras. Organizaram, no presídio, uma escola em

que cada um ensina o que sabia aos outros companheiros. Antonio Carlos de Andrade

(irmão de José Bonifácio) lecionava aulas de inglês, Frei Caneca ensinou geometria e

cálculos.

Entre seus afazeres o carmelita redigiu, na prisão, o texto Breve compendio de

grammatica portugueza organizado em forma systematica, com adaptação a

capacidade dos alunos, onde desenvolveu uma metodologia que realça o uso das regras,

para se conseguir à perfeição do aprendizado. Esse volume foi organizado por duas

freiras do Convento do Desterro, d. Rosa e d. Cândida Luíza de Castro, reclusas, que

sem conhecerem pessoalmente Frei Caneca, tiveram um vínculo de solidariedade com

ele, mandaram-lhe comida, roupas e livros na prisão. Em troca, ele criou esse método de

ensiná-las por correspondência. Na época o ensino era negado as mulheres.

Com a Revolta Liberal9 do Porto, em 1820, os alicerces do Antigo Regime

português ficam estremecidos, inclusive na América portuguesa, isto é, o Brasil. O

absolutismo é rapidamente substituído pelo constitucionalismo, a liberdade de imprensa

começa a substituir a censura prévia. A Inquisição é eliminada em Portugal, os capitães

da América perdem seus postos para o governo provisório (algo semelhante ao que

9 Mesmo com a derrota de Napoleão, D. João VI permanecia no Brasil. Em 1820, a população portuguesa, liderada pela burguesia, se revoltou e exigiu que as tropas inglesas de Beresford saíssem do país. Foi convocada uma Assembléia Constituinte e derrubaram o absolutismo. O rei seria o mesmo – D. João -, mas teria que obedecer à Constituição criada pela Corte. A notícia chegou ao Brasil e recebeu apoio dos grupos contrários. Queriam que D. João voltasse para Lisboa e, em 1821, o rei retorna à seu país.

40

aconteceu na Revolução de 1817). Ainda acontecem batalhas judiciais e políticas

forçando a abertura das prisões. No dia 10 de fevereiro de 1821 Frei Caneca é liberado

da prisão e retorna para Pernambuco, sua terra natal.

1.6 - A Liberdade

Após a liberdade, Frei Caneca ainda sentia o peso da permanência naquele lugar,

em meio às transformações, precisava voltar ao cotidiano. O antigo regime absolutista

desfazia-se, tendo como cenário o espaço urbano (MOREL, 2000). Observa-se que a

cena política e social havia mudado e seu olhar também se modificava.

O religioso começava naquele momento um projeto de construção de uma

sociedade com “novas ideias”, e, agora, sua postura não estava mais escondida, assumiu

seu caráter revolucionário. Joaquim do Amor Divino Rabelo Caneca passaria a ser um

personagem de destaque, atuando com a expressão da palavra, escrevendo ou

discursando. Sua linguagem não era das mais fáceis, principalmente para aqueles não

tiveram a oportunidade do estudo, mas o conteúdo era nítido para todos: buscava a

liberdade moderna as legitimando pelas antigas tradições.

Nesse período escreveu "Dissertação sobre o que se deve entender por pátria do

cidadão e deveres deste para com a mesma pátria" (1822), onde preocupou-se em

mostrar a possibilidade da união entre os portugueses de ambos os hemisférios, sobre os

auspícios da monarquia constitucional.

Em 1822, acontece a Independência do Brasil10. E, pela falta de comunicação da

época a notícia do grande acontecimento, da libertação brasileira, chega a Recife com

mais de semana de atraso.

10 A Independência acontece quando a Corte do Brasil não consegue mais negociar com a Corte de Portugal. O Brasil queria construir uma Assembléia Constituinte e Portugal não aceitava. “Naturalmente que cada atitude de independência do Brasil do governo brasileiro, agora liderado por José Bonifácio, repercutia negativamente em Portugal, provocando indignação e revolta entre os portugueses” (LUTOSA, 2003, p.32). Os portugueses achavam que a população brasileira era negra, selvagem e sem cultura, e está situação, gerou revolta m alguns brasileiros que chegaram a mudar o sobrenome de origem portuguesa. A política liderada por José Bonifácio agia como se a nação fosse livre, mesmo antes da Independência. E no, então, dia 07 de setembro de 1822, durante a viagem de D. Pedro à província de São Paulo, foi dado grito do Ipiranga, o grito de liberdade. “Após a Independência, os grupos que cercavam d. Pedro e que vinham se enfrentando de forma cada vez mais agressiva desde o começo do governo Andrada entraram em choque direto por conta das definições do poder que teria o imperador” (LUTOSA, 2003, p.33). De

41

No dia 08 de dezembro de 1822, celebra-se, em Recife, a aclamação de D. Pedro

I, imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brasil. Festejos e solenidades foram

promovidos pelo Senado da Câmera, com a presença de toda a autoridade local, clero,

burguesia e o povo. Na ocasião, Caneca fez o sermão, de uma hora e meia, inspirado nas

palavras do evangelista Mateus e correspodentes à data de Nossa Senhora da Conceição

– Maria, de qua natus est Jesus, qui vocatur Christus. Ao termino, os que estavam ali

presente afirmaram que tal reconhecimento do novo monarca era uma mudança de

“pacto social”, retomando expressões difundidas por Rosseau. E nesses dois pactos –

constitucionalismo e pacto social – a expectativa não era arcaica, mas característica das

“novas ideias” e da liberdade moderna.

1.7 - Constituição 1823 e 1824

Após a Proclamação da Independência do Brasil, sucedeu uma discordância

entre os radicais e os conservadores na Assembléia Constituinte. A Independência não

foi solidificada com aclamação do imperador, mas sim em sua Constituição, e a

Assembléia Constituinte deu início ao trabalho no dia 13 de maio de 1823, quando d.

Pedro discursou sobre seus pensamentos e o que esperava dos legisladores.

Os constituintes ficaram divididos, uma parte seguiu a orientação liberal –

democrata, buscavam uma monarquia que respeitasse os direitos dos cidadãos, assim,

diminuindo o poder do imperador. (Dom Pedro queria exercer o poder sobre o

Legislativo por meio do voto). Com isso, iniciou-se uma discórdia entre os pontos de

vista.

Irritado com a situação, D. Pedro determinou que o exército invadisse o plenário,

no dia 12 de novembro de 1823, levando preso e exilando os deputados que eram contra

suas ideias, e este acontecimento ficou conhecido como “A Noite da Agonia”

Ao dissolver a Assembléia Geral, Dom Pedro I designou um conselho presidido

por ele próprio para criar-se uma Carta Constitucional, e, na ocasião, fez um discurso

um lado, os maçons comandados por Gonçalves Ledo queriam que D. Pedro jurasse a Constituição antes mesmo de ser formulada e render o imperador à Assembléia. E, de outro lado estava José Bonifácio tentando garantir o poder ao imperador. Esta situação causou grandes atritos políticos, até que D. Pedro estendeu a guarda, José Bonifácio renunciou ao cargo e três dias após reasssumiu.

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longo que adverte contra o despotismo democrático e defenderia a Constituição, caso,

ela fosse digna do Brasil e dele

Esse Brasil, do qual se falava, era minoria dos ricos que estavam presente na

Assembléia. Como havia muitos interesses divergentes, começaram os conflitos. O

Imperador hostilizava os portugueses residentes no Brasil e os portugueses, para se

defenderem, apoiavam suas pretensões autoritárias.

Outro motivo de conflito foi que o deputado Antonio Carlos de Andrada e Silva

(irmão de José Bonifácio) havia elaborado um projeto Constitucional em que propunha

limitação ao poder do Imperador. Porém, Dom Pedro não estava disposto a aceitar

limitações a seu exercício do poder, ele era autoritário. Rejeitou o projeto e mandou que

as tropas fechassem a Constituinte.

Uma nova Constituição é assinada e jurada pela Câmera do Rio de Janeiro, no

dia 09 de janeiro de 1824, porém as Câmeras de Olinda e de Recife se negaram assinar,

e aos de 25 março de 1824, a Constituição11 é outorgada pelo monarca.

Frei Caneca, indignado pelas atitudes do Imperador, publica Cartas de Pítia a

Damão que tinha a preocupação de fazer uma reflexão sobre a Constituição que se

instalava no país.

Em seguida, o carmelita passa a publicar o seu jornal Typhis Pernambucano12,

pregando abertamente a luta dos revolucionários. Tifis, na mitologia grega, era um

argonauta que partiu atrás do Carneiro de Ouro, em busca do imprescindível e até então

inatingível. Nascia, então, o argonauta – o cidadão navegador.

O jornal começou a circular no dia 25 de dezembro de 1823, “sob o impacto da

notícia da dissolução da Assembléia Constituinte que acabara de chegar à província”

(MOREL, 2000, p. 69). Frei Caneca se expressa por toda uma região que, perseguida

pelo absolutismo imperial, começava a fundir a luta armada. Era um ensaio de

modificar-se profundamente a situação do país que surgia, antes que se parasse

11 A Constituição de 1824 tinha alguns princípios liberais, mas sua base era o autoritarismo. De inicio, o voto era censitário, ou seja, só podia votar quem tivesse uma alta renda superior a 100 mil reis anuais e fosse maior de 25 anos. Ainda, o voto era indireto, tinham que escolher os votantes e tais escolheriam em quem votar. O Poder Legislativo era formado pela Assembléia Geral do Imperador, composta pela Câmera doa Deputados. O poder Judiciário tinha os juízes dos tribunais nomeados pelo Imperador. O poder Executivo tinha como chefe o imperador e era exercido pelos ministros, que ele nomeava sem dar satisfações ao povo e à Assembléia. O destaque maior foi o chamado Poder Moderador, que dava poderes quase ilimitados ao imperador, que, assim, tinha autoridade indiscutível sobre os três poderes. 12 O Typis Pernambucano teve uma curta duração. Foram publicados 28 números, entre o dia 25/12/1823 e 12/08/1824. O jornal era do tamanho 30X21 e tinha oito páginas. Trazia logo abaixo do título os seguintes dizeres, do poema os Lusíadas: “Uma nuvem que ares escurece, sobre nossas cabeças aparece”.

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novamente um berço esplêndido, sem romper todas as amarras coloniais. Era o Frei

Caneca que se utilizava de todos seus filósofos e exemplos bíblicos, da retórica,

enveredava pela trilha da desobediência civil.

1.8 - Confederação do Equador

Como apresentando no item anterior a Constituição de 1824 era autoritária e

centralista. O Rio de Janeiro tinha se transformado na capital do país, e até as

importações tinham de passar pela cidade e pagar os impostos. E o Nordeste não

aceitava isso.

Pernambuco já tinha passado pela Revolução de 1817, e alguns dos antigos

líderes revolucionários lá estavam para, novamente, começar uma rebelião. Além, dos

latifundiários, força dominante no movimento, havia aqueles que, ainda inspirados na

Revolução Francesa e na independência da América do Norte, sonhavam com

liberdades democráticas reais. A Constituição outorgada seria o motivo que os

revoltosos procuravam para iniciar um novo movimento.

Buscando maior autonomia para a província, os latifundiários não abriam mão

de ter o ex – revolucionário de 1817, Manoel Carvalho Pais de Andrade, como

governador. Porém, Dom Pedro I não aceitou, e enviou o inglês John Taylor.

Todavia, os Pernambucanos não aceitaram a imposição do imperador e

proclamaram a Confederação do Equador, obtendo a adesão do Ceará, do Rio Grande

do Norte e da Paraíba.

A idéia era clara: já que o Nordeste continuaria subordinado à capital, a solução

seria criar um novo país, independente do Brasil, formado apenas pelas províncias

daquela região.

Dom Pedro I não queria perder nenhuma parte do país. Fez um empréstimo com

os ingleses, comprou armas e munições e contratou homens britânicos. A repressão foi

cruel. Os ingleses incendiaram Recife. O governo imperial efetuou centenas de prisões e

espancamentos. Várias pessoas foram mortas. Depois alguns líderes populares

capturados foram enforcados. E a Confederação durou três meses.

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A figura de Frei Caneca é considerada com um símbolo da rebeldia. Seu jornal,

Typhis Pernambucano, era um dos principais fatores de animação e orientação referente

à Confederação. Lido ansiosamente pelos rebeldes. Nas grandes assembléias públicas

suas palavras eram uma das mais ouvida. O carmelita procurava resumir as

convergências conflitantes no interior do movimento, sem perder a aparência

revolucionaria.

Antes da proclamação da Conferência do Equador, Caneca participou de

Assembléias (grandes reuniões com o objetivo de discutir e criar métodos de defesa ao

Nordeste e buscar soluções libertadoras), que, geralmente, eram secretariadas por ele.

Nessas oportunidades, se portava como intelectual, visando discussões para uma nova

sociedade. Ainda teve a missão de criar um anti – projeto de Constituição, que não

chegou a ser posto em prática.

Frei Caneca estava à frente do exercito de latifundiários, em Pernambuco, largou

pra trás sua batina e vestiu um jaleco de guerrilha, para, assim, assumir o espírito de

guerra.

Por fim, no dia 29 de novembro, o major Lamenha, protegidos por pesada

artilharia a serviço do imperador, alcança os revolucionários. Alguns querem resistir até

as últimas conseqüências, mas frei Caneca convence os colegas de que seria um

sacrifício inútil. O major promete levá-los até Recife, onde o conde Lima e Silva lhes

daria tratamento humanitário e julgamento dentro da lei. E, também, promete por escrito

que Frei Caneca e seus companheiros depõem as armas.

Assim, começa a viagem de volta ao Recife.

1.9 - A prisão

No trajeto de volta alguns soldados conseguem escapar. O caminho teve cerca de

850 quilômetros, entre os dias 29 de novembro e 17 de dezembro de 1824. Ao chegarem

à Recife o grupo parou em frente ao Palácio do Governo, onde se encontrava o

brigadeiro e comandante – chefe das forças imperiais Francisco de Lima e Silva. O

chefe selecionou o grupo de prisioneiros: padre Mercês e Inácio Bento, o major

Agostinho Bezerra, o major José Maria Ildefonso, Francisco Rangel e Frei Caneca.

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Todos foram mantidos em um calabouço da cadeia, incomunicáveis, e o local

era imundo. O carmelita descreve esses dias como “infernal calabouço”.

No dia 18 de dezembro instalou-se a comissão de julgamento e os prisioneiros

foram citados para responder ao interrogatório ao meio dia, concedido o prazo de 24

horas para resposta, ou seja, a defesa. Sendo no dia 19 um domingo, passou-se para

segunda-feira o prazo.

Frei Caneca foi o primeiro a ser levado perante o tribunal, formado pelo

brigadeiro Francisco e Lima e Silva; Tomaz Xavier Garcia de Almeida, juiz relator;

coronel de engenheiros, Salvador José Maciel; tenente – coronel de caçadores Francisco

Vicente Souto; coronel de caçadores Manoel Antonio Leitão Bandeira e o Conde de

Escragnolle. E o interrogatório não foi muito longo

Nome, naturalidade, estado e idade13 Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo Caneca, natural desta cidade do Recife, estado religiosos carmelita turonense, idade de 45 anos e cinco meses. Sabe ou suspeita de sua prisão? Fui preso por me achar na divisão das tropas que daqui marcharam para o interior da província na ocasião em que entrava o Exercito imperial. Já publicou ou propagou ideias ou escritos subversivos da boa ordem? Fui redator do periódico Typis Pernambucano, que contém as ideias que propaguei, alias as mesmo de outros períodos até da Corte. Como nunca fui chamado ao Tribunal dos Jurados, me regulo pela lei que então existia sobre os abusos de liberdade de imprensa. Toda vez que atacava os desmandos públicos, dirigia-me ao ministério apenas. Em seus escritos disseminou ideias tendentes a promover a desunião das províncias e o ataque à integridade do Império? Me parece que nunca manifestei nenhuma idéia dessa natureza em meus escritos. Se alguma proposição existir d’onde isso se possa coligir só a mim compete interpretá-la. Contribuiu para não aceitar o Projeto de Constituição oferecido por Sua Majestade Imperial aos povos da província? Chamado pela câmara para dar meu parecer sobre essa matéria, meu voto foi que não se aceitasse tal projeto. Em tudo mais remoto ao dito no meu voto, que consta dos livros da câmara e corre impresso.

13 Trecho retirado do livro Obras Políticas e Litterarias de Frei Joaquim do Amor Divino Rabello Caneca, no texto que relata o julgamento de Frei Caneca.

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Por que passou a andar sem hábito e vestido de jaqué de guerrilha depois da entrada das tropas de S. Majestade Imperial em Recife? Não andei de jaqué de guerrilha, mas sim com jaqueta de chita, que trazia por baixo do hábito, o qual tirei na marcha do Cabo para Recife e que se perdeu por ir na garupa de um cavalo que desapareceu.

A sentença proferida declarava o religioso “incurso na pena de morte natural na

qual simplesmente o condenam, sendo o primeiro exautorado das ordens e honras

eclesiásticas”14.

De acordo com relatos, Frei Caneca escutou sua condenação sem nenhuma

agitação. Chegou a interromper algumas vezes a leitura para corrigir equívocos e

incoerências. Não voltou mais para o calabouço e, sim, para o oratório, onde ficavam os

condenados a morte.

O carmelita impressionou a todos com sua calma e soberania sobre a morte,

nunca demonstrou desespero. Deu continuidade a suas pregações: para soldados e

oficiais que vigiavam seu cárcere e pessoas que iam visitá-lo; falava da tirania, da

opressão, da liberdade dos povos, felicidade, de Deus, etc.

Neste período, Caneca escreveu o texto Itinerário, que é um caderno de

memórias sobre sua trajetória da Confederação do Equador, utilizando-se de uma

linguagem simples e acessível a todos.

1.10 - A morte

O dia 13 de janeiro de 1825 é da data final de sua trajetória. A população de

Recife vai às ruas para ver o, então, espetáculo de terror. E, depois de ser acordado por

seu amigo Frei Carlos São José, Frei Caneca segue para sua sentença em praça pública.

A morte de Frei Caneca foi um episódio dramático, desde seu julgamento, foi

condenado à simples “morte natural”, pela sua desoneração ao celibato e pelo fato de

três carrascos se negaram a sua execução. O primeiro era anônimo, sabia-se que era

presidiário, pobre e negro, ao negar a execução foi espancado, com socos e pontapés,

enquanto era espancado dizia que jamais faria qualquer coisa a Frei Caneca.

14 Idem 14

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O segundo era como o primeiro: negro, pobre e presidiário. Tentaram comprá-lo,

oferecendo a liberdade, e depois o ameaçaram de matar, mas nenhumas dessas

tentativas foram validas. Foi levado a frente do público e apanhou até cair. Por fim, o

terceiro carrasco que recusou, também, negro, pobre e presidiário, teve o mesmo

destino.

Devido a essa situação o coronel Lima e Silva toma a decisão de que a morte

seria por fuzilamento e não pela forca, como estava na sentença. Logo o pelotão de

fuzilamento se aproxima. Um soldado cai ao chão morto por um ataque do coração e

novo tumulto acontece. Ligeiramente, o pelotão é refeito. Frei Caneca com olhar singelo

coloca a mão no peito e o fuzilamento começa.

Morre, assim, o frade carmelita e herói da nação.

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CAPÍTULO II

RETÓRICA

2.1 - História da retórica e seus primeiros personagens

É difícil esboçar com muitos detalhes a cronologia da retórica, pois existem

poucas referências sobre o assunto, textos que permaneceram no latim, e, ainda, é

necessário retratar os acontecimentos ideológicos para entendê-la. Roland Barthes, na

década de 70, foi quem chegou mais próximo desta cronologia, criando um esboço de

tratamento da retórica antiga.

Barthes (1975) retrata que a retórica é uma verdadeira autoridade, mais ampla e

mais persistente que qualquer outra dominação política, por suas extensão e

permanência, fez “malograr o próprio quadro da ciência e da reflexão históricas, ao

ponto de por em questão a própria história e de obrigar a conceber o que se pode

chamar, alias, uma história monumental” (p. 150).

O desprezo científico unido à retórica participaria, então, dessa recusa geral em reconhecer a multiplicidade, a superdeterminação. Em que pesem as variações internas dos sistemas, a retórica, lembremos, reinou no Ocidente durante dois milênios e meio, de Górgias a Napoleão III; tudo o que ela, imutável, impassível e quase imortal, viu nascer, crescer, desaparecer, sem comover-se nem se alterar: a democracia ateniense, as realezas egípcias, a República Romana, o Império Romano, as grandes invasões, o feudalismo, a Renascença, a monarquia, a Revolução; assimilou regimes, a religião, civilizações; agonizante desde o Renascimento, levou três séculos para morrer; e ainda não havia certeza de sua morte. A retórica dá acesso ao que chamaríamos de uma supercivilização: o Ocidente, história e geográfica: foi a única prática (com a gramática, nascidas depois dela) através da qual nossa sociedade reconheceu a linguagem, sua soberania (Kyrosis, como disse Górgias), que era também, socialmente, uma “senhorialidade”; a classificação quem lhe impôs é o único traço verdadeiramente comum de conjuntos históricos sucessivos e diversos, como se existisse, superior às ideologias de conteúdos e às determinações diretas da história, uma ideologia da forma e como se existisse, para cada

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sociedade uma identidade taxionômica, uma sócio-lógica, em nome da qual seria impossível definir uma outra história, uma outra socialidade, sem desfazer aqueles já reconhecidos em outros níveis (BARTHES, 1975, p.150).

A tradição da retórica nasce no início século V a.C. (BARILLI, 1979), quando

dois soberanos sicilianos, Gelon e Hieron, fizeram desterros, mudanças de povoado e

exportação, para povoar a Siracusa e alastrar terras aos mercenários. Com a situação,

ambos foram retirados de seus tronos por uma rebelião democrática e o povo optou em

voltar à vida que levam anteriormente. Na ocasião, aconteceram diversos processos

jurídicos, mas, naquela época, os direitos de propriedade eram ainda confusos e

duvidosos. Tais processos conseguiram movimentar grandes júris populares, diante dos

quais, precisava-se convencer e ter boa eloqüência. Essa eloquência (BARTHES, 1975),

participando simultaneamente da democracia e da demagogia, do judiciário e do político

(o que se chamou depois de deliberativo), transformou-se rapidamente em objeto de

ensino.

Os primeiros professores da matéria foram Empédocles de Agrigento, Corax,

que foi seu aluno, e Tísias, e esta disciplina com rapidez as fronteiras devido aos

negociantes que começaram a contestar de suas habilidades, como havia acontecido em

Siracusa e Atenas.

Entre os professores, Corax foi quem primeiro apresentou as cinco principais

partes da oratio, que mais tarde formou o discurso oratório – o exórdio, a narração, a

argumentação, a digressão e o epílogo.

Sodré (1948) acrescenta os nomes de Górgias, Protágoras, Lysias, Isócrates e

Antifon, também como um dos primeiros estudiosos da disciplina.

Lysias, que era natural de Siracusa, que não podia pronunciar sua naturalidade

em Atenas, pois a legislação da cidade somente autorizava direitos civis aos atenienses

natos. Seu trabalho era escrever discursos para os outros. Conta-se (SODRÉ, 1948, p.

53) que Lysias escreveu uma defesa para Sócrates pronunciar perante o Tribunal com

argumentos formidáveis.

Isócrates teve um papel de destaque na história da retórica grega e foi um dos

maiores retóricos e logografos15 de sua época. Era um rapaz tímido, não se pronunciava

15 Na aquela ocasião, não existia a profissão de advogado e a população precisava-se se defender, em júri, por si próprio, e, com isso, surgiram escolas para o ensinamento da eloquência e a profissão de

50

em público, mas era de rara inteligência, observador, capaz de perceber com rapidez

coisas sutis e, ainda, soube ensinar muitos jovens o desafio de ser um bom retórico.

Antifon, também um grande mestre a eloquência, abriu, em Atenas, um escola

de destaque.

Protágoras foi o primeiro a levar a retórica para a Grécia continental, morou na

Sicília e esteve em contato com Córax e Tísias. Seu maior destaque foi o pensamento

retórico pitagórico, quando elaborou de uma forma independente dos pitagóricos, tendo

uma oposição com indicação a aversão à matemática e à música. Reelaborou os

conceitos retóricos, de uma nova forma que se desvincula do moralismo dos

pitagóricos. Também, elaborou a teoria da “oportunidade retórica”, em plano semântico

– expressivo, distinguindo pela primeira vez os tempos do verbo e discorreu sobre a

potência do kairós16·, com um novo sentido desta expressão para melhor criar o

discurso.

Outro conceito de Protágoras é orthoépeia, que tem relação com o de Kairós, e é

o predicado de encontrar palavras convenientes à expressão e à própria potência do

raciocínio (PLEBE, 1978, p. 09).

Mas o ideal da retórica protagórica é expresso na célebre formula to tòn hétto kreítto poiein conservada por Aristóteles, cuja tradução mais provável é “tornar mais potente o discurso menos valido”. Nisto vê-se principalmente uma revalorização do mundo parmenídico da doxa que, como dissemos, devia ser o âmbito natural do desenvolvimento de uma retórica (PLEBE, 1978, p.10).

Górgias foi mestre de Tucídides, e o interlocutor do sofista Sócrates no diálogo

de Platão intitulado Górgias. Sua importância foi ter julgado a retórica como um

discurso erudito, objeto estético, de linguagem soberana e com antepassado na literatura

(BARTHES, 1975), criando, assim, o terceiro gênero (após o judiciário e o

deliberativo), o epidítico, quando a escrita deixa de ser tratada apenas como discurso, e

passa a ser considerado como prosa decorativa, de uma prosa-espetáculo.

logografos, que eram elaboradores de discurso escritos destinados a serem pronunciados por pessoas interessadas. 16 O termo kairós significa oportunidade. Tal conceito é entendido como oportunidade retórica e prática que é preciso saber o modo certo e as palavras convenientes para comunicar-se com os diferentes grupos de pessoas. Os Pitágoras entendiam Kairós como uma harmonia numérica.

51

Górgias substitui o código imanente à própria prosa, palavra com a mesma

consonância, simetria das frases, reforço das antíteses por assonâncias, metáforas,

aliterações. Em destaque, apresentar uma perspectiva paradigmática traz a prosa à

retórica e a retórica à estilística.

Um segundo momento da história da retórica grega deve-se conferir a Platão

(428-347), porém de forma negativa, coincidindo com o mais severo esquecimento ou

abatimento que a retórica permitiu. Se os Sofistas transformaram fantasiosa a verdade

em favor da aparência, em Platão verifica-se, pelo contrario, a mais límpida afirmação

da episteme17 sobre a doxa18e, sobretudo o modo solitário, calado, da pesquisa própria

de quem avança para a verdade – episteme (pesquisa que não se refere à multidão, as

massas). O objetivo de Platão é extrair o direito de arbitrar, de sugerir, de resolver, de

fazer uma anti-democracia.

Platão afirma, sobretudo, que a retórica não é uma ciência, nem uma verdadeira

arte, mas sim uma prática empírica. Ou seja, ela – a retórica – não apresenta fundamento

“para as coisas que oferece ou explica a sua natureza, de modo que não pode falar da

causa de cada uma delas” (PLEBE, 1978, p. 23). Platão preocupa-se em situar a retórica

não como uma arte, e, sim, como uma dóxa (opinião).

Barthes (1975) descreve que Platão aborda duas retóricas, uma boa e uma má. A

primeira retórica de fato é formada pela logógrafia, trabalho que consiste em escrever o

discurso (não se controverter mais somente de retórica judiciária; a somatória da nação

é respeitável); seu objeto é a verossimilhança, a ilusão; é a retórica dos retores, das

escolas, de Górgias, dos Sofistas. II. A segunda retórica é a de direito, é a verdadeira

retórica, filosófica ou ainda a dialética; seu objetivo é a verdade; Platão chama-a de

psicagia, formação das almas pela palavra (p.153).

A oposição da boa e da má retórica, da retórica platônica e da sofística, faz parte de um paradigma mais extenso; de um lado, as bajulações, as astúcias servis, as falsificações; do outro, a rejeição de toda complacência, a rudeza; de um lado as empíricas, as rotinas; de outro as artes: as astúcias do prazer são uma falsificação desprezível das artes do Bem: a retórica é a falsificação da Justiça, a sofística da legislação, a cozinha da medicina, toilette da ginástica: a retórica (dos logógrafos, dos retores, dos sofistas) não é, pois, uma arte (BARTHES, 1975, p.154).

17 Episteme refere-se ao verdadeiro conhecimento. 18 Doxa tem o significado crença comum ou opinião popular. Era utilizada pelos retóricos como ferramenta para formação de argumentos através da opinião comum.

52

O mesmo autor relata que a verdadeira retórica é uma psicagogia, pois exige um

conhecimento total, desinteressado, e geral. Tal saber tem como meta a correlação ou o

intercâmbio que liga as espécies de almas e as espécies de discurso. A retórica de Platão

arreda o escrito e procura uma conversação pessoal, que fundamenta seu discurso entre

o diálogo do mestre e do discípulo. Pensar comum ou dóxas pode ser a divisão da

dialética.

Platão busca aproximar a essência da retórica para uma análise mais perspicaz,

distingue a retórica não só da dialética, como também da retórica sofística. A separação

acontece quando Sócrates afirma que “Pólo, por tudo o que disse, demonstra ter

exercitado mais na chamada retórica do que na dialética” (apud, PLEBE, 1978, p. 24).

A dialética, então, seria para Platão uma arte de discussão que submerge tanto a forma

quanto o conteúdo.

Platão revela que a retórica não é a única arte de persuasão, e nega que ela seja

uma técnica de afirmação, a não ser que ela demande de “um espírito imaginativo e

ousado, e, por natureza, extraordinariamente hábil no trato com os homens” (apud

PLEBE, 1978, p. 25). O pensamento platônico, também, reflete que a retórica é

simplesmente formal, e, portanto, indolente ao seu conteúdo; não se preocupa em

conhecer os assuntos, quer apenas de alcançar seus objetivos.

Observa-se que a dialética platônica é, na realidade, um exemplo daquilo que

será depois em Aristóteles o logos analítico. A dialética a que Platão se refere é, na

verdade, um empenho analítico de degeneração dos discursos, que, até então, eram

construídos como primordiais e utilizava-se de algumas categorias. A desconstrução

realizada faz parte da mentalidade analítica desprezada pelos sons das palavras, “os

nomes são como imagens, as cópias das coisas, e é, portanto, conveniente que se

revelem o mais transparente possível, sendo reduzidos a um papel instrumental, de pró-

memória, de sinais úteis, privados, todavia de um relevo autônomo” (BARILLI, 1979,

p. 18).

Também é verdade que o diálogo, a conversa a dois, a troca de argumentos tem

uma função insubstituível, na economia da dialética platônica, não se pode substituir

indivíduos e as expressões por símbolos literais, e ao contrario se verificará na analítica

aristotélica.

Os dialéticos, ou aqueles que vivem da retórica, sustentam duas influências

sólidas. De um lado, busca-se o termo concreto e incondicional da retórica, e de outro,

um movimento descendente, que espera atingir o inseparável. “Esta ‘decida’ é uma

53

escada: em cada etapa, ou degrau, dispõe-se de dois termos: deve-se escolher um contra

o outro, para reiniciar a descida e chegar a um novo binário de que se partirá

novamente” (BARTHES, 1975, p. 154).

Exemplo da definição, descrita por Barthes, progressiva do sofista:

Quadro 1 – Sistematização da Retórica de Barthes (1975).

Barthes relata que esta retórica divisional, que se contrapõem à retórica

silogística de Aristóteles, parece mais um programa cibernético, digital: cada opção gera

a seguinte alternativa, ou ainda a estrutura pragmática da linguagem, “cujos binários

comportam um termo marcado e um não-marcado. Aqui a expressão marcada torna a

lançar o jogo alternativo. Mas donde vem a marca?” (BARTHES, 1975, p. 155). É,

neste exemplo utilizado pelo pesquisador, que se encontra retórica de Platão: no diálogo

platônico, a marca é assegurada por uma concessão do respondente (discípulo). A

retórica de Platão supõe dois interlocutores e um que outorga: é a condição do

movimento, que ele se refere. Assim todos esses fragmentos que localizamos nos

diálogos de Platão e que nos fazem sorrir, quando não nos aborrecemos, por sua

simplicidade e banalidade manifesta, são na realidade “marcas” estruturais, atos

retóricos.

2.2 – A retórica Aristotélica

54

A arte da retórica não é toda baseada nos estudos aristotélicos, existem outros

pensadores desta disciplina, como citados, porém foi Aristóteles que, sem dúvida, criou

os elementos didáticos que sustentam os principais manuais de retórica do mundo.

Nascido no ano de 384 a.C., filho de Féstias ou Féstis (não se sabe ao certo o

nome de sua mãe) e de Nicômaco, foi médico, e após uma juventude confusa e agitada,

entrou para a Academia, onde permaneceu até a morte de Platão, isto é, durante vinte

anos. Seu mestre, Platão, o chamava de “o Espírito”, “o Entendimento”, “o Ledor”, por

ter tanto conhecimento. Mais tarde, quando já completará cinqüenta anos, fundou sua

própria escola, o Liceu, que chegou a ser um exemplo de Universidade (até mesmo para

os dias atuais).

