Graça Morais Jornal de Letras 4
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J 6 a 19 de março de 2013 * jornaldeletras.sapo.pt entrevista, inquérito artes * 19
1 Suspeito que o autor seengana tão requentementequanto os historiadores
sobre a motivação da sua obra.Os acontecimentos podem
1 Não
2 Comme çi/comme ça
de pessoas que sorem para meiadúzia viverem com a ambição dedominarem o mundo”. E um deno-minador comum, a que az semprequestão de se reerir, por ser muitoatenta às questões da desigualdadeassim como às especifcidades douniverso eminino: “As mulheressão sempre as maiores vítimas”.Particularmente em tempo de crisee de grande desemprego, o queé verifcável mesmo ao nível dosquotidianos. “Instruíram-se e sãoa maior parte dos licenciados, nonosso país por exemplo, mas aindaocupam muito poucos cargos dechefa, apesar de ser hoje uma mu-lher, que parece um homem, quemanda na Europa. O elo mais racosão as mulheres, que continuama sorer muita violência ísica epsíquica, mais agravada em temposde crise. Basta abrir os jornais evemos notícia disso. Ando mesmoparticularmente impressionadacom o número de mulheres que se
NikiasSkapinakis
O panfeto e a obra de arte
AnaVidigal
Lembrando Susan Sontag
› a arte e o mundo ‹
1. A marcha do mundo, os confitos, as guerras, a pobreza,a crise económica, o estado de coisas no país infuenciam, ‘inspiram’ ,
refetem-se de alguma maneira no seu trabalho artístico?
2. Entende que os artistas, enquanto tal e/ou como cidadãos,têm responsabilidades de intervenção cívica? E a que níveis?
1 Um artista é um ser do mun-do. Capta, observa e escrutinao que o envolve. A sua apu-
rada sensibilidade ajuíza e fltra asinjustiças e as mentiras do mundocontemporâneo, e regista-as, in-tuitivamente, a maioria das vezes,na sua produção quotidiana. Se nãoosse assim a arte seria abúlica,nascisística e inútil.
Recordo a este propósito doisexemplos históricos: o Fuzilamento do 3 de Maio de Goya e a Guernica de Picasso.
2 O artista estará sempre do ou-tro lado da barricada! Por issoa intervenção cívica é intrín-
seca aos artistas, mas a sua arma, acriação artística, é sem dúvida pode-rosa e o seu registo terá certamenteum orte poder de atuação.
Muito do que se passa, des-graçadamente, na mentalidadecontemporânea, egoísta, raudu-lenta, e ávida de lucro a qualquerpreço, tem sido registado, nos maisdiversos tipos de criação, queratravés da palavra, quer através daimagem. Mais tarde ou mais cedodará os seus rutos.J
José deGuimarães
Um ser do mundo
suicidam e antes matam os flhos.Desempregadas, desesperadas eabandonadas pela sociedade, semperspetivas, há uma carga imensasobre essa espécie de ‘Medeias’,que não querem deixar os seus f-lhos sós nesta desgraça. É uma tra-gédia para a própria Humanidade eé preciso que as pessoas pensem noque está a acontecer”.
É o que Graça Morais az pin-tando. E desse modo continua ociclo do ‘medo’. São essas mulhe-res que atravessam a nova série deobras, em que atualmente trabalhae que ainda não batizou. Comosempre, o nome vem no fm. Porenquanto, envolve-se no desenho,“essencial”, porque nele encon-tra uma ligação pereita “entre océrebro e a mão”. São desenhosdemoradamente pensados e depoispassados ao papel com a rapideze a intensidade de um momentoúnico, em que a mão da pintora seabre entre o espírito e o mundo. J
Enquanto tal:“Ela deve ter adivinhado que eleestava a inventar, para a divertir.Por ele, nunca teria achado taissonhos convincentes ; maislhe pareciam pinturas. Não lhedesagradava inventá-los. Gostariasó que ossem invenções mais bemeitas. Estava a ver se encontravauma maneira poética.
*Por vezes é aceitável não dizera verdade, toda a verdade,quando se conta ou reconstitui opassado. Às vezes é necessário.(...) Mas como é sublime não oazermos, apesar de tudo.”1
E como cidadãos:“Choraremos juntos certamente.Mas não sejamos estúpidos juntos. Um pouco de consciênciahistórica poderia ajudar-nosa compreender o que acaba deacontecer e pode continuar aacontecer.” 2
Conclusão:(e adaptação de uma rase)“A pintora que há em mimdesconfa da boa cidadã”3 E aboa cidadã que há em mim age ereage.J
1 Susan Sontag in O Amante do Vulcão ;2 Susan Sontag in Ao Mesmo Tempo ;3 Frase original de Susan Sontag: A escritora
que há em mim desconfa da boa cidadã
JorgePinheiro
Inquietação e revolta
1 Quando Walter Benjamimconstatava que “oscombatentes regressavam
mudos da rente, não ricos,mas mais pobres de experiênciacomunicacional”, estar-nos-iaa recordar que toda a diegesenecessita do Tempo parase instaurar. E nós estamosmergulhados num processo deconsequências imprevisíveisdo qual não podemos, por ora,
destacar dessa diegese elementosconstituíveis e pertinentes àconstrução de qualquer discurso.O que (nos) está a acontecerestá (me) ainda a acontecer.Por isso, não me “inspira”:inquieta-me simplesmente. Erevolta-me. Então, “que azer”?Continuar a cumprir, aos 81anos, liturgicamente, a cíclicadescida da Avenida da Liberdade,num protesto que a sociedadedo espetáculo oerecerá, pelaTV, devidamente assimilado edeglutido, ao remansoso serãodas amílias?
2 Não terão decorrido,talvez, 500 anos desdeo início do que poderá
chamar-se a assunção daconsciência de classe doartista-cidadão: artista que,há milénios e ainda não comotal substantivado, servilmenteo seu amo avoreceu. Dasua perormatividade, aPolis espera a produção dediscursividades e - admitidoo termo neste contexto -inevitavelmente políticas:o que, na complexa ligaçãogenética que perpetuamente oligará ao poder aí estabelecidoe na interdependência quea ambos alimenta, cria umaambivalente relação de amor/ódio e uma subtil sucessão de jogos de guerrilha. Mas, porquea sua indissolubilidade estánaturalmente garantida, o perigopara qualquer uma das partes énulo. Como tudo na Natureza,não morrem nem se matam:transormam-se, mas juntos.J
M A r c O s B O r g A