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Processo de Formação para a Gestão Regionalizada do Sistema Único de Saúde do Estado da Bahia: 1. Curso de Especialização em Gestão Regionalizada do Sistema Único de Saúde (SUS) – Lato sensu 2. Curso de Especialização Técnica em Gestão Regionalizada do Sistema Único de Saúde (SUS) Guia de Orientações aos Educandos (as) SALVADOR, MAIO DE 2009

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Processo de Formação para a Gestão Regionalizada do

Sistema Único de Saúde do Estado da Bahia:

1. Curso de Especialização em Gestão Regionalizada do Sistema

Único de Saúde (SUS) – Lato sensu

2. Curso de Especialização Técnica em Gestão Regionalizada do

Sistema Único de Saúde (SUS)

Guia de Orientações aos Educandos (as)

SALVADOR, MAIO DE 2009

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Sumário

Atividades e programação ........................................................................... 4

Cronograma de atividades ........................................................................... 5

Textos de Apoio ............................................................................................ 7

Texto 1: Planejamento e razão instrumental: uma análise da produção teórica sobre planejamento estratégico em saúde, nos anos noventa, no Brasil

8

Texto 2: Planejamento e gestão em saúde: flexibilidade metodológica e agir comunicativo

17

Texto 3: Planejamento como tecnologia de Gestão: Tendências e debates do Planejamento em Saúde no Brasil

28

Texto 4: A difícil arte de fazer acontecer 45

Texto 5: A Meta 48

Texto 6: O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO 52

Texto 7: A MONTAGEM DE UM PROJETO – Árvore de problemas / Árvore de objetivos

54

Texto 8: A mudança do modelo de Atenção à Saúde no SUS: Desatando nós, criando laços

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Módulo VII – Informação e Avaliação em Saúde

Atividades e programação

Objetivo geral

Apresentar e discutir noções e teorias do ciclo planejamento, acompanhamento e

avaliação em saúde voltadas para o fortalecimento da gestão regionalizada do SUS na

Bahia, assim como avançar na orientação dos trabalhos de conclusão de curso

Cronograma de atividades

Dia 06/08/09 – quinta-feira – tarde (14h) – Auditório

Nos grupos de trabalho por macrorregião: Retomada da atividade de mediação com a prática: construção da “Árvore de

Problemas” da regionalização do sistema de saúde na Bahia.

Leitura e discussão de texto básico sobre o planejamento (anexo).

Dia 07/08/09 – quinta-feira – noite (19h)

Nesta noite, teremos uma mesa redonda que abordará o tema do Planejamento em

Saúde. Está organizada da seguinte forma:

� Prof. Washington Abreu – Processo de planejamento da SESAB e

articulação entre PPA/Planos de Saúde/Pacto pela Saúde;

� Profª. Luisa Regina Pessôa - O Planejamento e o Processo de

Incorporação de Tecnologias em Saúde (apresentação de peça de

teatro de 15 minutos e exibição de um vídeo de 15 minutos);

� Profª. Nanci Salles (SESAB) – Educação Permanente em

Planejamento: uma proposta de ação regional da SESAB.

Dia 07/08/09 – sexta-feira – manhã (09:00h) – Auditório Realização da Mesa redonda, que apresentará algumas propostas e experiências, tendo a seguinte composição:

� Profª. Carmem Teixeira – Planejamento em Saúde na América Latina e

seu arcabouço normativo e jurídico no Brasil e no SUS;

� Profª. Márcia Mazzei (SESAB) – Indicadores para monitoramento e avaliação;

� Profa. Luisa Pessôa - O Planejamento e a Gestão de Projetos de Investimentos em Saúde;

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Dia 07/08/09 – sexta-feira – tarde (14h)

No turno da tarde, nos grupos de trabalho, iremos rever as árvores de problemas e

construindo planos, projetos, programas e indicadores para o planejamento regional

em saúde.

Dia 07/08/09 – sexta-feira – noite (19h)

Retomaremos o assunto do Trabalho de Conclusão de Curso: notas sobre a produção

de conhecimentos no cotidiano da regionalização.

� Profª. Isabela Pinto e Profª. Liliana Santos

Dia 08/08/09 – sábado – manhã (09:00h)

� 09:00h às 10:30 – TCC (continuação) � 10:30h às 12:00h – Trabalho nos grupos: construindo propostas

descentralizadas para a educação permanente em planejamento.

Questão para pensar:

Quais indicadores e metodologias que poderão ser utilizados para avaliar a produção de impactos nos problemas identificados?

Textos de Apoio

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ARTIGO ARTICLE

Planejamento e razão instrumental: uma análise da produção teórica sobreplanejamento estratégico em saúde, nos anos noventa, no BrasilPlanning and instrumental rationality: an analysis of theoretical production in strategichealth planning in the 1990s in Brazil

1 Departamento de MedicinaPreventiva e Social,Faculdade de CiênciasMédicas, UniversidadeEstadual de Campinas.Rua Américo de Campos 93,Campinas, SP 13083-040, [email protected]

Rosana Onocko Campos 1

Abstract This article analyzes recent theoretical production in Brazil on strategic health plan-ning, focusing on instrumental logic. The approach centers on authors who have emphasizedtheoretical and methodological aspects of strategic planning. Emphasis is on the need to developa new instrumentality capable of answering dilemmatic questions faced in health issues (profes-sional health workers’ efficacy/personal achievement) in order to recover the teleological plan-ning action. The author provides a proposal that considers planning a modulator for the incor-poration of technology by health institutions.Key words Planning Techniques; Health Planning; Planning; Public HealthResumo Este trabalho analisa uma parte da produção teórica, no Brasil, concernente ao Plane-jamento Estratégico à luz da crítica à razão instrumental. O recorte está focado em autores que,na década de noventa, centraram sua produção na elaboração teórico-metodológica. Enfatiza-sea necessidade de construir alguma nova instrumentalidade capaz de dar conta do dilema eficá-cia/realização pessoal dos trabalhadores, considerado central para as instituições públicas desaúde, resgatando a ação teleológica do planejamento. Propõe-se pensar o Planejamento comomodulador de incorporação tecnológica em instituições de saúde.Palavras-chave Técnicas de Planejamento; Planejamento em Saúde; Planejamento; Saúde Pú-blica

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O problema do planejamento em saúdeno fim do séculoO objeto de estudo deste artigo é a produçãode teorias e métodos de planejamento em saú-de. Limitamo-nos a analisar a produção recen-te de alguns autores brasileiros que – ao toma-rem, como eixo, a questão do Planejamento Es-tratégico – elaboraram propostas teórico-me-todológicas, não se restringindo a aplicar me-todologias já existentes. Por isso, não foram in-cluídos outros autores que também oferecemcontribuições do ponto de vista da difusão demétodos e legitimação da área do Planejamen-to na Saúde Coletiva Brasileira (Paim, 1992; Tei-xeira, 1995). A citação de todos excederia os li-mites deste trabalho.Ponderamos que o Planejamento – “Ato ouefeito de planejar; Trabalho de preparação pa-ra qualquer empreendimento, segundo roteiroe métodos determinados (...); Elaboração, poretapas, com bases técnicas de planos e progra-mas com objetivos definidos” (Ferreira, 1997) –somente terá valor de uso se não perder suacapacidade instrumental. É campo metodoló-gico que visa os meios como seu fim. Sua razãode existir é, e será, operacionalizar organiza-ções e grupos para atingir fins; em razão disso,defendemos que é o método dos meios por ex-celência.Esta questão coloca o Planejamento dosanos noventa em meio a um dilema fundamen-tal: como fugir do papel controlador, advindoda razão instrumental, sem perder a própriainstrumentalidade, não deixando de ter valorde uso.Semelhante dilema está presente nos auto-res que analisamos: quem tentou problemati-zar, com ênfase, a questão da razão instrumen-tal, nem sempre conseguiu se avizinhar de no-va metodologia; quem inovou mais na questãometodológica, não conseguiu se aproximar cri-ticamente da razão instrumental nem questio-nar o caráter controlador do planejamento so-bre trabalhadores e grupos.Tentamos fazer a leitura crítica de alguns au-tores, encarando a crise do Planejamento comuma hipótese central: a crise do Planejamento,neste fim de milênio, é uma crise de seu relacio-namento com a racionalidade instrumental. Is-to porque foi neste fim de século que a críticada razão instrumental voltou à pauta, depoisde ter sido relegada, durante algumas décadas,aos espaços periféricos das análises político-sociais.A crítica do referencial estrutural-marxistae a queda do socialismo real, no final dos anosoitenta, recolocou a questão da subjetividade

no foco das correntes preocupadas com as or-ganizações (Morgan, 1996). Mas o trânsito en-tre esses dois pólos não tem sido fácil: enfati-za-se, nas análises, um ou outro ponto de vista.Consideramos que se trata de falsa dicotomiaentre instrumentalização e subjetivação. Dico-tomia que nós, planejadores, deveremos en-frentar e questionar, se quisermos atingir a vo-cação teleológica da área.

Referencial teórico: a razão instrumentalou a razão como instrumento?É em Horkheimer & Adorno (1989) que podemser encontradas as reflexões mais críticas a res-peito do “pensamento cegamente pragmatiza-do” como a nova mitologia da modernidade; opensamento que teria perdido seu caráter crí-tico e sua relação com a verdade e, para o qual,“A natureza desqualificada torna-se o materialcaótico de uma simples classificação” (Horkhei-mer & Adorno, 1989:8).Para esses autores, somente a arte e o pra-zer escapariam do imperativo de prestar con-tas no mundo administrado: “(...) para o positi-vismo, que ocupou o posto de juiz da razão es-clarecida, uma digressão pelos mundos inteligí-veis não é apenas mais proibida, mas é vista co-mo uma tagarelice sem sentido” (Horkheimer &Adorno, 1989:19). Nessa perspectiva, o pensa-mento só pode ser legitimado como reduçãoao formalismo lógico, “a subordinação dócil darazão aos achados imediatos” (Horkheimer &Adorno, 1989:19). Nesse processo, sujeito e ob-jeto tornam-se nulos e a operação entre espíri-to e mundo é resolvida sem deixar resto. O pas-sado é expulso e colocado à disposição do ago-ra a título de saber praticável. Em contraparti-da, esses autores propõem pensar os dados“(...) como superfície, como momentos mediati-zados do conceito que só se preenchem no des-dobramento de seu sentido social, histórico, hu-mano (...)” (Horkheimer & Adorno, 1989:19). Aanálise que fazem do mundo contemporâneo,procura no Iluminismo a raiz do sistema de do-minação do trabalho e da reprodução das rela-ções sociais de poder estabelecidas.Horkheimer & Adorno (1989) buscam, norelato homérico da Odisséia, o entrelaçamen-to entre mito, trabalho e dominação. QuandoUlisses estabelece a divisão do trabalho em seubarco para resistir às sereias, estabelece os pri-mórdios da ordem social: o dono, que faz osoutros trabalharem para ele, assumirá o riscode escutar o canto mágico. Já seus companhei-ros, com as orelhas tampadas com cera, nadasabem da beleza do canto das sereias, só conhe-

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cem o perigo que implica. Fiéis ao seu papelsocial, reproduzem a vida do opressor ao mes-mo tempo que a sua própria. A tentação é neu-tralizada em puro objeto de contemplação, emarte. O prazer é separado, para sempre, do mun-do do trabalho.Hoje assistimos à colonização do senso co-mum, resultante da hegemonia do positivismono mundo científico, e à rendição da humani-dade ao reinado do mundo prático, adminis-trado. A técnica alarga seu espaço até ocupar oposto da teoria, e os métodos dos “meios” sãotransformados em “fins” em si mesmos.É nesta linha de crítica que nos propomos afazer a leitura dos autores brasileiros contem-porâneos que problematizaram o Planejamen-to. Mas, quando se trata de pessoas e institui-ções, enfrentar a questão da razão instrumen-tal só resolve parte do problema: com qual ouquais razões se deve repensar uma metodolo-gia de Planejamento? As questões humanas edo mundo social nunca poderiam ser reduzi-das ao mundo racional. Faz-se necessário am-pliar o referencial teórico.Segundo outros autores (Benasayag & Charl-ton, 1993), estamos diante de duas grandesrupturas, na época contemporânea. A primeirafoi estabelecida pelo marxismo, ao anunciarque não existe o bem comum “em si”, que ele écontraditório e conflitivo no devir dos proces-sos. Segundo essa leitura, as amarrações esta-riam determinadas por dada estrutura socialde produção. Todavia, para o marxismo e vá-rias das correntes estruturalistas, existe a pos-sibilidade de um agir racional: o agir do racio-cínio crítico, ao qual se chegaria, pela síntesedialética, superando a alienação dos trabalha-dores.A outra ruptura foi produzida pelo adventoda psicanálise. Freud teria “quebrado” a maiorilusão da modernidade: o agir racional estariaindefectivelmente contaminado pela pulsão demorte: o homem, como sujeito de carência, ja-mais poderia alcançar o desejado a não ser en-carnado em objetos parciais e transitórios. Omundo da razão está contaminado e compeli-do à reiteração: “Si todos los hombres piensan(...) tratar su subjetividad, su aprehensión delmundo como un simple velo a desgarrar paraacceder a la visión objetiva y unívoca de unmundo de verdades fue uno de los errores fun-damentales de la modernidad (...) cuando seelimina la subjetividad de un ser, es el ser mis-mo lo que uno elimina” (Benasayag & Charlton,1993:26).Na teoria geral da administração (TGA), alógica predominante é a da adaptação dos su-jeitos à organização e o controle maquilado

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dos sujeitos pela organização. As instituiçõesteriam vindo ao mundo não para melhorar avida dos homens, mas para serem eficientes.Quando, na equação eficácia/eficiência, a ên-fase se coloca puramente nesta última, deslo-ca-se a discussão dos fins para os meios em si.Localizamos aí o efeito colonizador da razãoinstrumental.Ao avaliarmos que o senso comum é colo-nizado pelo agir instrumental, pretendemosexercer o raciocínio crítico. Propomos uma re-flexão acerca do novo Planejamento para enti-dades públicas, sejam elas estatais ou não. Ain-da que essas entidades trabalhem reproduzin-do a lógica das entidades privadas (eficiência/dominação), mesmo assim, pensamos que énelas que o pólo contra-hegemônico (eficácia/realização pessoal) pode, se estimulado, apare-cer com mais facilidade: “En general la razóninstrumental es la que se halla al servicio de al-gún otro tipo de razón que se estima principal;según ello, la razón instrumental es ancillar ysubordinada a una razón ‘sustantiva’ o ‘subs-tancial’(...) parece que la razón instrumentalsea un ‘saber cómo’ a diferencia de un ‘saberqué’.” (Ferrater-Mora, 1994:3010).Como planejadores contemporâneos, te-mos responsabilidades. É demanda freqüentedas equipes de saúde a de um assessor de pla-nejamento para organizar o “como fazer”. Fre-qüentemente, enquanto técnicos de planeja-mento, chegamos para instrumentalizar um“saber como” sem interrogar as finalidades es-tabelecidas. Nesses casos, em nome dos méto-dos prontos, os sujeitos são sacrificados. De-fendemos que, em Planejamento, cabe enfati-zar a necessidade de colocar “o que fazer” emanálise, pois este é sempre anterior ao “comofazer”. E este “o que fazer” não é dado a priori.Deve ser a primeira construção do grupo, umesforço que contribuiria para a constituição daidentidade do grupo (Onocko, 1998). Este olharpode alargar o campo do Planejamento. Por ou-tro lado, enfrentando problemas do dia-a-diados serviços, é freqüente encontrar pessoasbem intencionadas com pouquíssimos recur-sos técnicos. Eficácia zero. Neste ponto é queressaltamos a responsabilidade dos planejado-res, oferecendo competência técnica para ins-trumentalizar as equipes em relação aos meios.

Análise dos autoresDe acordo com nossa análise, a produção deteorias e métodos de planejamento estratégicoem saúde dos autores investigados desenvol-veu-se em, pelo menos, quatro linhas diferen-

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tes de acordo com o enfoque predominante, asaber:• O resgate da potencialidade comunicativado Planejamento Estratégico, empreendidopor autores da Escola Nacional de Saúde Públi-ca do Rio de Janeiro, em especial Javier UribeRivera e Edmundo Gallo.• A ênfase no subsídio do Planejamento Es-tratégico para a gestão democrática, que carac-teriza os trabalhos de, entre outros, EmersonMerhy e Gastão Campos, do Departamento deMedicina Preventiva e Social da UniversidadeEstadual de Campinas.• O aprimoramento de uma técnica de Plane-jamento de Luiz Carlos de Oliveira Cecílio, doDepartamento de Medicina Preventiva e Socialda Universidade Estadual de Campinas.• O esclarecimento do Planejamento em re-lação às teorias da complexidade em voga,empreendido, de modo destacado, por AdolfoChorny, da Escola Nacional de Saúde Públicado Rio de Janeiro.Planejamento como meio da ação comunicativaA importante contribuição de Rivera para aárea de Planejamento em saúde caracteriza-sepela preocupação em ligar os conteúdos doplanejamento a uma reflexão filosófico-episte-mológica (Rivera, 1989). Ele aproxima, funda-mentalmente, a Teoria do Agir Comunicativode Habermas à área de Planejamento, visandoquebrar a instrumentalidade exacerbada decertos métodos.No texto O Planejamento situacional; umaanálise reconstrutiva (Rivera, 1992), a tarefa de-senvolvida por Rivera é exaustiva. Ele propõeum contraponto teórico entre o Agir Comuni-cativo e o Planejamento Estratégico Situacio-nal (PES). A partir dessa perspectiva teórica,questiona o PES de Carlos Matus, denunciandoo determinismo que o autor chileno atribui àestrutura econômica, o poder determinante daestrutura técnica e o rigor explicativo de “con-tornos pragmáticos” (Rivera, 1989:53). Diz ele:“(...) parece que na ânsia de uma estruturação,a proposta matusiana exacerba as pretensõescontrolistas do planejamento e o aproxima deuma abordagem objetivista. Isto fica em evidên-cia quando a comunicação é sublinhada emuma perspectiva um pouco instrumental” (Ri-vera, 1989:90). Ressalta ainda que há “(...) ne-cessidade do planejamento situacional revalo-rizar as estratégias de negociação e de coopera-ção, em prol da legitimidade dos planos. Istoimplica assumir uma perspectiva mais descen-tralizada de mundo, trazendo à tona o mundo

social dos atores para além da fria compreensãodo planejamento enquanto tecnologia (...)” (Ri-vera, 1989:89).Na fase de formulação operacional, contu-do, Rivera parece querer conciliar a teoria dacomunicação com o método proposto por Ma-tus. Assim, para ele,“(...) (a intenção dos atores)deve ser perquirida à luz da ideologia, da histó-ria social, da inserção material e das predispo-sições pessoais dos atores (das personalidadescomo acumulações)” (Rivera, 1989:75).O trabalho de Rivera (1989) traz grandescontribuições do ponto de vista da crítica e al-guns questionamentos fundamentais que, acre-ditamos, devem ser ressaltados neste fim de sé-culo. Entretanto nossa leitura de seu trabalhoconstata que ele está interessado, ainda nessetrabalho, numa reconstrução do formato me-todológico matusiano. Assim, a análise dos su-jeitos acaba repetindo a determinação matu-siana: os sujeitos determinados, as personali-dades como “acúmulos” e os sujeitos como “pos-suídos”.Gallo (1992), em sua obra Razão, poder epolítica para repensar o planejamento, buscaconformações históricas para explicar as rela-ções entre Estado, sociedade, razão e poder.Rastreia as raízes dessas relações desde os gre-gos até chegar às concepções modernas de Es-tado. “Fecha-se o ciclo colonizador: a economiae o subsistema estatal diagnosticam, delimitame definem os caminhos sociais. O resultado é amonetarização e a burocratização do mundovivido; é o bloqueio das ações comunicativas e adespolitização da sociedade; é a impossibilida-de desta definir suas normas autonomamente,de se tornar sociedade instituinte. É a derrotada interação e a vitória da técnica” (Gallo, 1992:32). O autor faz uma crítica do agir instrumen-tal e de sua colonização da vida.Ao chegar à crítica do planejamento, esseautor resgata outra crítica – a de Castoriardis –em relação à impossibilidade de separação to-tal entre meios e fins. Sem dúvida, Gallo co-nhece bem o problema de subsumir o planeja-mento a uma mera questão técnica, formal.Nas formulações finais, defende: “(...) é es-sencial para que a humanidade caminhe em di-reção ao seu interesse maior: sua emancipaçãoenquanto espécie tanto das limitações que a na-tureza lhe coloca – ao desenvolver sua raciona-lidade instrumental – quanto das formas de re-pressão social – através da racionalidade comu-nicativa.” (Gallo, 1992:33). Consideramos que ahumanidade não se liberta das limitações danatureza apenas por meio da racionalidade ins-trumental; nem tampouco concordamos que asformas de repressão social possam acabar pu-

