Guia de Estudo TEO-P5

104
Desenvolvimento Teológico Organizador Nicanor Lopes Bacharelado em Teologia 1ª edição - 2012 www.metodista.br

Transcript of Guia de Estudo TEO-P5

Page 1: Guia de Estudo TEO-P5

DesenvolvimentoTeológico

OrganizadorNicanor Lopes

Bacharelado em

Teologia

1ª edição - 2012 ww

w.m

etod

ista

.br

Page 2: Guia de Estudo TEO-P5

Un3d Universidade Metodista de São Paulo Desenvolvimento teológico / Universidade Metodista de São Paulo. Organização de Nicanor Lopes. São Bernardo do Campo : Ed. do Autor, 2012. 104 p. (Cadernos didáticos Metodista - Campus EAD) Bibliografia ISBN 978-85-7814-032-8

1. Teologia I. Lopes, Nicanor II. Título.

CDD 230

Coordenação do Curso de Graduação Bacharelado em Teologia - EADNicanor Lopes

Professores AutoresClaudio de Oliveira Ribeiro Helmut Renders José Carlos de SouzaOswaldo de Oliveira Santos Junior Paulo Roberto GarciaSandra Duarte de Souza

Assessoria Pedagógica Adriana Barroso de AzevedoCamila Faustinoni CabelloKarin MüllerThais Helena Santinelli

Conselho DiretorPaulo Roberto Lima Bruhn (presidente), Nelson Custódio Ferr (vice-presidente). Titulares: Ademir Aires Clavel, Augusto Campos de Rezende, Aureo Lidio Moreira Ribeiro, Carlos Alberto Ribeiro, Kátia Santos, Marcos Sptizer, Oscar Francisco Alves, Osvaldo Elias de Almeida, Suplentes: Regina Magna Araujo, Valdecir Barreros

Reitor: Marcio de MoraesPró-Reitora de Graduação: Vera Lúcia Gouvêa StivalettiPró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa: Fábio Botelho JosgrilbergDiretor da Faculdade de Teologia: Paulo Roberto GarciaCoordenação do NEAD: Adriana Barroso de AzevedoCoordenador Geral de EAD: Francisco José Sousa Lima

Universidade Metodista de São Paulo

Coordenação Editorial Nicanor Lopes

Editoração Eletrônica Editora Metodista Capa Cristiano Leão Revisão Eliane Viza Bastos Barreto

Impressão Assahi Gráfica e Editora Ltda. Reimpressão - 2o semestre de 2012

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Metodista de São Paulo)

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO Rua do Sacramento, 230 - Rudge Ramos 09640-000 São Bernardo do Campo - SP

Tel.: 0800 889 2222 - www.metodista.br/ead

É permitido copiar, distribuir, exibir e executar a obra para uso não-comercial, desde que dado crédito ao autor original e à Universidade Metodista de São Paulo. É vedada a criação de obras derivadas. Para cada novo uso ou distribuição, você deve deixar claro para outros os termos da licença desta obraex

pedi

ente

Page 3: Guia de Estudo TEO-P5

DesenvolvimentoTeológico

OrganizadorNicanor Lopes

Bacharelado em

Teologia

UMESP

1ª edição - 2012 ww

w.m

etod

ista

.br

Page 4: Guia de Estudo TEO-P5
Page 5: Guia de Estudo TEO-P5

Prezado/a aluno/a do Campus EAD Metodista,

Seja bem-vindo(a) à Universidade Metodista de São Paulo! A modalidade de educação a distância,

escolhida por você, está em crescente expansão. Para ter uma ideia, um em cada cinco alunos que

ingressaram no ensino superior no início de 2010 optaram pela EAD, segundo dados do Ministério

da Educação. Isso significa que vem ganhando confiança e credibilidade o ensino a distância, graças

também ao desempenho bastante positivo dos alunos no ENADE (Exame Nacional de Desempenho

Estudantil), se comparado àqueles matriculados na modalidade presencial.

O melhor de tudo isso é a democratização do acesso ao curso superior, facilitada pela EAD,

permitindo a uma parcela cada vez maior da população condições mais adequadas de inserção no

mercado de trabalho com a qualidade exigida. Tal atributo, associado a valores ético-cristãos que

como uma instituição ligada à Igreja Metodista a Universidade defende, são marcas e atributos que

buscamos vivenciar na prática pedagógica de nosso dia a dia acadêmico.

Este Guia de Estudos reúne os principais conceitos relacionados às disciplinas que integram o curso

que você escolheu. Nosso desejo é que tal material seja um norteador de trabalhos, atividades e outros

afazeres acadêmicos a serem desenvolvidos no decorrer do período em que estiver na Metodista.

Importante também é incentivá-lo no sentido de que as temáticas sejam aprofundadas em outras

fontes de pesquisa (livros, revistas e outras referências que os docentes podem oferecer-lhe).

Bons estudos e um ótimo semestre!

Prof. Dr. Marcio de Moraes

Reitor

Aprendizagem e autonomia

Page 6: Guia de Estudo TEO-P5
Page 7: Guia de Estudo TEO-P5

O que é pneumatologia

Critérios para discernimento da ação do Espírito Santo no mundo

Eclisiologia: chaves de leitura

Eclesiologia: identidade, sacramentos e propósitos da igreja Cristã como sinal do Reino de Deus

Ecumenismo: uma história de separação e busca da unidade

Ecumenismo: múltiplas formas, um só propósito

Introdução ao grego bíblico - o substantivo

Introdução ao grego bíblico - o verbo

Exegese do Novo Testamento I - metodologia e evangelhos:a primeira aproximação ao texto

Exegese do Novo Testamento II - segunda aproximação ao texto - leitura sincrônica

Exegese do Novo Testamento III - segunda aproximação ao texto - leitura diacrônica

Exegese do Novo Testamento IV: hermenêutica

Sociologia e religião: aspectos conceituais

Religião e cultura

Religião e modernidade

O panorama religioso da América Latina

Desafios do contexto urbano

A cidade de São Paulo como um caso a ser analisado

Teologia

91317

23

2933374349

53

57

61656973778185

sum

ário

Page 8: Guia de Estudo TEO-P5

75798589

Page 9: Guia de Estudo TEO-P5

O que é pneumatologia

Prof. Dr. Cláudio de Oliveira Ribeiro

Objetivos: Apresentar as noções bíblicas, históricas

e teológicas básicas da doutrina relativa ao Espírito Santo e as implicações dela na vida,

especialmente em termos de renovação ecle-sial e social.

Palavras-chave:Espírito Santo; alteridade; carisma; poder.

Módulo

www.metodista.br/ead

Teologia sistemática e ecumenismo

Page 10: Guia de Estudo TEO-P5

Falar de Deus é sempre um desafio, pois a melhor palavra diante da grandeza e da infinitude dele seria o silêncio. Como falar Daquele que é indizível? Como ex-pressar algo relativo Àquele que é inexprimível? Mas, se o silêncio total fosse o caminho, não comunicaríamos o amor dele pelo mundo, não é mesmo? Por isso, precisa-mos buscar as linguagens, as palavras, os gestos e sinais para expressar Deus e o seu amor. E tudo isso faz parte da dimensão humana. Quando falamos que a “mão de Deus sustentou alguém”, por exemplo, obviamente não estamos dizendo que Deus tem “mão” da mesma forma que nós, seres humanos, temos. Trata-se de uma forma simbólica e expressiva de falar da providência de Deus. É dessa forma que falamos de e com Deus.

No contexto bíblico e na história da Igreja, a partir de experiências concretas da vida, o povo de Israel e as comunidades cristãs descobriram que uma boa forma para falar de Deus e da interação dele no mundo seria com a expressão Espírito Santo. O Espírito Santo é Deus que, em seu amor, age no mundo. No caso da teologia cristã, é concebido que o Espírito age na criação e na preservação da vida (Gênesis 1.2, Jó 33.4), na inspiração da palavra pro-fética e na manutenção das promessas consoladoras (AT). O Espírito, como comunicador de Deus ao ser humano, se plenifica em Jesus e se revela como poder de regenera-ção eclesial (NT). A ressurreição de Jesus desencadeia o cumprimento das promessas proféticas relativas ao dom do Espírito à humanidade.

Diante dessas experiências, os grupos cristãos for-mularam, ao longo da história, uma doutrina. Trata-se de uma tentativa de compreender algo que, mesmo que esteja além de toda a compreensão humana, requer uma percepção racional básica, para que não caiamos no erro de um subjetivismo ao permitir interpretações sobre o Espírito Santo que negue ou contradiga os pontos centrais da mensagem bíblica (o kerigma). Com isso, temos na Teologia as reflexões pneumatológicas. A expressão Pneumatologia, em linhas gerais, quer dizer o estudo [logia, compreensão, conhecimento] bíblico-teológico sobre a doutrina do Espírito Santo [ruah, do hebraico e pneuma, do grego: vento, força vital, espírito]

Crer que Deus é Trino é olhar para fora de nós mesmosO Espírito Santo é inseparável do Pai e do Filho, embora possua sua própria personalidade

(= carisma). Na Trindade não há subordinação. As pessoas – do Pai, do Filho e do Espírito – se interpenetram (pericorese), carregando cada uma as demais dentro de si, sendo os três divinos co-eternos, co-infinitos, co-iguais e co-existenciais.

Em todo o Antigo Testamento, o Espírito (a Ruah, palavra feminina) e a Palavra de Deus não cessam de agir conjuntamente. Também no Novo Testamento, a Palavra de Deus feita carne pela operação do Espírito nada faz sem o próprio Espírito. A personalidade do Espírito Santo se torna compreensível a partir das relações dele com o Pai e o Filho, uma vez que ser pessoa é sempre ser-em-relação. O Espírito é o amor – distinto e pessoal – que reforça a unidade entre Pai e Filho.

O Espírito Santo, à luz dos conceitos vétero e neotestamentários, está associado às idéias de vento, fôlego, sopro, etc. Nesse sentido, a tradição o interpreta como o vento que impulsiona as comunidades a assumirem os princípios do Reino de Deus, em um processo de encarnação

Pneumatologia, quer dizer o estudo [logia,

compreensão, conheci-mento] bíblico-teológico

sobre a doutrina do Espírito Santo [ruah, do hebraico e pneuma, do grego: vento, força vital,

espírito]

Universidade Metodista de São Paulo

10

Page 11: Guia de Estudo TEO-P5

do Evangelho na História. Tal potencial não se limita às barreiras confessionais e/ou religiosas. O Espírito Santo “sopra onde quer” ( ). Na experiência comuni-tária da Igreja Primitiva, a ação do Espírito Santo, como “motor da libertação integral” da criação, é concedida, não sectariamente a alguns, mas ao gênero humano, na promessa de que “o Espírito será derramado sobre toda a carne”.

O Espírito Santo provoca no ser humano um êx-tase autêntico e criativo. Esse não anula as estruturas da consciência e da existência humana, mas as redi-mensiona em amor (cf. Paul Tillich). O Espírito Santo é a força dinamizadora que age no ser humano, levando-o ao conhecimento nas diferentes dimensões da vida humana: de si mesmo, do outro, do todo da criação e de Deus.

O Espírito Santo age no mundo e provoca o ser humano para as respostas (positivas ou negativas) ante as questões que marcam a vida. Essa provocação visa conduzir o ser humano a reconhecer suas limitações e também a confrontar as domestificações causadas por estruturas institucionais. Ao mesmo tempo, motiva o ser humano e as estruturas sociais a redescobrirem as suas potencialidades, tendo em vista os valores do Reino de Deus como a justiça, a paz e a integridade da Criação.

A difícil relação entre carisma e poderA experiência do Espírito, base da característica carismática da igreja primitiva, foi constan-

temente alvo de normatização e de critérios de discernimento. As conseqüências desse processo podem ser sinais tanto de aproximação como de distanciamento do Kerigma bíblico. Evidências desse processo podem ser encontradas nas seguintes experiências:

- As tensões presentes no movimento montanista (final do segundo século), incluindo o valor de liderança dado às mulheres.

- O processo de institucionalização eclesiástica: a supremacia do episcopado e a organização da liturgia (século III).

- As discussões acerca do filioque (O Espírito Santo procede do Pai e do Filho, e não somente do Pai como nas interpretações orientais).

- A masculinização do Espírito Santo. A paulatina mudança da palavra/conceituação hebraica ruah (feminina) para a concepção grega de pneuma (neutra) e posteriormente no mundo latino para spiritus (masculino).

- A redução do Espírito Santo à dimensão eclesiástica, tanto no catolicismo romano como no protestantismo.

- O excessivo racionalismo e a exacerbada intelectualização no mundo ocidental e moderno, frutos do menosprezo pela ação (e reflexão) do Espírito.

Da mesma forma, a experiência do Espírito, base da característica presente em diferentes movimentos ao longo da história da Igreja em especial os de caráter profético, foi constantemente força de desestabilização institucional, de crítica profética e de renovação eclesial. Igualmente há, na História da Igreja diversas evidências desse processo. Elas podem ser encontradas nas seguintes experiências:

O Espírito Santo é a força dinamizadora que age no

ser humano, levando-o ao conhecimento nas

diferentes dimensões da vida humana: de si mes-mo, do outro, do todo da

criação e de Deus.

11

www.metodista.br/ead

Page 12: Guia de Estudo TEO-P5

• Movimentos de espiritualidade, ao longo da época medieval, como os de Thomas A. Kempis, de Tereza D’ Ávila e de São João da Cruz.

• As perspectivas da Reforma do século XVI, em especial os ideais de Thomas Müntzer e dos anabatistas.

• O movimento metodista na Inglaterra do século XVIII.

• A renovação pastoral com o surgimento das comunidades eclesiais de base na América Latina (século XX).

• O movimento pentecostal no século XX, não obstante as suas formas rápidas e intensas de institucionalização.

As reflexões históricas e teológicas suscitam a compreensão de que, não obstante as barreiras e as reações humanas e institucionais contrárias, o Espírito age na vida nos aspectos pessoal, coletivo e cósmico; testifica a obra de Jesus, tendo o Reino como referência; recria a vida humana – pessoal, coletiva e institucional –, possibilitando novidade e diversidade em conformidade com o testemunho bíblico; renova as estruturas do pensar e do agir humanos, tanto individuais como institucionais; promove a vida em sentido amplo, sendo o responsável pela motivação da consciência humana, do desenvolvimento do bem-estar e da justiça social, conforme atesta a experiência bíblica.

O Espírito Santo não é somente o lado subjetivo da auto-revelação de Deus, nem a fé é ape-nas o elo da Palavra de Deus no coração humano. Mais do que isso, ele é a força da ressurreição dos mortos e da nova criação de todas as coisas. O Espírito Santo santifica a vida e renova a face da terra. (Cf. Jürgen Moltmann)

O Espírito Santo é o precursor e, ao mesmo tempo, o atualizador do carisma salvífico da graça encontrado em Cristo. A gratuidade, como dom de Cristo que chega ao ser humano pelo Espírito, é uma grandeza autônoma, importante em si mesma e que dispensa instrumentalizações (Cf. Gálatas 2).

Referências

COMBLIN, José. O Espírito Santo e a Libertação. Petrópolis-RJ, Vozes, 1987.

MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da Vida: uma pneumatologia integral. Petrópolis-RJ, Vozes, 1999.

SANTOS, Jorge Pinheiro dos. “Elementos para uma pneumatologia brasileira –Uma leitura pós-molt-manniana”. In: Caminhando (online), vol. 13, n. 2. (2008). Disponível em: < https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/CA/article/view/1049/1086 >. Acesso em: 20 jun. 2010.

Universidade Metodista de São Paulo

12

Page 13: Guia de Estudo TEO-P5

Critérios para discernimento da ação

do Espírito Santo no mundo

Prof. Dr. Cláudio de Oliveira Ribeiro

Objetivos: Apresentar um quadro de referência bíblica e teoló-gica para a avaliação e discernimento das experiên-cias relacionadas ao Espírito Santo e as implicações práticas da ação do Espírito na vida.

Palavras-chave:Espírito Santo; Cristo; renovação.

Módulo

www.metodista.br/ead

Teologia sistemática e ecumenismo

Page 14: Guia de Estudo TEO-P5

O quadro de referências para o discernimento das ações do Espírito, estabelecido pelas co-munidades cristãs primitivas, consistia na unidade entre o Antigo Testamento, a prática de Jesus e a novidade de vida no Espírito, próprio dessas comunidades. A teologia cristã, inspirada nesse quadro, prioriza como critério de discernimento das ações do Espírito, pelo menos, dois aspectos: (i) o confronto de tais ações com a experiência e os propósitos de Jesus, (ii) e a capacidade delas de gerar vida, fortalecer a dignidade humana e o valor de toda a Criação.

Com isso, torna-se notável a importância do caráter trinitário nas reflexões pneumatológicas para evitar individualismos e subjetivismos religiosos. O Espírito que é e vem de Deus sempre se refere à revelação de Deus em Cristo. Por toda a sua conduta Jesus manifesta que nele age o Espírito (Lucas 4.14). No Espírito, ele tem acesso ao Pai (Lucas 10.21), enfrenta o demônio e liberta as suas vítimas (Mateus 4. 1 e 12.28) e traz aos pobres a Boa Nova e a Palavra de Deus (Lucas 4.18).

O Espírito Santo e Jesus A atuação do “novo de Deus”, instaurado

em Jesus, o Cristo, ocupará na história a função propulsora da atualização e da re-interpretação do significado da ação do próprio Deus. Isso se dá em um círculo hermenêutico constante, na medida em que o Espírito atualiza a memória do Cristo, expressa a novidade de vida e fomenta a libertação.

Segundo o testemunho dos primeiros cris-tãos, a presença do Espírito Santo ocorre na perse-guição e no martírio e na necessidade de respostas às situações-limite da vida humana, ainda que a atuação dele não se restrinja a tais situações. Na experiência de Atos dos Apóstolos evidencia-se a presença do Espírito Santo na vida cotidiana, tanto em nível pessoal como comunitário.

A ação santificadora do Espírito promove o despertar da consciência humana e a direciona para a integridade da Criação. A perfeição, meta do processo de santificação, está associada à idéia do ser íntegro (aquele que, iluminado por Deus, assume a profundidade da existência). Esse seria o telos da vida humana, conforme os conteúdos bíblicos, em especial os do Novo Testamento, ao contrário das regras de pureza e dos princípios de cunho moralista que marcam boa parte das experiências religiosas ao longo da história. A santificação é um processo permanente e coti-diano que transforma as vidas pessoal e social, confere sentido à vida humana como um todo e desperta ações de solidariedade, unidade, humil-dade e serviço.

Catalisador da nova aliança, o Espírito, como prometido em Pentecostes, redimensiona a obra de Cristo para o presente, como defensor dos pobres, que assiste ao próximo e conduz o povo à santidade (Lucas 4). Segundo o testemunho bíblico, o chamado de Deus ao povo, exercido pelo Espírito, realiza-se por intermédio do cum-primento da justiça, da solidariedade e da busca

A santificação é um processo per-manente e coti-diano que trans-forma as vidas pessoal e social, confere sentido à vida humana como um todo e desperta ações

de solidariedade, unidade, humil-dade e serviço.

Universidade Metodista de São Paulo

14

Page 15: Guia de Estudo TEO-P5

da dignidade humana, na medida em que homens e mulheres criam a liberdade (“pois onde está o Espírito de Deus, aí está a liberdade”) e a igualdade para benefício do todo.

O Espírito Santo, atuando na vida do ser humano, conduz o processo de santificação, que é marcado pela graça, pela fé e o conseqüente perdão dos pecados e regeneração da vida. A realidade histórica humana é marcada por ambigüidades de diferentes naturezas. Essas podem ser assumidas e enfrentadas pelo ser humano na medida em que ele seja impactado pelo Espírito divino – referência transcendente de uma vida sem ambigüidades. Deus, que é Espírito, em ação misteriosa e sal-vífica, estabelece uma relação com ser humano que o conduz ao acolhimento do Evangelho.

O Espírito possibilita que a existência humana, condenada e marcada pela morte, dê lugar à vida. A Lei que mantêm o ser humano preso à letra dá lugar à “novidade do Espírito” (Romanos 7.6), a maldição é abolida pela graça e dá lugar à bênção (Gálatas 3.16), o pecado é superado pela justificação que vem de Deus (Romanos 7. 18-26), a condenação é substituída pela paz e a alegria do Espírito (I Tessalonicenses 1.6), e os frutos do Espírito tomam o lugar da lei da carne (Gálatas 5. 19-23). O Espírito – não obs-tante as suas manifestações e ações variadas e livres (pois, “sopra onde quer”) – possui o “rumo” do Reino de Deus, tal como anunciou e viveu Jesus, e como Paráclito, contribui para que o ser humano possa ter essa mesma direção.

Implicações práticas da ação do EspíritoA vida no Espírito não é uma posse intuitiva que o ser humano possa ter dele, mas é uma

experiência real e concreta cujos sinais são bastante variados. Todavia, todos os sinais estão a serviço do Evangelho do Reino, como testemunho, e do Corpo de Cristo, como edificação. A vida no Espírito também não é posse confessional ou institucional e, nesse sentido, não é algo que se possa manipular ou deter. A ação do Espírito é concretizada na comunidade, na abertura e na dinâmica do Corpo e do mundo – receptores do Espírito por excelência.

Há, portanto, uma relação direta e expressa entre pneumatologia e eclesiologia, em espe-cial a noção de que a compreensão e a manutenção e renovação da Igreja depende do Espírito. A pluralidade eclesiológica é um paradigma para se perceber a diversidade da ação do Espírito e dom de unidade proveniente dele.

O Espírito Santo é a força que lança a Igreja nascente “até os confins da Terra” (Atos 1. 8) e acompanha e guia a ação dos apóstolos (Atos 16.6s). A Igreja, como parte da nova criação, não pode nascer senão do Espírito, ao qual se deve tudo o que nasce de Deus.