Aristóteles foi professor por nobreza, suas obras são didáticas e escritas para

entendimento dos alunos, e não para um público em geral. Seu próprio modo de ensinar

é mais expressivo e consoante com a natureza da doutrina, para ele ensinar significa

demonstrar. Conseguiu discorrer por diversas disciplinas, menos pela matemática, como

a física, biologia, história, dramaturgia, política, entre outras. Contudo sua maior glória

foi relatar – identificar – as regras para as idéias da argumentação.

Aristóteles escreveu dois tratados sobre o discurso, mas ambos são diferentes. O

primeiro é Techne rhetorike, que apresenta a arte da comunicação cotidiana, do discurso

público, da opinião – a Arte retórica, abordando a progressão do discurso de ideia em

ideia. O segundo é a Techne poietike, que trás uma arte de lembrar o imaginário,

trabalha a progressão da imagem com a imagem, a Arte poética. Cada uma dessas tem

um sistema de aprendizado diferente, um trabalha com a retórica e o outro a poesia.

Alguns autores descrevem que tais técnicas são mutuamente parecidas, pois os grandes

retóricos são poetas.

Até o século VI, d.C., os trabalhos de Aristóteles eram reunidos em uma

coletânea chamada Organon, que significa Instrumento, dividida na seguinte maneira19:

1. Categorias, ou teoria dos termos; 2. Da Interpretação, ou teoria das proposições; 3.

Primeiras Analíticas, ou teoria da argumentação em geral; 4. Segundas Analíticas, ou

teoria da demonstração, ou seja, da argumentação que inicia dos princípios verdadeiros

e que gera certeza; 5. Os Tópicos, ou teoria da argumentação que parte de princípios

19 Citação de Godofredo Telles Júnior, que escreveu o prefácio do livro Arte retórica e Arte poética, edições Ouro, Rio de Janeiro, s/d.

55

prováveis ou opiniões, e que leva uma conclusão provável. E apoiado em seu tratado

Tópicos, que Aristóteles escreveu a Arte Retórica.

Naquela época, a eloquência era a arte literária de maior autoridade em Atenas.

Aristóteles, que se aproveitou de todos os estudos já realizados, as discussões sobre os

discursos, suas partes e a paixão de discursas em público, afirmou que a retórica é das

provas, ter a habilidade de discernir, é ter aptidão para persuadir seu público.

A Arte retórica abrange três livros. O livro I trás quinze capítulos, cujo de I a III

mostra as relações entre a retórica e a dialética, inclusive define o que é a retórica. Entre

III e XIV dedica-se aos estudos das provas técnicas. E, as provas extra-técnicas, ou seja,

as leis, depoimentos das testemunhas, contratos, declarações conseguidas pela tortura,

juramentos, aplica ao capítulo XV.

O livro II é divido em duas partes. Nos capítulos I a XVII, Aristóteles descreve

as provas morais e subjetivas, para que, nos capítulos XVII a XXVI apresente o exame

das provas lógicas.

O livro III é o mais consagrado ao estudo da retórica, pois é nele que Aristóteles

descreve a melhor forma de discursar, apresentar a teoria do orador, a didática da

eloquência.

A retórica de Aristóteles é, principalmente, uma retórica de provas, de

raciocínio, do silogismo (entimema), ou seja, é uma lógica adaptada ao nível do público,

que usa do bom-senso comum, à opinião em fluxo. Ainda é uma retórica peculiar e se

compõem de verossimilhança, de sinais, de exemplos. Enfim, a retórica permite os

artifícios capazes para se conservar e provar, até certo ponto, a presença de espírito, ou

que Aristóteles chama de “os lugares”, que são os meios de argumentação dos três

gêneros (judiciário, deliberativo e epidítico) e que tem menos influência que a dialética.

A retórica não é ciência, nem puro empirismo; não se funda no geral, mas no que se produz as mais das vezes; não é pratica, ou seja, não influi no comportamento geral da vida: nem é teorética, isto é, não tem por objetivo a essência. É poética, visto que formula regras da criação. Enfim, sua finalidade não é tanto persuadir quanto descobrir o que há de persuasivo em cada caso.20

Aristóteles descreve a retórica da seguinte forma:

20 VOILQUIN, Jean; CAPELLE, Jean. Introdução. In: Aristóteles. Arte retórica e arte poética. Rio de Janeiro, Ouro, s.d. p. 22-23.

56

É a faculdade de ver teoricamente o que, em cada caso, pode ser capaz de gerar persuasão. Nenhuma outra arte possui está função, porque as demais artes têm, sôbre o objeto que lhes é próprio, a possibilidade de instruir e de persuadir (...). Mas a retórica parece ser capaz de, por assim dizer, no concernente a uma dada questão, descobrir o que é próprio para persuadir. Por isso, dizemos que ela não aplica suas regras a um gênero próprio e determinado (ARISTÓTELES, s/s, p. 34).

Na reflexão que faz sobre as provas, o filosofo, diz que “a prova é uma

demonstração” (ARISTÓTELES, s/d, p. 31), pois a confiança é maior quando se tem

algo a demonstrar – provar – e se ganha a certeza aquele que melhor prova apresentar. E

as dividem em provas não dependentes e dependentes.

A prova não dependente é oferecida por outras pessoas, como por exemplo, o

testemunho, as confissões e as escritas. As provas dependentes são oferecidas por

métodos, por meios próprios e precisam ser encontradas, e são dividas em três

situações: a atitude moral do orador (que deixa a impressão de confiança), a disposição

que o ouvinte tem para com o orador (quando o orador consegue despertar os

sentimentos) e as provas apresentadas para argumentação (quando o assunto demonstra

verdade ou o que parece ser verdade).

O raciocínio retórico aristotélico se baseia em estudos lógicos, na Analítica e na

Dialética. A analítica estuda as formas de deduções válidas, de maneira especial o

silogismo. “Essa inferência é puramente formal: como a verdade é uma propriedade das

proposições, independente das opiniões dos homens, os raciocínios analíticos são

demonstrativos, coagentes e impessoais” (SOARES, 1995, p.37). Porém, este

pensamento não é o caso da dialética. Um raciocínio é dialético, de acordo com

Aristóteles, acontece se o ponto de partida do pensamento é feito de opiniões

comumente acolhidas por todos.

Aristóteles propõe-se a diferenciar as relações e as contestações da retórica e da

dialética. Para ele, a retórica e a dialética tem algo em comum, pelo caso de que o

contexto de ambas não é preciso e demarcado, e pode ser de qualquer gênero. A

diferença se dá pelo silogismo que parte de lógicas possíveis.

Ambas tratam de questões que de algum modo são da competência comum de todos os homens, sem pertencerem ao domínio de uma ciência determinada. Todos os homens participam, até certo ponto, de

57

uma de outra; todos se empenham dentro de certos limites sem submeter a exames ou defender uma tese, em apresentar uma defesa ou uma acusação (Aristóteles, s/d:29).

O filosofo ainda ressalta que a verdadeira retórica deve ser, antes de tudo, rígida

em seus argumentos. A ocupação da retórica não é persuadir, mas discernir

teoricamente, em cada caso, os meios de persuadir. Persuadimos pelo discurso quando

demonstramos a verdade, ou o que parece ser verdade. Esse processo é baseado nos

lugares, ou topos, que são opiniões geralmente aceitas sobre qualquer problema.

Sobre o silogismo, Aristóteles o descreve como:

Uma forma de raciocínio, mercê da qual, sendo dadas certas proposições (premissas), destas resulta necessariamente uma nova proposição... O silogismo dialético é aquele do qual resulta uma conclusão, quando as premissas são conformes com a opinião... O silogismo sofístico é o que se extrai de premissas aparentemente baseadas na opinião, mas que realmente não o são; o silogismo aparente é o que se extrai de proposições verdadeiras ou aparentemente conformes com a opinião (ARISTÓTELES, s/d, p. 36).

Aristóteles se refere ao silogismo oratório como entimema, diz que o exemplo é

uma indução, que consegue prender a atenção de um auditório e consegue se persuadir,

porém o silogismo que é um entimema impressiona muito mais. Sobre o silogismo,

entende-se que é arte de apresentar premissas convincentes e persuasivas, que abordam

contexto geral e não seja especifico a alguém, e o discurso tem que ser do conhecimento

do orador, pois do nada poderá se chegar uma conclusão. Existem dois tipos de

entimemas: os demonstrativos, que tem a função de provar que uma coisa é ou não é,

seguindo as premissas acolhidas pelo competidor; e os refutativos, que contradizem a

conclusão do adversário.

O filosofo realça que os entimemas deduzem-se das verossimilhanças e dos

sinais, “e tanto estes como aqueles apresentam necessariamente um destes caracteres”

(ARISTÓTELES, s/d, p.38). O verossímil é semelhante a verdade, não a verdade

absoluta, e, sim, contingente, na mesma relação que o universal para o particular.

Já nos sinais apresenta-se a necessidade do tecmérion21, ainda que o possa vir do

particular para o universal e do universal para o particular.

21 Tecmérion tem oposição ao indício e a verossimilhança, apresenta provas sujeitas a erro e é uma demonstração que prova mediante o raciocínio.

58

Aristóteles descreve o discurso retórico em três gêneros, de modo que são três

categorias de ouvintes do discurso – a pessoa que fala, o assunto de que se fala e a

pessoa a quem se fala22.

- Gênero Deliberativo: é aquele que busca aconselhar e desaconselhar, quer

refletir sobre situações particulares ou de interesse público. E aborda cinco estilos de

discursos, finança, defesa nacional, importação, exportação e legislação. Ainda, seu

tempo é o futuro para que se possa discutir os conselhos e desconselhos.

- Gênero demonstrativo: apresenta-se em duas partes, elogio e a censura - belo e

feio, que é belo é mais preferível e a virtude é bela e, por isso, que consegue maior

persuasão, segundo o filosofo. Suas preferências são a justiça, coragem e temperança. E

seu tempo é o presente.

- Gênero judiciário: se profere a um juiz, permitindo acusação e defesa. Seu

objetivo é a justiça e, por se tratar do julgamento de atos já cometidos, seu tempo é o

passado.

Aristóteles diz que cada gênero tem sua finalidade, como são três gêneros, existe

três fins distintos. Ainda, ressalta que os gêneros demonstrativo e deliberativo referir-se

a uma natureza comum: coisas que falamos quando aconselhamos podem se tornar

elogios, basta modificar a sua forma. O gênero demonstrativo se ajusta melhor a

desenvolver um discurso, entimemas que tem por objetivo exibir que uma coisa é

grande ou pequena, boa ou má, etc.

Aristóteles ressalva que são três questões respectivas ao discurso, que

necessitam ser abordadas: a primeira, de onde vêem as provas; a segunda, o modo que

se deve empregá-las; a terceira, o estilo de preparar as diferentes partes discurso.

Os dois primeiros itens já foram apresentados, e partiremos para a descrição do

estilo oratório, a melhor forma de se construir um discurso. Vale lembrar que tal

estrutura ainda é à base na qual aprendemos a escrever, e base para livros didáticos,

produções de textos e redações jornalísticas.

O filosofo inicia destacando algumas regras básicas para um discurso bem feito:

• Utilizar de adjacência própria, vocabulário usual e a metáfora são as únicas

expressões úteis para o estilo do discurso puro e simples;

• Usar metáforas de expressões mais valiosas e sensíveis;

• Evite muitas palavras compostas, que causa frieza;

22 O primeiro processo de comunicação, criado por Aristóteles.

59

• Fuja de palavras estranhas;

• Não exagere nos elogios;

• Usar de imagens e metáforas para compor o discurso;

• Cumprir com exatidão a regra gramatical;

• Tenha vocabulário correto;

• Evitar expressões anti-biologicas;

• Seguir corretamente os pronomes e os referi-los adequadamente;

• Concordância verbal e nominal correta;

• Evitar estilo poético;

• O discurso será conveniente se desenvolver a paixão ou intimidade com o

assunto.

Segundo Aristóteles as partes do discurso são:

1 – Exórdio: é o começo do discurso. Ele pode ser elogio, censura ou conselho, vai

de acordo com o gênero. “O exórdio baseia-se então em considerações que dizem

respeito ao ouvinte; é o caso, se o discurso trata de um assunto que fere a opinião

comum, ou que é difícil de aprender, ou demasiado repisado, este processo terá por

efeito conciliar a indulgência do juiz” (ARISTÓTELES, s/d, p. 249).

2 – Narração: é a parte do discurso em que os fatos são pautados e mencionados.

Aristóteles ressalta que o discurso não pode ser prolixo, ou seja, muito longo. Precisa-se

de argumentos que contribua para a valorização do mérito pessoal ou que coloque em

evidência a maldade do adversário, se fixar em tudo que possa ser agradável ao público,

e abusar do caráter moral, para que se consiga comover a platéia e passar a ação da

argumentação.

3 – Provas ou refutação: Em um discurso persuasivo é obvio que precisa de provas

e comprovar aquilo que se está falando. É a prova que sustenta a argumentação do

assunto em discussão.

4 – Epílogo ou peroração: É a conclusão do discurso. Aristóteles a divide em quatro

partes: A primeira consiste em dispor bem o ouvinte a nosso favor (ou contra o

inimigo); a segunda se concentra em desenvolver melhor o tema ou diminuí-lo, depende

do contexto do discurso e a disposição da platéia; a terceira é fazer com que aumenta a

paixão dos ouvintes, mexer com seus sentimentos; e a quarta é a recapitulação do que

foi dito. O filosofo ainda ressalta que para que o discurso seja fácil de seguir é preciso

60

várias repetições e a maneira mais indicada de fazer a recapitulação é aproximar os

argumentos ou seguir a ordem natural, na qual o orador expressou suas razões.

Pode-se concluir que após Aristóteles criar e descrever as técnicas da retórica,

muitos estudiosos o copiaram, alguns se aprofundaram mais e conseguiram novas

descobertas, outros apenas o reproduziram. E, assim, damos seqüências ao pensamento

retórico.

2.3 – Cícero

Após, o declínio da retórica grega, os romanos tentam emergi-la e se

aprofundam nos estudos, criam diversas escolas e novos oradores. Um dos principais

oradores romanos é Cícero, que muito bem fala da arte oratória, e escreveu dois

importantes manuais: Rhetorica ad Herenniun, atribuído a Cornifício e a Cícero; e De

inventione, que discute sobre a arte de escrever.

A retórica de Cícero compreende sete fatores: 1) A rhetorica ad herennin é uma

passa por cima da teoria aristotélica, deixa de lado a retórica do entimema e passa para

retórica profissionalizante. 2) De inventione oratória, é uma obra incompleta, que se

baseia nas causas jurídicas, que se destaca com epiquerema, ou seja um argumento onde

uma ou ambas premissas exibem demonstrações ou razões de ser de tal sujeito, precisa

de um argumento certo. 3) De oratore, obra apreciada até o século XIX devido ao seu

bom-senso, que discute a razão correta, com ideias originais sobre a retórica. Porém,

Cícero, assim com Platão, não aceita a retórica com uma disciplina a ser ensinada e

trabalha a obra em forma de dialogo, que define o orador, que precisa ter uma boa base

cultural, e faz uma revisão das partes da retórica. 4)Brutus, que relata a história da arte

oratória em Roma. 5) Orator, traz o perfil ideal do orador. 6) Os Tópicos, retoma aos

conceitos da estrutura criada por Aristóteles. 7) As Oratoriae Partitiones, é um pequeno

manual, de perguntas e respostas, sobre a retórica.

Barthes (1975) descreve que a retórica ciceroniana tem quatro características

marcantes. A primeira é que Cícero tenta se desvincular da teoria de Aristóteles,

descreve que a retórica precisa ser natural, sem regras de eloquência, apenas clara e se

propagar da verdade. A segunda é que Cícero tenta desvincular a retórica dos

61

pensamentos gregos, e tenta reconstruí-la com origens romanas, é o que faz no Brutus.

Após, a terceira característica, que é o romano relata que todo orador precisa ter um

vasto conhecimento cultural, até para que possa persuadir. A quarta e última é que

Cícero desenvolve a elocutio, evoluindo o estilo retórico.

2.4 – Marcus Fabio Quintiliano

Após a dedicação de Cícero em reformular a retórica aristotélica, e criar novos

conceitos, outro romano surge com um plano completo de formação pedagógica por

meio da retórica, Marcus Fabio Quintiliano23. Barilli (1979) diz que Quintiliano, ao

contrário de Cícero, é grande um conhecedor de retórica, um teórico e um historiador

desta arte, mais do que um cidadão que apenas usufrui da disciplina, e sim um homem

político que fez dela uma ferramenta de combate.

Sobre a vida de Quintialiano nada se sabe ao certo, de acordo com alguns

pesquisadores é provável que ele tenha nascido no ano 30 e falecido em 96, um ano

depois de ter escrito e publicado sua grandiosa obra, Institutio Oratoria. Sobre sua vida

pessoal, sabe-se que, no ano de 84, casou-se com uma jovem, no qual tiveram dois

filhos, porém não foi um enlace matrimonial duradouro, aos dezenove anos a esposa

faleceu e logo mais as crianças.

A retórica surge em sua vida por meio da influência familiar, seu avô e seu pai

também foram professores de retórica. De acordo com Alfonso Ortega 24 (2001), antes

de se dedicar ao exercício da arte retórica, o orador atuou como advogado, durante anos,

em Roma, e somente após retornar para sua cidade natal que, provavelmente, começou a

ensinar a eloquência. E, no ano de 68 (ORTEGA, 2001, p. 12), Quintiliano é nomeado

professor de retórica pelo Orçamento de Estado.

Quintiliano foi um intelectual a serviço de seu príncipe, que o próprio se

incumbiu de expor sua obra, para recuperar e restaurar a retórica para fins políticos.

Suas técnicas de ensino tiveram como base o conhecimento e o fluxo das palavras, e seu

23 Nesta ocasião, iremos apresentar o filosofo e sua contribuição para o ensino da retórica. No próximo capítulo, que buscaremos sua contribuição para a comunicação, mas precisamente para o jornalismo. 24 Alfonso Ortega foi quem escreveu a biografia de Fabio Quintiliano, em 2001, quando a Universidade de Salamanca publicou a obra completa do orador.

62

objetivo era criar um modelo mais favorecido e mais amplo para formar uma doutrina

convincente.

Era uma pessoa que sabia lidar com questões jurídicas – de tribunais -, de

conflitos, e de ensino. Com isso, utilizou de métodos narrativos, demonstrativos e

didáticos legitimados para refutar pontos específicos, colocando razão para as regras.

Exemplo disso, foi o os processos realizados em defesa da rainha Berenice (ORTEGA,

2001, p. 13).

A Institutio Oratoria, de Fabio Quintiliano, foi, sem dúvida, a maior obra

dedicada à retórica25, com 12 livros que analisam os detalhes da arte. Procura, ainda,

resgatar o histórico, como os estudos de Aristóteles e Cícero, acrescentar novos

conceitos e introduzi-las ao ensino pedagógico, que foi muito apreciado por Lutero,

Erasmo, La Fontaine e Racine.

De início, a enciclopédia era um manual acessível e didático de aprendizado na

arte de falar em público e a de construir um discurso com uma linguagem fácil.

Quintiliano buscava resgatar todo o contexto grego e romano, científico e literário da

retórica, com a intenção dar continuidade ao que já foi escrito e trazer novidades a

teoria.

Todavia, o principal objetivo de Quintiliano é dedicar os estudos retóricos a

serviço do público, na formação filosófica e literária do homem, e criar regras

pedagógicas para ensiná-la da melhor maneira, em um sistema universal, incluindo as

disciplinas de gramática, geometria, música, e, além de incluir os valores éticos, no qual

para ele é inseparável do discurso como uma responsabilidade pública.

Berton e Proulux (2006) ressaltam que Quintiliano foi quem fundou uma teoria

da arte de escrever bem. “Esse grande retor, o último da Antiguidade, ensinava ao que

desejava progredir na escrita um número de regras: ler e escrever muito, imitar modelos,

corrigir os próprios textos depois de deixá-los ‘repousar’” (p.36).

Em seu livro I, Quintiliano se preocupa com a formação primordial do orador,

destacando a importância dele ser ensinado desde sua infância. São XII capítulos, que se

dividem em orientar o aluno sobre as regras gramaticais e a ortografia, o exercício da

leitura, as premissas da retórica, como preparar um bom orador, quais aspectos

curriculares são importantes e a retórica do futuro – a música e a geometria.

25 Lembrando que toda origem da retórica se dá na Grécia Antiga, e Aristóteles foi o maior codificar desta disciplina. Porém, Quintiliano a reproduz e acrescenta informações importantes, principalmente, referentes à comunicação.

63

No livro II o pensador, verdadeiramente, se dedica a catequização da retórica

criando, assim, uma teoria pedagógica. Neste volume são designados XXI capítulos, no

qual, se aprofundam em um ensino sistemático da educação, da inteligência, da ética,

dos métodos, das definições e conceitos, e a utilização da retórica.

Barilli (1979) diz que neste momento, Quintiliano trata do problema mais

importante, referente ao significado da retórica e faz uma crítica:

Quintiliano milita ao lado dos conteúdistas, isto é, daqueles que defendem que o orador deve possuir uma quantidade de noções científicas dispostas em leque em todos os ramos do saber. Nisso está sua falta fé neo-ciceroniana, a defesa obrigatória da virtuosa linha romana, da qual ele foi de resto encarregado pelo príncipe. E todavia a definição sobre a qual, após um longo exame, ele manifesta a sua preferência, vem do estóico Cleantes e parece até bastante redutivo por excessiva indeterminação, limitando-se a apontar para a ciência do bem falar, onde não estão patentes os habituais conflitos que a retórica arrasta atrás de si, e que de resto Institutio ilustra abundantemente, entre a teoria e a prática, entre as palavras e coisas; ou melhor as primeiras parecem ter prioridades sobre as segundas (BARILLI, 1979, p. 52).

O livro III preocupa-se em construir o contexto retórico. O autor descreve a

história da arte, e, depois, a estrutura, assim, como fez Aristóteles. Apesar de

Quintiliano se obter de outros filósofos, como Cícero, e acrescentar novos conceitos, a

estrutura é a mesma de Aristóteles: Gêneros do discurso – deliberativo, demonstrativo e

jurídico -, e a arte de falar em público.

No livro IV demonstra as partes quantitativas da retórica: o exórdio, a narração,

a eventual digressão, a proposição e as partes argumentativas. É a vez de praticar e

qualificar o que foi aprendido com as teorias, seguindo o modelo ideal de um orador.

O livro V é um complemento do IV, pois dá continuidade a classificação retórica

com as explicações sobre o gênero jurídico e suas partes, os argumentos demonstrativos

e suas demonstrações (como utilizar-se das provas), e a refutação. Neste livro, o

capítulo três chama atenção, pois Quitiliano escreve sobre os rumores da Opinião

Pública, no qual ele diz que o orador precisa tomar cuidado com as ações em seus

testemunhos para não transformá-los em rumores e fofocas espalhadas por cidadãos que

haja com má fé. E, com isso, gerar uma opinião contraria do seu principal objetivo.

O livro VI finaliza a classificação retórica, com a conclusão do discurso e suas

partes. Nesta ocasião, Quintiliano se absorve dos poderes psicológicos (o orador precisa

64

usar de sentimentos e emoções) da retórica, e como as provas podem ajudar a conquistar

o objetivo do orador. Outro artefato que o orador pode utilizar são os gestos e as

expressões corporais, que também transmite emoção para o público.

Depois de ter aplicado a metodologia, Quintiliano se propõe, no livro VII, em

ordenar os princípios da retórica, e as concepções e divergências de opiniões dos antigos

retóricos. A impressão que o autor passa é que, neste livro, ele se preocupa em

complementar questões minuciosas, que talvez tenha passo superficialmente.

No livro XVIII e IX, Quintiliano apresenta a importância da eloquência e sua

compreensão, destaca que não basta encontrar boas matérias e ordenar o discurso, é

necessário saber conduzido-lo e ser expressivo com o público. O bom discurso adquire

vida, é eficaz e produz persuasão quando se tem cuidado com as palavras escolhidas e

fazendo delas uma grande harmonia. O autor ainda diz que a eloquência é a parte mais

difícil da retórica, pois é nela que se dá a validez retórica e é o momento de persuasão

perante o público através das técnicas.

Por fim, os livros X, XI e XII da maior valor a composição da eloquência, e a

clareza e fluência das palavras nos discursos. No livro X, o autor faz é relato da retórica

e da literatura Romana. Apresentar críticas, técnicas e história dos Gregos e Latinos,

acrescentando suas opiniões sobre o assunto.

Ainda diz que orador precisa tomar-se tanto da riqueza das palavras, quanto das

figuras e métodos para construção de uma boa frase. Neste contexto, ele usa, como

exemplo, Aristóteles ao citar a imitação como meio de atingir a persuasão. Para

Quintiliano uma imitação nunca será feita com precisão e correta, imitação não é uma

cópia exata, então não se consegue atingir o seu objetivo. O orador precisar ser é

criativo.

Já no livro XI, Fabio Quintiliano descreve que o pregador precisa saber o que é

útil e conveniente para o discurso. Também trás técnicas de narração e posturas, como

da boca para melhor dicção.

E, o último livro, o XII Quintiliano ensina sobre a ética e a moral, e a

importâncias dessas características para a formação de um orador. Faz uma revisão da

história sobre a filosofia ética grega e romana, apontando como deve se comportar um

homem honrado, a partir da sua imagem visual e de palavras a serem expressas.

Afonso Ortega diz que a obra de Quintiliano é uma perfeita aquisição,

principalmente para quem quer aprender a se comunicar:

65

En un tiempo en que El lenguaje cada vez queda más degradado en un simple medio de comunicación, con menosprecio de la dignidad del hablar bien, y aun niega valor ético y estético, la obra de Quintiliano mantiene toda su grandeza y valor humano y educativo. En ella formuló él de nuevo, con propia ciencia y ejemplar magisterio, el pensamiento que, a partir de Sócrates, contribuyó a la formación del hombre por medio de la palabra, porque el lenguaje es la más honda manifestación del espíritu, cuyo origen ha de buscarse en la divinidad (ORTEGA, 2001, 92 – 93).

Para, realmente, adentrarmos no pensamento de Quintiliano precisa-se de muito

mais tempo e espaço, coisa que não é possível para este trabalho, que busca entender o

pensamento comunicacional de Frei Caneca, por meio de seus estudos retóricos,

influenciados, principalmente por Quintiliano. Porém, o pouco já explorado, trás

conhecimentos para continuar tal entendimento, que tanto ascendeu o carmelita.

Nosso objetivo, aqui, foi mostrar e entender como Marcus Fabio Quintiliano se

aprofundou nos estudos da retórica. No próximo capítulo, iremos averiguar como a

retórica de Quintiliano foi explorada, no contexto da comunicação, mas especificamente

no campo do jornalismo. E como o carmelita e outros autores a reproduziram.

2.5 - O fim da Retórica

Durante anos a retórica continuou sendo a base para muitos filósofos, exemplo

foi Santo Agostinho. Outro exemplo foi à criação do sistema Trivium, no qual era a

junção das três disciplinas ou três artes relativas à eloquência (gramática, retórica e

dialética), que na Idade Média formavam a primeira divisão das artes liberais.

Alguns compreendiam a arte como Lógica, ou ciência da interpretação, que

abrange a Gramática, como expressão; a Dialética, como educação; e a Retórica, como

persuasão. Isso se deu principalmente no século XII, quando a filosofia se separada,

criando-se a disciplina Letras.

A Dialética opera em todas as disciplinas em que o resultado é abstrato. A Retórica recolhe, pelo contrario, aquilo que Dialética exclui. É o campo da hipótese (na antiga retórica, a hipótese opõem-se à tese como contingente ao geral – cf. infra B. 1.25), isto é, tudo o que implica

66

circunstâncias concretas (Quem? Que? Quando? Por quê? Como?). Assim surge uma oposição com grande destino mítico (pois dura ainda): a do concreto e abstrato. As letras (partindo da retórica) serão concretas. A filosofia (partindo da dialética) ficará abstrata (BARTHES, 1975, p.174).

A torna-se retórica se um ensino pedagógico, como principal meta o escrever

bem. Estilo que se limita ao ensino e fica ao domínio dos professores. Barthes (1975)

relata que este período a retórica é triunfante, pois domina todo ensino, porém tornar-se

moribunda porque esta restrita a pedagogia, e começa a entrar em descrédito intelectual

devido aos valores sociais que estão em mudança (fatos, ideias e sentimentos). Os

intelectuais se servem da retórica apenas como um instrumento de mediação ou

expressão.

Esta situação tornou-se clara no século XVI devido a três fatores: a reforma

protestante, pelo cartesianismo e o empirismo, no qual os conceitos filosóficos

mudaram. E, apenas, no ensino jesuíta que a retórica se encontra, ainda deixando de ser

lógica. Ou seja, a retórica para os jesuítas não é mais a arte de persuadir, de construir

grandes discursos, mas sim a linguagem correta a ser utilizada.

No final da idade média, o ensino da retórica foi, de certa forma, foi lesado,

principalmente na Europa, e a disciplina substituída. Porém, em 1600, na Universidade

da França, a retórica latina retorna como pensamento ideológico, disciplina e linguagem

como matéria nobre. Isso acontece até, aproximadamente, 1750 quando a eloquência

constitui a única forma de prestígio fora das ciências. Como o declínio dos jesui6as

dessa época, a retórica encontra algum incentivo entre os membros da maçonaria

(BARTHES, 1975, p. 176).

Neste período, da Idade Média, entre os séculos V e XV, muito manuais e

tratados foram escritos e rescritos sobre a retórica e alguns em latim. Eram manuais

escolares produzidos pelos jesuítas, ou retóricas poéticas. A partir do século XVII e

XVIII, iniciaram-se os tratados, que apresentam a retórica como: paradigmática e

sintagmática (construção oratória).

Diversos foram os autores que se dedicaram a tais publicações com diferentes

pensamentos e transformações, alguns ideológicos e revolucionários, outros com a

introdução da lingüística. E, no século XIX, a retórica apenas sobrevive de seus ofícios,

e seus títulos começam a ter mudanças, como por exemplo, F. de Caussade: Rhétorique

at genres littéraires, 1889, Prat: Eléments de rhétorique ET de littérature, ou seja, nesta

67

ocasião a retórica começa a perder espaço para a literatura que domina as grandes

bibliotecas do mundo.

Observa-se que a retórica entrou em declínio não pela substituição da disciplina,

mas por muitas transformações ocorridas, passando pela gramática, lógica, poética e

filosofia. Por vez era pejorativa, analítica e depois revalorizante até chegar à ideologia.

De acordo com Barthes (1975) não se tem um data certa de quando a retórica

entrou em decadência. Todavia, a retórica enquanto ciência nunca deixou abalar, pode-

ser averiguar, por exemplo, nos estudos de linguística (metáfora e a metonímia) ou no

campo da comunicação com a publicidade e o jornalismo. O que se conclui que é com o

passar dos tempos as mudanças ocorreram, a retórica foi criando novos instrumentos,

conflitos e ideologias, mas nunca deixou de fazer parte da sociedade, principalmente

dos intelectuais.

Breton e Proulx (2006) ressaltam que os grandes ensinamentos da retórica, por

meio de Aristóteles, Cícero e Quintiliano, atravessaram séculos, “graças a sua

integração com o catolicismo” (p. 38). Grandes discursos tornaram-se referência de

ensinamento e pregação para os cristãos, mantendo elo entre a comunicação e a

sociedade.

2.6 – Retórica e os estudos das Teorias da Comunicação

Até o presente momento nossa preocupação, neste capítulo, foi retratar a história

da retórica e os principais pensadores de tal disciplina, principalmente Aristóteles e

Quintiliano. A partir de agora vamos nos aprofundar na relação da retórica com os

estudos da Comunicação, até adentrarmos no pensamento comunicacional de Frei

Caneca, nosso personagem.

Sabe-se que a primeira maneira do homem se comunicar foi através da fala.

Depois aprendeu a escrever. Os homens primitivos, ou das cavernas como alguns os

chamam, se comunicavam, por meio, de gestos, expressões, desenhos e ruídos, algo

similar aos animais.

Sodré (1948, p. 25) conta que a palavra nasceu da necessidade que tinham os

homens de melhor exprimir, aos demais, pensamentos e emoções, ou seja, a necessidade

68

de se comunicar. A escrita teve origem em outra precisão: a de fazer persistir, para

sempre, aqueles pensamentos e emoções. E a escrita nasce da exatidão de se registrar a

história da humanidade.

Dimbleby e Burton (1990, p. 12) ressaltam que no passado, a arte de se

comunicar (ser capaz de expressar ideias e opiniões e entender outra pessoa) era

baseada apenas no uso correto da linguagem. Porém, o estudo da comunicação inclui,

além do uso adequado da linguagem, outras formas de expressão, que nos habilitam a

perceber o que nos dizem e, assim, nos dirigirmos com as pessoas. A arte de se

comunicar não é um processo que nascemos com ele, aprendemos a utilizar as formas

mais ativas à melhor compartilhar de nossos conhecimentos.

