Fundamentos Da Economia Perguntas e Respostas

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1 FUNDAMENTOS DA ECONOMIA: perguntas mais freqüentes e respostas mais simples José Henrique de Faria 1 Esse texto é destinado à formação de pessoas. Foram arroladas as perguntas mais comuns e frequentes feitas em diversos cursos ministrados pelo autor e destinados à população em geral, geralmente sem familiaridade com a Economia. A partir dessas perguntas, surgidas ao longo de quase uma década de cursos, o autor entendeu que uma forma de ampliar o conhecimento e fornecer um material para os interessados, fosse sistematizar as dúvidas em temas, organizar as questões e fornecer respostas o mais simples possível. É esse material que está agora disponível no site. A. PRODUTO 1. Por que algumas vezes se usa o PIB e outras o PNB como medida de riqueza? O Produto Interno Bruto mede o valor total de bens e serviços disponíveis na economia. O Produto Nacional Bruto mede a quantidade de bens e serviços produzidos pela economia. Alguns Fatores de Produção (RN; K; T; Tc) utilizados no processo produtivo são de propriedade de residentes no exterior; do mesmo modo, alguns residentes no país têm Fatores de Produção sendo utilizados em outros países. Assim, parte da renda gerada no país é pagamento de fatores de propriedade de não residentes e parte da renda gerada em outros países é pagamento de fatores de propriedade de residentes no país. A diferença entre produto interno e produto nacional é a renda líquida enviada para o pagamento de fatores de propriedade de não residentes. PN = PI + Renda Líquida Enviada ao Exterior PNB = PIB + RLEE Países que são grandes produtores e possuem mais empreendimentos no exterior do que empreendimentos de estrangeiros em seu país preferem utilizar o PNB porque este reflete a capacidade produtiva interna e externa da economia. Países em que sua capacidade produtiva é fortemente influenciada por empreendimentos de estrangeiros muito mais do que seus empreendimentos influenciam a economia de outros países, preferem utilizar o PIB como medida de seu desempenho. Tratam-se, ambas, no entanto, de medidas de contas nacionais. 2. Qual a relação entre Produto e Renda? O Produto é o valor monetário de todos os bens e serviços finais produzidos na economia em um determinado período de tempo (normalmente um ano) expressos em valores monetários. A Renda, que também é expressa em valores monetários, é o total dos pagamentos feitos aos fatores de produção que foram utilizados para a obtenção do Produto (salários, juros, aluguéis e 1 Para citar: FARIA, José Henrique de. Fundamentos da Economia: perguntas mais freqüentes e respostas mais simples. Curitiba: EPPEO, 2008. Texto de Formação. Acesso: www.eppeo.org.br

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FUNDAMENTOS DA ECONOMIA: perguntas mais freqüentes e respostas mais simples

José Henrique de Faria1

Esse texto é destinado à formação de pessoas. Foram arroladas as perguntas mais comuns e frequentes feitas em diversos cursos ministrados pelo autor e destinados à população em geral, geralmente sem familiaridade com a Economia. A partir dessas perguntas, surgidas ao longo de quase uma década de cursos, o autor entendeu que uma forma de ampliar o conhecimento e fornecer um material para os interessados, fosse sistematizar as dúvidas em temas, organizar as questões e fornecer respostas o mais simples possível. É esse material que está agora disponível no site. A. PRODUTO

1. Por que algumas vezes se usa o PIB e outras o PNB como medida de riqueza? O Produto Interno Bruto mede o valor total de bens e serviços disponíveis na economia. O Produto Nacional Bruto mede a quantidade de bens e serviços produzidos pela economia. Alguns Fatores de Produção (RN; K; T; Tc) utilizados no processo produtivo são de propriedade de residentes no exterior; do mesmo modo, alguns residentes no país têm Fatores de Produção sendo utilizados em outros países. Assim, parte da renda gerada no país é pagamento de fatores de propriedade de não residentes e parte da renda gerada em outros países é pagamento de fatores de propriedade de residentes no país. A diferença entre produto interno e produto nacional é a renda líquida enviada para o pagamento de fatores de propriedade de não residentes. PN = PI + Renda Líquida Enviada ao Exterior PNB = PIB + RLEE Países que são grandes produtores e possuem mais empreendimentos no exterior do que empreendimentos de estrangeiros em seu país preferem utilizar o PNB porque este reflete a capacidade produtiva interna e externa da economia. Países em que sua capacidade produtiva é fortemente influenciada por empreendimentos de estrangeiros muito mais do que seus empreendimentos influenciam a economia de outros países, preferem utilizar o PIB como medida de seu desempenho. Tratam-se, ambas, no entanto, de medidas de contas nacionais. 2. Qual a relação entre Produto e Renda? O Produto é o valor monetário de todos os bens e serviços finais produzidos na economia em um determinado período de tempo (normalmente um ano) expressos em valores monetários. A Renda, que também é expressa em valores monetários, é o total dos pagamentos feitos aos fatores de produção que foram utilizados para a obtenção do Produto (salários, juros, aluguéis e

