Globalização e Relações Laborais em Portugal: uma intervenção ...

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6 (*) Investigador Principal do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. (**) Assistente de Investigação do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. (***) Assistente de Investigação do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. CAPÍTULO Globalização e Relações Laborais em Portugal: uma intervenção sociológica nos sectores têxtil, automóvel, bancário, telecomunicações e hotelaria e restauração Este artigo apresenta os resultados do estudo «Globalização e Relações Laborais em Portugal», financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Trata-se de uma pesquisa baseada, numa primeira fase, na análise de dados quantitati- vos e qualitativos (entrevistas exploratórias a associações patronais e sindicais e peritos) referentes ao emprego, desemprego, criação de emprego e deslocalizações nos sectores têxtil, automóvel, bancário, telecomunicações e hotelaria e restauração, que visa desen- volver a metodologia da intervenção sociológica (Touraine, 1978). O objectivo da intervenção sociológica foi o de colocar em confronto e reflectir sobre as transformações no sistema de relações laborais, decorrentes dos processos de globali- zação, com os vários actores sociais (militantes sindicais, associações patronais, gestores, trabalhadores precários e desempregados, peritos e investigadores, dos sectores têxtil, automóvel, banca, telecomunicações e hotelaria e restauração). Nestas sessões foram debatidos temas como os das implicações dos processos de globalização no panorama actual das relações laborais (deslocalizações, introdução de novas tecnologias de informa- ção e de comunicação nos modelos de organização do trabalho), da evolução da negocia- ção colectiva, da democracia, participação e representatividade sindical, da precariedade laboral e desemprego e da revisão do Código do Trabalho. 1. AS CONSCIÊNCIAS DOS TRABALHADORES Partimos da hipótese elaborada por A. Touraine (1978) e reelaborada ulteriormente na intervenção sociológica realizada em 1989 (Lima et al., 1992) de que as identidades e as consciências dos trabalhadores são heterogéneas. Marinús Pires de Lima* Ana Guerreiro** Cristina Nunes***

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    (*) Investigador Principal do Instituto de Cincias Sociais da Universidade de Lisboa.(**) Assistente de Investigao do Instituto de Cincias Sociais da Universidade de Lisboa.(***) Assistente de Investigao do Instituto de Cincias Sociais da Universidade de Lisboa.

    CAPTULO

    Globalizao e Relaes Laborais em Portugal: uma interveno sociolgica nos sectores txtil, automvel, bancrio, telecomunicaes e hotelaria e restaurao

    Este artigo apresenta os resultados do estudo Globalizao e Relaes Laborais emPortugal, financiado pela Fundao para a Cincia e a Tecnologia (FCT).

    Trata-se de uma pesquisa baseada, numa primeira fase, na anlise de dados quantitati-vos e qualitativos (entrevistas exploratrias a associaes patronais e sindicais e peritos)referentes ao emprego, desemprego, criao de emprego e deslocalizaes nos sectorestxtil, automvel, bancrio, telecomunicaes e hotelaria e restaurao, que visa desen-volver a metodologia da interveno sociolgica (Touraine, 1978).

    O objectivo da interveno sociolgica foi o de colocar em confronto e reflectir sobreas transformaes no sistema de relaes laborais, decorrentes dos processos de globali-zao, com os vrios actores sociais (militantes sindicais, associaes patronais, gestores,trabalhadores precrios e desempregados, peritos e investigadores, dos sectores txtil,automvel, banca, telecomunicaes e hotelaria e restaurao). Nestas sesses foramdebatidos temas como os das implicaes dos processos de globalizao no panoramaactual das relaes laborais (deslocalizaes, introduo de novas tecnologias de informa-o e de comunicao nos modelos de organizao do trabalho), da evoluo da negocia-o colectiva, da democracia, participao e representatividade sindical, da precariedadelaboral e desemprego e da reviso do Cdigo do Trabalho.

    1. AS CONSCINCIAS DOS TRABALHADORES

    Partimos da hiptese elaborada por A. Touraine (1978) e reelaborada ulteriormente nainterveno sociolgica realizada em 1989 (Lima et al., 1992) de que as identidades e asconscincias dos trabalhadores so heterogneas.

    Marins Pires de Lima* Ana Guerreiro** Cristina Nunes***

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    (1) Conforme se explica numa outra investigao, a banca portuguesa passou de uma das mais atra-sadas da Europa para uma das mais modernas, em razo dos grandes investimentos tecnolgicos e orga-nizacionais, impostos pela concorrncia interna e internacional (Lima et al., 2008).

    Nas fases mais antigas, anteriores ao taylorismo e ao fordismo, a organizao do tra-balho centrava-se em pequenas equipas, onde o operrio de ofcio organizava o seu pr-prio trabalho, mantendo uma autonomia profissional baseada no seu saber-fazer. A cons-cincia da sua condio pode ser definida pela conscincia positiva da utilidade social doseu trabalho.

    No plo oposto encontram-se os operrios sem ofcio, destinados a desempenhar ostrabalhos mais penosos e que no requerem qualquer tipo de qualificao, habitualmentecom comportamentos economicistas.

    No grupo que foi seleccionado para a nossa interveno sociolgica no se encontramestes dois tipos de operrios.

    A introduo da organizao cientfica do trabalho veio alterar o modo como os ope-rrios se relacionam com o trabalho e entre si. O taylorismo e o fordismo submetem-os auma organizao que lhes cada vez mais estranha. Esta situao baseada nas poucasreferncias histricas que so feitas pelos militantes, nomeadamente na indstria txtil,automvel e nas telecomunicaes ou mesmo na banca, anteriormente racionalizao emodernizao ocorridas nas ltimas dcadas1.

    Uma vez que o Taylorismo e o fordismo j se encontram num processo de crise emudana, podemos afirmar que as fases marcadas pelas novas tecnologias de produo einformao dominam o grupo em anlise, como o revela o esquema seguinte:

    Figura 1: Conscincias dos Trabalhadores

    Conscincia orgulhosa dos operrios de ofcio

    1

    3 6

    5

    4

    2

    Neo-corporativismoNova classe operria

    Novos movimentos sociais

    Economicismo Crise poltica

    Conscincia proletria dos indiferenciados

    OperriosEspecializados (conscincia negativa)

    OperriosQualificados+ (conscincia positiva)

    Trabalhador social

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    (2) Sindicato Democrtico dos Trabalhadores das Comunicaes e dos Media.(3) Sindicato Nacional dos Quadros e Tcnicos Bancrios.(4) Federao Intersindical das Indstrias Metalrgica, Qumica, Farmacutica, Elctrica, Energia e

    Minas.(5) Fartos/as dEstes Recibos Verdes.(6) Sindicato Nacional da Indstria e da Energia.(7) Sindicato das Comunicaes de Portugal.(8) Federao dos Sindicatos de Alimentao, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal.(9) Federao dos Sindicatos dos Trabalhadores Txteis, Lanifcios, Vesturio, Calado e Peles de

    Portugal.

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    assim que podemos dizer que Manuel Silva (SINDETELCO2) e Oliveira Costa(SNQTB3) se aproximam dos 4 e que foi na sesso dos desempregados e dos precrios quenos surgiram mais pessoas prximas dos 5, designadamente Nuno Pereira (trabalhadorprecrio, sindicalizado na FIEQUIMETAL4), Helena Nunes (trabalhadora precria, sindica-lizada no SINDETELCO) e Pedro Rodrigues (Precrios Inflexveis), enquanto CristinaAndrade (FERVE5) evidencia um discurso mais tpico dos 6. Tudo isto num contexto e numgrupo marcados por um processo generalizado de terciarizao.

    As intervenes de alguns militantes permitem-nos identificar como novas cons-cincias gestionrias, que correspondem transio para a sociedade neo e ps-indus-trial e nos trabalhadores muito qualificados das novas tecnologias de informao.Abrem-se modernizao, ao sindicalismo de proposio e a temas negociveis: so oscasos de Antnio Chora (Comisso de Trabalhadores da Autoeuropa), Cardoso Lopes(SINDEL6), Carlos Vicente (SICOMP7) e dos interlocutores Glria Rebelo (Jurista), JosRamirez (Jurista) e Lus Silva (Responsvel pelas relaes colectivas da PT Comuni-caes e TMN).

    Outras intervenes aproximam-se das conscincias polticas (conscincias de classenegativas), em que os temas do conflito social, da crtica ao neo-liberalismo econmico ouao capitalismo so dominantes. So ilustraes militantes como Joaquim Pires(FESAHT8), Antnio Marques (FESETE9), Carlos Carvalho (FIEQUIMETAL) e ManuelBravo (FIEQUIMETAL).

    Isto no exclui que se verifique por vezes uma certa hibridez nos discursos em que quera negociao e o conflito, quer o dilogo e as contestaes so defendidos consoante a con-juntura econmica e poltica.

    De uma maneira geral, tambm o sindicalismo de servios (apoio assistncia mdica,aos fundos de penses, aos tempos livres, ao aconselhamento jurdico, tcnico, financeiroe econmico aos associados) encontra em geral defensores, no havendo ningum que selhe oponha, embora seja no sector bancrio que se verifique mais frequentemente bemcomo nos militantes de sindicatos no filiados em nenhuma central sindical.

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    2. DEMOCRACIA, PARTICIPAO E REPRESENTATIVIDADE SINDICAIS E TRANS-FORMAES DO SINDICALISMO FACE GLOBALIZAO

    Neste ponto analisar-se-o as representaes dos militantes sindicais em relao aostemas da democracia, participao e representatividade sindicais e das transformaes dosindicalismo face a um mundo cada vez mais globalizado.

    No que diz respeito ao tema da participao e da democracia, tentou-se compreenderqual o grau de participao real e desejvel considerado pelas instncias sindicais. Nestembito, uma das questes colocadas foi a de como se realiza a circulao da informaonas organizaes sindicais. Relacionado com este tema est a burocratizao das organi-zaes sindicais. A progressiva institucionalizao dos sindicatos implicou naturalmenteum aumento da burocracia organizacional. Assim, os diferentes dirigentes e militantessindicais foram questionados sobre o tipo de modelo organizacional adoptado por cadauma das instncias sindicais. Neste campo, lanou-se para a discusso o problema dopoder nas organizaes: at que ponto que existe ou no um controlo do poder nas cpu-las em relao aos nveis intermdios e da base? Os militantes foram tambm auscultadossobre as relaes entre partidos polticos e sindicatos e sobre a existncia de controlo dopoder poltico face ao sindicalismo.

    Outro tema abordado foi o da representatividade sindical das diferentes centrais sindi-cais (CGTP10, UGT11 e USI12) e dos sindicatos estudados no mbito deste projecto(FESETE, FESATH, FIEQUIMETAL, SINDEL, SINDETELCO, SICOMP, SBSI13, SNQTB).Tal como foi sublinhado pelo Prof. Marins Pires de Lima, na sesso da interveno socio-lgica dedicada a este assunto, em Portugal os dados sobre a representatividade so poucofiveis, existindo apenas estimativas. Aps o 25 de Abril de 1974, existia uma taxa de sin-dicalizao bastante elevada que se estima que alcanasse em mdia os 50%. Actualmente,tem-se vindo a assistir a uma diminuio do nmero de trabalhadores sindicalizados econsidera-se que a taxa de sindicalizao possa variar, dependendo tambm dos diferentessectores, entre os 18 e os 25%.

