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119 Gestão de Estoques Este capítulo estuda o item menos líquido do Ativo Circulante: os Estoques. A administração de estoques deve ser acompanhada com muita propriedade pelo gestor financeiro, uma vez que esse investimento interfere diretamente nas finanças corporativas. A gestão dos estoques é um relevante item dentro do Capital de Giro e precisa ser analisado. Ainda que essa área não seja de responsabilidade direta da administração financeira, essa deve estar à parte de suas particularidades, visto que os estoques são os investimentos menos líquidos do Ativo Circulante e que acarretam em custos consi- deráveis às organizações, especialmente às industriais. O estoque é um investimento e o gestor financeiro precisa estar atento ao seu nível, analisando-o constantemente sob a ótica do custo/benefício, para que os esto- ques não faltem (ocasionando perda de vendas), tampouco sejam conservados em altos níveis (aumentando os custos de conservação). Os estoques formam uma das variedades de investimentos de recursos pelas em- presas, podendo representar elevada proporção dos ativos totais. No quadro 12, pode-se visualizar a conta Estoques como parte do Ativo Circulante. Quadro 1 – Balanço Patrimonial Ativo Circulante Passivo Circulante Os autores. Disponibilidades Contas a receber Estoques Salários Fornecedores Impostos ... Ativo Realizável a Longo Prazo Ativo Permanente Passivo Exigível a Longo Prazo Patrimônio Líquido Os estoques são materiais, mercadorias ou produtos que são fisicamente man- tidos disponíveis pela empresa, com expectativa de ingresso no ciclo de produção, de seguir seu curso produtivo normal, ou de serem comercializados (ASSAF NETO, 2003).

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Este capítulo estuda o item menos líquido do Ativo Circulante: os Estoques. A administração de estoques deve ser acompanhada com muita propriedade pelo gestor financeiro, uma vez que esse investimento interfere diretamente nas finanças corporativas. Ativo Circulante Passivo Circulante 119 Passivo Exigível a Longo Prazo Patrimônio Líquido Disponibilidades Contas a receber Estoques Os autores.

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Gestão de Estoques

Este capítulo estuda o item menos líquido do Ativo Circulante: os Estoques. A administração de estoques deve ser acompanhada com muita propriedade pelo gestor financeiro, uma vez que esse investimento interfere diretamente nas finanças corporativas.

A gestão dos estoques é um relevante item dentro do Capital de Giro e precisa ser analisado. Ainda que essa área não seja de responsabilidade direta da administração financeira, essa deve estar à parte de suas particularidades, visto que os estoques são os investimentos menos líquidos do Ativo Circulante e que acarretam em custos consi-deráveis às organizações, especialmente às industriais.

O estoque é um investimento e o gestor financeiro precisa estar atento ao seu nível, analisando-o constantemente sob a ótica do custo/benefício, para que os esto-ques não faltem (ocasionando perda de vendas), tampouco sejam conservados em altos níveis (aumentando os custos de conservação).

Os estoques formam uma das variedades de investimentos de recursos pelas em-presas, podendo representar elevada proporção dos ativos totais. No quadro 12, pode-se visualizar a conta Estoques como parte do Ativo Circulante.

Quadro 1 – Balanço Patrimonial

Ativo Circulante Passivo CirculanteO

s au

tore

s.Disponibilidades

Contas a receber

Estoques

Salários

Fornecedores

Impostos ...

Ativo Realizável a Longo PrazoAtivo Permanente

Passivo Exigível a Longo PrazoPatrimônio Líquido

Os estoques são materiais, mercadorias ou produtos que são fisicamente man-tidos disponíveis pela empresa, com expectativa de ingresso no ciclo de produção, de seguir seu curso produtivo normal, ou de serem comercializados (ASSAF NETO, 2003).

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Para estabelecer os níveis desejados de estoques, é imprescindível ter uma noção em relação à previsão das vendas. Dependendo do montante que a empresa progra-ma vender em um determinado período, serão determinados os níveis de estoque, ou seja, o que é necessário manter na empresa para assegurar as vendas programadas.

A figura 1 apresenta um fluxo de informação para projetar as vendas para um período. Observe.