1 Para citar: FARIA, José Henrique de. Fundamentos da Economia: perguntas mais freqüentes e respostas mais simples. Curitiba: EPPEO, 2008. Texto de Formação. Acesso: www.eppeo.org.br

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lucros pagos aos agentes econômicos detentores dos Recursos Naturais, Capital, Trabalho e Tecnologia). 3. O que é valor adicionado ou valor agregado? A produção de bens é uma atividade que se processa através de cadeias produtivas. Para efeito de medida do valor do Produto Final de um bem, não se pode contar o valor da produção de um bem intermediário que o compõe senão uma única vez ao longo da cadeia produtiva. O fio é computado na fabricação de um tecido; o tecido é o valor do fio (custo de matéria prima) mais o valor agregado para produzi-lo; a roupa é o valor do tecido (custo de matéria prima) mais o valor agregado ou adicionado para produzi-la. Valores agregados são, assim, aqueles que se somam aos já computados na produção de um bem, de maneira a evitar a dupla contagem. 4. Qual a diferença entre Produto Nacional Bruto e Produto Nacional Líquido e entre preço de mercado e custo de fatores? Do total de bens e serviços finais produzidos por uma economia em um determinado período de tempo, uma parte refere-se a máquinas e equipamentos que vão compor o estoque de capital, incorporando-se ao mesmo. Uma parcela destas máquinas e equipamentos, no entanto, vão repor outras máquinas e equipamentos que se desgastaram durante o processo produtivo, ou seja, que se depreciaram. Assim, o Produto Nacional Líquido considera apenas a produção de bens finais destinados a repor o estoque de capital consumido no período. PNL = PNB – Depreciação O Produto Nacional pode ser medido a preço de mercado e a custo de fatores (PNapm e PNacf). O governo, ao longo de todo o processo produtivo e nas diversas etapas de comercialização, cobra impostos indiretos (IPI, ICMS). O valor cobrado dos impostos, em cada etapa, refere-se, contudo somente ao valor agregado. Quando se mede o Produto Nacional pela soma dos valores adicionados em cada etapa da produção, o resultado será o do produto a custo de fatores. Quando se mede o Produto Nacional pela somatória dos preços de venda, multiplicados pela quantidade de produtos vendidos, o resultado será o produto a preço de mercado. Assim, a diferença entre estas duas medidas é o total dos impostos indiretos. PNacf = PNapm – Impostos Indiretos 5. Qual o significado de Renda Disponível do Setor Privado? Significa o quanto o setor privado da economia teve ao seu dispor como resultado da atividade econômica. Tomando-se a Renda Nacional acf e dela deduzindo-se todos os impostos diretos (IRPF, Previdência) e a este resultado acrescentando-se todas as transferências que o Setor Público faz ao Setor Privado (aposentadorias, subsídios, etc.), tem-se a RDSP (que se destina a Consumo e Poupança). 6. A Renda per Capita e/ou o Produto per Capita podem avaliar a riqueza relativa de uma economia? Em termos. Tratam-se, ambas, de medidas de renda/produto médias (renda/produto dividido pelo número de pessoas). Entretanto, tal medida não revela a concentração/distribuição de renda de uma economia, sendo assim um indicador restrito. 7. Quais são e como se medem as Contas Nacionais? São seis as contas: Conta Renda e Produto Nacionais (onde são lançadas as transações envolvendo as unidades produtivas); Gastos das Famílias (onde

