Gestão de Tributos - Revista de Administração Municipal - Edição 275 - IBAM

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• FINANÇAS MUNICIPAIS • PARECERES E JURISPRUDÊNCIA • EM FOCO • PERGUNTE AO IBAM • COBRANÇA DE TRIBUTOS • IPTU PROGRESSIVO • ISSQN • DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL • REGULARIZAÇÃO DO SOLO URBANO • DESCENTRALIZAÇÃO ARTIGOS E MAIS Gestão de tributos Revista de Administração Municipal – MUNICÍPIOS IBAM Outubro/Novembro/Dezembro 2010 Ano 57 Nº 275

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• FINANÇAS MUNICIPAIS• PARECERES E JURISPRUDÊNCIA• EM FOCO• PERGUNTE AO IBAM

• COBRANÇA DE TRIBUTOS• IPTU PROGRESSIVO• ISSQN• DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL• REGULARIZAÇÃO DO SOLO URBANO• DESCENTRALIZAÇÃO

ARTIGOS E MAIS

Gestão de tributos

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

OS EDITORES

ED

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IAL

Missão da RevistaA missão da Revista é ser um meio de difusão de informação, de estudos, de resultados de pesquisas inéditas e um fórum de debate sobretemas de interesse nacional e internacional relacionados ao federalismo, à descentralização, ao desenvolvimento da capacidade institu-cional dos governos municipais, à construção de uma sociedade democrática e à valorização da cidadania.

Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

Gestão da cobrança de tributospróprios dos municípios

Em um estudo sobre a evolução das receitaspróprias municipais entre 1998 e 2007, baseadoem dados de 3.572 municípios brasileiros, aSecretaria do Tesouro Nacional evidencia o seuforte incremento – cerca de 300% no período. Éexpressivo, em particular, o incremento dasreceitas oriundas do Imposto sobre Serviços deQualquer Natureza – ISSQN.

Documento posterior que extrapola esses dadospara a totalidade dos municípios brasileiros,também de autoria da Secretaria do TesouroNacional, ratifica esse incremento. Provascontundentes das iniciativas dos governosmunicipais na melhoria dos instrumentos degestão de seus tributos próprios.

O IBAM tem a oportunidade de colaborar,há algum tempo, com alguns municípios nodesenvolvimento de sua capacidade de gestãotributária, via assessoramento em desenvolvimentoinstitucional com foco na implementação deinstrumentos que incrementem a arrecadação doISSQN ou recuperem créditos inscritos em dívidaativa, inclusive com a adoção de ferramentaseletrônicas que apoiam a atuação de fiscais e, emparticular, a tomada de decisões estratégicas dosgestores municipais.

Três artigos deste número abordam o tema dostributos municipais. O primeiro deles, de autoriade Arildo José Uller, trata da cobrança de tributose indica fluxos, processos e medidas que os

governos municipais podem adotar para a suaeficácia. Os artigos de Cristiane Mussi, MarcosRoberto Pinto e Márcia Zilá Longen Joafostambém abordam os tributos municipais; oprimeiro deles privilegia o IPTU e o segundo oISSQN. São os três primeiros artigos deste númeroda Revista do IBAM.

Antônio Augusto Veríssimo e FranciscoCarlos Martins escrevem artigos relacionados coma regularização do solo urbano e dodesenvolvimento sustentável; temas críticos naAdministração Municipal. Finalmente, WalterMarcos Knaesel Birkner, Fabrício Ricardo deLimas Tomio e Sandro Luiz Bazzanella estudama questão da descentralização na AdministraçãoPública brasileira.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos,Rafael Pereira de Sousa e Júlia Alexim Nunes daSilva emitem pareceres sobre temas daAdministração Municipal que foram objeto deconsultas ao Instituto pelos municípios que fazemparte da rede de associados-cooperadores doInstituto. Na seção Pergunte ao IBAM, DelaineCosta comenta se a sociedade discrimina asmulheres na política.

Heraldo da Costa Reis, em FinançasMunicipais, escreve sobre o impacto das mudançasno sistema de informações contábeis na gestãomunicipal e Seção Em Foco destaca o ObservatórioSocial de Maringá, Estado do Paraná.

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

EXPEDIENTEA Revista de Administração Municipal – MUNICÍPIOS é uma publi-cação do Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM, deperiodicidade trimestral, depositada na Reserva Legal da BibliotecaNacional e no Catálogo Internacional de Periódicos sob o n.° BLISSN 0034-7604. Registro Civil de Pessoas Jurídicas n.° 2.215.

EDITORESNilton Almeida Rocha – Editor ExecutivoHeraldo da Costa Reis – Editor TécnicoSandra Mager – Produção GráficaAna Kelly de Jesus – Apoio Editorial

Conselho EditorialAna Maria Brasileiro (UNIFEM/ONU/Washington/Estados Unidos),Celina Vargas do Amaral Peixoto (FGV/Rio de Janeiro/RJ), EmirSimão Sader (CLACSO/Buenos Aires/ ARGENTINA), FabrícioRicardo de Limas Tomio (UFPr/Curitiba/PR), Jorge Wilheim (Con-sultor em urbanismo, São Paulo/SP), Nilton Almeida Rocha (IBAM,Rio de Janeiro/RJ), Paulo du Pin Calmon (UNB/CEAG/Brasília/DF)e Rubem César Fernandes (VIVA RIO/Rio de Janeiro/RJ).

Conselho TécnicoAlexandre Santos, Heraldo da Costa Reis, Marlene Fernandes eNilton Almeida Rocha.

Esta publicação consta do indexador internacional Lilacs – Amé-rica Latina e Caribe.Consta nas seguintes páginas:

• FEA/USP - Departamento de Administração• FGV - Biblioteca Mário Henrique Simonsen• UNB - Biblioteca Machado de Assis• Biblioteca Nacional• Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia - Catálogo Coletivo Nacional (CCN)• Association of Research Libraries• Latin Americanist Research Resources Project• Institut des Hautes Études de l’Amérique Latine - Centre de Recherche et de Documentation sur l’Amérique Latine• Facultad de Ciencias Juridicas y Politicas - Universidad Central de Venezuela• HACER - Hispanic American Center for Economic Research

Filiação

A Revista de Administração Municipal – MUNICÍPIOS é filiada àAssociação Brasileira de Editores Científicos – ABEC.• (O selo da ABEC pode ser obtido no site: http://www.lncc.br/abec/)

ASSINATURASTel.: (21) 2536-9711/ 2536-9712 • [email protected] da assinatura anual: R$ 48,00Tiragem: 2 mil exemplares

REDAÇÃOCoordenação EditorialEdição 1 – Comunicação & Serviços Ltda. • Telefax: (21) 2462-1933Jornalista responsável: Mauricio S. Lima (MTb 20.776)Jornalismo: Ana Cristina SoaresRevisora gramatical: Lucíola M. BrasilProgramação visual: Virgilio PinheiroFoto de Capa: sxc.hu

DEPARTAMENTO COMERCIALContato: (21) 2462-1933

Os artigos refletem a opinião de seus autores. É permitida a suareprodução desde que citada a fonte.

IBAM – Edifício Diogo Lordello de MelloLargo IBAM, 1 – Humaitá – Rio de Janeiro, RJ CEP 22271-070Tel.: (21) 2536-9797www.ibam.org.br

Conselho de AdministraçãoJoão Pessoa de Albuquerque – PresidenteCelina Vargas do Amaral Peixoto, Luiz Antonio Santini Rodriguesda Silva, Mayr Godoy, Edson de Oliveira Nunes, Edvaldo Pereirade Brito, Henrique Brandão Cavalcanti, Maria Terezinha TourinhoSaraiva e Raymundo Tarcísio Delgado.

Conselho FiscalAguinaldo Helcio Guimarães, Inéa Fonseca, Jorge Gustavo daCosta, Paulo Reis Vieira e Roberto Guimarães Boclin.

Superintendência GeralPaulo Timm

REPRESENTAÇÕES

São PauloAvenida Ceci, 2081 • Planalto Paulista, São Paulo • SP• CEP 04065-004 • Tel/Fax: (11) 5583-3388 • [email protected]

Santa CatarinaRua Hermann Hering, 55, térreo • Bom Retiro • Blumenau • SC• CEP 89010-600 • Tel/Fax: (47) 3041-6262 • [email protected]

SEÇÕES / SECTIONS

ÍNDICE

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA / REPORTS AND JURISPRUDENCE

ARTIGOS E REPORTAGEM / ARTICLES AND REPORTAGE

29 – FINANÇAS MUNICIPAIS/MUNICIPAL FINANCES

84 – EM FOCO/ HIGHLIGHTING

86 – PERGUNTE AO IBAM/ASK TO IBAM

05 Gestão na cobrança de tributos – Management in thecollection of taxes

Arildo José Uller

14 Aspectos relevantes do IPTU progressivo e arrecadaçãoprópria dos municípios – Relevant aspects of the progressive taxand the municipalities own revenues Cristiane Miziara Mussi e Marcos Roberto Pinto

33 O ISSQN e o conflito entre municípios: Quem pode cobrar? Aquem recolher? – The ISSQN and conflict among municipalities:Who can charge? Who collect?

Márcia Zilá Longen

47 Implantando o desenvolvimento sustentável: economiasocioambiental para municípios de área contínua (urbana e rural)– Deploying sustainable development: environmental economicsfor municipalities of continuous area (urban and rural) Francisco Carlos Martins

58 Efeitos dos programas de regularização sobre o mercado desolo urbano: algumas considerações – Effects of regularizationprograms on the urban land market: some considerations Antônio Augusto Veríssimo

68 A descentralização em Santa Catarina – Decentralization inSanta Catarina

Walter Marcos Knaesel Birkner, Fabrício Ricardo de Limas Tomio e Sandro Luiz Bazzanella

78 Convênios / Contratos, Servidor Público. Convênio com instituiçãofinanceira. Oferecimento de linhas de crédito aos servidores públicos.Fornecimento da base de dados da Prefeitura Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

80 Tributação. Projeto de Lei. Doação de imóvel. Empresa Pública.ITD. Isenção heterônoma. Imunidade recíproca. Comentários Rafael Pereira de Sousa

82 Servidor Público. Desvio de Função. Pagamento de DiferençasSalariais. Considerações Júlia Alexim Nunes da Silva

ERRATA ERRATA ERRATA ERRATA ERRATA ERRATA

Diferente do que foi publicado na Edição 274 da RAM, os autores doartigo “Ocupações informais em áreas de relevância ambiental:formulação de um modelo para avaliar o conflito” são OswaldoSchuch, Alexandre de Ávila Lerípio e Adriana Marques Rossetto.

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAMCOBRANÇA DE TRIBUTOS

RES

UM

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INTRODUÇÃO

A Cobrança dos Tributos Mu-nicipais, há tempo, é tida, pelosgestores públicos e eleitores, comouma ação antipática. Provavelmentepor esse motivo, nunca foi dada

muita importância para a organiza-ção, de forma institucionalizada eprofissionalizada, dessa ação.

Nesse contexto, com o intui-to de colaborar para novas refle-xões no que se refere à gestãomunicipal, bem como estimular a

capacidade gerencial voltada à re-cuperação de tributos inadim-plentes, proporcionando uma vi-são estratégica sobre a importân-cia da cobrança na Receita Muni-cipal, este artigo faz uma aborda-gem voltada à Gestão na Cobrança

Este trabalho, tendo como suporte teórico os estudos de Uller, Silva e Zimmermann (2007), abordaos conceitos de cobrança e dívida e as deficiências encontradas na Administração Municipal quanto àgestão da cobrança; trata do diagnóstico dos estoques de créditos, do planejamento e de estratégias naconstituição de um departamento de cobrança; atenta para o controle dos custos do departamento;alerta, finalmente, para a importância de um sistema informatizado de cobrança dos tributos municipais.

Palavras-chave: Cobrança. Deficiências. Diagnóstico. Planejamento. Estratégias. Custos. Sistema decobrança.

Gestão na cobrançade tributos

Arildo José UllerMestre em Gestão de Políticas PúblicasConsultor e assessor em cobrança no setor público, na organização, estruturação de áreas erecuperação de créditos inscritos ou não em Dívida Ativa para municípios

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de Tributos sob aspectos práticos.Para tanto, apresenta, além daIntrodução, seis capítulos que in-dicam ações a serem adotadas con-juntamente de forma que se ge-rem melhores condições para omelhor desempenho da Gestãona Cobrança dos tributos muni-cipais.

O primeiro capítulo aborda osconceitos de cobrança e de dívidano âmbito do setor público, mos-trando seu diferencial; o segundoconsiste em uma reflexão acerca dedeficiências que podem ser encon-tradas dentro das Prefeituras e quecontribuem para os elevados esto-ques de dívidas nas receitas muni-cipais; o terceiro é referente aodiagnóstico necessário para umaavaliação do cenário atual, oriun-do do processamento de informa-ções coletadas e dispostas de for-ma organizada; o quarto contémo planejamento como reflexão,visto que é dele que surgem as ca-racterísticas do departamento decobrança, bem como a definiçãodas estratégias para as ações de co-brança; o quinto aborda a impor-tância de controlar, acompanhare analisar os custos dessas açõesplanejadas para garantir que o va-lor da dívida em questão compen-se, pelo menos, os custos que se-rão despendidos sobre créditomunicipal; o sexto e último capí-tulo discute o sistema informati-zado de cobrança, o qual, em con-junto com as demais ações, garan-tirá o sucesso na Gestão da Co-brança de Tributos. Por fim, te-cemos as considerações finais.

CONCEITO DE COBRANÇA

Quando falamos em cobran-ça dentro das Instituições Públi-cas, a primeira ideia que vem àmente são créditos inscritos em

Dívida Ativa. Porém, considera-mos importante fazer outra refle-xão e perguntar: Quando iniciauma cobrança?

A reflexão sobre essa questãogera a certeza de que, para cobrar,é preciso constituir o crédito, fa-zer nascer a obrigação tributária.Sendo assim, o conceito de Dívi-da e de Cobrança nas InstituiçõesPúblicas passa a ser o seguinte: dí-vida é o estado em que se encon-tra um crédito, e cobrança, a açãoque é exercida sobre o mesmo.

Assim, para quem exerce aação, independe o estado em quese encontra o crédito, pois seuestado para a ação é entendidocomo estratégico. Partindo daideia de que dívida é o estado emque se encontra o crédito, pode-mos classificar a dívida em trêsmomentos distintos: 1 - antes dainscrição em Dívida Ativa; 2 - nainscrição em Dívida Ativa; e 3 -na Execução Fiscal.

Sob essa perspectiva, podemostrabalhar a cobrança em três ní-veis, diferenciando as ações e as

estratégias de acordo com o seuestado.

AS DEFICIÊNCIAS

Consideramos que existemdeficiências externas e internasque interferem na construção dacultura da cobrança dos tribu-tos municipais.

As deficiências externas refe-rem-se às relações entre cidadão eEstado, as quais são conflituosasnão é de hoje. A falta de conheci-mento do cidadão no que diz res-peito ao que seja o Estado, suaestrutura, funcionamento e fina-lidades afeta diretamente os paga-mentos dos tributos, pois o cida-dão não consegue discernir a fi-nalidade dessas contribuições.

Muitas administrações já perce-beram que se aproximar do cida-dão é uma boa opção para ameni-zar tais conflitos e que tê-lo comoaliado é a melhor alternativa.

Para dar conta das demandasde que a sociedade carece, é im-prescindível o crescimento das

O cadastro de contribuintes éuma peça fundamental para aPrefeitura desenvolver suaspolíticas nas mais diversas

áreas. É simplesmente o eloentre a Prefeitura e o cidadão

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receitas dos municípios. A buscapela excelência no atendimentoseria o primeiro passo para apro-ximar o Estado do cidadão, mu-nindo-o de informações até entãodesconhecidas e, ao mesmo tem-po, garantindo-lhe o direito àtransparência. Essa conduta con-tribui para que o cidadão compre-enda a estrutura administrativa doEstado, seus conceitos, princípi-os e funcionamento, fazendo comque se sinta parte do processo;essas ações trazem resultados ebenefícios para todos.

As deficiências internas, porsua vez, estão alicerçadas em umtripé assim formado: informação– estrutura – organização.

A informação abrange:

• precariedade das informações;• falta de bancos de dados com-

partilhados e acessíveis;• falta de informações mais

conclusivas; e• insuficiência no monitoramento

e avaliação das políticas de cobrança.

Quanto à estrutura, esta engloba:

• inadequação dos critérios naconcessão de “gratificações” e seusefeitos na estruturação da remu-neração;

• insuficiência de quadros técni-cos permanentes na área da Fazenda;

• distribuição de pessoal;• falta de um espaço físico ade-

quado às ações de cobrança; e• número reduzido de muni-

cípios com sistemas informatiza-dos destinados à cobrança de tri-butos municipais.

A organização, por sua vez,abarca:

• falta de integração no fluxode trabalho entre os setores ligados

à cobrança: cadastro, receita,fiscalização e execução fiscal;

• incompatibilidade e tensãoentre legislação e estruturas;

• ausência de planejamento daforça de trabalho no setor público;

• deficiência na capacitação doquadro funcional;

• fluxos e processos adminis-trativos, sendo que os sistemasinformatizados seguem a lógica daestrutura administrativa, mas nãoa do cidadã; e

• falta de avaliação sistemáticada prestação de serviços públicos.

As deficiências resultam emestoques de créditos vencidosconcentrados nas Secretarias deFazenda municipais. A principalcausa provável é a inexistência,nos municípios, de departamen-to de cobrança estruturado quepense a cobrança, sua função e re-sultados.

O DIAGNÓSTICO

O diagnóstico constitui umaimportante fase para todo o pla-nejamento e a definição da políti-ca de cobrança do Município. Odiagnóstico nada mais é do que aanálise da situação em que se en-contram os estoques dos créditosconstituídos a receber que, sebem geridos, podem se tornaruma representativa fonte de finan-ciamento para investimentos noMunicípio.

O diagnóstico fornece inúme-ros elementos para a realização denovos planos de trabalho, ações eestratégias. A condução da coletade informações pode se dar emfunção dos seguintes elementos,por exemplo:

• número de imóveis no cadas-tro imobiliário;

• número de inscrições no ca-dastro mobiliário;

• quantidade de cadastros ins-critos em Dívida Ativa por tribu-to e seus respectivos valores;

• quantidade de execuções fis-cais e valores;

• histórico de lançamentos doImposto Predial e TerritorialUrbano (IPTU) e Alvarás em anosanteriores;

• histórico de arrecadação deDívida Ativa nos últimos anos;

• legislação tributária do mu-nicípio; e

• quantidade de cadastros imu-nes e isentos.

Partindo das informações co-letadas, teremos condições de pro-cessá-las, gerando relatórios geren-ciais, planilhas e gráficos que, porsua vez, poderão proporcionarmelhor capacidade de análise paraa definição das políticas a seremadotadas pelo Município. Servi-rão, também, para a criação decenários e indicadores de desem-penho, bem como para acompa-nhamento da eficiência das açõesoriundas de tais políticas. Dessaforma, será possível avaliar commaior precisão, combinando asanálises quantitativa e qualitativa,bem como efetuando proposiçõesbaseadas nas informações levanta-das e processadas.

A análise quantitativa pode serconduzida conforme as caracterís-ticas de organização de cada Prefei-tura. Podemos iniciar a coleta porfaixas de débito, por bairro, seto-res, zoneamento, atividades, anoetc. Essa análise é fundamental paraa definição da estratégia de cobran-ça e reformulação da legislação es-pecífica que trata de parcelamentose reparcelamentos, por exemplo.

Na análise qualitativa, é essen-cial averiguar o “estado” em que se

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encontram as informações dispo-níveis e quais os instrumentos e osmeios utilizados para a consulta.Temos de identificar e analisar osmétodos de atualização cadastralpara podermos decidir sobre asformas de localização e interaçãocom os contribuintes. Um cadas-tro pobre de informações e desa-tualizado pode causar muito trans-torno para os gestores, bem comoser muito oneroso, uma vez que oinsucesso no contato com o con-tribuinte é fatal.

Para desenvolver um diagnós-tico consistente e confiável, é im-portante que a coleta de dadosseja bem elaborada. Muitas vezes,é preciso “garimpar” determina-das informações em bancos dedados distintos. Observar o con-ceito do dado a ser procuradotambém se faz relevante para nãosermos induzidos ao erro no

momento de analisar as informa-ções que serão geradas a partirda coleta.

Quando possível, é oportunocoletar os dados segundo uma sé-rie histórica de pelo menos cincoanos, posto que isso possibilitauma análise com mais qualidade dosdados coletados, assim comopermite visualizar algum resultadooriundo de políticas já adotadasanteriormente. Alertamos, porém,que, nem sempre, o resgate dessesdados é possível e que talimpossibilidade não deve frustrara coleta. Cabe lembrar que qual-quer dado, consistente ou não, éimportante, porque, ainda assim,é melhor que nenhum.

De posse dos dados coletados,podemos gerar informações deacordo com as necessidades e osobjetivos. Os dados sugeridospara coleta darão conta de uma

gama enorme de informações quepoderão ser geradas. Devemostomar o cuidado para não exage-rar, sob o risco de nos envolver-mos em um emaranhado de núme-ros sem utilidade alguma.

Devemos encontrar respostaspara questões básicas, tais como:

•índice de inadimplência;• evolução do estoque da dívida;• evolução do crescimento das

inscrições cadastrais;• índice de recuperação por

tributo;• evolução dos isentos;• participação da recuperação

nas Receitas Correntes; e• distribuição por tributação

– concentração dos créditos.

O PLANEJAMENTO

Se, de um lado, há um tripéque sustenta as deficiências, deoutro, há um tripé que sustentao termo Gestão. Assim, quandofalamos em Gestão na Cobrançade Tributos, é essencial atentarpara Planejamento – Controle –Avaliação. Sem esse tripé, não háGestão que se sustente por mui-to tempo. É por meio de umaavaliação de cenário, obtida de umdiagnóstico oriundo do processa-mento de informações coletadase dispostas de forma organizada,que surgem os elementos orien-tadores para a determinação deestratégias.

Toda a cobrança, pública ouprivada, é conduzida por deter-minadas regras, sejam elas por in-termédio de circulares normativasou por leis. O fato é que, quandoplanejamos as regras para deter-minar quais os moldes da cobran-ça, temos de considerar as análi-ses efetuadas na carteira de cobran-ça. É comum encontrar municí-

A formalização de um Departamento de Cobrança faz-se necessária. Assim, a Prefeitura pode arrecadarvalores expressivos que, se trabalhados com planejamento, entrarão no caixa e, certamente, seagregarão à capacidade de investimento do Município

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pios com a legislação desajustadaàs ações de cobrança a serem im-plementadas, justamente poromissão dos aspectos relevantes,elaborando ou copiando mecanis-mos legais praticamente fora darealidade municipal. É o que po-demos chamar de “Ctrl C-Ctrl Vdo município vizinho”.

Conforme temos observado,não é comum que os municípiospossuam em suas estruturas de-partamentos de cobrança forma-lizados. Esse fato está se modifi-cando em face do crescimento dademanda por recursos; ademais, osmunicípios encontram-se sobpressão da sociedade que clamapor soluções nas mais diversas áre-as e pela sanção da Lei Comple-mentar n.º 101 – Lei de Respon-sabilidade Fiscal, de 2000, queexige rigor na cobrança de todosos tributos constituídos. Dessaforma, as administrações têm per-cebido o papel da cobrança namelhoria da arrecadação e, a pas-sos lentos, vêm modificando suasestruturas e criando departamen-tos específicos para a cobrança decréditos constituídos.

Haja vista a complexidade queé cobrar tributos em atraso, a for-malização de um Departamento deCobranças faz-se necessária. Assim,a Prefeitura pode se dedicar, com-preender, organizar, solucionar earrecadar valores expressivos que,se trabalhados com planejamento,entrarão no caixa e, certamente, seagregarão à capacidade de investi-mento do Município.

As Estratégias de Cobrança

As estratégias de cobranças aserem adotadas pelos municípiosnão decorrem, simplesmente, deuma decisão administrativa a sertomada. Passam, necessariamente,

por uma discussão política emprimeiro plano, pois, por se tra-tar de uma prática mais recente,nem sempre os prefeitos estãopropensos a tais medidas, argu-mentando que são antipáticas aosolhos dos eleitores. Entretanto,isso é um mito, visto que a maio-ria dos contribuintes é adimplen-te e merece o respeito e a cobran-ça daqueles que não pagam.

A estratégia de cobrança tam-bém não deve ser adotada simples-mente para arrecadar recursos fi-nanceiros, mas deve, fundamental-mente, ter como um dos principaisobjetivos criar a cultura deadimplência no Município, redu-zindo cada vez mais os índices desonegação e inadimplência.

Conforme as estratégias mon-tadas, são distribuídas as cartei-ras de cobrança. Cabe lembrarque a distribuição vem justamen-te após a formulação do diag-nóstico, do planejamento e dasestratégias.

Eis um exemplo: Se o Muni-cípio com 25.000 habitantes ti-ver mil cadastros inadimplentes,de que forma será feita a distri-buição desses contribuintesinadimplentes? Se a Prefeituraligar para todos, qual será o tem-po decorrido até a última liga-ção? Qual será o custo dessas li-gações? Se enviar cartas ou bole-tos, quanto gastará?

Essas indagações devem ser fei-tas para que sejam projetados osresultados esperados, visando,sempre, ao menor custo possível.Procurar atingir o conceito desegmentação da carteira de co-brança é a palavra-chave que pro-porcionará a identificação ade-quada dessa carteira. Assim, con-centrar-se-ão os esforços, em umprimeiro momento, nos inadim-plentes com maiores chances de

recebimento a um menor custopossível.

Após a segmentação, distribui-remos a carteira de cobrança con-forme as estratégias e os custos.Podemos segmentar a carteira decobrança por tipo de tributo, portempo de atraso, por região, entreoutras. É importante observar quea segmentação otimiza a performan-ce, bem como previne o envelheci-mento dos créditos e, por conse-guinte, a perda do mesmo.

Para que tenhamos sucesso nofluxo da cobrança organizada,podemos dividir, dentro do siste-ma, os procedimentos operacionaisem várias fases que servem para ogerenciamento e o acompanhamen-to da cobrança dos tributos. Pormeio dessas fases, saberemos asituação de cada contribuinte e, emconsequência, poderemos definircomo proceder a fim de dar opróximo passo para atingir oobjetivo principal: efetivar acobrança.

Todos os tributos pendentes depagamentos obrigatoriamente de-verão fazer parte de uma agendade cobrança, pois, a partir do ca-dastramento de uma dívida, o sis-tema fará o primeiro agendamen-to automático para o negociadorou a critério do gestor.

Cabem ao negociador os agen-damentos subsequentes. Para tergarantia de que nenhuma das fi-chas ficará fora da agenda, o ne-gociador deve preencher correta-mente a tela de contatos. Todasas conversas mantidas, sejam elaspor telefone ou pessoalmente,deverão ser registradas. Isso darásubsídios para conversas futurascom os contribuintes e para onegociador se precaver de ”histó-rias” mal contadas pelos mesmos.Nesse raciocínio ainda, enquantonão obtiver uma definição de ne-

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gócio ou não obtiver êxito na co-brança do tributo, o negociadoré obrigado a gerar um novo con-tato ou incluí-lo nas fases estabe-lecidas pelo gestor.

O cadastro de contribuintes éuma peça fundamental para a Pre-feitura desenvolver suas políticasnas mais diversas áreas. É simples-mente o elo entre a Prefeitura e ocidadão. Dessa forma, sem umcadastro de contribuintes consis-tente, o Departamento de Co-brança fica impossibilitado dedesenvolver qualquer ação de co-brança com resultados satisfatóri-os. Investimentos na atualizaçãocadastral e na qualidade dos dadosconstituem um fator preponderan-te para um retorno razoável dequalquer trabalho que seja feitousando como base de informaçãoo cadastro municipal.

O CUSTO DA COBRANÇA

É fundamental controlar,acompanhar e analisar os custosdessas ações planejadas de cobran-ça, em todas as suas etapas, demodo que se possa garantir que ovalor da dívida em questão com-pense pelo menos os custos queserão despendidos sobre créditomunicipal.

Cabe ressaltar que, ainda hoje,há pouca experiência acumuladaem custos para o setor público,em especial para as administra-ções diretas. A ausência de pro-fissionais treinados e capacitadospara dir ig ir a Contabi l idadePúbl ica de for ma que sepossibi l i te a Contabi l idadeGerencial é uma realidade dentrodas Prefeituras, e tudo indica queainda será necessário um bomtempo para se modificar essequadro. Normalmente, quandose fala em custos, imaginam-se

sistemas complexos, fórmulasmatemáticas incompreensíveis,planos de contas infinitos, en-tre outros. O que propomos éa busca de um modelo simplesde apuração que possa ser de-senvolvido em planilhas eletrô-nicas, baseado no método decusteio por atividades.

Os principais objetivos propos-tos no desenvolvimento da apuraçãotêm a ver com a obtenção deinformações gerenciais necessárias àtomada de decisões e para a avaliaçãodo desempenho do Departamentode Cobrança. Nesse sentido,devemos obter informações, taiscomo: custo da cobrança; custo dodepartamento de cobrança; custo dasações de cobrança; suporte adminis-trativo, telecobrança e atendimento;controle total dos gastos do departa-mento; oportunidades para a redu-ção de custos; acompanhamentomensal da evolução dos custos; eestabelecimento dos valores antieco-

nômicos.O estabelecimento dos valores

antieconômicos é de extrema re-levância para não cometermos er-ros como os vistos em muitosmunicípios que usam o saláriomínimo como indexador paravalores antieconômicos sem sabe-rem quanto custa uma cobrança.Estudos realizados apontam que,dependendo da formatação dadaao departamento de cobrança ex-trajudicial, o custo de cada co-brança efetivada, ou seja, os valo-res que entram nos cofres muni-cipais são, aproximadamente, de R$9,00 cada. Ao analisarmos essesnúmeros consolidados diante daarrecadação mensal, o custo total dodepartamento é, aproximadamen-te, de 5% a 6% da receita produzida,o que leva à conclusão daviabilidade econômica desse setordentro do Município.

Toda carteira de cobrança re-quer uma análise criteriosa para

Ter um Departamento deCobrança funcionando em

sintonia com a Procuradoria,em especial com a ExecuçãoFiscal, é fundamental paraambos, pois seus objetivossomam para o mesmo fim

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que, de posse dessas informa-ções, seja possível tomar as de-cisões e montar as estratégias deforma acertada.

O SISTEMA INFORMATIZADODE COBRANÇA

Assim como não possuem es-trutura de cobrança formalizadaem seus sistemas de gestão e ad-ministração tributária e de arreca-dação, muitos municípios tambémnão possuem módulos informa-

tizados voltados ao gerencia-mento da cobrança nos moldesapropriados. Os sistemas sãoineficientes para viabilizar a açãoefetiva de cobrança, limitando-se a simples relatórios contendodados e não informações. Alémdisso, não exercem a função decontrole nas ações adotadas pelaPrefeitura.

O sistema deve servir para fa-cilitar o trabalho do usuário noque diz respeito à manutençãocadastral; deve registrar negoci-ações, acompanhar acordos, bem

como deve interagir com os con-tribuintes por meio do resgate on-line de informações que possamauxiliar no momento das nego-ciações. Nele, o negociador tam-bém poderá realizar diversas si-mulações de negociação disponí-veis, agilizando assim o processode atendimento ao contribuinte.

Além de potencializar a capaci-dade de atendimento e permitir umamelhor qualidade desse atendimen-to, o sistema informatizado decobrança deve gerar um conjunto de

informações que permita aos ges-tores do processo reavaliar cons-tantemente o alcance das ações pla-nejadas, verificando, inclusive, arepercussão dessas ações no contri-buinte. A partir do desenho doscenários resultantes dessas avalia-ções, os gestores de cobrança po-derão realizar os acertos necessáriosde modo que se otimize o alcancedos objetivos idealizados.

Muitos dos procedimentos deinformatização atingem o fracassoabsoluto, contaminando decisiva-mente o objetivo principal que,

nesse caso, é o processo de cobran-ça, já que promovem a inversãode valores, tornando a informati-zação a estrela do processo e sub-metendo todo o resto às suas exi-gências e limitações. O risco quecorremos é de tornar uma simplesação de informatização doprocesso de cobrança em algomaior que este, consumindo gran-de parte dos recursos destinados àárea e ocupando, com tarefassecundárias, a maior parte do tem-po dos profissionais envolvidoscom a implantação do novo pro-jeto.

Na elaboração do projeto queorganizará a implantação da inici-ativa da cobrança, um dos capítu-los deve especificar com exatidãoos recursos tecnológicos necessári-os para efetivar a ação, da mesmaforma como serão dimensionadoso local que abrigará a nova equi-pe, a quantidade de cadeiras e po-sições para os usuários, o númerode linhas telefônicas etc.

A expressão “o ótimo é inimigo dobom” representa com exatidão apreocupação que devem ter osidealizadores do projeto de co-brança. O bom é dispor da tec-nologia que caiba no orçamentodo projeto e que forneça os me-lhores resultados em produtivida-de, relacionamento com o contri-buinte e gerenciamento. O ótimoé um objetivo a ser perseguido, enão um desejo irrealizável queparalise qualquer evolução tecno-lógica no processo de cobrança aser implantado.

Os custos de implantação po-derão ser diminuídos com a pre-paração prévia dos futuros usuári-os do sistema, os quais terão deentender com precisão as diversasatividades que desenvolverão noprocesso de cobrança. Uma vez quese tornem bons conhecedores das

O sistema informatizado de cobrança deve gerar um conjunto de informações que permita aos gestoresdo processo reavaliar constantemente o alcance das ações planejadas

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

rotinas da cobrança, a chegada dosistema informatizado será somenteuma nova ferramenta paradesenvolver suas atividades, facilitan-do a sua compreensão e uso.

Uma opção para diminuir oscustos de implantação e manuten-ção é basear o projeto em tecnolo-gia de software livre. A utilização deservidores com sistema operacionalLINUX , armazenamento egerenciamento das informações apartir de um banco de dados comoo PostGreSQL e disponibilizaçãodo aplicativo em estações detrabalho do tipo ThinClient(equipamentos de baixo custo demanutenção e gasto de energiaelétrica reduzido) já é uma realidadeem muitas empresas privadas e,também, no setor público. Os ta-bus que existiam em torno dosoftware livre já se dissiparam hámuito tempo, e só não se beneficiade sua qualidade tecnológica ecustos reduzidos quem não quer.

O sucesso da escolha de uma boasolução tecnológica, com custos con-dizentes com a realidade da institui-ção, depende essencialmente da eta-pa de projeto, quando serão especi-ficados os requisitos funcionais, atecnologia a ser utilizada, a infraes-trutura necessária etc. Quanto me-lhor for conduzida a fase de proje-

to, melhores serão os resultados aserem alcançados. Nessa fase, a con-tratação de consultorias especializa-das poderá fazer a diferença.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Gestão na Cobrança de Tri-butos, no princípio, pode parecersimples e pequena, porém, à me-dida que formalizamos um depar-tamento e planejamos as ações dacobrança propriamente ditas, per-cebemos o quanto as atividadesexercidas por ela podem ser com-plexas e importantes para ajudar amelhorar a gestão fazendária.

Uma aproximação com a Pro-curadoria do Município é funda-mental, não só para criar e manterum sincronismo entre as cobrançasextrajudicial e judicial mas tambémpara unificar a interpretação da vas-ta legislação que disciplina a maté-ria. Ter um Departamento de Co-brança funcionando em sintoniacom a Procuradoria, em especialcom a Execução Fiscal, é fundamen-tal para ambos, pois seus objetivossomam para o mesmo fim.

Devemos, ainda, dimensionar amão de obra conforme as estratégi-as e as ações de cobrança que serãoadotadas. Igualmente, devemosmanter bem informadas todas as

pessoas envolvidas no processo dacobrança, tanto no que se refere àlegislação como nas ações que oGoverno Municipal vem pratican-do, para que possam ter melhordesempenho no ato da negociação.

Gerir bem a Cobrança dos Tri-butos é uma obrigação de Estado;mais do que isso, significa resgatarrecursos estagnados para aplicarem políticas públicas a fim de su-prir as demandas da sociedade.

A abordagem do assunto nes-te artigo tem o objetivo de con-tribuir para o debate de questõesrelacionadas com a cobrança doscréditos estocados, principalmen-te nos municípios.

Mesmo com todas as dificulda-des e as deficiências apontadas, te-mos a convicção de que investir nadepartamentalização da cobrança,seja qual for o modelo, continuarásendo uma estratégia fundamentalpara garantir maior eficiência naarrecadação dos Tributos Munici-pais. É uma estratégia que, em ra-zão de toda a dinâmica envolvidano processo da cobrança, requercadastros organizados e atualizados,harmonia entre os diversos setoresenvolvidos, relacionamento diretocom os contribuintes e, fundamen-talmente, a formação da Cultura deAdimplência pelos cidadãos.

Os temas mais importantes da AdministraçãoPública são analisados aqui!

Revista de Administração

Municipal - MUNICÍPIOS

Ligue: (21) 2536-9711 / 2536-9712

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Ano 57 - Nº 275Outubro/Novembro/Dezembro 13

Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM COBRANÇA DE TRIBUTOS

ULLER, Arildo José; SILVA, Maurício José da; ZIMMERMANN, Michael. Gestão na Cobrança de Tributos. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2007. 160 p.

AB

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Management in the collection of taxes

This work, supported by theoretical studies Uller, Smith and Zimmerman (2007), discusses the concept of debtrecovery and the likely deficiencies within each Town Hall; deals with the diagnosis of inventory credit, planningand strategies in setting up a billing department, attentive to the cost control department, and alert to the importanceof a computerized system for the collection of municipal taxes.

Keywords: Collection. Disabilities. Diagnosis. Planning. Strategies. Costs. Collection system.

Gestión en la recaudación de impuestos

Este trabajo, apoyado por los estudios teóricos Uller, Silva y Zimmerman (2007), discute el concepto de cobro dedeudas y las deficiencias probables dentro de cada prefectura, se refiere con el diagnóstico de crédito de inventario,la planificación y estrategias en la creación de un departamento de recuperación, atención al departamento decontrol de costes, y alerta sobre la importancia de un sistema informatizado para la recuperación de impuestosmunicipales.

Palabras claves: Recuperación. Discapacidad. Diagnóstico. Planificación. Estrategias. Costos. Sistema de cobro.

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

Aspectos relevantesdo IPTU progressivo e arrecadação própriados municípios

IPTU PROGRESSIVO

INTRODUÇÃO

O presente estudo revela acompetência do Município aoinstituir o imposto sobre a pro-priedade territorial urbana, tecen-do considerações acerca dos limi-

tes encontrados nessa tributação,bem como da arrecadação própriados municípios.

Nesse passo, parte-se do con-ceito de IPTU, demonstrando seurespectivo fundamento legal, suaclassificação na ordem dos impos-

tos, para então, analisar sua pro-gressividade admitida nos expres-sos termos da Carta Constitucio-nal de 1988.

Por fim, iremos analisar oIPTU sob o enfoque da arreca-dação própria dos municípios.

