Gestao Da Cadeia de Suprimentos - Carne Suina

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GESTÃO DA CADEIA DE SUPRIMENTOS E A SEGURANÇA DO ALIMENTO: UMA PESQUISA EXPLORATÓRIA NA CADEIA EXPORTADORA DE CARNE SUÍNA Edson Talamini CEPAN, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. João Pessoa, 31, CEP 90040-000, Porto Alegre, RS, e-mail: [email protected] Eugenio Avila Pedrozo Escola de Administração, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. Washington Luiz, 855, sala 412, CEP 90010-405, Porto Alegre, RS, e-mail: [email protected] Andrea Lago da Silva GEPAI, Departamento de Engenharia de Produção, UFSCar, Rod. Washington Luís, km 235, CEP 13565-905, São Carlos, SP, e-mail: [email protected] Recebido em 30/6/2004 Aceito em 03/3/2005 Resumo A crescente preocupação com a segurança dos alimentos propõe que as cadeias produtivas tenham maior domínio sobre o processo produtivo. A Gestão da Cadeia de Suprimentos, aqui genericamente tratada de SCM (Supply Chain Management), pode apresentar importante contribuição na obtenção de um processo mais uniforme ao longo da ca- deia, facilitando o compartilhamento de informações e práticas produtivas. Este artigo tem como objetivo principal identificar a estrutura, as ligações e o nível de integração da Cadeia de Suprimentos da carne suína brasileira desti- nada à exportação, seguindo o modelo de Lambert et al. (1998), bem como as relações da SCM com a valorização de atributos da carne suína e a implementação de programas de segurança do alimento. A pesquisa empírica foi baseada em uma amostra de dez agroindústrias que atuam nesse setor, as quais foram responsáveis por aproximadamente 73% da quantidade de suínos abatidos em 2002. Os resultados mostram uma cadeia de suprimentos com forte influência da empresa focal (agroindústrias), cuja maioria das ligações com os demais níveis de fornecedores e compradores são do tipo gerenciadas. Estas constatações, somadas àquelas que revelam a importância da SCM na valorização de certos atributos da carne suína e na implementação de programas de segurança do alimento, colocam as agroindús- trias como membros-chave para o direcionamento de políticas de promoção da segurança do alimento da carne suína brasileira. Palavras-chave: gestão da cadeia de suprimentos, segurança do alimento, carne suína. v.12, n.1, p.107-120, jan.-abr. 2005 1. Introdução O objetivo principal a ser atingido pelas cadeias de suprimentos tem sido ampliar cada vez mais o valor per- cebido dos produtos que serão entregues ao consumidor final. A percepção do valor pelos consumidores está inti- mamente ligada aos atributos que estes mais valorizam. Estes atributos variam de produto para produto, podendo variar ao longo do tempo. Um exemplo disso é a crescen- te preocupação com segurança do alimento após os casos de contaminação de alimentos, principalmente carnes, que causaram vítimas fatais. Esses fatos geraram uma mudança na percepção de valor do atributo “segurança do alimento” quando o consumidor compra alimentos. Essa mudança no comportamento do consumidor mi- nimizaria os impactos sobre as cadeias produtivas se ao menos duas variáveis correlacionadas estivessem presen- tes. Primeiro, se houvesse distribuição uniforme ou igua- litária de informações ao longo da cadeia produtiva. E, segundo, se houvesse um ator da cadeia, de preferência o mais próximo do consumidor, que estivesse preparado para coordenar todo o processo produtivo. Na prática, as relações de mercado mostram situações diferentes. As informações entre produtores e consumi- dores são geralmente assimétricas (Akerlof, 1970) e as cadeias produtivas buscam amenizar seus efeitos por

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Gestao Da Cadeia de Suprimentos - Carne Suina

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  • GESTO DA CADEIA DE SUPRIMENTOS E A SEGURANA DO ALIMENTO: UMA PESQUISA EXPLORATRIA NA CADEIA EXPORTADORA

    DE CARNE SUNAEdson Talamini

    CEPAN, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. Joo Pessoa, 31, CEP 90040-000, Porto Alegre, RS,

    e-mail: [email protected]

    Eugenio Avila Pedrozo

    Escola de Administrao, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. Washington Luiz, 855, sala 412, CEP 90010-405, Porto Alegre, RS,

    e-mail: [email protected]

    Andrea Lago da Silva

    GEPAI, Departamento de Engenharia de Produo, UFSCar, Rod. Washington Lus, km 235, CEP 13565-905, So Carlos, SP,

    e-mail: [email protected]

    Recebido em 30/6/2004 Aceito em 03/3/2005

    Resumo

    A crescente preocupao com a segurana dos alimentos prope que as cadeias produtivas tenham maior domnio sobre o processo produtivo. A Gesto da Cadeia de Suprimentos, aqui genericamente tratada de SCM (Supply Chain Management), pode apresentar importante contribuio na obteno de um processo mais uniforme ao longo da ca-deia, facilitando o compartilhamento de informaes e prticas produtivas. Este artigo tem como objetivo principal identicar a estrutura, as ligaes e o nvel de integrao da Cadeia de Suprimentos da carne suna brasileira desti-nada exportao, seguindo o modelo de Lambert et al. (1998), bem como as relaes da SCM com a valorizao de atributos da carne suna e a implementao de programas de segurana do alimento. A pesquisa emprica foi baseada em uma amostra de dez agroindstrias que atuam nesse setor, as quais foram responsveis por aproximadamente 73% da quantidade de sunos abatidos em 2002. Os resultados mostram uma cadeia de suprimentos com forte inuncia da empresa focal (agroindstrias), cuja maioria das ligaes com os demais nveis de fornecedores e compradores so do tipo gerenciadas. Estas constataes, somadas quelas que revelam a importncia da SCM na valorizao de certos atributos da carne suna e na implementao de programas de segurana do alimento, colocam as agroinds-trias como membros-chave para o direcionamento de polticas de promoo da segurana do alimento da carne suna brasileira.

    Palavras-chave: gesto da cadeia de suprimentos, segurana do alimento, carne suna.

    v.12, n.1, p.107-120, jan.-abr. 2005

    1. IntroduoO objetivo principal a ser atingido pelas cadeias de

    suprimentos tem sido ampliar cada vez mais o valor per-cebido dos produtos que sero entregues ao consumidor nal. A percepo do valor pelos consumidores est inti-mamente ligada aos atributos que estes mais valorizam. Estes atributos variam de produto para produto, podendo variar ao longo do tempo. Um exemplo disso a crescen-te preocupao com segurana do alimento aps os casos de contaminao de alimentos, principalmente carnes, que causaram vtimas fatais. Esses fatos geraram uma mudana na percepo de valor do atributo segurana do alimento quando o consumidor compra alimentos.

    Essa mudana no comportamento do consumidor mi-nimizaria os impactos sobre as cadeias produtivas se ao menos duas variveis correlacionadas estivessem presen-tes. Primeiro, se houvesse distribuio uniforme ou igua-litria de informaes ao longo da cadeia produtiva. E, segundo, se houvesse um ator da cadeia, de preferncia o mais prximo do consumidor, que estivesse preparado para coordenar todo o processo produtivo.

    Na prtica, as relaes de mercado mostram situaes diferentes. As informaes entre produtores e consumi-dores so geralmente assimtricas (Akerlof, 1970) e as cadeias produtivas buscam amenizar seus efeitos por

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    meio do uso de sinais que garantam ao consumidor o atendimento a determinados padres (Spence, 1973). Por outro lado, coordenar a cadeia produtiva, tornando mais prximas as relaes entre os atores, tem sido uma alter-nativa com crescente implementao em diversas reas e por diferentes atores ao longo das cadeias, no apenas para o caso de garantir a segurana dos alimentos, mas tambm para obter outras vantagens que podem advir des-se processo, tais como a reduo dos custos de transao.

