Guia de estudos - BRIC, potenciais e limitações

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BRIC: Potenciais e Limitações Introdução ao problema O termo BRIC foi criado pelo economista do banco de investimentos Goldman Sachs, Jim O’ Neill, para se referir ao grupo econômico formado por Brasil, Rússia, Índia e China em 2001. Entretanto, esses países não formam um bloco econômico, apenas compartilham índices de desenvolvimento comuns e economias semelhantes, configurando o acrônimo dos principais países emergentes no mundo. Esses Estados têm pontos comuns no que se referem a uma recente estabilização econômica, níveis de produção e exportação em crescimento, bem como de seu Produto Interno Bruto (PIB), recepção de grandes investimentos estrangeiros, uma situação política estável com a diminuição contínua das desigualdades sociais, rápida inclusão digital da população, investimento em infra-estrutura, mão-de-obra em processo de qualificação e em grande número, além de altos níveis de reservas de recursos minerais. O primeiro objetivo desse acrônimo seria a união de seus estados membros a fim de conseguir maior poder de barganha para defender seus interesses comuns. Além de buscar mais realce no cenário internacional, uma vez que, sozinhos, não possuem autoridade suficiente nas negociações com potências mundiais e dificilmente conseguirão alcançar reformas como, por exemplo, no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) e na estrutura do sistema internacional com a modificação das divisões mundiais. Após a primeira reunião presidencial do BRIC que aconteceu em junho de 2009 em Ekaterimburgo, localizada na região dos Montes Urais na Rússia, novos objetivos foram apontados como as reformas das instituições financeiras (Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial), a fim de conseguir maior representatividade no sentido multilateral com os países em desenvolvimento com o propósito de discutir meios de enfrentar a crise mundial e configurar uma nova ordem internacional pós-crise. Na realidade pode-se dizer que a crise foi o que uniu o grupo (RENARD, 2009), pois juntos os quatro países são responsáveis por 15% dos US$ 60,7 trilhões da economia global, 13% do comércio mundial e dispõem de mais de 40% das reservas de divisas de todo o mundo de acordo com a Deutsche Welle e o Goldman Sachs, o que os tornam os “novos protagonistas da economia global capazes de influenciar consideravelmente os rumos econômicos nas próximas décadas,

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Guia de estudos - BRIC, potenciais e limitações

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BRIC: Potenciais e Limitações

Introdução ao problema

O termo BRIC foi criado pelo economista do banco de investimentos Goldman Sachs,

Jim O’ Neill, para se referir ao grupo econômico formado por Brasil, Rússia, Índia e China

em 2001. Entretanto, esses países não formam um bloco econômico, apenas compartilham

índices de desenvolvimento comuns e economias semelhantes, configurando o acrônimo dos

principais países emergentes no mundo.

Esses Estados têm pontos comuns no que se referem a uma recente estabilização

econômica, níveis de produção e exportação em crescimento, bem como de seu Produto

Interno Bruto (PIB), recepção de grandes investimentos estrangeiros, uma situação política

estável com a diminuição contínua das desigualdades sociais, rápida inclusão digital da

população, investimento em infra-estrutura, mão-de-obra em processo de qualificação e em

grande número, além de altos níveis de reservas de recursos minerais.

O primeiro objetivo desse acrônimo seria a união de seus estados membros a fim de

conseguir maior poder de barganha para defender seus interesses comuns. Além de buscar

mais realce no cenário internacional, uma vez que, sozinhos, não possuem autoridade

suficiente nas negociações com potências mundiais e dificilmente conseguirão alcançar

reformas como, por exemplo, no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) e na

estrutura do sistema internacional com a modificação das divisões mundiais.