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são lançadas as rendas e transferências recebidas pelas famílias bem como seus gastos, impostos pagos e poupança); Gastos do Governo (onde são lançadas as receitas e despesas correntes do Setor Público); Resto do Mundo (onde são lançadas as transações com o exterior: o saldo representa o superávit ou déficit em transações correntes, que é o item do Balanço de Pagamentos que congrega importações e exportações de mercadorias – Balança Comercial - e transações que envolvem serviços); Conta Consolidada de Capital (onde são lançados os saldos das poupanças das contas anteriores, os gastos com a formação de capital – investimentos e estoques – e a depreciação). Mede-se: a. Renda RNLacf = Salários + Juros + Aluguéis + Lucros + Contribuição Previdenciária Patronal + Impostos Diretos das Empresas + Renda do Governo + Rendas das Famílias RNLapm = RNLacf + Impostos Indiretos – Subsídios RNBapm = RNLapm + Depreciação b. Produto PIBapm = Consumo das Famílias + Gastos (Consumo) do Governo + Investimentos em Bens de Capital + Variação de Estoques + Exportações - Importações PNBapm = PIBapm – Renda Enviada ao Exterior + Renda Recebida do Exterior c. PNBamp = RNBapm d. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBKf) = FBKf do Governo + FBKf do Setor Privado (a qual é igual à produção da indústria de bens de capital + importações de bens de capital)

B. JUROS 1. Por que o Governo aumenta os juros? Porque o país começa a perder muitos dólares de suas reservas cambiais. Quando as reservas ficam muito baixas, o país passa a ter dificuldades para pagar suas contas no exterior (juros, dívidas, etc.). Aumentando a taxa de juros o governo espera atrair ou manter o capital financeiro no país. Com o aumento da taxa de juros o investimento financeiro passa a render mais, fazendo com que investidores estrangeiros e nacionais mantenham suas aplicações no país em lugar de buscar mercados mais seguros (EUA, Londres, etc.). Porém, a captação de capital financeiro resolve um problema imediato, mas cria outro, que é o aumento da dívida, pois todo o dinheiro que entra como crédito aumenta o passivo (débito). 2. Todo o capital financeiro é adequado para o país? A princípio sim. Porém, o capital financeiro que se transforma em investimento produtivo tem efeitos benéficos, pois tem caráter de propagação, gerando outros capitais. Já os capitais especulativos drenam as riquezas decorrentes da produção, ainda que possam ser necessários para dar lastro às reservas.

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3. Por que os investidores desejam retirar o dinheiro aplicado em um país? Os investidores e, mais especialmente, os especuladores, tiram seu dinheiro quando há fortes indícios de fuga de dólares, seja pela ameaça de instabilidade, seja pela baixa remuneração, seja pela composição entre o alto risco e o baixo retorno. Começa, assim, um círculo vicioso. As reservas do país começam a cair e os investidores temem que o dólar dispare. Nesta situação, os investidores teriam de comprar dólar mais caro quando fossem deixar o país, razão pela qual ficam ansiosos para levar rapidamente seu dinheiro embora. Quando mais os dólares saem, mais instável fica a economia e maior o risco. 4. A elevação dos juros acalma os mercados? Sim e não. Os ganhos dos estrangeiros que estão no país se tornam maiores do que os obtidos fora do país, o que, de certa forma, acalma o mercado. Por outro lado, o mercado interno fica nervoso porque muitas empresas e bancos precisam de dinheiro nacional para cumprir seus compromissos e o custo deste dinheiro é o juro alto. 5. Quais os impactos da alta de juros? As dívidas públicas (federais, estaduais e municipais) aumentam muito. Assim, os governos ficam muito endividados sem gastar mais com obras ou serviços (educação, saúde, etc.), tendo, portanto, de conseguir mais dinheiro para pagar suas contas, o que fará com aumento de impostos, com empréstimos e/ou com rolagem (repactuação) da dívida. 6. Que medidas o governo pode tomar além da alta de juros para segurar as aplicações estrangeiras? O governo pode isentar ou diminuir os impostos sobre as aplicações estrangeiras em renda fixa; pode oferecer facilidades tributárias para diferentes tipos de aplicações financeiras, escolhendo aquelas que mais lhe interessam que fiquem no país; pode dar maiores facilidades para que o capital especulativo permaneça no país lançando títulos em dinheiro nacional indexados ao dólar, entre outras. 7. A política de alta de juros dá certo? O capital estrangeiro está sempre mais interessado em segurança, em credibilidade, do que em juros altos. A tendência é que quanto menor a credibilidade, maior os juros. Mas isto tem um limite, acima do qual a economia nacional entra em bancarrota. Assim, uma política de juros altos só dá resultados se houver um mínimo de credibilidade. 8. Como o aumento dos juros afeta os cidadãos? Quem tem dívidas em cheque especial ou em cartão de créditos, paga mais. Quem financia a aquisição de bens ou de serviços sem taxa de juros pré-fixada, verá suas parcelas aumentarem muito. Quem pretende comprar à prazo, poderá ter mais dificuldades para obter crédito. 9. Quais são as duas pontas dos juros? Em uma ponta está o juro básico, que é a taxa SELIC, monitorado pelo Banco Central, que serve de parâmetro para aplicações financeiras e custo da dívida do governo. Em outra ponta está o juro do crédito, que é formado pelo custo de captação do dinheiro junto aos investidores, custos operacionais, impostos, taxa de risco e lucro. O juro do crédito pode ficar mais caro mesmo que haja queda do juro básico, pois o crédito contém um componente de incerteza; além disto, a expectativa de alta de juros de crédito se reflete no mercado futuro (nos

