GESTÃO DE PESSOAS NO SERVIÇO PÚBLICO: ASPECTOS … · pontos de melhoria da gestão de pessoas...

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1 * Discente no Curso de Pós-Graduação em Gestão de Pessoas e Liderança Coach da Universidade La Salle, matriculada na disciplina de Trabalho de Conclusão, sob a orientação da Prof. Dra. Renata Bidone. E-mail: [email protected]. Data de entrega: 31/07/2017. GESTÃO DE PESSOAS NO SERVIÇO PÚBLICO: ASPECTOS QUE DIFICULTAM A IMPLEMENTAÇÃO DE PRÁTICAS CONTEMPORÂNEAS Luzia Azevedo Mendes RESUMO Este artigo tem o objetivo identificar aspectos dificultadores da adoção da abordagem contemporânea de gestão de pessoas no serviço público do Brasil, a fim de propor alternativas que viabilizem melhores resultados, a partir de estratégias de gerenciamento já adotadas com sucesso nas organizações atuais. Para promover esta discussão, foi realizada uma pesquisa bibliográfica qualitativa, amparada nos estudos de relevantes autores: Rabaglio (2015) no que se refere aos conceitos contemporâneos de gestão de talentos, Gramigna (2007) para ancorar gestão e seleção por competências, Ferreira (2015) para abordar os princípios da liderança coach, Di Pietro (2013), Mello (2013) e Oliveira (2015) para discorrer sobre a origem do Direito Administrativo e a realidade do serviço público e Barbieri (2013) para abordar o talento humano na sociedade da informação. A partir deste estudo foi possível identificar pontos de melhoria da gestão de pessoas no serviço público com o objetivo de modernizá-la e adaptá-la às novas necessidades do mundo globalizado a fim de propiciar um ambiente adequado para a inovação, o desenvolvimento e a retenção de talentos, a liderança coach e a gestão e seleção por competências, aspectos essenciais para garantir a produtividade, a competitividade e perenidade das organizações na atualidade. Palavras-chave: gestão contemporânea de pessoas, gestão de talentos, gestão por competências, seleção por competências, liderança coach, direito administrativo, serviço público. 1 INTRODUÇÃO O serviço público é a força motriz do país, de importância inestimável, e último responsável pelo desenvolvimento e pela construção de uma sociedade justa e igualitária. Cabe ao serviço público organizar a sociedade civil e a ela prover serviços básicos e imprescindíveis à felicidade e ao bem-estar social (OLIVEIRA, 2015). Regulamentado pela Constituição Federal de 1988, o serviço público obedece aos princípios constitucionais da

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* Discente no Curso de Pós-Graduação em Gestão de Pessoas e Liderança Coach da Universidade La Salle,

matriculada na disciplina de Trabalho de Conclusão, sob a orientação da Prof. Dra. Renata Bidone. E-mail:

[email protected]. Data de entrega: 31/07/2017.

GESTÃO DE PESSOAS NO SERVIÇO PÚBLICO: ASPECTOS QUE DIFICULTAM

A IMPLEMENTAÇÃO DE PRÁTICAS CONTEMPORÂNEAS

Luzia Azevedo Mendes

RESUMO

Este artigo tem o objetivo identificar aspectos dificultadores da adoção da abordagem

contemporânea de gestão de pessoas no serviço público do Brasil, a fim de propor alternativas

que viabilizem melhores resultados, a partir de estratégias de gerenciamento já adotadas com

sucesso nas organizações atuais. Para promover esta discussão, foi realizada uma pesquisa

bibliográfica qualitativa, amparada nos estudos de relevantes autores: Rabaglio (2015) no que

se refere aos conceitos contemporâneos de gestão de talentos, Gramigna (2007) para ancorar

gestão e seleção por competências, Ferreira (2015) para abordar os princípios da liderança

coach, Di Pietro (2013), Mello (2013) e Oliveira (2015) para discorrer sobre a origem do

Direito Administrativo e a realidade do serviço público e Barbieri (2013) para abordar o

talento humano na sociedade da informação. A partir deste estudo foi possível identificar

pontos de melhoria da gestão de pessoas no serviço público com o objetivo de modernizá-la e

adaptá-la às novas necessidades do mundo globalizado a fim de propiciar um ambiente

adequado para a inovação, o desenvolvimento e a retenção de talentos, a liderança coach e a

gestão e seleção por competências, aspectos essenciais para garantir a produtividade, a

competitividade e perenidade das organizações na atualidade.

Palavras-chave: gestão contemporânea de pessoas, gestão de talentos, gestão por

competências, seleção por competências, liderança coach, direito administrativo, serviço

público.

1 INTRODUÇÃO

O serviço público é a força motriz do país, de importância inestimável, e último

responsável pelo desenvolvimento e pela construção de uma sociedade justa e igualitária.

Cabe ao serviço público organizar a sociedade civil e a ela prover serviços básicos e

imprescindíveis à felicidade e ao bem-estar social (OLIVEIRA, 2015). Regulamentado pela

Constituição Federal de 1988, o serviço público obedece aos princípios constitucionais da

legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. O artigo 37, inciso II da

Constituição Federal ainda define que “a investidura em cargo ou emprego público depende

de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a

natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as

nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”.

Assim, parte-se do pressuposto de que qualquer indivíduo será capaz de aprender – e

executar – qualquer ofício, desde que as regras para este estejam devidamente estabelecidas e

registradas. A administração pública brasileira assume que, com regras formais estabelecidas

– sejam elas normas internas, procedimentos, processos ou leis – todas as atividades

pertinentes à vida de uma organização serão propriamente executadas por qualquer pessoa

que possua a escolaridade mínima para a função (OLIVEIRA, 2015).

