HISTÓRIA DA PSICOLOGIA BRASILEIRA

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UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE UNIPLACDEPARTAMENTO DE CINCIAS BIOLGICAS E DA SADE CURSO DE PSICOLOGIA

HISTRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL

SONIA MOREIRA THOMAZI

LAGES 2002

UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE UNIPLACDEPARTAMENTO DE CINCIAS BIOLGICAS E DA SADE CURSO DE PSICOLOGIA

HISTRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL

Trabalho que Sonia Moreira Thomazi apresenta Professora Lilian Kanan para avaliao na Disciplina de Histria da Psicologia do Curso de Psicologia 1 Fase da UNIPLAC.

LAGES 2002

APRESENTAO

A Histria da Psicologia no Brasil resulta de cuidadosa pesquisa baseada no princpio segundo o qual uma abordagem social nesta rea possibilita a apreenso do dilogo que se estabelece entre a Psicologia e a formao social na qual ela se produz, considerado o conhecimento como produto fundamentalmente histrico e social. Desde Baldwin, de 1913, ou Brett de 1921, literatura pedaggica de Brock 1998, encontra-se uma Psicologia que freqentemente comea na era prsocrtica. A Psicologia constitui-se hoje numa cincia que, reconhecidamente, tem exercido uma funo social de grande relevncia, quer como rea de conhecimento que tem contribudo para ampliar a compreenso dos problemas humanos, quer como campo de atuao cada vez mais vasto e efetivo na interveno sobre estes. Compreender a Psicologia como construo histrica exige trs aspectos: o desenvolvimento especfico das idias e prticas psicolgicas, sua base epistemolgica e os fatores contextuais (aspectos estes s separveis como recurso didtico). possvel afirmar-se que generalizado o desconhecimento do processo de construo histrica da Psicologia em nosso pas, reflexo possvel do prprio desconhecimento da Histria do Brasil pela maioria da populao brasileira.

Buscou-se compreender como a Psicologia conquistou seu espao prprio como rea de conhecimento e campo de prticas no Brasil, atingindo sua autonomia e reconhecimento como cincia especfica, em conseqncia da produo de idias e prticas psicolgicas no interior de outras reas do saber. Destaca-se aqui o perodo que vai da ltima dcada do sculo XIX terceira dcada do sculo XX; perodo de grandes transformaes sociais, econmicas e polticas no Brasil e, particularmente, de significativa produo cultural.

PARTE I ANTECEDENTES

Falar-se- em pensamento psicolgico e no em Psicologia. Deve-se lembrar que a Psicologia alcanou o estatuto de cincia autnoma somente no ltimo quartel do sculo XIX, tendo como marco o estabelecimento de sua definio, de seu objeto de estudo, de seus mtodos e de seus objetivos por Wilhelm Wundt, na Alemanha. A abordagem desses antecedentes tem por objetivo demonstrar como o pensamento psicolgico foi produzido por outras reas do saber, sendo que seu desenvolvimento no seio destas foi fundamental para a absoro dos avanos que, no final do sculo passado, os estudos psicolgicos alcanaram na Europa. Criaram-se assim as condies para a penetrao e conseqentemente desenvolvimento da Psicologia no Brasil.

1 FENMENOS PSICOLGICOS NO PERODO COLONIAL

Tm-se referncia no artigo de Samuel Pfromm Netto A Psicologia no Brasil, mas somente em 1984 com a pesquisa pioneira realizada por Marina Massimi trouxe extenso e minucioso estudo sobre esta temtica. essa poca PESSOTTI denominou de perodo pr-institucional da Psicologia. A preocupao com os fenmenos psicolgicos aparece em obras oriundas de outras reas do saber: Teologia, Moral, Pedagogia, Medicina, Poltica e at mesmo Arquitetura. Os autores so brasileiros, com exceo de alguns que embora tenham nascido em Portugal, aqui passaram a maior parte de suas vidas. Em geral, tiveram formao jesutica e cursaram universidades europias, particularmente a Universidade de Coimbra. A maioria desses autores exercia funo religiosa eram

preponderantemente jesutas ou poltica, tendo vrios deles ocupado importantes cargos na colnia ou na metrpole. As obras so impressas na Europa, sobretudo em Portugal. Encontramse nestas obras preocupaes com os seguintes temas: emoes, sentidos, autoconhecimento, educao de crianas e jovens, caractersticas do sexo feminino, trabalho, adaptao ao ambiente, processos psicolgicos, diferenas raciais, aculturao e tcnicas de persuaso de selvagens, controle poltico e aplicao do conhecimento psicolgico prtica mdica.

Em algumas obras encontram-se referncias sobre as emoes e prtica der seu controle ou cura. Autores como Padre Vieira, Frei Mateus da Encarnao Pinna e Padre Angelo Ribeiro de Sequeira; em obras de Filosofia Moral, como a de Mathias Aires Ramos da Silva de Ea, e obras mdicas, como as de Francisco de Mello Franco. O conhecimento de si Padre Vieira e Encarnao Pinna (obteno de conhecimento de si pelo sujeito), Azeredo Coutinho (objetivao da experincia interior) e Mathias Aires (estudo da vaidade com objetivo de auto-conhecimento). Essa temtica guarda ntima relao com questes posteriormente abordadas pela Psicologia, sendo o auto-conhecimento assunto que permanece como objetivo da cincia psicolgica e de sua prtica. A preocupao com a objetivao da experincia interior constitui ainda hoje uma questo fundamental para a pesquisa psicolgica. As sensaes e os sentidos abordados principalmente no sculo XVIII e tiveram relao com o desenvolvimento das idias empiristas. Nesses estudos, temas caractersticos da Psicologia que viria a se desenvolver j estavam prenunciados: loucura, fatores de natureza sexual, fantasias, instintos e iluso de tica. Tratam desse assunto: Padre Vieira, Encarnao Pinna, Mathias Aires, Sequeira e Mello Franco. Para vrios autores, o ambiente considerado como um dos fatores determinantes do comportamento; para Padre Vieira o clima brasileiro favorece o cio e a dissimulao, assim como pata Mello Franco, para quem a natureza dispensa o homem da luta, levando-o ao cio. Concepes como esta sero freqentes at meados do sculo XX e tero relaes muito prximas com o pensamento psicolgico psiquitrico desenvolvido no Brasil. Se de um lado patente a condio de dependncia do pensamento psicolgico produzido no Brasil em relao aos interesse metropolitanos, por outro lado impossvel negar o carter de originalidade em muitas obras, particularmente no que se refere s idias psicolgicas propriamente ditas, o que pode ser constatado em muitos elementos apontados por Massimi em sua pesquisa. Destes, vale destacar os prenncios da psicoterapia, os estudos sobre as crianas e sua

