Gestão pública contemporânea e os desafios para além de 2015

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1 Gestão pública contemporânea e os desafios para além de 2015 Gestão pública contemporânea e os desafios para além de 2015 Paulo de Tarso Almeida Paiva FE1403 Na medida em que a economia brasileira se torna cada vez mais central no contexto global, crescem os desafios para a superação de gargalos e ampliação da competitividade nacional no cenário internacional. Para fazer frente a essas necessidades, empresas privadas e poder público precisam agir em um ambiente de grande sinergia. Nesse contexto, a FDC vem desenvolvendo soluções educacionais para o setor público, das esferas federal, estaduais e municipais, que vão desde a gestão por competência até soluções customizadas, atendendo às necessidades específicas de cada setor e tendo como premissa a agregração de valor para a sociedade. Este artigo é uma contribuição a essa reflexão. “Senhor, são os remos ou são as ondas o que dirige o meu barco?” Emílio Moura A sociedade brasileira tem pela frente uma oportunidade singular para buscar novos paradigmas de crescimento e ampliação do desenvolvimento econômico e social. Nas últimas décadas, o país enfrentou diversos desafios e vem passando por mudanças significativas, que precisam ser canalizadas para a construção de uma sociedade mais avançada e transformadora. Para isso, é preciso consolidar alguns conceitos do que podemos designar como “gestão pública contemporânea”, visando criar um ambiente propício aos avanços políticos, econômicos e sociais que desafiam o país a partir de 2015. Após experiências pouco enriquecedoras no passado, cujas origens remontam ao Estado Colonial e patrimonialista, notadamente absoluto, centralizado e interventor, sucedido mais tarde pelo Estado Novo, marcado por princípios burocráticos e corporativos, surgiu, bem mais recentemente, a perspectiva de implantação de uma terceira onda do gerenciamento da administração pública. Estamos, portanto, diante de uma grande oportunidade de implantar efetivamente, em escala nacional, uma gestão pública contemporânea, que parte de uma racionalidade bastante distinta de todas as experiências anteriores. Ela tem como pilar a concepção de um Estado eficiente e voltado para resultados, que utiliza ferramentas e conceitos oriundos da gestão privada, fazendo as adequações necessárias para a plena aplicação deles no âmbito público. Acreditamos, portanto, que a boa governança no setor público depende, fundamentalmente, de cinco premissas: transparência; eficiência da política fiscal; solidez das finanças públicas; eficácia nos resultados; eficiência na prestação de contas. Essas premissas já começam a se tornar realidade em função de algumas mudanças recentes que ocorrem na economia nacional, em decorrência do avanço da democracia brasileira, da consolidação dos mercados no país e, ainda, em função das próprias crises que assolaram a conjuntura mundial no final do século passado, o que proporcionou maior visibilidade às economias emergentes.

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A FDC vem desenvolvendo soluções educacionais para o setor público, das esferas federal, estaduais e municipais, que vão desde a gestão por competência até soluções customizadas, atendendo às necessidades específicas de cada setor e tendo como premissa a agregração de valor para a sociedade. Este artigo é uma contribuição a essa reflexão.

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1Gestão pública contemporânea e os desafios para além de 2015

Gestão pública contemporânea e os desafios para além de 2015Paulo de Tarso Almeida Paiva

FE1403

Na medida em que a economia brasileira se torna cada vez mais central no contexto global, crescem os desafios para a superação de gargalos e ampliação da competitividade nacional no cenário internacional. Para fazer frente a essas necessidades, empresas privadas e poder público precisam agir em um ambiente de grande sinergia.

Nesse contexto, a FDC vem desenvolvendo soluções educacionais para o setor público, das esferas federal, estaduais e municipais, que vão desde a gestão por competência até soluções customizadas, atendendo às necessidades específicas de cada setor e tendo como premissa a agregração de valor para a sociedade.

Este artigo é uma contribuição a essa reflexão.

“Senhor, são os remos ou são as ondas o que dirige o meu barco?”

Emílio Moura

A sociedade brasileira tem pela frente uma oportunidade singular para buscar novos

paradigmas de crescimento e ampl iação do desenvolvimento econômico e social. Nas últimas décadas, o país enfrentou diversos desafios e vem passando por mudanças significativas, que precisam ser canalizadas para a construção de uma sociedade mais avançada e transformadora.

Para isso, é preciso consolidar alguns conceitos do que podemos designar como “gestão pública contemporânea”, visando criar um ambiente propício aos avanços políticos, econômicos e sociais que desafiam o país a partir de 2015.

Após experiências pouco enriquecedoras no passado, cujas origens remontam ao Estado Colonial e patrimonialista, notadamente absoluto, centralizado e interventor, sucedido mais tarde pelo Estado Novo, marcado por princípios burocráticos e corporativos, surgiu, bem mais recentemente, a perspectiva de implantação de uma terceira onda do gerenciamento da administração pública.

Estamos, portanto, diante de uma grande oportunidade de implantar efetivamente, em escala nacional, uma gestão pública contemporânea, que parte de uma

racionalidade bastante distinta de todas as experiências anteriores.