Desconsidera, portanto, as competências individuais necessárias para o alto

desempenho das equipes de trabalho, a necessidade de a organização conhecer e desenvolver

as competências dos empregados, e o fato de que talentos são permanentes e únicos de cada

indivíduo (BARBIERI, 2013). Por isso, pode-se concluir que, com o objetivo de ser justa, a

Administração Pública brasileira deixa de lado a alta performance e torna-se estritamente

burocrática – aqui compreendido como a estrutura de leis, processos e procedimentos a serem

seguidos a fim de garantir o cumprimento dos princípios constitucionais do serviço público. A

forma, a publicidade e a legalidade de um projeto devem ser priorizadas, sendo mais

valorizadas que o desempenho, o compromisso e a motivação dos servidores públicos e, em

consequência disto, tornam-se menos importantes a criatividade, a inovação, a qualidade do

trabalho realizado e as recomendações técnicas.

Identifica-se, portanto, que a Administração Pública não utiliza práticas

contemporâneas de gestão de pessoas e que, segundo Regis Fernandes de Oliveira (2015),

parte do pressuposto que o servidor público "está suficientemente preparado para desenvolver

suas atividades, seja no aspecto ético, seja no aspecto do relacionamento com o superior ou

com os cidadãos”. Ignora, portanto, a natureza humana do indivíduo, suas aptidões e

talentos, suas emoções e valores, e toda a sorte de imprecisões às quais está submetido - sejam

elas nas relações familiares, afetivas ou profissionais.

Em contrapartida, ciente do impacto dos indivíduos no resultado organizacional, a

gestão contemporânea de pessoas estuda mecanismos que visam auxiliar os indivíduos a

sentirem-se plenamente satisfeitos com seu trabalho, a inovar nas suas atividades, a contribuir

com o ambiente organizacional e a contribuir ativamente na busca por eficiência e qualidade

dos serviços prestados. A gestão contemporânea de pessoas, portanto, objetiva oferecer um

ambiente organizacional onde prevaleça o empoderamento – a descentralização de poderes

com mais autonomia e responsabilidade aos trabalhadores – a inovação, a eficiência e a

felicidade (SOUZA; SOUZA, 2016).

Diante deste contexto, ainda que possa ser questionada a ousadia de se estabelecer um

paralelo entre a gestão pública e a gestão empresarial privada – vistas as substanciais

diferenças em suas naturezas, seus objetivos e seus regramentos – ao observar criticamente as

práticas de gestão de pessoas aprendidas no mundo empresarial privado, é factível sugerir sua

implementação no serviço público, considerando as peculiaridades deste contexto e

promovendo ajustes que permitam sua aplicabilidade. Isto, pois, em ambos os cenários tem-se

pessoas executando atividades organizadas com um objetivo comum. Diante desta realidade,

este trabalho irá identificar os principais fatores que dificultam a adoção de práticas

contemporâneas de gestão de pessoas no serviço público brasileiro.

Para tanto, pretende-se:

Apresentar o contexto do serviço público brasileiro comparativamente aos

conceitos de gestão contemporânea de pessoas;

Apresentar o conceito de gestão contemporânea de pessoas, no que se refere à

gestão de competências e, mais especificamente, a seleção por competências, à

liderança coach e à gestão de talentos, e sua configuração no serviço público

brasileiro;

Identificar aspectos dificultadores da adoção da abordagem contemporânea de

gestão de pessoas no serviço público do Brasil.

Assim, pretende-se discutir a necessária atualização do serviço público brasileiro no

que se refere à gestão de pessoas, para que este esteja apto a receber a adaptar-se ao mundo

moderno globalizado, em constante e rápida evolução, prestando serviços de melhor

qualidade aos cidadãos brasileiros e promovendo melhores resultados para o país.

2. METODOLOGIA

Este artigo é uma pesquisa bibliográfica qualitativa exploratória que visa identificar

aspectos que dificultam a implementação de processos contemporâneos da gestão pessoas no

serviço público brasileiro.

A pesquisa qualitativa exploratória, tem o objetivo de compreender como e por que os

fenômenos pesquisados acontecem, ampliando a compreensão dos aspectos relevantes da

situação-problema (Cooper e Schindler, 2011).

Para ANDRADE (2010), a pesquisa bibliográfica é o estudo desenvolvido com base

em livros, revistas, jornais, entre outros e neste artigo, foram utilizados alguns dos principais

conceitos de autores renomados como Rabaglio (2015), Gramigna (2007) e Ferreira (2015)

para tratar gestão contemporânea de pessoas, gestão por competências e liderança coach;

Barbieri (2013) para abordar o talento humano na sociedade da informação; Di Pietro (2013)

e Mello (2013) no que se refere aos princípios do serviço público brasileiro e do Direito

Administrativo e Oliveira (2015) para discorrer sobre a realidade contemporânea da gestão de

pessoas em empresas públicas.

3. O SERVIÇO PÚBLICO BRASILEIRO: SUAS ORIGENS E CENÁRIO

CONTEMPORÂNEO

Considerando apenas a esfera Federal, existem, no Brasil, quase dois milhões e

duzentos mil servidores públicos – o que equivale a um gasto anual de R$274 bilhões por ano

com despesas de pessoal. Esta gigante máquina administrativa é regida pelas leis do Direito

Administrativo e utiliza um modelo burocrático de gestão.