    Discutiu-se tambm o tema da renovao e da profissionalizao dos dirigentes sindi-cais. Neste ltimo ponto, como referiu o Prof. Marins Pires de Lima, num mundo globa-lizado necessrio que os dirigentes desenvolvam e adquiram competncias tcnicas cadavez mais qualificadas para acompanhar todas as mutaes econmicas, polticas, sociais eculturais. Esta profissionalizao pode ter aspectos positivos ou mais negativos como, porexemplo, uma maior distanciao dos problemas vividos, a nvel micro, nos locais de tra-balho e nas empresas.

    (10) Confederao Geral dos Trabalhadores Portugueses, Intersindical.(11) Unio Geral dos Trabalhadores.(12) Unio dos Sindicatos Independentes.(13) Sindicato dos Bancrios do Sul e Ilhas.

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    Por ltimo, analisaram-se os desafios que a globalizao coloca aco sindical. Partiu--se do pressuposto de que os sindicatos, ao terem mantido a sua tradio histrica de lutadireccionada para o espao nacional, ou seja, para a defesa dos interesses dos seus traba-lhadores enfrentam algumas dificuldades na constituio de uma dinmica sindical trans-nacional. No entanto, tambm a este nvel comeam-se a verificar novas tendncias.

    Comeamos por analisar as representaes dos interlocutores do sector bancrio. Orepresentante do SBSI afirmou que os motivos que conduzem os trabalhadores a partici-parem na actividade sindical so distintos dos encontrados em dcadas anteriores. O inter-locutor disse tambm que, em alguns casos, os trabalhadores sofrem presses das hierar-quias que apelam no participao. Afirma que actualmente mais difcil eleger delega-dos sindicais: hoje com balces de 3-4 pessoas () muito difcil () no se podemausentar porque num balco de 3 faltar um importante. A presso da hierarquia, a pres-so dos prprios colegas tremenda. No que concerne existncia do modelo de par-ticipao utilizado, foi dito que cada sector tem de encontrar o modelo que mais se ade-qua e adapta sua realidade, e que este deve primar pela flexibilidade.

    Em relao ao tema da representatividade, foi mencionado que Os sindicatos tradi-cionais e o Sindicato dos Bancrios do Norte, Centro, do Sul e Ilhas () representam noseu conjunto 75 ou 80% dos trabalhadores bancrios no activo () portanto, a questoda representatividade no caso do sector bancrio no se coloca. O sector tem uma altataxa de sindicalizao, fruto de uma tradio forte de interveno sindical. Este factoraliado a outras caractersticas do sector e ao facto de os seus trabalhadores, em geral, pos-surem elevados nveis de escolaridade conduzem, na sua opinio, a que a circulao dainformao se realize facilmente. Os principais meios utilizados para a divulgao da infor-mao so o site, a utilizao da intranet em algumas instituies bancrias e a revista edi-tada pelo sindicato.

    No que diz respeito renovao dos dirigentes sindicais, o representante do SBSIafirma que esta extremamente importante mas que um assunto difcil. Na sua opinio,no possvel ter dirigentes experientes com 30-35 anos de idade. Alm disso, para osjovens aderir causa sindical representa muitas vezes sacrificar a ascenso na carreira pro-fissional. Por outro lado, os dirigentes mais velhos, por vezes, tendem a permanecer noscargos no s porque dedicaram toda a sua vida a esta causa mas tambm por uma ques-to de poder e protagonismo pessoais.

    No que concerne profissionalizao sindical, o interlocutor defende o profissionalismomas no a profissionalizao. Assegurou que, no caso da sua organizao sindical, recorrema assessorias jurdicas e econmicas e que, devido natureza do prprio sector, os dirigen-tes tambm tm de estar muito preparados a este nvel. Neste sentido, entende a questoda profissionalizao como significando estarem apetrechados de forma competente pararesponder aos desafios que tm pela frente mas defende tambm que os dirigentes tmque ser scios do sindicato, no funcionrios do sindicato, mas trabalhar no sector.

    O representante do SBSI assegurou que nunca houve tentativa de intromisso dos parti-dos polticos no seu sindicato: eu nunca recebi nenhum contacto para Faz l no sindicato

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    (14) Confederao Europeia dos Sindicatos Independentes.(15) Confederao Europeia de Quadros.(16) Federao Europeia dos Quadros de Estabelecimentos de Crdito.

    isto porque d jeito ao Partido Socialista. Assume que outro aspecto diferente a posiopoltico-partidria de cada dirigente: eu sou influenciado sindicalmente porque sou doPartido Socialista e porque acredito mais nessas ideias. Mas isto no significa que eu estejaa receber telefonemas. O interlocutor defende tambm o sindicalismo de proposio.

    O representante do SNQTB, filiado na USI, afirma que: o movimento sindical emPortugal passa por um problema que eu chamo de 3 erres: repensar, reestruturar erenovar. Na sua opinio, esta transformao passa pela renovao das geraes sindi-cais e por criar incentivos para chamar as novas geraes, dos 35 aos 50 anos e paraisso preciso criar situaes, porque () hoje em dia a militncia missionria que carac-teriza muito os sindicatos, no tem grande futuro junto das novas geraes. Neste sen-tido, defende eventualmente subvenes estatais aos sindicatos para que sejam possveisa independncia e a profissionalizao dos sindicalistas. Relativamente ao ltimo tema,diz o seguinte: a profissionalizao dos sindicalistas, eu no estou a dizer que tenha queser hoje, mas um caminho que tem de ser seguido como j existe noutros pases

    A sua posio face representatividade sindical vai ao encontro da defendida pelorepresentante do SBSI, ou seja, a de que existe no sector da banca uma alta taxa de sindi-calizao. No caso especfico do SNQTB, assume que temos j mais de 15 mil associados() crescemos todos os anos 800 pessoas, roda disso. O dirigente sindical sublinhouainda o facto de que necessrio incentivar os trabalhadores precrios a participar nasorganizaes sindicais e defende que este assunto deve ser pensado conjuntamente pelasdiferentes centrais sindicais. Alm disso, defende tambm que deve existir uma interven-o do Estado para auxiliar os sindicatos a lidar, por exemplo, com as ameaas e discrimi-naes sofrida pelos delegados e dirigentes sindicais.

    Outro tema abordado quer por este representante, quer pelo Presidente do SNQTB foio da defesa do sindicalismo de servios: Hoje, ns defendemos, cada vez mais, seme-lhana dos sindicatos nrdicos, sindicatos de servios sociais. No entanto, o Presidentedo SNQTB assevera que o Estado no est preparado para isto! De tal maneira quepersegue os sindicatos que no se enquadram taxativamente na dicotomia contestatrioou propositivo. Persegue judicialmente. Persegue os actores que ousam levar este sindi-calismo de servios a bom porto e com sucesso entre os trabalhadores.

    Em relao internacionalizao do sindicalismo, o dirigente do SNQTB afirma que aUSI est representada na CESI14 e que o SNQTB pertence tambm CEQ15 e FECEC16.No entanto, adverte para o seguinte facto: eu no acredito muito no movimento inter-nacional de sindicatos. Acredito que uma situao interessante para se ouvir umasexperincias, para se ganhar algumas ideias, mas no acredito que o movimento inter-nacional dos sindicatos possa responder a este movimento de fuses e de aquisies queexiste nas telecomunicaes, nos txteis e at nas empresas de hotelaria. Em relao

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    a este assunto, o Presidente do SNQTB afirma que j vivemos h anos na banca ()j temos comits de empresa europeus, quer de bancos portugueses, quer de bancosestrangeiros e temos que reencontrar e redefinir qual o papel dos trabalhadores e dosseus sindicatos relativamente a estas formas de representao. A nvel nacional, lamentao facto de a USI no estar representada no CES17.

    O representante do STEC18 afirma que este sindicato do grupo Caixa iniciou a sua acti-vidade por considerar que o sindicato dos bancrios verticais no representava ogrupo () da que a adeso formao do sindicato foi uma exploso completa. Ao nvelda sua representatividade, diz que um sindicato que, contra aquilo que est a aconte-cer no mercado, a nvel sindical, cresce todos os dias () tem 5.000 e tal associados. Emrelao participao dos associados no sindicato assegura que apesar de o STEC ter tra-zido muitos benefcios aos trabalhadores do grupo, o seu envolvimento no sindicato no o desejado: estamos a falar de empresas que nunca tinham tido na vida um acordo colec-tivo, nunca tinham tido direitos e com o aparecimento deste sindicato () a vida delesteve uma transformao completa () agora, naturalmente que estamos a falar de pes-soas que tm muito pouca capacidade reivindicativa e participativa. Para eles, o sindica-lismo um pouco isto, no ainda participarem, reivindicarem, ajudarem ainda rece-berem: esto ali inscrevem-se e recebem!. Alm disso, afirma tambm que actualmenteos sindicatos so procurados at mesmo como consultrios de apoio psicolgico. O factode o sector bancrio ser extremamente exigente e competitivo conduz a que os trabalha-dores se filiem no sindicato porque no futuro podero ter de socorrer ao seu auxlio. Almdisso, defende que as pessoas, muitas vezes, no participam por medo. Contudo, refere queo STEC desenvolve um tipo de sindicalismo prximo dos trabalhadores. Assim, afirma umoutro membro do STEC, a divulgao da informao, para alm do site e dos comunica-dos, feita com os associados balco a balco.

    Relativamente internacionalizao do sindicalismo e das confederaes sindicaisinternacionais, afirmam que o sindicato se tem mantido margem destes assuntos.

    No que diz respeito ao sector txtil e do vesturio, a participao no conjunto das ses-ses da interveno sociolgica ficou a cargo da FESETE, filiada na CGTP. O seu dirigenteassumiu que a FESETE a quase que exclusivamente a nica protagonista do movimentosindical no sector: hoje no se nota uma interveno da UGT em termos de sector txtile vesturio. Este facto foi tambm corroborado pela representante da ANIVEC-APIV19 pre-sente na sesso dedicada s associaes patronais.

    No entanto, em relao representatividade sindical da FESETE, foi-nos transmitidonuma entrevista realizada a outro dirigente, que as deslocalizaes afectaram negativa-mente a taxa de sindicalizao. No passado, esta abrangia cerca de 70% dos trabalhadores,actualmente estima-se que atinja apenas cerca de 30%. O representante da FESETE, que

    (17) Conselho Econmico e Social.(18) Sindicatos dos Trabalhadores das Empresas do Grupo Caixa Geral de Depsitos.(19) Associao Nacional das Indstrias de Vesturio e Confeco.

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    participou na interveno sociolgica, afirmou o seguinte em relao ao tema da partici-pao: ns, s aqui na rea Sul, na altura da revoluo, chegmos a encher o Coliseudos Recreios () neste momento, no possvel fazer-se uma assembleia com muitos tra-balhadores, porque normalmente no vm. Da que defenda um sindicalismo de aconas empresas junto dos trabalhadores: ns devemos estar prximos dos trabalhadores,no possvel a burocracia no sector txtil () a nossa interveno uma intervenodiria. Exercendo os direitos sindicais nas empresas, fazendo plenrios. Alm destainterveno no terreno, a FESETE possui tambm um jornal e so feitos tambm comu-nicados: temos uma tiragem de 70 mil para um sector com 200 mil. Estamos muitolonge de atingir uma grande discusso, um grande envolvimento, mas no temos capa-cidade para chegar mais longe.

