GUERRA DO PARAGUAI: Uma Análise da Diplomacia no Conflito€¦ · Coelho, Vanessa Cavalcante....

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA CURSO DE HISTÓRIA VANESSA CAVALCANTE COELHO GUERRA DO PARAGUAI: Uma Análise da Diplomacia no Conflito São Luís 2011

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO CENTRO DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA CURSO DE HISTÓRIA

VANESSA CAVALCANTE COELHO

GUERRA DO PARAGUAI:

Uma Análise da Diplomacia no Conflito

São Luís

2011

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VANESSA CAVALCANTE COELHO

GUERRA DO PARAGUAI:

Uma Análise da Diplomacia no Conflito Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, para obtenção do grau de Licenciatura em História. Orientador: Prof. Dr. Marcelo Cheche Galves.

São Luís 2011

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Coelho, Vanessa Cavalcante. Guerra do Paraguai: uma análise da diplomacia no conflito / Vanessa Cavalcante Coelho.– São Luís, 2011. 65f Monografia (Graduação) – Curso de História, Universidade Estadual do Maranhão, 2011. Orientador: Prof. Dr. Marcelo Cheche Galves 1.Guerra do Paraguai. 2.Política externa. 3.Diplomacia., 4.Mediação. I.Título CDU: 94(81).067

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VANESSA CAVALCANTE COELHO

GUERRA DO PARAGUAI: UMA ANÁLISE DA DIPLOMACIA NO

CONFLITO

Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, para obtenção do grau de Licenciatura em História. Orientador: Prof. Dr. Marcelo Cheche Galves.

Aprovada em: / /

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________ Prof. Dr. Marcelo Cheche Galves (Orientador) Universidade Estadual do Maranhão

______________________________________ 1º Examinador (a)

______________________________________ 2º Examinador (a)

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Dedico este trabalho a Deus, por me dar força,

saúde e perseverança para poder lutar por meus

ideais.

Aos meus pais, Adiel e Teresa, pelo apoio.

Ao meu noivo, Jadiel, pela ajuda e compreensão

em todos os momentos.

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AGRADECIMENTOS

Ao meu Deus pela vida, e força para lutar.

Ao Professor Marcelo Cheche Galves, pela orientação e incentivo.

Aos funcionários do Departamento, que nunca hesitaram em colaborar.

Ao Noivo Jadiel Santos da Conceição, “pela ajuda no computador”.

Aos meus colegas de turma, pelo companheirismo.

Aos meus professores, pelo excelente ensinamento.

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A guerra é sempre uma falência da diplomacia.

Não há caso mais flagrante de falência da

diplomacia do que a chamada Guerra da Tríplice

Aliança, a guerra do Paraguai, a guerra contra o

Paraguai, guerra Guaçu, Grande guerra ou, só

para usar a expressão de um dos seus

protagonistas, a Guerra Maldita.

Alberto da Costa e Silva

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RESUMO

O presente trabalho tem por escopo trabalhar a atuação dos diplomatas brasileiros antes e durante o confronto da Guerra do Paraguai. Para tanto perpassaremos sobre a independência das colônias sul-americanas na região do Prata, e o conseqüente nascimento das mesmas como Estados-nações da América Latina. Nesta esteira trar-se-á à baila a vinda da corte portuguesa ao Brasil e a contribuição da diplomacia lusa ao desenvolvimento da política externa do Império. Ademais, trataremos das principais correntes historiográficas acerca da Guerra do Paraguai, quais sejam: clássica, revisionista e neorevisionista, no que tange ao desempenho do corpo diplomático da época. Por fim, tendo por base os documentos dos relatórios da pasta ministerial dos Negócios Estrangeiros do Império (1864 -1870), analisaremos a Guerra do Paraguai, segundo a óptica da diplomacia, e o aporte que foi a guerra civil entre blancos e colorados no Uruguai para deflagração da maior e mais trágica guerra ocorrida na América Latina no século XIX.

PALAVRAS-CHAVES: Guerra do Paraguai; Política; Diplomacia; Mediação.

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ABSTRACT

The scope of this work is the work performance of Brazilian diplomats before and during the battle of the War of Paraguay. For that permeated on the independence of South American colonies in the Plata region, and the consequent birth of them as nation-states in Latin America. On this track will bring to the forefront will be the coming of the Portuguese court to Brazil and diplomacy lusa contribution to the development of foreign policy of the Empire. Furthermore, we will treat the main historiographical trends of the War of Paraguay, which are: classical, revisionist and neorevisionista, regarding the performance of the diplomatic corps at the time. Finally, based on the documents of the reports of the ministerial portfolio of Foreign Affairs of the Empire (1864 -1870), we analyze the War of Paraguay, from the perspective of diplomacy, and the contribution that was the civil war between Blancos and Colorados in Uruguay to outbreak of the greatest and most tragic war in Latin America in the nineteenth century. KEYWORDS: War of Paraguay; Politics; Diplomacy, Mediation.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................... 10

2 BREVE HISTÓRICO DA DIPLOMACIA BRASILEIRA ........................... 12 2.1 Os estertores da independência: uma diplomacia luso-brasileira................ 15 2.2 Política externa do Império do Brasil na Bacia da Patra ................................ 20

3 REVISIONISTAS X TRADICIONALISTAS: o papel da diplomacia

brasileira .................................................................................................................. 26 3.1 Tradicionalistas: o discurso oficial ou clássico sobre a Guerra ................... 30 3.2 Revisionistas: o discurso imperialista ............................................................ 33 3.3 Neo-revisionistas: uma Interpretação Sistêmica Regional ............................ 39

4 A GUERRA DO PARAGUAI E OS RELATÓRIOS DO CORPO DIPLOMÁTICO BRASILEIRO .......................................................................... 45 4.1 Meados de 1864, fim das relações diplomáticas no Prata, começo da Grande Guerra ........................................................................................................ 45 4.2 O desenrolar da Guerra: Três contra Um ........................................................ 52

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 62

BIBLIOGRAFIA .................................................................................................... 66

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1 - INTRODUÇÃO

A diplomacia pode ser entendida como a complexidade das relações

internacionais desencadeada pela prática comercial em todos os continentes desde

o século XIX. Apresentada como sinônimo de política externa, a diplomacia

constituiu-se como instrumento que modela as relações externas entre as nações

mundiais, além de, refletir o estágio cultural em que as diferentes formas políticas

internas de cada país se destacam na esfera internacional.

Ao pensar o Brasil e sua política externa para com os vizinhos da região do

Prata, nos deparamos com uma série de questões, pelas quais se ensejou o

interesse pelo objeto de estudo desse trabalho, a diplomacia brasileira na Guerra do

Paraguai, mais precisamente a seguinte questão: A Guerra do Paraguai foi um

fracasso da diplomacia brasileira?!

Sabe-se que durante quase dois séculos, desde a fundação da Colônia do

Sacramento – 1680 (atual Uruguai), espanhóis e portugueses travaram lutas em

busca da hegemonia sobre as terras da bacia platina. Os rios da Bacia Platina eram

de grande importância econômica e militar, pois era por meio deles que

praticamente toda a produção - da Argentina, do Paraguai, do Uruguai e das

províncias do Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Sul - era exportada. Inúmeros

acordos diplomáticos foram estabelecidos para solucionar a questão dos limites,

porém, também quebrados. E assim a situação nessa área começava a se acirrar.

Levando em consideração que os Estados nacionais do Prata estavam ainda

em processo de formação territorial, cuja unidade via-se constantemente afrontada,

pois o fortalecimento de um país ameaçava constantemente a segurança dos

demais, percebe-se que o desencadear do conflito apresenta-se no momento em

que o Brasil invade o Uruguai.

Ora, a competição pela região do Prata e seus afluentes persistiu ao longo

do século XIX por parte dos governos brasileiros e argentinos até que em 1864,

Francisco Solano Lopez, então presidente do Paraguai, resolveu ratificar a presença

e os interesses paraguaios na região, frente a seus vizinhos.

Desta feita a intervenção brasileira, vista por Solano Lopez como um

desrespeito a soberania da nação Uruguaia que vivia uma guerra civil entre blancos

e colorados, configurar-se-á no “estopim” da Guerra, conjuntamente com a

apreensão do navio brasileiro Marques de Olinda, em Assunção, declarando guerra

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ao Brasil e dando início aos preparativos da campanha que culminariam na invasão

do Mato Grosso em dezembro de 1864 e a deflagração do conflito da Tríplice

Aliança contra o Paraguai.

Assim em 1865 a América Latina viveria um dos maiores conflitos armados –

Guerra do Paraguai - entre países vizinhos: Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai,

cuja duração seria de cinco anos.

O presente trabalho, estruturado em três capítulos, se propõe a explanar a

atuação da diplomacia brasileira quando da Guerra do Paraguai, principalmente nos

anos que a antecederam.

No primeiro capitulo trataremos da formação dos Estados Nacionais na

América Latina, a partir de estudos de autores como Gabriela Nunes Ferreira e Luís

Cláudio Villafañe Santos; e ainda, do desenvolvimento da política externa brasileira -

em sendo herdeira da diplomacia lusa – e suas fases.

O segundo capítulo, por sua vez, explanará sobre as diferentes correntes

historiográficas (e seus expoentes) - clássica ou oficial, revisionista e neorevisionista,

destacando as ações dos diplomatas do período conforme as idéias que sustentam

cada corrente.

Por fim, o terceiro capítulo versará exclusivamente sobre os acontecimentos

do ano de 1864 em diante, até os fins da guerra, conforme os documentos dos

Relatórios dos Negócios Estrangeiros de 1864-1870, ou seja, a visão e a atuação

dos plenipotenciários dos países envolvidos no confronto da Grande Guerra.

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2 - BREVE HISTÓRICO DA DIPLOMACIA BRASILEIRA

Para que se entenda a formação da diplomacia brasileira, deve-se remeter,

ainda que brevemente, ao panorama do processo de constituição dos Estados-

nações1 na América Latina, para o qual reputar-se-á, basicamente, aos estudos dos

cientistas políticos Gabriela Nunes Ferreira e Luis Cláudio Villafañe Gomes Santos .

Preliminarmente, atenta-se para a marcante distinção no processo de

evolução política nas Américas portuguesa e espanhola durante o século XIX. A

primeira diferença, fundamentada na clássica interpretação de José Murilo de

Carvalho (1980/1988, p.11), reside na manutenção da unidade política em um caso

e a fragmentação territorial em outro:

No início do século XIX a colônia espanhola dividia-se administrativamente em quatro vice-reinados e quatro capitanias-gerais que no meio do século se tinham transformado em 17 países independentes. Em contraste, as 18 capitanias gerais da colônia portuguesa, existentes em 1820 (excluída a Cisplatina), formavam, já em 1825, vencida a Confederação do Equador, um único país independente.

A segunda diferença concerne ao regime de governo adotado nos países

independentes: nas ex-colônias espanholas o regime de república e no Brasil o

sistema monárquico (FERREIRA, 2006).

Assim, os países americanos, exceto o Brasil, erigiram seus Estados, a

princípio, partindo da idéia de “nacionalidade e de soberania popular” 2. Santos

(2004, p.38) assevera que o estabelecimento da corte portuguesa no Brasil em 1808

e o processo de independência política liderado por um príncipe europeu,

contribuíram para que a formação do Estado-nação no Brasil ocorresse aos moldes

do europeu, isto é, de Estado territorial e dinástico a Estado-nação.

Na Europa, de maneira geral, a criação dos Estados-nações principiou de

um centro regionalizado que impôs, sob seu controle, as regiões vizinhas à medida

que o Estado ganhava força e coesão (SANTOS, 2003).

1 Ressalta-se que o processo histórico de formação nacional das ex-colônias ibéricas requer alguns cuidados para

não incorrer em anacronismos, como bem lembra Gabriela Nunes Ferreira ao citar os apontamentos de José

Carlos Chiaramonte “o equívoco é pressupor que a maioria das nações ibero-americanas existiam como tais

desde o momento da independência. Projeta-se sobre o momento da independência política uma realidade

inexistente, baseada num conceito também inexistente naquele período, ao menos no sentido habitual, qual seja,

o conceito de nacionalidade” (CHIARAMONTE apud FERREIRA, 2006, p.24). 2 Remete-se o leitor ao primeiro capítulo da obra O Brasil entre a América e a Europa: O Império e o

interamericanismo (2004), de autoria de Luís Cláudio Villafañe G. Santos, para melhor compreensão dos termos

pontuados.

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Por outro lado, em contraste com esse padrão europeu, os demais países da

América Latina, cujo domínio pertencia aos Estados patrimoniais, pelejaram para

adquirir o controle político-social que se encontrava nas mãos de uma sociedade

essencialmente elitista. O sociólogo e cientista político Miguel Centeno (apud

SANTOS, 2003, p.2), igualmente deduziu, quando afirmou que “ao contrário da

Europa, os militares [latino-americanos] não conquistaram territórios para construir o

Estado, mas tiveram de impor a ordem sobre um conflituoso conjunto de interesses

locais irrevogavelmente imbricados entre si”.

Destarte, o fato dos países latino-americanos possuírem extensos territórios

contribuiu de maneira significativa para que os governos patrimoniais que estavam

estabelecidos viessem a declinar, haja vista a dificuldade de exercer, efetivamente,

um controle dessas amplas regiões.

Noutro passo, segundo Santos, o nacionalismo para que se constituísse nos

países da America Latina necessitava, no mínimo, de algum grau de coesão social.

No entanto, as divisões internas das sociedades latino-americanas se mostraram

ainda mais intensas do que as européias. Ou seja,

O processo de invenção das nacionalidades alemã, francesa, inglesa ou italiana e de fortalecimento de seus respectivos Estados, por exemplo, não foi isento de dificuldades, nem de resistências regionais, mas não havia nestes casos as enormes distâncias sociais e raciais criadas nas sociedades americanas. No caso destas, a própria composição da nação era objeto de intenso debate. Em vista das fortes clivagens sociais e raciais, nos países latino-americanos foi criada uma idéia de nação progressivamente mais restrita e, portanto de um nacionalismo cada vez mais excludente, tendência que só se reverteria a partir do fim do século XIX (SANTOS, 2003, p.2, grifos nossos)

3.

Centeno (apud SANTOS, 2003, p.4) argumenta que as guerras favorecem o

desenvolvimento institucional dos Estados, mas este processo requer uma elite que

veja o desenvolvimento do Estado como do seu interesse. Assim, as elites latino-

americanas não possuíam coesão suficiente que as possibilitassem ver o

nascimento e fortalecimento dos Estados-nações como uma oportunidade para

avançar em seus interesses.

3 Com a crise do sistema colonial ao fim do século XVIII, nacionalidade e cidadania foram, por algum tempo,

idéias potencialmente inclusivas e igualitárias debatidas intensamente e entendidas de modos distintos. A partir

da segunda metade do século XIX, no entanto, nação e cidadania foram conceitos aplicados a um grupo seleto, geralmente de proprietários, de origem européia, alfabetizados e do gênero masculino. Foi apenas nas primeiras

décadas do século XX que voltaram os debates sobre a dinâmica de inclusão e exclusão nos Estados - nação

latino-americanos, debates que continuam até hoje (MALLON apud SANTOS, 2003, p.3).

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Uma aristocracia nacionalista ou uma burguesia em expansão, assegura

Santos, podem utilizar-se da guerra para derrotar seus rivais, sejam eles internos ou

externos, e fortalecer seu domínio (2003, p.4).

Todavia, os países latino-americanos não dispunham de nenhum destes

grupos. “Ao contrário da Europa, as guerras não criaram oportunidades para que

uma única facção ou família impusesse sua vontade aos demais, mas sim

mantiveram a possibilidade de rebelião permanentemente em aberto” (CENTENO

apud SANTOS, 2003, p.4).

Ademais, a América Latina, diferente da Europa, não fortaleceu e consolidou

os respectivos Estados-nações, em contraposição a inimigos externos, com o

recurso a guerras internacionais que movimentaram a maior parte das populações

em prol da causa comum.

Ao contrário, naquela, as guerras internacionais foram menos freqüentes e

raramente resultaram em mobilizações em massa das populações dos países

envolvidos (SANTOS, 2003).

No Brasil, todavia, a continuidade da monarquia resultou em uma

acentuação desta tendência, favorecendo, desde o início, uma idéia de nação

altamente excludente. Da mesma forma compreende o historiador Fernando Novais:

A ideologia do Império Brasileiro sempre foi a de que a Monarquia era a civilização, enquanto a Republica era a barbárie. [...] Costumo dizer que a independência foi uma revolução conservadora no Brasil. A expressão pode parecer paradoxal, mas é a mais apropriada. É uma revolução, porque uma colônia transforma-se em Estado soberano. Mas é conservadora porque, com a vinda da Corte portuguesa, este fenômeno absolutamente extraordinário da história - a colônia colonizando a metrópole -, a iniciativa da metrópole tinha ido tão longe que ultrapassou o ideário do senhoriato brasileiro, um senhoriato que estava realmente inventando uma nação (NOVAIS, 1995, p.80-81).

A opção pela monarquia, afirma Santos, conferiu ao processo de invenção

da nacionalidade brasileira um caráter bem diferente daquele de seus vizinhos, pois

estes, quando do rompimento com a metrópole passaram imediatamente à tarefa de

definir, já em termos de sentimento nacional, o que significava ser, por exemplo,

peruano, chileno ou mexicano, noções que até então ainda não possuíam

significado político (2003, p. 6).

No Brasil, a invenção da nacionalidade teria uma trajetória mais complexa. Como nas demais ex-colônias, tampouco existia nas primeiras décadas do século XIX uma consciência nacional ou mesmo de uma identidade brasileira nos habitantes das terras que viriam a ser o Brasil. A base escravista da produção, comum às diversas regiões brasileiras (ainda que em graus distintos), e a pouca integração entre elas dificultavam

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sobremaneira a possibilidade de êxito imediato do princípio da soberania popular e da república para a legitimação do Estado brasileiro. A manutenção da escravidão como base do modelo econômico exigia a exclusão automática de grande parte da população do corpo da cidadania, equação de estabilidade duvidosa em um regime que tivesse como base de sua legitimidade o recurso, mesmo retórico, à soberania popular, como a Guerra Civil estadunidense provaria anos mais tarde (SANTOS, 2003, p.5).

O Brasil se legitimou, enquanto Estado independente, sem que houvesse um

rompimento com sua situação de colônia. Assim, a identidade brasileira munida pelo

Estado dinástico, segundo Santos, alicerçava-se “em signos de continuidade da

ordem interna criada com a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro”

(2003, p.5).