educao, a determinao do ambiente sobre o comportamento, as concepes contrrias completa submisso da mulher, sobretudo, o reconhecimento da capacidade intelectual feminina e, finalmente, as relaes entre a prtica mdica e o saber psicolgico. possvel compreender a originalidade de vrias idias psicolgicas como tendo surgido do fato de que, em busca de solues para alguns problemas, a criatividade tornou-se um imperativo; as necessidades impostas pela realidade exigiram solues que, ao mesmo tempo que buscavam a manuteno da ordem estabelecida, tambm se constituam em foras impulsionadoras do real em direo ao futuro, ou ainda, poderia estar articuladas s foras que colocavam em questo o prprio status quo, no sentido da busca de uma nova ordem, o que pode ser confirmado pelo fato de que vrios autores estudados por Massimi tiveram em uma ou outra ocasio, problemas com o poder metropolitano ou com a Inquisio. O pensamento psicolgico produzido no perodo colonial de extrema importncia para a compreenso da construo histrica da Psicologia no Brasil, pois explicita suas mais antigas razes.

2 FENMENOS PSICOLGICOS NO SCULO XIX

O Brasil sofreu grandes mudanas no sculo XIX. A condio de autonomia, mesmo que relativa, trouxe profundas transformaes sociedade brasileira, entre as quais incluem-se significativas mudanas no plano cultura, inserindo-se a a produo de idias e prticas de natureza psicolgica. A produo do saber psicolgico ainda foi gerada, no entanto, no interior de outras reas de conhecimento, fundamentalmente na Medicina e na Educao.

2.1 O Pensamento Psicolgico na Educao O pensamento brasileiro no sculo XIX, extensivo Educao, sofreu profunda influncia europia, com presena marcante das idias francesas: o liberalismo, o positivismo e o pensamento filosfico do tomismo e do empirismo, bem como influncias do espiritualismo francs e do idealismo alemo. Telogas, professores e mdicos so freqentemente os autores de tais obras filosficas e tendem a considerar a Psicologia como parte integrante da metafsica, tendo como objetivo de estudo geralmente a alma, o esprito e o eu. Em pesquisa empreendida por Massimi (1989), os assuntos encontrados em tais obras filosficas so divididos pela autora em duas categorias: os conceitos relativos aos fundamentos da vida psquica (alma, eu, conscincia, identidade, carter, faculdades, etc.) e os conceitos referentes a fenmenos psquicos especficos (percepo, emoo, cognio, motricidade, etc.). Esses assuntos

apareceram freqentemente em obras psicolgicas e pedaggicas das primeiras dcadas do sculo XX. A relao entre Psicologia e Pedagogia guarda ntima relao com o pensamento escolanovista, cuja penetrao no Brasil inicia-se no sculo XIX, mas cuja efetiva explicitao e consolidao somente ocorreu no sculo XX.

2.2 O Pensamento Psicolgico na Medicina A primeira tese que trata do fenmeno psicolgico, foi defendida em 1836, por Manoel Ignacio de Figueiredo Jaime, denominada As paixes e afetos dalma em geral, e em particular sobre o amor, amizade, gratido e o amor da ptria. Temas relativos sexualidade so muito freqentes, como: cpula, onanismo, histeria, ninfomania, prostituio, etc., valendo ressaltar que, em 1914, a tese de Genserico Arago de Souza Pinto evolui para um tratamento terico baseado na Psicanlise. Vale lembrar que a Psicologia conquistou o estatuto de cincia autnoma no ltimo quartel desse sculo, momento em que aparecem teses que podem ser identificadas com a cincia psicolgica. No final do sculo XIX defendida a tese Durao dos Atos Psquicos Elementares, de Henrique Roxo, considerada por Loureno Filho, Pessotti e Pfromm Netto como o primeiro trabalho de Psicologia Experimental, baseado em nmero significativo de dados obtidos experimentalmente, com o uso do psicmetro de Buccola. Para MACHADO (1978), a constituio da Psiquiatria no Brasil inicia-se com a criao dos hospcios, articulada s finalidades da Medicina Social. Nasce assim, no Brasil dos meados do sculo XIX, no uma psiquiatria preventiva, mas a psiquiatria como instrumento da preveno Em 1842 inaugurado no Rio de Janeiro o Hospcio Pedro II, cujas prticas foram fundamentadas nas idias de Pinel e Esquirol. A psiquiatria brasileira evoluiu de uma concepo que propunha a cura da loucura com sangrias e

banhos, para uma preocupao de natureza comportamental, em que o tratamento passou a basear-se em intervenes no plano moral. Havia profundas diferenas entre os hospcios do Rio de Janeiro e de So Paulo. O primeiro teve, desde seu incio, uma preocupao mdicopsiquiatrica, com base em teorias e prticas da Psiquiatria estrangeira. O hospcio paulista, ao contrrio, funcionou to somente como espao de recluso, aparecendo uma concepo psiquitrica apenas no final do sculo, com Franco da Rocha.

PARTE II A PSICOLOGIA E SEU PROCESSO DE AUTONOMIZAO NO BRASIL

Novas e significativas transformaes ocorreram a partir do final do sculo XIX, tanto na sociedade brasileira quanto na Psicologia: o Brasil adotou o modelo republicano. A Psicologia, por sua vez, adquiriu no final do sculo passado o estatuto de cincia autnoma; processo esse originado a Europa e seguido de acelerada evoluo dessa cincia no apenas em seu solo original, mas tambm nos Estados Unidos. Na virada do sculo ocorreu intenso desenvolvimento da cincia psicolgica em todas as instncias. Os problemas que o Brasil enfrentava no sculo XIX tenderam, com a virada do sculo, a agravar-se e outros vieram a eles se somar, de tal maneira que o pensamento psicolgico, j em franco processo de desenvolvimento no pas, encontrou terreno frtil para penetrar e estabelecer na sua dimenso cientfica e caminhando para sua autonomia terica e prtica em relao s reas do saber no inteiro das quais havia se desenvolvido at ento, como a Medicina e a Educao. A Psicologia e outras reas do saber foram buscadas no sentido de contribuir com solues para os problemas relacionados sade, educao e organizao do trabalho. A produo psicolgica no interior de algumas instituies vai se delineando cada vez com maior clareza, como a Psiquiatria, e de outro lado pela penetrao das idias e prticas j constitutivas daquilo que, na Europa e nos Estados Unidos, era considerado como Psicologia Cientfica. As personagens dessa histria so principalmente mdicos, educadores, juristas e at engenheiros, sendo que muitos deles acabaram por dedicar-se exclusivamente Psicologia e podem ser considerados os primeiros psiclogos brasileiros.

