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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges FUNDAMENTOS Lição 1: A Escola como Sistema Eu era um bom professor de língua portuguesa. Tal fato teve como conseqüência o convite para coordenar o departamento de língua portuguesa do sistema no qual trabalhava. Como coordenador, também me saí bem, e me tornei vice-diretor de uma das unidades da instituição. Na vice-diretoria, tive também um bom desempenho, e a conseqüência foi tornar-me diretor de uma escola da instituição. Acredito que esse caminho foi trilhado por muitos daqueles que estão na direção de escolas brasileiras. Basta mudar o nome da disciplina. Tenho colegas de matemática, história, educação física, química, biologia, inglês, geografia que são ou foram diretores de escola. Sabe- se, no entanto, que dirigir uma instituição educacional é muito diferente de ser professor, e que, embora haja algumas coincidências, ser diretor exige competências e habilidades distintas daquelas que são necessárias para o exercício do magistério. Acontece, com certa freqüência, de um ótimo professor tornar-se um diretor medíocre. Há excelentes vice-diretores que, ao se tornarem diretores, “metem os pés pelas mãos”. E também ocorre, embora menos freqüentemente, de professores medianos se tornarem ótimos diretores. A direção de uma escola, por menor que esta seja, não é uma função apenas pedagógica. Sei que ser professor, principalmente nos dias de hoje, também não é uma função só pedagógica, mas há uma diferença, não de natureza, mas de grau. Tanto o professor quanto o diretor têm uma função administrativa muito importante, mas, enquanto aquele administra a sala de aula, este se responsabiliza pela escola como um todo. O diretor é professor de professores, ele cuida de um sistema bem mais complexo, com vários subsistemas — partes inter-relacionadas que constituem a escola. O contato permanente com vários tipos de escolas, na maioria das regiões brasileiras, mostra que as instituições educativas bem-sucedidas têm, inevitavelmente, um equilíbrio permanente entre o pedagógico e o administrativo, e essa harmonia decorre, quase sempre, da compreensão de que a escola é um sistema. No entanto, o conhecimento de que a escola é um sistema nem sempre permeia o dia-a- dia das instituições educativas e as perdas que daí decorrem são enormes. Segundo Deming, um sistema é um conjunto de funções ou atividades que interagem em um organismo em prol do objetivo desse organismo. As partes mecânicas e elétricas que funcionam juntas, em um automóvel ou um aspirador de pó, constituem um sistema. Há três idéias fundamentais que Deming coloca em destaque na sua visão do que é um sistema: 1. Sem objetivo não se pode dizer que existe um sistema. 2. Existe, em quase todos os sistemas, interdependência entre os múltiplos componentes. 3. Os componentes de um sistema são necessários, mas não suficientes por si mesmos para realizar o objetivo do sistema, e por isso precisam ser administrados. O primeiro passo de um diretor é definir, ou redefinir, com bastante precisão, o objetivo da escola. Embora isso pareça óbvio, na maioria das vezes, a escola não sabe o que quer, não sabe o porquê de sua existência. Ao conversar separadamente com alunos, pais, funcionários, professores, diretores, tem-se, com muita freqüência, a impressão de estar-se tratando de diversas escolas. Cada segmento acredita que os seus objetivos são os da escola; como não há clareza em relação ao que se pretende, surgem muitos conflitos desnecessários e perde-se muita energia. Algumas escolas, em sintonia com os ensinamentos da Gestão da Qualidade, buscaram definir a visão, a missão, os valores, mas muita coisa ficou apenas no papel. Em alguns casos, houve incoerência entre o escrito e o que se vivia no cotidiano da escola. Poucas instituições conseguiram identificar o que estava errado e buscar as soluções, aprimorando os processos da escola e melhorando as condições de trabalho. O segundo passo é considerar, em todas as decisões, a interdependência entre os múltiplos componentes do sistema, pois é quase impossível mexer com uma peça só. A imagem que me ocorre é a do horário de aulas. Com ele pronto, qualquer alteração pedida por um

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges FUNDAMENTOS Lição 1: A Escola como Sistema

Eu era um bom professor de língua portuguesa. Tal fato teve como conseqüência o convite para coordenar o departamento de língua portuguesa do sistema no qual trabalhava. Como coordenador, também me saí bem, e me tornei vice-diretor de uma das unidades da instituição. Na vice-diretoria, tive também um bom desempenho, e a conseqüência foi tornar-me diretor de uma escola da instituição.

Acredito que esse caminho foi trilhado por muitos daqueles que estão na direção de escolas brasileiras. Basta mudar o nome da disciplina. Tenho colegas de matemática, história, educação física, química, biologia, inglês, geografia que são ou foram diretores de escola. Sabe-se, no entanto, que dirigir uma instituição educacional é muito diferente de ser professor, e que, embora haja algumas coincidências, ser diretor exige competências e habilidades distintas daquelas que são necessárias para o exercício do magistério. Acontece, com certa freqüência, de um ótimo professor tornar-se um diretor medíocre. Há excelentes vice-diretores que, ao se tornarem diretores, “metem os pés pelas mãos”. E também ocorre, embora menos freqüentemente, de professores medianos se tornarem ótimos diretores.

A direção de uma escola, por menor que esta seja, não é uma função apenas pedagógica. Sei que ser professor, principalmente nos dias de hoje, também não é uma função só pedagógica, mas há uma diferença, não de natureza, mas de grau. Tanto o professor quanto o diretor têm uma função administrativa muito importante, mas, enquanto aquele administra a sala de aula, este se responsabiliza pela escola como um todo. O diretor é professor de professores, ele cuida de um sistema bem mais complexo, com vários subsistemas — partes inter-relacionadas que constituem a escola.

O contato permanente com vários tipos de escolas, na maioria das regiões brasileiras, mostra que as instituições educativas bem-sucedidas têm, inevitavelmente, um equilíbrio permanente entre o pedagógico e o administrativo, e essa harmonia decorre, quase sempre, da compreensão de que a escola é um sistema.

No entanto, o conhecimento de que a escola é um sistema nem sempre permeia o dia-a-dia das instituições educativas e as perdas que daí decorrem são enormes.

Segundo Deming, um sistema é um conjunto de funções ou atividades que interagem em um organismo em prol do objetivo desse organismo. As partes mecânicas e elétricas que funcionam juntas, em um automóvel ou um aspirador de pó, constituem um sistema. Há três idéias fundamentais que Deming coloca em destaque na sua visão do que é um sistema:

1. Sem objetivo não se pode dizer que existe um sistema. 2. Existe, em quase todos os sistemas, interdependência entre os múltiplos

componentes. 3. Os componentes de um sistema são necessários, mas não suficientes por si

mesmos para realizar o objetivo do sistema, e por isso precisam ser administrados. O primeiro passo de um diretor é definir, ou redefinir, com bastante precisão, o objetivo da

escola. Embora isso pareça óbvio, na maioria das vezes, a escola não sabe o que quer, não sabe o porquê de sua existência. Ao conversar separadamente com alunos, pais, funcionários, professores, diretores, tem-se, com muita freqüência, a impressão de estar-se tratando de diversas escolas. Cada segmento acredita que os seus objetivos são os da escola; como não há clareza em relação ao que se pretende, surgem muitos conflitos desnecessários e perde-se muita energia.

Algumas escolas, em sintonia com os ensinamentos da Gestão da Qualidade, buscaram definir a visão, a missão, os valores, mas muita coisa ficou apenas no papel. Em alguns casos, houve incoerência entre o escrito e o que se vivia no cotidiano da escola. Poucas instituições conseguiram identificar o que estava errado e buscar as soluções, aprimorando os processos da escola e melhorando as condições de trabalho.

O segundo passo é considerar, em todas as decisões, a interdependência entre os múltiplos componentes do sistema, pois é quase impossível mexer com uma peça só. A imagem que me ocorre é a do horário de aulas. Com ele pronto, qualquer alteração pedida por um

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professor desencadeia uma avalanche de mudanças. Um professor, quando pune um aluno, mexe com todos os alunos, com as famílias, com a escola toda. Uma instituição, quando escolhe o seu diretor, dá muitos sinais. A demissão de um professor quase sempre mexe mais com o grupo que fica do que com o demitido.

Um diretor que não compreende a interdependência entre os componentes do sistema passa grande parte do seu tempo apagando incêndios e corre o risco de levar a escola ao fracasso. Vendo apenas árvores isoladas, sem competência para ver a floresta, cria insatisfações, focos de resistência, desgastes desnecessários. Cada solução sua origina outros problemas.

O desempenho de cada componente deve ser avaliado em termos de sua contribuição para o alcance do objetivo do sistema. E o critério menos pessoal e, nas escolas, esse critério raramente é considerado. Tanto para o bem quanto para o mal, as simpatias, os apelos emocionais, o medo dos conflitos, os laços familiares, o tempo de casa falam mais alto que qualquer contribuição para o objetivo do sistema.

O terceiro e último passo é reconhecer que as falhas de um sistema decorrem fundamentalmente das ações administrativas. Se uma escola não vai bem, é possível encontrar muitas justificativas, mas nenhuma exime a direção da responsabilidade.

O diretor precisa pensar suas ações, mas não deve ter medo de agir. A administração é que permite o exercício de todas as profissões. Para que o professor realize o seu trabalho, é necessário que alguém esteja administrando a escola, criando condições para que as pessoas possam ser produtivas. Encontrar culpados para as mazelas da escola não revela competência alguma. Quanto maior o poder de uma pessoa, maior a sua responsabilidade pelos resultados. O salário de um diretor deve recompensar não o seu trabalho, mas a responsabilidade pelos resultados da instituição. Chegar à escola às seis horas da manhã e sair às dez da noite não é o que importa na avaliação de um diretor. Em resumo, não é a quantidade de trabalho que distingue o diretor, mas a qualidade de sua administração.

Compreender a escola como um sistema facilita a abordagem de determinados aspectos. Como melhorar a escola é um desses aspectos. Numa visão mais superficial, podem-se afirmar que quase todo sistema apresenta três componentes principais:

1. Parte física — instalações, materiais, equipamentos que constituem a infra-estrutura do sistema.

2. Tecnologia, o “como fazer” — conjunto de procedimentos operacionais (especificação de tarefas, atividades, rotinas), próprio de cada sistema.

3. Elemento humano — pessoas que operam o sistema. As escolas apresentam esses componentes. Nem sempre os procedimentos operacionais

estão explicitados, mas eles existem. Prova disso é o fato de dizer-se, com freqüência, para os novatos: “Aqui, fazemos assim; aqui, isto não é possível”.

Na melhoria de uma escola, há possibilidade de duas ações distintas: investimentos na parte física, ou investimentos em educação, no desenvolvimento das pessoas.

1. Investimentos na parte física: Por meio desses investimentos, pode-se melhorar prédios, instalações, equipamentos,

materiais de trabalho. Essa ação tem retorno imediato — a parte física sofre uma melhoria visível com as novas aquisições ou construções.

Quando há um desequilíbrio entre o administrativo e o pedagógico, com predominância daquele sobre este, a escola se transforma num canteiro de obras. Ainda quando os recursos são parcos, acontecem melhorias, porque todos os investimentos são canalizados para a parte física.

A experiência demonstra que essa ação sozinha não implica o aperfeiçoamento da escola como um todo. Isto significa que grandes melhorias nas instalações escolares, sem treinamento e capacitação de funcionários e professores, não resultam, necessariamente, em maior qualidade de ensino, em garantia de - aprendizagem.

2. Investimentos em educação: Essa ação tem retorno somente a longo prazo, mas o seu alcance é profundo e duradouro,

resultando em ganhos visíveis na qualidade e na produtividade. Educação e treinamento melhoram o desempenho das pessoas e, conseqüentemente, os procedimentos operacionais (estes dependem diretamente da eficiência do elemento humano e de seus conhecimentos).

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Para que a pessoa assimile os resultados dessa ação, é necessário que esteja motivada e que seu potencial mental seja explorado no sentido do pleno aproveitamento e desenvolvimento. Para os investimentos na parte física, não há barreiras, mas, para os investimentos no desenvolvimento de pessoas, há dois obstáculos a serem considerados: o potencial intelectual e a motivação. Pode-se criar o melhor programa de desenvolvimento e nada funcionar, se as pessoas não estiverem motivadas, ou se o programa não levar em conta o potencial intelectual delas.

Nas situações de vida real, o cargo de diretor de escola tem funções e características bem diferentes de uma instituição para outra. Em alguns casos, ainda que se compreenda que a escola é um sistema, é muito difícil que a prática reflita essa compreensão.

Ocorre-me a lembrança de escolas que têm como mantenedoras cooperativas educacionais, nas quais o diretor cuida apenas (como se isso fosse possível) do pedagógico, sem autonomia até mesmo para mudar a cantina de lugar. Lembro-me, ainda, de escolas de alguns sistemas de ensino ou de congregações religiosas em que há um diretor pedagógico e outro administrativo no mesmo nível de poder. Se se trata de pessoas imaturas, vaidosas, com ambição de poder, competitivas (e isto acontece com muita freqüência), quase toda a energia dessas pessoas é gasta na competição e pouco se realiza em prol do objetivo do sistema. A escola corre risco, quando cada parte pensa ser o todo, .e isto acontece freqüentemente quando se fragmenta a função do diretor. Na escola, o diretor (sem adjetivações) deve ser a última palavra em todos os aspectos, administrativos ou pedagógicos.

As mantenedoras podem e devem ter o controle das decisões e das ações do diretor, mas tão somente no nível estratégico, nunca no nível operacional. Os instrumentos para esse controle são os planejamentos, os orçamentos e os resultados.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges FUNDAMENTOS Lição 2: A Liderança como Serviço

A liderança pode ser considerada sob vários ângulos. Pretendo abordá-la como serviço, porque as palavras que fazem parte do campo semântico de serviço, tais como serviçal, servidor, servente, serventia, têm uma carga pejorativa muito grande.

Nas organizações autoritárias, aqueles que ocupam os cargos mais Importantes têm, com freqüência, os demais a seu serviço. Em muitas escolas, ainda hoje, supervisores, coordenadores, orientadores educacionais, secretárias escolares vivem em função do diretor; a serviço dos técnicos, estão os professores; estes têm como súditos os alunos. E bem verdade que essa situação vem sendo modificada e, às vezes, de maneira desastrosa.

Ao colocar o aluno no centro do processo educacional, numa sociedade mais democrática, algumas escolas passaram do autoritarismo para o anarquismo; equivocadamente destruíram a hierarquia, contribuindo para a falta de respeito nas relações, para o caos na rotina de trabalho, para a baixíssima produtividade no ambiente escolar.

Não se passou da heteronomia para a autonomia, mas para a anomia; não se passou do medo para a compreensão, mas para o desrespeito; não se passou da submissão para a liberdade, mas para a agressividade; não se passou do silêncio para a participação, mas para a revolta ou para a indiferença; não se passou da dominação para o serviço, mas para a subserviência.

A compreensão do que é servir talvez seja a única possibilidade de evitar tantos equívocos. Há um poema de Gabriela Mistral, poetisa e educadora chilena laureada com o Prêmio Nobel de Literatura de 1945, em que se lê:

(...) Uns criticam, outros constroem. Seja você o que serve. Servir não é faina de seres inferiores. Seja você o que remove a pedra do caminho, o ódio entre os corações e as dificuldades do problema. Há a alegria de ser puro e a de ser justo. Mas há, sobretudo, a maravilhosa e imensa alegria de servir.

Servir não é trabalho de gente pequena, de seres inferiores, O bom diretor é aquele que não precisa do cargo de diretor; é aquele que não fica preso a uma posição, a um título. O cargo de diretor lhe cai bem, porque ele pode viver sem ele. Há uma alegria no servir que só os seres superiores conseguem usufruir Os fracos, os pequenos, os incompetentes, quando podem, são autoritários; quando não podem, tornam-se subservientes, jamais servidores.

Na convivência com muitos grupos de educadores, foi possível perceber que o poder maior não é o que emana do cargo, mas o que procede da capacidade de servir. Entre os professores, são aqueles que servem os mais considerados, os mais respeitados pelo grupo. Nem sempre são os diretores.

A capacidade de servir é a verdadeira fonte do poder. No evangelho de São Mateus, capítulo 20, versículo 25 e seguintes, pode-se ler:

Mas Jesus os chamou a si, e lhes disse: Sabeis que os príncipes das gentes dominam os seus vassalos; e que os que são maiores exercitam o seu poder sobre eles. Não será assim entre vós outros. Entre vós, todo o que quiser ser o maior, esse seja o que vos sirva, e o que entre vós quiser ser o primeiro, esse seja o vosso servo. A lição é antiga, mas a vaidade e a ambição exacerbada cegam, e os mais famintos são

levados cada vez para mais longe daquilo que tanto querem. Robert Lamp, educador norte-americano, dizia que o diretor deve ser extremamente forte, para se tornar suficientemente fraco, para que o professor possa ser forte. Só o maior é capaz de se tornar o menor; a recíproca jamais é possível. Para servir, procure ser grande: não há outro caminho.

E o que é ser grande? As exigências, as necessidades, as expectativas são próprias de cada época, de cada lugar. Há, no entanto, um conjunto de características e de habilidades que garante um desempenho, no mínimo, razoável de alguém que esteja à frente de uma escola. Quanto maior o desenvolvimento tecnológico, maior a necessidade de líderes verdadeiramente humanos. Eles é que fazem a diferença. O acesso às inovações tecnológicas não é privilégio de

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nenhuma empresa. O líder capaz de criar esperanças, de ter valores e crenças que empolguem as pessoas, de fazer com que as pessoas queiram fazer, esse líder é que faz a diferença e que dá uma dimensão transcendental à organização a que pertence Em um artigo de Marco Aurélio Ferreira Vianna, sócio-diretor do Instituto Marco Vianna de Estudo e Humanismo, sobre os programas de qualidade, lemos no prefácio:

Estamos começando uma pesquisa sobre as características de liderança na ótica de cerca de 15 autores (Crosby, Gardnes, Bennis, Kouzes, Handdy, Motomura, Vianna, Fischer e outros) e, ainda que de maneira preliminar, conclui-se que 85% dos atributos colocados por esses estudiosos são de natureza humana, e não empresarial. A título de exemplo cabe citar as “características dos líderes” indicadas por Philip B. Crosby: ansiosos por aprender, éticos, disponíveis, determinados, cheios de energia, confiáveis, sensatos, humildes, intensos, agradáveis. Vale também exemplificar um conjunto de características dos “líderes superiores” pesquisados por Kouses/Posner. Em um estudo feito com base na visão de quem é liderado, estes esperam de seu líder o seguinte conteúdo de atributos: honesto, competente, olhar para adiante, inspirador, inteligente, justo, liberal, direito e fidedigno.