O Direito Administrativo só se desenvolveu como ramo autônomo no fim do século

XVIII e início do século XIX, originado das Revoluções que acabaram com os regimes

absolutistas da Idade Média. Antes disso, todo poder pertencia ao soberano, que tinha direito

ilimitado para administrar (DI PIETRO, 2013). A partir do surgimento do Estado de Direito,

diversos ramos ganharam autonomia: Direito Constitucional, Público e Administrativo, por

exemplo, que se estruturam sobre o princípio da legalidade1.

Pietro (2013) observa que o direito administrativo brasileiro baseou-se principalmente

na common law2 inglesa e no direito francês. No entanto, aponta que, diferente do que

acontece na Inglaterra e na França, “a jurisdição administrativa no Brasil depende de alteração

legislativa” [...] “com um agravante: as bases do direito administrativo estão na Constituição”.

(DI PIETRO, 2013, p. 25). Na França, por exemplo, o Conselho de Estado é o órgão de

cúpula da jurisdição administrativa e responsável pelos regramentos que regem o serviço

público – o que torna o Direito Administrativo muito mais adaptável e ágil. Em outras

1conhecido por meio da expressão latina nullum crimen, nulla poena sine lege, que significa que ‘não há crime,

nem pena, sem lei anterior que os defina’ e que até mesmo os governantes se submetem à lei (Mello, 2013). 2 Common law (do inglês "direito comum") é o direito que se desenvolveu em certos países por meio das

decisões dos tribunais, e não mediante atos legislativos ou

executivos.https://pt.wikipedia.org/wiki/Common_law.

palavras, a necessidade de reformas constitucionais e de atos legislativos é grande aspecto

dificultados de qualquer alteração no funcionamento das empresas e órgãos públicos,

tornando o processo burocrático e moroso, repercutindo no modelo de gestão de pessoas.

O serviço público brasileiro, portanto, é influenciado pelo modelo burocrático

adotado. Max Weber estruturou parte de sua teoria política partindo do conceito de governo

racional, que entende que a organização eficiente é aquela que possui “regras claras e

detalhadas, previamente estabelecidas e de preceitos rígidos e disciplinares” (apud

OLIVEIRA, 2015). Além do apego aos formalismos e ao cumprimento de regras e

procedimentos, a burocracia também se baseia no caráter racional da divisão do trabalho, na

impessoalidade das relações e na previsibilidade do comportamento humano.

Considerando que a Teoria da Burocracia de Weber se popularizou como Teoria

Administrativa amplamente praticada nas organizações na década de 40, percebe-se que

existe uma lógica temporal na sua forte presença no Direito Administrativo brasileiro. Pois,

este, tem seus alicerces nas constituições das décadas de 30 e 40.

Portanto, a ideia de atualização das leis e princípios relacionados ao Direito

Administrativo é uma demanda presente visto que estes foram estabelecidos em um período

histórico muito diferente do mundo globalizado atual, que demanda agilidade e

competitividade dos órgãos públicos, devido às constantes transformações oriundas da

tecnologia, por exemplo. Como explica Di Pietro (2013, p. 27):

O Direito Administrativo é um produto da Europa continental pós-revolucionária, o

que impede a generalização de conceitos para além destes limites de espaço e tempo.

Tendo em vista que as mais relevantes atualizações do Direito Administrativo são

contemporâneas à Constituição de 1988, pode-se perceber que a globalização, a tecnologia, a

internet e o impacto de tudo isso nas novas gerações de servidores públicos não podem ter

sido contemplados nas leis que regem a Administração Pública. Consequentemente, a gestão

de pessoas contemporânea – foco deste trabalho – também não encontra respaldo para sua

imediata implementação no cenário atual, esbarrando em conceitos antiquados ainda presentes

nas leis e nos princípios constitucionais.

Com o objetivo de dar luz a estas questões e responder aos objetivos a que este artigo

se propõe, apresentam-se, a seguir, conceitos contemporâneos da gestão de pessoas e

identificam-se fatores dificultadores para a adoção das novas abordagens, bem como se

discute a aplicabilidade destas no serviço público brasileiro.

4. A TRAJETÓRIA DA GESTÃO CONTEMPORÂNEA DE PESSOAS E O CENÁRIO

DAS EMPRESAS PÚBLICAS

Os avanços da tecnologia, a globalização e o desenvolvimento de uma sociedade da

informação – conceito desenvolvido por Daniel Bell em 1979 – afetaram o modo de pensar e

agir nas organizações ao longo dos séculos XX e XXI (SOUZA; SOUZA, 2016). Durante o

período da depressão de 1930, à luz do desenvolvimento da psicologia cognitiva, passou-se a

compreender que relações humanas saudáveis no ambiente de trabalho são relevantes na

criação de estratégias que visem o aumento da produtividade. Enquanto o sistema Taylorista

acreditava somente na divisão do trabalho em tarefas menores, com tempo e métodos pré-

definidos para execução, o atual cenário corporativo exige um novo paradigma de gestão de

pessoas e do mundo do trabalho que propicie a inovação, a melhoria contínua, a qualidade e a

redução do tempo de atendimento (SOUZA; SOUZA, 2016).

De acordo com a pesquisa realizada por Zarifian (2001), o conceito de trabalho

transformou-se radicalmente, já naquela época, devido a três fatores:

A ocorrência de incidentes, que se refere aos imprevistos que interferem no

sistema de produção, ultrapassando os procedimentos pré-estabelecidos e as

definições a priori das tarefas;

A importância da comunicação nas relações de trabalho, tanto entre os

indivíduos quanto na compreensão de objetivos e normas organizacionais;

O entendimento de que cada tarefa é um serviço e, portanto, possui um cliente

(interno ou externo) que deve ser plenamente atendido.