Todavia, a presença do Espírito Santo na comunidade primitiva – identificada especialmente pelos relatos evangélicos dos sinóticos e de Atos – não deve ser alimentada pelo mito de uma comunidade ideal e isenta de conflitos e de tensões internas.

Ao renovar constantemente a ação e os dons, o Espírito trabalha na unidade do Corpo de Cristo (I Coríntios 3.16), derramando o dom supremo do amor (I Coríntios 13; II Coríntios 6.6; Gálatas 5.22) e fazendo com que Cristo seja reconhecido como Senhor (I Coríntios 12.3). A variedade e a diversidade de dons operam uma construção comunitária singular – lugar preferencial de cooperação das diferenças. Dons e fruto do Espírito são (e precisam estar) articulados em favor do Reino.

Na atualidade, ocorre com freqüência nas igrejas, uma ênfase maior na experiência pessoal com o Espírito em detrimento das experiências que tenham o Espírito como motivador e impulsio-nador do cumprimento da missão. A ação do Espírito não é algo individualista, mas comunitário, que visa o amor, a justiça e o bem-estar de todo o Corpo.

A variedade, a ênfase excessiva, um ineditismo e até mesmo superficialismo no campo reli-gioso, referentes à atuação do Espírito Santo, têm gerado muitas divisões, fazendo com que os(as)

A vida no Espí-rito não é uma posse intuitiva

que o ser humano possa ter dele, mas é uma ex-periência real e concreta cujos sinais são

bastante variados.

15

www.metodista.br/ead

Page 16: Guia de Estudo TEO-P5

cristãos(ãs) percam de vista o kerigma evangélico e o caráter missionário. A missão, por vezes, tem se tornado secundária. No entanto, o Espírito Santo possui uma força motivadora que impulsiona as pessoas à missão. Ele atua nas dimensões de santificação, pessoal e social, e produz alteridade, unidade, vida comunitária e ministerial e frutos de amor e de justiça. A noção bíblica do Espírito Santo (AT e NT) associado ao vento, fôlego, sopro, impulsiona as comunidades a assumir os prin-cípios do Reino de Deus, em um processo de encarnação do Evangelho na História.

A experiência do Espírito realiza-se dentro da história, na ação do sujeito histórico. Não se separa da consciência do agir no mundo. É a experiência de liberdade. Esta liberdade exprime-se na palavra que é testemunho público, palavra eficaz, palavra que gera comunidade. Pois a expe-riência do Espírito não é individual: está ligada à constituição da comunidade. Tal experiência do Espírito é vida e ressurreição, novidade de vida. Vive-se como um novo nascimento” (JOSÉ COMBLIN).

A espiritualidade, como vocação do Pai destinada a toda a criação, é a presença do Espírito Santo na vida humana, que faz com que as pessoas, comunidades e instituições caminhem, a partir das referências do ministério de Cristo, em direção ao estabelecimento do Reino de Deus. O Espírito Santo é concedido a homens e mulheres em benefício do povo para a realização dos planos e propósitos históricos de Deus para toda a Criação.

Referências

COMBLIN, José. O Espírito Santo e a Libertação. Petrópolis-RJ, Vozes, 1987.

MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da Vida: uma pneumatologia integral. Petrópolis-RJ, Vozes, 1999.

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

Universidade Metodista de São Paulo

16

Page 17: Guia de Estudo TEO-P5

Eclesiologia: chaves de leitura

Prof. Dr. Helmut Renders

Objetivos: Introduzir uma parte do quadro referencial

para a análise e o uso adequado de eclesiolo-gias distintas, com consideração especial das

suas implicações práticas.

Palavras-chave:Eclesiologia; chaves de leitura; teocentrismo;

antropocentrismo; mediação da graça.

Módulo

www.metodista.br/ead

Teologia sistemática e ecumenismo

Page 18: Guia de Estudo TEO-P5

Eclesiologia: chaves de leituraO que é a Igreja? Qual é a sua tarefa? Como ela deve

ser organizada ou se organizar? Quais são as ferramen-tas que ela usa? Qual é a sua relação com Deus, com o cosmo, com a criação, com a humanidade? Gostaríamos de responder estas perguntas nas duas unidades sobre a eclesiologia. Inicialmente, não partiremos do texto bíblico nem de um levantamento fenomenológico. Investigamos diferentes formas de ver e interpretar as igrejas. Desta forma sensibilizada, introduziremos na segunda unidade as clássicas auto-compreensões confessionais das igrejas protestantes, discutiremos o conceito de biblicidade e rela-cionar-nos-emos com o cotidiano eclesiástico brasileiro.

Imagem 1

1. O “nascimento” da Igreja: PentecosteA Igreja nasce com o pentecoste. No seu momento inicial, enfatizam-se, imediatamente, dois

aspectos: o da comunicação do evangelho e o de uma nova comunhão que transcende barreiras culturais, étnicas, sociais, de gênero e de idade. A Igreja, então, tem um papel importante na missão de Deus e na antecipação do seu Reino.

Entretanto, mesmo para os testemunhos deste memoriável evento, o mistério da Igreja não se revelou de forma imediata e precisava ser interpretada (Atos 2.14-21). Hoje, além disso, precisam ser contemplados dois mil anos de História da(s) igreja(s): é uma história ambígua de libertação e opressão, profunda sabedoria e plena ignorância, atos admiravelmente, “divinos” e assustadoramente desumanos. Diante disso é a tarefa da eclesiologia, ser autocrítica, honesta e realista e, no mesmo momento, indicar caminhos da contínua reforma das igrejas como horizonte de esperança.

2. Conceitos subjacentes das nossas compreensões eclesiológicas A nossa conclusão a respeito da Igreja Cristã depende muito, das nossas perspectivas. Em

seguida, mencionamos e discutimos algumas destas possíveis leituras. Será que você encontra leituras usadas também por você?

2.1 Entre o teocêntrico e o antropocêntricoHá aproximações mais teocêntricas ou antropocêntricas. Percebemos isso já na cristologia.

Na eclesiologia transparece isso na descrição (teocêntrica) católica da igreja como “sacramento” e na descrição (antropocêntrica) protestante como “comunhão de fiéis”. “Comunhão dos santos” (Credo Apostólico) e “Assembléia de Deus” (nome de igreja) são conceitos mais “mistos”. A grande tarefa na teologia é, hoje, a compreensão e relação adequada, dinâmica, realista e esperançosa destes dois aspectos. Acreditamos que tanto uma hiper-divinação como uma hiper-redução ao aspecto antropológico sejam desfavoráveis à comunicação dinâmica, realista e responsável da graça pelas e nas igrejas.

2.2 Entre o estrutural e o essencialUma outra diferença é entre o formal e o essencial. Às vezes, procura-se uma identidade

formal. O essencial, aquilo que, no mesmo momento, transcende e relaciona todas as formas de igrejas – por exemplo a promoção da justiça e da paz –, corre o perigo de se tornar, na práxis, secundária. A distinção sociológica entre instituição, seita e movimento pode combinar os dois aspectos.

Universidade Metodista de São Paulo

18

Page 19: Guia de Estudo TEO-P5

A leitura estrutural pode ser feita também numa perspectiva funcional. Por exemplo: A alta diversificação formal das igrejas congregacionais reflete a sua grande flexibilidade no nível local, enquanto as igrejas episcopais fazem lembrar – com muito mais freqüência – os grandes temas do mundo e da nação, como por exemplo, a paz mundial ou os aspectos internacionais da globalização. Igrejas com estruturas globais precisam integrar diversas experiências culturais, étnicas, etc.

Aquelas que seguem a compreensão “centro - pe-riferia” estão em perigo de valorizar a cultura e etnia da sua “sede” (lugar de origem) e desqualificar as outras; aquelas que pensam mais em termos mútuos, uma rela-cionalidade ou conexionalidade, podem se abrir mais às culturas diferentes.

No cotidiano, a essência dá o sentido à forma e a forma preserva, dinamiza e focaliza a essência. Uma eclesiologia que contempla somente o aspecto formal corre o perigo de justificar a permanência daquilo que é (e desqualifica a outra como “seita”); mas, quem fala somente, e de forma radical e ideal, do essencial, pode acabar navegando no mundo dos altos ideais, projetá-los para um futuro escatológico, e se ausentar, assim, da tarefa de precisar provar as suas convicções nas contradições do dia-a-dia.

2.3 Entre o escatológico e o empírico Para contornar esse problema fez-se a distinção

entre a igreja invisível e visível (= Zuínglio – ecclesia invisibilis) ou encoberta (= Lutero - ecclesia abscondita, também traduzida como “oculta”). A teologia reformada compreendia, por muito tempo, como igreja verdadeira, a eclesia invisível (dos/as predestinados/as), já que a igreja visível é aquela dos/as (somente) vocacionados/as. Lutero relacionou as duas como “alma e corpo”, ou seja, uma não existe sem a outra, porém elas nunca seriam idênticas. Já o catolicismo e a Igreja Ortodoxa entendem seu corpo eclesiástico como “o” corpo de Cristo visível. Novamente há o perigo de uma polarização não frutífera entre uma hiper-invisibilidade (às vezes acompanhada por uma tendência docêtica na cristologia) e uma hiper-visibilidade, uma infeliz desvinculação ou confusão entre Igreja (encoberta) e igrejas (visíveis ou empíricas).

2.4 Entre o cristocêntrico e o eclesiocêntricoAs distinções transparecem também na relação en-

tre cristologia e eclesiologia. Segundo a teologia católica, Cristo fundou a Igreja. O perigo desta perspectiva é a subordinação da cristologia à eclesiologia (Igreja = sacra-mento = tendência eclesiocêntrica). Para o protestantismo, o único sacramento no sentido mais profundo é o próprio Cristo (Lutero, tendência cristocêntrica). A sua eclesiologia

Imagem 2

Imagem 3

Folheto da Ação Social, 1963

Guia Espiritual, 1914

19

www.metodista.br/ead

Page 20: Guia de Estudo TEO-P5

está em perigo de ser subordinada à cristologia. Enquanto o evan-gélico pode dizer, “Eu creio em Cristo, mas não preciso da igreja!” – o que representa a tendência de afirmar “Fora de Cristo não há salvação”, o catolicismo acentua “Fora da Igreja não há salvação” (isso causa, às vezes, o engano, de que uma participação na igreja, sem envolvimento pessoal, seria suficiente para ser salvo).

2.5 Entre o aspecto quantitativo e qualitativoA teologia protestante descreve a igreja como “comunhão dos/

as fiéis” e, no mesmo momento, como “comunhão dos/as pecado-res/as”, a teologia católica se refere à própria igreja como “santa” (cf. os Credos) ou “pecadora”. A teologia metodista descreve a igreja como “comunhão daqueles/as que buscam e crêem”. Em geral, a santidade é hoje interpretada de forma escatológica e cristocêntrica (= plenamente realizada somente em Cristo ou no Espírito Santo). Mas há novas tendências evangélicas de não somente afirmar a necessidade da busca da santidade, mas o “já da santidade” para si, não num sentido escatológico, mas empírico. Essas igrejas renovam o ideal de uma igreja – muitas vezes, da sua comunidade – “santa” no sentido de “imaculada” ou verdadeira. Não poucas vezes, elas conside-ram outras igrejas como “não santas” e, por causa disso, não mantêm relacionamentos fraternais com elas.

2.6 Entre a transmissão “imediata” e “mediada” da graçaComo e até que ponto Deus se faz presente no meio da sua criação

e do seu povo? Classicamente, diz-se que Deus se comunica, preferencial-mente, pelos sacramentos ou meios da graça, vinculados à imaginação da presença ou do próprio Cristo (Lutero) ou do Espírito Santo (Reformado). No Brasil, observamos as seguintes tendências:

No protestantismo histórico, observa-se a deconstrução dos sacramentos clássicos (rejei-ção do batismo de criança; Santa Ceia como mero ato memorial) e a introdução de novos meios da graça (óleo para ungir, localizado no “altar” (não mais a mesa do Senhor)).

Ênfase na comunicação imediata (= não mediada por um sinal visível = não por um meio da graça) entre Deus e a pessoa, preferencialmente pelo Espírito Santo. A idéia do não-mediado da comunicação divino-humana se une, muitas vezes, com a opinião de que este caminho “mais direto” favorecia uma “transformação” não-mediada (no sentido temporal e qualitativo) da pessoa atingida por Deus. O êxtase da pessoa – como um estado alterado visível da pessoa é sua prova máxima (falar em línguas, cair no Espírito, etc.). Essa compreensão revela-se pela sua preferência para superlativos como “tudo”, “pleno” etc.

Criação contínua de novos “canais de benção” (cf. a função do “saco da trindade”, do “sal grosso”, do “sabonete de descarrego” ou do “copo da água” em igrejas neo-pentecostais) com “tempos de validade” bastante variados. Tendencialmente causa um excesso sim-bólico seu próprio esvaziamento.

Considerações intermediáriasEsperamos que estas perspectivas e observações possam abrir nossos olhares para os aspec-

tos chaves das atuais dinâmicas eclesiásticas no cotidiano brasileiro. Em nossas tarefas semanais vamos aplicar estes olhares às nossas igrejas.

Imag

em 4

Cálices e pratos de uma Santa Ceia Protestante

Imag

em 5

Rosa consagrada, cartaz da IURD

Universidade Metodista de São Paulo

20

Page 21: Guia de Estudo TEO-P5

Referências bibliográficas

BOFF, Leonardo. Igreja: carisma e poder. Rio de Janerio, RJ: Record, 2005. 476p [3ª edição, com um novo prefácio e um balanço sobre a importância do livro; 2ª edição: Ática, 2001 [com do-cumentação do debate posterior]; 1ª edição: Vozes, 1981]

BRAATEN, Carl E. & JENSON, Robert W. (eds.). Dogmática Cristã, vol. II. São Leopoldo, RS: Editora Sinodal, 1987, p. 195-299. [referente aos capítulos “A Igreja” e “Os meios da graça”].

BRUNNER, Emil. Equívoco sobre a Igreja, trad. Paulo Arantes. São Paulo, SP: Editora Cristã Novo Século, 2ª impressão, 2004, 142p.

RENDERS, Helmut. “As notae ecclesiae do Credo Niceno-Constantinopolitano: fonte do re-encantamento com o projeto da Igreja Cristã”. In: Caminhando (online), Brasil, vol. 13, n. 2 (2008). Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-metodista/index.php/CA/article/view/1214. Acesso em: 6 jun. 2010.

Imagem 1Disponível em: < http://de.wikipedia.org/w index.php?title=Bild:RabulaGospelsFolio14vPentecost.jpg&filetimestamp=20050907043501 >. Acesso em: 20 jun 2008

Imagem 2JUNTA GERAL DE AÇÃO SOCIAL. Somos deste mundo. S.l.: s.a., capa. [Desenho da capa Dorita Smith] (Arquivo Histórico FT / Umesp)

Imagem 3JENSEN, André. Um folheto célebre ou o Livrinho do Coração: o coração humano templo de Deus ou de Satanás, representado por dez geniais ilustrações para edificação e despertamento da cristandade. [São Bernardo do Campo, SP]: Imprensa Metodista, 1970 [20ª edição], p. 69. (Arquivo Histórico FT / Umesp)

Imagem 4Disponível em: < http://de.wikipedia.org/w/index.php?title=Bild:Abendmahlsgeschirr.jpg&filetimestamp=20080225204610 >. Acesso em: 20 jun 2008.

Imagem 5 Disponível em: < http://thiagopaiva.com/qqq/?m=200801&paged=3 >. Acesso em: 20 jun 2008.

21

www.metodista.br/ead

Page 22: Guia de Estudo TEO-P5

Universidade Metodista de São Paulo

22

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

Page 23: Guia de Estudo TEO-P5

Eclesiologia: identidade, sacramentos e

propósitos da Igreja Cristã como sinal do

Reino de DeusProf. Dr. Helmut Renders

Objetivos: Introduzir aos elementos básicos da eclesiolo-gia protestante, coerentes em relação à heran-ça bíblico-dogmática e consistentes na consi-

deração das suas implicações práticas.

Palavras-chave:Eclesiologia; Batismo; Santa Ceia; Marcas da

Igreja; Comunhão dos Santos.

Módulo

www.metodista.br/ead

Teologia sistemática e ecumenismo

Page 24: Guia de Estudo TEO-P5

Damos, nesta unidade, preferência aos elementos classicamente usados no protestantismo histórico para descrever a Igreja Cristã, ou seja, a comunhão dos fiéis, o anúncio da palavra, a admi-nistração certa dos sacramentos, as marcas da igreja e, no caso da tradição reformada, a disciplina.

1. Comunhão dos/as que buscam e crêem: a união heterogênea do Reino

Segundo o Credo Apostólico, a igreja é “comunhão dos/as santos/as”. O protestantismo acen-tuou essa descrição referindo-se à igreja como “comunhão dos/as fiéis” ou reinterpretou “santo” como necessitando a graça incondicionalmente cedida por Jesus Cristo. Ainda mais, a igreja tam-bém é vista como “comunhão dos/as pecadores/as”, e no caso do metodismo, “comunhão daqueles que buscam (Deus)”. A compreensão da igreja, como forma social do evangelho, une um realismo antropológico (falibilidade) com a esperança expressa nas suas definições mais teocêntricas, como “povo de Deus”, “corpo de Cristo” ou “templo do Espírito Santo”.

1.1 Um evangelho para todos os povosDesde seu início a igreja luta com a sua diversidade. Perma-

nentemente, os apóstolos exortam e motivam as suas comunidades para serem “unidos de alma” e superar “partidarismo” e sensações da própria “superioridade” (Fl 2.1-4). O povo de Deus é heterogê-neo desde seu início por responder de forma ampla ao convite da graça universal. Assim o evangelho transcende aspectos culturais, étnicos, de gênero e de classe social, sem negá-los (At 1. 8; 2. 16-18 e 4. 32-35).

1.2 Servindo a Deus e à humanidadeA única forma de manter um corpo heterogêneo unido é a atitude do serviço mútuo. Desde

o início, este aspecto essencial foi vivenciado de formas diferentes. A ordem presbiterial (anciãos) segue a estrutura da sinagoga e parece ter sido, por um lado, mais igualitária, e, por outro lado, menos inclusiva (mulheres, jovens). Nos ambientes greco-romanos preferia-se a estrutura de dons e ministérios, que era mais inclusiva, porém, logo se hierarquizou (“maior” ou “menor” dom). O serviço é sempre a Deus e à humanidade. Para garantir a qualidade do serviço, as igrejas ordenam pessoas (= eles estão em ordem para exercer seu ministério). A ordenação confirma vocação, carisma (atitude de servir com seus talentos) e formação da pessoa de forma comunitária. Recentemente, fala-se muito da “unção” (teocêntrico), às vezes, usada como elemento revolucionário (leigos/as ungidos/as contra pastores/as ordenados/as), às vezes, como elemento da afirmação das estruturas de poder estabelecido. Como a unção afirma somente vocação e carisma, mas não formação, ela pode ser um elemento adicional, mas não um substituto.

1.3 Interpretando a palavra, orientando e ajudando na vidaO ministério fundante é o “da palavra”, ou seja, da adequada interpretação da tradição apos-

tólica e do anúncio relevante do evangelho. Além disso, foram desenvolvidos ministérios litúrgicos e de serviço. A igreja protestante enfatiza a centralidade do “anúncio do evangelho” e da “certa administração dos sacramentos” como constituti-vos para a Igreja. Eles rejeitam uma compreensão formal (forma litúrgica -culto; eclesiástica - governo). O desenvolvimento do ministério leigo, às vezes visto como sacerdócio universal (visão teocêntrica do laicato) precisa avançar.

Ordenação de uma pastora

Imag

em 6

Banco de imagens

Universidade Metodista de São Paulo

24

Page 25: Guia de Estudo TEO-P5

1.4 O ministério femininoNuma perspectiva cronológica, o ministério femini-

no foi aceito em muitos momentos iniciais da Igreja. Com a sua institucionalização, as mulheres, em alguns casos, perderam este lugar (compare a práxis de John Wesley com o metodismo do século XIX), dependendo do con-texto cultural e da classe social atingida.

No século XX, retornaram algumas igrejas para seus inícios, (metodismo, anglicanismo), outras, criaram as condições pela primeira vez (luteranos). Às vezes, houve restrições graduais (missionária - possível; pastora - im-possível)). A maioria das igrejas brasileiras rejeita o pleno ministério feminino. Até a revisão desta situação, a sua defesa será uma questão da educação cristã contínua.

2. Batismo: sinal visível da graça invisível que constitui a comunidade do Reino de Deus

O batismo de crianças se baseia na compreensão teocêntrica, sobretudo, da primazia da graça. O entendi-mento do batismo de adulto como “testemunho” ou ato de obediência às ordenanças de Jesus revela um caráter mais antropocêntrico (inclusivo da necessidade de poder “sentir” o batismo). Enquanto os textos bíblicos mantém uma compreensão sacramental (incondi-cionalidade da iniciativa divina; cf. Tt 3.4-7) eles também destacam a importância da resposta (cf. Ap 3.20) e responsabilidade humana.

2.1 Um só batismo, em duas formas e diferentes modosNesta “relacionalidade” baseia-se a interpretação metodista. A observação de ou uma única

forma no sentido de seqüência (1º batismo, depois a fé; 1º fé, depois o batismo), ou de um único modo (derramamento, aspersão, imersão, tripla imersão) não preserva a essência do batismo. Ele deve acontecer na comunidade como proclamação da graça de um outro modo e sinal da inclu-são da igreja invisível (universal), o que no caso de um batismo de um/a adulto/a coincide com a recepção na membresia de uma igreja visível ou empírica.