    O dirigente sindical no se demonstrou a favor da profissionalizao sindical: o nossosindicalismo assenta nos trabalhadores das empresas, por isso quem no scio do sin-dicato no pode ser dirigente do sindicato e a regra a ligao s empresas. A regra esta: eu, no sindicato, ganho o mesmo salrio que ganhava na CUF ou na QUIMIGAL, notenho nenhuma benesse. Em relao renovao dos dirigentes sindicais, afirmou queesta necessria e por este motivo que no prximo Congresso da FESETE sero prova-velmente eleitos 3 jovens para a direco, mas que um dirigente para possuir experincianecessita de 10-15 anos de actividade sindical.

    Assume tambm que a FESETE, onde esto filiados 14 sindicatos, uma organizaosindical plural do ponto de vista ideolgico dos seus membros: 6 sindicatos tm umatendncia catlica, socialista, uma federao plural! H autonomia do movimento sin-dical!. Relacionado com este assunto, est o do controlo dos sindicatos pelos partidospolticos que, neste caso, apaziguado pelo dirigente: Eu acho que se exagera tambmmuito nisto () ns somos independentes face aos partidos () agora, bvio que umapessoa que est no movimento sindical, aqueles que entendam, tambm tm o seu par-tido poltico, mas uma coisa a vida partidria outra o sindicalismo. Eu falo pela minhaorganizao, no h ali presses partidrias e a prova disso que mesmo aquelas pessoas,que tm outras sensibilidades, sentem-se bem na discusso () s vezes, oio muitoPartido Comunista daqui, de acol, mas acho que no, so pessoas que normalmente noconhecem as organizaes

    Quanto natureza do sindicalismo praticado pela FESETE, o seu dirigente defendeuma actuao contestatria e negociadora: somos contestatrios porque os problemasso muitos! Somos proponentes, negociadores e ao mesmo tempo tambm somos nego-ciadores. Ns somos tudo isto () o sindicalismo tem que ter uma dinmica de massas,de trabalhadores. O interlocutor assume tambm que o sindicalismo deve combater asinjustias sociais: O sindicalismo existe para lutar contra as injustias! Para que omundo seja melhor! Um trabalhador txtil ganha 2 euros acima do salrio mnimo nacio-nal! Esto no limiar da pobreza! Daqui a importncia do sindicalismo.

    No que concerne construo de uma dinmica sindical transnacional, o interlocutordemonstra algumas desconfianas: h desenvolvimentos organizativos que ns at

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    temos dvidas. Por exemplo, a nossa federao txtil europeia, neste momento decidiramfundir-se com os metalrgicos, com a qumica. Ns no estamos de acordo com isto! ()H uns desenvolvimentos no sentido de haver uma federao europeia, quase uma fede-rao da indstria, o que cria alguns problemas porque depois os sectores mais pequeni-nos so aqueles que vo ficar mais afectados. Afirma ainda que deve existir um inter-cmbio internacional entre as diferentes organizaes sindicais, mas que o espao deactuao nacional deve ser privilegiado: bvio que, em termos sindicais, ns temos quever com o movimento sindical internacional. Mas h uma coisa que est presente: nsno temos dinheiro para irmos fazer uma manifestao Eslovnia, como a CES20, fezaqui h pouco tempo, que ficou a 50 Km de distncia das pessoas que estavam a protes-tar. Aquilo no d nada! Por isso ns privilegiamos a luta aqui no interior do nosso passem descurar o intercmbio. Defende tambm que a OIT21 tem um papel importante naimplementao e regulao das normas internacionais do trabalho.

    O interlocutor demonstra ainda algum cepticismo face eficcia dos movimentossociais e das associaes que surgiram recentemente contra a precariedade laboral: osmovimentos sociais so importantes mas h ali uma questo negativa nos movimentossociais: que no so eleitos pelas pessoas! No sindicalismo ns temos que ser eleitospelos trabalhadores! () Em termos democrticos, eu tenho muitas dvidas sobre estaquesto, de pessoas a falar em meu nome, quando eu no participei em nenhuma elei-o () mesmo os trabalhadores que no esto sindicalizados, quando h algum pro-blema batem logo porta dos sindicatos para os ajudar! Ento vo bater porta dequem? Do movimento social da precarizao ou do movimento social no sei qu? No.Aquilo no d resposta aos problemas dos trabalhadores.

    No sector da hotelaria e restaurao, contmos apenas com a presena em algumas ses-ses do representante da FESATH, filiada na CGTP. Este no esteve presente na sesso emque discutimos os temas em anlise, mas afirmou que a sua organizao pratica um sin-dicalismo de contestao, de massas e propositivo (embora o seu discurso se dirija maispara a actuao contestatria): um movimento sindical propositivo ou contestatrio?Eu julgo que, no meu sector sinto isso, ns temos essas 2 facetas. Estamos inseridosnuma corrente, chamada movimento social unitrio, que tem como princpio ser um sin-dicalismo de massas, ser um sindicalismo independente e democrtico.

    Em relao ao tema da participao e da representatividade, o interlocutor lamentousimultaneamente o facto de ser difcil efectuar a sindicalizao dos trabalhadores prec-rios, normalmente jovens, e das contrariedades que as mulheres enfrentam para levar acabo a participao sindical.

    Ao nvel do sector automvel, um dos representantes da FIEQUIMETAL, filiada naCGTP, comeou por abordar a questo da participao sindical sublinhado as atitudes anti--sindicais levadas a cabo pelas entidades patronais: a atitude antidemocrtica, que

    (20) Confederao Europeia de Sindicatos.(21) Organizao Internacional do Trabalho.

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    tambm no surpresa, de grande parte das entidades patronais, ou seja, do patronatodo sector. So raras as excepes em que as actividades sindicais so respeitadas no inte-rior das empresas. O interlocutor, tal como o dirigente da FESATH, frisa tambm quer ofacto de a precariedade estar a dificultar a sindicalizao dos trabalhadores quer as difi-culdades sentidas pelas mulheres na participao sindical: o aumento da precariedadeneste sector tem sido exponencial! A par do agravamento da jornada de trabalho! O quetraduz depois, do ponto de vista da participao dos trabalhadores, um aumento tambmdas dificuldades deles prprios em participarem. Temos casos em que as mulheres parti-cipam ao nvel da empresa, na estrutura de base, dentro do perodo do horrio de traba-lho, mas depois traz-las a tempo inteiro uma carga de trabalhos, porque h todo umcontexto social que as envolve, que lhe dificulta a participao () e isso no nos satis-faz nada, pelo contrrio.

    No que se refere representatividade sindical, outro dirigente da FIEQUIMETAL, afir-mou que entre 40% a 45% dos trabalhadores sindicalizados no sector tm idades inferio-res a 35 anos. Este dirigente demonstrou a seguinte opinio face ao tema da renovao dasgeraes sindicais: A CGTP definiu, para o ltimo Congresso, que eram sindicalistas commais de 60 anos que se reformassem durante o mandato. A direco nacional levantou--se, parecia um escndalo nacional que isso acontecesse. Essa medida tem exacta-mente como objectivo que sejam os trabalhadores no activo os verdadeiros representan-tes, aqueles que esto em melhores condies para interpretar os problemas em cadamomento e procurar encontrar solues para eles.

    Os 2 representantes da FIEQUIMETAL demonstram a no-aceitao da profissionali-zao dos dirigentes sindicais: A experincia que temos vai no sentido das pessoas par-ticiparem porque tm vnculo laboral com uma entidade patronal () entendemos queisso desvirtuava o papel dos sindicatos. Os sindicatos so associaes de classe dos tra-balhadores, daqueles que esto no activo. O outro dirigente afirmou o seguinte:estamos de acordo no sentido do profissionalismo como a melhoria dos conheci-mentos e da formao necessria para melhor representar os trabalhadores. Se profis-sionalismo entendido como profissionais que se dedicam depois a ser sindicalistas, h operigo srio de afastar os que representam os trabalhadores do conhecimento real dosproblemas () o profissionalismo nesse sentido, na minha organizao, estamos com-pletamente em desacordo

    A FIEQUIMETAL afirma desenvolver um sindicalismo de aco junto dos trabalhado-res: apostamos muito na deslocao dos dirigentes sindicais aos locais de trabalho() a secretria um local de apoio actividade, e o sindicalismo faz-se com as pessoas,partilhando os problemas delas, procurando resolv-los. No que diz respeito emer-gncia de novas formas de organizao sindical no sector, e tomando como exemplo, ossindicatos de grupo ou de empresa constataram-se as seguintes asseres: a questoCaixa (dirigindo-se ao representante do STEC) um exemplo, um laboratrio, no ?Est aqui um exemplo concreto e que at podia, h condies para repensar algunsaspectos ou algumas formas de organizao. Mas como que ns fazemos nos sectores

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    industriais, e at posso falar aqui no sector txtil tambm, onde 95% do tecido empresa-rial baseado em pequenas e mdias empresas? Organizamos os trabalhadores porpequenas e mdias empresas? () ns, nos nossos sectores, estamos fartos de discutir istoe no vemos outra soluo que no seja haver sindicatos regionais

    Relativamente ao possvel controlo exercido pelos partidos polticos sobre os sindica-tos, um dos dirigentes afirma que h quem prefira discutir os sindicatos como instru-mentos partidrios ou outra coisa qualquer, eu prefiro discutir os sindicatos como ins-trumentos dos trabalhadores para responderem a problemas dos trabalhadores. Outrointerlocutor da FIEQUIMETAL disse o seguinte: tenho pena que os partidos noinfluenciem mais hoje em dia! Porque esto a influenciar pouco! Ou seja, que se saiba eque se entenda o que que pertence a cada um e qual o espao de interveno de cadaum () mas tambm no vale a pena ignorar que a interveno sindical tambm temuma componente ideolgica.

    No que respeita eventual criao de subvenes estatais s entidades sindicais(assunto que foi levantado pelo dirigente do SNQTB), um dos dirigentes da FIEQUIMETALdemonstrou o seu desacordo por acreditar que constitui uma ameaa autonomia sindi-cal: se eu criasse uma estrutura num sector que no dependesse exclusivamente dos tra-balhadores, no momento da verdade, em que preciso dizer sim ou no, vamos colo-car a questo do Cdigo do Trabalho: preciso dizer sim ou no em funo daquilo queos trabalhadores necessitem, se os sindicatos tivessem uma subveno do Estado, estosempre dependentes do subsdio, que aumenta ou diminui em funo da posio sindical,a organizao dos trabalhadores tem que ser autnoma.