Na mesma esteira, comenta Gabriela Ferreira, que “ao passo que a América

espanhola teve de criar um novo poder legitimo (ou melhor, novos poderes) para

substituir o do monarca, no Brasil assistiu-se à perduração de um poder legítimo, o

que significou uma relativa continuidade na transição de colônia a império”

(FERREIRA, 2006, p.40).

Doutra maneira, os demais países latino-americanos, ao adotarem o sistema

republicano, rescindiram com a situação colonial em várias dimensões:

[...] no geográfico, pela distinção entre o Novo e Velho Mundo (América versus Europa); no ideológico, pela instauração da noção de organização social baseada em um contrato social, em oposição ao direito dinástico; e no institucional pela fundação da república (SANTOS, 2003, p.6).

Ademais, a vinda e o estabelecimento da família real portuguesa em terras

brasileiras, além de trazer consigo uma estrutura complexa de instituições políticas,

irá principiar o desenvolvimento, extremamente intricado e contraditório, da política

externa brasileira.

2.1 Os Estertores da Independência: uma diplomacia luso-brasileira

A decisão de transferir a Corte para o Brasil, em 1808, delegou a D. João,

como uma de suas primeiras tarefas, a implantação de uma administração que

aparelhasse o país para suas novas funções como sede da Monarquia e centro do

comércio e da política na América do Sul (RODRIGUES; SEITENFUS, 1995, p. 50).

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Os primórdios do desenvolvimento das relações exteriores do Brasil4

estiveram intimamente atrelados às ingerências européias. É o que se infere do

disposto por Amado Luiz Cervo e Clodoaldo Bueno:

A política externa brasileira à época da independência esteve ainda profundamente condicionada pela hegemonia inglesa sobre Portugal, estabelecida por meio de uma aliança histórica, cujos efeitos foram transferidos ao Brasil: a ingerência política inglesa nas decisões da corte do Rio de Janeiro e o modelo mais acabado de inserção dependente no sistema internacional produzido pela Revolução Industrial, conforme os termos dos tratados de 1810. Obtidos em conjuntura favorável à Inglaterra, em virtude às guerras napoleônicas, servirão eles posteriormente de modelo para regulamentar as relações exteriores com a America Latina, sob o ângulo das pretensões européias (CERVO; BUENO, 2008, p.22).

Outrossim, “o Estado dos Bragança, comportando-se ao estilo da diplomacia

européia, arquitetou para si, ao tempo da regência de Dom João VI, a construção de

um império americano, para compensar as perdas sofridas na Europa, durante as

guerras napoleônicas” (CERVO; BUENO, 2008).

Desta feita, o primeiro ministério foi constituído em 11 de março de 1808,

sob o comando de D. Rodrigo de Sousa Coutinho - o Conde de Linhares – que

assumiu a função de Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiro e da

Guerra. Após ele, entre outros, destacou-se D. Pedro de Sousa e Holstein, o Conde

de Palmella (RODRIGUES; SEITENFUS, 1995, p. 51).

Antes da regência do príncipe D. Pedro, houve a separação da pasta

distinguindo os Negócios da Guerra dos Negócios Estrangeiros, dantes unas. Desta

feita, os Negócios do Estrangeiro foram incorporados aos Negócios do Reino,

nascendo assim o Ministério do Reino e Estrangeiros, cuja ocupação se deu a D.

Marcos de Noronha e Brito, o Conde de Arcos.

Ressalta-se que todos os ministros, responsáveis pela política externa do

Brasil, as vésperas da independência, eram portugueses. Se não vejamos,

O primeiro ministro brasileiro do primeiro Gabinete de 16 de janeiro de 1822, antes de realizada a Independência, foi José Bonifácio de Andrada e Silva. José Bonifácio era o único brasileiro entre três portugueses no Gabinete, fato tão curioso e significativo, a revelar que parecia ser necessário, para levar avante a política de autonomia, que um brasileiro ocupasse a pasta do Império e Estrangeiro, assim designada a partir de 12 de outubro de 1822, em decorrência da aclamação, nessa data, do Imperador D. Pedro I. Temos, assim, o Patriarca da Independência como o primeiro Ministro do Império e Estrangeiros, e este Ministério como a primeira Secretária de Estado ocupada por um brasileiro no Gabinete que sucedeu o “Fico” e à derrota e retirada das tropas portuguesas comandadas por Avilez (RODRIGUES; SEITENFUS, 1995, p. 51, grifos nossos).

4 A realeza portuguesa ao se instalar, na colônia, acunhou esta de Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, e

não somente Brasil, designação que viria após a independência.

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A política externa de D. João foi marcada por acontecimentos importantes,

como a abertura dos portos e os acordos comerciais com a Inglaterra em 1810, bem

como a conquista e restituição de Caiena, que estava sob o domínio dos Franceses,

durante o período compreendido entre 1808 e 1817.

Por sua vez, no que tange ao Prata, Rodrigues e Seitenfus, comentam que

logo após serem presos por Napoleão os reis Carlos IV e Fernando VII, Carlota

Joaquina (filha primogênita de Carlos IV – rei da Espanha - e esposa de D. João VI)

arquitetou a aceitação de sua regência no rio da Prata. Todavia, inicialmente, D.

João protegeu essas pretensões que se assomavam ao ideal, mantido nas lutas

pelo domínio da Colônia do Sacramento, de estabelecer para América Portuguesa a

fronteira até o rio da Prata (RODRIGUES; SEITENFUS, 1995, p.110-109).

Assim, Ângelo Pereira (apud RODRIGUES; SEINTENFUS, 1995, p.110)

descreve que logo após o reconhecimento da abdicação dos Reis Católicos (Carlos

IV e Fernando VII), “Carlota Joaquina e seu sobrinho, o Infante de Espanha, D.

Pedro Carlos de Bourbon e Bragança, dirigiam um Manifesto aos Vassalos de S. M.

Católica e uma relação do Príncipe Regente”, com o desígnio de erguer, sob seu

domínio, um trono nas províncias espanholas da América, ou a menos, governar

como regente em nome de seu irmão Fernando VII.

Dadas as circunstâncias, D. João tentando barrar as pretensões de sua

então esposa, envia D. Rodrigo de Sousa Coutinho (futuro conde de Linhares),

Ministro da Guerra e dos Estrangeiros, com uma mensagem datada de 13 de março

de 1808, com o fito de induzir o agente espanhol Antonio Lopes, a oferecer, ao

Cabildo, em nome do Príncipe Regente, a união comercial do Brasil e de Buenos

Aires e a proteção da colônia espanhola pela monarquia portuguesa.

A negativa da proposta por Buenos Aires, ensejaria a união de Portugal com

a Inglaterra em prol desta causa, isto é, D. João, lembrava, com essa ameaça

velada, as invasões inglesas a Argentina (PEREIRA apud RODRIGUES;

SEINTENFUS, 1995, p.111).

Após esse episódio, o Brigadeiro Joaquim Xavier Curado era enviado a

Buenos Aires com uma carta de Carlota Joaquina para o governador Santiago de

Liniers e os manifestos do Príncipe Pedro Carlos. Liniers, por sua vez, declarou

obedecer fielmente às ordens da Junta de Sevilha, que se instaurara em nome de

Fernando VII (RODRIGUES; SEINTENFUS, 1995).

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O ministro Sousa Coutinho confidencia ao encarregado dos negócios

ingleses, Mr. Hill, seu receio com a possibilidade das colônias espanholas

declararem-se a favor do Príncipe Regente, o que o tornaria o único monarca de

todo o continente sul-americano (MANCHESTER apud RODRIGUES; SEINTEFUS,

1995, p.110).

Diante disso, inúmeros acontecimentos se sucederam com o fito de exercer

o monopólio da Banda Oriental:

Em Buenos Aires, o Cabildo, diante dessas ameaças, iniciou preparativos para atacar o Rio Grande do Sul, mas a chegada de Sir Sidney Smith (almirante inglês) atemorizou-os, pois acreditavam que a Inglaterra estava por trás, das ameaças nos bastidores. [...] Curado exigiu de Liniers a entrega da Banda Oriental, sob o pretexto de uma ameaça de invasão francesa. A participação inglesa limitava-se à tácita aquiescência de Hill e à cooperação do almirante da esquadra. Strangford (ministro inglês, responsável pelos negócios no Brasil) não se comprometeu quando, ao chegar, ouviu as propostas de Sousa Coutinho, sugerindo a George Canning (ministro substituto de Strangford) que a Inglaterra retivesse Montevidéu ou Buenos Aires, caso o plano tivesse êxito. Os acontecimentos de Espanha, os manifestos de Carlota Joaquina e Pedro Carlos, a proteção à Regência, as combinações em Buenos Aires com partidários da Independência forçaram uma declaração formal de Canning e Strangford contrária ao movimento em 1808. As idéias tresloucadas de Carlota Joaquina em combinação com Smith, atemorizaram D. João, que pediu a Strangford que admoestasse Sir Sidney Smith, chamando-o de volta, e não permitiu a partida da sua esposa. Os despachos de Strangford aos governadores de Montevidéu e Buenos Aires, assegurando que a Inglaterra nunca apoiaria qualquer tentativa de mudar o Estado político dos domínios espanhóis na América, a pouca receptividade ao manifesto da Princesa e, especialmente, sua recusa em aceitar uma monarquia constitucional, fizeram ruir o plano de Regência da América Espanhola por D. Carlota Joaquina (MANCHESTER apud RODRIGUES; SEINTENFUS, 1995, p.110-

111).

Todo esse cenário político no qual o Reino Unido de Portugal, Brasil e

Algarves estavam imerso – some-se a independência de Buenos Aires em 1810 e

sua luta com Montevidéu, que restava submissa à Junta de Sevilha – aguçou, mais

uma vez, a atenção luso-brasileira para a questão do rio da Prata (RODRIGUES;

SEINTENFUS, 1995).

D. Carlota Joaquina promovia o dissídio, ao apoiar Elio, governador de

Montevidéu. Assim, em fevereiro de 1811, o então governador de Montevidéu,

declarou guerra à Junta Revolucionária de Buenos Aires, mantendo a Banda

Oriental como a única província do vice-reino ainda sujeita ao domínio espanhol

(RECKZIEGEL, s/n).

No entanto, em abril do mesmo ano, entraria em cena o revolucionário

Artigas, que se pondo em armas contra Elio, confinou-o às praças de Montevidéu e

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Colônia. Acuado, Elio solicitou o apoio da Corte portuguesa, sendo as tratativas

feitas através do capitão-geral do Rio Grande do Sul, Diego de Souza

(RECKZIEGEL, s/n).

O governo português se manifestou no sentido de que se as forças de

Buenos Aires cruzassem o Paraguai ou o Paraná com o intento de atacar

Montevidéu, as tropas luso-brasileiras cruzariam as fronteiras.

Desta feita, a advertência supramencionada, dada ao então ministro inglês

Strangford, se concretizou, posto que a massa de tropas de Buenos Aires, que se

juntava nas fronteiras, sob a direção de Artigas, Soler e Rondeau havia invadido

Montevidéu.

Em junho de 1811, as tropas luso-brasileiras se movimentam ao Estado

Oriental, a fim de suspender o sítio a Montevidéu e conseqüentemente forçar a

retirada de Artigas e seus compassas (RODRIGUES; SEITENFUS, 1995, p.112).

Autorizado pelo governo do Rio de Janeiro, Diego Souza, invadiu o território

oriental com um exército de cinco mil homens, penetrando consecutivamente nas

localidades de Melo, Santa Teresa, Rocha, São Carlos e Maldonado, a caminho de

Montevidéu. Nesse entremeio, Buenos Aires, após as derrotas sofridas no Alto Peru

e o subseqüente enfraquecimento militar, decidiu pelo reconhecimento da autoridade

da Espanha sobre a Banda Oriental. As tropas portuguesas, no entanto,

permaneceram em território uruguaio até 1812 (RECKZIEGEL, s/n).

Todavia, segundo Rodrigues e Seitenfus, “o armistício precipitado de 26 de

maio de 1812, que durou apenas quatro anos, obrigou a retirar nossas tropas da

fronteira” (1995, p.112). Com isso a situação no Prata se tornava cada vez mais

critica, tendo em vista que Artigas tinha uma combinação secreta de unir-se a

Buenos Aires, caso a Espanha fizesse a tentativa de reconquistar as colônias, e,

principalmente, a de cruzar as fronteiras brasileiras (RODRIGUES; SEITENFUS,

1995, p.112).

Entre tantos acordos e desavenças, no dia 31 de julho de 1821, o Estado de

Montevidéu, sob o nome de Província Cisplatina, passava a integrar o território luso

brasileiro.

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2.2 Política externa do Império do Brasil na Bacia da Prata

A América Latina, na primeira metade do século XIX, estava envolta em um

complexo cenário político, no qual buscavam ser independentes de suas metrópoles,

buscando assim, a formação de seus Estados-nações.

Nessa esteira, em 1822 o Brasil se torna independente. Com a

independência o Império do Brasil, enquanto nação em formação precisava garantir

que os territórios coloniais em conflito – dantes sob o monopólio português e

espanhol – se confirmassem como parte do então território brasileiro (ALMEIDA,

2009).

Assim nasciam, sob os fundamentos da política externa lusa, as noções

relativas a uma configuração política - institucional exclusivamente brasileira.

Ademais, quando se pensa na construção da nação brasileira, autores como

Fernando Novais, compreendem que foi pela questão da consolidação de territórios

(herdada pela cultura política portuguesa) que a diplomacia brasileira, inicialmente,

se conduziu a fim de suster a materialidade do Brasil enquanto território nacional.

Vejamos:

A fórmula da Independência brasileira deixou-nos um legado da colonização sob forma de um Império, que era uma garantia de continuidade. A idéia do Império, portanto, era uma idéia de preservação territorial, até mais do que isso, era uma idéia expansionista, que se apresentou, desde o inicio, nas intervenções Cisplatinas (NOVAIS, 1995, p.81, grifos nossos).

Desta feita, poder-se-ia afirmar que a noção de diplomacia

institucionalmente brasileira começou a ser utilizada enquanto campo político de

negociação internacional nos anos seguintes da proclamação da independência, a

qual possuía como missão principal: fazer-se reconhecer enquanto soberana em

relação à antiga metrópole (SILVA, 2006, p.123).

Assim, “o envio do corpo diplomático imperial brasileiro à Europa constituiu o

primeiro momento de materialização de um projeto dito “nacional”, na medida em

que firmou a necessidade de se fazer enxergar no painel geral das então nações

européias como um corpo político autônomo” (SILVA, 2006, p.123).

Na mesma esteira, segundo Gabriela Ferreira, a política externa do Brasil,

no inicio do período independente, irá definir-se em função da herança colonial do

Estado Bragantino com suas estruturas sociais, seus valores, conexões e desígnios.

Assim a política externa brasileira representava-se pelos respectivos entes políticos:

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Parlamento, e mais precisamente, na pessoa do Imperador. Conforme se denota

dos dispositivos elencados na Constituição de 1824, houve uma centralização, na

condução da política externa, sob os auspícios do Poder Executivo (Imperador)

(FERREIRA, 2006, p.131).

O Parlamento, explica Cervo, emergia em 1826 como um novo poder que,

ao lado do gabinete, do Conselho de Estado e do próprio Imperador, irá influir na

condução da política externa, de duas formas: diretamente, através de medidas de

controle inerentes ao processo legislativo, como no caso das tarifas alfandegárias,

da navegação, do tráfico de escravos e da imigração; e por outro lado,

indiretamente, através da pressão que o mesmo representa como força política de

maior expressão nacional (CERVO, 1981, p.31).

Logo, esse corpo político que compõem o Parlamento insurge-se a fim de

tratar questões relevantes no que concerne a nascente política internacional

brasileira:

A primeira legislatura, de 1826 a 1829, ocupa-se com importantes questões em que o país esteve envolvido em seus primeiros anos de vida política autônoma. O parlamento aborda problemas com ampla liberdade, revelando prudência e discernimento no trato de questões delicadas, como a guerra no Prata, as relações com a Santa Sé, coragem e determinação no exame das relações com as potências européias regulamentadas pelos tratados, indignação e repúdio diante dos acordos relativos ao comercio externo e ao trafico de escravos, consciência nacional ao eliminar o perigo da penetração estrangeira na Amazônia (CERVO, 1981, p.31, grifos nossos).

Ora vejamos, os anos que sucederam 1822 até 1889, segundo Amado Luiz

Cervo e Clodoaldo Bueno, foram anos nos quais a política externa brasileira atuou

de forma precisa e significativa nos Países Cisplatinos. Os autores, didaticamente,

dividem essa atuação nas seguintes fases: I – tentativa de cooperação e

entendimento para defesa das independências [1822-1824]; II – Guerra da

Cisplatina [1825 – 1828]; III – política de neutralidade [1828 – 1843]; IV – passagem

da neutralidade à intervenção [1844 – 1852]; V – presença brasileira ativa [1851 –

1864]; VI – retorno a política intervencionista [1864 – 1876]; e por fim VII –

retraimento vigilante [1877 – 1889] (BUENO; CERVO, 2008, p.109).

No que concerne a este trabalho monográfico, interessou-nos o estudo da

sexta fase, posto que compreende o tema principal desse trabalho: A Guerra do

Paraguai; assunto que será desenvolvido com maior precisão no capítulo 3 do

presente estudo.

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A primeira fase, compreendida entre os anos de 1822 e 1824, depara-se

com o estopim de inúmeros conflitos que almejam a independência de colônias

situadas na América Latina. No Brasil a inauguração do Primeiro Reinado foi

marcada pelas interferências da Europa na política interna, mediante uma série de

tratados que ao passo que fortalecia o comercio e a economia do continente

europeu, sobrepujava economicamente a antiga colônia.

Desta feita, percebe-se, nesse primeiro momento, que o Parlamento

brasileiro pugna por uma maior proximidade com os países do continente sul

americano, cujas razões podem ser assim elencadas: o grau de igualdade entre os

países sul-americanos, o que asseguraria um relacionamento o qual houvesse

interesse recíproco e a peleja pela liberdade que os unia face às intimidações

européias (CERVO, 1981, p.32).

No entanto, a questão do Prata, continua pendente entre o Império e o

governo portenho. A Guerra da Cisplatina, tema da segunda fase, resultou na

independência “definitiva” do Uruguai, que antes havia sido incorporado ao Brasil no

período Bragantino.

