GUIÃO DO PROCESSO DE CONSULTAS...

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1 GUIÃO DO PROCESSO DE CONSULTAS COMUNITÁRIAS Um instrumento de apoio aos intervenientes no processo de consulta comunitária Samanta T. A. Remane Maputo, Janeiro de 2009

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GUIÃO DO PROCESSO

DE CONSULTAS COMUNITÁRIAS

Um instrumento de apoio aos intervenientes no processo de consulta comunitária

Samanta T. A. Remane

Maputo, Janeiro de 2009

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GUIÃO DO PROCESSO

DE CONSULTAS COMUNITÁRIAS

Um instrumento de apoio aos intervenientes no processo de consulta comunitária

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Centro Terra Viva

Maputo, Janeiro de 200

GUIÃO DO PROCESSO

DE CONSULTAS COMUNITÁRIAS

Um instrumento de apoio aos intervenientes no processo de consulta comunitária

Ficha Técnica

Produção: Dra. Samanta T. A. Remane Revisão: Engo Issufo I. Tankar Fotografias: Lino Manuel e Cristina Louro Coordenação: Dra. Alda Salomão Patrocínio: IIED Impressão: Tiragem: Propriedade: Centro Terra Viva (CTV)

Rua D, 27, Bairro da COOP. Tel 258 21 416131, Fax 258 21 416134

Email: [email protected].

Website: www.ctv.org.mz

Maputo, Janeiro de 2009

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ÍNDICE

Conteúdo Página

I. INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 5 II. PROCESSO DE CONSULTA ................................................................................. 7

1. O Que é uma Consulta Comunitária? ................................................................... 7 2. Qual é o objectivo da consulta? ............................................................................. 8 3. Quando é que uma Consulta Comunitária deve ter lugar? ................................ 8

4. Como se faz a consulta comunitária? ................................................................... 8 4.1 Etapas do Processo de Consulta Comunitária ..................................................... 9

Passo 1. Informação Prévia à Comunidade ................................................................ 9 4.1.1 Objectivo da Informação Previa ........................................................................... 9 4.1.2 Quem deve receber Informação Prévia? ......................................................... 10 4.1.3 Quem deve dar Informação Previa? ................................................................. 11 4.1.4 Que informação deve ser transmitida? ............................................................. 11 4.1.5 Com que antecedência se deve fornecer essa informação prévia? ............ 12 Passo 2. Convocatória para a reunião/ encontro de auscultação .......................... 13

4.2.1 Qual é o objectivo da Convocatória para a reunião da auscultação? ......... 13 4.2.2 O que significa Convocatória para a reunião da auscultação? .................... 13 4.2.3 Como deve ser Convocada a reunião da auscultação? ................................ 13

4.2.4 Quando deve ser convocada a reunião da auscultação? ............................. 14

Passo 3: Reunião/ Encontro de Auscultação ............................................................ 14 4.3.1 Objectivo da reunião de auscultação ................................................................ 14 4.3.2 O que é reunião de auscultação? ...................................................................... 15 4.3.3 Quem é o alvo da reunião de auscultação? .................................................... 15

4.3.4 Quem deve orientar a reunião de auscultação? ............................................. 15

4.3.5 Como é feita a reunião de auscultação? .......................................................... 15 Passo 4. Acta da Consulta ........................................................................................... 16

4.4.1 O que é Acta de consulta? ................................................................................. 16

4.4.2 Qual é o objectivo da acta da consulta? .......................................................... 16 4.4.3 Como é elaborada a acta da consulta? ............................................................ 17 4.4.4 Quem deve assinar a acta da consulta? .......................................................... 17 5. Acções de seguimento ........................................................................................... 17

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS: .......................................................................... 19

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I. INTRODUÇÃO

Na legislação moçambicana, as comunidades locais têm o direito de uso e aproveitamento da terra e de outros recursos naturais, embora todos eles continuem propriedade do Estado. Deste modo, todos os membros da comunidade, homens e mulheres, devem decidir em conjunto como usar as terras que ocupam e os recursos naturais aí existentes segundo as normas e práticas costumeiras que não contrariem a constituição e demais leis.

