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Novos projetos, fôlego renovado O GT Racismo entra em 2011 cheio de planos. Em muitos sentidos, esse será um ano de realizações, tanto quanto 2010 foi um ano de mobilização, sensibi- lização e planejamento. Nos próximos meses, o GT concluirá uma pesquisa sobre a percepção do público interno do Ministério Público de Pernambuco a respeito do racismo. Os resultados desse trabalho inédito serão de importância capital para que a instituição encontre o rumo certo em seu trabalho de enfrentamento à discriminação racial, interna e externamente. Também em 2011, o GT deverá lançar uma campanha de divulgação sobre a importância de denunciar crimes de racismo e injúria racial. Construída junto com o Movimento Negro e com as polícias Civil e Militar, a campanha é fruto de um esforço interinstitucional para tornar o Sistema de Justiça mais capacita- do e eficaz no tratamento deste tipo de delito. Várias outras medidas estão sendo tomadas conjuntamente por estas instituições para combater a subnotificação do racismo. União essencial para um tema ainda pouco debatido e de pouca vi- sibilidade nas polícias, no Judiciário e no próprio Ministério Público. O ano começa também com a esperança de que o MPPE passe a contar com uma promotoria especializada em racismo e outras formas de discriminação. Sugestão antiga do GT e alvo recente de recomendação do Conselho Nacional do Ministério Público, a medida pode se tornar realidade ainda no primeiro semes- tre, bastando que seja aprovada pelo Conselho Superior da instituição. Detalhes sobre todos esses assuntos você confere nesta edição do GT Racismo. GT inicia 2011 com projetos a concluir e novas ideias para combater o racismo com mais eficácia NÚMERO 18 JANEIRO 2011 Renata Beltrão/MPPE

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Novos projetos,fôlego renovadoOGT Racismo entra em 2011 cheio de planos. Em muitos sentidos, esse seráum ano de realizações, tanto quanto 2010 foi um ano de mobilização, sensibi-lização e planejamento. Nos próximos meses, o GT concluirá uma pesquisasobre a percepção do público interno do Ministério Público de Pernambuco arespeito do racismo. Os resultados desse trabalho inédito serão de importânciacapital para que a instituição encontre o rumo certo em seu trabalho deenfrentamento à discriminação racial, interna e externamente.Também em 2011, o GT deverá lançar uma campanha de divulgação sobre aimportância de denunciar crimes de racismo e injúria racial. Construída juntocom o Movimento Negro e com as polícias Civil e Militar, a campanha é frutode um esforço interinstitucional para tornar o Sistema de Justiça mais capacita-do e eficaz no tratamento deste tipo de delito. Várias outras medidas estão sendotomadas conjuntamente por estas instituições para combater a subnotificaçãodo racismo. União essencial para um tema ainda pouco debatido e de pouca vi-sibilidade nas polícias, no Judiciário e no próprio Ministério Público.O ano começa também com a esperança de que o MPPE passe a contar comuma promotoria especializada em racismo e outras formas de discriminação.Sugestão antiga do GT e alvo recente de recomendação do Conselho Nacional doMinistério Público, a medida pode se tornar realidade ainda no primeiro semes-tre, bastando que seja aprovada pelo Conselho Superior da instituição. Detalhessobre todos esses assuntos você confere nesta edição do GT Racismo.

GT inicia 2011com projetos aconcluir e novasideias paracombater oracismo commais eficácia

NÚMERO 18JANEIRO 2011

Renata Beltrão/MPPE

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OLINDA E PAULISTAPromotores de Justiça de Olinda e Paulistaestão construindo com representantes dosmunicípios um termo de ajustamento deconduta visando à implementação das Leis10.639/03 e 11.645/08, que instituíram aobrigatoriedade do ensino de culturaafricana, afro-brasileira e indígena nasescolas. Reunião realizada em novembropelos promotores de Justiça Janaína Sacra-mento, Clóvis Alves de Araújo, SérgioSouto (Olinda) e Camila Mendes (Pau-lista) com os gestores de Educação dos doismunicípios e da Gerência Regional deEducação serviu para atualizar as infor-mações do MPPE a respeito dos prepara-tivos para implementação das Leis. Casoseja formalizado o compromisso, o MPPEespera que o tema permaneça como prio-ridade dos municípios, mesmo em eventu-ais mudanças de gestão. Nesta atuação, ospromotores observaram o cumprimentodas metas do Planejamento Estratégico2009-2012 do MPPE, que traz emdestaque outras atividades visando oenfrentamento à discriminação racial.

