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Doença de Chagas 282 Secretaria de Vigilância em Saúde / MS D O EN Ç A D E C HAGAS C ID 1 0 : B 5 7 C a r a c t e r ís t ic a s c lín icas e ep id e m io ló g ica s D e s c r iç ã o Doença infecciosa,causada por protozooário agelado,de curso clínico crônico,que se caracteriza por fase inicial aguda,com sinais ou sintomas quase sempre inespecí cos, quando presentes, e que pode evoluir para a fase crônica, com com prom etim ento cardíaco (cardiopatia chagásica) ou digestivo (m egaesôfago e m egacólon). O utras m anifestações clí- nicas são bastante raras,com o a m eningoencefalite chagásica. A g en te etio ló g ic o É o Trypanosoma cruzi, protozoário agelado da ordem K inetoplastida, fam ília Trypa- nosamatidae , caracterizado pela presença de um agelo e um a única m itocondria. N o san- gue dos vertebrados,o Trypanosoma cruzi se apresenta sob a forma de trypomastigota e, nos tecidos,com o am astigotas.N os invertebrados (insetos vetores) ocorre um ciclo com a transformação dos tripomastigotas sangüíneos em epimastigotas,que depois se diferen- ciam em trypom astigotas m etacíclicos, que são as form as infectantes acum uladas nas fezes do inseto. R e s e r v a t ó r io A lém do hom em ,m am íferos dom ésticos e silvestres têm sido naturalm ente encon- trados infectados pelo Trypanosoma cruzi, tais como gato, cão, porco dom éstico, rato dom éstico,m acaco de cheiro,sagüi,tatu,gam bá,cuíca,m orcego,dentre outros.O s m ais im portantes são aqueles que coabitam ou estão m uito próxim os do hom em , com o o cão, o rato,o gam bá,o tatu e até m esm o o porco dom éstico,encontrado associado com espécies silvestres na A m azônia. A s aves e anim ais de “sangue frio” (lagartos, sapos, outros) são refratários à infecção. Vetores Das mais de 120 espécies conhecidas,48 foram identi cadas no B rasil,das quais 30 já capturadas no am biente dom iciliar. Dessas, cinco têm especialim portância na transm issão da doença ao hom em . Por ordem de im portância: Triatoma infestans, T. brasiliensis, Pans- trongylus megistus,T. pseudomaculata e T. sordida.O utros,com o T. rubrovaria,no Rio G rande do Sul,e R hodnius neglectus,em G oiás,com a eliminação do T.infestans,vêm co- lonizando a habitação e tendem a assum ir, tam bém , algum papel na transm issão dom iciliar da doença de Chagas.O utras espécies,por razões diversas,devem ser consideradas.Entre essas,deve-se fazer referência ao T.vitticeps,pelas altas taxas de infecção natural(Espírito Santo, Rio G rande do Sule M inas G erais), R .nasatus, pela freqüência com que é capturado,

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Doença de Chagas

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D O E N Ç A D E C H A G A SC ID 1 0 : B 5 7

C a r a c t e r ís t ic a s c lín ic a s e e p id e m io ló g ic a s

D e s c r iç ã oDoença infecciosa, causada por protozooário � agelado, de curso clínico crônico, que

se caracteriza por fase inicial aguda, com sinais ou sintom as quase sem pre inespecí� cos,

quando presentes, e que pode evoluir para a fase crônica, com com prom etim ento cardíaco

(cardiopatia chagásica) ou digestivo (m egaesôfago e m egacólon). O utras m anifestações clí-

nicas são bastante raras, com o a m eningoencefalite chagásica.

A g e n t e e t io ló g ic oÉ o Trypanosoma cruzi, protozoário � agelado da ordem K inetoplastida, fam ília Trypa-

nosamatidae, caracterizado pela presença de um � agelo e um a única m itocondria. N o san-

gue dos vertebrados, o Trypanosoma cruzi se apresenta sob a form a de trypom astigota e,

nos tecidos, com o am astigotas. N os invertebrados (insetos vetores) ocorre um ciclo com

a transform ação dos tripom astigotas sangüíneos em epim astigotas, que depois se diferen-

ciam em trypom astigotas m etacíclicos, que são as form as infectantes acum uladas nas fezes

do inseto.

R e s e r v a t ó r ioA lém do hom em , m am íferos dom ésticos e silvestres têm sido naturalm ente encon-

trados infectados pelo Trypanosoma cruzi, tais com o gato, cão, porco dom éstico, rato

dom éstico, m acaco de cheiro, sagüi, tatu, gam bá, cuíca, m orcego, dentre outros. O s m ais

im portantes são aqueles que coabitam ou estão m uito próxim os do hom em , com o o cão, o

rato, o gam bá, o tatu e até m esm o o porco dom éstico, encontrado associado com espécies

silvestres na A m azônia. A s aves e anim ais de “sangue frio” (lagartos, sapos, outros) são

refratários à infecção.