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ramente através da racionalidade comunicati-va. Esse tipo de armadilha é o maior triunfo darazão instrumental, pois ela pretende que umaúnica racionalidade dê conta de todas as or-dens de problemas.O planejamento como subsídio da gestão democrática e das mudançasNa obra de Campos (1989), o Planejamento apa-rece somente como método alternativo para ra-cionalizar e adequar estruturas e equipamentos,colocando-os a serviço de novo modelo assis-tencial. O Planejamento está vinculado à ques-tão da instituição de modelo inovador de gestão.Campos está próximo de Testa e de outros in-telectuais latino-americanos que viram no Pla-nejamento uma ferramenta capaz de opor-se aque as leis do mercado sejam as únicas ordena-doras dos sistemas médico-sanitários. Além dis-so, para ele, os planos deveriam operacionali-zar sínteses entre as diretrizes de eficiência e asde eficácia; e entre a saúde pública (prática maiscoletiva) e o atendimento médico individual(baseado na clínica médica). Campos esperaque o Planejamento seja incorporado ao debatesanitário brasileiro e o resgata como instrumen-to capaz de promover mudanças, fazendo ape-lo a sua dimensão teleológica (Campos, 1989).Pode-se afirmar que, além dessas expecta-tivas, e a de que o Planejamento possa servircomo setting para organizar uma gestão maisdemocrática e participativa, Campos não temmais demandas para o Planejamento em Saú-de. Para ele, o Planejamento é mais um item dagestão, ao contrário de Matus, para quem agestão é item do Planejamento (Matus, 1993).Essa inversão faz diferença, pois, para Campos,haveria gestão ainda que sem Planejamento,mas não poderia haver Planejamento sem ges-tão. A questão nuclear em toda a obra desseautor é a de como utilizar o instrumental dagestão para propiciar a construção de sujeitosmais livres e criativos, comprometidos com vi-são de mundo mais solidária e com o resgate dovalor de uso do trabalho (Campos, 1992).Em textos posteriores, a questão metodoló-gica é revalorizada e, na procura de caminhosoperacionais, abre-se o campo do Planejamen-to a outras disciplinas: “Do ponto de vista teóri-co (...) temos nos apoiado criticamente, basica-mente reservando-nos o direito de reelaboração(...), de Gramsci ao Agir comunicativo de Haber-mas, do planejamento estratégico às avaliaçõesde desempenho, em tudo temos buscado instru-mentos úteis ao sucesso de projetos (...). Ultima-mente, temos valorizado o acervo já acumuladopelos movimentos de psicoterapia e análise ins-

titucional (...). Talvez devêssemos nos apropriarde vários destes ensinamentos (...) imagino quetodo gerente, coordenador ou integrante deequipes de saúde, deveria receber formação e serorientado para operar com esses conhecimentosno dia-a-dia” (Campos, 1994:47).Preocupando-se com a possibilidade de quea instrumentalidade exacerbada venha a trans-formar-se em “problema das nossas soluções”,denuncia: “Comumente, o planejamento nãoconsegue perceber que o social nunca é só umaabstração estatística, mas que também se encar-na no doente e em sua doença (...)” (Campos,1994:60). O Planejamento aparece-lhe comorecurso, mais um, não o único nem o principal,inclusive com problemas.As principais contribuições teóricas deCampos à área de Planejamento são: ter mos-trado a necessidade de abertura para o camposubjetivo e as disciplinas que o abordam, paraalém das propostas metodológicas prontas; ehaver ressaltado que o resgate da função teleo-lógica está indefectivelmente ligado à questãoda eficácia, e esta, à produção de valor de uso.Merhy (1995), em Planejamento como tec-nologia de gestão: tendências e debates do pla-nejamento em saúde no Brasil, busca uma tipo-logia das configurações do Planejamento comotecnologia da ação. Descreve três situações bá-sicas (Merhy, 1995:119):a) “O planejamento como instrumento/ati-vidade dos processos de gestão das organiza-ções, tendo em vista que nestas ocorrem proces-sos de trabalho.”b) “O planejamento como prática socialtransformadora, tendo em vista a determinaçãode novas relações sociais.”c) “O planejamento como método de açãogovernamental, tendo em vista a produção depolíticas.”Merhy questiona o uso do Planejamentonos regimes socialistas pois, “(...) tentar cons-truir uma tecnologia de governar o processo his-tórico desembocou numa práxis totalitária, en-quanto, por outro lado, construir uma tecnolo-gia de governar o processo de trabalho pode efe-tivamente levar a um aumento da eficiência eeficácia dos meios” (Merhy, 1995:125).A nosso ver, no entanto, o governo planeja-do do processo de trabalho, visando a eficiên-cia dos meios, foi muito bem atingido pelo tay-lorismo. E esse é um modelo paradigmático doque significa “governar o processo de trabalho”.O grande desafio estaria colocado no desenvol-vimento de algum instrumental que desse con-ta “de “desgovernar” o processo de trabalho. Oprocesso de trabalho em saúde já está forte-mente governado: pelas lógicas dos saberes,

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das formações corporativas, das diretrizes or-ganizacionais etc. (Onocko, 1998). Portanto, odilema não é como governá-lo, mas como libe-rá-lo. O próprio Merhy, em trabalhos posterio-res, avança nessa questão, propondo ferra-mentas para promover a liberação do trabalhovivo (Merhy, 1997).Em relação à produção de políticas, Merhyconsidera o Planejamento uma “tecnologia degestão de políticas” (Merhy, 1995:128) e, nestecaso, ele é arma do governo. Várias vezes emseu trabalho, Merhy aborda a questão do Plane-jamento como ferramenta governamental. Con-tudo, pensamos que o Planejamento tambémpode vir a instrumentalizar para a ação gruposque não estão necessariamente no governo.Esse autor não abre mão do agir racional,mas está pensando em múltiplas e não em ra-cionalidade única. Merhy alarga o campo doPlanejamento, parecendo, em algumas passa-gens, que até o dilui, confundindo-o ora com apráxis política ora com a gestão: “Nos casos emque a gestão da política se torna o campo doplanejamento (...) a dimensão instrumental doplanejamento cede lugar à lógica da política eda conformação histórica dos processos institu-cionais (...). Desse modo, todos os métodos queprocuram impor-se aos instituintes, ambicio-nando ser em si um instituinte, acabam confi-gurando-se como processos prescriptivos/nor-matizadores (...)” (Merhy, 1997:148).Desta maneira, para ser instituinte de mu-danças, o Planejamento deveria acabar com osmétodos, uma proposta que dificulta construircerta instrumentalidade. Merhy não está preo-cupado com isto, o que ele quer é desconstruira visão determinista e fechada do agir instru-mental, representado pelas várias correntes dePlanejamento que analisa. É essa a sua maiorcontribuição teórica.O planejamento como técnicaPossuir alguma técnica – “Maneira, jeito ou ha-bilidade especial de executar ou fazer algo”(Ferreira, 1997) – parece ser o centro da ques-tão, quando se pensa o problema de certa ins-trumentalidade.Entre os autores revisados por nós, foi Cecí-lio (1997) quem demonstrou maior preocupa-ção em superar os impasses colocados à apli-cação sistemática de técnicas de Planejamen-to. O seu objetivo: manter algum rigor metodo-lógico, tornando, ao mesmo tempo, acessívelao maior número de pessoas os segredos doPlanejamento. Em Uma sistematização e dis-cussão de tecnologia leve da planejamento es-tratégico aplicada ao setor governamental, Ce-

cílio (1997), sistematiza e divulga seu método,desenvolvido em longos anos de experiência.Esse autor sugere nova tecnologia de plane-jamento: “PES modificado ou ZOOP (sigla ale-mã “Zielorientierte Projektplanung” – Planifi-cação de Projetos orientada a objetivos) enri-quecido com PES”, cujo desenvolvimento visadar conta: “(do) tempo como recurso escasso dosdirigentes e da necessidade de tornar acessível omanuseio de tais tecnologias a um número cres-cente de pessoas (...)” (Cecílio, 1997:152). Cecí-lio descreve o modo como desenvolve seu tra-balho de planejador. Revela suas fontes (PES,ZOOP) e fundamenta a escolha de seu recorte.Criticamos, todavia, o recorte do momentoexplicativo do PES, que Cecílio substitui pelaárvore explicativa do ZOOP, pois, a nosso ver,perde-se a etapa mais complexa e demoradado método, mas também a mais rica em críticae potencialidade de construção de uma com-preensão do mundo para além da linearidadedo senso comum (Onocko, 1998).Cecílio recomenda enfaticamente deter-sena descrição cuidadosa dos problemas: “(...) éuma etapa muito importante por duas razõesprincipais: a) para afastar qualquer ambigüi-dade diante do problema que se quer enfrentar.b) quando bem feita, tem como produto os indi-cadores que serão utilizados para avaliar os im-pactos do plano.” (Cecílio, 1997:155). Para Ma-tus, eludir a explicação das causas e meramen-te descrever os problemas é “(...) vício da pla-nificação normativa” (Matus, 1993:245).Nossa experiência em assessoria de Plane-jamento leva-nos a preferir pensar os proble-mas como dados: “como superfície, como mo-mentos mediatizados do conceito que só se pre-enchem no desdobramento de seu sentido social,histórico, humano (...)” (Horkheimer & Adorno,1989:19). Com esse olhar, “afastar (completa-mente) a ambigüidade” é tarefa impossível, e“quantificar” é uma cristalização muito útil,porém, temporária. Se assumimos que os pro-blemas são dados que precisam ser desdobra-dos, não podemos concordar com a propostade, simplesmente, enfatizar a descrição.Também criticamos a simplificação do mo-mento estratégico, transformando-o em sim-ples análise de controle de recursos e interessedos atores, já que entendemos esse momentocomo chave para a constituição da identidadede um grupo. “De fato seria esse o momento-chave para a equipe se confrontar com a per-gunta: quem somos? Quem são os outros? Esta-mos imaginando o mesmo futuro? Desejamosas mesmas coisas?” (Onocko, 1998:97).Para Cecílio, “(...) um grupo gerente de pro-jeto não é ator. O ator, no caso, é a autoridade

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que instituiu o grupo” (Cecílio, 1997:153). Lei-tura instrumental, esmagando os sujeitos: seráque se pode supor que um grupo de gerentesfuncionaria – de fato – como simples correia detransmissão da vontade, do desejo ou do proje-to do chefe-autoridade? Pessoalmente aproxi-mamo-nos mais da idéia de identidade do queda concepção instrumental de ator. Defende-mos que todo grupo cria certos padrões de sub-jetividade a partir das singularidades dos sujei-tos que o compõem, e que é a partir desse posi-cionamento que a tarefa comum se faz possível.Voltando ao texto de Cecílio, resgatamosseu esforço em construir nova metodologia sis-temática; contudo, ressaltamos a falta de críti-ca ao controle advindo da ação instrumental.O planejamento como meio de intervenção em ambientes complexosO texto de Chorny (1998) Planificación en sa-lud: viejas ideas en nuevos ropajes começa peloresgate do sentido, dos fins do Planejamento:“El propósito de la planificación en salud es lasalud (...) Es algo habitualmente aceptado quela planificación está referida al futuro” (Chorny,1998:1). Testa (1997) defende que existem ra-zões “porquê”, referidas ao passado, que expli-cam, e “razões para”, referidas ao futuro, quedão motivos para agir. A colocação de Chornyparece óbvia, mas não é. Se o planejamento es-tá referido ao futuro, precisará de “razões para”,o que concorda com nosso argumento a res-peito de certa razão substantiva, que deveriaser anterior a toda razão instrumental na horade agir. Chorny (1998) é taxativo quando enun-cia os fins: a produção de saúde. Na quase nun-ca explicitada equação eficiência/eficácia, eleressalta a eficácia. Questão praticamente es-quecida por alguns planejadores modernosque entraram na pós-modernidade para tornareficientes (leia-se, baratas) as instituições.Nesse trabalho, Chorny (1998) repassa todaa tradição de planejamento latino-americano efaz uma análise do cenário futuro, colocandoaspectos a serem abordados no planejamentoem saúde. Em relação ao passado do planeja-mento, Chorny honra a tradição, que bem co-nhece por ter participado do grupo de formula-dores nesse campo. O que o separa da maioriados planejadores é sua aguda capacidade críti-ca. “Se puede afirmar, sin temor a cometer gran-des injusticias, que, actualmente, gran parte delos modelos de planificación en el área de la sa-lud son orientados por el simple y único objeti-vo de reducir gastos, privilegiando la racionali-dad de los medios sobre los fines” (Chorny, 1998:13). Após contextualizar as teorias da comple-

xidade, afirma: “Así, lo que deberia ser un me-dio, se transformó en un fin” (Chorny, 1998:16).Para ele, o primeiro objeto de reflexão dosplanejadores deverá ser a situação de saúde, osegundo, a dimensão metodológica, e o tercei-ro, a ação. Em relação à dimensão metodológi-ca, pondera: “(...) La reflexión es substituida porel dogma disfrazado de enunciado científico.Las panaceas milagrosas (japonesas, alemanaso de cualquier otro lugar del mundo) proponenel éxito fácil para quien sea que las adopte (...)Para superar los conflictos generados por estasmaneras de ver la realidad (...) es preciso dejarde lado los preconceptos y admitir la interrela-ción dialéctica entre métodos, sujetos y objetos”(Chorny, 1998:17).Na análise dos momentos do planejamen-to, Chorny ressalta o momento tático como omomento da programação, resgatando o uso deferramentas específicas para esse fim. Este émais um grande esquecimento dos planejado-res modernos que não passa despercebido aesse autor. Resumindo, o próprio autor con-clui: “Los planificadores (...) se ocupan del con-trol de gastos. (...) La innovación se transformóen un fin en sí mismo, no se innova para hacerfrente a nuevos problemas o a viejos problemasno resueltos, se crean ‘ondas’ para hacerse un lu-gar (...)” (Chorny, 1998:33).Metodologicamente, Chorny poderia serconsiderado um planejador clássico. Todavia,sua aguda visão de mundo permite-lhe ressal-tar a centralidade do conjunto das finalidadespara enfrentar os desafios da complexidade.Paradoxo do fim de século: certas leituras clás-sicas ganham tremenda atualidade.

A título de conclusãoNosso foco nos autores concorda com Foucault(1987), quando defende que a pergunta centralna interpretação é “quem?”. Escolhemos auto-res que respeitamos e valorizamos pela contri-buição ao campo do Planejamento e Gestãoem Saúde Coletiva. Nos autores revisados apa-receu com muita clareza como o objeto de preo-cupação de cada um deles foi, simultaneamen-te, solução e obstáculo para enfrentar os dile-mas meios-fins e controle-subjetivação. Consi-deramos que a complexidade da tarefa de pla-nejar instituições de saúde exige que esses di-lemas sejam enfrentados. Dificilmente, porém,um método ou teoria, sozinho, poderia dar con-ta de tamanho recado.Propomos recuperar a idéia de Planejamen-to como mediação (Onocko, 1998), o que per-mitiria articular a questão da lógica dos fins

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com a necessária operacionalidade, mas já nãomais como tecnologia. Mario Testa (1997) dizque o “saber fazer” em ciências sociais não seincorpora – como no caso das ciências duras –como tecnologia, mas como ideologia, e queisto é possível a partir da interpretação históri-ca (Testa, 1997).Uma interpretação do Planejamento, nostermos de Foucault (1987), tal como vem sen-do pensado e desenvolvido em épocas recen-tes nas organizações, permite-nos propor mu-dar a idéia do Planejamento como corpo tec-nológico (representado por métodos prontos eacabados) e outorgar-lhe o papel de modula-dor de incorporação tecnológica. Assim, o Pla-nejamento poderia ir subsidiando a incorpora-ção de outras ferramentas e técnicas para cons-tituir roteiros, mais ou menos modulados parasituações-tipo. Essas situações compreende-riam: momentos dos grupos, momentos da or-ganização, pontos críticos do projeto (seja co-mo vulnerabilidade ou desafio institucional).Pensar criticamente exige certa capacidadeanalítica para apreender o sentido social, his-tórico e humano de nossas práticas. E jogarcom essa capacidade exclui a submissão a re-ceitas prontas. Por que determinado grupoconsegue levantar alguns e não outros proble-mas? O recorte dos problemas, o porquê desserecorte, poderia ser um dos momentos centraispara fazer a ponte entre a capacidade instru-mental do Planejamento e a questão de “o quefazer”, do sentido, dos fins perseguidos pela al-

mejada mudança. Defendemos que o Planeja-mento pode fazer a mediação entre uma racio-nalidade crítica, a serviço da liberação das pes-soas, e a necessária cota de instrumentalidadeoperativa (Onocko, 1998).Assim como Castoriardis (1987) argumentaa não-separabilidade total entre meios e fins,defendemos a não-separabilidade entre o agirracional e o momento subjetivo dos grupos quese preparam para, ou estão em ação. Propomosexplorar a idéia de identidade dos grupos, dasinstituições, como construção possível a partirdas identidades individuais, sem apagar asidentidades dos sujeitos. Construção que o Pla-nejamento poderia bem subsidiar.Isso traz à tona a questão de nossa propos-ta não ser mais a de um método, mas a de umterritório de composições disciplinares varia-das que permitiriam a incorporação tecnológi-ca seqüencial segundo demanda. A intenção évalorizar essa demanda, e conseguir tambémoperacionalizá-la, honrando o compromissoteleológico do Planejamento enquanto ativida-de, respeitando, sobretudo, a compreensão davida e a dinâmica dos processos como fluxos,gradientes, sempre provisórios e situacionais.Foucault (1987) afirma que a interpretaçãohermenêutica moderna está sempre relaciona-da com certa terapêutica. Talvez, no fundo, es-tejamos atrás de uma “cura”, a dos males pro-vocados pela aplicação instrumental de certosmétodos que acabaram sendo fetichizados poralguns planejadores modernos.

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TIG

O A

RT

ICL

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Planejamento e gestão em saúde:flexibilidade metológica e agir comunicativo

Health planning and management:methodological flexibility and communicative action

1 Departamento de Administração e Planejamento, EscolaNacional de Saúde Pública,Fundação Oswaldo Cruz,Rua Leopoldo Bulhões1480, 7o andar 21041-210 ManguinhosRio de Janeiro, RJ, [email protected]

Francisco Javier Uribe Rivera 1

Elizabeth Artmann 1

Abstract This paper intends to analyse the

possibilities and the gaps of situational plan-

ning, related to the development of dialogical or

communicant organizations aim. It stablishes,

futhermore, an initial dialog with the health

planning streams in Brazil and it defines some

research issues that may offer the necessary

complement in order to make planning accom-

plish its function as a communicative action.