Cristiane Miziara MussiDoutora em Direito Previdenciário pela PUC/SPMestre em Direito das Relações Sociais (subárea de Direito Previdenciário) pela Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo – PUC/SP

Marcos Roberto PintoMestre em Ciências Contábeis pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJProfessor da Universidade Federal Fluminense – UFF

O presente estudo tem como objetivo geral a análise do Imposto Predial e Territorial Urbano, sob o aspecto daprogressividade e a arrecadação própria dos municípios. O tema ganha grande vulto, ao pretenderem os municípiosutilizar o IPTU de maneira punitiva àquele que não cumpre a função social da propriedade. Nesta perspectiva,necessário se faz traçar os contornos e os limites da progressividade. No que tange aos aspectos teórico-metodológicos,foram realizados coleta e estudo de artigos e demais doutrinas pertinentes ao assunto, não deixando de lado alegislação e as jurisprudências relacionadas ao tema em análise, bem como a pesquisa, a coleta e a interpretação deinformações, referentes à arrecadação tributária, disponibilizadas no banco de dados mantido pela Secretaria doTesouro Nacional – STN. Como principais resultados, o artigo revela os limites do Município na aplicação da progressividadeno imposto sobre a propriedade territorial urbana, em respeito aos princípios e aos ditames constitucionais, assegurando autilização adequada da propriedade urbana, no espaço e no tempo. O estudo realizado procura também evidenciar algunsaspectos relacionados à estrutura de fiscalização e arrecadação municipal.

Palavras-chave: IPTU. Progressidade. Capacidade contributiva. Função social da propriedade. Arrecadação.

RES

UM

O

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM IPTU PROGRESSIVO

IPTU: CONCEITO

O Imposto sobre a Proprie-dade Predial e Territorial Urba-na (IPTU) conceitua-se comotributo não vinculado, incidentesobre o valor venal1 do imóvelnos termos do art. 33 do CódigoTr ibutár io Nac iona l , t endocomo sujeito ativo o Município(art. 156, I, CF/88) e o DistritoFederal (art. 147, CF/88)2 e,como su je i to pass ivo, oproprietário do imóvel prediale territorial urbano, o titular doseu domín io út i l , ou seupossuidor a qualquer título, deacordo com o art. 34, CTN.

Previsão Legal

O imposto predial foi criado,no Brasil, pelo Alvará, de 27 dejunho de 1808, sob a denomina-ção de “décima urbana”. Sua co-brança foi regulada pelo Alvará,de 13 de maio de 1809. Recaindosobre os prédios localizados naCorte, nas cidades, nas vilas e naspovoações da orla marítima, a tri-butação atingia, além dos propri-etários, os aforadores3.

Efetuando uma sucinta análisehistórica na perspectiva constitu-cional, consta que o Imposto so-bre a Propriedade Predial e Ter-ritorial Urbana (IPTU) passou ater previsão na Carta Magna de1891, sendo sua cobrança de com-petência exclusiva estadual.

Na sequência, a ConstituiçãoFederal de 1943 determinou acompetência para a instituição doimposto dos municípios.

A atual Carta Constitucional,no art. 156, inciso I, estabelece:

“Art. 156. Compete aos Mu-nicípios instituir impostossobre:

I – propriedade predial e terri-torial urbana;[...]”

O Código Tributário Nacio-nal e o Decreto-Lei n.º 57/66,recepcionados com status de LeiComplementar estabelecem emseus arts. 32 a 34 e art. 15, respec-tivamente, as normas gerais sobreo IPTU: fato gerador, base decálculo e contribuintes.

O art. 32 do Código Tributá-rio Nacional – CTN estabelececomo hipótese de incidência doIPTU a propriedade, o domínioútil ou a posse, de bem imóvel pornatureza ou acessão física, comodefinido no Código Civil, situa-do na Zona Urbana do Municí-pio, desde que servido por, nomínimo, dois dos melhoramen-tos arrolados no § 1.º do disposi-tivo.

Observa-se que a inserçãopelo Código Tributário Nacionalda expressão “situado na ZonaUrbana do Munic ípio”evidencia-se a escolha pelocritério da localização do bem enão da atividade desenvolvida nomesmo. Cabe ao Munic ípiodelimitar o seu perímetro urbano,vez que estando fora deste, acompetência para a Instituição doImposto será da União (art. 153,VI, CF/88).

Prescreve o art. 32, § 1º, quepara efeito do IPTU:

“Art. 32.[...]§1.ºEntende-se como zona urbanaa definida em lei municipal, ob-servando o requisito mínimo daexistência de melhoramentosindicados em pelo menos doisdos incisos seguintes, construí-dos ou mantidos pelo PoderPúblico:

I – meio-fio ou calçamento, comcanalização de águas pluviais;II – abastecimento de água;III – sistema de esgotos sanitá-rios;IV – rede de iluminação pú-blica, com ou sem posteamen-to para distribuição domicili-ar;V – escola primária ou pos-tos de saúde a uma distânciamáxima de 3 (três) quilôme-tros do imóvel considerado”.

E, ainda de acordo com o §2.ºdo mesmo artigo, a lei municipalpode considerar urbanas as áreasurbanizáveis, ou de expansão ur-bana, constantes de loteamentosaprovados pelos órgãos compe-tentes, destinados à habitação, àindústria ou ao comércio, mesmoque localizados fora das zonasdefinidas nos termos do parágra-fo anterior.

Referendado imposto tam-bém se encontra disciplinado naLei Federal n.º 10.257, de 10/07/2001 – Estatuto da Cidade (art.7º, §§1º a 3º), além de LegislaçãoMunicipal.

CLASSIFICAÇÃODOS IMPOSTOS

Antes de apresentarmos a clas-sificação do imposto sobre a pro-priedade predial e territorial ur-bana, é preciso destacar a distin-ção doutrinária traçada entre im-postos diretos e indiretos; fixos,proporcionais e progressivos; eentre pessoais e reais.

Impostos Diretos e Indiretos

Por impostos diretos pode-seentender aqueles que são supor-tados por um contribuinte defi-nitivo e que gravam situações

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

permanentes, constantes, ou pelomenos continuadas. Na acepçãode Vittorio Cassone, “direto é oimposto que assim se caracterizaquando, numa só pessoa, reú-nem-se as condições decontribuinte direto (aquele que éresponsável pela obr igaçãotributária) e contribuinte de fato(aquele que suporta o ônus doimposto)”4. Nessa l inhaclassif icatória, encontra-se oimposto sobre propriedadeterritorial urbana.

Já os impostos indiretos sãoaqueles que não são suportadospor um contribuinte definitivo,mas sim por terceira pessoa. Alémdo mais, gravam situação instan-tânea ou mutável, como ocorreno imposto sobre produtos in-dustrializados.

Impostos Fixos,Proporcionais e Progressivos

Na classificação doutrinária,impostos fixos são aqueles quetêm seu montante já determina-do, ou seja, dizem respeito a umaquantia certa.

Impostos proporcionais, porsua vez, são aqueles em que suasalíquotas observam sempre o va-lor da matéria, a fim de que seestabeleça um percentual.

Finalmente, os progressivos,como veremos adiante por refe-rir-se ao IPTU, são aqueles emque suas alíquotas são estabeleci-das em percentagens variáveis, deacordo com o valor da matériatributável.

Impostos Pessoais e Reais

Essencial se faz del imitara d i s t i n ç ã o e n t r e i m p o s t opessoa l e rea l . No impostoreal, há a evidente abstração

das caracter ís t icas indiv idu-ais do contr ibuinte , ao pas-so que no impos to pessoa lsão consideradas as caracte-r í s t icas indiv idua is do mes-m o .

Para Geraldo Ataliba, são im-postos pessoais:

“[...] aqueles cujo aspectomaterial da h.i. leva em con-sideração certas qualidades,juridicamente qualificadas,dos possíveis sujeitos passi-vos. Em outras palavras: es-

tas qualidades jurídicas in-fluem, para estabelecer dife-renciações de tratamento le-gislativo, inclusive do aspec-to material da h.i. Vale di-zer: o legislador, ao descre-ver a hipótese de incidência,faz refletirem-se decisiva-mente, no trato do aspectomaterial, certas qualidadesjurídicas do sujeito passivo.A lei, nesses casos, associa tãointimamente os aspectos pes-soal e material da h.i. quenão se pode conhecer este

O IPTU, como imposto que é, deve ser mensurado conforme a capacidade contributiva do indivíduo apuradaobjetivamente, ou seja, o que importa é a situação concreta do contribuinte de ter um imóvel

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

sem considerar concomitan-temente aquele”.5

Kiyoshi Harada preleciona:

“São chamados de impostospessoais ou subjetivos aquelescuja carga tributária, é estabe-lecida segundo a capacidadecontributiva de cada um. Nes-sa tributação de natureza pes-soal há verdadeira individua-lização da pressão tributárialevando em conta os mais di-versos aspectos, tais como aidade, o volume da renda oudo patrimônio, o estado civil,o domicílio, a residência, ograu de parentesco etc.”.6

No que se refere aos impos-tos reais, utilizamos o conceito deKiyoshi Harada:

“São chamados de impostosreais e objetivos aqueles de-cretados sob a consideraçãoúnica da matéria tributável,com total abstração das con-

dições individuais de cada con-tribuinte. São aqueles que gra-vam uma determinada rique-za, ou uma certa situação, ou,ainda, um determinado atoeconômico, com inteira abs-tração da pessoa que possui ariqueza, a que se refere aque-la situação ou aquele ato eco-nômico.”7

Geraldo Ataliba confirma talentendimento ao esclarecer:

“São impostos reais aquelescujo aspecto material da h.i.limita-se a descrever um fato,ou estudo de fato, indepen-dentemente do aspecto pesso-al, ou seja, indiferente aoeventual sujeito passivo e suasqualidades. A h.i. é um fatoobjetivamente considerado,com abstração feita das con-dições jurídicas do eventualsujeito passivo; essas condi-ções são desprezadas, não sãoconsideradas na descrição doaspecto material da h.i. (o que

não significa que a h.i. nãotenha aspecto pessoal; tem,porém este é indiferente à es-trutura do aspecto materialou do próprio imposto)”.8

Ainda na tentativa de estabe-lecer uma definição “[...] impos-tos reais, cuja incidência leva emconsideração a matéria tributária,unicamente, sem cogitar das con-dições pessoais do contribuinte”.9

Considerando o contribuintecomo pessoa física ou jurídica,todos os impostos são pessoais.No entanto, “com exceção doImposto de Renda, todos os de-mais impostos do Sistema Tribu-tário Nacional são reais, tais comoo IPI, o ICMS, o IOF etc.”.10

Classificação do IPTU

O IPTU é um tributo direto,progressivo e real/pessoal11, nãovinculado a uma contraprestaçãoespecífica, sujeito aos ditames doprincípio da capacidade contribu-tiva e da progressividade.

PROGRESSIVIDADE

A progressividade representauma forma de graduação do tri-buto. Nesta seara, tributo pro-gressivo é aquele cuja alíquotacresce na medida em que aumen-ta a base tributável. Excepcional-mente, pode-se ter outro critérioconsiderado relevante para a de-terminação do valor do tributo.

Conforme Domingues deOliveira, “a igualdade tributáriaabriga a conotação de que quemmais riqueza tem mais contribuipara o gasto público, graças aoque se legitima a tributação pro-gressiva”.12

Para Regina Helena Costa,“entendemos que a todos os im-

IPTU PROGRESSIVO

O IPTU, como já destacamosneste estudo, é um Imposto,de competência municipal,

aplicado sobre as propriedadese não sobre a renda

ou mesmo o consumo

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postos é possível imprimir-se atécnica da progressividade, umavez que esta é exigência do pró-prio postulado da capacidade con-tributiva, igualmente aplicável atodos eles. Somente mediante ainstituição de alíquotas progres-sivas, faz-se a desigualação entresituações desiguais, cumprindo-se,outrossim, o princípio maior daigualdade (art. 150, II)”.13 E ob-serva em sua conclusão que “aprogressividade está limitada peloprincípio da capacidade contribu-tiva, visando a não-confiscatorie-dade e o não-cerceamento de ou-tros direitos constitucionais”.14

É óbvio que a progressividadenão pode atingir índices exorbitantesque venham a contrariar a capacidadeeconômica do contribuinte.

Como se vê, este critério pro-gressivo de aferição do montantetributário está intimamente liga-do ao princípio da capacidadecontributiva, já que para este vi-gora o entendimento de quequanto maior for a capacidadecontributiva do indivíduo, mai-or será sua contribuição e vice-versa. Portanto, a efetivação daprogressividade fará com que serealize o princípio da capacidadecontributiva.

O IPTU e os PrincípiosCorrelatos

Princípio da estrita legalidade

O princípio da estrita legali-dade é encontrado no artigo 150,inciso I, da Constituição Federal,que assim dispõe: “sem prejuízode outras garantias asseguradas aocontribuinte, é vedado à União,aos Estados, ao Distrito Federale aos Municípios: I - exigir ouaumentar tributo sem lei que oestabeleça”.

O princípio da legalidade tri-butária, segundo Cretella Júnior,

“[...] nada mais é do que aconsagração da tradicionalgarantia existente no Estadode Direito, segundo a qual otributo só poderá ser criado– ou aumentado – por lei,consistindo em mera trans-posição, para esta área espe-cializada, da regra genérica,outorgada a todo cidadão, deque ‘ninguém será obrigadoa fazer ou deixar de fazer al-guma coisa, senão em virtu-de de lei’ (Constituição de1988, art. 5º, III; Constitui-ção de 1969, art. 153, §2º;Constituição de 1967, art.150, §2º; Constituição de1946, art. 141 §2º; Constitui-ção de 1934, art. 113, inc. 2;Constituição de 1891, art.72, §1º)”.15

Assim, observa-se que a legis-lação tributária é privativa doPoder Executivo. Por meio dodecreto, poderá ser corrigidomonetariamente o valor do tri-buto. Não se tratando de cor-reção de valores monetários, ouse tratando de aumento de tri-buto, só poderá ser feito pormeio de lei.

Diante disso, leciona WagnerBalera que “podemos considerara reserva de lei como o conteú-do mínimo do princípio da le-galidade a significar que somen-te a lei (ato emanado do PoderLegislativo) pode obrigar os ci-dadãos a cumprirem determina-das prestações que possam repre-sentar restrições à sua liberda-de, à sua segurança e ao seu pa-trimônio”.16

Como bem esclarece EduardoMarcial Ferreira Jardim, “tipici-

dade significa a exata adequaçãodo fato à norma”.17

Paulo Henrique do Amaralleciona que

“o tipo fechado ou cerrado de-fine, de modo exaustivo, seuselementos sempre necessári-os. Nesse tipo há a adequa-ção do fato concreto ao tipo,isto é, o fato concreto deveapresentar todos os elemen-tos do tipo.O tipo aberto apenas descreve,isto é, faz uma enumeraçãonão exaustiva de seus elemen-tos. No caso concreto podefaltar um elemento ou apre-sentar um elemento a mais,o que é irrelevante, podendoo tipo legal aberto ser aplica-do ao fato”.18 (grifo nosso)

Assim, de acordo com o prin-cípio da tipicidade, há a necessida-de de que a hipótese de incidênciaanteriormente descrita pela normaencontre perfeita adequação como fato gerador ocorrido.

A obrigação tributária surge,deste modo, com o fato geradorrealizado pelo sujeito passivocapaz de ensejar tal obrigação.Por este princípio, o IPTU sóserá devido se o sujeito passivorealizar um fato concreto hipo-teticamente previsto pela leicomo capaz de gerar esta obri-gação tributária.

Princípio da igualdade

No campo da tributação, aConstituição Federal de 1988estabelece em seu artigo 150,inciso II, que “sem prejuízo deoutras garantias constitucio-nais asseguradas ao contribu-inte , é vedado à União, aosEstados, ao Distrito Federal e

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM IPTU PROGRESSIVO

aos Municípios: II – instituirtratamento desigual entre con-tr ibuintes que se encontremem situação equivalente, proi-b ida qua lquer d i s t inção emrazão de ocupação profissionalou função por eles exercida, in-dependentemente da denomina-ção jurídica dos rendimentos,títulos ou direitos”.

Por este princípio, ao cri-ar o tributo, o legislador de-ve rá t r a t a r i gua lmente osiguais e desigualmente os de-siguais.

A questão é saber quais oscontribuintes que se encontramem situação equivalente ou não.Para tanto, há de se observarque o princípio da igualdade tri-butária decorre do princípiogeral da igualdade e está intima-mente ligado ao princípio da ca-pacidade contributiva, que daráao mesmo os parâmetros a se-rem seguidos quando da suaaplicação.

O Município deve, portanto,ao instituir o IPTU, aferir crité-

rios para a sua cobrança de acor-do com o princípio da igualdade.Sendo assim, aqueles que estão namesma situação, terão o mesmotratamento quando da cobrançado referido imposto.

Princípio do não-confisco

A Constituição Federal de1988 proíbe o Poder Público deutilizar tributo com efeito deconfisco. Embora implícita emtodas as Constituições brasilei-ras, a vedação ao confisco estáexplicitada no texto constituci-onal em vigor no Capítulo re-ferente ao Sistema TributárioNacional, na Seção “Das limita-ções do poder de tr ibutar”,princípio desconhecido dos le-gisladores da Lei n.º 9.783/99,que ofende o inc. IV do art. 150da CF, in verbis:

“Art. 150. Sem prejuízo deoutras garantias asseguradasaos contribuintes, é vedado àUnião, aos Estados, ao Distri-

to Federal e aos Municípios:[...]IV. utilizar tributo com efei-to de confisco”.

Observa-se, assim, a expressavedação ao confisco.

O tributo com efeito de con-fisco é tributo que, por ser exces-sivamente oneroso, é sentidocomo penalidade.

Cretella Júnior assim definetributo confiscatório:

“Se o quantum do tributo fortão grande ou oneroso quechegue a atingir o patrimôniodo contribuinte, desfalcando-o no mais alto grau, temos o‘tributo confiscatório’. Ocontribuinte precisará alienarseus bens para pagar o fisco.Por isso, a utilização de tri-buto com efeito de confisco évedado à União, aos Estados,ao Distrito Federal e aosMunicípios”. 19

Portanto, o tributo nuncadeve ser criado, calculado ou co-brado de modo que prejudiqueo contribuinte, tornando inefici-ente, ainda menos, paralisando ouobstruindo a atividade produti-va do contribuinte. Quer isso sig-nificar que o imposto sobre a pro-priedade territorial urbana, ain-da que admita a cobrança combase na progressividade, não podeser confiscatório.

Princípio da capacidadecontributiva

O princípio da capacidadecontributiva é aquele que exigeque a tributação seja feita emproporção à riqueza de cadacontr ibuinte . Capacidadecontr ibut iva é , ass im, a

Mas ao falarmos do IPTU,devemos lembrar que sempre

existirão alguns aspectosnegativos que podem

representar verdadeirosobstáculos à exploração do seu

potencial arrecadador

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potencial idade de contr ibuircom os gastos públicos.

Segundo Isso ChaitzScherkerkewitz, “possuir capa-cidade contributiva é possuir ca-pacidade para ser contribuintede determinado tributo em vir-tude da posse dos requisitos eco-nômicos e jurídicos fixados emlei para tanto”. 20

Alguns autores fazem distin-ção entre “capacidade contribu-tiva” e “capacidade econômica”.Assim, nas palavras de CelsoRibeiro Bastos e Ives GandraMartins,

“embora sejam ambas dimen-sões da capacidade do contri-buinte pagar tributo, têm, aomeu ver, conotação distinta.Contributiva é a capacidadedo contribuinte relacionadacom a imposição específica ouglobal, sendo, portanto, di-mensão econômica particularde sua vinculação ao poder tri-butante, nos termos da lei.Capacidade econômica é a ex-teriorização da potencialidadeeconômica de alguém, inde-pendente de sua vinculação aoreferido poder”.21

Regina Costa Helena esclare-ce: “No que concerne à capacida-de contributiva, não se pode ne-gar o fundamento econômico doconceito, por vezes identificávelcom ‘capacidade econômica’. Poroutro lado, também não se poderefutar seu conteúdo jurídico, namedida em que se encontra amal-gamado com a ideia de justiça tri-butária”.22 E, ainda, cita o seguin-te raciocínio:

“Luigi F. Natoli, em mono-grafia acerca do assunto, afir-ma que a expressão ‘capacida-

de econômica’ é ainda maisvaga que ‘capacidade contribu-tiva’, o que resulta difícil aidentificação mesma dos doisconceitos. Todavia, exemplifi-ca, um sujeito pode ser capazeconomicamente, no sentidode possuir renda ou patrimô-nio, mas não tem nenhumacapacidade contributiva, seesta renda ou patrimônio per-mitir somente um mínimo vi-tal, intributável. Assim, de-monstra, numa primeira conclu-são, a natureza ‘essencialmen-te’ mas não ‘exclusivamenteeconômica’ da capacidade con-t r ibu t iva” . 23

Roque Antônio Carrazza ob-serva que “estamos percebendoque, no Brasil, capacidade contri-butiva é o mesmo que capacidadeeconômica. Conquista do EstadoModerno, ajuda a realizar a justi-ça fiscal, porque tem por escopofazer com que cada pessoa cola-bore com as despesas públicas namedida de suas possibilidades”.24

Ora, a nosso ver, quem nãotem capacidade contributiva nãotem capacidade econômica evice-versa.

Portanto, pode-se concluirque capacidade contributiva ecapacidade econômica têm seusconceitos tão próximos, quequalquer diferenciação torna-sedesnecessária. Mesmo grandesdoutrinadores que discordamda similitude dos conceitos, ob-servam que tais expressões po-dem ser encontradas contidasumas nas outras. Assim, concor-dando com a opinião de RoqueAntônio Carraza, entendemosque, no Brasil, capacidade con-tributiva e capacidade econômi-ca devem ser utilizadas comosinônimas.

O princípio da capacidadecontributiva é considerado comoprincípio norteador de todo osistema tributário.

De acordo com o que dispõeo art. 145, §1º, o princípio dacapacidade contributiva abrangeapenas os impostos (tributos nãovinculados). Dizem respeito so-mente a impostos diretos que têmcaráter pessoal.

A utilização do legislador daexpressão “sempre que possível”,à nitidez, só pode estar relacio-nada à espécie “imposto”, sendoque, nos indiretos, a graduaçãonão tem como ser pessoal.25

Há, no entanto, entendimen-to diverso.

De acordo com Eduardo Mar-cial Ferreira Jardim,

“a nosso ver o significado dodispositivo é o seguinte: sem-pre que possível a tributaçãohaverá de ser efetivada pormeio de impostos de caráterpessoal, porquanto estes sãomais susceptíveis de seremaferidos em função da capa-c idade contr ibut iva .Esclareça-se, de outra parte,que o reverso não éverdadeiro, ou seja, ao firmara premissa enunciada, oconstituinte não quis dizerque os demais tributos esta-riam fora do alcance do men-cionado princípio. Trata-sede um reconhecimento explí-cito de que os tributos sãopersonalizados, conquantotambém subordinados aomesmo vetor, não permitema aferição tão rigorosa quantoos impostos de t imbrepessoal”.

José Marcos Domingues deOliveira vem a dar ênfase a esse

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entendimento: “É verdade que acapacidade contributiva tem apli-cação mais ampla aos impostosporque estes gravam fatos da vidaeconômica privada que indepen-dem de qualquer atividade esta-tal específica referida ao contri-buinte, e, por isso, neles avulta ofator ‘riqueza do contribuinte’.Mas isto não justifica negar aoprincípio eficácia quanto aos de-mais tributos”.26

José Artur Lima Gonçalvesnos explica como seria a aplica-ção do princípio da capacidadecontributiva a outros tributosque não os impostos:

“[...] conforme estejamos tra-tando de tributos vinculadosou não vinculados, a regra dacapacidade contributiva temalcances e fases de aplicação(em relação ao processo dinâ-mico da tributação) distin-tos. Nos impostos atua, porum lado, como pauta fixado-ra dos limites máximo e mí-nimo de exação, e, por outrolado, como possível elemen-to de discriminação. Nos tri-butos vinculados, a seu tur-no, atua somente como fun-damento do discrímen, ser-vindo, portanto, de instru-mento autorizador de revi-são e controle judiciário ten-dente a coarctar eventual des-propositada pretensão de dis-criminação entre situaçõesque não revistam distintasaptidões contributivas”.27

Dispõe Luiz Carlos TroucheRamina:

“Note-se que este princípio re-fere-se aos impostos, espécietributária não vinculada a qual-quer atuação estatal, ou seja,

independentemente de qual-quer atividade específica dogoverno tributante em relaçãoao contribuinte. No que se re-fere às taxas, o legislador com-petente deve observar a regrada retributividade ou remune-ração. Na contribuição de me-lhoria respeitar-se-á a regra dobenefício advindo da realizaçãode obra pública”.28

Quanto ao sujeito, de acordocom Regina Helena Costa, verbis,“entendemos que, feitas pequenasadaptações ao conceito clássico, opostulado da capacidade contri-butiva tem aplicação também emrelação às pessoas jurídicas, semalteração de sua essência comovetor para o exercício de um tri-butação justa em matéria deimpostos”.29

Essa colocação ganha melhoranálise feita por Kiyoshi Harada:“Finalmente, convém lembrarque, como o contribuinte podeser pessoa física ou jurídica, oprincípio constitucional da capa-cidade contributiva se aplica, tam-bém, às firmas ou empresas[...]”.30

Tal entendimento se deve aofato de que a própria Constitui-ção Federal não fez qualquer dis-tinção acerca do destinatário doprincípio em análise. Sendo as-sim, tem-se que o princípio dacapacidade contributiva abrangeo contribuinte, seja pessoa física,seja jurídica.

Observe-se que não é qualquerindivíduo que pode ser sujeitopassivo.

Geraldo deixa claro esse enten-dimento: “Sujeito passivo sóquem, nos impostos, revele capa-cidade econômica (art. 145, §1º)provocando o fato ou dele parti-cipando, ou quem receba os atos

de polícia ou serviços públicos(art. 145,II) ou, ainda, o proprie-tário imobiliário (art. 145, III)”.31

Quanto às pessoas públicas,esclarece: “Em se tratando de im-postos, as pessoas públicas nãopodem ser sujeito passivo, devi-do ao princípio constitucional daimunidade tributária (art. 150,VI). Já no que se refere a tribu-tos vinculados, nada impede que,também, pessoas públicas delessejam contribuintes”.32

O IPTU, como imposto queé, deve ser mensurado conformea capacidade contributiva do in-divíduo apurada objetivamente,ou seja, o que importa é a situa-ção concreta do contribuinte deter um imóvel, independente-mente das dificuldades econômi-cas reais pelas quais vem passan-do. Quanto maior for a capaci-dade contributiva, maior será aalíquota.

“[...] Quando um contribuin-te alega que, apesar de ser pro-prietário de um valioso imó-vel, não possui renda para ar-car com o IPTU devido, nãojulgamos estar o Juiz possibi-litado a dispensar-lhe o paga-mento do tributo, por forçade uma suposta ‘ausência in casude capacidade contributivasubjetiva’. Na verdade, há simcapacidade subjetiva nestecaso, bastando que o contribu-inte aceite a realidade de suareal situação econômica e ad-quira um imóvel mais compa-tível com suas condições – su-pondo, é claro, que o valor doIPTU não se mostre per seconfiscatório, e o imóvel nãoseja de tal maneira simplórioque exigir que o contribuintese mude para outro mais aca-nhado implique em ferir sua

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dignidade ou impor-lhe ingen-tes sacrifícios”.33

A capacidade contributivaobjetiva é a que mais coaduna coma realidade brasileira. Com certe-za quis a nossa Carta Magna de1988 estabelecê-la quando discipli-nou, em seu art. 145, § 1º, de for-ma expressa, o princípio da capa-cidade contributiva. Dessa forma,os impostos, como o IPTU, de-vem ser calculados de acordo comas manifestações de riqueza doindivíduo.

Espécies de Progressividade

Ao explicitar as espécies deprogressividade previstas no orde-namento jurídico brasileiro, nota-seclara a divisão conceitual entre aprogressividade fiscal e aprogressividade dita extrafiscal.

A progressividade fiscal visaalicerçar o aumento da arrecada-ção tributária, ao passo que a pro-gressividade extrafiscal relaciona-se ao poder tributante do entefederado detentor da competên-cia para a instituição do imposto,ou seja, o Município.

Nesta intrincada distinção, aprogressividade fiscal é realizadacom o intuito de aumento da ar-recadação, respeitando o princí-pio da capacidade contributiva ecom fundamento constitucionalno § 1º, do art. 146.

Estabelece a Carta Constitu-cional, ainda, a progressivida-de extrafiscal a fim de atenderà função social da propriedade.Sua inserção deu-se com basenos arts. 5º, I, e 150, II, da CF/88, que disciplinam a progres-sividade de acordo com o prin-cípio de igualdade, atendendoaos critérios da capacidade con-tributiva (art. 145, § 1º, da CF/

88); no art. 156, § 1º, I e II34:em função do valor, da locali-zação e do uso e no art. 182, §4º, II, da CF/88 (progressivi-dade no tempo).

EXTRAFISCALIDADE E FUNÇÃOSOCIAL DA PROPRIEDADE

O artigo 5.º, inciso XXII, daMagna Carta de 1988 garanteo direito de propriedade. Aopretender a garantia desse direi-to, é estabelecida a extrafiscali-dade do imposto sobre propri-edade territorial urbana, que,muito além de representar ar-recadação de tributo, garante,também, outras funções, comoa de reguladora da economiavigente.

A prova contumaz da funçãoextrafiscal do imposto em análise éencontrada no §1.º do art. 156(redação determinada pela EC 29/2000) e §4.º do art. 182, CF/88,ao consubstanciarem o efeito pro-gressivo em relação ao IPTU parapropriedade que não atenda à suafunção social. Saliente-se que o§4.º do art. 182 da CF/88 exigelei federal para instituir este tipode progressividade.

PROGRESSIVIDADE NO IPTU

Progressividade é o “fenôme-no pelo qual as alíquotas de umimposto crescem à medida queaumentam as dimensões ou in-tensidade da circunstância consi-derada pela norma como condi-ção de sua aplicabilidade”.35

Paulo de Barros Carvalho afirma:

“Ao construir suas pretensõesextrafiscais, deverá o legisladorse pautar, inteiramente, dentrodos parâmetros constitucio-nais, observando as limitações

de sua competência impositi-va e os princípios superioresque regem a matéria, assim osexpressos e os implícitos. Nãotem cabimento aludir a regi-me especial, visto que o instru-mento jurídico utilizado é in-variavelmente o mesmo, mo-dificando-se tão-somente a fi-nalidade de seu manejo”.36

Originariamente, a CartaConstitucional de 1988 previu no§ 1º do art. 156 que “o impostoprevisto no inciso I poderá serprogressivo, nos termos de leimunicipal, de forma a asseguraro cumprimento da função socialda propriedade”.

Com a Emenda Constitucionaln.º 29, de 13/09/2000, foramincluídos ao §1.º do art. 156 da CF/88 os incisos I e II. Com a redaçãoconferida por esta Emenda, aalíquota poderá ser progressiva emrazão do valor do imóvel (art. 156,§ 1º, I) e diferenciada de acordo coma localização e uso do imóvel (art.156, § 1º, II), sem prejuízo daprogressividade no tempo a que serefere o art. 182, § 4º, II, da Lei Maior.

Conforme art. 182, § 4º, II, daConstituição Federal de 1988, a alí-quota poderá, inclusive, ser progres-siva no tempo como aplicação depena ao proprietário do solourbano não edificado, subutilizadoou não utilizado, com o objetivode promoção do adequado apro-veitamento do solo urbano.

Denota-se da análise constituci-onal que a progressividade incidenteno imposto sobre a propriedadeterritorial urbana faz-se necessáriapara assegurar o cumprimento dafunção social.

A progressividade no tempotem por escopo o alcance da fun-ção social da propriedade maisrapidamente.

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Deflui-se destas observaçõesque, primeiramente, o mau uso dapropriedade deve ser o fator pre-ponderante para a progressividade.Em segundo lugar, quanto maiorfor o tempo que o proprietáriodeixar de seguir as determinações doMunicípio relativas à função social dapropriedade, maior deverá ser a suaalíquota.

Na progressividade do IPTU, aalíquota é distinta conforme o va-lor venal do imóvel. Na perspectivada progressividade, é analisado o PlanoDiretor do Município, que deve ater-se, estritamente, aos casosexpressamente previstos na Consti-tuição, como decidiu o SupremoTribunal Federal ao julgar a AçãoDeclaratória de Constitucionalidade –ADC 8-MC.

Nesse raciocínio, o SupremoTribunal Federal editou a Súmu-la 688, entendendo inconstituci-onal a lei municipal que tenha es-tabelecido, antes da EmendaConstitucional n.º 29/2000, alí-quotas progressivas para o IPTU,salvo se destinadas a assegurar ocumprimento da função social dapropriedade urbana.

Ao tratar da possibilidade deinstitui-se a progressividade emrelação ao IPTU pelo Município,Aires Barreto afirma que a Cons-tituição Federal “autorizou a pro-gressividade, mas lhe impôs res-trição: ‘de forma a assegurar ocumprimento da função social dapropriedade’”.37

Conferida nova redação aoart. 156, §1.º, da ConstituiçãoFederal de 1988 pela EmendaConstitucional n.º 29, os muni-cípios passam a dispor da compe-tência para instituir o IPTU comas seguintes alíquotas, além da alí-quota padrão: alíquota progres-siva em razão do valor do imóvel(art. 156, § 1º, I); alíquota dife-

renciada de acordo com a locali-zação e o uso do imóvel (art. 156,§1º, II) e alíquota progressivida-de no tempo como aplicação depena ao proprietário do solo ur-bano não edificado, subutilizadoou não utilizado, com o objetivode promoção do adequado apro-veitamento do solo urbano.

IPTU E A ARRECADAÇÃOPRÓPRIA DOS MUNICÍPIOSBRASILEIROS

Os 5.564 municípios brasileirossão considerados, de acordo com aConstituição Federal de 1988,membros da República Federati-va do Brasil. Tal status foi concre-tizado pela estrutura tributáriaoriginada do Pacto Federativo, oqual teve como um de seus objeti-vos a garantia da reforma tributá-ria e fiscal, definindo com clarezaos aspectos envolvidos na partilhade tributos entre os três níveis degoverno (federal, estadual e mu-nicipal) e a distribuição de seusencargos. A sustentabilidade doPacto Federativo gira em torno dacapacidade do cumprimento dasatribuições definidas para cadaente federado. Essa capacidadedecorre da relação entre os meiosdisponíveis (recursos financeiros)e a extensão de suas responsabili-dades.

Mesmo existindo lacunas nostermos que atribuem competên-cias aos membros da Federação,o art. 30 da Constituição Federalde 1988 define que compete aosmunicípios brasileiros, dentreoutras atribuições: (i) organizar eprestar, diretamente ou sob regi-me de concessão ou permissão, osserviços públicos de interesse lo-cal, incluído o de transporte co-letivo, que tem caráter essencial;(ii) manter, com a cooperação téc-

nica e financeira da União e doEstado, programas de educaçãoinfantil e de ensino fundamental;(iii) prestar, com a cooperaçãotécnica e financeira da União e doEstado, serviços de atendimentoà saúde da população; (iv) promo-ver, no que couber, adequadoordenamento territorial, median-te planejamento e controle douso, do parcelamento e da ocu-pação do solo urbano; (v) promo-ver a proteção do patrimônio his-tórico-cultural local, observada alegislação e a ação fiscalizadorafederal e estadual.

A capacidade para o cumprimen-to de tais obrigações é proporciona-da pelo recebimento de transferên-cias de recursos originários dosgovernos estaduais e federal, alémdos recursos originários da institui-ção, e pela arrecadação dos tribu-tos de sua competência e de possí-veis ganhos com aplicações de seuspróprios recursos.

Estudo baseado na arrecada-ção e na distribuição da carga tri-butária incidente no Brasil, re-vela que, em um período de 15anos (de 1991 a 2005), a arreca-dação dos tributos de competên-cia municipal atingiu a média de1,33% do Produto Interno Bru-to (PIB) Nacional. Neste mesmoperíodo, a carga tributária totalincidente na economia nacionalatingiu uma média de 30,8% doPIB Nacional, partindo de24,62% em 1991 e manteve-se emuma tendência crescente até atin-gir a significativa marca de37,37% em 2005. O ente federa-tivo que mais contribui para amanutenção deste elevado per-centual tributário é a União (Go-verno Federal) que responde poruma carga tributária média de21,22% no mesmo período emque os tributos de competência

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dos governos estaduais atingirama média de 8,23% do PIB. Apre-sentamos, a seguir o gráfico queilustra tais informações:

Pela baixa importância relati-va, apresentada pela parcela dacarga tributária de competênciamunicipal quando comparadocom o PIB do período, optamospor uma análise mais focalizadadeste conjunto de fontes de Re-ceita Corrente Pública.

A análise específica e maisaprofundada sobre a receita de-corrente da arrecadação própriamunicipal nos revela uma signifi-

cativa e interessante gama de in-formações que nos permitem fa-zer uma série de relevantes ob-servações.

Neste sentido, observamosque, embora os municípios bra-sileiros, em média, tenham con-tado com 16,28% do total da re-ceita disponível para a execuçãodo Orçamento Público, no mes-mo período, foram responsáveis

pela arrecadação média de 4,30%do total consolidado das receitasarrecadadas pelos três níveis degoverno.

A diferença entre a média dareceita total disponível para aexecução orçamentária munici-pal e a média de arrecadação pró-pria municipal atinge o patamarde aproximadamente 12% dasreceitas consolidadas do perío-do. Tal percentual foi direcio-nado aos orçamentos municipaispor meio das transferências in-tergovernamentais, sendo 5,28%Transferências Constitucionais

procedentes da União e o res-tante, 6,87%, das Transferênci-as Constitucionais procedentesdos estados.

Tal análise demonstra que osmunicípios brasileiros, em média,são responsáveis pela arrecadaçãode 26,44% dos recursos que neces-sitam para cumprir todas as suascompetências, atribuídas pelo Pac-to Federativo, fixadas pela Cons-

tituição Federal de 1988. Sendoassim, tal análise indica que existeum elevado grau de dependênciados municípios em relação às trans-ferências intergovernamentais.

Trazendo os componentes dareceita proveniente da arrecada-ção própria dos municípios parao foco das análises, podemosperceber detalhes que, antes,pela baixa participação da arre-cadação própria municipal emrelação ao total do PIB Nacio-nal, permaneciam ocultos. Emum esforço voltado para a me-lhor visualização do comporta-

mento histórico e da composi-ção destas fontes de recursosorçamentários, apresentamos oseguinte gráfico:

As linhas indicam que, embo-ra as receitas provenientes da ar-recadação própria do conjunto demunicípios brasileiros tenhamcrescido no período, desde 1998,permanecem no mesmo patamarem relação ao PIB Nacional, com

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arrecadação equivalente aproxima-da de 1,50% do PIB.

A mesma análise permite veri-ficar que, no período anterior aoano 2000, a arrecadação munici-pal não apresentava um compor-tamento linear, ocorrendo algunspicos negativos que indicam que-da na arrecadação. Tais picos es-tão bem localizados entre os anosde 1992 e 1993, voltando a ocor-rer no ano de 1996. No mesmográfico, observamos que as linhas,que individualizam o comporta-mento da arrecadação dos tribu-tos de competência municipal,indicam que o tributo que con-tribui diretamente para a ocorrên-cia dos referidos picos é justamen-te o IPTU.

O gráfico deixa claro que háuma relação direta entre as ocor-rências dos referidos picos com ocomportamento da arrecadaçãodo IPTU. Resta-nos então iden-tificar quais as características doIPTU, bem como quais as parti-cularidades dos momentos histó-ricos, para tentarmos explicar taisocorrências.

O IPTU, como já destacamosneste estudo, é um Imposto, de

competência municipal, aplicadosobre as propriedades e não sobrea renda ou mesmo o consumo. Talnatureza confere algumas vantagensem relação aos demais tributos.Dentre tais vantagens, podemosdestacar a imobilidade da base tri-butária, o que oferece um potenci-al minimizador dos conflitos decompetência para a cobrança doimposto. Outro destaque favorá-vel ao IPTU é a menor sensibilida-de do preço dos imóveis a mudan-ças abruptas nos níveis das ativida-des econômicas, como as que viven-ciamos na “crise econômica”. Taiscaracterísticas tornam-se mais rele-vantes ao considerarmos que a de-manda por serviços públicos ten-dem a aumentar justamente quan-do as atividades econômicas, e con-sequentemente o emprego e a arre-cadação de tributos sobre essas ati-vidades, sofrem uma retração.