2.2 Batismo, profissão da fé e colaboração na missãoO batismo de uma criança cumpre a sua promessa inerente na confissão da sua fé, formal-

mente, recepção como membro. A profissão pública da fé (ou confirmação, etc.), no meio da comu-nidade, é um dos momentos altos da vida cristã. A relacionalidade entre os dois momentos deve sempre ser destacada quando eles acontecem. A inclusão voluntária e consciente na comunidade leva à participação na sua missão e é acompanhada pela vontade de amadurecer. Quem enfatiza o aspecto teocêntrico do batismo jamais iria rebatizar pessoas, basta seu caráter trinitário (para muitos batistas, um “rebatismo” poderia ser somente um segundo batismo de uma pessoa crente já no momento do seu primeiro batismo). Pela mesma razão que o rebatismo de uma pessoa ba-tizada como criança é desnecessário, também não precisa se batizar em situações de vida e morte: a graça é salvadora, não o batismo em si ou certo modo, ou momento do batismo.

O batismo de uma criança cumpre a sua promessa inerente na confissão da sua fé,

formalmente, recepção como membro.

Imag

em 7

25

www.metodista.br/ead

Page 26: Guia de Estudo TEO-P5

2.3 Renovação batismalIgrejas que praticam o pedobatismo criaram, nas últimas décadas, rituais de renovação ba-

tismal. Eles valorizam o aspecto antropológico do aspecto teocêntrico, sem negar o último.

3. Santa Ceia: sinal visível e antecipação do Reino de DeusPara Zuínglio, a Santa Ceia é um mero ato memorial

(hiperantropocêntrico), o catolicismo defende a transubstan-ciação (hiperteocêntrico) e os luteranos a consubstanciação (presença cristológica sem fusão entre representação e re-presentado). Enquanto a rejeição do batismo católico é um fenômeno protestante, o catolicismo não admite a comunhão eucarística aos não-católicos. Os dois sinais centrais visíveis da graça invisível são reduzidos a sinais confessionais. Assim, não são sinais da inclusão e a participação da sociedade do Reino de Deus que transcende as confissões e denominações.

3.1 A Santa Ceia aberta como “graça que converte”

No metodismo, a Santa Ceia é vista como proclamação do evangelho sem palavras e, por causa disso, também como “graça que converte”. Celebra-se uma Ceia aberta, inclusive aberta às pessoas que buscam Deus com sinceridade e às crianças. Liturgicamente, a Ceia combina os aspectos do perdão (participação do Judas), da comunhão com Cristo na igreja visível e invisível; da comunhão fraterna, da antecipação do Reino e da esperança escatológica.

3.2 A Ceia não aberta, a excomunhão e a disciplinaEnquanto o catolicismo pratica a “excomunhão”, igrejas na tradição reformada defendem a

“exclusão (temporária) da Ceia”. No segundo caso, reduz-se “disciplina” ao exercício de punição (“colocar em” disciplina). Em consequência, essas igrejas celebram uma Ceia “fechada”. Conseqüen-temente, a tradição metodista vê disciplina como atitude ou virtude (discípulos/as vivem uma vida disciplinada; nome dos Cânones da Igreja Metodista: “Doutrina e Disciplina” = “fundamentos” e “exercícios” da imitação de Cristo).

4. As “marcas da Igreja” como sinais da antecipação do Reino de DeusSegundo o Credo Niceno-Constantinopolitano, a Igreja é una, santa, católica e apostólica.

Mas, tratam-se de sinais da Igreja encoberta / invisível ou da(s) igreja(s) visíveis? Algumas igrejas tendem a quase identificar as duas (Igreja Católica; algumas igrejas pentecostais ou comunidades congregacionais), outras expressam mais uma compreensão relacional como entre “alma” e “corpo” (luteranos, metodistas). O maior distanciamento é defendido pela teologia reformada (Igreja invisível = os/as predestinados/as; igreja visível = as/os – somente – vocacionadas/os). Lemos essas marcas como sinais da plenitude do Reino de Deus. A sua antecipação, mesmo fragmentada, é um sinal de esperança, apesar de que as igrejas, nem cada uma para si, nem em conjunto, representam “`o´ corpo de Cristo”, “`o´ templo do Espírito Santo” ou “`o´ povo Deus” na sua totalidade.

Imagem 8

Santa Ceia do Altar da Reforma na Igreja de Wittenberg, Alemanha

Universidade Metodista de São Paulo

26

Page 27: Guia de Estudo TEO-P5

Referências

CONSELHO MUNDIAL DE IGREJAS. Batismo, eucaristia e ministério: convergência da fé. Brasília, DF: CONIC / Koinonia / Aste, 2001. [3ª edição] 71p.

GARCIA, Paulo Roberto. “`Isto é o meu corpo´: rituais de alimentação e interação social no cristianismo primitivo”. In: Caminhando (online), Brasil, vol. 12, n. 2 (2007). Disponível em: < https://www.metodista.br/revistas/revistasmetodista/index.php/CA/article/view/1233 >. Acesso em: 22 jan. 2010.

LOPES, Edson Pereira; FERNANDES, Janniere Villaça da Cunha. Santa Ceia: uma das mais signifi-cantes controvérsias entre os reformadores Lutero, Zwínglio e Calvino. In: Ciências da Religião História e Sociedade, vol. 6, n. 2, p. 98-122. (2008). Disponível em: < http://www3.mackenzie.br/editora/index.php/cr/article/view/424/250 >. Acesso em: 22 Jan. 2010.

REILY, Duncan Alexander. Ministérios femininos em perspectiva histórica. Campinas, SP / São Bernardo do Campo, SP: Cebep / Editeo, 1997. [2ª edição] 219p.

RENDERS, Helmut. Um só batismo, em duas formas e diversos modos: fundamento e com-preensão de uma prática batismal incomum no solo brasileiro. In: Caminhando (online), Brasil, vol. 12, n. 1, (2007). Disponível em: < https://www.metodista.br/revistas/revistas-metodista/index.php/CA/article/view/1198 >. Acesso em: 22 jan. 2010.

SOUZA, Jose Carlos de. Caia do Senhor e hospitalidade eucarística: uma perspectiva me-todista. Caminhando [revista da Faculdade de Teologia da Umesp], vol. / ano 6, n. 8 (2. sem. 2001), p. 27-46.

Imagem 6Disponível em: < http://kwc.brickriver.com/files/oPictures_Pages_HSBCSF/Ordination-DT-RF-byLED_TKY3GEUE.jpg >. Acesso em: 20 jun 2008.

Imagem 7Batismo de criança (tripla imersão?): Imagem parcial do Altar da Reforma na Igreja de Wittenberg, Ale-manha (Foto: Arquivo H. Renders). Batismo de adulto por imersão (Foto: Arquivo H. Renders)

Imagem 8Santa Ceia: Imagem parcial do Altar da Reforma na Igreja de Wittenberg, Alemanha (Foto: Arquivo H. Renders).

27

www.metodista.br/ead

Page 28: Guia de Estudo TEO-P5

Universidade Metodista de São Paulo

28

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

Page 29: Guia de Estudo TEO-P5

Módulo

www.metodista.br/ead

Ecumenismo: uma história de separação

e busca da unidade

Prof. Dr. José Carlos de Souza

Objetivos: Analisar e comparar os diferentes argumentos

levantados contra e a favor do movimento ecu-mênico;

Examinar o processo de divisão na história do cristianismo e as origens atuais da busca pela

unidade das igrejas.

Palavras-chave:Divisão; unidade; diversidade; ecumenismo; missão.

Teologia sistemática e ecumenismo

Page 30: Guia de Estudo TEO-P5

Um tema polêmico Falar sobre ecumenismo desperta fortes paixões. Trata-se de uma questão controversa, viva-

mente debatida em inúmeros círculos da Igreja de Cristo. De um lado estão todas as pessoas que entendem que o testemunho de sua fé requer o empenho consciente para manifestar, em respeito, diálogo e, sobretudo, amor, a unidade que existe em Cristo. A indiferença, a competição, quando não a hostilidade sistemática, são vistas como a negação da mensagem de comunhão e fraternida-de anunciada no Evangelho. Nesse sentido, tais atitudes se constituem em verdadeiras pedras de tropeço, no sentido bíblico, para aqueles que não crêem. Afinal, como acreditar que “Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo” (2 Co 5.19), se as comunidades cristãs se encontram tão divididas e se mostram incapazes de conviver em harmonia umas com as outras? Diante disso, é preciso se perguntar com toda a honestidade: será que a diversidade de opiniões e práticas justifica a absoluta separação e a animosidade entre aqueles que se proclamam discípulos do “Príncipe da paz”? De qualquer modo, não há dúvidas de que Jesus quis ardentemente a unidade entre os seus seguidores a ponto de rogar ao Pai: “que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17.21).

De outro lado, muitas pessoas se opõem, com veemência, ao movimento ecumênico. Receiam que o diálogo com quem pensa diferentemente conduza ao desprezo pela “fé que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd 3). Preocupadas com a identidade denominacional, mostram-se reticentes a qualquer tipo de associação que possa ser interpretada como concessão ao erro. Assim como crentes e descrentes não podem estar sob o mesmo jugo, também não deve existir comunhão entre a luz e as trevas (cf. 2Co 6.14). A profissão da reta doutrina, argumenta-se, exige que se separe cuidadosamente o trigo do joio. Além disso, segundo alguns críticos, a prática ecu-mênica contribui para atenuar a preocupação com a evangelização na medida em que os mem-bros de outras igrejas já não são mais vistos como público-alvo da pregação, e sim como irmãos em potencial. Aos poucos, o anúncio das boas novas perde a sua urgência enquanto, na mesma proporção, a tarefa de reunir as famílias cristãs cresce em importância. Deve-se considerar, ainda, o temor que grupos cristãos minoritários revelam de ser absorvidos por organismos eclesiásticos numericamente mais expressivos.

Enfim, a má compreensão do que é ecumenismo, geralmente associada à desinformação e ao preconceito, também é fonte de receios, polêmicas e rejeição.

O fato é que ninguém pode permanecer indiferente quanto a esse assunto. Antes, deve fir-mar a sua posição de forma consciente e refletida. Convém levar em conta todos os argumentos, avaliando os prós e os contras. O amor é essencial, mas a busca da verdade não pode ser desva-lorizada. Desprovido do amor, contudo, o mero apego à verdade leva facilmente ao fanatismo e à intolerância. Por essa razão, a recomendação do apóstolo é surpreendentemente atual e pode ser renovada para os dias de hoje: “Segui a verdade em amor...” (Cf. Ef 4.15,16).

Uma triste história de separações Infelizmente, as divisões na Igreja de Cristo não são fenômenos exclusivos da presente época.

Ao contrário, desde as origens do cristianismo, tendências divisionistas ameaçam fracionar o corpo de Cristo, diluindo a força do testemunho evangélico. Mesmo entre os apóstolos, o desejo de ser maior no reino dos céus, isto é, a luta pelo poder, gerou discórdias e tensões (Cf. Lc 9.46-48). Con-flitos também se instalaram na comunidade de Jerusalém, dividida entre hebreus e helenistas (At 6.1-7) e a disputa em torno da validade da lei mosaica pôs em perigo a unidade da Igreja nascente (At 15.1-35). Em particular, a igreja em Corinto demonstra as dificuldades de se manterem os elos da comunhão cristã numa comunidade dividida, seja pela predileção por este ou aquele líder (1 Co 1.10-13), seja pelas diferenciações sociais que se refletiam especialmente na celebração da Ceia do Senhor (1 Co 11.17-22). Apesar de tudo, a igreja na era apostólica soube superar tais crises, buscou o diálogo e preservou a unidade do Espírito na multiplicidade dos dons concedidos.

Universidade Metodista de São Paulo

30

Page 31: Guia de Estudo TEO-P5

Porém, os desafios se ampliavam com o passar dos tempos. Movimentos religiosos, como o gnosticismo e o montanismo, requeriam da liderança cristã firme posicionamento. A igreja assume, assim, maior rigidez institucional e doutrinária. A adoção de uma regra de fé, a definição do cânon do Novo Testamento e a submissão à autoridade dos bispos foram medidas necessárias para enfrentar as correntes que questionavam o ensino dos apóstolos. De qualquer modo, a teologia cristã procu-rava ser inclusiva, abrangendo tendências diferentes que mantivessem fidelidade ao que era considerado fundamental.

A máxima atribuída a Agostinho bem expressa a intenção almejada: “No essencial, unidade; no que é secundário, liberdade; em todas as coisas, a caridade”.

A situação se modifica quando, no século IV, o cristianismo é reconhecido como religião lícita e, final-mente, oficial nos limites do Império Romano. Fatores de ordem política impõem a uniformidade das práticas religiosas como instrumento para assegurar a integrida-de do Estado. Os concílios gerais procuram solucionar as controvérsias em torno da Trindade, da cristologia e da natureza da igreja e dos sacramentos, mas não conseguem impedir que divisões se estabeleçam definitivamente. As igrejas orientais antigas se constituem nas regiões limítrofes do Império e, depois do surgimento do islamismo, se desenvolvem em completo isolamento.

No ano 1054, ocorre o chamado Grande Cisma, separando a Igreja Ortodoxa (Oriental) da Igreja Católica (Ocidental), num processo complexo que envolve fatores geográficos, políticos, culturais, históricos, teológicos e práticos. Outra divisão, igualmente expressiva, teve ocasião no século XVI, quando Lutero e outros reformadores reivindicaram que a Igreja moldasse sua vida e missão pela norma do Evangelho. Desde então, diferentes interpretações, diretamente vinculadas ao contexto social em que surgiram, vêm fragmentando mais ainda o cristianismo, dando origem ao chamado denominacionalismo moderno.

A busca da unidadeA bem da verdade, deve ser dito que, em quase todos os momentos em que a separação

tomou forma, não faltaram vozes chamando o povo de Deus à comunhão e à unidade. Porém, o clamor isolado e descontínuo de alguns poucos indivíduos ou grupos foi se ampliando de tal maneira que, no final do século XIX e início do século XX, mobilizou igrejas inteiras, assumindo formas consistentes e ininterruptas que resultaram na criação de diversos organismos buscando promover, cada qual a seu modo, a integração, o diálogo e a cooperação entre cristãos de diferentes confissões. É significativo que a Conferência Missionária de Edimburgo, em 1910, seja considerada o marco inicial do movimento ecumênico, pois, ao reunir delegação oficial das sociedades mis-sionárias, expôs tanto o escândalo das disputas entre as igrejas por fazer novos conversos quanto a necessidade de maior colaboração entre elas. Do mesmo modo, deixou patente que a unidade cristã não pode ser dissociada da missão, da preocupação com a união de todos os povos na oi-koumene, isto é, em toda a Terra habitada (Cf. Mt 24.14; Lc 21.26; At 17.6, etc).

Outros movimentos fortaleceram a caminhada ecumênica: da juventude, dos educadores, do cristianismo prático, dos diálogos teológicos, da oração, etc. O fato de que a preocupação pela unidade das Igrejas tenha renascido intensamente nos campos missionários e entre as pessoas comprometidas com a prática do cristianismo nas contradições da sociedade atual é de grande

Os concílios gerais pro-curam solucionar as

controvérsias em torno da Trindade, da cristo-logia e da natureza da igreja e dos sacramen-tos, mas não consegue impedir que divisões se estabeleçam definitiva-

mente.

31

www.metodista.br/ead

Page 32: Guia de Estudo TEO-P5

relevância simbólica. Revela que a busca pela unidade cristã deve ser compreendida como teste-munho e serviço, jamais como fim em si mesmo.É importante assinalar que o ecumenismo, como movimento, não se identifica com nenhuma instituição em particular. Nenhuma agência ou or-ganismo detém o seu monopólio. Como fruto do Espírito de Deus, às vezes ele sopra em lugares inesperados. É preciso abertura e discernimento para seguir a sua direção.

Referências

BRAKEMEIER, Gottfried. Preservando a unidade do Espírito no vínculo da paz: um curso de ecumenismo. São Paulo: Aste, 2004.

CONIC & CLAI. Diversidade e comunhão: um convite ao compromisso. São Leopoldo/São Paulo: Sinodal/Paulinas, 1998.

CUNHA, Magali. Quando a vida supera as fronteiras: unidade e cooperação na promoção da justiça, da paz e da integridade da criação. Caminhando (online), Brasil, vol. 12, n. 1 (2002). Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-metodista/index.php/CA/article/view/1221. Acesso em: 6 maio 2010.

PINTO DE CASTRO, Clovis. Viver na dimensão do cuidado: a relação entre santidade social e a vocação pública do metodismo. Caminhando (online), Brasil, vol. 8, n. 2 (2003). Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-metodista/index.php/CA/article/view/1432. Acesso em: 22 jun. 2010.

SANTA ANA, JúLIO H. de. Ecumenismo e libertação: reflexões sobre a relação entre a unidade cristã e o reino de Deus. Petrópolis: Vozes, 1987.

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

Universidade Metodista de São Paulo

32

Page 33: Guia de Estudo TEO-P5

Ecumenismo: múltiplas formas,um só propósito

Prof. Dr. José Carlos de Souza

Objetivos: Identificar organismos, grupos, agências

e instituições que promovem o movimento ecumênico, ressaltando as principais tarefas que

a prática ecumênica requer hoje das Igrejas Cristãs; Estabelecer os vínculos estreitos que unem os esforços em prol da

unidade da Igreja com a missão, a defesa da vida e a luta pela justiça e os direitos humanos.

Palavras-chave:Conselho Mundial de Igrejas; catolicismo;

testemunho social; diálogo; serviço.

Módulo

www.metodista.br/ead

Teologia sistemática e ecumenismo

Page 34: Guia de Estudo TEO-P5

O Conselho Mundial de IgrejasNão há dúvida de que o movimento ecumênico é maior do que do que as organizações que

o promovem, sejam elas tomadas separadamente ou em conjunto. As várias formas de prática ecumênica não se excluem mutuamente, mas se complementam, contribuindo para gerar um clima de fraternidade e cooperação entre igrejas, agências e fiéis de diferentes confissões cristãs, as quais se mostram empenhadas mais em sinalizar o reino de Deus e defender a vida, em suas múltiplas manifestações, do que em se fecharem nas suas próprias realizações e conquistas. Toda a prioridade deve ser dada à missão de Deus!

De qualquer modo, nesse horizonte mais amplo, alguns organismos se destacam, entre eles, o Conselho Mundial de Igrejas (CMI), considerado a mais expressiva manifestação do movimento ecumênico, seja por sua presença em todos os continentes, seja pelo alcance de sua representa-tividade teológica, seja, ainda, pela força de seu testemunho. A decisão de formar um conselho de igrejas, reafirmada pelos movimentos “Vida e Ação” e “Fé e Constituição”, em suas respectivas assembléias em 1937, não pôde ser implementada pela comissão instituída em 1938. A eclosão da 2ª Grande Guerra retardou esse acontecimento até agosto de 1948, quando se realizou a as-sembléia de fundação do CMI, em Amsterdã, na Holanda, com a participação de 350 delegados, representando 147 igrejas, de 44 países diferentes. Sob o tema “A ordem de Deus e a desordem do homem”, consideram-se as principais tarefas das igrejas cristãs num mundo marcado pela guerra e dividido por grandes tensões políticas e ideológicas. Desde cedo, descobriu-se que a unidade dos cristãos não poderia ser concebida à parte dos conflitos que dilaceram a sociedade humana.

Essa percepção foi plenamente confirmada nas oito assembléias subseqüentes realizadas em Evanston, Estados Unidos (1954); em Nova Délhi, Índia (1961); em Uppsala, Suécia (1968); em Nairobi, Quênia (1975); em Vancouver, Canadá (1983); em Canberra, Austrália (1991); em Harare, Zimbábue (1998); e em Porto Alegre, Brasil (2006). Não apenas o número de igrejas-membro cresceu continuamente, mas também a representação das grandes famílias confessionais foi ampliada. Se, no início, o CMI reunia quase exclusivamente as igrejas de tradição protestante da Europa e América do Norte, hoje congrega cerca de 350 igrejas, representando mais de 550 milhões de cristãos, de diferentes orientações: protestantes, ortodoxas, anglicanas, pentecostais, unidas, e outras, procedentes de mais de 110 países de cinco continentes. No Brasil, apenas seis igrejas integram o CMI, a saber, a Metodista (a primeira a aderir ao CMI na América Latina, em 1942, portanto, antes da assembléia constitutiva), a Episcopal Anglicana, a Cristã Reformada, a Evangélica de Confissão Luterana, a Presbiteriana Unida e a Presbiteriana Independente (esta a partir da última assembléia). Por algum tempo, a Igreja Pentecostal “O Brasil para Cristo” também esteve associada ao CMI. O perfil conservador da religião, fortalecido por campanhas antiecumê-nicas, é um dos fatores que explica a pouca adesão das igrejas brasileiras ao CMI.

O Conselho Mundial de Igrejas define a si mesmo como “uma comunidade de Igrejas que confessam o Senhor Jesus Cristo como Deus e Salvador, segundo o testemunho das Es-crituras, e procuram responder, juntas, à sua vocação comum para a glória do Deus único, Pai, Filho e Espírito Santo” (base constitutiva). Não pretende ser uma superigreja, nem possui qualquer jurisdição sobre as igrejas-membro. Não impõe nem despreza qualquer visão eclesiológica. Antes, possibilita que as Igrejas preservem a sua identidade, inserindo-as, contudo, numa comunhão eclesial mais dilatada. A sua estrutura inclui a assembléia geral, um comitê central, um comitê executivo, um secretário geral e órgãos consultivos. Na última assembléia, em Porto Alegre, foram definidos seis programas para os próximos sete anos: (1) o CMI e o movimento ecumênico no século XXI; (2) Unidade, missão, evangelização e espiritualidade; (3) Testemunho público: confrontar o poder, afirmar a paz; (4) Justiça e diaconia; (5) Educação e formação ecumê-

O Conselho Mundial de

Igrejas define a si mesmo como

“uma comunidade de Igrejas que confessam

o Senhor Jesus Cristo como

Deus e Salvador.

Universidade Metodista de São Paulo

34

Page 35: Guia de Estudo TEO-P5

nica; e (6) Diálogo e cooperação inter-religiosos. Desta forma, o CMI busca responder aos enormes desafios que as comunidades cristãs enfrentam no tempo presente.