David Berlo (2003, p.01) relata que uma pesquisa realizada nos Estados

Unidos26, demonstra que o norte-americano gasta cerca de 70% do seu tempo ativo

comunicando-se verbalmente, ou seja, ouvindo, falando, escrevendo e lendo. Cada ser

humano gasta cerca de onze horas do dia se comunicando.

A expressão comunicação nasce do latim communicatio, cujo se divide em três

partes: munis, que significa “estar encarregado de”; que sucedido do prefixo co, que

promulga da ideia de ter “uma atividade realizada conjuntamente”; e finaliza com a

terminação tio, que avigora a ideia de atividade.

A origem da palavra comunicação surge no universo do cristianismo antigo,

naquela ocasião, a vida eclesiástica era de veneração e o isolamento, e duas

convergências as decifravam: os anacoretas e os cenobitas27, relata o pesquisador Luiz

C. Martino (2010, p. 13), viviam em mosteiros, receberam uma prática com o nome de

communicatio, que é a ação de “tomar a refeição da noite em comum”, cuja

peculiaridade não é evidentemente o fato de “comer”, mas sim de fazê-lo “junto com

outras pessoas”, unidos, assim, aqueles que viviam isolados e originando o costume de

se romper com o isolamento. “Não se trata, pois de relações sociais que naturalmente os

homens desenvolvem, mas de uma certa prática, cujo novidade é dada pelo pano de

fundo do isolamento” (MARTINO, 2010, p. 13). Com isso, nasceu à necessidade de se

criar uma palavra que exprimi tal prática.

26 O autor não relata a data da pesquisa.

27 Os anacoretas eram religiosos que viviam em total solidão, retirada do convívio social. Os cenobitas são monges que vivem em comunidade e tem uma convivência social.

69

O pesquisador continua seu pensamento descrevendo que existem preferências

importantes no sentido original da palavra comunicação: o termo comunicação não

indica os tipos de relações, mas sim aquela em que se encontram características de

isolamento; a o desígnio de quebrar o isolamento; existe o conceito de uma efetivação

em comum.

A epistemologia da palavra comunicação deve-se diferenciar de duas outras

expressões. O termo “participação”, no sentido platônico, no qual o filosofo proclama a

relação dos seres com as ideias, dizendo que tudo no mundo sensível participa de uma

ideia radical de onde se parte. Platão avaliou as ideias como criaturas, que permanecem

em si e por si, que constituem o mundo inteligível, qualificado e afastado do mundo

sensível; que constituem um mundo que vive de aparência. A segunda expressão refere-

se em dizer que a comunicação não é “ter algo em comum”, pessoas com peculiaridades

ou qualidades parecidas. Todavia, não significa que duas pessoas com características

semelhantes tenham uma relação comunicativa ou porque fazem parte da mesma

comunidade.

A partir desta idéia que a terminação comunicação não se sobrepõe as

características ou ao jeito de ser das coisas, não demonstra um ato que agrupa pessoas

de uma comunidade. Ele não indica nem o ser, nem a ação sobre a matéria, tampouco a

práxis social, mas um tipo de relação intencional exercida sobre outrem, como ressalva

Luiz C. Martino (2010, p. 14).

Enfim, o significado de comunicação também pode ser expresso na simples decomposição do termo comum + ação, de onde significa “ação em comum”, desde que se tenha em conta que “algo em comum” refere-se a um mesmo objeto de consciência e não a coisas matérias, ou à propriedade de coisas materiais. A “ação” realizada não é sobre a matéria, mas sobre outrem, justamente aquela cuja a intenção é realizar o ato de duas (ou mais) consciência com objetos comuns. Portanto, em sua acepção mais fundamental, o termo “comunicação” refere-se ao processo de compartilhar um mesmo objeto de consciência, ele exprime a relação entre consciência (MARTINO, 2010, p.15).

Todavia, Antônio Hohlfeldt (2010, p. 62) diz que qualquer tipo de comunicação

é um fenômeno social, porque se dá através da linguagem e implica um número maior

de elementos que uma só pessoa. Ou seja, o homem é impossibilitado de viver separado

e sozinho, e, por isso, ocorre que o fenômeno da comunicação que também é social.

70

De acordo com HOHLFELDT (2010, p.62) existem quatro fenômenos

comunicacionais ligados ao homem. O primeiro é a intracomunicação, que é ligada a

fatores psicológicos, e acontece internamente (pensamentos), em apenas uma pessoa. A

interpessoal ocorre entre duas pessoas, a comunicação face – a - face. A comunicação

grupal que se dá entre uma pessoa e um grupo ou ao contrario. E, enfim, a comunicação

de massa28 que ocorre, por meio, dos veículos de comunicação.

Hohlfedlt (2010) completa seu pensando dizendo que as formas de nos

comunicarmos são três: 1) Pela fala, escrita ou desenho (imagem), como exemplo, a

escrita emprega de palavras, que são assinaladas no papel e seguem regras gramaticais.

2) Os veículos de comunicação, no qual a maioria utiliza-se de recursos tecnológicos,

mas também podem ser considerados meios de comunicação gestos e expressões. 3)

Mídias, que são subsídios da comunicação de massa, cujo inclui outras formas de

comunicação, como a imagem (TV), a fala (Rádio) e a escrita (Jornal).

Qualquer tipo de comunicação precisa de criação e troca de significados, e tais

significados são representados por signos e códigos. E o estudo da comunicação reflete

a respeito à criação e ao entendimento de tais signos. “Na verdade, as pessoas sentem

necessidade de ver significados em todas as ações humanas. Observar e entender este

processo pode conduzir a termos mais consciência do que estamos fazendo quando nos

comunicamos” (DIMBLEBY E BURTON, 1990, p. 12).

Entretanto, o professor Martino (2010, p.34) ressalva que a comunicação,

enquanto problema particular e como disciplina organizada, somente ganha autonomia

quando é tomada por significações. Ou seja, quando ela – comunicação – começa a ser

definida como prática social que se demonstra como tática lógica de inclusão do sujeito

na sociedade.

Fenômeno correlato à emergência de uma forma de organização coletiva cuja a dinâmica não se assenta sobre os valores da tradição, mas sobre o consumo do presente. Ou seja, uma organização social onde os atores vivem de seus contatos imediatos, da renovação compulsiva dos laços coletivos. É somente uma tal forma de

28 A massa, por definição, é constituída de elementos isolados psicologicamente e fisicamente. Se existirem duas pessoas em contato, acabou a massa, ao contrario de multidão. Não existe nenhuma organização e as pessoas processam as informações como indivíduo. A massa age por convergência. São várias pessoas, que isoladamente processam uma informação e por iniciativa individual tomam a mesma ação. A comunicação de massa ocorre quando existe uma grande audiência, algo talvez incontável; os receptores são heterogêneos; e anônima, o emissor não pode conhecer nomes nem características pessoais dos receptores. Sabe, é claro, o perfil do público, mas nada individualizado. As pessoas devem ser também anônimas entre si, ou seja, um não sabe que o outro está recebendo a mensagem.

71

organização coletiva que pode criar para si uma instancia chamada atualidade, a fim de exprimir o conjunto de uma realidade complexa, segmentada pela multiplicidade de agrupamentos (comunidades) (MARTINO, 2010, p. 34).

E, por meio, de tal organização coletiva, a qual Martino se refere, que os meios

de comunicação dão início a um desempenho relevante perante a sociedade. Pode ser

através da atualização perante o espaço público, tendo como exemplo o espaço virtual,

as redes sociais. Ou por aquele indivíduo que usa dos meios de comunicação como

instrumento de sondagem da sociedade, para que se possa ter uma continua relação com

os seres.

O pesquisador resume seu pensamento dizendo que é a partir de uma avaliação

da sociedade enquanto tipo de organização coletiva que se pode abranger, de um lado, a

precisão da comunicação do sujeito em sua participação coletiva; e, de outro lado, o

aspecto evidente e crescente que adquirem os meios de comunicação na sociedade de

massa, como parte importante no processo de instrumentalização da atividade individual

face ao seu desafio de engajamento numa coletividade complexa (2010, p. 35).

Hohlfeldt ressalta que a comunicação, hoje, tornou-se uma disciplina específica,

porém, seu campo de estudo é híbrido, e se encontra em diversas ciências e complexo,

como a sociologia, psicologia, ciências políticas, entre outros.

O que precisamos ter claro, contudo, é a existência de uma intima relação entre os processos comunicacionais e os desenvolvimentos sociais. Isso porque a comunicação, ao permitir o intercambio de mensagens, concretiza uma série de funções, dentre as quais: informar, construir um consenso de opinião – ou, ao menos, uma sólida na maioria – persuadir ou convencer, prevenir acontecimentos, aconselhar quanto a atitudes e ações, construir identidades, e até mesmo divertir. Os estudos da história das civilizações – fiquemos com as ocidentais, mas certamente podemos aplicar os mesmo principio a todas as demais – evidencia uma íntima relação entre a existência de sistemas comunicionais e o auge do desenvolvimento da civilização. Dentro os outros estudiosos, os canadenses Harold Adams Innis e Marshall McLuhan desenvolveram estudos nessa direção. Para efeito de uma primeira abordagem do fenômeno comunicacional em sua relação com o desenvolvimento das tecnologias, dos avanços culturais e dos fenômenos sociais, podemos exemplificar, no caso da civilização

72

ocidental, com cinco momentos diferentes29 (HOHLFELDT, 2010, p. 63).

Adentrando ao pensamento do professor Hohlfeldt30, e seguindo sua cronologia

aos estudos sobre a história da comunicação e das teorias da comunicação, podemos

compreender a importância dos estudos dos filósofos gregos a os estudos da retórica.

Primeiramente, gostaríamos de explicar o que é uma teoria e como conceitua –

lá, para depois apresentarmos a história. A pesquisadora Vera Veiga França (2010, p.

47) relata que uma teoria é um conjunto de expressões, um corpo organizado de ideias

sobre a realidade ou sobre certos aspectos da realidade. A etimologia da palavra teoria

abrange os conceitos de espetáculo, apreciação e abstração intelectual. É o resultado das

considerações já apontadas, se vinculando com a realidade e autonomia da reflexão.

A pesquisadora ressalta que não somente o conhecimento cientifico produz

teorias.

(...) Nossa convivência e nosso desempenho no terreno da comunicação promovem um grande estoque de conhecimentos sobre elas. Mas ao lado desse conhecimento, no entanto, um outro esforço compreensivo vem sendo desenvolvido no campo da ciência, através do desenvolvimento de inúmeros estudos sobre os meios de comunicação e a realidade comunicativa. A teoria ou as teorias da comunicação são o resultado e a sistematização dessas inúmeras e distintas iniciativas, com pretensão científica, de conhecer a comunicação (FRANÇA, 2010, p. 47).

Seguindo para a história das teorias e sua repercussão com a retórica, professor

Antonio Hohlfeldt conta que com a criação da cidade de Atenas e Esparta iniciou-se a

civilização grega, gerando uma grande economia, principalmente agrícola. Com a

evolução, os gregos começaram a desenvolver atividades culturais e filosóficas, como

os discursos de Platão e Sócrates, inicia-se o teatro, com grandes espetáculos para cerca

de 15 mil pessoas, os atores e a ideia do diálogo. Acontecia, ainda, atividade política e

29 O pesquisador Antônio Hohlfeldt descreve, em seu texto “As origens antigas: A comunicação e as civilizações” (HOHLFELDT, A; MARTINO, Luiz C.; FRANÇA, Vera Veiga; in: Teorias da Comunicação: Conceitos, escolas e tendências. 9º Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010), que os estudos das teorias da comunicação são divididos em cinco etapas: Grécia, século V a.C.; Roma, entre os séculos I a a.C. e o século I d.C.; França, a partir do final do século XVII e especialmente ao longo de todo o século XIX; Europa e Estados Unidos, a partir da segunda década do século XX até o momento. Porém, o maior foco desta dissertação é se concentrar no período da Grécia Antiga, quando surgem os estudos sobre a retórica, principalmente, com Aristóteles. 30 Idem, ibidem 12

73

judicial, pois os gregos gostavam de discutir com intensidade nos tribunais e

construírem sua democracia, praticada na ágora31.

A literatura, também, já era prática dos gregos, como Homero, que escreveu

Ilíada e Odisséia. Com a criação do Monte Olimpo, como templo dos deuses e

idealizador da semelhança dos homens, Hesíodo apresentou aos gregos a compreensão

da realidade, para ele tudo se resume ao conceito physis (natureza), que é a lei do

retorno, o homem paga pelo que se faz.

Dentro deste contexto histórico foram, então, os gregos, que por primeiro, no

Ocidente, conjeturam o pensamento comunicacional, a partir dos estudos filosóficos dos

pré – Socráticos32, que iniciaram o aprendizado através do diálogo, com perguntas e

respostas, desenvolvidas por um mestre, levando o (s) discípulo (s) ao aprendizado

esperado (HOHLFELDT, 2010, p. 69). Porém, os primeiros estudos à comunicação,

com práticas e reflexões importantes, pertencem a Platão e Aristóteles.

Platão nos deixa duas contribuições importantes. A primeira refere-se quando

escreveu o Livro VII de A República, escreveu a narrativa o Mito da caverna, podendo

ser considerado a primeira projeção de cinema devido a situação descrita, que são

humanos presos dentro de uma grande caverna, que estão de frente para a parede e de

costa para entrada, local em que se entraria uma luz. E, sem poderem se mexerem

apenas visualizavam a projeção das sombras dos objetos reais, que passam por fora

caverna e por dentro devido a força da luz, fazendo com que eles acreditassem que o

acontecimento fosse real.

Basta vocês visualizar a situação proposta por ele para entender o quero dizer: os homens agrilhoados no fundo da caverna seriam os expectadores no interior da sala; a projeção das sombras, a partir da boca da caverna, produzidas por força da luz que incide sobre elas, é o próprio principio da iluminação projetada sobre o celulóide transparente que, graças ao jogo de lentes e ampliadores, projeta as imagens sobre a tela branca, etc. (...) A genial criador de histórias em quadrinhos brasileiro, Maurício de Souza, parodiou esta situação, com uma historinha exemplarmente inteligente: “As sombras da vida”, com Piteco (HOHLFELDT, 2010, P. 72-73).

31 Local mais alto de um monte, onde os cidadãos de maior conhecimento se reuniam para conferencias de ideias, de onde os gregos concluíram se em tornarem os primeiros teóricos nos campos da filosofia, da política e da retórica, como veremos adiante. 32 Como já relatamos com o início dos estudos da retórica, que surgem com pré-socráticos, passando para os Socráticos.

74

Em um segundo momento, no mesmo livro, Platão amplia seus conhecimentos

em inúmeros graus, desde a ignorância até o verdadeiro saber, passando pela opinião,

assunto que discute em outros discursos33.

O professor Antônio fez um quadro, cujo explica a ideia do filosofo sobre o

mundo sensível.

Ilustração 1- A ideia do mundo sensível de Platão.

Apesar de Platão ser considerado o primeiro a concretizar a comunicação, porém

seu pensamento era de uma visão negativa do mundo. Em sua teoria do mundo ou das

ideias pressupõe que o homem vive de sua memória e cópia ideias originais, e que o

saber é impraticável ao menos para os homens que recebem o dom do conhecimento

(em uma metáfora Platão ressalva que o conhecimento pode ser um dom aos homens

privilegiados pelos Deuses) ou buscam estudos. “Ele nega, de certo modo, a

possibilidade da troca de informação entre os seres humanos, condenados, segundo ele,

à condição de prisioneiros da caverna... (HOHLFELDT, 2010, p.72).

Eduardo Neiva Júnior (1991), com pensamento ao contrário do professor

Antônio, apresenta que os conceitos de comunicação se aplicam antes mesmo de Platão,

quando Córax descobre que o discurso deve corresponder a um arranjo, sendo

esquematizado e trazer ensinamentos, para que, assim, alcance a persuasão e o

convencimento. O autor descreve que os discursos tinham como ato de comunicação,

33 Neste contexto, Platão se refere ao mundo sensível, no qual, já mencionamos neste capítulo.

75

convencer e atingir sua audiência. Para atingir a audiência precisavam ser discursos

muito bem preparados, escritos e comentados, de linguagem fácil.

Após inicia-se a discussão da importância do verossímil, com os pitagóricos e

sofistas, que dá a entender que a consciência do que o assunto retórico será dinâmico na

medida de sua adaptação à audiência. “Pouco importa formular uma proposição

verdadeira se os destinatários forem refratários a seu efeito de verdade” (NEIVA, 1991,

p. 171). Ainda apresentam a retórica psicagogia, que é de caráter psicológico, ou seja, o

orador só terá resposta e o estimulo da audiência se ele conseguir, por meios

psicológicos, conquistar seu público (falando de valores e crenças).

Os pitagóricos discutiam o Kairos34 que dava segurança do conhecimento do

convívio social aos atos comunicativos. Os argumentos oportunos são mais importantes

do que a verdade além do conhecimento. Aquele que tem melhor poder de persuadir

torna a verdade em objeto secundário.

E, no século XX, inspirada no modelo matemático dos pitagóricos, criou-se a

teoria da comunicação matemática, também conhecida como teoria da informação, que

aborda a necessidade de uma zona comum àquele que constrói o discurso e a quem o

recebe. Sem isso não existe comunicação. Sob a forma de saber técnico, renascem os

conceitos da antiguidade (NEIVA, 1991, p. 172).

Ainda, na última metade do século V a.C. (NEIVA, 1991, p. 173), antes de

Platão, os sofista saíam pela cidade da Grécia ensinando a retórica, gramática e cultura,

em um período onde eles se preocupavam com tais assuntos. “A nossa própria educação

ainda é baseada na estrutura criada pelos Sofistas: é preciso estudar gramática, retórica,

ter conhecimento do uso da linguagem para a vitória nas disputas verbais” (NEIVA,

1991, p. 174).

E a partir de então surge o pensamento platônico, no qual se refere à

comunicação, com uma visão negativa. Platão questiona de tal forma a retórica que num

primeiro momento diz que essa ciência é apenas a preleção que busca decorar, bajular e

persuadir. Depois, em um segundo momento, tem uma atitude conciliadora, diz que a

retórica fica a depender do conhecimento temático daquilo que está em discussão.

A crítica de Platão chega a tal ponto que dá início a uma amargura a retórica,

que segundo ele enquanto técnica persuasiva, a retórica morre. Para Platão a retórica só

é boa quando emerge do conhecimento e conhecer é definir.

34 Kairos é o conhecimento dos costumes de cada setor social. E utilizar o de tal conhecimento é assegurar que o orador conseguirá atingir seu objetivo.

76

Vera V. França (2010, p. 52) diz que estaríamos enganados se afirmarmos que

os homens e a sociedade não se preocupassem com a comunicação, pois os gregos já

exerciam o uso da palavra, da escrita e do discurso. A mesma ressalta que, Platão

enfatiza a importância do discurso que procura a verdade, diferenciando-o da retórica.

Aristóteles conceitua a retórica, de diversas formas, como meio de persuasão, além de

organizar e classificar suas ideias.

A importância dos estudos de Aristóteles, e outros filósofos gregos, não se ligam

apenas na retórica, mas também na política e cultura. Marques de Melo (2003a) diz que

a comunicação e a política são duas faces da mesma moeda, pois são condições

necessárias para poder se viver na sociedade. E os homens conseguiram se unir e

construir um Estado capaz de assegurar justiça, conhecimento e cultura.

Esse fenômeno de dupla sobrevivência - física e cognitiva - foi gerada ao mesmo tempo pela communis – dimensão retórica da vida social – e pela polis – variável política da organização societária. A capacidade humana de gerar símbolos – palavras, sons e imagens – comunitariamente reconhecidos e pacificamente legitimados foi a alavanca que neutralizou a barbárie, dando passagem à civilização. Os grupos humanos substituíram o poder da violência pela força do argumento, obtendo o consenso duradouro ou negociando tréguas estratégias entre competidores aguerridas (MARQUE DE MELO, 2003a, p. 14-15).

O pesquisador afirma que Aristóteles foi a primeira fonte codificadora da cultura

grego-romana, e é o alicerce do pensamento ocidental. E pode-se encontrar, em suas

obras, demonstrações satisfatórias para tal afirmação, aonde está o início do paradigma

comunicacional, composto em duas obras: Políticas e Retórica, no qual primeiramente

procura explicar, separadamente, cada uma e depois como tal união pode ser fonte de

maior importância para o seres humanos.

Em seu Livro I da Política, o filosofo diz que o Estado “é a forma mais elevada

de comunidade” (MARQUES DE MELO, 2003a, p.15), chamando-a de comunidade

política. E junto criou o sentido da natureza, atribuindo características relacionadas ao

homem. Para tal pensamento, Aristóteles diz que o homem é, por natureza, um animal

político, e para poder se expressar, faz a comunicação, utilizando-se das palavras.

É evidente que o homem é um animal mais político do que as abelhas ou qualquer outro ser gregário. A natureza (...) não faz nada em vão, e o

77

homem é o único animal que tem o dom da palavra. E mesmo que a mera voz sirva para nada mais do que uma indicação de prazer ou de dor, e seja encontrada em outros animais (...) o poder da palavra tende a expor o conveniente e o inconveniente, assim como o justo e o injusto. Essa é uma característica do ser humano, o único a ter noção do bem e do mal, da justiça e da injustiça. E é associação de seres que têm uma opinião comum acerca desses assuntos que faz uma família ou uma cidade (POLÍTICA, p. 144 apud MARQUES DE MELO, 2003a, p.15).

O objetivo da política atingiu-se, na sociedade grega e seguindo o modelo as

próximas sociedades, pelo fato de que o homem ter conseguido conciliar o seu consenso

político, a criação do Estado e seu ambiente de comunicação, situações que podem

garantir a vivência do ser. Aristóteles apresenta essa circunstância como à concepção

do “homem perfeito”, capaz de harmonizar a comunicação com a transposição da

sociedade.

Aristóteles via a política como uma arte de governar, de administrar a justiça. E,

ainda, ressalta que a melhor forma de conduzir a justiça, os governantes necessitam

valer-se da retórica (MARQUES DE MELO, 2003a, p. 16), na qual consegue ter o

discernimento de significado da integridade.

Melo ressalta que o artefato da Comunicação é saber articular o exercício da

política e, ao contrário, para o exercício da política precisa saber proferir a

comunicação, e que trata-se de atividades concluíres, mas não coincidentes, elas se

ajudam, porém são de autonomia diferentes. E, para bem se desenvolver com tais

práticas a retórica35 constrói um papel fundamental.

(...) Donde resulta ser retórica como que um rebento da dialética e da ciência dos costumes que podemos, com justiça, denominar Política. Pelo que a retórica chega ao ponto de se cobrir com a máscara da Política. Assim procedem aos que têm a pretensão de a praticar, levados pela ignorância, por impostura ou por outros motivos inerentes à natureza humana (ARISTÓTELES, p. 23 apud MARQUES DE MELO, 2003a, p. 17).

Ao apresentar o exercício das duas práticas – Retórica e Política – Aristóteles,

esclarecia, para a sociedade da época, a ação da democracia, e, para isso, era preciso

saber persuadir os poderosos (legisladores e juízes) e a população. Sendo assim, a

retórica era indispensável para os sábios. 35 Neste capítulo já foi explicado que é a retórica e como Aristóteles a classifica.

78

Nesta linha de raciocínio, os cultores da Retórica do tempo de Aristóteles são percussores remotos dos profissionais midiáticos da sociedade pós-industrial, sobretudo, aqueles contingentes que hoje se dedicam à Comunicação Institucional, à Informação Estratégica e ao Marketing Político. (...) Na verdade dimensiona esse espaço retórico como fenômeno embrionário do mass media, que somente viria a ser poten-cializado no século XV, com a invenção da imprensa, e concretizando no século XIX, com o funcionamento das rotativas (MARQUES DE MELOa, 2003a, p. 18).

Porém, durante muito tempo, as sociedades não se preocuparam em aprofundar

os estudos da retórica, e se tornou inútil. Somente, quando ocorreu as Revoluções

Burguesas (Inglaterra, França e América do Norte), que tal ensinamento voltou a ter

estima.

Marques de Melo (2003a) ressalta que o primeiro indício do retorna da retórica

se dá na peça oratória Aeropagítica (1644), com uma preleção à liberdade de imprensa

designado ao Parlamento Inglês, cujo autor da peça, reivindica a extensão

“democrática” do uso do novo areópago – a imprensa – a todos os cidadãos,

independente de “censura prévia” (p. 19).

É justamente, no início do século XX, quando surgem os novos meios de

comunicação que trazem som e imagem, que a política atinge a sociedade promovendo

a aptidão comunicacional em seus agentes. A transparência que os mass media dão aos

atos governamentais transforma os cidadãos em partícipes das decisões tomadas pelos

três poderes (executivo, legislativo e judiciário) (MARQUES DE MELO, 2003a, p. 20).

E foi, neste contexto, que a comunicação se tornou o “quarto poder”, no qual fez com os

que atuam na política sentissem obrigados a conhecer sobre sua estrutura. Porém, com o

surgimento dos novos meios de comunicação, a persuasão proposta por Aristóteles se

emergiu, e também se inovou com a ciência do comportamento, entre a Política,

Comunicação e Psicologia.

Com os novos meios, surgem novas ideias e pensamento, e foi o que aconteceu

com o pioneirismo de Harold Lasswell, com seu texto Propaganda Technique in the

World War (1927), que discute a ação da comunicação política durante a primeira

guerra mundial, como forma de persuasão direta a sociedade (estimulo – resposta).

Lasswell cria o primeiro paradigma comunicacional: canais, comunicadores, conteúdos,

efeitos.

79

Ele rompe a estreita dimensão dos estudos comunicacionais aristotélicos – cuja centralidade está no interior do processo: o discurso, o interlocutor e o ouvinte – incorporando o ambiente cultural, particularmente no seu contexto sociopolítico – efeitos -, e ao mesmo tempo deslocando a centralidade do foco analítico para a tecnologia que dá suporte ao processo comunicativo – os canais (MARQUES DE MELO, 2003a, p. 21).

Como complemento do pensamento do professor Marques, citamos Mattelart e

Mattelart (2004, p. 37) que dizem que os meios de difusão passam a existir como

organismo necessário para a “gestão governamental das opiniões”.

Para Lasswell, propaganda rima, daí por diante, com democracia. A propaganda constitui o único meio de suscitar a adesão das massas; além disso, é mais econômica que a violência, a corrupção e outras técnicas de governo desse gênero. Mero instrumento, não é nem mais moral nem mais imoral que “a manivela da bomba d’água”. Pode ser utilizada tanto para bons como para maus fins. Essa visão instrumental consagra uma representação da onipotência da mídia, considerada ferramenta de circulação “eficaz dos símbolos”. A opinião comum que prevalece no pós-guerra é a de que a derrota das forças alemãs deveu-se enormemente ao trabalho de propaganda dos Aliados. A audiência é visada como um alvo amorfo que obedece cegamente ao esquema estimulo – resposta. Supõe-se que a mídia aja segundo o modelo da “agulha hipodérmica”, termo forjado por Lasswell para designar o efeito ou impacto direto e indiferenciado sobre os indivíduos (MATTELART E MATTELART, 2004, p. 37).

Marques de Melo reflete sobre a contribuição para a Comunicação Política.

Porém, outros autores abrem mais leques ainda. O próprio Antonio Hohlfeldt, diz que

Aristóteles está à frente de conceitos, dos dias atuais, sobre a cultura e como ela age

perante a sociedade.

Em sua obra Metafísica, Aristóteles descreve que toda natureza é uma potência,

pois ela pode ser transformada dependendo da ação humana, e materializada em um ato.

E essa potência é uma matéria, que pode ser arquitetada em diversos aspectos pelo

homem, adotando assim formas, que também depende do homem36. Ou seja, tudo nasce

do homem, da natureza, que se modifica sob resultado de alguma coisa transformando

em outro objeto, e gera o ato – o acontecimento.

36 HOHLFELDT, Antonio, 2010, p. 73 apud Aristóteles, in Rodolfo Mondolfo, O pensamento antigo, São Paulo, Mestre Jou / EDUSP, 1964, vol. 02, p.29s.

80

Entende-se que o filosofo quer ressaltar a importância do homem como um

agente capaz de modificar as ações. E em sua obra Poética, ele consegue explicar

melhor, por meio, da dramaturgia, da imitação. “O imitar é congênito no homem (e

nisso difere dos outros viventes, pois, de todos, ele é o mais imitador e, por imitação,

aprende as primeiras noções) e os homens se comprazem no imitado”37.

Hohlfeldt descreve que a imitações se diferenciam uma das outras por três

motivos: as que imitam por meio diversos, imitam por objetos diversos, e imitam

objetos diversos, de maneiras diversas e não do mesmo modo. É, claro, que não se pode

imitar tudo e de todas as maneiras, porém os meios pelos quais nos comunicamos

podem ser imitados, como a imagem, a palavra, gestos, e, assim, se consegue múltiplos

efeitos.

Baseados nestes conceitos, o professor Antonio Hohlfeldt descreve que a arte da

imitação, na qual Aristóteles se refere é o que, hoje, designamos de romance, novela,

conto ou poesia (2010, p. 75). “Aristóteles é, pois, o primeiro a refletir a respeito das

diferentes artes e dos gêneros artísticos, temas que, depois ocupariam a Estética ao

longo dos séculos” (HOHLFELDT, 2010, p. 75).

Em continuação ao pensamento comunicacional Aristotélico, Hohlfedlt destaca a

obra mais importante do filosofo, A retórica38, que é a arte de se discursar bem e saber

persuadir o seu público. O pesquisador, de início, apresenta a mesma ideia de Marques

de Melo (2003a), que o homem é um “ser animal social e político”, porém ele dá

destaque dá importância a retórica para se viver em sociedade e ao poder de persuasão

que se tem perante o público. E, ainda, diz que a retórica tem por finalidade a persuasão,

e sua evidência é apresentar os meios de como persuadir.

Por fim, Hohlfeldt ressalva que o estado da retórica é aquela em que três

elementos devem ser claramente discerníveis: “o que, aquilo que se fala e aquele a

quem fala” (2010, p.78). E com tal presunção, Aristóteles é considerado o primeiro

teórico a estabelecer a condição da comunicação por excelência.

A fórmula descrita por Aristóteles, na retórica, é a mesma reproduzida quando se

iniciou os estudos da Teoria da Comunicação, modelo – já apresentando por Marques

de Melo (2003a) – de Harold Lasswell.

37 HOHLFELDT, Antônio, 2010, p. 74 apud Aristóteles, Poética, São Paulo, Abril Cultural, p. 445 (1448aiIV) 38 Neste mesmo capítulo já apresentamos toda a essência da Retórica de Aristóteles.

81

ARISTÓTELES: a pessoa que fala - o assunto - a pessoa a quem se fala

H.D. LASSWELL: emissor (fonte) – mensagem – receptor39

O real modelo de Lasswell apresenta mais dois itens: em que canal e com que

efeito. Porém, como ressalta o professor Antonio, a contribuição de Lassweell ocorreu,

mais de 20 séculos, depois de Aristóteles, que tinha ainda uma prerrogativa:

Ele – Aristóteles – pressupõe o processo verdadeiramente comunicativo, na medida em que, ao discernir os gêneros, entende que a situação comunicacional é dialógica, isto é, a pessoa que fala, ao dirigir-se a seu antagonista, espera dele uma resposta ou alcança convencê-la ou dissuadi-lo de ou sobre algo. Assim, a pessoa a quem se fala transforma-se, num segundo momento, numa outra pessoa que fala, e fala àquela primeira, por sai vez, transformada em ouvinte. Esta realidade não chega ser analisada no modelo proposto por Lasswell, reduzindo-o, pois, apenas a um processo informativo, na medida em que se esgota ao atingir o receptor: Quem – Diz o quê – Em que canal – A quem – Com que efeitos (HOHLFELDT, 2010, p.79).

Para acrescentar os estudos de Lasswell, anos mais tarde, os pesquisadores

Raymond Nixon e Wilbur reviram o modelo apresentando, o estendendo, abrangeram os

objetivos do emissor e as condições de recepção, ordenando um modelo genuinamente

comunicativo.

Para concluir o pensamento do professor Hohlfeldt, o próprio descreve que os

gregos, a sociedade antiga, conseguiu se erguer enquanto sociedade e comunidade

através de seus conhecimentos e a capacidade de se comunicarem. A retórica fez a

integração de todos.

Outro autor que discute os estudos retóricos no contexto da comunicação é

David Berlo (2003), no qual, ressalta que Aristóteles determina à retórica

(comunicação) como “todos os meios disponíveis de persuasão” (p.7). O filosofo

argumentou com outros prováveis elementos de quem fala40, porém deixou, claramente,

exposto que o principal objetivo da comunicação é a persuasão, ou seja, fazer com que

os outros aceitem as opiniões apresentadas por aquele que fala. 39 Fórmula descrita por Antônio Hohlfeldt (2010, p. 79). 40 De acordo com o processo de comunicação criado por Lasswell.