Base de dados Processo de Previsão de Vendas Usuários

Históricos:

– Vendas

– Preço

– Promoções

– Ações da con-corrência

Gerenciamento das Previsões Áreas

– Finanças

– Marketing

– Produção

– Compras

– Logística

Técnica de Previsão Sistemas de Apoio à Decisão

(CO

PPEA

D, 2

004

apud

MAT

IAS,

200

7)

Figura 1 – Fluxo do processo de previsão de vendas

No primeiro quadro temos as informações para projetar as vendas. Essas podem vir dos históricos de períodos anteriores, do preço praticado pela empresa, das promo-ções que serão promovidas para atrair clientes, ou das ações da concorrência na busca pela maior fatia de mercado. Com isso, é possível utilizar técnicas de previsão de venda, como as projeções estatísticas, por exemplo.

Todos os departamentos da empresa podem se utilizar das informações para pro-gramar as atividades. Quando remetemos à gerencia dos estoques, remete-se aqui à íntima relação entre o departamento de compras e finanças. O departamento de com-pras busca comprar bem, mesmo que em grandes lotes. A administração financeira busca um equilíbrio, pois considera estoques como um investimento do Ativo Circu-lante, que gera custos, benefícios e, principalmente, tem o menor índice de liquidez de todos os itens do circulante.

Antes de adentrarmos na análise custo/benefício do investimento em estoques, é importante saber que eles podem ser classificados da seguinte maneira:

matérias-primas – itens adquiridos pela organização para uso na elaboração de seus produtos;

produtos em elaboração – itens que estão passando pelo processo de pro-dução; e

produtos acabados – itens que foram produzidos e ainda não foram vendidos.

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Pode-se entender estoques como amortecedores das entradas e saídas dos pro-cessos de comercialização (produtos acabados) e produção (matérias-primas e produ-tos em elaboração). Assim, os estoques podem diminuir os efeitos de erros de plane-jamento e variações inesperadas de oferta e demanda, bem como ajudar a isolar ou diminuir a interdependência de todas as partes da organização (SANVICENTE, 1987).

Assaf Neto e Silva (1997) indicam algumas causas da existência de estoques:

evita a interrupção no fluxo de produção – os estoques asseguram que inter-ferências no fornecimento de matéria-prima não prejudicarão o fluxo das ativi-dades até a resolução do problema. Se a produção dependesse diretamente da entrega do fornecedor, esta passaria à dependência dos prazos acordados;

características econômicas particulares de cada setor – em alguns setores, a produção encontra-se concentrada em determinadas épocas do ano, enquanto a demanda está distribuída ao longo do ano, a organização não consegue uma saída para os seus produtos na mesma proporção da oferta. O contrário também justifica a conservação dos estoques;

perspectiva de aumento imediato do preço do produto – nesse caso admite-se que o ganho obtido por adquirir na pré-alta mais que compense os custos de estocagem;

proteção contra perdas inflacionárias – esse fato é evidenciado quando o mercado de capitais não se encontra plenamente desenvolvido e as alternativas de investimento não são adequadas; e

a política de vendas do fornecedor – quando recebe descontos dos fornece-dores para adquirir maior quantidade de matéria-prima, o administrador é in-centivado a ter maior comprometimento de recursos em estoques.

Conservar estoques em uma organização acarreta em inúmeros custos que pre-cisam ser avaliados, para que recursos financeiros não sejam desperdiçados nesse tipo de investimento. Os custos de estoques mais relevantes, segundo Matias (2007) são:

custo de estocagem – considera o custo do capital investido (custo de opor-tunidade); o custo de armazenagem e manuseio; gastos com seguro, impostos, depreciação e obsolescência;

custo de encomenda, embarque e recepção – refere-se aos custos de pedidos; custos de embarque e manuseio (incluindo despesas alfandegárias e movimen-tação de estoques dentro da organização);

custo de insuficiência de estoques – diz respeito à perda de vendas, à insatis-fação do cliente e à ruptura do cronograma de produção;

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custo de qualidade – considera as falhas e inconformidades, as trocas em ga-rantias e assistência técnica, a imagem e a reputação da empresa, assim como o tempo ocioso.

Enquanto os custos de estocagem, de encomenda, embarque e recepção e os custos de qualidade são fáceis de mensurar, os custos de insuficiência de estoque pre-cisam de uma análise mais profunda, já que as perdas que a organização adquire por não ter o estoque adequado ao momento são subjetivas.