A Igreja Católica e o movimento ecumênico Convém esclarecer que a Igreja Católica Apostó-

lica Romana (ICAR) não é membro do CMI. Aliás, até o Concílio Vaticano II, nos anos 1962-1965, os católicos romanos mantiveram-se oficialmente distantes de qualquer forma de colaboração ecumênica, quando não se mostraram inteiramente contrários a ele. O tom geral foi dado pelo Papa Pio XI, na encíclica Mortalium Animos, de 1928, na qual o envolvimento dos católicos nos chamados movimentos “pancristãos” foi totalmen-te interditado. A única forma de unidade admitida, naquele momento, era o retorno dos filhos rebeldes ao seio da Igreja-mãe. O importante é que a proibição não impediu que os católicos buscassem, cada vez mais, tanto o conhecimento quanto a comunhão com outros cristãos, quer ortodoxos quer evangélicos, e vice-versa. As crises que assolavam a sociedade euro-péia e o mundo relativizavam as diferenças, exigindo a colaboração intensa entre as comunidades cristãs. Assim, quando o papa João XXIII revelou a sua inten-ção ecumênica, ao convocar o Concílio, o caminho se encontrava pavimentado para o diálogo. Entre os vários documentos aprovados pelo Vaticano II, o decreto so-bre o ecumenismo, intitulado Unitatis Redintegratio (A reintegração da unidade), demarcou uma nova maneira de ver a questão. Os bispos conciliares afirmaram a parcela de culpa da ICAR nas separações, reconheceram a existência de autênticos valores nas demais comunidades e igrejas, e se dispuseram para a conversação teológica e a cooperação cristã em vários campos. A expressão “irmãos separados” substituiu os termos “he-reges” e “rebeldes”, usualmente empregados para se referir aos demais cristãos.

A partir de então, criou-se a Secretaria para a Unidade dos Cristãos, posteriormente trans-formada em Conselho Pontifício, e se estabeleceram diálogos bilaterais e multilaterais com todas as famílias confessionais. A Declaração conjunta sobre a justificação por Graça e Fé foi assinada em 1999 por luteranos e católicos representa um dos pontos culminantes desse processo. Apesar de não ser filiada ao CMI em função de sua própria compreensão eclesiológica, a Igreja Católica Romana mantém estreitos laços com este conselho, participando em comissões mistas e inúmeros grupos de trabalho e, desde 1961, tomando assento por meio de observadores nas assembléias gerais.

Obviamente, persistem inúmeras dificuldades. Há problemas não resolvidos. Tendências conservadoras recobram as forças e impõem um modelo de igreja que reforça a identidade ro-mana e se afasta do consenso em torno dos elementos comuns partilhados por todos os cristãos. Documentos oficiais recentes, ao mesmo tempo que reiteram o compromisso ecumênico, também estabelecem limites que parecem ignorar as convergências já alcançadas.

É o caso da declaração Dominus Iesus e da encíclica papal Ecclesia de Eucharistia, de 2003. Não obstante, um longo trajeto foi percorrido e o catolicismo atual, definitivamente, não é mais uma realidade monolítica. Parte significativa, tanto do laicato quanto do clero, não aceita passivamente restrições impostas por sua hierarquia e aspira por comunhão mais efetiva com outras comunidades cristãs, especialmente na dimensão do serviço e da solidariedade com os que sofrem. Este anseio revela a importância crescente dos organismos ecumênicos com base regional e local.

A declaração conjunta sobre a justificação por

Graça e Fé, assinada, em 1999, por luteramos e ca-

tólicos.

35

www.metodista.br/ead

Page 36: Guia de Estudo TEO-P5

Ecumenismo no BrasilEssa última afirmação leva à reflexão sobre a realidade brasileira. Aqui, como na América

Latina, o ecumenismo também contou com a iniciativa das igrejas protestantes que, a partir do Congresso do Panamá em 1916, procuraram integrar, de forma consciente e planejada, os seus esforços missionários. A partir dos anos 1960, contando já com a participação de católicos roma-nos, vários organismos foram criados, procurando responder, sobretudo, às tarefas do serviço e testemunho cristão. Não poderia ser diferente, em face da realidade de pobreza e desigualdade que marca o contexto brasileiro. Merecem destaque particular o CLAI, Conselho Latino-Americano de Igrejas, e o CONIC, Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, ambos fundados em 1982, em virtude de contar com a adesão oficial das Igrejas, e não apenas com a participação de indivíduos bem intencionados. São muitos os obstáculos que persistem no movimento ecumênico, assim como são inúmeras as formas de concretizá-lo, porém, um único propósito motiva esse compromisso: manifestar visivelmente a unidade que há em Cristo no serviço e na comunhão do reino.

Referências

Krüger, Hanfried. O Conselho Mundial de Igrejas. São Leopoldo: Sinodal, 1987.

Plou, Dafne Sabanes. Caminhos da unidade: itinerário do diálogo ecumênico na América Latina. São Leopoldo: Sinodal, 2002.

Wolff, Elias. Caminhos do ecumenismo no Brasil: história, teologia, pastoral. São Paulo: Pau-lus, 2002.

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

Universidade Metodista de São Paulo

36

Page 37: Guia de Estudo TEO-P5

Introdução ao grego bíblico –

o substântivo

Prof. Dr. Paulo Roberto Garcia

Objetivos: Apresentar elementos instrumentais da língua grega que facilitem o uso de instrumentos de

tradução do texto bíblico, como dicionários bíblicos, gramáticas da língua grega, interline-

ar grego e português, etc. O objetivo é o de proporcionar subsídios para leituras de textos

teológicos e pastorais, aprofundando o conhe-cimento do texto neotestamentário através de

sua língua original.

Palavras-chave:Grego bíblico; declinações; substantivo.

Módulo

www.metodista.br/ead

Exegese do Novo Testamento: metodologia e evangelho

Page 38: Guia de Estudo TEO-P5

Introdução

a) O Grego e o Novo TestamentoO Novo Testamento foi escrito em Grego. Isso é intrigante. Por que o Novo Testamento foi

escrito em Grego, se ele surgiu a partir de um movimento que falava aramaico (língua de Jesus e de seus discípulos) e em um período de dominação romana (em que língua de Roma era o latim)?

A resposta pode ser encontrada quando nos lembramos que a dominação romana foi pre-cedida pela dominação helênica, a qual estabeleceu o grego como uma língua franca, ou seja, comum em todas as regiões que estavam sob a influência do Império de Alexandre, o Grande, e seus generais, herdeiros de seu império.

Por isso, o grego do Novo Testamento não é o mesmo grego usado por Homero, o grego clássico. É uma versão da língua mais comum, língua do comércio. Por isso é chamado de Grego Koine, ou seja, grego comum.

Ainda assim, quando comparado com o Português, esse grego comum do Novo Testamento deve ser considerado como uma língua rica, com muita precisão no uso de palavras, de tempos verbais e de vocabulário.

b) Por que estudar grego?Há um antigo ditado italiano que diz que o tradutor é um traidor. Sempre que alguém traduz

algo, muito do sentido do texto original se perde, especialmente quando traduzimos um texto de uma língua rica para uma língua pobre ou uma língua não tão precisa em termos de vocabulário. Para exemplificar isso, e nos motivar ao estudo, vamos demonstrar em um texto bíblico como a tradução faz diferença.

O texto é a perícope sobre a cura de um coxo (At 3.1-10). Vamos examinar apenas os versículos 3 a 5. Na primeira coluna temos o texto em português. Na segunda o texto em grego (assim você já vai se acostumando com a língua). Na última coluna temos as observações sobre a tradução.

3 Vendo ele a Pedro e João, que iam entrar no templo, im-plorava que lhe dessem uma esmola.

O coxo vê os discípulos. O verbo ver aqui é o oraw, que significa perceber, observar.

4 Pedro, fitando-o, juntamente com João, disse: Olha para nós.

5 Ele os olhava atentamente, esperando receber alguma coisa.

Finalmente, o coxo olha aten-tamente (epexo), esperando receber algo.

O verbo atenizo tem o sen-tido de olhar atentamente. É o mesmo verbo usado no texto do jovem rico que diz que Jesus olhou e o amou.Já no pedido de Pedro (Olha para nós) o verbo usado é o blepo, que significa prestar atenção.

Almeida Revista e Atualizada Grego Nestle Alland, 27ª Edição Observações

Universidade Metodista de São Paulo

38

Page 39: Guia de Estudo TEO-P5

Nesse exemplo, percebemos que um pequeno relato de três versículos apresenta quatro ver-bos diferentes para o mesmo ato de ver (oraw, atenizo, blepo, epexo). O que muda é a intensidade do olhar. Enquanto o coxo tem verbos ligados ao olhar que percebe potenciais ofertantes de esmola, prestando atenção aos discípulos, com a expectativa de receber algo, o olhar de Pedro é um olhar interessado, apaixonado. Essa diferença na intensidade desenha o relato como um todo e mostra uma nova possibilidade de interpretação, aprofundando o sentido do relato. A cura, que quase não é mencionada, não é o ponto central no texto. O que é central é o olhar que, contrariando a lógica da época, não ignora e não discrimina o enfermo. Muito pelo contrário, olha apaixonado e profundamente, interessado nele.

A partir dessa discussão vemos que, mesmo buscando estabelecer diferenças na tradução, pelo fato de nossa língua não ser tão precisa, nossas traduções não conseguem expressar essa riqueza da língua grega. Por isso, precisamos recorrer ao texto em sua língua original.

O Substantivo

Objetivo: O objetivo desta aula é o de entender o substantivo grego, com ênfase especial nas declinações.

1. Compreendendo uma língua com declinações do substantivoA declinação dos substantivos é uma novidade para quem está acostumado com a gramáti-

ca da língua portuguesa. Para introduzir o conceito de declinação, vejamos primeiro como nossa língua funciona.

Exemplo 1: o homem e o cavalo – no portuguêsVejamos as seguintes frases:

O homem comprou o cavalo.O cavalo carrega o homem.

Na primeira frase o sujeito da frase é o homem e o objeto direto é o cavalo. Já na segunda frase o sujeito da frase é o cavalo e o objeto direto é o homem. Perceba que a forma de escrever homem e cavalo, nas duas frases, não muda. Isso parece obvio para nós que fomos alfabetizados dessa forma. No exemplo estudado, a pergunta que nós não fizemos foi: como o substantivo ho-mem, tanto ao cumprir o papel de sujeito como ao cumprir o papel de objeto direto, permanece invariável na sua forma? Ela não muda. E se mudasse? Isso é o que acontece com o substantivo em uma língua declinada, conforme a função que ele exerce na frase. Veremos isso no exemplo 2.

Exemplo 2: o homem e o cavalo – no gregoContinuemos com as mesmas frases:a) O homem comprou o cavalo.b) O cavalo carrega o homem.

39

www.metodista.br/ead

Page 40: Guia de Estudo TEO-P5

Na língua grega as palavras têm uma terminação específica para cada caso. Deste modo, se a palavra for um sujeito da frase ela tem uma terminação que indica isso. Se for objeto, ela tem outra terminação. Fica fácil, então, descobrir quem é o sujeito e quem é o objeto de uma frase. Para exemplificar, vamos reescrever a frase mantendo as palavras em português, mas acrescentando a terminação em grego:

a) O hom oz comprou o caval oub) O caval oz carrega o hom ou Perceba que quando o homem é sujeito ele é escrito de uma forma e quando é objeto, de

outra. Não há dúvida sobre sua função na frase.

Exemplo 3: o homem, o cavalo e a feiraNa frase anterior tínhamos uma frase com um sujeito e um objeto apenas. Vamos, agora, formular a frase com um sujeito, um objeto direto e um objeto indireto.

a) Frase em português: O homem comprou o cavalo na feira.b) Frase em português com terminação em grego: O homoz comprou o cavalou na feirw

Exemplo 4: embaralhando as palavrasAparentemente, não se percebe nenhuma vantagem em mudar terminações de acordo com a função que a palavra exerce na frase. Porém, vamos mostrar uma vantagem nesse processo. Para isso, precisamos embaralhar a frase: Frase embaralhada em português: Comprou o cavalo o homem na feira.Com algum esforço podemos entender a frase, porém ela fica estranha. Pode-se

perguntar: quem comprou quem? A frase fica duvidosa. O cavalo comprou o homem? O homem comprou o cavalo? Essa confusão não acontece no grego. Vejamos a mesma frase com as termi-nações em grego:

Frase embaralhada com terminações em grego: Comprou o cavalou o homoz na feir .Sabemos que o sujeito da frase é o homem, pois a terminação oz indica isso. Sabemos

que o objeto é cavalo, pois a terminação ou é a terminação do objeto direto (o que comprou). Finalmente, sabemos que o objeto indireto é feira, pois a terminação é a terminação do objeto indireto (aonde comprou. No grego, locativo – indicativo de lugar). Ou seja, não há como errar na hora da tradução.

ResumindoNo grego as palavras aparecem nas frases “vestidas para a ocasião”, ou seja. Elas são escritas

de acordo com a função sintática que elas desempenham. Por isso, é muito mais fácil analisar e, conseqüentemente, traduzir uma frase do grego para o português do que o inverso.

2. Declinações do substantivoNo grego do Novo Testamento, temos cinco declinações básicas (sendo que o dativo se

desdobra em dativo, dativo instrumental e dativo locativo):

Universidade Metodista de São Paulo

40

Page 41: Guia de Estudo TEO-P5

Declinação Função na frase Terminação em grego* Tradução

Nominativo

Acusativo

Dativo

Instrumental

Locativo

Genitivo

Vocativo

Sujeito

Objeto direto

Objeto indireto

Objeto indireto indicando o instrumento que realiza a ação

Objeto indireto indican-do o local onde a ação acontece

Interjeição. Chamado de atenção

log

log

log

log

log

log

log

A palavra

A palavra

Da palavra

Pela palavra

Na palavra

Desde a palavra ou (filho) da palavra

Palavra! Ou: Oh! Palavra!

Indica posse de alguma coisa ou origem de al-guém ou de alguma coisa

* Estamos apresentando a terminação singular das palavras da 2ª declinação. São três declinações em grego, de acordo com a termina-ção, gênero e características dos substantivos. Você deve verificar no material complementar uma tabela completa das declinações.Estamos usando “logos” (palavra) como paradigma. Vale destacar que em grego palavra é masculino. Por isso, muitas vezes se traduz por o verbo, pois a tradução literal seria o palavra.

Conclusão

a) Grego instrumental – o que é isso?Depois de você conhecer o que é uma declinação, podemos, agora, estabelecer as possi-

bilidades e os limites do aprendizado do grego para a exegese. Talvez você pense que, ao final do curso, você poderá ler o Novo Testamento em grego com fluência. Infelizmente não podemos prometer isso. Para ler o Novo Testamento em grego é necessário um curso de grego de quatro anos com a mesma dedicação que se pede para alguém que queira aprender, por exemplo, ale-mão. O nosso objetivo, ao final do curso é que, usando as ferramentas que temos para o Novo Testamento em Grego, você possa fazer uma tradução dos textos para preparar uma exegese e utilizar em um sermão, ou em um estudo ou ainda para preparar algum subsídio teológico. Para isso, detalharemos em material de apoio as ferramentas disponíveis e como elas serão úteis em tarefas de tradução de texto.

b) O que você será capaz de fazer ao final dessa unidade?Conhecendo o conceito do que é uma língua com declinações e as funções que um dativo

ou um nominativo, por exemplo, exerce na frase, você será capaz de, com ajuda das ferramentas de apoio que existem, traduzir frases simples. Com a próxima aula, que abordará o verbo, você poderá conhecer um pouco mais da riqueza desta língua.

41

www.metodista.br/ead

Page 42: Guia de Estudo TEO-P5

Material de apoio para essa unidade: Alfabeto Grego

Paradigmas da declinação do substantivo Exemplos de ferramentas de apoio para a tradução.

Referências bibliográficas

RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do Novo Testamento. São Paulo: Paulus. 2003.

SWETNAN, James. Gramática do Grego do Novo Testamento. São Paulo: Paulus. 2002. Vo-lumes 1 e 2.

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

______________________________________

______________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

______________________________________

______________________________________

Universidade Metodista de São Paulo

42

Page 43: Guia de Estudo TEO-P5

Introdução ao grego bíblico

– o verbo

Prof. Dr. Paulo Roberto Garcia

Objetivos: Apresentar elementos instrumentais da língua grega que facilitem o uso de instrumentos de

tradução do texto bíblico, como dicionários bíblicos, gramáticas da língua grega,

interlinear grego e português, etc. O objetivo é o de proporcionar subsídios para leituras de

textos teológicos e pastorais, aprofundando o conhecimento do texto neotestamentário

através de sua língua original.

Palavras-chave:Grego bíblico; verbo; tempos verbais; aoristo;

imperfeito.

Módulo

www.metodista.br/ead

Exegese do Novo Testamento: metodologia e evangelho

Page 44: Guia de Estudo TEO-P5

Introdução

a) O papel dos verbos nas línguasUm dos elementos mais importantes na construção

de uma língua é o verbo. Ele determina o andamento e a movimentação descritos em um texto. Veja, por exemplo, a seguinte frase: o homem o cavalo. Esses dois subs-tantivos, em verdade, não formam uma frase. Quando acrescentamos o verbo comprar, aí então surge uma frase: o homem comprou o cavalo. Com isso, podemos saber que o homem comprou o cavalo, a compra já está feita (por isso o verbo aparece no passado) e quem comprou o cavalo foi o homem. O verbo oferece todas as condições para descrevermos uma ação.

O verbo tem três dimensões:

Voz

Modo

Tempo Descreve o tempo em que a ação ocorre (passado, presente e futuro).

Descreve de que forma a ação é apresentada. O verbo pode indicar uma certeza (indicativo: o homem comprou o cavalo), pode indicar uma dúvida ou um desejo (subjun-tivo: que o homem compre o cavalo) ou pode indicar uma ordem (imperativo: Homem! Compre o cavalo!). Temos então três modos básicos: o indicativo, o subjuntivo e o imperativo, além do particípio (cavalo comprado), do gerúndio (comprando) e do infinitivo (comprar).

Banco de imagens

Determina se o sujeito da frase exerce (voz ativa: o ho-mem compra) ou sofre (voz passiva: o cavalo é comprado) a ação que o verbo descreve.

Além das dimensões da ação, o verbo descreve também quem pratica a ação (eu, tu ou ele) e quantas pessoas praticam a ação (singular – eu – ou plural – nós).

Resumindo

O verbo, ao descrever uma ação, informa ao leitor a pessoa (eu, tu, ele...) o número (singular ou plural); o tempo (passado, presente ou futuro); o modo (indicativo, subjuntivo ou imperativo) e a voz (ativa ou passiva). Com essas informações, nós conseguimos compreender plenamente as ações que são descritas em um relato.

b) características particulares do verbo grego

Ao descrevermos as características específicas do verbo grego vamos destacar apenas o que é mais importante para o trabalho de tradução.

b.1. Quanto à pessoa

Em português o verbo é conjugado usando o pronome pessoal. Por exemplo: Eu falo. Em grego o pronome pessoal não é usado, exceto para ênfase. Deste modo, a frase Eu falo quando escrita em grego fica assim: .

Universidade Metodista de São Paulo

44

Page 45: Guia de Estudo TEO-P5

Se escrevermos a frase , onde:

, é o pronome pessoal eu;

é a primeira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo le,gw – falar (obs: nos dicionários gregos os verbos são apresentados na 1ª. pessoa do singular do presente do indicativo, diferente do português em que o verbo é apresentado no infinitivo).

A frase não será traduzida como eu falo. Na verdade, a tradução correta é sou eu que falo, ou então, eu mesmo falo (e não outro). O pronome pessoal enfatiza, fortalece a afirmação. Por isso, ele só é usado para essa função específica.

b.2. Quanto ao tempo

Aqui temos a maior diferença do verbo grego para o português. O verbo grego não des-creve o quando da ação, mas sim o status da ação. Enquanto a frase O homem comprou o cavalo descreve em português uma informação de um ato acabado, a mesma frase em grego significaria que um homem negociou durante algum tempo e efetuou a compra desse cavalo e, finalmente, que esse processo de compra já estava concluído. Para demonstrar isso, precisamos dar alguns exemplos. Porém, antes, é importante destacar que, quando uma estrutura verbal tem essa carac-terística, os tempos verbais têm uma precisão muito grande. Voltemos ao exemplo: vamos partir de duas frases:

a) O bombeiro me salvou (o tempo verbal usado é o pretérito).

b) Jesus me salvou (o tempo verbal usado também é o pretérito).

Na primeira frase, o salvamento está ligado a algum incidente. Em algum momento do passado eu sofri algum risco de vida e um bombeiro me salvou. A frase indica uma ação que teve começo, meio e fim, no passado. Ela está concluída.

Na segunda frase, temos uma afirmação de fé que enfatiza o estágio presente. No passado, a partir de uma experiência de fé, eu fui salvo e sou, até este momento, salvo. Temos uma ação que aconteceu no passado, mas cujo efeito dura até agora: eu sou um cristão.

Em português as duas frases estão corretas, o contexto é que irá determinar o que desejamos exprimir. Já em grego, para a primeira frase, o tempo verbal a ser usado é o imperfeito, que denota uma ação que aconteceu no passado e está concluída. Para a segunda frase, usa-se o perfeito, que denota uma ação concluída no passado, mas cujo efeito, que é o que se quer destacar, dura até o presente momento.

Para demonstrar as características do tempo no verbo grego, podemos montar o seguinte quadro, tendo como base o verbo (que significa soltar) e que é base do paradigma dos verbos gregos (terminados em w):

ResumindoO grego tem como objetivo informar sobre o andamento de um processo, e não sobre

o tempo em que ele ocorreu. Por isso, se em português podemos usar o pretérito para ações concluídas e para ações em que o efeito dura até hoje, no grego isso não é possível. Aqui está a dificuldade da tradução. Muitas vezes não encontramos um termo equivalente para traduzir um verbo. É necessária uma explicação. Como em nossas Bíblias não temos notas de rodapé, esses detalhes ficam faltando.

b.3. Quanto ao modo

Em relação aos modos, o grego possui muita semelhança com o português. Como vimos, os modos indicativo, subjuntivo e imperativo têm significado igual ao português. O mesmo acontece com o infinitivo.