LIMOEIROAs Leis 10.639/03 e 11.645/08 tambémmotivaram a atuação da Promotoria deJustiça de Limoeiro. O promotor IvoPereira de Lima conseguiu firmar termo deajustamento de conduta com o Municípioprevendo a implementação das legislações.Entre outras ações, o termo estipula amodificação dos livros de referência aserem adotados pelas escolas, bem como acapacitação continuada do corpo docente.O acordo prevê, ainda, medidas de com-bate à evasão escolar, ao trabalho infanto-juvenil e ao uso de substâncias tóxicas porcrianças e adolescentes.

TUPARETAMAA promotora Ana Clézia Nunes foi outra aelaborar acordo relacionado às Leis daeducação étnico-racial. A Prefeitura deTuparetama se compromete a realizarcapacitação continuada com os professoressobre a temática e a modificar os livrosdidáticos, além de fazer com que o con-teúdo seja ministrado em todo o currículoescolar, especialmente nas disciplinas de

Artes, Literatura e História Brasileira. Aideia é que as mudanças entrem em vigorjá no ano letivo de 2011.

SERRA TALHADAEm Serra Talhada, o promotor de JustiçaVandeci Souza Leite incluiu tambémescolas particulares no termo de ajusta-mento de conduta visando à implemen-tação das Leis 10.639/03 e 11.645/08.Fizeram parte dos acordos as escolasImagem do Progresso, Tempo Avançar,Maria José Mendes e Nova Geração; oscolégios de Aplicação da Faculdade deFormação de Professores de Serra Talhada,Imaculada Conceição e Francisco Men-des; além do Centro Educacional UlissesBezerra dos Santos.

VITÓRIAJá em Vitória de Santo Antão, a promoto-ra Vera Rejane Alves dos Santos emitiurecomendação para que a Prefeiturainforme ao MPPE sobre a incorporação datemática étnico-racial nos currículos esco-lares para o ano letivo de 2011.

VISITA AO QUILOMBO

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MPEM AÇÃONessa coluna, o GT Racismo reserva espaço para publicação denotícias das atividades dos promotores e procuradores de Justiçano combate ao racismo. Envie seu material e participe dasdiscussões sobre discriminação e promoção da igualdade racial.

>>> Quarenta e sete alunos de sétima série da EscolaFazer Crescer visitaram o quilombo Onze Negras, no Cabode Santo Agostinho, como parte do projeto pedagógicodesenvolvido ao longo de 2010 pelas professoras deGeografia e Biologia. A visita foi acompanhada pela coor-denadora do GT Racismo, procuradora Bernadete Azevedo.No local, os estudantes aprenderam sobre a origem dacomunidade e puderam conversar com os moradores sobreas conquistas e dificuldades que ainda enfrentam paragarantir direitos básicos.

Renata Beltrão/MPPE

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>>> Além da caminhada promovidapelo GT Racismo, uma homenagemmuito especial foi o outro marco doMês da Consciência Negra para oMinistério Público de Pernambuco. Aprocuradora de Justiça MariaBernadete Azevedo, coordenadora doGT Racismo, recebeu o Troféu TerçaNegra junto com o afoxé baianoFilhos de Gandhi e o sambista Belo X,em uma cerimônia realizada no Pátio

de São Pedro. Criado em 2009, otroféu é uma homenagem do Núcleode Cultura Afro-Brasileira daPrefeitura do Recife, outorgado sem-pre a pessoas e entidades que con-tribuem na divulgação e promoção dacultura africana. A Terça Negra ocorrehá 10 anos no Pátio de São Pedro comapresentações semanais de música ecultura de inspiração afro, desde oafoxé ao hip hop.