82

O pensamento de David Berlo foca-se, principalmente, nos processos de

comunicação, como eles surgem e a introdução às teorias. E pode-se dizer que todo esse

processo tem como base os estudos aristotélicos referente à retórica, preocupados com

ação: de quem – diz o quê – a quê (como já relatado por Antônio Hohlfeldt). Berlo

apenas mudas as palavras: Influenciar? Influenciar quem? E como? (2003, p.15)

O pesquisador ressalta que desde que nascemos e começamos a entender o nosso

organismo, o organismo social em que vivemos, influenciamos e somos influenciados.

Usamos dos instrumentos do comportamento comunicacional para alcançarmos

objetivos, ou seja, a relação entre o homem e o homem, e as bases culturais.

Nosso objetivo básico na comunicação é nos tornar agente influentes, é influenciarmos outros, nosso ambiente físico e nós próprios, é nos tornar agentes determinantes, é termos opção no andamento da coisa. Em suma, nós nos comunicamos para influenciar – para influenciar com intenção (BERLO, 2003, p.12).

Esta discussão, segundo o autor, tem por objetivo esclarecer que todo

comportamento de comunicação visa apenas produzir uma reação. Assim, quando temos

uma ação comunicativa e logo temos a reposta, conseguimos atingir nossa principal

meta. E, essa fórmula apresentada nada mais é que o princípio clássico de Aristóteles,

porém a dificuldade encontra-se em localizar o objeto do comunicador e o que ele

pretende com a reação. O próprio dá um exemplo citando estudantes de comunicação:

“No estudo da oratória ou do jornalismo, da redação publicitária, o estudante terá

dificuldades em decidir o que irá ou não comunicar, enquanto não especificar os efeitos

que pretende, em termos da reação que deseja provocar na audiência” (BERLO, 2003,

p. 13).

De início Berlo (2003) relata que este pensamento de que a comunicação é

persuasiva foi aprofundado até o final do século XVIII, pois, em um período anterior,

no século XVII surgiram escolas de pensamentos psicológicos, que diferenciaram “alma

e mente” (p.08), aplicaram conceitos caracterizados entre eles. Esses novos conceitos

submergiram a retórica, atribuindo dois novos atributos independentes: o primeiro –

mente – é da natureza intelectual ou cognitiva; e o segundo – alma – de caráter

emocional.

83

Por essa teoria, um dos objetivos da comunicação era informativo – um apelo à mente. O segundo era persuasivo – um apelo à alma, às emoções. O terceiro era o divertimento, e argumentava-se que poderíamos classificar as intenções do comunicador, e o material de apoio por ele usado, dentro dessas categorias (BERLO, 2003. p.08).

Neste ponto o pensamento não é defendido no contexto da psicologia ou por

psicólogos, mas sim, na existem da intenção de comunicação. Ou seja, a maneira de

expressar-se, a argumentação pode ser feita pela mente, utilizando de provas racionais e

lógicas, ou na persuasão.

Porém, houve uma necessidade de se revisar os conceitos do objetivo da

comunicação, mas não deixando de lado o que já se havia conquistado, e com a

evolução do pensamento da psicologia das faculdades surgem os behavioristas, que

manifesta a opinião de que a estrutura pode ser observada, apresentando melhores

resultados se abandonamos o pensamento de que as ações são estímulos para si mesmo,

ao invés de ações para todos. “Ao seguir este ponto de vista, o teórico do

comportamento comunicativo está mais próximo da posição clássica aristotélica,

redefinida à luz da pesquisa e do pensamento posterior” (BERLO, 2003, p.09).

Também com base no pensamento de David Berlo, pode-se considerar o

surgimento da teoria da argumentação, também conhecida como teoria da persuasão,

baseada nos estudos retóricos, que iremos rever mais adiante.

Berlo apresenta que na Retórica, Aristóteles afirma que temos que nos prender a

três situações: quem fala, o discurso e a audiência. Para o pesquisador cada uma desses

elementos é fundamental a comunicação e a base dos estudos do processo, sob três

visões: primeiro, a pessoa que fala; segundo, o discurso que faz; e, terceiro, a pessoa

que ouve. E, ainda, que grande parte dos modelos de comunicação é semelhante ao de

Aristóteles, embora alguns sejam mais complexos.

O pesquisador Eduardo Neiva compartilha do mesmo pensamento de Berlo, de

que as principais teorias se baseiam na retórica, e uma das teorias contemporânea, na

qual, mais se fundamentou na classificação de Aristóteles foi a teoria da Informação,

que nem mesmo é uma teoria de comunicação humana, mas sim de comunicação

eletrônica e que foi incluídos mais dois itens: 1 – A fonte; 2 – O transmissor; 3 – O

sinal; 4 – O receptor; 5 – O destinatário.

84

Se traduzirmos a fonte como a pessoa que fala, o sinal como o discurso e o destinatário como ouvinte, teremos o modelo aristotélico, acrescido de dois ingredientes: o transmissor, que envia a mensagem da fonte, e o receptor, que capta a mensagem para o destinatário (BERLO, 2003, p. 30).

Claro, como já citado, existem muitos outros modelos, como o clássico de

Lasswell também inspirado em Aristóteles, o que os diferem são elementos, alguns que

incluem, outros se modificam, depende do ponto de vista de cada um e para qual sua

finalidade.

Para adentrar e melhor entender o paradigma da retórica com os estudos da

comunicação, chegando assim ao pensamento de Frei Caneca, buscamos outro autor, já

citado, que discute o pensamento aristotélico com um outro ponto de vista, a retórica

como formação da opinião pública.

Eduardo Neiva Júnior (1991) ressalta que o pensamento aristotélico sobre a

formação da opinião pública se dá ao questionar o verdadeiro e o verossímil, e a

analítica e a dialética. De início, o autor, diz que a opinião pública se forma através

daquilo que o homem acredita ser verdade e vai de acordo com seus valores, e é

exatamente esta atuação do verossímil41, que supõe que a argumentação é eficiente

graças a sua aprovação por todos ou pela maioria, ou pelos membros notáveis de uma

comunidade (p. 187).

A retórica é uma teoria da opinião pública e também do uso de representações coletivas presentes no discurso; pois – afinal – qualquer construção comunicacional irá se valer de conteúdos aceitos pela coletividade que se quer persuadir. Essa é uma regra retórica fundamental: só é persuasivo o argumento que atua convincentemente sobre a audiência específica que recebe a argumentação (JÚNIOR, 1991, p.187).

Argumentos psicológicos e emocionais também têm poder de persuasão e são

vantajosos para a audiência por abordarem assuntos de interesses pessoais, e ainda

manifesta opiniões mantidas pela grande maioria. Aristóteles aconselha que o orador

utilize pensamento e ideias em que a comunidade destinou ao assunto em questão,

fixou-se como opinião pública.

41 O conceito de verossímil já foi apresentado no início deste capítulo.

85

Junior (1991) acrescenta que a opinião precisa ser respeitável e democrática com

o público, e chega-se a opinião por meio de uma organização indutiva. “A opinião

pertence, por tanto, ao regime da pragmática. A opinião não é apenas emitir juízos. A

opinião coletiva permite que juízos parciais sejam decisivos” (p.191).

Todavia, o autor diz que, segundo a tradição grega, opinião também é definida

como que ideologia, pois ambas se caracterizam por irem além do contexto da

individualidade, chegando às formas de ação coletiva. E a ideologia pode estar

manifesta em qualquer tipo de mensagem, até mesmo em discursos científicos

(JÚNIOR, 1991, p.193).

A ideologia ou a opinião surge através de valores tanto individual quanto

universal, tradições, crenças e cultura, porém a retórica deve se aproveitar dessas ações

para melhor persuadir e atingir a audiência. E valores apoiados na sociedade obtêm

força a partir da proximidade de associação aos argumentos. “A retórica e a

comunicação resultam da força: são dimensões da potencia social: Força, poder e crença

advêm do mesmo horizonte” (JÚNIOR, 1991, p.198).

Eduardo Neiva Jr. conclui seu pensamento fazendo uma reflexão de que a

retórica, teve seus altos e baixos, porém ainda precisa de muito para se ter uma

conclusão da importância da retórica para os estudos de comunicação. Sempre ao ler

Aristóteles, e outros se consegue ter uma nova visão do contexto e abrir um novo leque.

Aristóteles refere ao discurso, como modo de persuasão, no qual, hoje, podemos

nos referir aos veículos de comunicação, que são produtores da opinião pública. “No

universo da opinião, tão tradicionalmente diverso dos regimes analíticos e científicos, o

quantificador todos indica constituição, formação dos sujeitos a partir da opinião

pública” (JÚNIOR, 1991, p.200).

E o próprio Aristóteles ressalva “(...) a arte retórica preocupa-se unicamente com

o que se refere à opinião, dizendo-nos que, embora não justificável em si, é no entendo

necessário” (s/d, p.206).

Após entendermos o contexto histórico, cultural e social da retórica seguimos

para o pensamento retórico de Frei Caneca, objeto de estudo desta pesquisa.

86

2.7 – A retórica de Frei Caneca

Depois de nos aprofundarmos no campo da retórica, em sua história e seu

contexto comunicacional, procuramos apreender como Frei Caneca foi influenciado por

esta disciplina e como ela o ajudou a desenvolver discursos e textos tão bem

trabalhados.

Durante muitos séculos a linguagem era o principal meio de comunicação,

através dela formaram-se expressões, conceitos e pensamentos, que alicerçaram

concepções, construções políticas e jurídicas (hoje, temos outros meios de comunicação,

como a televisão, o rádio, o jornal e a internet). Também, por meio da linguagem,

surgiram os primeiros publicistas, hoje, conhecidos como jornalistas, que discursavam

em praças públicas, e ou criaram seus próprios panfletários.

Ainda a linguagem senhorial era empregada com muito realce pela sociedade

conservadora, e a retórica estava amplamente ligada ao pensamento liberal, pensamento

do carmelita. Os sermões, discursos, textos didáticos e o jornal Typhis Pernambucano,

são mais que referências para termos conhecimento de que seus trabalhos seguiam os

critérios dos mestres da eloquência. E sobre o qual elaborou três textos: Gramática

Portuguesa, Tratado de Eloquência e Taboas Synopticos Do Systema Rhetorico de

Fabio Quintiliano.

O pensamento comunicacional de Frei Caneca foi produzido entre os anos de

1803 e 1824, quando elaborou e publicou seus textos, também marcados pela forte

atuação política, intelectual e jornalística, com grande influência do Iluminismo

(Revolução Francesa). No entanto, não escreveu nenhum livro sobre o jornalismo, até

mesmo porque a existência dessa atividade em sua época era legitimada como

publicismo. O seu pensamento comunicacional pode ser encontrado nos seguintes

textos, além dos três a cima citados: Dissertação e Oração, e todos foram publicados,

em 1979, no livro Obras Políticas e Literárias de Frei Joaquim do Amor Divino

Caneca. Além disso, Caneca foi redator do jornal Typhis Pernambucano, entre os anos

de 1823 e 1824.

Suas ideias começaram a ser expostas ao iniciar seus textos didáticos, os dois

primeiros, já mencionados, - Tratado de Eloqüência, dividido em três partes – A 1ª

Systema de Eloqüência, no qual apresenta a estrutura retórica, as partes do discurso; 2ª

Preceitos eloqüentes com aplicações em prosa e verso, descreve a maneira correta da

87

elocução, a construção de textos e discurso. E a 3ª Verasificação Portuguesa, Frei

Caneca preocupou-se em ensinar a gramática para a construção de um bom discurso.

Em Taboas Synopticas do Systema Rhetorico de Fabio Quintiliano -, o religioso

definiu a retórica como poder de persuasão, sendo associada ao exercício do magistério

e, mais ainda, à pedagogia político cultural, visando esclarecimento a humanidade. A

retórica e a eloquência eram pontos-chave para a formação das elites no século XIX.

Assim, é possível fazer a ligação entre a imprensa de opinião que surgia com força no

Brasil dos anos 1820 e 1830, com considerável peso na cena pública da nacionalidade, e

as duas disciplinas ministradas pelo professor Frei Caneca, que desse modo se

identificava com o Brasil (MOREL, 2000).

Frei Caneca, como mencionado no capítulo anterior, foi um grande pensador,

professor, escritor e atuante da retórica no Brasil, no século XIX. Aristóteles e

Quintiliano foram seus aparatos da disciplina. Porém, é visível que os dois textos

referentes à retórica, Frei Caneca resumiu, ou melhor dizendo, sistematizou todo o

pensamento de Quintiliano para entendimento de seus alunos e para sua forma de

trabalho.

Essas duas obras são de uso didático, recorridas em atividades docentes, que

expressam importante tendência intelectual e política no início do século XVII, marcado

pelo pensamento Iluminista. O Carmelita faz critica, nesse trabalho, aos “charlatões e

pedantes”, que desacreditavam as faculdades da inteligência, ao mesmo em que

valorizava a eloquência como faculdade de significar com deleite os pensamentos por

palavras, para convencer e persuadir.

A retórica passaria por significativa mudança nesse período, rompendo com a tradição escolástica caracterizada pelos excessivos ornamentos estilísticos e pelo uso e abuso de citações que pretendiam ostentar erudição, tão marcantes no direto e no bacharelismo. A nova tendência definia a retórica como poder de persuasão, sendo associada ao exercício do magistério e, mais ainda, à pedagogia política cultural, visando esclarecimento da humanidade. Dessa forma, retórica e eloqüência eram pontos-chave para a formação das elites ao mesmo tempo XIX. E assim é possível fazer a ligação entre a imprensa de opinião que surgia com força no Brasil do anos 1820-30, com considerável peso na cena pública na nacionalidade, e as duas disciplinas ministradas pelo professor Frei Caneca – que desse modo se identificava com o Brasil (MOREL, 2000, 25).

Ao escrever o Tratado Eloquência¸ Caneca relata como trabalhar com a arte de

88

persuadir por meio da palavra e da escrita. Define a eloquência como a “faculdade de

significar com deleite os pensamentos por palavras, para convencer e persuadir” (1972,

p.79), e a retórica “é a arte, que dirige as disposições naturaes do homem no uso da

eloquência” (1972, p.79). Dividindo a eloquência em seis partes42:

• Invenção- descobrir os pensamentos mais adequados para o qual o orador

se propõe.

• Disposição: ordenar os pensamentos.

• Elocução: escolher bem as palavras e colocação para exprimir os

pensamentos.

• Memória: conservar a disposição dos pensamentos, para que possa

apresentá-los aos ouvintes.

• Pronunciação ou declaração: nada mais é que declarar seus pensamentos.

• Ação: o gostou – ação, que o orador deve empregar na publicação de

seus pensamentos.

Neste texto, Caneca descreve como deve ser o trabalho com essa ciência.

Explica suas maneiras de exposição, os objetivos, os meios de uso do orador e os meios

da eloquência. Divide o trabalho da eloquência em quatro partes: A 1ª é o discurso, que

é parte em que o orador dispõe o que lhe convém e o ouvinte escuta o que lhe é

favorável. A 2ª é a narração, que o orador se dedica a informar os ouvintes. Esta

narração também é divida em três modos: por proposição, por participação e por

narração. Ainda retrata que a narração conta com três virtudes: a clareza, brevidade e

verossimilhança. A 3ª parte dos estudos do frei é de confirmação ou provas. O momento

de convencer os ouvintes ilustrando o entendimento do assunto, sempre usando de

argumentações com embasamentos.

Por fim, a 4ª se refere à conclusão. “Depois de informar o ouvinte e convencer

por provas lógicas, ele faz sua conclusão” (CANECA, 1979, p. 69). Dentro da

conclusão o orador precisa fazer a recapitulação do que foi falado de maior importância.

No epílogo, ele arrebata o que se tratou na confirmação.

42 CANECA, 1972, p. 79

89

Com os argumentos da retórica pode-se dizer que o religioso iniciou a prática do

jornalismo opinativo. Através de seus discursos fala sobre a situação do governo,

explicando a população a atual conjuntura vivida e expondo sua opinião. Também seus

textos tinham o mesmo formato e poder de persuasão.

Nilo Pereira (1975, p. 80) diz que Caneca, ao expor a retórica, utiliza de dois

verbos que resumem todas suas ações revolucionárias: convencer e persuadir, pois são

elas – as palavras - que o tornaram um polemista, panfletário, doutrinador, lógico,

erudito, jornalista, filosofo, jurista e analista da realidade brasileira divido em dois

caminhos: o da Pátria e o da sabedoria.

Um terceiro texto didático de Frei Caneca, com influência da retórica de

Quintiliano sobre a “arte de se escrever bem”, foi Breve compendio de grammatica

portugueza organizado em forma systematica, com adaptação a capacidade dos alunos.

Tal obra foi redigida durante sua prisão, entre os anos de 1817 e 1821, para ensinar os

presos que não sabiam ler nem escrever, e duas freiras do Convento do Desterro.

Caneca se ponderou de uma metodologia que realça o uso das regras, para se conseguir

à perfeição do aprendizado. Ou seja, o carmelita buscou ensinar todas as regras

gramaticais e como aplicá-las em um bom texto.

Pedro Calmon (1972) diz que Frei Caneca tornou-se um excelente professor da

escrita correta – a gramática – e de falar bem – a eloquência. E, que tais ações

correspondem à impregnação das lições de Quintiliano, que haviam sido proclamadas

há quase dois mil anos.

O frade carmelita faz críticas ao alfabeto português, dizendo que é imperfeito e

complicado, pois em algumas sílabas e palavras faltam letras, em outras ocasiões elas

sobram, e dá exemplos dessa situação, como “a letra c com som de k ou q; a letra g com

som de j; a letra s com som z; as letras ch com o som de q ou de x; as letras ph com o

som de f 43” (CANECA, 1972, 72). E conclui afirmando que:

Si nós fallamos para sermos entendidos, não há cousa mais miserável, que fallarmos de modo que ninguém entenda; o que assim succederia, si pronunciássemos todas as consoantes duplicadas (CANECA, 1972, p. 73) 44.

Montenegro (1978) diz que em toda a obra caneciana, ora isolado, ora em

conjunto, a retórica está presente com uma linguagem simples e direta.

43 Alguns exemplos de Frei Caneca já foram corrigidos no alfabeto português. 44 A redação foi copiada de acordo com a escrita de Frei Caneca, que corresponde a ortografia da época.

90

Exemplo solitário é o Itinerário, onde o autor faz um relato muito fiel dos eventos sem qualquer atavio literário, como quem está redigindo uma carta. No panfleto, evidencia-se um estilo próprio, de alta exarcebação ideológica, no qual se realiza integralmente aquela combinação. Ele constitui um extraordinário campo de pesquisa. Pois onde a retórica e a ideologia, o autoritarismo, dão ao discurso uma configuração especial, traduzindo à perfeição a postura política utópica – radical do carmelita. Todos os números do Typhis Pernambucano assumem essa forma (MONTENEGRO, 1978, p. 192).

A retórica pela sua própria ação e designação de princípios obtém sentidos e

imaginação para persuadir seu público, e com este ato acaba se transformando em uma

ideologia, que faz a opinião de quem a lê ou a ouve. E Frei Caneca atua com esta

intenção, de convencer os leitores da veracidade de suas teses, numa forma

demonstrativa ou jurídica, que acarreta as informações na essência da sua razão para,

assim, aumentar o poder de persuasão sobre suas ideologias (ou opiniões).

Pode-se dizer que, no discurso do carmelita, é impossível separar a linguagem da

ideologia, pois os textos envolvem valores, crenças, opiniões e um conjunto de

significados retóricos. Também há um forte teor de religiosidade na integra dos

discursos ideológicos do carmelita.

Pereira (1975) acha curioso Frei Caneca citar poemas de Camões, os Lusíadas,

no início de todas as edições do Typhis Pernambucano, e diz que isto também é

retórica, pois com as citações mostram boa eloquência e intelectualidade, partindo do

princípio de que a retórica é uma “arte”.

“Uma nuvem, que ares escurece, Sobre nossas cabeças aparece” Camões, Os lusíadas, canto V 45 (CANECA, 2001, P. 303).

O mesmo autor continua seu pensamento dizendo que na oratória de Caneca, a

simbologia tem um lugar de destaque, e, por isso, cita o famoso poeta português.

Durante a Confederação do Equador surgiu outra parte da sua produção, tendo

participado de discussões públicas e sobre temas políticos, sendo um grande orador que

influenciou a população local. Nesse período escreveu "Dissertação sobre o que se deve

entender por pátria do cidadão e deveres deste para com a mesma pátria" (1822), onde

45 Este é o verso da primeira edição do Typhis Pernambucano.

91

preocupou-se em mostrar a possibilidade da união entre os portugueses de ambos os

hemisférios, sobre os auspícios da monarquia constitucional.

Neste texto é interessante analisar que o carmelita inicia seu pensamento com

menções de Cícero e Quintiliano, e por diversas vezes os citam como referência sobre

eloquência, como agir perante a sociedade e seus deveres de cidadãos, e usa a

comunidade Grega e Romana como exemplo de organização social. E, complementa ao

dizer que não escreve para homens letrados e, sim, para o povo:

Do que tenho dito, já se deixa ver que eu não escrevo para homens letrados; sim para o povo rude, e que não tem aplicação às letras. E porque não procuro ambicioso nome de escritor, não se me dá que haja Zoilos e Frérons que me mordam; os quais comigo perdem o seu tempo, porque se para minha desgraça me atacasse a mania de querer obter um juízo do responsável público, não o procuraria dos que vivem atualmente comigo, sim da justiceira posteridade; pois tenho muito presente o apotegma de Nassão (...) (CANECA, 2001, p. 57)

Montenegro (1978) diz que este texto de Caneca pode ser considerado o melhor

exemplo de sua performance com a retórica devido a sua linguagem – verossímil e

clara, com demonstrações convincentes, os questionamentos sobre o verdadeiro e o

moralismo. Enfim, predicativos de uma boa ação retórica.

Frei Caneca fez pregações na saída de mosteiros e conventos, pois acreditava

que os ensinamentos de Cristo só seriam recuperados em sua pureza se os religiosos,

como “fermento na massa”, estivessem juntos dos demais seres humanos, ou seja, a

oração como ação. Foi quando escreveu Oração.

Pereira diz que o frade foi irônico em seu texto, pois o tratou de forma ortodoxa.

Porém, o próprio Frei Caneca explica-se que agiu de acordo com a retórica, cumprindo

suas regras, e que era a forma de alcançar seus objetivos em calar alguns ‘troncos

dessecados’ e dar novos frutos (1975, p. 4).

Escreveu também As Cartas de Pítia a Damião (1823), publicadas no Correio

do Rio de Janeiro, que fazem referências e críticas ao governo Imperial.

No ano seguinte escreveu o Itinerário, narrando os momentos que passou na

Confederação do Equador, incluindo sua tentativa de fuga e seus dias de prisão. Ao

narrar, Caneca defende seu pensamento, que visava auxiliar a população, todavia não

foi aceito pelo Imperador:

92

(...) Quando as mudanças políticas do Brasil nos penhoraram para que ajudássemos nossas compatriotas com a curteza de nossas ideias, e, deslizando as trevas intelectuais do povo, reuníssemos todos os entendimentos em uma só verdade, que produzisse o bem geral e a felicidade de todos; assim tivemos por meio da imprensa de comunicar nossos pensamentos em diversos escritos, como sejam: “Dissertação sobre o que se deve entender por pátria do cidadão”; “Cartas de Pítia ao seu amigo Damão”; Typhis Pernambucano; “O caçador atirando à Arara Pernambucana”, e outros escritos inseridos em alguns periódicos. À proporção que nossos trabalhos se estendiam a beneficiar nossos compatriotas, nós caminhávamos ao perigo e à ruína, pois que nossas verdades chocavam os interesses de d. Pedro de Alcântara, príncipe português, que o Brasil imprudente e loucamente havia aclamado seu imperador (CANECA, 2001, p.570).

O pensamento ideológico e revolucionário de Frei Caneca pode ser bem definido

nas páginas do jornal Typhis Pernambucano, aonde se faz diversas críticas ao Império e

orienta a população em ações de utilidade pública, e, nos textos observa-se a exposição

de argumentos retóricos.

A postura ideológica de Frei Caneca é marcada por uma produção híbrida, com

diferentes dogmas, “desde as de linhagem empirista às de coloração idealista e

tradicionalista, com acréscimos da circunstâncias, e num ritmo alucinante de confronto

político, fabricou um discurso, que com certas variantes se incluiu na episteme clássica

(MONTENEGRO, 1978, p. 212).

Se analisarmos textos por textos, tanto do jornal quanto os didáticos, encontram-

se as classificações retóricas, e as regras por ela postas, seja de Aristóteles, Cícero ou

Quintiliano.

De acordo com Morel (2000), Frei Caneca, como todos os homens de letras de

sua geração, independente do posicionamento político, escrevia no chamado estilo

panfletário, que expressou uma das fases mais criativas e vigorosas dos debates

políticos mundiais e da imprensa brasileira.

O estilo panfletário (difícil de ser redigido com qualidade e hoje em franco desuso na imprensa) alcança eficácia por várias características interligadas, como: a capacidade de convencer e de atacar, espírito mordaz e crítico, retórica literária, sátira, requerendo ao mesmo tempo densidade doutrinária e ideológica e agilidade para expressar em situações específicas e circunstanciais uma visão de mundo geral e definida. (MOREL, 2000, p. 19).

93

Pereira (1975) diz que Caneca era um orador preocupado com o estilo simples e

comunicativo, agia de modo que todos entendessem suas ideias. Seguia, fielmente,

aquilo que ensinava. Seu conhecimento era grandioso no meio em tudo que vivia e

desempenhava, era ágil e inteligente, e, por isso, conseguiu aprimorar tanto saberes.

Sua eloquência, com a profundeza da palavra simples, direta e clara, adentrava

na ‘alma’ quem a ouvia ou lei, pois seus argumentos eram ligados a sentimentos e

emoções, como ensinou Aristóteles e Quintiliano, e, com isso, se persuadia e convencia

tanto.

Também essa gloria – a do orador – o fará lembrado. Afinal, num homem assim, todos os dons da inteligência perseguem os meemos fins. E ele foi fiel à sua vocação como soube ser altivo na hora derradeira, quando deixava o exemplo do carmelita que havia passado a noite das vésperas diante do Crucifixo que recolheu os últimos pensamentos e as últimas ânsias dessa alma de herói, a quem o suplício, em praça pública, deu o sentido memorável da sua Oração – livre das regras da Oratória para ser apenas de Deus, no misterioso encontro. Talvez o maior orador tenha sido esse – o do silêncio, na vigília da morte, na meditação das coisas que passam e que daí a pouco seriam a Eternidade. Para essa oração não precisava dos seus compêndios. Era da alma que vinha a inspiração para qual não havia público nenhum. O orador apenas movia os lábios; e nunca foi tão eloqüente (PEREIRA, 1975, p. 85).

Mariana dos Santos Ribeiro, em sua dissertação de mestrado defendida no ano

de 2005, ressalta que o pensamento do carmelita, com origem no iluminismo europeu,

era ambíguo. De um lado tem-se uma filosofia ilustrada que emprega uma retórica a

glorificar a liberdade política, econômica e de pensamento para os indivíduos, em suas

relações em si e com o Estado. E, por outro lado, sua retórica ia de encontro com a

urgência de uma liberdade contra a opressão imposta pelo governo Imperial. Frei

Caneca buscava maiores reivindicações de uma autonomia financeira para o nordeste, as

vezes favorecendo não somente os que precisavam, mas uma grande parte da elite. Sua

retórica era em busca do direito dos cidadãos e da província.

O discurso das luzes torna-se algo indesejável neste aspecto em especial, posto que a manter a instituição escravista era condição fundamental para boa parte das elites não só na região nordestina, mas uma sociedade com um passado colonial pautado pela importância da propriedade fundiária e do trabalho escravo. Embora os preceitos liberais europeus não se baseassem necessariamente na construção de um Estado de bem-estar-social, a difusão de suas ideias poderia

94

desembocar num caos social, e porque não dizer, num levante escravo em meio às aspirações de liberdades restritas ao âmbito das elites (RIBEIRO, 2005, p.89).

A pesquisadora conclui seu pensamento dizendo que toda a produção discursiva

de Frei Caneca, deve ser compreendida entre as revoluções de 1817 e 1824, em

momentos de tensões, mesclando, assim, ideias reformistas adquiridas da tradição do

pensamento europeu, vinculando-se a influência do anti-colonialismo e

emancipacionismo.

A apropriação das ideias de liberdade e igualdade, supra-sumo do pensamento ilustrado Frances e americano, aliado a uma perspectiva reformista, inerente não só à ilustração lusa, mas também em alguma medida no próprio pensamento ilustrado europeu, acabou por situar as ideias de homens como Caneca neste limiar transitório entre a “contenção” e a “explosão” (RIBEIRO, 2005, p. 96).

De um modo geral, o pensamento do religioso está ligado as transformações

políticas e culturais do Brasil do século XIX, proporcionada, em grande parte, pelas

reformar pombalinas46, “que trouxeram para o espaço colonial a prática da retórica e da

eloquência” (RIBEIRO, 2005, p.98-99). Sendo assim, o estilo retórico de Frei Caneca

era conservado a pedagogia do entendimento humano, através da razão e de uma

sociedade ideal. Seus argumentos justificavam suas ideias, que eram tidas como verdade

a ser seguida, e todo este teor é mostrado com exatidão em seus escritos, em uma

retórica entusiasmada.

Nesse sentido, apesar de atribuir importância a uma construção teórica que primava por uma razão cientificista européia, Caneca se utilizava de uma retórica de cunho emocional. Seu estilo passeava de um referencial que se pretendia pautado na razão a uma feição de persuasão, e de

46Após concluir seus estudos de direito, na Universidade de Coimbra, o Marques de Pombal volta ao Brasil, e criar um método de ensino luso-brasileiro, que ficou conhecida como Reforma Pombalina Educacional. Tinha como base de ensino, grande parte, dos filósofos iluministas, e centralizou uma notável “escola de intelectuais”. Sua principal ação foi expulsar os jesuítas das colônias e proibi-los o ensino, passando, assim, ao Estado esta tarefa. E, criou as aulas régias ou avulsas de Latim, Grego, Filosofia e Retórica, que deveriam suprir as disciplinas antes oferecidas nos extintos colégios jesuítas. Para alguns historiadores, esta ação, foi a primeira grande desastrosa reforma da educação do país.

95

denúncia jornalística, por vezes até irônica e sarcástica que ele entendia como condição necessária para garantir um efeito mais eficaz no seu público ouvinte (RIBEIRO, 2005, p.100).

Apesar de Caneca ter se dedicado à retórica com tanto entusiasmos, sendo

professor e publicado sobre o assunto, esta não é uma característica somente dele, visto

que, naquela época, havia outros pensadores políticos que, provavelmente, foram fontes

de inspiração ao carmelita.

Como uma de suas maneiras de persuadir Frei Caneca usava de juízo de valores

e grandes exemplos históricos, com citações de filósofos iluministas, autores gregos -

romanos, e até mesmo Camões.

Na sexta edição, 29/01/1824, do jornal Typhis Pernambucano Frei Caneca cita

Montesquieu, com uma forma de reforçar a sua opinião e a opinião pública. Refere-se

que é necessário falar sobre o mesmo assunto diversas vezes para que o leitor entenda e

firme uma opinião sobre a discussão.

Se não tivéssemos em vista a máxima lembrada e posta em prática por Montesquieu de “se não esgotar de tal maneira um assunto, que se não deixe nada a fazer aos leitores”, nós faríamos ver que o novo fim que s.m. se propõe MS proclamação de 16 de novembro (...) (CANECA, 2001, p. 343).

Caneca novamente cita Montesquieu utilizando-se de suas palavras para retratar

a liberdade política. Pode-se observar que ao fazer isso, ele também questiona sobre o

direito e a liberdade de opinião dos cidadãos.

A liberdade política é, como diz Montesquieu, Del’Esp.desLois,lib.2, cap.06, aquela tranquilidade de espírito, que goza o cidadão, nascida da opinião que tem cada uma da sua segurança. Para que esta exista, é necessário que o governo seja tal que um cidadão não possa temer outro cidadão, e jamais esta se pode encontrar e gozar naqueles estados em que acham depositados nas mesmas mãos os dois poderes, Legislativo e Executivo, pois pode-se temer que o mesmo soberano não faça leis tirânicas para eles as executar tiranicamente (CANECA, 2001, p. 345).

Sobre a literatura grego-romana dava exemplos de Cícero, Quintiliano ou

96

Virgilio. Através desse diálogo, Caneca deixou-se influenciar pelo estilo neoclássico,

sendo observado em seus escritos sobre os valores e intuições políticas da Grécia e

Roma antiga.

Os discursos de Caneca, também, foram influenciados pelos acontecimentos

lusos – brasileiros, passando para um padrão de jornalismo imediatista, principalmente,

a partir de 1822 com a liberdade de imprensa e o surgimento de novos pasquins. No

qual, dedicou-se a lutar pela liberdade social, política e econômica de seu povo.

Contudo, pode-se concluir que a retórica de Frei Caneca, além de pedagógica, era

política, em busca de liberdade, seja ela qual for, pregava uma sociedade onde todos

fossem iguais perante a lei.

