GÊMEAS

SUZANA CARVALHO e

ZELAIR S. DE CARVALHO

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Ficha Técnica Nome: “Gêmeas” Autoras: Suzana de Carvalho e Zelair S. de Carvalho Capa: Marco Palanti Editora: Perse Editora 1ª. Edição - 2013

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Prefácio Eu e a Zelair nunca nos vimos pessoalmente, mas a distância e os contatos mudos através do Facebook nunca foram empecilhos à nossa grande amizade e afinidade nas letras e na vida. Esse romance “nasceu” há alguns anos, fruto de uma grande necessidade de exprimir o romantismo que nos vai à alma, assim como nasceram os outros livros que escrevemos. “Gêmeas” é o fruto de muitas conversas, muita emoção e nosso grande amor pelas letras. Agradeço ao meu avô Thron que, há muitos anos, ambientou, sem saber, a estória que vocês vão ler. É a estória de Amélia e de sua grande família, com as dificuldades impostas às mulheres no começo do século vinte. É a estória comovente de uma família criada com amor e respeito. Então, boa leitura. Suzana Carvalho

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Agradecimentos: Agradecemos a Marco Palanti pela nossa capa, um lindo presente, à Associação de Moradores Nova União, à empresa Passarinho Automóveis, à nossa amiga Rosalina Gutrevil, ao nosso amigo Noelcir Bello, e também à Associação Amigos da Arte e Cultura de Pinhais pelo apoio que nos deram para a realização deste sonho.

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1 Era uma linda tarde de céu azul e uma brisa morna entrava sorrateira pela fresta da janela entreaberta do gabinete...

O parto foi difícil e demorado, mas sua esposa está bem...

O senhor pode entrar agora para vê-la. - anunciou o médico, com o semblante cansado do longo trabalho.

O “bambino” está bem? - perguntou o pai, com seu sotaque carregado e com aquela cara orgulhosa de quem vai distribuir charutos cubanos para todos os amigos, para comemorar o nascimento do primogênito.

As crianças estão bem. - respondeu o médico - são gêmeos... Ou melhor, gêmeas.

Gêmeas? - o pai ficou subitamente aturdido. - duas... Ahn... bambinas?

Sim senhor... Vá ver suas filhas! São lindas e saudáveis meninas idênticas. - respondeu o médico sorrindo.

Mas... Com todos os diabos! Será que “questa dona” não podia me dar ao menos “um” “bambino maschio”? - o pai já não estava mais orgulhoso. Estava com raiva da jovem que tomou por esposa, na esperança de que ela lhe desse o filho tão desejado que a primeira esposa não conseguiu. - É uma sina esta a minha de só ter filhas? O que

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“facio io” com “tanti doni” ao “mio” redor?

Filhas também são dádivas de Deus, senhor! Amá-las é ter a simpatia de nosso Pai Maior... Por favor, não culpe sua jovem esposa pelo fato de não ter gerado um menino para si, senhor... Ela não tem culpa disso! - aconselhou o médico seriamente, com pena da jovem mãe que com certeza teria que aguentar a ira do marido. Amélia tinha apenas dezessete anos, quando foi obrigada a se casar com um homem trinta anos mais velho do que ela, recentemente viúvo e com três filhas de dez, doze e quinze anos para cuidar. Ângelo, o marido, era um homem extremamente apegado às tradições, italiano imigrante, católico praticante, dono de uma grande indústria do setor alimentício, além de outros bens e que se julgava prejudicado por não ter um herdeiro homem para deixar seu legado. Pensava que mulheres foram feitas apenas para cuidar de casa, do marido e dos filhos que um casamento respeitável pudesse proporcionar. Jamais reconheceu qualidades profissionais em nenhuma mulher. As operárias de sua indústria ganhavam apenas a metade do que os colegas homens que exerciam funções semelhantes. Até sua secretária, que já trabalhava com ele há mais de vinte anos, sequer era notada pelo chefe, que gritava suas ordens, cumpridas num piscar de olhos, sob a pena de algum tipo de punição. O “signore” Ângelo, como era chamado até pela esposa era, o que muitos diriam um déspota.