V e t o r e s Das m ais de 120 espécies conhecidas, 48 foram identi� cadas no Brasil, das quais 30 já

capturadas no am biente dom iciliar. Dessas, cinco têm especial im portância na transm issão

da doença ao hom em . Por ordem de im portância: Triatoma infestans, T. brasiliensis, Pans-

trongylus megistus, T. pseudomaculata e T. sordida. O utros, com o T. rubrovaria, no R io

G rande do Sul, e Rhodnius neglectus, em G oiás, com a elim inação do T. infestans, vêm co-

lonizando a habitação e tendem a assum ir, tam bém , algum papel na transm issão dom iciliar

da doença de Chagas. O utras espécies, por razões diversas, devem ser consideradas. Entre

essas, deve-se fazer referência ao T. vitticeps, pelas altas taxas de infecção natural (Espírito

Santo, R io G rande do Sul e M inas G erais), R.nasatus, pela freqüência com que é capturado,

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em áreas localizadas (CE e RN), e R. prolixus, pelo fato de ser a principal espécie em alguns

países (Colômbia, V enezuela) e por ter sido identi� cado em focos naturais (macaubeiras),

no estado do T ocantins. Na Amazônia, as espécies mais importantes são R. pictipes, R.

robustus, P. geniculatus, P. lignarius e T. maculata. Ainda, podemos citar R. prolixus nas

Guianas e Suriname, R. prolixus, T. dimidiata e R. pallescens na América Central e T. bar-

beri, T. dimidiata e T. phyllosoma no México.

M odo de transmissão A transmissão natural, ou primária, da doença de Chagas é a vetorial, que ocorre atra-

vés das fezes dos triatomíneos, também conhecidos como “barbeiros” ou “chupões”. Esses, ao picar os vertebrados, em geral defecam após o repasto, eliminando formas infectantes de trypomastigotas metacíclicos, presentes em suas fezes, e que penetram pelo orifício da picada ou por solução de continuidade deixada pelo ato de coçar.

A eliminação do T. infestans, espécie estritamente domiciliar, e a diminuição da den-sidade triatomínica domiciliar, por outras espécies de triatomíneos, reduziu signi� cativa-mente a transmissão vetorial que, na década de 70, se estimava ser responsável por 80% das infecções humanas. A transmissão transfusional ganhou grande importância epide-miológica nas duas últimas décadas, em função da migração de indivíduos infectados para os centros urbanos e da ine� ciência no controle das transfusões, nos bancos de sangue. A transmissão congênita ocorre, mas muitos dos conceptos têm morte prematura, não se sabendo, com precisão, qual a in� uência dessa forma de transmissão na manutenção da endemia. Ocorrem ainda a transmissão acidental em laboratório e a transmissão pelo leite materno, ambas de pouca signi� cância epidemiológica. Sugere-se a hipótese de transmis-são, por via oral, em alguns surtos episódicos. Recentemente, foram relatados no Paraná casos da doença de Chagas na forma aguda, conseqüentes à transmissão por via oral após

ingestão de caldo de cana contaminado com fezes de barbeiros.

P eríodo de incu b ação Q uando existe sintomatologia, na fase aguda, esta costuma aparecer 5 a 14 dias após a

picada do inseto vetor. Q uando adquirida por transfusão de sangue, o período de incuba-

ção varia de 30 a 40 dias. Em geral, as formas crônicas da doença se manifestam mais de 10

anos após a infecção inicial.

P eríodo de transmissib ilidadeA infecção só passa de pessoa a pessoa através do sangue ou placenta. A maioria dos

indivíduos com infecção pelo T. cruzi alberga o parasito nos tecidos e sangue, durante toda

a vida, o que signi� ca que devem ser excluídos das doações de sangue e de órgãos.

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Aspectos clínicos e laboratoriais

Manifestaçõ es clínicas A doença de Chagas apresenta distintas formas clínicas, podendo ser classi� cada da

seguinte maneira:

F orma aguda

Aparente

Inaparente

F orma crô nica

Indeterminada

Cardíaca

• Síndrome de arritmias

• Síndrome de insu� ciência cardíaca

• Síndrome tromboembólica

Digestiva

• Síndrome de megaesôfago

• Síndrome de megacólon

Forma mista

Outros megas

Forma nervosa

F orma congê nita

Dentre estas destacam-se, por sua importância epidemiológica, as formas agudas (in-

dício de transmissão ativa), indeterminadas (mais freqüentes), cardíacas e digestiva (gra-

vidade clínica). Estima-se que as formas agudas aparentes se manifestam em 3% dos casos,

em área endêmica; as formas indeterminadas, em 50%; as formas cardíacas, em 30% e as

digestivas em 7% a 8%.

F ase aguda

Quando aparente, corresponde aos fenômenos clínicos que se estabelecem nos pri-

meiros dias ou meses da infecção inicial, sendo diagnosticada pelo encontro do parasito no

sangue periférico. É caracterizada por uma miocardite, na maioria das vezes, só traduzível

eletrocardiogra� camente. As manifestações gerais são de febre (pouco elevada), mal-estar

geral, cefaléia, astenia, hiporexia, edema, hipertro� a de linfonodos. Freqüentemente, ocor-

re hepatoesplenomegalia. À s vezes, agrava-se numa forma meningoencefálica, principal-

mente nos primeiros meses ou anos de vida.

Quando existe porta de entrada aparente, ela pode ser ocular (sinal de Romaña) ou

cutânea (chagoma de inoculação). O sinal de Romaña é um edema bipalpebral (que, às

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vezes, se expande à face), elástico indolor, de início geralmente brusco, coloração róseo-

violácea das pálpebras, congestão conjuntival, enfartamento dos linfonodos satélites (pré-

auriculares, parotídeos ou submaxilares) e, com menos freqüência, secreção conjuntival e

dacrioadenite. O chagoma de inoculação é uma formação cutânea, ligeiramente saliente,

arredondada, eritematosa, dura, incolor, quente e circundada por edema elástico, asseme-

lhando-se a um furúnculo que não supura mas que às vezes pode exulcerar. É acompanha-

do de linfonodos satélites.