Key words Health Management; Health Plan-

ning; Public Health

Resumo Este artigo pretende ser uma reflexão

acerca das possibilidades e das lacunas do pla-

nejamento situacional no que tange ao desen-

volvimento da imagem-objetivo de organiza-

ções dialógicas ou comunicantes. Estabelece,

ainda, um início de diálogo com as correntes de

planejamento de saúde mapeadas no Brasil e

define algumas temáticas de investigação que

podem oferecer o necessário complemento para

que o planejamento cumpra sua função como

agir comunicativo.

Palavras-chave Gestão em Saúde; Planeja-

mento Estratégico-Comunicativo; Saúde Pú-

blica

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Introdução

Convidados a realizar uma análise das pers-pectivas teórico-metodológicas do planeja-mento/gestão em saúde no Brasil, nos vemosobrigados a assumir uma perspectiva situacio-nal e a resgatar do conjunto de nossas refle-xões e leituras um fio condutor, qual seja: odas possibilidades do planejamento estratégi-co, segundo a nossa matriz cultural, na cons-tituição de organizações solidárias. O termocomunicante atribuído a essas organizações éretirado de Bartolli(1992) apud Rivera (1996a)e corresponde a organizações abertas, evolu-tivas, flexíveis, com finalidade explícita e res-ponsabilizante para todos.

No desenvolvimento deste excurso, iden-tificamos os aspectos produtivos da propostado planejamento estratégico situacional e suaslacunas conceituais e metodológicas, procu-rando indicar possíveis áreas de complemen-tação que poderiam ser motivo de investiga-ção e de aplicação, no intuito de abrir cami-nho a uma proposta mais ampla e comunica-cional do objeto aludido. Desta maneira, ten-tamos dar um substrato mais prático à alter-nativa do planejamento comunicativo resga-tada de uma crítica ao modelo puramente es-tratégico (Artmann, 1993; Rivera, 1995).

No percurso do trabalho, procuramostambém fazer um mapeamento de tendênciasna área de planejamento e gestão nos planosnacional e internacional. Não há a intençãode fazer uma análise aprofundada destas, masde fazer alguns comentários que podem levara questionamentos delimitadores de objetosde pesquisa.

Deve ficar claro ao longo do trabalho quesituamos o planejamento – como momentode desenho – no interior do processo de ge-renciamento/gestão de serviços e sistemas. Oplanejamento, assim, é entendido como ferra-menta organizacional, fazendo parte de umprocesso mais amplo de desenvolvimento dasorganizações, que valoriza a condução da ação.As próprias possibilidades do planejamentosão interpretadas aqui como mediadas/subor-dinadas à cultura das organizações.

O planejamento situacional como possibilidade instituinte de uma organização comunicante

O planejamento fracassa na sua tentativa ori-ginal de obtenção de uma regulação global,imperativa, da sociedade. Enquanto alterna-tiva à economia de mercado, o planejamentodos países socialistas não deixou de ser o mo-delo de regulação de um ator único, de um atortecnocrático, que subordinou as relações in-tersubjetivas a uma visão de desenvolvimen-to baseada no determinismo econômico.

Os modelos de planejamento global de queo setor saúde se apropria, como o CENDES/OPS, padecem do mesmo problema, qual se-ja, a incapacidade de totalização desde umaperspectiva central de atores e instituições dís-pares, com racionalidades não semelhantes.Há uma incapacidade do Estado de represen-tar a diversidade mediante atos formuladoresque substituem a negociação política.

O planejamento estratégico em saúde (PES)surge, em meados da década de 70, como atentativa de reconhecimento da complexida-de ao introduzir as idéias da superioridade dopolítico sobre o econômico e da diversidadede atores-sujeitos do mesmo ato de planejar.A questão da viabilidade política passa a ocu-par um papel central e a definição de propos-tas/compromissos de ação a depender de umaarticulação que se abre a uma perspectiva po-licêntrica de análise.

Talvez o grande mérito do planejamentoestratégico tenha sido o de trazer à tona a imi-nência do diálogo. Falar em planejamento co-municativo corresponde a uma interpretaçãodo planejamento estratégico matusiano comoa possibilidade de uma problematização cole-tiva, capaz de articular sujeitos sociais, como apossibilidade de incorporação de um raciocí-nio sobre a governabilidade de situações decompartilhamento e dispersão do poder queenfatiza a negociação política.

Ainda que o planejamento estratégico nãotenha colocado com transparência essa pers-pectiva – sua abordagem do poder enquantorelação entre acúmulos de recursos que sãomobilizados em torno do objetivo da vitóriade atores individuais oculta essa visão encon-tramos aspectos que permitem uma interpre-tação comunicativa. O reconhecimento do atode planejar como relação interativa, a adoçãoda negociação cooperativa como meio estra-tégico possível, a valorização da explicação do

outro como parâmetro de crítica da nossa pró-pria explicação e possível complemento e, fi-nalmente, o destaque concedido à cultura nodelineamento das regras institucionais, sãoelementos que abrem caminho para uma in-terpretação menos presa à uma racionalidadepura de fins.

O planejamento comunicativo é assumidocomo meio de construção de organizações dia-lógicas. Um aspecto fundamental deste enfo-que é a busca da integração, da possibilidadede um projeto solidário, entendido como de-safio gerencial permanente. Nesta perspecti-va, a escolha dos métodos de desenho ou deanálise se subordina a esse objetivo próprio aocampo da gestão. Vários métodos que criem apossibilidade de fluxos de comunicação am-pliada e de negociação de compromissos po-dem ser estimulados. Não há, portanto, a pre-tensão de uma exclusividade metodológica. Opróprio método deve passar por um confron-to com a diversidade.

Vale ressaltar que a perspectiva comunica-tiva não se reduz à escolha de métodos, masenvolve o processo gerencial como um todo,a partir de uma racionalidade ampliada, paraalém da racionalidade de fins, considerandoo mundo da vida dos atores envolvidos numapostura dialógica que motive a construção deprojetos que possam ser assumidos coletiva-mente como compromissos.

Ajudar a desenvolver uma dinâmica de di-reção que potencialize o diálogo gerador decompromissos é, então, o fio condutor de umanova compreensão do planejamento que nãoconsegue mais se divorciar da gestão. Matus(1994a) entendeu muito bem que a viabilida-de do modelo racional de planejamento porele defendido dependia de determinadas ca-racterísticas das regras organizacionais, espe-cialmente das regras de responsabilidade quesobredeterminariam a qualidade da gestão.

O triângulo de ferro do PES (Matus, 1994a)é uma boa figura que pode ajudar a delimitaros contornos de uma organização comunican-te ou dialógica. Os três vértices representamos principais subsistemas do sistema de dire-ção estratégica a saber a Agenda do Dirigen-te, que exige concentração no que é estratégi-co, a Gerência por Operações e o Sistema dePetição e Prestação de Contas. A tese funda-mental que o autor sustenta é que a baixa res-ponsabilidade gera uma tendência no sentidoda centralização e da ingovernabilidade. Ideal-mente, o objetivo defendido é a construção de

Ciên

cia & Saú

de C

oletiva,4(2):355-365,1999

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uma organização onde a prestação de contaspor resultados seja uma norma interiorizadaculturalmente pelos indivíduos, onde haja des-concentração do poder e delegação permanen-te (uma sábia distribuição do poder de pro-cessamento de problemas) e onde predomineum tipo de gestão criativa por operações oupor objetivos.

Matus acredita que com a introdução denovas práticas gerenciais será possível viabili-zar uma alta qualidade da gestão. Estas novaspráticas gerenciais se confundem com a pro-posta de seu sistema de direção estratégica que,além dos subsistemas acima destacados, deveser apoiado por outros como o planejamentoestratégico, sistema de informações, etc. A re-comendação explícita é de que essa constru-ção siga o modelo de uma reforma organizati-va vertical, no sentido de uma reforma radi-cal e seletiva em todos os sistemas relevantesda organização simultaneamente, dada a mú-tua dependência de todos os subsistemas, ca-da um gerando demandas para os outros.

A sobredeterminação que as regras de res-ponsabilidade exerceriam sobre toda a dinâ-mica de gestão reforça a importância da cul-tura enquanto conjunto de estruturas mentaisque subordinaria todas as práticas de traba-lho e as derivadas formas organizativas. A ne-cessidade de impactar esse baluarte definidordas virtualidades gerenciais chama a atençãopara a prioridade dos componentes Teoria eTreinamento em quaisquer processos de mu-dança organizacional. Assim, o primeiro pas-so de uma estratégia de reforma administra-tiva estaria representado no modelo matusia-no pelo desenvolvimento de um centro de trei-namento que procuraria promover novas prá-ticas gerenciais e de trabalho.

Sutilmente, o voluntarismo racionalista deMatus encontra um limite nas possibilidadesde lidar com cultura. Embora reconheça a pri-mazia da cultura em relação aos processos detrabalho, o autor não aprofunda sua análiseem busca de uma proposta de intervençãomais eficaz. A cultura impõe um elemento demoderação que dificulta o estabelecimento deprazos para a mudança organizacional, que sealimenta da indeterminação do processo demudança cultural (Rivera, 1996a, 1998a; Art-mann, 1997a).

Não questionamos a proposta de treina-mento e teoria em si, mas devemos relativizarseu impacto quando vista como medida isola-da de atuação sobre estruturas mentais. Para

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atingir esse objetivo, o desenvolvimento de prá-ticas educativas permanentes deveria ser acom-panhado de mudanças no sistema de gerência.Basicamente, pensamos na introdução de umsistema de gestão criativa que priorize formasde tomada de decisão e de controle coletivas,consensuadas, capazes de estimular a comuni-cação. A única possibilidade de mudar cultu-ra a longo prazo reside na capacidade de cons-trução legitimada de novas representações queos atores podem ter em função de sua partici-pação em processos comunicativos, de apren-dizagem. De qualquer maneira, a cultura teráque ser considerada como elemento de viabili-dade ou de modulação da proposta de mudan-ça organizacional. Neste sentido, nas organi-zações do tipo profissional, segundo classifi-cação de Mintzberg (1989), como é o caso dasorganizações de saúde, não se justifica a intro-dução de um sistema pesado de gestão estra-tégica, do tipo supra-estrutural, mas um con-junto de práticas que de maneira mais infor-mal partilhem da filosofia da intensificação doespírito da gestão por compromissos. O dadocultural da forte autonomia profissional nes-sas organizações sugere reforçar o objetivo deajudar os profissionais a internalizar o racio-cínio estratégico como parte de seu processode decisão cotidiano, como alternativa a pesa-dos processos de formalização de planos rea-lizados em instâncias separadas dos centrosoperadores, de corte tecno-burocrático.

Relacionado a esta questão, temos destaca-do a necessidade de valorização da reflexão rea-lizada por autores da área da saúde pública(Dussault, 1992; Lima, 1994) acerca dos requi-sitos em termos de modelo de gestão colocadospela leitura das características das organizaçõesprofissionais de saúde. A complexidade do tra-balho nessas organizações, a impossibilidaderelativa de uma padronização mecanística e aintensa distribuição do poder nas mesmas, su-gerem, junto com outras características, ummodelo de gestão negociado, de ajustamentomútuo, comunicativo. Isto reforça nossa pers-pectiva de organização comunicante.

De Matus (1993) resgatamos principal-mente os seguintes elementos:• a idéia de um sistema de gestão descentra-lizada por operações• a análise de problemas e de soluções• aspectos da análise de viabilidade e do de-senho estratégico.

É inerente a um sistema de gestão descen-tralizada a definição de objetivos a partir de

problemas colocados fora e dentro da organi-zação (ou macroorganização). A capacidadede processamento destes, entendidos como ne-cessidades declaradas ou demandas, define aqualidade da oferta institucional. A arte de ge-rir consiste para Matus (1994a) em saber dis-tribuir bem os problemas pela organização demodo que todos os níveis estejam sempre li-dando de forma criativa com problemas de al-to valor relativo. O modelo organizacional pro-posto por este autor é o de uma organizaçãoreflexiva a todos os níveis, como condição degovernabilidade.

O caráter totalizador e rigoroso da expli-cação situacional facilita a escolha de opera-ções de caráter transversal ou horizontal, quetranscendem setores, departamentos e unida-des e, nesta medida, o planejamento situacio-nal favorece a integração horizontal, sob a for-ma de uma estrutura matricial por projetos.A horizontalização pode ser entendida aquicomo sinônimo de descentralização e de cria-tividade, de tratamento multidisciplinar.

Há no PES um apelo claro no sentido dacoordenação lateral, como alternativa a um ti-po de estrutura tipicamente hierárquica. Esteelemento característico de estruturas descen-tralizadas e participativas tem sido destaca-do pelo Laboratório de Planejamento do De-partamento de Medicina Preventiva e Social(LAPA) da Universidade de Campinas, comoparte de um modelo que enfatiza, por outrolado, uma boa dose de autonomia das unida-des de produção e a necessidade de colegiadosde gestão que democratizem a tomada de de-cisão. Por referência às organizações profis-sionais de saúde, defendemos a tese de equi-pes de gestão com representantes das princi-pais categorias profissionais.

A complexidade do PES tem sido suaviza-da através de propostas e adaptações do mé-todo (Artmann, 1993; Cecílio, 1997) que con-servam aspectos substantivos do mesmo co-mo a necessidade de uma boa descrição doproblema como base para uma explicação efi-caz; a diagramação das relações de causalida-de sob a forma de uma rede ou árvore simplesde causalidade; a definição de nós críticos combase no protocolo ad-hoc do PES e a descri-ção dos mesmos tendo em vista ajudar à defi-nição do conteúdo mais preciso das propos-tas de intervenção (operações), vistas comomacro-unidades de ação que incidem sobre osnós críticos; a definição por operação da rela-ção recursos/produtos/resultados; uma análi-

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se de viabilidade simplificada baseada na moti-vação dos atores em relação às operações e nadefinição de quem controla predominantemen-te os recursos envolvidos nas operações; e, fi-nalmente, a necessidade de relacionar generi-camente estratégias de viabilização e construirindicadores de acompanhamento do plano.

A adaptação e simplificação do PES temajudado a evitar uma centralização obsessivaem questões metodológicas reforçando a idéiade que o método é um simples meio a serviçode sujeitos.

Alguns problemas ou deficiências do PESjá foram apontadas por nós em alguns traba-lhos:• a inexistência de uma reflexão mais apro-fundada sobre cultura enquanto componenteda viabilidade de uma intervenção planejada(Artmann, 1993, 1997a; Rivera, 1995, 1996a);• a necessidade de um desenvolvimento es-pecífico da tecnologia de negociação coope-rativa (Rivera, 1998b);• uma determinada visão da liderança quedestaca a necessidade de um estado maiorconstituído pelo desenvolvimento de superes-truturas de gestão, em detrimento do aperfei-çoamento de habilidades da liderança centra-das na capacidade da mediação das relaçõesinterpessoais (Rivera, 1996a, 1998a);• a questão da validade do método para odelineamento ou precisão de uma visão com-partilhada sobre a missão institucional (Art-mann et al., 1997);• uma construção ainda muito simplificadada prospectiva, onde predomina uma relaçãoexcessivamente determinista do contexto so-bre o plano e onde as relações cruzadas entreas variáveis-chave do cenário não são devida-mente registradas ou formalizadas; (Rivera,1998 c);• a possibilidade de construção de um proje-to coletivo a partir da multiplicidade de racio-nalidades presentes em organizações de saú-de;• dificuldades inerentes à própria comple-xidade do método.

Estas áreas definem desafios metodológi-cos importantes.

A questão da cultura nos leva a M. Théve-net (1986, 1993), autor francês que destaca anecessidade de uma análise participativa dacultura que colabore para o discernimento deaspectos fortes da cultura que podem ser fun-cionais à mudança. A visão da cultura comorecurso se coloca pragmaticamente a serviço

do objetivo de discernir os aspectos da cultu-ra que deveriam ser reforçados para enfrentarproblemas correlatos. A relação problemas-cultura, como definição desafiadora perma-nente, apresenta a cultura como condição deviabilidade das formas de enfrentamento dosproblemas. O autor propõe uma grade de aná-lise cultural, com categorias de informaçãomarcantes e formas de estabelecimento de hi-póteses culturais. O caráter participativo e sis-temático da pesquisa cultural colabora para apossibilidade de realização de um sentido pro-fundo inerente a essa análise, qual seja o deajudar a desvendar representações sociais com-partilhadas, o qual reforça núcleos de colabo-ração e agregação institucionais. A cultura, en-quanto um conjunto de tradições e pré-inter-pretações de situações, tem um papel deter-minante na organização e sua abordagem ébastante interessante para a compreensão domundo organizacional. Contudo, baseados emHabermas (1987), entendemos que as tradi-ções culturais, ainda que condionem forte-mente o funcionamento das organizações e aação dos atores, podem ser questionadas a par-tir do exercício de um discurso crítico. Estaquestão encontra-se abordada no texto de Art-mann (1997a).

O PES distingue a negociação (conflitiva,mista e cooperativa) como um meio estraté-gico possível. A indicação da necessidade deum tal tipo de estratégia não é suficiente senão for acompanhada de uma reflexão maisaprofundada do conteúdo específico da nego-ciação. A Escola de Negociação de Harvard,de Ficher e Ury (1985), enseja uma bom mo-delo de negociação cooperativa, do tipo ga-nhar-ganhar, que se aproxima de um modeloargumentativo. Aspectos marcantes deste en-foque são:• a necessidade de separar a negociação dasubstância do problema do relacionamentointersubjetivo, que requer um investimentoparticular;• a necessidade de negociar a partir dos inte-resses, dos pressupostos ou motivações das po-sições, e não das posições mesmas, procuran-do discernir atrás de posições aparentementeopostas, interesses comuns que podem ser ex-plorados em termos de faixas de acordo, ouinteresses distintos, porém não conflitantes,que podem ser harmonizados;• a idéia de que a negociação é um processoideativo, criativo, interdisciplinar, de geraçãode múltiplas opções de ganho mútuo, o qual

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desvirtua a idéia da negociação como um bo-lo fixo;• a tese de que o fundamental é negociar cri-térios de validade universal ou de maior legi-timação capazes de balizar objetivamente apossibilidade de um acordo.

O enfoque de negociação de “Como Che-gar ao Sim”(1985) pode e deve ser exploradocomo complemento necessário ao planejamen-to estratégico e ao desenvolvimento das habi-lidades da liderança.