Mas, ao falarmos do IPTU,devemos lembrar que sempreexistirão alguns aspectos negativosque podem representar verdadei-ros obstáculos à exploração do seupotencial arrecadador, que de-pende diretamente de uma sériede fatores estruturais e adminis-

trativos, tais como: existência efe-tiva de um cadastro imobiliáriomunicipal atualizado, atualizaçãomonetária dos imóveis, efetivaexecução das fases da receita tri-butária: previsão, lançamento,cobrança e recolhimento.

A prática evidencia que os pe-quenos e médios municípios bra-sileiros têm sérias dificuldadespara criar e manter uma efetivaestrutura de fiscalização e arreca-dação tributária. Como consequ-ência, os levantamentos realizadospela Secretaria do Tesouro Naci-onal (STN) em relação aos dadoscontábeis dos municípios brasilei-ros no ano de 2007 (http://w w w . s t n . f a z e n d a . g o v . b r /estados_municipios/index.asp)apontam para uma enorme con-centração da arrecadação doIPTU, sendo que 50,6% do totaldas receitas provenientes do IPTUforam arrecadados por apenas 10municípios, componentes de umaamostra de 5.296 municípios bra-sileiros.

Juntando-se à falta de estrutu-ra as ingerências de ordem políti-ca na isenção do tributo, princi-palmente em ano eleitoral, temos

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então o cenário completo acercados pontos negativos e dos obs-táculos para a obtenção de melho-res índices na arrecadação das re-ceitas provenientes do IPTU nospequenos e médios municípios.Para corroborar tal observação,informamos que os fatos históri-cos ocorridos nos períodos depicos negativos da arrecadaçãotributária municipal, nos anos de1992 e 1996, como mostra oGRÁFICO III, foram as eleições

locais para vereadores e prefeitos.Em 2000 e 2004, também houveeleições municipais, porém estasocorreram após a promulgação daLei Complementar n.º 101, de 4de maio de 2000, Lei de Respon-sabilidade Fiscal (LRF), que, den-tre outros pontos, estabelece nor-mas de finanças públicas voltadaspara a responsabilidade na gestãofiscal. O tema “Receita Tributá-ria” tem merecido redobrada

atenção por parte dos administra-dores públicos, eis que a arreca-dação dos tributos municipais éum dos requisitos para que se te-nha uma gestão fiscal responsável.

CONCLUSÕES

1 – O imposto sobre a proprieda-de territorial urbana é de compe-tência dos municípios, sendo direto,progressivo e real.

Anuncie

na próxima edição.

(21) 2462-1933

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NOTAS

1 Valor de venda ou valor mercantil.2 Excepcionalmente, a União pode instituí-lo e cobrá-lo sobre os imóveis situados em Território Federal não dividido em municípios (art. 147, CF/88).3 BARRETO, Aires F. Curso de Direito Tributário Municipal. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 175.4 CASSONE, Vittorio. Direito Tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 16ª ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 104.5 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p.142.6 HARADA, Kiyoshi. Sistema tributário na Constituição de 1988: tributação progressiva. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 152.7 HARADA, Kiyoshi. Sistema tributário na Constituição de 1988: tributação progressiva. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 152.8 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 141.9 FREITAS, Vladimir Passos de (coord.). Código tributário nacional comentado: doutrina e jurisprudência, artigo por artigo, inclusive ICMS (LC 87/96), ISS (DL 406/68), IPVA. São Paulo: Revista dosTribunais, 1999, p. 46.10 FREITAS, Vladimir Passos de (coord.). Código tributário nacional comentado: doutrina e jurisprudência, artigo por artigo, inclusive ICMS (LC 87/96), ISS (DL 406/68), IPVA. São Paulo: Revistados Tribunais, 1999, p. 46.11 O IPTU é imposto real, conforme tantas vezes foi afirmado pelo STF. Isso porque tem como critério a simples propriedade do imóvel urbano, sem qualquer consideração relativamente à situaçãopessoal do proprietário. Por isso, aliás, que o STF dizia da impossibilidade de se instituir IPTU progressivo, eis que não se presta à graduação conforme a capacidade contributiva, não visualizada nomesmo. No sentido de que, após a EC 29/00, o IPTU passou a ter também natureza de imposto pessoal. (PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina eda Jurisprudência. 8ª.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. ESMAFE, 2006, p. 450.).12 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário: Capacidade Contributiva: conteúdo e eficácia do princípio. 2ª ed. rev. e atual/ da obra premiada pela Academia de Direito Tributário,Livro do Ano de 1988. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 59.13 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 2ª edição. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 93. (Coleção Estudos de Direito Tributário).14 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 2ª edição. São Paulo: Malheiros, 1996, p.103. (Coleção Estudos de Direito Tributário).15CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Tributário Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 58-59.16 BALERA, Wagner. O Princípio da Legalidade no direito tributário. Caderno de Pesquisas Tributárias, n.º 6, p. 410 apud FIORILLO, Celso Antônio Pacheco e FERREIRA, Renata Marques. DireitoAmbiental Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 138.17 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual do direito financeiro e tributário. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 141.18 AMARAL, Paulo Henrique do. Direito tributário ambiental. São Paulo: RT, 2007, p. 77.19 CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Tributário Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 91.20 SCHERKERKEWITZ, Isso Chaitz. Considerações sobre o sistema Constitucional Tributário. São Paulo, 1994. 65p. (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católicade São Paulo – PUC.21 BASTOS, Celso Ribeiro. MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Vol. 6. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 57-58.22 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 2ª. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 33. (Coleção Estudos de Direito Tributário).23 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 2ª. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 33. (Coleção Estudos de Direito Tributário).24 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 13ª. edição. rev. amp. atual. de acordo com a Emenda Constitucional nº. 21/99. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 75.25 BASTOS, Celso Ribeiro. MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Vol. 6. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 60-61.26 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário: Capacidade Contributiva: conteúdo e eficácia do princípio. 2ª ed. rev. e atual/ da obra premiada pela Academia de Direito Tributário,Livro do Ano de 1988. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 82.27 GONÇALVES, José Artur Lima. Princípio da isonomia. Aplicação de um modelo. São Paulo, 1992. 117p. (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo– PUC.28 RAMINA, Luiz Carlos Trouche. Iniciação ao direito financeiro e tributário. 2ª. ed. São Paulo: Resenha Tributária, 1996, p.75.29 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 2ª. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 60. (Coleção Estudos de Direito Tributário).30 HARADA, Kiyoshi. Sistema tributário na Constituição de 1988: tributação progressiva. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 167.31 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 34.32 Ibidem, p. 36.33 GODOI, Marciano Seabra de. Justiça, igualdade e direito tributário. São Paulo: Dialética, 1999, p.200.34 “Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I – propriedade predial e territorial urbana; [...] §1.º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, §4.º, II, o impostoprevisto no inciso I poderá: I – ser progressivo em razão do valor do imóvel; e II – ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel”.35 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 296, apud AMARAL, Paulo Henrique do. Direito TributárioAmbiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 105.36 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17ª. ed. – São Paulo: Saraiva, 2005, p. 245-246.37 BARRETO, Aires F. Curso de Direito Tributário Municipal. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 253.

2 – A instituição do IPTU encon-tra limite em alguns princípiosconstitucionais, devendo ser apli-cado nos expressos termos da lei(princípio da estrita legalidade),não podendo ser excessivo, a pon-to de retirar do contribuinte ascondições mínimas para uma vidadigna (princípio do não-confisco),aferido conforme a capacidadecontributiva do contribuinte,analisada objetivamente.3 – É característica do IPTU noBrasil, consagrada pela Carta

Constitucional de 1988, a progres-sividade, devendo o Municípiorespeitar as hipóteses previstasconstitucionalmente, com o intui-to de garantir a função social dapropriedade. A progressividadepoderá ser fiscal ou extrafiscal, ob-servando que esta última só pas-sou a ser admitida após a EmendaConstitucional n.º 29/2000.4 – Embora sendo a instituição ea arrecadação do IPTU de com-petência municipal, garantida pelaCarta Constitucional de 1988,

existindo também a possibilidadeda progressividade desse tributo,a prática – retratada nos levanta-mentos feitos sobre da arrecada-ção dos tributos municipais – nosrevela que ainda há muito espaçopara a execução de ações que ve-nham a fortalecer a estrutura pró-pria de fiscalização e arrecadaçãotributária e, assim, contribuir paraque os municípios cumpram opapel delineado pelo Pacto Fede-rativo e alcancem toda a extensãode suas responsabilidades.

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

Relevant aspects of the progressive tax and the municipalities own revenues

This study aims to analyze the general property tax and urban land, under the aspect of progressivity and theMunicipalities own revenues. Theme wins major “if they wish to municipalities, to use the property tax so punitivethat which does not fulfill the social function of property. In this perspective, they have to trace the contours andlimits of progressivity. With regard to the theoretical-methodological aspects were conducted to collect and studyarticles and other doctrines pertaining to the subject, leaving aside the legislation and jurisprudence related to thetopic under review, as well as research, collection and interpretation of information pertaining to tax collection,available in the database maintained by the National Treasury Secretariat - STN. As main results, the article revealsthe limits of the municipality in the application of progressivity in the tax on urban land ownership in respect of theprinciples and constitutional principles, ensuring the proper use of urban property, in space and time. The study alsoseeks evidence of some aspects related to the structure of supervisory and municipal tax revenues.

Keywords: Property tax. Advance. Ability to pay. Social function of property. Collection.

Aspectos relevantes del impuesto progresivo y los ingresos propios de los municipios

Este estudio tiene como objetivo analizar el impuesto sobre la propiedad en general y de la tierra urbana, bajo elaspecto de la progresividad y los ingresos propios de los Municipios. El tema principal es grande, si lo desean a losmunicipios, para utilizar el impuesto a la propiedad por lo punitiva que no cumple la función social de la propiedad.En esta perspectiva, tienen que trazar los contornos y límites de la progresividad. En lo que respecta a los aspectosteóricos y metodológicos, se llevaron a cabo para recoger y estudiar los artículos y otras doctrinas relacionadas conel tema, dejando de lado la legislación y la jurisprudencia relacionada con el tema objeto de examen, así como lacolección de investigación, y la interpretación de la información relativa a la recaudación de impuestos, disponibleen la base de datos gestionada por la Secretaría del Tesoro Nacional - STN. Como principales resultados, el artículopone de manifiesto los límites del municipio en la aplicación de la progresividad en el impuesto a la propiedad de latierra urbana en el respeto de los principios y los principios constitucionales, garantizando el uso adecuado de lapropiedad urbana, en el espacio y el tiempo. El estudio también busca evidencia de algunos aspectos relacionadoscon la estructura de los ingresos fiscales y de supervisión municipal.

Palabras claves: Impuesto sobre bienes inmuebles. Anticipo. Capacidad de pago. La función social de la propiedad. Larecolección.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASAMARAL, Paulo Henrique do. Direito tributário ambiental. São Paulo: Revista dos tribunais, 2007.ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.BALERA, Wagner. O Princípio da Legalidade no direito tributário. Caderno de Pesquisas Tributárias, n.º 6, p. 410 apud FIORILLO, Celso Antônio Pacheco e FERREIRA, Renata Marques. DireitoAmbiental Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009.BARRETO, Aires F. Curso de Direito Tributário Municipal. São Paulo: Saraiva, 2009.BASTOS, Celso Ribeiro. MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Vol. 6. São Paulo: Saraiva, 1990.CASSONE, Vittorio. Direito Tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 16ª ed. São Paulo: Atlas, 2004.CARRAZZA, Elizabeth Nazar. IPTU & progressividade: igualdade e capacidade contributiva. Curitiba: Juruá, 1998.CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 13ª. ed. rev. amp. atual. de acordo com a Emenda Constitucional n.º 21/99. São Paulo: Malheiros, 1999.CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17.ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2005.COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 2.ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996. (Coleção Estudos de Direito Tributário)CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Tributário Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1993FREITAS, Vladimir Passos de (coord.). Código tributário nacional comentado: doutrina e jurisprudência, artigo por artigo, inclusive ICMS (LC 87/96), ISS (DL 406/68), IPVA. São Paulo: Revista dosTribunais, 1999.FURLAN, Valéria. Imposto predial e territorial urbano. 2.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004.GODOI, Marciano Seabra de. Justiça, igualdade e direito tributário. São Paulo: Dialética, 1999.GONÇALVES, José Artur Lima. Princípio da isonomia. Aplicação de um modelo. São Paulo, 1992. 117p. (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo– PUC.HARADA, Kiyoshi. Sistema tributário na Constituição de 1988: tributação progressiva. São Paulo: Saraiva, 1991.JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Manual do direito financeiro e tributário. 2.ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994.OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário: Capacidade Contributiva: conteúdo e eficácia do princípio. 2.ª ed. rev. e atual/ da obra premiada pela Academia de Direito Tributário, Livrodo Ano de 1988. Rio de Janeiro: Renovar, 1998.PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 8.ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. ESMAFE, 2006.RAMINA, Luiz Carlos Trouche. Iniciação ao direito financeiro e tributário. 2. ed. São Paulo: Resenha Tributária, 1996.SCHERKERKEWITZ, Isso Chaitz. Considerações sobre o sistema Constitucional Tributário. São Paulo, 1994. 65p. (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católicade São Paulo – PUC.Sites:http://www.receita.fazenda.gov.br/Historico/Arrecadacao/Carga_Fiscal/default.htm

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

Heraldo da Costa ReisProfessor da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis da UFRJCoordenador do Centro de Estudos Interdisciplinares de Finanças Municipais ENSUR/IBAM

[email protected] / [email protected]

• FINANÇAS MUNICIPAIS •

O MUNICÍPIO NO CONTEXTO DAS MUDANÇASNO SISTEMA DE INFORMAÇÕES CONTÁBEIS

INTRODUÇÃO

Mudanças, todos estamos habi-tuados a realizá-las. Mudamos decasa para apartamento e vice-versa.Mudamos de roupa todo o santo dia,inclusive roupa de cama. Mudamosde pontos de vista sobre este ouaquele assunto. Enfim, a todo ins-tante, estamos diante de certas situ-ações que nos obrigam a rever asnossas posições e, assim, providen-ciarmos as nossas mudanças.

Na área da administração, es-sas situações não são diferentes.Observem, por exemplo, a nossaConstituição da República, que, detempo em tempo, os parlamenta-res sempre encontram um disposi-tivo para mudar a redação, em ra-zão de algo que já vem acontecen-do e produzindo algum efeito noseio da administração. Vejam apolêmica causada pela abertura decertos créditos extraordinários, cu-jos motivos vão de encontro ao queestá estabelecido no seu art. 167,§ 3º, os quais provocaram a exis-tência de uma emenda, que aindanão foi aprovada. Aliás, aprovei-tando o tema, seria interessanteperguntar e saber em que pontose encontra essa emenda, da qualnunca mais se teve notícia.

As mudanças, independente-mente da sua natureza e do seuobjetivo, sempre causam preocu-pações e, até mesmo, resistênciasem aceitá-las, seja por ser algonovo, seja, por vezes, algumas pes-soas não vislumbrarem razões plau-síveis que motivem a aceitação.

Às vezes, entretanto, a resistên-

cia às mudanças é motivada pelaforma com que elas são promovi-das, ou seja, porque alguns queremforçar a sua aceitação com alega-ções que, muitas vezes, não con-vencem àqueles que po-las-ão emprática. Outras, entretanto, aceitasem razão de alguns aspectos quese evidenciam, dentre os quaispode-se destacar o temor de preju-dicar a organização em que se vãorealizar as mudanças, ou mesmo atépor receio de ver piorar uma situa-ção já existente.

Em realidade, o que se está ten-tando trazer à tona para um deba-te, no sentido de facilitar a implan-tação e a implementação de mudan-ças propostas no âmbito da Admi-nistração Pública, é a questão dopreparo da administração para acei-tá-las. Enfim, o que se quer dizer éque, no âmbito da AdministraçãoPública, é necessário verificar o âni-mo dos gestores e dos servidorespara aceitá-las, e se estão prepara-dos para a missão de fazer com queas mudanças pretendidas funcionem.

AS MUDANÇAS NOSPROCEDIMENTOS CONTÁBEIS

As mudanças que versam sobreprocedimentos de Contabilidade aserem adotados pelas entidades detodas as esferas governamentaisenvolvem as NBCTs do ConselhoFederal de Contabilidade e o novoPlano Geral de Contas da Secretariado Tesouro Nacional, que já provi-denciou reestruturações das demons-trações contábeis da Lei n.º 4.320,de 17 de março de 1964.

A aplicação dos princípios funda-mentais de Contabilidade é a tônicadessas mudanças, dentre os quaisdestaca-se o de competência para oreconhecimento das receitas e dasdespesas governamentais.

A Lei Complementar n.º 131, demaio de 2009, trouxe-nos algumasnovidades ao introduzir mudançasna estrutura do art. 48 e seu pará-grafo único da Lei Complementarn.º 101/2000, tais como: a obriga-toriedade da divulgação em temporeal, inclusive com a utilização demeios eletrônicos, das receitas edespesas governamentais, estabe-lecendo para tanto os prazos neces-sários para a efetivação dessa di-vulgação para a União, os estados,os municípios e o Distrito Federal.

A outra determinação da lei men-cionada é a que diz respeito ao lan-çamento prévio das receitas e aosrespectivos recebimentos, o que dáo entendimento do emprego obriga-tório do regime de competência paraas receitas, conquanto as despesasjá devessem aplicar esse regime, oque, em realidade, não vem acon-tecendo, pois adotam o regime decompetência orçamentário com ful-cro no entendimento do art. 35, II,da Lei n.º 4.320/64, acima mencio-nada (veja também art. 6º da Porta-ria Conjunta STN/SOF n.º 3, de 14de outubro de 2008).

Evidentemente, qualquer ideia,procedimento ou técnica que seja di-ferente do que se fazia, traz-nos o re-ceio, o medo da novidade, a preocu-pação e a resistência à sua aceitação.

Ocorre que a obrigatoriedade dolançamento prévio da receita não é

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

tão nova, conforme se depreende daleitura das regras contidas nalegislação pertinente (veja os arts.39, 52 e 53, parágrafos e incisosrespectivos da Lei n.º 4.320/64combinado com as disposições da Lein.º 5.172/66) já fartamente mencio-nada e, como já posto tambémvárias vezes, a LC n.º 131/2009 ape-nas ratificou aquela obrigatoriedade.

Assim, ainda que não se trateefetivamente de uma mudança nalegislação, a implantação e a imple-mentação de uma nova atividade,de uma nova regra ou de um novoprocedimento exigem da administra-ção uma prévia preparação daequipe de servidores, inclusive dospróprios dirigentes, sobre as vanta-gens que advirão da sua aceitação,sem se descurar, entretanto, das di-ficuldades, talvez iniciais, que existi-rão durante aqueles exercícios porconta da resistência ou do despre-paro daqueles que a executarão. Poristo, não se pode determinar queuma nova ideia seja implantada eimplementada sem um conhecimen-to prévio da situação atual da admi-nistração da entidade, o que inclui oaspecto psicológico dos que vão li-dar diretamente com o assunto.

Assim, um diagnóstico preliminarda capacidade técnica dos servido-res, da capacidade tecnológica daadministração, das rotinas administra-tivas para conhecimento das relaçõesinternas dos setores envolvidos, dalegislação pertinente, da estruturaadministrativa da entidade para seconhecer as funções e as finalidadesdos setores, e, até mesmo, do conhe-cimento do quem é quem na admi-nistração, é necessário, para que oobjetivo pretendido seja alcançadosem qualquer dificuldade.

Por exemplo:

1. para o lançamento prévio dereceitas de tributos, é precisose tomar conhecimento da ori-

gem do direito sobre o recebí-vel, ou seja, é necessária a iden-tificação prévia da forma daconstituição do crédito tributá-rio, se é tributo de lançamentodireto, tributo de lançamentopor homologação ou tributo delançamento por declaração,para se estabelecer a rotinacorreta que indicará a integra-ção do setor da Contabilidadecom o setor responsável por umdaqueles procedimentos;

2. o registro contábil do ato de re-conhecer o direito sobre o valorrecebível, evidentemente, tam-bém exigirá uma rotina que rati-fique a integração mencionada.

Assim, se a questão central é ainteratividade do setor responsávelpela Contabilidade com os demaissetores da entidade governamental,a resposta a esta questão dependedo esclarecimento de outras ques-tões, dentre as quais, salientam-seas que se seguem:

1. saber qual o objeto da Conta-bilidade;

2. definir o objeto da Contabili-dade;

3. determinar o objetivo da Con-tabilidade;

4. definido o objetivo da Contabi-lidade e, uma vez alcançado,saber se contém os elementosnecessários à orientação dospassos dos usuários;

5. identificar os usuários do que seconstitui em objetivo da Con-tabilidade;

6. elencar os elementos necessá-rios à composição do que seconstitui em objetivo da Con-tabilidade;

7. informar como e onde conse-guir os componentes do que seconstitui em objetivo da Con-tabilidade;

8. saber se a composição do ob-

jetivo da Contabilidade depen-de de obediência a regras quelhes são impostas pela legisla-ção;

9. apontar os componentes des-sa legislação;

10. verificar se o objeto da Conta-bilidade sofreu mudanças aolongo da sua existência;

11. fazer o levantamento de ondesurgem essas mudanças ecomo são provocadas.

Como se percebe, são várias asquestões envolvidas na organiza-ção de um sistema de informaçõescontábeis, que refletirão os efeitosdas decisões da administração so-bre o que se constitui em objetoda Contabilidade.

Entretanto, não basta à Con-tabilidade, na sua organização,indicar as contas que serão utili-zadas no reconhecimento dos di-reitos sobre recebíveis. É precisoque o setor responsável por estafunção lhe encaminhe os ele-mentos necessários que compro-varão a existência efetiva daque-les direitos. Por exemplo: quemsão os devedores por tributos delançamento direto ou por decla-ração, e também quais são os de-vedores inscritos para a cobran-ça judicial ou mesmo já em co-brança judicial.

A composição do saldo dessesdireitos ao final de um certo períodoserá comprovada com o saldo exis-tente no setor que lhe encaminharaos elementos necessários ao registro.

Outro exemplo é o relacionadoaos inventários de bens tangíveise/ou intangíveis, cuja gestão e con-trole poderá ser função de um ou-tro setor, o qual se responsabiliza-rá pelo encaminhamento dos ele-mentos necessários à apuração dosresultados dessa gestão.

Na execução do orçamento, porexemplo, é preciso deixar bem claro

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

quem é quem dentro da organização;quem decide a realização de umadespesa ou a realização de uma lici-tação, ou ainda, quem assinará umcontrato ou um convênio.

AS PROVIDÊNCIAS

Preliminarmente, há de se apresen-tar os significados dos regimes ado-tados pela Contabilidade. na ges-tão orçamentária e patrimonial parao reconhecimento das receitas e dasdespesas no âmbito das entidadesgovernamentais, União, estados,Distrito Federal e municípios e res-pectivos órgãos autárquicos efundacionais.

No Brasil, atualmente, em todasas esferas governamentais,conforme o disposto no art. 35, I eII, da Lei n.º 4.320, de 17 de marçode 1964, é adotado o regime misto,que se compõe dos regimes:

• de caixa, para as receitas obti-das por meio das atividadesgeradoras de receitas próprias,das relações jurídico-financeirascom outras entidades de direi-to público e de direito privado,das aplicações no mercado fi-nanceiro e de capitais e outras;e

• de competência, para as des-pesas legalmente empenhadasno exercício financeiro.

Os seguintes aspectos, im-portantes para a organização dosistema de controle interno daentidade governamental, sãodestacados e nos levam a refle-tir sobre o relacionamento dosetor da Contabilidade com osdemais setores da entidade esobre o cumprimento das nor-mas pertinentes no registro dasoperações realizadas para ela-borar as informações que auxili-arão o gestor na tomada de de-

cisões, tais como:

• no regime de caixa, adotadopara o reconhecimento das re-ceitas, o relacionamento daContabilidade se estreita coma Tesouraria, relevando, destaforma, o controle sobre o di-nheiro, o qual se refere à recei-ta obtida no período;

• no regime de competência,para as despesas, o relaciona-mento da Contabilidade com osdemais setores da organizaçãodependerá, exclusivamente, daorganização local.

Evidentemente, os dois regimesdeixam a desejar, posto que, se, deum lado, não evidenciam em ne-nhum momento a verdadeira situa-ção econômico-financeira da enti-dade, do outro lado, não cumpremcom os princípios fundamentais deContabilidade. Observe-se que, noregime de caixa, não se mencionamos devedores da fazenda pública,independentemente da naturezajurídica do débito e que, no regimede competência orçamentária, a leinão menciona a realização ou aconcretização do objeto da despe-sa, o que nos leva a entender queum e outro não atendem às neces-sidades de uma informação corretaque respalde decisões que devamser tomadas pelo gestor governa-mental.

Entretanto, no regime de com-petência financeira, principalmentequando se refere às receitas, é ne-cessário que a administração daentidade se organize de tal modoque possibilite a evidenciação dosseus devedores, sejam ou não denatureza tributária.

Assim, a adoção do regime decompetência exigirá da administra-ção as seguintes providências:

1. No que respeita às receitas:

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namento entre o setor daContabilidade e o setor dareceita tributária;

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namento entre o setor dareceita tributária e o setorda Procuradoria Jurídicapara os registros dos deve-dores da Fazenda, a fim depossibilitar a cobrança ju-dicial da dívida ativa tribu-tária;

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namento entre o setor daContabilidade e o setor daProcuradoria Jurídica paraos registros de inscrição ecobranças da Dívida Ativatributária e não tributária;

• reorganização ou organi-zação das rotinas de rela-cionamento entre o setorda Procuradoria Jurídica eo Cartório por onde cor-rem as cobranças judiciaisdos créditos da FazendaPública;

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namento entre os setoresda Contabilidade e aque-les que têm a responsabili-dade de gerir e controlar agestão de contratos e con-vênios;

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namento entre os setoresque controlam as receitasde transferências, indepen-dentemente da natureza;

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namento entre os setoresda Contabilidade e da Te-souraria que possibilitem asvisualizações das receitas,

FINANÇAS MUNICIPAIS

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

dos recebimentos e dospagamentos das obriga-ções da entidade;

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de nature-za contábil que abranjamtodos os relacionamentosanteriores, com vistas àgeração de informações edos relatórios, que são deinteresse da administraçãoe exigidos pela legislaçãopertinente e em vigor.

2. No que respeita às despesas:

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namentos entre os setoresda Contabilidade e aque-les que realizam licitações,adjudicações de contratos,empenhos, liquidações epagamentos de obrigações;

• reorganização ou organiza-ção das rotinas de relacio-namentos entre os setoresda Contabilidade e da Te-souraria;

• reorganização ou organi-zação das rotinas de rela-cionamentos entre ossetores de Contabilidadee aqueles que sãoresponsáveis pela gestãoe pelo controle de bens,para fins de cálculo eregistros das deprecia-ções, avaliações, reavali-ações e ajustes monetári-os, inventários permanen-tes e/ou periódicos;

• reorganização ou organi-zação das rotinas de rela-cionamentos entre os se-tores da Contabilidade eos demais setores da or-ganização, para o fim decontrole da gestão orça-mentária.

Certamente, não se pode esque-

cer da capacitação dos servidoresda entidade que estejam envolvidosdireta ou indiretamente nas ativida-des descritas, sejam de órgãos daadministração direta, sejam de ór-gãos da administração indireta.

CONCLUSÃO

A grande vantagem da ado-ção do regime de competênciano reconhecimento das receitasgovernamentais, conforme dis-põem os arts. 39, 52, 53, combi-nados com o art. 35, I e II, todosda Lei n.º 4.320/64 e com os dis-positivos do Código TributárioNacional e da Lei n.º 8.666/ 93(Licitações, Contratos e Convê-nios), é o cumprimento do obje-tivo contábil, a Evidenciação,bem como a visualização na es-trutura do Balanço Patrimonial eo consequente reflexo no Balan-ço Financeiro dos devedores daFazenda Pública.

Outra vantagem que a adoçãodo regime de competência possi-bilita quanto às receitas é a mu-dança do foco do controle paraos devedores em cobrança admi-nistrativa e judicial, além de me-lhor o controle sobre a Tesoura-ria, e por extensão ao CadastroImobiliário e ao cadastro do ISS edemais tributos de competênciada entidade.

Acrescente-se ainda que a in-formação gerada pela Contabili-dade tem mais credibilidade, con-forme se pode verificar pelo se-guinte exemplo: supondo que oMunicípio tem 1.000 imóveis ca-dastrados, cujo valor venal indivi-dual é de R$ 1.000,00, e comovalor total seja R$ 1.000.000,00,e que o IPTU é igual a 10% sobreo valor venal, o que indica umareceita de R$ 100.000,00, cujosrecebimentos serão em dez pres-tações mensais, a partir do mês

de fevereiro. No regime de cai-xa, a Contabilidade registra ape-nas o que entrou em caixa, semestar preocupada com quemdeve, o que só acontecerá noencerramento do exercício, quan-do, então, os devedores serão ins-critos na Dívida Ativa para a co-brança judicial. Já no regime decompetência, a preocupação co-meça no momento em que os de-vedores são lançados, quando,então, a Contabilidade registra areceita pelo seu valor global, an-tes, portanto, de arrecadar, emcontrapartida com os devedoresjá inscritos e lançados pelo setorresponsável. A partir daí, os de-vedores tornam-se o principalalvo dos controles da administra-ção. Se, porventura, desses de-vedores, 10% forem inscritos naDívida Ativa para a cobrança ju-dicial, a Contabilidade receberáda Procuradoria Jurídica as infor-mações sobre a situação dos mes-mos, cujos efeitos serão sentidosno Balanço Financeiro.

Com referência às despesas,o regime de competência aplica-do com correção, de conformi-dade com o art. 60 da Lei n.º4.320/64, combinado com o art.50, II, da Lei Complementar n.º101/2000 – LRF, evitará, por exem-plo, que apareçam contas nãorespaldadas pela legislação vigen-te, como é o caso de Restos aPagar não Processados, que fa-zem com que os resultados finan-ceiro, primário e econômico e asituação liquida patrimonial seapresentem prejudicados.

Assim, o regime de competên-cia financeira mostra-se muito maiseficiente, pois, possibilitará à ad-ministração informações contábeismelhor estruturadas e confiáveis, oque permitirá decisões corretas emrelação ao resguardo e à utilizaçãodo Patrimônio Público.

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM ISSQN

O ISSQN e o conflito entremunicípios:Quem pode cobrar?A quem recolher?

INTRODUÇÃO

Na proporção em que ganhouimportância como fonte de recei-ta, o Imposto Sobre Serviços deQualquer Natureza transfor-

Márcia Zilá LongenAuditora Fiscal Tributária da Prefeitura Municipal de Blumenau - SC

Este artigo enfrenta um dos mais complexos problemas vivenciados pelos contribuintes e pelas admi-nistrações tributárias municipais: as dúvidas que envolvem a competência para exigir e arrecadar o Impos-to Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN. O estudo demonstra de que forma a falta de clarezano tratamento da questão abriu caminho para que se instalasse uma verdadeira guerra fiscal entre osmunicípios e, no viés contrário, dá sustentação para muitos contribuintes deixarem de recolher o impos-to. Analisa o exercício do poder tributante pelos municípios, considerando as limitações constitucionais einfraconstitucionais, o papel e o alcance da lei complementar nacional. Aborda o fato gerador do impostosobre serviços em seus aspectos material, temporal e espacial, à luz da legislação, das principais decisõesjurisprudenciais e posições doutrinárias, e classifica os serviços tributáveis segundo o local de sua presta-ção, avaliando as implicações decorrentes e determinantes para a cobrança do imposto. Examina a presun-ção na legislação tributária, o conceito de estabelecimento prestador e o poder de polícia especial quedetêm os municípios para regular o exercício de atividades em seu território. O estudo avalia, portanto, osaspectos e as variáveis relacionadas ao tema a partir da realidade vivida pelas administrações tributárias nacobrança do tributo e, sem pretender fechar a discussão, objetiva colaborar para a minimização dos efeitosdo conflito que tanto incomoda e prejudica os municípios e os contribuintes.

Palavras-chave: Competência. ISSQN. Fato gerador. Serviços. Estabelecimento prestador.

mou-se em alvo de disputas, en-volvendo a legitimidade para a suacobrança. Não são poucos osmunicípios brasileiros que, nabusca de aumentar a receita pró-pria, passaram a atrair empresas

praticando alíquotas muito redu-zidas, patrocinando um verdadei-ro leilão. Diante da possibilidadede aliviar a carga tributária, mui-tos prestadores de serviço trans-feriram suas empresas, alguns efe-

RES

UM

O

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

tivamente, outros de forma fictí-cia.1

Outro fator ainda mais sutilmotiva a economia ilegal de tribu-tos gerada pelo estabelecimento fictí-cio em uma cidade: a precária es-trutura das administrações tributá-rias dos municípios pequenos.Com a transferência da sede jurí-dica da prestadora para escritóri-os virtuais, o contribuinte foge dafiscalização (normalmente maispreparada e estruturada nos mu-nicípios maiores) e, não raro, de-sobriga-se do cálculo do impostopelo preço do serviço, recolhen-do valores ínfimos fixados por es-timativas sem respaldo na realida-de da empresa.

O Superior Tribunal de Justiçafirmou entendimento no sentido deque o local da prestação do serviço é quedefine o Município competente paraa imposição tributária. Assim deci-dindo, resguardou o direitodaqueles municípios que sofriamcom as fraudes, na medida em quedeterminou que o imposto fosse re-

colhido no local onde o prestadorestivesse efetivamente prestando oserviço, em detrimento do endere-ço jurídico da empresa.

Mas a questão não se resol-veu assim tão facilmente e nãosão raros os casos em que doisou mais municípios tentam tri-butar os mesmos fatos gerado-res, situação inadmissível emnosso sistema jurídico tributá-rio, onde a competência de umente federado exclui de prontoa pretensão impositiva de qual-quer outro.

A Emenda Constitucional nº.37, de 12 de junho de 2002, trou-xe certo alívio ao fixar a alíquotamínima do ISSQN em 2%, po-rém, nem a edição da Lei Com-plementar nº. 116, de 31 de ju-lho de 2003, resolveu definitiva-mente o problema.2

A solução fica ainda mais dis-tante com a confusão criada pelointérprete e aplicador do direitotributário que frequentemente utilizaa expressão ditada pela jurisprudên-

cia “local da efetiva prestação do serviço”como sinônima de “município sede dotomador do serviço”.

O equívoco agrava o proble-ma também para o sujeito passi-vo, seja ele o prestador, contri-buinte direto ou o tomador doserviço, eleito responsável tribu-tário em situações previstas na leicomplementar federal e nas legis-lações municipais.

Diante da falta de clareza euniformidade no tratamento daquestão, perdem os contribuintese os municípios que, além dosprejuízos diretos provenientes dovalor do tributo em si, obrigam-se a resguardar seus direitos emprocessos administrativos e/oujudiciais, onerosos por natureza.

A proposta deste artigo é apre-sentar e discutir aspectos pertinen-tes ao Imposto Sobre Serviços deQualquer Natureza e colaborarpara a minimização dos nocivosefeitos produzidos pelo conflitoque envolve a sua cobrança.

O ISSQN E O EXERCÍCIO DACOMPETÊNCIA TRIBUTÁRIAMUNICIPAL

Aos municípios, compete ins-tituir e arrecadar, dentre outrostributos, o ISSQN. O exercícioda competência tributária, po-rém, pressupõe obediência às li-mitações contidas na Constitui-ção Federal, nas Constituiçõesdos Estados, nas Leis Orgânicase, não menos importante, mos-tra-se a observação das normasgerais de direito tributário.

Sobre o tema, Amaro (2006,p. 106 e 107) ensina que

“o exercício do poder detributar supõe o respeito às fron-teiras do campo material de in-cidência definido pela Consti-

O Decreto-Lei nº. 406/68, para definir o critério espacial do fato gerador do ISSQN, estabelecia em seuartigo 12 regra geral em que o serviço considerava-se prestado e o imposto devido no local do “estabele-cimento prestador”, listando apenas duas exceções ou regras especiais

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tuição e a obediência às demaisnormas constitucionais ou infra-constitucionais que complemen-tam a demarcação desse campoe balizam o exercício daquelepoder. [...] Desse modo, as cha-madas ‘limitações ao poder de tri-butar’ integram o conjunto detraços que demarcam o campo, omodo, a forma e a intensidade deatuação do poder de tributar[...]”. (Grifamos em negrito)

Na Constituição Federal, aslimitações são verificadas essenci-almente nas imunidades por ela

conferidas e nos princípiosconstitucionais tributários, queservirão de norte ao legisladorordinário na criação e na regulaçãodos tributos.

Dentre os princípios consti-tucionais, merece atenção espe-cial o princípio da territorialida-de, segundo o qual a legislação tri-

butária terá sua aplicação defini-da pelos limites geográficos doente titular da competência ativa.Carvalho (2002, p. 161) anota que“a observância eficaz do princípioda territorialidade da tributação écondição determinante do bomfuncionamento e da harmonia queo ordenamento planificou”.

Passando ao campo infracons-titucional, encontramos as nor-mas gerais de direito tributário,prescritas pelo Código Tributá-rio Nacional e, no caso do ISS-QN, pela Lei Complementar n.º116, de 31 de julho de 2003.

Destacamos aqui o importantepapel reservado expressamentepelo art. 146 da Constituição Fe-deral à lei complementar nacio-nal que reger matéria tributária.Segundo Amaro (2006, p. 168 e169), é função precípua da lei com-plementar dispor sobre conflitosde competência entre os entes tri-

butantes, “explicitando, por exem-plo, a demarcação da linha divi-sória da incidência do ISS (impos-to municipal) e do ICMS (impos-to estadual)”, assim como a regu-lação das limitações constitucio-nais ao poder de tributar e o es-tabelecimento das normas gerais.Ensina o autor:

“Dir-se-ia que a Constituiçãodesenha o perfil dos tributos(no que respeita à identifica-ção de cada tipo tributário,aos limites do poder de tri-butar, etc.) e a lei comple-mentar adensa os traços ge-rais dos tributos, preparan-do o esboço que, finalmen-te, será utilizado pela lei or-dinária, [...].A par desse adensamento dodesenho constitucional decada tributo, as normas ge-rais padronizam o regramen-to básico da obrigação tri-butária (nascimento, vicissitu-des, extinção) conferindo-se,dessa forma, uniformidadeao Sistema Tributário Naci-onal”. (grifo nosso)

Cabe observar que a compe-tência para estabelecer normasgerais em matéria tributária incluia definição dos fatos geradoresdos impostos, conforme teor doinciso III, alínea a do dispositivoconstitucional.

Portanto, o exercício regularda competência tributária pelosmunicípios impede o legisladorordinário de definir fato gera-dor não previsto ou diferentedo previsto na legislação com-plementar. A mesma orientaçãodeve nortear a previsão legisla-tiva quanto à responsabilidadetributária e a atribuição destanão pode certamente resultar na

ISSQN

As empresas, quer sejamcomerciais, industriais ou

prestadoras de serviços, assimcomo as pessoas físicas que

desenvolvem atividadeseconômicas estão sujeitas,

portanto, ao poder de políciaespecial do Município ondeestiverem estabelecidas ou

domiciliadas

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invasão da competência de ou-tro ente federativo.

