Gazeta do Jovem Historiador/Revolta da Chibata

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GAZETA DO JOVEM HISTORIADOR Maio de 2013 Muito mais que uma revolta: a verdadeira face política da Revolta da Chibata. "Vale é saber que as carnes de um servidor da pátria só serão cortadas pelas armas dos inimigos, mas nunca pela chibata de seus irmãos. A chibata avilta.” Essa declaração de João Cândido, líder da rebelião, em entrevista ao Coreio da Manhã em 1910, sintetizou o real sentido e a finalidade da Revolta da Chibata, que marcou a História brasileira de tal forma a tomar esse movimento como um dos embates políticos mais importantes ocorridos na Velha República. Contexto: por que ocorreu Mudando o contexto histórico de um país completamente explorado, marinheiros sofreram maus-tratos e castigos físicos em exercício de sua profissão. O negro recém- liberto, analfabeto e marginalizado da sociedade, só tinha uma opção para tentar ascender na sociedade da época: incorporar-se na Marinha. Porém, muitas vezes eram recrutados à força, sofrendo o exasperado aviltamento através dos açoites, prática proibida com a Proclamação da República, entretanto reintroduzida no Decreto 328 de abril de 1890, como forma de punição e controle sobre os marinheiros – em sua maioria negros e pobres. A situação dos marinheiros era deplorável: cativeiro em prisão solitária, a pão e água, rebaixamento de salário e 25 chibatadas para faltas graves, que eram penas regulamentadas em plena República. Após assistirem ao brutal açoitamento de Marcelino Rodrigues, acusado de embarcar com cachaça e agredir outro marujo, que não levou 25 chibatadas, mas 250, desmaiou e continuou sendo açoitado, todos “O Brasil não tem povo, tem público.” Lima Barreto 1

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2013Muito mais que uma revolta: a verdadeira face política da Revolta da Chibata.

"Vale é saber que as carnes de um servidor da pátria só serão cortadas pelas armas dos inimigos, mas nunca pela chibata de seus irmãos. A chibata avilta.” Essa declaração de João Cândido, líder da rebelião, em entrevista ao Coreio da Manhã em 1910, sintetizou o real sentido e a finalidade da Revolta da Chibata, que marcou a História brasileira de tal forma a tomar esse movimento como um dos embates políticos mais importantes ocorridos na Velha República.

Contexto: por que ocorreu

Mudando o contexto histórico de um país completamente explorado, marinheiros sofreram maus-tratos e castigos físicos em exercício de sua profissão. O negro recém-liberto, analfabeto e marginalizado da sociedade, só tinha uma opção para tentar ascender na sociedade da época: incorporar-se na Marinha. Porém, muitas

vezes eram recrutados à força, sofrendo o exasperado aviltamento através dos açoites,

prática proibida com a Proclamação da República, entretanto reintroduzida no Decreto 328 de abril de 1890, como forma de punição e controle sobre os marinheiros – em sua maioria negros e pobres. A situação dos marinheiros era deplorável: cativeiro em prisão solitária, a pão e água, rebaixamento de salário e 25 chibatadas para faltas graves, que eram penas regulamentadas em plena República.Após assistirem ao brutal açoitamento de Marcelino Rodrigues, acusado de embarcar com cachaça e agredir outro marujo, que não levou 25 chibatadas, mas 250, desmaiou e continuou sendo açoitado, todos os marinheiros estavam inebriados de furor. E não foi só esse acontecimento que levou a revolta de muitos. Marinheiros revoltosos haviam se organizado desde 1908, mas a eclosão do movimento adveio somente em 1910, sob a liderança de João Cândido, mais conhecido como “Almirante Negro”, e Dias Martins, o mentor intelectual do grupo.

A Revolta e o Almirante Negro

“O Brasil não tem povo, tem público.” Lima Barreto 1

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Na noite de 22 de novembro, os marinheiros, liderados por João Cândido, mais conhecido como “Almirante Negro”, tomaram controle do Minas Gerais, assassinando quatro oficiais, inclusive o comandante do navio. Na manhã do dia 23, os revoltosos, que haviam conseguido apoio de outras tripulações, enviaram uma carta dirigida ao então presidente, Hermes da Fonseca. No manifesto, os marinheiros diziam

não suportar mais “a escravidão dentro da Marinha", afirmando-se a favor de uma reparação no "código imoral e vergonhoso que nos rege a fim de que desapareça a chibata [...] e

outros castigos semelhantes”.

Figura 1. Manchete de jornal da época sobre a Revolta da Chibata. Fonte: arocacontaumconto.blogspot.com

O desfecho do movimento aconteceu no dia 26, quando os marinheiros entregaram os navios, depois de o presidente sancionar anistia aprovada pelo Senado. Porém Hermes da Fonseca assinou um decreto que permitia a exclusão dos marinheiros, que foram levados para a Ilha das Cobras, onde organizaram um novo levante, que foi duramente combatida pela

Marinha que dizimou boa parte dos revoltosos. Sobreviventes foram forçados a embarcar no navio Satélite, que seguiria para o Amazonas, para trabalhar na produção de borracha. João Cândido, posteriormente, foi internado como louco no Hospital dos Alienados.

Em segundo plano, à esquerdaDias Martins não recebe tantas homenagens como João Cândido, apesar de ser o “cérebro” da Revolução, mas ainda assim não ficou à margem da história, segundo o historiador Marco Morel. “No momento que eclode a rebelião, João Cândido virou símbolo, expressão e rosto, não só para a fama, mas também para a repressão”, argumenta o historiador, lembrando das perseguições que Cândido sofreu mesmo anos após a revolta. “Dias Martins foi considerado uma figura de bastidor, por ser associado a um homem com cultura letrada. É um homem bastante reconhecido.” Já o historiador Álvaro Pereira do Nascimento acredita em outra tese: a falta de documentos confiáveis sobre o personagem. “Falta mesmo pesquisa sobre Dias

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Martins. Falta fonte. O que eu sei: Dias Martins não ficou em segundo plano. João Cândido é que foi elevado ao primeiro plano”, explica, dando como argumento o tempo de trabalho: “ele tinha 15 anos de serviço militar”.

Homenagem a João Cândido: Mestre-Sala dos maresMúsica de João Bosco e Aldir Blanc(música censurada durante a ditadura)Há muito tempo nas águas da GuanabaraO dragão do mar reapareceuHa figura de um bravo feiticeiroA quem a história não esqueceuConhecido como navegante negroTinha a dignidade de um mestre-salaE ao acenar pelo mar na alegria das regatasFoi saudado no porto pelas mocinhas francesas Jovens polacas e por batalhões de mulatas...

Figura 2. João Cândido, líder da Revolta. Fonte: www.ebc.com.br

Segundo Elisângela Galvão, professora de História e de Étnico Racial da Faculdade Santa Fé, “o episódio da Revolta da Chibata representa a emancipação do pensamento a respeito da consciência social e política”.

Equipe: Danielle Barbosa, Isamor Lopes, Jerffeson Martins, Marley Moraes e Tayssa Lima. [3º ano D]

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