    As cadeias produtivas de carnes, especialmente, po-dem obter essas mltiplas vantagens ao implementar sis-temas de gesto da cadeia de suprimentos (Supply Chain Management SCM), permitindo um processo mais con-vel e com resultados previsveis, dada a proximidade e a troca mais intensas de informaes entre os atores. O Brasil tem se caracterizado como um novo entrante no mercado mundial de carne suna, aumentando sua par-ticipao em termos de volume produzido e exportado e sendo um dos poucos pases com capacidade de ampliar signicativamente sua produo. Nos ltimos dez anos, o Brasil foi o pas que mais aumentou o volume de carne suna exportada, tornando o mercado externo um impor-tante diferencial como fonte de recursos nanceiros e de desenvolvimento interno. Contudo, para consolidar uma posio de importante player mundial, dever estar apto a atender a um mercado comprador extremamente exi-gente e que requer cuidados especiais no atendimento a atributos como segurana do alimento.

    Neste contexto, o uso dos conceitos associados SCM da carne suna brasileira produzida para exportao pode, alm de outros benefcios, facilitar a implementao de programas de segurana do alimento de forma conjun-ta, gerando produtos que sero entregues ao consumidor com maior valor percebido. O estudo de Talamini (2003) mostra que os conceitos de SCM so amplamente utiliza-dos pela cadeia exportadora de carne suna brasileira, es-pecialmente pelas agroindstrias, e que podem facilitar a implementao de programas de segurana do alimento. Exemplos desses programas so rastreabilidade, transpa-rncia e garantia de segurana e qualidade dos alimentos (Liddell e Bailey, 2001). Isso ressalta a importncia dos atores da cadeia produtiva em atuar como coordenadores desse processo. As principais questes a serem respon-didas so: qual a estrutura da cadeia de suprimentos da carne suna brasileira destinada exportao? Qual o principal ator em um processo de implantao dos con-ceitos de gesto da cadeia de suprimentos e os principais processos gerenciados por ele? Qual o nvel de integra-o entre os atores? A SCM facilita a implementao de programas de segurana do alimento? Quais atributos da carne suna exportada so valorizados aps a implanta-o dos conceitos de gesto da cadeia de suprimentos?

    Este estudo tem como objetivo identicar a estrutura da cadeia de suprimentos da carne suna brasileira des-

    tinada exportao, seu principal ator no processo de gesto e o nvel de integrao entre os atores. Alm dis-so, procurou-se avaliar o impacto da gesto da cadeia de suprimentos sobre os atributos da carne suna exportada e na implementao de programas de segurana do alimen-to. Para tanto, a base terica utilizada foram os conceitos desenvolvidos por Lambert et al. (1998) para a anlise da gesto da cadeia de suprimentos.

    Alm do presente tpico introdutrio, o presente es-tudo composto por outros quatro tpicos principais. No tpico a seguir so apresentados aspectos tericos relacionados ao conceito de segurana do alimento e a Gesto da Cadeia de Suprimentos. No terceiro tpico so apresentados aspectos relativos aos mtodos e procedi-mentos utilizados para desenvolver o presente estudo. Os resultados obtidos so discutidos no quarto tpico, de acordo com a estrutura de anlise proposta nos mtodos e procedimentos. Finalmente, so feitas algumas conside-raes acerca dos resultados obtidos.

    2. Reviso de literatura

    2.1 Segurana alimentar X segurana do alimento - alguns conceitos explicativos

    O termo segurana alimentar apresenta dupla in-terpretao. Uma delas est associada ao termo ingls Food Security, sendo concebida sob uma tica quanti-tativa. Segundo a FAO Food and Agriculture Organiza-tion , a segurana de existncia de comida para todas as pessoas, a toda hora, terem acesso fsico e econmico comida suciente, segura e nutritiva (...) para uma vida ativa e saudvel (FAO, 2003). A outra interpretao est associada ao termo Food Safety, sendo traduzida como a garantia de o consumidor adquirir um alimento com atributos de qualidade que sejam de seu interesse, entre os quais se destacam os atributos ligados sua sade e segurana (Spers, 2000, p. 286). Neste trabalho o termo segurana do alimento aquele relacionado aos aspec-tos qualitativos do alimento, uma vez que os programas de Rastreabilidade, Transparncia e Garantia utilizados para mensurar o desempenho da cadeia produtiva esto basea-dos em prticas que levam qualidade da carne suna.

    A segurana do alimento pode apresentar certos riscos associados. Exemplos de atributos e de riscos associados so: nutricional/fsico-sade, valor/gosto, segurana do alimento/sade, entre outros (Fearne et al., 2001). Com os fatos relacionados falta de segurana dos alimentos ocorridos nas ltimas dcadas, o atributo segurana do alimento tornou-se ainda mais valorizado, especialmen-te para carnes. No entanto, nem todos os atributos podem ser avaliados pelos consumidores no momento da com-pra. O nvel de contaminao por microorganismos e/ou resduos qumicos, por exemplo, s poder ser determi-

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    nado por meio de testes laboratoriais mais sosticados. Nesse contexto, como o consumidor poder saber qual o nvel de segurana presente nos alimentos que est ad-quirindo? As cadeias agroindustriais esto preocupadas com essa situao e buscam tranqilizar o consumidor informando-lhe sobre as condies sob as quais um de-terminado alimento foi produzido. O processo produtivo como um todo, desde as matrias-primas at a entrega do alimento ao consumidor, deve ser realizado sob certos padres especcos de higiene, limpeza e segurana, e estar em constante avaliao para que possa sinalizar aos consumidores que o alimento seguro.

    As prticas dos processos produtivos de alimentos, no que se referem segurana do alimento, esto ampla-mente amparadas em um conjunto de programas e nor-mas que visam garantir as condies adequadas para que isso ocorra. Liddel e Bailey (2001), por exemplo, utiliza-ram um conjunto de programas de segurana do alimento para comparar o desempenho das cadeias produtivas de carne suna de alguns pases. Estes programas esto ba-seados na rastreabilidade e na transparncia do processo produtivo, bem como na garantia da qualidade extrnse-ca (bem-estar animal, preservao ambiental, etc.) e da segurana do alimento por meio de prticas que podem beneciar atributos intrnsecos da qualidade, tais como: as Boas Prticas de Manufatura BPM e a Anlise de Perigos e Pontos Crticos de Controle APPCC. Eles le-varam em conta os nveis de disponibilidade desse con-junto de programas para os diferentes nveis das cadeias produtivas, uma vez que, para um alimento efetivamente seguro, todos os atores devem estar conscientes da neces-sidade de adotarem tais prticas.

    2.2 Gesto da Cadeia de SuprimentosOs processos produtivos independentes so cada vez

    mais raros em oposio a uma crescente especializao das atividades inter e intrarmas que compem uma ca-deia de valor. A diviso cada vez maior das etapas ou ati-vidades que agregam valor aos produtos tem aumentado signicativamente a necessidade de transaes at chegar ao produto nal com o mximo de valor adicionado. Isso implica que, nesta condio, uma simples transao co-mercial tem reexos no apenas sobre o vendedor e o comprador, mais diretamente envolvidos, mas sobre todo o sistema de valor. Logo, o impacto ser to abrangente quanto a amplitude e a profundidade do sistema de va-lor que deu origem ao produto transacionado, devido ao efeito em cascata que ocorre entre os diferentes nveis do sistema.