As pessoas singulares ou colectivas, nacionais ou estrangeiras também podem adquirir o direito de uso e aproveitamento da terra e de exploração dos recursos naturais nela existentes com vista a desenvolver projectos que contribuam para o desenvolvimento local e do país no geral. Por conseguinte, o Estado deve encontrar formas de conciliar o objectivo de promover o desenvolvimento e salvaguardar os direitos das comunidades bem como das pessoas que as integram. Para o efeito, a Legislação estabeleceu uma série de obrigações e procedimentos que devem ser seguidos no processo de atribuição de direitos de uso e aproveitamento da terra ou de outros recursos naturais. Uma das mais importantes exigências legais para a atribuição desse direito é o processo de consulta à comunidade afectada pelo pedido, que deve ser orientado pelo Estado. A consulta é feita para saber se esse pedido deve ou não ser aceite e garantir que o mesmo não prejudique as comunidades locais, permitindo que na tomada da decisão sejam fixados os termos e condições que essa concessão/autorização deverá respeitar para não prejudicar os direitos e interesses das comunidades que vivem nesse local, criando harmonia entre o investidor as comunidades locais. Muitas vezes têm se verificado que o processo de consulta comunitária tem ocorrido de forma deficiente. Geralmente as consultas são feitas somente na presença do líder comunitário e alguns amigos, e noutras nem se quer estes participam. Em alguns casos os representantes das comunidades são obrigados a tomar uma decisão sem um profundo conhecimento da área requerida ou o tipo de projecto que será implantado. Veja a declaração de um representante da Direcção Nacional de Terras e Florestas na caixa abaixo.

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Declaração de um representante da Direcção Nacional de Terras e Florestas Numa conversa informal este afirma ”o processo de consultas não está sendo conduzido da melhor maneira e isso deve-se ao fenómeno “corrupção”, que não está apenas ao nível do Governo (técnicos da geografia e cadastro e outros envolvidos) mas também a nível local (chefes locais - régulos). Alguns régulos após receberem algum agrado (dinheiro ou outros presentes) recolhem as assinaturas ou trazem para a consulta pessoas de sua confiança para que estas assinem a acta. Isto significa que algumas actas de consulta não reflectem a anuência ou decisão da comunidade e o mecanismo para suprir esta falha é fortalecer o mecanismo de convocação e comunicação e ainda de controlo deste mesmo mecanismo”.

Chókwe, 3 de Março de 2008

A ocorrência deste e outros problemas que muitas vezes tem gerado conflitos em prejuízo das comunidades, levaram à preparação do presente guião com objectivo de auxiliar as partes envolvidas no processo de consulta comunitária relativamente a procedimentos a seguir para assegurar que: a) Os membros da comunidade receberam informação relevante em tempo oportuno (com a devida antecedência) para que possam perceber e decidir de uma forma consciente sobre o pedido em causa; b) Os investidores forneceram toda a informação relevante e ouviram todas as partes interessadas no seio das comunidades (e não apenas os Líderes, ou um grupo específico), de modo a evitar conflitos futuros e conseguir uma participação harmoniosa da comunidade no investimento a ser feito; c) Os planos e projectos aprovados têm enquadramento nos planos e programas de desenvolvimento socioeconómico distrital, e que a decisão tomada (aprovação ou não aprovação) demonstre claramente que os interesses de ambas as partes foram devidamente consideradas com base na lei e nas politicas nacionais. O guião vai servir também como base de orientação para as comunidades, investidores, agentes do governo e ONG´S que trabalham com as comunidades, de modo que haja um processo de consulta uniforme, harmonizado e transparente.