Após a primeira reunião presidencial do BRIC que aconteceu em junho de 2009 em

Ekaterimburgo, localizada na região dos Montes Urais na Rússia, novos objetivos foram

apontados como as reformas das instituições financeiras (Fundo Monetário Internacional

(FMI) e o Banco Mundial), a fim de conseguir maior representatividade no sentido

multilateral com os países em desenvolvimento com o propósito de discutir meios de

enfrentar a crise mundial e configurar uma nova ordem internacional pós-crise. Na realidade

pode-se dizer que a crise foi o que uniu o grupo (RENARD, 2009), pois juntos os quatro

países são responsáveis por 15% dos US$ 60,7 trilhões da economia global, 13% do comércio

mundial e dispõem de mais de 40% das reservas de divisas de todo o mundo de acordo com a

Deutsche Welle e o Goldman Sachs, o que os tornam os “novos protagonistas da economia

global capazes de influenciar consideravelmente os rumos econômicos nas próximas décadas,

já que é provável que os BRIC’s desempenhem um papel cada vez mais crescente”

(AMORIM, 2009).

Histórico do problema

As semelhanças entre os países deste acrônimo, todavia, não impedem a existência de

divergências que podem acabar causando o rompimento entre as partes e liquidando de vez as

perspectivas de se consolidar uma agenda internacional comum para formalização de um

bloco econômico. O surgimento de dissensões entre os membros tem sido conseqüência

principalmente das mudanças nos interesses primordiais que mantêm a união do grupo, uma

vez que se percebe que a economia já não ocupa o centro da mesa de discussões sozinha,

divide essa posição com questões da política e de segurança internacional.

O projeto de substituição do dólar como moeda comercial é um bom exemplo para

ilustrar esses desentendimentos. Não existe sequer um consenso entre os quatro países, uma

vez que com uma hipotética desvalorização da moeda norte-americana fortaleceria outras

moedas como o real, mas ao mesmo tempo causaria grandes perdas nas reservas

internacionais chinesas. As questões de segurança também não estão em sintonia entre as

potências médias, pois China e Índia possuem até hoje pendências e rivalidades e por isso têm

uma das regiões fronteiriças mais militarizadas do mundo. Além disso, China, Rússia e Índia

já são potências militares (sendo China e Índia também potências nucleares) enquanto o Brasil

possui um caráter pacifista.

Outro ponto ainda envolvendo a segurança nacional é a reforma do Conselho de

Segurança das Nações Unidas que é motivo de claro desentendimento. De um lado Brasil e

Índia lutam pela democratização e desejam avidamente mais espaço nas tomadas de decisão e

de outro lado Rússia e China por medo de perder posição e poder no cenário internacional não

apóiam tais mudanças (MURAKI; BANDEIRA, 2009).

Não existe também um projeto comum entre os BRIC que conflua para a

institucionalização do grupo, já que essas nações apresentam disparidades multilaterais. E

ainda, é importante ressalvar que não houve um elemento fundador desse fórum, o BRIC

nasceu quase que por um acidente, visto que não há aproximação histórica, geográfica ou de

interesses. Neste sentido o BRIC pode ser entendido como um mito que aos poucos vem se

tornando realidade (PUSHKOV, 2009), pois atualmente configura um grupo informal dentro

de fóruns mundiais que se reúne para debater pontos de vista a fim de tomar decisões

coletivas.

Embora haja a necessidade de acertar os objetivos comuns, as projeções futuras para o

BRIC apontam um bom potencial econômico. De acordo com o economista Cláudio Raza,

em menos de 40 anos os quatro países juntos representarão 40% da população mundial e terão

um PIB de mais de 85 trilhões de dólares. Além disso, provavelmente os BRIC já serão as

maiores economias do mundo, superando até mesmo as potências do G6 (Estados Unidos,

Reino Unido, Alemanha, Japão, França e Itália) de acordo com o banco Goldman Sachs

(2008).

Ainda de acordo com as progressões do Banco Goldman Sachs (2008), estima-se que a

China em 2040 pode se tornar a maior potência econômica mundial baseando-se em seu

desempenho industrial e em seu crescimento econômico ao longo do século XXI. Sendo

assim, irá dispor de uma enorme quantidade de indústrias e alcançará enorme poderio

tecnológico e militar. Com o crescimento de seu PIB em torno de 8% por ano, em termos do

dólar americano, a China ultrapassará nos próximos quatro anos a economia da Inglaterra, a

do Japão em 2015 e a dos Estados Unidos em 2039.