O território que compõe a região do Prata é extremamente importante para

as novas nações que nascem naquela região, tanto política como economicamente.

A disputa pelo Prata, segundo Maria Luisa Nabinger de Almeida, é herança

das questões territoriais mal resolvidas entre Portugal e Espanha, e do florescimento

das nações latinas que acirraram essa disputa, com o fito de afirmarem-se não só

entre os vizinhos americanos, mas ao mundo europeu.

Quando temos a notícia de que o plenipotenciário Manoel Garcia veio ao Rio de Janeiro para ajustar a paz em 1825, dirigindo-se ao governo brasileiro a famosa nota na qual declarou a incorporação da banda oriental do rio da Prata às Províncias Unidas do rio da Prata, entendemos que a intervenção brasileira no Estado cisplatino objetivou o direito de existência, conservação e defesa – do território, principalmente em virtude da região de fronteira com a Província do Rio Grande do Sul (ALMEIDA, 2006, p.84).

Destarte as restrições aos direitos e deveres ao Estado nascente do Uruguai

criaram, segundo Almeida, em conseqüência, precedentes para a continuidade dos

conflitos naquela República, motivados por desejos de conquista das Províncias

Unidas do Rio da Prata, e que resultariam em novas invasões, logo a quebra da

neutralidade brasileira, exigindo assim outras intervenções do Império, como de fato

sobrevieram em 1851, 1854 e 1858.

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Segundo Bueno e Cervo, o período compreendido entre 1844 e 1876

caracterizou-se pela ascensão, apogeu e declínio de uma política externa brasileira

de potencia periférica regional, autoformulada, contínua e racional, na medida em

que se guiava por objetivos próprios, aos quais se subordinavam os métodos e os

meios. Desta sorte, o Prata foi a principal área a qual o Império se impôs como

potência (BUENO; CERVO, 2008, p.110).

Desta feita, a neutralidade do Império compreendida entre os anos de 1828

e 1843, não foi algo planejado pelos plenipotenciários brasileiros, resultando em

alguns impasses a política platina que se desenvolveria na fase seguinte (a

intervenção).

Entre o malogro da composição com Rosas, em 1843, e a intervenção no inicio da década seguinte, a política platina do Brasil atravessou um período de transição, marcado por indefinições táticas e estratégicas, pela consideração das alternativas incompatíveis e pela falta de clareza no estabelecimento de metas concretas. Manteve-se a neutralidade efetiva, não como opção política consciente, mas, ao contrário, em função de sua ausência. Houve uma preeminência da forma sobre a substância. Embora se envolvessem com a política externa os órgãos de Estado em seu conjunto, é inegável que a mudança freqüente do titular dos Negócios Estrangeiros – onze ministros ocuparam a pasta entre 1843 e 1849 – contribuiu para tal instabilidade (BUENO; CERVO, 2008, p.110, grifos nossos).

Dessa forma, não por acaso, comenta Gabriela Ferreira que 1850 foi,

igualmente, o ano em que o governo brasileiro deu inicio a uma intervenção

diplomática e militar no Uruguai e na Argentina, rompendo uma duradoura

neutralidade e configurando uma reviravolta na condução da política externa na

região platina (FERREIRA, 2006, p.15).

Logo, inaugurada a fase de intervenções brasileira na bacia do Prata, de

acordo com Almeida (2006, p.86), o exercício da autonomia (as formas de governo,

de organização política, de legislação, de administração pública e judicial), além do

controle eminente sobre o território, a soberania com o direito de existência -

enquanto nação livre e independente -, de conservação e de defesa territorial,

infligiram-se como restrições à República Oriental do Uruguai.

O Tratado de Limites e Navegação de 2 de janeiro de 1859, celebrado entre

o Império do Brasil, a Confederação Argentina e a República Oriental do Uruguai,

mesmo não tendo sido ratificado pelo Brasil, refletiu o espírito de dependência da

Republica Oriental do Uruguai aos seus vizinhos, tanto com relação a integridade

física-continental como fluvial.

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Segundo Almeida, a recusa brasileira no momento de ratificação desse

tratado teve um alvo preciso – a Província de Buenos Aires que o general Urquiza

desejava atrair ao grêmio da Confederação Argentina. Logo, para o Império

Brasileiro, tratava-se de manter, conforme preleciona Pinto (apud ALMEIDA, 2006,

p.86)

[...] a posição internacional da República Oriental do Uruguai, onde o artigo 8º estabelecia: [...] “fica declarada e garantida como Estado absoluto e perpetuamente neutro entre o Império do Brasil e a Confederação Argentina”, além de estabelecer as condições desta neutralidade, em caso, sobretudo, de guerra entre os Estados limítrofes.

Desta feita, a intervenção do Brasil na guerra civil da República Oriental do

Uruguai, em 1864, suscitou uma série de questões conflituosas tanto do ponto de

vista jurídico quanto político, ainda que tenha sido no início uma ação diplomática

para, em seguida, tomar proporções de uma ação militar (LOPES apud ALMEIDA,

2006, p.91)

Assim, se, por um lado, a atuação da diplomacia brasileira resultou em uma

conduta paradoxal - como afirma Almeida - na bacia do Prata e, principalmente, na

República do Uruguai, com base na antítese costume-lei5, houve, por outro lado, o

reconhecimento do outro, originário de um direito voluntário6. O aspecto jurídico-

político da região configurou-se não somente na busca da legitimidade por meio de

5 Costume, porque a indefinição dos limites geográficos e das fronteiras políticas na região do Prata aprofundou

o vácuo jurídico criado anteriormente pelas metrópoles, estimulando as formas próprias de organização dos

nacionais na America Latina, até então assentados sem a formalização contratual com seus respectivos

soberanos. E lei, pois quando da emancipação da metrópole, as nascentes nações passaram a se relacionar internacionalmente por meio de tratados-leis, fusão de várias vontades, tendo um mesmo conteúdo, cujo objetivo

é satisfazer os interesses comuns, semelhantes ou únicos (ALMEIDA, 2009, p.35). 6 O jusnaturalismo, no início da modernidade, adquiriu um viés antropológico. O filósofo Hugo Grotius,

considerado um dos precursores do Direito Internacional, dividiu o direito em duas categorias: jus voluntarium

ou direito voluntário, que decorre da vontade divina ou humana, e o jus naturale, oriundo da natureza do homem

devido a sua tendência inata de viver em sociedade. Para Hugo Grotius o direito natural seria o ditame da razão,

indicando a necessidade ou repugnância moral inerente a um ato por causa de sua conveniência ou

inconveniência à natureza racional e social do homem. Na perspectiva de Maria Luisa Almeida, quando

focalizamos a região do Prata, sob a óptica jurídica, constatamos que, durante o domínio das Coroas ibéricas, foi

sendo moldada uma forma especifica de ocupação e de atuação das gentes que a povoaram, em detrimento de

toda a formalização constituída por meio dos tratados celebrados entre aqueles monarcas. Dessa forma, as áreas geográficas eram reconhecidas até por linhas imaginárias, pois o poder do Estado assentava-se na propriedade

territorial (Teoria do território-objeto). Assim do ponto de vista político, esse patrimônio territorial conferia ao

Estado colonial o direito de soberania, independentemente da existência dos indivíduos, em particular nos

domínios sul-americanos, que se organizavam, porém, voluntária e não mais naturalmente. Voluntária porque

ao final do século XV, houve um enfraquecimento paulatino da autoridade político-espiritual do papa,

propiciando a firmação de tratados-contratos, diretamente, entre os reis católicos ibéricos. Dessa forma esses

tratados são o resultado de uma troca de vontades, perseguindo objetivos diferentes, no qual as vontades

contratantes se equilibram e oscilam entre promessas e concessões. Formava-se, assim a América do Sul, o

embrião da emancipação colonial (ALMEIDA, 2009, p.15)

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títulos jurídicos, os tratados7 (como os tantos havidos a fim de solucionar as

questões territoriais), mas também na ausência da demarcação de fronteiras,

inviabilizando o reconhecimento atributivo ou constitutivo do Estado do Uruguai

(ALMEIDA, 2009, p.87).

E se a problemática política se estendeu no caso da República Oriental do

Uruguai pelas mudanças constantes de fronteira, não foi diferente com o Paraguai.

O Império do Brasil considerou o Paraguai como Estado separado do governo de

Buenos Aires pelo disposto no art. 5° do Tratado de 1811, porém somente em 1841

que a diplomacia brasileira o reconheceu efetivamente como nação independente

(ALMEIDA, 2009, p.88).

Por fim, entre inúmeros tratados e acordos internacionais, a questão platina

parece não se resolver até a deflagração da pior guerra ocorrida em território sul

americano: a Guerra do Paraguai.

7 Alguns dos tratados e acordos com o fito de sanar questões territoriais, políticas e econômicas na Bacia do

Prata são os: Tratado de Madrid (1750), Tratado de El Pardo (1761), Tratado de Santo Idelfonso (1777), Tratado

de Amistad, Garantia y Comercio ou Tratado de El Pardo (1778), Convenção Preliminar de Paz (1828), Tratado

de Limites e Navegação (1859).

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3- REVISIONISTAS X TRADICIONALISTAS: o papel da diplomacia brasileira

A discussão historiográfica que versa sobre a Guerra do Paraguai é vasta. O

tema sempre suscita muitos debates no meio acadêmico, particularmente entre os

historiadores; sejam em razão das causas ou das conseqüências dessa Grande

Guerra, o assunto parece não se esgotar tendo em vista o robusto acervo

bibliográfico do conflito.

Em razão dessa ampla bibliografia, fez-se mister dedicar um capitulo desse

trabalho, trazendo em breves linhas as análises dos principais teóricos que

estudaram o assunto.

Para tal segue-se a divisão bastante conhecida no meio historiográfico sobre

as visões do conflito: tradicionalista/oficial/clássica e a revisionista. Há ainda uma

terceira corrente, segundo Doratioto, chamada de Nueva Historiografia ou

Interpretação Sistêmica Regional (DORATIOTO, 2008, p.8), ou simplesmente

neorevisionistas (SALES, 2005).

Ressalta-se ainda que as visões aqui explanadas tratam da atuação da

diplomacia antecedente ao conflito propriamente dito, ou seja, as ações da política

externa quando do estopim da Guerra.

De antemão, achou-se por bem situar o leitor do cenário político que se

processava na região do Prata. Para tanto se utilizará os estudos de Max Justos

Guedes, sobre panorama político da região e a importância da delimitação das

fronteiras.

Segundo Guedes, desde a descoberta do ouro no Mato Grosso em 1718, a

Coroa Portuguesa passou a enfrentar um sério problema de comunicações com

Cuiabá.

As chamadas “monções” exigiam sacrifícios gigantescos e risco de monta, quer pelo número de cachoeiras a enfrentar no trajeto fluvial, desde a proximidade de São Paulo até a capital mato-grossense, quer pela ameaça dos indígenas ao longo do percurso, em especial os paiaguás, índios canoeiros de extraordinária belicosidade (GUEDES, 1995, p. 56).

Desta feita, continua Guedes, com o aparecimento da navegação a vapor, o

caminho natural e único possível passou a ser feito pela bacia do Prata, subindo os

Rios Paraná, Paraguai e São Lourenço (GUEDES, 1995). No entanto, “o

inconveniente desse caminho era a necessidade de abertura da navegação

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daqueles rios, vital para o Império levar as enormes potencialidades da região”

(GUEDES, 1995, p.56).

Assim, o Império do Brasil passou por muitas complicações políticas com

seus vizinhos, em especial com o Paraguai, pois a não fixação dos limites na Região

Platina tornou-se, praticamente, o único ponto contencioso das relações que o Brasil

mantinha com aqueles governantes, principalmente Carlos Antonio Lopéz, ainda que

tenha sido o Brasil o primeiro país a reconhecer a independência paraguaia, quando

ela foi reafirmada pelo Congresso guarani em 1842 (GUEDES, 1995).

Por sua vez, não há como negar, afirma Guedes (1995, p.57) “o interesse

brasileiro em impedir que Juan Manuel Rosas conseguisse reunir os territórios do

antigo Vice-Reinado do Prata sob as rédeas de Buenos Aires”. A diplomacia

brasileira, herdeira da diplomacia lusa, mantinha vivas as lembranças do século de

lutas com os espanhóis e as terríveis dificuldades enfrentadas para manter os

territórios que paulatinamente havia ocupado ou povoado, ou ainda despovoado,

conforme aqueles que repreendem a ação bandeirante (GUEDES, 1995).

Nessa esteira, José Antonio Pimenta Bueno8, futuro Marques de São

Vicente, exercendo o cargo de plenipotenciário brasileiro em Assunção, incentivou

com afinco que o então presidente paraguaio Carlos Antonio López se defendesse

de Rosas.

Humaitá, a quase inexpugnável fortificação, se não foi idéia sua, foi por ele amplamente discutida com o presidente. Oficiais brasileiros ajudaram a organizar e a instruir o exército paraguaio, e armas e munições foram-lhe

fornecidas pelos imperiais (GUEDES, 1995, p.57).

Entretanto, não houve a participação paraguaia, nas forças que baniram

Rosas do poder. Logo após a queda do ditador, “o Brasil tranqüilizara-se, pois

Argentina e o Uruguai, convulsionados internamente, não eram ameaças potenciais

e mantinham-se as boas relações com o Paraguai” (GUEDES, 1995, p.58).

8 A missão de reconhecimento do Paraguai, como nação independente coube, a Pimenta Bueno. Em

16 de outubro de 1843, José Antônio Pimenta Bueno era nomeado Encarregado de Negócios e cônsul do Império na República do Paraguai, ali chegando a 18 de agosto de 1844. O ato formal deu-se a 14 de setembro. O protesto argentino contra o reconhecimento “do desmembramento de uma parte importante do território argentino” é de 20 de fevereiro de 1845. O contraprotesto brasileiro, redigido por Antônio Paulino Limpo de Abreu, data de 29 de julho de 1845. Promoveu Pimenta Bueno a assinatura do Tratado de 7 de outubro de 1844, não ratificado pelo Governo Brasileiro, e do protocolo de 1º de junho de 1845, sobre a pacificação do rio da Prata, pelo qual garantiu a liberdade de comércio e navegação dos rios Paraná e Uruguai. O reconhecimento pela Argentina só se deu depois da queda de Rosas, por iniciativa do General Urquiza, servindo como agente Santiago Derqui. Foi solenemente declarado a 17 de julho de 1852 (RODRIGUES; SEINTEFUS, 1995, p.164)

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Diante desse cenário e após os acontecimentos de 1851 e 1852 foi a

independência do Paraguai reconhecida pela Confederação Argentina em 17 de

julho de 1852, além do Reino Unido e várias nações européias que não haviam

aderido ao pedido de reconhecimento de 1842.

Desta feita, segundo Rodrigues e Seitenfus (1995, p.187)

As manifestações de consideração partidas do Brasil, que fora o primeiro a reconhecer-lhe a Independência, faziam supor que se pudesse chegar a um acordo sobre as várias questões pendentes e conseqüentes ao Tratado de 25 de dezembro de 1850, especialmente quanto à navegação dos rios, comércio e limites.

Para tal, conforme Guedes, o Império enviou ao Paraguai um “diplomata

menos hábil”, Felipe José Pereira Leal, visto que foi responsável por lançar a

desconfiança no espírito de Lopez (GUEDES, 1995).

O presidente paraguaio declarou que nada ajustaria com o Império se não

houvesse o prévio acordo sobre os limites e fronteiras, todavia tais pretensões do

líder do Paraguai foram julgadas inaceitáveis pelo governo brasileiro (RODRIGUES;

SEITENFUS, 1995).

A navegação do Paraná estava aberta a todas as nações pelos dois governos de Buenos Aires e a Confederação Argentina, mas os barcos brasileiros não podiam chegar à província de Mato Grosso, porque o Paraguai lhes proibia o tráfego pelos seus rios. Concedia o Paraguai o direito de navegar seus rios a várias nações, mas recusava-se ao Brasil, ao qual devia, pelas nossas alianças e esforços, o poder de navegar o Paraná até o rio da Prata. Nenhuma negociação sobre comércio e navegação seria decidida sem o ajuste dos limites, sobre os quais sua pretensão era descabida (RODRIGUES; SEITENFUS, 1995, p.188, grifos nossos)

9.

Assim, segundo Guedes (1995, p.57), com os “laços estremecidos”

perigou a navegação brasileira no Rio Paraguai e o Império resolveu, inadvertidamente, aplicar a “diplomacia das canhoneiras”, escolhendo mal aquele que seria o executor dela, o chefe de divisão Pedro Ferreira de Oliveira, com seu pavilhão na depois famosa fragata Amazonas.

Com as relações suspensas, o governo brasileiro envia o chefe de esquadra

Pedro Ferreira Oliveira, em 10 de dezembro de 1854, ao Paraguai com a missão

especifica de solicitar o efetivo cumprimento do art. 3 da Convenção de 25 de

dezembro de 1850, cujo dispositivo assegurava a livre navegação do rio Paraná até

o rio da Prata. Além disso, a missão também tinha por objetivo reclamar satisfações

9 Atente o leitor que algumas citações (expressões em negrito precisamente) aqui feitas da obra de

José Honório Rodrigues e Ricardo Seitenfus demonstram um discurso clássico sobre a condição do Paraguai de responsável pelos entraves que ensejariam a Guerra anos depois.

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29

pelo ato praticado contra o plenipotenciário Pereira Leal. (RODRIGUES;

SEITENFUS, 1995).

Contudo, ainda que elevado o número de navios da força naval sobre a

chefia de Ferreira de Oliveira, Lopez negou-lhe a subida do rio, sendo o

plenipotenciário brasileiro forçado a deixá-la próximo a Três Bocas e a subir o

Paraguai só com a fragata Amazonas, que encalhou antes de Assunção,

demonstrando, “desde então (1855, dez anos antes do inicio do conflito), que navios

de madeira e grande calado não poderiam operar naquelas águas” (GUEDES, 1995,

p.57).

Desta feita, o máximo que conseguiu o “inusitado” diplomata foi um Tratado

de Amizade, Comercio e Navegação, sendo postergada a questão de limites, da

qual Solano Lopéz foi o principal negociador (GUEDES, 1995, p.57).