O paradigma da “organização que apren-de” de Peter Senge dá uma especial atenção àquestão da liderança. Em “O Novo Trabalhodo Líder” (Starkey, 1997), o autor se contra-põe à visão da liderança forte, carismática, as-sumindo a liderança como a principal respon-sável pelos processos de aprendizagem coleti-va. Aprender significa incorporar habilidadesnovas, nunca completamente realizadas, de in-teração e de reflexão. Estas habilidades bási-cas, que supõem um questionamento profun-do dos modelos mentais, dos pressupostos ecrenças dos participantes organizacionais, po-dem ajudar a consolidar uma visão comparti-lhada capaz de tensionar a organização em umsentido renovador e produtivo. Não haveriapara Senge algo como conteúdos universais eespecíficos da administração, mas o desafio decriar uma liderança disseminada, como pos-sibilidade de mediação reflexiva das relaçõesinterpessoais e de escuta da subjetividade (ex-pressa por meio do não dito que mediatiza ne-gativamente relações de aprendizagem mal su-cedidas). Parte importante da proposta desteautor refere-se à necessidade de desenvolvi-mento de um raciocínio estrutural no que dizrespeito à explicação de problemas, buscan-do-se causas essenciais de alto poder de ala-vancagem, o qual o aproxima de Matus. Ou-tra contribuição refere-se à necessidade de umdesenvolver da técnica de simulação de cená-rios como instrumento de aprendizagem. So-bre este este último particular, Senge susten-ta que a aprendizagem da experiência é limita-da, pois a realidade é complexa, sendo difícilo estabelecimento de relações claras de causa-efeito entre as decisões que tomamos hoje esuas consequências futuras, dados seus distan-ciamentos eventuais no tempo e no espaço.Este elemento de indeterminação obrigaria atentar aprender do futuro, mediante experiên-cias de simulação que essencialmente ajuda-riam a costurar uma visão de futuro organi-zacional. Para o autor o grande mérito da pros-

pectiva é possibilitar um diálogo sobre os mo-delos mentais que embasam as visões de futu-ro, que cria possibilidades harmonizadoras noque tange à visão organizacional. Trazer “alembrança do futuro” corresponde à tentati-va de reforçar uma construção positiva da vi-são que opere como um polo forte da mode-lagem do projeto institucional, que se tensio-na criativamente com a experiência dos pro-blemas da organização. Há em Senge, basea-do na experiência de seguidores da learning

organization, uma nova compreensão do pla-nejamento enquanto processo de aprendiza-gem. O fundamental não seria a elaboração degrandes planos estratégicos, mas a difusão ouincorporação de um raciocínio estratégico pe-lo corpo organizacional, a ser aplicado no co-tidiano das decisões sobre opções alternativas.Coerente com o pensamento de Mintzberg, aestratégia seria o resultado, não de um proces-so superior destacado no tempo e no espaço,mas de múltiplas interações entre os agentesorganizacionais munidos de habilidades co-muns como, por exemplo, de análise de siste-mas. Este conceito seria o de estratégia emer-gente, que desde a nossa perspectiva valoriza oplanejamento tático-operacional ou o momen-to tático-operacional do planejamento.

Uma das perguntas que nos colocamos dizrespeito à contribuição do PES para o delinea-mento da missão, dos produtos organizacio-nais. Em um trabalho relativamente recente,Matus (1994b)) assume que o primeiro desa-fio da organização é a correta delimitação deseus produtos e responsáveis. O planejamen-to a partir de problemas terminais, colocadospela ambiência externa, pelos usuários da or-ganização, poderia ajudar a realizar este deli-neamento. Vários passos seriam necessários:um levantamento exaustivo dos problemas desaúde de uma área de referência; sua prioriza-ção em função de critérios sócio-políticos etécnico-sanitários (epidemiológicos, econô-micos, de vulnerabilidade, etc.); uma explica-ção adaptada procurando selecionar nós crí-ticos nas várias áreas de prestação de serviçospossíveis, setorial e extra-setorialmente (pro-moção, prevenção específica, tratamento,acompanhamento, reabilitação, etc.) e, final-mente, uma distribuição das operações-açõesentre as várias unidades de serviços de saúdeda área (em função do grau de complexidadeacordado para as mesmas) e as unidades ex-tra-setoriais. Algumas particularidades do se-tor teriam que ser respeitadas: critérios espe-

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cíficos de priorização; classificação das opera-ções/ações em várias formas específicas de cui-dado/prestação; um planejamento anterior dacomplexidade das unidades operacionais. Apriorização de determinados problemas nãopode deixar de se acompanhar de um trata-mento extensivo aos problemas menos priori-tários, ainda que num nível de manutenção queimplique na não piora da situação de saúde. Anecessidade de um atendimento universal emsaúde leva a considerar o aspecto de rede e as-pectos extrasetoriais dos problemas de saúde.

A maior parte das experiências que temosacompanhado nos mostram uma tendência atrabalhar no âmbito dos problemas mais in-termediários que afligem uma organização, emdetrimento da seleção de problemas terminaisno nível de rede local, embora aqueles impac-tem também os produtos finais. Neste caso, aseleção de problemas pressuporia uma missãopreviamente definida, a qual reforça a impor-tância de pré-requisito da mesma. Às vezes, aprópria falta de clareza sobre a missão apare-ce como problema (Artmann et al., 1997b).Acreditamos, porém, que há no Brasil um capi-tal acumulado no âmbito da definição da ofer-ta a partir de problemas terminais dentro dacorrente da Vigilância à Saúde, que tem pro-duzido instrumentos próprios de programa-ção situacional. Esta abordagem não se chamade programação situacional impunemente: ébastante extensiva e se apoia em formas de ter-ritorialização, em formas de estimativa rápidade problemas que esquadrinham minuciosa-mente regiões, em mapas de risco epidemioló-gico e social, e finalmente, na dinâmica de ex-plicação de problemas e de desenho de ações.

Esta é, sem dúvida, uma das áreas de pes-quisa avaliativa mais importantes do momen-to. Pensamos, porém, que a situação é tão oumais complexa no âmbito do setor hospitalarenvolvendo também o subsetor privado. Esteâmbito está caracterizado, em alguns espaços,por situações de concorrência ou de descoor-denação (desintegração, duplicidade), onde sedisputa clientela ou recursos. Aqui nos pare-ce útil o enfoque de gestão estratégica hospita-lar de Michel Cremadez: La Dèmarche Stratè-

gique (1997).O enfoque respectivo supõe inicialmente a

segmentação ou agrupamento de atividadeshomogêneas em nível de cada especialidade.Em seguida é realizada a análise estratégica es-pecífica de cada segmento em função de duasdimensões: o valor de cada segmento, corres-

pondente à capacidade de atração de clientelae ao interesse do hospital de lhe alocar recursos,e a posição competitiva do mesmo, que é fun-ção do grau de controle dos fatores chave desucesso respectivos. Por meio de um sistemade notação, o valor e a posição concorrencialsão calculados. A partir desta análise se constróio portafólio de cada especialidade, que corres-ponde à localização de todos os segmentos den-tro de uma grade constituída pelas duas variá-veis ou dimensões anteriores. Este documen-to serve de base para a definição da estratégia,consistente de três grandes objetivos: segmen-to que é necessário expandir; segmento que énecessário manter; segmento que é necessáriodesativar, recortar, negociar com a rede. Final-mente, desenha-se o plano de ação, que impli-ca em geral em atacar os pontos fracos da aná-lise concorrencial e em mexer com aspectos dovalor, quando possível.

Este enfoque tem sido aplicado a algumassituações hospitalares e, embora não tenha-mos tido tempo de avaliar com mais profundi-dade estas experiências, que são ainda recentes,detectamos um relativo sucesso no delinea-mento da missão. Apesar da linguagem típicado planejamento estratégico corporativo, es-te instrumento ajuda a negociar formas de in-tegração com a rede. Fundamentada na estra-tégia de diferenciação ou de aprofundamentodas competências distintivas, a análise estra-tégica de Cremadez permite transformar aconcorrência frontal em colaboração. É, final-mente, um espaço de comunicação que forta-lece a autonomia dos centros operadores e queajuda a promover mudanças culturais pela di-fusão do pensamento estratégico ao nível des-ses centros.

Um confronto PES/Dèmarche acerca daspossibilidades da utilização de ambos no ca-so da formulação da missão é um tema de in-vestigação que estimulamos. Parece-nos queos dois enfoques podem contribuir muito maisdo que a Qualidade Total, que para além deseus apelos no sentido das Jornadas de Mis-são não exibiria enfoques metodológicos tãoestruturados.

A questão da prospectiva tem sido embrio-nariamente desenvolvida por nós à luz de Go-det (Rivera, 1998c), com a intenção de preen-cher lacunas deixadas pelo PES. Do enfoquede Godet duas técnicas nos chamam a aten-ção: a análise estrutural, que é uma simulaçãodo poder de influência recíproco (duas a duas)das variáveis inicialmente relacionadas para

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construir o cenário do sistema escolhido, e amatriz dos impactos cruzados centrada nasprincipais tendências ou hipóteses de compor-tamento das variáveis. A primeira permite re-duzir o número de variáveis, ao selecionar asmais importantes (de maior poder de deter-minação), e a segunda possibilita analisar emque medida uma hipótese de comportamen-to de uma variável influencia as hipóteses decomportamento das outras. Podemos dizerque estes dois instrumentos são de grande va-lia na construção de cenários.

Alicerçada na consulta a especialistas pa-ra reduzir a subjetividade, na análise do jogodos atores e em um software baseado em cál-culo de probabilidades de cenários, a aborda-gem de Godet corresponde ao que se tem demais avançado no campo da prospectiva maisformalizada.

Não se pode esquecer, porém, que a mes-ma abordagem formalizada pode ser traduzi-da em um enfoque mais qualitativo e simples,que resgata as duas técnicas acima menciona-das. A simplificação da técnica, posta a servi-ço da discussão dos modelos mentais dos par-ticipantes da simulação, nos moldes da pro-posta de Senge, parece pertinente.

Panorama dos enfoques gerenciais no mundo

Da multiplicidade de enfoques existentes qua-tro correntes que nos parecem expressivas po-dem ser comentadas sinteticamente: a Gestãoda Qualidade Total (QT), a Reengenharia, oPlanejamento Estratégico Corporativo e aLearning Organization.

Sobre a QT tecemos comentários em arti-go ad-hoc (Rivera, 1996b). Com um discursoestimulante de centralização no cliente e dereconhecimento das relações de confiança for-necedor – cliente como garantia de qualida-de, a QT parece não ter estruturado instru-mentos e técnicas que lhe propiciem a supe-rioridade metodológica sobre outras corren-tes, principalmente sobre a variedade de en-foques estratégicos. Apesar de contar com ins-trumentos de utilidade para a detecção e ex-plicação de problemas (em ambientes partici-pativos), a QT não desenvolveu enfoques pró-prios de análise de atores e de prospectiva. Is-to, somado a toda uma tradição histórica depreocupação estatística com a redução de va-riedade e com a padronização produtiva, ten-

de a fazer dele uma corrente normativa commatizes humanitárias. Recentemente evolui, apartir de uma leitura menos racionalizadorada obra de Deming, para um discurso que sus-tenta a alternativa de uma Liderança Comu-nicativa em contraposição à Administraçãopor Objetivos e para a incorporação de ele-mentos da Administração Estratégica, princi-palmente o conceito de fatores chave de suces-so. Sem um corpo teórico – metodológico pró-prio e adaptado aos avanços da época, a QTpersiste como um remanescente do passadoque se alimenta de todos e pretende ser o gran-de guarda-chuva de todos.

A Reengenharia, vista equivocamente poradeptos da QT como sua continuação, entrano mercado como uma moda de poucas recei-tas, algumas extremamente válidas, porém deefeitos secundários imprevisíveis; a compac-tação de processos é uma delas. A crítica à frag-mentação exagerada do trabalho e a defesa dacriação de equipes de trabalho são fatores quecolaboram para uma maior criatividade e di-versificação, para uma maior inovação. Menospadronizadora que a QT, a Reengenharia su-cumbe pelo peso do autoritarismo, pela pre-tensão de provocar rupturas organizacionais,pelos motivos ocultos de enxugamento e dedemissão de força de trabalho, secundários àtentativa de integração de tarefas e de simpli-ficação dos múltiplos controles anteriores. Nocampo do planejamento, uma leitura produ-tiva da Reengenharia, aliada ao enfoque lin-guístico das organizações de Flores (1989) po-de ser verificada em Matus (1994 b) e traz al-gumas contribuições importantes.

O Planejamento Corporativo Americano,representado por exemplo por Michael Porter(1980, 1986) da Escola de Negócios de Har-vard, mostra um grande dinamismo no âmbi-to das grandes corporações americanas e ja-ponesas. Apoiada na segmentação estratégicadas empresas e em um tipo de análise estraté-gica das possibilidades mercadológicas dessessegmentos, este enfoque tem-se mostrado útilpara a definição de estratégias que permitamvantagens comparativas. Esta corrente lançamão de vários portafólios de atividades, umdos quais é o portafólio mercado/posição con-correncial, que tem sido adaptado criativa-mente por Cremadez para uma aplicação emhospitais e no setor público. Restam dúvidasquanto à aplicação do modelo empresarial,não o adaptado por Cremadez, à lógica do se-tor social.

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Aspectos da Learning Organization já fo-ram comentadas acima em relação à liderança.Apresentado o paradigma na V Disciplina deSenge (1998), constitui-se de técnicas e ins-trumentos que visam a despertar habilidadesde aprendizagem. A questão seria aprender aaprender, através da incorporação de habili-dades de reflexão, de indagação, de argumen-tação, de colocação autêntica. Estas capacida-des dizem respeito a cinco disciplinas: a apren-dizagem em equipe; o trabalho com modelosmentais; o domínio de si mesmo; a visão com-partilhada; o pensamento sistêmico. Um as-pecto crítico desta corrente corresponderia aouso proposto por Senge da idéia de arqueti-pos sistêmicos ou de regularidades de com-portamento para efeitos de aprendizagem.Com esta tentativa Senge reduz os comporta-mentos globais possíveis das empresas econô-micas a uns poucos modelos cuja capacidadede dar conta da diversidade pode ser questio-nável.

O planejamento de saúde no Brasil

Mehry fez uma boa classificação do estado daarte em artigo conhecido (1995).

Do nosso ponto de vista, os quatro mode-los referidos podem perfeitamente conviverem um fluxo de muita alimentação. De sua di-versidade situacional de pontos de vista é pos-sível apreender aspectos que podem vir a sercomplementares, ainda que as divergênciasapontem, por vezes, para a construção de dife-rentes tipos de modelos assistenciais.

A corrente da Vigilância à Saúde destaca-se pela busca de operacionalização prática deconceitos do planejamento situacional dentrodo contexto da construção da idéia de distritosanitário como processo social de mudança daspráticas sanitárias, no sentido da eficiência eeficácia sociais, eqüidade e democratização. Es-te processo manifesta-se no espaço local, on-de se estabelecem as relações entre instituiçõesde saúde, de preferência ancoradas no paradig-ma da promoção da saúde, sob a regulação deuma autoridade sanitária local e a sociedadeou grupos sociais, com a diversidade de pro-blemas que se expressam na singularidade da-quele território. Este, além de território-solo,constitui-se em território econômico, políti-co, ideológico, cultural e epidemiológico.

Este enfoque enfeixa um conjunto de téc-nicas de vários campos, do planejamento urba-

no-espacial, da epidemiologia, do planejamen-to estratégico em saúde e da gestão. Nutre umconceito alternativo à velha saúde pública quese destaca pela tentativa de criar horizontali-dades entre os velhos programas sanitários,através do planejamento a partir de proble-mas, baseado na concepção matusiana, emcontraposição ao enfoque por programas.

Facilitador de uma visão mais sócio-am-biental do binômio saúde-doença, este enfo-que abriria caminho para uma perspectiva deintersetorialidade e de promoção em saúde,contribuindo assim para uma recriação dosmodelos assistenciais, a partir de novas práti-cas sanitárias. Estas práticas sanitárias se cons-tituem em conjuntos de processos de traba-lho, articulados em operações, que impõemuma estratégia de ação sobre os nós críticosdos problemas e seus efeitos em um dado ter-ritório.

Duas práticas sanitárias contraditórias coe-xistem no Distrito Sanitário. A primeira refe-re-se à Vigilância à Saúde, direcionada paraproblemas de enfrentamento contínuo, esco-lhidos pelo alto impacto nas condições de vi-da dos grupos populacionais das microáreas. Asegunda, a Atenção à Demanda, volta-se paraa intervenção pontual, ocasional sobre os efei-tos dos problemas ao nível individual, auto-percebidos e é considerada estratégica para alegitimidade social do projeto e para a capta-ção de informações para a Vigilância à Saúdeque, pretende-se, venha a ser a prática hege-mônica.

Um problema deste enfoque poderia estarrepresentado pela ausência de uma propostaque dê conta das particularidades do âmbitohospitalar.

A corrente da Programação em Saúde daUSP propõe a construção de um sistema desaúde programado em termos de suas ativida-des a partir da Epidemiologia Social. Visa a re-duzir uma lógica de atenção espontaneista, demercado. Afirma-se em um tipo de constru-ção micro política de novas práticas assisten-ciais, de referenciamento a equipes de saúdeintegral (em vários campos do atendimento).Busca promover novas aglutinações dos pro-gramas tradicionais em conjuntos mais am-plos e modernos, privilegiando o componen-te populacional. Os autores identificam umaevolução da programação de uma posição de“técnica de planejamento” (racionalização eco-nômica do processo de produção em saúde)para um significado de “modelo assistencial

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ou modelo operatório das práticas de saúde”(tecnologia de trabalho), integrando a práti-ca médica e a sanitária, apresentando-a comoum campo de experimentação de novas for-mas de trabalho em saúde. Problemático po-de ser para esta corrente o grau de subordina-ção da velha clínica a uma racionalidade pro-gramada. Talvez seja menos voluntarioso pen-sar em termos de uma tensão permanente en-tre demanda programada e espontânea, nocontexto da qual procurar-se-ia uma hegemo-nia relativa da primeira (nos termos da Vigi-lância à Saúde). Destaca-se ainda a externali-dade das questões de viabilidade com relaçãoao método.

Em relação à corrente da Gestão Estraté-gica e do Planejamento de Saúde articulada aoModelo Tecno-assistencial em Defesa da Vi-da, do LAPA, já comentamos os esforços de-senvolvidos na direção do desenvolvimento deuma tecnologia leve de planejamento (a partirdo enfoque matusiano e do ZOPP). Sua noçãode caixa de ferramentas (composição de téc-nicas, procedimentos e enfoques adaptados doPES, de Mário Testa, de elementos teóricos dapsicanálise e da análise institucional, entre ou-tros) dá uma idéia da flexibilidade de aborda-gem e da diversidade de instrumentos mani-pulados por esta corrente que experimentouem profundidade tanto o planejamento situa-cional quanto o enfoque de qualidade total.Sua riqueza se explica pela acumulação de ex-periências (de condução e de consultoria/pes-quisa) tanto na rede básica quanto no campohospitalar, ainda que parta inicialmente deuma concepção redebasicocêntrica propondodepois, uma inversão na clássica pirâmide pa-ra um círculo, onde o sistema admitiria váriasportas de entrada, segundo a melhor tecnolo-gia e oportunidade para cada usuário. Umaflexibilização dos critérios de hierarquizaçãosempre foi defendida pela proposta do LAPA.O território é visto com restrições: é impor-tante definir a área de responsabilidade dasinstituições de saúde, mas o usuário não po-de ser aprisionado numa área restrita, pois semovimenta no sistema em busca da satisfaçãode suas necessidades. A concepção tradicionale verticalizada de programas é substituída pe-la formulação criativa de equipes locais, orga-nizadas buscando evitar corporativismos emonitoradas por avaliações de desempenhoreferenciadas por metas vinculadas aos objeti-vos definidos para os serviços. A proposta deorganização do sistema de saúde visa a dar

conta das relações entre os diversos tipos deprodutores, tendo nos gerentes locais/regio-nais uma base fundamental de articulação, on-de todos os produtores deveriam estar subme-tidos ao controle público. A relação da unida-de de saúde com a população é estruturadacom algumas noções emprestadas da área deSaúde Mental: vínculo e responsabilidade eacolhimento, procurando-se desenvolver umarelação personalizada e humanizada.