    Diante da complexidade do ambiente, as empresas buscam alternativas para melhorar seu desempenho. De acordo com Al-Mudimgh et al. (2004), a gesto da cadeia de suprimentos reconhecida como um conceito capaz de agregar benefcios tanto de natureza estratgica quanto

    operacional. Este conceito envolve a gesto das mltiplas relaes existentes ao longo da cadeia de suprimentos, oportunizando ganhos de sinergia na integrao intra e interorganizaes, isto , a SCM enfoca a excelncia dos processos da atividade como um todo e representa uma nova maneira de gerenciar os negcios e as relaes com outros membros da cadeia de suprimentos (Lambert et al., 1998).

    Este conceito surgiu na dcada de 1980 e no princpio, e talvez ainda permaneam alguns erros de interpretao, foi confundido com logstica. Cooper et al. (1997) mos-tram claramente as diferenas entre os conceitos de lo-gstica e SCM. Sem detalhar pormenorizadamente essas diferenas, observa-se que, diferentemente da logstica, a gesto da cadeia de suprimentos busca integrar dife-rentes processos de negcio intra e interorganizaes. De acordo com Cooper et al. (1997), existe uma diferena fundamental entre os conceitos de gesto da cadeia de suprimentos e o de gesto da logstica integrada. Essa di-ferena diz respeito aos relacionamentos e mesmo s par-cerias entre empresas, uma vez que a gesto da cadeia de suprimentos envolve maior gama de processos e funes do que a gesto da logstica integrada. Ou seja, a gesto da cadeia de suprimentos, no entender dos autores, acaba por modicar muitos dos processos organizacionais sob os quais a Logstica no teria poder, nem conhecimento para interferir.

    A gesto da cadeia de suprimentos tem seu conceito discutido por vrios autores. Segundo Batalha e Silva (2001), a capacidade de coordenao entre as atividades de produo e de distribuio desenvolvidas pelas empre-sas com o objetivo de reagir mais prontamente s opor-tunidades de negcios, ou como dene Albertin (2000, p. 67), o gerenciamento da cadeia produtiva desde o fornecimento da matria-prima at a rede de distribuio dos produtos. Um conceito de SCM amplamente utiliza-do na literatura o utilizado por Lambert e Cooper (2000) com base na denio do Global Supply Chain Forum (GSCF): a gesto da cadeia de suprimentos a integrao dos processos-chave de um negcio partindo do usurio nal at os fornecedores iniciais de produtos, servios e informaes que adicionem valor para o comprador e para outros stakeholders. Uma Cadeia de Suprimentos composta por diversos agentes que atuam ativamente no sentido de atender demanda do mercado consumidor. Esse conjunto de agentes no est preocupado apenas em disponibilizar produtos e servios em quantidade, quali-dade e preo esperados pelos clientes, mas atuam como estimuladores da demanda dos seus produtos.

    De acordo com Hadley (2004), o principal propsito de uma cadeia de suprimentos dar suporte a todas as estratgias competitivas e s metas de uma empresa, e, por este motivo, ela deve estar alinhada com as estrat-gias competitivas das empresas. No caso da cadeia de

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    suprimentos da carne suna exportada, como menciona-do na introduo, considera-se que o valor a ser criado e entregue ao consumidor um produto com atributo de segurana do alimento.

    Atualmente, com o crescente nmero de estudos rea-lizados, o conhecimento sobre SCM amplo devido ao grande nmero de variveis presentes numa cadeia de suprimentos. Anlises interessantes e usuais na literatura sobre SCM so aquelas desenvolvidas com base no es-quema elaborado por Cooper et al. (1997). Segundo esses autores, a SCM seria o meio de ligao entre trs elemen-tos bsicos como pode ser visto na Figura 1.

    Este estudo analisar parcialmente os trs elementos propostos neste esquema: a estrutura da cadeia de supri-mentos, os tipos de ligaes que envolvem os processos de negcios e o nvel de integrao como componente da SCM. Apesar da importncia dos processos chave de gesto das atividades ao longo da Cadeia de Suprimen-tos, estes no sero analisados neste momento. O foco da reviso de literatura a partir deste ponto ser naqueles elementos que serviro de base para atingir os objetivos do estudo proposto.

    2.2.1 Estrutura de uma Cadeia de Suprimentos

    A estrutura de uma cadeia de suprimentos composta por todas as empresas que, de alguma forma, participam do processo produtivo. A dimenso de uma cadeia de suprimentos ser denida pela quantidade de membros que a complexidade do processo produtivo exigir para ser realizado. Contudo, nem todos os membros de uma ca-deia de suprimentos possuem a mesma importncia sob o ponto de vista da anlise e gerenciamento da cadeia. Os membros de uma cadeia de suprimentos so deni-dos como primrios ou de apoio. Os membros primrios so todas aquelas empresas autnomas ou unidades es-tratgicas de negcios que executam, de fato, atividades

    operacionais e/ou administrativas nos processos empre-sariais designadas a produzir um bem especco para um cliente ou um mercado particular. Contrastando como os membros primrios da cadeia de suprimentos esto os membros de apoio, que so aquelas empresas cuja funo fornecer recursos, conhecimento, utilidades ou ativos para os membros primrios. Apesar de desempenharem atividades relevantes dentro da cadeia de suprimentos, estes membros no participam diretamente na realizao de atividades de transformao que adicionem valor para o consumidor nal (Lambert et al., 1998). Segundo es-ses autores, tendo denidos os membros primrios e de apoio, possvel denir o ponto de origem e o ponto de consumo da cadeia de suprimentos. O ponto de origem ocorre onde no existirem outros fornecedores prim-rios, ou seja, todos aqueles membros anteriores sero de apoio. O ponto de consumo onde nenhum valor a mais adicionado ao produto, ou seja, onde o produto efeti-vamente consumido.

    A estrutura de uma cadeia de suprimentos, analisada a partir de uma empresa focal, com suas ligaes com outros membros da cadeia est representada na Figura 2. A empresa focal aquela a partir da qual a cadeia de suprimentos analisada, tanto nas ligaes desta com os fornecedores de matrias-primas, quanto com os demais membros posteriores a ela. Dessa forma, cada empresa de uma cadeia de suprimentos, alm de pertencer a outras, possui sua prpria cadeia de suprimentos, sendo que cada cadeia apresenta uma dimenso estrutural especca.

    De acordo com Lambert et al. (1998), as dimenses estruturais de uma cadeia ou rede so essenciais para des-crever, analisar e gerenciar uma cadeia de suprimentos. Essas dimenses so: a estrutura horizontal, a estrutura vertical e a posio horizontal da empresa focal dentro da cadeia de suprimentos. A estrutura horizontal se re-fere ao nmero de nveis ou camadas existentes ao longo da cadeia. A cadeia de suprimentos representada na Fi-gura 2 seria composta por trs nveis de fornecedores e trs nveis de compradores em relao empresa focal. A cadeia de suprimentos pode ter uma estrutura horizontal longa, apresentando vrios nveis de fornecedores e/ou compradores, ou curta, quando possui poucos nveis. Ao nmero de fornecedores/compradores existentes dentro de cada nvel denomina-se estrutura vertical. Esta pode ser estreita, quando poucas empresas esto presentes em cada nvel, ou ampla, quando muitas empresas esto pre-sentes em cada nvel. Uma empresa pode estar posicio-nada horizontalmente mais prxima ao ponto de origem, ou mais prxima ao ponto de consumo ou em qualquer posio entre o incio e m da cadeia de suprimentos (Lambert et al., 1998).

    Segundo Lambert e Cooper (2000), a complexidade exigida para o gerenciamento de todos os fornecedores partindo do ponto de origem, e todos os produtos, pro-

    Processos de Negcio na Cadeia

    de Suprimentos

    Componentesda SCM

    Estrutura da Cadeia

    3) Qual o nvel de integraoe gesto que deve seraplicado em cada link

    2) Como os processos podemser interconectados e quaisso chaves para os membrosda cadeia

    1) Quem so os membroschave e com quais ligar queprocessos

    Figura 1. Esquema dos elementos e decises-chave da SCM. Fonte: Lambert et al., 1998.