O FATO GERADOR DOIMPOSTO SOBRE SERVIÇOS

Para o estudo proposto, éimprescindível empreender aná-lise prévia do critério materialda hipótese de incidência do im-posto sobre serviços, assimcomo delimitado pela legislação.Para tanto, optou-se por apoiaro raciocínio nas normas atuais,estabelecidas pela LC n.º 116/2003, comparando-as com a le-gislação por ela sucedida, o DLn.º 406/68.

Pode-se afirmar com precisãoque não houve, com a transiçãolegislativa, mudança no núcleo docritério material, corresponden-do o fato gerador à “prestação” dosserviços previstos em lista especí-fica (art. 8º DL n.º 406/68 e art1º n.º LC 116/2003).

Luciano Amaro ensina que ofato gerador de um tributo cor-responde a “uma situação mate-rial descrita pelo legislador [...]definido pela referência a umaação ou situação [...] que se iden-tifica como núcleo ou materia-lidade”, em torno do qual gra-vitam circunstâncias “igualmentenecessárias para a identificação da obri-gação tributária”. Discorrendo so-bre cada uma destas circunstân-cias, lembra o autor que o fatogerador é um acontecimentohistórico, motivo pelo qual sepõe no tempo e no espaço, as-pectos cuja análise e definiçãoentende ser de grande relevân-cia, considerando que uma mes-ma situação pode constituir-seem fato gerador tributário emum determinado lugar e não emoutro, e, mais que isso, em rela-ção ao espaço, “para efeito da

solução de possíveis conflitos denormas”, posto que define, porexemplo, se a prestação de umserviço estará sujeita à legislaçãode um ou de outro município.Quanto ao aspecto temporal,considera o autor que “o fatoacontece no tempo”, sendo esteaspecto relevante não apenasporque define os prazos paracumprimento de obrigações,mas principalmente porqueidentifica a legislação aplicável,qualificando o fato, se geradorou não de obrigação tributária,isento ou tributável, e ainda, de-finindo a al íquota incidente.(AMARO, 2006, p. 263 a 267)

Os aspectos que circundam ofato gerador dele não se separame, por certo, a previsão legal cor-respondente não pode destoar dasituação material também descri-ta pela lei.

Sendo o critério material daobrigação tributária caracteriza-do pela ação de prestar um servi-ço, é preciso identificar inicial-mente quando aconteceu o fato.Definido o momento da materi-alização ou da concretização dahipótese de incidência, a presta-ção do serviço, podemos extraircom isenção total de dúvida ondeesta se deu e, assim, qual o Muni-cípio competente para exigir aobrigação tributária decorrente.

Nas relevantes palavras domestre Amaro (2006, p.279),

“o que se deve ressaltar é aimportância da precisa iden-tificação temporal e espacialdo fato gerador, pois, a par-tir do momento em que elese realiza, nasce a obrigaçãotributária, com a irradiaçãode direitos e deveres, preten-sões e ações, conferidos àspartes que titulam os polos

ativo e passivo da relação ju-rídica tributária”.

Para situar o fato no tempo, éimportante lembrar o art. 116 doCódigo Tributário Nacional,que, diferenciando as situações defato e de direito, preceitua ter-sepor ocorridas as primeiras (nasquais se inclui o fato gerador doISSQN): “desde o momento emque se verifiquem as circunstân-cias materiais necessárias a queproduza os efeitos que normal-mente lhe são próprios.”3

Neste sentido, esclarecedor ocomentário de Decomain (2000,p. 458):

“Nada obstante as previsõescontidas no art. 116, as leis quecriam cada tributo podem de-finir em que momento se con-sidera realizado o respectivofato gerador. Assim, porexemplo, a Lei Complementarn.º 87/96, que contém normasgerais relativas ao ICMS, con-sidera realizado um dos possí-veis fatos geradores daqueleimposto, representado poroperação de circulação de mer-cadoria, no momento em quea mercadoria deixa o estabele-cimento do fornecedor”.

O Decreto-Lei n.º 406/68,para definir o critério espacial dofato gerador do ISSQN, estabe-lecia em seu artigo 12 regra geralem que o serviço considerava-seprestado e o imposto devido nolocal do “estabelecimento pres-tador”, listando apenas duas ex-ceções ou regras especiais, con-sistentes nos serviços relaciona-dos à construção civil e à explo-ração de rodovia mediante pre-ço ou pedágio.4 Reconhecia,portanto, apenas em duas situa-

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ções excepcionais, que o fatoimponível ocorria em local diver-so e independente do estabeleci-mento prestador.

A Lei Complementar n.º 116/03 tratou a questão com maiorzelo e ajustou a definição do cri-tério espacial ao princípio da ter-ritorialidade, ao ampliar as regrasespeciais (art. 3º, I a XXII e §§ 1ºe 2º). Ao mesmo tempo, no caputdo artigo, confirmou a regra ge-ral do local do estabelecimentoprestador para todos os demaisserviços. Vejamos:

“Art. 3o O serviço conside-ra-se prestado e o impostodevido no local do estabele-cimento prestador ou, na fal-ta do estabelecimento, no lo-cal do domicílio do prestador,exceto nas hipóteses previs-tas nos incisos I a XXII,quando o imposto será devi-do no local:I – do estabelecimento dotomador ou intermediário doserviço [...];

II – da instalação dos andai-mes, palcos, coberturas e ou-tras estruturas [...];III – da execução da obra [...];IV – da demolição [...];V – das edificações em geral,estradas, pontes, portos econgêneres [...];VI – da execução da varrição,coleta, remoção, incineração,tratamento, reciclagem, sepa-ração e destinação final delixo [...];VII – da execução da lim-peza, manutenção e con-servação de vias e logra-douros públicos, imóveis,chaminés, piscinas, par-ques, jardins e congêneres[ . . . ] ;VIII – da execução da deco-ração e jardinagem, do cortee poda de árvores [...];IX – do controle e tratamen-to do efluente de qualquernatureza e de agentes físicos,químicos e biológicos [...];X e XI - (VETADOS)XII – do florestamento, reflo-

restamento, semeadura, adu-bação e [...];XIII – da execução dos ser-viços de escoramento, con-tenção de encostas [...];XIV – da limpeza e dragagem[...];XV – onde o bem estiverguardado ou estacionado [...];XVI – dos bens ou do domi-cílio das pessoas vigiados,segurados [...];XVII – do armazenamento,depósito, carga, descarga,arrumação e guarda [...];XVIII – da execução dos ser-viços de diversão, lazer, en-tretenimento e [...];XIX – do Município ondeestá sendo executado otransporte [...];XX – do estabelecimento dotomador da mão de obra [...];XXI – da feira, exposição,congresso ou congênere [...];XXII – do porto, aeroporto,ferroporto, terminal rodovi-ário, ferroviário ou metrovi-ário [...].§ 1º No caso dos serviços aque se refere o subitem 3.04da lista anexa, considera-seocorrido o fato gerador e de-vido o imposto em cada Mu-nicípio em cujo territóriohaja extensão de ferrovia,rodovia, postes, cabos, dutose condutos [...].§ 2º No caso dos serviços aque se refere o subitem 22.01da lista anexa, considera-seocorrido o fato gerador e de-vido o imposto em cada Mu-nicípio em cujo territóriohaja extensão de rodovia ex-plorada”.

Da simples leitura das regrasespecíficas, extrai-se com seguran-ça que a lei não vinculou o crité-

ISSQN

Serviços como os de varrição; limpeza; decoração; jardinagem e fornecimento de mão de obra, por exemplo,mesmo que o seu exercício não necessite de alvará prévio, estarão ainda assim sujeitos ao poder de polícialocal em face da necessidade de instalação e manutenção de estrutura física para a prestação

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rio espacial ao tomador dos ser-viços, ao seu estabelecimento ouao domicílio.

O que a lei fez foi pinçar doelenco de serviços tributáveisaqueles que exigem a transferên-cia efetiva, mesmo que temporá-ria, de estrutura necessária à exe-cução do serviço para local diver-so do estabelecimento prestadore, a partir desta seleção, definiuque o imposto é devido àqueleMunicípio onde os serviços fo-rem executados, o que pode co-incidir com o Município sede doprestador dos serviços, do toma-dor ou qualquer outro. Somentenos incisos I e XX, a lei indicouo estabelecimento do tomadorpara definir o local da prestação,presumindo que, somente nele, osserviços podem se realizar.

O ASPECTO ESPACIAL DOISSQN, A JURISPRUDÊNCIAE A DOUTRINA

O Superior Tribunal de Justiça,enquanto ainda vigente o DL n.º406/68, firmou entendimento nosentido de que o Municípiocompetente para exigir e arrecadaro ISSQN era aquele onde o serviçofosse efetivamente prestado,podendo-se, para alcançar estaverdade, ignorar o teor da alínea ado artigo 12 do citado diploma le-gal. Neste sentido, a decisão dos Em-bargos de Divergência no RecursoEspecial n.º 130.792-CE, de relato-ria do Ministro Ari Pargendler,publicada no DJ, em 16/06/2000,página 66: "... importa o local ondefoi concretizado o fato gerador,como critério de fixação de com-petência do Município arrecadadore exigibilidade do crédito tributário,ainda que se releve o teor do artigo12, alínea ‘a’ do Decreto-lei n.º 406/68”.5

Tal decisão não permaneceuisenta de críticas. Ives Gandra daSilva Martins e Marilene TalaricoMartins Rodrigues (in PEIXO-TO e MARTINS, 2004, p. 245)avaliaram que o entendimento fe-riu expressamente dispositivo le-gal. Citando o acórdão do Resp.54.002-0/PE (94.0028001-7), osautores dão o tom da repercussãoprovocada pelas decisões daqueleTribunal: “Foi, portanto, comsurpresa que os doutrinadorespátrios e advogados tomaram co-nhecimento das decisões do STJ,em que o Poder Judiciário assu-me as funções de ‘legislador posi-tivo’, claramente declarando queo fazia”.

Bernardo Ribeiro de Moraes(apud Martins e Rodrigues, in PEI-XOTO e MARTINS, 2004, p.247) classificou a decisão comocontrária à lei: “A jurisprudência,data venia, não pode ser contralegem, nem o Superior Tribunalde Justiça deixou de aceitar, comovigente, o art. 12 do Dec.-lei 406/68, que adota o ‘estabelecimentoprestador’ como local da presta-ção de serviços (incidência tribu-tária)”.

Ainda é cedo para concluirqual o tratamento que o STJ dis-pensará à questão para os fatosgeradores tributários ocorridossob a égide da LC n.º 116/2003.Os julgados emitidos após aqueladata, ou se referem a fatos gera-dores pretéritos ou não tiveramo problema enfrentado por de-pender de reexame de provas fáti-cas, o que esbarra na Súmula 7daquele Tribunal.6

O fato é que o entendimentojurisprudencial, pacificado emrepetidas decisões, serviu de pe-dra fundamental a uma confusãoconceitual ainda não soluciona-da e, não raro, a orientação de

desconsiderar o local do estabe-lecimento prestador para fins dedefinir o destino da arrecadaçãodá suporte à utilização da expres-são “local da efetiva prestação doserviço” ou “local onde foi con-cretizado o fato gerador”, comosinônima de “município do to-mador do serviço”.

A cobrança do tributo combase na interpretação equivocadadas expressões afronta diretamen-te o critério material do ISSQN,marcada pelo verbo prestar. Inci-dirá o imposto municipal sobre aprestação do serviço, não sobre asua destinação ou fruição.

OS SERVIÇOS TRIBUTÁVEIS:CLASSIFICAÇÃO E ANÁLISESEGUNDO O LOCAL DESUA PRESTAÇÃO

Análise atenta da Lista de Ser-viços anexa à LC n.º 116/2003leva à identificação de três divi-sões ou grupos de serviços classi-ficáveis segundo o local de suaprestação.

Em um primeiro olhar, é pos-sível identificar aqueles serviçoscuja prestação necessariamenteocorrerá no estabelecimentoprestador.

Tais serviços serão sempre con-cretizados em um determinadolocal físico, normalmente um pré-dio. São exemplos os serviçosprestados por hospitais, laborató-rios, clínicas, creches, asilos, ser-viços de hotelaria, bancários, grá-ficos, guarda e alojamento de ani-mais, entre outros.

Em relação a estes, não restadúvida de que a competência paraexigir o ISSQN deve pertencer aoMunicípio da localização do pré-dio onde a atividade é desenvol-vida integralmente – o estabeleci-mento prestador –, em sintonia,

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portanto, com a regra geral esta-belecida pela lei.

Em um olhar um pouco maisatento, são encontrados os servi-ços cuja prestação necessaria-mente ocorrerá fora do estabe-lecimento prestador.

Neste grupo, estão, por exem-plo, os serviços de construção ci-vil; demolição; varrição, coleta,remoção, incineração, tratamen-to, reciclagem, separação e desti-nação final de lixo; limpeza, ma-nutenção e conservação de vias,imóveis, piscinas, parques e jar-dins; corte e poda de árvores; flo-restamento e reflorestamento;decoração; jardinagem; vigilância,segurança, monitoramento depessoas ou bens, fornecimento demão de obra e exploração de ro-dovia mediante pedágio.

Entendemos que o legisladorbuscou identificar os serviços cujaprestação necessariamente oumuito provavelmente ocorre forado estabelecimento prestador, lis-tando-os nos incisos e nos parágra-

fos do art. 3º da lei, que consti-tuem exceções à regra geral. Estasregras especiais respeitam oprincípio da territorialidade e oaspecto material da hipótese deincidência, quando conferemcompetência para exigir e cobraro imposto ao Município onde osserviços são executados, o que nãose confunde com o local paraonde é emitido o documento fis-cal ou com o domicílio do toma-dor do serviço.

Existe, no entanto, um tercei-ro grupo, no qual se encontramos serviços que, por suas caracte-rísticas, podem ser prestados tan-to no estabelecimento prestadorquanto no estabelecimento oudomicílio do tomador do servi-ço ou em um terceiro lugar qual-quer.

A maior problemática relaci-onada à competência para exigire arrecadar o ISSQN é precisa-mente neste ponto encontrada.Exemplo típico são os serviços deassessoria e consultoria, que, a

princípio, podem ser prestadosem qualquer lugar, nada impedin-do que o prestador faça com queo fato gerador se concretize emlocal totalmente diferente do es-tabelecimento prestador ou do to-mador do serviço. Nos temposatuais, em que a informática e,principalmente, a Internet propi-ciam a aproximação virtual daspessoas e aceleraram sobremanei-ra a comunicação, não é mais pre-ciso que o prestador vá pessoal-mente ao encontro do cliente parafechar negócios ou cumprir con-tratos.

O deslinde da questão exigeentender que a prestação dos ser-viços incluídos nesta categoria,que inclui, por exemplo, além doscitados assessoria e consultoria,serviços de informática; publici-dade; agenciamento; corretagem;intermediação; medicina; advoca-cia e contabilidade, entre outros,demanda a existência de uma baseoperacional, física ou não, ondeo prestador concentre a estrutu-ra necessária, seja ela de equipa-mentos ou mesmo de bens imate-riais, como o conhecimento ou atecnologia a ser empregada.

Há de se considerar ainda quecabe ao Poder Público municipalo planejamento e a organizaçãoda cidade. Para exercer suas fun-ções, os municípios detêm, alémde competência legislativa, o cha-mado poder de polícia especial,pelo qual controlam o exercíciodas atividades econômicas em seuterritório, permitindo e organi-zando, por meio de alvarás de li-cença, a instalação, a localizaçãoe o funcionamento de indústria,comércio e serviços, segundo a le-gislação disciplinadora das postu-ras municipais.

As empresas, quer sejam co-merciais, industriais ou prestado-

ISSQN

A solução proposta requer umavisão ampla sobre a legislaçãopertinente e, também, sobre osfatos tributáveis, de modo que,

principalmente, se evitem asconfusões conceituais, hoje tão

comuns e desastrosas, entre“local da efetiva prestação doserviço” com “município sede

do tomador do serviço”

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ras de serviços, assim como aspessoas físicas que desenvolvematividades econômicas estão sujei-tas, portanto, ao poder de políciaespecial do Município onde es-tiverem estabelecidas ou domi-ciliadas. Assim, ao decidir pordeterminado Município comodomicílio tributário e efetiva-mente nele estabelecer-se, fixan-do e mantendo a estrutura ne-cessária à atividade, o prestadorde serviços estará sujeito à legis-lação deste.

O fato de algumas atividadesexigirem o deslocamento do pres-tador de um Município para ou-tro em alguma das etapas da pres-tação do serviço não o desobrigade estabelecer-se em um Municí-pio determinado, onde manteráa estrutura operacional e adminis-trativa necessária ao seu negócio,o que inclui o alvará de funciona-mento municipal conforme a res-pectiva legislação de posturas.

A lei tributária subordinou osserviços incluídos neste terceirogrupo à regra geral e considerouprestado o serviço e devido oimposto para o Município do es-tabelecimento prestador. Preven-do de outra forma, estaria negan-do a competência municipal paraorganizar seu território e discipli-nar o exercício das atividades eco-nômicas. Estaria permitindo queos prestadores destes serviçosexercessem sua atividade sem obe-decer qualquer legislação da espé-cie, sem licenças para funciona-mento, sem alvarás municipais.

Deve ser notado que o en-tendimento defendido para estegrupo de serviços não confron-ta com o indicado para o segun-do grupo antes apresentado,onde os serviços necessariamen-te são executados fora do esta-belecimento prestador e que a

LC n.º 116/2003 listou, subme-tendo-os a regras especiais. Istoporque o exercício daquelas ati-vidades exige licenciamento doMunicípio onde o serviço forexecutado, ainda que não emi-t ido em nome do prestador,sujeitando-se, portanto, à legis-lação de posturas daquele Mu-nicípio. É o caso das obras deconstrução civil; dos serviçosde diversões públicas; feiras eeventos; exploração de rodovi-as (pedágio); serviços portuári-os, aeroportuários, ferroportu-ários, terminais rodoviários emetroviários. Já serviços comoos de varrição; limpeza; deco-ração; jardinagem e forneci-mento de mão de obra , porexemplo, mesmo que o seu exer-cício não necessite de alvaráprévio, estarão ainda assim sujei-tos ao poder de polícia local, emface da necessidade de instalaçãoe manutenção de estrutura físicapara a prestação.

Podemos concluir que a lei,ao estabelecer que o serviço con-sidera-se prestado e o impostodevido no território onde se en-contrar o estabelecimento pres-tador ou o domicílio do pres-tador, para todos os serviçosnão constantes das exceções quelistou, entendeu que a hipóte-se de incidência tributária doISS deve ser tida como materi-alizada no local onde o presta-dor mantém as condições neces-sárias ao seu negócio, ainda quepossa deslocar-se para prestar oserviço no estabelecimento en-comendante ou em outro lugarqualquer, em sua casa de praia,campo, em viagem internacio-nal etc.

Também o fato de determi-nados ser viços demandaremeventual deslocamento de pro-

fiss ionais (que pode ocorrerem qualquer momento desde acontratação até a finalizaçãoou entrega ao contra tante )para outros municípios, sededo tomador ou não, não temo condão de transferir a com-petência tributária ativa àque-les municípios.

Nos termos já amplamentedemonstrados, o que ocorre comfrequência e deve ser combatidaé a falta de clareza verificada nasdecisões administrativas e judici-ais sobre a matéria, ou o que épior, na interpretação a elas dada.

Neste sentido, é preciso dispen-sar atenção especial à tradução dasexpressões empregadas, não seadmitindo confusão entre “localda efetiva prestação do serviço”ou “local da ocorrência dos fatosgeradores” com “domicílio docontratante do serviço” ou “do-micílio do tomador do serviço”ou ainda, com “domicílio de ter-ceiro”, que venha a ter relaçãodireta ou indireta com os fatosgeradores.

A confusão tem servido deescudo para que se cometam ver-dadeiros absurdos. Alguns mu-nicípios simplesmente autuam ocontribuinte efetivamente esta-belecido em outro, por créditostributários que não lhes perten-cem e defendem o lançamentocom fundamentos desprovidosde razoabilidade ou de qualqueroutro valor jurídico. Recente-mente, um prestador de servi-ços do ramo de informática de-vidamente estabelecido no Mu-nicípio A, notificado pelo Mu-nicípio B a recolher imposto su-postamente devido pela presta-ção de serviços a órgão públicodaquele Município, teve negadoseu pedido de revisão adminis-trativa sob o argumento de os

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serviços terem sido lá “disponi-bilizados”. Ora, a disponibiliza-ção de serviço não se constituiem fato gerador do ISSQN, semcontar que, naquele caso concre-to, o contrato de prestação deserviços previa que os serviçoscontratados seriam disponibili-zados ao tomador por meio depágina eletrônica, evidenciandoque os serviços seriam prestadosno estabelecimento prestador,até porque inexistia qualquerprevisão de visitas ou desloca-mentos, mesmo que eventuais,ao endereço do contratante, ouseja, o Município B entendeuque o fato gerador do impostose dera com a fruição do servi-ço, não com a sua prestação, oque contraria todo o sistemajurídico tributário.

O fato de um documentofiscal ser emitido contra pessoaestabelecida ou domiciliada emoutra cidade não é elemento su-ficiente para caracterizar que látenha sido o serviço executado,tampouco transfere a competên-cia tributária ativa àquele Mu-nicípio. O que determina a in-cidência tributária é a ocorrên-cia do fato gerador, no caso, aprestação do serviço, não a suadestinação, disponibilização oufruição. Em regra, a emissão dodocumento f iscal é efetuadacontra aquele e no endereço da-quele que f icou responsávelpelo pagamento do preço, nor-malmente o tomador do servi-ço, porém o pagamento do pre-ço não é fato gerador tributá-rio, logo, não pode este quesi-to orientar o destino da arre-cadação.

Portanto, ao subordinar àregra geral os serviços que, emtese, podem ser prestados tantono estabelecimento prestador

quanto em quaisquer outroslugares , a le i complementarpresumiu a materialização dahipótese de incidência no esta-belecimento prestador do ser-viço, afastando, desde logo,quaisquer outras discussões.

A Presunção na LegislaçãoTributária

Analisando a possibilidade dea lei tributária valer-se de presun-ções ou ficções para compor anorma de incidência, Amaro(2006, p. 272 e 274 a 275) leciona:

“Num dado acontecimento,que pode desdobrar-se em vá-rias fases, a lei pode escolherdeterminada etapa desseacontecimento para o efeitode precisar, no tempo, o ins-tante em que o fato geradorse tem por ocorrido e noqual, portanto, tem-se pornascida a obrigação tributá-ria. [...]. As presunções le-gais, como as humanas, ex-traem, de um fato conheci-do, fatos ou consequênciasprováveis, que se reputamverdadeiros, dada a probabi-lidade de que realmente o se-jam [...]Se o emprego dessas técnicasimplicar afronta, ainda queindireta, a qualquer princí-pio constitucional, ele deveser repelido [...] aquilo queo legislador não puder fazerdiretamente (porque não es-teja na sua esfera de compe-tência ou porque fira precei-to de norma superior), eleigualmente não pode fazer demodo indireto, mediante uti-lização (que, nessas circuns-tâncias, se revelará artificio-sa) das presunções ou fic-

ções”. (Grifos originais emitálico)

Na mesma linha, Ferragut(2005, p. 146 a 148) pondera compropriedade:

“Se a segurança jurídica nãoadmitisse as presunções, aca-baria dificultando a proteçãodos direitos daqueles que osdetêm, mas que são prejudi-cados pela fraude, dolo e si-mulação. Dentre esses encon-tra-se, sem dúvida alguma, oFisco. [...] No Direito Tribu-tário, assumem significativaimportância, tendo em vistaque fatos juridicamente rele-vantes são muitas vezes ocul-tados por meio da fraude à leifiscal, ficando o processo depositivação do direito obsta-do de ocorrer. [...] Todas es-sas técnicas, se vistas sob o ân-gulo da praticabilidade, têmcomo objetivo: evitar a inves-tigação exaustiva do caso iso-lado, com o que se reduzemos custos na aplicação da lei;dispensar a colheita de provasdifíceis ou mesmo impossíveisem cada caso concreto ouaquelas que representem inge-rência indevida na esfera pri-vada do cidadão e, com isso,assegurar a satisfação do man-damento normativo”. (Grifonosso)

Assim, a LC n.º 116/2003, aopresumir a ocorrência do fatogerador no local do estabeleci-mento para os serviços cuja iden-tificação dos aspectos espacial etemporal será sempre questioná-vel e facilmente mascarada pormeio da fraude fiscal, o fez den-tro dos limites de sua competên-cia e cumpriu o papel a ela atri-

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buído pelo artigo 146 da Consti-tuição Federal. Definiu o aspec-to espacial em consonância como critério material da hipótese deincidência – a prestação do servi-ço –, respeitando o princípio daterritorialidade das leis e ainda di-rimindo possíveis conflitos decompetência entre municípios.

O Estabelecimento Prestador

Em sintonia com o CódigoCivil7, a Lei Complementar n.º116/2003 definiu estabelecimen-to pressupondo a existência deuma base física, uma estruturaonde o prestador promova par-te ou todo o complexo de ativi-dades necessárias à conclusão doserviço:

“Art. 4º – Considera-se estabe-lecimento prestador o localonde o contribuinte desen-volva a atividade de prestarserviços, de modo perma-nente ou temporário, e queconfigure unidade econômi-ca ou profissional, sendo ir-relevantes para caracterizá-loas denominações de sede, fili-al, agência, posto de atendi-mento, sucursal, escritório derepresentação ou contato ouquaisquer outras que venhama ser utilizadas”.

Ao assim dispor, o legisla-dor complementar pretendeuinibir a prática fraudulenta decontribuintes que se instalamformalmente em munic ípiosonde obtém vantagem com a in-cidência de alíquota menor emdetrimento do local onde estáde fato estabelecido, onde man-tém sua unidade econômica ouprof iss ional e efet ivamentepresta serviço.

Ainda na vigência do art. 12,a, do Decreto-Lei n.º 406/68, al-guns autores já defendiam que aquestão crucial a ser respondidaé: O que é estabelecimento pres-tador?

Da doutrina, destacamos a liçãode Machado (2003, p. 360):

“O equívoco está em consi-derar como tal o local de-signado formalmente pelocontr ibuinte . Estabeleci -mento na verdade é o lo-cal em que se encontram osequipamentos e instru-mentos indispensáveis àprestação do serviço, o lo-cal em que se pratica a ad-ministração dessa prestação.Adotado esse entendimen-to, as situações fraudulen-tas podem ser corr ig idas ,sem que se precise descon-siderar a regra do art. 12 doDecreto-Lei n.º 406/68”.

O entendimento do SuperiorTribunal de Justiça não divergia:

“[...] ISS. Transporte de Pe-dra. Competência para Co-brança. [...] Competente paracobrar o ISS é o Municípioonde a empresa prestadora doserviço se instala para executá-lo, mesmo que seja em caráterprecário ou temporário. Re-curso Improvido”. (REsp6.679/ES, Rel.Min. César As-for Rocha, 1ª.T., DJ 04/10/1993 p. 20502)

Mantendo a posição, ao deci-dir questão em que o Municípiode Porto Alegre pretendia cobraro ISS sobre serviços de adminis-tração de consórcios sob o argu-mento de que a coleta de adesõespara a formação do grupo ocor-

ria em seu território, o STJ emen-tou:

“TRIBUTÁRIO. ISS. LO-CAL DA INCIDÊNCIA. Olocal do recolhimento do ISSincidente sobre a administraçãode bens ou negócios, inclusiveconsórcios é o do territóriodo município onde se realizao serviço. O serviço de admi-nistração de consórcio com-preende não só a coleta dosnomes dos interessados comoa realização de reuniões, co-brança de parcelas e respecti-va contabilização, aquisiçãodos bens e sorteio dos consor-ciados, e, "in casu", em todasessas etapas, praticado no mu-nicípio de Lins, ao qual cabeo poder de tributar. Recursoimprovido. Decisão unâni-me”. (REsp 72.398/SP, Rel.Min. Demócrito Reinaldo,1ª.T., DJ 10/06/1996 p.20283)

Defendendo a competênciatributária do local onde o servi-ço é efetivamente prestado, aque-le egrégio Tribunal reconheceu-aao Município de Lins, onde o ser-viço fora executado no seu con-junto pelo estabelecimento pres-tador. Considerou, portanto, ir-relevante haver a coleta de adesõesem Porto Alegre, entendendoque esta não caracterizava a reali-zação do serviço, apenas partedele, que não configurava fatogerador tributário.

O julgado do recurso inter-posto contra decisão do Tribu-nal de Alçada do Paraná nãodestoa. O Município de Curiti-ba, abrigando escritório de ven-das com estoque de mercadori-as de empresa do ramo gráfico,pretendia tributar os serviços

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nele negociados sob o argumen-to de que lá ocorria a contrata-ção dos serviços com a defini-ção dos modelos de formulári-os e outros detalhes do contra-to, completando-se o fato im-ponível também em seu terri-tório com a entrega e cobrançado serviço, enquanto que o“parque gráf ico”, local izadoem outro Munic ípio, serviaapenas para a impressão dos for-mulários. A decisão contestadafoi mantida por unanimidadecom a seguinte ementa:

“TRIBUTÁRIO – ISS –SERVIÇOS DE COMPO-SIÇÃO GRÁFICA – MUNI-CÍPIO COMPETENTEPARA EXIGIR – LOCALDA REALIZAÇÃO DOFATO GERADOR – IN-TERPRETAÇÃO DO ART.12 DO DECRETO-LEI406/68 – PRECEDENTES.- Consoante iterativa jurispru-dência desta eg. Corte o Mu-nicípio competente para a co-brança do ISS é aquele em cujoterritório se realizou o fato ge-rador, em atendimento aoprincípio constitucional implí-cito que atribui àquele Muni-cípio, o poder de tributar osserviços ocorridos em seu ter-ritório. - Executados os servi-ços de composição gráfica emestabelecimentos localizadosem outros municípios, nãotem a Municipalidade de Cu-ritiba competência para exigirISS referente a esses fatos ge-radores. - Recurso especial nãoconhecido”.(Resp 252.114/PR, Rel. Min.Francisco Peçanha Martins,DJU, de 02/12/02)

Os exemplos acima ilustram o

verdadeiro sentido da jurispru-dência formada pelo STJ, que re-conhece a competência do Municí-pio onde materializada a hipótesede incidência, o que não seconfunde com a sede jurídica doprestador tampouco com o destinoa entrega ou fruição do serviço. Oimposto será devido onde forprestado o serviço, de fato.

Sempre atual o entendimentodo consagrado mestre Moraes(1975, p. 489):

“Estabelecimento vem a ser olocal fixo , onde a pessoaexerce sua atividade ou admi-nistra seus negócios. Manifes-ta-se através da lo ja , doarmazém, do escritório, dohospital, da oficina, da agên-cia, do consultório, etc. [...] Oessencial, para a caracteri-zação do estabelecimento,é essa manifestaçãomaterial em que a pessoa sesitua no espaço em queexista um centro de ocupa-ção habitual. Sem essa ma-nifestação do exercício de ati-vidades ou esse núcleo deocupações habituais, inexisteestabelec imento”. (gr i fonosso)

A doutrina contemporâneanão destoa:

“Existem alguns serviços cujaprestação tem início em umestabelecimento e etapas exe-cutadas em outro(s), de modoque podem existir dificuldadespara identificar aquele que écontribuinte do ISS. [...] A re-gra da Lei Complementar116/2003 deu maior relevân-cia à atividade realizada peloprestador do que à utilidadefruída pelo tomador. Essa con-

clusão decorre também da lei-tura do art. 4º, quando, ao de-finir estabelecimento presta-dor, o faz indicando o ‘localonde o contribuinte desenvolvaa atividade’ de prestar serviçose ‘que configure unidade econô-mica ou profissional’. [...] paraser considerado um estabele-cimento para fins de incidên-cia do ISS, basta ser o localda prestação que, ao mesmotempo, configure uma unida-de econômica ou profissio-nal. Ou seja, a configuraçãode um estabelecimento de-correrá de elementos de fatoe não de características jurí-dicas. Será o exercício de umaatividade, aliado àidentificação de uma instala-ção como unidade distinta erelevante que a faça apresen-tar-se perante a clientela, afiscalização tributária, osconcorrentes, que irá quali-ficar um estabelecimentoprestador de serviços”. (gri-fo nosso) (CEZAROTI (inPEIXOTO e MARTINS,2004, p. 217).

Assim, o estabelecimento deveser visto de forma mais ampla doque a sua formalização jurídica edeve ser reconhecido independen-temente de estar ele legalizado emforma de sede, filial, sucursal etc.,sendo possível caracterizá-lo se-gundo as manifestações do ânimode permanecer estabelecido,que pode ser exteriorizado de di-versas formas.

Pensando nisso, alguns muni-cípios têm instituído obrigaçõesacessórias, como é o caso do Mu-nicípio de São Paulo que, pela Lein.º 14.042/2005 determinou aobrigatoriedade de inscrição emcadastro específico de empresas

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que prestarem serviços para em-presas domiciliadas em seu terri-tório e utilizarem documentosfiscais autorizados por outramunicipalidade. A medida, que visaevitar a fraude fiscal com ainstalação de sedes fantasmas, tevea constitucionalidade confirmadapelo Tribunal de Justiça de SãoPaulo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Poderíamos concluir este estu-do afirmando que a exigência doImposto Sobre Serviços de Qual-quer Natureza caberá sempre aoMunicípio onde ocorrer o seufato gerador. Tal assertiva, po-rém, parece zombar da inteligên-cia do leitor, na medida em queesta é frase corrente e batida en-tre os aplicadores do direito tri-butário e não conduz à tão espe-rada solução para os impasses vi-venciados diariamente.

A solução proposta requer umavisão ampla sobre a legislação per-tinente e, também, sobre os fatostributáveis, de modo que, princi-palmente, se evitem as confusõesconceituais, hoje tão comuns e de-sastrosas, entre “local da efetivaprestação do serviço” com “muni-cípio sede do tomador do serviço”.

Pressuposto preliminar resi-de no entendimento de que acobrança do ISSQN pelos mu-nicípios deve harmonizar-secom a Constituição da Repúbli-ca e com as normas gerais tri-butárias, sendo-lhes vedado,portanto, definir fato geradorou aspectos dele de forma dife-rente da previsão contida em leicomplementar nacional, a quemcompete também e, em caráterexclusivo, a solução dos confli-tos de competência entre os en-tes tributantes.

Do mesmo modo, é vedadoaos municípios agir na cobrançado imposto, adotando interpreta-ção equivocada ou, o que é pior,utilizar as palavras da lei e/ou dajurisprudência, distorcendo-as,ora empregando-as em um senti-do, ora noutro, para obter van-tagem indevida. A vedação aquiexpressa estende-se, por óbvio, aosujeito passivo tributário.

Outra premissa básica a fixaré que, conforme disposição expres-sa da LC n.º 116/2003, o critériomaterial da hipótese de incidênciado ISSQN corresponde à“prestação” de serviços, não à suadestinação ou fruição. O momen-to da concretização do fazer de-terminará o critério temporal dofato gerador tributário, decorren-do dele, por consequência, o as-pecto espacial.

Os serviços, por sua vez, apre-sentam características própriasque indicam o local de sua pres-tação. Merece atenção especial ofato de que alguns podem ser exe-cutados pelo mesmo prestador,ora em seu estabelecimento, orano estabelecimento do tomador,ora em outro lugar qualquer.

Classificando os serviços tribu-táveis a partir do local de sua pos-sível prestação, identificamos trêsespécies, sendo: a) serviços cujaprestação necessariamente ocorre-rá no estabelecimento prestador;b) serviços cuja prestação neces-sariamente ocorrerá fora do es-tabelecimento prestador; c) ser-viços que em tese podem ser pres-tados tanto no estabelecimentoprestador quanto no estabeleci-mento ou domicílio do tomadordo serviço ou mesmo em qual-quer outro lugar, a escolha doprestador.

O imposto sobre os serviçosincluídos no grupo a será, sem

sombra de dúvida, devido aoMunicípio em que esteja localiza-do o estabelecimento prestador,posto que somente neles o fatogerador poderá concretizar-se.

Quanto aos serviços indicadosno grupo b, entendemos que es-tes correspondem às regras espe-cíficas listadas pelo art. 3º da LCn.º 116/2003, e o imposto deveser recolhido para o Municípioindicado pelo dispositivo legal,local onde ocorre a materializaçãoda hipótese de incidência, que nãose confunde com o Município sededo tomador do serviço.

Em relação aos serviços conti-dos no grupo c, o imposto deveser recolhido conforme a regrageral disposta na lei, qual seja, aoMunicípio que hospedar o esta-belecimento prestador, local daocorrência dos fatos tributáveis,por presunção legal, que servirá,nestes casos, para afastar o con-flito de competências entre osentes tributantes, orientandoigualmente o sujeito passivo tri-butário.

Em outras palavras, o fato ge-rador do ISSQN dar-se-á indubi-tavelmente e concretamente noestabelecimento prestador, paraos serviços cuja prestação deman-da a existência de base física imó-vel, e presumidamente para aque-les que podem ser executados tan-to no estabelecimento prestadorquanto no estabelecimento oudomicílio do tomador do servi-ço ou ainda em um terceiro lugarqualquer, cujo controle foge aoalcance do Poder Público, assimcomo a ninguém transparece.

A lei complementar nacional,ao utilizar o instituto da presun-ção para definir o estabelecimen-to prestador como local da ocor-rência do fato gerador tributáriopara os serviços cuja identificação

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM ISSQN

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 12ª edição rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. 512 p.BRASIL. Código Civil. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm.BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei n.º 5.172/1966. 31ª edição. São Paulo, Saraiva, 2002. 1034 p.BRASIL. Lei Complementar n.º 116, de 31 de julho de 2003. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/LCP/Lcp116.htm .CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 14ª ed.rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002. 544 p.DECOMAIN, Pedro Roberto. Anotações ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2000. 796 p.FERRAGUT, Maria Rita. Presunções no Direito Tributário. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2005. 318 p.MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28ª edição. São Paulo: Malheiros, 2007. 560 p.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NOTAS

1 O jornal “Folha de São Paulo”, já em 2002, dava o tom dos acontecimentos: “Interessadas em aumentar a arrecadação do ISS (Imposto Sobre Serviços), algumas cidades da grande São Paulo estimulama criação de empresas dentro dos limites de seus territórios sem que elas desenvolvam qualquer atividade econômica no município. Isso ocorre porque as empresas recolhem o imposto no local onde,pelo menos oficialmente, estão instaladas. Como as alíquotas desses vizinhos da capital paulista são, muitas vezes, bem menores – 0,3% em Carapicuíba, por exemplo, contra 5% em São Paulo –, a transação interessa a empresários e prestadores de serviço. Para que a companhia não necessite transferir de fato a sua sede para fora da capital, a tática é a seguinte: para usufruir da alíquotamenor, ela adota o endereço de um escritório, geralmente de contabilidade, como domicílio fiscal. Com isso, torna-se uma ‘empresa virtual’ e funciona em um ‘escritório virtual’. O resultado temsido positivo para esses municípios (espécie de paraísos fiscais) e incomoda a Prefeitura de São Paulo, que promete pedir uma ação do Ministério Público contra essa prática. Em São Paulo, o ISS foiresponsável por 50,98% da receita tributária da prefeitura em 2001” (Folha de São Paulo. Ed. 24/04/2002. Reportagem de Chico de Góis. Disponível em <http://www.gcontrol.com.br> Acesso setembro/2008).