Outros aspectos da retórica apresentados por Aristóteles, Cícero e Quintiliano,

como a ética, crença e valores Frei Caneca, também, se apossou. Na grande maioria de

seus discursos falava de Deus, de Nossa Senhora, valores e princípios de uma sociedade

justa, e seu principal alvo no jornal Thypis Pernambucano, o Imperador, era citado

como o exemplo de um homem anti-ético. Em seu texto Oração, o carmelita pregou

sobre a presença de Nossa Senhora e de Deus nas vidas das pessoas, e fez graves

acusações contra Dom Pedro I e a corte real sobre suas ações e falta de ética com o povo

brasileiro.

O único livro escrito por Frei Caneca, História de Pernambuco, ficou inédito,

pois foi destruído pelos seus familiares. Grande parte de seus escritos integra as Obras

Polypticas e Litterárias de Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, organizada por

Antônio Joaquim de Melo, publicada em sua primeira edição no Recife, em 1875.

97

CAPÍTULO III

O JORNALISMO DE FREI CANECA

3.1 - Breve história do Jornalismo

Para retratar o contexto histórico da imprensa mundial encontram-se alguns

autores, como Marques de Melo, Luiz Beltrão, Jorge Pedro Souza, Philippe Breton, que

se dedicam aos estudos da história do jornalismo, tanto mundial quanto nacional, que

podemos nos basear.

Em seu livro Iniciação à filosofia do Jornalismo Luiz Beltrão (1960, p. 24)

relata que desde que o mundo foi criado o jornalismo existe, pois o homem necessita ter

e passar informações.

Os mais antigos documentos conservados e decifrados dos tempos heróicos são a inscrição gravada por YU, o Grande, sobre o monte Heng-Chan, na China, cerca de 2.200 AC, registrando o cataclisma do dilúvio, e o chamado Mármore de Paros, encontrado no século XVI e lavado à Inglaterra pelo conde de Arundel, através do qual se pode acompanhar, dia a dia, a fundação de Atenas. Flavius Josephus afirma que os babilônios contavam com historiógrafos, encarregados de escrever o resumo dos acontecimentos públicos e que teria sido utilizado esse material que Bérose compôs, no século III AC, a sua História da Caldéia. Voltaire escreveu que a China possuía jornais desde tempos imemoriais, e se bem que sem comprovação absoluta, em 1908 foi comemorado, naquele país, o milenário da Gazeta de Pequim (King Pão) que, segundo a tradição, era escrita em madeira. Também no Egito, no ano 1750 AC, teria existido um diário oficial, no reinado de Toutmés II, impresso em papiro, além da constante circulação de jornais satíricos, um dos quais combatera acirradamente o faraó Amarsis. Entre os fragmentos arqueológicos ainda hoje indecifrados e que julgam conter informações jornalísticas, figuram os sinais gravados nas ruínas Maias, nas pedras da ilha de Páscoa e as misteriosas inscrições das covas de Altamira, na Lagoa Santa, Minas Gerais, e da pedra das vertentes do rio das Mortes, nos bravios sertões matogrossenses (BELTRÃO, 1960, p. 24).

Sobre este pensando o autor reflete que é evidente que nenhum monumento

epigráfico ou paleográfico pode ser considerado ou qualificado como jornal, porém

encontram-se informações e situações narradas.

98

Marques de Melo (2003b, p. 33) diz que a imprensa surge ao mesmo tempo em

que o alfabeto, pois nasce a oportunidade da escrita e as expressões perante a sociedade.

Ressalta que historicamente as origens estão no Oriente, quando os chineses, japoneses

e coreanos realizavam impressões de tabulares, e criaram, por primeiro, o papel. Porém,

baseando-se em McLuham (apud 1972, p.320), o autor diz que a impressão da arte

chinesa (gravuras e ideogramas) não corresponde à impressão do alfabeto fonético, por

não se tratar de uma estrutura que dá sentido, constrói palavras e frases. Melo ainda

recorre a Max Weber (apud 1967, p. 3) para confirmar tal pensando, dizendo que as

artes gráficas já eram conhecidas na China, mas as leituras impressas, as primeiras

impressões, ocorreram no Ocidente.

De acordo com Marques de Melo (2003b, p.34) a imprensa surge, portanto, na

Europa, no final da Idade Média com o aparecimento do comércio e pequenas

indústrias, o renascimento da vida urbana, criação de universidades e um novo contexto

social e intelectual na sociedade. Claro, trazendo com sigo um novo contexto cultural e

até mesmo econômico.

Muitos foram os motivos que levaram ao nascimento da imprensa, os principais

deles são: liberdade de expressão para a população, mesmo quando não se discutia sobre

a opinião pública ou a liberdade de imprensa; A necessidade intelectual da elite na

produção de livros; Interesses da Igreja com a reprodução de orações, imagens de

Santos, liturgia cristã, entre outros. E, segundo Melo (2003b), as primeiras

manifestações da tipografia foram as relações e as folhas volantes devido a precisão de

informações diárias e se manterem atualizados sobre os acontecimentos da época.

Luiz Beltrão (1960) diz que o período da Idade Média foi a força da palavra

falava, ou seja, as informações eram transmitidas oralmente, por discursos, poesias e

prosas ou canções. A população mal sabia escrever.

Os autores Breton e Proulx (2006) ressaltam que foi no Renascimento,

especialmente entre as décadas de 1450 e metade do século XVI, em que aconteceu o

desenvolvimento das técnicas de comunicação. Nesta ocasião, com a era Gutenberg, os

documentos foram transformados em livros e chegaram a 1.300 impressões por dia.

Todavia, os mesmo complementam dizendo que o livro tinha como objetivo

difundir novas ideias e alastrá-las ao maior número de pessoas, e, com isso, tornou-se

uma produção imensa. E a invenção da imprensa aconteceu, portanto, na ocasião em

que se começou a reproduzir livros em grandes quantidades.

99

Beltrão (1960) complementa dizendo que na época do Renascimento o

jornalismo se concretiza com o surgimento do papel, com interesse de comerciantes e

navegadores. “Entre as publicações, figuram os avvisi venezianos, as news letteres

inglesas do século XIII e os Ordinari Zeitungen dos mercadores alemães” (p. 27).

Breton e Proulx (2006) descrevem que a grande evolução da imprensa se dá com

o progresso das técnicas do metal, com o progresso em fábricas, ourives e moedeiros,

que se beneficiavam no século XV. E sua necessidade era substituir o pergaminho pelo

papel.

Os autores relatam que o papel não ficou conhecido apenas no Oriente, mas,

também, no Ocidente, principalmente na China devido a grande impressão de

xilogravuras de textos budistas.

Marques de Melo (2003b, p. 45) destaca a representação da Alemanha, no século

XV, devido à arte da tipográfica que veio a incentivar outros países no Oriente. E todo

este trabalho de aprimoramento da imprensa se deve à Gutenberg, cujo inventou a

prensa – caractere móvel, ou seja, a primeira máquina de impressão gráfica. Suas

principais publicações eram Bíblias, missais, gramáticas e calendários.

Tal invenção movimentou tanto aptidões técnicas como financeiras, com um

relacionamento visando lucros. Porém:

O espírito mercante, que se harmonizou tão bem com a inovação técnica, é todavia anterior a ela, e parece mais prudente explicar o nascimento da imprensa por meio da convergência do movimento de renascimento intelectual e do espírito mercantil do que por sua divergência. O Renascimento fez do livro uma ferramenta eficiente de comunicação, ferramenta que se torna logo de saída um objeto comercial (BRETON. PROULX, 2006, p.45).

O período do renascimento foi a “era de ouro” do livro, onde os intelectuais, a

elite os burgueses faziam questão de sua existência. E as principais leituras eram de

conteúdo religioso, literários, de Direito e obras científicas. Além disso, o mesmo

período apresenta o livro como o progresso de transformação do conceito de ideia e

informação, de acordo com Breton e Proulx (2006). Com a evolução do livro surgem as

ideias, que são reproduzidas e progressivamente repassadas, e nesta ocasião que nasce a

informação. “O livro iria favorecer as técnicas e as ciências descritivas, que

100

encontravam nele um suporte bastante adequado a sua divulgação em massa”

(BRETON; PROULUX, 2006, p. 48). O livro, também, como técnica de comunicação

impressiona os meios intelectuais e conseguem adentrarem aos fatos memoráveis e

argumentativos.

Juarez Bahia (1971, p. 31) ressalva que durante o Renascimento a informação

escrita intensifica sua relevância, pois existe uma imensa vontade da sociedade em

obter-se de conhecimentos e acontecimentos. Porém, a história pode ser confundida

com jornalismo, pois existiam os anotadores dos fatos históricos, que não se distanciam

dos observadores e comentadores do cotidiano, em termos de informação e opinião.

Foi, também, na época do Renascimento que os estudos de Quintiliano voltaram

a ser reconhecidos, pela arte da memória e da escrita, e muito utilizada pelo catecismo

da Igreja Católica. A obra foi reeditada diversas vezes e traduzida para alguns idiomas.

E no final deste período a retórica, novamente, retoma seu poder, com a

redescoberta dos autores latinos – Cícero e Quintiliano – com a arte de palavras e

escrever bem e as técnicas eficazes da argumentação. Breton e Proulx relatam que os

jesuítas muito se dedicaram na divulgação da retórica latina, com a arte da pedagogia, e

criaram escolas que eram baseadas em humanidades e retórica47.

Essas instituições formaram a elite da nação e, como na Antiguidade, cultura, eloquência e capacidade de persuasão constituíram as virtudes do homem chamado a dirigir. O domínio da comunicação – cuja retórica é a técnica – continuo sinônimo de exercício eficaz e legítimo do poder. O modelo romano atravessou sem empecilho maior as grandes transformações da Revolução, da qual, aliás, era um dos princípios referentes (BRETON; PROULX, 2006, p. 55).

Marques de Melo (2003b) ressalva que tanto a Igreja quanto os governos civis

tiveram grande importância na expansão da imprensa, e também sob seu controle. A

Igreja tinha como objetivo publicar obras de formação religiosa, e o governo sobre suas

fortunas e acontecimentos.

Já nos séculos XVI e XVII (MARQUES DE MELO, 2003b, p. 55) a imprensa

entra em decadência, em toda Europa, devido a censura da publicação de livro. Tal

censura parte da Igreja, quando papa Alexandre VI obrigou a ter uma licença para 47 Vale ressaltar que quando os jesuítas chegaram ao Brasil implantaram a catequese para os índios e os ensinou a arte retórica. Tanto que o Padre Antônio Vieira foi o primeiro a introduzir a retórica no Brasil.

101

impressão de livros em países católicos, e com uma lista de livros a serem proibidos. E,

ainda, houve o confronto entre os católicos e os protestantes.

De acordo com Breton e Proulx (2006) a propaganda foi criada, neste período,

pelo papa Gregório XIII com o objetivo de lutar contra a reforma dos protestantes.

A necessidade de alardeada de uma “propagação” da doutrina cristã mostra bem a que ponto o debate se situou ao mesmo tempo no plano de uma técnica de difusão social de um conjunto de valores e no da fé como modalidade individual de uma relação com Deus (BRETON E PROULX, 2006, p. 52).

A próxima etapa da história da imprensa se dá na Revolução Francesa. Nesta

ocasião, a sociedade cria novos valores sociais e econômicos, a uma divisão entre o

espaço privado e o espaço público. Acaba a censura sobre o escrito, inicia-se a liberdade

de imprensa e opinião. Ainda, nesta época, existia um grande predomínio dos oradores,

que discursavam com o objetivo influenciar e persuadir a população com suas ideias.

No século XVII acontece uma grande revolução na comunicação, houve uma

troca cultural que modificou os meios, passa-se da palavra oral para a escrita. Aqueles

domínios de grandes discursos retóricos passam a se tornarem textos informativos e

opinativos.

O papel social do orador e da argumentação afirmou-se toda vez que acontecimentos importantes mobilizavam a opinião, como dá testemunho a Revolução Francesa. A formação progressiva de uma “opinião pública”, gerada pelo desenvolvimento da democracia e dos direitos humanos, proporcionou aos oradores um lugar central. A civilização que, pouco a pouco, se instalou, mais do que ser descrita com base em uma oposição factícia entre a escrita e o oral, poderia ser mais precisamente qualificada de “civilização da mensagem” (BRETON; PROULX, 2006, p. 58).

Marques de Melo (2003b) abre uma reflexão dizendo que a imprensa surge

assim que se inaugura a impressão gráfica, porém o Jornalismo, em si, tem um grande

retardamento devido a censuras do século XVI e XVII. Os primeiros periódicos surgem

no século XVII (apud BOIVIN, 1949, p. 9), por medidas governamentais e submetidas

à censura, não se colocam como meios de informação e muitas vezes foram zombados.

O mesmo autor diz que os primeiros periódicos começam a circular, com o respeito de

102

todos, após o declínio da Revolução Francesa e a vitória de seus liberais, e, a partir de

então, que aos poucos nasce uma imprensa de massa que criará força apenas nos século

XIX, com a evolução não apenas dos livros, mas sim dos jornais e panfletos.

Breton e Proulx destacam que o jornal, como fonte de informação, surge no

inicio do século XVII, quando foi um avanço no desenvolvimento das técnicas de

impressão, melhoria dos transportes e das vias de comunicação física – o correio.

O primeiro jornal de importância para a sociedade, pois os boletins impressos

com pequenas notícias já existiam, foi La Gazette, de Théophraste Renaudot, na França,

em 1631 (BRETON. PROULX, 2006, p. 58). Sua periodicidade era semanal, com doze

páginas e com a tiragem de 1.200 exemplares. E depois de quase um século e meio

surge o primeiro jornal cotidiano, La Journal de Paris, em 1º de janeiro de 1777.

Entretanto, o pesquisador Jorge Pedro Souza diz que há uma grande controvérsia

sobre qual teria sido o primeiro jornal impresso. Segundo Costella (1984: 83 apud

SOUZA, 2001, p.19), alguns historiadores o mais antigo jornal impresso da história é o

Noviny Poradné Celého Mesice Zari Léta 1597 (Jornal Completodo Mês Inteiro de

Setembro de 1597), mensal e editado em Praga por Daniel Sedltchansky, no ano de

1597. Já outros historiadores relatam que o primeiro jornal impresso foi Nieuwe

Tijdinghen, criado em Antuérpia por Abraão Verhoeven, em 1605. Em 1622, surge em

Inglaterra o Weekly News. Em 1611 aparece o Mercure Français.

Devido à censura e controle da imprensa não podia se expressar novas ideias e

opiniões ou até mesmo debate político as informações eram baseadas, e algumas vezes

escolhidas, em favorecimento do poder político, sem comentários ou citações

ideológicas.

Todavia, com as revoluções ocorridas no século VIII teve consequências sobre a

evolução da imprensa. Na França, entre os anos de 1789 e 1790, surgiram centenas de

jornais. Os Estados Unidos a imprensa ganhou favorecimento político, com a liberdade

de comunicação e opinião. Já em 1840, no final do Império48, surge a imprensa operária,

com o jornal L’Atelier, no qual tinha como objetivo trazer debates políticos e sempre

inserido no contexto da sociedade.

Souza (2001) descreve que, no século XIX, a imprensa predominante era

opinativa, ideológica e partidária. Diversos são os fatores que colaboraram para esta

situação. A primeira delas é a falta de matéria – prima informativa, pois parte da

48 Nesta ocasião Napoleão tentou combater a liberdade de imprensa.

103

população era analfabeta e com tinham poucos recursos econômicos e, então, grande

parte da aquisição de jornais era da elite. A segunda é que neste período houve a

propagação de movimentos políticos – ideológicos que utilizavam da imprensa para

divulgar suas ideias e, por decorrência emergiram o jornalismo opinativo. “O artigo

tornou-se o gênero jornalístico dominante” (SOUZA, 2001, p.21).

Outro fator foi que, na metade do século XIX, surgiram os novos meios, o

telégrafo e os caminhos de ferros, e, com isso, ampliou-se a circulação dos jornais que

passaram a produzir notícias com conteúdos mais informativos do que opinativos,

matérias factuais e de utilidade pública. Sem contar, que nesta ocasião a população já

teria mais acesso aos períodos devido ao desenvolvimento educacional.

De uma maneira bem resumida Nelson Traquina (2005) apresenta os fatores que

contribuíram, no século XIX, para o crescimento da imprensa: 1) a evolução do sistema

econômico; 2) os avanços tecnológicos; 3) fatores sociais; e 4) a evolução do sistema

político no reconhecimento da liberdade sobre à democracia.

Todavia, o jornal impresso, realmente, começa ter forças no final do século XIX,

início do século XX quando a publicidade é introduzida em suas páginas e começa a

gerar renda. Com a abertura do liberalismo político, que deu aval a liberdade de

imprensa, transformou o jornal em empresas jornalísticas, cujo precisavam de renda

para sobreviver. Com isso, a publicidade tornou-se a principal fonte de renda dos

impressos. Tal situação aconteceu em destaque nos Estados Unidos, que desenvolveu

com muita rapidez a imprensa. Com tamanho avanço, em 1891, na França, existiam

mais de 400 jornais diários. E, na mesma época, nos Estados Unidos 1.662, de acordo

com Breton e Proulx (2006).

A história da imprensa é muito vasta e complexa. Cada livro, texto e pesquisador

apresentam o seu ponto de vista, com informações variadas. Por isso, encerra-se este

assunto, pois nosso propósito principal era contar a trajetória do jornalismo do século

XIX, período analisado por esta pesquisa.

3.2 – O jornalismo como ciência: a contribuição de Tobias Peucer

104

O pesquisador Jorge Pedro Sousa faz uma reflexão sobre o campo cientifico do

jornalismo dizendo que não podemos abrir mão dos pensamentos dos filósofos antigos,

como Platão, que distingue o discurso e a realidade, Aristóteles, com as técnicas do

discurso, e ainda outros pensadores romanos que já abordavam sobre as noticias, os

estudos sobre essa ciência se originaram no século XVII, mesmo período em que os

primeiros periódicos surgiram.

De acordo com o pesquisador o pioneirismo se dá na Alemanha, que durante a

reforma dos protestantes o país desenvolveu alto índice de alfabetização, acompanhando

o enriquecimento econômico, e, assim, incentivando o consumo dos periódicos.

Já no Reino Unido, século XVII, passou por uma época de turbulência com

desordens políticas e militares, porém essa situação fez gerar um jornalismo noticioso,

político, partidário e combatente. E, ainda, foi o primeiro país a utilizar o periódico

como defesa política e a basear nos princípios da liberdade de impressa. Este modelo,

criado pelos britânicos, serviu de inspiração para muitos outros países, principalmente

os Ocidentais.

Sousa (2007) diz que foi na Alemanha, no ano de 1629, que pela primeira vez

tentou-se caracterizar o jornalismo e as notícias. O acadêmico Christophorus Besoldus

foi quem tentou classificar as notícias com uma visão jurídica, em sua obra Thessaurus

Practicus. Também foi nesta obra que pela primeira vez se usou a expressão “periódico

de novidades” ao se referir os jornais (apud CASASÚS E LADEVÉZE, 1991, p. 52). A

associação da ideia de jornalismo ao aparecimento periódico de notícias é um

contributo relevante para o entendimento do jornalismo, afirma Sousa (2007, p. 3).

Já no ano de 1630, Ahasver Fritsch trata da problemática do estilo e excesso nas

notícias. Em 1644, John Milton faz o primeiro discurso sobre a liberdade de imprensa e

suas responsabilidades. No ano de 1685, Christian Weise publicou a primeira análise de

conteúdo sobre os jornais alemães, que acreditava no valor formativo, informativo,

utilitário e pedagógico do jornal (SOUSA, 2007, p. 3).

Foram muitos que surgiram destacando o papel da imprensa perante sociedade,

alguns com pequenos ensaios, que muitas vezes nem se referia a imprensa. Outros

dizem sobre a importância da impressa e suas funções.

E no ano de 1690, na Universidade de Leipzig, na Alemanha, a primeira tese de

doutorado em jornalismo foi apresentada por Tobias Peucer, orientando por Adam

Rechenberg (SOUSA, 2007, p. 4). Sua tese inicia, de forma simbólica, a ciência da

comunicação e do jornalismo como um campo de estudo. E tinha como objetivo fazer

105

um esboço sobre as relações e relatos de novidades, ou seja, é como chamamos os

jornais e as notícias nos dias de hoje.

O destaque que se dá para os estudos de Tobias Peucer49 é que naquela época

não existia jornalistas e o jornalismo propriamente dito, a imprensa estava no processo

de iniciação, começava a, então, fazer parte da rotina das pessoas.

É interessante observar, na tese de Peucer, os apontamentos feitos para se

estruturar e utilizar a notícia, pois são os principais conceitos dos estudos das Teorias do

Jornalismo. Com 29 capítulos interligados, de início ele praticamente iguala o

jornalismo com a história, diz que um dos objetivos dos períodos é relatar fatos e

acontecimentos importantes para a sociedade.

Para Peucer a causa do nascimento dos “periódicos impressos com tempestiva

frequência hoje em dia, são em parte a curiosidade humana e em parte a busca pelo

lucro, tanto da parte dos que confeccionam os periódicos, como da parte daqueles que

os comerciam, vendem50”

Sua tese segue descrevendo o conceito de notícia, e a define como um texto

descrito, com atualidade e informações de úteis para a sociedade. Ressalta que é

necessário relatar os acontecimentos até para que possa servir como registros históricos

das cidades. Para ele, a notícia precisa passar credibilidade, se prender em fatos

verdadeiros, se manter imparcial em todos os registros e trazer novidades.

Também diz que é primordial se ter um agradável texto, boa narrativa, e não um

texto técnico e com palavras difíceis, mas sim que envolva o leitor. Para isso, Peucer

cita Cícero e Fabio Quintiliano como mestres da arte de escrever e discursar.

Por fim, Tobias Peucer encerra sua dissertação dizendo que após apresentar os

conceitos dos periódicos abre um espaço para discutir sobre os variados gêneros.

Todavia, o pesquisador apresenta apenas o gênero literário, pois havia periódicos

específicos para esta natureza, e que muitas vezes eram traduzidos para diversas línguas.

Finaliza dizendo que para não tornar seu trabalho algo tedioso preferiu não aprofundar o

assunto, deixando para os próprios leitores escolherem o gênero preferido, e assim

escreverem.

49 Todas as referências sobre a tese de doutorado de Tobias Peucer foram retiradas da Revista Comunicação e Sociedade. In: PEUCER, T. (1690/2000). Os relatos jornalísticos. Comunicação e Sociedade, nº 33, pp. 199-214, 2000. (Tradução de De relationibus novellis, Leipzig: Tese (Doutorado em Periodística) – Universidade de Leipzig, 1690.) 50 PEUCER, T. (1690/2000). Os relatos jornalísticos. Comunicação e Sociedade, nº 33, pp. 199-214, 2000. (Tradução de De relationibus novellis, Leipzig: Tese (Doutorado em Periodística) – Universidade de Leipzig, 1690.)

106

Entretanto, Marques de Melo (2004, p. 75) diz que as expressões jornalísticas

pioneiras ficaram estancadas pelo inevitável elitismo do seu conteúdo, como afirma o

próprio o precursor dos estudos jornalísticos o “o prazer encontrado na leitura dos

periódicos pelos eruditos”, ou seja, “aqueles que gozam do conhecimento da geografia,

da genealogia e dos afazeres cívicos”. (PEUCER, 1690/2000, p.213).

Orlando Tambosi (2004) alega que Tobias Peucer não foi o primeiro teórico do

jornalismo:

Na verdade, os pressupostos teóricos e regras técnicas que ele enuncia correspondem à “cultura da notícia” que começava a se consolidar nos principais centros da Europa (principalmente na Holanda) em função da expansão do comércio e da proliferação de periódicos. Peucer remete, portanto, às origens do jornalismo (o próprio termo “jornalista” passou a ser utilizado em francês, inglês e italiano somente por volta de 1703). Filho da modernidade tal como as ciências, o jornalismo seria decisivo, no século XVIII, à difusão das idéias do Iluminismo – só então assumindo características político-ideológicas mais nítidas que desembocariam na formação da chamada “opinião pública” e na Revolução Francesa de 1789 (TAMBOSI, 2004, p. 50).

Jorge Pedro Sousa (2004) descreve que muitas foram as suas contribuições para

os estudos das Teorias do Jornalismo: o conceito de notícia; o efeito do jornalismo, hoje

conhecido como a agenda-setting; a teoria do efeito de distanciamento social, que faz

certo controle sobre os assuntos a serem abordados no jornal; e, ainda, a teoria de usos e

gratificações, que Tobias Peucer diz que o leitor precisa encontrar satisfação ao ler o

jornal.

O pesquisador relata que Peucer é muito descritivo ao se referir à ética e à

técnica que se deve ter ao escrever para jornais “podendo, por isso, pode ser

considerado como o autor do primeiro manual de jornalismo do mundo” (SOUSA,

2004, 42), com a técnica jornalística e a cobertura de acontecimentos, e suas formas de

atuação. Já sobre a estrutura da notícia, Peucer diz que é necessário conter informações

como a pessoa, o objeto, a causa, o modo, o local e o tempo (cap. XXI da tese), ou seja,

o que conhecemos, hoje, como o lead da matéria: “quem?”, “o quê?”, “onde?”,

“quando?”, “porquê?” e “como?”. “Conforme se disse, esta sugestão de Peucer,

importada da retórica clássica, mostra bem que a fórmula dominante para a construção

de uma notícia está muito longe de ser uma invenção anglo-saxónica do século XIX”

(SOUSA, 2004, p. 42).

107

Em relação à ética do jornalismo o doutorando Peucer faz uma reflexão da

imprensa da época, que a denúncia que muitos publicavam assunto de pouca

importância, algumas baseadas em rumores ou informações que prejudicam os outros.

Jorge Pedro Sousa ainda complementa dizendo que quando Tobias Peucer

escreveu sua tese as referências na retórica, na filosofia, na história, no jurídico, na ética

e na moral já existiam e foram utilizadas para aproveitamento do jornalismo.

Alguns dos autores de que Peucer se serviu eram seus contemporâneos, mas outros remontavam à antiguidade grega e romana. No campo da retórica, Peucer socorreuse dos antigos filósofos e retóricos gregos e romanos, como Fábio Quintiliano ou Cícero, que, entre outros contributos para os estudos jornalísticos, há mais dois mil anos foram fixando para a posteridade a fórmula dos elementa narrationis para contar novidades (circunstâncias de sujeito, objeto, lugar, tempo, causa e maneira, ou seja, “quem?”, “o quê?”, “onde?”, “quando?”, “porquê?” e “como?”), tantas vezes atribuída erroneamente aos americanos do século XIX. Peucer lançou também mão de outros textos clássicos, como os de Luciano de Samosata, autor do século II, sobre historiografia. Este autor, que Peucer subscreve, escreveu a obra Como se Deve Escrever a História, onde adopta um tom positivista, prescrevendo que a historiografia se deve basear em factos e não em interpretações (enquadramentos) (SOUSA, 2004, p.45).

Através do texto de Tobias Peucer observa-se a importância dada ao tratamento

do jornalismo produzido já naquela época. A definição do conceito de notícia e a

introdução da imprensa informativa, abrindo espaço para novos gêneros. Sua grande

contribuição foi o pioneirismo nos estudos da Teoria do Jornalismo, que absorveu as

principais características da retórica, como o texto descritivo, o estilo e, ainda, originou

discussões sobre a liberdade de imprensa e a ética.

A teoria esboçada por Peucer, como já dito, é encontrada nos principais manais e

livros de jornalismo. Marques de Melo (2006), em seu livro Teoria do Jornalismo, faz

uma discussão sobre objetividade da notícia e aponta como seus principais critérios a

veracidade (circunscrição ao real, factível, comprovável), clareza (identificação dos

elementos que permitam ao interlocutor a reconstrução integral do objetivo narrado) e a

credibilidade (apresentação de indícios e evidencias suficientes para suscitar a confiança

coletiva) (p. 50). O pesquisador acrescenta que no jornalismo de hoje a objetividade

implica em pluralidade de observação e relatos. “O que se desdobra em pluralidade de

fontes, de canais e de núcleo de receptores” (2006, p.49).

108

Os conceitos apresentados são, também, os mesmo que Frei Caneca descreve,

em seu texto Tratado de Eloquência, sobre as virtudes da narração, são três: A clareza

(o texto precisa ser claro e empregar palavras que vão de acordo com o vocabulário do

leitor), brevidade (não fugir do assunto principal) e verossimilhança, ou seja, ser

verdadeiro e atual com os fatos.

Neste contexto, observa-se a atuação de Frei Caneca como precursor dos estudos

da Teoria do Jornalismo no Brasil, pois em sua época, século XIX, nada se discutia

sobre os princípios e valores da imprensa, e o, então, carmelita se dedica à retórica

aplicando-a em seus discursos e no jornal Typhis Pernambucano, e de uma maneira de

conceituá-la em suas atuações. A influência da retórica no jornalismo produzido por

Caneca veremos a seguir.

3.3 – O início do jornalismo brasileiro: 1808

A história da imprensa brasileira tem início com a chegada da família Real ao

país em 1808. Porém, fica uma indagação: se o Brasil havia sido descoberto em 1500,

porque a imprensa só viria existir em 1808?

O Brasil foi um dos últimos países do mundo a difundir a palavra escrita. As

poucas tentativas se davam através de tipografias, todavia tudo o que era impresso,

livros, folhetos, opúsculos eram censurados e a tipografia fechada.

Proibiram a impressão de qualquer obra ‘sem primeiro ser vista e examinada’ pelos desembargadores do Paço, depois de vista e aprovada pelos oficiais do Santo Ofício da Inquisição (SODRÉ, 1999, p.9-10).

A intolerância, do Brasil, com o que poderia parecer imprensa aconteceu de

forma contraria nas Américas Espanholas e Inglesas. No México e no Peru, a imprensa

surgiu em 1539 e 1536 e nas colônias Inglesas em 1650, de acordo com Sodré (1999,

p.10). Essa intolerância se dá porque nas colônias os Portugueses encontrados povos

primitivos que não puderam ser aproveitados para o trabalho escravo. E nos locais em

109

que a mão-de-obra indígena foi aproveitada a cultura dos mesmos foi destruída pela

catequese dos jesuítas.

Já nas colônias Espanhola e Inglesa foram encontrados povos com cultura em

nível avançado precisando, apenas, incluir a cultura dos europeus. Com a dualidade de

cultura nas colônias Espanhola e Inglesa a chegada da imprensa se tornou necessária.

Como no Brasil não havia uma cultura avançada, por isso, o aparecimento tardio da

imprensa.

Razões sociais, econômicas, políticas – como se fossem instâncias separadas do mundo social – explicariam, por isso, os motivos da não circulação, antes de 1808, de jornais impressos no Brasil. Claro está que as proibições à circulação dos impressos impossibilitam os trabalhos de impressão na colônia, o que não impede a existência de tipografias clandestinas e circulação de manuscritos com o sentido de fazer proliferar ideias e opiniões. Portanto, razões de natureza material mais concretas exclusivamente não explicam o chamado atrasa brasileiro em relação à outras colônias da America Espanhola no que diz respeito à implantação da impressa (BARBOSA, 2010, p. 19-20).

O desenvolvimento da imprensa portuguesa só se dá em 1808, com a chegada da

família real. O homem que merece destaque é Antônio de Araujo (futuro conde das

barcas) que trouxe no navio em que veio, o Medusa, a tipografia, que assumiu o papel

da Impressão Régia.

Era a gráfica que se destinava originalmente a atender àquele ministério em Lisboa e que, no Rio, assumiria o papel da Impressão Regia, responsável por todas as publicações impressas no Rio de Janeiro até 1821. (...) O decreto de D. João VI sobre a implantação da Impressão Régia sugere que ele só ficou sabendo da existência da gráfica depois que aqui chegou e quando ela já se encontrava montada na cada de Antônio de Araújo (LUTOSA, 2000, p. 66-67).

Muitas publicações clandestinas foram feitas na colônia até 1808 e até mesmo

depois, mas nenhuma delas eram consideradas imprensa e nem jornalismo.

A existência de informações manuscritas e da impressão clandestina, entretanto, não permitiam dizer que existam imprensa e jornalismo. Só existe imprensa, no sentido estrito do termo, a partir do momento em que a transmissão de informações regular se torna pública, ou seja, acessível ao público em geral. Até então as novidades ou opiniões, sem

110

qualquer regularidade, não eram transformadas em notícias. Existe troca de informação, mas não existe imprensa. Só há imprensa quando a ideia do público como espécie de abstração-concreta se torna o desejo dominante das publicações. Não importa que tipo de público: se os próprios jornalistas, se os poderosos do reino, se os comerciantes e os militares de altas patentes. Há jornalismo quando há publicização no sentido mais amplo do termo (BARBOSA, 2010, p. 10).

A Gazeta do Rio de Janeiro é o primeiro jornal impresso no Brasil, seu 1º

exemplar saiu no dia 10 de setembro de 1808. No começo sua periodicidade era

semanal, depois passa a sair as quartas e sábados mudando para terças, quintas e

sábados. Além das edições regulares, o jornal tinha muitas edições extraordinárias.

A Gazeta do Rio de Janeiro (1808-1822) inaugura a impressão no Brasil e a circulação regular dos periódicos que aqui passam a ser impressos e se tornam, gradativamente, acessíveis a um público mais amplo. Junto com ela acorrem outras publicações: livros, opúsculos, jornais, boletins e outros impressos clandestinos, como o Correio Braziliense (1808-1822) (BARBOSA, 2010, p. 21).