HOMENAGEM NA TERÇA NEGRA

GT RACISMO - NÚMERO 18 - JANEIRO 2011 - 3

UMA CASA PARA A NAÇÃO XAMBÁ

CAMINHADA MARCA DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRAIntegrantes do Ministério Público de Per-nambuco e parceiros do Movimento Negroconseguiram chamar a atenção da socieda-de, na Semana da Consciência Negra, coma I Caminhada Contra o Racismo Instituci-onal. O evento aconteceu em lembrança aoDia Nacional da Consciência Negra, come-morado oficialmente em 20 de novembro,data da morte de Zumbi dos Palmares.Vestidos de preto e distribuindo material dedivulgação sobre o tema, o grupo percorreua Rua do Imperador até o Palácio do Gover-

no, passando pela Ordem dos Advogadosdo Brasil e pelo Tribunal de Justiça.A caminhada foi organizada pelo Grupo deTrabalho sobre Discriminação Racial (GTRacismo) do MPPE mas, além dos seusintegrantes, contou com a participação depromotores de Justiça e servidores de váriosoutros setores da instituição, a exemplo daAssessoria Ministerial de Planejamento eCentral de Inquéritos da Capital. Cerca de40 pessoas participaram do evento e aju-daram a distribuir folders.

Sobrevivência de uma cultura, tradição de um povo. Evocandoesses conceitos, a procuradora de Justiça Maria Betânia da Silva deuparacer favorável no processo de usucapião do imóvel ocupado peloterreiro da Nação Xambá, um dos mais importantes do estado. Acasa no bairro de São Benedito, em Olinda, é habitada por inte-grantes da comunidade desde 1951.A casa, com 855 metros quadrados, é também onde se concentramas atividades sociais e religiosas deste que é considerado o únicoquilombo urbano de Pernambuco, já reconhecido pela FundaçãoPalmares. Na primeira instância, o juízo de Olinda extinguiu o

processo por considerar que as ações de usucapião especial de imó-vel urbano estão limitadas a 250metros quadrados. ANação Xambárecorreu e o caso está na 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça dePernambuco.“O juízo de primeira instância não considerou que a modalidadede usucapião ordinária, prevista no Código Civil, não limita área,mas apenas tempo e natureza da posse. Além disso, a ação de usu-capião não deve ficar presa apenas à formalidade. Deve considerarprincipalmente o interesse que se quer proteger”, afirmou a procu-radora. Nenhuma outra parte manifestou interesse no imóvel.

TJPE foi uma das paradas da caminhada

Renata Beltrão/MPPE

Isabela Torres/GT Racismo

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MPPE APOIA CAMPANHA DO UNICEFCONTRA RACISMO NA INFÂNCIA

“Nos chamam de macacos e nos xingam na rua. Mas eusou negra e orgulhosa da cor que tenho”, afirmou aestudante Tainá Oliveira, de apenas 12 anos, para um

lotado auditório na sede da Ordem dos Advogados do Brasil(OAB-PE) numa manhã de dezembro. Antes dela, a também estu-dante Jamille Estefany do Carmo contou como foi a reação doscolegas da escola quando descobriram que ela frequentava um ter-reiro para aprender maracatu. “ficaram me chamando de macum-beira e xangozeira”, narrou.Os depoimentos aconteceram durante a cerimônia de lança-

mento estadual da campanha do Fundo Nacional das NaçõesUnidas para a Infância (Unicef ) contra o racismo, iniciativa queconta com o apoio institucional do MPPE, na ocasião represen-tado pelo ouvidor Gilson Barbosa e pela coordenadora do Centrode Apoio Operacional às Promotorias da Infância e Juventude,promotora Ana Carolina Paes de Sá. Tainá e Jamille são apenasdois exemplos do que ocorre todos os dias, ao redor do País, comcrianças de raças e etnias discriminadas. Atitudes, frases, piadas ebrincadeiras “inofensivas” que moldam negativamente a relaçãodestas crianças com o mundo, com a sociedade e consigopróprias.Cleuza Pereira, secretária estadual de Desenvolvimento Social e