Depois de muita discussão e de manifesta má vontade paraguaia foram assinadas a 27 de abril de 1855, duas convenções: a primeira relativa ao trânsito livre e à navegação e comércio dos dois países; a segunda marcando o prazo de um ano para o ajuste de limites, sem o qual o primeiro não poderia ter feito. As convenções firmadas sob essas condições valiam apenas como promessa de um futuro acordado definitivo, sem cumprimento da obrigação há muito contraída; deste modo, continuava interditada à bandeira brasileira a navegação do Paraguai e Paraná. Julgava Lopez que se o tratado de comércio e navegação fosse ratificado logo e posto em execução, não conseguiria a República ajustar e conduzir o de limites numa base razoável e justa, pois teria aberto mão de sua posição de segurança e defesa. O Governo brasileiro também não escondia sua insatisfação em face de nada se haver decidido e, assim, não ratificou as convenções (RODRIGUES; SEITENFUS, 1995, p.189).

Logo, segundo Guedes, “se Pedro Ferreira de Oliveira nada conseguira na

sua inglória expedição, o ministro Paranhos, um ano depois, assinou com José

Borges, plenipotenciário paraguaio, um segundo Tratado de Amizade, Comércio e

Navegação” (GUEDES,1995, p.58).

No entanto, com a questão de limites pendente, os vários conflitos regionais

que foram se desencadeando em função das disputas políticas no Prata e o

contínuo problema de delimitação de fronteiras assolavam as recém-nascidas

nações sul americanas.

Por isso, Carlos Antonio López desabafou com Thornton, ministro britânico em Buenos Aires, quando este visitou Assunção, afirmando temer que a questão de limites levasse a uma ruptura entre os países. Natural, pois, que, mesmo firmada a convenção sobre liberdade de navegação fluvial (1858) e inaugurado o serviço regular de vapores, via Rio Paraguai, entre o Rio de Janeiro e Cuiabá, Francisco Solano López acelerasse seus preparativos para ampliar Humaitá, aumentar o exercito e contratar técnico e engenheiros militares no estrangeiro. Envolvido com seu interesse maior,

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as questões em ambas as margens do Prata, o governo imperial parece ter ignorado aqueles preparativos (GUEDES, 1995, p.58).

Assoma-se a essas circunstâncias os entraves que ocorreriam, também no

Uruguai, entre blancos e colorados e a interferência brasileira na região. Segundo,

Carlos Guilherme Mota, existe certa concordância de que uma das causas próximas

para eclosão da Guerra foi a intervenção político-militar do Brasil, em 1864, em um

momento no qual o Paraguai tentava articular uma nova configuração geopolítica na

América do Sul (MOTA, 1995).

O Uruguai, governado por Atanasio Aguirre, do partido Blanco, era hostilizado pelo governo imperial brasileiro, sob o argumento de que os blancos não tomavam providencias a favor dos brasileiros ali residentes e alegando que estes sofriam prejuízos e eram despojados de seus bens. A Argentina não logrou ser intermediária no conflito, e o governo brasileiro anunciou que suas tropas, estacionadas na fronteira, agiriam em represálias contra os uruguaios. O Presidente paraguaio Francisco Solano Lopez protestou contra intervenção brasileira, qualificando-a como “atentatória ao equilíbrio dos Estados do Prata, que interessa à República do Paraguai como garantia de sua segurança, paz e prosperidade”. Localiza-se aí o estopim da Guerra (MOTA, 1995, p.46).

Desta feita, conforme os acontecimentos acima narrados na Região do Prata,

Mota afirma que a conflagração deve-se inicialmente à “firme determinação do

presidente paraguaio Solano Lopez de bloquear o esforço expansionista brasileiro.

De fato, desde 1855, o Império do Brasil vinha pressionando o Paraguai a assinar

tratados de limites e de navegação que nem Carlos Antonio Lopez nem seu filho,

Solano López, estavam dispostos a assinar” (MOTA, 1995, p.46).

Tomando por base essa conjuntura, vejamos os principais discursos ou

correntes sobre as causas.

3.1 Tradicionalistas: o discurso oficial ou clássico sobre a Guerra

As obras ditas tradicionalistas ou clássicas sobre a Guerra do Paraguai, em

geral são acometidas do sentimento nacional e patriótico daqueles que a

combateram, no qual o Paraguai, mais precisamente o presidente Francisco Solano

Lopez, teria sido o principal responsável pela deflagração da guerra.

Obras tidas como diários de guerra, alguns dos principais representantes

dessa corrente foram Alfredo d’ Escragnolle de Taunay com o livro A Retirada da

Laguna (1868), o General Dionísio Cerqueira em Reminiscências da Campanha do

Paraguai (1980) e Antonio de Sena Madureira em A Guerra do Paraguai (1870).

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Segundo Doratioto (2009, p.2), o livro A Retirada da Laguna narra com

dramaticidade os acontecimentos e lhes dá proporções épicas, na qual o inimigo não

é só o soldado paraguaio, mas é, também, “a natureza que é majestosa e, ao

mesmo tempo, cruel com suas pequenas pragas – mosquitos, serpentes, etc. – e

obstáculos – pântanos, rios, clima”.

Essas características de A Retirada da Laguna, conforme Doratioto (2008,

p.3),

[...] estão presentes, em menor ou maior grau, nos livros sobre a guerra escritos após 1870, normalmente tendo como autores homens que estiveram no teatro de operações. E estão presentes não por imitação, mas sim, porque as dimensões dramática e épica eram realidade nos campos de batalha. Afinal, esse tipo de discurso não foi uma reconstrução intencionalmente deturpada do passado, mas tratou-se, sim, de esforço em relatá-lo, embora se saiba que a memória é traiçoeira e, mais, que a narração também é interpretação.

Desta feita, ao sopesar o discurso clássico da guerra teremos relatos

inflamados tais como o de Dionísio Cerqueira, no qual afirmava que o ditador

paraguaio, que se preparava desde muito, para a realização de seus projetos de

expansão e supremacia na América meridional, aproveitou a invasão brasileira em

terras uruguaias como pretexto para um rompimento com as relações com o Império

(CERQUEIRA, 1980, p.46).

Segundo Doratioto (2009, p.4), entre os livros brasileiros sobre a guerra, de

caráter memorialístico, a obra de Cerqueira é das mais interessantes quer por seu

conteúdo, quer pela condição do seu autor, tendo em vista que Cerqueira lutou

durante toda a guerra, iniciando como alferes, e, na República brasileira, chegou a

general e Ministro das Relações Exteriores. Nas suas memórias, Cerqueira

reafirmou o relato tradicional sobre Francisco Solano López, reforçando os relatos

brasileiros anteriores (de tirano e ambicioso), além de reconhecer com simpatia, em

diferentes passagens de sua obra a valentia dos soldados paraguaios. Tal

reconhecimento, segundo a historiografia revisionista e neorevisionista, caracterizar-

se-á como uma forma de secundarizar a questão da incapacidade do governo

brasileiro de vencer rapidamente a guerra.

Por sua vez, Sena Madureira, aduz que o Império só se pôs a Guerra para

repelir o inimigo que “inesperada e traiçoeiramente” invadiu uma de nossas mais

importantes províncias, mesmo havendo o Brasil por tantas vezes tentado solucionar

os impasses dos limites, por meio das inúmeras missões de seus plenipotenciários

no Paraguai (MADUREIRA, 1870, p.10).

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Outro autor do discurso nacional é Joaquim Nabuco, em cujo livro “Nabuco

de Araújo, um estadista do Império”, rejeita a idéia de que houvesse intenção do

Império brasileiro de ensejar a guerra contra o Paraguai ao fazer gestões

diplomáticas no Rio da Prata com a Missão Saraiva e pressão militar sobre o

governo uruguaio. Pelo contrário, Joaquim Nabuco “justifica a ação brasileira no

Uruguai e, ainda, a Guerra de 1865-1870 como um instrumento de civilização e de

liberdade. Na realidade, não é exagero afirmar que Nabuco via o conflito como um

confronto entre a Civilização e a Barbárie” (DORATIOTO, 2009, p.4).

As obras clássicas não deixavam dúvidas quanto à origem da guerra, mas muitas delas eram dúbias ao analisar a evolução do conflito. Embora justificassem a luta pela necessidade de responder à agressão de López ao Império, não escondiam a admiração pelos paraguaios que lutaram bravamente, preferindo a morte à rendição. Tamanha coragem não se harmonizava com a explicação de que os paraguaios lutavam devido ao terror que lhes infundia o ditador e as represálias que ele impunha a parentes e companheiros daqueles que não cumprissem suas ordens (DORATIOTO, 2009, p. 6).

Segundo Doratioto, tal visão não está de todo errada, visto que López de fato

exercia o terror. No entanto, essa visão clássica está incompleta, pois não leva em

consideração, também, que os paraguaios foram convencidos do que dizia a

propaganda lopizta: “os aliados, se vitoriosos, poriam fim à independência do

Paraguai” (DORATIOTO, 2009).

A exemplo, Julián N. Godoy, ajudante de ordens de López, endossa esse

terror implantado pelo líder paraguaio, ao dizer que a adulação produzida pelo terror

que López infundia chegava a tal ponto que os informes que recebia eram sempre

falsos em relação ao número de forças inimigas, fazendo-o crer, depois de qualquer

combate, por pior que nos tivesse sido o resultado, que a vitória definitiva para

nossas armas estava próxima, motivo pelo qual não se preocupava em enviar-nos

qualquer reforço (LOPEZ apud DORATIOTO, 2002).

Assim, os soldados paraguaios resistiram bravamente porque estavam

convencidos de que defendiam a soberania do seu país. Afinal, diz Doratioto (2009,

p.5), “a versão que se impôs no Brasil foi aquela que, com variações de ênfase e

enfoque, definiu Francisco Solano López como chefe de Estado ambicioso e

responsável pelo inicio da Guerra Grande/Guerra do Paraguai”. Logo, na origem

dessa versão tradicional

[...] predominavam os relatos de ex-combatentes, como Taunay, Dionísio Cerqueira e André Rebouças, mas havia, também, ensaios interpretativos. Essa interpretação constitui a historiografia clássica brasileira porque, afinal,

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ela foi a primeira a surgir e, mais, construiu um modelo explicativo que predominou por décadas para explicar a Guerra do Paraguai (DORATIOTO,

2009, p.5).

Desta feita, a sobreposição do “discurso oficial” preponderou sobre os

demais que possivelmente poderiam existir. O momento histórico pelo qual os

combatentes, as pessoas, o governo, e os intelectuais em geral estavam inseridos –

necessidade de encontrar uma explicação para a mortandade do conflito, além de

justificar toda a política internacional, econômica e social ajudou a formação dessa

corrente tradicionalista. No entanto, já no início do século XX despontava uma

releitura desse discurso oficial, o denominado de revisionismo.

3.2 Revisionistas: o discurso imperialista

Segundo Doratioto (2009, p.8), a historiografia oficial da guerra foi

contestada, com acuidade decrescente, pelos positivistas “motivados por

pressupostos filosóficos e pela disputa intelectual contra os críticos dos primeiros

anos da República brasileira, durante os quais a corrupção e o nepotismo foram

comuns”.

No final do século XIX e inicio do século XX surgiram vozes discordantes dessa interpretação tradicional. No Brasil, os adeptos do positivismo, filosofia contraria ao regime monárquico de governo, passaram a responsabilizar o Império brasileiro pelo início da Guerra. No Paraguai, por essa época, surgiu o revisionismo sobre Solano López, que teve sua imagem “reconstruída” e passou a ser apresentado como estadista e grande chefe militar (DORATIOTO, 2002, p.19).

Porém, faltava aos positivistas acervo probatório suficiente que inocentasse

Francisco Solano López da responsabilidade pela deflagração da guerra. O que

havia eram documentos que demonstravam “ter López se deixado convencer – ou

simulou que se convencera –, pela diplomacia uruguaia, de que a intervenção

brasileira e argentina na guerra civil do Uruguai, apoiando os rebeldes colorados, se

voltaria posteriormente contra o Paraguai” (DORATIOTO, 2009, p.5).

Entre os teóricos que encabeçam essa corrente citamos o que consideramos

os dois maiores expoentes, León Pomer (1968), com a obra A Guerra do Paraguai:

A grande tragédia rioplatense e Julio José Chiavenato, em Genocídio Americano: A

Guerra do Paraguai (1979) e Eduardo Galeano, em As veias abertas da América

Latina (1978).

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Segundo Pomer, o Paraguai foi vítima dos interesses conjuntos de potências

imperialistas, em especial a Inglaterra, cujo interesse residia na expansão de seus

domínios de mercado. Pomer justifica tal argumento sobre a responsabilidade

inglesa ao afirmar que o cenário político mundial, economicamente falando, estava

envolto ao crescente desenvolvimento das economias capitalistas, que em conjunto

com os ideais liberais propunham a essas novas potencias em ascensão (França,

Inglaterra, Estados Unidos) o domínio sobre novos mercados. Assim, a Inglaterra

precisando de um novo mercado para depositar suas mercadorias e escoar sua

produção, segundo Pomer, teria “eleito” o mercado das recém-nações latino-

americanas (POMER, 1968).

Desta feita, conforme Pomer, o isolamento paraguaio com relação às

influências européias, foi considerado pelas grandes potencias como um problema a

ser eliminado tanto porque imponha limites à expansão do capital inglês, quanto

para que não servisse como exemplo aos demais países (POMER, 1968).

Nesse sentido a Guerra do Paraguai foi a maneira encontrada para que o

problema inglês fosse resolvido, tendo em vista que além do Brasil, Argentina e

Uruguai manterão relações econômicas com a Inglaterra, a mesma financiou o

conflito.

Pomer sustenta sua tese imperialista ao analisar a documentação

diplomática do Brasil e da Argentina, assim temos: “Insignificante em si mesmo, o

Paraguai, na opinião de Sir Edward pode impedir o desenvolvimento e progresso de

todos os seus vizinhos”, conforme relato do ministro norte-americano em Assunção,

Sir Washburn (POMER, 1968, p.106).

Conforme a visão revisionista de Pomer, pelo tratado que no dia 25 de

dezembro de 1850 Brasil e Paraguai assinaram, ambos comprometiam-se a manter

a independência da República Oriental do Uruguai. Esse tratado, no entanto, foi

violado por um dos signatários e pela Argentina, por mais que formalmente o

Uruguai permanecesse independente. Mais tarde, no dia 2 de janeiro de 1859, o

Império e a Confederação prometiam reciprocamente, e ao Uruguai também, não

tolerar em seus respectivos territórios trabalhos subversivos contra a nacionalidade

oriental. Também este tratado havia sido grosseiramente violado.

O governo de Mitre dedicou-se à tarefa de colocar amigos no governo de Montevidéu e, mediante manobras diplomáticas astuciosas, conseguiu que o Brasil realizasse uma operação militar. Como conseqüência da intervenção brasileira, que culminou com a ocupação militar do território uruguaio, os blancos foram eliminados do poder, sendo substituídos pelo

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general Venâncio Flores, que posteriormente retribuiria a favor recebido com a participação das tropas orientais, comandadas pelo próprio general, no conflito que não tardou em eclodir (POMER, 1995, p.117).

Mas o pior de tudo, afirma Pomer, era o controle do acesso ao rio Paraná e

depois através dele, ao rio Paraguai que agora estava em mãos de potências hostis

ao país guarani. A gravidade do fato era notória considerando que a boca de saída

da República do Paraguai era o Rio da Prata; e que obstruída essa passagem, seu

futuro tornar-se-ia suficientemente sombrio para representar uma grave crise

nacional (POMER, 1968, p.129).

Assim, o presidente Francisco Solano López (apud POMER, 1968, p. 129-

130), explica em mensagem ao Congresso Extraordinário, de 5 de março de 1865

que

Os motivos da ruptura de nossas relações com o Império do Brasil e o estado pouco cordial em que ficaram com o gabinete argentino,são os sangrentos acontecimentos que hoje enlutam a República Oriental do Uruguai e que ameaçam deslocar o equilíbrio do Rio da Prata. Estas duas potências, garantia da independência daquele Estado, são as que hoje a atacam, e o Brasil, que em 1850, num tratado solene, sustentava conosco a necessidade do status quo das nacionalidades desta parte da América e especialmente a autonomia o Estado Oriental, alia-se ao partido rebelde que, lançado da capital argentina e com os auxílios de um comitê revolucionário, publicamente estabelecido, desloca a riqueza nacional e ensangüenta o solo pátrio.

Destarte, justifica Pomer, o Paraguai viu-se na obrigação de declarar a

guerra ao Brasil e de imediato iniciou as operações ofensivas (POMER, 1968).

Corrobora com Pomer, o jornalista e escritor brasileiro Chiavenato, ao

endossar o discurso imperialista de que a Inglaterra teria sido a maior interessada no

desenrolar do conflito. Para Chiavenato, o Paraguai foi alvo por estar se organizando

como um país auto-suficiente e independente dos interesses estrangeiros, fato esse

que além de incomodar a Inglaterra “economicamente”, criava entraves com seus

vizinhos (CHIAVENATO,1979).

Segundo Chiavenato, apesar dessa incompreensão dos seus vizinhos e dos

demais “incomodados”, Carlos Antonio Lopez soube suplantar vários incidentes

diplomáticos importantes, sendo que grande parte deles compelidos a complicar o

governo do Paraguai (CHIAVENATO, 1979, p.38).

Para corroborar com tal argumento, Chiavenato afirma ser necessário que

uma rápida informação seja dada sobre alguns dos principais desses incidentes, a

fim de demonstrar que a sua superação não influi em nada na deflagração da

guerra.

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E justamente os motivos desses incidentes, sobretudo pelo lado Imperial do Brasil e da Argentina, são em geral apresentados como as causas da guerra. Eles só são superados enquanto a guerra não é uma necessidade; quando esta é uma exigência internacional, não há acordo diplomático possível (CHIAVENATO, 1979, p. 38).

Desta feita, Chiavenato aduz que o Império do Brasil poderia reclamar do

Paraguai, e com razão, seria a livre passagem dos seus barcos pelo rio Paraguai

para chegar a Mato Grosso e que essa livre passagem dos barcos brasileiros era

negada pelo Paraguai, segundo as denúncias brasileiras, porque no Mato Grosso

encontravam-se os mesmos produtos que os paraguaios exportavam

(CHIAVENATO, 1979, p.39).

Ademais, o Paraguai não querendo perder o monopólio da erva-mate e da

madeira principalmente, o governo de López criava embaraços aos barcos

brasileiros. Todavia, em 1857, o próprio Barão do rio Branco, em Asunción,

pressiona o Presidente Carlos Antonio López para abrir os rios paraguaios aos

barcos brasileiros (CHIAVENATO, 1979, p.39).

