HDTV Lições a aprender com a transição alta definição · ção OFDM com subportadora PSK/QAM....

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TRANSIÇÃO PARA HDTV - 67 Lições a aprender com a transição da alta definição Nesta série de artigos onde a Produção Profissional recordou as origens dos sistemas de televisão de alta definição e onde recuperámos a história do processo de evolução para HDTV - extremamente lento, tendo em conta a evolução paralela noutros sectores tecnológicos- na Europa (ainda em curso), Japão (concluído) e nos Estados Unidos (praticamente concluído), podemos aprender valiosas lições sobre a forma como a indústria não soube responder apropriadamente aos desafios de um mundo globalizado. A evolução para HDTV foi lenta porque se tratou de um processo fraccionado, onde se defenderam paradigmas muito condenados, tal como a protecção de fronteiras e de indústrias territoriais que, elas próprias, haviam desaparecido. Será que a evolução da televisão digital no mundo inteiro ainda poderá corrigir alguns destes erros? Será que estamos preparados para iniciar a transição para a Ultra Alta Definição (UHDTV) deixando para trás uma herança desastrada com a HDTV? Por volta de 2004, numa altura em que os Estados Unidos estavam "mergulha- dos" no seu processo ATSC, onde natu- ralmente os consumidores reconheciam como evidentes os benefícios da televi- são de alta definição e corriam às grandes su- perfícies para comprar um novo ecrã plano em HD, tornava-se claro para todo o mundo que o padrão de televisão se havia alterado, apesar de na Europa ainda se estarem a dar tímidos passos, em virtude das limitações evidentes do padrão DVB-T que não era apropriado para alta definição na forma como estava a ser im- plementado. Assim, em 2004, era evidente que o mundo estava a evoluir de forma desencontrada, com os Estados Unidos e Canadá a impulsionar a alta definição a toda a força mas com base num padrão que se sabia ser limitado, nomea- damente em termos da cadência de dados da compressão MPEG-2, então superada pelo MPEG-4, enquanto a Europa investia milhões numa transição "cega" para uma televisão digital que os consumidores não conseguiam distinguir do que tinham tido até então. A imagem era maioritariamente em formato "quadrado" 4:3 - quando toda a gente via DVD formato 16:9 e começava a ver Blu-ray em gloriosa alta definição em ecrãs de plas- ma e LCD de 42 polegadas ou mais - e não existia diferença de qualidade na imagem que fos- se perceptível em relação ao PAL analógico. Claro está, tal como recordámos, tudo porque as empresas de telecomunicações e alguns políticos acredita- vam que o importante era a "mobilidade" e a "interactividade", sendo 2004 precisamente o momento onde a triste realidade desses mi- lhões de investimento se começaram a revelar infrutíferos, perante a total indiferença dos consumidores. No entanto, nessa mesma altura, na Ásia, o Japão estava avançado na transição para HDTV, sendo que dos 45 milhões de lares, mais de dez por cento tinham televisores HD. O Japão iniciou as transmissões terres- tres na sua norma ISDB-T original (ainda em MPEG-2) em Dezembro de 2003 e, no fina de 2004, existiam 7 canais em HD nas suas redes terrestres que chegavam a praticamente todo o território, enquanto 18 canais HD via satélite eram recebidos por 30% da população e os primeiros serviços HD surgiam no cabo. O projecto HD do Japão Muito embora o primeiro serviço HDTV ti- vesse sido apresentado no Japão em 1 982, foi apenas quando os televisores HD se tornaram acessíveis e apelativos que os consumidores responderam de forma entusiástica. Ou seja, foi na electrónica de consumo, que verdadeira- mente se deu o impulso decisivo para o sucesso da HDTV, quando os televisores LCD se torna- ram extremamente acessíveis em comparação com qualquer outra tecnologia de televisores existentes até aí, para além do apelo de serem mais práticos de instalar nos lares e de estarem disponíveis em maiores dimensões, chegando tipicamente às 60 polegadas de diagonal. Num mercado com 45 milhões de lares, o Japão che- gou aos 100 milhões de televisores instalados graças a adopção da alta definição, efectiva- mente mais do que duplicando os televisores por lar. Em Abril de 2005, os sinais ISDB-T chegavam a mais de 10 milhões de lares japo- neses e os preços dos receptores integrados nos televisores começaram a ser decisivos para que a adopção acelerasse ainda mais. E é preciso recordar também que o Japão começou a ter televisão digital via satélite com a norma DVB-S, em 1996, tendo o serviço DirecTV chegado ao Japão em final de 1997. Mesmo assim, os serviços DVB-S estavam lon- ge de satisfazer os requisitos comerciais da indústria e a televisão de serviço público ja- ponesa, da NHK, juntamente com os maiores privados como a Nippon Television, TBS, Fuj TV e outros ainda conduziram a ARIB (Asso- ciation of Radio Industries and Businesses) a desenvolver um padrão de televisão via sa- télite ISDB-S que acelerasse a introdução da alta definição. Ao contrário do padrão DVB-S que definia uma capacidade de transporte de aproximadamente 34 Mbit/s por transponder de satélite, a norma proposta pela ARIB podia transmitir 51 Mbit/s num transponder, permi- tindo ter dois canais HDTV com áudio multi- canal, mais canais SD e dados. Estas emissões ISDB-S iniciaram-se em 2000. Essas iniciativas bem sucedidas conduziram rapidamente a que a associação ARIB acele- rasse a implementação das restantes normas ISDB divulgadas no site da DiBEG - The Digital Broadcasting Experts Group que, desde 1997 foi criado para promover as normas de televi- são digital ISDB-T International. Com estas iniciativas, o Japão passou a di- vergir totalmente do que se passava na Europa e Estados Unidos, promovendo as normas ISDB que incluíam a norma de satélite ISDB-S, a nor- ma terrestre original ISDB-T e também um pa- drão para cabo ISDB-C e um serviço para rádio digital na banda de 2.6GHz, Todas estas nor- mas começaram por ser baseadas em compres- são de imagem MPEG-2 e foram progredindo para a maior eficiência do MPEG-4 / H.264. Interessante nomeadamente foi a imple- mentação de recepção móvel para serviços ISDB-T com base na tecnologia Iseg (arqui- tectura de transmissão segmentada, ou One Documento do DiBEG - The Digital Broadcasting Experts Group que promovia a norma digital 1 terrestre ISDB-T