As alterações eletrocardiográ� cas estão na dependência do maior ou menor acome-

timento do coração, e as principais são: alargamento do espaço PR, alterações primárias

de onda T (baixa voltagem, bifasismo ou inversão), extra-sístoles ventriculares. Em casos

muito graves: bloqueio intraventricular (BRD) e desnivelamento de S-T com alterações de

T. Em geral, as alterações eletrocardiográ� cas são reversíveis, passada essa fase da doença.

Os exames de raios X de tórax pode mostrar imagem cardíaca discretamente aumen-

tada, logo no início do diagnóstico; achado que pode ser observado apenas após alguns

dias de doença.

Fase crônica

Forma indeterminada – passada a fase aguda aparente ou inaparente, o indivíduo

alberga uma infecção assintomática que pode nunca se manifestar ou se expressar clinica-

mente anos ou décadas mais tarde, em uma das formas crônicas.

Forma cardíaca – é a mais importante forma de limitação ao doente chagásico e a prin-

cipal causa de morte. Pode apresentar-se sem sintomatologia, mas com alterações eletrocar-

diográ� cas (principalmente bloqueio completo de ramo direito), como uma síndrome de

insu� ciência cardíaca progressiva, insu� ciência cardíaca fulminante ou com arritmias gra-

ves e morte súbita. Seus sinais e sintomas são: palpitação, dispnéia, edema, dor precordial,

dispnéia paroxística noturna, tosse, tonturas, desmaios, acidentes embólicos, extra-sistolias,

desdobramento de segunda bulha, sopro sistólico, hipofonese de segunda bulha.

As principais alterações eletrocardiográ� cas são: bloqueio completo do ramo direito

(BCRD), hemibloqueio anterior esquerdo (H BAE), bloqueio AV do primeiro, segundo e

terceiro graus, extra-sístoles ventriculares, sobrecarga de cavidades cardíacas, alterações da

repolarização ventricular, dentre outras.

Os raios X de tórax revelam cardiomegalia global discreta, moderada ou acentuada,

aumento isolado do ventrículo esquerdo, aumento biventricular, congestão vascular pul-

monar, etc.

Forma digestiva – caracteriza-se por alterações ao longo do trato digestivo, ocasio-

nadas por lesões dos plexos nervosos (destruição neuronal simpática), com conseqüentes

alterações da motilidade e de morfologia, ao nível do trato digestivo, sendo o megaesôfago

e o megacólon as manifestações mais comuns. São sinais e sintomas do megaesôfago: disfa-

gia (sintoma mais freqüente e dominante), regurgitação, epigastralgia ou dor retroesternal,

odinofagia (dor à deglutição), soluço, ptialismo (excesso de salivação), emagrecimento (po-

dendo chegar à caquexia), hipertro� a das parótidas. O megacólon se caracteriza por consti-

pação intestinal (instalação lenta e insidiosa), meteorismo, distensão abdominal, fecaloma.

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Os exames radiológicos são importantes no diagnóstico da forma digestiva. No caso

do megaesôfago há 4 grupos de alterações que vão desde uma simples di� culdade de seu

esvaziamento até as dolicomegaesôfago, que correspondem àqueles com grande volume,

alongado, atônico, dobrando-se sobre a cúpula diafragmática, produzindo sombra para-

cardíaca direita ao simples exame de tórax. O megacólon é classi� cado em três grupos, de

acordo com a capacidade de exoneração do meio de contraste, quando se realiza o enema

opaco.

Forma mista – o paciente pode ter associação da forma cardíaca com a digestiva e

também apresentar mais de um mega.

Forma nervosa e de outros megas – apesar de aventadas, não parecem ser manifesta-

ções importantes destas infecções.

Forma congênita – sobressaem, dentre os sinais clínicos, a hepatomegalia e esple-

nomegalia, presentes em todos os casos, icterícia, equimoses e convulsões decorrentes da

hipoglicemia. Não há relato de ocorrência de febre.

Diagnóstico clínico-epidemiológico e/ou laboratorial

Diagnóstico diferencial

Fase aguda – no que diz respeito às manifestações gerais, deve-se fazer diagnóstico

diferencial com a febre tifóide, leishmaniose visceral, esquistossomose mansônica aguda,

mononucleose infecciosa e toxoplasmose, dentre outras enfermidades febris. O sinal de

Romaña deve ser diferenciado de múltiplas manifestações oculares, a exemplo das conjun-

tivites, edema de Quincke, celulite orbitária, etc. O chagoma de inoculação pode ser con-

fundido com furunculose. A forma meningoencefálica comporta diagnóstico diferencial

com as determinadas por outras etiologias.

Fase crônica – a miocardiopatia chagásica tem que ser diferenciada de muitas outras

cardiopatias. Os dados epidemiológicos, a idade do paciente, os exames sorológicos, eletro-

cardiográ� cos e radiológicos, em geral, permitem a perfeita caracterização dessa entidade

clínica.

Forma digestiva – diferenciar de megas causados por outras etiologias.