O objetivo é estipular uma quantidade de estoque que não exceda o necessá-rio, sob pena de elevação de custo; e que não falte, para que não haja interrupção do processo produtivo ou até mesmo perda de vendas. Sanvicente (1987) afirma que o volume de estoques mantido por uma empresa dependerá:

da disponibilidade dos itens necessários, isto é, da velocidade com que podem ser adquiridos; quanto mais acessível, menor deverá ser o estoque e vice-versa;

da duração do ciclo de produção no caso de empresa industrial; quanto mais longo o ciclo, maior a necessidade de estoques de matéria-prima e produção em andamento;

dos hábitos de compra dos clientes, pois maior previsibilidade de encomendas permite a redução relativa dos investimentos em estoques;

da durabilidade dos itens estocados, caso sejam perecíveis ou deterioráveis, ou caso a situação do item estocado esteja sujeita a mudanças rápidas de estilo ou moda. Nos dois casos, manter estoques elevados não é aconselhável, tendo em vista que o risco de perda total do investimento é excessivamente alto.

Os estoques estão sujeitos a ação e planejamento de outras áreas da Adminis-tração, como vendas, produção, logística e materiais (compras). Os executivos res-ponsáveis por essas áreas normalmente têm opiniões divergentes quanto aos níveis apropriados de estoque. Cada um tem um ponto de vista dos níveis de estoque em função de seus próprios objetivos. Gitman (2002) afirma que a disposição do gerente financeiro é no sentido de manter estoques em níveis baixos, garantindo que o dinhei-ro da empresa não esteja sendo investido em excesso em estoques. Já o gerente de marketing tem interesse por grandes estoques de produtos acabados, visto que dessa forma todos os pedidos seriam atendidos rapidamente e não haveria perda de vendas por escassez de produtos.

O gerente de produção busca assegurar o processo produtivo, para que haja nível adequado de produtos acabados com qualidade a custos baixos. Para tanto, tal

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gerente se beneficia de níveis altos de estoques de matérias-primas, o que evita atra-sos na produção, além da fabricação de grandes lotes, diminuindo os custos unitários de produção. Já o gerente de compras se preocupa basicamente com o estoque de matérias-primas, sendo sua responsabilidade garantir o atendimento da produção em quantidades adequadas, nos prazos desejados e a preços favoráveis (GITMAN, 2002).

Entretanto, pelo grande volume de recursos aplicados em itens de baixa liquidez, as empresas buscam alta rotação em seus estoques como forma de elevar sua rentabi-lidade e contribuir para a conservação de sua liquidez.

Baseando-se nessa lógica, é possível identificar dois principais objetivos na admi-nistração de estoques de uma organização:

objetivo imediato – diminuir as necessidades de Capital de Giro associadas ao nível de estoques; e

objetivo a longo prazo – desenvolver um conjunto de técnicas que facilitem a gestão de estoques em fundamentos sólidos e contínuos.

Assim, com a finalidade de otimizar os recursos investidos na conta Estoques e promover a sua rotação, os gestores dispõem de várias técnicas de controle de esto-que. Dentre as utilizadas no planejamento e controle de estoque, destacam-se o sis-tema ABC, o Lote Econômico de Compra (LEC), o Ponto de Reencomenda e o sistema Just-in-Time (JIT).

Sistema ABCO Sistema ABC classifica os estoques em três grupos: A, B e C. O grupo A inclui

os itens que necessitam maior investimento. Tais itens demandam maior atenção por parte dos administradores, pelo alto investimento e sua importância no processo produtivo.

Já o grupo B representa os itens que tem o maior investimento depois do A. O grupo C consiste, geralmente, em um grande número de itens cujo investimento é relativamente pequeno.

Assaf Neto (2003) afirma que os itens classificados no grupo A representam em média 15% do volume do estoque e 80% do investimento. Os itens do grupo B re-presentam 17% do volume do estoque e 35% do investimento, enquanto os itens do grupo C representam 50% do volume do estoque e 3% do investimento, conforme a figura 2:

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100%

100%

Categoria C

Curva ABC

Categoria B

Categoria A

97%

80%

15% 50%

(ASS

AF

NET

O, 2

003,

p. 5

41)

Figura 2 – Curva ABC

Tal classificação permite que a organização determine o nível mais adequado de estoques e os tipos de procedimentos necessários para controlá-lo. O controle dos es-toques classificados no grupo A deve ser mais intenso, demandando maior atenção dos administradores quanto ao seu investimento.