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TRANSIÇÃO PARA HDTV - 67

Lições a aprender com a transição da alta definiçãoNesta série de artigos onde a Produção Profissional recordou as origens dos sistemas de televisão de alta

definição e onde recuperámos a história do processo de evolução para HDTV - extremamente lento,

tendo em conta a evolução paralela noutros sectores tecnológicos- na Europa (ainda em curso),

Japão (concluído) e nos Estados Unidos (praticamente concluído), podemos aprender valiosas lições sobre

a forma como a indústria não soube responder apropriadamente aos desafios de um mundo globalizado.A evolução para HDTV foi lenta porque se tratou de um processo fraccionado, onde se defenderam

paradigmas há muito condenados, tal como a protecção de fronteiras e de indústrias territoriais que,elas próprias, já haviam desaparecido. Será que a evolução da televisão digital no mundo inteiro

ainda poderá corrigir alguns destes erros? Será que estamos preparados para iniciar a transição

para a Ultra Alta Definição (UHDTV) deixando para trás uma herança desastrada com a HDTV?

Por

volta de 2004, numa altura em que

os Estados Unidos estavam "mergulha-dos" no seu processo ATSC, onde natu-

ralmente os consumidores reconheciam

como evidentes os benefícios da televi-

são de alta definição e corriam às grandes su-

perfícies para comprar um novo ecrã plano em

HD, tornava-se claro para todo o mundo queo padrão de televisão se havia alterado, apesarde na Europa ainda se estarem a dar tímidos

passos, em virtude das limitações evidentes do

padrão DVB-T que não era apropriado paraalta definição na forma como estava a ser im-

plementado.