Direitos Humanos, descobriu como isso funciona em suasprimeiras visitas à comunidade quilombola de Conceição dasCrioulas, anos atrás. Ao ver uma menina especialmente bonita,disse à garota que ela parecia uma boneca. “A menina respondeu nahora: ‘não existe boneca preta...’”.Para o coordenador do Unicef no Recife, Salvador Soler, narrati-vas como estas justificam a preocupação da entidade com asrelações raciais na infância, bem como o lançamento de uma cam-panha nacional para tratar do tema. “Nosso objetivo é alertar parao impacto do racismo nas crianças brasileiras e valorizar a con-vivência”, afirmou. A campanha é composta de cartazes, de umacartilha com dados estatísticos e sugestões de como se pode con-tribuir para uma infância sem racismo, VTs para televisão e inter-net. Todo esse material, assim como textos e artigos, está tambémdisponível no blog www.infanciasemracismo.org.br.Para o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), a campanhacontra o racismo na infância corrobora com o trabalho institu-cional pela implementação das Leis 10.639/03 e 11.645/08, queinstituíram o ensino de história e cultura africana e afro-brasileiranas escolas do País - legislação até hoje não cumprida.

Cartaz é uma das peças da campanha, que tem vídeo e hot-site

Crianças contaram como são afetadas pelo racismo na escola

Ricardo Almoedo/OAB-PE

Unicef/Divulgação

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GT RACISMO - NÚMERO 18 - JANEIRO 2011 - 5

PERNAMBUCO PODE TER PROMOTORIAESPECIALIZADA EM DISCRIMINAÇÃO

Pernambuco poderá ser o segundo esta-do do País a contar com uma Promotoriaespecializada em racismo. Antiga sugestãoGT, a proposta ganhou fôlego em dezem-bro passado com a aprovação, por partedo Conselho Nacional do MinistérioPúblico (CNMP), de uma recomendaçãopara que todos os MPs criem promotoriaspara atuar especificamente nesta questão.Atualmente, apenas a Bahia conta comeste órgão. Em Pernambuco, caso aprova-do pelo Colégio de Procuradores, ele sechamará Promotoria de Combate aoRacismo e Outras Formas de Discri-minação, abarcando, desta forma, a defe-sa da cidadania de povos indígenas,ciganos, homossexuais e outros gruposdiscriminados.A atuação do CNMP tem base na reco-

mendação n.º 11 da Comissão Interame-ricana de Direitos Humanos, que já trata-va da necessidade de existência de promo-torias especializadas, e de um pedido deprovidências apresentado em 2009 pelaSecretaria Especial de Direitos Humanosda Presidência da República, requisitandoo cumprimento da recomendação.Para os integrantes do GT Racismo, a

criação da Promotoria especializada vem

se unir ao trabalho que o grupo já realizana capacitação, sensibilização e articulaçãode todo o público interno com relação àquestão racial. O GT acredita que o temaprecisa ser tratado de forma transversal. “Aquestão é ampla e pressupõe uma atitudeinstitucional que considere, sobretudo, aimportância de fiscalizar a implementaçãodas Leis que garantem ações afirmativasbásicas”, defendeu o grupo em ofício envi-ado ao CNMP enquanto o conselho aindaavaliava a possibilidade de emitir arecomendação.

A criação da Promotoria de Combate aoRacismo está incluída na proposta de reso-lução apresentada pelo procurador-geral deJustiça Paulo Varejão ao fim de seu manda-to. Outras 14 promotorias podem ser cri-adas, todas a partir da modificação deatribuições de promotorias substituas já exis-tentes, dentre elas, uma especializada emcrimes cibernéticos e outras com atuaçãojunto aos juizados especiais do Torcedor, doIdoso e do Meio Ambiente, além de novaspromotorias de Infância e Juventude,Central de Inquéritos e Júri da Capital.