Sua crítica às propostas tecnocráticas eprescritivas em planejamento e gestão quepressupõem uma precedência dos métodos emrelação aos sujeitos é por nós partilhada. Se-gundo Matus, o método serve, no máximo pa-ra ajudar a sistematizar o conhecimento darealidade e não substituí-lo. Quem planeja ésempre o ator. Para Matus, um ator com co-nhecimento do problema e capacidade de ra-ciocínio estratégico com certeza enfrentarámelhor um problema do que alguém com bai-xo conhecimento da realidade e apenas conhe-cimento de método, por melhor que este seja.De todo modo, não há como negar a impor-tância de métodos que ajudem a dar conta dacomplexidade da tarefa de gerir situações queapresentam variáveis não controláveis e queexigem respostas eficazes, criativas e flexíveis.

Partilhamos ainda da preocupação com osujeito, e especificamente com a subjetivida-de, o que parece ser um diferencial analíticona proposta do LAPA. Embora não se tenhaum quadro claro ainda de como a análise ins-titucional recuperaria a subjetividade dosagentes em processos de autonomização e deinstituição de novas relações de poder capa-zes de democratizar amplamente estruturasorganizacionais, cumpre registrar, no entan-to, o esforço desenvolvido nesta direção.

A abordagem comunicativa em planeja-mento, que tem origens a partir de reflexõesteóricas sobre experiências com o enfoque doPES e do estabelecimento de um diálogo coma Teoria da Ação Comunicativa de Habermas,apresenta hoje vários desdobramentos teóri-co-metodológicos e pragmáticos, alguns ex-postos na primeira parte deste texto. Algunsdestes desdobramentos merecem ser aprofun-dados através de linhas de investigação, dasquais ressaltamos as seguintes:• análise da cultura enquanto componentede viabilidade de um projeto, objetivando umametodologia de escuta da cultura, o estabele-cimento da relação cultura-problemas em facede uma determinado macroproblema e o de-

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senho de estratégias de utilização da culturacomo recurso da intervenção sobre problemas;• desenho metodológico e missão institucio-nal, envolvendo uma análise comparativa daspossibilidades do PES e do enfoque de Crema-dez, em vários níveis de atenção em saúde;• desenvolvimento de habilidades de lide-rança e de negociação, que configuram juntocom o trabalho cultural o campo do que de-nominamos gestão pela escuta;• discussão teórica geral sobre a relação en-tre a gestão pela escuta e os métodos raciona-listas de gestão;• aplicação mais sistemática da prospectivaenquanto recurso crucial dentro do cálculo es-tratégico;

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É importante considerar a interrelação des-tas várias linhas e a preocupação com o desen-volvimento de métodos/enfoques, posturas econdutas que aprofundem processos de soli-dariedade e geração de compromissos com-partilhados num permanente aprender aaprender.

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A difícil arte de fazer acontecer.

Floriano Serra

(disponível no site: www.rhcentral.com.br)

Já passou o tempo de se acreditar que “quem planeja não executa”. Não há nenhuma

incompatibilidade que impeça músculos e neurônios de trabalharem juntos.

Nada de: “bom, pessoal, daqui pra frente vocês tocam, porque eu já fiz a minha parte!...”

Ninguém terá feito a sua parte enquanto o projeto não tiver acontecido.

Pense um pouco e responda depressa: de quantos Planos, Programas, Campanhas e

Projetos, você já tomou conhecimento na sua empresa...e que não aconteceram?

Muitos, não é mesmo? Não se preocupe. Isso não acontece só na sua empresa. Em

qualquer organização, a coisa mais fácil do mundo é dar idéias e sugestões – faladas ou

escritas. Transformá-las em realidade é que são elas.

Neste momento em que se fala tanto em Gestão / Avaliação / Seleção / Remuneração –

tudo isso e muito mais - por Competências, eu fico me perguntando: será que estão

incluindo no meio das competências essa difícil e tão pouco praticada arte de FAZER

ACONTECER? Em política, costuma-se dizer que as coisas não acontecem porque “falta

vontade política!” Que tipo de vontade falta quando as coisas não acontecem numa

empresa? Na verdade, eu acredito que essa questão – a de fazer ou não acontecer nas

organizações - deve ser abordada sob dois ângulos.

Um primeiro ângulo é de natureza constitucional. Não, nada a ver com a respeitável

Constituição Brasileira. Refiro-me aqui à constituição, enquanto estrutura mental,

intelectual, psicológica, emocional e até física (leia-se: energia e disposição) dos autores

das brilhantes idéias que costumam surgir nas reuniões ou constar nos Relatórios e

“Business Plans”.

Sejamos realistas: em toda empresa há pencas daqueles profissionais conhecidos como

“salto alto”, aquele que odeia ou não sabe “meter a mão na massa”, arregaçar as mangas

ou “tocar a obra” – permitam-me as expressões populares.

E isto nem é uma questão de incompetência, é questão de (falta de) estrutura mesmo, de

característica pessoal. O sujeito é “marcha lenta” por natureza e o que ele gosta de fazer

é pensar e propor. Fazer, que é bom, não é sua praia. Geralmente bem falante e de vasto

vocabulário, este profissional costuma impressionar nas apresentações de trabalho.

Depois, impressiona mais ainda quando entrega à Diretoria o “resumo” da apresentação,

uma “coleção” de pelo menos 3 grossos e pesados volumes. Um verdadeiro trabalho de

peso...

A partir daí, a Diretoria tem nas mãos um problemaço: “e agora, o que é que eu vou fazer

com isso?” Quase sempre a “solução” é criar um Grupo de Trabalho para se encarregar

da implantação daquele Projeto. Ou seja: acaba de ser decretado o arquivamento do

mesmo. Porque quem não participou da elaboração do trabalho não vai entender o

espírito, a essência, o processo de quem usou os neurônios e assim vai ter imensas

dificuldades para colocar tudo aquilo em prática. Que eu saiba, já passou o tempo de se

acreditar de que “quem planeja não executa”. Aliás, é justamente o contrário: não há

ninguém melhor para executar do que aquele que planejou. Não há nenhuma

incompatibilidade que impeça músculos e neurônios de trabalharem juntos.

O que podemos concluir disto? Que a teoria é ótima quando pode se tornar prática. Se

não, continuará teoria e de pouco valerá nestes tempos de acirrada competição

mercadológica, que cobra objetividade e pragmatismo em todas as ações

organizacionais. Nestes casos, é preferível dar mais atenção àquele colega que costuma

dizer “eu tenho a solução na cabeça, mas o diabo é que não sei colocá-la no papel”.

Vamos ao segundo ângulo da questão, que, na minha opinião, é de natureza psicológica:

tem a ver com insegurança, com medo de se expor, com desejo de resguardar-se de

eventuais fracassos. E explico porque: é muito cômodo apenas dar a idéia - e se o

resultado não for o esperado, sair-se com “ah, claro que não ia funcionar mesmo! Vocês

não seguiram direito as instruções do Manual que preparei...”.

Sabe aquela história do técnico de futebol que, mesmo depois da derrota do time, insiste

em dizer que “taticamente o time esteve perfeito, mas...” O que ele está querendo de fato

dizer? Que ele, técnico, não teve culpa, os jogadores é que não souberam finalizar o

chute e fazer o gol...E quando uma casa cai? “Vejam, os cálculos estruturais da obra

estão perfeitos, agora, com essa mão-de-obra que vocês pegaram não sei de onde, não

há muro que fique de pé!...” Ou ainda: “Meu Plano de Vendas está perfeito! Mas com essa

equipe que vocês contrataram, pelo amor de Deus!....” Claro que estes são meros

exemplos para ilustrar meu ponto de vista: sei que não cabe ao técnico de futebol fazer o

gol, nem ao engenheiro civil levantar o muro. Mas quanto ao Gerente de Vendas...

Espero que me entendam: é muito mais fácil fabricar “culpados” quando o gestor ou a

própria empresa divide a responsabilidade da missão em times isolados: há os que têm a

idéia, os que a colocam no papel, os que fazem os cálculos e projeções, os que compram

os recursos e os que efetivamente executam o trabalho. Eis o clima ideal para se praticar

a “Teoria de Noé”: isso “noé” comigo...

A solução? Simples: sinergia, união. Todos fazem parte de um mesmo cesto. Podem nele

existir maçãs, pêssegos, figos, uvas importadas ou bananas tupiniquins. Mas estão todos

juntos num mesmo cesto. Podem dar uma saborosa salada – mas se um apodrecer vai

todo mundo pro buraco. O nome disso é “equipe”. Todos pensam juntos e todos fazem

acontecer juntos. Em equipe, os envolvidos sugerem, discutem, discordam, concordam,

rediscutem... e quando chegam à decisão final, TODOS são responsáveis pela execução,

por FAZER ACONTECER. Nada de: “bom, pessoal, daqui pra frente vocês tocam, porque

eu já fiz a minha parte!...” Ninguém terá feito a sua parte enquanto o projeto não tiver

acontecido.

Os especialistas em processos organizacionais, marketing e planejamento estratégico são

unânimes em afirmar que, hoje, leva vantagem não necessariamente aquela empresa que

faz melhor, mas aquela que faz primeiro. Pois então: só fazendo acontecer é possível a

uma equipe ou a uma empresa fazer primeiro. Caso contrário, enquanto alguns

profissionais se debatem em infindáveis reuniões de planejamento, a concorrência já está

no mercado, faturando. E quando finalmente aquela turma de teóricos chegar num acordo

e decidir pôr a idéia em prática, o produto ou serviço já estará obsoleto.

Portanto, eis aqui minha “dica” da vez: ao fazer sua avaliação de desempenho por

competências, convém à empresa saber quem entre seus colaboradores passivamente

deixa as coisas acontecerem, concretamente faz as coisas acontecerem ou simplesmente

nem sabe que as coisas estão acontecendo!

A Meta

Tom Coelho

Você decide ir ao cinema. Sai de casa e quando percebe, imerso em seus pensamentos, está fazendo o

caminho convencional para ir ao trabalho - e que coincidentemente é diametralmente oposto. Depois de

enfrentar um belo trânsito, acerta o passo e chega ao shopping. Vasculha os três pisos para obter uma

vaga no estacionamento. Logo mais, encontra uma agradável fila para comprar os ingressos. Na boca

do caixa, descobre que a sessão está esgotada. Outra, só duas horas e quinze minutos depois.

Impossível? Improvável? Com você não? Pense bem antes de responder. Se você ainda não passou

pelo ciclo completo descrito acima, uma boa parte dele já lhe visitou num final de semana destes. O mal

é o mesmo que afeta profissionais e empresas no mundo corporativo: a ausência de metas definidas.

Cinco passos para uma meta

Vamos partir de um pressuposto. Você sabe o que quer, para onde deseja ir. Se está em uma empresa

que não lhe agrada, buscará outra. Se está disponível, sabe qual o perfil da vaga que lhe interessa. Se

está satisfeito em sua posição atual, almeja alcançar um cargo mais elevado.

Uma meta, qualquer que seja ela, só pode ser assim conceituada quando traçada segundo cinco

variáveis. A primeira delas é a especificidade. Seu objetivo deve ser muito bem definido. Assim, não

adianta declamar aos quatro cantos do mundo "quero trabalhar na multinacional ABC Ltda.". Desculpe-

me a franqueza, mas acho que você não será contratado a menos que pense "vou trabalhar como

gerente comercial, na divisão Alfa, da companhia ABC Ltda., atuando na coordenação e

desenvolvimento de equipes de vendas para a Região Sul". Quanto mais específica for a definição de

seu propósito, mais direcionado estará seu caminho.

A segunda variável é a mensurabilidade. Sua meta deve ser quantificável, tornando-se objetiva e

palpável. Em nosso exemplo anterior, você teria que definir, dentre outros fatores, a faixa de

remuneração desejada. Uma outra situação bem ilustrativa dessa variável é a aquisição de bens

materiais. "Pretendo comprar um carro", é um desejo. "Vou comprar um veículo da marca XYZ, modelo

Beta, com motor 2.0, dotado dos seguintes opcionais (relacioná-los) com valor estimado em

R$30.000,00", é uma quase-meta.

A próxima variável é a exeqüibilidade. Uma meta tem que ser alcançável, possível, viável. Voltando ao

exemplo inicial, o objetivo de integrar o quadro da ABC Ltda. como gerente comercial não será

alcançável se você tiver uma formação acadêmica deficiente, experiência profissional incompatível com

o perfil do cargo e dificuldades de relacionamento interpessoal.

Chegamos à relevância. A meta tem que ser importante, significativa e desafiadora. Você decide como

meta anual elevar o faturamento de seu departamento em 5% acima da inflação. Porém, seu mercado

de atuação está aquecido e este foi o índice definido - e atingido - nos últimos dois anos. Logo, é preciso

ousadia, coragem para determinar um percentual superior a este, capaz de motivar a equipe em busca

do resultado. Lembre-se de que o bom não é bom, onde o ótimo é esperado.

Finalmente, o aspecto mais negligenciado: o tempo. Muitas metas são bem definidas, mensuráveis,

possíveis e importantes, mas não estão definidas num horizonte de tempo. Aquela oportunidade de

negócio tem que ser concretizada até uma data limite. Aquela reunião tem que ocorrer entre 14h e 16h.

Aquele filme no cinema tem início às 21h30 e sairá de cartaz na sexta-feira próxima. Procrastinar, nome

feio dado à mania de adiar compromissos cabe como uma luva aqui e confere um golpe mortal a

qualquer meta proposta.

Metas, realização e resultados

No mundo das corporações as coisas nem sempre funcionam assim. Observamos o reinado do "auto-

engano". Metas são estabelecidas para justificar investimentos, agradar acionistas. São fixados objetivos

com base em expectativas irreais, prevendo crescimento da ordem de dois dígitos independentemente

de incertezas políticas e econômicas. Poderiam até ser alcançáveis dentro de um espaço de tempo

adequadamente delimitado. Mas como não se pretende mexer nas variáveis tempo e exeqüibilidade,

alteram-se as variáveis mensurabilidade - daí os balanços maquiados, ou melhor, a "contabilidade

criativa", e relevância - daí qualquer meio ser justificável, inclusive rasgar a Carta de Valores, praticar

downsizing a qualquer custo, desviar o foco do negócio, promover fusões e joint ventures desprovidas

de fundamentação.

As pessoas buscam realização. Mais do que um ato, um estado de espírito. Mais importante do que o

fato concretizado, a satisfação de tê-lo feito.

As empresas, por sua vez, buscam resultados. Mais do que a conclusão, o fim de algo em si mesmo.

Estes resultados podem ser representados por mais lucro, mais espaço no mercado, mais clientes. Ou

seja, invariavelmente deve significar "mais", embora não raro acabe por se tornar "menos".

Decorre desse estado de coisas, que acabamos por ter um grande teatro onde planejamentos são

criados, estratégias inventadas, profissionais desmotivados, valores corrompidos. A verdade é

mascarada, a integridade é volatilizada.

Há, infelizmente, uma distância quase incompatível entre metas corporativas e metas pessoais. Salvo

exceções, conciliá-las pode não passar de retórica barata. O executivo pretende vigiar sua saúde,

assistir à sua família e obter realizações palpáveis em seu ambiente de trabalho. A empresa diz que o

apóia, mas lhe exige pesada carga de trabalho, impõe-lhe a necessidade de resultados expressivos,

cultiva-lhe o estresse e a insegurança.

A meta deve ser você

Particularmente, não compactuo desta ditadura. Resultados não são tudo, assim como não é o cliente

quem manda na empresa. Resultados devem ser buscados com persistência, assim como clientes

devem sem atendidos com maestria. Mas o fim de tudo deve ser o sentimento de realização, a

satisfação de dever cumprido. Ainda que a contabilidade diga que você trocou seis por meia dúzia...

Por isso, estabeleça e mantenha o foco. Parafraseando os Irmãos Pedro Lopes, "várias flechas não

garantem o acerto do alvo, e vários alvos confundem o arqueiro". Esteja preparado para os tombos - um

obstáculo é apenas uma das etapas do seu plano. Use a vaidade e o dinheiro como bons estímulos,

mas jamais como objetivos. Redija suas metas de forma nítida, cuidando para que elas sejam

específicas, mensuráveis, alcançáveis, relevantes e temporais. Dê-lhes todo seu esforço e imaginação.

E, finalmente, lembrando Richard Carlson, "pense no que você tem, em vez do que gostaria de ter. A

felicidade não pode ser atingida quando estamos o tempo todo desejando novas metas. Quando você

focaliza não o que se deseja, mas o que tem, termina obtendo mais do que gostaria".

Tom Coelho

É graduado em Economia, em Publicidade e especialista em Marketing. É consultor, escritor e

palestrante.

O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

Bernardo Leite Moreira O nosso assunto refere-se ao “exercício” real de revisão, análise, projeção e preparação das novas expectativas e necessidades, nossas e dos nossos negócios. Uma ação cada vez mais necessária para todas as organizações. Gosto de iniciar o processo de aprendizagem sobre o planejamento estratégico com uma definição bastante despretensiosa, mas objetiva, de planejamento. Planejamento é: pensar antes de fazer! Pode parecer muito simples, mas como as pessoas têm dificuldade para fazer isso! Por sua vez, estratégia exige escolhas. Portanto, planejar passa a ser estratégico quando temos que fazer escolhas! Há críticos contumazes que questionam o “como fazer planejamento em uma situação de incertezas e mudanças extremamente rápidas?”. Para responder esta e outras questões sobre o planejamento temos que entender, primeiro, o que planejamento não é, ou seja, a negação da idéia. Por exemplo, não é previsão. A bem da verdade é exatamente por essa razão que o Planejamento Estratégico é necessário. Planejar é necessário exatamente porque não é possível prever! Também não é um instrumento de decisões futuras. Na prática é um meio de se tomar, hoje, as decisões que atuarão sobre o futuro que desejamos! Não é um meio de eliminar riscos. É sim um meio para ajudar na avaliação dos riscos que teremos que assumir! Estratégia não é tendência. Estratégia é escolha e envolve a definição de futuro desejado. Temos que criar o nosso futuro. Vou citar uma frase obrigatória para o melhor entendimento deste ponto: “para continuar no jogo basta simplesmente chegar onde os outros já estão, mas acredito que vencedores, em última instância, serão aqueles com capacidade de desenvolver jogos fundamentalmente novos”, Gary Hamel. Finalmente estratégia não é abranger tudo. Aliás, esta pode ser a própria característica básica do planejamento. “Ter planejamento é definir, antes de tudo, o que não fazer! Este ponto é particularmente importante como fator de contribuição do Planejamento Estratégico: a definição do foco! Sabemos que todas as organizações sempre trabalharão com restrições de recursos. Portanto focar a ação e possibilitar a conjugação dos esforços da organização para o alvo pretendido é determinante para o sucesso desejado. Portanto, ter foco é prerrogativa do posicionamento estratégico. Sem isso corremos grande risco de muito esforço e pouco resultado (já sentiram isso?). Pois bem, não vamos nos aprofundar nas definições e procedimentos do planejamento estratégico. Para conseguirmos agregar algo optamos por dar foco em algo que é inerente à análise e à definição estratégica: a comunicação da estratégia para toda a empresa!

Importante frisar que a comunicação não é outra ação, é a mesma ação, faz parte do planejamento estratégico. Sim, principalmente porque uma das maiores contribuições da estratégia é o de aglutinar esforços, orientar investimentos e permitir a definição de metas que possam agregar valor aos objetivos pretendidos. Algo como remar para o mesmo lado e direção! Estamos afirmando, então, que as decisões e informações derivadas do planejamento estratégico devem ser comunicadas a todos. Isso não significa dizer que tenho que passar os “segredos” do negócio para toda a empresa. Há estágios e alçadas para cada nível organizacional. O importante é que todos recebam as exigências que a estratégia impõe para o negócio de maneira que possamos colocar esforços para gerar nossa contribuição ao resultado global. É isto que se espera de todos na empresa. Percebam porque a comunicação das decisões estratégicas é fator inerente do planejamento e dos resultados. Afinal, como exigir se não há orientação, definição de foco e de expectativas do negócio. Lembrem-se, competências só merecem esse nome quando agregam valor ao negócio, portanto, quando agregam valor às necessidades estratégicas. Desejamos que esta abordagem possa salientar a importância do Planejamento Estratégico na condução dos negócios. É temerário dizer que não se pode planejar nos dias de hoje. Coloquem os seus esforços a serviço dos objetivos consensados e aprovados e terão resultados.