Assim, a gestão de pessoas em ambientes competitivos passa a ser cada vez mais

complexa. Estudos de Powell (apud DIMAGGIO, 2001) apontam que muitas organizações do

século XXI fracassam no enfrentamento dos novos desafios por não evoluírem crenças acerca

de gestão de pessoas baseadas em fundamentos tayloristas: descrições formais dos cargos,

foco em normas e regras universais, preferência por recompensas por senioridade, entre

outros.

Autores como Schwab (2016), afirmam que estamos no início de um período ainda

mais desafiador: a quarta Revolução Industrial, onde novas tecnologias estão fundindo os

mundos físico, digital e biológico de forma a criar grandes e velozes mudanças de amplitude e

profundidade significativas que nos forçarão a repensar como as organizações criam valor e

gerenciam o talento humano. Diante deste contexto, torna-se ainda mais relevante

instrumentalizar as instituições da área pública para acompanharem esta transformação no

cenário global.

O serviço público brasileiro é, legalmente, uma atividade burocrática na qual as tarefas

dos servidores são exercidas rigorosamente nos termos da lei, ignorando o propósito e o

significado do seu trabalho, que deveria ser atender à demanda dos cidadãos. “O servidor

público é o burocrata”, afirma Oliveira (2015) e está completamente voltado para dentro da

organização, para suas normas, regulamentos e procedimentos, e para o superior hierárquico,

seguindo a mesma rotina diariamente. Tal configuração de contexto compromete a adoção de

práticas contemporâneas de gestão de pessoas, uma vez que o modelo de gestão de pessoas

contemporâneo preconiza, por exemplo, trabalho em equipe, líderes inspiradores, gestão por

competências, inovação e métodos modernos de gestão de trabalho e de pessoas como a

prática de horários de trabalho flexíveis e remoto.

Portanto, é possível afirmar que a desconexão entre as leis que regem o sistema de

gestão do funcionalismo público em relação às demandas atuais do mundo moderno,

decorrentes da tecnologia e da globalização também configura aspecto dificultador da

implementação do modelo de gestão contemporânea.

Outro fator a ser considerado é o fato de que muitas instituições públicas sofrem

constante interferência política na designação do quadro de pessoas que assumirão a

liderança, gerando perda de coesão institucional e desvio do foco em relação aos objetivos

organizacionais, dividindo o quadro de pessoal em verdadeiros feudos, delimitados por

vínculos partidários. Desta forma, os projetos e as prioridades ficam a critério das escolhas

subjetivas das lideranças – para as quais a burocracia não prevê mecanismos de controle, pois

parte do pressuposto que o líder quer “o certo”. Em meio a isto, encontram-se servidores

públicos, sem relações político-partidárias, tentando realizar seu trabalho burocrático, com

pouca autonomia. Considerando esta realidade, torna-se possível inferir que a atividade

rotineira possa se tornar potencial fator de frustração para alguns servidores, devido a baixa

percepção de significado e propósito nas tarefas, especialmente, quando as lideranças, pouco

preparadas, demandam e/ou cancelam projetos sem qualquer justificativa técnica,

comunicação adequada, nem preocupação com o impacto das decisões no clima

organizacional e, portanto, na gestão de pessoas.

Diante deste modelo burocrático, afirma-se que é, muitas vezes, impossível para o

servidor público realizar suas tarefas com agilidade e eficiência para atender ao objetivo de

prestar melhores serviços à sociedade. Os profissionais servidores públicos da área de TI -

tecnologia da informação - e de desenvolvimento de software, especialidade fundamental na

era da globalização, por exemplo, precisam realizar malabarismos para atenderem as

necessidades do seu campo de estudo e de atuação em detrimento da burocracia pública –

cujas leis foram criadas muito antes dos computadores se tornarem material básico para

realização de qualquer atividade.

Neste trabalho, pretende-se analisar os seguintes tópicos da gestão contemporânea de

pessoas: gestão por competências e, mais especificamente seleção por competências, devido a

sua relevância no processo de gestão, a liderança coach e gestão de talentos e discutir a

possível aplicabilidade de seus conceitos no cenário do serviço público brasileiro que tem

como um de seus principais valores, devido aos princípios constitucionais, a impessoalidade.

4.1 Gestão por Competências

"O trabalho é o prolongamento direto da capacidade do indivíduo de mobilizar seu

saber, suas habilidades e suas atitudes em uma situação específica, mutável e complexa"

(SOUZA; SOUZA, 2016).

Assim, entende-se por competência, o conjunto de conhecimento, habilidades e

atitudes que são os diferenciais do perfil de cada pessoa e têm impacto em seu desempenho e

consequentemente nos resultados atingidos, onde:

Conhecimento é o que o indivíduo sabe em teoria;

Habilidade é o que o indivíduo pratica intensamente, tendo desenvolvido

experiência e domínio;

Atitudes são as características pessoais comportamentais que levam o

indivíduo a praticar ou não seus conhecimentos e habilidades.

Na gestão contemporânea de pessoas, o conjunto destes três aspectos determina as

competências necessárias para os indivíduos realizarem o pleno exercício das atribuições

relativas aos postos de trabalho, constituindo um conjunto de requisitos que abrangem

aspectos que vão além do conhecimento técnico e da experiência prévia em atividades

similares.