45

www.metodista.br/ead

Page 46: Guia de Estudo TEO-P5

Nome do tempo verbal Passado Presente Futuro Significado

Imperfeito Ação contínua concluída

Eu soltei (soltava)

Presente

Futuro

Perfeito

Mais que perfeito

Aoristo

Ação em andamento no presente

Eu solto ( estou soltando)

Ação que irá acontecer no futuro

Eu soltarei

Ação concluída no passado, cujo efeito está presente até o momento

atual

Eu tenho soltado ( eu soltei e está solto até

agora)

Ação concluída no passado com efeito que perdurou durante algum

tempo (no passado)

Eu tinha soltado (eu sol-tei, ficou solto durante

um tempo)

Esse “tempo” no grego é o que tem a menor categoria temporal. É usado para afirmações

atemporais.

Eu soltei (sem informa-ção de processo, só de

resultado)

.....

- - - - - - - - - - X

- - - - - X

Universidade Metodista de São Paulo

46

Page 47: Guia de Estudo TEO-P5

A diferença aparece no particípio, que pode ser traduzido como em português e pode tam-bém ser traduzido como gerúndio. Por exemplo, pode ser traduzido como “o que solta” (particípio em português) ou “soltando” (gerúndio em português). É importante ter muita atenção quando traduzir um particípio e observar qual das duas traduções é a correta.

b.4. Quanto à voz

O grego possui três vozes. A voz ativa (o sujeito exerce a ação) e a voz passiva (o sujeito sofre a ação) são idênticas ao português. A novidade é a voz média, onde o sujeito realiza a ação em be-nefício próprio. É certo que no grego do Novo Testamento, as formas do verbo na voz passiva e na voz média são iguais, mas o conceito permanece. Vejamos isso com o verbo – (lavar).

- ativo – eu lavo.

- média – eu me lavo (eu lavo para mim)

- passivo – eu sou lavado.

ConclusãoO verbo é um dos componentes de uma frase que, devido à sua importância, merece um

cuidado muito grande para uma boa tradução. Para isso, precisamos ter em mente a dinâmica que os verbos conferem à frase. Isso pode tornar o estudo de um texto bíblico em um agradável desafio. Para mostrar isso, veja os quadros com os exemplos de tradução. Esses exemplos nos mostram que pequenos detalhes de tradução podem enriquecer muito a nossa compreensão do texto.

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________47

www.metodista.br/ead

Page 48: Guia de Estudo TEO-P5

Em Mateus 12.1-8, há o relato de um conflito de Jesus com os fariseus. A disputa acontece quando os discípulos colhem espigas em um sábado. Jesus, retrucando a crítica dos fariseus, per-gunta: “não lestes na Lei...” (Mt 12.5). O verbo traduzido por ler é , que significa ler em público, a leitura da sinagoga. Por isso, é um verbo derivado do verbo conhecer.

Em nosso texto o verbo aparece no aoristo ( ), o que significa que os fariseus (em tempo nenhum) leram, conheceram, o que estava escrito na Lei. A acusação é de ignorância da Lei. Acusar um fariseu (que se orgulhava de ser um fiel cumpridor da Lei) de ignorante coloca o conflito em outro patamar e nos permite entender por que, ao final do segundo conflito descrito por Mateus, os fariseus planejavam como iriam matá-lo (12.14).

Mt 23.27: Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, porque sois semelhantes a sepulcros branqueados ( ), os quais por fora parecem bonitos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e de toda impureza.

é um particípio perfeito passivo de . Isso indica que os fariseus são semelhantes a sepulcros que foram tornados brancos, são brancos e continuam brancos até agora. Essa é uma acusação que olha o passado e o momento presente dos fariseus. A acusação, abordada com essa concepção do verbo fica ainda mais pesada.

Um exemplo de tradução de um verbo

Outro exemplo de tradução

Material de apoio para essa unidade:Tabela das conjugações regularesExemplos de ferramentas de apoio para a tradução.

Referências

RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do Novo Testamento. São Paulo: Paulus. 2003

SWETNAN, James. Gramática do Grego do Novo Testamento. São Paulo: Paulus. 2002. Vo-lumes 1 e 2.

Universidade Metodista de São Paulo

48

Page 49: Guia de Estudo TEO-P5

Exegese do Novo Testamento I - metodolo-

gia e evangelhos: a primeira aproximação ao texto

Prof. Dr. Paulo Roberto Garcia

Objetivos: O objetivo do módulo é de oferecer subsídios que possibilitem a apreensão e o domínio das

ferramentas exegéticas do método histórico-crítico. O estudo dessas ferramentas se dará a partir do exercício prático no gênero

literário evangelho.A aula enfocará a aproximação ao texto

bíblico, priorizando a análise exegética que possibilitam compreender a perícope a

ser estudada.

Palavras-chave:Exegese do Novo Testamento; método histórico-

crítico; delimitação; tradução; subdivisão.

Módulo

www.metodista.br/ead

Exegese e teologia do NTI

Page 50: Guia de Estudo TEO-P5

Introdução à exegese

1. O que é exegeseExegese é a metodologia de pesquisa de textos antigos que busca entender o significado

que ele teve para o grupo que o produziu ou que o tinha como texto referencial. No caso da Bí-blia, a exegese busca entender a mensagem que o texto bíblico transmitiu para a comunidade em que ele circulou (exegese). A partir disso, podemos entender o que o texto pode significar para as comunidades de fé, de hoje (hermenêutica).

2. Sobre a metodologiaA metodologia exegética do Novo Testamento é o resultado da somatória de diversas ferra-

mentas de pesquisa de um texto que busca entendê-lo como literatura, como estrutura literária, como forma de comunicação de um determinado grupo. Por isso, cada autor propõe um método com uso maior ou menor de ferramentas. Para nosso curso, vamos usar as ferramentas exegéticas descritas no quadro abaixo, organizadas em diversas aproximações.

Primeira aproximação do texto

Delimitação

Tradução

Subdivisão

Crítica textual

Segunda aproximação do texto

Leitura e sincrônica

Análise lingüísti-co-sintática

Leitura diacrônica

Análise literária

Análise da Redação

Análise da tradição

Análise das formas

Hermenêutica

Análise de conteúdo da

perícope

Análise de teologia da

perícope

Atualização da mensagem

Primeira aproximação do texto A tarefa que estamos chamando de primeira aproximação do texto é definir os limites de

nosso trabalho exegético. Determinar onde começa e onde termina o nosso texto, ou seja, definir a perícope*, traduzi-la e conhecer sua divisão básica. Para isso, um primeiro exercício importante, ao definir o texto bíblico com o qual se pretende trabalhar, é ler esse texto e os textos que o cercam, diversas vezes. Temos que conhecer o texto e seu entorno para darmos início à nossa tarefa.

Feito isso, vamos ao primeiro passo (ou à primeira ferramenta exegética).

*PerícopeVocê irá encontrar muito essa palavra em seus estudos exegéticos. Perícope é o termo técnico

que usamos para designar uma unidade completa de texto. Como os relatos bíblicos são com-postos de várias histórias que se completam ou de diversos episódios de uma mesma história, a perícope é uma história ou um episódio completo. Como o texto bíblico foi escrito sem divisão de capítulos, versículos (e até de palavras), a primeira tarefa da exegese é definir a perícope, ou seja, definir onde começa e onde termina uma história ou um episódio completo.

Universidade Metodista de São Paulo

50

Page 51: Guia de Estudo TEO-P5

1. Delimitação da perícope

Esse passo exegético** busca como afirmamos acima, um pré-conhecimento da perícope e seu entorno. Uma primeira e importantíssima tarefa é, discutindo com o texto, delimitar o início e o fim da perícope. Para isso precisamos relembrar o que já foi dito no quadro que define o que é perícope: todas as divisões de nossa Bíblia foram criadas a partir da Idade Média e tinha por finalidade ajudar a encontrar os textos. Por isso, os capítulos, os versículos e, especialmente os títulos, são opiniões e sugestões dos tradutores do texto bíblico. Infelizmente, nem sempre eles acertaram. Veremos no quadro abaixo um exemplo disso: Delimitação e seus problemas

Um exemplo clássico.O texto de 1 Coríntios é um dos textos mais conhecidos do Novo Testamento. A poesia do amor é repetida em diversos lugares. É comum ouvirmos e, inclusive, há uma de nossas versões da Bíblia, que apresenta o título: o amor é o dom supremo. Essa proposta surge uma vez que o texto inteiro fala sobre dons e termina dizendo que o amor é maior do que tudo. A conclusão é óbvia: o amor é o maior de todos os dons.Isso coloca alguns problemas, por exemplo: se o amor é dom, alguém pode alegar não ter esse dom? Criam-se respostas alternati-vas: por ser um dom maior todo mundo tem de ter. Ou, então, o texto fala de um amor que leva ao martírio, etc. Se olharmos uma proposta diferente de delimitação, o sentido do texto muda: a poesia tem sua introdução no capítulo 12, mais precisamente em 1 Co 12.31b (segunda parte do versículo 31). A introdução seria:

Mas, desejai os dons mais importantes e um caminho ainda maior que a excelência a vós eu mostro.

Nessa proposta de delimitação, o apóstolo está escrevendo a uma igreja dividida pelos diver-sos dons, afirmando que é importante buscar os melhores dons, mas esses dons têm de percorrer um caminho de excelência: o amor. O dom sem amor se perde na caminhada da fé.

Quando refletimos sobre o quadro percebemos que a delimitação não é apenas um exercício de descobrir onde a perícope começa e onde ela termina. Também, ao delimitar uma perícope, o sentido dela muda. Ou seja, uma delimitação errada leva a uma interpretação equivocada da perícope.

Para essa tarefa, algumas perguntas podem nos ajudar:

** PassoOutra palavra que é comum encontrar em estudos exegéticos é

passo (ou a expressão passo exegético). O que está por detrás dessa pa-lavra é o conceito de que a exegese é uma caminhada ao lado do texto. Cada ferramenta exegética aplicada é um passo nessa caminhada. Por isso, é comum se falar em passo, próximo passo, etc.

Onde começa e onde termina a perícope? Qual a primeira proposta de delimitação?

Quais argumentos, baseados na mudança de tempos verbais, de linguagem, de perso-nagem, de topografia, geografia, etc. ajudam a delimitar a perícope?

Quais argumentos, ao final desta tarefa, ajudam a provar ao leitor que a perícope inicia e termina como é proposto? Nesse ponto, o objetivo é apresentar um texto que convença o leitor de que a proposta de delimitação é a correta.

51

www.metodista.br/ead

Page 52: Guia de Estudo TEO-P5

2. Tradução formalA tradução formal, ou tradução bruta, é uma tradução básica que visa ajudar no trabalho exe-

gético, ou seja, não é uma tradução elegante; é uma tradução de trabalho. Para isso é necessário:

Traduzir o texto respeitando a ordem em que as palavras aparecem no grego, desta-cando as conjunções, preposições e verbos. O objetivo dessa tradução é familiarizar-se com o texto na forma como ele aparece em grego, respeitando as estruturas e repetições próprias da língua grega e da cultura semita;

Comparar a tradução com duas ou três traduções da Bíblia em português (o ideal é montar um quadro com colunas colocando os versículos em paralelo);

Avaliar as diferenças encontradas nas comparações. Listar apenas as diferenças mais significativas. Que tipo e quais alterações essas diferenças significativas produzem nas interpretações?

Novo Testamento Interlinear (SBB):Essa ferramenta é de grande ajuda nesse processo de tradução. Veja o material de apoio para a aula de Grego Bíblico e como utilizar o interlinear.

3. Subdivisão do textoFinalmente, para se ter uma idéia básica da organização do texto, deve-se propor uma

primeira sugestão de sua estruturação. Em outro passo será retrabalhada a estrutura de modo mais sistemático. O objetivo aqui é ter uma idéia básica do começo, meio e fim da perícope. Um levantamento de termos e ações propostas a seguir contribui para esse trabalho:

a) Respeitando as preposições, conjunções e usos verbais, como o texto pode ser subdividido?

b) Quais as repetições de palavras e de idéias?

Conclusão da primeira aproximaçãoAo final dessa primeira aproximação, a exegese já tem um campo delimitado. Já está definido

onde se inicia e onde termina a perícope. Também já temos uma tradução que respeita a perícope em sua organização inicial e já temos uma primeira idéia de como a perícope se estrutura. Com isso, podemos partir para a segunda aproximação da perícope, na qual ela é estudada como uma produção literária. Esse será o tema de nossa próxima aula.

Sugestão de leitura Essa aula pode ser aprofundada lendo:WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento Manual

de Metodologia. São Leopoldo / São Paulo: Sinodal /Paulus,1998. 407p. Esse passo é trabalhado no livro de Wegner na análise teológica da perícope (p. 28-38; 84-90).

Referências

THEISSEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico: um manual. São Paulo: Loyola, 2002.

WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. São Leopoldo/São Paulo: Sinodal /Paulus,1998.

Universidade Metodista de São Paulo

52

Page 53: Guia de Estudo TEO-P5

Exegese do Novo Testamento II

- segunda aproxima-ção ao texto

leitura sincrônica Prof. Dr. Paulo Roberto Garcia

Objetivos: O objetivo do módulo é de oferecer subsídios que

possibilitem a apreensão e o domínio das ferra-mentas exegéticas do método histórico-crítico. O

estudo dessas ferramentas se dará a partir do exer-cício prático no gênero literário evangelho.

A aula abordará uma proposta de conjunto da exegese e a segunda aproximação ao texto bíblico,

mas precisamente, a leitura sincrônica. Para isso serão priorizadas ferramentas exegéticas que pos-sibilitam compreender a perícope na forma como

nós a recebemos.

Palavras-chave:Exegese do Novo Testamento;

método histórico-crítico; sincronia.

Módulo

www.metodista.br/ead

Exegese do Novo Testamento - metodologia e evangelhos

Page 54: Guia de Estudo TEO-P5

Um texto é um conjunto de substantivos e verbos que se relacionam e estabelecem entre si uma relação de complementaridade, de oposição, etc. Deste modo, os termos que compõem um relato (ou, no jargão exegético, uma perícope) estabelecem uma relação de sincronia, ou seja, de inter-relação das diversas partes, constituindo uma forma completa de comunicação. Mesmo quando o texto apresenta uma falta de coesão interna (rupturas literárias, etc.), ele deve, em um primeiro momento, ser entendido como um todo. Posteriormente, o texto será trabalho diacroni-camente. Nesse ponto analisaremos as diversas partes que deram origem ao texto.

Sugestão de leituraEssa aula pode ser aprofundada lendo:Egger, Wilhelm.

Metodologia do Novo Testamento: introdução aos métodos lingü-ísticos e histórico-críticos. 2.ed. São Paulo: Loyola, 2005. 239 p (p. 71-154).

As demais partes da exegese seguirão a bibliografia básica do módulo:WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento:manual de metodologia. São Leopoldo/São Paulo: Sinodal /Paulus,1998. 407 p. Esse passo é trabalhado no livro de Wegner na análise teológica da perícope (p. 250-259).

1. Análise lingüístico-sintáticaCada autor tem um jeito próprio de escrever. A forma de construir frases, o vocabulário

usado, os termos teológicos preferidos, dão o contorno do que chamamos de estilo do autor. Uma primeira tarefa desse passo exegético é o de listar as características próprias da perícope que estamos trabalhando. Para isso vamos buscar no texto:

a) Descrição das características lingüísticas, ou seja, vamos ver quais características ou ênfases do autor são encontradas na perícope. Assim devemos verificar:

- Quais palavras, termos, expressões se repetem? É importante destacar que, no grego, a repetição é enfática, ela aponta o que a perícope quer mostrar (veja, por exemplo, na aula de Grego a perícope sobre a cura do coxo. A repetição se encontra nas múltiplas intensidades do ato de ver – aí está a ênfase).

- Quais conjunções foram encontradas no texto? Como as conjunções ordenam o sentido do texto? Como as partes do texto se relacionam?

- Quais verbos são utilizados? Como eles ordenam o sentido do relato?

b) Verificação estatística:

- Das repetições encontradas (verbos, conjunções, substantivos) quais são típicas do escrito em que se está trabalhando? (use para isso uma chave bíblica).

- De que forma elas apontam para temas e formas prediletas do escrito?

2. Análise semânticaO objetivo desse passo é o de agrupar palavras que se relacionam semanticamente, ou seja,

que embora tenham uma grafia diferente apresentam uma mesma idéia ou um mesmo conceito. Um exemplo disso ocorre na perícope de Atos 3.1-10, em que encontramos diferentes verbos que expressam uma mesma idéia: o verbo ver. Essa repetição mostra uma ênfase em torno do campo semântico do verbo ver, ou seja, o relato que costumamos chamar de “a cura do coxo”, na verdade, enfatiza as diferentes formas de ver (relembre isso na aula de grego, já estudada).

Para realizar essa tarefa necessitamos:

Banc

o de

imag

ens

Universidade Metodista de São Paulo

54

Page 55: Guia de Estudo TEO-P5

Criar um “inventário” semântico, respondendo:- Quais elementos, palavras, conceitos podem ser agrupados (informações geográficas, culturais, temporais, expressões correlatas, etc.)?

- Como esses agrupamentos determinam campos semânticos? Que campos são esses (por exemplo, o ato de ver, o mar, o monte, o ensino, etc.)?

Que eixos esses agrupamentos determinam? Quais são os temas que esse campo abarca?

Como os diversos eixos dos campos semânticos estabelecem oposições e correlações entre si?

Voltando ao exemplo já citado – a cura do coxo – o campo semântico principal é o do ato de ver. Os diversos verbos usados para descrever o enxergar apontam para a dinâmica principal da perícope. A cura é mencionada uma única vez. Não é o ponto central. Dentro do campo semântico principal, temos uma variação de intensidade que vai, pouco a pouco, determinando a perícope. De um lado, o coxo e seu olhar interessado (em receber esmola) de outro o olhar apaixonado de Pedro (e a mão que se estica e realiza o milagre). A percepção dessa dinâmica nos ajuda a com-preender qual a ênfase do relato.

Conclusão da sincroniaAo final desse passo, o trabalho exegético já pode contar com uma visão de conjunto da

perícope. Já temos listadas as diversas repetições, os temas que mais aparecem, os campos semân-ticos, as oposições e as complementaridades do relato. Isso nos possibilita ter uma abordagem diacrônica se nos perdermos da perícope e seu conjunto (próxima aula).

Para isso é fundamental não perder, durante os próximos passos, os pontos mais significa-tivos levantados nesse passo.

Referências

EGGER, Wilhelm. Metodologia do Novo Testamento: introdução aos métodos lingüísticos e histórico-críticos. 2.ed. São Paulo: Loyola, 2005. 239 p. (p. 71-154).

THEISSEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico: um manual. São Paulo: Loyola, 2002.

WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. São Leopoldo/São Paulo: Sinodal /Paulus,1998.

55

www.metodista.br/ead

Page 56: Guia de Estudo TEO-P5

Universidade Metodista de São Paulo

56

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

Page 57: Guia de Estudo TEO-P5

Exegese do Novo Testamento III -

segunda aproximação ao texto.

Leitura diacrônicaProf. Dr. Paulo Roberto Garcia

Objetivos: O objetivo do módulo é de oferecer subsídios que

possibilitem a apreensão e o domínio das ferra-mentas exegéticas do método histórico-crítico.

O estudo dessas ferramentas se dará a partir do exercício prático no gênero literário evangelho.A

aula abordará uma proposta de conjunto da exege-se e a segunda aproximação ao texto bíblico, mas precisamente, a leitura diacrônica. Para isso serão priorizadas ferramentas exegéticas que nos per-

mitem entender o texto como literatura. A análise literária, da redação, das formas e da tradição são

condutoras desse passo.

Palavras-chave:Exegese do Novo Testamento; método histórico-

crítico; análise literária; análise da redação; análise das formas; análise das tradições.

Módulo

www.metodista.br/ead

Exegese do Novo Testamento - metodologia e evangelhos

Page 58: Guia de Estudo TEO-P5

A segunda etapa de nosso trabalho aborda o texto a partir da diacronia, ou seja, o texto como literatura é formado de partes que são anteriores a ele (frases típicas, imagens comuns a um grupo, formas de linguagens, outros textos que serviram de base, etc.). Usando uma imagem, um texto é como uma colcha de retalhos. Os retalhos são partes de tecidos que serviram para muitas outras peças. Uma vez costurados juntos formam um novo conjunto, porém esse conjunto é formado por partes que já existiam antes dele. Nosso objetivo aqui é compreender essas partes, pois elas nos ajudam a compreender o mundo de quem colecionava esses retalhos e a intencio-nalidade ao reuni-los.

Essa etapa da exegese pode ser dividida em duas partes: A primeira parte, aborda o texto como uma produção literária e, a partir daí, verifica os aspectos literários que orientam a perícope e as ações redacionais que ela sofreu. A segunda parte aborda o texto como comunicação de um grupo social e busca perceber as formas literárias (formas fixas de comunicação de um grupo social) e as tradições (em nosso caso, teológicas) que subjazem na perícope.

1. O texto como produção literáriaa. Análise literária

Abordar o texto como literatura nos desafia a determinar sua estrutura, a discutir sobre a integridade e a coesão da perícope.

a.1. Estrutura da perícope

A partir de toda a discussão feita na primeira aproximação do texto e na segunda aproxima-ção – sincronia –, devemos propor uma estrutura que organize a perícope. Para isso é necessário conhecermos as estruturas literárias características do mundo grego e do mundo judaico. O im-portante é saber que a estrutura não é apenas um detalhe do trabalho. A estrutura nos permite perceber onde está o foco da perícope, o que ela pretende apresentar como desafio para a co-munidade de fé. A leitura sugerida apresenta, com detalhes, as estruturas mais comuns do mundo do Novo Testamento.

a.2. Integridade e coesão

A partir da imagem de uma colcha de retalhos, podemos apontar que um texto, que recolhe diversas tradições e dialoga com textos anteriores pode, nesse processo de colagem, apresentar rupturas, brusca mudança de assunto, interrupções do diálogo, interferência do narrador, etc. Fazer essas identificações nos ajuda a perceber o processo de formação do texto.