Lote Econômico de Compra (LEC)O Lote Econômico de Compra (LEC) é um dos modelos mais utilizados na admi-

nistração financeira dos estoques.

De acordo com Assaf Neto e Silva (1997), o Lote Econômico de Compra busca a melhor estratégia para determinar a quantidade adequada que deve ser mantida em estoques e em quanto tempo um novo pedido deve ser realizado. Assim, o LEC auxilia na determinação de quantidade ótima de cada pedido, de modo que os custos totais, com-preendidos pelo custo do pedido e o custo de estocagem, sejam os menores possíveis.

O Lote Econômico de Compra (LEC) pode ser calculado a partir da seguinte equação:

LEC = 2 X D X Cp

Cun

= n.o em unidades

Onde:

D = Demanda do item no período

Cp = Custo de pedir, por pedido

Cun

= Custo de manter o estoque, por unidade e por período

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Exemplo:

Considere que a empresa Volant’s, montadora de automóveis, utiliza 1 600 unida-des de pneus por ano. Seu custo de pedir é de R$50,00 por pedido e o custo de manter cada pneu é de R$1,00 por ano. Substituindo os valores para D = 1 600, C

p = R$50,00 e

Cun

= R$1,00, na equação do LEC temos:

LEC = 2 X 1 600 X R$50,00

R$1,00= 400 unidades

Conclusão: para a empresa Volant’s minimizar o seu custo de estoque, deverá pedir 400 unidades por pedido. Porém, quando a empresa deverá pedir?

Aplicando a fórmula a seguir, obteremos a seguinte resposta.

NP = D

LEC= n.o de pedidos no período

Onde:

NP = Número de pedido

D = Demanda do item no período

LEC = Lote Econômico de Compra

Voltando ao nosso exemplo em que a demanda era de 1 600 pneus e o LEC de 400 unidades, temos:

NP = 1 600

400= 4 pedidos

Ou seja, a empresa deverá fazer 4 pedidos de 400 unidades durante o ano. Além disso, podemos calcular o intervalo entre cada pedido (ND: número de dias por período):

ND = 3604

= n.o de dias por período

ND = 3604

= 90 dias

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Agora já temos as informações completas: a empresa Volant’s, a fim de minimizar os seus custos de estoque, necessita realizar 4 pedidos de 400 pneus com intervalos de 90 dias entre os pedidos.

Ponto de reencomendaNo cálculo anterior, o número de dias para pedir não considera o tempo de en-

trega do fornecedor, ou seja, assim que o pedido é emitido a encomenda chega à em-presa. Todavia, na maioria dos casos, existe um tempo entre o pedido e o recebimento dos itens. Assim, o ponto de reencomenda considera tal espera e pode ser obtido pela seguinte equação:

Ponto de reencomenda = tempo para reposição, em dias x demanda diária

Considere que o fornecedor de pneus da empresa Volant’s leva, em média, 10 dias para entregar a encomenda. Sabemos que a demanda diária é de, aproximadamente, 5 unidades. Portanto, temos:

Ponto de reencomenda = 10 dias x 5 unidades = 50 unidades

Assim, sabemos que, para minimizar os custos totais dos estoques, a empresa Volant’s deverá fazer pedidos de 400 unidades cada vez que seu estoque chegar a um nível de 50 unidades.

Caso a empresa almeje trabalhar com estoques de segurança, úteis em caso de haver imprevistos, deve-se acrescentar ao Ponto de reencomenda o número de itens que a gestão julgue como suficiente para cobrir as sazonalidades que poderão acon-tecer ao longo do período.

Sistema Just-in-TimeO sistema Just-in-Time (JIT) é utilizado na administração de estoques e tem como

objetivo quantificar e minimizar o investimento nessa conta. De acordo com Gitman (2002), a filosofia do Just-in-Time é de que os insumos precisam ser recebidos exata-mente no momento em que são requeridos na produção, levando à redução extrema, ou até à eliminação dos estoques de segurança.

Para adoção desse modelo por uma organização, suas atividades de compra, pro-dução e comercialização devem ser altamente coordenadas. Além do mais, as relações com os fornecedores precisam ser altamente especificadas, objetivando sobretudo a qualidade do que é fornecido, isso porque o sistema Just-in-Time não admite erros. A

dmin

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ação

do

Circ

ulan

te

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Empresas que operam com sistemas de encomendas adotam o sistema Just-in-Time com maior facilidade.