Proposta de criação de novas Promotorias será apreciada pelo Colégio de Procuradores

APOIO DOS DIRETORES DE ESCOLAS SUPERIORESO racismo e a questão racial aterrisaram de vez na agenda do

Ministério Público brasileiro. Além do CNMP, o assunto tam-bém foi debatido pelo Colégio de Direitores de EscolasSuperiores do MP que, em outubro, lançou a Carta de Curitiba,documento que defende uma postura mais atuante do MinistérioPúblico na efetivação do Estatuto da Igualdade Racial. Dentre asmedidas propostas, estão a criação de estruturas funcionais per-

manentes e multidisciplinares dentro de cada instituição paratratar a questão - a exemplo do que já ocorre em Pernambucocom o GT Racismo. A carta também ressalta a necessidade deque o MP monitore indicadores socioeconômicos e, a partir daconstante capacitação e conscientização dos seus quadros, tam-bém adote medidas judiciais e extrajudiciais voltadas a combaterdesigualdades raciais.

Arquivo MPPE

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Entre a libertação de Mandela e a realiza-ção das primeiras eleições não raciais naÁfrica do Sul, na década de 90, um grupode fotógrafos sul-africanos especializou-seem capturar imagens de conflitos sangren-tos entre comunidades negras. Uma ver-dadeira guerra civil que - confirmou-sedepois - foi inflada por setores da minoria

branca interessados em desqualificar osnegros para o exercício da política. Por searriscar entre tiroteios e espancamentos,esses fotógrafos ficaram conhecidos como“o clube do bangue-bangue”. Através deseu trabalho, o mundo pôde conhecer arealidade brutal pela qual passou a Áfricado Sul nos primeiros anos pós-Apartheid.

DICA DE LEITURA

O CLUBE DO BANGUE-BANGUEGreg Marinovich e João Silva - Cia das Letras - R$ 58,00

Apenas com a população bem informada sobre seus direitos oSistema de Justiça de Pernambuco poderá se adequar plenamentepara receber e encaminhar com eficácia as reclamações de injúriaracial e crimes de racismo. Por acreditar nisso, o Ministério Públicode Pernambuco, através do GT Racismo, junto com as políciasCivil e Militar e Movimento Negro estão trabalhando juntos naelaboração de uma campanha educativa cujo objetivo será estimu-lar as vítimas destes crimes a procurar a punição dos agressores.A campanha está sendo discutida conjuntamente e é uma das

medidas prioritárias definidas na audiência realizada pelo MPPEem outubro passado para discutir medidas contra a subnotifi-cação e baixo grau de resolução deste tipo de delito. Na base daação, haverá uma cartilha de bolso explicando passo a passo oque a vítima de racismo e injúria racial deve fazer para asseguraro encaminhamento da denúncia. O material explicará, ainda,qual o papel de cada instituição na investigação do caso e noprocesso contra o agressor.Um dos pontos principais do material é o esclarecimento sobrea mudança recente no Código Penal que transformou a injúriaracial em crime de ação pública condicionada. Em outraspalavras: a vítima não é mais obrigada a contratar advogado -agora, cabe ao Ministério Público dar início à ação penal. A cam-panha será reforçada com outras peças, como cartazes, hotsite eações de rua. Todo o material será produzido pela AssessoriaMinisterial de Comunicação Social do MPPE. A previsão é deque seja lançada ainda neste semestre.

POLÍCIAS, MP E MOVIMENTO NEGROPREPARARAM CAMPANHA CONTRA RACISMO

Discussão teve início na audiência pública realizada emoutubro

BAIXA PROCURA POR JUSTIÇAA Polícia Civil pernambucana registrou apenas 171 casos de

racismo e injúria racial ao longo de 2010 e, em 40 destes casos, avítima não manifestou interesse em processar o agressor. Issodemonstra a baixa procura da população por Justiça quando oassunto é discriminação. O levantamento também mostra queainda há dúvidas dos próprios policiais sobre como agir nestassituações, pois vários casos são registrados mediante TermoCircunstanciado de Ocorrência (TCO) - sem abertura deinquérito, como manda a Lei.