Assim, em 2004, era evidente que o mundo

estava a evoluir de forma desencontrada, com

os Estados Unidos e Canadá a impulsionar a

alta definição a toda a força mas com base

num padrão que se sabia ser limitado, nomea-

damente em termos da cadência de dados da

compressão MPEG-2, já então superada pelo

MPEG-4, enquanto a Europa investia milhões

numa transição "cega" para uma televisão

digital que os consumidores não conseguiam

distinguir do que tinham tido até então. A

imagem era maioritariamente em formato

"quadrado" 4:3 - quando toda a gente já via

DVD formato 16:9 e começava a ver Blu-ray

em gloriosa alta definição em ecrãs de plas-

ma e LCD de 42 polegadas ou mais - e não

existia diferença

de qualidade na

imagem que fos-

se perceptível em

relação ao PAL analógico. Claro está, tal como

já recordámos, tudo porque as empresas de

telecomunicações e alguns políticos acredita-

vam que o importante era a "mobilidade" e

a "interactividade", sendo 2004 precisamenteo momento onde a triste realidade desses mi-

lhões de investimento se começaram a revelar

infrutíferos, perante a total indiferença dos

consumidores.

No entanto, nessa mesma altura, na Ásia,

o Japão estava avançado na transição para

HDTV, sendo que dos 45 milhões de lares,

mais de dez por cento já tinham televisores

HD. O Japão iniciou as transmissões terres-

tres na sua norma ISDB-T original (ainda em

MPEG-2) em Dezembro de 2003 e, no fina

de 2004, já existiam 7 canais em HD nas suas

redes terrestres que chegavam a praticamentetodo o território, enquanto 18 canais HD via

satélite eram recebidos por 30% da população

e os primeiros serviços HD surgiam no cabo.

O projecto HD do JapãoMuito embora o primeiro serviço HDTV ti-

vesse sido apresentado no Japão em 1 982, foi

apenas quando os televisores HD se tornaram

acessíveis e apelativos que os consumidores

responderam de forma entusiástica. Ou seja,foi na electrónica de consumo, que verdadeira-

mente se deu o impulso decisivo para o sucesso

da HDTV, quando os televisores LCD se torna-

ram extremamente acessíveis em comparação

com qualquer outra tecnologia de televisores

existentes até aí, para além do apelo de serem

mais práticos de instalar nos lares e de estarem

disponíveis em maiores dimensões, chegando

tipicamente às 60 polegadas de diagonal. Num

mercado com 45 milhões de lares, o Japão che-

gou aos 100 milhões de televisores instalados

graças a adopção da alta definição, efectiva-

mente mais do que duplicando os televisores

por lar. Em Abril de 2005, os sinais ISDB-T já

chegavam a mais de 10 milhões de lares japo-neses e os preços dos receptores integrados nos

televisores começaram a ser decisivos para quea adopção acelerasse ainda mais.

E é preciso recordar também que o Japão

começou a ter televisão digital via satélite com

a norma DVB-S, em 1996, tendo o serviço

DirecTV chegado ao Japão em final de 1997.Mesmo assim, os serviços DVB-S estavam lon-

ge de satisfazer os requisitos comerciais da

indústria e a televisão de serviço público ja-

ponesa, da NHK, juntamente com os maiores

privados como a Nippon Television, TBS, Fuj

TV e outros ainda conduziram a ARIB (Asso-

ciation of Radio Industries and Businesses) a

desenvolver um padrão de televisão via sa-

télite ISDB-S que acelerasse a introdução da

alta definição. Ao contrário do padrão DVB-S

que definia uma capacidade de transporte de

aproximadamente 34 Mbit/s por transponderde satélite, a norma proposta pela ARIB podiatransmitir 51 Mbit/s num transponder, permi-tindo ter dois canais HDTV com áudio multi-

canal, mais canais SD e dados. Estas emissões

ISDB-S iniciaram-se em 2000.Essas iniciativas bem sucedidas conduziram

rapidamente a que a associação ARIB acele-

rasse a implementação das restantes normas

ISDB divulgadas no site da DiBEG - The Digital

Broadcasting Experts Group que, desde 1997foi criado para promover as normas de televi-

são digital ISDB-T International.

Com estas iniciativas, o Japão passou a di-

vergir totalmente do que se passava na Europa

e Estados Unidos, promovendo as normas ISDB

que incluíam a norma de satélite ISDB-S, a nor-

ma terrestre original ISDB-T e também um pa-drão para cabo ISDB-C e um serviço para rádio

digital na banda de 2.6GHz, Todas estas nor-

mas começaram por ser baseadas em compres-são de imagem MPEG-2 e foram progredindo

para a maior eficiência do MPEG-4 / H.264.