2 É o que mostrou a Revista Veja com a reportagem “Tem firma com sede até no cemitério” onde o destaque foi um jovem Município do Estado de São Paulo que aprovou alíquota de 0,5% de ISSpara prestadoras que, para lá, migrassem ainda que só no papel e, para atender à demanda, permitiu o uso de endereços notadamente falsos, como o ginásio de esportes municipal, o edifício-sededa Prefeitura, um lago e até o cemitério. O prejuízo aos municípios chegava, na época, a 800 milhões de reais anuais, beneficiando principalmente profissionais liberais e grandes empresas. Segundoa reportagem, a guerra fiscal entre os municípios seria ainda mais interessante e segura se comparada com a guerra fiscal dos estados porque: “Quando o objeto do incentivo era o ICMS, a empresaprecisava transferir de verdade fábricas e operações para o estado que oferecia a vantagem. No caso do ISS, a mudança ocorre, na maioria das vezes, apenas no papel. Arranja-se um endereço nacidade que dá desconto de ISS e transfere-se a sede para lá. Em geral, a alteração é só de fachada e não implica nenhum custo administrativo permanente, como aluguéis e funcionários. Não raro,a nova sede resume-se a uma caixa postal.” (Revista Veja, Ed. n.º 1938, de 11 de janeiro de 2006. Reportagem de Fábio Portela. Disponível em <http://www.fazenda.gov.br/resenhaeletronica/MostraMateria.asp?page=&cod=256565> Acesso setembro/2008)3 Código Tributário Nacional, art. 116, I.4 Alínea c incluída pela LC n.º 100/1999.5 No mesmo sentido: AgRg EDcl no Ag 468.839/DF; AgRg no REsp 299.838/MG; e AgRg no Ag 336.041/MG.6 Veja decisão do AgRg no Ag 903224 / MG, Ministra Eliana Calmon, DJ 07.02.2008 p. 1.7 Art. 1142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária.

dos aspectos espacial e temporalserá sempre questionável e facil-mente mascarada por meio dafraude fiscal, o fez dentro dos li-mites de seus poderes e de sua com-petência.

A conduta adotada por mui-tos municípios e pelos própriossujeitos passivos, de conferir aexigência do imposto indiscrimina-damente para o Município sede dotomador do serviço não nos parececorreta, especialmente porqueimplica considerar ocorrido o fatotributário segundo a destinação oua fruição do serviço, o que desvir-tua o critério material da hipóte-se de incidência – a prestação doserviço.

As regras legais definidorasdo aspecto espacial do ISSQNestão em sintonia com os prin-cípios constitucionais da terri-torialidade e da autonomia mu-nicipal, com a competência paraplanejar e organizar a cidade ecom o uso do poder de políciapara disciplinar o exercício dasatividades econômicas em seuterritório.

Para a correta aplicação da lei,o estabelecimento deve ser en-tendido como a unidade econô-mica ou profissional onde oprestador desenvolva sua ativida-de-fim, de modo permanente outemporário, observando-se que aexistência do estabelecimento in-

depende da sua formalização ju-rídica, de estar legalizado, emforma de sede, filial, sucursaletc., e deve ser caracterizado se-gundo as manifestações do âni-mo de permanecer estabelecido.

A solução do conflito exige,portanto, que tanto os municípiosquanto os sujeitos passivos tributá-rios orientem-se pela regraestabelecida pela Lei Complemen-tar Federal n.º 116/2003, estatutolegal que, cumprindo o papelatribuído pela Constituição Federale sem extrapolar seus poderes,dirimiu conflitos de competência efixou as normas gerais relativas aofato gerador do Imposto SobreServiços de Qualquer Natureza.

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The ISSQN and conflict among municipalities: Who can charge? Who collect?

This article faces one of the most complex problems experienced by the taxpayer and the municipal taxadministrations: the doubts that involve the power to require and raise the tax of services “ISSQN”. The studyinfers how the clarity missing on the treatment of the case has opened a way to be installed a real tax war betweenthe cities, and on the other hand, supports many taxpayers no longer pay the tax. It analyzes the exercise of thetaxing power of the cities, considering the constitutional and infra constitutional limitations, the function and thereach of the complementary national law. It addresses the generation fact of the tax on services on its material,temporal and spatial aspects, according to the law, to the main legal decisions and doctrinal positions, andclassifies the taxable services according to the place they were done, estimating the due and determinant implicationsto the tax recovery. It examines the presumption on the tax law, the concept of establishment provider and thespecial police power which the cities have to control the exercise of activities in its territory. The study estimates,therefore, the aspects and the variables connected to the theme starting from the reality lived by the taxadministrations on the tax collection and, don´t ending the discussion, it objectives collaborate to the minimizationof the effects from the conflict which so bothers and damages the cities and the taxpayers.

Keywords: Competence. ISSQN. Generative fact. Services. Provider establishment.

El ISSQN y los conflictos entre municipios: Quién puede cobrar? Que cobran?

En este artículo se aborda uno de los problemas más complejos que experimentan los contribuyentes y lasadministraciones locales de impuestos: las dudas sobre el poder de exigir y cobrar el impuesto sobre los serviciosde cualquier naturaleza - ISSQN. El estudio demuestra cómo la falta de claridad en el tratamiento de la cuestiónallanó el camino para la instalación de un impuesto de guerra real entre los municipios, y el sesgo en contraste,proporciona apoyo para los contribuyentes no llegan a cobrar el impuesto. Analiza el ejercicio del poder por losmunicipios tributante, teniendo en cuenta las limitaciones constitucionales y de infraestructura, el papel y alcancede la legislación nacional complementaria. Se acerca al sujeto pasivo del impuesto de eventos en sus aspectosmateriales, la luz temporal y espacial de la legislación, las grandes decisiones judiciales y posiciones doctrinales,y clasifica los servicios sujetos a impuesto según el lugar de su entrega, la evaluación de las repercusiones y losdeterminantes de la recaudación de impuestos. Examina la presunción de la ley fiscal, el concepto de proveedorde sistema de poder y de la policía especial de celebración de los municipios para regular el ejercicio de lasactividades en su territorio. El estudio analiza tanto los aspectos y variables relacionadas con el tema de larealidad vivida por las administraciones fiscales para recaudar el impuesto y, sin tratar de cerrar el debate, tienecomo objetivo ayudar a minimizar los efectos del conflicto que tanto molesta y perjudica a los municipios y loscontribuyentes

Palabras claves: Competencia. ISSQN. Hecho generador. Servicios. Establecimiento de proveedores.

CEZAROTI, Guilherme. O Fato Gerador e o Aspecto Espacial do ISS. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães, MARTINS, Ives Gandra da Silva (org.). ISS, LC n.º 116/2003. Curitiba: Ed. Juruá, 2004, 670 p.MARTINS, Ives Gandra da Silva; RODRIGUES, Marilene Talarico Martins. O ISS e o Local da Prestação do Serviço. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; MARTINS, Ives Gandra da Silva (org.). ISS, LCn.º 116/2003. Curitiba: Ed. Juruá, 2004, 670 p.MARTINS, Ives Gandra da Silva. Temas Atuais de Direito Tributário. São Paulo: Ed. Elevação Jurídica, 2001, 186 p.

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Implantando odesenvolvimentosustentável: economiasocioambiental paramunicípios de áreacontínua (urbana e rural)

RES

UM

ODESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Francisco Carlos MartinsEspecialista em Gestão e Planejamento Ambiental - USSProfessor da Universidade Severino Sombra, Vassouras, Rio de Janeiro.

INTRODUÇÃO

O homem sempre recorreu ànatureza para obter o seu supri-mento físico e espiritual, obtém-se essa conclusão pela história denossa evolução desde os primei-ros hominídeos. Mais tarde, naGrécia antiga, encontramos essa

ligação muito forte, sob o aspec-to espiritual, expressa por meiodas crenças do povo.

Na era cristã, há manifestaçõesda ciência tomando para si o usoindiscriminado da natureza,como fonte inesgotável de recur-sos. O findar do Renascimentoe durante o Iluminismo se aplica

a ideia da natureza a serviço daciência e, por sua vez, a ciênciaem favor do progresso e da in-dustrialização. É um tempo pré-revolução industrial, mas o con-ceito de progresso se projeta for-te, sem o contraponto de suasconsequências. As primeiras ocor-rências foram sociais e, mais gra-

Determinar os motivos pelos quais as diretrizes globais não são implantadas localmente e proporsoluções para que a vasta teoria existente transforme-se em ações concretas passa a ser o foco deste artigo,assim como sugerir um novo modelo econômico que atenda às necessidades de geração de emprego erenda desses municípios, com preservação ambiental e justiça social. Essas propostas se justificam pelaverificação de que o foco de estudos da crise ambiental e social se lança sobre locais e acontecimentosmais visíveis, não sendo levadas em conta às ocorrências pulverizadas. Consideremos que a reunião dasagressões realizadas nas pequenas comunidades urbanas e rurais tem uma contribuição enorme no contextogeral, mas o que está disperso não está visível. Como ajustar o desenvolvimento local à preservaçãoambiental, à justiça social e ao respeito à cultura? Como mudar o contexto atual de discussões eprovidências, não mais esperar por grandes soluções globais, mas sim realizar pequenas, mas efetivasintervenções locais? Qual deve ser o papel do Poder Público, na iniciativa privada e da sociedade? Qual omodelo ideal de economia para o desenvolvimento local sustentável?

Palavras-chave: Desenvolvimento local sustentável. Emprego e renda. Justiça social. Preservaçãoambiental.

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dualmente, veio aparecendo odesgaste ambiental. Ambos osepisódios foram impactantes ecom graves efeitos.

Em 1624, Francis Bacon escre-veu o texto intitulado “Nova Atlân-tida” que é a primeira indução a quese faça a organização e a socializa-ção da ciência e a utilização dela paraalavancar o progresso, retirando osrecursos necessários da natureza.1(BACON apud CAPRA, 1982,p.51-52.)

Outro momento é de Descar-tes no “Discurso do Método”com a mesma concepção de pro-gresso e domínio e exploração dosrecursos naturais.2 (DESCAR-TES, p. 35-36)

Em seguida, vem a explosão daRevolução Industrial, alterandotodo o contexto de produção, con-sumo e sociedade. O olhar maisatento sobre o ímpeto dessas mu-danças no meio ambiente só vema acontecer a partir da metade doséculo XX. Não faz muito tem-po que o personagem Desenvol-vimento Sustentável entrou emcena, mas sua atuação é fundamen-tal para que o drama da “Perma-nência da Vida no Planeta Terra”não se transforme na irremediáveltragédia “Consumatum est”.

Em 1968, foi realizada a reu-nião denominada Clube de Romaonde é usada e evidenciada a no-menclatura ecodesenvolvimento.Nesse encontro, propôs-se contero crescimento econômico e popu-lacional.

A Conferência das NaçõesUnidas Sobre Meio AmbienteHumano, Estocolmo 1972, cha-mou a atenção para a grande de-gradação causada pela ação dohomem, foi um novo e marcantemomento, colocando a discussãosob o enfoque do desenvolvimen-to com sustentabilidade, contudo

não se empregou propriamenteeste termo.

Em 1973, Maurice Strong utili-zou o conceito de ecodesenvolvi-mento, mais tarde utilizado porIgnacy Sachs3, que o transformouem Desenvolvimento Sustentável eampliou os conceitos propostosoriginalmente.

Antes, na década de 60, os mo-vimentos sociais na Europa e nosEstados Unidos criticam não só osmétodos de produção como omodo de vida da população. Oembate entre economia e meio

ambiente prossegue na “Conferên-cia de Belgrado” (Iugoslávia), em1975 (Carta de Belgrado), “Con-ferência de Tbilisi (antiga UniãoSoviética), em 1977 (EducaçãoAmbiental) até chegar a 1987,quando a comissão Brundtlandpublicou o relatório “Nosso Fu-turo Comum”, descrevendo o es-tado do planeta e a relação entreas comunidades humanas do pre-sente e as gerações futuras, intro-duzindo, pela primeira vez, o con-ceito de desenvolvimento susten-

tável. Esse relatório inclusive ser-viu de orientador da Conferênciada ONU, realizada no Rio de Ja-neiro, conhecida como ECO 92.

Em 1993, Ignacy Sachs propõecinco dimensões do Desenvolvi-mento Sustentável: sustentabilida-de econômica, social, ecológica, es-pacial e cultural (SACHS apud JA-COBI, p. 175-183).4 Pode-se obser-var um refinamento do que foraproposto por Strong em 1973 epelo próprio Sachs na década de 80.

Mesmo sendo tema atual, leva-do à pauta de conferências e trata-

dos e gerador de numerosos tra-balhos acadêmicos de altíssimonível, o desenvolvimento susten-tável continua sendo colocadocomo algo distante das pessoas ede suas comunidades, como se fos-se uma divindade, fora da esferahumana.

Nas primeiras mesas de discus-sões sobre o desenvolvimento, aeconomia prevaleceu sobre omeio ambiente. Esses dois pensa-mentos só vieram a convergir nocaminho para o Desenvolvimen-

Ao instalar uma indústria de médio, e principalmente, de grande porte, o Executivo Municipal passa a teruma visibilidade enorme. Mesmo que não cuide dos aspectos ambientais como deveria, o Poder Público terácomo escudo a oferta de emprego

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to Sustentável porque os econo-mistas chegaram à conclusão quetêm pelo menos um ponto emcomum com os ecologistas, a ne-cessidade da natureza. Ambosdependem da natureza, precisamda vida para a sobrevivência. Semnatureza, não há recursos e, semrecursos, não há economia.

Com esse enfoque, muitos es-tudos valorosos foram realizados,conclusões de grande percepçãoforam determinantes para se traça-rem diversas alternativas, algumascomplexas, outras simples, mas to-das com urgência de aplicação.

Portanto, propõe-se aqui analisaras razões dessa distância entre o pro-duzido e o aplicado, encontrar ousugerir formas de aproximação dateoria e da prática. Sugerir um mo-delo que satisfaça tanto política comosocial e ambientalmente, ou seja, quepromova crescimento, emprego, di-nâmica econômica, mas que equili-bre as forças e a resistência de susten-tação desse tripé, por meio de umaeconomia de ajuste social e ambien-tal e a transformação do tema De-senvolvimento Sustentável em umarealidade compreensível pelo cidadão,no âmbito, principalmente, dos mu-nicípios brasileiros com a caracterís-tica urbano/rural.

Como obstáculo a essa pro-posta, destaca-se um profundodesconhecimento de Administra-ção Pública e conceitos dos vári-os segmentos das políticas públi-cas por parte dos eleitos pelopovo. Os representantes da po-pulação (eleitos) têm (na sua mai-oria) uma visão equivocada deadministração e políticas públicas,por ignorar a importância de cadauma delas e de suas interligações.

Por sua vez, o cidadão, afasta-do que foi do processo de discus-são e decisão das ações públicasdurante todo o período do Brasil

Colônia, Império e maior parte daRepública, não se interessa peloque acontece em sua comunidade,cobrando a conta do Poder Pú-blico, esquecendo que o Municí-pio não é dos políticos, mas simdele mesmo e de sua família.

Equilíbrio é a chave para se atin-girem as metas sustentáveis, e o en-trave começa pela forma diversacom que essas duas áreas são trata-das pelos governos locais. Os muni-cípios de área contínua são maioriano País, e pode-se afirmar que exis-te uma dicotomia evidente e claraentre a Zona Urbana e a Rural.

A concentração de votos aindaé o cerne das diretrizes de políticaspúblicas. Consequentemente, osexecutivos municipais embelezamas praças, ampliam os serviços pú-blicos na sede do Município e nosdistritos mais populosos. O legis-lativo municipal, por sua vez, aban-dona suas funções de legislar, fisca-lizar e propor políticas públicaspara a coletividade e passa a reali-zar ações assistencialistas de caráterindividual, fazer indicações es-drúxulas e, dessa forma, as sessõesdas câmaras passam a ser palco deum espetáculo deprimente.

Em contrapartida, na área rural,os serviços públicos são escassos.Uma administração direcionada des-sa maneira vai desestruturando tan-to a cidade quanto o campo, tantoum quanto o outro entram em pro-cesso de degradação econômica, so-cial e ambiental.

Enquanto isso, o cidadão dis-cutiu com seu vizinho a poluiçãoverificada na China, mostrada emforma de névoa constante nasimagens da televisão quando datransmissão dos jogos olímpicosde 2008. Debateu sobre a forçados furacões que atingem a costados Estados Unidos e a Ásia, noentanto contribuiu, e contribui,

para a degradação ambiental comseus hábitos de consumo e com adestinação que dá aos resíduosque produz. Também fica indig-nado quando sai do interior emum final de semana, planejado hátanto tempo, e vê o seu banho demar prejudicado no cair da tar-de, quando a maré começa a tra-zer para a margem um volumeenorme de detritos. Mas, ele mes-mo deixou na praia um rastro desua passagem, seja pelo lixo quedeixou depositado na areia, oupor aquele que foi jogado na ruano trajeto até a praia.

Assim sendo, os efeitos catastró-ficos da ação antrópica registradosno mundo não são somente oriun-dos das grandes chaminés, das gran-des queimadas, das grandes lavou-ras, etc. mas também da soma dafalta de conscientização ou ignorân-cia de cada ser humano. Os huma-nos formam comunidades maioresou menores, mas todas elas sãoimpactantes. Desenvolvimento Sus-tentável, no seu contexto amplo,não é para ser discutido, é para quesejam traçadas as diretrizes e, emseguida, guardá-las em uma “cúpu-la” fora do alcance de quem deve-ria praticá-las. Não é o “mundo” ogerador das causas de impacto am-biental e social e, sim, quem o ha-bita. Não será o mundo quem mi-tigará os efeitos, mas as ações indi-viduais. Nenhuma ação coletivacomeça sem uma iniciativa indivi-dual.

DESCONHECIMENTO EFALTA DE ENGAJAMENTODO CIDADÃO NAS AÇÕESDO DESENVOLVIMENTOSUSTENTÁVEL: POR QUÊ?

A mitologia grega apresenta adescrição de um monstro de mui-tas cabeças, cujo hálito destruía

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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os campos e envenenava as águas.Esse monstro, a Hidra de Ler-na5, foi gerado por Tífon, umfilho horroroso da deusa Gaia(Terra) e de Tártaro (personifi-cação do inferno), e de Equidna,que era metade mulher e metadeserpente. Uma cabeça da Hidraera imortal. e as demais se recom-punham, portanto era um mons-tro eterno. No relato, o sobri-nho Iolau ajuda Hércules a des-truir o monstro, mas sem ne-nhum senso ecológico, pois in-cendiou uma floresta. A figurada Hidra e o episódio em si têmum apelo simbólico para a épo-ca6, mas pode-se considerá-lo mo-dernamente como se fossem asdisfunções provocadas pela con-vivência humana.

Hércules, um semideus, asso-ciou-se a um mortal para comba-ter a Hidra e, verificando que nãopoderia exterminar uma de suascabeças, a neutralizou. Ele dese-nhou uma estratégia com doispontos de ação: no primeiro, eledemonstra humildade, percebeque sozinho não alcançaria êxitoe recorre a alguém para auxiliá-lona tarefa e, no segundo, cedeuquando necessário; o que não erapossível exterminar deveria ficar

sob controle.Os primeiros hominídeos sur-

giram na Terra há cerca de 4,5milhões de anos7. Com eles, apa-rece o monstro “Anthropos-Insa-nus”. No início, um pequeno ser,que não chega a determinar ne-nhuma ameaça à integridade doscampos, das águas, do ar, portan-to do próprio homem e sua pri-mitiva sociedade. À medida queo grau de evolução da raça huma-na se desenvolve, o monstro tam-bém vai crescendo e ampliando onúmero de cabeças.

No início, a relação do ho-mem com seus semelhantes e coma natureza era calcada na luta pelasobrevivência. Ao evoluir, acres-centou-se a essa relação outrocomponente, a acumulação derecursos, evidenciando o pré-ca-pitalismo e o capitalismo comer-cial. Acumular riquezas derivapara uma presunção de poder.

Mais tarde, a “deusa industri-alização” fortaleceu o Anthropos-Insanus e lhe acrescentou a suaprincipal cabeça, a economia ca-pitalista industrial, aquela que iriacriar e alimentar as demais. Em-bora muitas críticas sejam feitas àeconomia capitalista, é fato queela não tem só características pre-

datórias. Porém, não é de bomalvitre deixá-la sem regulação.Tomando a estratégia de Hércu-les, o desafio está em colocar acabeça sob controle.

O nosso Hércules, que é a cú-pula dirigente e influente do pla-neta, perde energia batendo nacauda do monstro ou atirando fle-chas em suas cabeças que ressur-gem. O nosso Hércules não pediuajuda a Iolau, que, nessa analogia,é o cidadão, ou seja, o homem comsua postura e atitudes.

Portanto, o primeiro pontopara se alcançar sucesso, no quevem sendo proposto sobre Desen-volvimento Sustentável, está emdefinir estratégias eficazes e colo-car o cidadão como o elementoprincipal na execução das ações.

Como segundo ponto, tem deconsiderar e tratar o Desenvolvi-mento Sustentável como um sis-tema complexo (CHIAVENA-TO, 1994, p.70-75)8 e, tal qual umaempresa, dividi-lo em níveis deatuação. A hierarquização de suaestrutura organizacional irá con-duzir os planos de atuações maisdiretos, compreensíveis e realmen-te aplicáveis.

A composição organizacionalclássica das instituições apresentatrês níveis, demonstrados em for-ma de uma pirâmide, onde, notopo, está o nível estratégico (cú-pula-presidência), no meio, o ní-vel tático (diretoria) e, na base, onível operacional (gerência, cola-boradores). O plano traçado nonível estratégico é genérico, me-nos detalhado, trata de diretrizes.O plano tático detalha um pou-co mais as diretrizes e, por últi-mo, o plano operacional é muitoespecífico, destinando-se às inter-venções nas células de produção.Portanto, os resultados esperadospela “presidência”, só serão alcan-

As legislações municipais nãotraçam diretrizes ambientais

nem sociais e, quando o fazem,são dispersas, fora de um

contexto de projeto

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çados se forem minudenciadospara quem vai executar as tarefaspara atingi-los.

Portanto, como semelhança,constata-se que os planos estratégi-cos estão sendo traçados nas reuni-ões de cúpula, mas não avançam se-quer para o plano tático, para, en-tão, chegar às comunidades (opera-cional) e transformarem-se em atosindividualizados ou coletivos.

É perceptível que este é umponto que deve ser ponderado,pois reitera a ênfase desse traba-lho, não somente as ações traça-das e adotadas pela cúpula serãosuficientes para a implantação doDesenvolvimento Sustentável, poissempre estarão nascendo cabeçasno monstro “Anthropos Insanus”,substituindo aquelas que forameliminadas.

Nas empresas, os planos avan-çam em seus cursos e há cobran-ças quanto à sua execução e efeti-vidade. No tocante ao tema abor-dado, isto não acontece, haja vistao exemplo das Agendas 21 Locaise dos Planos Diretores, que, namaioria dos municípios, foramconcebidos para cumprir as impo-sições legais e estagnaram-se semperspectivas de implantação.

Não se trata simplesmente decriar mecanismos legais para queas diretrizes sejam detalhadas eoperacionalizadas, é necessário queas regras sejam compreendidas e,sobretudo, aceitas. É a aplicaçãode um processo de evolução hu-mana no campo ético-moral,como proposto por Kohlberg.9

(KOHLBERG apud MAXINIA-NO, 2004, p. 104-106)

Na questão das Agendas 21Locais e dos Planos Diretores, tra-ta-se exatamente disso, implantá-los pela convicção de que são im-portantes e necessários e não so-mente concebê-los para obter re-

compensas e evitar punições e,depois, abandoná-los ao perceberque não haverá nem castigos ouprêmios imediatos. A expressão“castigos ou prêmios imediatos” éproposital para remeter à percep-ção que tanto um quanto outroocorrerá, não pelos códigos jurí-dicos, mas pelas leis da naturezaque já se mostram implacáveis.

Supondo que, se atingissem ospontos acima: definição de estraté-gia, reconhecimento da importân-cia de inserir o cidadão (Iolau) nes-ta luta e estruturar o tema Desen-volvimento Sustentável como umaorganização complexa, ainda restaacertar naquilo que é essencial paraque o entendimento ocorra plena-mente, o plano de comunicação.

Em se tratando de comunica-ção, para que a mensagem ocor-ra, é fundamental a participaçãode três elementos: emissor, canale receptor. A mensagem é sem-pre transmitida em um código eé decodificada pelo receptor. Paraque possamos afirmar que a co-municação existiu, é necessárioque a mensagem seja entendidapelo receptor (totalmente decodi-ficada). Nessa definição conceitualsimples, está uma das razões daincompreensão do que seja Desen-volvimento Sustentável pela mai-oria das pessoas, pois os simplesmortais não sabem defini-lo, nãopercebem sua importância e, por-tanto, nada fazem para que eleseja elemento real e não mais per-sonagem de livros, fóruns, trata-dos etc. Logo, esse processo dedisseminação da informação temde considerar toda técnica que oenvolve para que se conclua comsucesso.

Esse tema está muito bem di-fundido, discutido, tratado e en-tendido no campo científico eacadêmico, mas a mensagem ain-

da não foi decodificada pela po-pulação, ou seja, no nível opera-cional da organização, ela aindanão dispõe do entendimento ne-cessário.

Uma série de fatores pode es-tar influenciando nesse fracassode relação entre os núcleos da“organização”: o formato da men-sagem não é o adequado, o canalnão está correto, e existem ruídosque interferem.

Na prática, para que as dire-trizes se transformem em ações,as mensagens devem ser descom-plicadas. Quanto aos canais, nun-ca existiram tantos à disposição.No entanto, veículos de comuni-cação de massa em profusão po-dem, atualmente, tanto explicarquanto confundir.

Traçar um planejamento uni-forme para a comunicação desseassunto é fundamental. Documen-tários mais atraentes, dentro da re-alidade de cada região, movimen-tos locais articulados pelo PoderPúblico em parceria com empre-sas, terceiro setor e sociedade orga-nizada são algumas das muitas op-ções para transformar essa matériarelativamente elitizada em absolu-tamente popular.

Nenhum projeto terá sucessose, em seus instrumentos, não exis-tir uma matriz de atribuições,delineada, clara e objetivamente.Essa matriz evitará a sobreposi-ção de competências que gera con-flitos e, também, o trabalho re-petido desnecessariamente emnúcleos de atuações diferentes quegeram desperdício de recursos.Deve-se partir do pressuposto deque o dever de todos (genérico)acaba por ser o dever de ninguém.Poder Público, iniciativa privada,terceiro setor e sociedade, paracada um, as atribuições devemestar nitidamente determinadas.

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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Ainda deve-se levar em conta oquanto realmente interessa difun-dir o tema, ou se há um empenhooculto de mantê-lo sob o domínioelitizado, mesmo, e principalmen-te, por aqueles, que tanta literatu-ra produziram e que tantos fóruns,debates e palestras promoveram,por ser o Desenvolvimento Susten-tável uma ótima vitrine para divul-gação de obras literárias, promo-ção pessoal e política.

Esses são os principais tópicosque precisam ser concatenados,em uma amplitude suficiente,para que o assunto vá à baila atodos os rincões, em todas as ca-madas sociais e passe a ser práticadiária da população.

A IMPLANTAÇÃO DODESENVOLVIMENTOSUSTENTÁVEL E OMODELO ECONÔMICOSOCIOAMBIENTAL

O modelo de sistemas, intitu-lado de “sucesso para os bem-su-

cedidos” (SENGE, 1990, p.271-273)10, nos mostra a distorçãoexistente e nos sugere uma corre-ção de rumo. Ele demonstra atendência do ser humano de de-dicar mais recursos onde será con-templado com mais benefícios.Ao analisarmos o cenário urba-no e o rural, vamos entendermelhor essa relação.

Esse arquétipo confirma a ten-dência humana de dispensar mais re-cursos para o segmento que lhe dámaior retorno, perdendo em visãosistêmica e, em consequência, despre-zando potenciais. Ao privilegiar umadas partes do sistema, ocorre um de-sastroso desequilíbrio e graves con-sequências. Um exemplo citado porSenge é da priorização do trabalhoem detrimento da vida pessoal.

Por outro lado, as Prefeiturasestão organizadas longe da visãodo Desenvolvimento Sustentável,seja do ponto de vista organizaci-onal (confronto de interesses desecretarias), seja do ponto de vis-ta estrutural e legal. Isso não con-

siderando políticas de subsídiosperversos, ou seja, intervençõespúblicas que incentivam produ-tores ou consumidores a práticasnegativas do ponto de vista am-biental.

Ao instalar uma indústria demédio e, principalmente, de gran-de porte, o Executivo Municipalpassa a ter uma visibilidade enor-me. Mesmo que não cuide dosaspectos ambientais como deveria,o Poder Público terá como escu-do a oferta de emprego, permi-tindo-lhe uma honrosa defesa.

Em contrapartida, ao contribuir,por negligência, com a degradação dosolo e da água no campo, fato queocorre lentamente e que vai eclodirem mandatos futuros, ele não correimediatamente o risco de uma avali-ação desfavorável imediata.

O Cenário Urbano

Na área urbana, os serviços pú-blicos, embora sofram críticasquanto à quantidade e/ou à quali-dade, estão disponíveis: transpor-tes, educação, saúde, saneamento,coleta de lixo etc. Além disso, temdisponibilidade de energia para to-dos e há o acesso fácil a informa-ção, inclusive com Internet gratui-ta em muitos municípios. As pes-soas, mesmo que precariamente, sesentem amparadas pelo Estado. Noâmbito industrial, comercial e deserviços, as entidades de apoio atu-am com cursos, palestras, orienta-ção sobre financiamentos e consul-toria, com uma efetiva parceria dogoverno local. Nesse aspecto, a eco-nomia avança.

No entanto, esse “progressoeconômico” não tem compromis-so com o desenvolvimento namedida em que denota somente ocrescimento. Essa é uma sutil, masimportante diferença, crescimen-

O agrupamento de erros no campo contribui para o agravamento da crise socioambiental. Vemos inexora-velmente diminuindo os espaços produtivos pela degradação do solo e da água e aumentando vertiginosa-mente a demanda por alimentos e energia

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to é pura e, simplesmente, umaexpansão, enquanto o desenvolvi-mento tem um sentido mais am-plo, pois contempla a distribuição.

A causa está na falta de visãosobre qual é o papel de nossa per-sonagem Desenvolvimento Sus-tentável, desprezando-se sua atu-ação. As legislações municipaisnão traçam diretrizes ambientaisnem sociais e, quando o fazem,são dispersas, fora de um contex-to de projeto. Uma prova destedistanciamento está no fato de

que é comum acontecer de umaempresa com alvará municipal serinterditada por um órgão estadualou federal por infringir a legisla-ção ambiental ou social.

Outro ponto negativo está naprópria estrutura de governo dosmunicípios, onde as secretariassão opostas em interesses. Exem-plo: uma Secretaria de Indústriae Comércio em confronto com ade Meio Ambiente (pode-se co-locar nesse cotejo também a Se-cretaria de Agricultura). Para seimplantar o DesenvolvimentoSustentável, o foco é a integração.

O centro urbano retém pes-soas e empreendimentos empre-sariais, mesmo com o aspecto de-sestruturado e arcaico das Prefei-turas. Essa concentração, diantede uma legislação inadequada,uma fiscalização despreparada euma estrutura desconexa, faz sur-gir pequenos focos de impactosambientais e sociais.

Somente criar uma legislação nãoresolverá o problema, os gestorespúblicos têm de mudar a concepçãoque fazem de políticas públicas e apli-

cá-las coletiva e organizadamente.Onde a política supera a técnica, oresultado é sempre, a médio e longoprazo, catastrófico.

O Cenário Rural

É perceptível a distinção de tra-tamento dado pelo Poder Públi-co aos espaços urbanos e rurais. Éa relação custo versus benefício, apli-cada à oferta de serviços públicose à capitalização de votos, que jácitamos no início desse artigo.Diante desse comportamento, osrecursos não chegam ao campo.

Um dos mais preciosos desses re-cursos é a informação e a sua capa-cidade de modificar hábitos, paramelhor ou pior.

Desconhecendo o certo faz-seo errado porque “sempre forafeito daquela maneira”.

O descaso com os recursos nãoé apropriado em momento al-gum, porém poderia até ser rele-vado em épocas de abundância,contudo, em ocasiões de escassez,isto é inadmissível.

Nesse cenário, aparece um Po-der Público negligente, pois nãoproporciona ao pequeno produtorinformação tampouco recursos tec-nológicos (considerando o acesso atécnicas e equipamentos mais ade-quados para que ele atinja melho-res índices de produtividade). Aoutra negligência é com a regula-ção das atividades desenvolvidaspelos grandes produtores (latifun-diários), que têm informação e tec-nologia, mas agem como o grandeindustrial-capitalista, esgotando re-cursos com uma visão imediatista,embora saibam das consequenciaispara as futuras gerações.

Encontramos, então, um pe-queno produtor agindo de formaculposa contra o meio ambiente econtra si mesmo, ao desvalorizarsua propriedade com práticas ina-dequadas, realizadas por ele oupelos arrendatários de suas terras.É habitual encontrar o pequenoagricultor sem capacidade financei-ra de explorar produtivamente suapropriedade e, então, a arrendapara ter algum ganho. O arrenda-tário não tem compromisso algumde preservação da gleba, pois,quando uma se degrada e não pro-duz mais, ele aluga outra e prosse-gue no seu ciclo predador.

A ação do grande latifundiá-rio é dolosa, pois ele tem acesso àinformação, sabe o que faz, tem

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

É importante que todo oprocesso seja conduzido sob oenfoque do engajamento, do

entendimento da problemática eda mudança do comportamento

ético-moral, para que, dessemodo, tenham-se consistência

e sustentabilidade

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capacidade financeira para esperara recuperação de determinadasáreas resilientes, enquanto issoutiliza de maneira dolosa aquelasque deveriam ser preservadas.

Há uma corrente de discussão deum conjunto de prerrogativas am-bientais para pequenos produtoresque atuam com a chamada agricul-tura familiar. Será mais um equívo-co, pois a soma dos impactos indi-vidualizados dessa atividade é o queimporta, e este resultado será o mes-mo daquele grande produtor quenão obedece à legislação.

Por que não discutir uma formade sustentabilidade para essas famíli-as que produzem, em lugar de criarexceções? Exceções carregam em suaspermissões o risco de tornarem-seregras. E o mais incoerente dessa li-nha de ação é que a vítima mais pró-xima e instantânea de atividades am-bientalmente incorretas será o pró-prio produtor que assim agiu, comfutura queda de produção e desvalo-rização de seu patrimônio. Isso semcontar outras nuances graves e com-plexas, que é a pressão ruralista so-bre a legislação ambiental, sobretu-do para facilitar o avanço do desma-tamento na Amazônia.

O agrupamento de erros nocampo contribui para o agrava-mento da crise socioambiental.Produz-se um paradoxo cruel,vemos inexoravelmente diminu-indo os espaços produtivos peladegradação do solo e da água eaumentando vertiginosamente ademanda por alimentos e energia.

Ajuste doDesenvolvimento Local

A proposta econômica se sus-tenta a partir do equilíbrio do con-junto de medidas do Poder Públi-co para cidade e campo, portanto,do próprio desprendimento polí-

tico. Está na extinção do arquétipodo “sucesso aos bem-sucedidos”.

Cabe ao Poder Público levar aocampo a sociabilidade de seus ser-viços e incentivar que entidades deapoio estejam presentes, levandoconhecimento e tecnologia. A par-tir do acesso a essa infraestrutura,o primeiro resultado positivo seráa permanência do homem do cam-po em seu lugar de origem e com aautoestima ampliada, o que serábenéfico do ponto de vista ambi-ental (pelo seu maior comprometi-mento) e social. Na outra vertente,o acesso ao conhecimento e à tec-nologia conduzirá a estabilizaçãoda degradação e, posterior, a regres-são desse processo. A implicaçãonatural será o aumento do poten-cial produtivo, regularizando aquestão contraditória, e assustado-ra, da perda de espaços produtivose aumento da demanda.

Dentro desse contexto, está di-recionar políticas públicas para “Ar-ranjos Produtivos Locais” – APLs11.Para isso, é necessário determinar ofoco da produção no campo e reu-nir um número significativo de inte-ressados nesse empreendimento e, emseguida, estimular e oportunizar formasde cooperação entre os produtores, oPoder Público e as entidades de apoiotécnico.

Nessa providência, está conti-do o fortalecimento da base eco-nômica local, para que seja com-petitiva em outros mercados.Abrangência plena, diversificaçãoe retroalimentação positiva são astônicas dessa conduta.

PRESERVAÇÃO AMBIENTAL,JUSTIÇA SOCIAL E RESPEITOÀ CULTURA: EFETIVASINTERVENÇÕES LOCAIS

Esse grande desafio consiste noagir para o desenvolvimento har-

mônico local. Considerando,como já foi citado, que, em umamaioria absoluta dos casos, asAgendas Sociais, as Agendas 21Locais e os Planos Diretores fo-ram montados para cumprir a lei,dentro do conceito de evitar pu-nições ou angariar recompensas,conclui-se que carecem de umarevisão imediata. Esses processosrequerem ampla discussão entresetor público, iniciativa privada,terceiro setor e sociedade, ou esta-rão condenados ao fracasso comomeros instrumentos de gaveta.

Cabe aos gestores públicos searmarem de muito desapego aosinteresses meramente políticos etomarem as rédeas para conduzira integração das lideranças, quetrarão, certamente, para as discus-sões muitos pontos conflitantes.

O óbice à renúncia aos inte-resses políticos por parte do Po-der Público é receio do surgimen-to de líderes carismáticos na esfe-ra dessa participação e, desta for-ma, preferem centralizar as deci-sões. É incrível como isto aconte-ça em pleno século XXI, ou seja,práticas de Estado centrismo, ca-racterísticas do nosso colonialis-mo, do império e de boa parte dachamada República velha. Isso sedá pelo medo da concorrência eda perda do poder. Diante disso,vê-se o despreparo para implemen-tar políticas públicas de real im-portância social.

O primeiro passo é reunir osinteressados para uma pauta defi-nida de ações e, nesse primeiroencontro, aprovar um cronogra-ma tentativo de intervenções,onde conste um prazo para a re-visão dos instrumentos existentes,associando suas linhas de atua-ções. Os prazos estipulados de-vem ser rigorosamente cumpri-dos, para que não haja esvazia-

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mento do propósito determina-do de juntar interesses e efetiva-mente se realizarem projetos con-dizentes com a realidade local.

É importante que todo o pro-cesso seja conduzido sob o enfo-que do engajamento, do entendi-mento da problemática e da mu-dança do comportamento ético-moral, para que, desse modo, te-nham-se consistência e sustentabi-lidade.

O MODELO ECONÔMICO

“Os homens agem para resol-ver o problema de sua existência.Não encontram, desde logo, tudoo que procuram... A economia éo esforço pelo qual se realiza aordem na casa” (GUITTON,1959, p. 14)

Ora, se a economia no sentidofigurado é “o bom uso que se fazdas coisas” e, etimologicamente, emsua origem grega, é direção, admi-nistração de uma casa, ela não podedesconsiderar os seus componentese suas variantes, pois natureza, ca-pital e trabalho estão relacionadoscom o homem e, portanto, com asociedade.

Segundo a teoria de Town-send (TOWNSEND apud GUIT-TON, 1959, p.183-184), o núme-ro de habitantes de um Estado édeterminado pela quantidade desubsistências de que dispõe. Poroutro lado, Cantillon (CANTI-LLON apud BORMANS, 2001,p.108) diz que o número de habi-tantes de um país não dependeapenas dos meios de subsistênciadisponíveis mas também do gêne-ro de vida da população. Malthusafirmava que a população tende acrescer mais depressa do que assubsistências de que pode dispor.(MALTHUS apud GUITTON,1959, p.185-187)

Reunindo essas afirmações,surge uma primeira constatação:o êxodo rural acontece pela de-terminante da diminuição daquantidade de subsistências, porfalta de recursos para produzir e,também, da ausência de serviçospúblicos que influem decisiva-mente na qualidade de vida daspessoas. A segunda é: quandoMalthus asseverou sobre o cres-cimento rápido da população, ain-da não se dava conta de que esseaumento poderia ser controlado.Mas, ainda assim, corre-se o riscode as subsistências não atenderemà demanda, pois, em contraparti-da do equilíbrio ou da diminui-ção do crescimento demográficoe das tecnologias de incrementoda produção, o fator natureza (es-paços para produção) está se tor-nando escasso.