Além da análise das características, dos custos e benefícios de se conservar os estoques (ou de não conservá-los), ainda existem outros aspectos que o gestor deve considerar. Tais aspectos são citados por Assaf Neto (2003) da seguinte forma:

Deve-se evitar quantidades excessivas de estoques, pois imprimem maior len-tidão ao giro dos ativos, além de reduzir a rentabilidade da empresa. Entretanto, em alguns casos, essa diminuição da rentabilidade pode ser mais que compensada por determinados benefícios. Os custos unitários diminuem a níveis compensadores quando o volume de produção se eleva substancialmente; as matérias-primas atin-gem preços atraentes quando adquiridas em grandes quantidades; uma previsão de escassez de certos meios materiais no mercado justifica uma antecipação das aquisições.

Na administração financeira dos estoques, tarefa árdua dos gestores das orga-nizações, cabe ressaltar que não há uma fórmula exata que determine os níveis de estoques de todas as organizações. Isso depende da sua atividade, seus recursos dis-poníveis, do mercado no qual está inserida, dos seus concorrentes e de muitos outros fatores que influenciam direta e indiretamente a administração empresarial.

Texto complementar

O segredo da ToyotaA empresa japonesa ameaça a liderança da GM e, em breve, se tornará

a maior montadora do mundo. Como ela conseguiu isso?

(SORIMA NETO, 2003)

A indústria automobilística vive uma das maiores crises de sua história. Líder mun-dial na produção de veículos, a General Motors luta para evitar a concordata. A Ford anunciou seu segundo grande plano de reestruturação em menos de uma década. A Volks vai demitir 20 mil funcionários. Poucas empresas de grande porte no setor têm escapado do prejuízo ou do risco de quebrar. Uma, em especial, tem passado ao largo da maré. Trata-se da Toyota, montadora que mais cresce no mundo. Desde o ano 2000, metade do aumento da produção mundial saiu de suas fábricas. A Toyota lucrou no ano passado US$11,4 bilhões, mais que as 12 principais concorrentes juntas.

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Em seu atual ritmo de expansão, deve chegar ao fim do ano como a maior fabricante de automóveis do mundo, ultrapassando a GM. Para completar, a Toyota é a pioneira na produção dos carros híbridos, tecnologia-chave para o futuro da indústria.

Qual é o segredo da Toyota? Sua fórmula se baseia numa obsessão: a eliminação de qualquer desperdício e a busca incessante por melhor qualidade e custos mais baixos. Hoje, essas ideias soam como lugar-comum para a indústria. Mas foi a Toyota, liderando outras montadoras japonesas, que as firmou como padrão internacional. Quando seus carros começaram a ser vendidos nos Estados Unidos e na Europa, nos anos 70, os consumidores estavam habituados com modelos grandes e caros, que costumavam ter muitos defeitos. O sucesso dos veículos mais confiáveis e baratos vindos do Japão levou todas as montadoras a rever seus conceitos. Muitas adotaram ideias lançadas pela Toyota, como a de não ter estoques e só reunir as peças na linha de montagem quando for preciso, prática conhecida como Just-in-time. Mas, mesmo copiando, ninguém conseguiu reproduzir o espírito original da Toyota.

Esse estilo único pode ser visto em qualquer unidade, da chamada Cidade da Toyota, em Nagoya, à filial brasileira em Indaiatuba, interior de São Paulo. Em suas fábricas, tudo é sincronizado e medido. A cada minuto, sai um novo carro da linha de montagem. A busca incessante por melhorias não fica só no discurso. É incorporada à rotina de trabalho. Os 265 mil funcionários são treinados para resolver qualquer problema e têm autonomia para interromper a produção quando necessário. Tudo de forma rápida, evitando paralisações demoradas e perda de tempo. O treinamen-to é contínuo. Há equipes de instrutores que viajam pelas 53 fábricas, em 27 países, divulgando os mesmos conceitos. Os empregados são desafiados a atingir metas ambiciosas. O desafio atual é elevar a participação no mercado mundial de 10% para 15%. ‘Vamos atingir esse objetivo até 2010’, disse a ÉPOCA Ai Ishiota, porta-voz da montadora no Japão. Há quem aposte que essa meta será cumprida em dois anos.