Para (SOUZA; SOUZA, 2016), as competências precisam ser mapeadas, exigidas,

avaliadas e desenvolvidas e delas derivam a estruturação e premissas dos processos de

Recursos Humanos, como por exemplo: recrutamento e seleção, treinamento e

desenvolvimento, sistema de remuneração e recompensas, avaliação por competências, entre

outros. Ampliando, portanto, a visão sobre o empregado, de forma que as atitudes dos

indivíduos passam a ser vistas como algo de extrema importância dentro das organizações.

Nesta nova abordagem, a seleção por competências é início de todo o processo de gestão por

competências, pois tem por etapa inicial a elaboração de um perfil de competências exigidas

para o pleno exercício do cargo. Com base neste perfil, o selecionador realiza uma entrevista,

que pressupõe diretrizes específicas, denominada comportamental, buscando identificar no

candidato as evidências de comportamentos que permitem inferir a presença das competências

mais importantes para a melhor execução das suas funções (RABAGLIO, 2015). O perfil

estabelecido para o cargo irá guiar todo o percurso da gestão do indivíduo nas organizações,

tais como as necessidades de capacitação e avaliação para promoção, entre outros já citados e,

devido a sua relevância, este artigo irá explorar o subsistema Seleção por Competências no

cenário público, etapa essencial que fornece sustentação para a Gestão por Competências.

É importante considerar, portanto, que o atual modelo de seleção para o serviço

público – o concurso – não considera as competências comportamentais necessárias para o

posto de trabalho, levando em consideração, para a seleção, apenas os conhecimentos técnicos

que promoveram a classificação na prova realizada. Ainda, pode-se inferir que o modelo atual

de gestão do trabalho, no serviço público brasileiro, pressupõe que as características pessoais

dos indivíduos – como suas competências comportamentais – são irrelevantes para o

cumprimento das atividades pertinentes ao cargo. Pois assume que todas as atividades estão

suficientemente descritas tecnicamente, e que qualquer pessoa com capacidade técnica

adequada pode realizar qualquer atividade.

Isto se dá devido a um desdobramento dos princípios constitucionais da

impessoalidade e da legalidade. Ou seja, a descrição dos cargos deve ser formal, aprovada no

Plano de Cargos e Salários (cuja aprovação requer concordância sindical e normalmente leva

anos pra ser atualizado), universal para todos os ocupantes daquele cargo. A seleção dos

empregados – via concurso público – deve ser objetiva e baseada em conhecimento e

experiência (prova de títulos), e as competências pessoais não devem ser medidas – já que se

entende que não podem ser comprovadas objetivamente.

O serviço público desconsidera as competências, de acordo com o conceito

apresentado por Souza e Souza (2016), do seu quadro funcional para a tomada de decisão e

exige que todos sigam procedimento estabelecido, de forma a ser o mais impessoal possível.

Percebe-se, portanto, que o atual processo de seleção de servidores públicos não considera os

modernos estudos sobre gestão de pessoas, competências e talentos e que um dos motivos

para esta desatualização é a crença prerrogativa de que não se pode ser objetivo na avaliação

das competências pessoais e que os talentos individuais devem sempre se submeter aos

procedimentos formais, num cenário em que a burocracia é soberana.

Considerando este cenário desafiador, acredita-se ser possível sugerir que o serviço

público adote práticas seletivas que avaliem competências, considerando o princípio da

impessoalidade e da legalidade, pois as competências necessárias, para o provimento de

pessoas para os cargos, podem ser mapeadas previamente e descritas no edital do concurso

público – proporcionando legalidade e publicidade (outro princípio constitucional) e as

avaliações no processo seletivo podem utilizar testes objetivos, com resultados imparciais.

A gestão por competências pessoaliza imparcialmente os cargos de trabalho, pois

amplia a visão do empregado e passa a considera-lo em suas características inatas e nos seus

comportamentos. Busca chegar à melhor combinação entre as aspirações do indivíduo e as

atividades a serem realizadas para que aquele seja satisfeito no seu trabalho, e estas sejam

executadas da forma mais eficiente.

Esta visão ampliada implica, também, na visão da liderança. Onde antes era suficiente

que o líder tivesse pleno conhecimento das atividades a serem realizadas, agora é, também,

papel do líder orientar as equipes a observar suas atitudes. O novo líder deve ser capaz de

auxiliar o processo de desenvolvimento pessoal dos empregados, para que adquiram

autoconhecimento, superem dificuldades, desenvolvam sua comunicação, e integrem equipes

de alto desempenho em alinhamento com os objetivos organizacionais.

Neste ínterim, destaca-se o estilo de Liderança Coach – apresentado a seguir – que

utiliza conceitos de coaching para que as lideranças consigam realizar sua função de

desenvolver indivíduos no ambiente de trabalho.

4.2 A Liderança Coach

O termo coach, originalmente, designava carruagens de quatro rodas. Estas eram

utilizadas por universitários nobres para irem às aulas e, a partir disto, os estudantes passaram

a chamar de “coach” os tutores particulares em universidades. Contudo, foi em 1974 que

Timoth Gallwey lançou o livro The Inner Game of Tennis, que conceituou o processo de

coaching pela primeira vez e, quase duas décadas depois, o processo foi aceito no mundo dos

negócios (NASCIMENTO, 2015).