A Índia, talvez, tenha o melhor desempenho do grupo, pois estima-se que em

cinquenta anos o país alcançará a terceira posição no ranking das potências econômicas

(perdendo apenas para China e para os Estados Unidos respectivamente) devido ao seu

empenho em projetos profissionalizantes para sua grande população que se tornará detentora

de grande poder industrial e de investimentos em tecnologia. Sendo assim, tanto o setor

industrial quanto o setor de serviços se tornaram as duas grandes forças impulsionadoras da

economia indiana.

Já em relação ao Brasil, afirma-se que deve ser o país que mais se beneficiará com

essa política conjunta de crescimento e desenvolvimento econômico, pois as projeções

garantem que o país se torne a quinta potência mundial, devido à previsão de crescimento de

seu PIB que gira em torno de 3,6%. Outros fatores que podem ajudar o país a alavancar nessa

corrida para o Primeiro Mundo são a inexistência de conflitos religiosos, a consolidação de

um regime político e um sistema financeiro sólido. Entretanto, o que preocupa os economistas

e analistas internacionais é o passo em que o Brasil se desenvolve quando comparado às

outras economias do BRIC. A administração de Lula está promovendo algum progresso, mas

a estabilidade macroeconômica alcançada é insuficiente para atingir os níveis de projeções do

banco de investimento.

O potencial russo está na produção petrolífera e na produção de matérias-primas. Esse

ramo importante para a economia nas condições atuais deve permanecer em contínuo

crescimento por causa da inevitável escassez do petróleo. Portanto, as estimativas apontam

que a Rússia estará uma posição atrás do Brasil, sendo a sexta potência mundial em 2050 e

terá neste momento o maior PIB per capita das quatro potências emergentes. Na realidade, a

Rússia vem demonstrando um desempenho maior do que o desenhado pelos gráficos do

Goldman Sachs, já que tem alcançado média superior no que diz respeito à educação,

expectativa de vida e tecnologia. Contudo, ainda necessita rever seus números de inflação que

se apresentam em dígitos elevados.

Hoje, entretanto, percebe-se uma mudança por parte do próprio O’Neill quanto a tais

previsões, já que ele as rejeita ao dizer que elas podem ocorrer não mais nos próximos

cinqüenta anos, mas nos próximos vinte. Tal reformulação gera críticas de várias partes já que

se questiona se todos os países conseguirão uniformemente alcançar as metas previstas.

Posição do Brasil

Internacionalmente conhecidos como países emergentes ou em desenvolvimento o

Brasil e os demais integrantes do BRIC apresentam claramente características fortes de países

subdesenvolvidos com dependência econômica e desigualdade social. Entretanto, nas últimas

décadas, tais atores vêm causando um desenvolvimento em sua indústria e alcançando níveis

de crescimento consideráveis no cenário econômico mundial.

O Brasil é o único país do BRIC que se apresenta como uma democracia quando o

assunto é economia diversificada, ao contrário da Rússia que após drásticas transformações

em sua política, adotou como modelo, o estado liberal ocidental, onde o intervencionismo

reduz-se a um mínimo e as propriedades estatais foram entregues ao controle e administração

privada. Por outro lado, a China que embora apresente mercados abertos para negociações

econômicas, ainda vive debaixo de um governo comunista. Além disso, o Brasil conta com a

imensa vantagem de não conviver diretamente com o risco de sofrer ameaça de conflito

atômico por parte de seus vizinhos ou demais países do globo. Foi assim que o relatório

especial da revista britânica “The Economist” resumiu a importância do Brasil dentro do

BRIC e conseqüentemente dentro do cenário econômico internacional: “Ao contrário da

China, o Brasil tem uma democracia. Ao contrário da Índia, não tem conflitos étnicos e

religiosos ou vizinhos hostis. Ao contrário da Rússia, exporta mais petróleo do que armas e

respeita investidores estrangeiros”. Mas alerta: “o perigo hoje é o excesso de orgulho” (The

Economist: “O Brasil decola” –Novembro de 2009).