Forma congênita – diferenciar da sí� lis e da toxoplasmose.

Diagnóstico laboratorial

Parasitológico – dentre as diversas técnicas, a mais simples é a da microscopia direta

sobre gota fresca de sangue, examinada entre lâmina e lamínula, com ocular 10 e objetiva

40. O exame deve ser minucioso e abarcar toda a lamínula, sendo positivo quando se en-

contra o parasito (geralmente em movimentação serpenteante entre as hemácias e leucóci-

tos) com sua forma alongada, grande cinetoplasto e � agelo muito móvel. Diante da suspeita

clínica, se negativo o primeiro exame, deve-se repeti-lo por três ou quatro vezes ao dia, du-

rante vários dias. Também se pode usar a técnica de gota espessa corada, como empregada

para malária, mas que é bem menos sensível que o exame a fresco. A propósito, não muito

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raramente tem ocorrido o diagnóstico ocasional de doença de Chagas aguda (DCA) pelo

achado do parasito em esfregaços corados para contagem diferencial de leucócitos e em

hemogramas de pacientes febris. Desde os anos 1960, o diagnóstico parasitológico direto

da DCA vem sendo aperfeiçoado com procedimentos de enriquecimento, sendo mais em-

pregadas as técnicas de microhematócrito (centrifugação e exame do creme leucocitário)

e de Strout (centrifugação do soro após retirada do coágulo). Cabe ainda mencionar que a

utilização de técnicas moleculares modernas, como a de PCR, permite detectar com grande

sensibilidade e especi� cidade frações do DNA do parasito. Mesmo podendo ser positivas

também na fase crônica, revelam-se úteis como auxílio diagnóstico de DCA – especialmen-

te nos casos congênitos.

Mé todos imunológicos

Hemaglutinação indireta – a interpretação do resultado varia de acordo com o ponto

de corte determinado pelo fabricante dos kits.

Imuno� uorescência indireta (IFI) – o resultado da imuno� uorescência indireta é

normalmente expresso em diluições são consideradas como positivas reações a partir da

diluição de 1:80.

Ensaio imunoenzimático (Elisa) – consiste na reação de anticorpos presentes nos so-

ros com antígenos solúveis e puri� cados de T. cruzi obtidos a partir de cultura in vitro (ou

antígenos recombinantes de T. cruzi). Esse antígeno é adsorvido em microplacas e os soros

diluídos (controle do teste e das amostras) são adicionados posteriormente. Os anticorpos

especí� cos presentes no soro vão se � xar aos antígenos. A visualização da reação ocorre

quando adicionada uma anti-imunoglobulina marcada com a enzima peroxidase, que se

ligará aos anticorpos especí� cos caso estejam presentes, gerando um produto colorido que

poderá ser medido por espectrofotometria. O resultado considerado sororreagente é aque-

le que apresente o valor da densidade ótica igual ou superior ao ponto de corte (Cut-O� )

do resultado do controle negativo.

As sorologias que detectam IgM (imuno� uorescência e hemaglutinação), também são

utilizadas para diagnóstico da fase aguda; entretanto, só se deve � rmar o diagnóstico de for-

ma aguda com o encontro de parasito no sangue periférico. Na fase crônica, utiliza-se mais

freqüentemente os métodos de detecção de anticorpos circulantes (IgG). Dentre os citados,

os mais utilizados são o Elisa, a imuno� uorescência e a hemaglutinação indireta.

T estes moleculares – reação em cadeia de polimerase – PCR (ampli� cação do DNA

do parasita), ainda não disponível na rede de laboratórios de saúde pública, utilizada apenas

em situações especiais.

T ratamentoTodo indivíduo com infecção chagásica deve ter acesso a um serviço médico capaz de

fazer os diagnósticos clínico, laboratorial e epidemiológico e identificar a fase da doença,

para definição do tratamento adequado, quando necessário. O manejo clínico do paciente

chagásico, particularmente das formas cardíacas, é importante, pois quando bem conduzi-

do e iniciado precocemente pode resultar na elevação da expectativa de sobrevivência.

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Tratamento específi co

Objetiva suprimir a parasitemia e, conseqüentemente, seus efeitos patogênicos ao or-

ganismo. Esse tratamento está indicado na fase aguda da doença, em casos congênitos, na

reativação da parasitemia por imunossupressão (aids e outras doenças imunossupressoras),

transplantado que recebeu órgão de doador infectado, quando a supressão da parasitemia

ou a prevenção do seu aparecimento tem ação bené� ca para os pacientes. Não está indicada

para casos crônicos pois os pacientes não se bene� ciam clinicamente, visto que nesta fase

a parasitemia não tem importância signi� cativa na evolução da doença e, mesmo em altas

doses, não se consegue, com segurança, curas parasitológicas. Está contra-indicado para

gestantes porque, além de não impedir a infecção congênita, as drogas podem causar danos

ao concepto.

Esquema terapêutico: benznidazol – 8mg/kg/dia, em duas tomadas diárias, durante

60 dias.

Efeitos colaterais: cefaléias, tonturas, anorexia, perda de peso, dermatites, lassidão,

depleção das células da série vermelha.