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    cessos e servios at o ponto de consumo, provavelmente seria suciente para explicar a razo pela qual os execu-tivos deveriam gerenciar suas cadeias de suprimentos a partir do ponto de consumo, pois todo aquele que pos-sui relaes com o consumidor nal ter poder sobre a cadeia de suprimentos. Entretanto, vale lembrar que Al-Mudimgh et al. (2004) armam que o a gesto da cadeia de suprimentos, enquanto conceito, no ampla sucien-te para capturar necessidades futuras dos clientes nais, como estas podero ser atendidas e nem sempre inclui uma avaliao ps-consumo/entrega e na construo dos relacionamentos com estes clientes nais.

    2.2.2 Tipos de ligaes entre os membros da Cadeia de Suprimentos

    A estrutura da rede de uma cadeia de suprimentos, como visto anteriormente, pode apresentar-se complexa e com diversas ligaes entre seus membros a m de atin-gir o objetivo nal da cadeia e entregar um produto com valor para o consumidor nal. Este objetivo atingido pela conuncia de diversas atividades, como: operaes de transformao, transporte, troca de informaes, u-xo de recursos nanceiros, entre outros. Embora existam diversos processos especcos para acompanhar o desen-volvimento destas atividades, tais como o processo de gesto das relaes com o consumidor (o uso de ferra-mentas de CRM - Customer Relationship Management, por exemplo), o processo de gesto do servio ao con-sumidor, dentre outros. O interesse aqui est focado em saber quais os tipos de ligaes existentes entre os mem-bros de uma cadeia de suprimentos na execuo do con-junto de atividades que a levam a atingir seus objetivos.

    De acordo com Lambert e Cooper (2000), a integra-o e o gerenciamento de todas as ligaes de todos os

    processos interorganizacionais ao longo da cadeia de su-primentos so impraticveis. Como a necessidade de in-tegrao depende de situao para situao, os nveis de integrao podem variar de um caso para outro e tambm ao longo do tempo. Como algumas ligaes so mais cr-ticas que outras, e, como os recursos so limitados, deci-dir em quais tarefas concentrar os esforos, parece fun-damental. Nesse sentido, foram identicados quatro tipos fundamentais de ligaes empresariais entre os membros de uma cadeia de suprimentos:

    i) ligaes de processos gerenciados (Managed Process Links): so aquelas ligaes relativas a processos que a empresa focal acha importante integr-los e geren-ci-los; representadas na Figura 3 pelas linhas slidas e de maior espessura; como representado nesta gu-ra, a empresa focal est integrando e gerenciando as ligaes de processos realizados com os membros do primeiro nvel de fornecedores e compradores, embo-ra mantenha outras ligaes com alguns membros de outros nveis;

    ii) ligaes de processos monitorados (Monitored Process Links): apesar de no serem processos crticos para a empresa focal, so sucientemente importantes para a empresa focal manter algum vnculo, mesmo que eles sejam integrados e gerenciados por outros membros da cadeia de suprimentos; o papel da empresa focal neste caso, passa a ser de monitorao dessas atividades por meio de auditorias, por exemplo; esse tipo de ligao aquele representado, na Figura 3, pelas linhas traceja-das de maior espessura;

    iii) ligaes de processos no-gerenciados (Non-managed Process Links): so aquelas ligaes nas quais a em-presa focal no est diretamente envolvida, ou seja, so

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    Figura 2. Estrutura da rede de uma cadeia de suprimentos. Fonte: Lambert et al., 1998.

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    processos no crticos ou no importantes o suciente para que sejam investidos recursos na sua gesto ou monitorao; desta forma, a empresa focal cona a ou-tro membro da cadeia de suprimentos esta tarefa; esse tipo de ligao representado pelas linhas contnuas de menor espessura na Figura 3; e

    iv) ligaes de processos com no-membros (Non-mem-ber Process Links): so ligaes de processos entre membros da cadeia de suprimentos da empresa focal e outros membros que no pertencem nica e exclusi-vamente a esta cadeia de suprimentos, os denominados no-membros; as ligaes com no-membros no so consideradas como ligaes da estrutura da cadeia de suprimentos da empresa focal, mas tais ligaes podem ter implicaes sobre o desempenho da cadeia de su-primentos da empresa focal; essas ligaes so repre-sentadas pelas linhas tracejadas de menor espessura, apresentadas na Figura 3.

    Uma cadeia de suprimentos, portanto, pode apresentar diversas conguraes no que diz respeito aos tipos de ligaes de processos empresarias entre seus membros, cadeias de suprimentos cuja rede de ligaes interempre-sas pode ter maior ou menor densidade. Certamente, a densidade aumenta medida que um nmero maior de processos se torna crtico para a empresa focal, tornan-do-se interessante para ela ter algum controle sobre o processo produtivo, uma vez que isso pode lhe assegurar uma performance positiva sob o ponto de vista de forne-cer produtos com valor ao consumidor.

    Quando a segurana do alimento um atributo de va-lor a ser entregue ao consumidor, por exemplo, a SCM pode ser fundamental para atingir tal objetivo. Em seu es-

    tudo, Bogetoft e Olesen (2004) identicaram que a estru-tura da cadeia de suprimentos inuencia diretamente nos resultados nais do controle de Salmonella pela cadeia produtora de carne suna da Dinamarca. Quanto maior a distncia existente entre os membros da cadeia, maio-res os custos e piores os resultados. Conseqentemente, menor valor ser oferecido ao consumidor nal em ter-mos de segurana do alimento.

    2.2.3 Nvel de integrao na Cadeia de Suprimentos

    Apesar de o nvel de gesto dos processos de neg-cios fazerem parte dos componentes de uma cadeia de suprimentos, o enfoque que ser dado neste trabalho ser sobre o nvel de integrao. Segundo Lambert e Cooper (2000), o nvel de integrao de uma cadeia de suprimen-tos uma funo do nvel e do nmero de componentes adicionados a uma ligao, podendo variar de baixo a alto nvel de integrao. Ou seja, medida que novos compo-nentes de gesto vo sendo adicionados s ligaes entre os membros de uma cadeia de suprimentos, maior tende a ser o nvel de integrao entre eles. Existem pelo menos nove componentes de gesto que podem e/ou devem ser observados para a gesto de uma cadeia de suprimentos, alguns com maior impacto que outros, mas todos com importncia relativa. medida que estes componentes so implementados, aumenta-se a integrao da cadeia de suprimentos. Esses componentes so: planejamento e controle, estrutura de trabalho, estrutura de organizao, estrutura para o uxo de produtos, estrutura para o uxo de informao, mtodos de gesto, estrutura de poder e liderana, estrutura de risco e recompensa e, cultura e ati-tude (Lambert e Cooper, 2000).

    Forn

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    Ligaes de Processos GerenciadosLigaes de Processos MonitoradosLigaes de Processos No-GerenciadosLigaes de Processos com No-Membros

    Empresa FocalMembros da Cadeia de Suprimentos da Empresa FocalNo-Membros da Cadeia de Suprimentos da Empresa Focal

    Fornecedores de 3 nvel ou de

    ponto de origem

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    Figura 3. Tipos de ligaes de processos organizacionais interorganizaes. Fonte: Lambert et al., 1998.

  • 113GESTO & PRODUO, v.12, n.1, p.107-120, jan.-abr. 2005

    Segundo esses autores, os nove componentes podem ser alocados em dois grupos: a) Grupo I Componentes Tcnicos e Fsicos de Gesto:

    planejamento e controle, estrutura de trabalho, estrutura de organizao, estrutura para o uxo de produtos, es-trutura para o uxo de informao; e

    b) Grupo II Componentes Gerenciais e Comportamen-tais de Gesto: mtodos de gesto, estrutura de poder e liderana, estrutura de risco e recompensa, e de cultura e atitude.