3 A PSICOLOGIA EM INSTITUIES MDICAS

As preocupaes estritamente psiquitricas formas se delineando com maior clareza e delimitando mais explicitamente suas fronteiras com a Psicologia. A criao de laboratrios de Psicologia em diversas instituies de natureza psiquitrica. Tanto o pensamento psiquitrico quanto o psicolgico encontraram frtil terreno para seus estudos e para a aplicao de seus conhecimentos por meio da Higiene Mental.

3.1 Os Hospcios e Algumas Instituies Correlatas O pensamento psiquitrico brasileiro da poca tinha como principal caracterstica o ecletismo, que conjugava o alienismo clssico, especialmente Pinel e Tuke, com o organicismo, em particular numa de suas vertentes, a teoria da degenerescncia, fortemente calcada na concepo da determinao hereditria da loucura. Muitos tericos acreditavam ser os negros mais propensos degenerao por sua inferioridade biolgica. O alienismo havia sido, no sculo anterior, expresso da Medicina Social, que inclua no seu projeto preocupao com a pobreza, a marginalidade social, o crime e a loucura. Como soluo apresentava-se a necessidade de um

efetivo controle da massa urbana, com vistas sua disciplinarizao. Nesse contexto, ganha fora a teoria da degenerescncia.

3.1.1 Hospcio do Juquery Os primrdios do Hospcio do Juquery situam-se no Asilo Provisrio de Alienados da Cidade de So Paulo. Sua criao obra de Franco da Rocha, que empreendeu a reforma psiquitrica em So Paulo, denunciando a precariedade da assistncia aos doentes mentais e defendendo uma nova instituio, baseada em prticas cientficas, sobretudo no asilamento racional. Franco da Rocha e seu sucessor, Pacheco e Silva, defendiam a centralizao da assistncia psiquitrica como forma de gerar condies para o estudo da loucura, com base na descrio, comparao e classificao, revelando concomitantemente a preocupao em demonstrar a pertinncia da teoria da degenerescncia. O Juquery representou em So Paulo o pensamento psiquitrico hegemnico no Brasil, nessa poca. Do ponto de vista prtico, as tcnicas cientficas utilizadas consistiam, por exemplo, em alternncia de banhos frios e quentes, malarioterapia, traumaterapia, laborterapia e terapias medicamentosas. A produo do Juquery circunscreve-se especificamente no mbito da Psiquiatria, no trazendo contribuio direta em nvel de conhecimento e prtica da Psicologia. Entretanto, sua preocupao com a loucura abarca, sem sombra de dvidas o fenmeno psicolgico, embora sua maior contribuio seja a de demarcar mais nitidamente as fronteiras entre a Psicologia e a Psiquiatria. necessrio reconhecer que ambas as reas tratam, sob enfoques e fundamentos diversos, fenmenos de uma mesma natureza e que inquestionvel que, apesar das fronteiras, h intersees tanto do ponto de vista do objeto de estudo quanto do ponto de vista prtico.

3.1.2 Hospital Nacional dos Alienados Aps a proclamao da Repblica, o Hospcio Pedro II passou a ser chamado Hospital Nacional dos Alienados. Em 1902, aps a deteco de inmeros problemas na instituio, foi nomeado para sua direo Juliano Moreira, cuja prtica inaugura uma psiquiatria cujos fundamentos tericos, prticos e institucionais constituram um sistema psiquitrico coerente. Nomes consagrados como Henrique Roxo, Afrnio Peixoto e Maurcio de Medeiros contriburam com a constituio da prtica psiquitrica na instituio. Em 1907, sob a direo de Juliano Moreira, criado o provvel laboratrio de Psicologia no Brasil (o primeiro teria sido no Pedagogium, em 1906), denominado Laboratrio de Psicologia Experimental da Clnica Psiquitrica do Hospital Nacional dos Alienados. Para ele confluram mdicos cariocas e baianos, representando as orientaes de Teixeira Brando e Raimundo Nina Rodrigues respectivamente, sendo que ambas as tendncias tiveram, apesar de suas particularidades, como seu principal fundamento a Medicina Social e seus motivos de natureza sciopoltica. Ao contrrio do Juquery, nesse hospcio explcito o vnculo com a Psicologia. O Hospital Nacional dos Alienados pode ser visto como uma instncia produtora de conhecimento psicolgico, tendo abrigado profissionais que, em seu laboratrio ou fora dele, produziram relevantes obras psicolgicas, como Maurcio de Medeiros e Plnio Olinto. Por fim, deve-se dizer que a impossibilidade de acesso aos documentos que registram a produo do laboratrio, pois esses encontram-se perdidos, compromete sobremaneira a avaliao mais profunda da participao desse hospcio na histria da Psicologia no Brasil.

3.1.3 Colnia de Psicopatas do Engenho de Dentro Fundada no Rio de Janeiro na dcada de 10, a Colnia produziu extensa contribuio Psicologia por meio de seu frtil laboratrio, criado em 1923.