Tratamento sintomá tico

Formas cardíacas – o manejo da cardiopatia chagásica exige um conhecimento espe-

cí� co das respostas que as drogas utilizadas na prática cardiológica apresentam neste tipo

de doente. Vale ressaltar que o início precoce e o tratamento bem conduzido bene� ciam

signi� cativamente o prognóstico de muitos pacientes, podendo aumentar a sobrevivência

e melhorar a sua qualidade de vida, permitindo o desenvolvimento das atividades habituais

desde que não impliquem em grandes esforços físicos. As drogas utilizadas são as mesmas

que se usam em outras cardiopatias: cardiotônicos, diuréticos, antiarrítmicos, vasodilata-

dores, etc. Em alguns casos, indica-se a implantação de marca-passo, com resultados bas-

tante satisfatórios na prevenção da morte súbita.

Formas digestivas – dependendo do estágio em que a doença é diagnosticada, indica-se

medidas mais conservadoras (uso de dietas, laxativos ou lavagens). Em estágios mais avança-

dos, impõe-se a dilatação ou correção cirúrgica do órgão afetado.

Aspectos epidemiológicos

A doença de Chagas, primitivamente uma zoonose, passou a constituir problema de

patologia humana, ou seja, uma antropozoonose, a partir da domiciliação dos vetores, des-

locados de seus ecótopos silvestres originais pela ação do homem sobre o ambiente.

A transmissão natural ocorre pela contaminação da pele ou mucosas e pelas fezes dos

vetores – insetos hematófagos estritos, da família Triatominae (Hemiptera: Reduviidae),

conhecidos genericamente por triatomíneos e, vulgarmente, por barbeiro, chupão, fincão,

procotó – com formas infectantes de T. cruzi. Os mecanismos secundários de transmissão

são por via transfusional sangüínea, materno-infantil (transplacentária ou por aleitamen-

to), por via oral, transplante de órgãos e transmissão acidental, mais freqüente pela manipu-

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lação de material contaminado em laboratório. Entre essas outras “possibilidades” de veicu-

lação da doença, tem especial importância epidemiológica a transmissão por transfusão de

sangue, que pode levar a doença para áreas sem transmissão natural, inclusive para grandes

centros populacionais, e a transmissão congênita, que pode representar o risco mais dura-

douro de produção de novos casos e de manutenção da endemia chagásica.

A distribuição espacial da doença, limitada ao continente americano – por isso é tam-

bém chamada de tripanosomíase americana – depende da distribuição dos vetores e, além

disso, da distribuição da pobreza e das condições por ela geradas, que determinam o con-

vívio do homem com o vetor, no ambiente domiciliar. A casa mal construída, mal acabada

ou mal conservada e a desinformação são algumas dessas condições, expressão da precária

situação de sobrevivência das populações sob risco. Então, em acréscimo aos determinantes

de natureza biológica ou ecológica, aqueles de natureza econômica e social estão na origem

da produção da doença de Chagas.

Vigilâ ncia epidemiológica

Objetivos• Manter erradicado o Triatoma infestans e sob controle as outras espécies importan-

tes na transmissão humana.

• Investigação epidemiológica de casos agudos, de transmissão vetorial, transfusional

ou transplacentária, visando a adoção de medidas de controle adequadas.

• Monitoramento da presença do vetor nos domicílios (vigilância entomológica).

• Monitoramento da infecção na população humana, através de inquéritos sorológi-

cos periódicos.

Defi nição de casoForma aguda

Suspeito

Todo paciente residente em área caracterizada como provável de estar infestada por

triatomíneo e que apresente sinal de Romaña ou chagoma de inoculação.

Todo paciente residente em área de transmissão ativa da doença e que apresente febre

com mais de uma semana de duração.

Todo paciente, com febre, que tenha sido submetido à transfusão de sangue ou hemo-

derivados sem o devido controle de qualidade.

Todo paciente com clínica sugestiva e com exame parasitológico direto negativo ou

não realizado.

Confi rmado

Todo caso suspeito com:

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• parasitológico direto positivo com ou sem sintomas;

• achados necroscópicos positivos.

Confi rmado de formas crônicas

Indeterminada – indivíduo que apresente duas ou mais sorologias positivas, ou xeno-

diagnóstico positivo, para T. cruzi, sem manifestações clínicas.

C ardíaca – indivíduo que apresente duas ou mais sorologias positivas e/ ou xenodiag-

nóstico positivo para T. cruzi, com manifestações clínicas de miocardiopatia chagásica.

D igestiva – indivíduo com duas ou mais sorologias positivas e/ou xenodiagnóstico

positivo para T. cruzi, que apresente algum tipo de mega.

M ista – indivíduo com duas ou mais sorologias positivas e/ou xenodiagnóstico positi-

vo para T. cruzi, que apresente algum tipo de mega e manifestações de miocardiopatia.

C ongênita – recém-nascido, � lho de mãe chagásica, com hepatoesplenomegalia, pa-

rasito no sangue periférico e/ou reações sorológicas que detectam IgM positivas.

Notifi cação Todos os casos agudos, independente da forma de transmissão devem ser noti� cados

e investigados imediatamente, mediante instrumentos do Sinan.

As principais fontes de conhecimento de casos são:

• laboratórios, através de quaisquer exames hemoscópicos para diagnóstico parasito-

lógico;

• serviços de hemoterapia, pelo diagnóstico sorológico na triagem de doadores de

sangue;

• serviços de assistência médica ambulatorial e hospitalar;

• inquéritos sorológicos;

• declaração de óbito.