Ela tem como pilar a concepção de um Estado eficiente e voltado para resultados, que utiliza ferramentas e conceitos oriundos da gestão privada, fazendo as adequações necessárias para a plena aplicação deles no âmbito público.

Acreditamos, portanto, que a boa governança no setor público depende, fundamentalmente, de cinco premissas:

• transparência; • eficiência da política fiscal; • solidez das finanças públicas; • eficácia nos resultados; • eficiência na prestação de contas.

Essas premissas já começam a se tornar realidade em função de algumas mudanças recentes que ocorrem na economia nacional, em decorrência do avanço da democracia brasileira, da consolidação dos mercados no país e, ainda, em função das próprias crises que assolaram a conjuntura mundial no final do século passado, o que proporcionou maior visibilidade às economias emergentes.

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Vale salientar que esse novo cenário, propício à implantação de uma gestão pública contemporânea, decorre também de recentes criações de novos padrões e códigos de conduta no contexto macroeconômico, entre os quais, podemos destacar:

• Iniciativa do FMI, que estabeleceu novos procedimentos e padrões de melhores práticas de transparência para as políticas monetária, financeira e fiscal.

• Os acordos de Basileia, que implantaram novos padrões para a supervisão bancária em âmbito mundial.

• A aprovação, nos EUA, do Sarbanes-Oxley Act para o setor privado.

• A adoção, por parte das bolsas de valores, de práticas diferenciadas de governança corporativa (novo mercado).

Por outro lado, também estão contribuindo para esse processo algumas experiências de reformas de gestão pública, que têm como referência a criação de um Fórum sobre a reinvenção de governos no âmbito das Nações Unidas.

Algumas economias desenvolvidas já vinham introduzindo mudanças significativas na gestão pública desde os anos 1980, como ocorreu na Inglaterra, Austrália, Nova Zelândia, Canadá e Suécia. Mais recentemente, outras iniciativas nesse sentido surgiram no Chile, Costa Rica, Colômbia e Brasil.

Podemos sintetizar, portanto, o conceito de “governo eficiente” com base em quatro pilares da boa governança no setor público: Reforma do Estado, Padrão de Gestão, Padrões Éticos de Comportamento e Implementação de Políticas Públicas.

E esse paradigma inovador de gestão decorre da introdução de novos elementos na administração pública, como o planejamento estratégico, a boa formação de gestores públicos, a determinação de se implantarem gestões de mudança e de projetos e a criação de incentivos remuneratórios associados à consecução de resultados.

É possível estabelecer que a gestão pública deve seguir padrões que garantam seu melhor desempenho, transparência e integridade. Nesse sentido, a divulgação periódica de indicadores de desempenho de execução fiscal e de resultados é importante para garantir a transparência e a integridade.

Nesse processo, destacam-se dois imporantes procedimentos gerenc ia is : a ava l iação e o acompanhamento do desempenho na execução de programas, políticas e projetos e a avaliação de resultados e impactos.

Tudo isso dito, podemos, então, identificar alguns desafios a essa gestão pública contemporânea. O principal deles, sem dúvida, é conseguir conciliar os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal com os programas, os projetos e as ações do governo. Os instrumentos para isso são a governança e a gestão, com base em ações eficazes de políticas públicas e de equilíbrio fiscal.

Outros desafios não menos importantes: conciliar as políticas públicas com as restrições financeiras, fazer mais e melhor com menos, melhorar a qualidade dos serviços, otimizar o uso dos recursos financeiros e humanos e inovar nos processos e nas práticas de gestão.

Os desafios para o futuro

Uma vez estabelecidos os conceitos, as características e o cenário geral para a implantação de uma gestão pública contemporânea, podemos refletir sobre um contexto bastante real e de grande interesse da sociedade brasileira – os desafios a serem enfrentados pelo país a partir de 2015, quando se inicia um novo mandato presidencial no país, que emergirá das eleições de outubro próximo.

Para que possamos estabelecer as bases da boa governança no futuro, a curto e a médio prazos, é preciso, contudo, lançar um olhar sobre a conjuntura política e econômica do Brasil de hoje e do passado recente.

Há duas leituras distintas sobre a conjuntura atual que podem ser ilustradas pelas respostas dos cenários “a” e “b” seguintes diante da seguinte indagação:

Como você vê a economia brasileira hoje?Cenário a: você vê o Brasil assim?

• “O PIB, nos últimos anos, está crescendo, em média, 2% ao ano. Dada a expansão demográfica de 0,8%, a renda per capita está aumentando em 1,2%, anualmente.

• As taxas de desemprego são as mais baixas já registradas pela Pesquisa Mensal de Empregos, e o nível do emprego formal como proporção do pessoal ocupado é o maior das últimas décadas.

• A inflação está dentro da meta, como costuma afirmar a presidente Dilma.

• A dívida pública líquida como proporção do PIB está abaixo de 40% e, convém lembrar, em passado não muito distante havia ultrapassado 60%.

• O país acumula reservas internacionais acima de 370 bilhões de dólares.

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3FDC Executive

• A nova classe média tem acesso ao consumo como nunca antes nesse país.