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A MUDANÇA DO MODELO DE ATENÇÃO À SAÚDE NO SUS: DESATANDO NÓS, CRIANDO LAÇOS1

Carmen Fontes Teixeira2

RESUMO O objetivo do trabalho é caracterizar as principais propostas de mudança no conteúdo e na forma de organização das práticas de saúde que vem sendo elaboradas e experimentadas no âmbito do sistema público de serviços de saúde no Brasil, nos últimos anos, tentando evidenciar suas diferenças e possíveis confluências tendo em vista o debate atual sobre as políticas e estratégias de transformação do “modelo de atenção à saúde” no âmbito do SUS. Toma como ponto de partida uma breve revisão da emergência e desenvolvimento das diversas correntes de pensamento nesta área e sistematiza alguns elementos teóricos de referência para a análise das diversas propostas. Trata, em seguida, de caracterizar as diversas propostas em debate, considerando suas origens, fundamentação teórico-conceitual, estratégias de ação e inovações introduzidas no processo de trabalho e/ou na organização dos serviços de saúde. Finaliza discutindo as tendências e desafios que de colocam no momento atual, levando em conta as políticas adotadas e as ações desencadeadas pelo Ministério da Saúde e outras instituições gestoras do SUS, analisando os limites e possibilidades de construção de alianças estratégias entre gestores, profissionais e trabalhadores de saúde e população em geral visando a construção de viabilidade para o fortalecimento e consolidação de um modelo de atenção integral à saúde.

1 Artigo publicado no número especial da revista Saúde em Debate dedicado ao temário da 12a. Conferência Nacional de Saúde (RSD, CEBES, Londrina, v. 27, n. set/dez de 2003, p. 257-277. 2 Doutora em Saúde Pública. Professora do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia.

Introdução

A reflexão sobre a problemática do que hoje denominamos “modelos de atenção à saúde”,

remonta aos primórdios do movimento da Reforma Sanitária Brasileira (RSB) e teve suas

origens na análise crítica da prática médica e dos “movimentos ideológicos” de reforma que

se apresentavam na conjuntura da época, especialmente a Medicina Preventiva (Arouca,

1975) e a Medicina Comunitária (Donnangelo, 1976). Esses estudos abriram o caminho

para a investigação dos determinantes do processo de trabalho em saúde (Bruno Gonçalves,

1979), de um lado, e das diversas modalidades de organização social das práticas de saúde

no Brasil, especialmente a “Medicina Previdenciária” (Oliveira e Teixeira, 1979) as

empresas médicas de “Medicina de Grupo” (Oliveira e Teixeira, 1984; Cordeiro,1984) e as

experiências alternativas que começavam a ser desenvolvidas naquele período, em vários

locais, como Montes Claros (MG), Londrina (PR), Campinas (SP) e outros.

Muita coisa aconteceu nos 28 anos que nos separam dos trabalhos pioneiros de Antonio

Sérgio Arouca e de Maria Cecília Donnangelo, ponto de partida para uma reflexão teórica e

política que contribuiu decisivamente para a construção dos alicerces conceituais do

movimento pela RSB. Uma revisão crítica da produção acadêmica ao longo desse período,

certamente indicará que a temática do processo de trabalho em saúde ou a produção social

dos serviços, em suas distintas modalidades e formas de organização, foi sendo

progressivamente deslocada do centro das atenções, em virtude da proeminência que

passaram a ter questões de ordem jurídico-legal (em função do debate parlamentar sobre o

direito à saúde e a legislação do SUS) e político-institucional, particularmente a

problemática do financiamento e gestão do sistema público de saúde, o que reflete,

inclusive, a dinâmica do processo político da RSB nos anos 80 e primeira metade dos anos

90.

Ainda assim, vários pesquisadores3 vinculados à universidades e núcleos de pesquisa e

cooperação técnica desenvolveram estudos e investigações sobre essa temática, acopladas

no mais das vezes, ao desenvolvimento de experiências inovadoras de gestão e

reorganização de serviços e de processos de trabalho em saúde. Nesse sentido, pode-se

constatar uma diversificação de abordagens e propostas alternativas, diferenciadas em

função dos contextos, dos fundamentos teórico-conceituais adotados e das estratégias de

mudança das práticas pré-existentes nas unidades de saúde e nos sistemas locais que se

constituíram em loci dessa experimentação e reflexão crítica. De fato, os últimos 15 anos

foram pródigos na geração de experiências locais, distritais e municipais, que

contemplaram a introdução de inovações organizacionais e operacionais no sistema de

serviços e nos processos de trabalho em saúde.

No período SUDS (87-89), em alguns Distritos Sanitários, dentre que foram criados em

todo o país, começou um processo de experimentação que buscava articular as

contribuições de distintas disciplinas e de distintos movimentos ideológicos em torno da

mudança das práticas de saúde. Ainda no final dos anos 80 e início dos anos 90, com as

mudanças políticas verificadas em vários municípios, multiplicaram-se as experiências que

buscavam introduzir alterações na organização dos serviços de saúde e nas relações entre a

oferta, a demanda e as necessidades de saúde da população, com a incorporação de

propostas elaboradas em conjunto com os grupos acadêmicos referidos, muitas vezes sob

patrocínio de organizações internacionais como foi o caso da OPS e da Cooperação Italiana

em Saúde (Silva Jr., 1998; Mendes, 1993; Teixeira e Melo, 1995).

Paralelamente a esse processo desencadeado pelos gestores de sistemas municipais de

saúde, notadamente a partir da implementação do PACS e do PSF, na segunda metade dos

anos 90, centenas de experiências inovadoras na prestação de serviços vêm sendo

desenvolvidas, seja no âmbito de uma unidade específica, ou mesmo no seio de uma equipe

dos programas, introduzindo-se inovações no conteúdo das práticas – assistenciais,

3 Cabe destacar as contribuições dos integrantes do LAPA – UNICAMP, os docentes do DMP-USP e o grupo do ISC-UFBA, que desenvolveram, respectivamente, um conjunto de propostas identificadas como “modelo tecno-assistencial em defesa da vida”, “ações programáticas de saúde” e “vigilância da saúde”.

preventivas ou promocionais, e nas relações dos serviços com os diversos grupos da

população nas áreas de abrangência dos programas.

O processo de construção do SUS vem se constituindo, portanto, em um imenso

“laboratório”, por conta de uma complexa e intrincada rede de relações entre assessorias e

consultorias prestadas por núcleos acadêmicos e organismos de cooperação técnica,

nacionais e internacionais. Isto contribuiu para a difusão e incorporação de propostas que

vinham sendo elaboradas e testadas em espaços restritos, as quais puderam ser transladadas

a outras realidades, gerando novas adaptações e desdobramentos. Observa-se, assim, um

processo de “interfertilização” entre a experimentação prática no âmbito de sistemas

estaduais e municipais de saúde e a reflexão teórico-crítica de diversos grupos acadêmicos.

Mais recentemente, o Ministério da Saúde vem adotando propostas de reorganização dos

serviços fundamentadas no debate internacional sobre o tema que “dialogam” com a

reflexão nacional, gerando experiências inovadoras, criativas, que constituem, a meu ver, a

base para o desenvolvimento de um modo de pensar e de agir em termos de mudança do

modelo de organização das práticas de saúde que aponta para a possibilidade de construção

de propostas e respostas coerentes com nossos problemas e nossas utopias.

Apesar disso, no âmbito do debate político, a questão dos modelos de atenção, mesmo que

tenha aparecido como tema da 10a. CNS e também na 11a,. foi obscurecida pelas discussões

em torno do financiamento e da gestão do sistema. Isso, desde o período SUDS, passando

pelo período Collor (ênfase na questão gerencial), no governo Itamar (quando se coloca

com mais força a proposta de municipalização, implementada a partir daí através das

NOBS) e mesmo no período FHC, quando, inicialmente o debate central girou em torno da

questão do financiamento (CPMF e posteriormente a EC29) e da gestão (com a NOB 96 e a

NOAS). Somente com a expansão da Saúde da Família a partir de 1998, esse tema passou a

ter um pouco mais de visibilidade, tanto na mídia, em função do marketing político do

governo quanto por conta das iniciativas desencadeadas pelas instâncias de coordenação

central e estadual dos programas, especialmente em eventos que evidenciaram os resultados

alcançados em termos de cobertura populacional, número de equipes formadas e

capacitadas, além dos efeitos verificados em alguns indicadores de saúde.

No momento atual, levando em conta o novo cenário governamental, especialmente no

âmbito do Ministério da Saúde, é possível se pensar que o centro do debate político que

vem se configurando no SUS, cujos desdobramentos se explicitarão na 12a. CNS serão as

propostas e estratégias de mudança do modelo de atenção à saúde. De fato, pela primeira

vez, nos últimos 15 anos, é possível que a problemática da mudança do modelo possa ser o

eixo articulador do conjunto das políticas do MS, direcionando, especificamente, as opções

em torno do Financiamento das ações e do Desenvolvimento de Recursos Humanos,

sabidamente os dois “nós críticos” mais importantes do processo de reforma.

Nesse sentido, o objetivo do presente artigo é caracterizar as principais propostas de

mudança no conteúdo e na forma de organização das práticas de saúde que vem sendo

elaboradas nos últimos anos, tentando evidenciar suas diferenças e possíveis confluências

tendo em vista a transformação do “modelo de atenção à saúde” em suas várias dimensões,

política, tecnológica e organizacional. Em seguida, procuro discutir as possibilidades e os

limites que se colocam no momento atual para o desenvolvimento desse processo, levando

em conta as tendências e opções do governo federal com relação à política de saúde e as

principais estratégias dirigidas à reorganização da atenção à saúde no SUS.

Mudança do “modelo de atenção” e transformação das práticas de saúde:

elementos conceituais e estratégias de intervenção

Em um texto produzido para um Seminário sobre “Saúde e Desigualdade: instituições e

políticas públicas no século XXI”, realizado na ENSP/FIOCRUZ, em novembro de 2001,

tratei de sistematizar alguns elementos conceituais que podem fundamentar o debate sobre

“modelo de atenção à saúde”, buscando explicitar, de um lado, a definição de “modelo

assistencial” que toma como referencial a teoria do processo de trabalho em saúde, e do

outro, a compreensão que se pode ter de “modelo de atenção”em uma perspectiva

sistêmica. Como exemplo da primeira abordagem, resgatei a definição de modelo

assistencial elaborada por Paim (1993, 1998, 1999) e tratei de descrever possíveis

dimensões do “modelo de atenção” entendido como um dos componentes de um sistema de

serviços de saúde. Reproduzo a seguir o trecho correspondente a essa sistematização tal

como foi publicado na coletânea de artigos sobre o assunto, organizada por mim em 2002

(Teixeira, 2002: 110-113), considerando que essa dupla perspectiva nos ajudará, mais

adiante, a compreender as semelhanças e diferenças, e os alcances e limites de cada uma

das propostas alternativas que vem sendo colocadas em debate no momento atual.

“Modelos assistenciais, segundo Paim (1993, 1998, 1999) podem ser entendidos como

“combinações de saberes (conhecimentos) e técnicas (métodos e instrumentos) utilizadas

para resolver problemas e atender necessidades de saúde individuais e coletivas, não sendo,

portanto, simplesmente uma forma de organização dos serviços de saúde nem tampouco um

modo de administrar (gerir ou gerenciar) um sistema de saúde”. Nessa perspectiva, os

modelos de atenção à saúde são “formas de organização das relações entre sujeitos

(profissionais de saúde e usuários) mediadas por tecnologias (materiais e não materiais)

utilizadas no processo de trabalho em saúde, cujo propósito é intervir sobre problemas

(danos e riscos) e necessidades sociais de saúde historicamente definidas” .

Além dessa concepção, fundamentada nos estudos sobre práticas de saúde, especialmente

na identificação dos elementos estruturais do processo de trabalho em saúde, pode-se

conceber uma concepção “ampliada”, sistêmica, sobre “modelo de atenção”, que inclui três

dimensões: uma dimensão gerencial, relativa aos mecanismos de condução do processo de

reorganização das ações e serviços, uma dimensão organizativa, que diz respeito ao

estabelecimento das relações entre as unidades de prestação de serviços, geralmente

levando em conta a hierarquização dos níveis de complexidade tecnológica do processo de

produção do cuidado, e a dimensão propriamente técnico-assistencial, ou operativa, que diz

respeito às relações estabelecidas entre o (s) sujeito(s) das práticas e seus objetos de

trabalho, relações estas mediadas pelo saber e tecnologia que operam no processo de

trabalho em saúde, em vários planos (promoção da saúde, prevenção de riscos e agravos e

recuperação e reabilitação) (Teixeira, 2002).

Nessa perspectiva “ampliada”, uma transformação do modelo de atenção, para ser

concretizada, exige a conjunção de propostas e estratégias sinérgicas, nas três dimensões.

Mudanças parciais, entretanto, podem acontecer em cada uma das dimensões assinaladas,

constituindo processos que podem facilitar transformações mais amplas. Assim, propostas

de mudança no processo político-gerencial, com a introdução, por exemplo, de tecnologias

de gestão que proporcionem a identificação de problemas e necessidades de saúde em uma

perspectiva social e epidemiologicamente orientada, podem favorecer a ocorrência de

mudanças nas práticas de saúde propriamente ditas, por induzir ao privilegiamento de ações

voltadas à intervenção sobre os determinantes dos problemas e não apenas aos seus efeitos

(Teixeira, 2001). Na mesma linha, a introdução de mecanismos de controle e avaliação do

processo de prestação de serviços, principalmente sobre a rede privada contratada e

conveniada com o sistema público, é de fundamental importância para o estabelecimento de

uma adequação entre a oferta e as necessidades e problemas de saúde da população,

contribuindo para a correção dos efeitos mais perversos da lógica de mercado no setor

(Solla et al., 2000).

Do mesmo modo, a introdução de mudanças na dimensão organizativa, quer seja pela

modificação nas proporções entre os diversos níveis de organização da produção dos

serviços, quer seja pelo estabelecimento de relações hierárquicas entre unidades de

produção de serviços nos níveis de complexidade (referência e contra-referência)

tecnológica, ainda que sejam fundamentalmente estratégias de racionalização de custos,

podem contribuir para a indução de práticas mais adequadas aos problemas e necessidades

de saúde. Nessa perspectiva, colocam-se, por exemplo, as propostas de ampliação da “rede

básica” de serviços de saúde, cuja expansão, em última instância pode alterar a proporção

estabelecida entre “cuidados primários”, “secundários e terciários”, ou usando a

terminologia da NOAS, entre a “rede básica” e a “atenção de média e alta complexidade”.

Na mesma linha, as propostas dirigidas ao estabelecimento de um pacto de

responsabilidades entre vários municípios, que podem vir a compor, em conjunto, uma

“microregião de saúde”, implicam, em última análise, na criação de possibilidades de

acesso a uma gama variada de ações e serviços que, de outro modo, não poderiam ser

garantidos à população, principalmente, aquela que habita os municípios menores, onde se

constata mais insuficiências de infraestrutura do sistema.

Tudo isso é necessário, porém não suficiente para a transformação propriamente dita do

modelo de atenção. Esta exige a implementação de mudanças no processo de trabalho em

saúde, tanto no que se refere a seus propósitos ou finalidades, quanto, nos seus elementos

estruturais, isto é, no objeto de trabalho, nos meios de trabalho, no perfil dos sujeitos e

principalmente, nas relações estabelecidas entre eles e a população usuários dos serviços.

Do ponto de vista das finalidades ou propósitos da atenção à saúde trata-se de superar o

modelo centrado na atenção à “demanda espontânea”, de atendimento a doentes, para

incluir ações de prevenção de riscos e agravos e de promoção da saúde, para além dos

muros das unidades de saúde, isto é, nos territórios onde vive e trabalha a população da área

de abrangência dos serviços, sejam estes delimitados enquanto “área de abrangência” de

unidades de saúde, seja, como prevê a NOAS4, o espaço compreendido em um “módulo

assistencial” e, principalmente, o espaço circunscrito de uma microregião de saúde.

A ênfase do processo de prestação de serviços se desloca do eixo “recuperar a saúde de

indivíduos doentes”, para “prevenir riscos e agravos” e “promover a saúde das pessoas e

dos grupos populacionais” o que implica tomar como objeto os problemas de saúde e seus

determinantes, organizando-se a atenção de modo a incluir não apenas as ações e serviços

que incidem sobre os “efeitos” dos problemas (doença, incapacidade e morte), mas,

sobretudo, as ações e serviços que incidem sobre as “causas” (condições de vida, trabalho e

lazer), ou seja, no modo de vida das pessoas e dos diversos grupos sociais (Paim, 1994;

Teixeira, 1998).

A redefinição do objeto de trabalho exige a utilização de saberes e tecnologias

consentâneas com a ampliação e diversificação do leque de ações e serviços, o que, por

sua vez, se reflete na necessidade de mudança no perfil dos sujeitos do processo de

trabalho, tanto no plano individual, de cada profissional e trabalhador de saúde, quanto,

principalmente, no perfil do “sujeito coletivo”. Entenda-se por “sujeito coletivo”, não

apenas a equipe multiprofissional responsável pelas ações de saúde em cada território

4 Norma Operacional de Assistência da Saúde, que prevê a implementação de um processo de regionalização dos serviços, que contempla a constituição de “módulos assistenciais” e “microregiões de saúde”. (MS, 2002).

específico, como se coloca no âmbito da estratégia de Saúde da Família, em que pesem

seus limites (Campos, 2001; Paim, 2001), senão que a população organizada em torno da

promoção da saúde e da melhoria da qualidade de vida, em um processo de

“empoderamento” político e cultural.

A introdução de mudanças nas finalidades, no objeto e no sujeito do processo de trabalho

em saúde incidem, em seu conjunto, sobre as relações estabelecidas entre os sujeitos e os

saberes e tecnologias que utilizam para a apreensão do(s) objeto(s), entre os sujeitos,

profissionais e trabalhadores de saúde, e a população usuária do sistema de serviços. Cabe

ressaltar que, que estas relações sociais tem uma dimensão técnica, mas também uma

dimensão ética, política e cultural, que circunscreve a primeira, embora na maioria das

vezes sua relevância escape à percepção dos sujeitos envolvidos, até pela hipervalorização

da dimensão tecnológica nas práticas de saúde no mundo contemporâneo”.

Como se pode perceber pelo exposto acima, o processo de mudança do modelo de atenção

à saúde é extremamente complexo, exigindo um conjunto heterogêneo de iniciativas

“macro” sistêmicas, quais sejam, a formulação e implementação de políticas que criem

condições para as mudanças ao nível “micro”. Ou seja, penso que é preciso conjugar

mudanças nas “regras básicas” do sistema, com o desencadeamento de processos político-

gerenciais que criem condições favoráveis para a introdução de inovações nas dimensões

gerenciais, organizativas e técnico-assistenciais propriamente ditas, isto é, no âmbito das

práticas de saúde, tanto em termos de mudança no conteúdo das práticas de modo a

direcioná-las para a solução dos problemas e atendimento das necessidades e demandas da

população, quanto na forma de organização do processo de trabalho nas unidades de

prestação de serviços nos diversos níveis de complexidade (básica, média e alta, para usar a

terminologia corrente no SUS) e também na forma de organização das unidades em redes

assistenciais que contemplem princípios de economia de escala na distribuição territorial

dos recursos e, ao mesmo tempo busquem o ajuste possível entre o perfil de oferta de ações

e serviços e as necessidades e demandas da população.