    No que se refere s posies do SINDEL, pertencente UGT, no podemos aferir as suasopinies sobre a maior parte das temticas em anlise, pois o seu representante no estevepresente na sesso em que as abordmos. No entanto, numa outra sesso, o dirigentedefendeu o sindicalismo de proposio: O SINDEL insere-se claramente num sindica-lismo propositivo, mas j h muito tempo, at porque onde est associado a isso tambmobriga. Eu dou como exemplo a negociao, muitas vezes, duradoura e antecipada quetemos que fazer com as empresas. A abordagem que fazemos muitas vezes tem que serpor antecipao e no por reaco () de nada vale estar a reivindicar aquilo que no reivindicvel. De nada vale estar a propor aquilo que no depois negocivel. Isso ape-nas fomentar o conflito. Quanto constituio de uma dinmica sindical internacional,o representante do SINDEL defendeu a constituio de uma bolsa social que mea os valo-res sociais praticados pelas empresas. O sector automvel obriga-nos a olhar para omundo todo () uma das coisas que ns vimos defendendo j h muito tempo era a cria-o de uma bolsa social internacional, os sindicatos tm que ter uma visibilidade maistcnica, funciona muito melhor o marketing televisivo, que combata o capital pelo pr-prio capital, do que, muitas vezes, uma manifestao ou uma greve ou outros factores deluta tradicionais, mas hoje verifica-se que os resultados obtidos por essas vias so redu-zidos. O que que se pretendia com esta bolsa social? Que os valores sociais associados empresa fossem quantificados! () preciso mostr-los e torn-los visveis. E aqui h

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    um problema de alguma dificuldade: que h muitos trabalhadores e muitos sindicatosque acabam por olhar para as conquistas que tm obtido, ao longo dos anos, como algoque seu. O sentido de pertena perante aquilo que conquistado para todos, no ape-nas para o sector. Uma empresa em Portugal ou nos EUA que tenha direitos, se se vai ins-talar na sia ou noutro lado bom que esses trabalhadores tenham conhecimento do que que os outros tm. O dirigente do SINDEL defende que esta bolsa social s pode sercriada por instncias sindicais a nvel internacional: Para isso preciso haver uma maiorarticulao entre os sindicatos a nvel internacional. O SINDEL est filiado em 4 orga-nizaes de mbito internacional (2 europeias e 2 mundiais).

    No que respeita s telecomunicaes, o representante do SICOMP, filado na USI, refe-riu que o sector se caracteriza por possuir um elevado nmero de trabalhadores sindicali-zados, fenmeno que se deve a uma tradio sindical consolidada desde h vrias dcadas.Contudo, esta tradio mais forte, no seu entender, na PT Comunicaes: no umnmero certo, mas anda um pouco aqum da mdia nacional, porque mesmo assim 75%dos trabalhadores so sindicalizados. Isto tem a ver com uma tradio sindical bastanteantiga. Portanto, nas telecomunicaes existem j sindicatos com actuao laboral ecom greves produzidas e movimentos laborais produzidos desde 1910. Contudo, salientaque tambm neste sector se tem verificado uma diminuio do nmero de sindicalizados:o ritmo de sadas maior do que o ritmo de entradas, logo a vai criar um aumento dedessindicalizaes. Alm de que os trabalhadores que esto noutras empresas, como notm contratao colectiva, a maior parte deles no so filiados nos sindicatos.

    No caso particular do SICOMP, reconhece que temos uma minoria de scios, notemos um scio, como alguns dizem, mas reconhecemos que no temos a maioria dosscios. Mas, em termos de influncia social, podemos ter a nossa influncia no movi-mento laboral. A circulao da informao realizada atravs de comunicados e do site.O presidente do sindicato assume que a principal funo dos sindicatos realizar a nego-ciao colectiva: as principais funes de um sindicato no so s a defesa dos traba-lhadores, mas tambm fazer a contratao colectiva. O sindicato est 10 anos sem fazerum acordo ou 20, como h alguns a, segundo consta () a sua condio principal de sin-dicato no cumprida, a relao laboral no efectiva, penso eu que no bom. Um dosaspectos frequentemente mencionados por este dirigente foi o controlo poltico-partidriode que pensa ser alvo a UGT e a CGTP: o actor institucional tem que ser autnomo eindependente em relao s directivas poltico-partidrias e o que me parece que, mui-tas vezes, a actuao destas centrais respeitam mais as directivas poltico-partidrias doque propriamente os interesses dos trabalhadores () o movimento sindical indepen-dente no surge assim por acaso, surge como uma evoluo histrica das decises que seforam operando no movimento sindical, por responsabilidade dos dirigentes sindicais daaltura aceitarem, portanto, a ingerncia dos partidos polticos. Outra questo levantadapelos membros do SICOMP foi a ausncia de participao da USI no CES.

    Ainda no que concerne s telecomunicaes, um dos dirigentes do SINDETELCO,filiado na UGT, concorda, no que se refere elevada taxa de sindicalizao dos trabalhado-

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    res, com o representante do SICOMP: mais de 82% dos trabalhadores das telecomu-nicaes tradicionais so sindicalizados () mas h um espao ainda grande, da ordemdos 20%, pelo menos, para sindicalizar e nestas esto obviamente as Optimus, esto asVodafones, esto as Onis () a no to fcil porque as prprias administraes dasempresas e os recursos humanos no tm tanta abertura e pensam que os sindicatos tmque ficar da parte de fora, nem do edifcio, da parte de fora da rea residencial onde oedifcio est instalado. Um outro membro do SINDETELCO relativamente representa-tividade sindical da sua organizao considera o seguinte: neste sector, posso dizer que onosso sindicato o mais representativo. Ns estamos muito bem implantados nesta parteda nova economia, que tem trabalhadores jovens, alguns com qualificaes universit-rias. No mesmo sentido, o secretrio-geral do sindicato no concorda com o facto de aprecariedade laboral poder afectar a sindicalizao dos trabalhadores mais jovens: Nomeu sindicato pelo menos uns 60% das pessoas tm menos de 35 anos. Da que consi-dere que o problema da renovao dos dirigentes sindicais no esteja nos jovens nem nasgeraes mais velhas, mas precisamente entre os indivduos que possuem entre 35 e 55anos. No entanto, considera que as geraes mais novas no esto disponveis para desem-penhar a actividade sindical a tempo inteiro e isto tambm levanta problemas ao sindica-lismo: qual a soluo? dirigentes eleitos a tempo inteiro e que lhes criem as con-dies para eles poderem exercer as suas actividades. Se chamam a isto profissionalismo?Olha, serve! Isso serve!. Alm disso, pensa tambm que no h dvida nenhuma queem muitos sectores o facto de se ser dirigente sindical sinnimo de se ser prejudicadona sua vida profissional.

    Um dos membros do SINDETELCO admite que no fcil mobilizar os trabalhadorespara participar activamente na esfera sindical: actualmente difcil os sindicatosterem essa participao, mas ela existe () se o sindicato l estiver e quiser mobilizaresses trabalhadores consegue-o e os trabalhadores sabem que tm sempre o sindicato outm sempre algum que vai ao seu encontro e que lhes poder dar algumas respostas oualgumas informaes () agora, que no fcil, no . Por outro lado, no conside-rado que os trabalhadores sujeitos precariedade laboral participem menos: Como queesses trabalhadores reagem aos sindicatos? Reagem da mesma maneira que os outros,apesar de a sua situao no ter o mesmo vnculo contratual e de estarem numa situa-o de maior fragilidade, porque qualquer possibilidade de alguma colagem ao sindicato,naqueles empregadores cria logo ali um problema e ento poderia criar problemas pr-pria continuidade dos trabalhadores nesse sector, que no o caso. A circulao dainformao no sindicato realizada atravs do site, do boletim, da intranet, em algumasempresas, e das deslocaes permanentes aos locais de trabalho.

    Relativamente possvel existncia de um controlo exercido pelos partidos polticos ereplicando as crticas do membro do SICOMP, o secretrio-geral do SINDETELCO respon-deu o seguinte: sou da comisso executiva da UGT e a nvel internacional da UNI22 e

    (22) Union Network International.

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    com tudo isto no deixamos de ser independentes! porque, s vezes, h conceitos quepensam que pelo facto de estarmos sindicalizados e os nossos sindicatos estarem em cen-trais sindicais que j no somos independentes () foca sempre a questo da indepen-dncia, centrais e, como se no estivesse numa, que uma coisa que eu acho de factointeressante. Ainda em resposta s crticas endereadas pelo SICOMP, outro represen-tante do SINDETELCO admite que at uma determinada poca, devido ao contexto pol-tico nacional, pudesse ter existido uma tentativa de intromisso dos partidos polticos:at aquela altura, em 1989, pode haver alguma interferncia da parte poltica, mas euno vejo, a partir dessa data nas decises que o sindicato toma tenham alguma coisa aver com alguma orientao do PSD ou do PS no sentido de assinar ou de influenciar istoou aquilo. Este actor duvida ainda da eficcia dos sindicatos independentes: eu noperfilho da mesma opinio das questes dos sindicatos independentes. Portanto, no soumuito apologista para os sindicatos independentes () percebo que, em determinadospases, poder existir, nomeadamente aqui em Portugal, essa dita 3. tendncia. Mas achoque, neste momento, para a nossa sociedade, a CGTP e a UGT conseguem responder per-feitamente s necessidades e s preocupaes dos trabalhadores.

    No plano internacional, o SINDETELCO, a nvel sectorial, pertence UNI e ao nvel daUGT est filado na CES e na CSI23. O secretrio-geral ir tambm participar no prximoFrum Social Mundial que se realizar, no Brasil, no prximo ano. Foi tambm mencio-nado que a pertena s instncias sindicais internacionais tem sido bastante til: A UNI,recentemente, atravs da sua influncia e da sua fora junto da UE criou condies paraque a UE criasse directivas, nomeadamente 3: uma que tinha a ver com o trabalho tem-porrio; uma outra que diz respeito ao trabalho a termo certo; e uma outra que tem a vercom a lei da maternidade e da paternidade. Cada pas obrigado a transcrever estasdirectivas. E, portanto, se no fosse esta interveno da UNI junto destas instncias nstambm poderamos estar aqui a ter alguns problemas. Alm disso, foi tambm subli-nhado que devido internacionalizao do movimento sindical, na nossa internacio-nal temos um projecto na ndia onde, neste momento, j sindicalizmos mais de ummilho de jovens dos call centers e o objectivo at 2010 sindicalizar 2 milhes.

    3. REPRESENTAES SINDICAIS FACE AOS PROCESSOS DE DESLOCALIZAO

    O impacto dos processos de deslocalizao nos sectores automvel, do txtil e do ves-turio conduziu a que este tema merecesse uma ateno especial no decorrer das sessesda interveno sociolgica. Do conjunto das sesses realizadas observa-se que um temaque preocupa no s os militantes dos sectores industriais mais expostos s deslocaliza-es, mas tambm os militantes dos restantes sectores e os peritos presentes na sessodedicada discusso do Cdigo do Trabalho.

    (23) Confederao Sindical Internacional.

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    O dirigente da FESETE lamentou o facto de o sector txtil portugus estar a concor-rer internacionalmente com pases que no cumprem as normas internacionais estabele-cidas pela OIT: ns temos uma componente de 30% nos salrios no custo do vesturio,mas a China tem 1%. Os chineses tm apoios do Estado, no ligam importncia ao pro-blema ambiental, no tm frias () ainda por cima em termos econmicos h oseguinte problema: agora com a questo das regras da OMC24 esses pases entram nonosso pas praticamente sem pagar impostos e ns para entrarmos l temos que pagar60 ou 70% de impostos. H portanto uma reciprocidade que no s e no leal. Assimno possvel. No se trata apenas da parte salarial, mas tambm do problema dasexportaes para esse pas!

    O dirigente da FESETE associa os fenmenos de desemprego massivo que assolam osector a nvel nacional liberalizao do mercado mundial do txtil e do vesturio e aosconsequentes processos de deslocalizao das unidades de produo: O nosso observat-rio sobre o emprego na FESETE conclui que, nos ltimos 10 anos, ns perdemos 100.000postos de trabalho. Isto uma coisa de grande envergadura! E esta perda de postos detrabalho tem a ver com o perodo de transio das quotas. A OMC acabou as quotas a par-tir deste ano e o sector teve que se modernizar para poder se adaptar em termos do mer-cado, em termos da globalizao. Mesmo assim perdemos 100.000 postos de trabalho comos investimentos que foram feitos.