Hoje no BRIC, o Brasil é responsável pela exportação de commodities compostas de

matérias - primas agrícolas como a soja, a carne bovina e o minério de ferro. Essas

exportações têm sido à base da economia brasileira para alcançar uma estabilidade econômica

sólida desde seu ingresso ao grupo e o que o faz um parceiro bem visto dentro do grupo e

também no cenário internacional.

Apesar da gigantesca crise econômica que o mundo tem passado nos últimos meses, o

Brasil tem reagido bem aos efeitos dela, e suas parcerias financeiras com os países integrantes

do BRIC foram fundamentais para o sucesso dessa estabilidade no cenário econômico

internacional. Antes mesmo do agravamento dos problemas financeiros mundiais, os asiáticos

já haviam se tornado clientes basilares dos produtos primários brasileiros.

No entanto, existem discursos que demonstram certo pessimismo, pois para muitos

economistas como é o caso de Nobert Walter, economista-chefe do Deutsche Bank (Folha

Online, 2009), o mercado interno brasileiro que se demonstra supreendente forte não

conseguirá manter a dinâmica necessária para que o país saia totalmente ileso da crise, pois o

consumo só gera lucros consideravéis para setores específicos. Além disso, o Brasil e a Rússia

são vistos como os mais fracos dos BRIC por sua clara dependência do dólar e por não

apresentarem altos índices de crescimento econômicos como a Índia e a China.

Contudo, há uma série de fatores que constituem um cenário extremamente positivo

para investimentos. Em sua última visita ao Brasil, o economista O’Neill definiu o Brasil

como um “novo país sortudo”, já que a combinação entre suas commodities, as novas

descobertas de petróleo e a concentração de energia alternativa acaba elevando a sua imagem

dentro do grupo e consequentemente na conjuntura econômica internacional.

Posições dos outros atores

Em conjunto, tais potências medianas vêem conquistando um maior poder de

barganha na defesa de seus interesses mesmo possuindo estruturas econômicas distintas.

Sabendo disso, outros atores importantes no cenário internacional demonstram um

verdadeiro incômodo quanto ao crescimento dos BRIC, como Estados Unidos e União

Européia. Para o diretor do centro das Relações Transnacionais da China, a China ainda quer

minar a hegemonia norte-americana, criando algum tipo de poder multilateral sério que possa

desafiar a dominância estadunidense, uma vez que os países do BRIC concordam que os

Estados Unidos em breve não terão mais a dominação da economia em um aspecto global.

Segundo o Relatório Internacional de Negócios da consultoria Grant Thornton

International, há um aumento do comércio entre os países BRIC e as grandes economias

mundiais, como Estados Unidos e União Européia. O aumento das relações comerciais com

os países do BRIC tem sido especialmente benéfico para a União Européia, pois 36% das

importações brasileiras são de produtos deste bloco econômico. Já na Rússia, esse índice

ultrapassa a metade de suas importações (63%). E na China, os produtos europeus

representam mais de um terço de suas importações (41%).

No entanto, a crise econômica de 2008 contribuiu para que o mundo focasse sua

atenção para o grupo. Segundo o professor de Geografia política da USP André Roberto

Martin (Revista Escola Abril, 2009) com o passar dos anos, a idéia de que o BRIC tem tirado

o dinamismo da economia mundial do chamado Trilateralismo (EUA, Japão e União

Européia) vem crescendo. Ele ainda coloca que a trilateral não tem mais como crescer,

embora possua capital, diferentemente dos quatro países do BRIC.

Principais pontos para o debate

1) A entrada da Índia ou do Brasil no Conselho de Segurança da ONU pode desfazer

este acrônimo?

2) Quanto a não aproximação geográfica e/ou histórica entre os países pode afetar a

construção de um bloco econômico e/ou político?

3) É possível já falar de uma influência atual do BRIC no sistema internacional ou só

em influências futuras?

4) Quais os novos objetivos que apareceram na agenda dos BRIC após a crise

econômica?

5) Como os BRIC podem se tornar protagonistas da economia global?

6) Por que o Brasil pode ser considerado um “novo país sortudo” ?

7) Como a emergência dos BRIC pode alterar o equilíbrio de poder global?

8) Pode o BRIC se considerado um bloco de países contrários à hegemonia de EUA e

União Européia?

Bibliografia

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