Propostas de mudança do modelo de atenção: diferenças e confluências

Uma primeira observação a ser feita com relação ao conjunto de propostas de mudança no

modelo de atenção à saúde que vem sendo implementadas e analisadas no âmbito do SUS5,

é que nenhuma delas dá conta, sozinha, de todos os aspectos envolvidos no processo de

mudança das práticas de saúde, desde quando cada uma delas enfoca aspectos parciais

desse processo, qual seja o desenho do sistema ao nível macro-organizacional, ou a

mudança do processo de trabalho em saúde, ao nível das “micro-práticas”, tanto em termos

de conteúdo quanto em termos de forma de organização das relações entre os agentes das

práticas e destes com os usuários.

Uma análise mais detalhada das diferenças, e eventuais confluências ou divergências, entre

as propostas sugere como determinantes das diferenças seu contexto de origem, os

fundamentos filosóficos e teóricos que embasam cada uma delas, o conteúdo mesmo das

propostas apresentadas e o grau de permeabilidade, de diálogo, entre elas na prática, isto é,

a possibilidade de conjugação e articulação das propostas em situações concretas no âmbito

do SUS, principalmente ao nível local (micro-regional, municipal e/ou distrital). Para tornar

claro essas diferenças e analisar suas possíveis confluências, trataremos de descrever

sucintamente cada uma das propostas, seguindo uma lógica de exposição, que inicia com as

que privilegiam o nível “micro” dos processos de trabalho em saúde, como é o caso do

“modelo em defesa da vida” e as “ações programáticas”, avançando paulatinamente para as

propostas que buscam dar conta de mudanças ao nível “macro”, de formulação e

implementação de políticas, que extrapolam, inclusive, os limites do sistema de serviços de

saúde, como é o caso da Promoção da Saúde e a proposta de Cidades Saudáveis. Entre

estas situamos as propostas da Vigilância da Saúde e a Saúde da Família, que enfatizam

aspectos técnicos e organizacionais do conjunto das práticas de saúde, tendo como

referência a noção de integralidade da atenção.

5 Não estamos tratando aqui de outras propostas de mudança na organização e gestão da produção de serviços que vem sendo difundidas no âmbito do sistema privado de prestação de serviços, especialmente o “managed care” ou a “medicina baseada em evidências”, ainda que, em algum momento, essas propostas possam repercutir no debate que vem sendo travado no sistema público.

Construindo um modelo “em defesa da vida”: acolhimento, vínculo,

contrato

O conjunto de propostas que constituem o chamado “modelo técnico-assistencial em defesa

da vida”, tem sua origem nos estudos e reflexões sobre a prática de gestão e consultorias

institucionais desenvolvidas por docentes e pesquisadores do LAPA-UNICAMP ao longo,

principalmente, da década de 90. Uma leitura crítica de alguns dos textos que sistematizam

as propostas dessa corrente (Campos, 1994; 1996; Merhry, 1994; 1997; Cecílio, 1994)

ainda que preliminar, revela que, guardadas as diferenças entre os principais autores, o

fundamento filosófico e conceitual comum foi construído a partir da apropriação crítica de

contribuições teóricas provindas do marxismo, do existencialismo, da psicanálise e da

análise institucional, sendo central nessa corrente de pensamento, as idéias de autores

contemporâneos pós-estruturalistas, como Felix Guattari e Cornelius Castoriadis.

O objeto central da análise empreendida por esses autores é o processo de trabalho em

saúde e seu propósito, intelectual e político, indica o desejo de criar metodologias e

instrumentos de gestão e organização do trabalho coletivo que desencadeiem uma

“revolução molecular” no âmbito das instituições de saúde e resulte no estabelecimento de

novas relações entre gestores, trabalhadores e usuários, mediadas pela busca de autonomia

e reconstrução de subjetividades. Com isso, estamos diante de uma perspectiva de

transformação radical das pessoas e das práticas, que busca criar processos “instituintes”,

subvertendo modelos “instituídos”, entre os quais, não só os modelos de organização social

da prática médica e sanitária hegemônica, senão também as propostas alternativas fundadas

nas idéias de descentralização, regionalização e hierarquização de unidades de prestação de

serviços, tornadas supérfluas pelo estabelecimento de processos que privilegiam o

“acolhimento”, os “vínculos”, o “contrato” e a “autonomia” dos sujeitos – trabalhadores e

usuários – na organização do “cuidado progressivo à saúde”.

Na prática, a incorporação dessas propostas tem gerado experiências bem interessantes, que

trazem à tona a problematização da chamada “(des)humanização" do atendimento, em

função da tecnificação do cuidado à saúde e também permitem o enfrentamento de questões

derivadas do processo de medicalização a que a população vem sendo expostas nos últimos

40 anos. Ou seja, problematiza a visão que a população usuária tem do sistema de saúde e

da prática médica, tendendo a valorizar a especialização, a sofisticação tecnológica, o

consumo de medicamentos e, até por associação, a prática privada.

Desse modo, a organização de práticas de “acolhimento” à clientela dos serviços públicos

de saúde, e o estabelecimento de vínculos entre profissionais e clientela, implica mudanças

na “porta de entrada” da população aos serviços com introdução de mudanças na recepção

ao usuário, no agendamento das consultas e na programação da prestação de serviços, de

modo a incluir atividades derivadas na “releitura” das necessidades sociais de saúde da

população (Merhy, 1994). Além de contribuir para a humanização e melhoria da qualidade

da atenção, é uma estratégia de reorientação da atenção à demanda espontânea que pode ter

efeitos significativos na racionalização dos recursos, no perfil ocupacional dos profissionais

e nas relações destes com os usuários e até no estabelecimento de processos de mudança

nas concepções da população acerca das suas necessidades de saúde e do lugar ocupado

pelo consumo de serviços de saúde na melhoria do seu bem-estar (Cecílio, 1994; Merhy,

1997).

O “ponto cego”, isto é, a lacuna principal desse “modelo”, a meu ver, é a ausência de

propostas com relação ao desenho macroorganizacional do sistema, coisa aliás, que

extrapola o universo teórico-conceitual e a perspectiva político-filosófica dos autores.

Talvez nem se possa considerar isto como sendo uma lacuna, na medida e que os

proponentes desse ‘modelo” não colocam esse ponto como necessário em seu referencial,

pelo contrário, ao trabalharem no plano dos “micropoderes”, estes autores descartam a

necessidade de se definir uma “imagem-objetivo” do sistema de saúde, políticas e

diretrizes, regras e normas gerais, sob responsabilidade do Estado fazendo-nos crer que as

que existem devem ser, inclusive, subvertidas, tendo em vista que o que se pretende é

revolucionar o cotidiano dos serviços de saúde e transformar as pessoas.

Redefinindo o modo de organização tecnológica do trabalho em saúde:

ações programáticas e uma nova ética do cuidado

As propostas do grupo de docentes e pesquisadores, organizado em torno do Centro de

Saúde Escola Samuel Pessoa, sob responsabilidade do DMP-USP, têm sido identificadas,

em vários textos, sob o rótulo de “ações programáticas em saúde”, na medida em que

tomam, como ponto de partida, uma reflexão sobre a programação enquanto uma

tecnologia que pode ser utilizada para a reorganização do processo de trabalho. Tendo

como ponto de partida uma reflexão sobre o processo de trabalho em saúde com forte viés

do marxismo estruturalista (Bruno-Gonçalves, 1979), essa corrente avançou para a

incorporação do enfoque epidemiológico, em uma perspectiva crítica (Ayres, 1995) e

chegou, mais recentemente, a problematizar a dimensão ética do cuidado à saúde a partir de

filósofos da modernidade como Heidegger, Habermas e Ricoeur (Ayres, 2001).

Do ponto de vista prático, esta corrente de pensamento propõe a delimitação dos objetos de

intervenção no âmbito dos serviços como sendo as “necessidades sociais de saúde”

definidas e função de critérios demográficos, sócio-econômicos e culturais, o que promove

o estabelecimento de recortes populacionais sobre os quais incidem as ações programáticas

(Bruno-Gonçalves, 1990; Schraiber, 1990, 1993, 1995, 1996). Como apontei em outro

trabalho (Teixeira, 2000) essa proposta constitui uma alternativa à implementação dos

chamados “programas especiais” definidos centralmente como “pacotes tecnológicos” a

serem incorporados aos serviços.

As ações previstas nos programas verticais derivam do conhecimento científico-técnico

disponível para intervenção sobre os problemas, constituindo normas técnicas a serem

seguidas universalmente. Estes programas têm sido implantados como “programas

verticais”, normativos, sem que o processo de operacionalização (ou não) leve em conta as

características específicas das populações dos distintos territórios e as condições concretas

de vida, que condicionam o modo de expressão dos problemas de saúde e doença. A

experiência desenvolvida pelo grupo da USP, entretanto, aponta possibilidades de

redefinição das práticas, tanto em termos do conteúdo das ações quanto na mudança das

relações de trabalho e nas relações dos trabalhadores de saúde e os usuários, resgatando,

inclusive, a problematização da dimensão ético-pedagógica do cuidado à saúde.

A incorporação das idéias e propostas desse grupo à prática gerencial no âmbito o SUS tem

sido uma fonte de inspiração para o aperfeiçoamento tecnológico e organizacional de

processos de programação que tem como horizonte a busca de superação do viés

economicista da Programação Pactuada Integrada – PPI e a institucionalização da

programação como um espaço de construção coletiva do projeto de trabalho das equipes de

saúde. Cabe lembrar que a PPI tem sido basicamente um instrumento de racionalização da

oferta de serviços pelas unidades de saúde, não problematizando o conteúdo das práticas

que são realizadas nem a sua adequação às necessidades e problemas de saúde da

população dos municípios. O diálogo com as propostas das “ações programáticas”,

entretanto, pode ser extremamente fértil na perspectiva de estimular os profissionais e

trabalhadores de saúde a buscarem aperfeiçoar continuamente suas práticas à luz do

desenvolvimento científico e tecnológico disponível, bem como pode evidenciar a

possibilidade de se experimentar formas alternativas de organização do cuidado mais

consentâneas com as características sócio-culturais dos usuários dos serviços.

Comparando a contribuição dessa corrente com a anterior, podemos perceber que têm em

comum o foco na reorientação do processo de trabalho em saúde, sendo que o “modelo em

defesa da vida” privilegia os processos intersubjetivos de natureza psicológica e política,

trabalhando as vinculações entre “desejo” e “vontade”, no estabelecimento de vínculos

entre profissionais e usuários, enquanto que a corrente das “ações programáticas”, enfatiza

o aperfeiçoamento das práticas pela incorporação crítica dos saberes, conhecimentos e

tecnologias disponíveis para a delimitação de objetos de intervenção referidos às

necessidades de grupos populacionais específicos – mulheres, adolescentes, idosos, etc. ou

problemas específicos que se apresentam na prática clínica, relançando-os no espaço social

mais amplo das determinações sociais e políticas.

Em ambas correntes de pensamento permanece a lacuna relativa ao desenho macro-

organizacional do sistema de serviços de saúde, no caso específico da contribuição do

grupo da USP, também por não se constituir em objeto de eleição para a pesquisa e

elaboração de propostas. Chama atenção também, que apesar de tomar como espaço de

intervenção as unidades de saúde, no caso, uma unidade básica, o grupo da USP não

tematiza necessariamente o território, e conseqüentemente, não trabalha com a idéia de

ações territoriais de prevenção de riscos e agravos. Quer dizer, apesar da ênfase na

utilização do enfoque epidemiológico, parece que a Epidemiologia ingressa na prática dos

serviços para “iluminar” a clínica, ainda que seu conteúdo remeta à problematização dos

determinantes sociais do processo saúde-doença nos grupos populacionais específicos sobre

os quais e com os quais se organiza o cuidado.

Articulando o conjunto de objetos e estratégias de intervenção no âmbito

das práticas: Vigilância da saúde e a busca de integralidade da atenção

A proposta conhecida como Vigilância da Saúde tem suas origens nas experiências

desenvolvidas no âmbito de Distritos sanitários implantados no final dos anos 80 e início

dos anos 90, por iniciativa de Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, contando com

apoio da Organização Panamericana de Saúde e da Cooperação Italiana em Saúde. A base

conceitual originária dos DS (SILOS), resultava de uma atualização da proposta de

regionalização dos serviços de saúde elaborada por Dawson, nos anos 20, na Inglaterra,

matriz da macro-organização do NHS e também do sistema de saúde italiano, ambos fontes

inspiradoras de propostas elaboradas pela vertente “político-institucional” do movimento

pela RSB, representada, de certa forma, pela presença de Hésio Cordeiro na presidência do

INAMPS no período SUDS.

Além do enfoque sistêmico, que fundamentava a noção de SILOS, a implantação dos DS

no contexto brasileiro absorveu rapidamente as propostas do planejamento estratégico-

situacional, do Carlos Matus (1993) e também se alimentou da reflexão que vinha sendo

desenvolvida por epidemiologistas como Pedro Luis Castellanos (1991;1997), acerca da

análise de situações de saúde. Além disso, incorporou, no mesmo movimento, as

contribuições da “nova geografia” do Milton Santos, como referencial para a delimitação

dos territórios (no plural) circunscritos pelo DS, quais sejam, os territórios administrativo,

sanitário e epidemiológico, não necessariamente coincidentes e sim recortados e

superpostos como um mosaico que permite a identificação de problemas e necessidades de

saúde e das possibilidades de oferta de serviços e de intervenções sobre condições de vida

da população.

A noção de Vigilância da Saúde (VISAU) surgiu, nesse contexto, como forma específica de

denominação da proposta de integração das práticas de saúde no território do DS, a partir

de uma releitura crítica e atualização histórico-concreta, do diagrama proposto

originalmente por Leavell & Clarck, a propósito dos “níveis de prevenção” que atravessam

a História Natural das Doenças (HND) (Leavell & Clarck, 1987; Arouca, 1975; Paim,

1994; Teixeira, 2000). A partir dessa concepção renovada do modelo da HND, a VISAU

incorpora, para além do esquema abstrato que organiza os diversos níveis de prevenção, a

análise concreta das práticas de saúde tal como se apresentam ou podem vir a se apresentar

em uma situação específica como a brasileira. Prevê, assim, a possibilidade de formulação e

implementação de “políticas públicas saudáveis”, conjunto de ações governamentais

(intersetoriais) e não governamentais voltadas à melhoria das condições de vida das

populações, e a reorganização das ações sob responsabilidade direta do sistema de serviços

de saúde, sejam as ações de “vigilância ambiental, sanitária e epidemiológica”, dirigidas ao

controle de riscos e danos, sejam as práticas de “assistência e reabilitação” dirigidas ao

atendimento de necessidades e demandas de indivíduos e grupos populacionais.

A operacionalização da proposta de VISAU implica, pelo exposto, a valorização dos

princípios de regionalização e hierarquização dos serviços, aplicados simultaneamente à

delimitação de diversas “áreas” (de abrangência/influência dos serviços, de acordo com sua

capacidade operacional) e, além disso, a incorporação da idéia de “mapas de risco”, que

fundamenta a delimitação de “microáreas” (definidas em função do mosaico

epidemiológico e das condições e modos de vida da população). A incorporação da noção

de “problemas de saúde” no processo de planejamento e programação das ações, por sua

vez, permite a valorização de uma visão policêntrica e democrática na definição dos objetos

de intervenção, sem se perder de vista, porém, a racionalidade técnica que orienta a

identificação de necessidades sociais de saúde e a problematização da demanda aos

serviços para além da perspectiva clínica predominante entre os profissionais de saúde.

Como se pode perceber, a proposta de VISAU pretende dar conta do principio da

integralidade, pensado tanto em uma perspectiva “vertical”, de organização dos serviços

segundo níveis de complexidade tecnológica, quanto “horizontal”, no que diz respeito à

articulação entre ações de promoção da saúde, prevenção de riscos, assistência e

recuperação. Na prática, todavia, essas propostas tendem a ser flexibilizadas, de modo a se

superar a idéia de uma estrutura “piramidal” de serviços, através da constituição de redes

articuladas em função do atendimento de problemas e necessidades prioritárias, bem como

permite uma plasticidade na composição do perfil de oferta de ações promocionais,

preventivas e assistenciais, novamente tendo em vista a adequação dos serviços aos

problemas e necessidades da população.

Talvez até por seu caráter abrangente, a Vigilância da saúde não avança com propostas

específicas de mudança na organização do processo de trabalho e saúde, tendo estabelecido,

inclusive, um diálogo com a corrente das “ações programáticas”, dada a confluência de

muitos dos seus pressupostos teóricos e políticos. Por outro lado, também tem se

aproximado do debate sobre Promoção da Saúde, visando ampliar o escopo da reflexão

sobre políticas e estratégia de ação intersetorial voltadas à melhoria das condições de vida.

Simultaneamente, esta noção passou a ser usada como referência no âmbito da “estratégia

de Saúde da Família”, introduzida por consultores do PACS/PSF que buscavam um termo

suficientemente abrangente que dê conta da busca de integralidade perseguida pela

coordenação nacional e por algumas coordenações estaduais e municipais desses

Programas.

“Rever tendo” o modelo de atenção através da expansão e qualificação da

atenção básica: a Saúde da Família e a regionalização da atenção

As origens da proposta de Saúde da Família remontam ao surgimento e difusão do

movimento de Medicina Familiar (Paim, 2003a) estruturado em meados dos anos 60 nos

EUA com a finalidade de introduzir reformas no processo de ensino médico. Difundido a

vários países da América Latina nas décadas seguintes, este movimento se deslocou

progressivamente das instituições de ensino para os serviços, inclusive no Brasil onde

emergiu enquanto proposta de formação pós-graduada em “Medicina Geral e Comunitária”,

vindo posteriormente a ser absorvido como fundamentação da política de organização da

Atenção Primária à Saúde. A trajetória institucional dessa proposta ilustra claramente um

processo de “refuncionalização” de suas concepções e práticas, na medida em que, partindo

de uma concepção voltada para a reorganização da prática médica, clínica, a partir da

ampliação do objeto de trabalho (dos indivíduos à família), estas propostas foram

paulatinamente associadas aos princípios da Medicina Comunitária e incorporaram

princípios e diretrizes que vão além da clínica, especialmente a contribuição da

epidemiologia e da administração e planejamento em saúde.

De fato, uma análise da concepção brasileira da Saúde da Família evidencia a articulação

de noções e conceitos provindos de distintas disciplinas do campo da Saúde Pública e

Coletiva, que se traduzem em princípios e diretrizes operacionais que buscam conformar

um modelo de atenção pautado pela organização sistêmica dos serviços

(complementariedade e hierarquização), pelo caráter multiprofissional das equipes de

trabalho, pela utilização da informação epidemiológica para o planejamento e programação

das ações de saúde e pela busca de integralidade das práticas (promoção, proteção e

recuperação) ainda que no âmbito da Atenção Primária, ou como se convencionou

denominar no SUS, da Atenção Básica. (MS, 1998; 2000).