Renata Beltrão/MPPE

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GT RACISMO - NÚMERO 18 - JANEIRO 2011 - 7

SECRETARIA ESPECIAL EXPEDIENTE

GT RACISMO - MPPE

Aguinaldo Fenelon - Procurador-geral de Justiça

Maria Bernadete Martins Azevedo Figueiroa (coordenadora),Gilson Roberto de Melo Barbosa (sub-coordenador),Antônio Fernandes, Helena Capela, Irene Cardoso, IvanaBotelho, Janeide de Oliveira Lima, Judith Borba, Marco AurélioFarias, Maria Betânia Silva, Muirá Belém, Renata Beltrão,Roberto Brayner Sampaio e Taciana Rocha.

www.mp.pe.gov.br � [email protected] � (81)3182.7055Edf. Promotor de Justiça Roberto LyraRua do Imperador, 473, Stº Antônio Recife-PE

Projeto gráfico: Ricardo MeloJornalista responsável: Renata Beltrão (textos e edição)Revisão: André Santana e Giselly Veras

>>>O GT Racismo enviou ofício parabenizando a soció-loga Luiza Bairros por sua nomeação para chefiar a Se-cretaria Especial de Políticas de Promoção da IgualdadeRacial (Seppir), órgão com status deministério ligadodiretamente à Presidência da República. A socióloga émilitante domovimento negro e demulheres há váriosanos. Ultimamente atuava como secretária estadual dePromoção da Igualdade Racial da Bahia. Entre 2003 e2007, coordenou o Programa de Combate ao RacismoInstitucional (PCRI), do qual o Ministério Público dePernambuco foi uma das agências implementadoras,junto com as prefeituras do Recife e de Salvador.

PESQUISA INTERNA EM FASE FINALCerca de 840 pessoas responderam a

pesquisa interna sobre racismo e racismoinstitucional aplicada em novembro comtodos os integrantes do Ministério Público.O nível de resposta chegou a 50% do públi-co interno total, índice considerado alto.Até março, a socióloga Liana Lewis, daUniversidade Federal de Pernambuco(UFPE) deve concluir a análise dos dados eapresentar o relatório com os resultados.Realizada a partir de um questionário com26 itens para resposta, a pesquisa procurouavaliar qual a percepção dos integrantes doMPPE a respeito do tema. O questionáriofoi distribuído para cada um dos 1.900integrantes da instituição, incluindo mem-bros, servidores, policiais militares da guar-

da patrimonial, funcionários terceirizados eestagiários, em todas as sedes e promotorias,na Capital e no interior.O alto nível de respostas foi garantido poruma campanha prévia de sensibilização,

elaborada pela Assessoria Ministerial deComunicação Social, que destacou aimportância da pesquisa e a rapidez comque se podia responder o questionário.Paralelamente, a Gerência de Estatística e aGerência Psicosocial mobilizaram coorde-nadores e administradores de sede paradescentralizar a distribuição e o recolhimen-to dos questionários.A partir dos resultados, o GT Racismo

poderá orientar melhor suas atividades desensibilização e capacitação do públicointerno para a questão racial. A pesquisaestá sendo realizada com verbas daSecretaria Especial de Políticas dePromoção da Igualdade Racial (Seppir),mediante convênio.

GT RACISMO PROGRAMA NOVAS OFICINASOGT Racismo está pleiteando a renovação do convênio com a

Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial(Seppir) para dar continuidade ao projeto de capacitação e sensibi-lização dos membros do MPPE para o tema racismo institucional.A proposta do GT é realizar mais cinco oficinas ao longo de 2011nos municípios de Afogados da Ingazeira, Caruaru, Petrolina,

Tamandaré e Olinda. A primeira rodada de eventos, em 2010, tevea participação de cerca de 30% dos promotores e procuradores deJustiça. No novo ciclo, a ideia é realizar uma medição do impactodo projeto no grau de conscientização dos participantes e incluirna pauta de discussões a campanha do Unicef sobre racismo nainfância (saiba mais sobre a campanha na página 4).

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RACISMO E FUTEBOL

Apróxima copa do mundo de futebol será disputada noBrasil e nosso estado é uma das unidades da Federaçãoa sediar jogos do campeonato.