Esse laboratrio foi transformado em Instituto de Psicologia, subordinado ao Ministrio de Educao e Sade Pblica, em 1932. Em 1937, foi incorporado Universidade do Brasil, para contribuir, segundo Penna, com as Faculdades de Filosofia, Cincias e Letras, de Educao e de Poltica e Economia. A extensa produo do laboratrio demonstra, em relao aos asilos, um imenso avano em direo ao reconhecimento da autonomia cientfica e prtica da Psicologia no Brasil. A Psicologia vista como campo prprio de conhecimento e ao, ao mesmo tempo em que reconhecida sua ntima relao com a Psiquiatria. Trs elementos apresentam-se como particularmente significativos: a preocupao com a formao de psiclogos e a difuso do conhecimento psicolgico; o trabalho clnico e a aplicao da Psicologia a questes relativas ao trabalho. A partir da, a Psicologia penetra no interior do processo produtivo, com um carter estritamente tcnico-cientfico, por meio da interveno direta nos processos seletivos e no estabelecimento de contingncias e normas nas relaes de produo, com base no saber psicolgico. Um destaque especial deve ser dado importncia da presena de Radecki nesse laboratrio e, por decorrncia, na histria da Psicologia no Brasil. Deve-se afirmar que a Colnia de Psicopatas do Engenho de Dentro foi uma das mais importantes instituies que geraram condies para o estabelecimento da Psicologia no Brasil, quer pela consolidao desta rea do saber como cincia, quer em relao ao reconhecimento de sua autonomia terica e prtica.

3.1.4 Liga Brasileira de Higiene Mental e Instituies Correlatas A Liga Brasileira de Higiene Mental foi fundada em 1923, por Gustava Riedel, tendo em seus quadros os mais eminentes psiquiatras e intelectuais da poca. Segundo Jurandir Freire Costa, o objetivo inicial da Liga idealizada por Riedel era a melhoria da assistncia ao doente mental.

A partir de 1926 a preocupao transferiu-se do indivduo doente para o normal, da cura para a preveno, ampliando seu raio de ao para a sociedade como um todo, definindo a ao psiquitrica como prtica higinica, apoiada na ao de eugenia. A Liga reconhecia a Psicologia como cincia afim Psiquiatria e estimulava sua produo. Nesse sentido, foi criado um laboratrio de Psicologia, cuja direo foi inicialmente confiada ao francs Alfred Fessard e posteriormente a Plnio Olinto, que foi sucedido por Braslia Lema Lopes. A Liga props em 1932, ao Ministrio da Educao e Sade Pblica, a presena obrigatria de gabinetes de Psicologia junto s clnicas psiquitricas. Anualmente a Liga realizava as Jornadas Brasileiras de Psicologia. Preocupao com a Psicologia teve tambm a Liga Paulista de Higiene Mental, fundada em 1926, por Pacheco e Silva, funcionando em moldes semelhantes sua correspondente em nvel nacional. A Psicologia aparecia articulada s questes relativas organizao do trabalho, como instrumento de obteno de reconhecimento a respeito das funes psicolgicas presentes no exerccio profissional, tais como: funes psicomotoras, memria, ateno e julgamento. O Instituto de Higiene Mental de So Paulo organizou um grupo de estudos de Psicologia Aplicada, do qual participaram mdicos, educadores e engenheiros; os estudos a realizados versavam sobra a Psicologia do Trabalho e deram origem ao Servio de Inspeo Mdico-Escolar, no qual foi criada uma escola especial para crianas portadoras de deficincia mental e, em 1938, uma clnica de orientao infantil, provavelmente a primeira no pas, chefiada por Duval Marcondes. A concepo psiquitrica das Ligas de Higiene Mental no era, contudo, unnime. interessante notar que a Psicologia, como detentora de um saber e de um corpo de tcnicas, particularmente a psicometria, relacionada s prticas especificamente psicolgicas, numa verso bastante prxima das atuais.

3.1.5 O Movimento Psiquitrico de Recife Esse movimento erigiu-se sobre o alicerce representado pelas idias e aes de Ulysses Pernambucano. Formado na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Pernambucano foi discpulo de Juliano Moreira. Nomeado em 1924 diretor do Hospital de Doenas nervosas e mentais de Recife, aboliu os calabouos e as camisas-de-fora, implantou a praziterapia, criou o Pavilho das Observaes, o Laboratrio de Anlises e o Pavilho de Hidroterapia, tendo tambm criado o sistema de internato acadmico para os jovens mdicos estagiarem. A referncia a controle cientfico relaciona-se aos estudos realizados por Pernambucano sobre os africanos no Brasil. Estes estudos foram inicialmente influenciados por Nina Rodrigues, cujo teor era marcadamente racista e considerava as manifestaes culturais negras como sintomas da degenerescncia mental em funo da inferioridade racial. Ulysses, entretanto, distanciou-se dessa concepo, passando a repudi-la e dirigindo seus estudos para caminhos opostos ao pensamento de Raimundo Nina Rodrigues. Pernambucano fundou a Liga de Higiene Mental de Pernambuco, que teve carter bastante diferente das demais ligas. Na Liga, Pernambucano criou uma Escola Para Anormais, que, em 1964, passou a ser dirigida pela APAE. Em 1936, ele criou o Sanatrio de Recife, no qual foi tambm instalada uma Escola Para Anormais. Preocupou-se tambm Pernambucano com a formao de profissionais da rea de sade mental, tendo realizado vrios cursos intensivos de especializao, com a finalidade de promover a formao prtica de monitores de sade mental e auxiliares psiclogos, sendo essa ltima funo ocupada principalmente por professoras diplomadas pela Escola Normal. Pernambucano pode ser considerado como pioneiro do movimento que mais tarde veio a ser conhecido como Anti-Psiquiatria. A doena mental era por ele concebida como situao existencial, resultante da dinmica do processo

psicolgico, considerando o sujeito como agente desse processo e admitindo os fatores sociais como co-determinantes. Do ponto de vista da produo especificamente psicolgica, o movimento de Recife veio contribuir em particular por meio de seu Instituto de Psicologia, mais tarde denominado Instituto de Seleo e Orientao Profissional. De forma geral, pode-se dizer que esse psiquiatra adotou atuar sobre a doena mental. em seu

trabalho uma perspectiva muito prxima Psicologia na sua maneira de conceber a

3.2 Medicina Legal, Psiquiatria Forense e Criminologia O combate ao alcoolismo, jogo, prostituio e crime ganharam terreno no interior da Psiquiatria, que procurou articular doena mental e criminalidade, com base na teoria da degenerescncia. Assim, Psiquiatria e Direito integravam-se por meio da Medicina Legal, da Psiquiatria Forense e da Criminologia, sob a influncia do organicismo, alm das idias de Spencer, Darwin, Galton, Comte, Wundt e, especialmente, de Lombroso. Mdicos como Oscar Freire, Afrnio Peixoto, Artur Ramos e o jurista Evaristo de Moraes so alguns daqueles que dedicaram grande parte de seus trabalhos Medicina Legal. Deve-se destacar o papel de Heitor Carrilho, cuja contribuio foi no apenas terica, mas fundamentalmente no campo da prtica institucional da Psiquiatria Forense. Carrilho iniciou seu trabalho como psiquiatra no Hospital Nacional dos Alienados. Por seu esforo foi criado em 1921, no Rio de Janeiro, o Manicmio Judicirio. Contribuiu com a criao de outras instituies semelhantes em vrios pontos do pas. Foi membro do Conselho Penitencirio, diretor do Servio Nacional de Doenas Mentais, presidente da Sociedade Brasileira de Neurologia, Psiquiatria e Medicina Legal e catedrtico de Clnica Psiquitrica na Faculdade Fluminense de Medicina.