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Depósitos Interbancários – DI) e nas taxas dos Certificados de Depósitos Bancários (CDB) oferecidos pelos bancos aos aplicadores. 10. O que é taxa SELIC É a taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC, divulgada pelo Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central. Ela tem vital importância na economia, pois as taxas de juros cobradas pelo mercado são balizadas pela mesma. Assim, se a taxa anual está em 17% e a inflação do mesmo período foi de 5%, a taxa de juro real anual foi de 12% (a diferença). A taxa overnight do SELIC, expressa na forma anual, é a taxa média ponderada pelo volume das operações de financiamento por um dia, lastreadas em títulos públicos federais e realizadas no SELIC, na forma de operações compromissadas. É a taxa básica utilizada como referência pela política monetária C. ESPECULAÇÃO 1. O que é um ataque especulativo? É a aposta dos investidores contra a moeda de um país, no sentido de que a mesma se desvalorize. A premissa é de que haja chance razoável de ganhar a aposta. Como não há disponibilidade automática de toda a quantidade de moeda solicitada, o governo é obrigado a desvalorizá-la ou elevar a taxa de juros, ou ainda a adotar ambas as medidas para tentar segurar os investidores no país. Se a moeda estiver sobrevalorizada ou o país estiver muito dependente de moeda estrangeira, as possibilidades de sucesso dos apostadores são boas. 2. Quando se sabe se a moeda está sofrendo ataque especulativo? A moeda está sofrendo ataque especulativo quando as saídas de dólar do país ocorrem mais como movimento de defesa contra uma eventual desvalorização da moeda do que em decorrência de outras opções de ganhos financeiros por parte dos investidores. 3. Como se pode enfrentar o ataque especulativo? Sendo uma questão de aposta e de credibilidade, o que está ao alcance dos governos é a obtenção de empréstimos externos para reforçar suas reservas e a adoção de uma política de combate à especulação nos mercados financeiros e nas bolsas. Estas medidas dão um tempo para respirar, mas não indicam o fim do ataque, pois para isto é necessário que a economia esteja estável (como é o caso da economia brasileira atualmente). 4. Qual o significado de comprado e vendido no mercado especulativo? Comprado é o jargão que indica que um determinado banco comprou dólares, tanto no mercado à vista quanto no mercado futuro (neste caso, expressa a expectativa de desvalorização da moeda nacional frente ao dólar). Vendido é o jargão utilizado para referir-se à situação em que um banco vendeu dólares no mercado à vista ou futuro (neste caso, expressando sua expectativa de valorização da moeda nacional frente ao dólar). 5. O que são os derivativos? São as operações que derivam de outras, ou seja, as que negociam expectativas a respeito do mercado físico. São negócios feitos no mercado futuro, como opções de compra de produtos agropecuários, taxas de juro, taxas de câmbio, metais, índices de ações e de conjuntura. 6. Qual a diferença entre mercado futuro e mercado pronto?

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Mercado futuro é aquele em que se fazem negociações de contratos que representam expectativas de variação nos mercados físicos em determinado período. As partes envolvidas assumem o compromisso de pagar ou receber determinado valor no prazo de vencimento. Este mercado pode envolver câmbio, índices de bolsas de valores e opções de compras de mercadorias. Já o mercado pronto é o mercado à vista, no qual as operações de compra e venda são pagas em até dois dias úteis (D+2) após a efetivação da negociação. É também chamado de mercado spot. D. CAPITAL EXTERNO 1. O que é capital externo? É como são chamados os investimentos, empréstimos ou financiamentos estrangeiros recebidos pelo país. Este dinheiro pode ser aplicado nas Bolsas de Valores, pode ser emprestado às empresas e ao governo ou investido diretamente na produção (compra ou abertura de uma fábrica etc.). 2. Por que o capital externo ingressa no país? Em busca de lucros. O capital ingressa onde a relação ganho/segurança for melhor.