Interessante nomeadamente foi a imple-

mentação de recepção móvel para serviços

ISDB-T com base na tecnologia Iseg (arqui-tectura de transmissão segmentada, ou One

Documentodo DiBEG

- The Digital

Broadcasting

Experts Group

que promoviai

a norma digital1 terrestre ISDB-T

seg), permitindo assim que telefones celulares

e computadores portáteis pudessem receber o

sinal das bandas de TV, nomeadamente tam-bém em veículos em movimento. A ARIB de-

senvolveu originalmente esta arquitectura de

segmentos denominada BST-OFDM que divide

a banda de frequência de um canal ISDB-T em

treze segmentos. Dessa forma, o sinal de um

canal HDTV pode ser segmentado em meno-res resoluções, permitindo que um receptormóvel num automóvel possa receber a emis-

são SD ou HD, com degradação progressiva,consoante as condições de recepção.

E curiosamente, todas estas normas de te-

levisão digital acompanharam de muito pertotodos os desenvolvimentos que decorriam nas

normas europeias DVB, sendo que a estrutura

de dados multiplexada dos serviços já havia

sido experimentada também nos serviços de

rádio digital do DAB/Eureka 147 e do sistema

que foi adoptado também na norma de televi-

são terrestre DVB-T.

Curiosamente, uma das razões porque o

Japão conseguiu rapidamente implementar

serviços ISDB-T no seu território, logo com su-

porte HDTV, foi pelo facto de terem começa-do justamente por usar canais de TV que não

estavam a ser usados em VHF e UHF. Outra

importante particularidade em comum com as

normas europeias foi a adopção de modula-

ção OFDM com subportadora PSK/QAM.

Outra curiosidade - antecipando-se aos con-

ceitos da televisão e rádio híbridas que agorasão propostas na Europa - o Japão definiu des-

de cedo que os padrões de transmissão ISDB

tivessem canais de retorno de dados através de

ligação à Internet, sendo suportados todos os

protocolos em redes Ethernet e lEEE 802. 1 1.

A

transmissão de dados com os sen/iços foi pre-vista desde o início para transmissão de inter-

faces interactivos básicos definidos no padrãoARIB STD-824 e para guias de programaçãoelectrónicos EPG. A nível de interfaces e encrip-

tação para serviços condicionados, as normas

japonesas também adoptaram o interface CAS

{Conditional Access System) com variantes es-

pecíficas B-CAS, tal como definidas na normaARIB STD-825 que também define o algoritmode scrambling (CSA). Esta tecnologia de scram-

bling foi adoptada no sistema japonês também

para efeitos de distribuição, permitindo tornar

o sistema mais robusto, mesmo no caso dos si-

nais abertos, tal como foi implementada a pro-

tecção de direitos imposta por Hollywood para

impedir a cópia digital. Tudo processos que se

podem considerar comuns a evolução das nor-

mas digitais que decorriam nos anos noventa

na Europa e que vieram posteriormente a ser

gradualmente alteradas ou abandonadas.

Entra o Brasil

Entre 2006 e 2007, os serviços ISDB-T no Ja-

pão tiveram importantes incrementos, à medida

que o preço dos televisores e receptores STB se

iam tornando cada vez mais acessíveis, mas en-

tretantosurgia no Brasil a implementação própriado ISDB-T que foi oficialmente adoptada como

Sistema Brasileiro de Televisão Digital ou SBTVD,

diferindo da norma japonesa original no facto

de ter sido adoptada já a compressão MPEG4

AVC em vez de MPEG2; no facto de a arquitec-tura One seg suportar a transmissão a 30 fra-

mes por segundo para dispositivos portáteis, em

vez dos 1 5 frames do sistema One seg do ISDB-

-T no Japão; e acrescentando-se o middlewdre

interactivo Ginga. O padrão resultante passou a

ser descrito como ISDB-Tb. Em Janeiro de 2009,o grupo de trabalho constituído entre o Brasil

e o Japão no âmbito da televisão digital publi-cou a especificação que consolidava o sistema

ISDB-T com o SBTVD, resultando na actual es-

pecificação ISDB-T International e que foi sen-

do progressivamente adoptado pela Argentina,

Peru, Chile e Equador, tendo-se progressiva-

mente alargado a toda a América do Sul, na

sequência da decisão da Venezuela, mantendo-

-se actualmente como únicas excepções a da

Nicarágua e das regiões da Guiana Francesa e

Suriname.