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Julgava-se o dono de tudo e de todos. Casou-se com Amélia apenas por esperar que ela lhe desse o tão desejado filho e por ser ela filha de um importante fazendeiro de café do interior do estado de São Paulo. Mal a suportava e não admitia qualquer tipo de censura ao tratamento que lhe dispensava ou às filhas. As quatro moças que viviam sob o mesmo teto estavam sempre aterrorizadas com a perspectiva de Ângelo chegar de mau humor ou de não ter dormido bem durante a noite, pois isso significaria alguns safanões ou castigos injustificados. A pouca diferença de idade existente entre elas as aproximou, tornando-as amigas e confidentes. Uma protegia a outra e geralmente Amélia acabava se responsabilizando por pequenas travessuras feitas pelas meninas, pois quase sempre era poupada de castigos ou safanões, já que era a esposa e não uma filha. Amélia e Ângelo estavam casados há pouco mais de um ano e, por pouco, a moça não foi devolvida aos pais. O casamento já tinha cerca de quatro meses e a moça ainda não tinha engravidado, apesar da insistência com que era procurada pelo marido para que a gravidez acontecesse. Muitas vezes Amélia rezava para realmente não engravidar e ser devolvida, mas logo em seguida retirava o “pedido”, pois morria de pena das meninas que ficariam sem nenhum apoio. Finalmente engravidou e a notícia pareceu abrandar um pouco o mau humor de seu marido. E agora finalmente a hora do parto chegou. As

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meninas se reuniram rezando para que o bebê fosse um menino e Amélia rezou para que o marido não tomasse nenhuma atitude contra o bebê, caso fosse uma menina. E não foi apenas uma menina, mas sim duas... Duas meninas... Gêmeas!

Ai Amélia... Papai vai ficar furioso com você... - Ana Luiza, a mais velha, segurava a mão de sua amiga e tinha lágrimas nos olhos.

Mas elas são tão lindas! - dizia Maria Augusta, a mais nova e mais alegre das três irmãs.

Só que o papai vai detestá-las! E vai brigar com você e conosco também! - Maria Eugênia era a mais séria das três e muito fatalista. Raramente sorria e vivia prevendo grandes catástrofes.

Meninas acalmem-se. O que o pai de vocês poderá fazer contra suas duas novas filhas ou contra mim? Fiquem tranquilas... Tudo vai dar certo! - Amélia queria realmente acreditar nisso, mas tinha um nó no estômago que a fazia temer pelo pior.

A expectativa não durou muito. No fim do dia Ângelo foi ver as novas filhas pela primeira vez. Sequer olhou para a esposa, dirigindo-se diretamente para o berço onde as duas menininhas estavam dormindo tranquilamente, enroladas em suas mantinhas brancas com fitas azuis, já que todo o enxoval foi feito para um menino e não para meninas, exigência do pai.

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Você também me traiu, Amélia. Como posso confiar numa molher que sequer consegue me dar o bambino maschio que tu sai que io voglio? - perguntou o marido.

Eu sinto muito, signore Ângelo... Eu rezei muito para que fosse um menino, apenas para agradá-lo, mas penso que Deus não deseja satisfazê-lo ainda. - respondeu Amélia magoada.

No parlare il nome de Dio em vão! - vociferou para Amélia, acordando as duas crianças que começaram a chorar ao mesmo tempo.

Por favor, meu senhor... Não as assuste! Não têm culpa por terem nascido meninas... - implorou Amélia tentando se levantar e sendo contida pela criada que entrou correndo quando ouviu o grito do patrão.

Dio Santo, io voglio afogare questi banbini no poço! - tornou a gritar o homem. – In due mesi ritorno a questo quarto. Io voglio que tu sei preparata per me, capicce?. Si é nata lautra banbina vocês vão tutti para um convento de madres, capicce?

Sim meu senhor! - Amélia chorava e tremia de medo e pensava numa forma de escapar com suas filhas e enteadas da ira de seu marido.

E para com questo pianjo! Não quero que il suo latte seque, para não ter que ouvir que tuas banbini morerom di fame. - ordenou novamente em voz alta.

Desculpe-me senhor meu marido. Vou me controlar a partir de agora.

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Os dias foram passando e Amélia tinha cada vez mais medo da hora em que o marido viesse cumprir o que prometeu.

E se não conseguir engravidar de um menino? E se for novamente uma menina ou duas? - perguntou certa manhã para Ana Luiza que segurava uma das gêmeas no colo.

Ah Amélia... Fique calma que Deus não há de nos desamparar. Você vai conseguir, vai ver! - respondeu a menina sorrindo com esperança.

“Queria que ele morresse!” - pensou Amélia na manhã do dia em que o marido viria como prometeu. - “Tenho verdadeiro horror quando penso neste velho resfolegando sobre o meu corpo novamente! O que será de nós, meu Deus?” Amélia levantou-se da cama e chamou a criada a quem pediu que preparasse um banho. Foi direto ao berço para ver suas duas joias preciosas. “Estão dormindo como dois anjinhos, sem noção de nada do terror por que passam suas irmãs mais velhas e sua própria mãe.” - pensou.