A grandeza de uma pessoa é determinada pelo equilíbrio entre três fatores: 1. Natureza de caráter 2. Relacionamento humano 3. Conhecimento

Crosby diz que a integridade do indivíduo determina o seu sucesso com antecedência. Os líderes são responsáveis pela ética das instituições; eles devem , um papel de destaque no desenvolvimento e na defesa de princípios e de valores. Não há como desempenhar esse papel sem honestidade, sem o desejo de ser justo, sem decência, sem nobreza de caráter. Dar poder a um mau-caráter, principalmente quando se trata de alguém competente, e arruinar, a vida de muitas pessoas. Felizmente, no meio educacional, quando acontece de um mau caráter assumir uma diretoria, freqüentemente seu mandato tem sido transitório. Os líderes, segundo o grego Tucídides, são conscientes de seus deveres e honrados no agir.

Uma dada situação se modifica quando as relações existentes nessa situação se modificam. O autoritarismo e a democracia se expressam principalmente nos relacionamentos, pois falar de relações é tratar da essência. É no campo das relações que mais aumentaram as exigências em relação ao trabalho do diretor de escola. A função de representar a escola, interna e externamente, como cabeça da instituição, é uma responsabilidade cada vez mais necessária e crítica. Trata-se de uma função importantíssima que não pode apenas ser tolerada ou delegada a outra pessoa.

A visibilidade e a acessibilidade são inerentes ao cargo de diretor. Muitos infortúnios são evitados, quando o diretor se torna visível, presente entre os alunos, os professores, os funcionários, os pais. Muito se aprende, muita dúvida é eliminada, quando o diretor é uma pessoa a que se pode chegar, quando as portas da diretoria se encontram freqüentemente abertas. É preciso que o diretor tenha gosto pelo relacionamento humano, que não tenha medo de atritos, que veja nos embates oportunidades de aprimoramento. Minha opinião é de que a demanda por visibilidade e contatos diretos crescerá muito. O exercício de uma diretoria será um tormento, uma tarefa altamente desgastante, para quem não tiver uma expectativa positiva em relação aos relacionamentos humanos.

“Para ir adiante dos demais, é necessário ver mais que eles” são palavras do cubano José Marti, um diretor de escola precisa ter convicções, idéias, projetos. O conhecimento técnico é imprescindível, mas não é suficiente para que se garanta uma gestão proficiente. Respeitadas as exigências legais, o melhor processo de escolha de um diretor seria o de pedir a todos os interessados que apresentassem propostas para a administração da escola nas quais falassem de suas convicções, idéias, projetos. Esse processo vale para escolas públicas e particulares, para escolas confessionais e laicas.

Tenho presenciado muitos equívocos na nomeação de diretores. Poucos, por falta de nobreza de caráter dos escolhidos; muitos, por carência de habilidade nos relacionamentos humanos; e a maioria, por falta de conhecimento, pela ausência de convicções, de idéias, de projetos, de capacidade de ver adiante, de enxergar mais que os liderados.

E o que é servir? Posso ser um servidor sem perder a autoridade sem me tornar subserviente? É possível inverter a pirâmide organizacional sem provocar o caos? É possível ter um modelo

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participativo sem perder agilidade nas decisões? É possível solicitar a contribuição das pessoas sem mostrar fraqueza, indecisão?

Sim é a resposta para as questões colocadas no parágrafo anterior, mas é mister lembrar que o conhecimento sobre o grupo de liderados é que permitirá ao diretor definir acertadamente o ritmo e as prioridades. Nada substitui o conhecimento da realidade e da cultura de cada escola, pois não basta o desejo de servir, não é suficiente a convicção de que o exercido do cargo de diretor é instrumento de desenvolvimento do grupo.

Em situações reais, as características mais importantes para um líder estão intimamente relacionadas com o grupo de liderados. Para o cumprimento de uma tarefa, para a consecução de um objetivo, dois fatores são muito importantes: competência e comprometimento. O papel da liderança varia dependendo do nível dos liderados em relação a esses fatores. Nível dos Liderados Papel da Liderança Grupo competente, sem comprometimento O líder cobra fiscaliza exige Grupo comprometido, sem competência O líder treina, ensina, acompanha Grupo sem competência, sem comprometimento

Se houver tempo, o líder educa, treina, cobra; não havendo tempo, demite o grupo ou se demite.

Grupo competente e comprometido

Situação ideal. O líder delega e cuidará do crescimento da organização e das pessoas que nela trabalham.

É importante ressaltar que, em situações reais, não se encontram grupos bem-definidos,

como o esboçado. Nenhum grupo é totalmente competente ou incompetente, comprometido ou não-comprometido. Um grupo pode ter predominantemente pessoas comprometidas ou não, profissionais competentes ou não; o papel da liderança é conhecer bem o grupo, trabalhar as suas necessidades e inspirá-los.

Vale a observação de Sergiovanni e Carver: É preciso conhecer em que nível estão os professores e os funcionários de uma escola. Não faz sentido querer motivá-los ao nível de autonomia, se eles estão inseguros, ou querer motivá-los ao nível de segurança, quando professores e funcionários buscam autonomia. Se superestimamos o nível de necessidade de operação de professores e de funcionários, e os amedrontamos com uma administração ultraparticipativa e auto- realizadora, somos tão ineficientes quanto os que negam satisfação significativa aos professores e funcionários, subestimando os níveis de necessidade de operação. De modo geral, pode-se dizer que o papel principal de um líder não é o de controlar, mas o

e liberar energias, o de apoiar e orientar, O líder exerce três papeis fundamentais: 1. De projetista. 2. De professor. 3. De administrador.

Como projetista ele cria realidade a partir dos anseios, dos objetivos pessoais seus e de seus liderados. O líder tem obrigação de introduzir mudanças que melhorem a qualidade de vida do grupo; precisa ter visão, inspirar o grupo. Como professor, prepara o grupo e se prepara para mudanças. Uma das principais preocupações do líder deve ser a de educar e treinar. O treinamento é que garante, na prática, os resultados das grandes idéias. As pessoas trabalham mal, na maioria das vezes, não por falta de motivação, preguiça ou deslealdade, mas por falta de competência. Os componentes de um sistema são necessários, mas não suficientes por si mesmos para realizar o objetivo de um sistema, e por isso precisam ser administrados. O líder tem um compromisso com as pessoas que lidera e com a missão da empresa em termos de resultados práticos. Uma administração incapaz traz prejuízos econômicos, emocionais e espirituais para as pessoas e para as organizações. Ter consciência disso desperta, naturalmente, uma maior responsabilidade nos líderes.

Tenho percebido que o professor, talvez, seja a pessoa mais parecida com o aluno. É um ser paradoxal: ele é a instituição (principalmente na relação com o aluno), mas ele a desafia constantemente; tem uma relação conflituosa com o aluno, mas é o seu maior aliado; exige do aluno respeito à sua autoridade, mas é quem lhe ensina o questionamento, o desafio; é forte

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quando se torna fraco e permite que seus alunos sejam fortes; quanto mais compartilha seus conhecimentos mais se torna sábio; é adulto na relação com crianças e adolescentes e, na relação com adultos, preserva a criança que há em cada um de nós. Com essas características, o “bom” professor precisa de um ambiente:

� Sem muita formalidade, sem muita burocracia. � Democrático, sem opressão. � Aberto, que lhe permita ousar, errar sem culpa. � Instigante, de diálogo, de troca. � De trabalho sério, mas sem casmurrice. � O professor espera e quer de seu diretor:

o Lucidez, clareza de objetivos. o Coerência, lealdade. o Alegria, bom humor, capacidade de rir dos próprios erros. o Compreensão, apoio, orientação. o Capacidade de formar uma equipe. o Abertura, diálogo. o Paciência, mas não complacência, tolerância.

O diretor deve ser um bom ouvinte. Precisa escutar as idéias, conhecer as necessidades e expectativas de seus professores, funcionários, estar sintonizados com as aspirações de seus alunos e, para que não se perca no meio da diversidade de desejos e convicções, o diretor precisa de lucidez e firmeza nos objetivos e constância de propósito. Servir não é fazer o que o outro quer, mas empenhar-se na realização do que é necessário para o bem de todos.

A arte da liderança, segundo Max De Pree, consiste em libertar as pessoas para fazerem o que lhes cabe, da maneira mais eficiente e humana possível. O líder é o servidor dos seus seguidores, pois afasta os obstáculos que os impedem de executar tarefas. Os líderes que sobrecarregam as pessoas, em vez de capacitá-las, não estão a serviço, mas se servindo da liderança.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges FUNDAMENTOS Lição 3: A Escola tem uma Responsabilidade Social Assumir a responsabilidade social é um dos indicadores da qualidade de uma organização. Uma escola realiza as suas atividades dentro de uma sociedade composta por seres humanos. Ela interage com pessoas, quer sejam alunos, pais, funcionários, fornecedores, vizinhos, acionistas, outras escolas, a comunidade. Não há como não ter responsabilidade social. Assumir consciente e competentemente essa responsabilidade é que é a maior necessidade de nossos dias. A educação, por si mesma, não tem sentido. Educação é meio, e não fim, pois a escola não trabalha para si mesma. Em As novas realidades, Peter Drucker afirma que a educação moderna rejeitou os valores morais, e essa rejeição trouxe como conseqüência a transmissão de valores errados: indiferença, irresponsabilidade, cinismo. Não há educação sem valores morais. O trabalho mais significativo, em nossos dias, diz ele, será definir quais são os valores morais da educação numa sociedade instruída, educar com esses valores e estar fortemente comprometido com eles. Escola para todos e sucesso de todos na escola não darão garantia de uma sociedade justa, fraterna, democrática, se a educação não tiver um propósito social. Os grandes corruptos deste país não são analfabetos. São pessoas instruídas, “competentes”, que estudaram em “boas” escolas e foram bem-sucedidos como alunos. Formar pessoas competentes não é suficiente; é necessário que sejam também íntegras. Mas ainda não é suficiente; é preciso que sejam competentes, íntegras e socialmente responsáveis. Bernardo Toro, educador colombiano, enumera sete aprendizagens básicas para a convivência social:

1. Aprender a não agredir o semelhante — Fundamento de todo modelo de convivência social. 2. Aprender a comunicar-se — Base da auto-afirmação pessoal e grupal. 3. Aprender a interagir — Base dos modelos de relação social. 4. Aprender a decidir em grupo — Base da política e da economia. 5. Aprender a cuidar-se — Base dos modelos de saúde e de seguridade social. 6. Aprender a cuidar do ambiente — Fundamento da sobrevivência. 7. Aprender a valorizar o saber social — Base da evolução social e cultural.

Se se quiser ter novas formas de convivência social, em que a proteção da vida e a felicidade sejam possíveis, deve-se construí-las. A convivência se aprende, se constrói e se ensina. É uma tarefa de toda a vida de uma pessoa e de uma sociedade. O Dr. Humberto Maturama— médico da Universidade do Chile, biólogo graduado na Inglaterra e nos Estados Unidos, em Biologia dei fenômeno social — afirma:

O ser humano é, na sua constituição, social. Não existe o humano fora do social. O genético não determina o humano, somente fundamenta o que é humanizável. Para ser humano, é preciso crescer humano entre humanos. Ainda que isso pareça óbvio, esquece-se de que se é humano somente na maneira de ser humano das sociedades a que se pertence. Se pertencemos a sociedades que valorizam, com a conduta diária de seus membros, o respeito aos mais velhos, a honestidade consigo mesmo, a serenidade na ação e a verdade na linguagem, esse será nosso modo de ser humano e o de nossos filhos. Pelo contrário, se pertencemos a uma sociedade cujos membros valorizam, com uma conduta cotidiana, a hipocrisia, o abuso, a mentira e o auto- engano, esse será nosso modo de ser humano e o de nossos filhos.

Mais do que aquilo que fala, a escola ensina aquilo que faz. Os alunos não apenas ouvem o que dizem os professores mas observam como se relacionam, o que valorizam como trabalham como se organizam como vivem , quais são seus valores, nas suas crenças. Aprendem como a escola resolve os problemas, como trata seus funcionários, que importância dá às disciplinas, aos setores, aos eventos, ao trabalho, ao lucro, ao bem-estar e à satisfação das pessoas. Educar é mais que instruir, transmitir conhecimentos, dar competência. Educar é dar um sentido ao conhecimento, é inspirar projetos de vida, é despertar o projeto de viver em fraternidade, é

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humanizar, é formar cidadãos, e, para isso, é preciso direcionar esforços ter lucidez em relação ao que se quer e ao melhor caminho para chegar lá. Finalidade da Educação Em março de 1990, em conferência mundial realizada na Tailândia, sob coordenação da UNESCO, 155 países colocaram como missão da escola: Satisfazer às necessidades básicas de aprendizagem das pessoas por meio de instrumentos e conteúdos. A missão é a razão de ser, a finalidade da instituição. Por que existe? A resposta a essa nos dá a missão da organização, mas não o seu propósito, a sua finalidade. Não é na missão, mas no propósito que uma escola se diferencia de outra. Para que e como satisfazer às necessidades básicas da aprendizagem das pessoas? Por que por meio de instrumentos e de conteúdos? Uma resposta, muitas vezes, deve ser apenas o ponto de partida para outras perguntas. “A grande preocupação com os aspectos didáticos é uma forma de evadir-se dos verdadeiros problemas da educação: para que trabalhamos? A quem servimos? Para que serve o que estamos fazendo?”, nos alerta Maria Teresa Nildecoff, em Uma escola para o povo. Qual é a finalidade da educação? Muitos se manifestaram em relação a essa pergunta e é pouco provável que se chegue a uma resposta única, válida para todo tempo e lugar. Cada instituição deve buscar, reinventar, criar uma resposta, sabendo que deve ser uma resposta presente, sem que esteja circunscrita ao momento presente. O início da Missão Educacional de um grupo de escolas do Estado de Minas Gerais diz o seguinte: Missão Educacional

A missão educacional pressupõe crença na vida, crença na capacidade de o homem compreender a realidade e nela atuar, tornando-se melhor e melhorando a qualidade de vida de toda a sociedade. E, pois, nossa responsabilidade como instituição educacional entender o passado, viver o presente e vislumbrar o futuro, para afirmar, com coragem e lucidez, os valores que fundamentam a vida, criando condições para que as pessoas se desenvolvam integralmente. ...entender o passado, viver o presente e vislumbrar o futuro...

Cícero disse que a finalidade da educação é libertar o homem da tirania do presente, e André Gide definiu a melhor educação como sendo aquela que vai na direção contrária ao indivíduo. Atualmente, dentre as possíveis finalidades colocadas para a educação, nenhuma alcança tão facilmente o consenso quanto a formação da cidadania. Contribuir para a formação de pessoas conscientes de seus direitos e deveres, criar um estado de felicidade para as pessoas são propósitos de quase todas as escolas. Para vivência plena de direitos e o cumprimento de deveres de modo autônomo, há, no entanto, a necessidade de o indivíduo desenvolver certas competências. No início desta lição, viu-se as aprendizagens básicas para a convivência social. O exercício da cidadania, além dessas aprendizagens, exige as seguintes competências: motora, cognitiva, estética, ética, afetiva. Se não se trabalhar objetivamente no desenvolvimento dessas competências, corre-se o risco de continuar falando sobre cidadania sem chegar a formar cidadãos. A escola deve harmonizar o desenvolvimento da pessoa nessas competências, sem privilegiar nenhuma delas. Do contrário, pode formar aleijados. Segundo Peter Drucker: “Ela (a educação) não pode dar-se ao luxo de permitir nem o bárbaro letrado que ganha bem a vida, mas cuja vida não vale ser vivida, nem o erudito amador que carece de compromisso e de eficácia”. Uma escola, se quiser realizar um trabalho de qualidade, precisa explicitar com clareza a sua finalidade, e, se quiser ser presente, necessita assumir a sua responsabilidade social. Assumir a responsabilidade social, em nosso país, tem a ver com o aprimoramento de uma ordem social de

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convivência democrática e com a construção de um país com eqüidade interna, isto é, sem miseráveis, excluídos, marginalizados. Muitos entendem por responsabilidade social a realização de campanhas (de agasalhos, de calçados, de alimentos...) em prol dos mais necessitados, de visitas a orfanatos, a asilos, a prisões, de trabalhos comunitários. Algumas escolas inovaram assumindo a responsabilidade pela preservação de rios, matas ou pelo cuidado de praças, avenidas ou outras áreas públicas. Tudo isto é importante e pode fazer parte da formação para o exercício pleno da cidadania, mas não reside aí a essência da responsabilidade social que deve ser assumida pela escola. Em um de seus melhores artigos para a revista Veja, em 3 de novembro de 1999, o economista Cláudio de Moura Castro afirma: “Nossas escolas estão melhorando. O momento é bom para pedir-lhes mais ênfase na responsabilidade social. Mas hoje sabemos que adicionar cursos do estilo ‘moral e cívica’ é uma parte muito pequena da tarefa. Os alunos não aprendem civismo em aulas de civismo, mas em uma escola que pratica justiça, tolerância, eqüidade e generosidade. Os alunos aprendem pelo que a escola pratica muito mais que pelos sermões em aula. A escola tem de ensinar pelo exemplo. Se o professor trata o aluno rico diferente da forma que trata o pobre, falece o aprendizado da eqüidade. Se o professor chega atrasado, a lição de pontualidade vai na direção oposta”. O desenvolvimento da responsabilidade social não pode ser uma atividade paralela ao currículo escolar. Os alunos não aprendem civismo em aulas de civismo, assim como não aprendem a ser socialmente responsáveis visitando esporadicamente asilos, orfanatos, hospitais, prisões, ou levando de casa para as campanhas ocasionais aquilo que lhes sobra, aquilo que já não querem mais, os entulhos. É preciso compreender que a responsabilidade social está na essência de uma educação de qualidade hoje. A maior responsabilidade social da escola é garantir a formação de pessoas que tenham responsabilidade social. Esta é a sua contribuição específica. Muita gente anda fazendo o resto em função de suas convicções ou de necessidades de marketing. O trabalho na sala de aula e na direção de escola me ensinou que é muito difícil aprender a interagir. Nas ações de caráter social, empreendidas com alunos de escolas particulares, a interação com os mais carentes corria sempre o risco de se tornar uma ação sobre os mais pobres. Raramente encontrei pessoas, mesmo entre os educadores, que percebiam que toda ação social é sempre uma troca, que não há lado sem carência nessa relação, que não existe quem sabe tudo e quem nada sabe. Não existe um problema que seja só do outro; os problemas são sempre nossos. Considerar a pessoa e respeitar a sua dignidade é compreender que toda a solução é sempre de dentro para fora, é entender que só a interação é o caminho para a promoção humana. É complicado dialogar com o diferente, mas é fácil definir, direcionar, resolver a vida do outro, principalmente quando ele é o mais fraco. Aprendi também que, em termos de responsabilidade social, parece ser mais freqüente olhar para fora que para dentro de nossas escolas. Quantos funcionários analfabetos, quantas famílias passando necessidades, quantos doentes, quantos professores que deram tanto pelo sucesso da escola, com quantas mazelas se continua convivendo dentro das instituições, mas é sempre lá fora que se busca os carentes, os necessitados. Duvido daqueles que só fazem o bem na casa dos outros. Uma escola deve começar a exercer a sua responsabilidade social junto a seus alunos, funcionários, professores. Esta é a melhor forma de educá-los para a cidadania.