Contemporaneamente, os líderes vêm sendo desafiados a atuar e a ser visto como uma

liderança servidora que auxilia seu colaborador/funcionário a identificar seus objetivos e a

definir quais ações irão o levar à sua realização, desde que estes estejam em linha com os

norteadores estratégicos e metas de resultados da organização. Assim, surge o conceito de

estilo de liderança coach.

Quando um líder atua como coach no ambiente organizacional, é necessária a

adoção de aspectos como empatia, integridade, desprendimento e todos os

comportamentos que ofereçam suporte a seus liderados, para que atuem de modo

consciente e comprometidos com suas responsabilidades. (NASCIMENTO, 2015, p.

51)

O líder coach dá suporte aos indivíduos/ equipes através de um conjunto de

abordagens desenvolvidas especialmente para este fim, de forma a combinar objetivos

pessoais, da equipe e organizacionais. O objetivo geral da liderança coach é promover que os

indivíduos desenvolvam a capacidade de observar a si mesmos e ao seu mundo de relações,

de forma a obter o máximo de rendimento por meio de seu perfil de competências

(RABAGLIO, 2015). Para tanto, deve-se analisar o presente e estar focado em conduzir os

colaboradores/funcionários a encontrar um caminho para atingir melhores resultados,

auxiliando-os a identificar seus fatores limitantes e motivadores. Para que, sempre que

possível, definam juntos as tarefas, os processos e as abordagens a serem adotadas rumo aos

objetivos do colaborador e da organização.

Assim, o líder coach auxilia seus liderados a assumirem a direção de sua trajetória

profissional, respeitando o estilo pessoal e entendendo que os indivíduos têm características

pessoais que devem ser consideradas para o atingimento de resultados mais expressivos e

sustentáveis – desde não firam as diretrizes da organização. O estilo de liderança coach pode

ser compreendido, portanto, como a habilidade de desenvolver os subordinados através da

empatia, da inspiração, da atenção, da escuta ativa e do empoderamento. Como afirma o

Professor Doutor Wilson Nascimento (2015, p. 61):

Para manter uma equipe motivada e comprometida é necessário que conheçamos

esse time, é melhor e, portanto, necessário que deixemos bem claro nosso interesse

por elas.

Para o autor, é fundamental que os líderes contemporâneos procurem ouvir e dar

atenção aos liderados, valorizando a essência dos interesses de sua equipe para tornar possível

ampliar e potencializar seus resultados. Viabilizando, assim, o alcance das metas

preestabelecidas pela empresa.

[...] Nos dias atuais, as organizações necessitam de líderes fortes, aptos e rápidos,

mas, sobretudo, líderes flexíveis, empáticos e que inspirem os seus colaboradores a

darem mais de si e serem sempre melhor. A gestão pelo medo e pela autoridade

torna-se assim obsoleta e cada vez mais se espera organizações inovadoras.

(NASCIMENTO, 2015, p.62)

No serviço público, via de regra, as lideranças não são escolhidas pela sua habilidade

de desenvolver pessoas e equipes. Suas competências não são analisadas nem desenvolvidas.

Sendo que existem, basicamente, duas formas de a ocupação de uma posição de liderança ser

decidida no serviço público: por livre nomeação de cargo em comissão ou por nomeação de

servidor efetivo à função de confiança. Ambas as nomeações são realizadas pelo mais alto

chefe executivo da instituição, discricionária e pessoalmente.

Ainda que o chefe executivo opte por verificar as habilidades dos candidatos, a lei lhe

dá plenos poderes para escolher com base no critério subjetivo de “confiança”. Legalmente,

compreende-se que esta discricionariedade faz-se necessária quando “os atributos objetivos da

função [...] não serão suficientes para avaliar a correção da opção do administrador por

determinada pessoa para ocupar cargo tipicamente de provimento efetivo” (OLIVEIRA, 2015,

p.40). Percebe-se, portanto, que a lei identifica que nem sempre os atributos objetivos são

suficientes para selecionar o ocupante de um cargo e conclui que, para estes casos, o chefe

executivo poderá nomear livremente qualquer pessoa em quem confie.

O que acontece na prática é que as lideranças são escolhidas por critérios partidários,

pessoais e sem a preocupação com a habilidade de liderar do indivíduo. Com isto, os liderados

sofrem com lideranças temporárias – devido ao viés político – despreparadas e cujos objetivos

não são relacionados ao desenvolvimento das pessoas e das equipes. Assim, é possível inferir

que, nas empresas públicas, não existe cultura organizacional de desenvolvimento e

reconhecimento da força de trabalho, mas sim uma cultura onde o chefe mais alto na

hierarquia tem poder para decidir quem serão todos os outros chefes com base, apenas, em sua

opinião subjetiva.

Enquanto a gestão contemporânea coloca o desenvolvimento dos indivíduos e das

equipes como prioridade máxima para a liderança, no serviço público o que importa é agradar

ao chefe superior. Seja por motivos partidários, políticas, ou por confiança.

Desta forma, o serviço público perde a capacidade de acessar aquilo que é considerado

o maior valor das organizações modernas: o talento humano. (DONOVAN; BENKO, 2016, p.

51)

4.3 A Gestão de Talentos

Do latim talentum, a palavra advém da Parábola dos talentos, do Evangelho de

Mateus. Cuja moral é a de que será mais valioso aquele que utilizar suas aptidões inatas (dons

dados por Deus) e que souber assumir riscos pela causa do seu senhor (Reino de Deus). Estas

aptidões são habilidades pessoais inatas. Contemporaneamente, entende-se que talento é a

habilidade de exercer certa ocupação para desempenhar uma atividade. Mais ainda, Carmo e

Aguiar (2015, p.12) definem talento como:

[...] uma expressão da inteligência emocional, que consiste em reconhecer e gerir os

sentimentos próprios para criar a motivação e orientar as relações sociais. Sendo

inato ou herdado conserva-se durante toda a vida, embora se possa potenciar com

estudos e práticas.