3. Quando um país é considerado um mercado arriscado? Quando tem um histórico de inflação e de calotes das dívidas externa e interna, quando a política econômica não inspira confiança porque o governo gasta mais do que arrecada (déficit público) e o país importa mais do que exporta (déficit comercial) sem que tal déficit seja compensado no Balanço de Pagamentos. 4. O que é capital especulativo? É o nome genérico que se dá para todos os investimentos externos que buscam lucros altos em prazos curtos. Este dinheiro concentra-se nas Bolsas de Valores (mercado acionário), nos investimentos de juros (derivativos) e cambial. Trata-se de um tipo de capital que é transferido de um país para outro com facilidade. 5. Atrair capital externo é ruim? Em tese não. O capital externo permite que a economia de um país cresça mais rapidamente ou, então, que o Governo amplie a oferta de serviços à população ou que invista em infra-estrutura urbana e social. Capital externo é uma “poupança externa” utilizada por um país quando sua poupança interna é insuficiente para suas necessidades de investimento. Porém, quando um país depende demasiadamente do capital externo (por falta de capacidade de geração de poupança interna), acaba ficando sujeito às variações do mercado internacional. Se este capital for especulativo, a situação é ainda mais frágil. 6. Como acontece a fuga de capitais? Para ingressar em um país, os investidores externos trazem dólares, compram a moeda local e fazem suas operações. Quando tais investidores acreditam que está se tornando desvantajoso ou muito arriscado continuar no país, compram seus dólares de volta e remetem ao exterior. 7. A fuga de capitais pode ser provocada por investidores nacionais? Sim. Os investidores nacionais podem acreditar que é arriscado ou desvantajoso manter seu dinheiro no país e, assim, trocam a moeda local que possuem por dólares e os enviam ao exterior. 8. Quais as conseqüências da fuga de capitais?

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Se muitos investidores decidem comprar dólares, o valor do dólar tende a subir, comprometendo o controle dos preços internos (inflação). Para enfrentar a fuga de capitais o governo eleva os juros, comprometendo o crescimento da economia e elevando o desemprego. Se a fuga não for contida, o país ficara sem divisas para honrar seus compromissos externos, o que pode gerar um período de inflação e de profunda recessão. 9. Como a situação internacional pode afetar o país? Mesmo que um país consiga conter a fuga de capitais, se a economia mundial caminhar para um período de retração é inevitável o fato da queda do consumo mundial prejudicar as exportações ao mesmo tempo em que há forte tendência dos investimentos externos diminuírem bastante, fazendo com que o país acompanhe o desaquecimento (recessão) mundial. 10. O que é reserva cambial? É a soma de moedas estrangeiras e ouro acumulados pelo país, geralmente à partir da diferença entre o ingresso e a saída de moeda forte. É uma espécie de garantia de que o país conseguirá pagar sua dívida externa e assegurar que os importadores conseguirão fazer câmbio para pagar suas compras no exterior.

E. AJUSTE DAS CONTAS PÚBLICAS 1. Quando ocorre déficit público? Ocorre quando o governo (federal, estadual e municipal) gasta acima de suas receitas. Isto é possível de duas maneiras: emitindo moeda (o que gera inflação) ou fazendo dívidas em títulos públicos (o que tende a elevar os juros). Quando acontece a emissão de títulos, a quantidade de moeda em circulação na economia diminui (entra papel e sai dinheiro) e as possibilidades de investimento privado também diminuem (por dois motivos: porque o dinheiro torna-se muito caro e porque são mais atrativos os ganhos financeiros do que os decorrentes da produção). 2. Qual a diferença entre déficit nominal, operacional e primário? 2.1. Déficit nominal é o critério mais amplo para medir o déficit público, pois leva em conta todos os gastos públicos, incluindo as despesas com o pagamento das dívidas interna e externa; 2.2. Déficit operacional é um critério (introduzido no Brasil no período de inflação alta) de medida que não leva em conta o crescimento da dívida pública que resulta de correção monetária; 2.3. Déficit primário é um critério de medida que não leva em conta os gastos com juros da dívida pública, mas apenas a diferença entre receitas e outras despesas. Quando o Setor Público tem déficit primário, precisa fazer dívidas para cobrir despesas de custeio, investimento e/ou pessoal. Voltaremos a este assunto no item G, adiante. 3. Qual a relação entre déficit e juros? O déficit público tende a provocar alta dos juros, por que o governo se torna o principal devedor do mercado e é obrigado a pagar taxas cada vez mais altas para conseguir dinheiro emprestado. Esta situação reflete um princípio do mercado financeiro que diz que quanto maior o risco representado pelo devedor, mais juro ele paga. 4. Qual a relação entre déficit e crescimento?