No atual estágio avançado de controle alcançado pelo país, a investigação de casos

agudos da doença de Chagas, que venham a ser conhecidos, torna-se indispensável para

determinar a origem e o mecanismo de transmissão. Sendo o caso resultante de transmis-

são vetorial, impõe-se uma investigação entomológica que forneça dados sobre a espécie

de vetor envolvida e extensão do foco de infestação domiciliar. U ma vez con� rmado que a

transmissão ocorreu por via transfusional, deve ser identi� cado o serviço de hemoterapia

que forneceu o sangue, com o objetivo de evitar a ocorrência de novos casos.

A investigação de surtos, acontecimento raro em doença de Chagas, é impositiva para

determinar a fonte comum de infecção, quase sempre alimento contaminado por fezes de

triatomíneos.

Os casos crônicos não são de noti� cação compulsória.

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Doença de Chagas

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Primeiras medidas a serem adotadas frente a um caso agudo

Assistência médica ao paciente

Todo caso suspeito de forma aguda da doença de Chagas deve ser internado, visando

instituir tratamento específico.

Q ualidade da assistência médica

A evolução clínica da forma aguda da doença de Chagas é muito variada, podendo ser

benigna ou apresentar manifestações de cardiopatia e meningoencefalite, razão pela qual se

indica internamento, se possível em hospitais de referência. Por outro lado, o tratamento

especí� co necessita de acompanhamento, devido aos efeitos colaterais e monitoramento

da parasitemia.

Proteção da população

Se a transmissão ocorreu por via transfusional, solicitar à vigilância sanitária inspeção

da instituição responsável e adoção das medidas pertinentes. Em caso de transmissão ve-

torial, realizar imediatamente pesquisa entomológica no domicílio e área de residência do

caso, visando a adoção das medidas de controle da população de triatomíneos.

Confi rmação diagnóstica

A doença de Chagas só é con� rmada mediante exame laboratorial, o que impõe que

os pro� ssionais dos serviços de vigilância veri� quem se foram providenciados a coleta e o

envio de material, conforme detalhado no Anexo I. Como a investigação só está indicada

para casos agudos, os exames de eleição são pesquisa de T. cruzi em sangue periférico e

sorologia para detecção de IgM.

Investigação

A inespeci� cidade dos sinais e sintomas, quando presente, na fase aguda da doença de

Chagas faz pouco freqüente a suspeita clínica. Não obstante, para que medidas de controle

sejam tomadas com oportunidade, a detecção e investigação de casos agudos pela vigilância

epidemiológica são importantes, seja por transmissão vetorial como transfusional, para a

adoção de medidas de controle.

Roteiro da investigaçãoepidemiológica de doença de Ch agas aguda

Identifi cação do paciente

Preencher todos os campos da � cha de investigação epidemiológica do Sinan, relati-

vos aos dados gerais, noti� cação individual e dados de residência.

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Coleta de dados clínicos e epidemiológicos

Para con� rmação da suspeita diagnóstica

Anotar na � cha de investigação os dados da história e manifestações clínicas.

Como, em geral, as suspeitas de doença de Chagas aguda se referem a casos com ma-

nifestações clínicas e os doentes são hospitalizados, deve-se consultar o prontuário e en-

trevistar o médico assistente para anotar as informações clínicas sobre o paciente, as quais

servirão para de� nir se o quadro apresentado é compatível com a doença.

Sugere-se que se faça cópia da anamnese, exame físico e da evolução do doente, com

vistas ao enriquecimento das análises e também para que possam servir como instrumento

de aprendizagem dos pro� ssionais do nível local.

Acompanhar a evolução dos pacientes e os resultados dos exames laboratoriais espe-

cí� cos.

Para identi� cação da forma de transmissão

Relato do paciente, ou familiares, de estadia ou residência em área de provável existên-

cia de triatomíneos, ou do indivíduo ser submetido à transfusão de sangue, nos 30 dias que

antecederam o início dos sintomas, orienta quanto à suspeita da forma de transmissão.

Para identi� cação e delimitação da área de transmissão, quando se tratar

de transmissão vetorial

Veri� car se o local de residência corresponde a uma área de provável infestação de

triatomíneos transmissores da doença. Caso o paciente não resida em área de provável

transmissão, veri� car seus deslocamentos para caracterizar se houve permanência em local

com esta característica.

Lembrar que a identi� cação da área onde se deu a transmissão é de fundamental im-

portância para nortear a continuidade do processo de investigação.

Observe-se que, mesmo em áreas onde o Programa de Controle da Doença de Chagas

já tenha eliminado o vetor, pode-se ter transmissão eventual pelo aparecimento de triato-

míneos que surgem nos domicílios vindos de matas próximas, mesmo que não se encontre

indício de colonização no intra ou peridomicílio.

Para determinação da extensão da área de transmissão

Captura e identi� cação de triatomíneos: fazer pesquisa de triatomíneos em 100% dos

domicílios da área, visando delimitar qual o raio de transmissão ativa. Identi� car as espé-

cies e adotar as medidas de rociamento indicadas.

Coleta e remessa de material para ex ames

Logo após a suspeita clínica de doença de Chagas, coletar material do caso e de outros

suspeitos que forem encontrados durante a busca ativa, encaminhando para exame, de

acordo com as normas técnicas apresentadas no Anexo 1.