“Definindo-se um conjuntoeconômico pela coerência de seuselementos essenciais, este conjun-to se localiza no espaço, em dadomomento do tempo. Toma cor-po, constrói-se. Uma construçãosugere, mesmo etimologicamen-te, os termos de arquitetura e es-trutura”. (GUITTON, 1959,p.18-20)

O enunciado do problema paraser resolvido em grupo compostopelo Poder Público, iniciativa pri-vada, terceiro setor e sociedade é:a cidade reúne melhores condiçõesde subsistência do ponto de vistade empregos, negócios e serviçospúblicos. No campo, os empregosnão existem ou são de má qualida-de, a distância para a tecnologia ea informação reduz a produtivi-dade e leva a práticas inadequadas.Encontre a equabilidade.

A economia municipal tem deseguir um esboço uniforme deoportunidades e, para tanto, re-quer que a cidade seja menos po-

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

luidora e que o campo tenha maispotencial para o fornecimento derecursos.

A primeira linha de observaçãoestá na questão: trazer novos em-preendimentos ou incrementar osjá existentes? Essa é mais uma ques-tão de equilíbrio. É plenamenteviável fortalecer a economia locala partir dos empreendimentos ins-talados, por meio de ArranjosProdutivos Locais. Esses investi-dores já têm compromisso com olocal, com o ambiente em que vi-vem, e se dedicarão muito mais,sentindo-se valorizados pelo PoderPúblico e pela própria sociedade daqual fazem parte.

Os investidores cooptadosnão estão neste contexto e, quasesempre, chegam à carona de mui-tos privilégios, fato que desesti-mula os empresários locais.

O segundo ponto está emolhar para o campo como umgrande manancial de recursos epossibilidades. Basta citar que abiomassa pode ser utilizada paraprodução de alimentos, suprimen-tos, combustível, fertilizante eração industrializada (PARIKHapud SACHS, 2002, p. 32-33).12

São várias as destinações úteis quese podem dar à biomassa, substi-tuindo vilões da natureza, e essetesouro está no campo. Porémnão dá para falar ou exigir práti-cas sustentáveis sem oferecer con-dições para que elas sejam adota-das. Portanto, esse escopo econô-mico local tem de contemplar ecombinar fatores: conhecimento,crédito, acesso à tecnologia e mer-cados.

Nesse arcabouço simples, masque considera o conjunto da obraestá consignado o caminho dasustentabilidade local, construin-do um modelo forte, porém fle-xível de acordo com as circuns-

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1 “a ciência pode e deve ser organizada e aplicada à industria para melhorar e transformar as condições da vida” e complementa com uma afirmativa: “devemos arrancar da natureza seus segredos,pela tortura se necessário...” (Francis Bacon em Nova Atlântida (1627)2 “que seja possível alcançar conhecimentos que sejam muito úteis à vida e que no lugar dessa filosofia especulativa que se ensina nas escolas possamos encontrar uma prática pela qual, conhecendoa força e as ações do fogo, da água, do ar, dos astros, dos céus, possamos empregá-las da mesma forma para todos os usos a que são apropriadas e, assim, tornarmo-nos donos e possuidores da natureza”.(Renée Descartes, Discurso do Método)3 O conceito de ecodesenvolvimento, lançado por Maurice Strong em junho de 1973, consistia na definiçãode um estilo de desenvolvimento adaptado às áreas rurais do Terceiro Mundo, baseado na utilização criteriosa dos recursos locais, sem comprometer o esgotamento da natureza, pois, nestes locais,ainda havia a possibilidade de tais sociedades não se engajarem na ilusão do crescimento mimético. Com a Declaração de Cocoyoc no México, em 1974, também as cidades do Terceiro Mundo passama ser consideradas no ecodesenvolvimento. Finalmente, na década de 80, o economista Ignacy Sachs se apropria do termo e o desenvolve conceitualmente, criando um quadro de estratégias aoecodesenvolvimento. Parte da premissa deste modelo se baseia em três pilares: eficiência econômica, justiça social e prudência ecológica.O ecodesenvolvimento representa uma abordagem ao desenvolvimento cujo horizonte temporal coloca-se a décadas ou mesmo séculos adiante. Entende que a satisfação das necessidades dasgerações futuras deve ser garantida, isto é, deve haver uma solidariedade diacrônica sem que, no entanto, comprometa a solidariedade sincrônica com a geração presente, já por demais sacrificadapelas disparidades sociais da atualidade. (LAYARQUES, Philipe Pomier. Do ecodesenvolvimento ao desenvolvimento sustentável: evolução de um conceito?)4 Princípios básicos – Ignacy Sachs 1993 – cinco dimensões de ecodesenvolvimento:Sustentabilidade econômica: sua necessidade torna-se evidente pelas recentes modificações na economia e na política mundial, exigindo que se pense a eficiência econômica em função de sua eficáciasocial e não só nos critérios de lucratividade de curto prazo, ignorando sua responsabilidade com as gerações futuras.Sustentabilidade social – busca reduzir as distâncias entre padrões de vida abastados e não abastados e a melhoria da qualidade de vida de todos os envolvidos nas distintas iniciativas de desenvolvimento.Sustentabilidade ecológica – destina-se à conservação dos sistemas naturais, preservando a biodiversidade, respeitando a sociodiversidade e garantindo sua capacidade de suporte e regeneração diantedos impactos causados pela ação humana.Sustentabilidade espacial – voltada a uma configuração rural-urbana mais equilibrada e uma melhor distribuição territorial de assentamentos humanos e atividades econômicas, promove projetosmodernos de agricultura regenerativa, agroflorestamentos e agroindústrias, proporcionado acesso a técnicas adequadas e estabelecendo medidas de proteção a ecossistemas frágeis.Sustentabilidade cultural – a partir de peculariedades de cada local, busca-se projetar, participativamente, um futuro apropriado às expectativas, às necessidades e às características de sua população.Os processos produtivos, tecnologias, modalidades de consumo e forma de vida são questionados, planejados e implementados dentro de uma perspectiva de reforçar os vínculos de pertencimentoentre o indivíduo e seu grupo e entre ele e o meio ambiente, a sociedade e as gerações futuras. (Estratégias de transição para o século XXI – desenvolvimento e meio ambiente. Editora Studio NobelFundap, São Paulo – 1993, citado por Jacobi)5 A Hidra de Lerna é um monstro horripilante, gerado pela deusa Hera para “provar” o grande Heracles. Criada sobre um plátano, junto da fonte Amimone perto do Pântano de Lerna , na Argólida.A Hidra é figurada como uma serpente descomunal de muitas cabeças, variando estas, segundo os autores, de cinco ou seis, até 100, e cujo hálito pestilento a tudo destruía: homens, colheitas e rebanhos.Para conseguir exterminar mais esse monstro, o herói contou com a ajuda preciosa de seu sobrinho Iolau, porque, à medida que Heracles ia cortando as cabeças da Hidra, onde houvera uma, renasciamduas. Iolau pôs fogo a uma floresta vizinha e, com grandes tições, ia cauterizando as feridas, impedindo, assim, o renascimento das cabeças cortadas. A cabeça do meio era imortal, mas o filho deAlcmena a decepou assim mesmo: enterrou-a e colocou-lhe por cima um enorme rochedo. Antes de partir, Heracles embebedeu suas flechas no veneno ou, segundo outros, no sangue da Hidra,envenenando-as. (BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Grega, Vol I. Petrópolis, Vozes, 2004)6 Hidra simboliza os vícios múltiplos, "tanto sob forma de aspiração imaginativamente exaltada como de ambição banalmente ativa. Vivendo nos pântanos, a Hidra é mais especificamentecaracterizada como símbolo dos vícios banais. Enquanto o monstro vive, enquanto a vaidade não é dominada, as cabeças, configuração dos vícios, renascem, mesmo que, por uma vitória passageira,se consiga cortar uma ou outra". O Sangue da Hidra é um veneno e, nele, o herói mergulhou suas flechas. Quando a peçonha se mistura às águas dos rios, os peixes não podem ser consumidos, o queconfirma a interpretação simbólica: tudo quanto tem contato com os vícios, ou deles procede, se corrompe e corrompe. (DIEL, Paul. O simbolismo na mitologia grega. Tradução de Roberto Carusoe Marcos Martinho dos Santos. São Paulo. Attar Editorial, 1991, citado em http://www.templodeapolo.net/Mitologia/mitologia_grega/1ger_div/mitologia_grega_1ger_div_hidra.html)7 Charles Darwin criou a teoria evolucionista, utilizando um conjunto de pesquisas, ainda em desenvolvimento. A partir daí vários membros da comunidade científica, ao longo dos anos, se lançaramao desafio de reconstituir todas as espécies que antecederam o homem contemporâneo. Entre as diferentes espécies catalogadas, a escala evolutiva do homem se inicia nos Hominídeos, com maisde quatro milhões de anos. O Homo habilis (2,4 – 1,5 milhões de anos) e o Homo erectus (1,8 – 300 mil anos) compõem a fase intermediária da evolução humana. Por fim, o Homo sapiens neanderthalensis, com cerca de 230 a30 mil anos de existência, antecede ao Homo sapiens, surgido há aproximadamente 120 mil anos, que corresponde ao homem com suas características atuais. http://www.brasilescola.com/históriag/evolucionismo.htm8 As empresas constituem sistemas complexos destinados a atingir objetivos igualmente diferenciados e complexos. Para tanto, ocorre a divisão do trabalho e especialização de atividades dos órgãose dos participantes. É possível definir diversos níveis de atuação dentro da empresa, cada qual desenvolvendo diferentes enfoques quanto aos objetivos empresariais. Cada nível tem a sua própriaracionalidade. Para Max Weber, racionalidade implica adequação dos meios utilizados aos fins que se deseja alcançar. Para Taylor, era essa a busca que fundamentou a Teoria Científica “the Best way”.(CHIAVENATO, Idalberto. Administração: teoria, processo e prática. São Paulo, Makron Books, 1994, 2ª edição)9 Estágio Pré-Convencional de Desenvolvimento Moral – neste estágio, a ética é essencialmente individualista ou egoísta. Não há regras comuns aceitas, a não ser a regra de que não há regras. Acerteza da impunidade reforça a permanência neste estágio.Estágio Convencional de Desenvolvimento Moral – a ética continua sendo individualista, porém regras de conduta são elaboradas tendo em vista a relação de uma pessoa ou grupo com outras pessoasou grupos. O receio da punição pelo comportamento incorreto e a busca de recompensas passam a conviver com a busca da satisfação pessoal, inerente ao primeiro estágio.Estágio Pós-Convencional do Desenvolvimento Moral – o comportamento atingiu o mais alto nível ético. A conduta pessoal, grupal ou individual está fundamentada em princípios morais quereconhecem os direitos alheios... O comportamento é orientado por princípios e convicções e não por convenções, pelo receio de punições e pela busca de recompensas. (adaptação dos princípiosda Teoria de Kohlberg extraída de MAXIMINIANO, Antonio Cesar Amaru. Fundamentos de Administração: manual compacto para cursos de formação tecnológica e sequenciais, Atlas, São Paulo, 2004.)10 “Este arquétipo é chamado de “sucesso aos bem-sucedidos”, consiste de dois processos de reforço, ambos estimulando o crescimento dos níveis de sucesso – não obstante as atividades seremcompetitivas entre si”. (SENGE, Peter M.A Quinta Disciplina: arte, teoria e prática da organização aprendizagem. Tradução Regina Amarante. Editora Best-Seller. São Paulo/SP. Pág. 271)11 O apoio a Arranjos Produtivos Locais é fruto de uma nova percepção de políticas públicas de desenvolvimento, em que o local passa a ser visto como um eixo orientador de promoçãoeconômica e social. Seu objetivo é orientar e coordenar os esforços governamentais na indução do desenvolvimento local, buscando-se, em consonância com as diretrizes estratégicas dogoverno, a geração de emprego e renda e o estímulo às exportações. (http://www.mdic.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=2&menu=300)12 Diagrama 5 F do professor Jyoti Parikh: alimento(food), suprimentos (feed), combustível (fuel), fetilizantes (fertilizers) e ração animal industrilizada (feedstock).

tâncias do espaço-tempo em quese aplica.

CONCLUSÃO

O Desenvolvimento Sustentá-vel, implantado por meio de umprograma de Economia Socioam-biental peculiar para municípiosde área contínua, é fundamentalpara que as metas globais de miti-gação do efeito poluidor sejamatingidas. Nessa conjuntura, in-sere-se, também, a preocupaçãoem não comprometer o supri-

mento da demanda por alimentose energia, potencializando a pro-dução de biomassa de forma ade-quada.

Este modelo passa por umaprofunda reforma político-cultu-ral, que se inicia no campo ético-moral para aceitação de formaconvicta de que Desenvolvimen-to Sustentável não é termo paradiscursos vazios, mas sim paraações concretas transbordantes desinceridade e honestidade dos pro-pósitos assumidos. Converge, des-te modo, para a implementação

de políticas públicas que igualemcampo e cidade no processo dedesenvolvimento.

Por último, esse artigo não es-gota o assunto, muito pelo con-trário, abre inúmeras alternativaspara outros trabalhos, mais seleti-vos sob o prisma ambiental, ousocial, ou cultural, ou da formade ocupação dos espaços. Com-porta, ainda, trabalhos direciona-dos a diagnosticar e apresentarsoluções para locais específicos:comunidades, municípios e mi-crorregiões.

NOTAS

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Deploying sustainable development: environmental economics for municipalities ofcontinuous area (urban and rural)

Determine the reasons for the overall guidelines are not implemented locally and propose solutions to the vastexisting theory to be transformed into concrete actions will be the focus of this article, as well as suggest a neweconomic model that meets the needs of generating employment and income of municipalities with environmentalpreservation and social justice. These proposals are justified by the finding that the focus of studies of environmentaland social crisis is launching on local events and more visible and are not taken into account the occurrencessprayed. Consider that the meeting of the attacks carried out in small urban and rural communities have a hugecontribution in the general context, but what is dispersed is not visible. How to adjust the local development,environmental preservation, social justice and respect for culture? How to change the context of current discussionsand arrangements, no more waiting for great solutions, but achieving small but effective local interventions. Whatshould be the role of public, private enterprise and society? What is the ideal model of economy for localsustainable development?

Keywords: Local Sustainable Development. Employment and income. Environmental preservation. Social justice.

Implementar el desarrollo sostenible: economia ambiental para municipios de la zonacontinua (urbanas y rurales)

Determinar las razones por las directrices generales no se aplican a nivel local y proponer soluciones a la gran teoríaexistente se transforma en acciones concretas, se convierte en el foco de este artículo, así como proponer un nuevomodelo económico que satisfaga las necesidades de generación el empleo y los ingresos de los municipios con lapreservación del medio ambiente y la justicia social. Estas propuestas se justifican por el hecho de que el centro deestudios ambientales y sociales de la crisis está poniendo en marcha en eventos locales y más visible, no se tienen encuenta la aparición pulverizada. Considere la posibilidad de que la reunión de los ataques llevados a cabo enpequeñas comunidades urbanas y rurales tiene un gran aporte en el contexto general, sino que se dispersa no esvisible. Cómo ajustar el desarrollo local, la preservación del medio ambiente, la justicia social y el respeto de lacultura? ¿Cómo cambiar el contexto de las actuales discusiones y acuerdos, no más de espera para grandes soluciones,pero el logro de los pequeños, pero eficaces, las intervenciones locales? ¿Cuál debería ser el papel de público, laempresa privada y la sociedad? ¿Cuál es el modelo ideal de la economía para el desarrollo local sostenible?

Palabras clave: desarrollo sostenible de desarrollo de sitios. El empleo y los ingresos. La justicia social. Lapreservación del medio ambiente.

BRAGA et al. Introdução à Engenharia Ambiental. São Paulo. Prentice Hall,2002.BRANCO, Adriano Murgel; MARTINS. Sustentável na Gestão de Serviços Públicos: responsabilidade socioambiental e informe social. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2007.BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Greva Vol I. Petrópolis: Vozes, 2004; HTTP://www.brasilescola.com/históriag/evolucionismo.htmBROWN, Lester R.,Ecoeconomia: construindo uma Economia para a Terra. Salvador: UMA Editora, 2003.CANTILON, Richardo. Essai sur le commerce, 1755, citado em BORMANS, Cristophes, Citations D’Économie Commnentées e Analysées, Studyrama, 2001 (pág.108)CAPRA, Fritjof. Ponto de Mutação. São Paulo: Cultriz, 2004.CHIAVENATO, Idalberto. Administração: teoria, processo e prática. São Paulo: MakronBooks, 1994, 2ª edição.DESCARTES, Renée. Versão eletrônica do livro Discurso do Método. Tradução Enrico Corvisieri. Créditos da digitalização: Membros do grupo de discussão Acrópolis (Filosofia), home page do grupo:http://br.egroups.com/group/acropolis/GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO Tratados e Organizações Internacionais em Matéria de Meio Ambiente: entendendo o meio ambiente .Volume I, 2ª edição. São Paulo. Secretaria doMeio Ambiente. Ficha Catalográfica (preparada pelo Setor de Biblioteca da CETESB) S 2 4 2 e São Paulo (Estado). Secretaria de Estado do Meio Ambiente. Entendendo o meio ambiente /Coordenação geral do Secretário de Estado do Meio Ambiente de São Paulo Fabio Feldmann. São Paulo: SMA, 1997.GUITTON, Henri, Economia Política, primeiro volume, 2ª edição, Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura.1959.GUITTON, Henri, Economia Política, segundo volume, 2ª edição, Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura.1959.JACOBI, Pedro. Meio Ambiente e Sustentabilidade. O Município do Século XXI: cenários e perspectivas. Edição Especial. São Paulo: Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam, 1999.JOSEPH, Townsend. A Dissertation on the Poor Laws,1786 (disponível no site: www.efm.bris.ac.uk/het/townsend/poor law.htmLAYRQUES, Philippe Pomier. Do ecodesenvolvimento ao desenvolvimento sustentável: evolução de um conceito? Disponível no site http//nereainvestiga.org/publicoes/user 35 FICH PT 32.pdf. MAXIMINIANO, Antonio Cesar Amaru. Fundamentos de Administração: manual compacto para cursos de formação tecnológica e sequenciais, São Paulo: Atlas, 2004.PFEIFFER, Peter, Gerenciamento de Projetos de desenvolvimento: conceitos, instrumentos e aplicações, Rio de Janeiro: Brasport, 2005.SACHS, Ignacy. Caminhos Para o Desenvolvimento Sustentável, Rio de Janeiro: Garamond.2002.SENGE, Peter M.A Quinta Disciplina: arte, teoria e prática da organização aprendizagem. Tradução Regina Amarante. São Paulo: Editora Best-Seller.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

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Efeitos dosprogramas deregularização sobreo mercado de solourbano: algumasconsiderações

RES

UM

OREGULARIZAÇÃO DO SOLO URBANO

Antônio Augusto VeríssimoArquiteto e UrbanistaCoordenador da Coordenadoria de Planejamento e Projetos da Secretaria Municipal de Habitação daPrefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.

INTRODUÇÃO

O parcelamento e venda ilegalde terras nas periferias têm sido aforma mais frequente de expan-são das grandes e médias cidadesdos países do terceiro mundo.Este processo de “urbanização”sem urbanismo avança sobre áre-as do entorno das cidades anteri-ormente destinada ao uso agríco-

la ou pastoril – ou ainda sobreáreas virgens não exploradas –produzindo assentamentos huma-nos desprovidos de infraestrutu-ra e serviços básicos, onde se fi-xam famílias de baixa renda à es-pera da chegada urbanização e deregularização fundiária.

A demanda que recorre a estetipo de produto (o lote sem ser-viços) é formada por um contin-

gente de trabalhadores urbanosque se apresenta como “demandainsolvável” para o mercado fun-diário e imobiliário formal, e, poreste motivo, busca no submerca-do informal de lotes urbanos umaforma de inserção na cidade.

O mercado de lotes irregula-res e clandestinos é um “submer-cado” do “mercado imobiliário”informal que atende à demanda

O parcelamento e venda ilegal de terras nas periferias têm sido a forma mais frequente de expansãodas grandes e das médias cidades dos países do terceiro mundo. Este processo de “urbanização” semurbanismo avança sobre áreas do entorno das cidades anteriormente destinada ao uso agrícola ou pastoril.Possibilitando um mercado de lotes irregulares e clandestinos um “submercado” do “mercado imobiliário”informal que atende à demanda por terra para a produção de unidades habitacionais para setores da forçade trabalho de baixa renda. Para explicar a formação da estrutura das grandes cidades latino-americanas,identificamos “duas grandes lógicas do mundo moderno de coordenação das ações individuais e coletivasque se consolidaram a partir da construção dos Estados Nacionais”.

Palavras-chave: Terras. Urbanização. Solo. Trabalho.

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM REGULARIZAÇÃO DO SOLO URBANO

por terra para a produção de uni-dades habitacionais para setoresda força de trabalho de baixa ren-da. Este “atendimento” se dá pormeio da oferta, no mercado, delotes resultantes do parcelamen-to do solo, sem o atendimento,total ou parcial, da legislação ur-bana. Este submercado, emborainformal, está também submeti-do a um conjunto de regras eprincípios que, segundo PedroAbramo, compõe a “lógica mo-derna de coordenação social dasações sociais, e econômicas”, quemarca a estrutura socioespacialdas cidades brasileiras. (ABRA-MO, 2007, p. 1, 2)

FUNÇÕES ECONÔMICAS ESOCIAIS DA INFORMALIDADE

A produção informal de lotesnão está dissociada do mercadoimobiliário em geral, pois estacumpre neste mercado uma “fun-ção econômica e social” que é ade prover terra para a produçãohabitacional a preços “acessíveis”para determinados segmentos so-ciais considerados “não solváveis”para o mercado imobiliário for-mal. Esta oferta informal somen-te se viabiliza economicamenteporque a demanda a que se desti-na não é atendida pelos agentesprodutores de lotes urbanos queatuam na legalidade, sejam elesprivados ou públicos. A inexistên-cia de uma oferta formal cria ascondições para a atividade infor-mal que, sem concorrência – a nãoser aquela estabelecida entre ospróprios informais – fica livrepara impor padrões urbanísticosde baixíssima qualidade a preçosrelativos elevados. Estudo realiza-do por este autor comprova que,em muitos casos, o preço pagopor um lote informal sem servi-

ços, ou com serviços precários,seria suficiente para custear todaa dotação da infraestrutura bási-ca exigida pela legislação vigentedo parcelamento do solo, desdeque fosse investida em obras deinfraestrutura a parcela do preçopago relativa à antecipação da va-lorização futura, garantida aoempreendedor a remuneraçãomédia da atividade da indústria daconstrução civil. Esse estudo de-monstrou que grande parte destademanda, que é considerada “nãosolvável” pelo mercado formal,possui efetivamente condições dearcar com o custo de produçãode um lote urbanizado. (VERIS-SIMO, 2007)

AS LÓGICAS MEDIADORASDO MERCADO FUNDIÁRIOURBANO

Para explicar a formação da es-trutura das grandes cidades latino-americanas, Abramo identifica“duas grandes lógicas do mundomoderno de coordenação dasações individuais e coletivas que seconsolidaram a partir da constru-ção dos Estados Nacionais”. Aprimeira atribui ao Estado o pa-pel de coordenador social das re-lações entre os indivíduos e os gru-pos sociais, funcionando comomediador social definidor da for-ma e da magnitude do acesso à ri-queza da sociedade. A segundaatribui ao mercado, por meio dasrelações de trocas, a mediação doacesso à riqueza social.

Tratando especificamente doacesso ao solo urbano, aquele au-tor define que, a partir da lógicade Estado, exige-se dos indivídu-os ou dos grupos sociais algumacúmulo de capital, que pode serpolítico, institucional, simbólicoou de outra natureza, capital este

que o habilita a participar do jogode distribuição das riquezas soci-ais. A lógica de mercado, poroutro lado, somente admite apossibilidade de se ter acesso àterra urbana por meio do acúmu-lo de capital monetário.

Para Abramo, a “lógica de mer-cado” pode adquirir duas diferen-tes formas institucionais. Uma,denominada de “mercado formal”,é condicionada pelos marcos nor-mativos do Estado que estabelecemo campo das relações econômicaslegais. E outra, denominada “mer-cado informal”, caracterizado pe-las relações que se estabelecem àmargem do sistema legal.

“Assim, a lógica de mercado decoordenação social de acesso à ter-ra urbana se manifesta através derelações legais ou ilegais. No pri-meiro caso, a coordenação é exer-cida pelo mercado formal, enquan-to no segundo caso o processo deacesso ao solo urbano é mediadopor um mercado informal.”(ABRAMO, 2007, p. 2)

Existe ainda uma terceira ló-gica de acesso à terra urbana queAbramo denomina de “lógica danecessidade”, esta seria “simulta-neamente a motivação e a instru-mentalização social que permitea coordenação das ações individu-ais ou coletivas dos processos deocupação do solo urbano”. Estalógica não exigiria o acúmulo denenhum dos “capitais” identifica-dos para as lógicas de Estado emercado, a princípio, apenas aabsoluta necessidade de dispor deum local de moradia seria o ele-mento acionador dessa lógica deacesso à terra urbana.1

Verifica-se, no entanto, que,embora o “submercado” de lotesinformais esteja submetido pri-

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mordialmente à “lógica de mer-cado”, na sua forma institucionalde “mercado informal”, está sub-metida simultaneamente tambémàs determinações das lógicas deEstado e de necessidade.

Pode-se identificar a subordi-nação à lógica de Estado, no mo-mento em que se constata seremos parcelamentos não regularesresultados, também, da atuaçãodo Estado, quando este definenormas urbanísticas e distribuirecursos e investimentos públicosno território (definição de formade acesso à riqueza social) que ser-vem de instrumento para a cria-ção ou o aprofundamento da se-

gregação socioespacial, segregaçãoesta que atua em benefício da re-produção maximizada do capitalimobiliário.

Ainda sob a égide desta lógica,está a questão do próprio acesso àregularização via ação do PoderPúblico, que somente se efetiva emfunção de luta e acúmulo de forçapolítica pelos moradores, o queestá bem exemplificado no caso daluta empreendida pelos morado-res em loteamentos nos final dosanos 70, na cidade do Rio de Ja-neiro. (JESUS et alii 2006)

Identifica-se a subordinaçãoà lógica da necessidade quan-do se constata que, apenas por

estarem em situação de neces-sidade e ausência de alternati-vas2, se submetem os adquiren-tes de lotes em parcelamentonão regulares às precárias con-dições de infraestrutura, aces-so e serviços que estes ofere-cem. (SMOLKA, 2007)

Para entender, ainda, o fe-nômeno da “produção” de par-celamento não regulares, é ne-cessário ter em conta que o“mercado imobi l iár io infor-mal” (no qual esta “produção”está inserida), embora esteja es-tabelecido à margem do siste-ma legal, está, em termos eco-nômicos, integrado ao circuitode valorização e acumulação docapital, ao “oferecer” solo, apreços “acessíveis”, para a pro-dução habitacional autocons-truída por setores de baixa ren-da da força de trabalho. A pos-sibilidade da existência destaoferta desobriga o capital de in-cluir no valor dos salários pa-gos aos trabalhadores o mon-tante necessário para suprir asdespesas com habitação (umdos componentes mais impor-tantes da cesta básica de repro-dução da força de trabalho) aocusto em que esta é oferecidano mercado imobil iár io for-mal. Por outro lado, desoneratambém, pelo menos a curtoprazo, o Estado, que só poste-riormente será cobrado a su-prir a demanda por infraestru-tura e serviços nesses locais demoradia.

A FORMAÇÃO DE PREÇOSNO SUBMERCADOINFORMAL DE LOTES

O submercado informal de lo-tes, como mercado primário, temseus preços determinados por con-

Para viabilizar as vendas, os loteadores informais oferecem condições de pagamento diferenciadas comrelação àquelas praticadas no mercado formal

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dicionantes endógenos e exógenos,sendo determinante para que pro-duto “lote” ganhe preço no merca-do e que o mesmo possua determi-nados atributos relacionados às se-guintes condições:

1. edificabilidade (relevo etopologia);

2. localização no território;3. comercialização;4. possibilidade da captura

de antecipação de valorização ad-vinda da intervenção pública deregularização.

Condição 1: está associada aosaspectos físicos do lote, tais como:suas dimensões, relevo e condi-ções topológicas; variáveis quevão determinar um maior oumenor custo de produção da edi-ficação em si. Um desenho geo-métrico que não permita um me-lhor aproveitamento ou um rele-vo que implique a necessidade deobras especiais (aterros, cortes econtenções). Para a viabilização

da edificação, exigirá um descon-to por parte do loteador. Estacondição tem a ver com as carac-terísticas próprias do terreno e,também, com a maior ou menorhabilidade do loteador em efetu-ar o dimensionamento e o arran-jo das parcelas no terreno, viabi-lizando, ou não, o maior e me-lhor uso do solo. Um desenhoque possibilite um uso mais in-tensivo do solo contribuirá maispara a formação do preço e, con-sequentemente, para a extração demais renda da terra.

Condição 2: a situação do lo-teamento em relação aos meiosde transporte público, acessibi-lidade ao centro de negócios, ser-viços e de oferta de empregos éfator determinante, sendo esta acondição de maior peso na for-mação do preço da terra. Estefator, no entanto, já tende a es-tar presente na formação do pre-ço da gleba original, não sendoo componente principal do gan-ho do loteador.

Condição 3: a condição deinsolvabilidade diante do mer-cado formal é condição impor-tante, porém não exclusiva paraa existência e o funcionamentodeste submercado, sendo tam-bém, por outro lado, o maiorlimitador das suas possibilidadesde ganho. Para viabilizar as ven-das, os loteadores informais ofe-recem condições de pagamentodiferenciadas com relação àque-las praticadas no mercado for-mal, o que implica uma maiorflexibilidade na forma de paga-mento e na criação de formasalternativas de cumprimentodas obrigações que incluem, emalguns casos, a entrega de bens,móveis e imóveis, como partedo pagamento e/ou a prestaçãode serviços.

Condição 4: a possibilidade deantecipar a valorização futura,que virá com a realização deobras de urbanização, implanta-ção de equipamentos, serviços ecom a regularização fundiária, éo componente mais importantedo ganho excepcional a ser cap-turado pelo loteador. Esta pos-sibil idade fica potencializadaquando existem fortes indícios deque estes benefícios chegaram emum prazo relativamente curto,em função da v igência depolíticas e programas públicosvoltados para o reconhecimentoe a regularização desses assenta-mentos. Quanto mais provávelesta possibilidade, mais alto seráo preço de transação dos lotesofertados (SMOLKA, 2007).Neste sentido, haverá maior gan-ho quanto maior for a capacida-de do loteador de antecipar asdecisões de investimento do Es-tado em dotação de infraestru-tura, conforme explica PedroAbramo.

Os loteadores formais possuemrestrições para atuar no

mercado de baixa renda porque,atuando na formalidade, nãopodem exercer a possibilidadede antecipação da valorização

futura na mesma escala dos queatuam na informalidade

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“Como diria Keynes dos especulado-res do mercado financeiro, os loteadoressão os verdadeiros ‘profissionais da anteci-pação,’ agentes que ganham na antecipa-ção das ações de urbanização futura doEstado onde todos os riscos futuros ficampor conta das famílias populares que ad-quiriram um lote com um ‘bônus virtual’de urbanização. Aqui cabe dizer que osenso comum se equivoca novamente, poisa prática dos loteadores e urbanizadorespiratas não é arcaica ou pré-moderna, elaé uma prática sofisticada dos mercados fi-nanceiros e que exige ser regulada, tal comonos mercados financeiros”. (ABRAMO,2007)

Conhecer esta prática, com-preender suas lógicas e tentar res-ponder a algumas questões perti-nentes a este tema é o desafio quese impõe neste trabalho.

O CIRCUITO DE INSERÇÃODOS POBRES À CIDADEPELA VIA DO MERCADOINFORMAL

Para uma adequada compreen-são de como se viabiliza a inser-ção dos pobres à cidade pela viado mercado informal e a conse-

quência deste processo como de-finidor de um determinado cir-cuito de valorização do solo, faz-se necessário retornar ao concei-to desenvolvido sobre a interação

das diversas lógicas de coordena-ção social na produção da infor-malidade urbana e avaliar seusefeitos sobre o mercado de lotesurbanos.

O esquema gráfico, acima,procura situar as diversas for-mas de produção habitacionalv igentes nas c idades la t ino-

americanas, segundo as lógicas(ou suas interações) a que es-tão submetidas.

Observando-se o esquema grá-fico anterior, é possível imaginardiversos circuitos de inserção dospobres à cidade a partir das di-versas lógicas de mediação, taiscomo: a aquisição no mercado deuma habitação formal em área debaixa renda; a aquisição no mer-cado de uma habitação subsidia-da pelo Estado; o acesso a umahabitação produzida pelo Estado;a aquisição de um lote em um lo-teamento ilegal; ou a ocupação deterras.

Para efeito deste estudo, noentanto, interessa- nos observarcom maior detalhe aquele circui-to de acesso que nos parece sero que promove a maior valori-

zação da terra e que permite amaior antec ipação deva lor ização futura do lo te ,qual seja o circuito que se ini-cia com a aquisição de um loteem um loteamento ilegal passapor uma ação estatal de urba-nização e titulação e, finalmen-te, se insere no mercado for-

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mal, conforme pode ser visua-lizado no gráfico seguinte.

O CIRCUITO DEVALORIZAÇÃO E SUAANTECIPAÇÃO PELOPARCELADOR NA FORMADO INCREMENTO DOPREÇO DO LOTE

A participação do Estado naprodução habitacional para baixarenda se dá por meio de investimen-to de recursos públicos que serealizam basicamente de três formas:i) produção direta de unidadeshabitacionais pelo Estado; ii) ofertade subsídio à demanda para aquisiçãode unidades no mercado; ii)regularização urbanística e fundiáriade assentamentos informais. Emtodos os casos, a participação doEstado pressupõe o consumo derecursos do “fundo público”3 parao atendimento de uma demanda ha-bitacional considerada não solvávelpara o mercado imobiliário formal.(OLIVEIRA, 1998)

No caso específico dos investi-mentos realizados na regularizaçãode loteamentos informais, oconhecimento prévio desta atuaçãoestatal por parte do empreendedor

informal e do adquirente permi-te ao primeiro a incorporação, aopreço da venda do lote informal,de uma parcela relativa à anteci-pação da valorização futura, ob-tida com a regularização urbanís-tica e fundiária do loteamento.Ocorre, portanto, uma transfe-rência antecipada de recursos pú-blicos para o loteador que, juntocom o lote, vende ao adquirente um“bônus virtual” que lhe dará acessono futuro à urbanização, 22/10/2009 a 1/1/2005 serviços e títulode propriedade a serem providos

pelo Poder Público, processo quepode ser visualizado no gráficoACIMA. (ABRAMO, 2007)

Se, a esta ação de regularização,forem adicionados mais recursospúblicos subsidiados direcionados aofomento de novas construções nos lotesou a melhorias nas existentes, este“bônus” será incrementado, tornandoainda mais elevado o preço do metroquadrado do lote informal no mercado.

Observa-se, portanto, um ciclovicioso onde quanto mais investi-mentos públicos forem direciona-dos à urbanização dos assentamen-tos e às melhorias das habitações,maior será o incremento no preçodo lote sem serviço ofertado emaior será a transferência derecursos dos cofres públicos paraos bolsos dos loteadores informais.

COMO OS PROGRAMAS DEREGULARIZAÇÃO AFETAM OFUNCIONAMENTO DOMERCADO FORMAL

Os loteadores formais possuemrestrições para atuar no mercado debaixa renda porque, atuando naformalidade, não podem exercer apossibilidade de antecipação da

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valorização futura na mesma es-cala dos que atuam na informali-dade. No mercado formal, o em-preendedor somente é capaz deantecipar valorizações futuras ge-radas por investimentos públicosou privados externos aoempreendimento em si, ou seja,não pode antecipar futuras valori-zações em função da realização deobras que fazem parte do rol dasobrigações legais que lhe cabem,porque o adquirente de um loteformal sabe que o custo dessasobras já está internalizado no preçodo lote.

A gleba adquirida para a exe-cução de um parcelamento formaljá incorporou no seu preço deaquisição os parâmetros de par-celabilidade e edificabilidade quelhe são atribuídos pela norma,tornando restrita a possibilidadede incorporação de inovações quetornem o produto diferenciadoe, portanto, passível de lhe seratribuído um sobrepreço em re-lação aos seus concorrentes nestemercado.

Por outro lado, no mercadoinformal, existe a possibilidade deextração máxima da antecipaçãoda valorização futura, uma vez quejá há um consenso entre vendedo-res e adquirentes de que a aquisiçãode um lote informal é, na verdade,a compra de uma “posição” noterritório, que habilita o seucomprador a reivindicar ao Estadomelhorias urbanas gradativas que,mais cedo ou mais tarde, lheproporcionarão um título depropriedade definitivo de um lotecom infraestrutura e serviços,integrando-o, portanto, à cidade eao mercado formal. O preço desta“posição” no território serávalorado segundo a sinalização dadapelo Poder Público, ou por seusagentes4, em relação à possibilidade,

à velocidade e à intensidade destaação regularizadora.

Outro fator que tem a vercom a possibilidade de antecipa-ção de valorização futura relaci-ona-se com a oportunidade deaquisição, pelos parceladores in-formais, de glebas que estão “forado mercado”, seja por não aten-derem aos parâmetros para o par-celamento exigidos pela legisla-ção, ou por não apresentarem,em função dessa mesma legisla-ção, condições de rentabilidadeque justifique o custo de seu par-celamento e urbanização formais.Paradoxalmente, estas são situa-ções que podem gerar para o lo-teador informal uma excelenterentabilidade, pois lhe permiteintroduzir “inovações” e ofere-cer no mercado produtos dife-renciados em relação aos seusconcorrentes formais, viabilizan-do a oferta de um produto aces-sível a uma faixa de renda quenão poderia adquirir um lote emdeterminadas regiões em funçãodas regras de parcelamento im-postas pelo Poder Público.

Como o proprietário da gle-ba tem dificuldades para a co-mercia l ização do lote nomercado formal e não é capazde antecipar (pelo menos noiníc io de um processo de“infor mal ização” de umadeterminada região da cidade) ouso futuro que será dado ao ter-reno pelo mercado informal,está disposto a vendê-lo a umpreço inferior ao praticado nomercado de g lebas para aprodução legal. Por outro lado,parcelador e adquirente sabemque, embora produzidos emdesacordo com os parâmetrosmínimos legais, cedo ou tarde,estes parcelamento e lotes serãoreconhecidos pela

Administração Pública. Poden-do contar, para este resultado,com o amparo das leis, excep-cionalizam-os como áreas ouzonas de especial interesse so-cial – AEIS ou ZEIS.

Observa-se, assim, que o Esta-do, na tentativa de dar uma res-posta para as graves carências queatingem os moradores desses as-sentamentos, acaba por incentivare aprofundar os processos perver-sos que alimentam a informalida-de, favorecendo o desvio dos re-cursos públicos e o incrementodo preço da terra, gerando, comoconsequência, mais segregaçãosocial e territorial.

COMO REGULARIZAR SEMREALIMENTAR AINFORMALIDADE EA ALTA DOS PREÇOS?