É extremamente interessante o facto de,durante a etapa de testes efectuados no Brasil

pela ABERT, SET e pela Universidade Macken-

zie, tenham sido detectadas e documentadas

algumas das mais importantes deficiências das

normas ATSC - que se mostrava adequada a

coberturas com emissores de grande potência,mas revelava grandes problemas na recepçãointerior - DVB-T e da norma ISDB-T original. Ba-

sicamente os testes do grupo da ABERT-SET e

Mackenzie permitiram concluir que a adopçãode uma norma nova de televisão digital deveria

ter em conta as virtudes dos sistemas existen-

tes, combinados com a evolução da tecnologia

disponível, levando à conclusão que o ISDB-T

era a melhor escolha pelo suporte implementa-do da alta definição e recepção móvel one seg,desde que combinado com novos esquemas de

modulação hierárquicos, permitindo maior qua-lidade na recepção móvel; máscaras de emissão

dos transmissores para evitar interferências em

zonas com o espectro muito congestionado;sistemas de multiplexação, sinalização e es-

truturas de dados adaptadas para os padrões

ocidentais, com os conjuntos de caracteres

para línguas latinas; e um sistema de recepçãoaberta, deixando de lado o sistema de protec-

ção de cópias japonês B-CAS DRM; tudo com a

eficiência da compressão MPEG-4 H.264, para

permitir maior capacidade de transmissão de

dados na mesma banda.

Curiosamente, uma evolução que, nalgu-mas das componentes inspirou muito do tra-

balho que posteriormente a Europa se apres-sou a implementar no sistema DVB-T2 e que,actualmente, sendo o mais recente, é também

o mais completo e evoluído padrão de televi-

são digital.

Daqui se conclui que, dos diferentes pro-

cessos de evolução para a televisão digital,onde existiu uma visão clara das prioridades,tal como a alta definição e a recepção móvel

do mesmo sinal aberto transmitido pelas re-

des broadcast terrestres, a progressiva imple-

mentação das normas - embora infelizmente

incompatíveis entre si - trouxe sempre impor-

tantes melhorias, reflectidas no serviço ofe-

recido ao consumidor e, consequentemente,acelerando o seu ritmo de adopção.

Em nenhum caso o processo foi tão mal

conduzido, graças às interferências políticas

e de grupos económicos com interesses di-

vergentes, como é o caso dos grupos de te-

lecomunicações, como aconteceu na Europa,

onde nunca se teve uma noção clara da priori-dade ao serviço dos consumidores.

Numa primeira fase acreditou-se que a

transição para digital teria como principal

motivação a simplificação das redes de trans-

missão para libertação de espectro, numa

segunda fase, tentou-se criar um padrão de

recepção móvel DVB-H que permitisse a em-

presas de Telecom entrar no negócio das tele-

visões, enquanto ao mesmo tempo se tentou

que a questão da interactividade (DVB-MHP)fosse sempre apresentada como prioridade,

de forma a desviar investimentos do sector

broadcast, sempre criticado e menosprezado

na Europa por não ter "canal de retorno". Em

suma, um claro exemplo de "lobbying" daste-

lecoms sobre o poder político europeu que, no

caso de alguns países levou a um retrocesso

deplorável que ainda hoje faz com que a Euro-

pa esteja a ficar para trás em termos globais.

Entretanto, o novo sistema ISDB-T Interna-

tional foi adoptado pelas Filipinas e pela Tailân-

dia em 2010 e pelas Maldivasem 201 1, sendo

este pequeno arquipélago o primeiro caso de

um pais que tem o sistema adaptado para ca-

nais de 8 MHz, o que será decisivo se algum

país africano vier a querer adoptar o mesmo

sistema. No entanto, a razão para as Maldivas

terem adoptado o sistema ISDB-Tb prende-se

com o facto de este ser o mais adequado em

termos de serviços de aviso de emergência,nomeadamente alertas de tsunami, tal como

o Japão sempre especificou.