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II. PROCESSO DE CONSULTA

1. O Que é uma Consulta Comunitária? Consulta comunitária é um processo que consiste em ouvir e colher a opinião e os interesses das comunidades locais que ocupam uma determinada área para o seu desenvolvimento social, económico e cultural. Esta consulta às comunidades pode ser feita em apenas um encontro ou em vários encontros dependendo da complexidade do projecto a implementar, extensão da área requerida, número das comunidades envolvidas, nível de percepção das mesmas, entre outros. A consulta permite, que as comunidades locais digam se a área que está sendo requerida está ou não ocupada, salvaguardando as áreas que elas necessitam para a realização de actividades comuns do seu interesse, como agricultura, pastagem, entre outras. A consulta serve também para impedir que um indivíduo/investidor (que não pertença à comunidade) explore os recursos naturais (terra, florestas, animais) existentes naquela área sem o consentimento prévio das comunidades. Este processo visa ainda conferir às comunidades locais o direito de participar na gestão dos seus recursos podendo vedar a ocupação indesejável e desvantajosa de suas terras por pessoas externas. O poder de veto não é um aspecto claro na Lei ou facilmente aceite, mas subentende-se, partindo de princípio de que a Lei obriga o Administrador a ouvir as comunidades antes de “atribuir” o DUAT e permite ainda que as comunidades coloquem algumas condições para a realização do investimento quando esta última (a comunidade) tem algum direito sobre tal área1. Isto significa que o parecer do Administrador deve ir de encontro com o resultado da consulta. Se na área requerida existirem outros direitos, o parecer do administrador deve incluir os termos pelos quais se regerá a parceria entre os titulares do DUAT por ocupação e o requerente. Mas, se a comunidade (como entidade local reconhecida) disser que não, o Administrador não deve “ceder” tal área ao investidor sob pena de gerar conflitos. Exemplo-1: Pedido de DUAT para construção de Hotel na área usada pela comunidade O Sr. Alberto (empresário sul africano) pretendia construir um hotel de luxo numa área da comunidade local de Maculuve. Porém a área requerida possui um terreno usado para produção agrícola e um celeiro. Isto significa que tal área está ocupada e por isso não poderá ser objecto do pedido em causa, a menos que mesmo assim a comunidade queira ceder, mediante certas condições a acordar.

1 Ver o nº 3 do artigo13 da Lei de Terras e o nº 3 do artigo 27 do Regulamento da Lei de Terras

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2. Qual é o objectivo da consulta?

A consulta tem fundamentalmente o objectivo de confirmar junto da comunidade local sobre a existência ou não de outros direitos de uso e aproveitamento da terra adquirido por ocupação na área requerida. A consulta comunitária serve ainda para assegurar: • A participação das comunidades locais no processo de tomada de decisões sobre a

gestão de recursos naturais, incluindo o processo de atribuição do direito de uso e aproveitamento de terras comunitárias a investidores para vários fins.

• Que o investimento traga benefícios para todas partes envolvidas (Comunidades, Investidor, Estado), contribuindo para o surgimento de parcerias.

3. Quando é que uma Consulta Comunitária deve ter l ugar?

A consulta às comunidades locais deve realizar-se quando um ou mais indivíduos pretendem explorar um determinado recurso naquela área comunitária e para tal, requer o direito de uso e aproveitamento da terra (no caso do recurso terra) ou licença simples de exploração florestal ou concessão florestal (no caso de recursos florestais e faunísticos).

4. Como se faz a consulta comunitária? Como foi explicado nas sessões anteriores, a consulta comunitária para além de ser um imperativo legal é um passo importante no sentido de envolver as comunidades na tomada de decisões sobre o uso dos seus recursos. Por isso, é importante que no processo de consulta comunitária sejam considerados todos detalhes legalmente exigidos e todos outros aspectos que contribuem para envolvimento e participação de todos actores. As despesas do processo de consulta comunitária devem ser suportadas pelo investidor. Apesar disso, é importante que se minimizem os gastos deste processo para não afastar os investidores com gastos desnecessários e salvaguardar os direitos das comunidades.