A importância dos talentos humanos fica clara quando Barbieri (2013) aponta que

estes são os geradores de riqueza das organizações e dos países. Tanto considerados

individualmente, quanto reunidos em equipes. Assim, cabe à Gestão de Pessoas manejar o

talento humano a fim de auxiliar as organizações a se tornarem cada vez mais eficientes e

bem-sucedidas.

Gerenciar talentos significa considerar o indivíduo não só em suas capacidades

técnicas, mas também em suas habilidades inatas e auxiliá-lo no desenvolvimento destas. Para

tanto, as organizações podem adotar diferentes planos de ação, mas dois processos principais

devem ser considerados: a seleção por competências e o desenvolvimento de talentos. O

primeiro processo define que as competências necessárias para um cargo devem ser

previamente mapeadas e identificadas nos candidatos à vaga. O segundo processo indica que

os treinamentos oferecidos aos empregados devem contemplar aspectos da personalidade dos

indivíduos, e não apenas aspectos técnicos.

São exemplos de ações organizacionais voltadas ao desenvolvimento de talentos as

avaliações por competências, as práticas de feedback, traçar o perfil individual dos

colaboradores, treinamentos voltados ao desenvolvimento do indivíduo, a liderança coach e a

preocupação com um ambiente e clima organizacional favorável ao desenvolvimento dos

talentos – e às práticas relacionadas a ele.

Ao avaliar o ambiente organizacional das empresas públicas brasileiras, percebe-se

que é predominantemente monótono, repetitivo e frustrante.

Um burocrata aprende cedo a não cultivar expectativas. Da complexidade dos

processos institucionalizados à simplicidade da visão dos chefes, o que o burocrata

vê é a certeza de que quase tudo vai dar em nada. Não entender a razão ou não

concordar com os procedimentos que executa é um importante motivo de frustração.

(OLIVEIRA, 2015, p. 25)

Este ambiente não favorece o desenvolvimento de talentos. A padronização de

procedimentos e a total formalização de atribuições e responsabilidades são corriqueiras. Na

distribuição das tarefas, alguns poucos assumem um grande volume de atividades, enquanto a

maioria trabalha um mínimo desejável para não deixar a máquina burocrática parar. Também

é muito presente o excesso de formalidades. Elas servem não apenas como tentativa de

padronização e racionalização, mas também como garantia para o servidor, que, tendo

observado rigorosamente as normas, acredita estar livre de responsabilidade. Oliveira afirma

que os servidores mais críticos veem claramente a insensatez de muitos procedimentos, de

trabalhos monótonos e improdutivos, e quanto mais ele vê, mais se frustra.

Evidente, portanto, o antagonismo deste ambiente com a gestão de talentos

compreendida como um novo paradigma da gestão de pessoas nas organizações voltado à

maior satisfação do indivíduo, onde lhe seja permitido exercer e desenvolver suas habilidades

pessoais, encontrar maior propósito em sua jornada de trabalho e, porque não, mais felicidade

e realização pessoal.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das reflexões promovidas neste artigo, é possível afirmar que é lamentável que

o serviço público brasileiro não tenha se atualizado no âmbito de gestão de pessoas

considerando que “pesquisas recentes evidenciam que a mudança recente de paradigma

transformou o indivíduo em um agente digno de investimento” (SOUZA; SOUZA, 2016, p.

22).

Em suma, as pressões competitivas impuseram às organizações contemporâneas a

reinvenção da gestão do elemento humano e esta transformação é contínua e irreversível.

Nesta direção, a gestão de pessoas exige mudanças significativas nos papéis e função dos

profissionais de Recursos Humanos e lideranças que recebem o desafio de construir condições

favoráveis à execução das estratégias definidas para a concretização da visão empresarial

assegurando o alinhamento estratégico entre os rumos da organização e as estratégias de

gestão do capital humano que

é toda a capacidade, habilidade, aptidões e conhecimentos que se adquirem por meio

de educação, do treinamento, da experiência bem aproveitada e da leitura,

representando um acervo de conhecimento existente na população de um país, entre

o pessoal de uma empresa ou um indivíduo. Lacombe (apud CARMO; AGUIAR,

2015, p. 10).

O capital humano tende a proporcionar produtividade mais alta para quem o possui, e

esta é a principal razão pela qual as empresas investem em capacitação. De acordo com

Barbieri (2014) o Capital Humano e o Intelectual de uma empresa resultam num diferencial

competitivo; fazem a diferença na gestão e nas operações de um negócio, contribuindo de

forma relevante para questões como governança corporativa, liderança, qualidade,

produtividade, lucro, rentabilidade, inovação em gestão e inovação tecnológica.

Profissionais de talento são considerados competentes por apresentarem habilidades

técnicas e comportamentais diferenciadas, conseguirem se relacionar dentro da organização

sem perder o foco no trabalho e, principalmente, possuírem engajamento compatível com os

objetivos e as necessidades da empresa. Por engajamento, entende-se, neste artigo, "o

envolvimento, comprometimento e satisfação de um colaborador com seu trabalho. Estudos já

relacionaram altos níveis de engajamento de colaboradores a um melhor desempenho

organizacional". (Miller, 2009, p. 111).