    Os componentes do Grupo I apresentam caractersticas mais visveis, tangveis, mensurveis e de fcil mudana, enquanto que os do Grupo II so menos visveis e tang-veis, alm da diculdade de acess-los e alter-los. Contu-do, so os componentes do Grupo II que denem o com-portamento organizacional e inuenciam na forma como os componentes fsicos e tcnicos sero implementados.

    3. Mtodos e procedimentosO presente estudo se caracteriza como uma pesquisa

    exploratria (Gil, 2002) aplicada cadeia exportadora de carne suna. A populao de estudo possua 26 agroin-dstrias exportadoras de carne suna aliadas a ABI-PECS Associao Brasileira da Indstria Produtora e Exportadora de Carne Suna no ano de 2003 (ABI-PECS, 2003a). O motivo de optar pelas agroindstrias como empresas focais se deve ao conhecimento emprico de que se dispunha sobre a inuncia destas ao longo da cadeia de suprimentos. A pesquisa de campo foi realiza-da entre abril e setembro de 2003.

    A principal fonte de dados foi um questionrio estru-turado, enviado por correio eletrnico. Foi realizado um pr-teste do questionrio com 5 agroindstrias, das quais 3 responderam. Pequenos ajustes foram feitos na estru-tura do questionrio de maneira que os questionrios recebidos no pr-teste foram utilizados na anlise dos re-sultados. Na seqncia, o questionrio foi enviado para as 21 agroindstrias restantes. Destas, 8 retornaram o ques-tionrio respondido, mas apenas 7 deles puderam ser apro-veitados. A amostra nal para a anlise dos resultados foi composta por 10 (dez) agroindstrias, ou seja, 38,5% do conjunto de elementos da populao. Contudo, esse valor signicativo se analisada a participao das agroinds-trias da amostra na quantidade total de sunos abatidos no Brasil. A quantidade de animais abatidos por essas agroindstrias correspondeu a mais de 72% do total de sunos abatidos no Brasil em 2002 (ABIPECS, 2003b).

    Outras fontes para a coleta de dados foram utilizadas, tais como: pginas de empresas e entidades na Internet, correspondncias pessoais via correio eletrnico, conver-sas telefnicas com funcionrios das agroindstrias. A anlise dos dados foi realizada por meio de um processo de triangulao entre os dados obtidos por meio das di-

    ferentes fontes, de maneira a obter resultados mais con-sistentes. De acordo com a problemtica e os objetivos propostos para este trabalho, buscou-se trabalhar com parte do esquema de anlise da SCM proposto por Lam-bert et al. (1998), conforme representado na Figura 4. O questionrio contava com questes que possibilitaram identicar variveis que denem a estrutura da cadeia de suprimentos da carne suna, ou seja, quais so os mem-bros da cadeia de suprimentos e como esto distribudos a montante e a jusante da empresa focal. Embora a em-presa focal seja aquela a partir da qual o estudo da cadeia de suprimentos realizado, foram introduzidas questes que permitiram conrmar a importncia desses membros no gerenciamento da cadeia de suprimentos e identicar alguns processos importantes sobre os quais elas exer-cem algum controle.

    Outras questes objetivaram identicar, junto s agroindstrias, as percepes destas quanto: inun-cia dos conceitos associados SCM na implementao de programas de segurana do alimento e sobre quais atributos da carne suna exportada so positivamente inuenciados pela SCM. Ou seja, para efeito deste es-tudo, a segurana do alimento tida como o valor nal a ser fornecido ao consumidor. A mensurao do nvel de integrao da cadeia de suprimentos baseou-se em componentes tcnicos e fsicos. Para tanto, assumiu-se como indicador da implementao desses componentes as pontuaes obtidas pela cadeia da carne suna para a implementao de programas de segurana do alimento, conforme estudo realizado por Talamini (2003).

    Os resultados foram obtidos com base na interpretao dos dados coletados, luz do referencial terico esco-lhido, para cada uma das agroindstrias individualmen-te, quando comparadas algumas variveis entre elas no momento da caracterizao. Para a anlise da cadeia de suprimentos como um todo, levou-se em considerao a participao relativa de cada agroindstria na quantidade total de sunos abatidos, calculando-se, com base nisso,

    Espao de anlise do presente estudo

    2

    13Estrutura da Cadeia

    de Suprimentos

    Cadeias deProcessos

    Empresariais

    ProcessosEmpresariais

    Tipos deLigaes

    Nvel deIntegrao

    Nvel deGesto

    Figura 4. Espao de anlise. Fonte: Adaptado de Lam-bert e Cooper, 2000.

  • 114 Talamini et al. Gesto da Cadeia de Suprimentos e a Segurana do Alimento: Uma Pesquisa Exploratria...

    um fator ponderador. Esse fator ponderador pode ser vis-to na Tabela 1, no tpico dos resultados a seguir.

    4. ResultadosCom base na interpretao dos dados e informaes

    obtidas, foram estruturados alguns resultados com rela-o s caractersticas da amostra utilizada, a estrutura da cadeia de suprimentos da carne suna exportada, os tipos de ligaes presentes entre alguns membros da cadeia de suprimentos e as impresses das agroindstrias quanto ao papel ou inuncia da SCM na promoo de programas de segurana do alimento ao longo da cadeia e na valo-rizao de atributos da carne suna. Tais resultados so apresentados a seguir.

    4.1 Caracterizao da amostraPor questes j comentadas anteriormente, a amostra

    nal utilizada para este estudo foi composta por 10 (dez) agroindstrias. Para um melhor entendimento dos resul-tados e do contexto no qual eles foram obtidos, julgou-se importante apresentar algumas caractersticas deste con-junto de agroindstrias. Por solicitao destas, suas ra-zes sociais no sero divulgadas e sero substitudas por denominao de Agroindstria

    x ou AI

    x, sem seguir

    qualquer critrio especco para a ordem apresentada na Tabela 1.

    De acordo com dados apresentados na Tabela 1 perce-be-se que, em termos absolutos, a maioria das agroinds-trias pertence a cooperativas, mas a maior participao relativa em termos de quantidade abatida so das S.A.s, as quais, juntas, abatem mais de 70% da quantidade total da amostra. A localizao das agroindstrias da amostra est concentrada na Regio Sul do Brasil, especialmente nos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Ape-

    sar disso, sabe-se que outros Estados tambm possuem agroindstrias que atuam na exportao de carne suna, mas a concentrao maior nesta regio.

    Todas as agroindstrias exportaram no ano de 2002 e, em mdia, cada agroindstria possua 2 (duas) plantas frigorcas habilitadas a produzirem carne suna para ex-portao. Em mdia, cada agroindstria abateu, naquele ano, 1,2 milhes de animais, ou seja, 638 mil animais/ano/abatedouro. Desse dado, pode-se deduzir uma capa-cidade mdia diria de abate e processamento por planta frigorca superior a 2 mil animais/dia. Contudo, como as agroindstrias atuam apenas em parte do processo pro-dutivo, ou seja, existem outros membros a montante e a jusante, e um dos objetivos identicar a estrutura da cadeia de suprimentos, os resultados encontrados sobre essa estrutura so apresentados a seguir.

    4.2 Estrutura da Cadeia de SuprimentosSeguindo o modelo de anlise citado na reviso de li-

    teratura, buscou-se identicar a composio da estrutura da cadeia de suprimentos nas suas extenses horizontal e vertical, detectando alguns membros primrios e de apoio, bem como a posio da empresa focal ao longo da cadeia de suprimentos. Na Tabela 2 so apresentadas algumas caractersticas dos membros e atividades funda-mentais existentes ao longo da cadeia de suprimentos. O objetivo demonstrar, parcialmente, a representatividade das agroindstrias nos resultados que sero apresentados posteriormente, esquematizando a estrutura da cadeia de suprimentos como um todo, baseada nas caractersticas mais freqentes entre as agroindstrias.