Inúmeros acordos e tratados foram feitos entre o Império e o Paraguai a fim

de garantir a pacificidade das navegações usando essa rota, porém, afirma

Chiavenato que essa “comunicação fluvial” estava sob os interesses imperialistas da

Inglaterra:

Esse serviço de comunicação fluvial, porém, tem outra sutil conotação: serve principalmente, aos interesses ingleses. Os barcos brasileiros são uma garantia constante para o transporte de produtos industrializados ingleses e para suprir de matéria prima barata a matriz exportadora. Carlos Antonio López, que já tinha enfrentado a decisão do Império do Brasil em abrir à força os rios paraguaios antes, elimina um ponto de atrito que poderia ser importante pretexto para qualquer ação armada contra seu país (CHIAVENATO, 1979, p.39).

Adiante, afirma Chiavenato, que outros incidentes com o Brasil foram

agravando suas relações com Paraguai. O caso, por exemplo, da missão do

plenipotenciário brasileiro Pedro Ferreira Oliveira, é narrado por Chiavenato (1979,

p.39-40) como mais uma tentativa expansionista brasileira, vejamos:

Já em 1855, o Almirante Pedro Ferreira de Oliveira ameaçou entrar nas águas paraguaias com uma esquadra poderosa, exigindo livre passagem para os barcos brasileiros. Esse incidente também foi contornado pelo governo paraguaio, de forma a não aceitar as pressões imperiais e não sofrer represálias militares. O Almirante Pedro Ferreira de Oliveira, comandando uma forte esquadra, com um exercito pronto para o desembarque, armada com cem canhões, foi ao Paraguai como ministro plenipotenciário para resolver questões de limites e dos rios. Para robustecer seu poder militar e fortalecer seus argumentos diplomáticos, dois outros exércitos imperiais partiram de Mato Grosso e do Rio Grande do Sul, dirigindo-se ao Paraguai onde se encontrariam com o almirante.

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Esse foi o mais importante incidente com o Império enfrentado por Carlos Antonio López. Ceder às reivindicações expansionistas do Império do Brasil significaria praticamente perder Meade do território paraguaio. As reivindicações territoriais do Império por seu lado, não se basearam nunca em fatos concretos, de direito ou de tradição.

Nessa esteira, Chiavenato (1979, p.40) arremata dizendo que essa

expedição poderosa, um verdadeiro teste para a capacidade diplomática de Carlos

Antonio López, tinha tudo para ser uma grande força de pressão do Império contra o

Paraguai, todavia, acaba quase automaticamente transformada num dos grandes

“desastres da diplomacia brasileira”10. O próprio Barão do Rio Branco (apud

CHIAVENATO, 1979, p.40) afirma que o Almirante Pedro Ferreira tinha ordem, em

certos casos, para um procedimento “enérgico e militar”.

Desta feita, Pedro Ferreira foi expulso do Paraguai, pois segundo López, o

plenipotenciário brasileiro teria agido com o fim de gerar intriga e impor o ódio ao

Supremo Governo do Estado, e de levantar atrozes calúnias contra o líder

paraguaio.

Chiavenato conclui, sobre o referido incidente, que o mesmo por si só,

dentro dos conceitos monárquicos brasileiros, teria gravidade suficiente para fazer o

Império à guerra contra o Paraguai (CHIAVENATO, 1979).

Assim, em vez de estabelecer uma estratégia para essa situação, afirma

Chiavenato, Carlos Antonio López assumiu os canais de uma diplomacia tradicional

restringindo a defesa dos interesses nacionais paraguaios, tratando com seus

vizinhos sobre questões formais, por mais que aparentemente essas questões há

seu tempo pudessem representar problemas definitivos e substanciais. Logo, esse

desvio internacional ensejou, quando da interferência brasileira no território

uruguaio, um temor (por Francisco López) de que o Império e seus aliados,

financiados pelos ingleses, pusessem fim ao que a nação Paraguai havia

desenvolvido autônoma e independentemente (CHIAVENATO, 1979, p. 43–44).

Por fim, nos pareceu de bom alvitre, finalizar, essa corrente revisionista com

um dos seus mais inflamados defensores, Eduardo Galeano.

Para Galeano, os paraguaios, ainda hoje, sofrem a herança de uma guerra

de extermínio, que se incorporou à história da América Latina “como seu capítulo

10

Chiavenato utiliza o comentário - que define a expedição de Ferreira como desastre diplomático -

de um dos correntistas da visão oficial, Joaquim Nabuco, para endossar seu argumento sobre esse incidente político.

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mais infame”. “Chamou-se a Guerra da Tríplice Aliança. Brasil, Argentina e Uruguai

tiveram a seu cargo o genocídio” (GALEANO, 1978, p.133).

Assim, como Chiavenato e Pomer, Galeano confere - por meio de um longo

texto, que aqui nos pareceu interessante reproduzir - ao imperialismo inglês a

responsabilidade pela guerra na Bacia do Prata, ao descrever o Paraguai antes e

depois da Guerra, bem como atenta para as causas.

Não deixaram pedra sobre pedra nem habitantes varões entre os escombros. Embora a Inglaterra não tenha participado diretamente na horrorosa façanha, foram seus mercadores, seus banqueiros e seus industriais que se beneficiaram com o crime do Paraguai. A invasão foi financiada, do começo ao fim, pelo Banco de Londres, a casa Baring Brothers e banco Rothschild, em empréstimos com juros leoninos que hipotecaram o destino dos países vencedores. Até sua destruição, o Paraguai se erguia como uma exceção na América Latina: a única nação que o capital estrangeiro não tinha deformado. O longo governo de mão-de-ferro do ditador Gaspar Rodríguez de Francia (1814-1840) incubaram, na matriz do isolamento, um desenvolvimento econômico autônomo e sustentado. [...] Francia tinha-se apoiado nas massas camponesas para esmagar a oligarquia paraguaia e conquistado a paz interior estendendo um rigoroso cordão sanitário frente aos restantes países do antigo vice-reinado do rio da Prata. [...]. Não existiam, nem existiriam mais tarde, as liberdades políticas e o direito de oposição, porém naquela etapa histórica só os nostálgicos dos privilégios perdidos sofriam a falta de democracia. Não havia grandes fortunas privadas quando Francia morreu, e o Paraguai era o único país da América Latina que não tinha mendigos, famintos nem ladrões. Os viajantes da época encontravam ali um oásis de tranqüilidade, em meio das demais comarcas convulsionadas pelas guerras contínuas. O agente norte-americano Hopkins informava em 1845 a seu governo que no Paraguai “não tem menino que não saiba ler e escrever...”. [...]. O extermínio da oligarquia possibilitou a concentração das alavancas econômicas fundamentais nas mãos do Estado, para levar em frente esta política autárquica de desenvolvimento dentro de suas fronteiras. Os governos posteriores de Carlos Antonio López e de seu filho Francisco Solano continuaram e vitalizaram a tarefa. A economia estava em pleno crescimento. Quando os invasores apareceram no horizonte, em 1865, o Paraguai contava com uma linha telegráfica, uma ferrovia e uma boa quantidade de fábricas de materiais de construção, tecidos, lenços, ponchos, papel e tinta, louça e pólvora. Duzentos técnicos estrangeiros, muito bem pagos pelo Estado, prestavam sua colaboração decisiva. Desde 1850, a fundição de Ibycui fabricava canhões, morteiros e balas de todos os calibres; no arsenal de Assunção eram produzidos canhões de bronze, obuses e balas. A siderurgia nacional, como todas as demais atividades econômicas essenciais, estava em mãos do Estado. O país contava com urna frota mercante nacional, e tinham sido construídos no estaleiro de Assunção vários dos navios que ostentavam o pavilhão paraguaio ao longo do Paraná ou através do Atlântico e do Mediterrâneo. O Estado virtualmente monopolizava o comércio exterior: a erva-mate e o tabaco abasteciam o consumo do sul do continente; as madeiras valiosas

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eram exportadas para a Europa. A balança comercial mostrava um grande superávit. [...]. A esponja imperialista não absorvia a riqueza que o país produzia. [...]. O Estado praticava um zeloso protecionismo, muito reforçado em 1864, sobre a indústria nacional e mercado interno; os rios interiores não estavam abertos às naves britânicas que bombardeavam com manufaturas de Manchester e Liverpool todo resto da América Latina. O comércio inglês não dissimulava sua inquietação, não só porque aquele último foco de resistência nacional no coração do continente era invulnerável, mas também, e sobretudo, pela força do exemplo que a experiência paraguaia irradiava perigosamente para os vizinhos. O país mais progressista da América Latina construía seu futuro sem inversões estrangeiras, sem empréstimos do banco inglês e sem as bênçãos do livre comércio. Porém, à medida que o Paraguai ia avançando neste processo, sua necessidade de romper a reclusão se tornava mais aguda. O desenvolvimento industrial requeria contatos mais intensos com o mercado internacional e com as fontes de técnica avançada. O Paraguai estava objetivamente bloqueado entre Argentina e Brasil, e ambos países podiam negar o oxigênio a seus pulmões, fechando-lhe, como o fizeram Rivadavia e Rosas, as bocas dos rios, ou fixando impostos arbitrários ao trânsito de suas mercadorias. Para seus vizinhos, por outra parte, era uma condição imprescindível, para os fins de consolidação do estado oligárquico, acabar com o escândalo daquele país odioso que se bastava a si mesmo e não queria ajoelhar-se ante os mercadores britânicos. O ministro inglês em Buenos Aires, Edward Thornton, participou consideravelmente nos preparativos da guerra. Às vésperas da explosão, tomava parte, como assessor do governo, nas reuniões do gabinete argentino, sentando-se ao lado do presidente Bartolomeu Mitre. Diante de seu atento olhar se urdiu a trama de provocações e de enganos que culminou com o acordo argentino-brasileiro e selou a sorte do Paraguai. Venâncio Flores invadiu o Uruguai, nas ancas da intervenção dos dois grandes vizinhos, e estabeleceu em Montevidéu, depois da matança de Paysandú, seu governo adjunto ao Rio de Janeiro e Buenos Aires. A Tríplice Aliança estava em funcionamento. O presidente paraguaio Solano López ameaçou com a guerra, se assaltassem o Uruguai: sabia que assim se estava fechando a tenaz de ferro em torno da garganta de seu país encurralado pela geografia e pelos inimigos (GALEANO, 1978, p. 133-135, grifos nossos).

Enfim, percebe-se pelo discurso revisionista que o Paraguai era um país

bastante avançado no que diz respeito à economia, política e a sociedade, se

comparado aos demais vizinhos e que a questão territorial, mas principalmente os

interesses ingleses na região tolheram o desenvolvimento do país.

3.3 Neo-revisionistas: uma Interpretação Sistêmica Regional

Essa corrente historiográfica surge em meados de 1980, com o objetivo de

buscar as causas da Guerra do Paraguai no próprio processo histórico dos países

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platinos. Isto é, segundo Doratioto (um dos expoentes dessa corrente), “uma

historiografia que se caracteriza por pesquisa sólida em fontes primárias, o que lhe

permite concluir que as origens da guerra estão no próprio processo histórico

regional” (2009, p.7).

E que, ao contrário do que os revisionistas argumentarem, o Paraguai não

constituía exemplo de modernidade econômica e social no período que antecedeu o

conflito. Somado a isso, essa corrente, também se propõem a “analisar criticamente

os personagens que participaram do processo que levou ao enfrentamento armado,

em lugar de robustecer mistificações” (DORATIOTO, 2009, p.8).

Desta feita, temos como a primeira obra dessa corrente, segundo Doratioto

(2009, p.8) o livro de Luiz Alberto Moniz Bandeira, O expansionismo brasileiro: o

papel do Brasil na bacia do Prata (1985), seguido a essa obras teremos, ainda

segundo o autor, em ordem cronológica, os seguintes autores/títulos: Ricardo Salles

com Guerra do Paraguai: escravidão e cidadania na formação do Exército (Rio de

Janeiro: Paz e Terra, 1990); Francisco Doratioto com Guerra do Paraguai: Segunda

Visão (São Paulo: Brasiliense, 1991); Wilma Peres Costa com A espada de

Dâmocles: o Exército, a Guerra do Paraguai e a crise do Império (São Paulo:

Hucitec, 1996); Victor Izeckson com O cerne da discórdia: a Guerra do Paraguai e o

núcleo profissional do Exército brasileiro (Rio de Janeiro: E-papers); Alfredo da Mota

Menezes com Guerra do Paraguai: como construímos esse conflito (São Paulo:

Contexto, 1998); André Toral com Imagens em Desordem: a iconografia na Guerra

do Paraguai (São Paulo: Humanitas, 2001); Ana Paula Squinelo com A Guerra do

Paraguai, essa desconhecida... ensino, memória e história de um conflito secular

(Campo Grande: UCDB, 2002); Francisco Doratioto com Maldita Guerra, nova

história da Guerra do Paraguai” (São Paulo: Cia das Letras, 2002), uma obra mais

completa do autor em comparação ao livro Guerra do Paraguai: Segunda Visão de

1991, e ainda outra obra de Ricardo Salles intitulada Guerra do Paraguai; memória &

imagens (Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 2003).

Como se vê são inúmeras obras que se afastam desse discurso revisionista,

as citadas acima só são algumas dos numerosos escritos com essa nova releitura

da guerra. Nesse trabalho, em questão trataremos de algumas apenas, que

consideramos as mais relevantes para o estudo em voga.

Esse tópico, propõem-se necessariamente a desmistificar um pouco essa

visão revisionista que foi criada a respeito das causas da Guerra, vemos essa

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corrente dita neo-revisionista como uma mediadora entre o discurso oficial e o

imperialista, coadunando, por sua vez, com os argumentos dessa nova releitura.

Doratioto, por exemplo, acredita que a interpretação revisionista surgiu por

motivos financeiros, e foi adotada por uma seqüência de ditadores:

Rafael Franco (1936-7) a oficializou, Higino Morinigo (1940-8) a fortaleceu e Alfredo Stroessner (1954-89) a tornou ideologia oficial de Estado, a ponto de prender e exilar aqueles que dela divergissem. [...] Foi, porém, a partir de fins dos anos 1960 que intelectuais nacionalistas e de esquerda do Rio da Prata promoveram Solano López a líder antiimperialista. Esse revisionismo que, com o tempo, descambou para posturas populistas, apresenta o Paraguai pré-guerra como um país progressista, onde o Estado teria proporcionado a modernização do país e o bem-estar de sua população, fugindo à inserção na economia capitalista e à subordinação à Inglaterra. Por essa explicação, Brasil e Argentina teriam sido manipulados por interesses britânicos para aniquilar o desenvolvimento autônomo paraguaio (DORATIOTO, 2002, p.19).

Segundo Menezes, a tese de que o Paraguai estava no caminho de um

modelo de industrialização avançado é equivocada, pois o perfil da industrialização

paraguaia surgida nos dez anos anteriores à guerra não era efetivamente dirigido

para a ampliação da produção industrial voltada para a exportação, mas sim

direcionada para uma indústria antes de tudo preocupada com a defesa do Estado

paraguaio, além de limitada e muito aquém do que pretendem Pomer e Chiavenato

ao descreverem o Paraguai no século XIX (MENEZES, 1998).

Nesta esteira, e partindo do argumento de revisão historiográfica

(revisionismo) sobre a realidade paraguaia durante o século XIX, o quadro que se

apresenta é o de um país ainda em um estágio muito incipiente no desenvolvimento

industrial, ou seja, carente de matérias primas, capacidade tecnológica e mão-de-

obra especializada (MENEZES, 1998).

Como os demais autores da corrente neo-revisionista, Menezes, rechaça a

idéia da Inglaterra como articuladora ou interessada no conflito, ao contrário,

endossa o autor que as motivações da guerra devem ser buscadas dentro do

contexto regional (MENEZES, 1998).

André Toral, por sua vez, salienta que à maneira de Doratioto, Sales e Brun,

não consideram a Inglaterra como a grande articuladora do conflito. Ao contrário,

Entendo, ainda, que os países do Cone Sul possuíam projetos políticos próprios. Analiso, finalmente, Argentina, Uruguai e Brasil como sujeitos políticos, ainda que em posição marginal aos centros econômicos da época, e não simplesmente cartas com as quais as grandes potências imperialistas fariam o jogo da história (SALES e BRUN apud TORAL, 2001, p.40).

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De acordo com Doratioto, as relações do Paraguai com a Grã-Bretanha não

tinham se caracterizado, até 1865, por “excesso de cordialidade”.

Porém, mais do que isso pode ser dito quanto ao Império, que, inclusive, rompeu, relações diplomáticas com Londres em 1863. Conforme Herken e Krauer e Giménez de Herken, baseado em farta documentação diplomática britânica, a opinião pessoal dos diplomatas ingleses que tiveram que negociar com o governo paraguaio foi, em sua maioria, negativa, tanto quanto ao caráter político do país, como sobre suas potencialidades comerciais. Isso não impediu que esses representantes seguissem as instruções de seu governo com respeito ao Estado Guarani, as quais consistiam, essencialmente, em impedir que Solano López utilizasse a Grã-Bretanha nas disputas com os países vizinhos e, ao mesmo tempo, em assegurar o livre acesso dos navios de bandeira britânica aos rios Paraná e Paraguai. Foi esse país europeu o que mais capitalizou com o auge econômico paraguaio do pré-guerra: os projetos de infra-estrutura guarani foram atendidos por bens de capital ingleses e os especialistas estrangeiros que os implementaram eram, em sua maioria, britânicos (DORATIOTO, 2002, p.90).

O argumento neo-revisionista de que a Inglaterra não possuía interesse no

conflito, como queriam os revisionistas, é endossado na carta que o ministro inglês

Thornton (aput Doratiotto, 2002, p.90-91) escreveu ao chanceler José Berges, logo

após o rompimento das relações entre o Paraguai e o Império, vejamos:

Ao Exmo. Senhor Dom José Berges Reservada Bueno Aires, 7 de Dezembro de 1864. Meu prezado Senhor e Amigo,

Muito agradeço a comunicação dos documentos importantes anexos à sua Nota Oficial de 17 p. Não posso deixar de deplorar a necessidade de seu governo, segundo sua opinião, romper as relações de amizade com o Brasil. V.E. (Vossa Excelência) já conhece meu pensamento sobre esse assunto. Creio que o Brasil, a julgar pelos documentos que vi, tem justos motivos de queixa contra o governo oriental e tem direito de pedir satisfação pelas ofensas que seus súditos tiveram que agüentar. Também não tenho o menor motivo para suspeitar que o Governo do Brasil tenha a menor intenção de ameaçar a independência da República Oriental do Uruguai. Contudo, devo reconhecer que o governo paraguaio é o melhor juiz do que mais convém à sua pátria e não me é permitido dizer nada contra suas resoluções.