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Pedro Faria Borges ESTRATÉGIAS Lição 4: Ações de Planejamento

No primeiro esboço que fiz deste livro, esta lição estava com o título de Planejamento estratégico. Pensando um pouco mais, percebi que o fundamental não é a escola ter um planejamento estratégico, mas ter a cultura do planejar, sem a qual a organização estará, inevitavelmente, fadada ao fracasso Assim como não se constrói um prédio ou uma estrada sem projeto, não se deve construir uma escola sem planejamentos. “Não há vento a favor para quem não sabe para onde vai”, já dizia Sêneca.

O que parece óbvio nem sempre é levado em consideração na vida das escolas. Durante um bom tempo, tive como ocupação principal o trabalho de assessorar escolas e conheci escolas em todas as regiões deste país e também no exterior. Excetuando-se as grandes organizações educacionais e as escolas que buscam a excelência, localizadas principalmente nas capitais e nas grandes cidades, as pequenas e médias empresas voltadas para a educação não têm, na maioria das vezes, nem mesmo um orçamento elaborado com um mínimo de competência técnica. Não é de se estranhar que seja assim, porque embora a elaboração de planejamentos seja uma prática comum na indústria há um bom tempo, o seu surgimento como atividade das mais importantes nas instituições educacionais é bastante recente.

A capacidade de planejar o seu futuro, definindo as suas metas, organizando sistematicamente os recursos e os esforços necessários para realizá-las e medindo os resultados em confronto com as expectativas, é uma estratégia que nenhuma escola pode ignorar ou desprezar, sem correr o risco de perder o rumo e não ter futuro. A falta de um projeto dificulta e, às vezes, até impede o crescimento de uma escola. Uma organização sem visão de futuro perde tempo, energia e dinheiro.

Tenho presenciado o drama de algumas escolas de Educação Infantil que, em virtude de seu trabalho sério e competente, tiveram de estender, por exigência dos pais, o seu atendimento para outros segmentos, e que, nos dias atuais, tiveram de destruir física e culturalmente muito do que tinham feito, porque não vislumbraram que o futuro pudesse ser maior e mais rico de possibilidades que o presente. Algumas perderam até mesmo o nome. É difícil um aluno das séries finais do Ensino Fundamental ou do Ensino Médio contentar-se em estudar em uma escola com o nome infantilizado ou no diminutivo.

Por menor que seja a escola, ela precisa de algumas peças de planejamento para garantir a sua sobrevivência, para dar segurança a seus professores e funcionários, e estimulá-los, para obter resultados consistentes, para satisfazer as necessidades e expectativas das famílias, enfim para ser competitiva e crescer. A escola é um organismo vivo e, como todo ser dessa natureza, se não cresce, murcha e morre.

Uma escola minimamente organizada deve apresentar: • Calendário escolar. • Calendário de eventos • Orçamento anual • Programa anual de educação e de treinamento • Planejamento estratégico • Planos operacionais É claro que o nível de sofisticação desses instrumentos gerenciais depende do tamanho e

da complexidade da operação escolar. Uma escola de Educação Infantil, com 150 alunos, única na cidade, carece de menos sutilezas na elaboração desses instrumentos, mas esse trabalho de explicitação sempre traz benefícios incalculáveis para a escola, qualquer que seja o seu perfil.

Uma organização precisa deixar claros os seguintes pontos: qual é o seu propósito, qual é a sua finalidade ou missão, qual a sua visão, os seus sonhos e quais as estratégias que irá utilizar para realizar os seus ideais e dar conta de seus propósitos. A definição dessas questões gera um ambiente adequado, porque permite selecionar as pessoas adequadas, cria sinergia, facilita a identificação de prioridades, permite a delegação de responsabilidades e de autoridade, oferece

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critérios objetivos para a avaliação de desempenho, clareia a relação com as famílias, dá segurança, evita grandes turbulências, dá unidade às ações, possibilita focalizar a essência.

Dar rumo à escola é a maior responsabilidade do diretor. Essa responsabilidade pode ser compartilhada com a equipe técnica, com os professores, com os funcionários e até mesmo com os alunos, mas quem responde por ela é o diretor. Como diretor, posso pedir ao vice-diretor que elabore um projeto para a realização de eventos, mas não é o vice-diretor que responde pelo fato de a escola ter ou não ter um projeto dessa natureza. Um gerente administrativo pode ser responsável por cem por cento da elaboração do orçamento, mas é o diretor que responde pelos acertos e desacertos do que foi orçado. O que pretendo, nesta lição, é mostrar a importância do planejamento como estratégia para o crescimento harmônico de uma escola. De um modo geral, gasta-se pouco tempo para decidir o que fazer, pouco tempo para educar e treinar as pessoas para fazer e muito tempo fazendo. Decorre daí que muitas escolas vivem numa “fazeção” extenuante e sem tréguas, realizando ações sem sentido e, quase sempre, malfeitas.

Conta-se que, num país distante e há muito tempo, um general tinha seu gabinete próximo a uma pracinha, no interior do quartel, e que, nos finais de tarde, ele gostava de sentar-se num dos bancos dessa pracinha e meditar sobre as grandes decisões tomadas no decorrer do dia.

Um belo dia (em histórias assim, o dia é sempre belo), o general, olhando da janela de seu gabinete, percebeu que o banco de sua preferência estava com a pintura gasta e bastante sujo. Imediatamente, chamou um subordinado e mandou pintar o banco e, para que ninguém se sujasse enquanto a tinta não se secasse, colocou um guarda ao lado do banco.

O guarda cumpriu seu turno, outro o rendeu. Naquela noite, o general morreu, mas os soldados continuaram cumprindo turno e sendo rendidos ao lado do banco. Depois de muitos anos, um general mais novo, intrigado com o soldado ao lado do banco, perguntou a um oficial qual a razão daquele trabalho. O oficial disse que não sabia, mas que sempre tinha sido assim.

Nas escolas, há muita coisa sem sentido que contínua sendo feita, porque sempre foi assim. E comum o fato de diretores me apresentarem grandes dificuldades na execução de algumas tarefas e, quando lhes pergunto por que realizam aquelas tarefas, ou por que as realizam daquele modo, levarem um susto porque nunca pensaram nessa questão. Algumas dessas tarefas, para alívio de todos, podem simplesmente ser eliminadas, como o guarda ao lado do mundo mudou.

Quando se estabelece um ciclo de planejamentos, passa-se a escola a limpo. É no nível estratégico que as questões operacionais ganham significado. Se os planejamentos são feitos de modo participativo, assegura-se a compreensão e o comprometimento das pessoas. Este é o melhor caminho, quando o diretor tem a lucidez para não se eximir da responsabilidade pelos rumos e resultados da escola.

É bastante claro para mim que o planejamento e os seus modelos devem ser específico de cada escola, mas acredito que a experiência de quem já fez pode contribuir como fonte de inspiração para quem está começando. Por pensar assim, exponho, no final desta lição, dois trabalhos elaborados pela equipe de liderança de uma escola que tive o privilégio de dirigir. Eu fui o redator desses trabalhos e também contribui bastante em sua elaboração. Mudei algumas datas, eliminei nomes e fiz pequenas alterações que julguei necessárias para que esses trabalhos pudessem ser mais úteis.

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Planejamento Estratégico COLÉGIO TRADIÇÃO

• Missão Atender às necessidades de aprendizagem das pessoas, nos segmentos de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, em harmonia com os valores institucionais explicitados pelo Colégio Centro Educacional • Visão Ser uma escola presente, auto-sustentável, referência para as demais escolas, contribuindo para a formação de pessoas íntegras, competentes e socialmente responsáveis. • Valores Foco na aprendizagem. — Relações éticas. — Trabalho cooperativo. — Melhoramento contínuo — Responsabilidade social Estratégias • Liderança Ampliar o conceito de liderança, preparando professores, funcionários e alunos para exercerem, com eficácia, em suas áreas de desempenho, a função de líderes. • Educação e treinamento Sistematizar o processo de educação e treinamento, propiciando: — embasamento teórico para as mudanças; — trabalho em equipe; — suporte para a consecução das metas. • Gerenciamento da rotina Padronizar os processos repetitivos e relevantes, permitindo delegação e universalizando a auto-inspeção e o autocontrole. • Qualidade da aprendizagem Aperfeiçoar o processo de ensino e de aprendizagem e atualizar o processo de avaliação, em sintonia com as habilidades necessárias ao mundo de hoje. • Comunicação Aprimorar e padronizar os meios de comunicação existentes e criar outros que permitam a efetiva comunicação interna e da escola com as famílias e outras instituições da comunidade. • Responsabilidade social Buscar, por meio de políticas e ações concretas, a justiça social interna e estimular a participação de alunos, de professores e de funcionários em programas de cunho social. • Expansão de serviços

Identificar oportunidades de expansão de serviços, capitalizando sobre competências, necessidades e espaços.

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ESTRATEGIA 1.0 - LIDERANÇA 1.1 Diretrizes Específicas 1.2 Metas •Responsável pelo

Plano de Ação 1.1.1 Criar condições para que as chefias do setor conheçam o conceito de liderança transformadora e desenvolvam habilidades desse estilo.

1.2.1 Formatar um curso sobre liderança, de 24 a 30 horas, e treinar todas as chefias da escola, até...

1.1.2 Buscar a participação dos segmentos nas decisões que os afetam.

1.2.2 Promover um encontro das chefias do setores para o aprimoramento do estilo de liderança transformadora.

1.1.3 Abrir espaço para a participação efetiva dos alunos.

1.2.3 Criar espaço para participação nas decisões importantes da escola.

1.2.4 Promover, no mês de abril de cada ano, um curso de liderança para a diretoria do Grêmio Estudantil e representantes de turma.

1.1.4 Estimular, nos diversos setores, o surgimento de novas lideranças.

1.2.5 Capacitar as chefias para a formação de times auto dirigidos em seus setores, até...

ESTRATÉGIA 2.0 - EDUCAÇÃO E TREINAMENTO 2.1 Diretrizes Específicas 2.2 Metas •Responsável pelo

Plano de Ação 2.1.1 Buscar o conhecimento (SABER) e a aplicação do conhecimento (SABER FAZER) como fatores essenciais para o desenvolvimento de capacidades e potenciais humanos.

2.2.1 Aplicar, mensalmente, 1,5% do total da folha de pagamento em atividades de educação e treinamento.

2.1.2 Criar possibilidades de aprimoramento contínuo nos níveis pessoal e profissional.

2.2.2 Apresentar, até março de cada ano, o “Programa anual de educação e - treinamento”, contemplando todos os setores da escola.

2.1.3 Propiciar às pessoas satisfação no trabalho e contribuir para o enriquecimento de suas vidas.

2.2.3 Garantir 50% do tempo dos departamentos — uma reunião de 2 horas a cada 15 dias — para as atividades do “Projeto Pedagógico”.

2.1.4 Propiciar embasamento teórico para as mudanças necessárias no processo ensino/aprendizagem.

2.2.4 Criar um corpo de coordenadores que garanta o aprimoramento contínuo dos professores em seus conteúdos - específicos, em estratégias de ensino, até fevereiro de...

2.1.5 Dar sustentação para a realização dos objetivos da escola.

2.2.5 Viabilizar a participação de professores e funcionários em cursos, seminários, congressos, com subsídios próprios, a partir de...

2.1.6 Compreender as aplicações em educação e treinamento como investimentos e não como custos.

2.2.6 Ter um modelo de avaliação de desempenho até o final de março de...

2.2.7 Avaliar sistematicamente todos os profissionais, usando o modelo de avaliação, a partir de junho de...

2.1.7 Atender às necessidades de desenvolvimento das pessoas a partir da avaliação do desempenho pessoal.

2.2.8 Promover oito palestras, por ano, para as famílias dos alunos, atendendo às necessidades específicas dos segmentos.

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ESTRATÉGIA 3 - GERENCIAMENTO DA ROTINA 3.1 Diretrizes Específicas 3.2 Metas •Responsável pelo

Plano de Ação 3.1.1 Criar condições para que os setores desenvolvam as suas atividades com autonomia.

3.2.1 Padronizar, até o final de..., todos os impressos usados pelo SOE e pela Secretaria.

3.1.2 Promover a delegação. 3.2.2 Padronizar, até o final de..., circulares, cartas, informativos encaminhados às famílias.

3.1.3 Universalizar o autocontrole e a auto-inspeção.

3.2.3 Criar uniformes para secretárias e atendentes até março de...

3.1.4 Liberar as lideranças para a busca de solução para s problemas do amanhã.

3.2.4 Definir, a cada ano, um calendário de eventos da escola, com uma temática e equipe responsáveis.

3.2.5 Atualizar, até junho de..., um organograma da escola com definição de papéis e responsabilidades.

3.1.5 Possibilitar o surgimento de novas lideranças.

3.2.6 Ter todos os processos principais da gestão escolar padronizados até o final de..., para que sejam totalmente informatizados até o final de....

ESTRATÉGIA 4.0 - COMUNICAÇÃO 4.1 Diretrizes Específicas 4.2 Metas •Responsável pelo

Plano de Ação 4.1.1 Tornar comum a percepção e o entendimento, compartilhando e interpretando a Visão da Escola.

4.2.1 Criar, no início de cada ano, um grupo de comunicação interna, formado por pessoas de diferentes setores, para definir canais de comunicação e escolher assuntos.

4.1.2 Criar vínculos entre os profissionais, a diretoria e as famílias.

4.2.2 Ter um encontro mensal da Diretoria com cada grupo de profissionais da mesma área para passar informação direta e esclarecer dúvidas.

4.1.3 Tornar os funcionários e os professores participantes do processo pelo qual a escola passa, tendo acesso aos objetivos e às metas e ao que é esperado deles.

4.2.3 Publicar, nos meses de abril, agosto e novembro, um jornal para as famílias e para os profissionais da escola.

4.1.4 Definir, com toda a clareza, a responsabilidade da família e da escola no processo de educação.

4.2.4 Criar um Manual Informativo da Escola a partir de...

4.1.5 Fortalecer o aluno como canal natural de comunicação entre família e escola.

4.1.6 Comunicar às famílias, de modo gradual e constante, a proposta pedagógica da escola, as suas crenças e direcionamentos.

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ESTRATÉGIA 5.0 - RESPONSABILIDADE SOCIAL 5.1 Diretrizes Específicas 5.2 Metas •Responsável pelo

Plano de Ação 5.1.1 Contribuir para a melhoria das condições de vida dos funcionários mais necessitados.

5.2.1 Levantar até junho de... os dados de todos os funcionários de serviços gerais e apoio administrativo, para análise socioeconômica.

5.1.2 Criar mecanismos de participação social de alunos, de professores e de funcionários, preferencialmente a partir de parcerias com escolas públicas.

5.2.2 Criar, até o final de ..., plano de - assistência médica e odontológica para funcionários de serviços gerais e apoio - administrativo.

5.1.3 Ter como finalidade privilegiada do processo educacional a construção do bem comum.

5.2.3 Criar um plano de melhoria das condições de vida dos funcionários de serviços gerais e apoio administrativo, contemplando saúde, habitação, estudo, até o final de...

5.1.4 Criar condições para que os alunos, os funcionários e os professores possam contribuir efetivamente para a construção de uma sociedade justa e fraterna,

5.2.4 Realizar pelo menos um evento por semestre em parceria com órgãos da Prefeitura Municipal.

5.2.5 Ter, a partir de..., pelo menos três grupos de alunos atuando na comunidade, prestando serviços sociais.

5.1.5 Estimular e facilitar o surgimento de grupos ecológicos, grupos de trabalho em favelas, hospitais, etc... 5.2.6 Desenvolver, pelo menos, duas

campanhas — junho e novembro — de apoio aos mais necessitados.