Por sua grandiosidade, referido evento reclama enormeesforço de planejamento e execução de pesadas intervençõesna infraestrutura. De fato, diariamente, vêm sendo veiculadasnotícias acerca de construções e reformas de arenas esportivas,investimentos em estradas, portos, aeroportos, transportespúblicos, hotéis etc., fruto de compromissos assumidos pelopaís como contrapartida pelo direito de sediar o mundial.Entretanto, isso não é tudo o que devemos e podemos fazerpara que o campeonato seja um sucesso.Tema talvez ainda esquecido na preparação do mais impor-tante torneio de futebol do mundo, o combate ao racismo nodesporto deve ser objeto de preocupação dos envolvidos naorganização da Copa.De fato, a história demonstra que o mencionado comporta-mento criminoso persiste no futebol e não há, regra geral,resposta adequada do aparelho repressor do Estado na puniçãodos infratores.Não raro, nos deparamos com episódios envolvendo apenasjogadores ou, o que é bem pior, manifestações coletivas de tor-cidas inteiras contra atletas negros da equipe adversária.Lembro de alguns episódios em que o jogador xingou o

adversário negro de "macaco", exemplo clássico de injúriaracista e que, invariavelmente, vem sendo tratado como crimede menor potencial ofensivo pelas autoridades, embora o deli-to tenha pena de reclusão de um a três anos, hipótese queimpõe a instauração de inquérito policial e, caso presentes oselementos, a prisão em flagrante, pois ao delegado de polícia évedada por lei a concessão de fiança.O mais grave é testemunharmos uma massa de torcedores

reproduzir sons e gestos imitando um macaco no momentoem que o jogador negro do time adversário recebe a bola,como aconteceu em um jogo entre Juventude e Internacionalpelo campeonato brasileiro de futebol. Todas as vezes que ojogador Tinga, do Inter, era acionado, a torcida do Juventuderepetia o comportamento. O clube foi multado em R$200.000,00 e punido com a perda do direito de sediar dois

jogos em sua arena, consequência da raríssima atitude do árbi-tro Alício Pena Júnior, que registrou o episódio na ata do jogo.No entanto, nenhum torcedor que praticou o crime foipunido ou sequer processado.Na Europa, ocorreram episódios semelhantes com torce-

dores arremessando bananas nos atletas negros, num mistotenebroso de racismo e xenofobia. Foi o caso do atacante ita-liano Balotelli, jogador da Inter de Milão, agredido destaforma por torcedores da Roma.Na Alemanha, pouco antes da Copa do Mundo de 2006,

em outra lamentável manifestação racista, o jogador GeraldAsamoah, alemão de origem ganesa e primeiro negro a serconvocado para seleção daquele país, foi vítima de uma terrí-vel campanha. Espalharam cartazes por Berlim com os dizeres"Não Chita, você não é Alemanha. Você é ummacaco" e coma imagem de um chimpanzé.Para não ir além dos limites territoriais de Pernambuco, empassado não longínquo, presenciamos a repetição desse com-portamento dentro de nossos estádios. O goleiro Nilson, compassagens por Santa Cruz e Náutico, também foi hostilizadoem várias oportunidades pela torcida adversária através da imi-tação de ruídos e mímica que remetem aomacaco, não haven-do registro de punições ou qualquer atitude concreta daFederação de Futebol ou de outras autoridades.No século passado, época da fundação dos clubes de futebolmais tradicionais do Brasil, havia agremiações que aberta-mente praticavam o racismo e não aceitavam em suas hostesjogadores negros. Hoje, tempo dos direitos humanos, mesmoapós campanhas educativas promovidas pela FIFA e manifes-tações diversas contra a prática do racismo no desporto, ocrime ressurge a cada temporada.Diante dessa constatação, é preciso que as autoridades da

Polícia, Ministério Público e Judiciário estejam preparadaspara enfrentar eventual ocorrência do delito durante a Copado Mundo. Afinal, conhecer a legislação, evitar a impunidadee não minimizar a hedionda conduta é obrigação do anfitriãodos jogos.

* Promotor de Justiça e integrante do GT Racismo

8 - GT RACISMO - NÚMERO 18 - JANEIRO 2011

Roberto Brayner Sampaio*