V.E. sabe que a Inglaterra também está em atritos com o Brasil, de modo que tanto por esse motivo, como pela falta de instruções de meu governo, não poderia fazer nada oficial com seu governo; mas particularmente sim, se puder servir, no mínimo que seja, para contribuir para a reconciliação dos dois países, espero que V.E. não hesite em me utilizar.

Me atrevo a lembrar a V.E. sua promessa de enviar-me alguma informação sobre

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a quantia total das contas da República (do Paraguai). Quando V.E. tenha um momento para dedicar-se a esse assunto, ficarei imensamente agradecido.

Ao mesmo tempo, suplico a V.E. que apresente meus respeitos ao Exmo. Senhor e que tenha a certeza de minha alta consideração, com o que tenho a honra de subscrever-me.

De V.E.

O atento servidor

E amigo

(??)

Edward Thornton (assinatura)

Ademais, no que tange a intervenção do Brasil na guerra civil na Republica

Oriental do Uruguai, em 1864, segundo Lopes (apud ALMEIDA, 2009, p.91) suscitou

uma série de questões conflituosas tanto do ponto de vista jurídico quanto político,

ainda que tenha sido no inicio uma ação diplomática para em seguida, tornar-se uma

ação militar.

A política externa brasileira com relação ao Uruguai e sua conexão com os

partidos políticos deste terá sua cota de participação nas definições do contexto

platino e contribuirá para a decisão belicosa de Solano Lopez (MENEZES, 1998).

Enfatizando a grande importância do Uruguai no quadro regional, Menezes

(1998) destaca que a decisão brasileira de interferir na política interna uruguaia,

favorecendo os Colorados e atendendo aos anseios da província do Rio Grande do

Sul, irá entrar em rota de colisão direta com os interesses paraguaios, tais quais

dantes definidos por Solano Lopez, por meio dos tantos tratados firmados entre os

plenipotenciários de ambos os países.

A união entre Lopez e os Blancos uruguaios previa uma maior aproximação

entre as duas nações e objetivava, além da promoção comercial, um tratado

defensivo e ofensivo entre os dois países (MENEZES, 1998).

Diante de todo esse cenário os vizinhos da bacia do Prata irão se confrontar

a fim de assegurar sua legitimidade política e jurídica (tendo em vista os tratados e

acordos), bem como a integridade de seus territórios e sua afirmação enquanto

nações soberanas na América do Sul.

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Assim temos, conforme preleciona Fernando Novais, que a fórmula da

Independência brasileira deixou-nos um legado da colonização sob forma de um

Império, que era uma garantia de continuidade. A idéia do Império, portanto, era

uma idéia de preservação territorial, até mais do que isso, era uma idéia

expansionista, que se apresentou, desde o inicio, nas intervenções Cisplatinas

(NOVAIS, 1995, p.81).

E por todo o exposto, sejam por injúrias, “razões justas” ou pretextos, como

afirma Almeida (2009, p.107), em 1865 irá ocorrer a maior e mais trágica guerra que

o continente sul-americano já viveu.

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4- A GUERRA DO PARAGUAI E OS RELATÓRIOS DO CORPO DIPLOMÁTICO BRASILEIRO

O conflito entre blancos e colorados no Uruguai fez com que o Império

brasileiro interviesse de forma enérgica no país oriental, acirrando ainda mais a crise

político-diplomática que o Brasil mantinha com o Paraguai.

O presente capítulo foi buscar, de forma breve, nos documentos que

compõem os Relatórios da Repartição dos Negócios Estrangeiros, o atual Ministério

das Relações Exteriores do Brasil, entre o período de 1864 e 1870, um esboço da

visão diplomática da Guerra do Paraguai, principalmente sobre os acontecimentos

que propiciaram o desencadear desta já no fim de 1864, além de mencionar alguns

pontos sobre o seu desenrolar e fim da mesma.

4.1 Meados de 1864, fim das relações diplomáticas no Prata, começo da

Grande Guerra

Segundo Rodrigues e Seitenfus (1995, p.194), a questão dos limites com o

Paraguai chegaria ao ponto crítico quando da crise brasileiro-uruguaia de 1864,

ainda mais quando Lopez ofereceu intermediação diplomática para guerra que se

processava na Cisplatina. Todavia, o Sr. Conselheiro Saraiva, ministro

plenipotenciário do Império em Montevidéu, rechaçou como desnecessária a

mediação paraguaia.

O governo desta Republica, logo que teve conhecimento da missão especial confiada ao Sr. Conselheiros Saraiva, dirigindo-se a este Sr., e directamente ao governo Imperial, offerecendo a sua mediação para a solução amigável de nossas pendências com Estado Oriental. Esta offerta foi feita depois que o governo oriental respondeu com uma reconvenção á nota com que o Sr. Conselheiro Saraiva iniciaria a sua missão, e quando elle com os ministros argentino e de S.M. Britannica tratavão de resolver pacificamente a guerra civil, que flagellava a Republica; havendo então fundada esperança de que medrasse este empenho, em cujo feliz resultado enxergava-se um dos meios mais romptos e mais efficazes de solver as difficuldades internacionaes com que a mesma Republica se achava a braços. Estas considerações motivarão a resposta que ao governo do Paraguay deu o Sr. Conselheiro Saraiva, e que o governo imperial confirmou, declarando não ser possível acolher, como aliás desejaria, a offerta de que se tracta (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.28, grifos nossos).

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Nessa esteira, contudo, não medrando êxito na conciliação com a República

Oriental, o diplomata Saraiva, em 4 de agosto de 1864, sob o comando do governo

Imperial, dava um ultimatum ao governo uruguaio.

Chegado a 4 de Agosto em Montevidéo, nesse mesmo dia o Sr. Conselheiro Saraiva, exigindo do governo da Republica as satisfações pedidas em sua nota de 18 de Maio, accrescentou que se, dentro do prazo improrogavel de seis dias, não fossem attendidos os reclamos do Imperio, e sendo certo que não podia este tolerar por mais tempo os vexames e perseguições, que soffrião seus concidadãos, nem deixar de prover à indeclinável necessidade de garanti-los por qualquer modo, estava auctorizado para declarar o seguinte: Que as forças do exercito brasileiro, estacionadas na fronteira, receberião ordem para proceder a represalias sempre que fossem violentados os súbditos de Sua Magestade, ou ameaçadas as suas vidas e segurança; incumbindo ao respectivo comandante providenciar pela fórma, uqe fosse mais conveniente e efficaz a bem da protecção de que elles carecessem; Que tambem o vice-almirante brasileiro receberia instrucções para proteger, com a força de esquerda ordens, os agentes consulares e os cidadãos brasileiros offendidos por quaesquer auctoridade ou indivíduos incitados a commetter desordens pela violência da imprensa ou intigações das mesmas auctoridades. Não sendo as represalias, a que se via forçado a recorrer o governo imperial, verdadeiros actos de guerra, esperava o mesmo governo que o da Republica evitaria que se auguentasse a gravidade daquellas medidas, impedindo successos lamentáveis, cuja responsabilidade exclusivamente sobre elle (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.13).

A partir desse ultimatum e sua rejeição pelo governo uruguaio, houve o

desencadear do confronto armado entre a República Oriental e o Império.

O Sr. Conselheiro Saraiva não o desconheceu; e, pois, no dia immediato comunicou ao governo oriental que, de conformidade com a sua nota do dia 4 de Agosto, e segundo as ordens do governo imperial, iaô ser expedidas instrucções ao vice-almirante brasileiro e ao comammandante dos corpos do exercito estacionados na fronteira para procederam a represalias e empregarem as medidas mais convenientes em ordem a tornar effectiva por si mesma a protecção a que tinham direito os súbditos brasileiros e que não podia assegurar-lhes o governo oriental (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.14).

Porém, o Império não só conflitaria com o governo uruguaio, mas com a

República paraguaia, como vemos no relatório dos diplomatas brasileiros:

Não sabia então o governo imperial, mas soube depois e oficialmente, pela nota que com data de 30 de Agosto do anno passado dirigido o ministro das relações exteriores do Paraguay ao representante do Estado Oriental alli residente, que a mediação que aliás fora pelo governo deste Estado solicitada, tinha sido tambem por elle próprio addiada declarando seu representante no Paraguay em 4 de julho que na confiança fundada e no interesse de restabelcer promplamente cordiaes relações com o Imperio do

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Brasil julgava cumprir um dever nâo fazendo uso, por ora, dessa importante mediação. Até aqui seguramente nenhuma razão plausível havia para suppôr que a Republica do Paraguay nutrisse resetimentos e intenções hostis contra o Império; pelo contrarío, o passo, que acabava de dar, fazia presumir que estava o seu governo animado de disposições pacificas e amigaveis para comnosco, revelando ainda melhor essas disposições no modo por que acolhèra o nosso agente diplomatico. A illusão, porém, durou pouco, porque, chegando á Assumpção a noticia do ultimatum apresentado ao governo de Montevidéo pelo Sr. Conselheiro Saraiva, apressou-se o ministro das relações exteriores daquella Republica a dirigir ao nosso ministro alli residente a significativa nota de 30 de Agosto (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.28).

Segundo Doratioto (2002, p.59), “o protesto da Chancelaria paraguaia,

apresentado à Legação do Brasil em Assunção, e o predomínio da influência dos

blancos radicais sobre o presidente Aguirre reduziram a margem para uma solução

diplomática para crise uruguaia”.

Assim, enquanto o governante argentino, bem como o brasileiro, estavam

convencidos de que essa crise somente terminaria com o próprio fim do governo de

Aguirre, para Solano López, por sua vez, “essa situação apresentava-se como a

oportunidade de o Paraguai impor-se como potência regional” (DORATIOTO, 2002,

p.59).

Eis a nota do governo paraguaio, pelo plenipotenciário José Berges, ao

Império, datada de 30 de agosto de 1864:

O abaixo assignado, ministro e secretario de estado das relações exteriores, teve ordem do Exmo. Sr, presidente da Republica para dirigir à V. Ex. esta communicação, com o fim que passa a expôr. [...] A moderação e previdencia que caracterisão a politica do governo imperial, autorisarão ao do Paraguay a esperar uma solução diversa ás suas reclamações com o governo oriental, e esta confiança era tanto mais fundada quanto S. Ex. o Sr. Conselheiro Saraiva, e até o próprio governo imperial, ao declinar a mediação offerecida por este governo a pedido do governo oriental, para o ajuste amigavel dessa mosmas reclamações, declarárão-na sem obejto pelo curso amigavel que ião tendo as mencionada reclamações. O governo do abaixo assignado respeita os direitos que são inherentes á todos os governos para o ajuste de suas difficuldades ou reclamações, uma vez negada a satisfação e justiça, sem prescindir do direito de apreciar por si o midi de effetua-lo, ou o alcance que póde ter sobre os destinos de todos os que têm interesses legítimos nos seus resultados. A exigencia feita ao governo oriental por S. Ex. o Sr. Conselheiro Saraiva, em suas notas e 4 e 10 deste mez, é de satisfazer ás suas reclamações dentro do improrogavel prazo de seis dias, sob a ameaça de no caso contrario usar de represalias, com forças imperiaes de mar e terra, reunidas de antemão sobre as fronteiras da Republica Oriental, e de augmentar a gravidade das medidas da attitude assumida, o que significa uma occupação próxima de alguma parte daquelle território,

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quando o seu governo não se nega a attender e a satisfazer ás reclamações apresentadas, como consta da nota de S. Ex. o Sr. Ministro de relações exteriores de 9 do presente mez. Este é um dos casos em que o governo do abaixo assignado não pôde prescindir do direito que lhe assiste, de apreciar este modo de effetituar as satisfações das reclamações do governo de V. Ex., porque o seu alcance póde vir a execer consequencias sobre os interesses legítimos que a Republica do Paraguay possa ter em seus resultados. Penosa foi a impressão que deixou no animo do governo do abaixo assignado a alternativa do ultimatum consignado nas notas de S.Ex. o Sr. Conselheiro Saraiva, de 4 e 10 do corrente ao governo oriental, exigindo delle um impossivel pelo obstaculo que oppõe á situação interna daquella Republica e para cuja remoção não em sido bastantes, nem o prestigio de SS. EEx os Srs. Thornton, Elizalde e Saraiva, nem o concurso e abnegação do governo oriental. [...] O governo da Republica do Paraguay deplora profundamente que o de V. Ex haja julgado do opportuno afastar-se nesta occasião da politica de moderação em que devia coniar agora mais do que nunca, depois da sua adhesão ás ostipulações do Congresso de Paris, não pode, porém, ver com indifferença, e menos consentir que em execução da alternativa do ultimatum imperial, as forças brasileiras, quer sejão navaes quer terrestres, occupem parte do território da Republica Oriental do Uruguay, nem temporaria nem permanentemente, e S. Ex. o Sr, presidente da Republica ordenou ao abaixo assignado que declare á V. Ex., como representante de S. M. o Imperador do Brasil: que o governo da Republica do Paraguay, considerará qualquer occupação do território oriental por forças imperiais, pelos motivos consignados no ultimatum de 4 do corrente, intimado ao governo oriental pelo ministro plenipotenciário do Imperador, em missão especial junto daquelle governo, como attentatoria do equilíbrio dos Estados do Prata, que interessa á Republica do Paraguay como garantia de sua segurança , paz e prosperidade, e que protesta da maneira a mais solemne contra tal acto, desonerando-se deste já de toda responsabilidade pelas consequencias da presente declaração (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, Anexo 1, p.172-173, grifos nossos).

A ameaça implícita no protesto paraguaio de 30 de agosto, segundo

Doratioto (2002, p.60), não foi levada a sério, quer pelo governo brasileiro, quer pelo

argentino. No Rio de Janeiro não se acreditava sequer que o Paraguai estivesse

disposto a romper com o Império em decorrência do ultimatum dado a Montevidéu.

Segundo o plenipotenciário argentino, Rufino de Elizalde (apud DORATIOTO, 2002,

p.60), “o Paraguai não faz, não fará, nem pode fazer nada”. Vejamos o que consta

dos relatórios diplomáticos:

Como vereis, [...], o governo da Republica do Paraguay erigia-se em arbitro supremo entre o governo imperial e a Republica Oriental, pretendendo, por uma intimação ameaçadora, coaretar ao Brasil, sob o pretexto de perigo para a independência daquelia Republica, uma parte de seus direitos de soberania no conflicto em que se achava com o seu governo, ao qual aliás era inteiramente estranho o do Paraguay.

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O nosso ministro, julgando-se com razão dispensado de explicar ao governo do Paraguay as causas, que havião compellido o do Imperio a usar de represalias contra o da Republica do Uruguay, por se acharem já essas causas claramente expostas e desenvolvidas em documento officiaes e solemnes, de que tinha aquelle governo perfeito conhecimento, limitou-se a responder: Que nenhuma apprehensão fundada podia existir de que pretendesse o Imperio attentar contra a independencia e integridade do Estado Oriental; Que enviando uma missão especial á Montevidéo para o fim de ajustar as reclamações pendentes, dera o governo imperial um novo testemunho de moderação, e do desejo de ver amigavelmente resolvidas as mesmas reclamações; Que esta sua moderação não fora bem comprehendida, resistindo systematicamente o governo da Republica aos meios de solver pacificamente a questão. A estas declarações, tão justas e tão moderadas, estava o governo imperial longe de esperar que respondesse o governo da Republica como o fez, em nota de 3 de Setembro ao nosso ministro, ratificando o seu protesto e annunciando que o faria effectivo, se se realizassem as apprehensões de que estava possuído (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.29, grifos nossos).

Conforme Doratioto (2002, p.60), havia, de fato, informações que levaram o

Império e a Argentina a robustecerem a convicção de que o Paraguai não faria

qualquer intervenção militar na questão uruguaia. Isto é, continua Doratioto, os

relatórios dos agentes diplomáticos brasileiros em Assunção minimizaram a

capacidade militar paraguaia e as intenções agressivas de Solano López.

De acordo com os relatórios, a resposta dada à manifestação paraguaia de

30 de agosto de 1864 pelo ministro Saraiva absteve o governo Imperial de esperar

que respondesse o governo do Paraguai como o fez, em nota de 3 de setembro ao

ministro, ratificando o seu protesto e anunciando que o efetivaria, se fossem

realizadas as pretensões brasileira do ultimatum.

O Império já preocupado com os veementes protestos paraguaios acerca da

crise no Uruguai, resolveu tomar algumas providências com relação a província de

Mato-Grosso, confiando a execução delas ao coronel Frederico Carneiro Campos.

A 25 de Outubro chegára á Assumpção a noticia da entrada da vanguarda do nosso exercito no território oriental, e da occupação da Villa de Mello pelo general Flores. No dia 11 de Novembro o vapor brasileiro Marquez de Olinda, da companhia, que faz navegação do Alto Paraguay, tocou em Assumpção, levando a seu bordo, além de outros passageiros, o novo presidente nomeado para a província de Matto-Grosso. O vapor, a cujo bordo não havia tropa nem armamento, ia, como de costume,proseguir tranquillo em sua viagem, ao abrigo dos ajustes solemnes, que lhe garantião o livre transito, e do estado de paz em que se achava a Republica com o Imperio, quando a poucas léguas aquém

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da Villa da Conceição foi abordado, conduzindo ao porto donde sahira, e alli detido com os passageiros e a sua tripolação sob as baterias do vapor de guerra paraguayo Taquary! (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.30, grifos nossos).

O conflito que perduraria por anos entre os vizinhos da Bacia do Prata,

segundo alguns autores como Leslie Bethell (1995) e Guedes (1995), iniciar-se-ia

com a patente hostilidade com a qual o Paraguai teria apreendido o navio do Império

do Brasil.