A simples constatação dos efei-tos “perversos” dos programas deregularização sobre o mercado deterras e os consequentes processosde segregação socioterritorial nãoresolvem a questão colocada peladívida social e urbanística que ascidades possuem em relação àsmilhares de famílias que habitamcentenas de loteamentos, vilas eoutros tipos de parcelamentos nãoregulares carentes de infraestrutu-ra, serviços e titularidade. Não hácomo não reconhecer como legí-timas as lutas e as reivindicaçõesdessas comunidades por integraçãosocioespacial na cidade. No entan-to, as políticas e os programas aserem formulados não devem ig-norar ou minimizar esses efeitosperversos sobre o mercado, especi-almente no que se refere à transfe-rência de recursos públicos para asmãos dos loteadores piratas. Nestesentido, cabe o exame de algumasprovidências que devem ser

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consideradas na formulação deprogramas e projetos de regulari-zação com o objetivo de mitigar,ou mesmo eliminar, esses efeitosdos programas de regularização.

REPARTINDO OS ÔNUSDA URBANIZAÇÃO

Uma das medidas mais efica-zes para a redução da transferên-cia de recursos para os loteadoresclandestinos seria, sem dúvida, acobrança, pelo Poder Público, aosmoradores beneficiados, da tota-lidade ou de parte substancial doscustos de urbanização. Desta for-ma, não teriam os parceladorescomo antecipar no preço dos lo-tes sem serviços a valorização agre-gada pela futura regularização,pois o adquirente já saberia queteria de arcar com esse custo nofuturo e não concordaria em adi-antar essa parcela do valor do loteao parcelador, reduzindo, por-tanto, o seu preço de venda.

Compreende-se, no entanto,que a implementação de tal me-dida não se daria sem custos polí-ticos, já que tradicionalmente asobras de urbanização e regulari-zação realizadas nessas comunida-des nunca resultaram em ônusdiretos para os beneficiados,quando muito a sua inserção nocadastro imobiliário do Municí-pio, para fins de cobrança doIPTU e nos cadastros das conces-sionárias de serviços públicos.

Estudos elaborados por esteautor com base em dados do Pro-grama de Regularização de Lotea-mentos desenvolvido na Cidade doRio de Janeiro (VERISSIMO, 2007)demonstraram, no entanto, que estaantecipação de ganhos realizada peloloteador clandestino se dá de formadiferenciada no território, variandoconforme a maior ou menor

capacidade de pagamento ou do“excedente de consumidor”disponível. Em áreas maisvalorizadas da cidade, constatou-se que o preço de venda do loteirregular já internaliza valores ca-pazes de suportar um padrão le-gal mínimo de urbanização e, ain-da assim, garantir uma remunera-ção ao parcelador compatível como mercado da construção civil. Emáreas intermediárias, o preço devenda suporta a urbanização empadrões legais mínimos, porémficam reduzidas as margens deremuneração. Nas áreas maisperiféricas, verifica-se que os preçospraticados efetivamente nãosuportam a execução da urbanizaçãoe, portanto, não antecipam de formaplena a valorização futura.

Tais resultados nos permitemconcluir que medidas diferencia-das poderiam ser implementadaspelo Poder Público para a formu-lação de uma ação legítima e de-fensável, política e socialmente, derecuperação de investimentos nosprogramas de regularização. Nasduas primeiras regiões, constata-da a capacidade do pagamento,poderia ser compartilhada com osbeneficiários a totalidade ou par-te dos custos da urbanização e daregularização, cabendo lembrarque já há base legal para este “com-partilhamento” segundo o quedispõe o parágrafo primeiro doartigo 62 da Lei n.º 11.977 de 7de julho de 2009, que instituiu oPrograma Minha Casa MinhaVida. Na ultima, certamente, seriamais difícil a imposição de ônusadicionais aos beneficiários, emboraalguma recuperação possa serobtida pela via fiscal.

Cabe ressaltar que todo o va-lor apurado com a cobrança decontrapartidas dos beneficiáriosassim como todas aquelas advindas

das ações judiciais movidas con-tra os loteadores clandestinos de-verão ser encaminhados ao Fun-do Municipal de Habitação deInteresse Social, aumentando, as-sim, a legitimidade social destacobrança.

OFERTA DE LOTESURBANIZADOS –COMPETINDO COMA INFORMALIDADE

O resultado do estudo anteri-ormente citado também permiteformular alternativas para o en-frentamento do tema da informa-lidade do parcelamento do solopela via da oferta de lotes urbani-zados legalizados. Neste sentido,cabe lembrar que já existem nalegislação brasileira instrumentoslegais que podem viabilizar a par-ceria entre proprietários de ter-ras e Poder Público para a ofertade lotes urbanizados legalizadospara a população de baixa renda,destacando-se a figura do Consór-cio Imobiliário previsto no art.46 do Estatuto da Cidade, que éa forma de viabilização de planosde urbanização ou edificação pormeio da qual o proprietáriotransfere ao Poder Público Mu-nicipal seu imóvel e, após a reali-zação das obras, recebe como pa-gamento unidades imobiliáriasdevidamente urbanizadas ou edi-ficadas, sendo o valor das unida-des imobiliárias entregues aos pro-prietários, correspondente ao va-lor do imóvel antes da execução dasobras.

Nestes moldes, já existe emcurso, desde 19975, uma experiên-cia em desenvolvimento na Cidadede Joinville – Santa Catarina, ondea Prefeitura promove, atualmente,um projeto de urbanização em umaárea de 789.000,00 m² em parceria

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1 Analisando o quadro mais recente dos processos de acesso ao solo urbano nas grandes cidades brasileiras, pode-se concluir que as lógicas de mercado e de necessidade se articulam para viabilizareste acesso. Já não são frequentes nas grandes cidades os processo de ocupação onde não se exigem dos ocupantes algum aporte, prévio ou posterior, de capital monetário ou político.2 Segundo Smolka, “a maioria das famílias de mais baixa renda não escolhe um assentamento informal porque neste lhe oferecem um lote por menor preço, senão porque com frequência só possuemesta alternativa”3 Para Francisco de Oliveira, o “fundo público, em suas diversas formas, passou a ser o pressuposto do financiamento da acumulação do capital, de um lado, e, de outro, do financiamento da reproduçãoda força de trabalho, atingindo globalmente toda a população por meio de gastos sociais.” No caso em tela, o fundo público financia a acumulação do capital nas suas vertentes informal e formal.4 Candidatos a cargos eletivos, por exemplo.5 Sobre legislações de incentivo à produção de lotes urbanizados, veja VERISSIMO, 2004.6 Informações fornecidas pela Prefeitura de Joinville por e-mail em 05/03/2009.7 Sobre a experiência do Urbanizador Social, veja DAMASIO, 2006.

NOTAS

com um proprietário privado. Se-gundo o contrato estabelecidoentre as partes, cabe à Prefeitura odesenvolvimento do projeto; aexecução das obras de infraestru-tura; o desmembramento e lega-lização dos lotes, bem como o pa-gamento de taxas e obtenção delicenças. Ao proprietário priva-do, como título de remuneraçãopela terra, cabem 50% dos lotes aserem comercializados. Estes, noentanto, somente poderão ser ofe-recidos a pessoas cadastradas naSecretaria Municipal de Habita-ção. O preço de venda, as regrasde cobrança e o número de par-celas, também, estão estipuladosno contrato.6

Outro experimento interessan-te foi o desenvolvido pela Prefei-tura de Porto Alegre, o denomina-do Urbanizador Social, quebuscava atrair para a parceria como Município empreendedores for-mais e informais, oferecendo umasérie de “ferramentas” instituídaspela Lei do Urbanizador Social.7

Com base nesses experimentose nos referenciando ao caso doRio de Janeiro, podemos imagi-nar que, no primeiro caso expos-to, uma atuação firme da fiscali-

zação municipal associada a incen-tivos específicos a empreendedo-res formais poderia gerar na regiãouma oferta de lotes legalizados pelomercado formal que poderiacompetir e inibir efetivamente aoferta clandestina. No segundo,com a utilização do instrumento doConsórcio Imobiliário previsto noart. 46 do Estatuto da Cidade e emparceria com proprietários deterras, poderia o Poder Públicooferecer lotes com serviços apreços de custo. No último caso,no entanto, a intervenção públicadeveria aportar algum tipo desubsídio a esta produção, tendo emvista o menor poder aquisitivo dapopulação beneficiária.

CONCLUSÕES

A questão do parcelamento e davenda ilegal da terra urbana é ape-nas uma das diversas faces que as-sumem o problema da produçãoinformal da moradia nas grandescidades. O seu equacionamentodepende da articulação de diversasáreas do conhecimento e envolve aatuação multidisciplinar, poisabrange aspectos de ordem políti-ca, social, ambiental e econômica.

No presente trabalho, buscamosrefletir sobre aspectos das lógicaseconômicas que condicionam ofuncionamento deste “submerca-do” e, por meio da sua compreen-são, tentamos identificar alternati-vas para a atuação governamentalque, por um lado, minimizem os“efeitos perversos” dos programasde regularização e, por outro, pos-sibilite a oferta de alternativas paraa população que se encontra “re-fém” deste tipo de oferta informal.

Não se pode deixar de abor-dar o fato de que nos encontra-mos em um momento de gran-des expectativas em relação à via-bilidade de redução de uma par-cela considerável do deficit habita-cional em nossas cidades com autilização dos recursos disponí-veis no Programa Minha CasaMinha Vida do Governo Fede-ral. Por maiores que sejam, noentanto, os recursos, estes nãodarão conta do tamanho e dacomplexidade da demanda, neces-sitando-se ainda estudar a viabili-dade de alternativas para amplia-ção e democratização do acesso àterra urbanizada e à habitação.Com este objetivo, estas reflexõespretendem contribuir.

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Effects of regularization programs on the urban land market: some considerations

The split and illegal sale of land in the suburbs have been the most frequent form of expansion of large andmedium cities in third world countries. This process of 'urbanization' without advance planning on areassurrounding the cities previously intended for agricultural or pastoral use. Allowing a market for irregular andclandestine plots a 'sub' do 'real estate' informal meets the demand for land for the production of housing unitsfor sectors of the workforce with low incomes. To explain the formation of the structure of large Latin Americancities have identified "two broad logics of the modern world of coordination of individual and collective actionsthat were consolidated from the construction of nation states".

Keywords: Land. Urbanization. Land. Work.

Efectos de los programas de regularización en el mercado de suelo urbano: algunasconsideraciones

La división y la venta ilegal de tierras en los suburbios han sido la forma más frecuente de expansión de lasciudades grandes y medianas en los países del tercer mundo. Este proceso de "urbanización" sin planificaciónprevia sobre las áreas que rodean las ciudades anteriormente destinados a usos agrícolas o de pastoreo. Permitirque un mercado de parcelas irregulares y clandestinos un sub '"hacer" de bienes raíces se reúne informal de lademanda de tierras para la producción de unidades de vivienda para los sectores de la fuerza laboral de bajosingresos. Para explicar la formación de la estructura de las grandes ciudades de América Latina se han identificadodos lógicas amplia del mundo moderno de la coordinación de las acciones individuales y colectivas que se hanconsolidado desde la construcción de estados nacionales”.

Palabras claves: Tierra. La urbanización. La tierra. El trabajo.

ABRAMO, Pedro. O mercado de solo informal em favelas e a mobilidade residencial dos pobres nas grandes cidades: notas para delimitar um objeto de estudo para a América Latina. IPPUR-UFRJ, Rio de Janeiro. 2007.DAMASIO, Claudia. (Org.) Urbanizados Social: da informalidade à parceria. Lincoln Institute of Land Policy. Editora Livraria do Arquiteto, Porto Alegre, 2006.JESUS, Ângela Regina de; PEREIRA, Sonia M. da Silva; VERISSIMO, Antônio Augusto. Regularização de loteamentos: notas sobre a experiência carioca. (co-autoria) In Revista de AdministraçãoMunicipal – Municípios – IBAM – Ano 52 – n.º 259, pg. 19-30. Rio de Janeiro, julho/agosto/setembro, 2006.OLIVEIRA, Francisco. O Surgimento do Antivalor. Capital, força de trabalho e fundo público. In Os direitos do antivalor: A economia política da hegemonia imperfeita. Editora Vozes. Petrópolis, 1998.SMOLKA, Martin O. Informalidad, pobreza urbana y precios de la tierra. In. SMOLKA , Martin O. e MULLAHY, Laura (Org.). Perspectivas urbanas. Temas críticos en políticas de suelo em AméricaLatina. Cambridge, MA: 2007. pg. 71-78.VERÍSSIMO, Antônio Augusto. Incentivos à produção de lotes urbanizados: uma análise dos instrumentos legais de Joinville, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Bogotá. In. Revista de AdministraçãoMunicipal, Rio de Janeiro: Ano 49 n.º 247, p. 31- 39, mai./jun., 2004.

__________________________. Quantificação das Mais Valias geradas nos loteamentos informais pela antecipação da valorização produzida pelos programas de regularização. Trabalho finalindividual apresentado no Curso de Aprofundamento em Políticas de Solo Urbano, Lincoln Institute of Land Policy, Cidade do Panamá, 26 de fevereiro a 11 de maio de 2007.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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RES

UM

OA descentralizaçãoem Santa Catarina

DESCENTRALIZAÇÃO

Walter Marcos Knaesel BirknerDoutor em Ciências SociaisConsultor do IPAC -IBAM/SC

Fabrício Ricardo de Limas TomioDoutor em Ciência PolíticaProfessor da Universidade Federal do Paraná – UFPR

Sandro Luiz BazzanellaDoutor em Ciências Humanas na UFSCProfessor da Universidade do Contestado – UnC.

Este artigo é resultado de uma pesquisa de avaliação institucional sobre a Descentralização em SantaCatarina. Analisa respostas de dois questionários: o primeiro do tipo quantitativo, aplicado entreintegrantes de Secretarias de Desenvolvimento Regional – SDRs e seus respectivos Conselhos deDesenvolvimento Regional – CDRs. O segundo é qualitativo, resultado da análise do conjunto deentrevistas cujos interlocutores são igualmente integrantes das SDRs e dos CDRs.

Palavras-chaves: Descentralização. SDR. Reformas institucionais.

INTRODUÇÃO

No ano de 2003, Luiz Henri-que da Silveira assume o cargo degovernador de Santa Catarina,respaldado pela coligação PMDB-DEM-PSDB. A assim denomina-da Tríplice Aliança confere-lhe abase de governabilidade e gover-nança para a implantação, no mes-mo ano, da descentralização po-lítico-administrativa para a pro-moção do novo desenvolvimen-to regional. Esse reordenamento

governamental está configuradona composição de atuais 36 Secre-tarias de Desenvolvimento Regi-onal – SDRs e seus respectivosConselhos de DesenvolvimentoRegional – CDRs. Cada uma dasprimeiras é comandada por umsecretário, do staff de secretáriosde Estado, no topo de um orga-nograma constituído, na sequên-cia, por um diretor geral e dire-tores setoriais, além de funcioná-rios públicos e pessoal de cargoscomissionados. Por sua vez, os

CDRs são presididos pelo mes-mo secretário regional e consti-tuídos pelos prefeitos, presiden-tes de câmaras e dois representan-tes da sociedade civil de cadaMunicípio da microrregião deabrangência das SDRs, indicadospelos prefeitos.

A descentralização insinua-separte de um importante movi-mento histórico do Estado mo-derno. Nessa direção, as Secreta-rias de Desenvolvimento Regio-nal e seus Conselhos representam

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uma experiência local bastanteoriginal no Brasil, embora nãoexclusiva. Os efeitos de sua ope-racionalização já permitem, seteanos depois, o apontamento dealguns aspectos centrais e algumasconsiderações analíticas. Alémdisso, a política da descentraliza-ção catarinense faz parte de umadinâmica marcada por dois im-portantes aspectos, entre outrospossíveis de observação na cons-tituição desse movimento inter-nacional do Estado.

Primeiramente, a descentraliza-ção demonstra o esforço governa-mental de agentes políticos e bu-rocráticos em promover a refor-ma republicana do Estado, racio-nalizando processos de gestão dacoisa pública, e tornando o pro-cesso decisório mais aberto à par-ticipação da sociedade e, por essarazão, mais transparente. Nessadireção, se considerarmos apenasa realidade brasileira, é importan-te saber que algumas experiênciasestaduais estão em curso, tanto emrelação ao aspecto gerencial quan-to em relação ao político. Sobreisso, ainda se pode dizer que setrata de uma consequência histó-rica da própria dinâmica do Esta-do brasileiro. Sua democratizaçãoa partir de 1985 despertou, apesardos percalços, uma crescente aspi-ração reformista na década de 90pela reestruturação do Estado, en-cerrando o ciclo varguista, com-promisso afirmado pelo ex-presi-dente e sociólogo Fernando Hen-rique Cardoso.

O segundo aspecto diz respei-to a uma tendência internacional,representando a transição do Es-tado centralizador de inspiraçãohobbesiana, para o Estado dasautonomias de John Locke, comosugere Amaral [2002]. Trata-se datendência histórica de descentra-

lização político-administrativa doEstado Moderno, aspecto que sematerializa desde décadas anteri-ores em países europeus, apare-cendo nos fundamentos da expe-riência catarinense e que, pela for-ma de operacionalização, de-monstra também nesse estado fe-derativo boas chances de continui-dade e consolidação futura. Nãoobstante, esse efeito ainda depen-de de capacidade de articulaçãopolítica, de força operacional doEstado e de sensibilidade continu-ada da sociedade civil. Nessa di-reção, importante é a ressalva deque não se trata, por hora, deuma política de Estado, mas umapolítica de governo.

Entre outras observações, osresultados da construção dessetipo de inovação política termi-nam por superar hipóteses malformuladas na década de 90 noBrasil. Segundo elas, os movimen-tos de aproximação do Estadopara com a Sociedade civil pode-riam, de um lado, representar oenfraquecimento do Estado – re-ceio conservador – e de outro,significar uma desobrigação doEstado acerca de suas incumbên-cias – receio de faceta reacionária,dos críticos de uma suposta cons-piração neoliberal. O que o pro-cesso demonstra, diferentemente,é a perspectiva de fortalecimentoinstitucional do Estado, por meioda sinergia com a sociedade civilorganizada local e regional.

Assim, o interesse aqui é de-monstrar alguma perspectivaquanto a essa possibilidade. Esteartigo faz parte de um conjuntomaior de considerações que deve-rá compor um trabalho comple-to e, portanto, mais volumosoacerca da descentralização catari-nense. Em relação aos dados con-tidos neste relatório geral da pes-

quisa, o conjunto de respostas dosquestionários [quanti], somados àsopiniões, às críticas e às sugestõesdas entrevistas [quali] realizadas,apresenta uma avaliação geral doprocesso, além de indicar os prin-cipais pontos fortes, fracos, ame-aças e oportunidades da descen-tralização.

Nessa direção, é importanteque o leitor leve em consideraçãoo fato de que os 432 entrevista-dos e inquiridos durante a pesqui-sa, em 20 das 36 microrregiões quesediam as SDRs, são agentes ati-vos da descentralização e conhe-cedores do processo em curso.Os entrevistados com menor en-volvimento direto foram os de-putados estaduais, cujas entrevis-tas foram realizadas na última eta-pa da pesquisa. Praticamente, to-dos os 44 parlamentares foramcontatados, embora nem todostenham tido a disponibilidade deagenda para as entrevistas.

Conquanto a condição empre-gatícia ou política da maioria dosentrevistados e dos inquiridospudesse incorrer em algum viésopinativo, é preciso esclarecerque, entre o total dos que consti-tuíram a amostra, estiveram en-volvidas pessoas cujas opiniõesparecem pouco vulneráveis a in-terferências que comprometes-sem a honestidade das respostas.Os casos que poderiam se incli-nar a essa tendência são as entre-vistas com os secretários de desen-volvimento regional, cujos cargossão indicados, e outros cargoscomissionados subalternos. Ocontato com pessoas nessa últimacondição foi evitado, constituin-do, no máximo, algumas exceções.Entre os secretários regionais, adesvinculação partidária é impos-sível de ser feita objetivamente. Ocuidado tomado, nesse sentido,

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esteve orientado principalmentepelos esclarecimentos prévios, emcada entrevista e aplicação dosquestionários, sobre a principalintenção do contratante da pes-quisa, o Governo do Estado deSanta Catarina, por meio da suaSecretaria de Estado de Planeja-mento e Gestão: promover umaavaliação institucional que iden-tificasse as potencialidades e as

vulnerabilidades, permitindo in-tervenções com vistas ao fortale-cimento da política de descentra-lização. Nessa direção, o esclare-cimento introdutório dos pesqui-sadores ao público da amostra foiexplicitamente orientado a partirdessa perspectiva crítica em rela-ção ao processo, por recomenda-ção da Diretoria de Descentrali-zação da referida secretaria seto-

rial. Esta Diretoria é o órgão go-vernamental diretamente respon-sável pela operacionalização dapolítica das SDRs e seus CDRs.

Não obstante, a escolha daamostra seguiu critérios de distri-buição espacial, leia-se, sedes deSDRs distribuídas em todas asregiões e entrevistas com todos osseus secretários. Depois disso, ocritério da amostra seguiu a alea-toriedade. Na pesquisa quantita-tiva, foram inquiridos todos osfuncionários de carreira encontra-dos no momento da visita, semdiscriminar os comissionados,além dos membros dos CDRs nasrespectivas reuniões. Na pesqui-sa qualitativa, foram entrevista-dos aleatoriamente prefeitos, pre-sidentes dos legislativos munici-pais, empresários e representan-tes outros da sociedade civil, alémde funcionários públicos de car-reira, com estabilidade emprega-tícia, lotados nas SDRs.

Dito isso, é útil observar que ograu de conhecimento e capacidadeanalítica dos entrevistados foi o prin-cipal fator de construção da análisedeste relatório. Resulta disso, em boamedida, a regularidade encontradaacerca dos principais aspectos identi-ficados no arranjo da descentraliza-ção. Sem o propósito de antecipar asconclusões ao leitor, é possível afir-mar que as observações nele constan-tes constituem um conjunto de in-formações úteis ao interesse dos quese debruçam sobre os processos pú-blicos de gestão e decisão e sobre osrumos do Estado moderno.

AVALIAÇÃO GERAL DOPROCESSO DEDESCENTRALIZAÇÃO

A avaliação geral que os entre-vistados indicam sobre o proces-so de descentralização é positiva.

Sendo improvável que a capacidade orçamentária do governo se multiplique para atender a todos os pleitosdos CDRs, parece necessário que o orçamento geral do Estado destine uma parte às SDRs

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Mais que isso, é importante des-tacar o caráter praticamente unâ-nime dessa avaliação por parte dosentrevistados. Isso inclui, modogeral, as posições mais críticas aoprocesso, sejam aquelas vindas deatores políticos situacionistas, se-jam dos oposicionistas. Trata-se,antes de tudo, do reconhecimen-to ao caráter de inovação perce-bido na iniciativa governamental.A descentralização, independen-temente de sua “paternidade” edos inúmeros aspectos questiona-dos de sua operacionalização, éreconhecida como uma respostaàs demandas regionais de atorespolíticos, econômicos e culturais.

Nesse sentido, repita-se, é pra-ticamente unânime a aprovação àideia da descentralização. O usodo termo “praticamente” decor-re do fato de que algumas respos-tas não explicitaram literalmenteessa posição, mas a demonstraramao longo da entrevista. Portanto,embora a aprovação geral possasurpreender e motivar algumadesconfiança, é preciso considerarminimamente os aspectos que elu-cidem esse resultado geral.

Assim, um deles é próprio daantropologia política, tendo a ver

com uma aspiração natural dascomunidades regionais por inici-ativas de governança descentrali-zadoras. Essas expectativas inde-pendem de vinculações partidári-as, expressando antes uma deman-da universalizada, de caráter cul-tural. Nisso, acrescente-se que as-pectos mais ou menos particula-res ao contexto sociopolítico ca-tarinense tornaram o processo dedescentralização mais facilmenteassimilável.1

Não obstante, a regularidadedas respostas pode ser compara-da com o fato de que as críticas àoperacionalização do processoestão longe de ser uma exclusivi-dade de atores políticos de oposi-ção ao Governo Estadual. Mui-tos governistas apontaram falhasno processo, nesse sentido emnada se distinguindo de oposici-onistas.

Quanto ao desenvolvimentoda pesquisa, um falso problemade ordem metodológica poderiaser apontado, qual seja, o de con-siderar restrito o público-alvo dasentrevistas, composto apenas porintegrantes das Secretarias de De-senvolvimento Regional – SDRsou dos Conselhos de Desenvol-

vimento Regional – CDRs. No-vamente é preciso ressaltar queessa composição geral é marcadapela diversidade partidária, tantonos CDRs quanto entre funcio-nários públicos locados nas SDRs,muitos deles de carreira e, por-tanto, de suposta independência,como faziam questão de se decla-rarem estes últimos. Da mesmamaneira, entre os parlamentaresda Assembléia Legislativa entre-vistados, essa diversidade partidá-ria está considerada, enquanto aregularidade de opinião persisteem relação à aprovação geral aoprocesso. Isso permite concluir,parafraseando inúmeras respostas,que o processo é compreendidocomo “irreversível.”

PONTOS FORTES DADESCENTRALIZAÇÃO

Em geral, os entrevista-dos não tiveram dificuldades deapontar as principais qualidadesdo processo. Salvo raros casos emque o entrevistado não tenha in-dicado nenhum ponto forte, emgeral, há novamente uma boa re-gularidade nas respostas. Um dospontos altos das observações re-side no reconhecimento de que oprocesso de descentralização mul-tiplicou o ambiente do diálogoregional, o que é enfatizado quan-do a questão se refere especifica-mente aos CDRs. A transparên-cia é outro fator mencionado comfrequência notável. Esse fator dizrespeito, por exemplo, à apresen-tação das demandas e dos proje-tos de interesse municipal feitasao Governo Estadual. Nessa di-reção, a apresentação pública daspropostas e solicitações entre osatores regionais tende a inibir aformulação de demandas de du-vidoso interesse público, destitu-

DESCENTRALIZAÇÃO

Com alguma frequência,membros dos Conselhosatribuem a melhora das

condições de seus pequenosmunicípios ao processo de

descentralização

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ídas de maior significado ou qua-lidade técnica.

Não menos importante, é amencionada proximidade, de vá-rias formas, que o processo dedescentralização promove tantoentre as regiões e o Governo doEstado quanto entre os municí-pios, bem como a proximidade dogoverno com a própria popula-ção que, segundo alguns depoi-mentos, estaria percebendo commais intensidade a presença gover-namental. Essa impressão é atri-buída ao movimento provocadopelas SDRs, seja pelas reuniõesdos CDRs, seja pelas obras físi-cas que muitos atribuem à descen-tralização, assim como pelas visi-tas de representantes governamen-tais, notadamente do própriogovernador. No sentido dessaaproximação, teria havido inclu-sive uma inversão. Trata-se doaspecto prático da diminuição dosdeslocamentos a Florianópolis,fato mencionado com bastante

frequência, o que teria em muitofacilitado a vida dos prefeitos.Em geral, os chefes do executivomunicipal se sentem mais atendi-dos com os secretários regionais,e o efeito disso é a percepção oua sensação de que o diálogo como Governo Estadual é intensifi-cado por meio desse contato comos secretários. Em relação a essaproximidade, menciona-se que,embora a capacidade de atendi-mento às demandas seja insufici-ente, esse atendimento tem sidofeito com maior agilidade. Detoda maneira, a impressão geralsugere a sensação de maior pre-sença governamental nas regiões.

Especificamente em relação àautonomia dos municípios, tam-bém se menciona que estes temsido mais encorajados a buscaremalternativas endógenas, o que vaisendo progressivamente estimula-do por meio da regularidade dasreuniões. Nesse sentido, a simplestroca de experiências e informa-

ções que as reuniões dos CDRstêm promovido, é entendidacomo estímulo ao aumento deconhecimento e criatividade.Além disso, alguns depoimentossugerem a percepção de que estáem jogo um progressivo aumen-to do poder regional no proces-so decisório.

Outro aspecto, ressaltado comalguma frequência, tem relaçãocom a satisfação expressa por ato-res de municípios menores, mui-tos dos quais compreendendo-semais contemplados do que emoutros tempos. Com alguma fre-quência, membros dos Conselhosatribuem a melhora das condiçõesde seus pequenos municípios aoprocesso de descentralização.Nessa direção, alguns entrevista-dos afirmam que houve algumadiminuição das desigualdades en-tre eles.

AS FRAGILIDADES DADESCENTRALIZAÇÃO

Em relação aos pontos fracosdo processo descentralizador, al-gumas regularidades são identifi-cadas nas falas dos entrevistados.Nessa direção, uma das reclama-ções mais frequentes diz respeitoà falta de autonomia. Esse aspec-to está diretamente relacionado àfalta de orçamento próprio paracada região de abrangência dasSDRs. A maioria dos entrevista-dos se refere espontaneamente aesse aspecto, reivindicando o seurespectivo CDR como interveni-ente legítimo. É bastante comuma crítica ao fato de que “tudo noConselho é aprovado”, mas quemdefine o que será efetivamenteexecutado é o Governo Estadual,provocando nesse processo umsentimento de frustração e de fal-sas expectativas.

Alguns entrevistados denunciam a insistência de uma relação direta e nociva entre alguns prefeitos comdeputados ou secretários setoriais para a liberação de verbas cuja distribuição desrespeita a existência dos CDRs

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Nesse aspecto, segue uma crí-tica bastante comum entre os en-trevistados acerca do centralismoorçamentário das Secretarias Se-toriais de Estado – SSEs. Reve-lando aqui todo o pragmatismo,sugerem inúmeros entrevistadosque de pouco adianta um pro-cesso de descentralização que nãodesconcentre os recursos finan-ceiros das SSEs, localizadas emFlorianópolis. A crítica à buro-cracia aparece aqui com bastantevigor. Integrantes das SDRs detodos os escalões dizem-se refénsdesse protagonista das organiza-ções. Em relação a esse aspecto,estão os depoimentos mais des-contentes dos que revelam sen-sação de paralisia administrativae desânimo com o processo, emfunção de trâmites que conside-ram inaceitáveis, a exemplo dascompras de materiais, que de-pendem das autorizações dos se-cretários setoriais.

Há manifestações municipa-listas por parte de integrantesdos CDRs, reclamando autono-mia para a materialização de de-mandas locais-regionais. Natu-ralmente, isto significa que, umavez detonado o processo de des-centralização, ele cria aspiraçõescrescentes e incontidas. Isso nãoquer dizer que tais aspiraçõessejam sempre compatíveis comcertos interesses governamentaisestratégicos, que ultrapassam asaspirações por autonomia terri-torial. Eventualmente, interessesna área do turismo, por exem-plo, podem ter estratégias racio-nalmente concentradas em deter-minados nichos, por um cálculode resultados, e isso não ser de-vidamente compreendido poralgum prefeito do interior. Detoda maneira, pela própria natu-reza do processo de descentrali-

zação, a tendência parece apon-tar para essa insistente insatisfa-ção encarnada nas SDRs e seusConselhos com as SSEs.

Por extensão a essa crítica, al-guns entrevistados denunciam ainsistência de uma relação diretae nociva entre alguns prefeitoscom deputados ou secretários se-toriais para a liberação de verbascuja distribuição desrespeita aexistência dos CDRs. A crítica é,portanto, relativa ao caráter desobreposição deste tipo de rela-ção tradicional à autoridade queos conselheiros reivindicam aosCDRs e às SDRs. Este aspectotão-somente pressiona o indicadoponto de conflito entre as SSEs eas SDRs. Da mesma maneira, pro-voca o confronto com os desíg-nios de um processo inovador defortalecimento da autonomia re-gional. Ao estabelecer uma novainstância no processo decisório deformulação das demandas locais-regionais, a descentralização in-terfere em tradicionais relações declientela, há muito estabelecidasentre parlamentares e suas regiões.Embora a atuação de muitos de-putados consiga se distanciar des-se perfil clientelista, em tantosoutros casos, esse é o comporta-mento padrão. Quando surgeuma nova instância regional deintermediação política, essas rela-ções tradicionais tendem a ser afe-tadas, mas resistem, provocandoo conflito de papéis. Nesse con-texto, a emergência da figura dosecretário regional é também mar-cada por alguma indefinição depapéis. Não obstante, a sua che-gada à cena política também aba-la a condição do deputado, quetende a ser empurrado à sua fun-ção legislativa. Abala também ospapéis do secretário setorial, quetende a ser empurrado a uma fun-

ção mais administrativa do quepolítica. Por essa razão, os secre-tários regionais encontram-se di-ante do desafio de firmarem sualiderança regional, instituídosdessa condição, mas não devida-mente à vontade para assumi-la.

O último ponto frágil a sermencionado diz respeito à qua-lificação dos atores envolvidosdiretamente no processo de des-centralização. Esse fator contémo caráter da dupla generalização.Primeiramente, o de que diferen-tes categorias de integrantes doprocesso o denunciam. Em se-gundo lugar, porque a denúnciase dirige a todas as categorias departicipantes, desde funcionári-os das SDRs, passando pelosmembros dos CDRs, até chegaraos secretários regionais e seto-riais. A crítica mais acentuadareside na falta de qualificação depessoas lotadas nas SDRs, resul-tado do “empreguismo” fre-quentemente apontado.2 Nessesentido, as críticas relacionadasao “excesso de pessoal” ou ao “in-chaço de gente” não estão pro-priamente no volume, mas jus-tamente na duplicidade de fun-ções e na ineficiência.

MEDIDAS DE GESTÃO PARAO FORTALECIMENTO DOSOBJETIVOS DADESCENTRALIZAÇÃO

A falta de maior autonomia é,sem dúvida, a maior reclamaçãoe, portanto, a sugestão mais re-gular entre os inquiridos. No atu-al estágio da experiência, signifi-ca a mais clara expressão da von-tade expressa dos atores da des-centralização. E esse pleito podeser sumariamente classificado emtrês esferas, sendo elas, a financei-ra, a política e a administrativa.

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Na primeira delas, trata-se deadmitir que a descentralizaçãorequer alguma autonomia orça-mentária. Isto será necessário, afim de que a descentralização nãorepresente meramente a represen-tação parcial e ilustrativa do umprojeto apresentado à sociedadecomo inovador e democrático.Sendo improvável que a capaci-dade orçamentária do governo semultiplique para atender a todosos pleitos dos CDRs, parece ne-cessário que o orçamento geral doEstado destine uma parte àsSDRs. Da forma como está, semautonomia orçamentária, tudoque é apresentado nos Conselhospode ser aprovado sem discus-sões. Na medida em que não exis-te orçamento regionalizado, cadaMunicípio apresenta os seus plei-tos para aprovação, e fica a espe-ra de liberação do Governo Esta-dual. Nesse caso, embora a for-ma pública de apresentação dospleitos ajude a qualificá-los, asse-gurada essa qualidade mínima,seria irracional que qualquer con-selheiro questionasse-lhes a vali-dade, correndo o risco de indis-

posições políticas desnecessárias.Já que não há orçamento, osCDRs e as SDRs ficam na de-pendência das SSEs e presos a re-lações clientelistas com parlamen-tares. Naturalmente, uma atitu-de de mudança assim sugerida sig-nificaria algo inédito e, talvez, dedifícil aplicação do ponto de vis-ta político. Mas, sem isso, o de-bate não se consolida, as reuniõestendem ao caráter homologató-rio, e a relação e a situação dedependência das regiões para como governo centralizado nas secre-tarias setoriais continuam. Dessemodo entendido, não haveriacomo ignorar os apelos pela au-tonomia orçamentária, ainda querelativa, enquanto um desideratonatural do processo, cuja inobser-vância poria em risco a continui-dade da inovação política.

Na segunda classificação, esta-ria a demanda por autonomiapolítica. Em verdade, ela não pa-rece senão derivada da primeirademanda. Assim, quando agentesdo desenvolvimento regional re-clamam autonomia política, istosignifica que defendem um espa-

ço de discussão para a delibera-ção sobre o que fazer. E essa con-dição decisória só é racionalmen-te possível se houver orçamentoregionalizado. A relação entreautonomia orçamentária e políti-ca, portanto, é direta. E não dei-xa de ser interessante observar adisposição dos agentes para a po-lítica, isto é, para o debate sobrea coisa pública. Nessa direção, éimportante novamente observarque o recurso para o atendimen-to aos pleitos não é o fator cen-tral de reivindicação. A principalsolicitação não é o aumento deverbas. O centro da reivindicaçãotem um caráter político e denotarealismo por parte dos conselhei-ros. Portanto, o teor da deman-da sugere que o orçamento seja apeça originária do debate. Quan-do reclamam isso, os atores regi-onais chamam a si a responsabili-dade do debate e da decisão, o quequalifica a crítica. Dessa maneira,a posição dos conselheiros não ésequer de solicitação, o que im-plicaria o reconhecimento e a per-petuação de uma relação de de-pendência. Ao contrário, é umareivindicação considerada legíti-ma, manifestando a disposição aodebate político e a responsabili-zação autônoma sobre a coisapública. Nada mais republicano,revelando de resto que o proces-so de descentralização só fez des-pertar sabiamente o caráter antro-pológico a que essa política se di-rige, qual seja, o de uma culturapolítica historicamente predispos-ta à autonomia.3

Não obstante, há ainda umconjunto de referências especifi-cas à necessidade de autonomiaadministrativa, tendo isso a vercom a organização das SDRs. Osentido geral dessa sugestão estárelacionado à composição dos

(...) não há como negar que adinâmica eleitoral confere

poder a quem, em umacampanha vitoriosa, nela tenhase empenhado. Evidentemente,esse esforço tem o seu preço e

será cobrado

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quadros funcionais das secreta-rias regionais. Não havendo po-sição única a respeito, de umlado, sugere- se a soberania dosecretário regional em fazer essaconstituição; de outro lado, pararesolver a deficiência qualitativade pessoal, sugere-se a racionali-zação técnica dessa composição,com o estabelecimento de crité-rios que fujam à racionalidademeramente eleitoral das indica-ções, incluindo sugestões de con-curso público. Conquanto nãotraga qualquer novidade ao de-bate, essa reivindicação tem umainsistência cujo mérito é inegá-vel. Ela revela, sem distinção par-tidária, a considerável preocupa-ção de conselheiros e integran-tes das SDRs com a qualidade doserviço público. “Qualificar paramelhorar a gestão das Secretari-as”, “qualificar os cargos comis-sionados” e conferir um caráter“mais técnico e menos político”à composição das SDRs e, tam-bém, dos Conselhos foram algu-mas das manifestações literais dosentrevistados.

Todavia, quando alguns entre-vistados sugerem a substituição docaráter político pelo técnico, pro-põe-se uma inédita e improvávelinversão do critério, em detrimen-to das indicações partidárias nacomposição dos cargos comissio-nados. Talvez essa alternativa nãose vislumbre no horizonte. Ain-da que revele a preocupação maissincera sobre o funcionamento dacoisa pública, parece improvávelapresentar ao problema uma al-ternativa assim radical, isto é, nãohá como negar que a dinâmicaeleitoral confere poder a quem,em uma campanha vitoriosa, nelatenha se empenhado. Evidente-mente, esse esforço tem o seu pre-ço e será cobrado. Ora, na inevi-

tabilidade desse critério na barga-nha de composição dos cargos,seria mais fácil seguir a sugestãode alguns poucos entrevistados,que sugerem o insistente trabalhode sensibilização na forma de con-gressos, seminários, palestras, cur-sos etc.