    Se cada uma das agroindstrias da amostra for tomada como a empresa focal, haver uma cadeia de suprimen-tos especca para cada uma delas, ou seja, poderiam ser

    Tabela 1. Caractersticas da amostra.

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    Capital Social1 Ltda S.A. Coop. S.A. S.A. Coop. Coop. Coop. Coop. S.A.

    Localizao2 RS SC RS RS SC MT RS SC PR SC

    No Abatedouros3 01 02 01 01 04 01 01 05 01 04

    Abatedouros Exportao4 01 02 01 01 04 01 01 05 01 04

    Exporta?5 Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim

    Abate6 247 1.794 99 686 3.941 312 357 2.372 214 2.752

    Fator Ponderador7 1,9 14,0 0,8 5,4 30,9 2,4 2,8 18,6 1,7 21,51Cooperativas (Coop.), Sociedades Limitadas (Ltda) ou Sociedades Annimas (S.A.);2Estado no qual est localizada a Matriz;3Nmero de plantas frigorcas de abate e processamento de sunos que a empresa possui;4Entre os abatedouros de sunos que a empresa possui, quantos deles esto habilitados para a exportao de carne suna;5Se a agroindstria exportou (sim ou no) no ano de 2002;6Quantidade total de sunos abatidos por cada agroindstria (x 1000) no ano de 2002, com base nos dados da ABIPECS e nas respostas dos questionrios; e7O fator ponderador um indicador da representatividade de cada agroindstria na amostra total com base no seguinte clculo: n de su-nos abatidos pela AI

    n/quantidade total de sunos abatidos pelas agroindstrias da amostra. Esse fator ponderador foi utilizado na anlise

    da estrutura e das ligaes da cadeia de suprimentos como um todo.Fonte: Dados da pesquisa.

  • 115GESTO & PRODUO, v.12, n.1, p.107-120, jan.-abr. 2005

    esquematizadas dez diferentes estruturas de cadeias de suprimentos. No entanto, no este o objetivo, mas estru-turar uma cadeia de suprimentos que represente o contex-to do conjunto de agroindstrias baseada nas caracters-ticas que se destacam entre elas. Essa estrutura pode ser entendida como representativa da cadeia de suprimentos da carne suna brasileira, destinada exportao, como um todo.

    Com base nos dados e informaes obtidas, pode-se perceber que as agroindstrias exercem papel fundamental na cadeia de suprimentos, estando presentes em mais que um ponto da estrutura vertical e horizontal da cadeia. Na verdade, a empresa focal executa atividades em diferen-tes nveis da cadeia: transformando matrias-primas em raes e fornecendo aos produtores rurais, prestando ser-vio de assistncia tcnica e fornecendo outros insumos, como reprodutores, por exemplo. A jusante, a empresa focal desempenha atividades de comercializao, estando integrada inclusive ao ambiente comercial internacional, com unidades atacadistas localizadas no exterior.

    Assim, a empresa focal encontra-se bastante integrada ao longo da cadeia de suprimentos, gerenciando diversas atividades e no se pode denir um ponto especco no qual a empresa focal esteja localizada ao longo da cadeia. Isso comprova a suposio emprica na qual foi baseada a escolha das agroindstrias como populao e amostra de estudo, em vez de um grupo de produtores de sunos, por exemplo. Seguramente, as agroindstrias possuem mais domnio sobre as informaes disponveis ao longo da cadeia.

    Com base nos dados da tabela possvel identicar a estrutura com alguns membros a montante e a jusante da empresa focal, mas, logicamente, o conjunto de membros e as suas inter-relaes esto cercados por membros de apoio, tais como: bancos, empresas de logstica, servios de transporte, rgos pblicos, instituies, prossionais liberais, empresas de assistncia tcnica, fornecedores de outros insumos para processo de abate, processamento e industrializao, servios porturios, alfndegas, entre outros. Todos esses membros de apoio so fundamentais

    Tabela 2. Algumas caractersticas individuais das agroindstrias que compem a estrutura da Cadeia de Suprimen-tos.

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    Fornecedores de reprodutores1 PP AI AI AI AI PP AI AI TC AI

    Fornecedores de rao2 PA AI AI AI AI TC AI AI AI AI

    Fornecedores de insumos3 P V P V M P P V P M

    Origem dos sunos4 TC IG IG IG IG CP CP CP IG IG

    No de produtores5 600 850 150 800 + 1250 50 825 1250 625 + 1250

    Estrutura produtiva6 CC R-R-T RR-T R-R-T RR-T RRT RR-T RR-T RR-T R-R-T

    Assistncia tcnica7 IP AI AI AI AI EP AI AI AI AI

    Abate/processamento/industrializao8 API API API API A-P-I AP API API API API

    No de plantas frigorcas 01 02 01 01 04 01 01 05 01 04

    Vendas mercado externo9 AE AE AI AI AI AE AI AI AI AI

    No de pases compradores10 06 10 04 06 18 01 06 09 06 121Quem fornece reprodutores aos produtores rurais: Agroindstrias [AI]; Terceiros [TC] empresas especializadas, por exemplo ou os Prprios Produtores [PP] por meio de seleo na propriedade ou trocas entre produtores;2Quando o fornecedor da maior parte da rao aos produtores rurais for: Terceiros [TC], Produo Autnoma [PA] ou a Agroindstria [AI];3Medida subjetiva que se refere quantidade de fornecedores de insumos para dar suporte s atividades de produo de sunos: P = pou-cos; V = Vrios; e, M = muitos;4Quando a origem de sunos para abate for de: terceiros [TC], Cooperados [CP] ou Integrados [IG];5Nmero aproximado de produtores rurais que fornecem sunos para a agroindstria;6Quando o produtor de sunos em Ciclo Completo, ou seja, realiza as etapas de Reproduo, Recria e Terminao na mesma proprieda-de [CC]; Reproduo, Recria e Terminao em propriedades diferentes [R-R-T] ou Reproduo e Recria numa mesma propriedade e a Terminao numa terceira [RR-T];7Se as atividades de Assistncia Tcnica aos produtores de sunos so realizadas por corpo tcnico da prpria agroindstria [AI] ou se por instituies pblicas [IP] ou empresas privadas [EP];8Se refere s etapas do processo de abate, industrializao e/ou processamento, se realizadas em uma mesma planta ou em plantas sepa-radas. Quando Abate, Processamento e Industrializao so realizados na mesma planta = [API]; Abate, Processamento e Industrializa-o realizados em plantas separadas [A-P-I], ou quando a agroindstria apresenta apenas as etapas de Abate e Processamento em uma mesma planta [AP];9Se o maior volume de vendas para o mercado externo realizado pelas prprias agroindstrias [AI], Atacadistas localizados no Brasil [AB] ou por Atacadistas localizados no Exterior [AE];10Nmero de pases para os quais a agroindstria estava exportando na poca da pesquisa, ou seja, entre abril e setembro de 2003.Fonte: Dados da pesquisa.

  • 116 Talamini et al. Gesto da Cadeia de Suprimentos e a Segurana do Alimento: Uma Pesquisa Exploratria...

    para o processo e certamente esto ligados a diferentes membros da empresa focal.