    Para enfrentar os problemas causados pela crescente concorrncia internacional epelas deslocalizaes a FESETE negociou um novo contrato colectivo de trabalho com aATP25 e com a ANIVEC-APIV. Este novo acordo na negociao colectiva vai no sentido deproporcionar s empresas uma maior flexibilidade nas formas de organizao da produoe do trabalho para que possam responder de forma mais eficaz s necessidades dos merca-dos internacionais.

    A propsito deste acordo nomeado pelas associaes patronais de acordo histrico edas fragilidades sentidas tanto pelos empresrios como pelos trabalhadores face aos desa-fios da globalizao, a representante da ANIVEC-APIV afirmou o seguinte: esta dicoto-mia associaes de empregadores-sindicatos, no nosso sector esgotou-se, ns realmente,neste momento, no estamos a representar interesses contrrios. Ns estamos aqui numaperspectiva de cooperao na criao e na manuteno do emprego, estamos todos nomesmo barco.

    O dirigente da FESETE no se mostrou muito favorvel a esta afirmao da represen-tante patronal de que estamos todos no mesmo barco mas reconheceu que as mudan-as levadas a cabo ao nvel da negociao colectiva so inevitveis para que os trabalha-dores no percam os seus postos de trabalho: ns conseguimos negociar contratos glo-bais em 2006 e demos alguns instrumentos aos empresrios! Para qu? Para conseguirmais competitividade a nvel dos nossos produtos e para manter o emprego. Alis, o

    (24) Organizao Mundial do Comrcio.(25) Associao dos Txteis de Portugal.

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    Governo agora costuma dar o exemplo do sector txtil, at uma imagem nossaextremamente negativa, dizendo que as propostas do Cdigo esto um bocado equiva-lentes ao que a txtil negociou.

    No que diz respeito ao sector automvel, os exemplos dos processos de deslocalizaoocorridos em Portugal mencionados durante as sesses da interveno sociolgica foramsobretudo os da Opel e da General Motors. Como exemplo de preveno dos fenmenosde deslocalizao e de modelo a seguir por outras empresas multinacionais discutiu-seintensivamente o acordo celebrado entre a administrao da Autoeuropa e a Comisso deTrabalhadores.

    Os acordos laborais da empresa Autoeuropa (acordos win-win ou de soma no nula)tm sido considerados inovadores no contexto da negociao colectiva. A perda de direitosdos trabalhadores para garantir a competitividade da fbrica e impedir despedimentosconstitui a base destes acordos. A resposta encontrada foi a de preservar os postos de tra-balho, manter a exigncia dos aumentos salariais e procurar pontos comuns que, emboracontendo cedncias, possibilitassem uma soluo menos desfavorvel para os trabalha-dores. O exemplo da Autoeuropa muitas vezes apresentado como exemplo do modelo deflexigurana em Portugal em que, por um lado, h maior flexibilidade e, por outro, garantida segurana aos trabalhadores, nomeadamente na manuteno dos empregos.

    A propsito do tema das deslocalizaes em geral e do acordo celebrado na Autoeuropa,o representante da Comisso de Trabalhadores desta empresa referiu o seguinte: aquesto da deslocalizao , hoje em dia, ou se previne ou no se evita! Depois o que seentra num campeonato de ver qual a associao sindical que mais indemnizaesconsegue para os seus associados. Eu penso que no por a que vamos l, no essecampeonato que eu quero jogar nem os trabalhadores da Autoeuropa tm jogado, e nemfoi esse o campeonato que jogaram em 2003, foi o campeonato da preveno. O acordoque ns fizemos, que foi muito criticado na altura por algumas fraces sindicais outrasnem tanto, hoje parece que toda a gente o apoia, j permitiu que entre 2003 e 2008 ostrabalhadores da Autoeuropa ficassem 127 dias em casa recebendo o salrio por completoe adquirindo apenas o direito a 105.

    O dirigente do SINDEL compara o caso da Opel ao da Autoeuropa analisando quer osmotivos que podero ter conduzido deslocalizao da primeira, quer prevenido a deslo-calizao da Autoeuropa: por acaso gostava de ter aqui no apenas representantes daAutoeuropa, mas gostava de ter os da Opel, gostava de ter da BMW, gostava de ter daToyota, gostava de ter uma quantidade de empresas. E por que que no os temos?Porque as empresas no encontram no pas a competitividade necessria para progredi-rem () ora se na Autoeuropa h dilogo social permanente por que que no h nou-tras empresas? Como que se ganhou a Autoeuropa? Porque foram ao fundo da questo,foram analisar os custos, foram analisar onde que podiam ser competitivos e trabalha-ram em funo disso, encontraram inclusivamente interlocutores.

    O representante da FIEQUIMETAL falou sobretudo no caso da Opel: A Opel foi deslo-calizada e ns tnhamos feito um acordo de viabilizao da Opel que assegurava a per-

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    manncia da empresa em Portugal at 2009. O que certo e sabido que a administra-o rompeu aquele acordo. Foi penalizada agora em tribunal por isso, mas aos trabalha-dores de pouco serve, ficaram de facto sem emprego. Ns fizemos cedncias para que istono acontecesse. E esta ideia de que quanto mais cedncias os trabalhadores portugue-ses fizerem mais se torna atractivo o mercado portugus para as empresas estrangeiras,esta uma falsa questo! Ns estamos todos aqui a nivelar por baixo e de direitos huma-nos que estamos a falar.

    4. PRECARIEDADE LABORAL E DESEMPREGO PRTICAS E POLTICAS SINDI-CAIS

    Processos como a globalizao, a difuso das tecnologias de informao e de comu-nicao e a intensificao da concorrncia provocaram importantes e significativasmudanas no mercado laboral. Assistimos a uma tendncia crescente para a flexibiliza-o dos mercados, onde se desenvolvem novas formas de organizao empresarial e deorganizao do trabalho, que assentam na externalizao dos servios e numa plurali-dade de formas de emprego que escapam regra contratual do contrato de trabalho atempo indeterminado, relacionada com a procura de flexibilizao quantitativa e com areduo de custos.

    O trabalho deixa de ser concebido como propiciador de relaes de produo duradou-ras, estveis e vinculativas e como o garante dos direitos sociais e do acesso cidadania epassa a ser perspectivado como um factor de instabilidade e de permanente degradao dascondies de vida dos cidados.

    As novas formas de emprego, tendencialmente instveis e precarizantes, frequente-mente mal pagas, com horrios instveis, fracas condies de trabalho, reduzidas pers-pectivas de evoluo profissional e pouca formao, que segmentaram e individualizaramas relaes laborais e enfraqueceram os laos de solidariedade entre os trabalhadores, com-portam tambm um elevado risco de o trabalhador vir a engrossar, a curto prazo a fileirados desempregados.

    O aumento do trabalho temporrio, dos vnculos contratuais precrios, do trabalho atempo parcial, do falso trabalhador independente, da subcontratao e a diminuio daproteco social dos trabalhadores so alguns dos exemplos dos efeitos do novo modeloeconmico-social, decorrente da globalizao.

    A expanso da precariedade tem vindo a afectar a generalidade dos sectores de activi-dade, inclusivamente sectores tradicionalmente considerados como estveis do ponto devista das relaes de trabalho, ou seja, sectores industriais fortes onde prosperaram osempregos assalariados, de que so exemplo o sector automvel e o sector txtil.

    Paralelamente precarizao das relaes laborais, aumenta tambm o desemprego.Segundo os dados recentes do INE, a taxa de desemprego em Portugal situa-se nos 7,7%(dados referentes ao 3. trimestre de 2008), sendo que esse valor era de 4,7% em 1991.

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    Perante este cenrio, as organizaes sindicais vem-se confrontadas com dificuldadesem mobilizar os trabalhadores, sobretudo no caso dos trabalhadores precrios e dos desem-pregados, que se manifesta concretamente na diminuio do nmero de sindicalizados.

    Com o objectivo de estudar o desenvolvimento e o impacto das formas flexveis deemprego e do desemprego nos actores envolvidos nas relaes de trabalho e de aprofundaro conhecimento das estratgias de actuao e de interaco desenvolvidas pelas associa-es sindicais, foi realizada uma sesso da interveno sociolgica dedicada exclusiva-mente a este tema. Nela estiveram presentes militantes sindicais dos vrios sectores emestudo, trabalhadores precrios e desempregados, gestores de empresas e grupos de traba-lho e de denncia contra a precariedade laboral (FERVE e Precrios Inflexveis).

    Dos discursos dos vrios intervenientes podemos concluir que a precariedade laboralconstitui uma problemtica socioeconmica de crescente pertinncia, no s pela cont-nua expanso desse fenmeno, em praticamente todos os sectores de actividade econ-mica, mas sobretudo pelas repercusses sociais que provoca nas sociedades contempor-neas e, em especial, na sociedade portuguesa.

    Os trabalhadores precrios confirmam a crescente instabilidade que se verifica no mer-cado de trabalho, onde proliferam formas de emprego instveis, inseguras e transitrias,contrastantes com o tipo de emprego caracterizador do perodo taylorista e fordistabaseado na estabilidade, permanncia e na segurana do emprego. Trabalho naAutoeuropa j h 15 anos e j passei por 5 empresas. Aquele posto de trabalho posto aconcurso de 3 em 3 anos, da que eu acho que aquilo uma precariedade, pois a empresaque ganha aquilo no final dos 3 anos fica com quem quiser e ao preo que quer. () Nastrs primeiras empresas eu que estive fui sempre efectivo. Mas no deixava de ser prec-rio, porque ao fim de 3 anos eu podia ficar como no podia como muitos colegas meusque ficaram pelo caminho.

    referido por esses trabalhadores a constante angstia e incerteza em relao aofuturo, enfatizando-se a imprevisibilidade nos termos da durao de trabalho. O meucontrato um contrato temporrio, porque eu trabalho para uma empresa de outsour-cing, que por sua vez faz prestao de servios para a PT Contact, que por sua vez prestaprestao de servios PT Comunicaes (PT C). O que eu acho que a maioria das pes-soas sente muita angstia e muita incerteza em relao ao futuro, porque ns nuncasabemos quando que vamos ficar de um momento para o outro ou sem trabalho ou comoutras condies.

    Estou numa situao em que no sou efectivo. () O contrato prende-se com adurao do posto de trabalho. Devo dizer que neste momento j passaram os trs anos doconcurso e est-se espera de saber qual a empresa que ganha.

    Podem tambm representar situaes de frustrao e de desmotivao em resultado deuma actividade no desejada ou no conseguida. Acho que tudo isto cria uma grandeangstia e pode, eventualmente, criar desmotivao.

    Na maioria dos casos, essas formas de emprego so impostas contra a vontade do tra-balhador, que por ausncia de alternativa positiva o empurram para uma mobilidade pro-

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    fissional forada (Rebelo, 2004). Antes da PT C trabalhei na TV Cabo. Trabalhei com con-tratos automaticamente renovados e quando cheguei ao fim dos 3 anos, em que ia pas-sar a efectiva, apresentaram-me uma carta de resciso e passados 3 dias deram-me umacarta de renovao, uma adenda ao contrato que tinha, com a mesma empresa e eu acei-tei. () E a perspectiva que nos do : ou aceitamos ou vimos embora.