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O déficit público pode estimular o crescimento econômico por meio de obras que gerem empregos, de investimento em infra-estrutura social, em desenvolvimento científico e tecnológico, em aportes ou financiamento de atividades produtivas, entre outras. Quando o déficit público cresce a ponto de gerar desconfiança no mercado, entretanto, ocorre uma alta nas taxas de juros e a conseqüente redução dos investimentos públicos, comprometendo o crescimento e o desenvolvimento econômico. Se o país tem poupança suficiente para financiar o déficit e os investimentos, não precisa atrair poupança externa; caso contrário, como já foi exposto anteriormente, torna-se dependente do capital externo. 5. Que relação existe entre juro, câmbio e política monetária? Política monetária é o conjunto de políticas adotadas pelo governo para adequar a quantidade de moedas disponível no país às necessidades da economia. Os dois grandes instrumentos de política monetária são os juros e o câmbio, pois se tratam de formas de remunerar o dinheiro, de estabelecer o seu valor e de definir a quantidade necessária para circular na economia.

F. CONTAS EXTERNAS 1. Como são divulgadas as contas externas brasileiras? Desde janeiro de 2001, o Banco Central divulga as contas externas brasileiras seguindo a metodologia recomendada no "Manual do Balanço de Pagamentos" editado pelo Fundo Monetário Internacional. Esse manual define as normas internacionais para a apuração das contas externas de forma integrada, englobando os dados de fluxos (o Balanço de Pagamentos propriamente dito) e os dados de estoques de ativos e passivos financeiros internacionais do País. 2. Qual a estrutura do Balanço de Pagamentos? O Balanço de Pagamentos (BP) é estruturado em dois grandes grupos de contas:

• A conta corrente, que agrega a balança comercial, a balança de serviços e rendas e as transferências unilaterais correntes líquidas;

• A conta capital e financeira, que agrega os investimentos diretos e em carteira de estrangeiros no País e de brasileiros no exterior, além de operações com derivativos e outros investimentos. A soma dos resultados das contas “corrente” e “capital e financeira” constitui o resultado global do BP, resultado este que, por definição, é igual à variação das reservas internacionais no conceito de liquidez internacional. Os erros e omissões podem dar margem a uma discrepância estatística entre os dois fluxos, sendo devidamente registrados no Balanço de Pagamentos. 3. Como a conta corrente brasileira tem evoluído? A conta-corrente brasileira pós-Plano Real (1994) apresentou duas tendências opostas. Até 1998, os déficits foram crescentes, atingindo o pico histórico naquele ano (US$33,4 bilhões, equivalentes a 4,2% do PIB). A partir de 1999, todavia, com a adoção do regime de câmbio flutuante, verificou-se um ajuste gradual das transações correntes brasileiras, fechando 2004 com superávit de US$11,7 bilhões ou 1,9% do PIB. Embora diversos fatores afetem o desempenho do comércio externo (como o nível de atividade doméstica, a demanda externa, os termos de troca – preços de exportação e importação – e as tarifas e barreiras ao comércio), o principal motor do crescente saldo comercial desde 1999 tem sido a taxa de câmbio real efetiva, que trouxe um

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relativo ganho de competitividade para as exportações (de alguns produtos) e impulsionou a substituição de importações por produção doméstica. 4. O que é a taxa de câmbio real efetiva? A taxa de câmbio real efetiva, elaborada pelo Banco Central, é uma medida da competitividade das exportações, dada pela cotação do real em relação às moedas de nossos 15 principais mercados, ponderada pela participação desses países no total das exportações brasileiras. Utiliza-se um índice doméstico de inflação como deflator interno e os respectivos índices de preços ao consumidor de cada país como deflator externo. É, portanto, um indicador mais amplo da competitividade das exportações do que taxas de câmbio bilaterais. 5. O que são as necessidades de financiamento externo? Definem-se as necessidades de financiamento externo como sendo a diferença entre o saldo em conta corrente e os investimentos estrangeiros diretos líquidos (incluindo empréstimos intercompanhias). Ou seja, correspondem à parcela do déficit de transações correntes não financiada pela entrada líquida de investimentos diretos. Quando esse ingresso líquido é mais do que suficiente para cobrir o déficit em conta-corrente, as necessidades são negativas. 6. Qual o tamanho da dívida externa? Qual sua evolução recente? Em 2005, a dívida externa brasileira fechou na casa dos US$200 bilhões. Após uma fase de crescimento acelerado entre 1990 e 1998, o endividamento externo passou a apresentar tendência de queda a partir de 2000. A dívida externa de médio e longo prazos totalizava, em 2005, US$180 bilhões, enquanto a dívida externa de curto prazo situava-se em US$20 bilhões. 7. Que proporção da dívida externa é pública? Em 2005, o setor público não-financeiro (que inclui o Tesouro Nacional, o Banco Central, os governos estaduais e municipais e as empresas estatais) tinha responsabilidade sobre 63% da dívida externa de médio e longo prazos, enquanto o setor privado e o setor público financeiro respondiam pelos 37% restantes. 8. Qual a composição da dívida externa? Em 2005, cerca de 35% da dívida era constituída por meio de bônus e 25% por meio de empréstimos junto a organismos internacionais, incluindo o FMI, o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento. Essas duas últimas categorias são majoritariamente de responsabilidade do setor público não-financeiro. Há ainda um saldo de dívida de US$3,5 bilhões junto ao Clube de Paris, também de responsabilidade do setor público não-financeiro. Já a maior parte da dívida externa do setor privado é constituída por meio de notes2, empréstimos bancários e créditos de fornecedores. 9. Qual a composição da dívida externa por moeda? A maior parte da dívida externa está expressa em dólares norte-americanos (70,8%), enquanto o euro responde por cerca de 9,6% do total e o iene japonês por cerca de 7%. Cerca de 12,6% da dívida são expressos em DES (Direitos Especiais de Saque), a "moeda" do FMI. Há ainda pequenas denominações da dívida em libra esterlina, franco suíço e dólar canadense, que alcançam cerca de 1% do total.