Daqui para a frenteNeste processo de evolução contínua, em

ciclos gradativos que cada vez se aproximam

mais, será curioso observar como será que a

evolução digital irá continuar a evoluir daqui

em diante, nomeadamente em termos de al-

guma aproximação e compatibilização das

normas técnicas, tal como vem sendo defen-

dido, por exemplo, pelo recém criado grupode trabalho do Future Of Broadcast TV (FoB-

TV). Numa altura em que nos Estados Unidos

se começa a planear a próxima etapa quevirá actualizar a norma ATSC para algo ainda

mais eficiente, nomeadamente de forma a

permitir libertar o espectro que o processo de

transição para digital original não conseguiu

reorganizar; e em que a Europa está mais in-

teressada que nunca em capitalizar no sucesso

internacional que está a ter o padrão DVB-T2;

desenham-se agora iniciativas interessantes de

convergência entre serviços de recepção móvel

broadband e broadcast.

Ao longo desta história de evolução dos

diferentes padrões tornaram-se claras as virtu-

des, por exemplo, da modulação OFDM (Or-

thogonal Frequency Division Multiplexing) em

zonas urbandas densas e na recepção móvel,

motivo porque diferentes esquemas de imple-

mentação desta modulação se encontram nos

padrões mais recentes ISDB-T, DVB-T2 e DTMB

(na China).

Por outro lado, os sistemas de correcção de

erros ou FEC (Forward Error Correctiorí) têm

também vindo a ser aperfeiçoados, aumentan-do a robustez da recepção dos sinais, junta-mente com códigos LDPC {Low Density Paríty

Check) que permitem uma recepção mesmo

próxima dos limites de Shannon, tal como se

demonstrou nos padrões mais recentes DVB-

-T2 e DTMB.

Outra clara tendência tem sido a expansão

dos serviços broadcast terrestres para a recep-

ção móvel, tal como está definido no padrão

ATSC-M/H (mobile/handheld) e que pode ser

complementado por tecnologias inovadoras

como os Multiple Physical Layer Pipes (MPLP)

que foram introduzidos no DVB-T2, onde a

camada física é dividida em sinais lógicos se-

parados (pipes).

As mais recentes tecnologias que estão a ser

exploradas incluem também a expansão das

constelações de modulação para 1024QAM, a

adopção dos esquemas de codificação LDPC

FEC e a aplicação da tecnologia de antenas de

recepção MIMO (Multiple Input Multiple Out-

puf), tal como o consórcio DVB e a EBU vêm

explorando na Europa e está a ser analisado

no consórcio ATSC nos Estados Unidos.

Mas, tal como a história da transição paraHDTV nos tem demonstrado, essencial a essa

nova etapa será efectivamente não ignorar a

evolução na implantação social dos próprios

Media, em plena transformação provocada

pela Internet e pela sociedade de informaçãode forma geral; a alucinante evolução da tec-

nologia IT e de electrónica de consumo, quemuito antes da alta definição estar globalizadanos serviços de televisão, começa agora a pro-

porcionar o acesso a resoluções muito supe-

riores, alcançando já os 4K; e em análise finai,os próprios interesses dos consumidores que,mais do que ter acesso a algo ainda melhor

do que a televisão de alta definição, está inte-

ressado em serviços que sejam compatíveis a

nível global e que lhe permitam aceder a con-teúdos onde e quando quiser.

Ignorar qualquer um destes pré-requisitos

será condenar a indústria da televisão a deixar

de ser o media dominante.

E se de alguma coisa existem certezas, é

que a actividade de broadcasting, via satélite

ou terrestre ou mesmo por cabo, é a forma

mais eficiente de distribuir programas ao maior

número de pessoas, de preferência em regime

aberto, como vem sendo implementado com

grande sucesso no Brasil, independentemen-te de se poderem criar formas alternativas de

acesso a conteúdos "a-pedído".Se olharmos para as tendências de mercado

registadas e analisadas em 2012, os consumi-

dores continuam a preferir ver televisão como

espectadores passivos - a interactividade

resumindo-se a pouco mais que a escolha de

canais e controlo de volume - de preferênciaem alta definição, acedendo a conteúdos de

alta qualidade. A partir deste conceito base,

podemos determinar que a tolerância dos con-sumidores a diferentes patamares de qualida-de varia consoante estão a aceder a conteúdos