    So tambm apontadas as diferenas em termos salariais e de direitos laborais porcomparao com os trabalhadores efectivos, uma vez que o trabalho precrio caracteri-zado pelos baixos salrios e pelos baixos benefcios sociais (falta de estabilidade noemprego, fraca segurana perante o emprego e contribuies incompletas para efeitos dereformas) (Rebelo, 2004). Depois tambm trs uma grande diferena salarial e em ter-mos de direitos laborais tambm. Ns no temos o que tm os trabalhadores efectivos ea distncia enorme e nem tem comparao.

    Os trabalhadores precrios sentem-se muitas vezes como trabalhadores de segundaclasse, sem sentimento de pertena organizao. Existe uma grande maioria de con-tratados a prazo que no se sentem como fazendo parte da empresa, porque existe umgrande distanciamento entre a empresa e estes trabalhadores.

    No conjunto dos sectores analisados, o crescimento da precariedade laboral e de for-mas de trabalho atpicas esto tambm associadas a uma diminuio na taxa de sindicali-zao dos trabalhadores (principalmente nos mais jovens). Em relao questo da dimi-nuio da taxa de sindicalizao, foi referido pela trabalhadora precria do sector quecada vez mais as pessoas funcionam em termos individuais. Em termos de trabalho, aspessoas individualizam-se cada vez mais e pensam cada vez mais em si, em vez de teruma conscincia colectiva. E isso acontece, na sua opinio, porque tudo est cada vezmais difcil e a juventude no tem tanto essa conscincia porque mais o tentar sobrevi-ver. A participao dos trabalhadores nas empresas tende, portanto, a ser feita fora doquadro sindical e a inscrever-se no processo de crescente individualizao das relaes detrabalho (Kvacs, 2005).

    Analisando os discursos dos militantes sindicais por sector de actividade, e comeandopelo sector automvel, importa sublinhar que se trata de um sector com forte incidnciade precariedade laboral, sobretudo no conjunto das empresas que trabalham no parqueAutoeuropa. De acordo com o representante da FIEQUIMETAL, mais de metade dos tra-balhadores [do parque Autoeuropa] estaro em situao precria, () com vnculos pre-crios! No seu conjunto, estes vnculos referem-se a contratos a prazo ou a termo, a tra-balho temporrio, a recibos verdes (que ns ltimos anos tm vindo a assumir uma maiorexpresso) e a prestaes de servios. H prestaes de servios que nunca so perma-nentes, pois de trs em trs anos ou de quatro em quatro anos pode mudar. Noutrasempresas do sector, sobretudo onde se processam as grandes reparaes, tambm existeo trabalho hora.

    Outro militante desta organizao confirmou a prtica de salrios mais baixos no casodos trabalhadores com contratos precrios, situando-se os valores em cerca de 25% abaixodos salrios dos trabalhadores efectivos. Trata-se, na maioria dos casos, de situaes de

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    trabalho permanentes, com remuneraes e condies de trabalho bastante inferiores sdos trabalhadores permanentes. Por outro lado, admitiu que os trabalhadores prec-rios no tm acesso formao profissional e que no evoluem em termos da sua quali-ficao profissional.

    Face ao aumento da precariedade laboral neste sector, um dos interlocutores destafederao referiu que se instalou a ideia de que natural e legal estar a contrato aprazo, quer por parte das entidades patronais, quer por parte dos trabalhadores. A suaconcepo vai no sentido oposto, uma vez que admite que todos os trabalhadores devemter um contrato permanente e que s dever haver contratos a termo ou temporriosquando o trabalho no permanente. Refere ainda que no conjunto do parqueAutoeuropa quando admitido um trabalhador sempre com um contrato temporrio,durante o primeiro ano e que ao fim desse ano de trabalho temporrio passa a contratoa prazo durante mais trs anos. No deixa de sublinhar que h casos em que [os traba-lhadores ao fim dos trs anos] vo embora e depois voltam outra vez com um contrato detrabalho temporrio. E conclui afirmando que h pessoas nessa situao durante vriosanos (6, 7 anos), o que, na sua opinio, ilegal.

    Na concepo de Rebelo (2004) estamos perante formas de trabalho que vo para almdos limites da legalidade, ou seja, perante a precariedade ilegal, que se traduz, por exem-plo, na contratao de trabalhadores a termo para desempenhar funes de trabalho semtermo, na contratao de falsos trabalhadores independentes (recibos verdes) e nasdiversas formas de contratao ligadas ao trabalho clandestino.

    Em termos das prticas e das polticas desenvolvidas pelas estruturas sindicais no sen-tido de combater a precariedade laboral, destacamos o trabalho de denncia e de reivindi-cao (neste caso atravs dos cadernos reivindicativos) que a FIEQUIMETAL vai desenvol-vendo, na pessoa dos delegados e dirigentes sindicais que esto no terreno e que acompa-nham os trabalhadores nos prprios locais de trabalho.

    Os interlocutores desta organizao referem que esse trabalho dificultado no caso dostrabalhadores a recibos verdes, onde h uma menor interveno, dado o maior afasta-mento destes trabalhadores em relao ao sindicato, embora esta tendncia se esteja gra-dualmente a inverter, com a sindicalizao deste tipo de trabalhador. Nos contratos aprazo os trabalhadores esto mais disponveis para defender os seus direitos, no trabalhotemporrio h menos disponibilidade. Destacam que uma das prioridades da sua acopassa por encontrar formas de negociao para que os trabalhadores temporrios possampassar a ter um contrato de trabalho efectivo.

    O trabalhador precrio do sector automvel presente na interveno sociolgica, ape-sar da sua situao, sindicalizado e reconhece o importante papel de apoio do sindicatona defesa dos direitos e dos interesses dos trabalhadores. O sindicato tem dado uma boaajuda. () Tem havido momentos difceis, nomeadamente aquele em que ns ficmos narua, e foi com a coordenao do sindicato e com o apoio do sindicato que ns consegui-mos no s defender a reentrada, como depois garantir e retomar os direitos e as rega-lias que tnhamos.

  • Globalizao e Relaes Laborais em Portugal

    No caso do SINDEL, de acordo com o interlocutor presente na sesso da intervenosociolgica, uma das dificuldades encontrar uma melhor comunicao, mais efectivae mais atempada com as pessoas que trabalham no sector, com os delegados sindicais eisso acontece porque, na sua opinio, os trabalhadores so mais pressionados pelas enti-dades patronais e tambm pela prpria situao de dificuldade financeira, o que faz comque tenham muito mais dificuldade de se aproximar e de colaborar com os sindicatos.

    Para combater esta dificuldade o SINDEL desenvolve aces de formao e promovedebates e encontros de reflexo, com o objectivo de alertar os trabalhadores para as situa-es de precariedade que possam existir nos locais de trabalho, de modo a que as possamdivulgar e possibilitar uma interveno atempada por parte dos sindicatos. Refere quemuitas vezes, uma das nossas dificuldades detectar a tempo as precariedades e quea capacidade representativa, de negociao e de interveno do sindicato tanto melhorquanto mais profisses, trabalhadores e situaes de trabalho estiverem representados.

    No que diz respeito ao sector txtil e do vesturio, nas ltimas dcadas, a abertura concorrncia e a progressiva liberalizao do mercado mundial dos txteis e do vesturioprovocaram inmeras mudanas na estrutura e organizao deste sector em Portugal. Umdos seus efeitos mais notrios foi a diminuio do nmero de empresas e de postos de tra-balho, decorrentes das deslocalizaes e encerramentos de empresas, com o aumentogeneralizado do desemprego neste sector. De acordo com o interlocutor da FESETE onosso observatrio sobre o emprego concluiu que nos ltimos 10 anos perdemos 100.000postos de trabalho. Essa reduo tambm se ficou a dever modernizao tecnolgica.

    Refere que para alm da perca de postos de trabalho h tambm a perca dos direitosdos trabalhadores, porque [cerca de] 90% dos trabalhadores [que foram afectados com osencerramentos das empresas] no receberam nada!

    reconhecida a impotncia e a dificuldade com que as associaes sindicais se depa-ram na defesa dos interesses dos trabalhadores perante as situaes de deslocalizao e deencerramento das empresas. Admitem que no tm qualquer forma de impedir que aempresa se deslocalize, sendo que a nica forma de defesa dos trabalhadores a negocia-o das indemnizaes a que tm direito, ou nos casos de falncia das empresas a nego-ciao dos fundos de garantia salarial.

    No entanto, apesar das dificuldades, o dirigente assume que no deixam de estar juntodos trabalhadores e de procurar defender da melhor forma os seus direitos, numa posturade luta e de interveno. Na esmagadora maioria das empresas os sindicatos estiveramjunto dos trabalhadores. A resistir, a lutar, a intervir. No h nenhuma empresa que fecheem que no esteja l o sindicato, a lutar e a dar o nimo aos trabalhadores e a no aban-donar os trabalhadores. Refere o exemplo apresentado na sesso da interveno sociol-gica, em que as pessoas no estavam sindicalizadas, mas o sindicato foi l, apoiou e ostrabalhadores esto a ter os resultados dessa nossa interveno. Para corroborar estaconcepo, deixamos o testemunho de uma desempregada do sector txtil, que esteve pre-sente na sesso da interveno sociolgica: Actualmente estou desempregada. Trabalheinuma fbrica de confeces. As condies que tnhamos no eram nenhumas. O orde-

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    nado era baixo mas ia havendo sempre trabalho, alis sempre com pressa. Viemos a des-cobrir que [no eram feitos] os descontos para a Segurana Social. [A situao] foificando cada vez pior, at que [deixmos de receber, mas mesmo assim] continumos sem-pre a trabalhar. Pedimos ajuda ao sindicato, [mesmo no sendo sindicalizadas] e no nosviraram as costas. [Com o apoio do sindicato conseguimos receber] o Fundo de GarantiaSalarial. () Basicamente foram eles que nos valeram.

    O sector txtil caracteriza-se por uma certa estabilidade no emprego, por comparaoaos restantes sectores de actividade em anlise, na medida em que a maior parte dos tra-balhadores tm contratos sem termo. O militante da FESETE afirmou que o sector temum quadro consolidado com mais de 80% dos trabalhadores com vnculo efectivo. Posso--vos dizer que em termos de sector ns temos entre 17 e 18% de contratos a prazo, comtodos os direitos contratuais idnticos aos dos contratos sem termo. No h nenhumcontrato a prazo que possa ter menos do que o salrio do contrato, que possa ter menosfrias, menos subsdio de frias, menos subsdio de Natal, menos idas ao mdico, ou seja,menos direitos e regalias.

    Apesar de tudo, h a conscincia de que existe algum trabalho precrio que no se podequantificar, sobretudo pessoas que trabalham em casa informalmente para determinadasempresas, porque se trata de realidades escondidas e difceis de descortinar ao nvel da eco-nomia informal e ilegal.

    Em termos da actuao dos sindicatos, tendo em conta as dificuldades sentidas, despo-letadas com a globalizao dos mercados, e face s especificidades prprias do sector, foramnegociadas entre os sindicatos e as associaes patronais novas condies para a contrata-o a termo. Foi acordado entre as partes que no sector no poder haver mais de 20% depessoas com contratos de trabalho a prazo, incluindo aluguer de mo-de-obra.