ESTRATÉGIA 6.0 - MANUTENÇÃO E EXPANSÃO DOS SERVIÇOS 6.1 Diretrizes Específicas 6.2 Metas •Responsável pelo

Plano de Ação 6.1.1 Criar condições que permitam o crescimento da escola.

6.2.1 Aumentar o faturamento da Unidade em 10%, em ...

6.1.2 Buscar oportunidades de crescimento que estejam relacionadas à operação da escola.

6.2.2 Ter, até o final de... alunos na Escolinha de Esportes e Artes da Unidade.

6.1.3 Compreender o crescimento como a necessidade vital de todo o organismo.

6.2.3 Estabelecer pelo menos três convênios com escolas de educação infantil e ensino fundamental até o final de ...

6.1.4 Privilegiar os investimentos que tenham retorno em termos de faturamento, sem deixar de ter visão de médio e longo prazo.

6.2.4 Operar a escola com um resultado operacional mínimo de 12%.

6.1.5 Garantir um resultado operacional que permita investimento na melhoria de estruturas, qualificação dos processos e treinamento das pessoas.

6.2.5 Reduzir para 5% o índice de inadimplentes no último dia do mês e ter no máximo 1,5% de débito acumulado ao longo do ano.

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Eventos na Escola Por que realizar eventos? Celebrar é um verbo que se conjuga em todas as culturas. O ser humano criou músicas, danças, rituais, símbolos, datas, em todos os tempos e lugares, para comemorar seus feitos, suas vitórias, seus heróis, suas crenças, seus valores. Celebrar é uma necessidade humana. A celebração de eventos, além de satisfazer a uma necessidade humana, oferece à escola oportunidades preciosas para: 1. Desenvolver projetos, oferecendo às pessoas espaços para participação e exercício da criatividade. 2. Dar significado aos conhecimentos adquiridos e construídos em sala de aula. 3. Educar alunos, funcionários, professores para a participação em manifestações públicas. 4. Educar alunos, funcionários, professores para a valorização dos símbolos, datas e valores da cultura brasileira. 5. Desenvolver o respeito e o apreço pelas manifestações artísticas e culturais do indivíduo ou do grupo. 6. Formar cidadãos conscientes de seus direitos e também de seus deveres. 7. Criar laços de fraternidade entre as pessoas e de lealdade e respeito entre estas e as instituições. Quais eventos realizar? Não é suficiente gastar tempo fazendo eventos; é necessário que também se gaste tempo para definir o que fazer Essa definição deve considerar, em primeiro lugar, o potencial educativo de cada atividade. Os ganhos educativos é que devem nortear as escolhas; os demais ganhos devem ser subprodutos. A vida é uma sucessão de eventos, mas a escola deve ter lucidez para comemorar aqueles que contribuem para desenvolver os valores que ela julga importantes Com base nesse pressuposto, acredito que, na história atual do Colégio Tradição, devem ser comemorados os seguintes acontecimentos: 1. Independência do Brasil. 2. Aniversário da cidade. 3. Aniversário da escola. 4. Dia da criança — Da pré-escola até 4ª série do ensino fundamental. Dia do estudante — A partir da 5ª série do ensino fundamental. 5. Dia do professor. 6. Festa junina. 7. Festa da família. Esses são acontecimentos que devem ser lembrados por todos os segmentos da escola, com o envolvimento de todos os alunos, professores e técnicos. Há, ainda, outros que atingem todos os setores da escola. São eles: 1. Dia Internacional da Mulher. 2. Natal. 3. Encerramento do ano letivo. Além de comemorações de caráter geral, cada segmento, seguindo o mesmo modelo, deve elaborar um cronograma das atividades que são específicas do seu setor. Como realizar os eventos? A educação é um processo Não se educa com acontecimentos episódicos, por mais bonitos e elogiáveis que sejam. Educação é tarefa de todos os dias. Justamente por isso, toda comemoração deve ser sempre a culminância de um processo. Não se juntam alunos e professores no pátio ou no auditório para algo que não seja do conhecimento prévio deles Se se dispõe a comemorar a Independência do Brasil ou o Dia do Trabalho, é necessário que esses temas estejam presentes no planejamento de todos os professores. Achar que o professor de química ou o de matemática não tem nada a ver com a Independência do Brasil ou com o Dia Internacional da Mulher é uma postura ultrapassada e extremamente prejudicial ao processo educativo.

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Deve haver uma temática geral para cada ano, que permita às pessoas estabelecerem ligações entre os v eventos, dando sentido às comemorações. Por isso, sugiro as seguintes temáticas para os próximos anos • 2008 — O Ar, Água e Terra • 2009 — A Escola • 2010 — O Trabalho • 2011 — O Tempo Assim, ao comemorar o aniversário da escola em 2008, deve-se relacionar tal comemoração com a temática “O Ar, Água e Terra”. Um bom começo seria buscar respostas para as questões a seguir: • Como uma escola pode ajudar a construir um mundo ecológico? • Como o Ar, Água e Terra são essenciais na existência da humanidade? • Como as pessoas trabalham a ecologia dentro da nossa escola? A comemoração de cada evento deve tornar-se um projeto. Para cada pro1eto devem ser constituídas duas comissões: comissão temática e comissão executiva. As comissões temáticas serão coordenadas sempre pela direção da escola; as comissões executivas, sempre pela coordenação de um dos segmentos da escola. Para as comemorações do primeiro semestre de 2008 ficam definidas as comissões:

Comissões/Eventos Dia Internacional da Mulher

Aniversário da Escola

Festa Junina Dia do Estudante

Comissão temática 1. 2. 3.

1. 2. 3

1. 2. 3

1. 2. 3

Comissão Executiva

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

Comissões/Eventos

Comissão temática 1. 2. 3.

1. 2. 3

1. 2. 3

1. 2. 3

Comissão Executiva

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

Comissões/Eventos

Comissão temática 1. 2. 3.

1. 2. 3

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Comissão Executiva

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

1. 2. 3. 4.

Comissões/Eventos

Comissão temática 1. 2. 3.

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Comissão Executiva

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Avaliação Na escola, tudo deve servir à educação. Avaliar urna atividade é avaliar o grau de conformidade da atividade com a proposta educativa da escola. Em si mi nenhuma comemoração tem significado relevante para o processo educacional Não há aprimoramento, se não temos o hábito de refletir sobre as nossas ações. Após a realização de um evento, é preciso parar e verificar: 1. Qual o universo atingido? 2. Qual o nível de envolvimento das pessoas? 3. Quais os objetivos atingidos? 4. Quais as mudanças provocadas pelo processo de elaboração e execução do projeto? 5. O que não deu certo? 6. Quais os ganhos no relacionamento entre as pessoas? 7. Qual o resultado da relação gasto de energia versus benefícios para as pessoas? Essas perguntas, substituídas ou acrescidas por outras, ajudarão a evitar que os eventos se tornem um amontoado de festas que, com muita freqüência, só trazem custos, preocupações e trabalho para a escola, com pouquíssimos ganhos para o processo educacional.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges

Lição 5: Trabalho Cooperativo

A educação formal não é tarefa para indivíduos, mas para equipes Isoladamente, ainda que haja competência e comprometimento, os resultados do trabalho educacional são quase sempre insignificantes.

Em termos de produtividade, uma escola se distingue de outra em virtude do maior ou menor grau de sintonia entre professor e escola, entre professor e aluno, entre escola e família, entre alunos, entre professores Quando essas relações são desafinadas, por melhor que seja o desempenho de cada indivíduo, sempre há prejuízos. Mais do que de energia, o trabalho educacional precisa de sinergia.

Cuidar do crescimento das pessoas e um dos caminhos mais efetivos para a formação de uma equipe. Por maior que seja o esforço, é muito difícil constituir uma equipe, quando as pessoas do grupo, em sua maioria, são egoístas, mesquinhas, agressivas, desleais, competitivas, duras, irônicas, permissivas, autoritárias. A competência individual (técnica e pessoal) é condição necessária para a democratização das relações, para se dar poder aos indivíduos, sem que se caia no caos, sem aumentar a confusão e sem dificultar o gerenciamento da equipe.

O talento individual, embora imprescindível, não é suficiente para que forme uma equipe. É necessário que os talentos se unam em torno de um objetivo comum, é preciso que tenham uma visão compartilhada. O trabalho individual bem-feito, sem um norte, não-sintonizado, é pouco efetivo para a consecução das metas de uma instituição. Quando há uma única direção para as energias individuais, cria-se uma sinergia.

A falta de um objetivo comum gera perda de energia. As pessoas podem trabalhar com afinco, vestir e suar a camisa, mas não conseguem resultados significativos com os esforços despendidos. Em seu livro A quinta disciplina, Peter M. Senge diz, a respeito do objetivo comum, o seguinte:

Um objetivo compartilhado, ou comum, não é uma idéia, mas uma força inculcada no coração das

pessoas, uma força de poder impressionante. Pode ser inspirado por uma idéia, mas assim que ganha impulso — se tiver força suficiente para atrair mais de uma pessoa — deixa de ser uma abstração, transformando-se em algo concreto. As pessoas começam a vê-lo como se existisse. Poucas forças nas relações humanas têm o poder de um objetivo que é de todos.

Num nível mais simples, um objetivo comum é a resposta à pergunta: ‘O que queremos criar?’. Assim como os objetivos pessoais são imagens que as pessoas carregam na mente ou no coração, o mesmo acontece com os objetivos compartilhados pelas pessoas de uma mesma organização. Eles criam um sentimento de coletividade que permeia a organização e dá coerência às diferentes atividades. Um grande desafio para a liderança de uma escola é conseguir o comprometimento das

pessoas em relação aos objetivos. A relação de uma pessoa com o trabalho que executa, ou melhor, com a instituição em que tudo pode acontecer em quatro níveis:

• Apatia Nenhum comprometimento, nenhum interesse, nenhuma energia. Não é contra e nem a favor. Está sempre de olho no relógio. • Obediência Faz o que lhe compete, não quer perder o emprego. Segue o regulamento, as normas, à risca. E um bom soldado. • Participação A pessoa quer. Faz tudo que for necessário dentro do espírito da lei. Ajuda a realizar o objetivo, mas não sente que ele também seja seu, embora reconheça os seus benefícios. • Comprometimento Não se trata de realizar um objetivo da empresa, mas de estar comprometido com algo que dá sentido à própria vida. A pessoa fará com que o objetivo se realize. Se necessário, cria novas estruturas.

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Na maioria das escolas, o envolvimento de professores, de funcionários, de alunos não vai além da participação, porque não há um objetivo comum, uma visão compartilhada. O objetivo comum deve ser construído dentro do grupo, considerando os objetivos pessoais. Um objetivo imposto pela liderança, ainda que honesta e competentemente, não alcança o nível de comprometimento das pessoas. Estas só se comprometem com aquilo que ajudaram a criar, que definiram em conjunto.

Em obra já citada, Peter M. Senge narra o seguinte episódio: Talvez você se lembre do filme Spartacus, uma adaptação da história de um escravo gladiador romano que liderou uma rebelião de escravos em 71 a.C. Os escravos, depois de derrotarem as legiões romanas por duas vezes, após um longo cerco e uma árdua batalha, foram finalmente dominados pelo general Marcus Crassus. No filme, Crassus diz aos sobreviventes do exército de Spartacus: “Vocês eram escravos e voltarão a ser escravos. Entretanto, serão poupados da pena de crucificação por clemência das legiões romanas. Basta apenas me entregarem o escravo Spartacus, pois não sabemos quem ele é”. Após uma longa pausa, Spartacus (interpretado por Kirk Douglas), levanta-se e diz: Eu sou Spartacus. Então o homem que está a seu lado também se levanta e diz: Eu sou Spartacus. Outro homem levanta-se e faz o mesmo, e, no transcorrer de um minuto, o exército escravo todo está de pé. Apócrifa ou não, essa história mostra uma profunda verdade. Pondo-se de pé, todos os homens optaram pela morte. Mas a lealdade do exército de Spartacus não era ao homem Spartacus, mas sim, ao objetivo que ele inspirava e que era compartilhado por todos — a idéia de que podiam ser livres. O objetivo era tão forte que nenhum dos homens suportaria a idéia de abandoná-lo e voltar à escravidão. O desempenho de uma equipe depende da competência individual de seus membros e da

capacidade de trabalhar bem em conjunto É bastante freqüente o exemplo de equipes de futebol com grande número de estrelas que apresentam resultados desprezíveis em campeonatos; e não é raro equipes com menor número de talentos individuais surpreenderem grandes equipes. É fácil perceber que equipes talentosas são formadas por indivíduos talentosos, mas que nem sempre indivíduos talentosos formam equipes talentosas. Uma equipe é bem mais que um conjunto de pessoas.

Sentimento de equipe não se confunde com sentimento de amizade. Os administradores escolares, na ânsia de terem equipes afinadas, muitas vezes gastam boa parte de seu tempo promovendo encontros, reuniões, festas, comemorações que possam criar laços de amizade entre os membros de seu grupo. A amizade não precisa ser patrocinada pela instituição. O indivíduo é capaz, por si só, de escolher e de cultivar seus amigos. O amor é gratuito. Não é necessário, para que se tenha uma equipe produtiva, que os membros de um grupo morram de amores uns pelos outros.

O professor, principalmente os das séries mais adiantadas, precisa ter uma visão holística da educação e do espírito cooperativo. O seu conteúdo, a sua disciplina, as suas crenças, os seus objetivos, os seus sonhos são parte de uma realidade muito maior. É com os outros conteúdos, as outras disciplinas, as outras crenças, os outros objetivos, os outros sonhos que ele conseguirá conduzir o aluno até mais próximo da verdade. A relação com os outros professores, com os supervisores, os coordenadores, os orientadores educacionais, os psicólogos, os diretores deve ser de cooperação, de lealdade. Os alunos, quando percebem que há unidade no grupo de educadores, se sentem mais seguros, mais confiantes e mais dispostos a seguir orientações, a gastar energia com as tarefas escolares. O melhor caminho para que o aluno valorize o trabalho do professor é o professor valorizar o trabalho de cada um de seus colegas. E isto não é difícil, pois o conhecimento é um todo, dividido em disciplinas, porque individualmente não se dá conta do todo.

O trabalho cooperativo tem uma importância muito grande na rotina de uma escola, porque satisfaz três necessidades básicas: 1. Cumprimento da missão. 2. Realização e proteção. 3. Crescimento pessoal, profissional e como membro da equipe.

O cumprimento da missão exige método, disciplina e as pessoas sentem necessidade de organização, de ordem; a participação, a alegria de contribuir e de realizar algo são inerentes ao ser humano, assim como a necessidade de proteção, de segurança, de apoio, de se sentir pertencendo a um grupo; o crescimento é natural, orgânico: todos querem crescer. O crescimento profissional é possível (ainda que com mais dificuldade) isoladamente, mas o pessoal e o

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crescimento como membro do grupo (aprender a ouvir, a falar, a liderar, a compartilhar idéias) só são possível no trabalho em equipe.

A opção de uma pessoa por trabalhar em uma escola ou sistema educacional deve estar relacionada com a capacidade de a escola ou o sistema oferecer, principalmente, condições para um trabalho cooperativo. Os trechos a seguir justificam por que se joga tão forte no trabalho de equipe, baseado na cooperação entre pessoas.

A competição, considerada como a principal coisa na vida, é bárbara demais, é dura demais, apenas uma questão de músculos fortes e determinação obsessiva, que possibilita um modo de vida para, no máximo, mais duas gerações. Depois deste tempo, ela deverá produzir fadiga nervosa, diversos fenômenos de escapismo, uma procura do prazer tão tensa e tão difícil quanto o trabalho — uma vez que o descanso se - tornou impossível — e, no fim, o desaparecimento da espécie. (Bem-and Russeli) O único caminho aberto para nós está na direção de uma paixão comum, de uma conspiração de amor. (Pierre Trudeau) Ei vivir democrático es una obra de arte. No tiene que ver com eficiência, no tiene que ver com la perfección, tiene que ver com eI deseo de ana convivencia en la fraternidad. La democracia es un proyecto comúm, por eso es una obra de arte, porque tiene que configurarse momento a momento en la convivencia. Por eso es que la democracia no es una temática dei poder. (Humberto Maturana) O trabalho cooperativo pressupõe integração, comunicação, responsabilidade mútua,

consideração por aquele que está ao seu lado, que se comprometeu com você e com quem você se comprometeu. A cooperação não ocorre naturalmente, é um comportamento aprendido. Numa escola em que as pessoas aprendem a competir umas com as outras para progredir, não será com discursos e tapinhas nas costas que professores e funcionários começarão a construir relacionamentos de confiança, a trabalhar cooperativamente. Mais do que as palavras, importam, neste momento, as atitudes do diretor.

A partir de uma mudança verdadeira na conduta do diretor e da adoção de novos processos operacionais, é possível iniciar uma transformação. Pode-se, por exemplo, avaliar o desempenho da equipe de professores que trabalha com a 5ª série E, em vez de avaliar isoladamente o trabalho de cada professor. O diretor pode destacar os projetos desenvolvidos por equipes mais que aqueles que foram conduzidos individualmente.

Desaprender um comportamento é um processo bastante complexo; envolve ansiedade, atitude defensiva e resistência à mudança. Em momentos de desaprendizagem, o papel do diretor é relevante. Esse processo pode ser compartilhado, mas não delegado. O diretor precisa estar na frente, sinalizando com suas atitudes que o comportamento competitivo agora é considerado mais negativo, enquanto o cooperativo, mais positivo.