2 Obrigações de médio/longo prazo do tesouro norte-americano. Suas emissões têm vencimentos entre 2 e 15 anos.

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10. Que proporção da dívida externa está contratada a taxas de juros fixas? Quanto à composição da dívida por taxa de juros, 60,4% estão contratados a taxas de juros fixas e 39,6% a taxas flutuantes (38,3% dos quais vinculados à Libor3), em 2005. G. DÍVIDA LÍQUIDA E NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DO

SETOR PÚBLICO 1. Qual a diferença entre Setor Público e Governo no que se refere à dívida? Em função das peculiaridades histórico-institucionais do Brasil, temos dois conceitos:

• Setor Público: utilizado para mensuração da dívida líquida e do déficit público correspondente ao setor público não-financeiro mais Banco Central. Considera-se como setor público não-financeiro as administrações diretas federal, estaduais e municipais, as administrações indiretas, o sistema público de previdência social e as empresas estatais não-financeiras federais, estaduais e municipais, além da Itaipu Binacional. Incluem-se também no conceito de setor público não-financeiro os fundos públicos que não possuem característica de intermediários financeiros, isto é, aqueles cuja fonte de recursos é constituída de contribuições fiscais ou parafiscais. O Banco Central é incluído na apuração da dívida líquida pelo fato de transferir seu lucro automaticamente para o Tesouro Nacional, além de ser o agente “arrecadador” do imposto inflacionário.

• Governo: para obtenção de indicadores mais próximos dos padrões internacionais, adota-se o conceito de Governo, que abrange as administrações diretas federal, estaduais e municipais, bem como o sistema público de previdência social. 2. O que é dívida líquida do Setor Público? Corresponde ao saldo líquido do endividamento do setor público não-financeiro e do Banco Central com o sistema financeiro (público e privado), com o setor privado não-financeiro e com o resto do mundo. Entende-se por saldo líquido o balanceamento entre as dívidas e os créditos do setor público não-financeiro e do Banco Central. É importante ressaltar que os saldos da dívida líquida são apurados pelo critério de competência4, ou seja, a apropriação de encargos é contabilizada na forma pro rata (proporcionalmente ao tempo da dívida), independente da ocorrência de liberações ou reembolsos no período. Deve-se mencionar ainda que, diferentemente de outros países, o conceito de dívida

3 LIBOR é LONDON INTERBANK OFFERED RATE (Taxa Interbancária do Mercado de Londres); PRIME é PRESCIBED RIGHT TO INCOME AND MAXIMUM EQUITY (Taxa Preferencial de Juros - Bolsa de Valores de Nova York). 4 O regime de competência é um princípio contábil segundo o qual as receitas e as despesas devem ser incluídas na apuração do resultado do período em que ocorrerem, independentemente de recebimento ou pagamento. Exemplo: O lojista aceita o pagamento das compras de clientes através de cartões de crédito. As empresas de cartões cobram uma taxa (comissão) sobre as vendas, a título de operacionalização e garantia do crédito. Tais taxas devem ser apropriadas, contabilmente, pelo lojista, por ocasião da venda, e não somente por ocasião da liberação (crédito) do valor em sua conta corrente.