Exemplo de quebra de coesão:

Em Jo 13.1-11, no texto do Lava-pés, temos o diálogo de Jesus com Pedro. No versículo 10 Jesus afirma que nem todos estão limpos. No versículo 11 aparece uma informação que não tem relação direta com o diálogo, é antes uma informação complementar do narrador (Pois ele sabia quem era o traidor. Foi por isso que disse: nem todos estais limpos. ARA). O narrador precisou explicar a fala de Jesus. Essa interferência do narrador, ao mesmo tempo, aponta para uma quebra de coesão

e, com ela, aponta, também, para onde o relato caminha: a traição de Judas.

b. Análise da redação

Considerando a perícope como literatura, temos de ter em mente que há um processo redacional. O desafio é perceber as ações redacionais na perícope. As interferências do redator significam pontos importantes que ele entendeu ser necessário enfocar para destacar o desafio de fé que a perícope apresentava para as comunidades cristãs.

b.1. O uso de fontes escritas

A primeira tarefa nesse item é de determinar se, na redação, foram usadas fontes. Textos do Antigo Testamento ou até do próprio Novo Testamento, são utilizados pelos autores. As notas marginais ou de rodapé de nossas Bíblias ajudam a descobrir os paralelos.

Universidade Metodista de São Paulo

58

Page 59: Guia de Estudo TEO-P5

Um alertaAo utilizar as notas marginais é importante ter em mente o proces-

so de formação do Novo Testamento. Por exemplo, ao estudar o texto da instituição da Eucaristia é importante lembrar que o texto de Paulo em 1 Coríntios é mais antigo que o dos evangelhos. O mesmo vale quando estudamos textos de Mateus e Lucas. Não se pode esquecer que eles se utilizaram do evangelho de Marcos.

A segunda tarefa é de verificar, no processo de utilização de uma fonte, quais as mudanças que o redator realizou. São duas perguntas orientativas: a primeira é sobre a opção do redator em utilizar essa fonte específica; a segunda é sobre como ele utilizou a fonte (integralmente, par-cialmente, etc.). As mudanças apresentam a intencionalidade. Para se perceber isso, é importante montar um quadro com o texto que estamos estudando e a fonte que ele utilizou, lado a lado. Perceber as diferenças fica mais fácil deste modo.

2. O texto como comunicação de um grupo sociala) Análise das formas

Toda língua tem formas literárias para a comunicação. Elas são aprendidas e transmitidas no cotidiano. Quando ouvimos alguém cantando “parabéns a você”, automaticamente, sabemos que há uma festa de aniversário. Da mesma forma, os que apreciam jogos de futebol sabem que “onde a coruja faz o ninho” é o ângulo do gol. Para outras pessoas a frase não faz sentido (afinal, coruja faz ninho no chão).

Como as formas fixas são características de cada cultura, para determinar as formas presen-tes nas perícopes do Novo Testamento precisamos recorrer à bibliografia de apoio (veja maiores informações no quadro):

Sugestão de leituraEssa aula pode ser aprofundada lendo:WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento:manual de metodologia. São Leopoldo / São Paulo: Sinodal /Paulus,1998. 407p. (p. 84-229; 245-247).

Leitura específica para Análise das Formas:Wegner, Uwe. Exegese do Novo Testamento... p. 165-230.Berger, Klauss. As formas literárias do Novo Testamento. São Paulo: Loyola. 1998. 366p.

b) Análise das tradições

Semelhante às formas fixas, há também nas línguas imagens e figuras utilizadas pelos grupos sociais que formam um conjunto de tradições que são transmitidas oralmente e que aparecem nos textos com significado próprio para os grupos que as estão utilizando, mas que, para quem é de outra cultura, não fazem sentido. São tradições próprias de um povo.

59

www.metodista.br/ead

Page 60: Guia de Estudo TEO-P5

Exemplo de Tradições

Um exemplo clássico sobre o desafio de interpretar uma tradição se dá quando buscamos compreender a parábola do grão de mostarda (Lc 13.18-19) que diz que a pequena semente se torna em árvore. A mostarda é um arbusto e, por mais que ela cresça, continuará sendo um arbusto. Será que Jesus e seu movimento não sabiam disso? Como alguém pôde se enganar com uma planta que era tão comum? Na verdade a informação sobre a árvore é uma tradição teológica. Quando buscamos no Antigo Testamento, vemos que a árvore é usada como metáfora de Reino. Ou seja, o Reino de Deus é como o grão de mostarda que é pequeno como a menor das sementes, mas que cresce e se torna um reino que protege e abriga os mais fracos (pássaros). Há muitas outras imagens que podem ser descobertas, por exemplo, gafanhotos como metáfora de exército invasor, leão e urso como símbolo de rei ímpio, etc.

Um bom caminho para descobrir as tradições presentes nas perícopes é usar uma chave bíbli-ca. Ao perceber imagens que estão presentes na perícope trabalhada, o caminho é, usando a chave bíblica, localizar no Antigo Testamento outros textos em que estas imagens aparecem. Na somatória das ocorrências podemos perceber o sentido que essa imagem tinha para aquele povo.

Conclusão de leitura diacrônicaAo abordar o texto como literatura, percebendo o trabalho literário e redacional unindo

retalhos de textos e apresentando a história embebida em formas fixas e tradições teológicas, passamos a compreender o texto a partir da cultura que o produziu. Isso nos dá condições de compreender melhor o sentido que ele tinha para aquela comunidade e, a partir daí, que sentido ela pode ter para nós hoje. Com isso, podemos caminhar para a última etapa da exegese, que é a análise do conteúdo e teológica.

Referências

BERGER, Klauss. As formas literárias do Novo Testamento. São Paulo: Loyola. 1998. 366p.

EGGER, Wilhelm. Metodologia do Novo Testamento: introdução aos métodos lingüísticos e histórico-críticos. 2.ed. São Paulo: Loyola, 2005. 239 p. (p. 71-154).

THEISSEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico: um manual. São Paulo: Loyola, 2002.

WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. São Leopoldo/São Paulo: Sinodal /Paulus,1998.

Universidade Metodista de São Paulo

60

Page 61: Guia de Estudo TEO-P5

Prof. Dr. Paulo Roberto Garcia

Objetivos: O objetivo do módulo é de oferecer subsídios que possibilitem a apreensão e o domínio das ferramentas exegéticas do método histórico-

crítico. O estudo dessas ferramentas se dará a partir do exercício prático no gênero literário

evangelho.A aula abordará o processo final da elaboração

da exegese. As análises de conteúdo e teológica se constituem no último passo antes da elabo-ração. Abordar esse processo final é o objetivo

dessa aula.

Palavras-chave:Exegese do Novo Testamento; método histórico-

crítico; análise literária; análise de conteúdo; análise teológica.

Exegese do Novo Testamento IV

- hermenêutica

Módulo

www.metodista.br/ead

Exegese do Novo Testamento - metodologia e evangelhos

Page 62: Guia de Estudo TEO-P5

- Que contribuições a delimitação da perícope trouxe para o trabalho exegé-tico?

- Que elementos importantes a tradução apresentou? Que termos ou que

verbos merecem destaque?

- Quais substantivos ou verbos se repetem, indicando uma ênfase do autor?

- Quais campos semânticos estão presentes no texto e conferem sentido ao texto?

- Quais os principais eixos da perícope?

- Qual a contribuição que a estrutura da perícope apresentou? Qual o foco da perícope?

- Que elementos de integridade e coesão devem ser destacados? Como eles apontam in-terferências importantes no processo de redação do texto?

- Quais fontes literárias o autor usou? Quais alterações significativas ele fez? Como essas alterações apontam os objetivos e ênfases do autor?

- Quais as formas literárias encontradas na perícope? Qual o uso que essas formas tinham no mundo do Novo Testamento?

- Quais as tradições teológicas presentes na perícope? O que elas transmitiam para os povos dos tempos bíblicos?

A finalização de uma exegese se constitui em um momento de síntese. Cada passo de uma exegese, além de apresentar informações importantes para a apreensão do sentido que o relato teve para as comunidades primitivas, apresenta, também, perguntas que nos remetem a outros passos. Ao final da exegese devemos conjugar as informações apresentadas em cada passo, com as respostas às perguntas que surgiram no caminho. Esse processo leva em consideração a perí-cope (e o sentido que ela tinha para a comunidade primitiva) e também o livro em que ela está localizada. Desta forma, a Análise de Conteúdo foca a perícope, e a Análise Teológica foca os temas teológicos presentes na perícope e sua relação com o livro do qual ela é parte.

1. Análise de conteúdoA análise de conteúdo deve ser realizada em três momentos.

a) Inventário de contribuições dos diversos passos

Nesse passo, levantamos as contribuições de cada passo. Algumas perguntas podem nos orientar:

A resposta a essas perguntas, enfocando apenas os pontos principais levantados em cada passo, apresenta um número grande de informações que necessitam ser organizados para formar um discurso que desafiava a fé da comunidade cristã do primeiro século. Para isso, precisamos conhecer a comunidade em que essa perícope circulava. Esse é o próximo passo.

b) A comunidade do texto

Estamos enfatizando a realidade da comunidade como determinante da interpretação da perícope, e não a realidade e características principais do autor. A compreensão é que o autor do mundo bíblico é parte do contexto de sua comunidade e reage a esse contexto. Mais ainda, se o texto foi conservado pela comunidade e passado adiante até chegar a nós, hoje, é porque o texto respondia às angústias e aos desafios que a comunidade enfrentava.

Nesse ponto, necessitamos pesquisar em comentários e introduções ao livro do qual a pe-rícope é parte, qual era a conjuntura da comunidade. Para isso, necessitamos responder:

Universidade Metodista de São Paulo

62

Page 63: Guia de Estudo TEO-P5

- Qual é a realidade econômica da comunidade?

- Qual é a realidade social da comunidade?

- Qual é a realidade política da comunidade?

- Qual é o discurso ideológico e teológico dominante que a comunidade enfrenta?

Dois alertas:Quando pesquisar a realidade da comunidade, em especial tratan-do-se de evangelhos, cuidado para não misturar a conjuntura de Jesus com a conjuntura da comunidade de Mateus, por exemplo. Embora a pesquisa moderna localize o evangelho de Mateus na Galiléia, a Galiléia de Jesus (anos 30) já não era mais a mesma localidade de Mateus (anos 80), pois, entre os dois momentos houve a Guerra Judaica e a destruição do Templo.

Cuidado para não perder a perícope nesse processo de pesquisa. É comum a realidade econômica, social e política da comunidade se tornar tão importante, que nos esquecemos da mensagem específica da perícope.

c) A mensagem da perícope

Finalmente, comparando todas as contribuições que cada passo exegético ofereceu, elencadas no primeiro item com a realidade econômica, social, política e ideológica da comunidade, pergunta-se: Qual a mensagem da perícope para essa comunidade? Qual a ênfase? Quais os desafios?

2. Análise teológicaA partir da pesquisa do contexto da comunidade, deve-se perguntar:

• Quais os principais temas teológicos que estão presentes no escrito do qual a perícope é parte?

• Quais desses temas são encontrados na perícope?

• Como a mensagem da perícope colabora para aprofundar esse tema?

3. Atualização da mensagemComo passo final da exegese, devemos responder à pergunta hermenêutica:

• A partir da mensagem apresentada pela perícope, frente aos desafios da comunidade, como podemos atualizar essa mensagem para os desafios de nossas comunidades cristãs nos dias de hoje?

O produto de uma exegeseaO trabalho exegético e seu usoAo final de uma exegese, temos material para produzir uma

infinidade de contribuições para o trabalho em comunidades de fé ou em organizações. É comum se perguntar se para cada sermão é necessário fazer uma exegese. A resposta é diferente. Cada exegese oferece a possibilidade de se realizar um conjunto de sermões, estudos, pastorais, etc.b) A atualização da mensagem e a vivência na comunidadeTambém, é importante destacar que, ao final da exegese, temos um conjunto de informações que pode ser atualizado para a realidade de nossas comunidades ou de nosso mundo de hoje. Porém, para que a atualização seja eficaz, é necessário que haja uma vivência comunitária ou uma inserção em nosso mundo que permita fazer a atualização. A boa aplicação da exegese depende de um profundo conhecimento bíblico e um profundo conhecimento da realidade onde se está inserido. Sem isso, o resultado do trabalho pode ser infrutífero.

63

www.metodista.br/ead

Page 64: Guia de Estudo TEO-P5

Referências

EGGER, Wilhelm. Metodologia do Novo Testamento: introdução aos métodos lingüísticos e histórico-críticos. 2.ed. São Paulo/Loyola, 2005. 239 p. (p. 71-154).

Introduções ao Novo Testamento e comentários aos livros do Novo Testamento

THEISSEN, Gerd; MERZ, Annette. O Jesus histórico: um manual. São Paulo: Loyola, 2002.

WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento: manual de metodologia. São Leopoldo/ São Paulo: Sinodal /Paulus,1998.

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

Universidade Metodista de São Paulo

64

Page 65: Guia de Estudo TEO-P5

Sociologia e religião: aspectos

conceituais

Profa. Dra. Sandra Duarte de Souza

Objetivos: Apresentar o campo de estudo da disciplina

Sociologia.Analisar a relação entre sociologia e religião.

Conceituar o objeto Religião.Analisar o processo de produção social da

religião e o processo de produção religiosa da sociedade.

Palavras-chave:Sociologia da religião; interiorização; exteriorização; objetivação; teodicéia.

Módulo

www.metodista.br/ead

Igreja e sociedade

Page 66: Guia de Estudo TEO-P5

O que a Sociologia estuda?

A pergunta parece simples, mas envolve uma complexa área de saber. Em 1839, em seu Curso de Filosofia Positiva, o francês Augusto Comte (1798-1857) usou, pela primeira vez, o termo sociologia. Porém, foi com a sistematização de Émile Durkheim (1858-1917) da sociologia como o estudo dos fatos sociais, que esta passou a ser tratada com status de ciência. Daí em diante o conceito se complexificou, mas podemos sintetizá-lo afirmando que a sociologia estuda as relações do ser humano em sociedade, buscando compreendê-lo em seu cotidiano, em sua interação com outros sujeitos e com as instituições sociais.

Da relação entre sociologia e religião: o objeto religião

A religião foi objeto de análise sociológica desde os primeiros autores da área. Os chama-dos clássicos da sociologia – Karl Marx, Émile Durkheim e Max Weber, dentre outros – dedicaram especial atenção à questão da religião.

Karl Marx:Karl Marx (1818-1883), especialmente no início de sua atividade intelectual, tratou

do tema da religião. Segundo ele, esta é produto humano, refletindo as relações de do-minação de classe. Ela se caracterizaria por sua condição alienante e ideológica.

Émile Durkheim:Émile Durkheim, influenciado pelo positivismo comteano, demonstra, inicialmente,

uma preocupação com o renascimento do misticismo religioso. Porém, reconhece que a religião tem uma influência importante sobre o campo da moral. Numa postura mais dia-lética, no clássico “As Formas Elementares da Vida Religiosa”, Durkheim concebe a religião como um sistema de forças, que suscita no ser humano um estado singular de poder. Ele demonstra especial interesse pelo tema das representações coletivas, particularmente pelas representações religiosas.

Max Weber (1864-1920), desde cedo, demonstrou um grande interesse pelos fenô-menos religiosos. Como o cerne de sua preocupação está no processo de racionalização da sociedade moderna, ele se pergunta pelo lugar da religião nesse processo. A tentativa de entender o processo de racionalização econômica do Ocidente, o levou ao estudo do protestantismo alemão e de sua afinidade com o capitalismo. A obra que melhor sintetiza esse esforço é “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”. Weber, em “Economia e Sociedade”, também criou uma tipologia conhecida como dos tipos ideais, em que apresenta tipos indicadores do processo de racionalização como: magia e religião; mago, sacerdote e profeta; tabu e ética; religiosidade mística e religiosidade ascética.

Max Weber:

Universidade Metodista de São Paulo

66

Page 67: Guia de Estudo TEO-P5

Esta pequena trajetória pelos clássicos nos indica a pertinência da religião como objeto de estudo da sociologia. A religião estrutura e é estruturada pela sociedade. Ela tem um importante papel na produção e reprodução da vida social e do sentido da existência humana. Daí a impor-tância de se estudar a relação entre sociologia e religião.

O processo de produção social da religião e o processo de produção re-ligiosa da sociedade

Partimos do pressuposto de que a sociedade é produto do ser humano e de que o ser hu-mano é produto da sociedade. A religião atuaria nesse processo também como produto e como produtora da sociedade e dos sujeitos sociais.

Peter Berger, em seu “O Dossel Sagrado”, aponta para a importância do processo dialético de construção da sociedade. Empregando os conceitos de interiorização, exteriorização e objetivação, ele explica como os sujeitos sociais apreendem o mundo (interiorização), como se manifestam no mundo (exteriorização) e de que maneira o mundo social se apresenta como autônomo em relação àqueles que o produziram (objetivação).

A manutenção desse mundo socialmente construído se daria pelas instituições, que fun-cionariam como mecanismos de legitimação da ordem social (nomos). Para Berger, a religião é uma, senão a mais importante, instituição de legitimação social. A eficácia da legitimação re-ligiosa estaria no fato de relacionar esse mundo precariamente construído com uma realidade meta-social, situando as instituições e os papéis específicos (pai, mãe...) no campo do sagrado, do cósmico. A ordem social, portanto, seria equi-parada à ordem sagrada, e a desordem, ao caos ameaçador – anomia. Se a ordem é legitimada religiosamente, qualquer resistência a ela será classificada como resistência ao sagrado.

Diante da anomia e da perda de plausibilida-de da ordem socioreligiosa, as teodicéias surgem para explicar e, principalmente, para dar significa-do ao caos, utilizando-se, para tanto, do recurso religioso. Situações limite como, por exemplo, catástrofes naturais, enfermidade, morte, desi-gualdades sociais, etc., encontram, nas teodicéias, o sentido necessário para garantir a continuidade da vida e a plausibilidade da ordem social.

Sociedade

Ser Humano Religião

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________67

www.metodista.br/ead

Page 68: Guia de Estudo TEO-P5

Referências

BERGER, Peter. O dossel sagrado: elementos para uma teoria sociológica da religião. São Paulo: Paulinas, 1985.

OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à sociologia. São Paulo: Ática, 2000.

TEIXEIRA, Faustino (org.) Sociologia da religião: Enfoques Teóricos. Petrópolis: Vozes, 2003.

WEBER, Max. Economia y sociedad: esbozo de sociologia comprensiva. México: Fondo de Cultura Económica, 1997, p. 328-492 (cap.V) (tradução para o português da UnB).

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

______________________________________

Universidade Metodista de São Paulo

68

Page 69: Guia de Estudo TEO-P5

Religião e cultura

Profa. Dra. Sandra Duarte de Souza

Objetivos: Apresentar o campo de estudo da disciplina

Antropologia;Conceituar cultura;

Analisar a relação entre Cultura e religião;Conceituar o objeto Religião na perspectiva da

Antropologia;Analisar a relação entre cultura e religião.

Palavras-chave:Antropologia; religião; cultura;

sistemas simbólicos.

Módulo

www.metodista.br/ead

Igreja e sociedade

Page 70: Guia de Estudo TEO-P5

Cultura: conceituação e derivaçõesA noção de cultura é fundamental para a análise antropológica da religião, pois os seres

humanos só podem ser entendidos como seres de cultura. Aqui abordaremos a religião como sistema cultural, logo, não há como dissociá-la da discussão da cultura.

Inicialmente empregado para expressar o cuidado com o campo (séc. XIII) e o cultivo da terra (séc. XVI), o termo cultura vai adquirindo significados mais complexos com o passar do tempo. A partir do século XVIII, a palavra ganha mais corpo conceitual, expressando mais do que uma ação. Cultura passa a designar conhecimento adquirido, formação, educação. Daí surgirem afirmações do tipo: “aquele sujeito é culto” ou “ele não tem cultura”. Para os iluministas do século XVIII, cultura significa o acúmulo e a transmissão social dos saberes. Essa noção vai surgir na França e se espalhar por toda a Europa ocidental, influenciando também o seu conceito de civilização que se impõe como uma evolução racional das sociedades até atingir estados avançados de conhecimento.

Na Alemanha de meados do século XVIII, as tensões entre burguesia e aristocracia vão estabelecer uma oposição entre cultura e civilização, distanciando-se do pensamento francês. A burguesia advoga para si o papel de guardiã e transmissora da cultura alemã. Isso ganha maiores proporções no século XIX em que se afirma a particularidade da cultura, contrapondo-se à noção universalista dos iluministas que afirmavam uma cultura uniforme. Tal postura alimentará o nacio-nalismo alemão daquela época.

O universalismo cultural persistirá na França dos séculos XVIII e XIX, apesar de algumas relativizações derivadas da influência do pensamento alemão. Mas os problemas políticos que culminaram com a Primeira Guerra Mundial e com o enfrentamento desses dois países, terminaram forçando cada qual a afirmar uma noção diferenciada de cultura: para os franceses, o universalismo cultural; para os alemães, o particularismo cultural. Segundo Denys Cuche, são essas duas posições que estão na base do debate atual das ciências sociais sobre a noção de cultura.

Somente para citar alguns antropólogos que aderiram à concepção universalista ou à con-cepção particularista de cultura, vamos nos restringir aos seguintes: Edward Burnett Tylor (1832-1917), considerado o fundador da antropologia britânica, definia a cultura como a expressão da totalidade da vida social.

A abordagem universalista acompanha toda a sua trajetória acadêmica.