No cenário atual, manter o comprometimento com o processo de aprendizagem, estar

sempre atualizado e bem informado, possuir boa capacidade de adaptação e flexibilidade,

fazem toda a diferença para a carreira profissional, visto que estamos inseridos em um espaço

no qual as organizações passam por transformações diariamente e a competitividade é cada

vez maior.

No entanto, o serviço público brasileiro apresenta aspectos que dificultam a

implementação de práticas contemporâneas, pois não acompanha esta evolução. Continua

preso à burocracia, à impessoalidade e à escolha de lideranças inaptas a desenvolver pessoas,

por razões já citadas no desenvolvimento deste trabalho. Isso, pois, as leis que regem o

serviço público são desatualizadas em relação ao mundo moderno, globalizado e tecnológico.

Assim para que as empresas públicas possam ser mais dinâmicas e adaptáveis, é possível

afirmar que é necessária uma profunda reforma legal e, até, constitucional. Além disso, a

indicação arbitrária e política para os cargos de liderança propicia que critérios pertinentes

como as competências para desenvolver pessoas e equipes possam ser ignorados,

prevalecendo interesses partidários e pessoais.

Portanto, para a autora, é estarrecedora a contradição no funcionamento do serviço

público, que visa ser tão impessoal e justo a ponto de apenas avaliar os servidores pelo seu

conhecimento técnico e habilidade de seguir procedimentos, mas permite a pessoalidade na

escolha das lideranças – sem absolutamente nenhum mecanismo de controle. Não é de

estranhar que se observe, diante desta dinâmica, que haja, na história recente do país, casos de

corrupção realizada por dirigentes de empresas públicas associados a políticos.

Os critérios de seleção dos servidores públicos considera majoritariamente a formação

acadêmica, portanto, o serviço público conta com profissionais de qualificação formal acima

da média nacional. Assim, não é possível assumir que os servidores públicos não tenham

formação acadêmica ou profissional adequada.

É possível afirmar que o ambiente do serviço público brasileiro seja percebido por

muitos servidores como um cenário de atividades repetitivas, monótono, improdutivo e

frustrante certamente não facilitando a retenção de talentos que poderão ser perdidos para

outras organizações devido ao ambiente hostil ao desenvolvimento humano. Atente-se ao

risco do ambiente se encarregar de moldar os profissionais a sua cultura e/ou sofrer o impacto

de indivíduos insatisfeitos que não atuam no ápice de suas potencialidades.

Para manter e reter seus talentos é necessária uma relação entre empregado e

empregador onde os dois lados devem ser beneficiados, tanto a empresa quanto seus

colaboradores. Infere-se que as empresas buscam profissionais engajados que oferecem

qualidade ao seu trabalho, enquanto as pessoas buscam satisfazer as suas necessidades para

alcançar desenvolvimento profissional enfrentar e superar desafios, obter autonomia e sentir-

se responsável e respeitado no âmbito profissional, condições que podem ser desenvolvidas a

partir da abordagem da liderança coach. É possível concluir que o cenário público brasileiro

não é um ambiente favorável a estas demandas, pois tem a burocracia como padrão

operacional.

A fim de superar estes aspectos dificultadores de uma gestão voltada às necessidades

dos indivíduos, as empresas públicas precisam passar por consistente evolução, sem prazo

para terminar. Principalmente, considerando que estudos atuais apontam que o foco da gestão

de desempenho está mudando. Enquanto hoje se avalia as responsabilidades e os resultados

alcançados, no futuro o foco será a aprendizagem. À medida que o mundo – e as suas

demandas – mudam, torna-se mais valioso o empregado capaz de se adaptar, adquirir novos

conhecimentos, desenvolver-se como pessoa e manter-se útil à organização (BEER;

FINNSTROM; SCHRADER, 2016, p. 31).

As empresas modernas já questionam os métodos de avaliação de desempenho

utilizados atualmente que não analisam o impacto da liderança, nem as condições do negócio

que estão além do controle dos funcionários. No serviço público, ainda é necessário vivenciar

a gestão de pessoas voltada ao desempenho para se chegar a este nível de questionamento.

Pois, do contrário, predominará a burocracia comprovadamente ineficiente e frustrante.

PEOPLE MANAGEMENT IN THE PUBLIC SECTOR: ASPECTS THAT

DIFFICULT THE IMPLEMENTATION OF CONTEMPORARY PRACTICES

ABSTRACT

The current article intends to identify the aspects that difficult de adoption of contemporary

practices when it comes to people management in the public sector of Brazil, with the goal of

propose alternatives towards better results, considering some successfully adopted

management strategies. In order to promote this discussion, it was performed a qualitative

bibliographic research, using studies from very relevant authors: Rabaglio (2015) on what it

comes to contemporary concepts of talent management, Gramigna (2007) to base competency

management, and competency base selection, Ferreira (2015) to approach the principles of

coach leadership, Di Pietro (2013), Mello (2013), and Oliveira (2015) to discourse about

Administrative Law origins, and the reality of the Brazilian public sector, and Barbieri (2013)

to approach human talent on the information society.

Based on those studies, it was possible to identify points of improvement regarding people

management in the public sector with the goal of modernize and adapt it to the new demands

of the globalized world, in order to create an adequate environment for innovation, talent

development and retention, coach leadership, and competency management and selection,

which are essential aspects for guarantying, productivity, competitiveness, and the endurance

of organizations.

Key-words: competency management, contemporary people management, talento

management, competency based selection, coach leadership, administrative law, public sector.

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