Apenas, constou a legação imperial tão insolito acontecimento, em nota datada do dia 13 exigio ella do governo da Republica as devidas explicações, quando foi surprehendida pela nota do mesmo governo do dia 12, na qual, calando-se completamente aquelle estranho facto, e só alludindo-se á entrada do nosso exercito no território do Estado Oriental, reputava-se como violada a integridade territorial deste e declaravão-se interrompidas as relações com o Imperio, e impedida a navegação de suas águas, tanto para a bandeira de guerra como para a mercante do Brasil. E o protesto de 30 de Agosto foi allegado como prévia e solemne declaração de guerra para justificar o inqualificavel abuso de boa fé com que ia aquelle governo iniciar as suas hostilidades (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.30, grifos nossos).

Em nota ao governo paraguaio, datada de 14 de novembro de 1864, o então

plenipotenciário Cézar Sauvan Viana de Lima expõe ao ministro paraguaio José

Berges:

Sr. Ministro – Hontem á noite chegou ás minhas mãos a nota de V. Ex. datada do dia anterior communicando-me que recebêra ordem o Exmo. Sr. Presidente da Republica para me notificar, em conseqüência de não ter sido attendido pelo meu governo o proesto constido na nota de V. Ex. de 30 de agosto ultimo contra a entrada de forças imperiaes no Estado Priental ficavão interrompidas as relações entre os dous governos e impedida a navegação nasaguas desta Republica para a bandeira de guerra e mercante do Imperio, sob qualquer pretexto ou denominação que seja. É sem duvida devido a esta grave resolução do governo de que V. Ex. faz parte o acto de violência commettido sobre o paqueto brasileiro Marquez de Olinda, que se dirigia a Corumbá levando á seu bordo o Sr. Presidente novamente nomeao para a província de Matto-Grosso; acto acerca do qual apressei-me hontem mesmo a pedir a V. ex explicações, que até entes momento ainda não recebi, continuando o o comanddante, passageiros e tripolação do paquete a permanecerem detidos e incommunicaveis com a terra. Em presença de um semelhante estado de cousas prescindo de discutir as considerações de que V. Ex acompanhou a sua comunicação, e limito-me a protestar do modo o mais solemne em nome o governo de S.M. o Imperador do Brasil contra o acto de hostilidades praticado em plena paz contra o referido paquete Marquez de Olinda, em violação do que foi convencionado entre os dous paizes a respeito do transito fluvial; e desejo já resalvo os direitos da companhia de – Navegação de Alto Paraguay – pelas percas e damnos que lhe possa occasionar a interrução que o dito paquete soffre e vier a soffrer nas suas viagens em conseqüência da decisão tomada pelo governo da Republica.

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Tendo, portanto, de retirar-me qquanto antes desta capital peço a V. Ex. que se sirva mandar os passaportes para mim, minha família, o secretario da legação e comitiva, afim de podemos seguir viagem no paquete Marquez e Olinda (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, Anexo 1, p.181, grifos nossos)

Em resposta á nota do ministro Viana de Lima, Berges envia os passaportes

conforme o solicitado: “Incluso tenho a honra de remetter á V. Ex. o passaporte que

pede, para retirar-se quanto antes desta capital com sua família, secretario de

legação e comitiva” (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS

ESTRANGEIROS, 1864, Anexo 1, p.181).

No entanto, ao passo que foram enviados, no dia 15 de novembro, os

passaportes pedidos, obstava o governo paraguaio a retirada do agente diplomático

brasileiro, proibindo a todos os navios mercantes a saída do porto de Assunção.

Segundo Doratioto (2002), somente com a intervenção do ministro residente

norte-americano, Charles Ames Washburn, conseguiu-se que Solano López

facilitasse a saída do representante brasileiro e sua família e de outros membros da

Legação brasileira, transportando-os no navio de guerra paraguaio Paraná até

Buenos Aires, onde chegou após uma semana de viagem.

Pretendia o nosso ministro fazer viagem para Buenos-Ayres no paquete Marquez de Olinda; mas, este único meio de transporte lhe foi recusado! A retirada, pois daquelle agente diplomático, cujas immunidades forão tão grosseiramente desconhecidas pelo governo Paraguay só pôde realizar no dia 29 por intervenção do Sr. Wasburn, ministro dos Estados-Unidos, a bordo de um vapor paraguayo,mas ainda sob a garantia, que se exigio do mesmo ministro, de não ser o dicto vapor molestado em sua viagem de ida e volta (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1864, p.31).

Desta feita, sobre a alegação da necessidade de manter o equilíbrio das

Repúblicas do Prata, ao Paraguai era imperioso protestar contra qualquer invasão

de forças brasileiras no território do Estado Oriental, ato que considerou como

atentatório a independência e integridade do mesmo.

O governo de Aguirre, por sua vez, embalado com a idéia de que essa

declaração, traduzida em fato, importaria um auxilio eficaz contra o Império,

obstinou-se em suas recusas as reclamações do governo brasileiro sobre a proteção

e segurança de seus súditos. Distanciava-se assim a resolução “pacifica e

amigável”, pela qual pugnava o Império, das dificuldades internas do Uruguai, que

complicava, se não era causa essencial, os já existentes embaraços internacionais

que assoberbavam a Bacia do Prata naquele período.

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Restava, então, deflagrar a Grande Guerra na Bacia do Prata, na qual após

a pacificação do conflito no Uruguai, uniu-se em Tríplice Aliança Argentina, Brasil e

Uruguai contra o Paraguai.

4.2 O desenrolar da Guerra: Três contra Um

Em março de 1865, o liberal progressista Francisco Octaviano de Almeida

Rosa substituiu o ministro Paranhos, demitido da missão especial ao Prata. O

ministro havia recebido instruções de colaborar para fortalecer o governo de

Venâncio Flores, de verificar o valor dos prejuízos causados a brasileiros pela

Guerra Civil uruguaia, quais recursos o Estado Oriental tinha disponíveis, e mais,

como este poderia cooperar com o Brasil na guerra contra o Paraguai (DORATIOTO,

2002).

Almeida Rosa deveria, em relação a Argentina, conseguir que esse governo

não criasse obstáculos11 à ação do Império contra o Paraguai, posto que os ataques

de Solano López ao Brasil eram justificativas, por si só, para que esse aceitasse o

empreendimento da guerra que aquele ensejou.

Ressalva-se ainda que a cooperação entre o Império e a Argentina, quanto à

situação do Uruguai, existia desde o encontro do plenipotenciário Elizalde com

Saraiva no ano de 1864, em Puntas Del Rosario (DORATIOTO, 2002).

No entanto, o Tratado da Tríplice Aliança só foi acordado após a agressão

paraguaia à Corrientes. Portanto, foram os ataques paraguaios a Mato Grosso e

Corrientes que viabilizaram a formalização da aliança argentino-brasileira, à qual,

também, aderiu o Uruguai governado por Venâncio Flores.

Satisfeito do procedimento que adoptára para com o Brasil, animando-se em plena paz a capturar o vapor Marquez de Olinda e invadindo à mão armada a remota e indefesa província de Mato-Grosso, entendeu o marechal Lopez que poderia levar a impunidade de sua ambiciosa politica ao extremo de provocar por actos semelhantes mais uma nação visinha, que nenhum motivo de queixa lhe havia dado e que não mostrava intenção de ultrapassar os limites da neutralidade que adoptára. Uma esquadrilha paraguaya, composta de cinco vapores, capturou em abril do anno próximo passado no porto de Corrientes a dois vapores argentinos, o Vinte e cinco de Maio e o Gualeguay, que alli se achavão desapercebidos;

11

Cabe lembrar, que o conflito de fronteiras não era algo exclusivo do Brasil com o Uruguai ou com Paraguai. Várias foram as discussões entre Argentina e o Império sobre a navegação na Bacia do Prata. E a Guerra do Paraguai, com o Tratado da Tríplice Aliança, ratificaria claramente a patente disputa pelos territórios do Prata, tão importantes economicamente para esses países latino-americanos.

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e, pouco depois, forão a própria cidade e província d’aquelle nome invadidas por numeroso exercito. Estes actos de inopinada hostilidade arrancárão o governo Argentino da posição neutral em que se havia collocado, forçando-o a aceitar a guerra que lhe era declarada. [...] A aliança da Republica Oriental do Uruguay estava garantida ao Imperio desde o mez de janeiro do anno próximo passado pela palavra leal do seu governador provisório o Sr. general D.Venâncio Flores. A da Républica Argentina encontrava o Obstaculo da sua neutralidade respeitada pelo governo Imperial com a mesma sinceridade, com que sempre reclamou e exerceu igual direito de abstenção nas questões dos paizes limitrophes. Esse obstáculo foi removido pela inesperada provocação do governo do Paraguay. Igualmente feridos em seus brios e interesses, não podião os tres governos deixar de igualar-se na defesa d’elles. A alliança, pois, determinada pelos actos do presidente Lopez, foi, no 1º de maio, estipulada em tratado solemne, que recebeu o seu complemento em um protocollo e em duas reversaes da mesma data e que foi sem demora approvado e ratificado pelas tres partes contractantes (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1865, p.5-6).

Formada, então estava a aliança dos três - Brasil, Argentina e Uruguai -

contra um - o Paraguai. Para Doratioto (2002, p. 157), essa aliança contra o

Paraguai era parte de uma aliança maior, planejada por Mitre antes desses ataques,

pela qual Argentina e Brasil estabeleceriam uma política de cooperação no Prata,

exercendo uma hegemonia compartilhada em substituição às rivalidades e disputas

que predominaram nas relações entre os dois países.

Desta feita, em 1° de maio de 1865, foi assinado pelos plenipotenciários

Elizalde (Argentina), Almeida Rosa (Brasil) e Carlos de Castro (Uruguai), em Buenos

Aires, o Tratado da Tríplice Aliança, contra Solano López, que estabelecia as

condições da paz e também deveria servir de base para que, segundo Cerqueira

(apud DORATIOTO, p.157) “façamos [Argentina e Brasil] uma aliança perpétua,

baseada na justiça e na razão, que será abençoada por nossos filhos”.

O texto do tratado era secreto e estabelecia, segundo Doratioto (2002) além

da aliança militar, os pré-requisitos para o estabelecimento da paz e não menos

importante – a prévia determinação das fronteiras entre os países guarani e os

vizinhos Argentina e Brasil.

A aliança desses países ensejou gastos exorbitantes para a guerra, os quais

o Tesouro brasileiro patrocinava por meio de empréstimos aos aliados – Uruguai

com 200 mil libras esterlinas e Argentina com 400 mil libras esterlinas (DORATIOTO,

2002, p.158). Esgotados os recursos, os aliados republicanos foram financiados por

empréstimos do Barão de Mauá e dos banqueiros ingleses.

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Para Solano López, afirma Doratioto, a Tríplice Aliança era uma catástrofe.

Restava-lhe, como opção mais segura, recuar suas tropas de volta ao território paraguaio e negociar a paz em inferioridade, mas em forte posição defensiva, atrás da poderosa fortaleza de Humaitá. Essa alternativa, porém, não o resguardaria de ser obrigado a fazer concessões. Outra possibilidade, mais arriscada, seria usar os recursos acumulados com fins defensivos para desencadear uma operação bélica, de grande envergadura, contra os aliados. Esta, se bem-sucedida, provocaria grande impacto psicológico no inimigo, criando melhores condições para o governo paraguaio negociar a Paz (DORATIOTO, 2002, p.159-160).

E não somente o Paraguai via como péssima a aliança que se formara entre

os vizinhos, o próprio Conselho de Estado do Império, não via com bons olhos a

Tríplice Aliança:

A notícia da assinatura do Tratado da Tríplice Aliança foi recebida friamente no Rio de Janeiro. Era crença generalizada de que, para vencer o Paraguai, seria preciso apenas que Buenos Aires não opusesse obstáculo à ação das forças brasileiras, sendo desnecessária uma aliança entre o Império e a Argentina. O representante argentino no Brasil, José Mámol, relatou que o governo imperial recebeu a aliança como necessária, mas sem entusiasmo, e via como um golpe de fortuna, sem conseguir dissimular o ocorrido. Isso decorreria, segundo esse diplomata, de que na aliança seria inevitável uma comparação entre o “poder viril e democrático” de uma República, a Argentina, com o poder “oficial e gasto” de um Império, o Brasil. Acreditava Mármol que os governantes brasileiros temiam essa comparação e as combinações de interesses políticos que, terminada a guerra, poderiam surgir entre argentinos, paraguaios e uruguaios, povos de mesma origem e língua (DORATIOTO, 2002, p.162, grifos nossos).

O ministro argentino Elizalde, vendo os embaraços internos que a aliança

criava no Império, escreveu a José Antonio Saraiva, a essa altura ministro dos

Negócios Estrangeiros, dizendo não compreender que, no Rio de Janeiro, houvesse

quem não entendesse as vantagens que a aliança trazia ao Império.

A Tríplice Aliança, argumentou Elizalde, encurtaria a duração da guerra,

poupando o Império de dificuldades, ao permitir o uso de território argentino para as

ações bélicas contra Solano López, e tornaria desnecessário novas mobilizações

militares no Brasil, em virtude do reforço obtido com a entrada no conflito dos

Exércitos da Argentina e do Uruguai (DORATIOTO, 2002).

Desta feita, convencido da brevidade da guerra, a Argentina apresentou a

Chancelaria brasileira, ainda em 1865, por meio de seu representante no Rio de

Janeiro, um projeto de paz.

O texto foi encaminhado por dom Pedro, juntamente com o Tratado da Tríplice Aliança, as notas “reversais” e o protocolo, assinados em 1º de maio, à Seção dos Negócios Estrangeiros do Conselho de Estado, para que emitisse um parecer. O documento da aliança, assinado por Almeida

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Rosa, fora aprovado pelo gabinete liberal presidido pelo marquês de Olinda, mas acabou por ser duramente criticado pela oposição conservadora. Assim, a resposta da Seção dos Negócios Estrangeiros foi, graças aos votos dos conselheiros conservadores, uma crítica à proposta argentina de paz e ao próprio Tratado da Tríplice Aliança. O parecer da Seção dos Negócios Estrangeiros classificou as estipulações do Tratado de 1º de maio, referentes ao Charco, como contrárias à política tradicional do Império, que fora concebida no sentindo de manter não só as independência do Paraguai, como também sua soberania sobre a parte do território necessária para separar a fronteira de Mato Grosso do contato direto com o território Argentino. Segundo o parecer, pelo fato de o tratado de aliança reconhecer como argentina também a área de Misiones, a independência paraguaia estava ameaçada, pois o pais guarani sofreria um “abraço apertado” a Argentina, com a qual seria fronteiriço a leste e a oeste, além de já o ser ao sul. Como o Tratado da Tríplice Aliança garantia a independência paraguaia pelo prazo de cinco anos no pós-guerra e não perpetuamente, as suspeitas dos conselheiros aumentavam. Perguntava-se, no referido parecer, se esse período não corresponderia, na verdade, ao prazo necessário para que Buenos Aires preparasse a incorporação do Paraguai. Ademais, apontavam-se como ausências suspeitas no projeto argentino o fato de não se propor a garantia dos aliados ao novo governo que substituísse o de Solano Lopez e a omissão em confirmar seu afastamento do Paraguai (DORATIOTO, 2002, p.162-163, grifos nossos).

Tais desconfianças, como podemos ver, não foram infundadas, pois as

estipulações do Tratado da Tríplice Aliança foram cumpridas, reduzindo

consideravelmente o território paraguaio no fim da Guerra.

A seguir achou-se por bem, para não tornar extensa a descrição dos

acontecimentos da guerra, uma cronologia do conflito, a partir da assinatura do

Tratado da Tríplice Aliança, extraída do texto Cronologia da Guerra, de Leslie Bethel

(1995, p. 14-18), vejamos:

1865

1° de maio – é firmado o tratado da Trípice Alianç (Argentina, Uruguai, Brasil) contra

o Paraguai. Os objetivos da guerra são: fim da ditadura de Lopés; livre navegação

do sistema fluvial; anexação do território reivindicado pelo Brasil, no nordeste do

Paraguai, e pela Argentina, no leste e oeste do Paraguai (cláusula secreta).

Maio-junho - O exército paraguaio, sob o comando do coronel Antonio de La Cruz

Estigarribia, cruza Missões e invade São Borja, no Rio Grande do Sul.

11 de junho – Batalha de Riachuelo: a marinha paraguaia ataca a marinha

brasileira, mas é vencida e destruída.

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- O Paraguai é bloqueado, mas o avanço aliado ao longo do Rio Paraguai é detido

pela artilharia da linha de Curupaiti e principalmente pela Fortaleza fluvial de

Humaitá.

5 de agosto – Tropas paraguaias tomam Uruguaiana.

Agosto – Bartolomé Mitre torna-se comandante das forças aliadas.

14 de setembro – Estigarribia rende-se a D. Pedro II, Mitre e Flores, em

Uruguaiana.

Setembro – Empréstimo de 7 milhões de libras ao Brasil, feito pelo Banco de

Rothschild.

Setembro- Novembro – O exército paraguaio recua, através do Paraná, retirando-se

de todo território aliado, exceto do Mato Grosso, para defender a fronteira sul.

1866

16 de abril – As forças aliadas cruzam o alto do Rio Paraná e dão início à invasão

do Paraguai, estabelecendo-se em Tuiuti.

24 de maio – Batalha de Tuiuti, primeiro grande teste de força. Luta feroz, na qual o

Paraguai fracassa na tentativa de desalojar os aliados. (Não há qualquer avanço

aliado até setembro.)

3 de agosto – Zacarias volta ao poder como chefe do novo gabinete liberal do

Brasil.

3 de setembro – Vitória aliada em curuzu.

12 de setembro – Encontro entre Miltre e López, em Yatayti-Corá, fracassa na

tentativa de acabar com a Guerra.

22 de setembro – Batalha de Curupaiti. Impedindo o avanço aliado. Pior derrota da

Guerra. (Nenhum avanço até julho de 1867.)

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Outubro – O marechal Luís alves de Lima e Silva, então marquês de Caxias, é

nomeado comandante-em-chefe das forças brasileiras terrestes e navais.

Novembro – Levante Montonero contra Miltre e Guerra, em Cuyo, província da

Argentina, comandado por Felipe Varela.

1867

Maio-junho – Retirada da Laguna pela força expedicionária brasileira, no Mato

Grosso.

22 de julho – As forças aliadas, sob o comando temporário de Caxias, iniciam o

Movimento de cerco a Humaitá.

2 de agosto – Ocupação aliada da posição norte de Humaitá.

18 de agosto – Navios de guerra Brasileiros, sob o comando do Almirante Joaquim

José Inácio, investem contra as baterias de curupaiti.