No momento em que a escola percebe que a sua função social vai além da simples transmissão de conhecimentos, em que o professor descobre que o seu desafio não é ensinar, mas garantir a aprendizagem, em que se sabe que uma das melhores maneiras de avaliar as instituições educacionais é avaliar a “performance” de seus alunos, torna-se imperativo mudar a dinâmica das relações. O trabalho cooperativo, em todos os níveis, não é uma opção, mas uma exigência dos novos modelos de ensino e aprendizagem. Talvez seja esta mudança a mais urgente a acontecer em nossas escolas: criar cooperação entre o ensino e a aprendizagem.

O ensinar e o aprender têm sido, em muitas escolas, uma tarefa árdua, com resultados aquém da expectativa da sociedade. Isto ocorre porque se parte de um pressuposto que é meia-verdade; acredita-se que, havendo ensino, conseqüentemente haverá aprendizagem, e não é tão simples assim.

É verdade que os professores ensinam, e que os alunos aprendem, mas acreditar que os alunos aprendem porque os professores ensinam é iludir-se. Ensinar e aprender são processos entrelaçados, imbricados, mas não há entre eles uma relação linear de causa e efeito.

Muitas escolas têm enfocado quase que exclusivamente o ensino, privilegiando a agenda do professor, que se distancia, cada vez mais, das necessidades e das expectativas do aluno. Se se observa o dia-a-dia da maioria das escolas, verifica-se que as situações de ensino predominam.

Em situações de ensino: • Quem decide o que deve ser aprendido é o outro (professor). • O processo é fragmentado, separado da vida.

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• O aprendiz apenas escuta e pensa, não tem o que fazer: — Você entendeu? — Sim. — Ok, vamos em- frente. • O sucesso depende de ficar quieto, seguir orientações. • O tempo é de quem ensina e é difícil de controlar, porque não se considera o ritmo de quem aprende. • O foco não está no aprendiz, mas nas unidades de estudo, nos planejamentos elaborados com antecedência. • As atividades estão centradas no professor. Ao privilegiar o ensino, acreditando que a melhoria dos resultados de aprendizagem é

diretamente proporcional à melhoria das estratégias de ensino, as escolas tendem a: • Dar ênfase exagerada aos recursos tecnológicos. • Supervalorizar momentos específicos de avaliação. • Abusar das aulas expositivas. • Ignorar o aluno, desconsiderando os seus conhecimentos e sentimentos. • Supervalorizar o professor-instrutor em detrimento do professor-educador. • Ser eficientes, e não eficazes. As escolas que enfocam a aprendizagem privilegiam o aluno, considerando as suas

necessidades, desejos, sentimentos, expectativas. O ponto de partida é o aluno, e, logicamente, essas escolas organizam o tempo, o espaço, as relações de modo bastante diferente daquelas que dão ênfase ao ensino.

Em situações de aprendizagem: • O aprendiz é quem decide o que aprender. • O mundo do aprendiz importa muito, tudo deve ser contextualizado. • O aprendiz age, junta raciocínio e prática. • O sucesso depende da participação, do envolvimento. • O tempo é do aprendiz, as atividades acontecem no ritmo dele. • As atividades estão centradas no aluno. • Predomina o diálogo. As escolas que têm como foco a aprendizagem correm o risco de: • Dar ênfase exagerada ao processo. • Abusar dos trabalhos de grupo, das pesquisas. • Ter medo de ensinar. • Cair no espontaneísmo. - • Avaliar os produtos com benevolência. Quando se estabelecem comparações, há uma tendência a pensar que, havendo

diferenças, forçosamente um dos elementos comparados é superior, mais importante que o outro. É provável que se pense que as escolas devam cuidar da aprendizagem e não do ensino, mas aí está o perigo. Se se esteve mais preocupado com o ensino, não se trata, agora, de mudar o foco para a aprendizagem e riscar do mapa o ensino. São processos diferentes, mas complementares e, até certo ponto, indissociáveis.

O educador Paulo Freire, em uma entrevista à revista Dois Pontos — Teoria e Prática em Educação, afirmou:

O que acho é que todos nós, homens e mulheres, somos ‘seres programados para aprender’. Repetindo a afirmação do grande cientista François Jacob, numa entrevista que deu ao Correio da Unesco, eu acrescentaria: somos seres programados para aprender, mas também para ensinar. Eu não separo jamais uma coisa da outra, e não tenho dúvidas de que, milernamente, no campo da História, foi exatamente essa percepção que nos levou a descobrir que era possível ensinar. Isto é: ensino não foi o começo, o começo foi o conhecer, foi a aprendizagem. Aprendendo a gente descobriu que era possível ensinar a aprender. Eu parto daí. Penso também que se pode partir daí. Inicialmente, invertendo os verbos: aprendendo e

ensinando. Depois, compreendendo melhor o uso do gerúndio: aprender e ensinar são processos. Não são realidades estáticas, mas dinâmicas; não permitem papéis predeterminados e únicos.

É, ainda, necessário compreender que, nas organizações modernas, não há mais espaço para papéis fixos, do tipo:

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• Quem ensina e quem aprende. • Quem pensa e quem faz. • Quem lidera e quem é liderado. • Quem decide e quem executa. Pensar que a escola é o lugar aonde as crianças vão para aprender, e os adultos, para ensinar é

estar ultrapassado. Tal visão leva à crença de que alunos nada têm a ensinar, e de que professores nada têm a aprender. O professor que estiver interessado na efetividade de seu trabalho educacional deve procurar, com urgência, ouvir os seus alunos. E preciso que ele diminua o seu tempo de fala e aumente a sua capacidade de ouvir. Como grupo, os professores estão acostumados a falar, não a ouvir; são pouco perspicazes, de certa forma insensíveis a indícios não-verbais. O professor necessário é aquele que ensinaprendendo”, e o bom aluno é aquele que “aprendensinando”.

É preciso permitir que os alunos se tornem professores, para que se tornem bons aprendizes; se ensino, aprendo. É necessário que os professores se tornem bons aprendizes, para que possam ter êxito no ensinar: se aprendo, sei o quê e como ensinar. Uma escola em que o aluno pudesse, além de aprender, ensinar, e o professor, além de ensinar, aprender, estaria fazendo uma revolução. Parece fácil, mas trata-se de um longo caminho. Esquece-se de escutar. Foi-se preparado para ensinar, e o aluno vem à escola para aprender. Se se mudar a mentalidade, se estará transformando o processo educacional. Isto requer um competente programa de educação e treinamento.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges

Lição 6: Educação e Treinamento Sei que muitos educadores têm ojeriza à palavra treinamento, mas nenhuma palavra ou

expressão representa melhor o que pretendo com esta lição do que o binômio “educação e treinamento”. A educação amplia a percepção e a compreensão que as pessoas têm em relação ao trabalho que fazem; a educação lhes ensina o por quê”. O treinamento aumenta as habilidades e a competência e ensina aos trabalhadores o “como” de um trabalho. O treinamento melhora o que a pessoa faz; a educação melhora a própria pessoa.

Seriam evitados desperdícios, soluções canhestras, improvisões inadequadas e perigosas, se as escolas cuidassem um pouco mais do treinamento dos seus funcionários e professores. Eventualmente, um jogador de futebol pode acertar uma bola no ângulo, mas bater dez faltas e fazer sete, oito gols, só com muito treinamento. Quanto mais se treina, mais sorte se tem. Nenhuma instituição dá conta do seu propósito sem um processo sistemático de educação e treinamento.

Não é possível continuar fazendo as mesmas coisas e esperar que os resultados sejam diferentes daqueles que se tem obtido. Não é possível, embora se tenha mudado os objetivos, sonhar com resultados diferentes, se se continua realizando, com o mesmo espírito, as mesmas tarefas no trabalho de cada dia. Novas realidades exigem novas aprendizagens.

É lógico que não basta apenas treinamento, principalmente no caso de professores. A escola não é um mundo estável, a educação é dinâmica. As relações interpessoais, essenciais no trabalho educacional, a todo momento apresentam situações inéditas e exigem competências que vão além das adquiridas com o exercício e o treino. Segundo Perrenoud, os diretores devem, assim como os professores, saber agir em uma situação de crise que rompe subitamente com um trabalho de rotina. Não é fácil manter competências de ponta que não podem ser exercidas senão de maneira episódica.

É comum, quando se fala de competência nas escolas, voltar-se os olhos apenas para o conjunto de conhecimentos necessários para o exercício de determinada função. O domínio desse conjunto de conhecimentos pode ser chamada de competência técnica. Esta, embora imprescindível, não é suficiente para o trabalho em equipe. Saber matemática, inglês ou química não é suficiente para transformar uma pessoa num professor competente. Necessita-se de uma outra competência: a pessoal. E preciso que o professor saiba sobre pessoas, perceba o que mexe com elas, o que faz alguém querer aprender, gastar tempo nesta ou naquela atividade.

Mais do que eficiente ou eficaz, a educação precisa ser efetiva, para que dê conta das necessidades presentes. A educação pautada na técnica, preocupada em acertar, em seguir fielmente as orientações pediátricas e pedagógicas, eficiente, não dá conta das necessidades do mundo contemporâneo. O método é importante, mas o preciosismo inoperante é o lado negativo de uma justa preocupação.

Ser eficaz também não é suficiente. A educação centrada nos resultados, sustentada por práticas tradicionais — fazer medo, comparar, enganar —, mostrou-se incapaz de formar pessoas aptas a viver significativamente em nossos dias.

Precisa-se de uma educação efetiva: educação centrada na auto-realização da pessoa, processo que ajude a manifestação das potencialidades individuais. Não é apenas o uso das técnicas corretas e nem a obtenção de resultados enganosos. Trata-se de formar pessoas competentes, íntegras e socialmente responsáveis.

O educador, além de um bom profissional, deve ser uma pessoa madura. Mas o que é uma pessoa madura? Muitos dos que se dizem maduros já apodreceram. Em que sentido se deve orientar o desenvolvimento pessoal?

Algumas características são próprias de uma pessoa madura: • Não é vítima das circunstâncias. Sabe que qualquer mudança significativa decorre de sua ação. O desenvolvimento pessoal é uma tarefa indelegável. • Tem auto-estima razoavelmente estável. Aceita-se e se permite conhecer-se melhor. • É capaz de dar e receber amor.

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Sabe interessar-se pelo outro, percebe suas necessidades, desenvolve o intercâmbio de afeto. • É capaz de colocar-se na pele do outro. Sabe ouvir, compreende o ponto de vista da outra pessoa. • É capaz de ser útil sem pretensões a salvador do mundo. A bondade por si só de nada adianta. E difícil ser bom sem ser bobo, ingênuo. • Sabe lidar com suas emoções. Tem autocontrole, dá vazão às emoções no momento adequado. • Sabe dar crédito adicional às pessoas. Não interpreta ações ou palavras alheias com malícia, acredita nas pessoas, está do lado da vida. • Encara os fatos com humor. Ao lidar com um fato, consegue um certo distanciamento, não exagera a sua importância. Tem humildade intelectual, espírito aberto para ver os fatos sob novos ângulos. Como educadores, gastamos grande parte do tempo em busca de conhecimentos. Muito

pouco do esforço é gasto no aprimoramento de habilidades de convivência, de comunicação; cuida-se pouco do crescimento pessoal. A educação tem-se importado pouco com a pessoa e se preocupado muito com os conteúdos, com os métodos, com as estratégias. Uma pessoa madura, no entanto, pode afetar positivamente a vida de gerações. Um bom professor (competência técnica + competência pessoal) tem influência na escolha de carreiras, na postura diante da vida, no comprometimento com as idéias, no exercício da cidadania. Um mau professor pode matar sonhos destruir vidas.

A ironia, a violência, a deslealdade, a permissividade, o jogo de poder, as baixas expectativas do professor contribuem muito mais decisivamente para os fracassos da educação do que a falta de verbas, as instalações físicas inadequadas, os métodos e as técnicas ultrapassados. A educação pode transformar a sociedade, mas, para isso, é necessário que os educadores se transformem.

Em A conspiração aquariana, Marylin Ferguson faz a seguinte afirmação: As pesquisas têm demonstrado que as crianças aprendem melhor com adultos espontâneos, criativos, incentivadores, fisicamente aptos... que buscam significados, em vez de fatos apenas... que têm elevada auto-estima... que encaram sua função como liberadora, e não como controladora dos alunos de aprendizagem mais lenta. Os bons professores estão mais interessados no processo de aprendizagem que na consecução de objetivos específicos. São os que admitem seus erros, que acolhem as idéias radicais dos seus alunos, discutem sentimentos, fomentam a cooperação, encorajam a participação dos estudantes em seu trabalho, proporcionam recursos além do cumprimento do dever. Humilhação, disciplina, punições e regulamentos inibem o aprendizado.

Em algumas profissões, não há como separar o profissional do pessoal. Assim é o magistério. Ser um bom professor implica ser uma boa pessoa, principalmente quando se trata de ser professor de crianças e adolescentes. Os conteúdos de uma disciplina são pretextos. O texto de um professor é sempre a educação, e há muito se sabe que mais se educa com exemplos do que com palavras.

No convívio diário com professores e alunos, tenho percebido que o conhecimento de um conteúdo, ainda que em nível altíssimo, não é suficiente para criar interesse e nem para garantir uma relação cooperativa em sala de aula. E isto por uma razão muito simples: a motivação é intrínseca, e, na vida, só vamos juntos com aqueles que amamos, e o conhecimento, apesar de imprescindível, não basta para despertar o amor.

Os professores que têm realizado trabalhos notáveis, extremamente importantes para seus alunos e fonte de muita alegria para eles próprios, apresentam características que são comuns a todos eles. São pessoas que percebem que, apesar de todas as dificuldades, é preciso tentar novos caminhos. São aqueles que conseguem a integração entre o que há de sabedoria no passado e o que é preciso de coragem para o futuro. São pessoas destemidas, ternas, amigas, compreensivas. Não vivem cobrando; fazem o que está ao alcance delas. Não encaram o novo, o desconhecido como ameaça, mas como oportunidade. Não bajulam, a segurança que têm decorre da competência que possuem. São criativos, são amados e sabem amar. Não têm medo da imperfeição, convivem bem com o que há de humano no outro. Gostam de aprender, não se

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julgam os donos da verdade. Não são ingênuos, têm visão precisa dos próprios limites. Não se prendem a picuinhas, sabem que a vida é muito maior que tudo isso. Estão comprometidos com a vida, acreditam no que fazem, têm uma proposta educacional; são criativos, pensam, propõem, falam com as pessoas certas, têm crença na vida, no ser humano. E bom viver ao lado deles. São presente. Constroem o futuro, mas sabem que não podem estar aquém nem além, têm de ser homens de seu tempo.

Entre as exigências das famílias, das empresas, do governo, e os anseios e as necessidades dos alunos, o verdadeiro educador sabe o que é preciso fazer e faz. A sua missão não é corresponder às expectativas. Ele está centrado em si mesmo, não vive ao sabor dos modismos, não é apenas um cumpridor de tarefas. Não deseja mudar de profissão. Não há revolta, ódio em seu coração, mas questiona a realidade, batalha por melhores condições de trabalho, discorda do que é injusto, luta pelos seus direitos, tem espírito de grupo, não se vende, coopera, participa, cria, aventura-se. Um programa de educação e treinamento deve ser capaz de:

• Criar possibilidades de aprimoramento contínuo nos níveis pessoal e profissional. • Propiciar às pessoas satisfação no trabalho e contribuir para o enriquecimento de suas vidas. • Permitir delegação e universalizar o autocontrole e a auto-inspeção. • Contribuir para a unidade da equipe, criando sinergia e melhorando os resultados, • Dar sustentação ao trabalho de realização dos objetivos da escola. • Propiciar embasamento teórico para as mudanças necessárias nos processos de aprendizagem e de ensino. • Sistematizar o processo de educação e treinamento na escola, tornando-o relevante e efetivo para as pessoas e para a instituição.

Um programa de educação e treinamento deve considerar os seguintes pressupostos: • As pessoas são diferentes umas das outras; aprendem de maneiras diferentes, em ritmos diferentes. • As pessoas nascem com uma inclinação natural para aprender e inovar; não precisam de recomendações para crescer, o crescimento é natural e orgânico. • O mundo do trabalho não deve ser fonte de esgotamento, mas lugar privilegiado de realização e criatividade. • O papel das lideranças é criar condições para que as pessoas tenham uma vida o mais enriquecedora possível. • Uma instituição tem o dever social de implementar ações que dêem às pessoas oportunidades de externarem e desenvolverem as suas potencialidades. • Os gastos com educação e treinamento não são custos, mas investimentos; nada muda, se as pessoas não se modificam. • Atualmente, as decisões importantes são, quase sempre, tomadas em grupo; pessoas que dependem umas das outras para decidir e agir precisam aprender em grupo; o aprendizado individual não é suficiente para a instituição. O aprendizado individual é quase irrelevante para o aprendizado organizacional. Diretores,

coordenadores de escolas estão sempre participando de seminários, de congressos, de cursos, mas o dia-a-dia de suas escolas permanece como sempre foi. Nas organizações atuais, muito mais do que em outras épocas, quase todas as decisões importantes são tomadas em grupo, as pessoas precisam umas das outras para agir. Não é suficiente que um aprenda, porque tão importante quanto o aprendizado é o processo de aprendizagem. A competência individual e o objetivo comum são indispensáveis, mas não são suficientes para a formação de equipes talentosas. A aprendizagem em grupo é que é o processo de dar unidade à ação, é que desenvolve a capacidade de um grupo criar os resultados que seus membros realmente desejam.

Não é difícil compreender a importância da aprendizagem em grupo para a formação de uma equipe. Numa corrida de São Silvestre, os corredores (há um bom número de excelentes atletas, grandes talentos individuais) têm um objetivo comum: vencer a corrida. Não se fala, no entanto, em equipes numa corrida de São Silvestre, mas se fala de equipes quando se trata de times de futebol. E comum se ouvir que fulano de tal (grande estrela) não jogará tal partida,

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porque ainda não se entrosou com o resto da equipe. E sabe-se que o entrosamento só acontece com os treinamentos, com um tempo de convivência.