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4.1 Etapas do Processo de Consulta Comunitária

Para que o processo da consulta comunitária seja eficaz deve seguir os seguintes passos:

Passo 1: Informação prévia à Comunidade; Passo 2: Convocatória para a reunião de auscultação Passo 3: Reunião de auscultação Passo 4: Acta de Consulta Comunitária

Passo 1. Informação Prévia à Comunidade

4.1.1 Objectivo da Informação Previa

Esta fase do processo de consulta tem o objectivo de dar a conhecer os direitos que as comunidades têm na gestão da terra e outros recursos naturais existentes na respectiva comunidade e informar sobre o projecto que pretende-se instalar na comunidade. As Comunidades Locais devem ter toda a informação necessária sobre o projecto para que possam decidir conscientemente pelo acolhimento ou não do projecto, incluindo o recurso a intervenção, assistência ou acessória técnica de ONG´S, administração ou outras instituições especializadas no apoio às comunidades se estas julgarem necessário, relativamente a proposta de investimento, de modo a conduzir-lhes a uma decisão acertada. Exemplo-2: Projecto de implantação de uma fábrica de Alumínio

Ao pretender-se implantar uma fábrica de alumínios numa área comunitária a comunidade deve ser informada antecipadamente sobre o que significa ter uma fábrica destas na sua área, em termos, ambientais (qual é o impacto que esta trará para os membros da comunidade, para as plantas e animais a volta), sociais (que condições de vida terão) e económicos (que benefícios poderão ter). A comunidade deve ter toda a informação sobre a fábrica antes de se prosseguir para os passos subsequentes e antes da atribuição do direito de uso e aproveitamento daquela área.

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4.1.2 Quem deve receber Informação Prévia?

Na Lei de Terras todos os membros da Comunidade (líderes e não líderes) são co-titulares do DUAT e devem ser consultados sobre as decisões que se relacionam com uso e gestão dos recursos naturais existentes na sua comunidade. Por isso, é importante que a informação atinja toda Comunidade2, devendo também ser difundida para o investidor, e outros actores que actuam na comunidade pelos seguintes motivos:

• A Comunidade é constituída por vários membros, com características e interesses diferentes (homens, mulheres, jovens e velhos) e precisa de tempo para perceber a importância do projecto e tomar uma decisão benéfica para si.

• O projecto de desenvolvimento é geralmente implementado em áreas pertencentes às Comunidades Locais e por isso, estas terão de fazer mudanças necessárias de comportamento, de direitos e deveres relativamente ao uso e gestão dos recursos da comunidade.

• A informação sobre os procedimentos e exigências legais deve ser dada também ao futuro investidor pois, nem sempre este conhece a Lei, nem percebe o esforço que terá de empreender, os passos que tem de seguir, as dificuldades e as necessidades locais de modo a delimitar o âmbito das suas actividades (os moldes em que esta será exercida), e os deveres e direitos que lhe são atribuídos.

Exemplo-3: Implantação de uma empresa madeireira

Se uma empresa madeireira, pretender explorar recursos florestais para fins comerciais deve compreender que antes desta actividade de exploração ter o seu início, já viviam nesta área, comunidades. Desta forma, o investidor deverá reconhecer e respeitar o direito das comunidades de circular livremente dentro dela e de recolher ou cortar árvores para o consumo próprio.

2 Definida no nº 1 do artigo 1 da Lei de Terras e no nº 5 do artigo 1 da Lei de Florestas e Fauna Bravia

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Por vezes, existem dificuldades de reunir todos os membros da comunidade pelo facto de, muitas vezes se situarem em lugares distantes uns dos outros, para além de apresentarem uma estrutura organizacional interna, aspectos culturais e de educação que tornam difícil a realização de reuniões ou a transmissão de informação. No entanto, mesmo nestes casos deve-se encontrar alternativas que permitam uma participação de maior número possível de membros da comunidade. Exemplo-4: Marcação de reuniões em Zavala Nas comunidades no sul de Moçambique, particularmente em Zavala, é muito difícil marcar encontros com as comunidades nas primeiras horas do dia (de manhã) porque a maior parte das pessoas sai para as machambas. Muitas das reuniões marcadas nessas condições resultaram em pouca afluência da população, principalmente das mulheres. Como estratégia, deve-se deixar que a própria comunidade (representada pelos chefes e outros membros) estipule a hora e dia de semana que lhe for conveniente.