    Se analisada de forma linear, a estrutura horizontal da cadeia de suprimentos da carne suna exportada pode ser considerada razoavelmente longa, uma vez que apresenta diversos nveis de membros, tanto a montante quanto a jusante da empresa focal. Isso ocorre talvez, pelo fato de incluir as atividades de exportao, o que acarreta alguns nveis adicionais em relao ao mercado interno. A estru-tura vertical, por sua vez, apresenta nveis amplos como o caso dos produtores de sunos cuja mdia de membros presentes consideravelmente superior aos demais mem-bros, e nveis mais estreitos, como o caso da produo de alguns dos principais insumos, a qual realizada pela prpria empresa focal, reduzindo o nmero de membros verticais neste nvel da cadeia. A forte presena da em-presa focal na realizao de diversas atividades ao longo da cadeia pode interferir nas ligaes existentes entre os membros, tornando os processos muito mais integrados e, portanto, com possibilidade de gerenciamento e/ou monitoramento pela empresa focal. Os resultados quanto aos tipos de ligaes existentes so apresentados a seguir.

    4.3 Tipos de ligaes de processosAs agroindstrias esto presentes em diversas etapas

    do processo produtivo da cadeia. Esse posicionamento em diferentes nveis horizontais da cadeia de suprimen-tos resulta em relaes diretas com diversos membros da cadeia. O resultado nal uma densa rede de ligaes, a maioria das quais gerenciadas pelas agroindstrias e al-gumas monitoradas. Certamente outras ligaes no-ge-renciadas tambm fazem parte da cadeia de suprimentos.

    O modelo de produo integrada, bastante comum en-tre produtores de sunos e as agroindstrias, contribuiu para que fosse desenvolvida, ao longo do tempo, uma re-lao bastante prxima entre esses dois nveis da cadeia de suprimentos. caracterstica da integrao vertical, as agroindstrias fornecerem praticamente todos os in-sumos produtivos. Existem vrias razes para isso, entre elas, o gerenciamento da qualidade e da quantidade do produto. Para isso, as agroindstrias possuem a maioria das ligaes do tipo gerenciadas, ou seja, as agroinds-trias julgam importante gerenciar a maioria dos proces-sos produtivos, desde o ponto de origem at o ponto de comercializao dentro do Brasil e, em alguns casos, ge-renciando inclusive atividades fora do pas.

    Convm ressaltar, porm, que as caractersticas da ca-deia de suprimentos apresentadas na Tabela 2 abreviam suas ligaes. Ou seja, logicamente existem outros nveis de fornecedores e de membros de apoio que no esto representados na tabela. Por exemplo, existem n pro-dutores de gros fornecendo seus produtos para unida-des cerealistas, as quais fornecem para as agroindstrias. Esses produtores de gros estariam num quarto nvel de

    fornecedores e as ligaes desses com as agroindstrias seriam do tipo no-gerenciadas. Neste exemplo espec-co, algumas agroindstrias possuem unidades prprias de recebimento de gros, neste caso, a empresa focal es-taria presente tambm no terceiro nvel de fornecedores, tornando ainda mais destacada sua participao efetiva como agente coordenador ao longo da cadeia de supri-mentos.

    Entre os membros de apoio, esto: bancos, rgos p-blicos, transportes, etc. Com a maioria desses membros as ligaes so do tipo no-gerenciadas, mas, especial-mente, com membros relacionados aos transportes, nas diferentes etapas do processo produtivo, as ligaes so do tipo gerenciadas ou monitoradas, dada a importncia desses membros para o uxo dos produtos e a garantia de boa parcela da qualidade do produto. Existe tambm, ob-viamente, uma srie de no-membros ao longo da cadeia de suprimentos, ou seja, diversos atores que fornecem ou compram bens de outras cadeias. o caso exemplica-do pelos fornecedores de embalagens diversas, os quais atendem diferentes cadeias de suprimentos, no fazendo parte, portanto, nica e exclusivamente da cadeia de car-ne suna exportada.

    A julgar pela quantidade de ligaes que as agroinds-trias possuem ao longo da cadeia de suprimentos, pode-se esperar que o nvel de integrao entre os membros seja elevado. A seguir so apresentados os resultados referen-tes ao nvel de integrao da cadeia de suprimentos.

    4.4 Nvel de integrao da Cadeia de Su-primentos

    Conforme comentado anteriormente, a anlise do nvel de integrao levou em considerao aspectos relaciona-dos a componentes tcnicos, tendo como indicador bsi-co o nvel de implementao de programas de segurana do alimento ao longo da cadeia. Parece lgico deduzir que: i) havendo uma forte integrao entre os membros da cadeia de suprimentos baseada em componentes tc-nicos e fsicos, como: planejamento e controle, estrutura de trabalho e atividade, estrutura de organizao, estru-tura para informao e estrutura para uxo do produto, os quais parecem estar presentes devido proximidade e interao promovida pelas agroindstrias; ii) esses componentes facilitariam a implementao de programas de segurana do alimento, cuja implementao passa por componentes tcnicos e fsicos; e iii) assim, as possibi-lidades de uma ampla implementao de programas de segurana do alimento tenderia a estar presente ao longo da cadeia de suprimentos, demonstrando um elevado n-vel de integrao.

    Com base nos resultados obtidos por Talamini (2003), a implementao efetiva de programas de segurana do alimento entre os membros da cadeia de carne suna no apresenta uniformidade, ou seja, alguns membros

  • 117GESTO & PRODUO, v.12, n.1, p.107-120, jan.-abr. 2005

    possuem alguns programas implementados e outros nenhum. Com base nos programas de rastreabilidade, transparncia e garantia da qualidade e segurana do ali-mento, pode-se dizer que, para a cadeia como um todo, os programas de rastreabilidade podem ser considerados inexistentes em todos os nveis da cadeia de suprimentos. A transparncia do processo produtivo est presente na empresa focal a sua jusante, sendo que a montante no h evidncias que permitam considerar o processo pro-dutivo transparente. Programas de garantia da segurana do alimento e da qualidade esto implementados apenas em nvel da empresa focal, sem que outros nveis possu-am programas que possam dar continuidade ao processo como um todo.

    Percebe-se, portanto, um processo descontinuado na tentativa de adicionar o valor segurana do alimento carne suna, ou seja, as aes so parciais e em pontos especcos ao longo da cadeia de suprimentos. Isso torna o processo falho e ineciente, no podendo se considerar a carne suna brasileira um alimento seguro, haja vista a falta de uniformidade do processo no que se refere aos cuidados com medidas de segurana do alimento. Se esse indicador representar satisfatoriamente o nvel de integra-o da cadeia de suprimentos, pode-se dizer que, apesar da proximidade entre os principais membros da empresa focal e do forte gerenciamento das ligaes que esta exe-cuta, a cadeia apresenta um baixo nvel de integrao.

    Com base nos resultados apresentados at aqui, im-portante avaliar a percepo que as agroindstrias tm quanto ao papel dos conceitos associados Gesto da Cadeia de Suprimentos na agregao de valor ao produ-to. Dado o enfoque do estudo, a abordagem de valor est centrada em atributos que garantam a segurana do ali-mento entregue ao consumidor.

    4.5 SCM, atributos do produto e seguran-a do alimento

    Apesar das evidncias que mostram a aplicao de conceitos ligados Gesto da Cadeia de Suprimentos (SCM), por parte das agroindstrias, nem todas reconhe-cem o uso da SCM como uma ferramenta ou um pro-grama com denominao e estrutura especca para sua gesto e monitoramento. Sobre este assunto, sete entre as dez agroindstrias responderam ao questionrio e, des-tas, 71,4% identicam os conceitos associados SCM como algo institucionalizado nas suas empresas, tendo suas funes e objetivos especcos a serem atingidos. Esse resultado mais signicativo se observada a parti-cipao relativa dessas empresas com SCM na quantida-de de sunos produzidos e abatidos. Analisando por essa tica, mais de 90% dos sunos abatidos pertencem a estas empresas.