As escolas querem ser reconhecidas como referência para as demais, pela excelência do seu trabalho educacional, precisam ter um processo sistemático de educação e de treinamento, precisam abrir espaço para que seus professores e funcionários possam conversar, possam aprender em grupo. As condições de trabalho oferecidas pela maioria das escolas brasileiras transformaram os professores em meros transmissores de conhecimentos. Os autores dos livros didáticos, cientes da falta de tempo do professor, passaram a elaborar manuais tão eficientes (planos de cursos, modelos de avaliação, propostas de atividades extracurriculares, folhas de respostas, sugestões de leitura, etc.) que dispensavam o professor de qualquer reflexão a respeito de suas atividades, de qualquer participação no processo de definição de programas, conteúdos e que, portanto, acabaram por transformar o professor em espectador do processo educacional.

Na maiorias das escolas, ou o professor está na sala de aula ou não está na escola. O ser professor consiste apenas em dar aulas. O professor não produz conhecimentos, só transmite. E como transmissor de conhecimento, o aluno já percebeu que a competência do professor é, muitas vezes, inferior a de um aparelho de televisão ou de um microcomputador.

Até mesmo o professor se sente muito mal, ano após ano, repetindo as mesmas histórias, contando as mesmas piadas. O resgate da figura do professor passa, necessariamente, pela capacidade de o mesmo gerar conhecimento. Tem-se verificado que os professores que pensam por si mesmos, que vão além dos livros didáticos, que têm uma filosofia de vida própria, que sabem o que querem com o que fazem, são respeitados pelos alunos e exercem um papel importante no desenvolvimento das pessoas.

A auto-estima de uma pessoa está intrinsecamente relacionada à sua capacidade de ser útil, significativa. No caso do professor não é diferente. Um professor de português que percebe que uma pessoa, tendo acesso ao livro didático algumas horas antes dos alunos, faria em sala o mesmo que ele, provavelmente se sentirá pouco significativo. Se for uma pessoa sadia, permanecerá pouco tempo nessa situação.

A escola dará uma grande contribuição à sociedade, quando encarar a aprendizagem em grupo não como estratégia, mas como disciplina que deve e pode ser aprendida, para que se garanta a unidade na ação e, portanto, resultados melhores e menor perda de energia.

Quando se coloca como um dos códigos da modernidade “a capacidade para conceber, trabalhar e decidir em grupo: aprendizagem cooperativa”, a escola não pode pretender dar conta de sua responsabilidade apenas exigindo trabalhos de grupo, sem que se desenvolvam em professores e alunos as habilidades necessárias para um trabalho em grupo efetivo. Não se pode esperar que haja aprendizado em grupo, se os participantes de uma equipe não conhecem nem mesmo as técnicas do tipos básicos de discurso: diálogo e discussão.

As escolas, apesar de serem instituições que lidam com o conhecimento, que têm o grosso de suas atividades relacionadas com a aprendizagem e o ensino, acreditam pouco no processo de educação e treinamento. Não são muitas as escolas que têm um sistema voltado para o desenvolvimento das pessoas. São, ainda, em menor número aquelas que têm no orçamento recursos alocados para um programa de educação e treinamento.

Falo de um sistema, de um programa, porque não se conseguem resultados com eventos, com ações esporádicas. Uma palestra aqui, um seminário acolá, a indicação casual de um artigo, a leitura descompromissada de um livro são insuficientes para uma escola implementar uma mudança, ou seja, mudar de patamar.

O diretor precisa acreditar no processo de educação e treinamento para alocar os recursos necessários, para garantir a sua realização e para incluir-se nele. Se não houver crença, diante da primeira dificuldade financeira da escola, o programa será interrompido e, muito freqüentemente, com os aplausos de professores e funcionários.

Na criação de um sistema de formação continuada ou, mais modestamente, na elaboração de um programa anual de educação e treinamento, alguns cuidados podem ser tomados, apesar da realidade de cada escola ser específica.

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Cuidados • Propor um programa que atenda às necessidades e às expectativas de todos os segmentos, isto é, com atividades para professores, técnicos educacionais, funcionários administrativos e de serviços gerais. • Buscar unidade nas ações de educação e treinamento, para que, a médio e a longo prazos, a escola tenha uma mesma linguagem em relação a assuntos como: disciplina, conhecimento, aprendizagem, ensino, avaliação, papel da família, serviços de apoio. • Buscar total sintonia entre as ações de educação e treinamento e os objetivos gerais da escola e os específicos de cada setor. • Propor atividades de duas naturezas:

— Atividades compulsórias: presença obrigatória das pessoas a quem se dirigem, remuneradas, atendendo às necessidades da escola. — Atividades livres: presença espontânea das pessoas, com inscrição prévia, fora do horário de trabalho, não-remuneradas, gratuitas ou pagas pelos participantes, atendendo necessidades e expectativas de crescimento pessoal e profissional.

• Realizar as atividades em datas, horários e freqüências definidos de comum acordo com os participantes, procurando evitar sobrecarga de trabalho. • Avaliar sempre toda e qualquer atividade do programa, buscando o melhoramento contínuo.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges

Lição 7: Comunicação Betona era uma mulher grande, como indica o nome; eu a conheci no interior do Estado de

Goiás, numa cidade pequena. Morena alta, mulher despachada, sem papas na língua, pessoa extremamente comunicativa, presença muito agradável; era dona de um restaurante. Almoçar ou jantar no restaurante da Betona sempre tinha dois atrativos: a comida, gostosa e farta, e a certeza de um bom papo.

Certa vez, depois de um riquíssimo dia de trabalho, lá fui eu para jantar no restaurante da Betona. Víamo-nos pouco; talvez por isso era sempre uma alegria muito grande quando nos encontrávamos. Eu estava com o diretor de uma escola e jantamos demoradamente. No final, já com a casa um pouco mais vazia, Betona veio sentar-se conosco.

No meio da conversa, ela me disse muito naturalmente: Pedro, eu agora tô com o Zé, e apontou para um senhor de uns 40 anos, que ajudava no atendimento às mesas. O Zé me falou que fazia dez anos que ele era apaixonado por mim. Riu gostosamente e completou: Pois é, Pedro, eu tô gostando tanto do Zé, ele apaixonado por mim, e só agora... Quem sabe o quê que o calado quer?

Há muito tempo não vejo a Betona, mas a frase “Quem sabe o quê que o calado quer?” ficou como ensinamento para mim. Quando um diretor reclama que um professor nunca faz o que a escola espera dele, quando a minha esposa lamenta que a faxineira faz tudo errado, eu lhes pergunto: Você já falou para ele ou para ela o que você quer? Quem sabe o quê que o calado quer?

Parece-me que uma das regras básicas da boa comunicação é dizer ao outro, com clareza, objetividade e gentileza, o que se espera, o que se quer dele. Um diretor não tem o direito de exigir que professores, funcionários, famílias adivinhem o que ele quer. Alguns acreditam que o fato de eles pensarem é suficiente para que os outros saibam o que deve ser feito. Quantos esforços inúteis dos empregados, quanta energia jogada fora, porque acontecem na contramão dos objetivos da escola, não por maldade das pessoas, mas por falta de comunicação.

Não dizer, não explicitar, sonegar informações são atitudes antiéticas, porque desrespeitam o outro, e pouco inteligentes, porque fomentam a fofoca. Quando não digo o que quero, forço o outro a adivinhar, e aí ele dá asas à imaginação. O diretor tem na comunicação da filosofia, da crença, dos valores, dos objetivos da escola, para todos os segmentos, e no zelo pela sua compreensão uma de suas funções mais importantes.

Outra regra: a boa comunicação requer credibilidade. Lembro-me (sem saudade) de um tempo, no Brasil, em que toda a vez que se falava que um ministro estava firme no seu cargo, era certo que ele seria demitido. Diante de uma informação, é muito comum as pessoas perguntarem: “Quem falou isso?”, querendo dizer: “Será que essa informação é verdadeira? Dá para acreditar no que foi falado?”.

O diretor precisa fazer o que diz; é preciso que haja coerência entre suas palavras e suas ações. Para que isto aconteça, dois fatores são importantes: (1) firme convicção quanto aos valores; e (2) integridade. Um diretor corre o risco de ficar à mercê das circunstâncias, dos modismos, se a sua liderança não estiver sustentada em princípios, em valores, e se isto acontece, adeus credibilidade. As pessoas confiam em outras quando estas lhes dizem que algo acontecerá e esse algo realmente acontece. A maneira mais fácil de desacreditar um supervisor ou um professor é não permitir que aconteça aquilo que disseram que aconteceria.

A falta de constância em relação aos objetivos, aos propósitos da instituição, às mudanças oportunistas quanto aos rumos da escola geram desconfiança, descomprometimento, descrença e confusão entre os empregados. A substituição de um diretor por outro, ocasionada pela busca de resultados financeiros de curto prazo, sem preocupações éticas, tem sido desastrosa para muitas instituições. A credibilidade, construída ao longo de muitos anos, evapora-se em pouco tempo. Um diretor é bem mais que um gerente de orçamento, alguém a quem se ordena que corte 10% do custo, alguém que obedece, sem questionamentos, à ordem para eliminar este ou aquele benefício, para demitir esta ou aquela pessoa. Sem princípios, o diretor se torna facilmente manipulável e desacreditado diante de seus liderados.

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Sem integridade, não há confiança. A boa comunicação não se restringe à troca de informações. Ela cria laços, energiza as pessoas, ela reforça a confiança. Havendo integridade, há respeito pelas pessoas, há escuta, há consideração pelas idéias divergentes. No trabalho junto às escolas, sempre encontrei muitas dificuldades, mas o único problema sem solução era encontrar, à frente de um grupo de professores e funcionários, um diretor sem integridade. Graças a Deus, isto aconteceu raríssimas vezes. Quando é assim, a solução é afastar o diretor, ou afastar-se dele.

O direito a uma comunicação clara, objetiva e gentil obriga a todos o respeito à língua, à consideração pelas características específicas dos ouvintes e leitores. A instituição escola não pode ser informal nas suas comunicações, não pode desconhecer as normas na elaboração de um ofício, não pode apresentar um texto confuso, ilógico ou recheado de erros gramaticais. Segundo Ferreira Gular, a crase não foi feita para humilhar ninguém, mas uma vírgula, uma letra, uma crase mal colocadas mexem com a imagem de uma escola. O diretor é responsável por todas as comunicações de sua escola, até mesmo por aquelas que ele não assina.

O diretor que fala para um grupo de faxineiros como se estivesse se dirigindo a um grupo de intelectuais não é gentil. A gentileza me leva a compreender o outro, ao respeito de suas necessidades. Certa vez, depois de uma reunião com o pessoal de serviços gerais, na qual a diretora lhes apresentou a visão, a missão e os valores da escola, eu perguntei a um dos presentes se ele havia gostado do encontro. Na maior simplicidade, ele me disse: “Gostei, professor. Não entendi quase nada, mas achei bonito; a diretora fala muito bem, a gente é que, é bronco”. A verdade tem a ver com o conteúdo da comunicação; a gentileza, com a sua forma.

Clareza e objetividade são outros traços da boa comunicação e há uma estreita relação entre essas características. Enquanto você não souber, com precisão, o que pensa, o que você quer com uma comunicação, não fale, não escreva. Converse, troque idéias, ouça as pessoas. Se o diretor estiver preparado para ouvir, muitas pessoas poderão ajudá-lo a não errar tanto. Os empregados, em todos os níveis, possuem experiências, habilidades, conhecimentos com os quais podem contribuir para que a escola acerte mais. Em comunicação, improvisar é quase sempre uma irresponsabilidade. Não aumente a angústia, o medo, a insegurança de seus liderados com comunicações confusas, destemperadas, desrespeitosas.

Sabe-se que tempo é dinheiro, mas, nas escolas, gasta-se desregradamente o tempo das pessoas. Há uma doença crônica entre nós: a falta de objetividade. A produtividade de reuniões, de encontros, de simpósios com a participação de professores é muito baixa. A experiência mostra que a falta de objetividade está relacionada com a falta de preparação e de comando.

Uma reunião de uma hora exige, pelo menos, três horas de preparação, para que seja produtiva. Marcar um encontro com professores e funcionários e não prepará-lo é irresponsabilidade. O objetivo de um encontro é que determina o número e a diversidade de participantes. Não se reúnem 300 pessoas para pensar sobre um assunto, a não ser que você encontre a dinâmica adequada para este tipo de encontro. Não se juntam professores e alunos no pátio de uma escola para algo que não seja do conhecimento prévio deles. Não se convocam pais para uma reunião sem lhes enviar a pauta, sem lhes indicar os seus objetivos e a sua duração. Nesses casos, a falta de informação precisa é um risco muito grande. Os eventos humanos são, por natureza, inusitados, e, com muita freqüência, é necessário improvisar, mas a boa improvisação só acontece quando houve planejamento anterior, quando você improvisa em cima de um roteiro preparado.

Uma reunião precisa ter dono. Alguém que se sente à cabeceira, que dê início, que diga o porquê de estarem ali, que explicite as regras do convívio naquele momento, que estimule as pessoas a contribuírem e que encerre o encontro. Se não houver comando, não haverá objetividade. Em poucos diretores encontrei competência para dirigirem uma reunião, e, em pouquíssimos, para terminá-las. Alguns eram extremamente desrespeitosos em relação ao tempo das pessoas, e o pior é que isto, muitas vezes, era entendido como disponibilidade para o trabalho, como dedicação à escola. Incompetência transvestida de generosidade.

“Um é sempre melhor.” Um local, um dia da semana, um horário. Aprendi isto num destes cursos rápidos sobre gerenciamento e me serviu muito na direção de escolas. As reuniões de rotina devem ser realizadas sempre num mesmo local, num mesmo dia da semana ou do mês e num mesmo horário. Isto evita esquecimentos, desencontros, comunicações excessivas. Você já

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deve ter ouvido, mais de uma vez, frases do tipo: “Poxa, faz uns 30 minutos que estou procurando por vocês”; “Oh! Já acabou, a reunião não era às 8 horas?”; ou “Você me desculpe, mas eu pensei que a reunião fosse hoje”.

Os diretores prolixos, sem objetividade, confusos, estão sempre muito ocupados. Pessoas ocupadas são um perigo para as instituições. Há algum tempo trabalhei com uma diretora com quem raramente se conseguia falar, e ela estava sempre atendendo alguém, pessoalmente ou por telefone. Passava o dia ocupada, mas a sua produtividade era muito próxima de zero. O tempo de um diretor não é dele, mas das pessoas. Deve haver gentileza nos relacionamentos, mas a cortesia não deve ser confundida com explicações desnecessárias, com detalhes irrelevantes, com alusões ao passado que nada acrescentam ao fato, com divagações que só servem para irritar o interlocutor. A desconsideração pelo tempo do outro é um traço do autoritarismo. Deus me livre daquela pessoa a quem você pergunta como vai, e ela lhe explica; a quem você pergunta pela família, e ela lhe conta a história de cada um dos seus três filhos.

É bom que, na rotina de seu trabalho, o diretor tenha certos cuidados, traduzidos, a seguir, em algumas proibições:

1. não permita que secretária, supervisores, coordenadores, gerentes administrativos, vice-diretor sejam obstáculos para o seu contato direto com alunos, professores, funcionários e famílias; 2. não transforme os membros da equipe técnica em moleques de recado; não é muito difícil de definir quem é o responsável por uma comunicação; nunca fuja da sua responsabilidade; 3. não permita que a comunicação daquilo que deve ser feito chegue aos funcionários e aos professores como se fosse um desejo, um capricho do diretor (a não ser que isto seja verdade); 4. não prometa o que você não tem certeza de poder cumprir; se perder a sua credibilidade, será muito difícil continuar diretor; 5. não sonegue informação, as pessoas têm o direito de saber as coisas; a informação é poder, mas se torna um poder inútil, se não for compartilhada; 6. não doure a pílula, mas também não seja deselegante; verdade e gentileza são preciosidades numa comunicação; 7. não culpe os outros pela não-compreensão de uma mensagem; procure melhorar a sua capacidade de comunicação.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges RELACÕES Lição 8: A Aliança com o Professor

Ser professor deve ser uma opção. Trabalhar nesta ou naquela escola, pertencer a este ou àquele sistema educacional, fazer parte desta ou daquela rede de escolas deve ser fruto de uma opção, mas nem sempre é assim. Ainda se vive uma realidade em que é comum o trabalhador ter de dar conta de uma tarefa, situações em que o trabalho não é parte da vida, mas apenas uma obrigação que se cumpre, para ganhar dinheiro, para viver a vida depois.

Na convivência com professores, percebe-se, com facilidade, quando a profissão foi escolhida e quando foi imposta pelas circunstâncias da vida. Percebe-se, também, com a mesma facilidade, quando há comunhão entre os objetivos pessoais e os da instituição. As pessoas mais saudáveis e as instituições com maior clareza de propósitos têm maior rapidez na solução dos conflitos que decorrem da falta de opção, mas o mercado, muitas vezes, força a permanência de certas situações. Se faltam empregos ou se faltam profissionais, a convivência desarmoniosa entre pessoas e instituições pode prolongar-se, com prejuízos generalizados.

Sem comprometimento, sob pressão, é quase impossível realizar um bom trabalho em qualquer área, e muito menos em educação. Qualquer realização, numa escola, depende da contribuição das pessoas; na maioria das vezes, depende da participação do professor. Quando o professor se torna um problema maior do que a contribuição que ele pode dar, é hora de se fazer alguma coisa por ele. Quando a rotina se torna um peso, quando desaparece a alegria de fazer o que se está fazendo, está na hora de fazer alguma coisa por si mesmo.

Diante de situações adversas, é freqüente a atitude de querer encontrar os culpados, em vez de identificar as causas do problema e buscar as soluções. Essa atitude leva o diretor a ver o professor como um inimigo e não como um aliado, como problema e não como uma solução. Uma das funções mais importantes de um diretor é cuidar do desenvolvimento dos seus professores. Se os professores são preguiçosos, se não se comprometem, se são intransigentes, sem espírito de cooperação, a única pessoa de quem o diretor poderá cobrar alguma coisa é de si mesmo.