COM A INFORMAÇÃO PRÉVIA PRETENDE-SE EVITAR: I. Que apenas um pequeno número de membros da comunidade seja informado sobre o projecto; II. Que participem nos encontros de consulta apenas ou maioritariamente os líderes comunitários (chefes tradicionais, secretários de células do partido), onde a opinião destes quase sempre prevalece e a dos restantes membros é ignorada.

4.1.3 Quem deve dar Informação Previa?

A informação deve ser dada, principalmente, pela Administração Local do Estado e pelos Serviços Públicos de Cadastro, pelo facto de serem estas as principais entidades responsáveis pela atribuição do DUAT. Por outro lado, prevê-se que até a emissão do título e autorização do projecto de desenvolvimento, estas entidades façam o acompanhamento adequado de todo o processo, inclusive o da consulta. Entretanto, nada obsta que a informação relacionada com o tipo de projecto, suas implicações, e outros aspectos seja dada pelo investidor, ONG´s ou outros sectores relacionados com o objecto do projecto. Contudo, nestes casos é importante que a divulgação da informação seja feita em coordenação com administração local para garantir transparência e isenção na transição da informação.

4.1.4 Que informação deve ser transmitida?

Deve-se dar informação sobre o projecto de desenvolvimento que será implementado, no que diz respeito aos objectivos do investidor, a essência do projecto e ao tempo útil da exploração, seus benefícios, deveres e direitos das partes interessadas e afectadas (investidor e comunidade local) e ainda das desvantagens, caso existam.

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Para tal, algumas questões devem ser tomadas em consideração durante a fase de informação prévia, tais como:

1) Direitos dos membros das comunidades 2) Localização da parcela requerida 3) Natureza do projecto de investimento e o plano de exploração do requerente? E

o que é que isso significa na prática? 4) Possíveis termos duma parceria entre os titulares do DUAT e o requerente 5) Que passos se vão seguir? 6) O que é que eles devem esperar desta actividade? 7) Em caso de incumprimento dos acordos, como deverão agir?

4.1.5 Com que antecedência se deve fornecer essa in formação prévia? O espaço de tempo entre a primeira fase “informação prévia” e os encontros ou encontro de auscultação é relativo, tendo em conta que as áreas das comunidades locais têm dimensões diferentes, organização e acessibilidade também diferentes. Por esta razão é recomendável que para esta fase se reserve pelo menos um período de 45 dias ou se fixe o número de dias consoante o tempo necessário para que a informação alcance a maioria dos membros da comunidade. Exemplo-5: Testemunho de um funcionário da Administração do Distrito de Quissico/ Zavala (Entrevista realizada no dia 27 de Novembro de 2007) Segundo um representante da administração distrital de Zavala, nas consultas comunitárias em que ele interveio, durante dois anos, nunca se forneceu previamente alguma informação sobre a implementação dos projectos em causa. Eram apenas convocados os chefes das comunidades para os encontros de auscultação, em que estavam lá presentes o administrador ou o seu representante, um agente dos Serviços de Geografia e Cadastro e o requerente da área. Esta reunião de auscultação é apenas realizada em (01) um dia e numa situação em que a comunidade nada sabe até aquele momento e o mais provável é que estas não estejam capazes de perceber realmente o que significa tal investimento. No final da reunião de auscultação elabora-se a acta de consulta, onde constará todas as observações de 10 membros da/s comunidades envolvida/s, incluindo os benefícios e as exigências (a condição segundo a qual as comunidades aceitam o investidor). COM A INFORMAÇÃO PREVIA PRETENDE – SE EVITAR: I. Grande pressão para a Comunidade Local – pois muitas vezes os agentes do governo e o investidor chegam a comunidade, no dia da consulta, já com a intenção de obter imediatamente a decisão da comunidade. II. Que as comunidades tomem decisões não devidamente analisadas e discutidas na comunidade.