    Essa considerada uma percentagem razovel, tendo em conta que se trata de um sec-tor de actividade que tem picos de actividade e que por vezes trabalha com sries muito cur-tas e com entregas rpidas. Para alm de que se trata de um sector caracterizado por umafora de trabalho muito feminina (cerca de 73% do total dos trabalhadores so mulheres,com uma percentagem ainda mais elevada se considerarmos o subsector do vesturio), comas consequncias que advm das licenas de maternidade e de assistncia a filhos menores.

    Assume que antes era uma selva muito grande () de contratos a um ms, quinzedias, dois meses, trs meses, quatro meses e que a regulamentao negociada com asassociaes patronais veio delimitar o mnimo de seis meses para a realizao de qual-quer contrato a termo. Na sua opinio, isto tambm d a possibilidade de o movimentosindical aparecer de forma positiva na negociao no sentido de defender os interessesdos trabalhadores.

    Refere que foi negociado, em 2006, um novo contrato colectivo de trabalho para o sec-tor, entre as associaes sindicais e patronais, onde se tentaram adaptar as mudanasintroduzidas pelo Cdigo de Trabalho.

    No que diz respeito sindicalizao, as situaes de deslocalizao afectaram bastantea taxa de sindicalizao do sector, porque muitas empresas que fecharam, algumas de

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    (26) A nica a estar representada nas sesses da Interveno Sociolgica.

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    grande dimenso, tinham muitos trabalhadores sindicalizados. Por outro lado, uma outradificuldade revelada pelos sindicatos a da sindicalizao dos mais jovens, onde se mani-festa uma maior incidncia de trabalho temporrio e uma maior rotatividade, dada a pol-tica de baixos salrios, menos no caso dos jovens mais qualificados.

    No entanto, segundo o interlocutor da FESETE, a questo do sindicalismo no semede s pelo nmero de sindicalizados, mede-se tambm pela influncia que o sindicatotem junto dos trabalhadores. Em relao a esta questo esclarece que a actuao da fede-rao abrangente a todos os trabalhadores do sector. Sublinha que no fazem reuniesnas empresas com os trabalhadores excluindo os trabalhadores no sindicalizados. Ascondies que ns negociamos so para todos os trabalhadores e inclusivamente pedimosportarias e regulamentos de extenso para todos os trabalhadores. Da que considereque a influncia que tm bastante significativa. A esmagadora maioria dos trabalha-dores reconhecem no sindicato o seu defensor e h sempre um momento em que vobater porta do sindicato para o sindicato os poder ajudar.

    Defende que o sindicalismo da CGTP um sindicalismo prximo dos trabalhadores:de eleio dos delegados sindicais nas empresas, de reunies e de plenrios com os tra-balhadores. A CGTP desenvolve um sindicalismo de proximidade com os trabalhadores eintervm na sociedade com uma grande responsabilidade.

    Ainda no que diz respeito interveno desta federao, o seu dirigente salientou oestabelecimento de vrias parcerias com um conjunto de entidades externas (universida-des, centros de formao, entidades internacionais), no sentido de desenvolver projectosnuma perspectiva de defesa do emprego, de defesa dos direitos dos trabalhadores, de res-ponder aos problemas dos trabalhadores, de desenvolvimento do prprio sector).

    Uma grande preocupao com o emprego no sector da hotelaria e da restaurao aforte incidncia dos vnculos contratuais precrios e temporrios, neste ltimo caso muitorelacionados com a sazonalidade das actividades, tratando-se muitas vezes de emprego nodeclarado. No sector da Hotelaria, as situaes de emprego precrio assumem um pesosuperior mdia nacional, estimando-se que quase metade dos trabalhadores deste sectoresteja numa situao de emprego precrio.

    Segundo o dirigente da federao do sector, filiada na CGTP, a FESAHT26, detectadaa existncia de muita contratao a termo certo e de contratao a termo incerto semjustificao. Afirma tambm que o trabalho temporrio tem aumentado substancial-mente e de uma forma escandalosa, nomeadamente no sector da restaurao colectiva(restaurao das cantinas, dos refeitrios, as IPSS dentro dos prprios hospitais), comtodas as consequncias que isso tem, [quer para os trabalhadores e suas famlias, querpara o Estado, quer para a prpria economia].

    Este interlocutor divulgou os resultados de um estudo levado a cabo pela sua organi-zao sobre a precariedade laboral no sector, em que em 424 empresas inquiridas, num

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    universo de 37.000 trabalhadores (que foram contactados directamente ou obtivemosesta informao via estudo dos quadros de pessoal e dos balanos sociais), foram apura-dos 23.805 trabalhadores efectivos. A diferena de cerca de 13.000, que corresponde atrabalhadores que esto na condio de contratos a termo certo ou incerto, alguns tra-balhadores a recibos verdes, a trabalhadores a tempo parcial, a trabalhadores tempo-rrios. Refere ainda que na opinio da federao essa diferena peca por defeito.

    O dirigente sindical sublinhou ainda que nalgumas regies do pas, como por exem-plo no Algarve, a taxa de precariedade, tendo em conta estes pressupostos, ultrapassou os50%, quer nos hotis, quer nos restaurantes, quer nas cantinas.

    Para alm da precariedade dos vnculos contratuais defende que a precariedadeassume neste sector uma dimenso mais alargada, por exemplo, quando no se cumpreos dias de folga, quando no h formao profissional para os trabalhadores (e 28empresas destas nunca deram formao profissional aos seus trabalhadores e so obri-gados a dar), quando no se declara tudo aquilo que o trabalhador recebe (o que foi apu-rado acontecer em 82 empresas). Conclui afirmando que foi apurada a mdia de 31, 8%de taxa de precariedade deste conjunto de fenmenos no sector da hotelaria e restaura-o e das cantinas.

    Este estudo tambm permitiu concluir que existe uma grande preferncia do tecidoempresarial em contratar trabalhadores no especializados em detrimento dos trabalha-dores especializados: os empregados de mesa encartados, os cozinheiros, os pasteleiros,com forte incidncia para o pagamento de baixos salrios.

    Face s caractersticas deste sector e tendo em conta a sazonalidade das actividades,esta estrutura sindical admite o recurso contratao a prazo e temporria, mas nestecaso justificada. Obviamente admitimos no nosso sector algum tipo de precariedade,() h determinados perodos em que os hotis tm um acrscimo de clientes, obvia-mente que nessa altura tem que haver contratao a prazo. Mas, fora disso, tem quehaver um quadro mnimo de trabalhadores, com contrato, com garantias de efectividade.E hoje a aposta, efectivamente, no essa. A aposta caminhar, cada vez mais, para ovnculo precrio dos trabalhadores.

    No que diz respeito s estratgias de actuao desta organizao, aquando da inicia-o dos processos reivindicativos ns temos clusulas de referncia que juntamos s nos-sas propostas, de modo a criar regras que permitam sindicalmente combater o fenmenoda precariedade laboral e a conseguir a passagem para o quadro de efectivos permanen-tes dos trabalhadores com contratos a termo que estejam a exercer funes e a ocuparpostos de trabalho de carcter permanente.

    O sector bancrio sempre foi reputado como um sector caracterizado pela estabilidadedo emprego e pela promoo a nveis superiores de qualificao e salariais. Em 2004, aforma mais comum de contratao no sector bancrio era a dos vnculos duradouros,sendo que 94% dos trabalhadores do sector tinham um contrato sem termo.

    No entanto, de acordo com os vrios dirigentes das organizaes sindicais presentesnas sesses da interveno sociolgica (SNQTB, SBSI e STEC), nos ltimos anos tambm

  • Globalizao e Relaes Laborais em Portugal

    est a ser atingido pela precariedade do emprego e das relaes laborais. Embora, nestecaso, no assuma a dimenso que assume em outros sectores de actividade consideradosno nosso estudo.

    A este nvel, foram referidos os exemplos dos bancos estrangeiros a actuar em Portugal,que nas palavras do dirigente do SNQTB admitem as pessoas com um contrato a prazoe depois ao fim do ano renovam o contrato a prazo e, eventualmente, s ao fim de trsanos que as pessoas entram para os quadros do banco. E ao mesmo tempo que fazemisso, esto a publicar anncios para admitir pessoas e admitem pessoas com contratosdefinitivos, at numa certa agressividade concorrencial no mercado de trabalho. E issoacontece, sobretudo, no caso dos jovens que ainda esto no incio da sua carreira. H tam-bm os exemplos dos call centers de alguns bancos, cujo desenvolvimento est muito asso-ciado externalizao de servios, sobretudo nas reas no estratgicas, com o objectivofinal da reduo significativa dos custos. Nesses casos os trabalhadores esto numa situa-o de trabalho temporrio e a recibos verdes.

    O STEC, o sindicato do grupo Caixa Geral de Depsitos, na pessoa do seu presidente,defende que num sector forte como a banca no faz sentido que exista contratao atermo, o que considera ser uma forma de precariedade laboral. Sublinha que se trataclaramente de um aproveitamento das entidades patronais para pouparem dinheiro,principalmente no captulo dos direitos, a partir daquilo que a lei permite fazer.

    Este sindicato tem procurado que esses contratos a termo no ultrapassem os 3 anos,embora a lei, neste momento, permita estender esse prazo at ao limite de 6 anos (istoantes da reviso do Cdigo do Trabalho). E reconhece que nesse domnio a empresa temdemonstrado alguma preocupao no sentido de no prolongar demasiado esse vnculo deprecariedade. Para este dirigente, apesar de desempenharem as mesmas funes que ostrabalhadores permanentes, esto numa situao desigual, no s em termos de vnculose da estabilidade do emprego, mas tambm porque no tem acesso s mesmas regaliassociais, sendo que o exemplo mais gritante o acesso ao crdito habitao nas condiesregulamentadas no Acordo de Empresa.

    No caso dos trabalhadores de trabalho temporrio (os tarefeiros), o sindicato tem feitoum esforo no sentido de sensibilizar a empresa para a no utilizao de trabalhadoresem regime de trabalho temporrio. Refere que tem havido alguma reduo, mas conti-nua a ser praticada.

    O interlocutor do SBSI considera que a realidade da precariedade laboral na banca relativamente recente, mas existe a todos os nveis. Existe em termos de outsourcing,de recibos verdes, de aproveitamento exagerado dos estgios (), de contratos a termocerto, de recurso a trabalhos sazonais (campanhas de vendas de cartes), e, ultimamente,tambm o trabalho pea. Este ltimo exemplo refere-se s conferncias de crdito parahabitao. Afirma que cada processo de crdito para habitao tem que ser conferido equantos mais conferires, mais ganhas. Por cada processo conferido esses trabalhadoresauferem 1,56, por cerca de meia hora de trabalho. Considera que isso o ponto mximoda explorao e da escravatura.

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    Em termos da actuao dos sindicatos face a estas realidades, no caso do STEC, a ati-tude, quer em relao aos precrios, quer em relao ao trabalho temporrio, quer emrelao aos contratos a termo, de apoio naquilo que pudermos, porque temos a noode que o prprio futuro do sindicato e do sindicalismo [poder estar em causa] se no con-seguir acompanhar, intervir e apoiar este segmento de trabalhadores.

    O departamento jurdico do STEC est completamente ao dispor de todos os traba-lhadores, incluindo os que esto em situao de precariedade laboral. Esse tambm onosso papel!

    A principal luta desta organizao sindical, neste momento, tentar que os contratosa termo no ultrapassem o prazo mximo de dois anos.