em directo ou pré-gravados. No primeiro caso

temos os exemplos contrastantes de notícias

e desporto em que a tolerância é alta no caso

das notícias - até pode ser em resolução infe-

rior ao PAL/NTSC e mesmo a preto e branco,

desde que se queira estar informado - e mui-to baixa no segundo caso - em que cada vez

mais o desporto em directo é até associado a

tecnologias de vanguarda, estando os consu-

midores receptivos a novas experiências como

o 3-D ou emissões de grandes ecrãs imersivos,

por exemplo. Se analisarmos os conteúdos

pré-gravados, a tolerância dos consumidores

às variações de recepção depende puramen-te do dispositivo/ecrã onde estão a receber

o conteúdo, exigindo-se a máxima qualidadecom menor tolerância a variações de recepção,

por exemplo, quando se está a ver cinema ou

séries de qualidade em casa, no ecrã da sala.

É com base na análise destes parâmetros de

comportamento dos consumidores que toda a

definição do que deverá ser a evolução das

próximas gerações das tecnologias de televi-

são digital deverá ser ponderada e não com

base na discussão das condicionantes tecno-

lógicas ou exclusivamente económicas (pelo

menos de curto prazo).Por exemplo, numa altura em que já se

debate se o padrão da televisão para daqui a

5 a 8 anos deverá ser o ITU/UHDTV 1 a 4K

(porque já existem televisores em 2012) ou

ITU/UHDTV 2 a 8K (porque o Japão propôs e

já tem um projecto em curso para 2020) e se

começa a debater se essas normas técnicas de-

vem ter suporte de áudio multicanal imersivo

(22.2 canais, por exemplo) e suportarem auto-

-estereoscopia e outros horizontes meramente

técnicos, será realmente importante definir

os cenários prováveis de aplicação para essas

tecnologias no mundo que existirá não em

2020 mas para além disso. Um mundo onde

teremos banda larga móvel a 100Mbps aces-

sível até em África, mas onde o espectro de

radiofrequência apropriado estará largamentecondicionado. Mas também um mundo onde

os consumidores irão viajar com dispositivos

móveis que estes esperam lhes permitam ter

acesso aos conteúdos e programas, onde quer

que seja, pelos quais estão dispostos a pagarindependentemente de a sua distribuição ser

feita por broadcast ou broadband.

Se condicionarmos a discussão meramen-

te ao tema da definição - que temos vin-

do a tratar nesta série - será evidente que a

norma futura de televisão deverá considerar

Ultra-Alta Definição a pelo menos 4K ou 8K

em varrimento exclusivamente progressivo, a

pelo menos 60 ou 120 frames por segundo,mantendo uma compatibilidade "hierárquica"com as actuais 1920x1080 linhas de resolução

com 25/30 frames por segundo, para que se

possam ter implementações móveis económi-

cas e alguma compatibilidade com os arquivos

de conteúdos existentes.

Se o tema da largura de banda é crítico na

distribuição destes sinais em infra-estruturas

IP e nomeadamente no acesso "on-demand"

que é antecipado pelos serviços broadband, a

verdade é que a evolução previsível das nor-

mas de compressão (HEVC - High Efficiency Vi-

deo Coding) e a própria evolução da eficiência

das redes de transmissão terrestres, permitem

que a distribuição broadcast via terrestre e o

satélite sejam sistemas viáveis e atraentes paraessas normas futuras. Claro, tendo em conta

que o mundo não irá continuar a suportar a

multiplicação simples de canais nessas formas

de distribuição broadcast - até porque dificil-

mente haveria conteúdos adequados que o

justifiquem.Ou seja, será possível antecipar um cená-

rio onde o acesso dos consumidores aos con-

teúdos seja feito por tecnologias convergentese híbridas broadcastforoadband, mantendo-

-se uma oferta diversificada e multicanal es-

sencialmente "on-demand" para serviços IPTV

e acesso em múltiplos ecrãs; e uma oferta de

alta qualidade e alta relevância (informação,

cultura, desporto e entretenimento) nos servi-

ços broadcast de alta qualidade.

Qualquer evolução que venha a ser projec-tada que não tenha isto em conta estará con-denada ao fracasso. ¦FONTES:

Especificação ETSI - D2-HDMAC/Packet system (ETS 300 352)

High Defínition Television; the Creation, Development and Im-

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