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Passo 2. Convocatória para a reunião/ encontro de a uscultação

4.2.1 Qual é o objectivo da Convocatória para a reu nião da auscultação? O objectivo é garantir a participação efectiva das comunidades, tanto em termos numéricos como em termos de contribuições, para a reunião/encontro realizar-se acautelando os interesses das partes.

4.2.2 O que significa Convocatória para a reunião d a auscultação?

A convocatória é apenas um mecanismo de aviso e apelo às comunidades locais, para que estejam presentes na data e local marcado para a realização da reunião/ encontro de auscultação. A convocação não é propriamente uma fase mas é um elo de ligação, entre a 1ª e a 3ª. É muito importante para que efectivamente a comunidade participe neste processo de tomada de decisão.

4.2.3 Como deve ser Convocada a reunião da ausculta ção? A Administração Local do Estado e os Serviços Públicos de Cadastro (autoridades), devem se dirigir às comunidades e informá-las de que em sequência à informação prévia, vai haver uma reunião de auscultação cujo objectivo é saber das comunidades qual a decisão que vão tomar em relação ao projecto em causa e como as suas preocupações e interesses serão protegidos. E para tal, é necessário que os representantes das comunidades locais estejam presentes na reunião e tragam a decisão da comunidade face a este pedido. A convocação para a reunião deve se efectuar de várias formas: 1º Oral Conversas directas com os vários membros das comunidades locais, tendo em conta as associações locais e outras organizações comunitárias, de modo a divulgar mais a informação para o maior número de possível de pessoas. 2º Escrito Fixar em vários pontos (mais frequentados), tais como, mercados, bares, igrejas, escolas da comunidade, um aviso escrito, convocando as comunidades e os representantes das comunidades locais a participarem na reunião de auscultação;

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Envio de cartas ao régulo, secretários de bairro, e aos chefes de 10 casas, entre outros para que eles mesmo sensibilizem as pessoas a participar nessa reunião.

3º Outras Formas São também admitidas outras formas desde que contribuam para que a mensagem chega aos membros das comunidades. Ex: Rádio nas comunidades onde existam rádios comunitárias.

4.2.4 Quando deve ser convocada a reunião da auscul tação? A Legislação de terras não estabelece nenhum prazo para convocação desta reunião mas a Legislação Florestal exige que a convocação seja feita com antecedência mínima de 15 dias. Por isso, recomenda-se que para ambos casos a convocatória seja feita com antecedência de pelo menos 15 dias da data da reunião de auscultação, pois isso vai permitir uma melhor preparação e participação da comunidade na referida reunião.

Passo 3: Reunião/ Encontro de Auscultação

4.3.1 Objectivo da reunião de auscultação A reunião de auscultação tem fundamentalmente o objectivo de confirmar junto da comunidade local a existência ou não de outros direitos de uso e aproveitamento da terra adquirido por ocupação na área requerida. A reunião serve ainda para envolver as comunidades na tomada de decisões sobre os recursos dos quais estes dependem para a sua sobrevivência, criando um espaço de diálogo franco e aberto em que as comunidades podem abordar todas as questões a volta do projecto em causa, desde as suas dificuldades, preocupações e interesses. Caso sobre a área requerida recaiam outros direitos, poderá estabelecer-se parcerias entre os titulares do direito de uso e aproveitamento da terra por ocupação e o requerente permitindo o desenvolvimento de projectos que beneficiem ambas partes. O referido acordo de parceria deverá constar na acta de auscultação mas também poderá ser redigido por escrito em forma de acordo de parceria. Importa ainda referir que são consideradas áreas ocupadas todas aquelas que são usadas para habitação, agricultura, pastagem, caça, extracção madeireira, incluindo as que estão em pousio.