• Enfim, a economia brasileira vai muito bem, obrigado”.

Cenário b: ou você vê o país assim?

• “O crescimento é medíocre (e não há crises para servir como álibi).

• A inflação está perigosamente próxima de uma região escorregadia onde atolaram e afundaram alguns países vizinhos.

• As contas externas e fiscais permanecem flagrantemente fora de lugar.

• Há problemas setoriais com potencial explosivo (como no setor de energia, petróleo e também na mobilidade urbana).

• A produtividade estagnou há anos.

• E a confiança do investidor (nacional e estrangeiro) atingiu os piores níveis em muitos anos”.

Há, no país, diferentes leituras do contexto econômico, como ilustrado nesses exemplos. O debate se torna mais profícuo na medida em que se analisam tais proposições.

O que se percebe, contudo, é um cenário que transita entre os dois. Uma evidência disso é o recente rebaixamento do rating do país por parte da agência de classificação de risco Standard & Poors.

Segundo a instituição, o rebaixamento se deu não em razão de risco imediato de default, mas por uma série de indicadores relacionados com a conjuntura do país. Os principais entraves macroeconômicos do país estão relacionados, para a agência, a problemas com a política fiscal, dificuldades de ajustes na economia em função das eleições de outubro, fragilidades nas contas externas, perspectiva de baixo crescimento do PIB em função de fatores cíclicos e estruturais e enfraquecimento da força de trabalho. Tudo isso num contexto de redução da capacidade de ação do governo face os entraves externos.

Objetivamente, o fato é que a confiança nos fundamentos macroeconômicos do país estão se esvaindo, com base no que podemos definir como “a armadilha da renda média”. Isso ocorre, basicamente, pelos seguintes fatores: o país vive um baixo crescimento, na média de 2% ao ano; a taxa de investimentos (em relação ao PIB) ainda está aquém da necessária, a produtividade no país tem crescido também num ritmo baixo, a infraestrutura em geral é precária e insuficiente, as reformas microeconômicas (trabalhista, previdenciária e tributária) não ocorreram, e o programa de privativações é ainda incipiente e inadequado. Tudo isso no contexto de uma economia ainda muito fechada.

O quadro seguinte demonstra como as estimativas de crescimento do Brasil até 2015, segundo avaliação do FMI, estão abaixo da média de outras nações que formam os BRICS, como China e Índia, ou mesmo outros países da América Latina, como Argentina, Chile, Colômbia e Peru.

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Concomitantemente, o Brasil encontra-se na 56ª posição no ranking de competitividade do World Economic Forum. Segundo a instituição, os principais fatores que explicam esse fraco desempenho são a oferta inadequada de infraestrutura, a excessiva carga fiscal e de impostos em geral, a ineficiência da máquina administrativa governamental e o excesso de regulamentação das relações de trabalho.

Pois bem, diante de um cenário como esse, cabe indagar: quais os principais desafios para o futuro? Acreditamos, inicialmente, que estamos diante de duas prioridades: recuperar a credibilidade governamental e desarmar a armadilha da renda média.

Se formos levar em conta a agenda política e econômica nacional, podemos estabelecer 2015 como o ano de se promoverem as mudanças necessárias nesse contexto.

A pergunta, então, é: quais as prioridades em termos de políticas públicas para o país?

Em debates com empresários e especialistas, é comum listarmos algumas das ações prioritárias para se reestabelecer o crescimento econômico do país, como apresentado no quadro a seguir. Em quase todas as ocasiões, muito pouco se discorda sobre “o que fazer” para se alavancar a economia. A grande indagação, na verdade, é “como fazer?”

Este é o ponto verdadeiramente crucial desta reflexão: como garantir a qualidade das “entregas” das políticas públicas.

O que fazer para preparar o país para o crescimento econômico:

• Abrir a economia. • Reduzir o Custo-Brasil. • Ampliar a infraestrutura física. • Aumentar a taxa de investimentos (I/PIB).

• Estimular os investimentos privados.

• Focar na qualidade da educação.

• Aumentar a produtividade.

Para o país resgatar sua capacidade de investimento e de crescimento, implantando uma gestão pública contemporânea, é preciso, antes de tudo, superar um modelo de administração pública que muitas vezes não responde com a eficiência requerida para os avanços necessários.

Nesse contexto, fica evidente a necessidade de o país encarar o desafio imediato de perseguir novos patamares de governança e de excelência gerencial – sempre tendo como base os valores de transparência, responsabilidade, equidade e prestação de contas.

Como salientado, o fundamental, na atual conjuntura, não é mais buscar definir o que fazer, mas como fazer, ou como desenvolver as ações transformadoras da gestão pública. Sugerimos, para concluir, três iniciativas essenciais:

• Investir na escolha e na definição das políticas públicas necessárias, priorizando o planejamento estratégico, as metas e os resultados.

• Investir na capacidade institucional, com base na boa governança e na gestão de qualidade.

• Investir na capacidade gerencial, cujas referências devem ser o comprometimento com a missão, os valores e resultados, as competências, a meritocracia e a liderança.