Um segundo ponto importante da fórmula da Toyota é não se acomodar nunca. A empresa está sempre em reestruturação, buscando reduzir custos. Não se trata de reagir a crises, mas de aumentar o poder de competição. ‘A Toyota nunca passou por reestruturações para lidar com crises de perda de mercado. Suas mudanças são sempre para melhorar’, diz José Roberto Ferro, criador do Lean Institute Brasil, orga-nização especializada no conceito de produção enxuta da Toyota. A obsessão por corte de gastos é uma das marcas do atual presidente mundial da empresa, Katsuaki Watanabe. Ele está à frente do projeto Construção da Competitividade de Custos para o Século 21 (CCC 21). Na prática, o plano visa a enxugar ainda mais os gastos, já mais baixos que os da concorrência. Nos últimos cinco anos, trouxe uma econo-mia de mais de US$10 bilhões. Com mais dinheiro em caixa, a Toyota pode agora

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se expandir. Enquanto a GM e a Ford fecham fábricas nos EUA, a Toyota abre novas unidades lá, no México, na Tailândia, na Rússia e na China.

Uma terceira razão para o sucesso da empresa é a rapidez para se adaptar a mudanças de mercado. A Toyota é capaz de lançar um modelo em 12 meses, um terço do tempo de outras montadoras. Essa velocidade permite desenvolver um novo carro logo quando a empresa vê uma brecha de mercado ou então reagir a lançamentos bem-sucedidos dos concorrentes. Foi assim que a Toyota conseguiu responder rapidamente à chegada dos modelos de luxo americanos e europeus ao mercado japonês na década de 90. Hoje, tem 60 modelos à venda só no Japão e várias diferentes versões no exterior. Também foi graças a essa agilidade que a Toyota tomou mercado de marcas tradicionais nos Estados Unidos. Com a alta do petróleo, os americanos passaram a procurar carros mais compactos e econômicos. As montadoras de Detroit demoraram a se mexer. Já a Toyota lançou há dois anos o Scion xB, um compacto que custa US$15 mil e agrada especialmente ao público mais jovem. Foi um sucesso. Agora, ela é pioneira nos carros híbridos.

O Brasil é um dos poucos lugares onde a imagem da Toyota ficou durante muito tempo associada ao atraso. Durante anos, ela manteve aqui um modelo ultrapassa-do, o jipe Bandeirantes, que nada tinha a ver com sua fama de empresa de ponta. De acordo com um concorrente, a fabricação do jipe foi a maneira encontrada para manter os contatos no mercado brasileiro sem correr maiores riscos. Na virada da década, a Toyota resolveu voltar a investir no país, desta vez seguindo à risca seu padrão internacional. Deu prioridade à rentabilidade. Em vez de entrar nas áreas mais congestionadas, como a dos carros populares, especializou-se no segmento de modelos acima de R$40 mil. Lançou no Brasil o Corolla, o carro mais vendido da his-tória (30 milhões de unidades), e passou a exportá-lo para outros países da América do Sul, América Central e Caribe. A Toyota ainda detém menos de 5% do mercado brasileiro, mas foi uma das únicas montadoras no país a dar lucro no ano passado, ao lado de Ford e Fiat. ‘A Toyota tem bala para ser mais agressiva no Brasil. Mas sua estratégia é ir devagar, pensar no longo prazo’, diz Corrado Capelano, analista da consultoria Roland Berger.

Aqui também ficam evidentes os riscos do modelo da Toyota. A empresa não consegue formar mão-de-obra qualificada em pouco tempo. Por isso, não deverá construir tão cedo uma nova fábrica no país para manter seu crescimento. [...] Esse é o mesmo dilema que se repete em outros países. A Toyota cresce rápido demais e já produz mais carros no exterior que no Japão. Em seu processo de globalização, ela até abriu mão de uma velha tradição e nomeou executivos estrangeiros para fazer parte da diretoria mundial. Também ampliou seu raio de ação para o setor de

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financiamentos. Seu braço financeiro dobrou de tamanho em cinco anos e já tem ativos de US$46 bilhões. O grande desafio é continuar crescendo em ritmo acelera-do sem perder a essência de sua filosofia de trabalho. A Toyota se tornou a montado-ra de maior sucesso no mundo porque nunca se acomodou. Para continuar no topo, terá de se manter incomodada.

Atividades

O que são estoques?1.

Cite e descreva os principais tipos básicos de estoques.2.

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Quais os principais objetivos da gestão de estoques?3.

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