Não é difícil identificar a ori-gem desse problema. Trata-se deadmitir que muitos desses cargoscomissionados são ocupados so-mente pelo critério do esforço decampanha, noutros termos, docapital eleitoral obtido e que ser-ve de moeda de troca. Sendo esteo critério, a relação entre parti-do e correligionários assume o ca-ráter restrito da fidelidade, ouseja, nessa relação, não há maiorincentivo tampouco coerção, aomérito da formação qualificadapara os cargos comissionados.Sem uma resposta categórica aessa equação, é possível afirmarque a solução é de longo prazo edepende de consensos intraparti-dários que, a sua vez, tambémexigiriam enorme esforço de sen-sibilização dos líderes dos parti-dos em relação aos filiados.

Desse modo, poder-se-ia sermuito alto o custo político deuma solução radical, de carátermeritório e baseado em princípi-os da racionalidade na gestão, ese a solução de longo prazo é ape-nas um caminho paralelo que nãoresponde a certas urgências dadinâmica política, então a alter-nativa é a capacitação permanen-te dos quadros funcionais. Nãoparece tarefa simples, além de serdispendiosa, a princípio. Mas, sepuder contar com as sinergiaspossíveis dos agentes cognitivosdistribuídos em todo o Estado deSanta Catarina, mecanismos decompensação poderiam ser cria-dos e viabilizar uma intervenção

desse tipo. Essa capacitação, serealizada no futuro, precisará in-corporar não apenas um conjun-to de ensinamentos operacionaisde cunho técnico. Conquantoinegável a premência desse tipo decapacitação, é necessário que osatores envolvidos na descentrali-zação sejam esclarecidos sobre osdesígnios desse processo e seu sig-nificado histórico. Da mesmamaneira, pelas necessidades con-temporâneas do mundo das or-ganizações privadas, do mercadode trabalho e da gestão pública,princípios teóricos não apenas daadministração mas também deoutras áreas do conhecimentodeverão formar o pessoa da esfe-ra pública.

Por último, há uma sugestãoapresentada algumas vezes du-rante as entrevistas de campo. Emgeral, reconhecendo os méritosda política de descentralização,alguns integrantes dos CDRs edas próprias SDRs sugerem, noentanto, a redução do númerodessas secretarias. Não é um dadodesprezível quando apontadopor pessoas que aprovam expli-citamente a descentralização. Oscríticos desse aspecto acreditamque esse número é desnecessário,atende a interesses menores, criainchaço à estrutura, custos exce-dentes, além de amplificar des-necessariamente problemascomo os relacionados à falta decapacitação de agentes envolvi-dos. Ninguém demonstra muitasegurança ao sugerir um núme-ro certo, mas apontam esse comoum dos aspectos a serem revis-tos na experiência.

Quanto a essa sugestão, há al-gumas observações a apresentar.A primeira é quase óbvia, mas nãocusta lembrar, qual seja, a de queos municípios menores, notada-

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mente os que sediam as SDRs,demonstrariam alguma resistênciaem relação à tal mudança. Nessesmunicípios, os impactos políticoe econômico são reconhecida-mente positivos. Estão relaciona-dos, de um lado, ao aumento daautoestima nessas cidades e de umsentimento inédito de aproxima-ção com o governo estadual, di-minuindo a sensação de isolamen-to. Se cada microrregião dessas,com sua cidade sede, recebe umaSDR, criam-se alguns serviços eespaços de liderança política quevalorizam o poder político mi-crorregional, tornando-o expo-nencial. Isso tende a ser progres-sivamente assimilado pela comu-nidade daquela microrregião. Fi-gurar no mapa político estadual,para uma cidade de 20 mil habi-tantes e a centenas de quilômetrosda capital, resulta em um fenôme-no psicossocial de dificílima men-suração. Mas é possível concor-dar que isso possa lhe trazer inú-meras vantagens ao longo do tem-po, sobretudo no tocante à reten-ção e até à atração de capital hu-mano, sendo esta a própria expec-tativa da descentralização.

É natural perceber tambémque o número de SDRs amplifi-ca proporcionalmente a visibili-dade da população ao processo,bem como pode aumentar a par-ticipação comunitária. Em sendomenor o número de municípiosligados a uma SDR, será menoro rodízio de reuniões dos CDRs,e as reuniões são mais frequentesnos municípios. Ainda no que serefere ao impacto econômico, al-guns depoimentos admitem queos municípios sede das SDRs fo-ram de algum modo potenciali-zados economicamente. Isso teriaacontecido notadamente com osmunicípios menores, cujo ponto

de partida comparativo entre oantes e o depois permite obser-var maior impacto.

Isso acontece, seja pelas obraspúblicas, seja pelo poder de atra-tividade, pela visibilidade, poralgum investimento atraído pelanova condição do Municípiosede, ou pela circulação de pesso-as, direta ou indiretamente, emtorno ou por conta da SDR, oupela economia de gastos, dispen-sando viagens a Florianópolis. Éde se perguntar se essas comuni-dades estarão dispostas a perderessa condição, ou mesmo, se aslideranças locais ficarão indiferen-tes a alguma alteração futura.

No sentido de sugerir a redu-ção do número de SDR, aparece,portanto, o importante aspectoda sobreposição de uma visão ad-ministrativa e contábil a uma pers-pectiva eminentemente política dadescentralização. Com toda a for-ça do argumento quantitativo, eleé passível de comprovação, e osresultados alcançados em termosde investimentos microrregionaistambém devem ser submetidos aavaliações criteriosas que permi-tam confrontar os números como objetivo geral da descentraliza-ção, qual seja, o da promoção dodesenvolvimento regional, nota-damente das microrregiões depri-midas. Além do mais, admita-seque o número elevado de Secre-tarias e Conselhos congêneres te-nha aspectos ignorados pela lógi-ca da racionalidade instrumental,naturalmente restrita ao resulta-do mensurável. Ainda na direçãodessa racionalidade, a acusação de“cabides de emprego”, frequente-mente imputada pela oposição àsSDRs, pode ser devidamente ave-riguada.4

Além do que foi observadoacima, há pelo menos mais um

aspecto a considerar. Ele diz res-peito a uma acomodação de in-teresses e particularidades mi-crorregionais, de ordem políti-ca, econômica e cultural, quepodem se mostrar de difícil com-patibilidade. Embora o proces-so seja de integração regional,esses fatores de difícil mensura-ção, e pouco confessáveis, têm lásua força. Conflitos, interesses eparticularidades microrregionaispodem criar constrangimentosprejudiciais aos objetivos maio-res da descentralização, relacio-nados à autonomia política e àpotenciação do desenvolvimen-to regional. E talvez ajudem acompreender que a política dedescentralização, ao contrário deconter seus ímpetos republica-nos, deve liberá-los. E pode fazê-lo a partir do alargamento dasensibilidade política de seus lí-deres, se esses compreenderemdistinções em pouco ou nadaperceptíveis na esfera da raciona-lidade sistêmica, isto é, da buro-cracia e da administração da eco-nomia pura. Entre elas, podemestar essas distinções microrregi-onais, que particularizam pro-blemas e potencialidades que so-mente essas pequenas comunida-des territoriais conhecem e po-dem, com a devida autonomiapolítica, de um lado, resolver e,de outro, potencializar seus as-pectos mais particulares. Talvezseja essa a sensibilidade já desen-volvida por governos de outrasnações, aqueles que promovemhá mais tempo processos de des-centralização. Nessa direção, pa-rece importante destacar que ocaso das Secretarias de Desenvol-vimento Regional e seus Conse-lhos de Desenvolvimento Regi-onal pode conter na sua dinâmi-ca e no seu movimento históri-

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Ano 57 - Nº 275Outubro/Novembro/Dezembro 77

Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

AMARAL, Carlos Eduardo Pacheco. Do Estado soberano ao Estado das autonomias. Blumenau, Edifurb, 2002.BIRKNER, Walter Marcos Knaesel. Desenvolvimento regional e descentralização político-administrativa: estudo dos casos de Minas Gerais, Ceará e Santa Catarina. In: REDES Revista deDesenvolvimento Regional da Unisc. Santa Cruz do Sul – RS. Vol. 16, nº. 30, 2007.________. Intervenções governamentais nos procesos decisórios para a promoção do desenvolvimento das economías locais. In REDES – Revista de Desenvolvimento Regional da Unisc – RS. Vol.10, 2005.CASSIRER, Ernst. O mito do Estado. São Paulo, Códex, 2003.CATALÁ, Joan Prats I. Governabilidade democrática na América Latina no final do século XX. In: PEREIRA, Luiz C. Bresser & SPINK [orgs.], Peter. Reforma do Estado e administração pública gerencial.Rio, FGV, 1998.EVANS, Peter. Government action, social capital and development: reviewing the evidence on synergy. In: World Development Journal. Vol.24, n.º 6, 1996, Elsevier Science Ltda, Great Britain.LOCKE, John, 1632-1704. Ensaios politicos/John Locke; organizado por Mark Goldie; tradução de Eunice Ostrensky. São Paulo, Martins Fontes, 2007.PEREIRA, Luiz Carlos Bresser & SPINK, Peter [orgs.]. Reforma do Estado e administração pública gerencial. Rio, FGV, 1998.PUTNAM, Robert D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. Rio, FGV, 1996.STOHR, Walter. Globalização e descentralização. In: VERGARA [2004]VERGARA, Patrício. Desenvolvimento endógeno: um novo paradigma para a gestão local e regional. Fortaleza, IADH, 2004.

1 Entre os aspectos, estão: alto número de pequenos municípios, de diversidade e relativa suficiência econômica, de relativa autonomia regional e de experiências precedentes de descentralização,notadamente as associações de municípios, as universidades regionais comunitárias e os Fóruns de Desenvolvimento Regional Integrado, experiência esta que antecedeu às atuais SDRs e seus Conselhos.2 No trabalho de Robert Putnam sobre a descentralização italiana, também são frequentes as acusações sobre ineficiência. Houve reclamações sobre falta de coordenação entre órgãos de governo,designação de pessoal inadequado para cargos estratégicos, impraticabilidade de projetos, falta de capacitação de pessoal para discutir e planejar o desenvolvimento regional etc. [PUTNAM, 1996:63-4]3 Objeto da antropologia política, esse aspecto é praticamente inexplorado pelas ciências sociais no Brasil, sobretudo no caso catarinense, em que um tipo de predisposição republicana tende a sermais facilmente despertado por uma reforma institucional, em função de aspectos culturais presentes nesse Estado, os quais muitos autores denominariam de capital social.4 A Diretoria da SPG de SC informa que o aumento do número de funcionários das SDRs durante os sete anos de existência teria crescido 8%.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NOTAS

AB

STR

AC

TR

ESU

MEN

Decentralization in Santa Catarina

This article is the results of an institutional evaluation research about the decentralization in Santa Catarina State,Brazil. It analyses the answers of two questionaries : the first was quantitative, applied between members of theRegional Development Secretaries – SDRs and his Regional Development Councils – CDRs. The second was aqualitative questionary, about a conjunct of interviews which interlocutors are equally members of SDRs andCDRs.

Keywords: Decentralization. SDR. Institutional reforms.

Descentralización en Santa Catarina

El artículo es el resultado de una pesquisa de evaluación institucional sobre la descentralización en Santa Catarinaque analiza las respuestas de dos cuestionarios: el primero fue de tipo cuantitativo, aplicado entre integrantes delas Secretarias de Desarrollo Regional, SDR y sus respectivos Consejos de Desarrollo Regional –CDR. El segundofue cualitativo resultado de un análisis al conjunto de entrevistas cuyos interlocutores son igualmente integrantesde las SDR y de los CDR, especialmente secretarios, directores, funcionarios de carrera, alcaldes, presidentes decámaras, miembros de la sociedad civil organizada, y Diputados Estaduales. El objetivo General del trabajo fuelevantar a través de las opiniones recolectadas los puntos fuertes y débiles, las amenazas y las oportunidades delproceso de descentralización en Santa Catarina.

Palabras claves: Descentralización. SDR. Reformas institucionales.

co ainda incipiente o significadode uma tendência universal doEstado contemporâneo.

Se for esse o caso, então serevela a importância de que a so-ciedade saiba reconhecê-lo devi-damente, para que o processonão sofra solução de continui-dade de um subsequente gover-

no desavisado. Se esta for a com-preensão mais conveniente des-se processo, a experiência go-vernamental de Santa Catarinaprecisará ser o objeto de muitasanálises e comparações no vastocampo das ciências sociais. Porconsequência, a descentralizaçãoem Santa Catarina pode ser to-

mada como uma política de go-verno a transformar-se, porven-tura, em uma política de Esta-do. Independentemente de suasvirtudes e insuficiências, algu-mas das quais apresentadas aqui,ela servirá, assim, de referênciaa outros estados brasileiros elatino-americanos.

DESCENTRALIZAÇÃO

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

CONSULTA

Chefe da Assessoria Jurídica da Prefeitura Municipal consulta esteInstituto a respeito de convênio que se pretende firmar com o Bancodo Brasil S/A para concessão de crédito imobiliário para financiamentode imóveis aos servidores públicos municipais. Requer análise quanto àlegalidade do convênio ante os princípios constitucionais que regem aAdministração Pública, especialmente os da isonomia, da impessoalidadee da moralidade, tendo em vista o fato de que o referido convênio serácelebrado diretamente com o banco citado, sem a realização de préviocertame licitatório para escolha da instituição bancária.A consulta vem documentada.

Convênios / Contratos,Servidor Público.Convênio com instituiçãofinanceira. Oferecimentode linhas de crédito aosservidores públicos.Fornecimento da base dedados da Prefeitura

RESPOSTA

Os convênios são acordos devontade que podem ser realiza-dos pela Administração Públicacom pessoas de direito público ou

privado, caracterizando-se pelaconsecução de um objetivo institu-cional comum em vista da existên-cia de uma confluência de interes-ses entre os partícipes. Diferencia-se do contrato, portanto, em razão

do fato de que, nesse, os interessesdas partes são opostos econtraditórios, enquanto, noconvênio, há uma mútuacolaboração para um fim comum.

Em tendo a Prefeitura Munici-

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA

Gustavo da Costa Ferreira M. dos SantosConsultor Técnico

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

pal competência para gestão deseus recursos humanos, é possívelque firme convênios relativos a estecampo específico de atuaçãoadministrativa. Muito comum é aassinatura de convênios cominstituições financeiras objetivandoa concessão de crédito para osservidores em condiçõesvantajosas, sob o argumento con-sistente de que o fomento indiretoà melhoria da qualidade de vidapor meio do acesso a bens mate-riais é uma forma de prestigiá-lose lhes dar motivação e ânimo parao exercício de suas funções. Deigual modo, a concessão de crédi-to aos servidores é bastante inte-ressante para as instituições finan-ceiras, uma vez que gozam de ga-rantias à manutenção do vínculomaiores que as habitualmente en-contradas dentre outras categoriasde trabalhadores.

No caso da consulta, o convê-nio que se pretende firmar como Banco do Brasil prevê que oMunicípio colaborará com a di-vulgação dos produtos oferecidospela instituição financeira pormeio do fornecimento da base dosservidores públicos municipais e,também, por comunicações inter-nas, ficando a instituição financei-ra, por outro lado, obrigada aoferecer condições mais vantajosasque as encontradas no mercado.Entendemos que se trata demedidas adequadas para as quaisé defensável a existência de inte-resse público conforme afirmadono parágrafo anterior, desde quesejam observadas algumas precau-ções.

A primeira diz respeito ao for-necimento da base de dados daPrefeitura. Entendemos que asinformações pessoais dos servido-res somente podem ser forneci-das à instituição financeira com a

sua anuência, ainda que tácita. Seriaadequado, assim, o envio de ofíciocircular em que seja comunicada aosservidores a pretensão daAdministração Pública, permitindo-lhes, em determinado prazo,manifestar sua não concordânciacom o fornecimento de seus dadospessoais. Caso um servidor nãodeseje ser importunado com apropaganda do banco, por óbviotrata-se de vontade que deve serrespeitada sob pena de ofensa àprivacidade garantida pelo art. 5º,X, da Constituição.

Também compreendemos nãoser viável a confecção de folders eoutros instrumentos de divulga-ção às expensas da Prefeitura con-forme autoriza o convênio anali-sado, podendo, no entanto, aAdministração facilitar o acessode representantes da instituiçãofinanceira aos recintos e a divul-gação de material de propagandado banco. A realização de despe-sa pública com folders e com mate-rial de propaganda para produ-tos da instituição financeira, a nos-so ver, viola o princípio da mo-ralidade (art. 37, caput, CRFB).

Além disso, mesmo que pre-tenda o banco praticar juros van-tajosos, é importante que o ad-ministrador adote cautelas paraimpedir o favorecimento de umaou outra empresa interessada emprestar serviços ao servidor, oque seria atentatório aos princí-pios da moralidade e da impesso-alidade (art. 37, caput, da CRFB). Alicitação, embora exigível em tesepara convênios nos termos do art.116 da Lei n.º 8.666/1993, não é oinstrumento adequado para tantono caso específico da consulta,dada a inviabilidade de competiçãoe a própria peculiaridade do caso,em que não é o Município ocontratante e, sim, o servidor

público, tendo a Prefeitura apenasobrigações acessórias relacionadasà facilitação da divulgação dosprodutos. Temos, assim, que amedida mais adequada é a adoçãode sistema de credenciamento, emque se proceda à habilitação detantas quantas instituições financei-ras se interessarem, de acordo comcritérios e exigências mínimas aserem fixadas pela PrefeituraMunicipal, deixando para oservidor a faculdade de escolher obanco que ofereça condições maisvantajosas para a contração doempréstimo. Não se argumente que,na hipótese da consulta, a preferên-cia é admissível por se tratar debanco público, uma vez que a Cons-tituição exige, em seus arts. 173 e§§., a igualdade de condições paraconcorrência entre as empresasprivadas, as sociedades de econo-mia mista e as empresas públicas,não podendo haver nenhum fa-vorecimento para uma ou outra.

Por todo o exposto, concluí-mos que a medida pretendida éviável, desde que os servidoresque não desejem receber propa-ganda das linhas de crédito ofere-cidas tenham sua vontade respei-tada, em atendimento ao direitoconstitucional à privacidade (art.5º, X, da CRFB). Além disso, éinviável a confecção de materialde divulgação dos produtosoferecidos às expensas do PoderPúblico. Atendidos essesrequisitos, observamos que,embora inexigível a licitação emrazão da inviabilidade de compe-tição, é recomendável a realizaçãode credenciamento para habilita-ção das instituições financeirasaptas a oferecer serviços seme-lhantes aos servidores, sob penade ofensa ao princípio da mora-lidade e da impessoalidade (art.37, caput, da CRFB).

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

CONSULTA

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA

Rafael Pereira de SousaAssessor Jurídico

Tributação. Projeto de Lei.Doação de imóvel.Empresa Pública.ITD. Isenção heterônoma.Imunidade recíproca.Comentários

A consulente nos envia o Projeto de Lei n.º 66/2010, de iniciativa do prefeito,que autoriza o Município a doar área de terras de sua propriedade aoFundo de Arrendamento Residencial – FAR, representado pela CaixaEconômica Federal, e faz as seguintes indagações:1) Por ser uma doação do Município para um fundo gerido pela CaixaEconômica Federal, não seria possível aplicar o instituto da imunidadetributária, previsto no art. 150, VI, a?2) Mantendo-se o dispositivo acerca da isenção, estaria ele violando oque prevê o art. 150, §6º, da CF, ou seja, deveria o senhor prefeitodesmembrar o projeto e enviar outro exclusivamente tratando daisenção pretendida no artigo 6º?3) Há desrespeito ao princípio da isonomia tributária previsto no art.150, II, da CF?

RESPOSTA

A Constituição partilhou en-tre os membros da Federação acapacidade para instituir e cobrarimpostos. Ao Estado, coube, en-tre outros, instituir imposto so-bre transmissão causa mortis e doa-ção de quaisquer bens ou direi-tos (ITD, art. 155, I); ao Municí-pio, sobre a transmissão onerosade bens imóveis (ITBI, art. 156,II). No caso em tela, portanto, oimposto incidente não é o ITBI,

mas sim o ITD, já que referente àdoação de bem imóvel.

Consectário da competência tri-butária atribuída a cada entidade fe-derativa é a sua face reversa – o po-der de isentar. Isto significa dizer quea entidade competente para instituira norma impositiva tributária é amesma que pode reduzir a carga dorespectivo tributo (isenção ou incen-tivo fiscal parcial) ou impedir a suaincidência (isenção ou incentivo to-tal), em relação a determinadas pes-soas, situações ou coisas. Nesse senti-

do, é vedado ao Município conce-der a isenção pretendida, por se tra-tar da chamada "isenção heterôno-ma", vedada pelo nosso ordenamen-to, como pode-se depreender peloart. 151 da Constituição Federal:

"Art. 151. É vedado à União:III - instituir isenções de tributos

da competência dos Estados, do Dis-trito Federal ou dos Municípios".

Nesse sentido, o Pretório Ex-celso assim se manifestou:

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Ano 57 - Nº 275Outubro/Novembro/Dezembro 81

Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

"A questão tem que ver com asisenções denominadas heterônomas– CF, art. 151, III – isenções conce-didas por lei de pessoa pública quenão é titular da competência parainstituir o tributo. A isenção hete-rônoma não é, de regra, admitidapela Constituição: art. 151, III. Ascustas e emolumentos constituemespécie tributária, são taxas, é dajurisprudência do Supremo Tribu-nal Federal. Essas taxas são do Es-tado-Membro. Proibida estaria aUnião, em consequência, de esta-belecer isenções quanto a essas ta-xas. Ter-se-ia, no caso, isenção he-terônoma, vedada pela Constitui-ção, art. 151, III". (ADC 5-MC,Rel. Min. Nelson Jobim, voto doMin. Carlos Velloso, julgamentoem 17/11/99, DJ de 19/9/03)

A vedação constante do inciso IIIdo artigo 151 da Constituição, emboradirigida à União, afirma que a isençãodeve ser concedida pelo ente federativocompetente para instituir o tributo, sobpena de invasão de competência e vi-olação do princípio federativo e, con-sequentemente, da autonomia dosdemais entes federados.

A impossibilidade de o Municípioinstituir isenção de tributos estaduais éatestada pela Constituição Federal, aqual assegura ao contribuinte quequalquer subsídio ou isenção, reduçãode base de cálculo, concessão decrédito presumido, anistia ou remissão,relativos a impostos, taxas oucontribuições, só poderá serconcedido mediante lei específica,federal, estadual ou municipal, queregule exclusivamente as matériasacima enumeradas ou ocorrespondente tributo ou contribui-ção (art. 150, §6°).

Percebe-se, portanto, que a leiespecífica decorre diretamente dacompetência tributária do entefederativo para instituir o tributo, o

que impede a sua exclusão por outroente federativo diverso daquele queo instituiu, no caso, o Estado, eis queeste último é que irá suportar os res-pectivos custos.

Contudo, no tocante à imuni-dade recíproca, a empresa estatalprestadora de serviços públicos,por exercer uma atividade de in-teresse público e não ter finalida-de lucrativa, é equiparada, parafins tributários, à autarquia, sen-do, portanto, beneficiária destaimunidade tributária.

No voto proferido pelo MinistroCarlos Velloso, no julgamento do RecursoExtraordinário n.º 220.907, que, muitoembora se refira à Empresa Brasileira deCorreios e Telégrafos – ECT, entende-mos ter aplicação para toda e qualquerempresa estatal prestadora de serviços pú-blicos, tal como a Caixa Econômica Fe-deral, fica evidenciada a necessária distin-ção entre estatais, para fins de tributação,como se verifica pelo trecho do seu votoabaixo transcrito:

“É preciso distinguir as empre-sas públicas que exploram atividadeeconômica, que se sujeitam ao regi-me jurídico próprio das empresasprivadas, inclusive quanto às obri-gações trabalhistas e tributárias (CF,art. 173, § 1º), daquelas empresaspúblicas prestadoras de serviços pú-blicos, cuja natureza jurídica é deautarquia, às quais não tem aplica-ção o disposto no § 1º do art. 173da Constituição, sujeitando-se taisempresas prestadoras de serviçopúblico, inclusive, à responsabilida-de objetiva (CF, art. 37,§ 6º)".

O Ministro do STF supramen-cionado continua a tecer comen-táros sobre o tema no julgamen-to do Recurso Extraordinário n.º407.099, abaixo transcritas:

“Dir-se-á que a Constituição

Federal, no § 3º do art. 150, estabele-cendo que a imunidade do art. 150,VI, a, não se aplica: a) ao patrimônio,à renda e aos serviços relacionadoscom a exploração de atividadeseconômicas regidas pelas normasaplicáveis a empreendimentosprivados; b) ou em que hajacontraprestação ou pagamento depreços ou tarifas pelo usuário; c)nem exonera o promitente compra-dor da obrigação de pagar impos-to relativamente ao bem imóvel, àECT não se aplicaria a imunidademencionada, por isso que cobra elapreço ou tarifa do usuário.

A questão não pode ser enten-dida dessa forma. É que o § 3º doart. 150 tem como destinatárioentidade estatal que explore ativi-dade econômica regida pelas nor-mas aplicáveis a empreendimentosprivados, ou em que haja contra-prestação ou pagamento de preçosou tarifas pelo usuário. No caso,tem aplicação a hipótese inscritano § 2º do mesmo art. 150”.

Desta forma, não há dúvidas emse afirmar que as empresas estataisprestadoras de serviços públicos, porexercerem uma atividade de interes-se da população, não podem se su-jeitar à competência tributária im-positiva dos demais entes da Fede-ração, eis que são beneficiários daimunidade tributária recíproca.

Diante do exposto, conclui-sepela inconstitucionalidade do art.6º do projeto de lei analisado queconcede isenção do imposto inci-dente sobre transmissão de bensimóveis por doação, visto tratar-sede tributo de competência de ou-tro ente federativo. Contudo, háimunidade tributária com funda-mento na imunidade recíproca,decorrente da própria Constituiçãoe que independe de previsão legis-lativa municipal ou estadual.

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA

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Ano 57 - Nº 275 Outubro/Novembro/Dezembro82

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CONSULTA

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA

Júlia Alexim Nunes da SilvaConsultora Técnica

Servidor Público. Desviode Função. Pagamento deDiferenças Salariais.Considerações

Relata o consulente que servidora pública, admitida para a realizaçãoda função de Assistente de Serviços Gerais, passou a realizar,cumulativamente, atribuições correspondentes à função de Assistentede Serviços Administrativos. Diante desse quadro, indaga:

a) A servidora tem direito às diferenças salariais?b) Pode a Câmara Municipal pagar, pela via administrativa, essasdiferenças?c) Como deve ser feito o cálculo das diferenças salariais?

RESPOSTA

Não foi possível determinarse, no caso em análise, a servido-ra é estatutária ou celetista. Noentanto, seja qual for o regime, oexercício, pela servidora, de fun-ções que não correspondem àque-las do emprego ou cargo que ocu-pava originariamente caracterizadesvio de função.

Por isso, antes de tratar espe-cificamente do problema do pa-gamento das diferenças salariais,é importante esclarecer que o des-

vio de função é um ato ilícito ad-ministrativo, vedado pela ordemjurídicoconstitucional brasileira.

Isso porque, o desvio de fun-ção viola o princípio da obriga-toriedade do concurso público.Com efeito, o artigo 37, II, daConstituição Federal determina:

"Art. 37. A administração pú-blica direta e indireta de qualquerdos Poderes da União, dos Esta-dos, do Distrito Federal e dosMunicípios obedecerá aos princí-pios de legalidade, impessoalida-

de, moralidade, publicidade e efi-ciência e, também, ao seguinte:

I - (...)

II - a investidura em cargo ouemprego público depende deaprovação prévia em concursopúblico de provas ou de provas etítulos, de acordo com a naturezae a complexidade do cargo ouemprego, na forma prevista em lei,ressalvadas as nomeações para car-go em comissão declarado em leide livre nomeação e exoneração".

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Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

Assim, por força do princípio daobrigatoriedade do concurso público,o acesso a cargos ou empregospúblicos depende de aprovação emseleção pública, sendo que a referidaseleção deve ser condizente com anatureza e a complexidade da funçãoa ser desempenhada. Em suma, o ser-vidor, ocupante de determinado cargoou emprego, não pode desempenharfunções correspondentes a outrocargo ou emprego, para o qual nãofoi aprovado em concurso. Naspalavras de Celso Antônio Bandeirade Mello,

"o que a Lei Magna visou com osprincípios da acessibilidade e do con-curso público foi, de um lado, ensejara todos iguais oportunidades de dis-putar cargos ou empregos na Admi-nistração direta e indireta. De outrolado, propôs-se a impedir tanto oingresso sem concurso, ressalvadas asexceções previstas na Constituição,quanto obstar a que os servidorhabilitado por concurso para cargo ouemprego de determinada naturezaviesse depois a ser agraciado comcargo ou emprego permanente deoutra natureza, pois esta seria umaforma de fraudar a razão de ser doconcurso". (CELSO, Antônio Bandei-ra de Mello. Curso de Direito Admi-nistrativo. São Paulo: Malheiros, 2008,p. 257 e 258)

Quanto às diferenças salariaisexistentes entre a remuneração docargo ou emprego original do ser-vidor e a remuneração correspon-dente às funções por ele efetiva-mente desempenhadas, essas sãodevidas pela Câmara Municipal.Embora o desvio de função sejavedado pela Constituição, os Tri-bunais Superiores entendem queo Poder Público não pode se lo-cupletar do ato ilícito e deve, por-tanto, remunerar o servidor pelas

funções que desempenhou.A matéria, com relação aos ser-

vidores submetidos ao regime decargo público, é regulada noEnunciado 378 da Súmula do STJ,que dispõe:

"Súmula 378: reconhecido odesvio de função, o servidor faz jusàs diferenças salariais decorrentes".

O mesmo entendimento preva-lece no Tribunal Superior do Tra-balho, relativamente aos servidoresocupantes de emprego público,como demonstra a Orientação Ju-risprudencial n.º 125 da SDI- 1:

"OJ-SDI1-125 DESVIO DEFUNÇÃO. QUADRO DECARREIRA.

O simples desvio funcional doempregado não gera direito a novoenquadramento, mas apenas às di-ferenças salariais respectivas, mesmoque o desvio de função haja inicia-do antes da vigência da CF/1988".

É importante ressaltar que ahipótese em tela não é de equipa-ração salarial, dado que a equipa-ração entre servidores de pessoasjurídicas de direito público é ve-dada. Desse modo, o servidor nãotem direito ao cargo ou empre-go, mas tão-somente a receber osvalores correspondentes às dife-renças salariais, com fundamentono fato de que o Poder Públiconão pode auferir as vantagens de-correntes do exercício das fun-ções pelo servidor, sem pagar adevida contraprestação.

Diante das orientações juris-prudenciais destacadas, a CâmaraMunicipal pode reconhecer queas diferenças salariais são devidase pagá-las administrativamente.No entanto, esses pagamentos sãodespesas como outras quaisquer,

por isso, só podem ser realizadasse observadas as exigências da Leide Responsabilidade Fiscal (LeiComplementar nº.101/2001).

Finalmente, quanto ao cálculo dasdiferenças salariais devidas, esse deveser feito como se a servidora ocupasseo cargo ou emprego correspondenteàs funções que exercia. Foi esse o en-tendimento do Superior Tribunal deJustiça no REsp 1053067/AP julga-do em que os ministros, em acórdão,afirmaram:

"A Terceira Seção desta Cortepacificou o entendimento no senti-do de reconhecer o direito do servi-dor às diferenças relativas ao desviofuncional com base nos padrões emque, por força de progressão funcio-nal, gradativamente, se enquadraria.

Precedente”. (AgRg nos EDclno REsp 1053067/AP, Rel. Mi-nistra LAURITA VAZ, QUIN-TA TURMA, julgado em 27/10/2009, DJe 23/11/2009)

Além disso, incidem juros ecorreção monetária sobre as quan-tias devidas, uma vez que são de-vidas desde o momento em que aservidora efetivamente realizou asfunções, de modo que, se pagas,serão pagas com atraso.

Em resumo, diante das questõescolocadas pelo consulente entende-mos que: (i) as diferenças salariaisdecorrentes do desvio de função sãodevidas à servidora; (ii) os referidosvalores podem ser pagos por via ad-ministrativa, desde que obedecidasas exigências da Lei de Responsabi-lidade Fiscal; (iii) o cálculo dos va-lores devidos deve ser feito comose a servidora, durante o períodoem desempenhou as funções, fosseocupante do cargo ou emprego aque essas funções correspondiam,incidindo, ainda, juros e correçãomonetária.

PARECERES E JURISPRUDÊNCIA

Page 83: Gestão de Tributos - Revista de Administração Municipal - Edição 275 - IBAM

Ano 57 - Nº 275 Outubro/Novembro/Dezembro84

Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

O Observatório Social de

Maringá (OSM) busca dar

transparência à administração

dos recursos públicos,

monitorando e controlando

as contas dos poderes Execu-

tivo e Legislativo. No primei-

ro ano, fiscalizando as licita-

ções da Prefeitura Municipal,

atuando desde a elaboração

do processo de compra até a

entrega dos produtos ou dos

serviços contratados e passan-

do pela divulgação aos forne-

cedores e pela impugnação

de editais com suspeitas de

fraudes, o trabalho do OSM

resultou em uma economia

real de mais de R$ 9 milhões

para os cofres públicos. Esta

economia se deu por meio da

devolução de recursos pagos

a maior, do cancelamento de

licitações fraudulentas, da

alteração de editais que

tinham preços e quantidades

incompatíveis com a

realidade, entre outras ações.

Atualmente, essa econo-

mia passou a marca dos R$

21 milhões, assim a popula-

ção desfruta de mais investi-

mentos em obras e benefíci-

Fonte: Centro de Referência Melhores Práticas/ Escola Nacional de Serviços Urbanos/IBAM

os. Desde a criação do OSM,

o Município reduziu as despe-

sas com pessoal e encargos,

com custeio e, em

consequência, aumentou os

investimentos.

Além do acompanhamen-

to nos gastos públicos, é rea-

lizado o trabalho de educação

fiscal por meio de palestras,

seminários, concursos de re-

dação, de monografias e de

filmes de curta metragem,

além de peças teatrais.

Um dos maiores resultados

que o OSM alcançou é a dis-

seminação dessa ferramenta

em outras cidades. Já mais de

40 cidades no Brasil criaram

seus observatórios, a partir da

experiência de Maringá e com

Observatório Social de Maringá/Paraná

• EM FOCO •• EM FOCO •

base no seu padrão de pro-

cedimentos.

É importante ressaltar a

credibilidade que o OSM con-

quistou pela seriedade da

sua atuação, sendo reconhe-

cido pelos órgãos públicos,

pela imprensa que divulga

com destaque todas as suas

ações gratuitamente e pela

sociedade de todos os muni-

cípios onde tem sido convida-

do para demonstrar os traba-

lhos, tornando-se referência

como ferramenta de transpa-

rência da gestão pública.

Esta prática recebeu em

2009 o Prêmio CAIXA Me-

lhores Práticas em Gestão

Local e está concorrendo ao

Prêmio Dubai 2010.

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Ano 57 - Nº 275 Outubro/Novembro/Dezembro86

Revista de Administração Municipal - MUNICÍPIOS - IBAM

De fato, embora as mulheresrepresentem não só a maior parte doeleitorado do País, sua presençaexpressiva também se destaca nomomento das eleições por meio dosuporte aos candidatos e às candidatas,seja como militantes, seja como aquelasque influenciam a decisão do voto, nobairro, junto aos amigos, na família, notrabalho, nas redes comunitárias esociais de relações. Contudo, o que setem observado é que as mulheres estãosim sub-representadas numericamentenos cargos eletivos.

Por exemplo, em cada 100prefeitos eleitos (cargo do executivo),apenas 9 são mulheres e, entre osparlamentares (cargo do legislativo),o percentual é um pouco maior, mas,ainda assim é bem menor do que oesperado pela “lei de cotas”, criadahá mais de dez anos (Lei n.° 9.504,de 30 de setembro de 1997)! Assim,hoje, em cada 100 vereadores eleitosno País, apenas 13 são mulheres. Eestamos tratando aqui da políticamunicipal em que, tradicionalmente,no Brasil, as mulheres têmconquistado maior visibilidade.

Podemos então concluir que a“sociedade” produz mecanismosque contribuem para discriminar asmulheres na política. Se pensarmosque a divisão sexual do trabalho (istoé, os trabalhos que são reconhecidoscomo feminino e masculino), noâmbito das atividades domésticas,produz entre as mulheres a duplajornada de trabalho (o trabalhoremunerado conjugado ao trabalhodoméstico não remunerado), épossível identificar que as mulherestêm maior dificuldade e escassez detempo para se dedicar às atividadesde militância política, como reuniõesnos partidos políticos e sindicatos.Assim, as mulheres, de uma forma

As mulheres representam mais de 50% do eleitorado e, noentanto, são minoria nos cargos eletivos. A sociedadediscrimina as mulheres na política?

geral, apresentam na sociedade umamaior dificuldade de acesso aosespaços de socialização na política –especialmente a política partidária –uma vez que acumulam uma maiordiversidade e quantidade deresponsabilidades sociais, o queresulta no menor número de mulheresna política.

O que é necessário fazer para aumentaro número de mulheres na política?

Muitas ações se fazem necessárias,algumas com efeitos de curto prazo,outras com efeitos de médio e longoprazos. A curto e médio prazos,podemos pensar que as própriasmulheres (e também os homens)deveriam melhor conhecer o programaou as intenções dos candidatos nosentido de observar em que medidacontribuirão para reduzir asdesigualdades na sociedade – esobretudo as desigualdades degênero. Sob este aspecto, a frase“mulher não vota em mulher” poderáser colocada em xeque, e maismulheres poderão fornecer suporte àcandidatura e à liderança de outrasmulheres que tenham por resultado amelhoria das condições de vida paraas mulheres e a equidade de gênero.

Um outra medida a curto prazo seria opróprio interesse das mulheres pelo temaem si, isto é, como aumentar o número demulheres eleitas? De que forma incidirpoliticamente nos partidos políticos paraque o tema ganhe visibilidade? Quais aslideranças femininas que podem serapoiadas? Que resultados se pretendeatingir em termos da legislação, dosprogramas governamentais, das políticaspúblicas para a redução das desigualdadesde gênero?

A longo prazo (no horizonte dequatro anos, isto é, das eleições), seria

necessário pensar no aumento daslideranças femininas, no seu apoio eno seu suporte ao longo da trajetória,isto é, a participação em espaços dedecisão (associação de moradores,espaços comunitários, conselhos,órgãos de classe etc.), em espaçospolíticos, como a filiação à partidospolíticos e, sobretudo, à formaçãopolítica. Nesse aspecto, preparar asmulheres para o melhor desempenhopolítico por intermédio doconhecimento (na teoria e na prática)do funcionamento do governo –executivo e legislativo – das políticaspúblicas, do orçamento público, doplanejamento, da agenda de direitoshumanos, do diálogo com osmovimentos sociais é fundamental.

Neste caso, tanto os partidospolíticos podem propiciar estaformação continuada, quanto asorganizações da sociedade civil, comoo IBAM que, com o apoio do Fundode Desenvolvimento das NaçõesUnidas para a Democracia – UNDEF ea ONU Mulheres, implementa oprojeto Democracia e Gênero noLegislativo Municipal que consisteno Curso gratuito de Educação aDistância: www.ead.ibam.org.br/moodle (consulte o site para conhecere se inscrever no curso).

Enfim, o tema se desdobra emmuitas questões que dizem respeitoa todos e a todas nós, uma vez que setrata de tornar a democracia inclusiva.Mas esta democracia se faz nocotidiano, com a participação dasmulheres tanto quanto eleitoras comocandidatas. Produzir condições maisfavoráveis para a l iderança e aparticipação femininas, nas esferasprivadas e públicas, formais einformais, pessoais e institucionais, éum desafio para o projeto democráticocomo um todo.

Delaine Martins CostaCoordenadora do Programa Gênero e Políticas Públicas do IBAM

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