    As agroindstrias que realizam a SCM admitem ga-nhos na adio de valor carne suna exportada. Dentre

    os atributos mais valorizados pela SCM esto: segurana do alimento, qualidade da carne e o valor que esse pro-duto tem para o consumidor nal. Esses atributos foram igualmente pontuados por 71,4% das sete empresas que responderam a estas questes, o que signica que a SCM uma importante ferramenta para atingir mercados que valorizem aqueles atributos da carne suna.

    A segurana do alimento, sob a tica da qualidade e no da quantidade, pode ser alcanada por meio da im-plementao de um conjunto de prticas interligadas e comuns a todos os membros de uma cadeia de suprimen-tos. Nesse sentido, a utilizao de conceitos associados SCM pode ser um facilitador no processo de divulgao e implementao efetiva dos programas de segurana do alimento entre os membros dos diferentes nveis da cadeia de suprimentos. Das sete agroindstrias que responderam a essa questo especca do questionrio, apenas quatro, ou 57%, identicam na SCM, um conjunto de conceitos capazes de facilitar a implementao de programas de se-gurana do alimento. Sendo que todas admitem que as relaes mais beneciadas por estes conceitos so aque-las mantidas com fornecedores, embora a SCM tambm sirva para relaes a jusante.

    Contudo, apesar da razovel utilizao dos conceitos associados SCM, dos nveis da cadeia que o mesmo per-mite integrar, do poder de gerenciamento que as agroin-dstrias possuem e da crescente demanda por segurana do alimento pelos consumidores, a cadeia exportadora de carne suna brasileira encontra-se em desvantagem em relao a outros pases, sendo que os pontos mais dbeis na implementao de programas de segurana do alimen-to esto em nveis a montante da cadeia de suprimentos (Talamini, 2003).

    5. Consideraes naisOs resultados mostram que a cadeia de suprimentos da

    carne suna exportada possui uma estrutura razoavelmen-te longa e ampla em alguns nveis (Figura 5). Destacando especialmente o posicionamento da empresa focal, a qual ao mesmo tempo o principal membro do segundo nvel de fornecedores, tornando-o inserido no contexto da em-presa focal. Alm de atuar como membro em nveis a ju-sante, as agroindstrias atuam diretamente na comercia-lizao internacional de parte da carne suna, marcando presena fsica com escritrios atacadistas no exterior.

    Pelas caractersticas da cadeia de suprimentos, no que se refere sua estrutura horizontal especialmente, perce-be-se que a anlise linear no sentido de um uxo seqen-cial do produto por meio das atividades de agregao de valor, no pode ser aplicada para o caso da cadeia da car-ne suna brasileira, a qual apresenta como caracterstica diferencial a ao da empresa focal em diferentes pontos da cadeia.

  • 118 Talamini et al. Gesto da Cadeia de Suprimentos e a Segurana do Alimento: Uma Pesquisa Exploratria...

    Dada essa forte presena das agroindstrias em diver-sos nveis da cadeia de suprimentos, as ligaes mantidas por estas com os demais membros so, em sua grande maioria, do tipo gerenciadas, tanto a montante como a jusante da empresa focal. Tal caracterstica pode ser vista como uma facilitadora nas trocas de informaes entre os diferentes nveis da cadeia, agilizando o uxo dos pro-dutos com um nvel superior de controle e resultados em termos de qualidade e performance da cadeia como um todo.

    Contudo, os resultados relativos ao nvel de integra-o mostram um processo com rupturas, no que diz res-peito implementao de programas de segurana do alimento, pois, medida que as agroindstrias possuem esses programas implementados e os demais membros, a montante especialmente, no possuem, sinal de que as informaes e as prticas no esto sendo compartilha-das entre os membros da cadeia. Talvez esse baixo nvel de integrao seja explicado por outros componentes de ordem gerencial e comportamental, pois, conforme men-cionado na reviso de literatura, estes inuenciam sobre

    os componentes tcnicos e fsicos, os quais servem de base para a implementao dos programas de segurana do alimento.

    Essas caractersticas, aliadas s evidncias da impor-tncia dos conceitos associados SCM na valorizao de atributos de valor da carne suna, na promoo da imple-mentao de programas de segurana do alimento e no uso intenso do gerenciamento das relaes com membros a montante, facilitariam sobremaneira a adoo de prti-cas que visem garantir a segurana do alimento da carne suna. Contudo, esse processo deixa a desejar, colocando o Brasil em uma posio inferior s cadeias produtivas de outros importantes pases produtores. Parece evidente, pelas caractersticas da cadeia de suprimentos descritas ao longo do trabalho, que boa parte das aes para mu-dar esse quadro encontra-se nas mos das agroindstrias. Portanto, polticas que visem aumentar o nvel de segu-rana do alimento da carne suna devem levar em consi-derao o papel das agroindstrias ao longo da cadeia.

    Uma ltima contribuio deste trabalho refere-se conceituao do termo segurana do alimento, espe-

    Clientes de3 Nvel

    Vendas Atacado

    Gerenciados

    No-gerenciados

    Monitorados

    No-membro

    Empresa Focal

    Outros membros

    Produtores RuraisFornecedores de

    1 Nvel

    Forn

    eced

    ores

    de

    3 N

    vel

    Brasil Exterior

    *Fornecedores de2 Nvel

    Clientes de1 Nvel

    Clientes de2 Nvel

    Granjas de Reprodutores

    Bancos de Smen

    ImportadoresMat. Gentico

    Cerealistas

    IndstriaQumica

    Servios

    Equipamentos

    Treinamento

    IndstriaAutomotiva

    P1

    P2

    Pn

    P3

    P4

    P5

    P6

    P7

    P8

    P9

    Transporte

    IndstriaProcessadora

    IndstriaProcessadora

    IndstriaProcessadora

    AtacadistaInternacional

    AtacadistaInternacional

    Varejista

    Varejista

    Varejista

    Varejista

    Varejista

    Abatedouro

    Assistncia Tcnica*

    Raes*

    Reprodutores*

    Vendas Atacado

    Vendas Atacado

    Consumidores

    Figura 5. Estrutura da cadeia de suprimentos da carne suna e os tipos de ligaes entre a empresa focal e seus mem-bros. Fonte: Elaborado com base nos dados e resultados da pesquisa.

  • 119GESTO & PRODUO, v.12, n.1, p.107-120, jan.-abr. 2005

    cialmente para a realidade brasileira na qual tal termo tem sido empregado tanto como referncia a aspectos quali-tativos quanto quantitativos dos alimentos. Parece mais

    adequado e, causaria menos confuso, se, para referncias a aspectos quantitativos, fosse utilizado o termo seguri-dade alimentar em vez de segurana do alimento.

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  • 120 Talamini et al. Gesto da Cadeia de Suprimentos e a Segurana do Alimento: Uma Pesquisa Exploratria...

    SUPPLY CHAIN MANAGEMENT AND FOOD SAFETY: EXPLORATORY RESEARCH INTO BRAZILS PORK EXPORT SUPPLY CHAIN

    Abstract

    Growing concern about food safety indicates that supply chains play a predominant role in the productive process. The concepts of Supply Chain Management (SCM) may contribute substantially toward a more uniform process throughout the chain, facilitating the sharing of information and productive practices. This paper discusses the structure, links and degree of integration of Brazils pork export supply chain based on the model of Lambert et al. (1998), and the relation of SCM to the valuation of pork attributes and the implementation of food safety programs. Our empirical research was based on a sample of ten hog breeders whose production volume represented about 73% of the hogs slaughtered in 2002. Our ndings reveal a supply chain strongly inuenced by the meat processing industry, whose connections with suppliers and buyers are of the managed type. These ndings, and the conrmation of the importance of SCM in the valuation of pork meat attributes and the implementation of food safety programs, place the processing industry in the position of key coordinator of policies aimed at promoting the safety of Brazilian pork.

    Keywords: supply chain management, food safety, pork.