Heitor Carrilho foi contundente crtico do Direito Clssico e grande defensor do Direito Positivo. O Direito Positivo acabava psicologizando ou individualizando o ato criminoso e sua interpretao. Carrilho desenvolveu em eus artigos uma srie de elementos necessrios para a prtica do Direito Positivo, particularmente no que diz respeito interpretao psicolgica e psiquitrica do crime. Defendia ele a elaborao de um psychobiograma, isto , uma ficha de informaes bio-psquicas, para cada preso. Contribuiu tambm Carrilho no exame e no relatrio que fundamentaram o primeiro caso de inimputabilidade de um criminoso, por ter sido estes considerado louco. Grande contribuio a essas reas do saber veio tambm de Afrnio Peixoto. Sua tese de doutoramento j apontava para essa temtica: Epilepsia e Crime. Do vasto conjunto de obras de Peixoto, destacam-se: Elementos de Medicina Legal (1910); Psicopatia Forense (1916); Sexologia Forense (1934) e Novos Rumos da Medicina Legal e Criminologia. A Medicina Legal, a Psiquiatria Forense e a Criminologia demonstraram a importncia da Psicologia como uma de suas cincias auxiliares. Apesar do reconhecimento, a Psicologia permanecia como instncia pertinente Psiquiatria, tanto que s recentemente a Psicologia e o psiclogo tm sido reconhecidos no mbito do poder judicirio.

3.3 Teses de Doutoramento das Faculdades de Medicina Em 1890, foi apresentada a tese Psicofisiologia da percepo e das representaes, por Jos Estelita Tapajs. Trs teses so apresentadas com a denominao Das Emoes, apresentadas por Verssimo Dias de Castro (1890), Manuel Pereira de Melo Morais (1891) e Adolfo Porchat Assi (1892). A tese de Odilon Goulart, Estudo psicoclnico da afasia, de 1891, talvez o primeiro estudo relacionado Psicologia Clnica, segundo Pessotti.

De Alberto Seabra, a tese A memria e a personalidade, de 1894, constituiu-se num estudo pioneiro sobre a memria, anunciando a preocupao com uma temtica que seria largamente pesquisada nos anos subseqentes, particularmente pelos laboratrios de Psicologia. No se pode deixar de fazer referncia figura de Raimundo Nina Rodrigues, mdico baiano, professor da Faculdade de Medicina da Bahia e grande produtor de pesquisas. Exerceu ele forte influncia sobre toda uma gerao de mdicos, os quais, de uma maneira ou de outra, contriburam para o desenvolvimento da Psiquiatria e Psicologia no Brasil. Foi Nina Rodrigues um dos mais importantes e veementes defensores da teoria da degenerescncia. A tese de Henrique Roxo, Durao dos atos psquicos elementares, de 1900, traz a defesa da Psicologia como propedutica da Psiquiatria, o que mostra o reconhecimento da autonomia entre as duas reas de conhecimento. Defendida em 1907, a tese de Maurcio Campos de Medeiros, Mtodos em Psicologia, veio demonstrar a penetrao da Psicologia no pas e a preocupao metodolgica com a produo de conhecimento nos patamares do rigor cientfico. A tese de Plnio Olinto de 1911, denominada Associao de idias, demonstrativa da j indubitvel produo cientfica da Psicologia no Brasil. Deve-se tambm destacar o primeiro trabalho acerca da Psicanlise, que foi a tese Da Psicanlise: a sexualidade nas neuroses, de Genserico Arago de Souza Pinto, defendida em 1914. Essas teses, particularmente aps 1890, constituem-se numa das mais importantes evidncias da conquista gradativa de autonomia da produo psicolgica no Brasil. Embora produzidas como teses em Medicina, pode-se dizer que muitas delas constituram-se em estudo de natureza estritamente psicolgica, diferenciadas da psiquiatria e, mais que isso, contribuindo para a defesa da Psicologia e para o esforo de demonstrar sua especificidade, estabelecendo os meios para produzi-la.

4 A PSICOLOGIA EM INSTITUIES EDUCACIONAIS

A conquista de autonomia pela Psicologia no Brasil teve na Educao um dos mais importantes substratos para sua realizao. A Psicologia tornou-se necessria como cincia bsica e instrumental para a Pedagogia. Esse desenvolvimento foi de tal maneira relevante que, da Educao, ampliou-se para outras reas, como a organizao do trabalho e o atendimento clnico nos Servios de Orientao Infantil. Foi realizada, em 1890, a Reforma Benjamin Constant, que levou o nome do titular do ento Ministrio da Instruo Pblica, Correios e Telgrafos. Essa reforma propunha a liberdade, a laicidade e a gratuidade do ensino primrio, em consonncia com a orientao constitucional. Sua tnica foi a substituio da tendncia humanista clssica pela tendncia cientificista. Merece destaque nessa reforma a substituio da disciplina Filosofia pelas disciplinas Psicologia e Lgica. Foi nas primeiras dcadas do sculo XX que as teorias pedaggicas, preocupadas com o processo de ensino aprendizagem, sobretudo o escolanovismo, tiveram, uma penetrao sistemtica no Brasil e, junto com elas, as teorias e tcnicas da Psicologia, produzidas nos centros europeus e norteamericanos de pesquisa e aplicao. possvel destacar, nesse perodo, dois grandes movimentos

educacionais: o movimento pela difuso da educao e a influncia escolanovista no pensamento pedaggico.