O mais interessante e, sem dúvida, mais relevante, politicamente, é que a Saúde da Família,

formulada enquanto um programa “vertical” a ser implantado nas regiões Norte e Nordeste

do país, onde se colocava a necessidade de interromper ou redefinir o ritmo de expansão da

epidemia de cólera no início dos anos 90, foi reapropriada e redefinida, por um conjunto

heterogêneo de atores políticos, ao nível estadual e posteriormente federal, que viram no

PACS e em seu sucedâneo, o PSF, uma oportunidade histórica de promover a mudança do

modelo de atenção à saúde em larga escala. Com isso, a partir de 1994 e, principalmente no

período 1998-2002, a Saúde da Família deixou de ser um programa que operacionalizava

uma política de focalização da atenção básica em populações excluídas do consumo de

serviços, para ser considerada uma estratégia de mudança do modelo de atenção à saúde no

SUS, na verdade, o instrumento de uma política de universalização da cobertura da atenção

básica e, portanto, um espaço de reorganização do processo de trabalho em saúde nesse

nível. Mais que isso, a Saúde da Família, vem sendo concebida como parte de uma

estratégia maior de mudança do modelo de atenção, na medida em que se conjugue com

mudanças na organização da atenção de média e alta complexidade induzidas por políticas

de regulação e controle.

A pertinência dessa estratégia para a extensão de cobertura da atenção básica vem sendo

evidenciada pela enorme expansão do número de equipes do PSF implantadas em todo o

país (aproximadamente 20 mil), ainda que não se possa afirmar que, no conjunto, as ações e

serviços produzidos signifiquem de fato, a mudança de conteúdo das práticas e da forma de

organização do processo de trabalho prevista nos documentos oficiais. Nesse sentido, ainda

que a Saúde da Família tenha como “imagem-objetivo” a integralidade das ações, o que

tem gerado, inclusive, um diálogo e “interfertilização’ com as propostas da Vigilância da

Saúde (Campos, 2003) ainda há um longo caminho a percorrer para se alcançar, na prática

das equipes, uma lógica de adequação permanente das práticas às necessidades e problemas

de saúde da população, tendo como referência a possibilidade de conjugar ações voltadas

com controle de determinantes, riscos e danos (promoção, prevenção e assistência).

Do mesmo modo, a pertinência dessa estratégia enquanto indutora de mudanças na

organização do sistema de serviços de saúde como um todo, vem sendo testada e

comprovada em diversas experiências municipais, cuja institucionalização, evidentemente,

depende da existência ou criação de condições de permanência e reprodução do modelo, o

que extrapola, às vezes, a capacidade dos governos municipais. Daí que se coloca a

necessidade de articulação do processo de implementação da Saúde da Família com a

Regionalização da Assistência, desencadeada no período 2001-2002 através do debate e

implantação da NOAS. De fato, a possibilidade de se avançar na “microregionalização

cooperativa”, forma de superação da chamada “municipalização autárquica” (Mendes,

2001), que marcou o processo de descentralização da gestão do SUS nos últimos 10 anos,

além de servir como um “choque de realidade”, diante dos enormes vazios sanitários que se

observa em vastos territórios de diversos estados do país, traz embutida uma preocupação

com economia de escala na implantação de serviços de apoio diagnóstico e terapêutico,

bem como de serviços de atenção hospitalar em áreas prioritárias, sabidamente o “ralo” por

onde escoa montante significativo dos recursos financeiros do SUS.

Pelo exposto percebe-se os avanços, mas também as lacunas da proposta de Saúde da

Família, as quais, na prática concreta dos serviços, podem vir a ser superadas pelo diálogo e

incorporação crítica de outras propostas que contemplam a redefinição do conteúdo das

ações, como,por exemplo, a Vigilância da Saúde, orientando a ampliação dos objetos de

intervenção nos territórios a partir da descentralização das “vigilâncias” – ambiental,

sanitária e epidemiológica, e, mais que isso, a incorporação das idéias e propostas do

movimento em torno da Promoção da Saúde, que extrapola as ações de “educação e

mobilização popular” e incorporam o desencadeamento de ações intersetoriais nos

territórios de abrangência das ações das equipes. Do ponto de vista da vinculação sistêmica

com outros níveis de atenção, a articulação com a proposta de microregionalização da

assistência pode contribuir para superar uma limitação de origem, isto é, o fato da Saúde da

Família estar voltada fundamentalmente para a reorganização da atenção básica. Além

disso, o processo de expansão da Saúde da Família para grandes municípios tem

evidenciado novas lacunas e desafios para o aperfeiçoamento dessa estratégia, os quais

abordaremos no último item desse trabalho.

Reor ientando a política de saúde com base na Promoção da Saúde: das

políticas públicas saudáveis à recr iação do espaço público nas cidades

A concepção atualmente difundida de Promoção da Saúde, surge e se desenvolve, como

assinala Buss (2003) nos últimos 20 anos, no Canadá, Estados Unidos e países da Europa

ocidental, sendo um marco importância a Conferência de Ottawa (1986), na qual se

apresentou a Promoção da Saúde como um “enfoque” político e técnico em torno do

processo saúde-doença-cuidado. De fato, a proposta atual de Promoção da Saúde dá novo

significado ao termo cunhado por Sigerist (1946) para designar uma das funções da

medicina, ultrapassando em muito a idéia embutida no “nível de prevenção primária”

definido por Leavell & Clarck (1987), estando associado a um conjunto de valores (vida,

saúde, solidariedade, equidade, democracia, cidadania, desenvolvimento sustentável,

participação e parceria referindo-se a uma “combinação de estratégias que envolvem a ação

do Estado (políticas públicas saudáveis), da comunidade (reforço da ação comunitária), de

indivíduos (desenvolvimento de habilidades pessoais), do sistema de saúde (reorientação do

sistema de saúde) e de parcerias interinstitucionais, trabalhando com a propostas de

“responsabilização múltiplas seja pelos problemas, seja pelas soluções propostas para os

mesmos” (Buss, 2003: 16).

Do ponto de vista conceitual, a Promoção da Saúde tem aberto espaço à reflexão sobre o

conceito de saúde (Almeida Filho e Andrade, 2003), e a problematização das diferenças e

semelhanças entre as estratégias de prevenção e promoção (Czeresnia, 2003), estimulando

epidemiólogos e cientistas sociais que atuam no campo da Saúde Pública/Coletiva, a

aprofundarem a discussão em torno do conceito de risco (Caponi, 2003), vulnerabilidade

(Ayres et al, 2003) e suas implicações para as práticas de saúde no mundo contemporâneo

(Castiel, 2003), o que tem como um dos desdobramentos a atualização da reflexão sobre a

proposta de Vigilância da Saúde (Freitas, 2003; Paim, 2003b).

A difusão das idéias que constituem o corpo doutrinário da Promoção da Saúde tem gerado

a incorporação de muitas de suas propostas no processo de formulação de políticas e

programas de saúde, como é o caso do Programa de Controle do Tabagismo e do Programa

de Controle da AIDS, ao lado de diversas iniciativas em torno da definição de estratégias

para a Promoção da Paz e do controle da Violência, em várias cidades brasileiras (Teixeira

e Paim, 2000) e da formulação de políticas públicas saudáveis que levem em conta a

possibilidade de articulação de ações intersetoriais voltadas para a melhoria da qualidade de

vida de grupos populacionais expostos a riscos diferenciados (Viana, 1998; Junqueira,

2000).

Uma das formas de difusão e incorporação das propostas do movimento da Promoção da

Saúde no Brasil tem sido a criação de “cidades saudáveis”, iniciativa fomentada pela

Organização Mundial da Saúde e incorporada por várias administrações municipais nos

últimos anos (Campinas, Curitiba, Fortaleza, e outras) (Akerman, 1997; Junqueira, 1997,

1998; Ribeiro, 1997). A noção de “cidades saudáveis” implica uma visão ampliada da

gestão governamental, que inclui a promoção da cidadania e o envolvimento criativo de

organizações “comunitárias” no planejamento e execução de ações intersetoriais dirigidas à

melhoria das condições de vida e saúde, principalmente em áreas territoriais das grandes

cidades onde se concentra a população exposta a uma concentração de riscos vinculados à

precariedade das condições de vida, incluindo fatores econômicos, ambientais e culturais

(Westphal, 1997; Malik, 1997, Keinert, 1997; Ferraz, 1999; RADIS, 2000). Como assinalei

em outro lugar, sua incorporação ao referencial adotado pelas administrações municipais

pode contribuir para a concretização de processos de descentralização, intersetorialidade e,

principalmente, para a ampliação do leque de ações sociais voltados ao atendimento de

necessidades de saúde da população, gerando experiências inovadoras de articulação

intersetorial para o enfrentamento de problemas cujos determinantes extrapolam o âmbito

de ação do sistema de serviços de saúde (Teixeira, 2000).

A difusão e multiplicação de propostas políticas derivadas do movimento pela Promoção da

Saúde, incluído recentemente na Agenda política de entidades representativas das

Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) e pelo próprio Ministério da Saúde, que

em 1998 chegou a criar um projeto de Promoção da Saúde sob responsabilidade da então

Secretaria de Políticas de Saúde (MS, 2002), sem dúvida, constitui uma importante

inovação conceitual e político-ideológica na área de formulação de políticas sociais, porém,

não dá conta, evidentemente, do encaminhamento dos problemas específicos da

organização do “modelo de atenção à saúde”. Sua inclusão nesse debate, a meu ver, se

justifica, porém, pela renovação de perspectivas e pela abertura de um diálogo que tende a

extrapolar o espaço de governabilidade das instituições gestoras do sistema de saúde e

aponta, seja no nível federal, estadual ou municipal, para a possibilidade de reorientação de

práticas que incidam sobre as condições e modos de vida da população, produzindo efeitos

diretos e indiretos sobre o perfil de necessidades e demandas que venham a se apresentar ao

sistema de serviços no futuro. Nesse sentido, a análise dos processos de transição

demográfica e epidemiológica, os novos “mapas de risco” e as estratégias de promoção e

prevenção a serem adotadas nesses cenários, é parte da reflexão sobre as tendências e

perspectivas das políticas e práticas de saúde no âmbito do SUS (Barreto, 2002; Paim,

2003c; Teixeira, 2003).

Problemas e desafios no momento atual: desatando nós e cr iando laços

Vistas, em suas linhas gerais, as semelhanças e diferenças, confluências e divergências

entre as diversas propostas de mudança do modelo de atenção à saúde no âmbito do SUS,

cabe retomar a análise do contexto atual para que se possa identificar tendências e desafios

colocados ao desenvolvimento desse processo. Pelo exposto anteriormente, podemos

considerar que um dos “nós críticos” a serem desatados no momento atual, diz respeito à

compreensão dos limites e possibilidades de cada uma das propostas em debate e

experimentação, para que se possa, inclusive, conjugar elementos conceituais,

metodológicos e operacionais de cada uma delas, na medida e que não apresentem

incoerências e incompatibilidades entre si.

Nesse contexto, além das insuficiências e lacunas conceituais e metodológicas das diversas

propostas de mudança do modelo de atenção, nos enfrentamos com a possibilidade de que

as diferenças entre as propostas sejam assumidas como diferenças de projetos políticos das

diversas forças envolvidas na formulação das estratégias de intervenção sobre o processo de

reforma. Daí que é fundamental que se avance, durante os debates a serem realizados na

12a. Conferência Nacional de Saúde, na construção de um consenso acerca de qual é o

“SUS que queremos”, ainda que para isso, tenha que se superar resistência de ordem

filosófica até mesmo com relação uma definição de uma “Imagem-objetivo”.

A partir daí será mais fácil, creio eu, avançar na definição das políticas e estratégias de

mudança do modelo, potencializando o que já vem ocorrendo em grande número de

municípios que, através de consultorias ou pelo acesso à literatura da área, tratam de

incorporar inovações na organização dos serviços e nas práticas de saúde que, muitas vezes,

provém de correntes de pensamento diferentes. Como já defendi em outro trabalho

(Teixeira, 2000), penso que nenhuma das propostas sozinha dá conta do processo de

mudança do modelo de atenção à saúde em todas as suas dimensões, daí que defendo a

necessidade de se buscar reconstruir a organização dos serviços e se redefinir o conteúdo

das práticas, a partir da situação concreta de cada local, seja um distrito, um município ou

uma microregião de saúde, levando em conta a heterogeneidade estrutural da situação de

saúde e do sistema de serviços de saúde em cada região e estado. Com isso, é possível

admitir que não deve se estabelecer um “modelo padrão” a ser reproduzido em todos os

locais, senão que, como já vem ocorrendo, deve se definir princípios e diretrizes que

possam ser adaptados às diversas realidades, constituindo variantes de um modelo que

tenha como eixo central, a busca de universalização, integralidade e equidade na prestação

de serviços.

Considerando que a questão da integralidade pode ser tomada como o eixo central para a

formulação de políticas e implementação de estratégias de mudança do modelo de atenção

à saúde (Pinheiro e Mattos, 2001; 2003), cabe avançar na análise dos problemas e desafios

que se colocam, no momento atual para a efetiva construção de um “modelo de atenção que

tenha a integralidade do cuidado como atributo central. Nesse sentido, cabe, em primeiro

lugar, registrar que a noção de “integralidade” remete a uma dupla dimensão, a primeira

relativa à integralidade do sistema de serviços de saúde (e à construção dos chamados

“sistemas integrados”, conforme analisado por Mendes, 2001) e a segunda à integralidade

das práticas de saúde (e à articulação das ações de promoção da saúde, prevenção de riscos

e agravos , diagnóstico, recuperação e reabilitação de danos) em todos os níveis

organizacionais do sistema de serviços.

O processo de construção da Integralidade na dupla perspectiva (sistema e práticas)

enfrenta hoje no âmbito do SUS um conjunto de desafios que podem ser classificados de

“estruturais” e “conjunturais”. Do ponto de vista “estrutural”, o principal problema deriva

exatamente do fato das práticas de saúde em nosso meio terem sido estruturadas segundo

determinações econômicas e político-ideológicas que continuam, ainda hoje a vigorar. Isto

é, a reprodução do “modelo médico assistencial hospitalocêntrico e privatista” não ocorre

por simples inércia ou somente pela vontade política dos sujeitos que ocupam os vértices do

triângulo constituído pelo Estado, multinacionais de medicamentos e equipamentos

médicos e empresariado nacional e multinacional da área da saúde. A própria existência

desse triângulo revela as fortes determinações econômicas envolvidas na reprodução do

modelo, determinações essas que só se alteram no longo prazo, por força da acumulação de

fatos e processos que venham a condicionar uma nova dinâmica de reprodução, induzida

pelo fortalecimento do papel do Estado como regulador, isto é, como sujeito responsável

pela implementação de um projeto político de mudança da lógica de organização e

funcionamento do sistema que subverta as pressões mercadológicas em nome dos interesses

sociais (e epidemiológicos) da população.

Do ponto de vista “conjuntural”, as opções adotadas pelos gestores do sistema (ao nível

federal, estadual e municipal) no momento atual, conformam um mosaico extremamente

complexo no qual se evidenciam elementos favoráveis e elementos desfavoráveis à

manutenção ou transformação do modelo, que incidem, portanto, na construção da

integralidade do cuidado e na acumulação de fatos e processos que podem vir a contribuir

para a “reversão” efetiva do modelo médico-assistencial hegemônico.

Como elementos favoráveis podemos elencar:

a) a ênfase na implementação e fortalecimento da Atenção Básica à Saúde através da

expansão e qualificação da Saúde da Família, com incorporação das chamadas

“ações programáticas estratégicas” (MS);

b) a possibilidade de se implementar a proposta de regionalização da atenção à saúde

(NOAS), sob responsabilidade dos gestores estaduais (SES);

c) o interesse em se avançar na implantação de ações intersetoriais de Promoção da

Saúde, principalmente, ao nível municipal (bandeira do CONASEMS);

d) a reorientação da formação profissional em saúde (Novas Diretrizes Curriculares)

e a implementação dos Pólos de Educação Permanente (SEGETES) desde quando

não enfraqueçam e sim potencializem a experiência acumulada com a formação e

capacitação das equipes de Saúde da Família;

Como elementos desfavoráveis, destacamos:

a) a provável redução do volume de recursos financeiros para a saúde, diante das

restrições derivadas da política econômica adotada pelo atual governo;

b) a pressão do empresariado médico-hospitalar pela manutenção do fluxo de recursos

financeiros para os serviços de média e alta complexidade;

c) a resistência de algumas Secretarias Estaduais de Saúde em avançar com o processo

de microregionalização da atenção à saúde acatando, apenas, uma perspectiva

limitada de expansão da Atenção Básica (focalização);

d) a baixa capacidade gerencial e operacional de um número significativo de

secretarias municipais de saúde;

Como se pode perceber, os “nós críticos” essenciais a serem desatados, na prática político-

institucional, dizem respeito ao Financiamento e ao desenvolvimento de pessoal, através

das ações de formação, capacitação e educação permanente dos profissionais e

trabalhadores de saúde. De fato, as opções em termos dos critérios de distribuição e

utilização de recursos financeiros pelos diversos níveis de gesto do sistema e pelos diversos

níveis de organização dos serviços, podem atuar como constrangimentos ou mecanismos

indutores de mudanças no modelo de atenção. Do mesmo modo, as políticas de formação e

capacitação de pessoal podem contribuir ou restringir as possibilidades de mudança das

práticas de saúde, daí sua importância crucial nessa conjuntura.

A análise da direcionalidade da política de financiamento e de educação permanente dos

profissionais de saúde, portanto, é imprescindível para a compreensão dos rumos que

tomará o processo de mudança do modelo de atenção à saúde no SUS. Mais que isso,

entretanto, a possibilidade de se incidir nessa direcionalidade, tendo em vista o

fortalecimento de um processo de mudança que conduza efetivamente à universalização e

integralidade da atenção, exige a construção de alianças estratégicas entre os gestores do

SUS interessados nesse processo, os profissionais de saúde e a população usuária.

Nesse sentido, algumas questões merecem um aprofundamento, como, por exemplo, a

proposta de expansão da estratégia de Saúde da Família aos municípios de mais de 100 mil

habitantes. Cabe problematizar a pertinência de se implementar essa estratégia da mesma

forma como vem sendo implementada nos pequenos e médios municípios, por duas simples

razões: a) nos grandes centros, a Saúde da Família passa a competir, de fato, com o modelo

médico-assistencial hegemônico, enfrentando a resistência de vários atores implicados na

reprodução desse modelo, inclusive os profissionais de saúde; b) por isso mesmo, a Saúde

da Família, tal como vem sendo implementada, encontra resistência na própria população

usuária, habituada a consumir serviços especializados, mesmo ao nível da atenção básica.

Por conta disso, há que se pensar na flexibilização da proposta, de forma a não se perder de

vista a possibilidade de legitimá-la junto à população, ator central na construção da

viabilidade da mudança do modelo.

Na mesma linha, há que se ter bastante cuidado com a implementação das propostas de

desenvolvimento de pessoal de saúde, seguramente o aspecto mais delicado na sustentação

do processo de mudança das práticas. A experiência acumulada pelos Pólos de Capacitação

em Saúde da Família revela que os profissionais de saúde, até mesmo os médicos, podem

vir a se constituir em potentes aliados do processo, desde quando sejam contemplados

interesses econômico-financeiros e técnico-científicos, para além do compromisso político

e ético que pode vir a ser construído coletivamente no âmbito do processo de formação e

educação permanente.

Enfim, para concluir, quero relembrar a observação precisa da professora Maria Cecília

Donnangelo, em 1979, chamando a atenção para que a reforma “se fará com a população

ou não se fará”, a lembrar-nos que o sentido maior de todo o esforço desencadeado no

âmbito jurídico-normativo, político-institucional e principalmente, na “ponta do sistema”,

para a mudança na organização e no conteúdo das práticas de saúde, é a escuta e a resposta

aos problemas e necessidades sociais de saúde da população, e que é através desse processo

que podemos contribuir para a redução das desigualdades, para a melhoria das condições de

vida e o alcance de um patamar digno de saúde e bem-estar coletivos.

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