As edições extraordinárias da Gazeta do Rio de Janeiro publicavam notícias

somente sobre os acontecimentos da invasão do exército de Napoleão na Espanha e em

Portugal. Isso se deu até o final de 1808 e 1809 até que anunciasse a vitória dos Ingleses

sobre os franceses em Portugal. Com o tempo essas notícias se tornaram monótonas.

Além disso, as informações, para escrever as edições extraordinárias, vinham de fora até

mesmo através do Correio Braziliense, elas eram dadas com atraso de quatro a seis

meses.

A Gazeta do Rio de Janeiro tinha o caráter oficial, era de propriedade dos

oficiais da Secretaria do Estado dos Negócios Estrangeiros da Guerra. O primeiro

redator foi o frade português Tibúrcio José da Rocha e, em 1812, assumiu o capitão

Manuel Ferreira de Araújo Guimarães. No cenário nacional era difícil ver um

profissional de jornalismo com pensamentos contrários do que ocorria na Europa.

Era uma imprensa européia do século anterior. Ao contrario do que já se conhecia na Europa, são raros nesse cenário os jornalistas profissionais. Muitos seriam os padres que acumulariam a condição de eclesiásticos com as de funcionário público e jornalistas. A redação da Gazeta do Rio

111

de Janeiro era uma mistura de redação propriamente dita com reparticipação pública e claustro, não só por conta do grande número de funcionários públicos e padres que nela escreviam, mas também, apesar de se classificar como um empreendimento de particulares, por funcionar numa secretaria do governo. Típico do ambiente de claustro que caracterizava administração da Gazeta é o final do caso contra Ferreira Araújo, em que os patrões, em vez de exigirem as sanções legais para o suposto crime do ex-empregado, prometem orar pela sua salvação (LUTOSA, 2000, p. 71).

A Gazeta do Rio de Janeiro circulou pela última vez em dezembro de 1821,

aonde dá espaço para o “Diário do Governo”. Além, da Gazeta, outros jornais tiveram

grande destaque no início da impressa brasileira: Correio Braziliense, de Hipólito da

Costa.

A pesquisadora Isabel Lutosa (2000, p. 71) afirma que o jornal a Gazeta do Rio

de Janeiro não foi o primeiro jornal brasileiro, mas sim o primeiro a ser impresso, como

já dito. E, o primeiro jornal brasileiro é o Correio Braziliense, lançado, em Londres, três

meses antes. “O quadro da imprensa que se fazia no Rio de Janeiro se manteria

praticamente inalterado entre 1808 e 1821. A censura aos impressos permanecia total. A

única voz era de Hipólito da Costa” (LUTOSA, 2000, p.73).

Hipólito chegou à Londres no ano de 1805, fugido da inquisição. Seu sonho era

estar no Brasil, mas como era impossível, usou de seu jornal para defender e opinar

sobre seu país de origem. Juarez Bahia (2009) relata que para Hipólito a data correta de

sua primeira publicação é 1º de junho de 1808, quando chega o primeiro exemplar ao

Brasil.

A diferença entre o Correio e a Gazeta não é só datas, já notara um leitor eminente, John Armitage: o Brasil visto pela Gazeta deveria ser considerado como o paraíso terrestre, onde nunca se tinha expressado nenhum queixume. O Correio, ao contrario, questiona essa falsa realidade (BAHIA, 2009, p.32).

Em Londres, local em que residia e editava o jornal, tinha garantia da lei e a

proteção do duque de Sussex, maçom e amigo dedicado de Hipólito da Costa. Todavia,

assim, mesmo o jornal é proibido, apreendido, censurado e processado no Brasil. Em

Portugal, outro país em que circulava, o Correio é a violação da lei. “A administração

do Reino edita avisos e mobiliza a polícia para impedir a circulação, que já no número

112

sete alcançava as províncias e ostenta uma influência e um prestígio significativo”

(BAHIA, 2009, 32).

Manuel Carlos Chaparro (2008) o descreve o Correio dizendo que tinha a

natureza enciclopedista, e por isso era, também, conhecido como Armazém Literário.

Juarez Bahia (2009) já o descreve como uma revista e o livro, num contexto de

informações gerais, cultura, ciência ou história. O jornal é uma brochura de 140

páginas, grandes e com capa azul, com a periodicidade mensal.

O periódico completo abrange 175 publicações e 29 volumes, entre os anos de

1808 e 1822. “Um compêndio clássico do jornalismo político, obra de um jornalista,

escritor, pensador cientista e político” (BAHIA, 2009, p. 33).

Isabel Lutosa (2000) expõe que o jornalismo de Hipólito como irônico, pois

debochava das medidas tomadas pelo Brasil pelo governo português recém instalado no

Rio de Janeiro. O jornalista era de opinião contrária ao poder absoluto, pois achava que

o governo abusava da nação e dos cidadãos. “Era uma monarquista constitucional do

tipo britânico, se mostraria totalmente avesso às tendências democráticas herdadas da

Revolução Francesa” (2000, p.76). Queria grandes reformar para o país, mas não

desejava que as reformas fossem feitos pelos cidadãos, assim como aconteceu.

Já Nelson Sodré (1999) descreve que o jornal Correio Braziliense nasceu com

objetivo de organizar Brasil para que não se deixasse corromper pelos políticos. “Trata-

se, assim, de uma finalidade moralizadora e não modificadora, ética e não

revolucionária” (p.23). Ainda que, o Correio foi um grande influenciador da opinião

dos brasileiros.

Um dos maiores pesquisadores sobre Hipólito da Costa e o Correio Braziliense,

Carlos Rizzini (1957), conta que o jornal tinha um enorme “espaçamento das edições,

descontinuando e alterando os assuntos, e com as enormes distancias a separar o

periódico dos seus alvos e dos seus leitores” (p.114). Ou seja, às vezes, os fatos do

Brasil demoravam de cinco a seis meses para repercutirem em Londres e retornarem ao

Brasil, e as críticas ou comentários já estavam esquecidos pelos leitores.

Só em agosto, por exemplo, conseguiu o Correio publicar na íntegra a carta-régia de 28 de janeiro abrindo os portos da Colônia ao comércio internacional. Da criação da Imprensa Régia, a 13 de maio, tomou conhecimento em outubro (RIZZINI, 1957, p.114).

113

Rizzini (1957) relata que além de noticiar os grandes acontecimentos, o

periódico publicava dissertações doutrinárias, informações científicas, agrícolas,

comerciais e literárias; notícia das principais nações. Divulgava tabelas e estatísticas de

moedas, importação e exportação, preços de mercadorias e movimento portuário. E,

através do Correio conseguia-se acompanhar notícias minuciosas da Europa.

O jornalismo informativo, vivo, rápido, vulgarizador das novidades e das reportagens que o público quer conhecer e seguir, este, como nós o temos hoje em ponto grande, nasceu com o cavalo vapor, disparando as tiragens (RIZZINI, 1957, p. 115).

O Correio torna-se inspiração para muitos outros jornais, citação que faz crescer

o número de periódicos no Império. Todavia, o momento crucial para imprensa

brasileira acontece entre os anos de 1820 – 1821 (MOREL, 2008, p.34), contexto que

antecede a Independência e marca mudanças significativas na estrutura política da

Península Ibérica e de seu domínio na América.

Em 1820, como é sabido, ocorreram as revoluções constitucionalistas na Espanha e em Portugal, inspiradas no modelo liberal da Constituição de Cádiz (1812). Esses acontecimentos teriam impacto importante nos domínios portugueses e espanhóis na America. Entre as primeiras medidas da Junta do Governo da Revolução Constitucional portuguesa estava o decreto estabelecendo a liberdade de imprensa, datado de 21 de setembro de 1820. Em seguida, a 13 de outubro, as mesmas autoridades liberaram a circulação dos impressos portugueses fora de Portugal. Enterravam, assim, a censura prévia (MOREL, 2008, p.34).

Sodré (1999) relata que nesta ocasião houve uma mistura de dois problemas, o

da Independência e o da liberdade, que denunciava a fase difícil da política. “A luta pela

Independência seria, naturalmente, a luta pela liberdade de imprensa” (p. 47). A questão

era que alguns políticos colocavam a Independência como prioridade e outros a

liberdade, e esta situação fez gerar a revolução portuguesa de 1820.

Para o desenvolvimento da imprensa brasileira, o movimento de 1820 teve consequência favoráveis. Foi em função delas que o processo da

114

Independência prosseguiu, mudando a sua qualidade mas encontrando um mínimo de imprensa para nele influir (SODRÉ, 1999, p.49).

Marco Morel (2008) relata que D. João VI não teve outra saída a não ser assinar

o decreto que oficializa, em 2 de março de 1821, a suspensão provisoriamente da

censura prévia. Era uma decisão tardia, pois a circulação dos periódicos era

incontrolável naquele momento no Brasil. A partir de, então, a liberdade de imprensa foi

inserida no país, porém com diversas dificuldades.

Houve um crescimento da imprensa, sim, mas a questão do controle desta atividade seguiria uma linha sinuosa, com recuos e expansões: os dilemas, vividos pelos redatores de diversas correntes políticas, se cruzariam com as preocupações governamentais e com as constantes alterações dessa legislação (MOREL, 2008, p. 34).

Marialva Barbosa (2010) relata que a partir de 1821 multiplicaram-se os

periódicos, alarmando o príncipe regente. Em janeiro de 1822 (p.40), D. Pedro interdita

o anonimato das obras, para que existisse responsáveis pelo conteúdo escrito. Já em

junho de 1822, durante a solicitação da Assembléia Geral Constituinte e Legislativa o

próprio elaborou um decreto contra o abuso da imprensa.

É preciso evitar que “ou pela imprensa ou verbalmente, ou de qualquer outra maneira, propagem e publiquem os inimigos da ordem e da tranquilidade e da união, doutrinas incendiarias e subversivas”. Essas doutrinas, segundo a letra da lei, promoveriam a anarquia e poderiam significar a destruição de um sistema no qual “os povos por sua própria vontade escolheram, abraçaram e requereram” (Decreto de 18 de junho 1822, apud BARBOSA, 2010, p.40, apud NEVES, 2000, p.390-391).

Este decreto foi mantido até o ano seguinte, quando alguns deputados criaram

um projeto de lei sobre a liberdade de imprensa questionando a censura. Porém, com a

dissolução da Assembléia Constituinte, em novembro de 1823, o projeto é suspenso.

A Constituição de 1824 limita-se a declarar que “todos podiam comunicar os seus pensamentos, por palavras, escritos e publicá-los na imprensa, sem dependência da censura”. Entretanto, devem responder

115

pelos “abusos que cometerem no exercício deste Direito, nos casos, e pela forma, que a Lei determinar”. Este dispositivo é regulado apenas em setembro de 1830, sendo integrado ao Código Criminal em dezembro do mesmo ano, onde permanece até 1890 (NEVES, 2000, p. 392 apud BARBOSA, 2010, p.41).

Marco Morel (2008) afirma que o tema da liberdade permanece durante toda

história da imprensa e, até hoje, é uma questão mal resolvida entre o governo e a mídia.

Dentro deste contexto histórico da imprensa brasileira, o pesquisador Marco

Morel (2008) faz uma retrospectiva dos principais jornais, de influência na opinião

pública, entre os anos de 1808 e 1830, aproximadamente.

A lista seria extensa, com centenas de títulos e dezenas de redatores somente na década de 1830 (Neste ano, Evaristo Veiga calculava que, apenas, no Rio de Janeiro, duzentas pessoas sobreviviam da atividade impressa, entre tipógrafos, livreiros, redatores e outras profissões diretamente derivadas) (MOREL, 2008, p. 40).

Para melhor exemplificar estes jornais, o pesquisador Marcos Paulo da Silva

(2009) criou uma tabela com um dos principais jornais da época51:

Quadro 2 – Referente aos primeiros jornais do Brasil

Redator Posição política Periódico

José da Silva Lisboa (Visconde de Cairu)

Conservador e erudito Vários folhetos e jornais de combate

Evaristo da Veiga

Liberal, crítico de Dom Pedro I, depois apoiador

das regências

Aurora Fluminense

Antonio Borges da Fonseca

Republicano e posteriormente socialista

O Repúblico

Ezequiel Correa dos Santos

Neojacobino

Nova Luz Brasileira

Joaquim do Amor Divino

Caneca (Frei Caneca)

Frei carmelita, liberal e

republicano

O Tiphis Pernambucano

51 Estes jornais são classificados por Marco Morel (2008), como “vozes panfletárias”, ou seja, jornais

com poucas condições técnicas, mas que exerciam com grande ardor as críticas ao governo.

116

Januário da Cunha Barbosa e Joaquim Gonçalves Ledo

Defensores da independência

O Revérbero Constitucional

Fluminense Líbero Badaró Liberal O Observador

Constitucional

Lopes Gama

Conservador e satírico

O Carapuceiro

Vários redatores

Governamental

Gazeta do Brasil / Diário Fluminense

3.4 - O Jornalismo Opinativo do século XIX: Influência retórica e

conceitos

Como já apresentando o jornalismo nasce, no Brasil, no século XIX, com origem

ocidental, e uma de suas características é ser opinativo, discutindo sobre a política e a

economia.

Marco Morel e Mariana M. de Barros (2003, p.15) relatam que naquele período,

chamado por eles de República das Letras com traços peculiares, traz a imprensa de

opinião e consigo o homem público: o jornalista ou panfletário, também conhecido

como gazeteiro ou redator.

Entre as mutações culturais sobrevindas com a manifestação da modernidade política ocidental, surgia este homem de letras, em geral, visto como portador de uma missão ao mesmo tempo política e pedagógica. É o tipo escritor patriota, difusor de ideias e pelejador de embates, que achava terreno fértil para atuar numa época repleta de transformações. Ao contrario do que possa parecer, tais letrados não tinham exatamente o mesmo perfil dos filósofos iluministas ou sábios enciclopedistas do século XVIII, embora aludissem a estes com frequência (MOREL, 2006, p. 15).

O jornalismo opinativo, também conhecido como “argumentativo”, tem origem

no século XVIII, junto ao processo histórico da Independência dos Estados Unidos e da

Revolução Francesa, transformando-se em uma imprensa de combate. Beltrão (1980,

p.14) descreve que a opinião, independente da imprensa, exerce uma “função

117

psicológica, pela qual o ser humano, informado de ideias, fatos ou situações

conflitantes, exprime a respeito seu juízo”.

Foram os movimentos sociais e a efervescência política provocados na Europa pela Revolução Burguesa que restauraram o prestígio e com que recriaram a imprensa de opinião. O público reclamava uma orientação e os impressos foram convertidos em agentes de luta, adotando, propagando e defendendo determinados princípios e ideologias e combatendo os opositores. Foi a época áurea da polêmica (BELTRÃO, 1980, p.35).

Marco Morel (2006) descreve que no início do século XIX, após as grandes

revoluções, tais intelectuais se dividem em duas partes: Os liberais, partidários; e os

melancólicos que ficaram ligados ao século XVIII, junto as Letras. E, a primeira opção

é a característica dos primeiros redatores brasileiros, que se encontravam em um espaço

de abundante transformação com as revoluções ideológicas e culturais.

No Brasil, de acordo com Luiz Beltrão (1980), a fase do predomínio da imprensa

opinativa sobre o objetivismo frio da informação se estende da Regência até,

aproximadamente, o ano de 1880, quando o jornal toma como característica o

capitalismo e a tipografia perde sua particularidade artesanal.

Marco Morel, no ano de 2008, publicou uma pesquisa, no qual, apresenta que

antes de 1808, com a chegada da Família Real e o Correio Braziliense, já existia

aproximadamente mais de 300 obras de autores brasileiros, contando não só livros, mas

também impressos desconhecidos, com descrições de festas e acontecimentos. E, o

mais admissível é que tenham produzidos periódicos propagando novas ideias,

combatendo o Governo Imperial, dando forçar ao povo e ao mesmo tempo buscando

uma maneira de moldar suas formações.

Eram textos variados: desde narrativas, históricas até poesias, passando pela agricultura, medicina, botânica, discursos, sermões, relatos de viagens e naufrágios, literatura em prosa, gramática e até polêmicas (MOREL, 2008, p. 24).

118

Além disso, no século XVII, já se falava sobre a opinião pública popular, no

qual eram vozes ou rumores à respeito da sociedade de forma oral e não escrita.

Realizava-se leituras, em voz alta, em praças públicas por disposição do governo e da

Igreja.

Esta ação é de origem Européia, marcada pela oralização coletiva, e que trás

como ascendente a Grécia Antiga, quando se tinha a prática de fazer grandes discursos

com o respaldo da retórica. Frei Caneca também fez muito uso desta prática,

principalmente pregando em Assembléias, praças e Igrejas, exemplo é seu discurso a

Oração.

No mesmo caminho, é expressivo levar em conta a pluralidade e a intensidade dos escritos nas sociedades de tipo absolutista que, manuscritos, circulavam de formas variadas, através de correspondências particulares, copias de textos, papeis e folhas que pregavam em paredes e muros ou rodavam de mão em mão, muitas vezes através da atividade de copistas. Tais formas de transmissão manuscritas e orais, típicas daquelas sociedades, marcavam a relacionavam-se à imprensa periódica; que não se afirmara ainda como o principal meio de transmissão, embora tenha alterado bastante e dado outras feições à cena pública em sua dimensão cultural (MOREL, 2008, p. 28).

O autor ainda descreve, que antes da chegada do primeiro período no país,

circulava, pela capital e algumas vilas, jornais estrangeiros como, por exemplo, a

Gazeta de Lisboa. Porém, é com a criação do espaço público político, de críticas,

quando as opiniões começavam a ser propagadas, instaurou-se a, então, opinião pública,

cujo Frei Caneca tanto abordou nas páginas do Typhis Pernambucano.

Hipólito do Costa foi o primeiro redator a se dispor das opiniões públicas, no

Brasil, com valores absolutistas e liberais. Porém, Marques de Melo (2009, p. 123) diz

que a seu ver Hipólito da Costa ganha o título de precursor do jornalismo brasileiro,

mas não “configura um processo de observação sistemática, nem tampouco de

acumulação de conhecimento sobre a práxis da notícia” (MARQUES DE MELO, 2009,

p. 123).

Este processo sistemático, de acordo com o autor, acontece quando Frei Caneca,

com escreve Tratado de Eloquência e Tábus sinóticas do sistema retórico de

Quintiliano, constituindo o marco da referência do pensamento comunicacional, que é o

tema de nossa pesquisa e será descrito mais adiante. Todavia, ambos eram padronizados

119

pelo espírito da Revolução Francesa, o liberalismo e a moderna política citando

Montesquieu, Rousseau entre outros. E, ainda, seguiam de perto a separação entre Brasil

e Portugal.

Morel e Barros (2003) relatam que a imprensa do século XIX era “elitistas”,

poucos tinham acesso ao jornal, e a comunicação, ainda, era de gestos e palavras. E,

sendo assim, o conteúdo de informação ultrapassava os limites do jornalismo impresso.

Em sua grande maioria, os primeiros jornalistas da época eram de famílias alta

sociedade, jovens ou adultos formados em bacharel (medicina ou direito). Somente

algumas exceções aconteciam, como por exemplo, Frei Caneca que era de família

simples, mas conseguiu se destacar devido a sua dedicação aos estudos, principalmente

à retórica.

Essa alta sociedade era conhecida como “elite cultural”, isso é, pessoas letradas

e de fácil ascensão a imprensa, discutiam sobre política, economia, escravos,

agricultura, indústrias e os movimentos que surgiam. E, com isso, iniciava-se uma

sociedade com comércios e relação com o poder. Marco Morel (2005) descreve que a

imprensa era visto como algo positivo para a sociedade e uma autêntica narradora de

fatos e da verdade.

Um dos pressupostos da elite cultural e intelectual, como já citado no capítulo

anterior, era ter conhecimentos retóricos. E, no Brasil o primeiro a introduzir a retórica

como conhecimento foi o padre jesuíta Antônio Vieira, com a catequese dos índios e a

formação do clero. Contudo, o primeiro brasileiro naturalizado a se dedicar a esta

disciplina, transformando-a em grandes discursos e textos jornalísticos foi Frei Caneca,

que reescreveu de forma sistemática a retórica de Quintiliano e soube aplicá-la.

Partindo, então, do pressuposto de que a sociedade, de certa forma, era elitista e

iniciava o jornalismo opinativo, podemos dizer que a retórica teve influência neste

meio. Ou seja, a retórica é a arte de discursar a modo de persuadir e convencer as

pessoas sobre suas ideias e conceitos, mesmos objetivos da imprensa que nascia. E,

como complemento, ambos agregam a relação da sociedade sobre seus valores, crenças

e opinião, tendo como procedência a troca de informações e, ideias.

A partir deste pensamento, o discurso jornalístico torna-se uma narração

retórica, que se baseia em argumentos lógicos e sentimentais, esboçando artifícios em

um contexto para a composição do verossímil, e, assim, ganhar a confiança de seu

público. E, ainda, o discurso jornalístico opinativo se cria a partir da intenção de

120

persuadir, podendo variar de acordo com as estratégias retóricas escolhidas pelo orador

e a disposição do público.

Quando se pensa na estrutura do discurso retórico: a argumentação persuasão, a

interação entre os sujeitos, e na maneira como deve ser preparado. Pode-se dizer que a

retórica percorre e organiza o discurso jornalístico, sendo ele em seus diversos gêneros

– opinativo, informativo ou interpretativo.

A retórica organiza sua estratégia defendendo, por meio de argumentos, teses e fatos e, portanto, elegendo um ponto de vista, uma ‘realidade’/verdade. O jornalismo se coloca, dessa forma, como agente que ‘constrói fatos’, pois sua atividade é orientada pela escolha de aspectos da realidade. O jornalista constrói realidades na medida em que torna presentes idéias e acontecimentos, enfim produzindo notícia através de seu discurso eminentemente retórico. O ato de selecionar e tornar ‘presente’ determinado aspecto da realidade social é um dos elementos que caracteriza o discurso jornalístico como estratégia retórica argumentativa. Perelman diz que “o fato de selecionar certos elementos e de apresentá-los ao auditório já implica a importância e a pertinência deles no debate. Isso porque semelhante escolha confere a esses elementos uma presença, que é um fator essencial da argumentação” (PERELMAN, 2000, p. 132 apud GIORDANI, 2005, p. 236).

O jornalismo do século XIX, influenciado pelos acontecimentos da época e os

conceitos retórico, se submete a um recorte ideológico, político e econômico da

sociedade da época, com enfoques e abordagens dos eventos. Os jornalistas eram

considerados como observadores, onde se pautavam dentro de um panorama histórico e

cultural e iniciava-se uma mediação na formação da sociedade.

Com a influência da retórica forma-se uma nova geração de jornalistas e

formadores de opinião, criando, assim, o discurso opinativo que se expõe através de

argumentos relacionados à ideologia.

Como estratégica retórica, pode-se vislumbrar o discurso opinativo como agente capaz de interferir decisivamente na formação da opinião pública e, portanto, assumir seu papel na esfera pública. Nele, o jornalista/orador se posiciona, elege fatos e opiniões com o objetivo de persuadir seu leitor a respeito da tese defendida (GIORDANI, 2005, p.237).

121

Além dos pressupostos de argumentação e da construção do discurso

apresentando pelos principais filósofos – Aristóteles, Cícero e Quintiliano -, é

necessário ressaltar a importância dada por Quintiliano sobre a arte de escrever bem.

Em seu Quinto livro, capítulo X, o autor dedica-se em trabalhar com os argumentos e as

provas demonstrativas, refere-se á disposição dos discursos e às questões a respeito

sobre a melhor forma de narrar as novidades. Alguns dos princípios adotados por

Quintiliano são considerados as mesmas regras para a construção do lead.

A hora paso al marco de las cosas, en las que de modo especial, en el tratamiento que hacemos, hallamos su vinculación con las personas, y por eso hemos de considerarlas en primer lugar. En toda cosa, pues, que se hace, las preguntas en principales son éstas: Por qué se hizo? Dónde? Cuándo? De qué modo? Con qué medios? (QUINTILIANO, 199, p.179)

O mesmo contexto da redação descrita por Quintiliano é apresentado pelos

principais manuais de redação sobre a forma de se escrever:

O lead é a abertura da matéria. Nos textos noticiosos, deve incluir, em duas ou três frases, as informações essenciais que transmitem ao leitor um resumo completo do fato. Precisa sempre responder às questões: o que, quem, quando, onde, como e por quê (MARTINS, 2001, p. 154)..

Esta estrutura apresentada por Quintiliano, que depois se tornou base para a tese

de Tobias Peucer, em 1690, que não se prende apenas ao estilo opinativo, mas também

ao informativo, descrevendo a objetividade do jornalismo.

Contudo, a retórica, de certa forma, influenciou muito mais o estilo jornalístico

opinativo por se tratar de uma teoria argumentativa, de persuasão, que tinha como

objetivo gerar conceitos e opiniões sobre sua audiência, e motivada pela prática ética e

democrática. E, era o estilo produzido pelos primeiros jornalistas brasileiros, do século

XIX.

Valdemir M. Carmo (2006), em sua dissertação de mestrado, diz que a retórica,

com sua índole ideológica, sustentada em um alicerce ético, caminha para um debate de

democrático e de interesse da sociedade, com seu estilo argumentativo.

122

Portanto, ao se conceber a opinião, segundo as necessidades e intenções do enunciador, deve-se ter em foco, independente do gênero, a necessidade de se antever um fundamento ideológico. Sem esse fundamento, muitas vezes usado de modo inconsciente, o jornalista não teria ponto de partida em sua tarefa de produção de uma argumentação sólida e ponderada. Será também este fundamento que, concretamente, fará o leitor ser cada vez mais um leitor fiel do profissional dos textos. Portanto, os jornalistas que se utilizam de argumentos e versam opiniões nas áreas diversas do conhecimento são essenciais à sociedade e ao jornalismo. Conseqüentemente, o jornalista se utilizará da argumentação, persuadindo o leitor paulatinamente da concepção de seu julgamento. Por fim, o jornalista opinativo deverá estabelecer no leitor uma semente reflexão que deverá redundar numa auto-análise no que diz respeito ao cidadão, seus direitos e deveres, bem como as decorrências e efeitos da liberdade de opiniões, a fim de adotar mesmo tempo um caráter ético e marcadamente de interesse público (CARMO, 2006, p. 52-53).

Naquela época, e continuou-se até os dias de hoje, o papel do jornalismo

opinativo era informar a sociedade sobre os acontecimentos sócio-econômicos e

culturais, alegando suas opiniões.

Neste contexto do jornalismo argumentativo emergiu-se a opinião pública como

uma solução para legitimar posições políticas, desempenhando um papel importante na

criação do espaço público. “Diante do poder absolutista, havia um público letrado que,

fazendo uso público da razão, construía leis morais, abstratas e gerais, que se tornavam

uma fonte de crítica do poder e de consolidação e uma nova legitimidade política”

(MOREL, 2008, p.33). Este acontecimento surgia entre os sábios, no reino da opinião e

do conhecimento.

A opinião pública surge em meio às grandes turbulências no Brasil, revoluções,

contestações, acontecimentos, entre os anos de 1820 e 1821, que antecedem a

Independência do Brasil, e marcavam a estrutura política em toda a América e Península

Ibérica. O fato principal, de se concretizar a opinião pública, foi a liberdade de impressa

que havia sido decretada por D. Pedro.

Morel e Barros (2003) descrevem que o momento crucial para a liberdade de

imprensa no Brasil se deu, em 02 de março de 1821, quando o rei. D. João VI assinou

um decreto suspendendo provisoriamente a censura prévia para a imprensa. Contudo,

essa atitude não significou que a imprensa estava livre, sem censura, para se pronunciar

da maneira como bem quisesse, relatando fotos e expressando opiniões. Ainda, sim,

123

existia um controle dessa atividade por parte do governo, que com persistência alterava

a legislação.

Morel (2008) diz que uma das figuras marcantes da primeira geração da

imprensa brasileira e dos questionamentos sobre a opinião pública foi o baiano Cipriano

Barata – também um grande influenciador do jornalismo revolucionário de Frei

Caneca. O autor concluiu seu pensamento dizendo que a discussão sobre a opinião

pública e a liberdade de imprensa vive em constante permanência na história de nosso

país, pois são assuntos ainda não resolvidos entre o governa, a população e a imprensa.

Marques de Melo (2003c) diz que com o fim da censura prévia o jornalismo

assumiu uma atividade peculiar de formador de opinião. Porém, como o governo não foi

de acordo com a situação, e começou a gerar transtornos para os veículos e jornalistas

que opunham opiniões contrarias a ele. Com as restrições o jornalismo opinativo

começou a se transformar em jornalismo informativo, assumindo, assim, um caráter

com mais informação do que opinião.

Para não cair num tipo de discussão bizantina, é preciso deixar claro que essa distinção entre a categoria informativa e a opinativa corresponde a um artifício profissional e também político. Profissional no sentido contemporâneo, significando o limite em que o jornalista se move, circulando entre o dever de informar (registrando honestamente o que observa) e o poder de opinar, que constitui uma concessão que lhe é facultada ou não pela instituição em que atua. Político no sentido histórico: ontem, o editor burlando a vigilância do público leitor em relação às matérias que aparecem como informativas (news), mas na prática possuem vieses ou conotações (MARQUES DE MELO, 2003c, p. 25).

O autor ressalta que o jornalista não deixou de se preocupar com os fatos e

relatos de suas ideias, principalmente, com sua ideologia, apenas narrava os

acontecimentos com mais precisão e veracidade.

Narras os fatos e expressar as ideias segundo os padrões historicamente definidos como jornalismo informativo e jornalismo opinativo não altera fundamentalmente o resultado do processo interativo que se estabelece entre a instituição jornalística e a coletividade que tem acesso ao universo temático e conteudístico manufaturado continuamente (MARQUES DE MELO, 2003c, p. 25).

124

Melo ressalta que os dois gêneros são de características semelhantes, pois o

jornalismo opinativo, com seus aparatos ideológicos, não deixa de informação e relatar

acontecimentos verdadeiros. Assim, como o próprio jornalismo ou outro meio de

comunicação de massa, independente de seu gênero, trás reproduções ideológicas e

atinge sua meta com a objetividade52.

O pesquisador Jorge Pedro Sousa (2001) ressalta que na essência do jornalismo

opinativo a descrição tem por objetivo tornar pública a informação e gerar

conhecimento, a opinião tender a influenciar o público e cooperar para o debate de

ideias, fatos e situações. Para se dar uma opinião pertinente é preciso sabedoria. Se a

descrição gera informação pura e se a análise produz conhecimento, a opinião é uma

manifestação de saber.

O texto opinativo é um enunciado jornalístico menos comum do que o texto descritivo e o texto analítico. Os jornalistas, geralmente, tentam separar a informação (descrição e análise) da opinião. A opinião fica reservada a especialistas, colunistas e opinantes. Nem sempre é fácil distinguir opinião de análise. Por vezes, para se chegar à opinião é necessário fazer uma análise. Mas talvez seja possível dizer que a opinião se destrinça da análise porque, ao contrário desta, não necessita de se basear em factos concretos e no exame atento da realidade. A perspectiva do opinante pode ser muito subjectiva, resultando unicamente da interacção entre a mente e a linguagem. Mas o facto de a opinião não necessitar de se basear em factos concretos ou no exame atento da realidade não significa o mesmo que deixar de se fazer essa ancoragem à realidade. De facto, pode opinar-se com base numa arguta interpretação do real (SOUSA, 2001, p. 140).

A existência do jornalismo se deu pelo seu objetivo de informar, narrar dos

fatos, com um espaço autônomo de liberdade e de confiança para com seu público. O

pesquisador Manuel Carlos Chaparro (2008) diz que a divisão entre o opinativo e o

informativo se transformou em uma organização do jornalismo, por desenvolver

valores, paradigmas, o campo científico, conceito entre os leitores.

O paradigma Opinião X Informação tem condicionado e balizado, há décadas, a discussão sobre os gêneros jornalísticos, impondo-se como critério classificatório e modelo de análise para maioria dos autores que

52 Objetividade no sentido de neutralidade, imparcialidade, assepsia política, cujo, é discutido na Teoria do Jornalismo.

125

tratam do assunto. A conservação dessa matriz reguladora esparrama efeitos que superficializam o ensino e a discussão do jornalismo, e tornam cínica sua prática profissional. Trata-se de um falso paradigma, porque o jornalismo não se divide, mas constrói-se com informações e opiniões. Além de falso, está enrugado pela velhice (CHAPARRO, 2008p. 146).

O mesmo autor descreve que no início da trajetória do jornalismo opinativo X

informativo, com as mais diversas revoluções – culturais ou tecnológicas, sua forma de

se expressar era apenas por meio de notícias e artigos. A reportagem surgiu somente

depois de cem anos, e foi predominante nos jornais e revistas. E com o passar do tempo

apareceu a entrevista, o fotojornalismo, a diagramação, o infográfico entre outras

tarefas.