Em relação à concepção particularista da cultura, o antropólogo e etnógrafo alemão Franz Boas (1858-1942) dedicou-se ao estudo das diferenças culturais, afirmando a singularidade de cada cultura. Na França, Emile Durkheim (1858-1917), apesar de sua abordagem sociológica, dialogou também com a Antropologia, buscando entender a dimensão cultural do social. O trabalho etno-gráfico foi fundamental para o desenvolvimento de sua sensibilidade em relação ao relativismo cultural. O mesmo se aplica a Lévy-Bruhl (1857-1939).

É nos Estados Unidos que o conceito vai ser mais debatido, havendo várias correntes de pensamento: a história cultural (Alfred Kroeber); a análise funcionalista da cultura (Bronislaw Mali-nowski); a escola “cultura e personalidade” (Ruth Benedict; Margaret Mead, Ralph Linton e Abram Kardiner).

Outros estudiosos da cultura se destacam: o inglês Edward E. Evans Pritchard (1902-1973) que sugere a conexão entre fatos culturais e estruturas sociais; e o francês Claude Lévi-Strauss que propõe uma leitura estruturalista da cultura.

Da relação entre cultura e religiãoPara Clifford Geertz, que trabalha na perspectiva da Antropologia interpretativa, a cultura é

um padrão de significados herdados e transmitidos pelos sujeitos sociais. Nessa perspectiva, ao empregarmos a noção de cultura para entendermos o objeto “religião”, estamos propondo que a religião é, antes de mais nada, sistema simbólico e, portanto, sistema cultural. Isso implica numa des-naturalização da explicação da religião, afirmando-a situada, orientada e limitada culturalmente.

Universidade Metodista de São Paulo

70

Page 71: Guia de Estudo TEO-P5

Assumimos aqui o conceito de religião desenvolvido por Geertz em seu “A Interpretação das Culturas”:

A religião é um sistema de símbolos que atua para estabelecer poderosas, penetrantes e duradouras disposições e motivações nos homens através da formulação de conceitos de uma ordem de existência geral e vestindo essas concepções com tal aura de fatuali-dade que as disposições e motivações parecem singularmente realistas. (p.104-105).

Assim, os sistemas religiosos são sistemas de símbolos, são fontes extrínsecas de informação que atuam sobre os sujeitos religiosos orientando suas vidas, constituindo ethos e cosmovisão religiosamente orientados.

Para Geertz, os sistemas de sentido religiosos são bastante eficazes em sua capacidade de gerar e manter ativas as disposições e motivações nas pessoas e, principalmente, em sua capaci-dade de ordenar a existência humana, conferindo sentido em meio ao constante perigo do caos. Esse perigo pode ser traduzido pelas situações limítrofes experimentadas pelo ser humano: nossa limitação explicativa; nossa dificuldade de suportar a dor e o sofrimento; e nossa dificuldade de aceitar que o sofrimento experimentado pelo justo é merecido. Em outras palavras, a religião não se propõe solucionar o problema da inexplicabilidade das coisas, não pretende resolver o proble-ma da dor, do sofrimento, da morte e do paradoxo moral, mas busca significar tudo isso, conferir sentido à experiência humana do caos.

A crença em um sistema religioso é o que possibilita que esse sistema se apresente como uma dimensão verdadeiramente real para o sujeito religioso, possuindo uma autoridade sobre ele e criando a possibilidade de transcendência das realidades cotidianas.

Referências bibliográficas

CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 1999.

GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989.

_______. O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa. Petrópolis: Vozes, 1998.

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

71

www.metodista.br/ead

Page 72: Guia de Estudo TEO-P5

Universidade Metodista de São Paulo

72

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

Page 73: Guia de Estudo TEO-P5

Religião e modernidade

Profa. Dra. Sandra Duarte de Souza

Objetivos: Analisar a relação entre Religião e Modernida-de, apresentando os novos desafios teóricos e

metodológicos que a questão oferece para o estudo da religião contemporânea.

Analisar o processo de secularização e a conseqüente perda do poder das instituições

religiosas.Compreender o pluralismo religioso e o trânsi-to religioso como derivações da Modernidade.

Palavras-chave:Modernidade; religião; secularização; pluralis-

mo religioso; trânsito religioso.

Módulo

www.metodista.br/ead

Igreja e sociedade

Page 74: Guia de Estudo TEO-P5

A modernidade religiosa: aspectos introdutórios

Durante toda a Idade Média a religião1 foi o grande centro de sentido da sociedade. No ocidente, a Modernidade vai inaugurar uma nova forma de se relacionar com a religião. Esta, gra-dativamente, começa a perder sua centralidade na ordenação da vida em sociedade, cedendo – ou sendo forçada a ceder – lugar a outras instituições que passam a ter maior influência social. Isso não significa o desaparecimento da religião, mas aquilo que se convencionou chamar de “periferização” da religião. Ela perde o seu poder significante e outras instituições sociais entram na disputa pelo controle material e simbólico da sociedade, antes exclusivamente da religião.

Essa autonomia da sociedade em relação à esfera religiosa vai desenhar o processo de se-cularização. Inicialmente expropriando os bens e direitos da Igreja e, posteriormente, afirmando uma relativa autonomia simbólica, a sociedade moderna “empurra” a religião para a periferia2, permitindo a ascensão de outros mecanismos de controle e coesão social. A religião, portanto, passa a compartilhar seu poder significante na sociedade com outras instituições de produção da subjetividade humana, como a ciência e a mídia, dentre outros. O Estado luta pela desvinculação da religião, afirmando a necessidade de separação da política em relação à ingerência religiosa. A isso denomina-se laicização do Estado.

É importante dizer que essa questão não se resolve tão facilmente. Por isso usamos o termo “luta”. Se o Estado “luta” contra a ingerência religiosa sobre sua constituição, isso significa que há conflitos de poder que não podem ser negados. A religião teima em permanecer nesses espaços e em afirmar a sua legitimidade, seja por intermédio de lobby de políticos religiosos; pela pressão de grupos religiosos sobre parlamentares e instituições sociais diversas, etc. Daí não se tratar de um processo linear – em que a religião perderia paulatinamente o seu poder até sua completa extinção (como advogavam alguns teóricos da secularização) – e sim um processo tenso, nuançado pela própria ambigüidade da sociedade em que vivemos.

Não há muito consenso sobre a abrangência e os limites da secularização. Alguns teóricos, dentre eles, Leskek Kolakowski, defendem a ideia de que o fato de experimentarmos uma efer-vescência religiosa nunca antes vista é um indicador de que estamos vivendo uma “revanche do sagrado” e, portanto, uma falência do processo de secularização. Outros estudiosos, como Flávio Pierucci, afirmam que o pluralismo e fragmentação religiosos só podem derivar de uma sociedade secularizada.

A fragmentação religiosa e o trânsito religiosoCertamente, a fragmentação religiosa contribui efetivamente

para a perda do poder da religião na Modernidade. Esse proces-so de fragmentação, de pluralismo religioso, que se dissemina amplamente nas sociedades modernas, já não comporta mais a noção de hegemonia religiosa. Quanto maior a diversidade de grupos religiosos, menores serão as possibilidades de consenso e de articulação. Além disso, o amplo leque de alternativas religio-sas possibilita ao sujeito religioso o trânsito por vários grupos e sistemas simbólicos, enfraquecendo/pulverizando o compromisso com uma instituição religiosa específica.

1 Referimo-nos aqui à religião, no singular, de maneira intencional. O poder religioso no ocidente durante a Idade Média traduzia-se pelo domínio cristão, particularmente da Igreja Católica, uma vez que o Protestantismo é, ele mesmo, produto da Modernidade.2 Aqui não nos referimos à “periferia” no sentido de verificarmos a presença institucional das religiões majoritariamente nas áreas periféricas das cidades, mas sim no sentido da perda do poder da religião como centro de significado e de ordenação da sociedade moderna.

Quanto maior a diversida-de de grupos

religiosos, menores serão as pos-sibilidades de consenso e de articulação.

Universidade Metodista de São Paulo

74

Page 75: Guia de Estudo TEO-P5

O pluralismo religioso coloca inúmeras alternativas religiosas diante do sujeito moderno. Isso possibilita uma ampliação do que chamamos de mercado de bens simbólicos. A oferta reli-giosa ampliou, pelo menos em termos do número de instituições – nunca se viu a emergência de tantos grupos religiosos – e do tipo de veículo – rádio, televisão, internet – que permitem uma maior acessibilidade dos sujeitos ao capital simbólico religioso. Esses são alguns dos fatores que contribuíram para a intensificação do trânsito religioso na Modernidade.

A concorrência religiosa está posta e se dá entre instituições religiosas que lutam pela adesão e pelo compromisso dos sujeitos. Esses, por sua vez, nem sempre estão dispostos a se engajar na instituição e, cada vez com mais freqüência, não tendo suas demandas atendidas, tendem a buscar resposta em outras instituições religiosas ou fora delas3. O tipo “fiel” está em tensão com o “infiel”. Isso cria uma movimentação constante no campo religioso.

Podemos classificar vários tipos de trânsito:

Poderíamos classificar essa situação de “trânsito sem pertença”.

Essa movimentação por diferentes grupos religiosos, somada ao acesso a outros sistemas simbólicos via rádio, televisão e internet, tem gerado composições religiosas singulares, indicando para o papel ativo dos sujeitos religiosos na produção (e não somente na reprodução) do capital simbólico-religioso.

Para a Sociologia da Religião, fica o desafio de ir além da análise das organizações religio-sas, buscando compreender o lugar dos sujeitos religiosos na reconfiguração das relações entre religião e Modernidade.

Há aqueles que transitam de uma religião para outra, isto é, abandonam a religião an-terior para aderir a uma nova religião. Esse tipo comum de trânsito tem se intensificado e se registram pessoas que contabilizam cada vez mais “passagens religiosas” em sua biografia. A esse tipo de trânsito poderíamos denominar “trânsito de pertença”;

Há aqueles que se declaram pertencentes a uma religião, mas que transitam por vá-rios outros grupos religiosos. Esse tipo de trânsito poderia ser classificado de “trânsito pertencente”;

Há outros sujeitos religiosos que afirmam não pertencer a qualquer grupo religioso. Eles transitam em vários grupos religiosos sem estabelecer vínculo formal com nenhum.

3 O número dos “sem-religião” é crescente. Por “sem-religião” deve-se entender o sujeito que não possui vínculo com uma instituição religiosa, mas que se afirma religioso.

Referências

MARTELLI, Stefano. A religião na sociedade pós-moderna: entre secularização e dessecula-rização. São Paulo: Paulinas, 1995, p. 271-335.

PIERUCCI, A. Flávio. Reencantamento e dessecularização: a propósito do auto-engano em sociologia da religião. In: Novos Estudos, 49. São Paulo: CEBRAP, 1997, p. 99-117.

SOUZA, Sandra Duarte de. Trânsito religioso e construções simbólicas temporárias: uma brico-lagem contínua. In: Estudos de Religião, 20. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2001, p. 157-167.

75

www.metodista.br/ead

Page 76: Guia de Estudo TEO-P5

Universidade Metodista de São Paulo

76

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

________________________________________

__________________________________________

Page 77: Guia de Estudo TEO-P5

O panorama religioso da

América Latina

Profa. Dra. Sandra Duarte de Souza

Objetivos: Apresentar e analisar os dados acerca do con-

texto religioso da América Latina.Apresentar dados acerca do panorama religio-so brasileiro e analisar sua configuração atual à luz da relação entre religião e Modernidade.

Palavras-chave:Diversidade religiosa; mapa religioso; merca-

do religioso; combinações simbólicas.

Módulo

www.metodista.br/ead

Igreja e sociedade

Page 78: Guia de Estudo TEO-P5

Pluralismo Religioso na América LatinaTocar no tema da diversidade religiosa experi-

mentada e praticada no continente latino-americano é aprender a pensar no plural, daí a necessidade de nos referirmos às religiosidades na América Latina.

Freqüentemente ouve-se falar de uma América Latina católica. Sob o substantivo América Latina, há uma diversidade político-econômico-social e cultural que devemos ter em mente quando tratamos da di-versidade religiosa. Sob o adjetivo católico (romano), ocultam-se outras matrizes religiosas que compõem o caldeirão religioso desse imenso continente, indicando uma suposta hegemonia religiosa que sugere uma única confissão de fé latino-americana. Essa noção de uma fé hegemônica deve ser relativizada, considerando-se a matriz indígena, comum aos países da América Latina, e a matriz africana, presente na grande maioria desses países, por força do processo de escravidão.

Se a história de nosso continente não começa com a história da América Latina, então nela também não se inscreve o cristianismo até antes da colonização. Apesar de apontarmos o óbvio, é importante fazê-lo, pois nele reside o elemento da diversidade primordial que marca essa terra de panteões diversos, de sacralização e ado-ração de elementos da natureza, de rituais informados pelos ciclos de vida e morte, de templos erigidos para deuses e deusas, sobre os quais o cristianismo tardio se instalou. Os colonizadores cristãos trouxeram consigo sua religião, o catolicismo, melhor dizendo, os catoli-cismos espanhol e português, com suas singularida-des. Porém, trouxeram também a diversidade religiosa através da escravização de várias nações africanas, cuja sobrevivência dependeu da assimilação do catolicismo ibérico. Constitui-se uma identidade religiosa da sobre-vivência não apenas limitada à reprodução do universo simbólico colonizador, mas uma identidade pautada na geração de laços de solidariedade e estratégias de afirmação cultural que, em grande parte, se traçaram através da ressignificação das religiões africanas em solo latino-americano. Devemos lembrar também que ao encontro-confronto das religiões indígenas, africanas e do próprio catolicismo, somar-se-ão outros grupos, derivados dos processos migratórios posteriores, que trouxeram em sua bagagem a novidade de outras ex-periências religiosas, como o protestantismo. É sobre esse substrato que se constituem as religiosidades na América Latina.

É quase impossível fazer um mapeamento do sagrado na América Latina, tamanho o pluralismo reli-gioso que a caracteriza. Apesar do fato de que a religião declarada da maioria de nossa população é, ainda, o catolicismo, o que as pesquisas de cunho quantitativo estão longe de mostrar, é a elasticidade religiosa que se esconde por trás dessa declaração.

Os colonizadores cristãos trouxeram consigo sua religião, o catolicismo,

melhor dizendo, os catoli-cismos espanhol e portu-guês, com suas singulari-dades. Porém, trouxeram

também a diversidade religiosa através da escra-vização de várias nações

africanas, cuja sobrevivên-cia dependeu da assimila-ção do catolicismo ibérico.

Universidade Metodista de São Paulo

78

Page 79: Guia de Estudo TEO-P5

Ser religioso na América Latina pode ser algo surpreendentemente distinto daquilo que a ortodoxia institucional deseja afirmar. A crescente diversidade religiosa e o fenômeno do trânsito religioso, que admite combinações simbólicas supostamente inadmissíveis por parte das instituições e movimentos religiosos, estão cada vez mais presen-tes no cotidiano dos sujeitos religiosos, mostrando que os purismos não encontram guarida em uma terra fértil de religião ou de religiosidades. O cristianismo “ma-joritário” da América Latina é vivenciado, em muitos casos, junto com outras experiências religiosas como as afro-latino-americanas, as indígenas, as espíritas e as religiões orientais, entre outras. Sem entrar na discussão dos problemas que envolvem o mercado religioso, o fato é que esse fenômeno de combinações simbólico-religiosas não pode ser ignorado no contex-to da discussão antropológica da religião. Os números sobre a conjuntura religiosa da América Latina devem ser sempre relativizados em função disso.

Além da expressiva presença católica em todo o continente, a parcela cristã dessas terras se traduz também na presença de diversos grupos protestantes “históricos”, como luteranos, presbiterianos, metodis-tas e batistas, chegados aqui por força dos movimentos de migração e de missão. Atualmente, o crescimento que as pesquisas têm registrado no processo de adesão ao protestantismo em quase toda a América Latina nos últimos anos, está diretamente relacionado ao crescimento do pentecostalismo e do chamado neopentecostalismo, elevando significativamente as, até então, tímidas estatísticas da presença protestante por aqui. O fenôme-no pentecostal coloca-se hoje como um tema primordial para a discussão das religiosidades na América Latina.

Conforme apontamos, não estamos em um continente exclusivamente cristão. Apesar de uma história de genocídios, diversas expressões religiosas indígenas sobreviveram, e se traduzem em religiões autóctones, em movimentos de recuperação das tradições ancestrais e em práticas amalgamadas com outras expressões religiosas.

As religiões afro-latino-americanas são inúmeras, mas podemos citar os candomblés do Brasil, a Santería de Cuba, o vodu dominicano, as congadas, os batuques e outras formas religiosas que sintetizam simbolismos religiosos diversos como a umbanda, a jurema, o terecô, a pajelança, a regla de palo, etc. É muito importante ressaltar que, em alguns países, nem sempre a prerrogativa étnico-racial é o que prevalece na adesão às religiões afro-latino-americanas, sendo estas com-postas por afrodescendentes e por não-afrodescendentes.

O catolicismo ortodoxo, o judaísmo e o islamismo também se fazem presentes na compo-sição do mapa religioso latino-americano, assim como outras religiões ou movimentos religiosos de origem oriental, como o budismo e suas derivações, os hare krishnas, a Igreja da Unificação e a Igreja Messiânica, só para citar alguns exemplos. Adventistas, mórmons e testemunhas de Jeová, apesar de numericamente pequenos, já têm uma antiga presença em nosso continente. Os chamados círculos esotéricos ou movimentos de espiritualidade new age também estão em franco crescimento na América Latina, seja na forma de grupos de espiritualidade holística ou alimentando formas tradicionais de religiosidade.

O fenômeno da transnacionalização das religiões é também algo, desde sempre, presente na América Latina, que tem experimentado a importação e, mais recentemente, a exportação de crenças e práticas religiosas.

O cristianismo “majoritário” da América Latina é vivenciado, em muitos casos, junto com

outras experiências religiosas como as afro-latino-ameri-canas, as indígenas, as espí-ritas e as religiões orientais,

entre outras.

79

www.metodista.br/ead

Page 80: Guia de Estudo TEO-P5

A geografia do sagrado na sociedade brasileira

O Brasil, como aponta Carmen Cinira Macedo, “está marcado pela diversidade de credos e filiações religiosas” (p. 27). Esse campo religioso plural, justamente por ser plural, não pode ser reduzido a algumas poucas denominações religiosas. As formas religiosas no Brasil são as mais variadas, passando pelo catolicismo, o chamado protestantismo histórico, o pentecostalismo, o neopentecostalismo, o espiritismo, a umbanda, o candomblé, o budismo e outras religiões orien-tais, o esoterismo e outras expressões religiosas. Tamanha diversidade religiosa aparece como um leque de opções para o sujeito religioso, facilitando o seu trânsito.

Segundo dados do IBGE (Censo 2000), os números relacionados à identidade religiosa brasi-leira se distribuem da seguinte forma: católicos (125.500.000); evangélicos (24.900.000 – incluam-se aí os chamados protestantes “históricos”, pentecostais e neopentecostais); espíritas (2.262.378); umbandistas (397.421); budistas (214.861); adeptos de outras religiões orientais (151.082); candom-blecistas (118.105); adeptos de outras religiões afro-brasileiras (9.485); judeus (86.819); esotéricos (58.443); muçulmanos (27.233); adeptos de tradições religiosas indígenas (17.092); hinduístas (2.908).

É importante destacar também uma categoria que tem crescido significativamente: os sem-religião, que contabilizam 12.400.000. Esses não se referem exclusivamente aos ateus, e sim àqueles que não possuem vínculo religioso institucional, apesar de manifestarem algum tipo de religiosidade.

A pluralidade religiosa brasileira se explicita no grande número de grupos religiosos que se revelam nas pesquisas e na observação empírica, porém, questiona-se a abrangência desse pluralismo na medida em que as declarações de fé demonstram grupos religiosos mais consolidados. Portanto, os números das pesquisas quantitativas devem ser qualitativamente considerados, pois a apreensão da dinâmica do campo religioso não se mostra apenas na declaração de um vínculo institucional religioso, mas na prática religiosa dos sujeitos de fé, que muitas vezes transitam por diferentes grupos religiosos e sistemas de fé, fazendo suas próprias combinações.

Banco de imagens

Referências

JACOB, César Romero; HEES, Dora Rodrigues; WANIEZ, Philippe; BRUSTLEIN, Violette. Atlas da filiação religiosa e indicadores sociais no Brasil. Rio de Janeiro: PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2003.

MACEDO, Carmen Cinira. Imagem do eterno: religiões no Brasil. São Paulo: Moderna, 1991.

SOUZA, Sandra Duarte de. Pluralismo Religioso: uma introdução ao tema. In: BHOGAL, Inderjit S. Pluralismo e a missão da Igreja na atualidade. São Bernardo do Campo: Editeo, 2007, p. 13 a 23.

Universidade Metodista de São Paulo

80

Page 81: Guia de Estudo TEO-P5

Banco de imagens

Desafios do contexto urbano

Prof. Ms. Oswaldo de Oliveira Santos Junior

Objetivos: Possibilitar aos/às estudantes a oportunidade de

analisarem as principais situações que marcam a realidade sociopolítica, econômica, cultural e

religiosa do Brasil e do mundo e relacioná-las ao compromisso social da Igreja.

Palavras-chave:Igreja; compromisso social; religião; urbanização;

globalização.

Módulo

www.metodista.br/ead

Igreja e sociedade

Page 82: Guia de Estudo TEO-P5

“De que me adianta viver na cidade se a felicidade não me acompanhar (...)”.