Nas escolas em que o diretor justifica a sua incompetência falando mal do professor, este, quase sempre, justifica a sua desídia falando mal do aluno. É um círculo vicioso que prende as pessoas e que as impede de crescer e de encontrar as soluções adequadas. O diretor precisa ter o professor como parceiro privilegiado e batalhar diuturnamente para que esse parceiro tenha as melhores condições de trabalho. É fortalecendo o professor que o diretor se fortalece. Todo o esforço no sentido de resgatar o prestígio do professor é um sinal de inteligência do diretor.

Não acontece, em educação, nenhuma inovação que não tenha, em seu centro, as atitudes do professor. As crenças, os princípios e os sentimentos dos professores são o ar que se respira na escola e que determina a qualidade de vida que se desenrola nesse ambiente. Querer transformar uma escola sem cuidar do professor é meter os pés pelas mãos.

Atualmente, no Brasil, percebem-se políticas e ações mais concretas no sentido de ter a educação como prioridade dos governantes, mas ainda há equívocos no trato da profissão mais crítica para a saúde mental da sociedade. Diz-se, por exemplo, que a melhoria de salários não melhora a competência de professores, o que é uma meia- verdade. A curto prazo, é lógico que não se dobra a competência de um professor ao dobrar-lhe o salário, mas não há dúvida de que, numa sociedade capitalista, o indício mais concreto da valorização de uma profissão é a remuneração que se dá a ela.

Um país que pretenda ser rico e forte, construindo uma ordem social de convivência democrática, com eqüidade interna, isto é, sem pobreza, precisa cuidar melhor de seus professores. O conhecimento é a moeda mais importante da atualidade, e o educador é o banqueiro dessa moeda. Os educadores constituem o grupo com maior número de profissionais, a população de profissionais melhor distribuída no país, o grupo de profissionais com o maior contato direto diário e, mais importante do que tudo isso, os educadores são os profissionais que podem criar formas de pensar, de sentir e de agir.

Em qualquer processo de mudança na educação, o professor deve ser considerado como o elemento fundamental. Caso contrário, corre-se o risco de a mudança jamais chegar à sala de

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aula, ou chegar de tal forma que mesmo as melhores idéias sejam incapazes de gerar bons frutos.

É ilusório pensar que, dentro das salas de aula, acontecerá algo muito diferente do que acontece fora delas. Se as famílias tratam os professores como profissionais de segunda ou terceira classe, é ingênuo pensar que seus filhos irão tratá-los com respeito e consideração. Se os professores são vistos apenas como transmissores de conhecimentos, é esperar demais que os alunos cheguem além do simples acúmulo de informações. É querer muito que crianças e jovens gostem de ler ou escrever, quando convivem com professores que nunca escrevem e que mal têm tempo para ler um jornal no final de semana. Como afirma Seymour Sarason, os professores são incapazes de criar e de manter condições adequadas para os alunos, se essas condições não forem criadas e mantidas para eles, professores.

É preciso assegurar qualidade de vida ao professor, e isto tem a ver com salário digno, ambiente de trabalho apropriado (salas bem-iluminadas, ventiladas, número adequado de alunos, sanitários limpos, espaços próprios para atividades físicas, para recreios, cantinas, etc.), plano de saúde, plano de carreira e salários, complementação da aposentadoria, liberdade de associação, respeito aos acordos intersindicais, processo sistemático de educação e de treinamento, tempo de lazer, segurança no trabalho.

Durante muito tempo, a educação foi, neste país, obra de abnegados, talvez pelo fato de os educadores serem, em sua maioria, religiosos; hoje, no entanto, a situação é outra. A maioria dos professores é constituída por pais e mães de família que têm na profissão a sua única fonte de renda, e os proprietários de escolas já não são congregações e igrejas, mas empresários bem-sucedidos. Apesar de o contexto ser outro, querem que o professor continue com os votos de obediência e de pobreza.

Melhorar as condições de trabalho do professor (dar-lhe dignidade) é o caminho mais curto para uma educação de qualidade, O professor infeliz, amargurado, incompetente, aviltado, submisso, dependente, sufocado pela carga de trabalho, doente, inseguro é e será sempre incapaz de educar pessoas de modo significativo. É preciso que governantes, sindicatos patronais, proprietários e administradores escolares deixem de ver os professores como inimigos e lhes ofereçam condições adequadas de trabalho, para que possam contribuir na construção de uma sociedade mais justa e fraterna. Não dá para acreditar na honestidade de políticas, de projetos, de campanhas que querem uma educação de qualidade distanciando o professor do processo, desconsiderando as suas expectativas e necessidades, calando a sua voz.

Não há dúvida de que o professor é a peça-chave do processo educacional e de que seus sonhos e suas expectativas influenciam muito a vida de crianças e adolescentes. E aqui está o grande desafio. É, na melhor das hipóteses, ingenuidade, e, na maioria dos casos, cinismo e desonestidade exigir que professores tenham altas expectativas, quando esses profissionais são tratados de forma indigna pela sociedade.

No artigo “O ponto cego do ensino público”, publicado no jornal Folha de São Paulo, no dia 9 de março de 1997, 1º caderno, página 3, seção Tendências/Debates, o Professor Alfredo Bosi (Universidade de São Paulo) faz as seguintes afirmações:

Talvez pouca gente ainda se lembre, mas 1996 foi o Ano da Educação. De minha parte, reavivei a memória repensando uma pesquisa que empreendi há um ano sobre o tema “Educação: as Pessoas e as Coisas”.

O trabalho procurava pôr o dedo na chaga do nosso ensino primário. O mal de base não era a falta de vagas e, menos ainda, a escassez de salas de aula. A quase totalidade das crianças em idade escolar tinha e tem acesso ao 1º grau. Tampouco o ínfimo rendimento do ensino deveria ser atribuído a problemas de saúde dos alunos de baixa renda ou ‘à carência cultural’ das suas famílias, como por algum tempo se propalou. Fatores semelhantes já se constatavam nos anos de 1940 e 1950, quando, porém, as professoras primárias, as saudosas normalistas, obtinham resultados sensivelmente melhores que os atuais.

Descartadas as falsas pistas, resta a realidade nua e crua: a reprovação em massa nos anos iniciais, a evasão nos últimos, e o funil que se estreita brutalmente do 1º ao 2º ciclo.

Está na hora de encarar a questão crucial e tocar o centro nervoso do sistema do qual depende a regeneração das suas células. Esse centro é a situação real do nosso mestre-escola.

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Uma simples vista d’olhos na tabela nacional do salário dos professores primários acende uma luz no labirinto do fracasso escolar brasileiro. Tanto a sociedade civil quanto o Estado agem como se ignorassem este fato cotidiano, mas espantoso: o nosso professor primário é remunerado como se fosse um operário não-qualificado.

Tive o cuidado de comparar os vencimentos de docentes da rede oficial em vários Estados. O professor de 1º grau, aquele a quem se delega a missão de ensinar a ler, a escrever e a contar, ganhava, em média, R$ 2 por aula nas províncias mais bem aquinhoadas. Continua, pois, vigorando o primado das coisas sobre as pessoas. Computadores e TVs aos milhares sem professores respeitados e estimulados são sucata virtual. Livros didáticos sem mestres que os leiam e os trabalhem com garra e entusiasmo são pilhas de papéis destinados ao lixo do esquecimento.

Nada há a “reciclar”, nada a avaliar enquanto não se eleva a plataforma inicial. Só neste caso será possível atrair para a escola talentos e vocações. As coisas sem as pessoas são letra morta. Preferir coisas a pessoas não é realismo. É equívoco ou conformismo.

Na mesma edição da Folha de São Paulo, também no 1º caderno, página 14, seção Brasil, a Professora Azuete Fogaça (Universidade Federal de Viçosa), em entrevista concedida a Elio Gaspari, afirma: Qualquer melhora depende de duas coisas, sem as quais não adianta perder tempo. Primeiro, temos que valorizar os professores. Eles ganham uma miséria, proletarizam-se. O professor paulista recebe hoje o equivalente a 20% do que recebia no governo Franco Montoro, nos anos de 1980. Há uma pesquisa feita no Rio de Janeiro onde se vê que o magistério é hoje um patamar buscado por jovens que trabalharam como empregadas domésticas, fizeram o supletivo, um curso de habilitação de má qualidade, prestaram concurso e ascenderam social e economicamente. Elas estão progredindo, o que é muito bom, mas só poderão ser boas mestras se forem recicladas e assistidas.

Se quiser que a educação seja mesmo um ponto de alavancagem para o desenvolvimento deste país, está na hora de se cuidar, com mais seriedade, do bem-estar e da satisfação dos professores. E se os professores quiserem realmente contribuir para a construção de um país produtivo, um país ganhador, com eqüidade interna, isto é, sem pobreza, e para a construção de uma ordem social de convivência democrática, é necessário que sonhem, que tenham altas expectativas em relação a seus alunos, que os desafiem e que despertem neles a força da aspiração.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges

Lição 9: A Parceria com a Família Eu tinha 36 anos quando assumi, pela primeira vez, a diretoria de uma escola. Era um

colégio com mais de 3.500 alunos, famílias de classe média alta. Muitos professores, muitos funcionários. Uma equipe técnica com vários orientadores educacionais, com alguns psicólogos e supervisores. Escola leiga, mais democrática, com mais facilidade de acesso das famílias à rotina escolar de seus filhos.

Logo na primeira semana, um casal me procurou e me pediu para marcar uma entrevista com a supervisora das séries iniciais do Ensino Fundamental, segmento em que um de seus filhos estudava. Ao conversar com a supervisora, para marcarmos a reunião com aquele casal, percebi nela uma inquietação muito grande, um quase pavor. Lembro-me de que a supervisora colocou uma série de restrições à maneira como aqueles pais educavam seus filhos. Na semana seguinte, tivemos um encontro ótimo com o casal. Eles estavam muito satisfeitos com a transferência dos filhos para a nossa escola e percebiam, principalmente na filha que estava na 3 série do Ensino Fundamental, muito mais alegria e comprometimento com a escola. Estavam ali para nos agradecer e parabenizar.

A medida que acontecia a reunião, o semblante da supervisora ia desanuviando. Após o encontro, tranqüila e serena, ela me disse: “Professor, ainda bem que a reunião não era para reclamar, para botar defeito no trabalho da gente. Eu estava tão preocupada com esta reunião. Ontem perdi o sono...”.

A relação família/escola tem sido, na maioria das vezes, uma fonte de desgastes para as duas instituições. Tem sido uma relação marcada quase sempre pela desconfiança, pelo medo, pelo autoritarismo, pela transferência de responsabilidade, pela imposição de culpa, pelo desinteresse, pela superficialidade, pela incapacidade de ouvir, pela competição. Precisa ser assim? E claro que não. Sendo assim, só há prejuízos, nenhum ganho para as pessoas.

Por que é assim? Penso que uma das razões é o tradicional autoritarismo das escolas. Embora se fale muito na importância da integração família/escola, grande parte dos diretores ficaria extremamente feliz se as famílias os deixassem em paz.

Tenho ouvido, com muita freqüência, que o maior problema da escola não são os alunos, mas os pais. Para o autoritário, qualquer forma de diálogo é perda de tempo, qualquer pensamento divergente é deslealdade.

Unidade pressupõe diferenças. Onde não há diferenças, há uniformidade, mas não unidade. Buscar unidade é ter consciência de que as pessoas são diferentes, e de que as diferenças são a riqueza de um grupo, e não obstáculos para o trabalho em equipe.

A uniformidade é a característica dos ambientes autoritários. O autoritarismo sufoca as diferenças e gera bajulação, insegurança, competição exacerbada, relações superficiais e instrumentalizadas. O autoritarismo se alimenta do medo. Momentaneamente, o medo pode provocar mudanças, gerar resultados significativos, mas quase sempre são resultados inconsistentes. Aparentemente, tudo vai bem, não há conflitos, as pessoas concordam com tudo. Não há, no entanto, possibilidade de eliminar as diferenças e, com o tempo, mesmo quando há um processo de eliminação dos diferentes, o medo se mostra incapaz de sustentar o trabalho em grupo e, conseqüentemente, a sobrevivência de uma instituição. Em ambientes autoritários, fechados, ao ocupante de um cargo basta a autoridade que a instituição lhe transmite junto com o cargo. Ser chefe, ser pai, ser professor, em sociedades fechadas, autoritárias, são papéis que se desempenham com relativa facilidade, pois não há questionamentos, enfrentamentos, desobediências. A nossa linguagem, ainda que, algumas vezes, em tom de brincadeira, está repleta de exemplos que evidenciam tal postura em relação à autoridade.

“O professor nunca erra, às vezes se engana.” “E um beberrão, mas é seu pai.” “Quem pode manda, e quem tem juízo, obedece.” “A corda sempre arrebenta do lado do mais fraco.” “Não adianta, é sempre o professor quem tem razão.” O que acontece em nossos dias, no entanto, é que a sociedade se tem tornado mais aberta

hoje e as relações, forçosamente, vêm-se tornando mais democráticas. O processo de coação já

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não funciona numa sociedade que se globalizou (diversidade de usos e costumes, de morais, de sistemas sociais, com divulgação total, velocidade no acesso às informações). Se, a cada dia, pais, professores, autoridades têm mais dificuldade para imprimir respeito, sinal de que o simples “respeito” já não funciona como fator de coação, é preciso ensinar às crianças (e os adultos que permanecem infantis a grande maioria), como afirma Lauro de Oliveira Lima, o respeito mútuo, a discussão das regras, a negociação dos conflitos, a vigilância mútua a partir do pacto livremente estabelecido por todos, a democracia (enquanto a democracia não se instalar nas microestrutras, não haverá democracia molar).

Essa nova realidade requer um novo diretor, transformado. A sua autoridade decorre não do cargo que ocupa ou da função que exerce, mas de sua postura pessoal. Quanto menor o poder de coação das instituições, maior deve ser o poder pessoal daqueles que as representam. E cada vez mais difícil para as escolas garantirem um ambiente de trabalho adequado para seus professores, se estes não entendem que criar uma moral resultante da cooperação está na essência de seu trabalho diário em sala de aula.

Os diretores que se dispõem apenas a cumprir planejamentos e calendários, a cuidar tão-somente dos aspectos burocráticos do cargo, a dar conta das tarefas que lhes são impostas, despreocupados de seus gestos, reações, posturas, estão com os dias contados. O medo já não é mais aliado de ninguém, e os diretores autoritários começam a enfrentar problemas inimagináveis há cinco, dez anos. Tenho verificado que os diretores que pensam por si mesmos, que vão além das normas estabelecidas, que sabem o que querem, que têm a vida como projeto e não como tarefa, que são responsáveis amigos, compreensivos, abertos, trabalhadores, exercem um papel importantíssimo no desenvolvimento das pessoas e têm o respeito e a admiração das famílias.

A escola, hoje, tem necessidade de falar menos e ouvir mais. Precisa ser menos presunçosa, mais humilde, aprender também, e não apenas ensinar. O perigo, se não houver princípios e valores que sustentem a instituição, é perder o rumo, ficar à deriva. E preciso ouvir mais e não demais. Democratizar as relações é o caminho.

Os ambientes democráticos favorecem (não garantem) a. unidade, pois consideram-se as contribuições singulares, trabalham-se os conflitos, valoriza-se a participação, busca-se o consenso. O exercício da democracia exige, no entanto, muito mais das lideranças e requer maturidade dos parceiros. Aparentemente, as relações são mais tensas, os problemas são em maior número, o ambiente se torna mais confuso. O que ocorre, na realidade, é que as relações se tornam mais verdadeiras, os problemas vêm à tona e não se acumulam, o ambiente se torna mais descontraído, menos formal.

Outra razão, acredito até que em decorrência do autoritarismo, é a falta de compreensão da responsabilidade social da escola. Em princípio, as escolas estão certas: são justas, têm a verdade. Não há dúvidas dentro das escolas. Tudo muda, mas a escola permanece. O mundo é outro, as famílias se transformaram, os alunos são muito diferentes, mas a escola resiste. Na década de 1980, passei seis anos trabalhando como diretor de escola no norte do país. Em Tucuruí, no Pará, encontrei alunos que estavam repetindo uma mesma série pela quarta vez, e os professores tinham muitas explicações e justificativas para esse fato, todas elas centradas no aluno e nas famílias deles. A frase que eu mais ouvia era que esses alunos (e eram muitos) não davam conta da escola. Foi trabalho árduo mostrar-lhes que a escola é que devia dar conta dos alunos, e não o contrário. E possível jogar uma escola fora, abandonar um sistema educacional, mudar um método, mas é desumano excluir pessoas, matar sonhos, marginalizar crianças.

Em Porto Velho, certa vez, depois de muitas horas de conselhos de classe, nos quais os professores insistiam em falar dos defeitos, da incompetência, do desinteresse, das mazelas dos alunos, sem pensar nas soluções, sem consciência de que, para a maioria daquelas crianças e jovens que estavam conosco, a escola, provavelmente, seria a única chance de se tornarem cidadãos, eu perguntei aos professores se a única solução seria devolvermos os alunos às famílias e pedirmos a elas que nos fornecessem estudantes mais adequados à escola que tínhamos.

Há razões para que seja tão desgastante e tão pouco produtiva a relação família/escola que têm origem na forma de pensar e na postura das famílias.

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Diz o ditado que “quem nunca comeu melado quando come se lambuza”. Acostumados a não participarem de nada, a não terem voz e nem vez, padecendo também do mal do autoritarismo, os pais, quando se abriram as portas da escola, passaram a querer ditar normas, a definir assuntos sobre os quais não tinham o menor conhecimento. Também lhes faltou humildade e sobrou presunção.