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líquida utilizado no Brasil considera os ativos e passivos financeiros do Banco Central, incluindo, dessa forma, a base monetária. 3. O que é dívida bruta do Governo? A dívida bruta do Governo abrange o total dos débitos de responsabilidade do Governo Federal, dos governos estaduais e dos governos municipais, junto ao setor privado, ao setor público financeiro, ao Banco Central e ao resto do mundo. Os débitos de responsabilidade das empresas estatais das três esferas de governo não são abrangidos pelo conceito. Os débitos são considerados pelos valores brutos, sendo as obrigações vinculadas à área externa convertidas para reais pela taxa de câmbio de final de período (compra). Os valores da dívida mobiliária do Governo Federal (que abrange dívidas securitizadas e carteira de títulos públicos federais no Banco Central) são calculados com base na posição de carteira, que não leva em consideração as operações compromissadas realizadas pelo Banco Central. São deduzidos da dívida bruta do Governo Federal os créditos representados por títulos públicos que se encontram em poder de seus órgãos da administração direta e indireta, de fundos públicos federais, dos estados e dos municípios, a saber: aplicações da previdência social em títulos públicos, aplicações do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e outros fundos em títulos públicos e aplicações dos estados em títulos públicos federais. Analogamente, são deduzidas da dívida dos governos estaduais e dos municipais as parcelas correspondentes aos títulos em tesouraria. 4. Quais as diferenças entre déficit ou superávit nominal e primário?

• O resultado nominal (déficit ou superávit) corresponde à variação dos saldos da dívida, deduzidos os ajustes patrimoniais efetuados no período (privatizações e reconhecimento de dívidas). Abrange o componente de atualização monetária da dívida, os juros reais e o resultado fiscal primário. Dependendo das finalidades, sua metodologia de cálculo pode incluir, ainda, o impacto da variação cambial sobre a dívida externa e sobre a dívida mobiliária interna indexada a moeda estrangeira (ajuste metodológico).

• O resultado primário é, em resumo, uma operação simples que indica a diferença entre a receita e as despesas. Os juros incidentes sobre a dívida líquida dependem do nível de taxa de juros nominal e do estoque da dívida que, por sua vez, é determinado pelo acúmulo de déficits nominais passados. Assim, a inclusão dos juros no cálculo do déficit dificulta a mensuração do efeito da política fiscal executada pelo Governo, motivo pelo qual se calcula o resultado primário do setor público, que corresponde ao déficit nominal5 (NFSP) menos os juros nominais apropriados por competência, incidentes sobre a dívida pública. A parcela dos juros externos e incidentes sobre a dívida mobiliária vinculada a moeda estrangeira é convertida pela taxa média de câmbio de compra. 5. O que significa ajuste patrimonial? Significa variações nos saldos da dívida líquida não consideradas no cálculo do déficit público. Inclui as receitas de privatização e a incorporação de passivos contingentes (esqueletos) 6.

5 O déficit nominal corresponde às Necessidades de Financiamento do Setor Público (NFSP). 6 Passivos contingentes (esqueletos) correspondem a dívidas juridicamente reconhecidas pelo Governo, de valor certo, e representativas de déficits passados não contabilizados (o efeito econômico já ocorreu no passado).

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6. Por que é necessário fazer ajuste metodológico? Ao obter financiamento no exterior, os governos em geral o fazem em moeda do país em que o empréstimo é efetuado ou em alguma outra unidade de conta válida para contratos no exterior (dólar americano, direitos especiais de saque, euro, etc.). Portanto, variações de paridade entre moedas estrangeiras, ou a variação cambial entre o dólar americano e o real, não aumentam nem diminuem o déficit público, porque não afetam o saldo da dívida externa medido na moeda em que o financiamento foi efetuado. Dessa forma, o componente do setor externo nas NFSP é mensurado a partir dos fluxos efetivos em dólares americanos, convertidos para a moeda nacional, à taxa média de câmbio. A apuração da dívida externa líquida, uma medida de estoque, é feita convertendo-se os saldos pela taxa de câmbio de final de período. Na presença de variação cambial da moeda nacional, ou de paridade entre as diferentes moedas e o dólar americano, fica claro que a variação da dívida externa líquida, expressa em reais, é diferente dos fluxos externos líquidos em moeda estrangeira, convertidos para reais. O ajuste metodológico, portanto, é necessário porque se trata de uma medida desse diferencial, pois corresponde à diferença entre a variação da dívida externa líquida convertida pela taxa de câmbio de final de período e as necessidades de financiamento externas, convertidas pela taxa média de câmbio.