Encaminhar, para exame do conteúdo gastrointestinal, alguns espécimes de triatomí-

neos capturados.

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Deve-se aguardar os resultados dos exames para iniciar o tratamento especí� co do

paciente. Só devem ser submetidos à terapêuticos, doentes com diagnóstico con� r-

mado, devido à toxicidade das drogas.

Inspeção em unidades de hemoterapia

Na suspeita de transmissão transfusional, notificar imediatamente ao órgão de vigi-

lância sanitária e acompanhar os resultados das inspeções e medidas adotadas.

Análise de dados e relatório fi nal

Em geral, os casos agudos diagnosticados ocorrem de forma isolada e a análise se res-

tringe à conclusão do diagnóstico, tratamento adotado e encerramento do caso. Importante

registrar, no relatório, as medidas de controle adotadas tanto pela vigilância epidemiológica

como sanitária, quando pertinente.

Vigilância entomológica A presença de focos silvestres nos quais o T. cruzi se mantém em circulação, entre

animais hospedeiros, veiculada por diversas espécies de triatomíneos, determina a neces-

sidade de uma vigilância entomológica de caráter permanente para se manter a doença de

Chagas sob controle.

Cabe aqui caracterizar, ao menos, quatro diferentes situações, em função do compor-

tamento das espécies de triatomíneos presentes e da pressão de infestação ou reinfestação

existente na área sob vigilância:

• presença exclusiva de espécie de triatomíneo, completamente domiciliada;

• presença de triatomíneo, estritamente domiciliado, e de espécies nativas, sem co-

nhecida capacidade de invasão de ecótopos arti� ciais;

• presença de triatomíneo, estritamente domiciliado, e de espécies nativas, com co-

nhecida capacidade invasiva de ecótopos arti� ciais;

• presença de espécies nativas, presentes em ecótopos arti� ciais e naturais.

Além disso, outras variáveis devem ser consideradas:

• a existência ou não de localidades próximas com infestação domiciliar;

• a densidade das populações silvestres de triatomíneos, de ecótopos naturais existen-

tes, sua proximidade das casas e a relação que com eles tem a população humana;

• mudanças que venham a se processar, ou estejam se processando, no ambiente na-

tural, pela ação do homem.

O conhecimento e análise de todo esse conjunto de condições vão implicar a de� nição

do tipo e extensão da vigilância a ser exercida.

Para uma situação, por exemplo, onde se observa a presença exclusiva de uma espécie

de vetor introduzida – T. rubrofasciata, em área urbana –, uma vez eliminado o vetor não

há, ao menos teoricamente, qualquer possibilidade de reinfestação das casas e a vigilância

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entomológica seria dispensável. Por outro lado, quando presentes espécies nativas com

reconhecido potencial de domiciliação, em alta densidade, em grande número de ecótopos

silvestres próximos às casas, e com os quais a população mantém estreita relação, a vigilân-

cia entomológica deve ser a mais atenta possível.

Inq uéritos sorológicosInquéritos sorológicos para determinação da infecção no homem, como parte da

vigilância epidemiológica, servem ao monitoramento da situação e ao esclarecimento de

questões, ou acontecimentos, em que importa determinar o grau de risco de transmissão,

tais como: infestação peridomiciliar, por diferentes espécies de vetor; infestação intrado-

miciliar residual, com baixa densidade populacional de triatomíneos, e infestação intra-

domicilar recente, por espécies de vetor de hábitos até então silvestres.

Além disso, inquéritos sorológicos podem estar indicados para a detecção de outros ca-

sos, a partir do conhecimento de caso agudo ou da infecção em triatomíneos domiciliados.

Instrumentos disponíveis para controle

Não se dispõe de vacina que permita a proteção de susceptíveis. Não se pode preten-

der o esgotamento das fontes de infecção desde que as drogas existentes são comprova-

damente e� cazes apenas nos casos de infecção recente, e também porque são muitos os

reservatórios animais de T. cruzi. Então, por limites determinados pela tecnologia disponí-

vel, ou por particularidades da própria epidemiologia da doença de Chagas, todo controle

da transmissão natural depende da intervenção sobre o vetor; enquanto que a transmissão

transfusional, do controle de qualidade do sangue transfundido.

Controle vetorialControle químico – a outra forma é pelo emprego, regular e sistemático, de inseti-

cidas de ação residual nas habitações sabidamente infestadas por triatomíneos. Portanto,

faz-se necessária a realização de pesquisa entomológica antes de se iniciar o rociamento

das habitações.

Os objetivos do controle químico variam de acordo com as espécies e o estágio de

domiciliação do vetor. Se a espécie é estritamente domiciliar, o objetivo é sua completa

eliminação, como é o caso do T. infestans, cuja proposta hoje é a de eliminá-lo em todos

os países que compõem o Cone Sul. No caso do Panstrongylus megistus, T. brasiliensis,

T.pseudomaculata, e T. sordida, o controle a ser alcançado é a manutenção dos intradomi-

cílios livres de colônias, visto que a existência de focos silvestres possibilita a reinfestação

das habitações. Com relação às outras espécies existentes, o objetivo é prevenir a coloniza-

ção dos domicílios, através de rigorosa vigilância entomológica.