Chaparro (2008) conclui seu pensamento dizendo que a opinião, no plano do

conhecimento, conserva e destrói, preserva e transforma ao mesmo tempo. “A inserção

do conhecimento, como parte contraditória, é discutida na filosofia desde Sócrates, para

quem as opiniões divorciadas do conhecimento eram coisas feias” (CHAPARRO, 2008,

p.148). A opinião constrói memória e esquecimento.

Os jornalistas do século XIX não se preocupavam com uma classificação do

estilo jornalístico, como existe hoje, até porque não existia nenhuma organização. A

meta era informar e opinar. Todavia, aos poucos, começaram a surgir novos formatos,

mesmo que muitos redatores não percebessem esta inovação. No início do século XX,

principalmente, houve novas influências e transformações, em destaque o estilo

jornalístico americano que deu origem ao comercio publicitário no veiculo impresso e

reforçou a objetividade no jornalismo informativo. E, assim, foi-se dando origem aos

novos gêneros jornalísticos53.

No Brasil, o pioneirismo se deu com Luiz Beltrão, que lança a trilogia com o

objetivo de organizar a imprensa brasileira, classificando os textos publicados nos

jornais, e faz a seguinte classificação dos gêneros jornalísticos:

• Jornalismo Informativo: Notícia, Reportagem, História de interesse

humano, informação pela imagem.

53 Não entramos na questão dos estudos dos gêneros jornalísticos contemporâneos. Mas, sim, os apresentaremos, com o propósito maior de destacar o gênero opinativo e suas classificamos.

126

• Jornalismo Opinativo: Editorial, Artigo, Crônica, Opinião Ilustrada,

Opinião do leitor.

• Jornalismo Interpretativo: Reportagem em profundidade

Após um grande mapeamento da imprensa brasileira realizado por Luiz Beltrão,

José Marques de Melo dá continuidade as pesquisas abrangendo novos conceitos, em

dois momentos. Inicialmente, na década de 1980, em sua tese de doutorado, contendo-

se na questão do jornalismo opinativo brasileiro54, que, ainda, naquela época

encontrava-se em destaque. No final da década de 1990, Marques de Melo faz uma

revisão daquilo que havia defendido, apresentando novos gêneros e formatos criados na

imprensa brasileira, concluindo que novos formatos no gênero opinativo55 (2003c, p.

65) emergiram:

Quadro 3 - Formatos dos gêneros opinativos classificados por Marques de Melo Formato Descrição

Editorial Expressa a opinião oficial da empresa diante dos fatos de maior repercussão no momento. Porta – voz da instituição jornalística. Espaço de contradições. Opinião das forças que mantém a instituição jornalística. Sinaliza a opinião pública, pretendendo nela influir. Predominante nos jornais, perde intensidade nas revistas, figurando episodicamente no rádio e na televisão e ressurge na internet.

Comentário Oriundo do jornalismo norte – americano, no qual é cultivado por jornalistas de grande credibilidade, mais conhecimento como “opinion maker”. Explica as notícias, seu alcance, suas circunstâncias, suas consequêcias. Nem sempre emite uma opinião explícita. O julgamento dos fatos é percebido pelo raciocínio do comentarista, pelos rumos da sua argumentação. Sua característica inerente é a continuidade. Uma matéria que contém a apreciação de um fato articula-se necessariamente com as que antecederam e com as que vão.

Resenha Apreciação das obras de arte ou dos produtos culturais, com finalidade de orientar a ação dos fruidores e consumidores. Não tem a intenção de oferecer julgamento estético. Tem função eminentemente utilitária. Ao mesmo tempo que se sinaliza aos consumidores, dialoga com produtores, oferecendo pistas para os autores, diretores, atores. Formato que abrange toda mídia, da imprensa ao rádio e à televisão, expandindo –se também na internet.

54 Vale ressaltar que o pesquisador não se dedicou apenas aos estudos do jornalismo opinativo ou que chegou a afirmar apenas essa existência. Ao decorrer da tese foi citado outro gênero, o informativo. Porém, como conclusão de sua pesquisa pode-se observar que o gênero de maior destaque foi o opinativo. 55 Ao apresentar a revisão dos gêneros, Marques de Melo descreve novos gêneros e formatos. Todavia, iremos destacar apenas o opinativo que é o foco desta pesquisa.

127

Coluna Mosaico estruturado por unidades curtíssimas de informação e opinião, caracterizando-se pela agilidade e pela abrangência. Cumpre uma função que foi peculiar ao jornalismo impresso antes do rádio e da televisão: o furo. Tem como espaço privilegiado os bastidores da notícia, descobrindo fatos que estão por acontecer. Picando opiniões que ainda não se expressam, ou exercendo um trabalho sutil de orientação da opinião pública. Aparentemente tem caráter informativo, mas na prática é uma seção que emite juízo de valor, com sutileza ou modo ostensivo.

Crônica Formato genuinamente brasileiro, corresponde a um relato poético do real. Gira permanentemente em torno da atualidade, captando com argúcia e sensibilidade o dinamismo da notícia que permeia toda a produção jornalística. Conversa aparentemente fiada, em torno de questões secundarias, constitui um momento de pausa, que reflete a trégua necessária à vida social. Hegemônica na imprensa, encontra também espaço no rádio e começa florescer na Internet.

Caricatura Forma ilustrada que a imprensa absorve com sentido nitidamente opinativo. Sua origem semântica corresponde a ridicularizar, satirizar, criticar. Pode ser exercitada também sob a forma de texto humorístico. Os caricaturistas atuam como a consciência crítica da sociedade, revelando uma tendência nitidamente oposicionista. Predomina na imprensa, mas floresce também na televisão, expandindo-se na internet.

Carta Espaço facultativo aos cidadãos para que expressem seus pontos de vista, suas reivindicações, sua emoção. Pretende romper barreira que existe entre o leitor e editor, produtor e consumidor. Território democrático, aberto a todos os cidadãos interessados em participar do debate público, sendo vedado o anonimato.

Artigo Matéria jornalística através da qual o jornalista e cidadãos desenvolvem idéias e apresentam opiniões. Contém julgamento mais ou menos provisórios, porque é escrito enquanto os fatos ainda estão se configurando. Democratiza a opinião no jornalismo, possibilitando o seu acesso à lideranças emergentes na sociedade.

Observa-se com a pesquisa que os gêneros jornalísticos estão se adaptando as

transformações da comunicação, porém são poucas as modificações e o que se inova são

os formatos.

3.5 – O jornalismo de Frei Caneca

Sabe-se que a vida de Frei Caneca foi marcada pelo seu forte desempenho

político, intelectual, religioso e jornalístico, suas ideias têm influência do Iluminismo,

128

principalmente sobre a Revolução Francesa, e não apenas ao pensamento trazido pelos

Portugueses ao chegarem no Brasil. Pode-se, assim, dizer que Caneca nasceu com o

espírito revolucionário.

Como citado, o carmelita nada escreveu referente ao jornalismo. Porém, suas

ideias e conceitos podem ser encontradas em seu jornal Typhis Pernambucano e seus

textos didáticos.

Desde o surgimento da imprensa, grande parte dos jornalistas escreviam sobre

política, colocando-se contra o governo. Com Frei Caneca não foi diferente, sua atuação

como jornalista aconteceu entre os anos de 1823 e 1824, quando expôs suas opiniões e

noticiou acontecimentos em seu jornal, o Typhis Pernambucano. Tifis, na mitologia

grega, era um argonauta que partiu atrás do Carneiro de Ouro, em busca do

imprescindível e até então inatingível.

Fernando Segismundo (1962, p.154) relata que a dissolução da Assembléia

Constituinte de 12 de novembro de 1823, com a prisão e deportação de deputados, foi a

chave para Frei Caneca iniciar suas publicações no jornal Typhis Pernambucano,

periódico a quem incumbirá daí por diante difundir os ideais autonomistas e

republicanos, e orientar a causa dos insurretos da Confederação do Equador.

Antonio Joaquim de Melo56 (1979) ressalta que na jornada contra a imposição e

resistências, contra a política da corte para obter o gosto da independência real e

verdadeira, e de liberdade, conforme aprendeu com os filósofos Iluministas, decidiu,

então, Frei Caneca a escrever um período, em que tratasse e defendesse esta política

provincial, que lhe parecia a verdadeira e mais eficaz. Assim, instaurou o Typhis

Pernambucano.

Este periódico interessa não só à literatura da nossa província, pelo bem que é escrito, como à sua história, por muitas notícias e fatos que da mais importante época consagra à perpetua memória dos vindouros (MELLO, 1979, p. 48).

O Typhis Pernambucano começou a circular em 25 de dezembro de 1823,

ocupando lugar de vanguarda na luta contra o absolutismo. Nasceu sob o impacto da

dissolução da Assembléia Constituinte e da prisão de Cipriano Barata57, em Recife.

56 Antonio Joaquim de Mello foi quem publicou o livro “Obras Políticas e Literárias de Frei Joaquim do Amor Divino Caneca”, e, também, quem escreveu sua biografia contida na obra. 57 A vida e obra de Cipriano Barata foi descrita no primeiro capítulo.

129

Sendo, assim, Frei Caneca realizou seu sonho de substituir o amigo de corrente política.

O jornal trazia os seguintes dizeres:

Amanheceu nesta Corte – tratava-se de correspondência do Rio de Janeiro – o lutoso dia 12 de novembro, dia nefasto para a liberdade do Brasil e sua Independência; dia em que o partido dos chumbeiros do Rio de Janeiro conseguiu dissolver a suprema Assembléia Constituinte Legislativa do Império do Brasil. Verificaram-se todas as previsões do espírito presságio da Sentinela da Liberdade... (SODRÉ, 1999, p.93).

O pesquisador Nelson W. Sodré (1999) descreve que o já em sua primeira

edição, o carmelita instigava os pernambucanos a ficar alerta sobre o Império,

informava da dissolução da Constituição, pregava a união em defesa da Independência e

da liberdade.

Sodré ressalta que uma das principais características do jornalismo de Frei

Caneca era a linguagem bem próxima da rebeldia, seus textos se compunham em lutar

contra a cúpula da Igreja, seu caso especifico era os cônegos de Olinda que estimulavam

a escravidão e o autoritarismo, açoitar o massacre contra os patriotas, buscar insensata

pela participação de todos na luta contra os apáticos, combater o preconceito contra as

raças, e não dar tréguas ao absolutismo na luta indomável pela liberdade.

Seu principal adversário era José Fernandes Gama, cujo atacava dizendo que

suas ideias eram velhas e sem valor.

Talvez as negras produções de um gênio ardente e malfazejo, recheadas de mentiras atrozes, e insolentes calumnias, produções de um coração ensopado na mais mortífera peçonha, não mereçam respostas aos olhos das pessoas de bom senso, que olham para ellas como para as investidas de um cão damnado, ou para os rugidos de uma fera acorrentada. Todavia, as línguas virulentas julgar-se-hiam autorisadas a mentir impunemente, si a Arara, ou Carasuja, como outros chamam, ou José Fernandes Gama, ficasse sem retorno. E bem que esta ligeira correção não aproveitando muito a tal Arara, porque, como lá dizem, Cavallo velho não toma andares; Ella pode servir de exemplo a outros que taes, e esclarecer aquelles que julgarem do merecimento da Arara pelo esplendor da sua plumagem (CANECA, 1979, p.253).

Frei Sampaio, editor do jornal O Regulador Brasileiro, também, era outro alvo

de Caneca por ser aliado às ideias da Igreja sobre despotismo e o autoritarismo, dizia ele

que não aceitava mais essas opiniões e o povo precisava ser livre.

130

Sustentam igualmente a existência deste propósito da facção portugueza as doutrinas e opiniões espalhadas por muitas províncias, mormente no Rio de Janeiro, todas coherentes com o desastroso sucesso, como entre outras sejam a proclamação aos soldados do Madeira pelo Lima, commandante do exercito pacificador da Bahia, de 28 de Março do anno passado; o celebre Regulador Brazileiro; a Sentinella do Pão de Assucar; as correspodencias do Diário do Governo do Rio, assignadas – o Bom Cidadão – T.F.G. e G.P.T.; e os prêmios dados ao reimpressor da Tripa Virada; e até o conhecimento e predição que muitos Portuguezes desta praça, que não seriam só os desta, fizeram da dissolução da assembléia, e chegada dos nossos deputados. Parece-nos termos satisfeito a nossa promessa de fazermos ver, que a dissolução da assembléia era negocio tratado e combinado há muito pelo chumbismo; resta-nos descobrir o alvo, à que Ella se destinou, e as suas consequências, o que reservamos para os números seguintes (CANECA, 1979, p. 442).

Frei Caneca é considerado um dos grandes jornalistas de rebeldia e indomável e,

morreu como um herói e mártir. Tinha um lugar de vanguarda na luta contra o

absolutismo e com seu jornal não deu tréguas a esta situação. O jornal, na fase de

extinção da liberdade do país, manteve-se na luta contra o poder Imperial, buscando

seus direitos como cidadãos.

4º) A todo homem é livre manifestar os seus sentimentos e a sua opinião

sobre qualquer objeto.

5º) A liberdade de imprensa, ou qualquer outro meio de publicar estes

sentimentos, não pode ser proibido, suspenso nem limitado. (CANECA,

2001, p.494)58

Combateu com veracidade e autoritarismo a Constituição de 1824:

Nós queremos uma Constituição que afiance e sustente nossa Independência, a união das províncias, a integridade do Império, a liberdade política, a igualdade civil, e todos os direitos inalienáveis do homem em sociedade; o ministério quer que, à força de armas, aceitemos um fantasma ilusório e irrosorio da nossa segurança e felicidade, e mesmo indecoroso ao Brasil... (CANECA, 1979, p. 445)

58 Frei Caneca publica os artigos 4 e 5 do “Comunicado: Base para a formação do Pacto Social, redigidas por uma sociedade de homens de letras”. Na vigésima quarta edição do jornal, datada em 01/07/1824.

131

As pesquisadoras Maria Gulla e Marcília Periotto (2008) descrevem que a

característica marcante do Typhis era o teor político, declarado não apenas em opiniões,

mas também em críticas pessoais, em ideias revolucionários europeus e, especialmente,

na apreensão em tornar-se um instrumento para libertação e cidadania nacional,

aclamando simultaneamente a liberdade de impressa.

No seu jornal Frei Caneca tratou dos acontecimentos de Pernambuco e de outras províncias em que explodiam manifestações contrárias ao Império. Usando de linguagem enérgica, destacava os erros cometidos pelo monarca e atacava a prepotência dos portugueses. Criticou, também, de forma muito severa, a escolha de Francisco Paes Barreto para o cargo de presidente da província e que convocara um conselho de cidadãos com representantes de todas as classes sociais para que fossem expostas por seu procurador as razões pelas quais se demitira do governo de Pernambuco. Para que a província não ficasse sem um dirigente elegeu-se um governo temporário que duraria enquanto não chegasse um presidente nomeado pelo imperador. (...) O público lia no jornal de Frei Caneca coisas desse teor (GULLA; PERIOTTO, 2008, p.5).

Marco Morel e Mariana M. de Barros (2003) relatam que quando surgiu o

Typhis Pernambucano muitos outros jornais já existiam na província, como o Aurora

Pernambucana, de Luis Rego; O Segarrega, redigido por Felipe Mena Calado Fonseca,

entre muitos outros. Os pesquisadores dizem que a imprensa período da época, o que

inclui o Typhis Pernambucano, era independente, ideológica, não industrial e artesanal,

era conhecida como folha ou pasquim.

O pasquim era de formato pequeno, tendo geralmente quatro páginas. Era redigido por uma pessoa, no máximo duas, que compunha o original em manuscrito e o enviava à tipografia, que servia não só como impressora, mas, muitas vezes, como ponto de venda, assim como as boticas, já que as livrarias eram raras. O pasquim (jornal) às vezes não se distinguia do opúsculo, do panfleto ou do folheto, pois a maioria desses veículos não circulavam com periodicidade. As publicações periódicas destacavam-se logo, eram raras. Nessa impressa embrionária, o jornalismo não era categoria profissional: qualquer individuo letrado que desejasse atuar na vida pública, fosse médico, clérigo, filósofo ou militar, encontrava relativa facilidade de rodar seu pasquim (MOREL; BARROS, 2003, p.49).

132

Morel (2008) acrescenta que o redator panfletário era um escritor patriota,

difusor de ideias, que combate as ações contrárias de sua ideologia, e aproveitou da

situação de transição do país. Foi o que nosso personagem fez, Frei Caneca usou do

panfleto para agir a favor dos cidadãos e contra o governo.

Naquela época jornalistas recebiam outros nomes, como redatores, gazateiros,

publicistas. E os jornais eram chamados de folhas, gazetas ou periódicos. O carmelita se

referia ao seu jornal como uma folha periódica:

E também alguns destes fatos já se achavam desenovelados em muitos impressos, e nem a pequenez da nossa folha admite este desenvolvimento (CANECA, 2001, p.330).

Manuel Carlos Chaparro (2008) descreve Frei Caneca como herói

pernambucano, guerreiro republicano, padre rebelde e jornalista libertário. Completa

dizendo que no jornalismo, o carmelita, combateu o absolutismo e, durante o período da

publicação do Typhis Pernambucano, foi o crítico mais contundente do Império.

Frei Caneca absorveu ao máximo sua atuação com jornal Typhis Pernambucano

para criticar as ações do Império, principalmente da província de Pernambuco, defender

seus ideais e o povo. Já no primeiro exemplar faz uma reflexão, com tom de justiça,

sobre a situação criada dentro da província pelos monarcas. Publica a correspondência,

trazido do Rio de Janeiro, que se refere à dissolução da Assembléia. No mesmo

exemplar, ainda, traz um decreto do imperador extinguindo a Assembléia e convocando

outra atuar no próximo projeto que acontecera. Principia a longa erudita análise desses

papeis, a qual se estenderá por sucessivas edições (SEGISMUNDO, 1962, p.155).

Em quase todas as edições, o frade questiona a posição do Império perante a

opinião pública, que naquela ocasião era muito discutido devido a liberdade de

imprensa que o imperador havia acabado de outorgar. E, também, sobre o direito de

informação aos cidadãos e a imprensa como utilidade pública

E, por fim, ainda na primeira edição, Frei Caneca retrata sobre o direito do

cidadão à informação:

É de direito natural e inalienável de qualquer cidadão, seja qual for a forma do governo em que se vive, o exame e o juízo dos fatos públicos,

133

sem que sirva de égide a alguém a graduação, a classe, a hierarquia e autoridade; e este dirwito é tanto mais sagrado quanto a ação praticada toca os direitos primários de um povo, de uma nação; e s.m.i. se acha tão penetrado desta verdade, que no dia 13 fez baixar o seu segundo decreto, em que declara que a qualificação de perjura, que o primeiro impôs à Assembléia Geral Constituinte e Legislativa, não se devia entender da totalidade da representação nacional do generoso poço brasileiro, sim da facção dominante do congresso (CANECA, p. 307).

Sobre a prática de um jornalismo cidadão, Frei Caneca brigava pelos direitos da

população. O pesquisador Ênio Morais Júnior traz uma reflexão dizendo que devido a

doutrina liberal, típica do iluminismo europeu, marcaram o comportamento e a atuação

política e jornalística de Caneca.

Seu pensamento ganhou condições favoráveis para transformar-se numa práxis no contexto histórico e político de que o Pernambuco de sua época foi palco por excelência. Foi nesse cenário que Caneca encontrou espaço para a aplicação de seus conhecimentos em nome de uma cidadania brasileira por intermédio do jornalismo (JÚNIOR, 2007)59.

A partir de, então, pode-se observar a construção do pensamento comunicacional

de Frei Caneca, por meio, de suas expressões, ideias e conceitos publicados no jornal

Typhis Pernambucano. De início, apresentamos seu conhecimento sobre o jornalismo

cidadão, retratando a importância do direito a informação. Seguindo apara o conceito de

opinião pública, liberdade de imprensa, jornalismo como utilidade pública e a serviço da

população, e, por fim, sua aplicação retórica, com textos noticiosos em um estilo

clássico.

O estilo jornalístico de Caneca, ideias e pensamentos, não eram diferentes dos

outros jornalistas da época. O que, na verdade, o difere de seus companheiros redatores

é a maneira de exercer o jornalismo dando importância a estrutura do texto, praticando a

arte de escrever bem, indo de acordo com os aprendizados retóricos. Ao analisar os

textos, chega à conclusão de que os cuidados retóricos do carmelita eram expressivos.

Cuidados semelhantes ao da produção do texto jornalístico nos dias atuais, como

exemplo, a matéria publicada no dia 12 de fevereiro de 1824:

59 Citação retirada do site: http://www.fnpj.org.br/grupos.php?det=200 Acesso dia: 25/01/2011.

134

Exórdio:

BAHIA Chegado a essa cidade no dia 12 de dezembro os seus deputados Calmons60, e sabendo-se da dissolução da Assembléia, a tropa e o povo comovido e assombrado deste funesto acontecimento, e julgando-se traído pelos portugueses, e que se tratava de reescravizar o Brasil a Portugal, dividiram-se em bandos e tomaram dos seus inimigos uma pesada vingança por três dias, sem haver quem desse quartel os portugueses, nem forças no governo para obstar a torrente que se havia despenhado com todo furor, quase verificando-se o que na Assembléia preconizou o ilustre deputado Henrique de Rezende.

Narração:

No dia seguinte, ajuntando-se um grande número de cidadãos de todas as classes, e indo à Casa da Câmera, a fizeram convocar pelo toque do sino. Junta esta, representaram que era preciso serem chamados os deputados, vindos do Rio, para quem darem a causa da sua retirada antes de acabarem os seus trabalhos; compareceram estes e, dando a conta que já todos sabem, requereu o povo que o presidente da Câmara representasse ao governo, em nome do mesmo povo, que convocasse um conselho composto dos cidadãos de todas as classes constantes de uma relação que apresentaram, para que nele se tratasse da segurança da província e tranquilidade da cidade. Tudo se fez; e foi assindado o dia 17 para o conselho. Chegado este dia, reuniu-se o conselho composto do governo, Câmara, empregados públicos, eclesiásticos e civis, militares, cidadãos virtuosos, ilustrados e zelosos da causa pública, e de comum acordo tomaram as medidas necessárias para manter a ordem e traquilidade da província em vinte artigos, todos cheios de prudência, segurança e zelo patriótico pelo bem da província e Brasil.

Confirmação:

Entre estes artigos, depois de mostrarem a sua profunda mágoa pela dissolução da Assembléia Constituinte e Legislativa, esperando que s.m. satisfizesse, como cumpria à sua alta dignidade, boa-fé e constitucionalidade, os juramentos que ele e todos os brasileiros prestaram, fazendo medrar o regime constitucional, requerem: Que com a maior brevidade apresentasse s.m. o projeto da Constituição duplicadamente mais liberal que o da extinta Assembléia, para que as Câmaras, interpondo o seu juízo e transmitindo-o aos deputados das respectivas províncias, seja por estes aprovados. Que s.m. jamais deixe de desempenhar a sua imperial palavra de que nada queria de Portugal, e que por consequência não consinta, nem sofra, que alguém se lembre de confederação com aquele reino; pois que a união é absolutamente impossível. Que s.m. não confiará os grandes cargos do império a súditos nascidos em Portugal, bem como os demais despachos civis e militares. Que o tribunal dos jurados fosse restabelecido para a liberdade da imprensa, como foi criado em 1822. Que s.m. haja por bem de obstar ao mal certo que deve resultar do decreto de 24 de novembro do ano passado, que manda conhecer devassamente os últimos

60 Referência a Miguel du Pin Calmon e Alemeida, futuro marquês de Abrantes, deputado pela Bahia à Assembléia.

135

acontecimentos daquela corte, do edital do intendente-geral da policia de 24 do mesmo, que admite denúncias em segredo. Que s.m. se dignasse restituir os deputados presos e expulsos do Brasil ao seio das suas províncias respectivas, tendo ao mesmo tempo consideração pelo deputado eleito Barata, cujas asserções imoderadas eram mais filhas do seu patriotismo exaltado do que da maldade do seu coração. E, declarando ao governo que se não desse posse a súdito algum nascido em Portugal, que viesse despachado para aquela província, sem que o primeiro desse parte a s.m., a fim de que o mesmo senhor houvesse de revogar o decreto, declararam afinal que aquela província era constantemente firme nos princípios da monarquia constitucional, que tem proclamado e jurado.

Peroração:

Dos assentos deste conselho se vê: 1º) que por aquela cidade também vogava o conhecimento da pretensão dos chumbeiros querem unir o Brasil a Portugal. E então deveremos fazer a vontade ao senhor Estevão de Rezende, intimada no seu edital de 17 de novembro de 1723? Tratar como irmãos inimigos encarniçados, que não cessam de empregar todas as forças para oprimir-nos, isto nunca foi admissível em política; o preceito do Evangelho que manda amar os inimigos é lá para outras coisas, e noutras ocasiões e circunstâncias; 2º) o que o voto daquela respeitável província, a primogênita de Cabral, antiga corte do Brasil, é que os deputados aprovem ou não o projeto da Constituição, estribados nos votos das Câmaras, o que se opõe de frente ao edital do muito leal e heróico Senado do Rio de Janeiro. A nobreza e generosidade e seus sentimentos, quando roga pela restituição ao seio de suas respectivas províncias dos deputados presos e expatriados, e reclama a contemplação de s.m. sobre o deputado eleito Barata, é uma bofetada para as províncias de São Paulo e Minas, que, sem mais exame, sem reflexão, só levadas de um espírito de vingança e de servilismo, se gloriaram da dissolução da Assembléia, único liame que enlaçava as províncias do império, e pela prisão extermínio dos seus deputados, a quem apelidam de monstros. A sua súplica para que s.m. desvie as desgraças que produzirá no Rio de Janeiro o decreto de 21 de novembro passado, ensina as demais províncias a não estenderem seu zelo e patriotismo à periferia dos seus termos unicamente, sim a todos os demais ramos da grande família brasileira. O seu protesto de ser firme constantemente nos princípios do regime constitucional é um proclama, pelo qual declaram a todo o Brasil e mundo inteiro que não admitirão outra forma de governo ao través de todos os perigos. Assim obra um povo patriota, que não é servil, e que prefere a morte à escravidão! (CANECA, 2001, p.355-3357).

O jornalismo de Caneca, por excelência, é opinativo, até mesmo por influência

de sua época e seus estudos. O pesquisador Ênio Morais relata que a retórica sempre foi

aliada mais próxima de Frei Caneca, tanto no jornal quantos nos textos e discursos. A

retórica se tornou um ofício a tal ponto que o condenou a morte. E, até mesmo em sua

defesa, o frade exagera na retórica deixando algumas marcas dos primeiros passos do

jornalismo opinativo, que foi apresentado como uma das hipóteses desta dissertação.

136

A enormidade da acusação é tão grande que depor por si basta para aterrar o varão mais forte, e faria temer, se o acaso se não lembrasse que eram seus juízes varões brasileiros, cheios de retidão, e que sabem dar descontos às fraquezas da humanidade, imitando a piedade e beneficência do príncipe magnânimo, que s revestiu de tão alta autoridade. Esta ideia consoladora anima o réu, e lhe alivia os espíritos abatidos, para alçar a trêmula voz e fazer chegar ao conhecimento deste juízo os argumentos em que funda defesa, e mostrar sua constante adesão e obediência ao supremo imperante nação brasileira (CANECA, 2001, p.628).

Retornando ao primeiro periódico publicado, Frei Caneca apresenta o Typhis

Pernambucano retratando sua atuação perante a sociedade, confirmando, assim, que

seria um jornalismo opinativo e informativo.

O teu Typhis te apontará as cílcades, os bósforos, as sirtes; te notará os perigosos até onde se estender o horizonte da sua vista; ele subirá o mais elevados tope da tua gávea sem mudar a cor do rosto. Rompamos por entre os maiores perigos, demandemos o norte da Independência ou Morte; temos um seguro santelmo no imortal Pedro I. Com os olhos fitos nele, sustentemo-nos na borrasca, que nos luzirá a bonança, risonha; trabalhemos com sofrimento e coragem. (CANECA, 2001, p.304).

Na terceira edição Frei Caneca dá fala sobre sua eloquência e persuasão perante

a Igreja:

(...) que odiassem a religião católica, apostólica, romana; que concebessem a execrável ideia de tentar contra a pessoa de s.m. e de seu destronizamento, não haverá força de eloquência e sedução que o possa persuadir (CANECA, 2001, p. 320).

Seguindo o pensamento comunicacional do carmelita nos deparamos com suas

discussões sobre a opinião publica e o direito de se expressar. No terceiro jornal, Frei

Caneca aponta a importância da opinião pública.

É necessário não se ter em conta alguma opinião dos homens, e ser insensível ao estímulo de boa fama, para se apresentar ao universo

137

absurdos desta estofa, e com a impavidez dos que fizeram a s.m. assinar estes papéis (CANECA, 2001, p. 321).

Na mesma edição, questiona a opinião pública:

Suponhamos que nas discussões das matérias apareciam opiniões as mais democráticas e mesmo revolucionárias; são estas as que decidem das obras da Assembléia, ou resultado das decisões? E quais foram estas, que tendessem a destruir o governo constitucional, abraçado e jurado pela nação? Nenhum das decisões que fez Assembléia até a sua dissolução merece ter esta qualificação. E se há por que se não mostrar? Era este um dever de quem faz acusação. Só houve pelo Congresso algumas coisas que se não escreveram, e nós, por não estarmos no teatro destas cenas, as ignoramos; mas por isso mesmo que se não escreveram, nada damos pela sua gravidade e as reputamos minudências e frandulagens indignas de uma atenção séria. E como estamos persuadidos que nem o grão – Khan da Tartária tem direito à fé de seus escravos em matéria de fato sem provas positivas, não nos podemos persuadir deste desconjuntamento da Assembléia, mormente quando o s.m.i. (...) (CANECA, p. 323)

Na sétima edição, em 12 de fevereiro de 1824, o carmelita questiona a falta de

opinião pública de alguns jornalistas.

Como, porém, não aparecesse presidente algum nomeado por s.m. e o Colégio Eleitoral se tivesse reunido a 8 do passado janeiro, nomearam o governo atual, e oficiaram a s.m., dando-lhe conta de haverem procedido a esta nomeação pela necessidade em que se achava a província, apesar de correr o boato de estar nomeado por ele Francisco Paes Barreto, por não ser este capaz de sanar os males da província, antes mais os exacerbaria pela falta de opinião pública em que infelizmente havia incorrido; (...) (CANECA, p. 357).

Caneca questiona a liberdade de imprensa. “Que o tribunal dos jurados fosse

restabelecido para a liberdade de imprensa, como foi criado em 1822 (CANECA, 2001,

p. 355). E, após, argumenta sobre a interferência do império sobre a opinião pública:

Conquanto parecesse ao réu que as doutrinas de seus impressos não formam objeto do conhecimento desta comissão, por já está determinado o tribunal dos jurados, como privativo dos abusos da liberdade de imprensa; contudo ignorando o réu as ordens imperiais, de que está escudada a mesma comissão, e que este reto juízo não ultrapassará os termos que lhe foram prescritos por sua majestade o

138

imperador, não hesita de si nestes artigos, que passa a expender (CANECA, 2001, p. 629).

E complementa se expressando sobre a liberdade de imprensa e a opinião

pública.

(...) Pois a opinião, os boatos e as vozes públicas são elementos dos periodistas, os quais estão autorizados a fazer até suposições e deduzir corolários: Tempora mutantur, ET nos mutamur in illis! (Mudam os tempos, e nós mudamos com ele! ( N.L)) (CANECA, 2001, p. 411).

Frei Caneca, também, descreve que o periódico tem por obrigação servir a

população como utilidade pública.

(...) a apatia dos mesmos ministros para com as acusações que já de voz, já pela imprensa, se fazia dos seus crimes, violência e injustiça, quando trabalhavam um Congresso destinado a reformar abusos e dar ordem aos negócios, fazendo sair aquelas tropas que haviam servido contra Pernambuco e Bahia, e manchando as mãos celeradas no sangue brasileiro servindo no mesmo império; (...) (CANECA, 2001, p. 329)

(...) Resumo da importação e exportação desta nossa província, que acaba aquele de apresentar ao público pela imprensa, e do Mapa geral, que este pela mesma via da tipografia ofereceu ao público sobre o rendimento, número de caixas e mais volumes de açúcar que se exportam desta província. Um e outro impresso, além de satisfatórios à curiosidade de todos os cidadãos, são de suma utilidade, pois dão a todos ideias claras das finanças da província adquiridas por estas duas grandes vias, e enchem aquele direito inalienável quem tem todo cidadão de saber o estado das forças pecuniárias do seu país, mormente na forma de governo adotada e proclamada pelo Brasil, em que o governo não é mais representativo da nação, a qual não deve ignorar o estado dos seus negócios (CANECA, 2001, p.366 e 367).

Na décima quinta edição, Frei Caneca discute sobre a imparcialidade de seu

jornalismo, um dos pontos que apresentava dentro da retórica e da Teoria do

Jornalismo.