Senhora... Seu banho já está pronto. Quer que a ajude? - perguntou a criada.

Sabe Maria... Meu marido nunca mais veio ver suas filhas desde o dia em que nasceram. Fico imaginando o que será que passa pela cabeça dele... - comentou Amélia pensativa.

Ah senhora... O seu Ângelo é assim mesmo! Dona Catarina também sofreu muito quando as meninas

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nasceram, porque ele fazia com ela a mesma coisa que fez com a senhora. Acho que a patroa morreu de tristeza, porque ela gostava muito do seu Ângelo, mesmo sendo ele como é. - respondeu Maria com tristeza.

Eu sei... Ana Luiza me contou toda a estória. É uma pena que o meu marido não reconheça o valor das mulheres que estão à sua volta. - comentou Amélia.

O dia passou muito vagarosamente. Amélia não teve coragem de sair do quarto e pediu à Maria que chamasse as meninas. Adorava conversar com as três e contar estórias para Maria Augusta, a mais apegada a ela.

Amélia... Você está com muito medo do papai? - perguntou Guta, como era carinhosamente chamada pelas irmãs e madrasta.

Não, meu amor... Não tenho medo do seu pai. Só tenho medo de não poder lhe dar o que ele deseja. - respondeu Amélia.

Mas é muito fácil, Amélia. Estive pensando... Os bebês não ficam dentro das barrigas de suas mães até poderem nascer? - perguntou a ingênua menina.

É sim, Guta... Mas porque você está dizendo isso? - perguntou Amélia intrigada.

Ora, é só nos irmos buscar um bebê menino bem pequenininho e colocar ele dentro da sua barriga. Assim, quando ele estiver prontinho nasce e o papai vai ficar contente com você. - Maria Augusta

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comoveu Amélia a ponto de fazê-la encher os olhos de lágrimas.

Ora Guta... Não é assim que as coisas funcionam! - falou Maria Eugênia séria. - Não se pode colocar um menino dentro da barriga da mãe. Eles se formam lá, sem que ninguém os coloque.

E como eles vão parar lá? De algum jeito isso tem que acontecer! Você é mesmo “burra” Geni! - Guta tinha as mãozinhas na cintura e falava com grande sabedoria.

Meninas... Não briguem... Não veem que Amélia está sofrendo? - ralhou Ana Luíza.

Deixe Lulu... Meninas, quando vocês crescerem mais um pouquinho eu lhes conto como é que um bebê se forma dentro de nossas barrigas, está certo? Por enquanto basta que você saiba Guta, que não podemos realmente colocar um bebê dentro de nossas barrigas da forma como você está pensando que é possível. Um dia deste lhe conto como é. Agora me deixem sozinha um pouco que daqui a pouco o pai de vocês vai chegar e virá direto para cá. - pediu Amélia por fim. As meninas mais novas saíram ainda discutindo como fazer um menino entrar na barriga de Amélia e sendo repreendidas pela mais velha que tentava fazê-las parar de comentar sobre aquilo, antes que o pai as ouvisse.

“Má!” O quê que vocês estão cochichando? É alguma coisa pecaminosa que não deveriam estar

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comentando? - interrompeu o pai que acabava de aparecer no alto da escada.

N-não papai! E-estávamos apenas conversando em voz baixa para não acordar as gêmeas. E não era nada pecaminoso papai - respondeu Ana Luíza nervosa.

Então andate via para o tuo quarto. Non voglio que vocês fiquem qüi, capicce? - perguntou Ângelo naquele tom que não admitia nem resposta e fazendo as três irmãs correrem em direção ao quarto da mais velha. Frequentemente dormiam todas juntas na cama de Ana Luíza, por temerem o aparecimento do pai à noite, o que as enchia de pesadelos. Amélia já tinha ouvido a voz do marido. Seu coração batia acelerado ante a perspectiva da entrada de Ângelo em seu quarto. Rezou para que nenhuma das filhas acordasse enquanto ele estivesse em seus aposentos e preparou-se. Uma hora mais tarde Ângelo irrompeu quarto adentro vestido em sua camisola de dormir.

Agora io voglio um banbino maschio, capicce? No voglio lautra banbina! – gritou para Amélia. Resignada, Amélia deitou-se na cama. Ângelo deitou-se ao seu lado e, sem maiores delongas, levantou sua camisola e a de Amélia para “resolver” logo a questão. Subiu no corpo da esposa e quando atingiu o clímax do ato, parou repentinamente de respirar, transformando-se num