O movimento em defesa da difuso da educao teve em Manoel Bonfim seu provvel precursor. O trip Educao Trabalho Psicologia fazia-se necessrio para o processo de industrializao massiva que se planejava para a sociedade brasileira, sob a gide da modernidade que se almejava para o pas. Nesse quadro, um outro movimento educacional, em verdade um movimento mais propriamente pedaggico, ganhou fora e estabeleceu-se como pensamento hegemnico: o escolanovismo. O escolanovismo fazia parte de um projeto de sociedade, baseado nas idias de modernidade, em que se fazia necessrio um homem novo, esculpido pela educao. Soma-se a isso o fato de que, no escolanovismo, a Psicologia constitua-se como uma das mais importantes cincias que fundamentavam sua pretenso de ser Pedagogia Cientfica. Nesse panorama, mudanas substantivas ocorreram na organizao escolar brasileira, principalmente por meio das reformas estaduais do ensino realizadas na dcada de 20, em que foi o escolanovismo o principal substrato pedaggico. Surgiram os primeiros profissionais voltados especialmente para a Educao, como Loureno Filho, Fernando de Azevedo, Ansio Teixeira e outros. No por acaso, Loureno Filho pode tambm ser considerado um dos primeiros psiclogos brasileiros e um dos mais importantes protagonistas do processo que levou ao estabelecimento definitivo da Psicologia cientfica e da profisso de psiclogo no Brasil. A Psicologia tornou-se ento, exigncia vital para a Educao, pois esta cincia deveria ser capaz de fornecer muitos subsdios tericos e todo um arsenal tcnico para instrumentalizar a ao educativa, A Psicologia ganhou seu mais importante alicerce para se estabelecer na condio de cincia, explicitar-se como rea especfica de saber e de prtica e, conseqentemente, definir-se como campo profissional especfico.

4.1 Algumas Instituies Educacionais 4.1.1 Pedagogium O Pedagogium foi constitudo inicialmente como Museu Pedaggico, cuja idia partiu de Rui Barbosa. Criado em 1890, sua finalidade seria a de funcionar como centro propulsor das reformas e melhoramentos de que carecesse a educao nacional. Em 1906, foi criado um Laboratrio de Psicologia Experimental, muito provavelmente o primeiro laboratrio de Psicologia no pas. Planejado por Binet, o laboratrio foi organizado e dirigido por Manoel Bonfim, que a permaneceu por doze anos. Manoel Bonfim buscava compreender determinados fenmenos em outras bases, considerando a importncia da natureza social do psiquismo em sua complexidade e concreticidade. Posteriormente, vrios estudos da Psicologia empreenderam crticas semelhantes s de Bonfim, assim como elaboraram concepes de Psicologia e de fenmeno psquico muito prximas daquelas que esse autor brasileiro formulou pioneiramente. O laboratrio do Pedagogium pode ser considerado um celeiro riqussimo de reflexes sobre a Psicologia, por meio das obras publicadas por seu genial diretor. O Pedagogium funcionou at 1919, quando foi extinto por decreto municipal. Segundo Penna, essa instituio perpetuou-se com a criao em 1938, do Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos INEP.

4.1.2 Instituto de Psicologia de Pernambuco Foi criada em 1925, por Ulysses Pernambucano. Foi transferido, em 1929, para o Setor de Educao anexo Secretaria de Justia e Instruo de Pernambuco, passando a chamar-se Instituto de Seleo e Orientao Profissional ISOP. Em 1931, era Pernambucano o diretor do Hospital de

Alienados de Recife, quando o ISOP foi anexado ao Servio de Higiene Mental do referido hospital. Muitos estudos foram a realizados, devendo ser ressaltadas as produes referentes a: testes psicolgicos de nvel mental, aptido e outros, assim como sua padronizao para a realidade brasileira; elaborao de testes pedaggicos; padronizao do teste de inteligncia de Ballard, alm de muitas pesquisas experimentais e de iniciao pesquisa com o objetivo de formar pesquisadores em Psicologia. A esse trabalho devem ser somadas as realizaes de Ulysses Pernambucano no campo da educao para deficientes mentais, cujo pioneirismo inconteste, sendo reconhecido pela prpria Helena Antipoff, a quem muitos atribuam as aes pioneiras nessa rea. Criou ele a Escola Para Anormais, anexa ao Curso de Aplicao da Escola Normal. O Instituto contribuiu tambm para o servio psiquitrico de Recife, em especial no que se refere ao emprego de tcnicas psicolgicas em questes de psicopatologia clnica.

4.1.3 Escola de Aperfeioamento Pedaggico de Belo Horizonte Fundada no final da dcada de 20, tornou-se ela referncia para a caracterizao dos rumos que a Psicologia tomou posteriormente. A Escola de Aperfeioamento foi uma realizao pertinente Reforma do Ensino de Minas Gerais, empreendida por Francisco Campos. Nessa reforma, a Psicologia assumiu papel de destaque, em que a Escola de Aperfeioamento deveria tornar-se o principal ncleo difusor que deveria ser implementada no estado. Cursos ministrados por C. A. Baker, Iago Pimentel, Alberto lvares e Alexandre Drummond, abordavam assuntos como Psicologia Educacional e testes, temas estes tambm presentes em artigos da Revista do Ensino.

A Escola de Aperfeioamento promoveu vrios cursos, para os quais foram chamados como docentes personalidades eminentes da Psicologia na poca, como Th. Simon (colaborador de Binet), Lon Walther e Helena Antipoff (assistente de Claparde). Helena Antipoff permaneceu no Brasil e aqui realizou extensa obra em Educao e Psicologia, abrangendo pesquisa, ensino e prtica educacional. Sob a responsabilidade de Antipoff, foi criado um Laboratrio de Psicologia. A perspiccia da anlise de Antipoff sobre os resultados que obtinha nas pesquisas lanou novas luzes sobre a realidade social brasileira e sua relao com os fenmenos de natureza psicolgica. As pesquisas realizadas por Antipoff foram fundamentalmente pesquisas de campo, cujos dados foram coletados em situao ordinria de sala; alm disso, grande importncia era dada considerao do meio social do qual provinham as crianas. Anexa Escola de Aperfeioamento foi criada uma classe especial para deficientes mentais. Helena Antipoff prestou a esse campo de atuao uma das maiores contribuies realizadas no Brasil, no apenas participando da criao de vrias instituies, mas tambm lutando pela melhoria de atendimento a essa populao. Props ela a denominao indivduo excepcional em lugar de deficiente mental, por considerar esta ltima expresso inadequada. A psicometria foi a estudada em contraste com o que ocorria no resto do pas. Na dcada de 40, a Escola de Aperfeioamento de Belo Horizonte fundiu-se com a Escola Normal, gerando o Instituto de Educao, ao qual foi incorporado tambm o Laboratrio de Psicologia.