139

Como, porém, nos consta que algumas pessoas, ou por confundirem os ofícios de um periodista com os de um magistrado de justiça, ou talvez por uma demasiada predileção em graça de algumas pessoas, têm qualificado de muito carregada e talvez injusta a descrição que naquele mesmo número fizemos do padre Francisco Muniz Tavares; nós, em abono da nossa imparcialidade e defesa da nossa moderação, oferecemos ao público as seguintes cartas do mesmo Muniz Tavares, que foram interceptados no sul, e uma ao examo. Presidente Carvalho, a fim de que o mesmo público imparcial nos faça justiça (CANECA, 2001, p. 423).

Enfim, são inúmeras as vezes que o carmelita se refere à opinião pública, a

liberdade de imprensa e direitos dos cidadãos. Nessas ocasiões, é possível averiguar o

seu aprendizado retórico e como ele a aplicou, de uma maneira convincente, com

clareza e verossímil. Frei Caneca tinha o estilo panfletário polêmico, e usava das

palavras para insultar seus adversários, planejava sua retórica em tom de desafio e

irônico, no qual saia como herói no final, e tudo isso pelos seus ideais políticos.

Seguindo os padrões de publicação da época, Frei Caneca não se preocupava em

criar regras ou hierarquias no jornal. Não existia manchete, as matérias e opiniões eram

distribuídas por seções, como por exemplo, Rio de Janeiro e Pernambuco que eram

fixas, com a intenção de apenas situar o leitor sobre o assunto em discussão. E, com

toda sua elegância, Caneca tinha o habito de iniciar e concluir o Typhis com citações de

Camões.

O Typhis Pernambucano teve 28 publicações, encerrando-se em de agosto de

1824, com a derrocada da Confederação do Equador, movimento republicano e

federalista de contestação à ordem monárquica centralizadora, do qual Frei Caneca foi

um dos expoentes. O jornal teve repercussão e era lido em todo o país, como

comprovam as cartas dos leitores.

3.6 - Classificação do jornalismo de Frei Caneca

Dentro de uma possível classificação de gêneros em relação ao jornalismo

opinativo de Frei Caneca, encontramos duas categorias do gênero: a carta do leitor e o

editorial. Em quase todas as publicações observamos que o formato do texto segue o

140

padrão de um editorial, como descrito por José Marques de Melo (2003c). “O editorial é

um gênero jornalístico que expressa a opinião oficial da empresa diante dos fatos de

maior repercussão no momento” (p.103). Nesta ocasião, o pesquisador descrever o

gênero da forma como a imprensa o utiliza nos dias de hoje, e naquela época a empresa

era apenas um jornalista, no máximo dois ou três, para o Typhis Pernambucano era,

apenas, a opinião de Frei Caneca.

Todavia, Juarez Bahia (1990, p.65), descreve que o editorial, epíteto do

jornalismo opinativo, “pode ser uma notícia, como defendem pesquisadores, mas é uma

notícia qualificada, com conteúdo oposto ao da informação, ou além dela, e sendo

crítica, emissora de idéias e de juízos de valores”.

Já sobre a carta do leitor, Marques de Melo (2003c, p.173) diz que é a ocasião

em que o leitor participa da comunicação de uma forma passiva, abstrata e indireta. E,

ainda, é uma forma de entender e conhecer a audiência.

No Typhis Pernambucano, a partir da décima segunda edição, Frei Caneca

destaca uma nova editoria, porém não era fixa, e chamada por ele de Correspondência,

que é a publicação de cartas dos leitores, em que, muitas vezes, era acompanhada de

uma resposta do editor.

“Senhora Redator: “Espero dever-lhe obséquio de inserir na sua folha de amanhã a inclusa nota, cuja a publicação muito importa ao esclarecimento da verdade. Sou, com a maior estima e consideração, seu muito respeitador. “João Guilherme Ratcliff. “Sua casa, 9 de março de 1824”. (CANECA, 2001, p.402)

Como complemento ao estudo do gênero jornalístico opinativo produzido por

Frei Caneca, e muitos outros jornalistas do século XIX, buscamos uma nova referência,

no qual acreditamos que ainda está em fase de pesquisa, que é uma análise apresentada

pelo professor José Marques de Melo, no ano de 2010, durante o XXXIII Congresso da

Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, no qual

se refere ao contexto histórico dos gêneros jornalísticos.

Nesta pesquisa, Marques de Melo diz que após um breve exercício de análise

factual, foram identificados outros protótipos dos gêneros legitimados como

contemporâneos, como:

• Informativo: relato de grandes acontecimentos;

141

• Opinativo: denúncias, críticas e libelos;

• Interpretativo: mapas, cartas e relatórios;

• Utilitário: tabelas e estatísticas de moedas, preços de mercadorias,

movimento portuário; e

• Diversional: informação literária.

Melo conclui que desse modo, o jornalismo, com raízes no século XVII até o

século XIX, em países latinos, é argumentativo.

Baseando na análise do prof. Marques de Melo (2010), pode-se observar que,

também, no jornalismo de Frei Caneca encontramos fragmentos dos gêneros

contemporâneos, divido entre o opinativo, por suas críticas, denuncias e libelos.

Informativo, com relato de grandes acontecimentos. E, interpretativo com cartas.

Para esta parte da pesquisa foram selecionados nove jornais, entre os 28

publicados, com 23 notícias no total, utilizando como método a análise de conteúdo por

unidade inteira. E, chegamos à conclusão que das 23 matérias analisadas, 15 são

opinativas e 8 interpretativas. Das opinativas duas são cartas de leitores, e das

interpretativas todas são cartas (Decretos ou Ofícios) que o jornal recebia como

correspondência e publicava.

O jornalismo informativo aparece de forma híbrida, pois o frade transmitia as

informações necessárias, relatava os acontecimentos da época, e, junto, expressa suas

ideias. Anteriormente, neste mesmo capítulo, ao retratar do hibridismo entre a Opinião e

a Informação, que se iniciava no século XIX, observamos Caneca agiu com semelhança

para cumprir sua meta de informar e, ao mesmo tempo, se esquivando da censura da

imprensa.

3.7 – Frei Caneca e a Teoria do Jornalismo

Uma das hipóteses desta pesquisa é a de que os estudos atuais da Teoria do

Jornalismo atribuem características e conceitos retóricos, e no Brasil, apontamos Frei

Caneca como precursor desta Teoria por ser o primeiro brasileiro a se dedicar em

escrever e, também à praticar a teoria da argumentação e a arte de se escrever bem. Até,

142

então, os estudos da retórica, no país, eram baseados em autores estrangeiros –

Aristóteles, Cícero e Quintiliano.

Esta suposição deu início quando o professor Marques de Melo (2003a) publicou

uma pesquisa sobre a vida e obra de Frei Joaquim do Amor Divino Caneca61. A

hipótese é que Caneca foi precursor da teoria da comunicação brasileira, exercendo o

jornalismo com a retórica, além de ser pioneiro na luta pela liberdade de imprensa e do

jornalismo opinativo.

Em relação à hipótese do professor Marques, de quê o religioso foi precursor na

teoria da comunicação, podemos nos basear no capítulo dois, que se refere a retórica e a

comunicação. A teoria se aplica de maneira a influenciar diretamente sua audiência, são

vários os meios que utiliza-se para convencer as pessoas sobre as nossas ideias e

opiniões, e argumentar, é muito mais que uma forma de expressão, exige-se de seus

praticantes discernimento, (Breton, 1996, p. 7) a argumentação, cuja especificidade é

acionar um raciocínio em uma situação de comunicação. E, Frei Caneca agiu com esta

convicção ao se pronunciar para seu público alvo, apoiando-se no jornal Typhis

Pernambucano e em suas obras didáticas, argumentou para se comunicar.

Seus textos eram diretos, convenciam seus leitores de suas ideias e os faziam

segui-las, prova disso são as cartas dos leitores publicadas, no Typhis, com interação e

concordância dos temas. Breton (1996) retrata o ato de convencer como uma alternativa

ao uso da violência física, “na verdade, pode-se obter do outro um ato contra a sua

vontade com o uso da força. (...) Mas convencer nem sempre está isento de violência,

diferente da violência física, ou do recurso a meios coercitivos”. (p. 7 e 8).

Várias formações em “comunicação” não são nada além de um aprendizado de processos que visam colocar o outro em uma espécie de armadilha mental da qual ele sairá apenas ao adotar a ação ou a opinião que lhes são “propostas” (BRETON, 1996, p. 8).

Suas obras, didáticas ou jornalísticas, tinham um charme, até mesmo nas

citações de Camões. Isso chamava a atenção do leitor e exibia o carmelita como grande

intelectual. Haja vista que são várias as formas de se convencer e uma delas é a sedução

“freqüentemente usada para levar o outro, ou até públicos inteiros, a partilhar

61 José Marques de Melo publicou esta pesquisa em seu livro História do Pensamento Comunicacional: cenários e personagens, 2003, Editora Paulus.

143

determinado ponto de vista. Leva-se assim o público a pensar como o orador porque ele

é muito sedutor”. (BRETON, 1996, p. 9). Exemplo das diversas maneiras de convencer

segundo os cientistas, publicado por Breton:

Ilustração 2 – Demonstração da persuasão. Retórica Ciência

Mauro Wolf apresenta a sua versão sobre convencer dizendo que a persuasão

dos destinatários é um “objetivo possível, sob a condição de que a forma e a

organização da mensagem sejam adequadas aos fatores pessoais que o destinatário ativa

na interpretação da própria mensagem”. (Wolf, 2003 p. 18). Ações que o carmelita se

propunha, é mais que notável sua maneira de organizar os textos e discursos, seguia a

regras a estrutura retórica.

Não descartamos de maneira alguma a hipótese, do professor Marques de Melo,

de que Caneca foi precursor dos estudos das teorias da comunicação no Brasil, baseado

na retórica. Tanto que temos no, capítulo anterior, um vasto texto sobre o assunto e a

importância da retórica para a comunicação. Todavia, esta pesquisa buscar averiguar o

contexto jornalístico e como as produções didáticas do carmelita foram importantes para

o aprofundamento do jornalismo produzido nos dias atuais. Também, como já

apresentando, muitos foram os panfletários, do século XIX, que se apoiaram na retórica

para a prática do jornalismo, mas nenhum deles preocupou-se em teorizar o assunto em

questão. Frei Caneca, no entanto, não escreveu nenhum livro sobre jornalismo, até

mesmo porque a existência dessa atividade em sua época era legitimada como

Convencer

Manipulação

Propaganda

Sedução

Argumentação

Demonstração

144

publicismo. E, assim, fica um questionamento: Afinal, como apresentar os preceitos de

Caneca como precursor de uma teoria do jornalismo brasileiro?

Primeiramente apresentamos, neste mesmo capítulo, que o religioso foi um

grande defensor da opinião pública, liberdade de imprensa, da justiça social, dos direitos

à informação, ainda, do jornalismo como utilidade pública. E, assim, construiu seu

jornalismo argumentativo. Assunto que foi, também, uma de nossas hipóteses.

A retórica muito o ajudou no combate de seus inimigos, construindo textos

estruturados, de poder persuasivo e de agrado da sua audiência levando-as irem de

acordo com suas ideias.

O primeiro pesquisador a citar – comparar - a retórica como origem do

jornalismo foi Tobias Peucer62, no ano de 1660, na Alemanha, que defendeu a tese que

caracterizou o jornalismo e as notícias. E, até hoje, é referência de estudos. Não

podemos averiguar se Frei Caneca chegou a ter acesso a tese de Peucer, pois em seus

escritos nada sobre ele foi citado. Porém, a referência de ambos são as mesmas:

Aristóteles, Cícero e Quintiliano.

Partimos, agora, para uma comparação entre os conceitos teóricos.

Luiz Beltrão (1976, p. 11) diz que a essência do jornalismo é a informação da

atualidade, ou seja, de fatos, situações e ideias que acontecem em uma determinada

sociedade. Diz que numerosos são conceitos de jornalismo, uns objetivos, outros

literários, alguns positivos e outros puramente retóricos.

Diremos primeiro que fazer jornalismo é informar. Jornalismo é antes de tudo, informação (...). Informação, bem entendido, de fatos atuais, correntes, que mereçam o interesse público, socialmente significativos – porque informar sobre fatos passados é fazer história e o jornalismo (...) (BELTRÃO, 2006, p.29).

Beltrão completa dizendo que a função da imprensa não é simplesmente

informar e apurar fatos e ideias, mas também de examiná-los, propor soluções, ensinar a

sociedade. O jornalismo, ao colocar em evidência acontecimentos diários, tem por

obrigação interpretar corretamente os fatos, pois a informação orienta e dá direção à

sociedade.

62 A tese de Tobias Peucer foi apresentando neste capítulo.

145

Exercendo-se pela difusão do conhecimento, utilizando todos os recursos da técnica disponíveis ao seu desenvolvimento, o jornalismo tem por objetivo orientar a opinião pública, mediante a censura ou à sanção das ações dos indivíduos, de grupos ou de poder, para que todos os membros da comunidade sintam e ajam com discernimento, buscando o progresso, a paz e a ordem. Em outras palavras, a finalidade do jornalismo é a promoção do bem comum (BELTRÃO, 2006, p. 30).

Nelson Traquina (2005) descreve o jornalismo como uma forma de democracia

para a sociedade. Além de narrar fatos e contar histórias e informar o público sem

censura.

Após descrevermos o conceito de jornalismo, pode-se observar que a atuação de

Frei Caneca, como panfletário, foi com os mesmo objetivos: informar os cidadãos,

trazer conhecimento, orientar a sociedade e a opinião pública, construir uma democracia

justa, em que todos tivessem o mesmo direito. Pode-se, também, dizer que o carmelita

ajudou na prática do “Quarto Poder”, narrando os fatos históricos da época, indo contra

o Império. Como já apresentando, Caneca por inúmeras vezes descreveu a importância

de manter os cidadãos informados e fazendo a prática do jornal como serviço de

utilidade pública para a sociedade.

Uma segunda questão que podemos levar é sobre a objetividade do jornalismo.

Marques de Melo (2006) diz que a objetividade não é um assunto novo, e foi adquirida

desde que o periodismo tornou-se uma autonomia social.

Isso ocorreu imediatamente após o triunfo da “revolução” burguesa, quando a prática do jornalismo nos países europeus assumiu duas feições distintas. Na França, emergiu um jornalismo opinativo – apaixonado, vibrante, impetuoso – predominando o fluxo da interpretação da realidade. Na Inglaterra, firmou-se um jornalismo objetivo – racional, contido, comedido – imperando o relato dos acontecimentos, isolados do comentário (MARQUES DE MELO, 2006, p.37).

O autor diz que o jornalismo inglês atribui à informação o caráter de

neutralidade e imparcialidade. Neste ponto, Frei Caneca, em seu décimo quinto jornal,

diz que seu jornalismo era imparcial e neutro, e era esta a maneira que todos os

periódicos precisavam seguir.

146

Marques de Melo continua seu pensamento dizendo que a objetividade

converteu-se em verdade absoluta, após o jornalismo implicar como uma atividade

comercial e industrial. Esta verdade absoluta, era o, então, verossímil retórico que dizia

ser a verdade a partir do ponto de vista do orador, e com os mesmo princípios originou-

se a subjetividade jornalística que são ideias, ideologias e opiniões que apontam as

notícias.

Melo (2006) acrescenta que uma das motivações do jornalista é o direito de

emitir suas ideias e pontos de vista sobre os acontecimentos. Porém, aqui, questionamos

como fica os direitos dos cidadãos de serem informados? A resposta é simples: é

preciso manter os valores e a ética. Na primeira edição do Typhis, Frei Caneca relata

que o todo cidadão tem direito a informação, e informações corretas, ou seja, relatando

a verdade, agindo com a ética. Aristóteles ao descrever os preceitos da retórica, em Arte

Retórica, já diz que todo orador precisa ser ético e agir de acordo com os valores da

sociedade. E, após Quintiliano reforça o mesmo pensamento.

A discussão da questão da objetividade, hoje, passa necessariamente pela compreensão do direito à informação. Mais ainda: pela sua defesa como prerrogativa democrática. E a informação entrelaça as duas vertentes do relato jornalísticos: a descrição dos fatos (informação objetiva: veraz, comprovável, confiável) e a sua interpretação (informação opinativa: analítica, valorática, orientadora) (MARQUES DE MELO, 2006, p. 49).

Esta afirmação se compara com as meta do discurso retórico. Um relato

informativo, que apresente provas e seja confiável ao público. E, a persuasão que passe

valores, análise as situações e oriente os ouvintes (no caso do jornalismo os leitores).

Frei Caneca (1972, p.79), no texto Tratado de Eloquência, diz que o orador emprega

três meios para persuadir: instrução, moção e deleite.

De acordo com a teoria jornalística descrita por Marques de Melo (2006), a

objetividade não é um assunto ultrapassado, e sim uma questão complexa e sempre

atual. Para alcançá-la o jornalista precisa ser éticos, exercer um comportamento político,

e “ver e ouvir, avaliar e comparar, descrever e explicar, precisar e comprovar” (p.50). E,

para noticiar, o jornalista precisa, sempre, atender três valores:

147

• Veracidade: circunscrição ao real, factível, comprovável.

• Clareza: identificação dos elementos que permitam ao interlocutor, a

reconstituição integral do objetivo narrado.

• Credibilidade: apresentação de indícios e evidências suficientes para

suscitar a confiança coletiva.

Neste contexto, Frei Caneca descreve a narração do discurso, que é a segunda

parte da preleção, e é “dedicada para informar os ouvintes” (1972, p.82). O carmelita

diz que a narração pode ser feita de três modos: 1) Por proposição, que é a informação

do assunto destacando apenas um ponto; 2) Por participação, que informar o assunto

destacando diversos pontos; 3) Por narração (restrita) que é a informação do assunto

destacando todas as ações de importância. Sendo que, as virtudes da narração são três:

1) Clareza; 2) Brevidade; 3) Verossimilhança.

A narração será clara, si o orador empregar palavras próprias, e não sórdidas, desonestas ou baixas; servir-se de palavras expressivas, não esquisitas ou desusadas, fizer a devida distinção das causas, das pessoas, dos tempos, dos lugares, e das coisas; e usar de uma pronuncia inteligível. A narração será breve, si o orador não introduzir objetos estranhos ao assunto, e cortar tudo o que não fizer falta sensível em ordem e clareza. A narração será verossimilhante, si o orador consultar a boa razão, para não dizer as razoes e os motivos antes dos fatos; der às pessoas os respectivos e convenientes caracteres; atender às circunstancias de lugar, tempo, etc; dispozer o enredo dos incidentes da narração de sorte que de um passe naturalmente a outro; lançar em a narração as sementes das provas; e usar das competentes preparações oratórias (CANECA, 1972, p.83).

Comparando as duas definições, observamos que ambos os autores tem o mesmo

objetivo. Tornar transparente e democrático a informação, para que todos têm acesso, e

de maneira ética.

O pesquisador Jorge Pedro Sousa (2001) realça este pensamento dizendo que o

conceito da objetividade do jornalismo está associado no âmbito da filosofia e

epistemologia do jornalismo, e ao passar do tempo foi se modificando. Uma das formas

de visualizar esta modificação é observar a evolução da objetividade

148

Enquanto os filósofos e os epistemólogos cedo argumentaram que é impossível alcançar a objectividade, isto é, que é impossível para um sujeito adquirir conhecimento total e perfeito de um objecto (lembremo-nos da Alegoria da Caverna, de Platão), os jornalistas tardaram a descobrir que as notícias nunca poderiam ser o espelho da realidade. De facto, só nos anos sessenta do século XX, com o segundo modelo de Novo Jornalismo, é que alguns jornalistas importaram para o campo jornalístico a ideia de que a objectividade, entendida como o espelho da realidade ou a apropriação integral do objecto de conhecimento pelo sujeito que conhece, pode ser uma meta mas não uma meta alcançável (SOUSA, 2001, p.46).

Retornado ao conceito apresentando por Frei Caneca sobre a clareza do discurso,

Luiz Beltrão (1966) faz advertências em relação a linguagem jornalística. “Do ponto de

vista do crítico, o estilo é a maneira pela qual se expressam escolas literárias. O

jornalismo, como categoria estética, literária tem também seu estilo” (p.37). O autor

define o estilo jornalístico em cinco categorias: correção, clareza, precisão, harmonia e

unidade. A correção é o conhecimento e a prática da gramática, no qual Frei Caneca

escreveu um texto e é regido, até por demais, pelas regras da língua portuguesa. A

clareza é a exposição correta dos fatos, evitando ações indiretas, por esta o carmelita

explicou muito bem em sua retórica. Já a harmonia é o estilo e a estética do texto sem

vícios, também explica em sua retórica. A precisão é o emprego dos números e das

palavras para expressar o pensamento, e sobre isto o carmelita descreve, na eloqüência,

que os parágrafos, textos ou pensamentos precisam ser objetivos, sem utilizar de muitas

palavras e sem redundâncias. Por fim, a unidade que Beltrão descreve como a

coordenação das ideias e circunstancia da redação. Sobre este pensamento, o religioso

retrata, em seu texto Breve Compreendimento da Gramática, que todo texto precisa ter

começo, meio e fim; ordenar as ideias para que todos, aos ler, possam entender com

exatidão suas ideias.

Enfim, observamos que a estrutura do discurso argumentativo descrita pelo

carmelita, que é a mesma de Aristóteles e Quintiliano63: o exórdio, parte em que se

apresenta o assunto a ser tratado, um resumo; narração, as informações; confirmação ou

refutação, exposição das provas; peroração, a conclusão do discurso, pode ser

comparada com técnica da construção da notícia jornalística.

Beltrão (2006) relata que a narração jornalística consta três partes, sendo duas

como que matérias – cabeça e corpo, e a outra é a essência da informação, o clímax. A

63 As partes do discurso foram descritas no capítulo 02.

149

cabeça é o resumo da notícia, dos fatos narrados e da informação. “Fica localizada nas

primeiras linhas do texto, e é o que os americanos chamam de lead” (p.96). Nesta parte,

surgem os elementos estruturais básicos do acontecimento: a ação, o agente, o tempo, o

modo, o lugar e o motivo. Vale ressaltar, que a base do lead é responder a cinco

perguntas: O que? Quem? Quando? Por que? Como? Seu outro objetivo é estimular o

leitor a continuar lendo sobre o assunto, por isso preciso chamar a atenção do público

alvo.

O lead se originou da dinâmica dos nossos tempos, em que o leitor comum dispõe de uns poucos minutos para informar-se de tudo que lhe interessa no jornal; este busca facilitar a sua procura de informação, dizendo-lhe os principais dados de um acontecimento no primeiro parágrafo da notícia. Se esta maneira de dizer é eficiente, o leitor sentirá aumento o seu apetite para ler mais. Assim, a cabeça tem uma dupla finalidade: resumir o fato a estimular o leitor a continuar informando-se de todos os seis detalhes (BELTRÃO, 1969, p.109).

O corpo da notícia tem por objetivo afirmar o que foi apresentando no primeiro

parágrafo, e dar ao leitor uma melhor compreensão da notícia obedecendo à ordem de

importância ou cronológica. “Na redação do corpo da notícia, o jornalista gosa de maior

liberdade de criação, seleção e estilo (...), dando ao público a informação sumária”

(BELTRÃO, 2006, p.98). Cada item anunciado na cabeça terá que ser melhor descrito,

com novos elementos, indo de acordo com os valores jornalísticos e a técnica de

redação.

Sobre o clímax, Beltrão (1969) diz que é o complemento mais importante da

notícia, o ponto chave da informação que faz o leitor prender toda sua atenção.

Fazendo a comparação, chega-se a seguinte conclusão: o texto argumentativo

inicia-se com o exórdio - a apresentação e o resumo do assunto a ser tratado, para o

texto jornalístico o lead; a narração - a informação ao público, cujo para o jornalismo é

a narração dos fatos, o assunto da matéria sendo exposto; a confirmação e refutação -

confirmação das provas, usar provas lógicas para convencer o público, aqui o

jornalismo utiliza de depoimentos e citações para confirmar o que foi escrito, ou até o

clímax descrito por Beltrão; e, por fim, a peroração - o orador faz uma recapitulação do

assunto tratado e conclui se pensamento. E para o jornalismo está parte tem a mesma

função, concluir o que foi exposto.

150

Sabe-se que as comparações entre a teoria do jornalismo e a retórica são

diversas, assim, como apresentadas na tese de Tobias Peucer. Porém, nossa meta era

esboçar o pensamento comunicacional - jornalístico de Frei Caneca, sendo pioneiro nos

estudos e na construção de uma teoria brasileira comparando sua retórica, seus ideais,

com toda sua produção, sendo o jornal Typhis Pernambucano ou as obras didáticas, e,

também, confrontando seu pensamento com os atuais estudos da Teoria do Jornalismo.

Com isso, chega-se a conclusão de que, além da comunicação social, o

jornalismo, como teoria ou disciplina, se baseou nos conceitos da retórica. E, Frei

Caneca foi o pioneiro, tanto na história quanto no jornalismo, ao se preocupar em

teorizar a arte de escrever bem e falar em público com o objetivo de persuadir sua

audiência. Seus textos, a maneira como escreve e se preocupa com as ações, estão de

comum acordo.

151

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desde o início deste trabalho, ficou claro que a escolha do tema – jornalismo,

retórica e gênero jornalístico opinativo – é um assunto polêmico, dificultoso e, com

chances de ser passivo a conflitos. Mas o desafio foi lançado e precisava ser encarado.

Foi um trabalho árduo, tanto pela busca de referências bibliográficas, quanto à pela

busca de documentos e analise feita. Esta pesquisa originou-se através de uma

curiosidade, que se transformou em uma provocação, a partir de aula com o professor

José Marques de Melo, em 2007, ainda como aluna especial, ao me referir a pesquisa

publicada, em seu livro História da Comunicação: cenários e personagens, sobre o

Pensamento Comunicacional de Frei Caneca. O professor me respondeu que, ainda, não

havia uma conclusão, e se eu tinha o interesse de concluí-la. Então, estava feito o

desafio, e iniciou a jornada, que se conclui após quase quatro anos, aproximadamente.

Acreditamos que a história da imprensa brasileira pode ser resumida pela

influência da revolução francesa e a independência da América do Norte, pela chegada

da família Real e todas suas aglomerações, e a influência da República das Letras, ou

seja, a influência da retórica. Poucos são os autores que incluem a retórica dentro do

contexto do jornalismo brasileiro, ou no cenário Ocidental (como é o caso do

pesquisador Jorge Pedro Sousa), podemos citar alguns como o próprio professor

Marques de Melo, Marco Morel ou Carlos Rizzini. Outros citam de forma indireta, ou

apenas se referem aos “homens letrados”, ou “intelectuais”. E, Frei Caneca fez parte

deste cenário, assim como afirma o professor Marques.

A primeira conclusão em que chegamos foi que Frei Joaquim do Amor Divino

Caneca, realmente, foi um grande revolucionário brasileiro. Ele não apenas morreu

como um mártir, mas, também, lutou pela Independência do país, pela liberdade,

igualdade e fraternidade deste povo (principalmente dos Nordestinos), pelos diretos de

cidadania, pela liberdade de expressão, seja da imprensa ou de pensamentos e ideias.

Ainda, lutou pelos direitos políticos, econômicos, sociais e culturais de todos, seja para

rico ou para o pobre. O carmelita não aceitava as injustiças cometidas pela Corte Real.

O carmelita, na nossa visão após concluir esta pesquisa, merece muito mais

destaque nos livros de História do Brasil, do que apenas ser lembrado como o frade que

lutou na Confederação do Equador e morreu como algo da injustiça do governo

152

autoritário da época, e ao longo da revisão bibliográfica procuramos mostrar a

importância do personagem para a história do país e da imprensa.

Frei Caneca foi preso injustamente, segundo alguns historiadores, na Revolução

de 1817, mas, mesmo assim, não desistiu de seus ideais. Deu aula de retórica, geometria

e gramática para seus colegas presidiários, e escreveu o texto didático Breve

compreendimento da Gramática da Língua Portuguesa para duas freiras aprenderem a

escrever e ler sem se quer ter as conhecido. Além disso, este texto dá continuidade à

essência de seus estudos retóricos, seguindo os mesmos princípios e Fabio Quintiliano

com a “arte de escrever”.

Como citado várias vezes no decorrer do trabalho, o carmelita não chegou

escreveu sobre os conceitos e teorias da comunicação ou jornalismo, apenas colocou

aquilo que aprendeu com os grandes filósofos, sendo da Revolução Francesa ou da

retórica. E, até porque, naquela época tais conceitos ainda não existiam. Esta é a nossa

segunda conclusão.

A ligação de Frei Caneca com os estudos da teoria da comunicação, hipótese

apresentada pelo professor Marques de Melo (2003a), em seu texto Frei Caneca,

precursor da teoria da comunicação, tem fundamento pelo fato de que o carmelita

seguiu, rigorosamente, os ensinamentos de Aristóteles, Cícero e Quitiliano sobre a “arte

de persuadir”. Em suas produções, o religioso expressa suas opiniões de maneira suave,

porém de acordo com as regras da disciplina.

Quando Aristóteles escreveu Arte retórica descreve que a retórica não tem como

principal objetivo persuadir, mas sim dar os meios de como persuadir, ou seja, ensinar a

melhor forma de atingir diretamente sua audiência para que, então ela absorva seus

pensamentos e ações. E foi, assim, que o religioso agiu. Em seu texto Oração, buscou

valores éticos, crenças, falou de Deus e de Nossa Senhora para criticar a população

sobre o ceticismo da época e, também criticar o imperador pelas suas atitudes.

Fazendo uma comparação entre os ensinamentos de Frei Caneca e a teoria da

comunicação, podemos dizer que a teoria da agulha hipodérmica (Ação = Reação) era

seu principal propósito.

Esta era uma das hipóteses apresentada pelo professor Marques. Todavia, a

nossa pesquisa trabalhou com outras duas suposições: a de que Frei Caneca, por meio,

da retórica que foi precursora na construção do jornalismo opinativo; e que, também,

através da construção de seu conceito de retórica, baseado nos filósofos, foi precursor

da teoria do jornalismo brasileiro.

153

Perante a nossa primeira hipótese, foi realizado um levantamento bibliográfico

sobre o jornalismo brasileiro, suas origens e o gênero jornalístico opinativo, e uma

análise de conteúdo de toda sua produção, sendo o jornal Typhis Pernambucano ou das

obras didáticas, e chegamos à conclusão de que, por meio da retórica, Caneca iniciou a

produção de um jornalismo argumentativo estruturado, ou seja, seus textos tinham uma

base teórica. Seguindo fielmente as regras da estrutura retórica.

Pode-se observar que suas ações e ideias não eram tão diferentes de seus

companheiros panfletários que questionavam a política nacional, sempre críticos e

árduos em seus comentários, sem temer o que podia acontecer. Porém, o amplo

conhecimento sobre a retórica era seu diferencial

Também, como expressão de seu jornalismo opinativo, Caneca publicava cartas

dos seus leitores, nos quais vangloriavam suas as ideias e também opinavam sobre a

situação do país e as atitudes de Dom Pedro.

Outros destaques da influência da retórica sobre o pensamento do carmelita são

os questionamentos da opinião pública. Aristóteles e Quintiliano já discutiam sobre o

assunto, dizendo que a argumentação exercia influência perante as pessoas – se os

argumentos fossem de acordo com os valores e crenças da audiência a opinião pública

estava formada. Frei Caneca questionava o governo pelo fato de não poderem exercer o

direito da opinião. E, ao questionar sobre a opinião pública, o carmelita também cobra

os direitos da imprensa livre.

Referente à nossa segunda hipótese, que Frei Caneca foi precursor dos estudos

da teoria do jornalismo no Brasil, foi feita uma comparação entre os principais conceitos

do jornalismo nos dias de hoje, com o que foi produzido pelo carmelita. E, chegamos à

conclusão que o religioso avançou tais estudos ao descrever a retórica e a eloquência.

Os principais autores brasileiros sobre as Teorias do Jornalismo apontam como

característica desta ciência a objetividade, veracidade, atualidade, periodicidade,

universalidade, exatidão, entre outros. Neste contexto, ao descrever a retórica, Frei

Caneca faz diversos apontamentos sobre a forma de redigir textos e de se comunicar

essas exposições do personagem, que podem ser consideradas como o alicerce da teoria

do jornalismo produzido nos dias atuais. Sempre destacando que precisa se conhecer

muito bem as regras da gramática, para, assim, escrever melhor.

Este não é um trabalho feito apenas de referências bibliográficas e observações

empíricas. Ele é resultado de anos de discussão, tanto acadêmica quanto profissional,

154

sobre o exercício da imprensa no Brasil, principalmente no que se refere ao jornalismo

opinativo e os primeiros conceitos desta ciência.

São muitos os pontos de vista, porém destacamos a importância de se estudar a

história, pois acreditamos que só assim conseguiremos entender o presente, e já nos

preparando para o futuro. É interessante observar que o jornalismo não nasce como uma

disciplina acadêmica, mas, sim, pela força de expressão, vontade de lutar por aqueles

que não têm voz na sociedade; ele nasce por se ter ideologia e opinião.

Não há dúvidas de que a pesquisa encerrada nestas linhas padece de erros e

restrições, até por se tratar de um trabalho humano. As falhas aqui deixadas ficam de

estímulo para que uma nova investigação possa se iniciar. Assim, como está deu

continuidade ao trabalho do professor José Marques de Melo.

155

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