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Exemplo-6: Área florestal usada para caça comunitária Se esta área estiver a ser usada para caça ou extracção de medicamentos pela comunidade local, então a comunidade possui o DUAT por ocupação. Ou seja a mesma possui ocupantes (Neste caso o ocupante é a comunidade) devendo qualquer investidor negociar e estabelecer um acordo com a comunidade para sua utilização.

4.3.2 O que é reunião de auscultação?

É um encontro orientado pelo Administrador distrital ou seu representante para colher/ouvir a opinião das comunidades locais a cerca do pedido de DUAT ou de exploração de outros recursos naturais.

4.3.3 Quem é o alvo da reunião de auscultação? Na reunião de auscultação devem participar todos os membros das comunidades interessadas, afectadas e envolvidas no processo tais como:

• A(s) comunidade(s) que vive/m dentro da área requerida; • A(s) comunidade (s) que usa/m os recursos da área requerida

A reunião de Auscultação é Pública, devendo participar nela todos interessados, incluindo o requerente ou seu representante.

4.3.4 Quem deve orientar a reunião de auscultação? A reunião de auscultação deverá ser orientada pelo Administrador distrital ou seu representante (No caso de um pedido ligado a área florestal ou faunística, o representante do administrador poderá ser apenas o Chefe do Posto). Deverá participar ainda nesta reunião o representante dos SPGC e de outras áreas (SPFFB por exemplo) mediante o tipo de empreendimento que se pretende desenvolver.

4.3.5 Como é feita a reunião de auscultação? a) Informação relevante Durante a reunião de auscultação, deverá ser transmitida informação sobre: - Motivo do processo de consulta; - Disposições relevantes da Legislação aplicável - Impacto e implicações da consulta - O papel dos representantes da comunidade

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- Os direitos e deveres das comunidades - Localização da parcela - Natureza do projecto de investimento - Outra informação que se julgar relevante para uma melhor percepção por todos intervenientes. Nesta reunião, os representantes do Estado e do Investidor deverão responder a todas as perguntas feitas pelos membros das comunidades. É importante clarificar que nos termos da Lei de Terras e a Lei de Florestas e Fauna Bravia as comunidades locais são, por ocupação, titulares do Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) e que de forma participativa tomam decisões fundamentais sobre a exploração e gestão dos seus recursos naturais.

b) Número de Reuniões de Auscultação A reunião de auscultação pode ser feita num único dia caso se consiga consenso. No entanto, muitas vezes este tempo é insuficiente para que o objecto da consulta seja alcançado sendo necessário realizar duas a três reuniões. Estas reuniões deverão ser marcadas por acordo das partes envolvidas devendo ter lugar no prazo de 45 dias a partir da data da fixação do edital.

Passo 4. Acta da Consulta

4.4.1 O que é Acta de consulta? Acta de consulta é um documento escrito que resume os assuntos discutidos e a decisão saída da reunião de auscultação. A acta serve também de prova dos compromissos alcançados e deve levar assinaturas ou impressões digitais de representantes de todos actores envolvidos nomeadamente: Comunidades, Administração local, SPGC e o Investidor.

4.4.2 Qual é o objectivo da acta da consulta? A acta de consulta tem o objectivo de assegurar, por um lado, que todos os dados sobre a dimensão da área, qualidade, objecto do projecto e as intenções sociais do investidor e por outro lado, as preocupações, exigências e a posição das comunidades relativamente ao projecto, estejam oficialmente registados, de modo que se possa servir de base para tomada de decisões pelo governo e recorrer a ela em caso de dúvida sobre os compromissos assumidos por qualquer das partes para confirmação.