4.1.4 Escolas Normais A produo das Escolas Normais consistiu, provavelmente, numa das mais importantes contribuies para o estabelecimento da Psicologia cientfica no Brasil, quer no mbito terico, quer no mbito da aplicao de seus conhecimentos. Sua importncia reside tambm no fato de muitos dos primeiros profissionais da

Psicologia terem iniciado sua formao nessas escolas, assim terem sido elas incentivadoras da publicao das primeiras obras especficas de Psicologia no pas. Foi nestas que se formaram os primeiros ncleos de estudiosos das teorias gerais e aplicadas, que os primeiros laboratrios de psicologia se fundaram. A formao dos mais destacados psiclogos educacionais brasileiros da atualidade (1950) tem suas razes naquelas escolas normais, (CABRAL, 1950, p. 31).

As primeiras Escolas Normais surgiram no Brasil na primeira metade do sculo XIX, sendo que somente no sculo XX a disciplina de Psicologia apareceu de maneira mais sistemtica em seus currculos, com o desdobramento da disciplina Pedagogia em Pedagogia e Psicologia. Em 1928, por decreto, a disciplina Psicologia foi inserida no currculo das Escolas Normais, juntamente com Pedagogia, Histria da Educao, Didtica, Sociologia, Higiene e Puericultura. O ensino sistemtico da Psicologia ocorreu originalmente nas Escolas Normais. Das Escolas Normais brasileiras merecem destaque as de Belo Horizonte, Recife, Salvador, Rio de Janeiro, Fortaleza e So Paulo. A Escola Normal de Salvador teve em Isaias Alves um dos mais expressivos representantes da Psicologia na poca; foi ele um dos pioneiros na difuso, aplicao, reviso e adaptao de testes pedaggicos e psicolgicos no Brasil, sendo um dos principais difusores da nova tcnica, quer pela publicao de livros ou realizao de cursos acerca desse tema. A Escola Normal do Rio de Janeiro teve sua produo psicolgica ligada a seu professor de Pedagogia e Psicologia, Manoel Bonfim, cujas idias encontram-se registrados em seus livros: Lies de Pedagogia e Noes de Psychologia. A Escola Normal de Fortaleza trouxe uma contribuio especial

Psicologia pela sua participao no contexto da Reforma do Ensino do Cear, empreendida por Loureno Filho, entre os anos de 1922 e 1923, quando essa escola assumiu importante tarefa e nela foi criado um laboratrio de Psicologia. A

Psicologia exerceu uma funo central nessa reforma que pode ser considerada como a primeira realizao de vulto do escolanovismo no pas; nesse sentido, podemos afirmar que a Psicologia assumiu papel fundamental, pois seu domnio deveria ser o principal instrumental do professor em sala de aula.

4.1.5 A Escola Normal de So Paulo As principais contribuies dessa escola sustentam-se no ensino pela ctedra de Pedagogia e Psicologia e pelos cursos ministrados por especialistas estrangeiros e na produo de seu laboratrio e a ctedra passam a Noemi Silveira Rudolfler, assistente de Loureno Filho, sendo que dois anos depois o laboratrio foi incorporado ctedra de Psicologia da ento criada Universidade de So Paulo e, em 1936, Rudolfler nomeada catedrtica de Psicologia Educacional da referida universidade. No que diz respeito ao ensino de Psicologia, a Escola Normal foi responsvel pela divulgao das teorias psicolgicas em voga na Europa e nos Estados Unidos, das tcnicas delas derivadas, em especial, a psicometria. Em 1914, a ctedra de Pedagogia e Psicologia foi assumida por Sampaio Dria que publicou um volumosos compndio de Psicologia, baseado nas idias de Spencer, Bain e Stuart Mill e divulgando os pensamentos de William James, Binet e Van Biervilet. Em 1925, Loureno Filho sucedeu Sampaio Dria na ctedra revitalizou o Laboratrio de Psicologia, contando com a colaborao de vrios professores, dentre eles Noemi Silveira Rudolfler, que viria mais tarde suced-lo nessa ctedra. O laboratrio foi criado na gesto de Oscar Thompson na direo da Escola Normal em 1914. Para organizar e dirigir o laboratrio, foi contratado o psiclogo italiano Ugo Pizzoli, catedrtico da Universidade de Mdena e diretor da Escola Normal da mesma cidade. Pizzoli realizou outros trabalhos na escola: curso de terico e prtico de Psicologia, orientao de pesquisas e elaborao da carteira biographica escolar.

Em 1914, o laboratrio edita o livro O Laboratrio de Pedagogia Experimental, tendo como elemento introdutrio uma palestra proferida por Thompson, denominada O futuro da pedagogia scientifico, tendo a a Psicologia posio privilegiada como cincia que deveria dar base Pedagogia. Pela exposio acerca do Laboratrio da Escola Normal de So Paulo, especialmente pelos contedos tratados no curso ministrado por Pizzoli, pelo equipamentos e pesquisas realizadas, d para apreender a orientao que teve sua produo, vinculada essencialmente medida das funes psicolgicas, sendo estas o fenmeno perceptivo, de longe o mais estudado. A produo da Escola Normal de So Paulo foi, em todos os aspectos, fundamental para a autonomizao da Psicologia no Brasil, na medida em que, por meio dela, se v com absoluta clareza a penetrao das teorias e prticas da Psicologia ento vigentes nos centros avanados de produo do saber. So Paulo se tornaria um dos mais importantes centros para a Psicologia. Percebe-se, pelo exposto, que a Psicologia encontrou nas Escolas Normais o mais frtil terreno para seu desenvolvimento. possvel dizer que essas escolas foram uma das principais portas para a penetrao da Psicologia cientfica no pas e para a definio do perfil dos profissionais que se tornariam especialistas em Psicologia, alem de, no caso da Escola Normal de So Paulo, ter sido ela uma das mais importantes bases para que a Psicologia se tornasse mais tarde disciplina universitria.