Houve um momento de muita tensão. Professores, sem convicção quanto aos conteúdos que ensinavam e aos métodos empregados, perderam o chão. Diretores sem profundidade pedagógica, sem crenças, sem lucidez, sem clareza de objetivos, sem constância de propósitos foram manipulados pelos pais, criaram o caos no interior de suas escolas. Nunca se viu tanta indisciplina; nunca havia acontecido tanto desinteresse, nunca se verificara tal descomprometimento. Foi um momento riquíssimo, porque exigiu profundidade e definições, mas de muito sofrimento para os educadores.

Outra razão com origem na família é a tentativa de transferir a responsabilidade de educar para a escola. A responsabilidade primeira pela educação dos filhos é da família. Diante da complexidade da vida moderna, a família se sente incapaz de prover as crianças de todos os conhecimentos e habilidades de que estas necessitam para viver de modo significativo na sociedade; portanto, buscam as escolas. Há, contudo, um equívoco que vem acontecendo com freqüência: a família transfere para a escola a responsabilidade de educar os filhos que gerou. Tal responsabilidade não pode ser transferida, ela pode ser compartilhada, mas não transferida. A relação família/escola é relação de parceria. A escola, por mais esforços que faça, não dará conta de substituir a família. Professora não é tia, professor não é pai nem pode ser mãe; escola não é um segundo lar no sentido de continuar relações, processos, modelos que são característicos da vida familiar. Não se trata, evidentemente, de eliminar da rotina da escola o amor, a afetividade, a alegria, a relação civilizada entre as pessoas, mas de marcar com mais precisão a responsabilidade de cada uma dessas instituições no processo educacional.

Na parceria se estabelece uma relação entre iguais, entre pares. Havendo subordinação, submissão, é impossível falar de parceria. As dificuldades, no entanto, para criar uma verdadeira parceria com as famílias não devem desestimular o diretor. Atualmente, é muito difícil construir uma escola de qualidade sem o contributo dos pais. A experiência mostra que as escolas que estão melhorando são aquelas em que há uma participação efetiva dos pais, apoiando, cobrando nas horas certas e de maneira competente, assumindo responsabilidades e reconhecendo e aplaudindo os acertos.

Não tenho dúvida de que o diretor deve gastar parte de seu tempo para aprimorar a relação família/escola. Há muito o que aprender, de ambos os lados, para que essa relação tenha resultados que, de fato, contribuam para a qualidade da educação. Pensar na relação família/escola, considerando apenas as situações formais, como as reuniões de pais ou os contatos da direção com os país, ou achar que a participação da família é apenas trabalhar na festa junina da escola ou cuidar da festa de formatura, é simplificar perigosamente a questão. Cada aula, cada contato, cada telefonema atendido, tudo isso é hora da verdade para a escola.

A escola que chega para as famílias é a que os alunos levam para casa, e essa escola; quase sempre, é a que os professores levaram para a sala de aula. Em algumas situações, a melhor maneira de trabalhar a relação com a família é cuidar da relação com os professores, é criar uma sintonia interna. Antes do diálogo, é necessário que haja monólogo. A relação com a família, muitas vezes, tem seus picos de tensão nas salas de aula, na secretaria, nos gabinetes dos técnicos educacionais, na portaria da escola.

É importante compreender que a relação com as famílias se dá por meio de várias pessoas: alunos, funcionários, professores, técnicos educacionais. E preciso educá-los para essa relação. Vale, ainda, realçar que tal relacionamento é concretizado por meio de vários mecanismos: atendimentos (secretaria, supervisão, orientação educacional), mensagens escritas (avisos, circulares, cartas de cobrança, materiais didáticos), reuniões, entrevistas, pesquisas, propagandas, jornais, eventos (festa junina, festa da família, aniversário da escola), encontros sociais (festa de 15 anos da aluna da 8 série do ensino fundamental, lançamento do livro de poesias do professor de matemática da escola). Nada pode ser deixado ao acaso. Em todos os lugares, em todos os momentos, a escola, por meio das pessoas que nela trabalham e dos instrumentos de que se utiliza, está sendo vista e avaliada.

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GESTÃO ESCOLAR: GUIA DO DIRETOR EM DEZ LIÇÕES Pedro Faria Borges

Lição 10: A Sintonia com a Realidade São muitas as semelhanças entre as instituições educacionais, mas existem características

que são próprias de cada uma delas, e o diretor é sempre diretor de uma escola específica, num momento específico da história dessa escola.

Há diferenças significativas entre ser o diretor de uma escola cuja mantenedora é uma congregação religiosa, com duzentos anos de atuação na área educacional, e ser o diretor de uma escola recém-criada e mantida por uma cooperativa de pais; ser diretor e proprietário é bem diferente de dirigir um colégio de um grupo, dono de vários colégios, em várias localidades.

O modelo organizacional define a priori muito da função do diretor. Quando este apresenta características não-alinhadas com o perfil da instituição e desconsidera as regras implícitas na cultura da organização, quase sempre dá com os burros n’ água. Uma pessoa forte, centralizadora, competitiva, ainda que tenha muita experiência em educação, terá sérias dificuldades na direção de uma escola em que as decisões pedagógicas necessitem da aprovação de uma diretoria administrativa.

O calcanhar-de-aquiles de muitas escolas de cooperativas está na disputa entre o pedagógico (responsabilidade do diretor) e o administrativo (responsabilidade da mantenedora). Esse modelo, também presente em algumas escolas de congregações religiosas e de grupos educacionais, tem tudo para dar errado. Se algumas escolas conseguem ser bem-sucedidas, isto se deve à maturidade de seus diretores e ao papel cooperativo de seus líderes. Basta a vaidade de um presidente de cooperativa ou a falta de diálogo de um diretor de escola para entornar o caldo.

Vale repetir aqui o que foi dito no final da Lição 1: na escola, o diretor (sem adjetivações) deve ser a última palavra em todos os aspectos, quer sejam administrativos ou pedagógicos. As mantenedoras mais ajudam quando se afastam do que quando se intrometem na rotina, nas questões operacionais. Assim como o diretor se fortalece quando fortalece o professor, também se torna forte a instituição quando dá força ao diretor, quando respeita e apóia as suas decisões. Uma escola passa por estágios em seu desenvolvimento. Há diferenças entre dirigir uma escola na sua fase de implantação e dirigi-la daí a dez anos, quando premissas, valores e princípios estão sendo, ou já foram construídos pela instituição. Há momentos em que se depende muito da energia, da forte convicção pessoal do diretor para que a escola supere os obstáculos, enfrente com sucesso as dificuldades, os problemas do dia-a-dia. O diretor, neste momento, deve ter as características de um empresário: criar esperança e gerar estímulo no grupo.

Quantas escolas começaram numa sala emprestada ou na casa de seus donos e, em função da energia e da convicção pessoal de seus proprietários, se transformaram em grandes empresas! Quantos grupos educacionais, que têm hoje milhares de alunos, iniciaram as suas atividades com uma turma! Dirigir uma escola, em que você conhece intimamente todos os funcionários, professores e, até mesmo, os alunos, em que você é o diretor, secretário escolar, supervisor, orientador educacional, em que você é o chefe do pessoal de limpeza e o responsável pela cantina, exige competências e habilidades diferentes das que são necessárias para o diretor de uma escola que cresceu, que tem muito mais alunos, que contratou profissionais especializados para as funções, que terceirizou serviços, que ampliou as suas relações com a comunidade, que passou a ter uma presença na mídia, que se tornou referência para outras escolas.

Tenho observado que, em muitos casos, os fundadores permanecem na direção por mais tempo do que seria conveniente. Segundo Edgar H. Schein, o problema de fazer a transição possui dois componentes: (1) o fundador-construtor não quer deixar o papel de liderança, ou não está emocionalmente capaz de fazê-lo; ou (2) ele cria (muitas vezes de forma inconsciente) uma variedade de processos organizacionais que impedem o crescimento da próxima geração de dirigentes. Ainda conforme Schein, no âmbito da personalidade, os dirigentes freqüentemente impedem potenciais sucessores de terem o tipo de experiência de aprendizado que lhes possibilitaria assumir a direção, ou, pio prejudicam quaisquer sucessores que demonstrem força e competência para assumir a direção.

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Acontece, às vezes, quando a permanência dos fundadores começa a gerar prejuízos para a instituição, de eles nomearem substitutos extremamente fracos e de continuarem mandando por meio do diretor, o que traz maiores prejuízos, só servindo para que continuem incompetentemente exercendo a liderança. E comum o fundador se afastar e, posteriormente, retornar como salvador da pátria. Não conheço caso algum em que o retorno de um fundador tenha sido benéfico para a instituição.

Cada etapa de desenvolvimento de uma escola tem exigências específicas, e o bom diretor em uma fase pode ser o diretor incompetente de uma outra. Se em determinado momento é preciso criar e sustentar uma cultura, em outro, é necessário ser um agente de mudança. As vezes, precisa-se de um empreendedor; às vezes, a carência é de um bom gerente.

O diretor deve estar sintonizado com as necessidades e expectativas da situação específica vivida pela escola. Isto parece óbvio, mas é bem mais freqüente do que se imagina a ocorrência de diretores que dirigem suas escolas em função de suas características e preferências, negligenciando as necessidades institucionais. E até natural que seja assim, mas não é conveniente que seja assim. “A la patria se la sirve y no se la toma para servirse de ella” disse o líder cubano José Martí. Substitua pátria por escola e compreende-se qual deve ser a essência da relação do diretor com a instituição.

O diretor é o maior responsável pelos resultados da escola. Ele deve ter olhos para o todo da instituição; não pode estar o tempo todo olhando para o próprio umbigo. Ele deve conhecer as características dos seu subordinados e ter lucidez para definir as prioridades. Aquele que chega à direção de uma escola e ignora a realidade, agindo como se boas idéias fossem suficientes para torná-lo um diretor de sucesso, corre o risco de, muito rapidamente, fracassar. Conhecer os pontos fortes e os pontos fracos da organização é fundamental na definição das prioridades e na implantação de - mudanças.

Em trabalhos de consultoria, pude presenciar o desastre da implantação de certas mudanças, por não se considerarem o nível e a postura de professores e funcionários da escola.. Por maior que seja a escola, o diretor precisa conhecer seus professores e funcionários. Em situações de conflito, em momentos de tensão, o diretor costuma afastar-se, isolar-se e refugiar-se nas tarefas burocráticas do cargo, perdendo o contato direto com as pessoas.

Por maior que seja a lealdade de supervisores, de coordenadores, de orientadores educacionais, de gerentes administrativos, nada substitui a percepção, o conhecimento que nasce do contato do diretor com os subordinados. Estar na sala de professores, andar pelos corredores, visitar as salas de aula, estar presente na secretaria escolar, na cantina, na praça de esportes, nos pátios devem fazer parte da rotina do diretor. Como foi dito na Lição 2, visibilidade e acessibilidade são inerentes ao cargo de diretor.

Os resultados de uma organização são obtidos por meio de processos executados por pessoas. A implantação de qualquer mudança deve levar em consideração esses elementos. Quando se trata de colocar em prática uma teoria, de mudar uma visão, de modificar velhos padrões, dois caminhos podem ser seguidos. A figura acima, apresentada por José Luís Santana, Consultor da Fundação Dom Cabral, em curso ministrado no SEBRAE/MG, mostra esses dois caminhos:

1. Curto caminho longo — Começa-se, a partir de uma teoria, a mudar processos, esperando que as pessoas se modifiquem para dar conta das mudanças ocorridas na empresa. Aparentemente, esse caminho é curto. R mudam-se os processos, mas não há sustentação para as mudanças. As pessoas não se transformam e, em pouco tempo, vem a descrença, surge o desânimo, perde-se a credibilidade e o caminho a ser retomado torna-se muito mais longo.

2. Longo caminho curto - E o caminho que passa primeiro pelas pessoas. Mudam-se as pessoas e, a partir daí, muda-se o modo de fazer da empresa, mudam-se os processos. Aparentemente, esse caminho é longo: é mais demorado mudar pessoas, é preciso que elas queiram mudar. Esse caminho, no entanto, é mais curto, porque não há retrabalho, não exige fiscalização.

A mudança, nas escolas, vem acontecendo por meio do curto caminho longo. Diretores, coordenadores, supervisores tomam contato (por meio de leituras, de freqüência a congressos, simpósios, cursos) com novas idéias, metodologias, modelos gerenciais, ficam entusiasmados e

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decretam mudanças da noite para o dia. Muda-se muito e continua tudo do mesmo jeito, E paradoxal, mas é assim que tem sido.

Neste capítulo, está-se tratando do processo de mudança, e não de mudanças. A palavra processo é a chave. Sem a compreensão dessa palavra, a liderança corre o risco de falhar na condução das mudanças necessárias. O processo de mudança é complexo. O conhecimento, apesar de necessário, não é suficiente para mudar uma pessoa. Se não houver sensibilidade para perceber o ritmo ideal, acontecem os atropelos, as representações, as maquiagens.

As mudanças de comportamento exigem um tempo, e as dificuldades para tais mudanças crescem na medida da profundidade em que devem ocorrer. Na escola, as mudanças mais significativas são sempre aquelas que decorrem da mudança de pensar das pessoas, principalmente dos professores.

O diagrama de Hersey, figura a seguir, apresenta duas formas de promover mudanças em um grupo de pessoas:

Caminhando de cima para baixo e da direita para a esquerda, tem-se um processo de mudança diretiva, ou impositiva. Essa forma de mudança dificilmente atinge o nível de compreensão ou de conhecimento. E a mudança por decreto; às vezes, necessária e quase sempre complicada.

Caminhando de baixo para cima e da esquerda para a direita neste diagrama, inicia-se com um processo de mudança por meio da compreensão, ou seja, o indivíduo adquire primeiro o conhecimento; depois, adquire consciência e se predispõe a mudar. Finalmente, aplica-se o conhecimento e muda o comportamento. Essa é uma mudança de dentro para fora, porque vem da mudança de compreensão do indivíduo.

Comparando os dois processos, vê-se que o segundo é muito lento, porque depende da mudança de compreensão e aquisição de conhecimentos pela pessoa. Em compensação, por esse caminho conseguem-se mudanças definitivas e consistentes. O primeiro é mais rápido, mas pode ter dificuldades de aceitação, dependendo do nível das pessoas que se quer mudar. Além disso, as mudanças “por decreto” não costumam ser duradouras e raramente atingem o nível da compreensão individual. O ideal é motivar para a mudança, dar o conhecimento por meio de educação e - treinamento e dirigir a mudança por meio da liderança da administração. Isto equivale a caminhar nos dois sentidos no diagrama de Hersey.

As dificuldades existem, e ignorá-las é dificultar ainda mais qualquer processo de mudança. A realidade pode não ser do meu agrado, mas é o que é. Uma das funções da liderança é encontrar o antídoto contra essas doenças. Algumas ações já foram catalogadas pela psicologia e servem para tratar dessas dificuldades.. • Seja construtivo — Fale dos benefícios da mudança, não se detenha nas deficiências antigas. • Seja paciente — Comece devagar, prossiga devagar. Faça experiência, escolha um setor, um segmento para teste; dê tempo suficiente para que as pessoas envolvidas na mudança adquiram, sem apreensões, os novos conhecimentos, avaliem os méritos da mudança. • Evite surpresas — A previsibilidade traz segurança; esclareça todo o processo para as pessoas. • Busque a participação — E uma maneira de evitar surpresas, permite a comunicação entre os contrários, desvenda a realidade. • Trabalhe com as lideranças informais — Todo grupo tem seus líderes; convencer esses líderes é uma etapa importante no processo de mudança. • Estabeleça nexos entre o que está sendo feito e o que deverá ser feito — Isto facilita a compreensão, tranqüiliza as pessoas. • Trate as pessoas com dignidade — Tenha consideração por todas as perguntas, gaste tempo com as pessoas, com suas dúvidas, com suas apreensões, com seus medos.

Ter lucidez para definir as prioridades é fundamental na direção de uma escola. Quantas vezes pude presenciar a preocupação excessiva de diretores com a modernização das instalações físicas e dos equipamentos, sem nenhuma ação quanto à obsolescência ou até ausência de um projeto pedagógico. Por outro lado, não são raros os casos de excelentes profissionais que deixam certas escolas por falta de condições de trabalho: salas inadequadas, horários malfeitos, salários em atraso.

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O diretor é responsável por indicar por quê, onde, quando e como as energias devem ser gastas. Em muitas escolas, há desperdício de recursos e gastos desnecessários de energia, porque não existe foco para as ações. Quando se quer tudo ao mesmo tempo, quase nada se consegue. Já disseram que a melhor maneira de comer um boi é fatiá-lo em bifes. Antes de começar a fazer, é importante que se gaste um tempo para definir o que deve ser feito.

As metas da escola, a sua situação específica no momento e a disponibilidade de recursos são os parâmetros para a definição de prioridades. Isso evita os modismos e assegura a constância de propósitos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CALKINS, L.M. A arte de ensinar a escrever: o desenvolvimento do discurso escrito. Porto Alegre: Artmed, 1989. DEMING, W.E. Qualidade: a revolução da administração. Rio de Janeiro: Saraiva, 1990. DRUCKER, P.F. As novas realidades. São Paulo: Pioneira, 1991. FERGUSON, M. A conspiração aquariana. Rio de Janeiro: Record, 1992. FREIRE, P. O profeta da esperança. Revista Dois Pontos, Belo Horizonte, v. 3, n.24, jan./fev. 1996. MATURANA, H. La democracia es una obra de arte. Colombia: Editorial deI Magistério, 1994. MATURANA, H. Biología deI fenómeno social. CAMACOL, n. 48. SENGE, P.M. A quinta disciplina. São Paulo: Best Selier, 1990. SERGIOVANNI, T.J.; CARVER, F.D. O novo executivo escolar: uma teoria de administração. São Paulo: E. P. U., 1976. TORO, J.B. La construcción de Nación y la Formacián de Educadores en Servício. Bogotá: Fundación Social, 1994.