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4.4.3 Como é elaborada a acta da consulta? A acta é elaborada pelo técnico de geografia e cadastro ou pelo funcionário da administração local, que se limita apenas a escrever todos os dados da consulta, num formulário próprio que se denomina “acta de consulta,” tais como:

1) A data do encontro, 2) A lista de representantes escolhidos da comunidade 3) Um resumo dos assuntos discutidos 4) Quem dirigiu a consulta,

5) Opinião da comunidade sobre o projecto, 6) Condições impostas pela comunidade. Em cada uma das reuniões de auscultação deve ser produzida, lida com tradução para língua local e assinada (escrita ou impressões digitais) uma acta em 4 exemplares, ficando uma cópia em poder da comunidade local, uma em poder da administração, uma em poder do requerente e a última para os SPGC.

4.4.4 Quem deve assinar a acta da consulta? A acta de consulta deverá ser assinada por um mínimo de três e um máximo de nove indivíduos, homens e mulheres idóneas para representarem a comunidade se for para efeitos de pedido de DUAT. No entanto, se o pedido for para exploração de recursos florestais e faunísticos a comunidade o número de representantes da comunidade que devem assinar a acta de consulta é de 10 pessoas. A acta deve ser assinada ainda pelos vizinhos da área requerida, pelo investidor e representante do governo. Contudo, o artigo 30 da Lei de Terras, estabelece que os mecanismos de representação e actuação próprias das comunidades locais serão fixadas por lei. Isto quer dizer, que na Lei de Terras não existe um mecanismo próprio de representatividade da comunidade local. Infelizmente, até hoje ainda não existe uma lei que fixe tais mecanismos, o que dá a possibilidade de se registarem formas de representatividade diferentes e não harmonizadas, inclusive as falsas formas de representatividade, acobertando interesses individuais e obscuros. Apesar disso, as comunidades podem escolher pessoas idóneas e de reconhecida reputação para assinar a acta de consulta em sua representação.

5. Acções de seguimento

Oficialmente o processo de consulta termina com a produção e assinatura da acta de consulta. Contudo, é importante que o resultado da consulta seja de conhecimento de todos, mesmo os que não puderam estar na reunião de auscultação para que possam participar na monitoria dos compromissos assumidos. Para tal, a comunidade deverá ainda levar a cabo as seguintes actividades:

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a) Após a elaboração da acta de consulta, a comunidade pode divulgar aos restantes membros da comunidade (os que não estiveram presentes) e outros interessados dos resultados da consulta feita. b) Caso o projecto seja aprovado, a comunidade deverá participar na fiscalização do empreendimento de modo a garantir o cumprimento do plano de exploração bem como do acordo estabelecido no acto da consulta/negociação.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:

1. Baleira, Sérgio e Tanner, Christopher, FAO.2006. LSP Working Paper 28. “Mozambique’s legal framework for access to natural resources: The impact of new legal rights and community consultation on local livelihoods, CFJJ, 2006;

2. Cuco, Arlito. Manual de divulgação da Lei de Florestas e Fauna Bravia. 2000

3. Joaquim, E. e Norfolk, Avante consulta! Consulta efectiva, IIED, 2005;

4. Macome, Eulália. e Salomão, Alda, MCRN: Parcerias, a Chave do Sucesso, Manual de negociação, Maputo, 2003;

5. MADER, DINAGECA, Normas e Instruções Técnicas para Execução da Lei de Terras e Regulamento. 2001

6. Serra, Carlos e Almeida, Irene Guião das Comunidades Locais no Domínio dos Recursos Naturais, CFJJ, Maputo, 2006;

Legislação:

1. Lei de Terras (Lei nº 19/97, de 1 de Outubro)

2. Regulamento da Lei de Terras (Decreto nº 66/98, de 8 de Dezembro)

3. Lei de Florestas e Fauna Bravia (Lei nº 10/99, de 7 de Julho)

4. Regulamento da Lei de Florestas e Fauna Bravia (Decreto nº 12/2002, de 6 de

Junho)