(Saudade da minha terra - Goia e Belmonte)

A religião tem sido uma importante expressão da vida das comunidades em todo o mundo. Nela o ser humano busca fortalecer a esperança e refletir sobre o sentido da vida e as motivações para as suas lutas históricas. Na América Latina, dada a forte religiosidade dos povos, as mani-festações litúrgicas (festas e ritos) possuem importância vital para o povo, isto porque povos que são profundamente religiosos pensam religiosamente, especialmente quando enfrentam situações de crise pessoal ou coletiva, em relação ao seu futuro (SANTA ANA, 1984, p. 11). É a partir desse aspecto que a Igreja, como instituição presente na sociedade e portadora de referenciais simbóli-cos e religiosos, pode cumprir um papel importante: de ser sinal de esperança em meio às crises enfrentadas pelos seres humanos no cotidiano, mesmo em meio ao fenômeno da secularização.

A conseqüência inevitável da urbanização é o fenômeno da secularização da vida, como apon-tado por Max Weber, e a eliminação das formas de solidariedade; ou, como observa Darcy Ribeiro:

O capitalismo quebra todas as formas de solidariedade porque vê nelas resistências ao seu desenvolvimento. As formas de solidariedade dão força aos trabalhadores. O capitalismo pretende reduzir o mais possível a força dos cidadãos para que estejam mais disponíveis para as necessidades das empresas. Por isso, promove a dissolução da família, da vida social dos bairros, das associações de todo o tipo (RIBEIRO, 1998, p. 6).

Como se pode analisar, a relação entre os habitantes da cidade é permeada por toda sorte de adversidades que dificultam, quando não impedem, uma harmonia e convivência plena entre os cidadãos.

As cidades constituem-se nos agrupamentos mais dinâmicos e complexos que a humanidade produziu. Todos os tipos de contradição e conflitos estabelecem-se nas cidades e tornam, quase sempre, as soluções muito complexas. Estas complexidades do contexto urbano nos fazem, muitas vezes, afirmar que existem muitas cidades se inter-relacionando num mesmo espaço.

A vida na cidade possibilita o surgimento de uma cultura urbana caracterizada pela desor-ganização e complexidade social e cultural, como abordado por Manuel Castells. Nesse ambiente surgem as iniciativas individualistas e a forte competição entre os membros da cidade é quase inevitável. Os laços familiares se tornam frágeis e a secularização da vida urbana torna-se uma constante (OLIVEN, 2002, p. 32.).

No que diz respeito à vida em cidades, observa-se que a secularização é uma das tendências importantes das sociedades urbano-industriais. Ela é, na verdade, um processo complexo, pois o êxodo rural transformou a vida das pessoas em sua passagem do campo para a cidade. As relações mudaram, assim como as necessidades do indivíduo urbano. Desta forma identifica-se que:

Em relação ao Brasil, diversos autores su-geriram que a recente intensificação do seu capitalismo estaria causando um declínio gradual do catolicismo entre a população urbana. Mas se por um lado a adesão e freqüência ao catolicismo pode estar dimi-nuindo nas grandes cidades brasileiras, por outro está havendo um crescimento impres-sionante da Umbanda e do Pentecostalismo (Idem, p. 42).

Os laços familiares se tornam frágeis e a secu-larização da vida urbana torna-se uma constante (OLIVEN, 2002, p. 32.).

Universidade Metodista de São Paulo

82

Page 83: Guia de Estudo TEO-P5

Não somente as religiões de origem africanas, igrejas pentecostais e neopentencostais têm experimentado um forte crescimento no Brasil, mas também as religiões orientais e os grupos de auto-ajuda.

Não se observa uma diminuição da religiosidade na cidade, mas um deslocamento, e o surgimento do sujeito religioso, aquele que constrói sua religiosidade de acordo com as suas necessidades mais urgentes; ou seja, surge um tipo de religiosidade com os elementos típicos da cidade: o individualismo, a competição e a busca de prosperidade.

Diversas pesquisas e estudos revelam que, entre os cristãos, não existe relação entre o cristia-nismo e as preocupações sociais e que muitos não procuram expressar sua fé numa ação social.

A igreja, no contexto urbano, tende a mobilizar todo o seu esforço para a conservação e, quando muito, para a expansão da própria comunidade local. A ação da igreja é, por assim dizer, de manutenção, uma ação tímida frente à complexidade da vida urbana e moderna.

No dizer de Comblin, a igreja:

... teme que o mergulho numa sociedade urbana tão diversa e múltipla leve a uma dispersão dos cristãos. Teme perder o controle sobre os cristãos que, no agir da cidade, usam uma linguagem não eclesiástica, formulam objetivos não eclesiásticos, formam solidariedades com pessoas de outras religiões. Por isso prefere manter o agir dos fiéis dentro do recinto paroquial ou diocesano (COMBLIN, 1996, p. 26.).

Não obstante o fato de Comblin estar se referindo com maior especificidade à igreja Católica Romana, a afirmação serve também para as demais igrejas, em especial as protestantes históricas, que agem de modo tímido no que tange à sua inserção nas questões sociais e em suas relações com os movimentos sociais e populares.

Na cidade tudo ganha um grande volume. O bem e o mal presentes nos seres humanos tornam-se, no espaço urbano, muito mais visível. Uma questão que ganha dimensões assustadoras nas grandes cidades é a grande massa de trabalhadores desempregados, os excluídos do sistema habitacional, educacional, de saúde e do mundo do trabalho.

Este contingente de excluídos é, sem dúvida, resultado de um sistema econômico que privi-legia o lucro em detrimento do ser humano. Esses indivíduos são aqueles que não são capazes de entrar e permanecer no mercado como consumidores. Para esse grupo de seres humanos, o que existe é uma existência à margem, excluída da sociedade e uma cidadania incompleta.

O mercado, em sua ânsia pelo acúmulo do capital, deixa à margem os pobres. Na lógica capitalista nada é feito para facilitar a vida dos seres humanos; tudo contribui e deve favorecer o acúmulo do capital. O dinheiro torna-se objeto de culto e veneração, a riqueza e o lucro, tornam-se os “deuses” na e da cidade, mas, esta riqueza não está ao alcance de todos , mas de uma minoria. Disso resulta esse enorme contingente de excluídos que surgem nas cidades, transformando-as em espaço onde a exclusão se concentra de forma muito evidente e violenta.

Em meio a toda esta situação e complexidade que é a cidade, o que faz a igreja? O que po-dem fazer os cristãos? Colocar a experiência da fé que produz milagres, no sentido que Hannah Arendt descreve, ou seja, como a capacidade humana de iniciar algo novo, por meio de uma ação que interrompe os processos automatizados (CASTRO, 2000, p, 110.). Clóvis Pinto Castro comenta ainda que: “A fé, nesta perspectiva, torna-se um instrumento apropriado para inserir os cristãos no espaço da pluralidade para ali, mediante a palavra e a ação, promoverem os milagres que gestarão o mundo novo” (Idem, ibid).

Certamente a cidade é um desafio para a Igreja, isto porque, em todo o tempo de existên-cia ,a Igreja sempre deu o tom, o rumo das práticas, mas, no espaço urbano, a Igreja não possui o monopólio da verdade. Sozinha, ela não é capaz de dar todas as respostas e solucionar todas as questões.

José Comblin chama a atenção para alguns desafios para a igreja no contexto urbano. O pri-meiro desafio, que se impõe à Igreja, é abrir-se para o diálogo com a sociedade e se envolver com a realidade humana e urbana, com toda a sua complexidade. O segundo desafio é compreender os tempos de vida comunitária, entender que as pessoas possuem pouco e valioso tempo e que,

83

www.metodista.br/ead

Page 84: Guia de Estudo TEO-P5

por isso, aquele tempo passado comunitariamente deve ser vivido de forma intensa e prazerosa, ao mesmo tempo em que desafia a assumir compromissos. O terceiro desafio é inserir-se no con-texto dos excluídos, possuindo um canal de comunicação com esse contingente da população, estando presente em todos os dramas da vida humana, tornando-se ativo na vida política e na organização da cidade, sendo sinal e não se deixando sinalizar e seduzir pelo mercado (COMBLIN, 2002, p. 9.).

A cidade deve ser resgatada como um espaço de convivência e de relações, de exercício da cidadania plena, ela não pode ser reduzida a um palco de enormes desigualdades e injustiças sociais. O que mais vale na cidade são as relações entre os seus habitantes (COMBLIN, 1996, p. 46.). Mediante essa constatação, “a Igreja não pode abandonar a sua vocação pública, e perder com isso, sua relevância política” (CASTRO, 2000, p. 110-111), a práxis litúrgica, portanto, deve contribuir para o surgimento de ações promotoras de justiça e igualdade.

Entretanto, nas grandes cidades como São Paulo, há cidadãos de diversas classes. Alguns usufruem todo o espaço urbano com todos os seus equipamentos públicos e privados, mas, para muitos seres humanos, o espaço territorial e os benefícios da grande cidade são extremamente restritos (SANTOS, 1998, p.112.). Essa situação exige por parte da igreja um planejamento e uma estratégia de atuação que envolve o estudo e a compreensão do fenômeno urbano. É o que se discute a seguir, tendo a cidade de São Paulo como referência.

Referências

ARBEX JR. José; OLIC. Nelson Bacic. O Brasil em regiões: sudeste. São Paulo: Moderna, 1999.

CASTRO, Clóvis Pinto. Por uma fé cidadã: a dimensão pública da igreja – fundamentos para uma pastoral da cidadania. São Paulo: Loyola / Umesp, 2000.

COMBLIN, José. Os desafios da cidade no século XXI. São Paulo: Paulus, 2002.

_____________. Viver na cidade: pistas para uma pastoral urbana. 2. ed. São Paulo, Paulus, 1996.

HINKELAMMERT, Franz J. Pensar em alternativas: capitalismo, socialismo e a possibilidade de outro mundo. In: DUSSEL, Enrique (et al). Por um mundo diferente: alternativas para o mercado global. Petrópolis: Vozes, 2003.

OLIVEN, Ruben George. Antropologia de grupos urbanos. 5. ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2002.

RIBEIRO, Darcy. Povo brasileiro. São Paulo: Companhia das letras, 1998, p. 6.

SANTA ANA, Júlio. Pelas trilhas do mundo, a caminho do reino. São Bernardo do Campo: Imprensa Metodista, 1984.

SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. 4. ed. São Paulo: Nobel, 1998.

Universidade Metodista de São Paulo

84

Page 85: Guia de Estudo TEO-P5

A cidade de São Paulo como

um caso a ser analisado

Prof. Ms. Oswaldo de Oliveira Santos Junior

Objetivos: Possibilitar aos/às estudantes a oportunida-de de analisarem as principais situações que

marcam a realidade sociopolítica, econômica, cultural e religiosa do Brasil e do mundo e

relacioná-las ao compromisso social da Igreja.

Palavras-chave:Igreja; sociedade; religião; urbanização;

globalização.

Módulo

www.metodista.br/ead

Igreja e sociedade

Page 86: Guia de Estudo TEO-P5

O crescimento econômico teve origem no século XIX e se consolida na primeira metade do século XX. Atraiu um grande contingente populacional para a cidade de São Paulo, causando diversos problemas urbanos, tais como: déficit habitacional, violência e desemprego ou o subemprego. O processo de favelização é resultado direto desse processo bem como o fenômeno da macrocefalia urbana, o acelerado crescimento urbano sem contar com uma infra-estrutura adequada.

A Igreja, no contexto urbano, encontra uma série de desafios que necessitam ser superados: a violência, a fome, o desemprego, etc. A cidade de São Paulo é, sem dúvida, um exemplo desses desafios que carecem de superação por parte da Igreja comprometida com os valores do Reino de Deus, como se pode observar no Credo Social da Igreja Metodista:

Em cada época e lugar surgem problemas, crises e desafios por meio dos quais Deus chama a Igreja a servir. A igreja, guiada pelo espírito santo, consciente de sua culpa-bilidade e instruída por todo conhecimento competente, busca discernir a vontade de Deus e obedecer a ela nessas situações específicas (CÂNONES DA IGREJA METODISTA, 2007, p. 52)

Desta forma, os problemas sociais serão vistos no Credo Social como conseqüências de uma estrutura socioeconômica injusta, que carecem da intervenção profética da Igreja. A reflexão sobre a cidade de São Paulo tem o objetivo de estimular o debate e a busca de soluções para as crises e problemas sociais vividos no contexto urbano.

Por se tratar de uma cidade que experimentou um acelerado crescimento urbano, São Paulo experimenta uma série de situações que tornam a vida de seus habitantes bastante difícil, em es-pecial para aqueles habitantes que carecem de recursos financeiros para usufruírem toda a cidade e seus equipamentos públicos.

A alma do Brasil se encontra em São Paulo. A cidade é o coração econômico do País (ARBEX JR. 1999, p. 26.) É bastante importante salientar que o desenvolvimento econômico da cidade de São Paulo teve como principal causa a atividade cafeeira, que chegou pelo Vale do Paraíba, vinda do Rio de Janeiro, num processo extremamente rápido se espalhando por todo o estado.

Os problemas vividos em São Paulo são de diversas ordens e origens, o que torna a sua so-lução algo bastante complexo. A violência urbana, por exemplo, demanda uma série de recursos públicos e privados com a finalidade de atenuar a questão; no entanto, o que se observa é um crescente número na criminalidade e violência, o que nos leva a questionar se o planejamento estratégico no combate à violência na cidade é o mais correto.

Atualmente a cidade de São Paulo, com os 37 municípios que compõem a região metropo-litana, possui uma população de aproximadamente 18 milhões de habitantes (IBGE) 1, distribuídos por uma área de mais 8.000 km2.

A cidade de São Paulo ingressa no século XXI, possuindo mais de 10 milhões de habitantes. Isto faz com que seja o quarto maior aglomerado urbano no mundo, já que a sua região metro-politana possui uma população de cerca de 18 milhões de pessoas. Entretanto, as taxas de cresci-mento populacional têm decrescido nos últimos anos. Entre 1991 e 2000, por exemplo, a população cresceu apenas 1% ao ano, bem abaixo dos 5% verificados entre 1940 e 1970, período de intensa

Imagem 9

1 IBGE – Instituto brasileiro de geografia e estatística – http://www.ibge.gov.br

Universidade Metodista de São Paulo

86

Page 87: Guia de Estudo TEO-P5

industrialização e migração interna, ou que os 14% verificados na última década do século XIX, quando da imigração européia, sucedida pela imigração japonesa no início do século XX. (IBGE)

A população da cidade de São Paulo vem crescendo num ritmo inferior ao verificado na re-gião Metropolitana, no Estado de São Paulo e no Brasil como um todo. Porém, cabe lembrar que a população paulistana, no ano 2000, ainda representava 6,1% da população brasileira, quase 30% da população do Estado de São Paulo e cerca de 60% da população da Região Metropolitana de São Paulo, composta de outros 38 municípios.

O perfil dos habitantes da cidade de São Paulo vem se transformando ao longo das últimas décadas, o que exige uma adaptação e planejamento por parte da Igreja, visando uma interven-ção mais eficiente da ação pastoral, visando o pleno exercício de uma fé cidadã, compreendendo que este exercício requer uma Igreja capaz de participar, preferencialmente, das lutas da classe trabalhadora.

A cidade possui uma dinâmica que pode, ao mesmo tempo que promover o desenvolvimento, promover também elementos de destruição e definhamento de seus espaços e instituições. Disso resulta a necessidade de uma intervenção hábil por parte da igreja visando resgatar o desenvolvi-mento da práxis litúrgica em meio às angustias e dilemas em que vivem os habitantes da cidade, buscando as transformações sociais, econômicas e políticas que proporcionem a cidadania.

Várias são as questões que demandam uma ação efetiva da Igreja. Ao ocupar o espaço urbano a Igreja é desafiada a inserir-se em todas as camadas e segmentos da sociedade, a expressar uma verdadeira fé cidadã2, ou seja, uma fé que se envolve e penetra na dinâmica da cidade. Para tanto é necessário o desenvolvimento de uma pastoral litúrgica para o contexto urbano, fundamentada na práxis, como fundamentação para a reflexão, libertação e exercício da fé cidadã.

A Igreja frente à globalização neoliberalA globalização neoliberal em todos os seus contornos, seja econômico, político, cultural,

ou religioso, é um desafio para o ser humano moderno. Ela modelou, nas últimas décadas, uma sociedade nova, centrada em valores que desafiam a igreja e a humanidade. Ela cresce sem limita-ções, forçando os países da periferia do capitalismo a abrirem seus mercados aos países centrais, privatizando suas economias, flexibilizando os direitos trabalhistas e impondo ajustes econômicos por meio de organismos internacionais como o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Mundial, que não somente impede o desenvolvimento dessas economias como também contribui para perpetuar a exclusão social, impedindo o investimento em áreas sociais vitais para a sobre-vivência dos pobres e excluídos.

A igreja não pode ignorar a globalização neoliberal imposta à sociedade, como um elemento que norteia as ações dos indivíduos, e as mudanças culturais dos diferentes grupos de países. Diante das pressões para impor o “pensamento único”, fica o desafio constante de buscar, na diversidade de pensamentos e alternativas criativas, formas para a superação dos problemas que tocam a humanidade que vive sob os efeitos desse modelo econômico perverso e excludente.

ConsideraçõesA Igreja, quando desprovida de teoria social e de uma teologia que faz da experiência com

o Deus encarnado a sua realidade, tende a repetir as práticas que prevalecem na sociedade atual como: o fatalismo sedutor que elimina a esperança humana e sepulta as práticas comunitárias de solidariedade e fraternidade, assumindo uma lógica destrutiva e individualista, ficando impossibi-litada de dar um salto das práticas comuns e repetitivas para a práxis transformadora e criativa.

As comunidades cristãs vivem as tensões de seguir numa sociedade em que o ideal de vida é que cada qual persiga seu interesse privado e solitário (HINKELAMMERT, 2003, p. 11.) e ou insistir nas ações concretas de solidariedade e ajuda mútua, em contraposição à lógica da competição que vem promovendo a destruição dos laços comunitários. Tal ação torna-se possível com o permanente aprofundamento teológico e da leitura crítica da realidade social, com o objetivo de renovar permanentemente as celebrações e as práticas cotidianas da Igreja, permitindo que elas

87

www.metodista.br/ead

Page 88: Guia de Estudo TEO-P5

permaneçam com seu conteúdo profético, isto é, fundamentada na esperança cristã e no ideal de libertação dos oprimidos, portadora de forças de mobilização, emancipação e transformação da sociedade urbana.

Por fim, podemos afirmar que as cidades brasileiras são desiguais e violentas em suas rela-ções; a ocupação do espaço e os serviços oferecidos aos cidadãos são desiguais, transformando os seres humanos em cidadãos de diversas categorias. Diante dessas questões, a Igreja, que acolhe o ser humano não somente como cidadão, mas também como homem e mulher que refletem a imagem do Deus que os criou, possui o grande desafio de resgatar a dignidade desse homem e dessa mulher que se encontram excluídos social e economicamente. Esse desafio impõe uma práxis pastoral capaz de superar as ações comuns e repetitivas, buscando a transformação da sociedade e a organização popular. A partir da lógica neoliberal, aqueles que estão abaixo da linha de pobreza3 (aproximadamente 50 milhões de pessoas no Brasil) não são vistos, pois não consomem, não ditam moda, não interferem na vida política, quando não estão social e politicamente organizados. É para essas pessoas que a Igreja deve (preferencialmente) “lançar seu olhar”, na busca de promover a cidadania e a plena dignidade desses homens e mulheres.

A opção pelos empobrecidos não ocorre por mero oportunismo, mas se dá porque o cristão percebe que a lógica capitalista é extremamente excludente, marginalizando a pessoa em todas as relações.

3 Esta linha de pobreza baseia-se no consumo de bens e serviços. É sugerida para a América Latina e Caribe uma linha de pobreza de 2 dólares norte-americanos por dia. Para a Europa do Leste e repúblicas da antiga União Soviética, tem sido usada uma linha de pobreza de 4 dólares norte-americanos por dia. Para a comparação entre países industrializados, tem sido usada uma linha de pobreza correspondente à dos Estados Unidos, que é de 14,4 dólares por pessoa por dia. (Relatório de desenvolvimento humano http://www.undp.org.br).

Imagem 9 Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki Imagem:Panorama_morro_da_concei%C3%A7%C3%A3o.jpg>.Acesso em: 20 jun 2008

Referências ARBEX JR. José e OLIC. Nelson Bacic. O Brasil em regiões: sudeste. São Paulo: Moderna, 1999.

CASTRO, Clóvis Pinto. Por uma fé cidadã: a dimensão pública da igreja – fundamentos para uma pastoral da cidadania. São Paulo: Loyola/Umesp, 2000.

COMBLIN, José. Os desafios da cidade no século XXI. São Paulo: Paulus, 2002.

_____________. Viver na cidade: pistas para uma pastoral urbana. 2. ed. São Paulo, Paulus, 1996.

CÂNONES DA IGREJA METODISTA. Colégio Episcopal da Igreja Metodista. São Paulo: Cedro, 2007.

HINKELAMMERT, Franz J. Pensar em alternativas: capitalismo, socialismo e a possibilidade de outro mundo. In: DUSSEL, Enrique (et al). Por um mundo diferente: alternativas para o mercado global. Petrópolis: Vozes, 2003.

OLIVEN, Ruben George. Antropologia de grupos urbanos. 5. ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2002.

RIBEIRO, Darcy. Povo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

SANTA ANA, Júlio. Pelas trilhas do mundo, a caminho do reino. São Bernardo do Campo: Imprensa Metodista, 1984.

SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. 4. ed. São Paulo: Nobel, 1998.

Universidade Metodista de São Paulo

88

Page 89: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 90: Guia de Estudo TEO-P5
Page 91: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 92: Guia de Estudo TEO-P5
Page 93: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 94: Guia de Estudo TEO-P5
Page 95: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 96: Guia de Estudo TEO-P5
Page 97: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 98: Guia de Estudo TEO-P5
Page 99: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 100: Guia de Estudo TEO-P5
Page 101: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 102: Guia de Estudo TEO-P5
Page 103: Guia de Estudo TEO-P5

Polo:Curso: Bacharelado em Teologia

Nome do aluno:

N0 matrícula:

Prova IntegradaDesenvolvimento Teológico

Data:

Nota:

Page 104: Guia de Estudo TEO-P5