    No caso do SBSI, existem estruturas regionais e estruturas de empresa, que tm pes-soas a tempo inteiro no sindicato, que apoiam nos locais de trabalho todos os trabalha-dores bancrios. () Tentamos reivindicar junto das administraes e das direces dosrecursos humanos as vrias situaes que vamos encontrando. Temos feito alguns deba-tes e comunicados sobre a matria da precariedade das relaes laborais.

    Muito recentemente foi levada a cabo por este sindicato uma campanha de sindicali-zao dirigida essencialmente aos trabalhadores das empresas de outsourcing. Houvenecessidade de alterar os estatutos do sindicato, que no permitiam que esses trabalha-dores se associassem.

    Este tipo de atitude contraditria em relao s acusaes que muitos autores fazemaos sindicatos de defenderem na sua aco sobretudo os privilgios dos trabalhadores quetradicionalmente representam, na sua maioria no precrios e de raramente surgirem preo-cupados com as questes da precariedade laboral ao nvel da negociao. (Kvacs, 2005)

    Das aces anteriormente descritas decorre a ideia de que a fora das associaes repre-sentativas dos trabalhadores passa muito pela reconsiderao das formas de filiao dostrabalhadores, que devem apelar tambm filiao dos trabalhadores precrios, que comovimos constitui um grupo de trabalhadores em crescimento (Rebelo, 2004). Esta concep-o extensvel a todos os sectores de actividade econmica.

    No que concerne ao sector das telecomunicaes, apesar de os dados estatsticos apon-tarem para uma reduo dos postos de trabalho, na opinio das organizaes sindicais pre-sentes nas sesses da interveno sociolgica tem havido criao de emprego, mas atravsdo aumento do trabalho temporrio e precrio (contratos a prazo, recibos verdes, subcon-tratao). Esta situao particularmente visvel no que diz respeito aos call centers, querecorrem aos servios das empresas de trabalho temporrio. Nas palavras do dirigente doSICOMP, a criao de novos postos de trabalho () feita atravs de contratao at-pica. Desprivilegia-se a contratao colectiva e recorre-se sistematicamente a contratosa termo ou a recibos verdes, o que na sua opinio gera insegurana, desemprego eprecariedade laboral.

    Para os vrios interlocutores deste sector, de correntes sindicais distintas, consensuala ideia de que com a liberalizao do sector entraram no mercado novas empresas, queoptam deliberadamente por situaes de contratao atpica.

  • Globalizao e Relaes Laborais em Portugal

    A crena das organizaes sindicais a de que nesta rea de prestao de servios cercade 80% do trabalho prestado esteja sujeito a condies de precariedade. Na opinio dosdirigentes, o grupo mais afectado por esta crescente precariedade so os trabalhadoresmais jovens que, em muitos casos, possuem habilitaes escolares superiores. Estes tra-balhadores contratados atravs das empresas de trabalho temporrio, mesmo a desempe-nhar as mesmas funes profissionais, ganham menos do que os outros trabalhadores.

    Foi referido pelo interlocutor do SICOMP que no sector a nica empresa em que h,de facto, contratao colectiva na PT Comunicaes, fruto de um movimento sindicalforte e de uma boa prtica de relaes laborais entre os sindicatos e a gesto da empresa.Com a modernizao do sector e a liberalizao do mercado o grupo PT tem vindo a sub-dividir-se em vrias empresas e o resultado tem sido a transferncia de trabalhadoresoriundos da PT Comunicaes para essas empresas atravs de contratos de cedncia, queso negociados entre a gesto da empresa, a PT Comunicaes, e os sindicatos. Noentanto, na perspectiva deste dirigente sindical, se essa situao no for alterada, vaicriar tambm, futuramente, uma situao grave, uma vez que, a caminharmos neste sen-tido, [apenas] uma parte dos trabalhadores, uma pequena minoria fica abrangida peloacordo colectivo de trabalho.

    Do conjunto das intervenes conclui-se que existe um conjunto de empresas degrande dimenso que no realizam negociao colectiva com as associaes sindicais e que,em geral, se regem apenas pelo Cdigo de Trabalho e ainda empresas de outsourcing, ondese incluem as empresas de trabalho temporrio, que fornecem a maior parte dos trabalha-dores para os servios de call centers. Algumas associaes sindicais mencionaram o factode estarem a propor e a tentar negociar um Contrato Colectivo de Trabalho com empresasde trabalho temporrio para os trabalhadores dos call centers das telecomunicaes.

    Relativamente actuao dos sindicatos face ao desemprego e aos trabalhadores pre-crios, o militante do SICOMP refere que se trata de uma situao que tem que ser resol-vida a nvel global () atravs de medidas baseadas num acordo social efectivo entre osprincipais actores sociais. Isto , o governo, as confederaes patronais, as centrais sin-dicais e confederaes sindicais representativas dos vrios sectores de ramos de activi-dade e tendo em conta a conjuntura internacional e a realidade da economia portu-guesa. Neste contexto, sublinha a importncia da credibilizao do Conselho Econmicoe Social, que na sua perspectiva est completamente desajustado da realidade actual,dado que, na sua opinio, no composto de acordo com a realidade sindical existente.

    Defende que a contratao colectiva fundamental e deve ser privilegiada em detri-mento do que so as actuais prticas das empresas do sector, e tambm dos restantes sec-tores em geral, que adjectiva de simplistas, baseadas na reduo de custos relacionadoscom o trabalho, na reduo de salrios, na reduo de benefcios sociais, no recurso sub-contratao, que no seu conjunto originam o aumento da precariedade laboral.

    Na sua opinio, a situao tem que ser completamente invertida e tem que se optarpor outra via que consiste na inovao, diversificando e adaptando os produtos s flu-tuaes da procura, mediante processos de qualificao, de responsabilizao e de adap-

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    tao dos trabalhadores como protagonistas indispensveis, bem como atravs do desen-volvimento de boas prticas nas relaes laborais, valorizando a contratao colectiva eo respeito pela liberdade sindical. Sublinha ainda que preciso uma formao contnuae qualificada promovendo a produtividade. So necessrias polticas orientadas para o mer-cado de trabalho e que promovam a sustentabilidade econmica das empresas. precisopenalizar as empresas que no cumprem com as suas responsabilidades sociais. E pre-ciso, tambm, uma moralizao e aperfeioamento dos sistemas de segurana social, demodo a que d respostas positivas situao dos desempregados.

    De acordo com a interveno do responsvel pelas relaes colectivas pela PT Comuni-caes e da TMN, as implicaes negativas da globalizao e da precariedade da actividadelaboral podero ser ultrapassadas atravs da co-responsabilizao entre o trabalhador ea entidade empregadora, naquilo que a promoo da formao pessoal e naquilo que a valorizao da sua empregabilidade. Este interlocutor defende que os trabalhadoresdevem exigir s suas empresas formao e as empresas devem exigir s pessoas produti-vidade acrescida.

    Sublinha que os sindicatos tambm assumem um papel preponderante no combate sdificuldades, mas considera que necessria uma abertura por parte destes actores sociaiss mudanas recentes do mercado de trabalho, considerando que devem adequar as suasestratgias ao novo contexto socioeconmico, sendo igualmente muito importante que nasua aco ultrapassem a lgica de mera concorrncia entre si a nvel de angariao deassociados. assim enfatizada a concepo de Rebelo (2004), de que a sociedade neces-sita de actores sindicais fortes para ajudarem a definir e, em consequncia, organizar umnovo enquadramento do conjunto de alteraes verificadas recentemente nos sistemasprodutivos, de forma a assegurar condies de trabalho para o futuro.

    No que concerne precariedade das relaes laborais tm surgido associaes ou gru-pos de cidados extremamente importantes que tm como preocupao e objectivo a pro-cura de novos meios de aco colectiva, no sentido de contribuir para a construo desolues no sentido de atenuar os efeitos da precariedade do emprego. A actividade de par-ticipao da cidadania em torno dos problemas quotidianos, como a precariedade laborale o desemprego, constitui uma forma de poltica da vida quotidiana.

    Um tema abordado na interveno sociolgica foi o da articulao da actuao dos sin-dicatos com a actuao deste tipo de associaes ou grupos de cidados.

    O FERVE e os Precrios Inflexveis constituem exemplos destes grupos de cidadosrecentemente criados.

    No que diz respeito ao FERVE, este grupo, criado por duas pessoas, teve como objec-tivos iniciais os de, por um lado, tentar fazer com que as pessoas que trabalham a reci-bos verdes pudessem debater os problemas e as dificuldades profissionais que sentiam etentar criar alguma conscincia da realidade laboral dos recibos verdes junto dessas pes-soas, e, por outro lado, comear a reflectir mais especificamente de recibos verdes e node precariedade em geral. Na opinio da representante do grupo os trabalhadores arecibos verdes encontram-se numa situao mais desfavorvel no mercado de trabalho

  • Globalizao e Relaes Laborais em Portugal

    por comparao ao trabalhadores com contratos a prazo, dado que h toda uma quan-tidade de direitos e deveres, inclusivamente direitos e deveres que dizem respeito aoEstado Providncia, que no esto inseridos na realidade laboral de quem trabalha arecibos verdes.

    Por outro lado, consideram que no existe um grande interesse por parte de quem jtem uma situao profissional regularizada em se consciencializar e em ter o esprito desolidariedade de ajudar estas pessoas.

    Foi criado um blog, que acabou por funcionar como uma plataforma, como um inter-face, para quem queira comunicar com o grupo e foi tambm criado um endereo de e-mail para ser possvel interagir com as pessoas que deixam os seus testemunhos no blog.Isso permitiu-nos, de alguma forma, ir chegando s pessoas e ir alargando a nossa redede contactos, porque apesar da crescente individualizao das relaes sociais e de tra-balho, quando necessrio mobilizar as pessoas elas, de facto, so mobilizveis.

    Em termos da relao do FERVE com os sindicatos, a interlocutora refere que os con-tactos dos sindicatos constam da base de dados do grupo e por isso recebem os e-mails queenviam, mas at hoje nunca tivemos qualquer tipo de resposta.

    Na sua opinio, a realidade dos recibos verdes no constitui uma prioridade dos sin-dicatos, porque estes representam e defendem, com toda a naturalidade, os interessesdos seus associados, que, normalmente, so trabalhadores que j tm toda uma srie dedireitos de trabalho garantidos. Por isso h uma grande dificuldade de quem trabalha arecibos verdes em se rever na actuao dos sindicatos.

    Em relao a esta questo, mais importante do que tudo a reflexo, com todos osactores sociais, incluindo os sindicatos, que nesse aspecto tero um papel primordial,sobre como se chegou a esta situao. Como que se chegou a um cenrio em que 1/5da populao portuguesa trabalha a Recibos Verdes?

    Conclui afirmando que esta situao poderia ser invertida se as inspeces por parte doMinistrio do Trabalho fossem mais actuantes.

    Os Precrios Inflexveis surgiram na sequncia do primeiro Mayday, em Lisboa, no anode 2007, decorrente de uma iniciativa internacional contra a precariedade.

    semelhana do FERVE, constituem um grupo de aco e de denncia contra a pre-cariedade. Tambm criaram um blog, que tem sido um instrumento importante de con-tacto com as pessoas, mas tambm de informao permanente, que tem melhorado aolongo deste ano. A questo dos testemunhos das pessoas no blog impor