Melhoria ou substituição de habitações – a transmissão vetorial pode ser controlada

através da melhoria ou substituição de habitações de má qualidade, que propiciam a domi-

ciliação e permanência dos triatomíneos no habitat humano (casas de pau a pique, de sopa-

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po, de adobe sem reboco, etc.), por casas de paredes rebocadas, sem frestas, que di� cultem

a colonização dos vetores. Prioriza-se a melhoria de habitações onde se encontram espécies

nativas, presentes, em alta densidade, em ecótopos naturais, em especial o T. brasiliensis e

o T.pseudomaculata.

Controle biológico – o uso de inibidores do crescimento, feromônios, microrganis-

mos patógenos e esterilização induzida está sendo estudado, mas a utilização sistemática

desses métodos ainda não é, até aqui, aplicável na prática.

Controle da transmissão transfusional Basicamente, consiste na � scalização das unidades de hemoterapia, para que se faça o

controle de qualidade do sangue a ser transfundido através da triagem sorológica de todos

os doadores de sangue com, pelo menos, duas técnicas de alta sensibilidade. Esta triagem

deve ser feita não só para a doença de Chagas como para todas as outras doenças transmi-

tidas pelo sangue (aids, sí� lis, malária em áreas endêmicas e hepatites virais).

Outra forma indicada, mas que não tem tido boa aceitação, por modi� car a coloração

do sangue, é a de se adicionar violeta de genciana, na concentração de 1:4.000, no sangue,

24 horas antes deste ser transfundido, visto que este produto elimina os parasitos.

Controle de outras formas de transmissão A transmissão em laboratório deve ser prevenida através de rigoroso uso das normas

de biossegurança. A transmissão pelo leite materno, apesar de descrita na década de 30,

não tem sido diagnosticada e, possivelmente, não tem muito signi� cado epidemiológico.

Não existe forma de prevenção da forma congênita.

Ações de educação em saú de A prevenção e controle de doenças implica na adoção de medidas efetivas, entre as

quais ressaltam as ações educativas. Todo esse processo requer a participação ativa da po-

pulação, de modo a permitir a apropriação de conhecimentos visando a transformação da

realidade socio sanitária.

Em relação à doença de Chagas, a população e os serviços de saúde devem participar

de discussões sobre formas de prevenção, tratamento e controle, inclusive sobre mecanis-

mos que facilitem o acesso às informações, e o entendimento sobre as relações sociais de

convivência, com fatores predisponentes e facilitadores para a instalação de doenças.

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A n e x o 1

C o le t a e c o n s e r v a ç ã o d e m a t e r ia lp a r a d ia g n ó s t ic o d a d o e n ç a d e C h a g a s

T ip o d e d ia g n ó s t ic o

T ip o d e m a t e r ia l

Q u a n t id a d eN º d e

a m o s t r a sM é t o d o

P e r ío d od a c o le t a

R e c ip ie n t eA r m a z e n a m e n t o /

c o n s e r v a ç ã oT r a n s p o r t e

So ro ló gico Sangu e

5 -10 ml

(mínimo 2

ml de s o ro )

1

Imu no fl u o

res cê ncia

Indireta/IF I

H emaglu tina-

ç ã o indireta

(H A I) o u E lis a

F as e agu da

(IgM)

F as e crô nica

(IgG , Ig

to tal)

T u b o de

v idro o u de

p lá s tico es té ril

e co m tamp a

(melh o r s e

E p endo rf® )

Sangu e to tal:

2 º C a 8 º C

So ro :

-2 0 º C

G elo s eco

o u reciclá v el

N itro gê nio

líq u ido

P aras ito -

ló gicoSangu e

2 go tas 1

G o ta es p es s a

o u es fregaç o

fi no

F as e agu da

D u as lâminas

p ara es fre-

gaç o

E x ame a fresco

é mais efi ciente

P ara s ecagem

es to car em

s u p o rte de

madeira

A p ó s a s eca-

gem, anex ar

e emb ru lh ar

a lâmina

ju nto co m

o p ap el iden-

tifi cató rio

1-5 ml 1

C o ncentraç ã o :

Q B C o u

creme

leu co citá rio

F as e agu da

T u b o de v idro

o u p lá s tico ,

s em tamp a

(melh o r s e

tu b o cap ilar

de micro -

mató crito )

N ã o p recis a,

p o is dev e s er

feito imediata-

mente ap ó s a

co leta

-

Observações:

1. O diagnóstico de infecção crônica (IgG ) deve ser feito por, no m ínim o, duas técnicas

de princípios diferentes, na m esm a am ostra de soro. O diagnóstico sorológico de

form a aguda (IgM ) pode ser feito por exam e único.

2. N os casos de inquérito sorológico (hum anos e de reservatórios), é recom endável

o uso de papel-� ltro com am ostras duplicadas, podendo ser transportadas em dis-

positivo de m adeira para estocar lâm inas, sacos plásticos ou envelope de papel. O

papel-� ltro pode ser estocado em tem peratura am biente com sílica gel e/ou na gela-

deira no m áxim o por 60 dias. A sensibilidade depende da técnica em pregada e oscila

entre 90% -97% .

3. A lâm ina pode ser � xada através do calor (� am bagem ) e corada (pelo m étodo de

G iem sa) para caracterização do Trypanossoma.

4. Deve-se deixar coagular o sangue e retrair-se o coágulo. O s � agelados concentram

no soro, que pode ser centrifugado para se obter m aior concentração.