3 de Novembro – Segunda Batalha de Tuiuti. As forças paraguaias atacam, mas

fracassam na tentativa de deter o movimento do cerco de Humaitá.

1868

13 de janeiro – Mitre transmite a Caxias o comando do exército da Tríplice Aliança e

regressa a Buenos Aires.

18 de fevereiro – Rebelião no Uruguai, liderada pelo ex-presidente Berro. Flores é

assassinado. Mais tarde, no mesmo dia, Berro é capturado, preso e assassinado.

22 de fevereiro – A marinha brasileira aporta em Assunção.

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12 de junho – Eleições na Argentina. O chanceler Rufino Elizalde, herdeiro político

de Mitre, vence Domingo Faustino Sarmiento, que defendia uma plataforma política

contra a Guerra.

16 de julho – No Brasil, gabinete conservador do visconde de itaboraí.

22 de julho – Humaitá é evacuada.

5 de agosto – Ocupação de Humaitá pelos aliados.

Dezembro – Uma série de ataques aliados às posições paraguaias (campanha de

Dezembrada).

- Batalha de Itororó e Avaí.

27 de dezembro – Batalha de Lomas Valentinas, na qual o exército paraguaio é

finalmente aniquilado.

- Lopés foge para a cordilheira a leste de Assunção.

30 de dezembro – O coronel George Thompson rende-se na última fortificação

fluvial paraguaia, em Angostura.

1869

1° a 5 de janeiro – Ocupação de Assunção pelas tropas brasileiras. A Guerra é

considerada finda. (Caxias ataca o teatro das operações de Guerra.)

Janeiro-agosto – López forma novo exército paraguaio e dá início às operações de

guerrilha.

Fevereiro – Missão de José Maria da Silva Paranhos (futuro visconde do Rio

Branco), em Buenos Aires e Assunção, para discutir a formação de um governo

provisório paraguaio.

15 de abril – O Conde d’Eu chega como novo comandante-em-chefe das forças

aliadas.

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11 de junho – Estabelecido o governo provisório em Assunção.

12 de agosto – Assalto das forças aliadas, que tomam Peribebuí, capital provisória

do Paraguai.

16 de agosto – Batalha de Campo Grande ou Acosta Ñu. As tropas paraguaias são

massacradas. Última grande batalha da guerra. Lópes escapa mais uma vez e

recua para o norte.

Setembro de 1869-março de 1870 – Lópes é perseguido pelas forças aliadas.

1870

1° de março – Lópes é encurralado e morto em Cerro Corá, no extremo nordeste do

Paraguai. Última resistência.

Em suma, durante os anos nos quais se sucederam a Guerra, não

visualizamos, em nosso breve estudo, qualquer indicativa de que a o confronto

viesse a ser breve, apesar do Império assim o considerar:

Os successos, que se tem seguido aos grandiosos feitos que, no dia 19 de Fervereiro do corrente anno, realizaram a esquadra imperial e os exercitos alliados, forçando uma divisão de encouraçados daquella o famoso passo de – Humaytá – e tornando estes de assalto o importante redueto denominado – Estabelecimento -, a que se seguio a occupação de – Carupaity – e de – Passo Pocú -, aproximaram a época da queda do marechal Lopez. Bem fundada é, pois, a grata esperança que me anima de ver em breve vingadas a honra e a dignidade do Imperio, aleivosamente ultrajadas pelo dictador do Paraguay, e conseguidas as garantias indispensáveis para a segurança e tranqüilidade futuras do Brazil e das Republicas suas alliadas (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1867, p.2, grifos nossos).

Tentativas européias e norte-americanas pugnavam por mediar e findar

a Guerra em 1867 como podemos observar abaixo:

O Sr. Gould, secretario da legação britannica na Republica Argentina, tendo ido ao Paraguay á bordo da canhoneira Doterel, em Agosto do anno próximo passado, com consentimento dos alliados, afim de dar

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protecção a subditos da sua nação, detidos naquella Republica, fez uma tentativa officiosa para o restabelecimento da paz. O Sr. Marquez de Caxias, a quem aquelle senhor, depois de entender-se com o governo paraguayo, entregou as bases de negociação, que se acham annexas a este relatório, não podia aceita-las e de feito as não aceitou. Deu conta ao governo de Sua Magestade. Pouco depois disso, e ainda antes de achar-se o Sr. Gould de volta ao seu posto de Buenos-Ayres, appareceu nos diários do Rio da Prata uma nota a elle dirigida peo Sr. Camiños, ministro do presidente Lopez. Nessa nota attribuia-se ao Sr. Gould o facto de haver declarado que sobre a maleria das referidas bases >> lhe haviam préviamente fallado o ministro brasileiro em Buenos-Ayres, e o presidente Mitre e o Marquez de Caxias no campo alliado. >> O Sr. conselheiro Thomaz Fortunato de Britto, que então estava acreditado em missão especial no Rio da Prata, logo que teve conhecimento daquella nota, apressou-se a provocar uma explicação. Resultou deste passo uma declaração franca e leal, que deixou patente a falsidade com que o ministro de Lopez attribuio aos alliados a iniciativa da proposta. Em carta de 16 de Outubro disse o Sr. Gould, nos termos mais positivos, que nenuma intelligencia prévia tinha havido entre elle e o Sr. conselheiro, ou qualquer dos generaes alliados. [...] O governo dos Estados- Unidos da America, por intermédio do seu representante nesta corte, offereceu novamente, em data de 27 de janeiro do corrente anno, os seus bons officios, renovando as propostas de mediação, que apresentára anteriormente para a terminação de guerra com o Paraguay. [...] O governo imperial não podia deixar de receber este novo testemunho da amizade e benevolência do governo imperial tinha de ouvir os seus alliados, como já feito por occasião do primeiro offerecimento, antes de tornar uma resolução definitiva em assumpto tão importante e que tanto interessava á alliança. Accordes os aliados em que continuavam a subsistir os mesmos motivos, que haviam impedido em 1867 a citação do primitivo offerecimento do governo dos Estados – Unidos; e, além disso, estando próxima a terminação da guerra, como fazem esperar o facto importante da passagem de – Humaytá – e os sucessos que se tem seguido, respondi, em 8 de Abril próximo findo, ao ministro americano – que o governo imperial agradecia, mas não podia aceitar o generoso offerecimento de dos Estados-Unidos (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1867, p.3-4, grifos nossos).

No entanto, as possíveis intermediações foram rejeitadas pelos aliados, e

guerra continuava cada vez mais atroz e com enorme baixa de vidas entre os

envolvidos, principalmente no Paraguai, visto que a guerra se dava em território

guarani. Temerosos pelas proporções que a guerra ganhara, uma pequena parcela

dos paraguaios enviaram nota a chancelaria brasileira, em apoio aos aliados:

Os paraguayos, que se achavam em Assumpção no dia 30 de Janeiro, dirigiram nessa data aos governos alliados uma petição, solicitando a creação de um governo provisório, eleito d’entre elle; e declarando que esse governo poderá apresentar um corpo de voluntários que coopere contra Lopez.

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Esta manifestação é importante pela sua espontaneidade e pelo grande numero de paraguayos que a assignam, e mostra que estes não só reconhecem o damno que seu paiz tem feito e póde fazer Lopez, mas também depositam inteira confiança nos alliados (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1868, p.3-4).

Enfim, a Guerra tinha seus dias contados, conseguira o Império e seus

Aliados a instalação de um governo provisório no Paraguai. Todavia, ainda que a

Guerra propriamente dita findasse, Solano López se reorganizou em um exército de

guerrilha para empreender novas batalhas contra os aliados. A sorte do ditador fora

determinada no Cerro Corá, quando foi encurralado e morto em 1870.

Finaliza-se, pois, este capítulo com o seguinte relato da diplomacia

brasileira, que desde o inicio do confronto já assinalava que nos pólos da Guerra

empreendida figuravam a “civilização” dos aliados versus a “barbárie” do governo

paraguaio:

Está concluída a guerra do Paraguay. As armas alliadas conseguira seu ultimo triumpho em Cerro-Corá. Cada Victoria da alliança foi nos últimos tempos um triumpho moral, que levava ao conhecimento das nações civilizadas as provas da índole feroz do tyrano, que a ignorância de alguns homens e a parcialidade de outros tanto exaltaram como o defensor de uma causa justa, como o defensor da liberdade e da civilização. Não são os alliados, são os infelizes Paraguayos e estrangeiros libertados que revelam as atrocidades commetidas por Lopez. Assim, a longa duração da guerra, si acarretou grandes sacrifícios, produzio por outro lado um resultado de immenso alcance. Hoje ninguem desconhece que os alliados, e somente elles, derramavam seu sangue por uma causa justa, cujo triumpho, em ultima analyse, era tambem o da liberdade e da civilisação. Factos recentes, entre elles o estabelecimento do governo provisório, tem mostrado que a alliança não podia ter, e não tinha, os fins que tão infundadamente lhe eram attribuidos. Os actos subsequantes hão de confirmar esta verdade e então se reconhecerá que os aliados não modificaram sua política segundo as circumstancias, mas seguiram sempre o pensamento primitivo, e que a sua acção diplomática é extreme de todo sentimento, que não seja o da maior sypathia e da mais sincera amizade para com o infeliz povo paraguayo (RELATÓRIO DA REPARTIÇÃO DOS

NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, 1869, p.2-3).

O que a historiografia nos conta, entretanto, diferente do relato acima, é que

ao Paraguai não foram respeitadas as fronteiras, e os aliados repartiram entre si

territórios importantes e significativos da nação guarani, reduzindo e muito seus

limites territoriais, além de imputar ao mesmo indenizações absurdas pelo conflito

armado que durou 5 anos (DORATIOTO, 2002).

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5- CONSIDERAÇÕES FINAIS

A guerra, certamente, representa sempre a falência da diplomacia. E a

Guerra do Paraguai não foi diferente.

A Guerra do Paraguai foi o conflito mais longo e sanguinolento vivido pelos

países latino-americanos no século XIX. A tragédia foi tal, que se estimou que mais

da metade da população masculina paraguaia teria sido dizimada nesse conflito, a

contar as baixas dos outros envolvidos.

As discussões das correntes historiográficas sobre esse confronto armado -

que envolveu de um lado a Tríplice Aliança, formada por Brasil, Argentina e Uruguai,

e do outro, o Paraguai - muito traduz as diferentes visões que se processaram e

formaram-se ao longo do tempo sobre as motivações, causas, responsabilidades e

conseqüências do conflito.

É pacifico na historiografia, independente da corrente historiográfica, que foi

o Paraguai quem deflagrou a guerra quando da apreensão do navio brasileiro

Marquês de Olinda, bem como a invasão dos territórios argentinos e brasileiros. Os

motivos para tal hostilidades guaranis encontravam-se na intervenção do Império e

da Argentina na, extremamente longa, guerra civil entre blancos e colorados, no

Uruguai.

Se por um lado, conforme o discurso oficial, vimos que o Paraguai foi o único

e exclusivo responsável por tão trágico conflito, o oposto - discurso revisionista -

seria a tentativa imperiosa do Paraguai, vítima dos vizinhos “marionetes dos

imperialistas ingleses”, manter o equilíbrio de forças na região do Prata, quando da

intervenção brasileira na República Oriental do Uruguai.

Entretanto, cremos que as raízes da Guerra do Paraguai, ou melhor, os

conflitos na Bacia do Prata em geral, estão nas lutas que as metrópoles ibéricas

Espanha e Portugal já travavam com respeito aos limites territoriais de suas colônias

sul-americanas (neorevisonismo).

Nessa esteira, endossamos tal conclusão, ao perceber a Guerra da Tríplice

Aliança como fruto das contradições platinas, tendo como razão última a

consolidação dos Estados Nacionais na região. E que essas contradições, herança

das metrópoles ibéricas, encontrou na Guerra Civil uruguaia - iniciada com o apoio

do governo argentino aos sublevados, na qual o Brasil e o Paraguai intervieram,

segundo seus interesses – o estopim da Grande Guerra.

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Todavia, pudemos observar também, que a Guerra não era a única

resolução para os embates que os países cisplatinos estavam envoltos. Se a mesma

ocorreu foi por interesse dos países envolvidos no confronto, sejam esses interesses

quais forem.

Em meio às informações desencontradas, exageradas e mesmo

negligenciadas, coube aos plenipotenciários dos países envolvidos buscarem, de

forma diplomática e resoluta, uma solução que viesse a atender, se não,

inteiramente, a cada um dos interesses em jogo, ao menos propiciasse o equilíbrio

dos mesmos.

Ora, durante a Missão de Paranhos em Montevidéo, a denominada

pacificação brasileira já havia revelado as contradições da política exterior do

Império na Bacia do Rio da Prata, pois ao mesmo tempo em que pugnava pela paz,

agia com hostilidades, como pudemos ver no ultimatum de Saraiva.

O Império, única monarquia na América Latina, não via com bons olhos as

proporções que tomavam os conflitos na bacia do Prata, tendo em vista que os

demais vizinhos, quando das suas independências, adotaram o regime republicano.

Ora, a imagem que um país constrói de si está relacionada à diferença que infligem

em relação às imagens de outras nações.

Assim, o “outro” do Brasil, foi toda a América Latina, pois dentro desta, num

determinado momento do século XIX, o “oposto” brasileiro foi o Paraguai, contra o

qual fez-se uma atroz guerra que era uma luta por territórios, por hegemonia, e

antes de tudo, uma guerra pela identidade afetada pela iminente derrocada do

Império escravista e seu modelo de “civilização”.

Desta feita, poderíamos sintetizar a Guerra contra o Paraguai como a

sinalização, nesta região do planeta, do “casamento de uma descolonização

prolongada, seletiva, e parcial com a dominação imperialista” (FERNANDES apud

MOTA, 1995, p.47)

Por fim, encerro esse breve trabalho sobre a diplomacia na Guerra do

Paraguai, coadunando ipsi literis, com a resposta dada, por Francisco Doraioto12 no

seguinte trecho da entrevista ao jornal catarinense A Notícia, vejamos:

AN - O Brasil tem um tradição de resolver as questões de limites com países fronteiriços pela negociação. Por que com o Paraguai a diplomacia fracassou?

12 Francisco Doratioto, ao nosso ver, qualifica-se como maior expoente sobre o tema Guerra do Paraguai, principalmente, no que tange a política externa brasileira na bacia do Prata.

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Doratioto - Há uma série de fatores. Do lado brasileiro, não se esperava e nem se planejava uma guerra contra o Paraguai. O Partido Liberal, que chegou ao poder em 1862, não tinha uma política externa planejada para o rio da Prata que substituísse aquela elaborada pelo Partido Conservador no final da década de 1840: preservar a independência do Uruguai e do Paraguai, para evitar a reconstrução do antigo reino do rio da Prata na forma de uma república, sob a liderança de Buenos Aires. Temia-se que uma grande república ao Sul impedisse a livre navegação dos rios platinos - essencial para o contato entre o Rio de Janeiro e a província do Mato Grosso, isolada por terra do resto do Brasil; se tornasse uma ameaça militar ao Império do Brasil e, ainda, que servisse para inspirar o surgimento de um movimento republicano brasileiro. Os conservadores tinham princípios norteadores de sua ação no Prata, já os liberais não. Ademais, os liberais não tinham unidade interna, havendo feroz luta entre "históricos" e "progressistas", impedindo uma atuação serena externa. Como conseqüência, em 1864, o governo imperial, chefiado pelos liberais, deixou-se envolver na guerra civil do Uruguai, por demanda de estancieiros gaúchos que tinham propriedades e interesses econômicos nesse país. Solano López, por sua vez, carecia de um serviço diplomático - tinha apenas um agente comercial em Montevidéu - que lhe desse informações seguras sobre a região. Ele se deixou convencer pelo governo uruguaio, do Partido Blanco, hostilizado por Brasil e Argentina, de que a independência uruguaia estava ameaçada por esses dois países, os quais, posteriormente, se voltariam contra o Paraguai. Nem uma coisa nem outra correspondiam à verdade, mas Solano López acreditou que sim e buscou antecipar-se a essa suposta ameaça, iniciando uma guerra para bater as tropas do Império no Uruguai e derrubar o presidente Mitre em Buenos Aires. Para Mitre, por sua vez, o ataque paraguaio à Argentina dava a oportunidade para aliar-se ao Brasil e vencer Solano López. Este tinha estreitos vínculos com a oposição federalista argentina, que se opunha à construção do Estado nacional centralizado, defendido pela burguesia mercantil de Buenos Aires e criado por Mitre em 1862, sob a designação de República Argentina. Esses vínculos tornavam Solano López uma ameaça à consolidação do Estado nacional argentino centralizado. Uma guerra que depusesse o líder paraguaio era, portanto, bem vista por Mitre. Pode-se dizer que a guerra era desejada pelos "blancos" uruguaios, que assim não ficariam sós na luta contra a Argentina e o Brasil e, por motivos diferentes, por Solano López e Mitre. Só não era desejada pelo governo imperial, que não teve condições políticas e nem tinha elaborado uma política externa clara que lhe permitisse resistir à pressão, dos estancieiros gaúchos e da opinião pública do Rio de Janeiro, para que o Império promovesse uma intervenção militar contra o governo uruguaio. Ademais, o governo imperial não suspeitava, pelo menos até outubro de 1864, da firmeza da decisão paraguaia em atacar o Brasil, caso houvesse essa intervenção. Daí não haver, com antecedência, uma ação diplomática no Prata, em lugar de uma ação de força por parte do Império (A Notícia, de 25 de agosto de 2002).

Desta feita, entendemos com esse estudo, que certamente merece ser

aprofundado em trabalho futuro, que a diplomacia brasileira falhou, não nos

inúmeros tratados que buscou firmar com seus vizinhos para solução dos conflitos

sobre as fronteiras, todavia fracassou, ou melhor, foi negligente com as

conseqüências a que o Império havia se exposto não considerando o protesto

paraguaio de 30 de agosto de 1864.

O argumento da responsabilidade do confronto que os revisionistas

atribuíram aos ingleses, não merece prosperar, muito menos a responsabilização

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única e exclusivamente do confronto pela corrente clássica, haja vista que a Guerra

do Paraguai foi um confronto eminentemente regional, no qual as nações latino-

americanas recém nascidas propugnavam por resolver, ainda que tragicamente, as

questões que herdaram das antigas metrópoles ibéricas: a delimitação das

fronteiras.

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