4.2 A Psicologia nas Obras Pedaggicas e Psicolgicas As obras que tratam da Psicologia esto relacionadas ao ensino normal, sendo seus autores muitas vezes professores que as escreveram para uso dos normalistas. Estas obras so fontes importantes para a compreenso da Psicologia no Brasil, pois constituem-se em documentos preciosos sobre as idias psicolgicas que eram aqui difundidas. No que diz respeito s tradues, encontram-se obras clssicas do pensamento escolanovista, em que a Psicologia considerada um dos mais

importantes sustentculos do processo pedaggico. Destacam-se nesse grupo obras de Claparde, Binet-Simon, Piron e Lon Walther, sendo estas pertencentes Biblioteca de Educao, criada em 1927, pela Cia. Melhoramentos e dirigida por Loureno Filho, que tambm foi tradutor de muitas delas. Outro grupo, constitudo de obras pedaggicas de carter geral, de autores brasileiros, tem como principal caracterstica expor questes gerais sobre a Educao, sendo, portanto, expresso de concepes determinadas sobre o processo educativo. Essa caracterstica define a importncia dada Psicologia como cincia de base para a ao pedaggica. Compem-se o outro grupo de obras que podem ser consideradas como explicitamente psicolgicas, dentre elas: Compendio de Paidologia e Educao da Infancia de Anormal de Intelligencia no Brasil, de Clemente Quaglio, editadas em 1911 e 1913 respectivamente.

5 A PSICOLOGIA NA ORGANIZAO DO TRABALHO

A Medicina Social veio exercer importante papel, propondo modelos higinicos de vida social, enquadrando em categorias patolgicas os comportamentos considerados desviantes. As primeiras experincias sistemticas de aplicao da Psicologia s questes do trabalho datam porm da dcada de 20 deste sculo, e teve sua acelerao principalmente a partir dos anos 30. Nesse momento, a Psicologia estabeleceu-se definitivamente no pensamento brasileiro. Tal situao confirma o estabelecimento da cincia psicolgica no pas, como conjunto de conhecimentos e prticas capazes de dar respostas e subsidiar aes que interviessem nos problemas dessa sociedade, demonstrando pela sua aplicao sistemtica uma etapa j avanada da referida cincia. A Psicologia veio inserir-se num panorama em que a preocupao com a maximizao da produo tornava-se um imperativo, contribuindo com a produo de conhecimentos e tcnicas necessria ao empreendimento da racionalizao do trabalho e da administrao cientfica do processo produtivo. Assiste-se nesse momento a implementao de processos

administrativos modernos, fundamentados nos progressos da cincia. Jorge Street, Roberto Simonsen e Paulo Nogueira Filho foram alguns dos mais destacados representantes do empresariado brasileiro que defenderam e adotaram tais idias.

Na dcada de 20, assiste-se a uma mudana nos regimes disciplinares: anuncia-se um projeto racional de produo do novo trabalhador, dissolvido enquanto ato e sujeito e redefinindo enquanto objeto de investimento do poder. Tais mudanas antecedem a penetrao das idias tayloristas e fordistas no pas. Sero essas idias a principal base sobre a qual as mudanas propostas encontraro suas diretrizes e sua justificativa. Sobre o taylorismo e j apontando suas articulaes com a Psicologia, afirma Loureno Filho: A phisiologia e a psychologia foram chamadas a cooperar na organizao das fbricas, para maior efficiencia economica e melhoria das condies do trabalho operario... preciso a adaptao psychologica ao homem, e a adaptao do motor humano ao trabalho. V-se, pois, que a cincia concebida como neutra e o conhecimento por ela produzido inquestionvel na sua autoridade; assim, a utilizao da cincia na administrao industrial justifica-se e legitimada. Em nome do progresso e da proteo ao bom trabalhador justificar-se-ia a administrao baseada na inquestionalidade da cincia, na neutralidade da tcnica e na valorizao da competncia individual. Parte do empresariado brasileiro percebeu a necessidade de

institucionalizao desse projeto de modernizao e cientificao dos processos administrativos. Esse projeto estava intimamente ligado Psicologia. Tiveram grande impacto sobre esse processo as conferncias proferidas por Lon Walther a respeito da Psicotcnica, instrumental fundamental para a materializao das finalidades enunciadas pela administrao cientfica. A Psicologia assumiu, ao lado de outras reas do saber, a funo de sustentculo cientfico dos novos mtodos administrativos. A profissionais. Vrios elementos confluram para a definitiva sistematizao da aplicao da Psicologia gesto da fora de trabalho. Nesse mbito foi especialmente importante o movimento dos testes, iniciado na dcada de 20, Psicologia agiu essencialmente sobre o fator humano da

administrao industrial, sobretudo na seleo de pessoal e orientao e instruo

tendo como marco o curso sobre Psicotcnica, ministrado por Piron, na Escola Normal de So Paulo. A experincia pioneira com a utilizao de testes ocorreu em 1924, no Liceu de Artes e Ofcios de So Paulo, sob a coordenao do engenheiro suo Roberto Mange, em que pela primeira vez no Brasil foram utilizados testes com a finalidade de seleo. O primeiro livro sobre testes no Brasil foi intitulado Testes: Introduo ao estudo dos meios scientificos de julgar a intelligencia e a applicao dos alumnos. Nesta em outras obras da poca so freqentes as referncias s inovaes norte-americanas nas diversas reas, em que vo sendo demonstradas as utilidades dos testes, destacando-se os Army Mental Tests e a orientao profissional. Sobre isso, afirma Medeiros e Albuquerque: Na instruco, o candidato approvado ou reprovado injustamente v o seu futuro sacrificado. No commercio ou na industria, o empregado, si rejeitado sem razo, soffre tambem o mesmo sacrificio; mas se admitido por uma opinio errada, vai estragar material, desacreditar a casa que o escolheu, fazer com que perca clientes talvez preciosos, at que sua incapacidade seja reconhecida e se resolvam a despedi-lo, (1925, p. 24).

Outra questo abordada e tambm relacionada ao trabalho a orientao profissional, na qual busca-se demonstrar a lucratividade da aplicao da Psicologia. Afirma Isaias Alves: O valor economico dos testes surge ento sob nova luz. Primeiro se v a escolha appropriada de profisso para cada individuo, lucrando a sociedade da plena expanso da actividade pessoal. Em segundo lugar, tornando-se de facto primeiro no decorrer dos annos, vem a orientao vocacional dos rapazes, (1930, p.6).

Surgem ento os testes vocacionais, cuja principal finalidade seria a de orientar profissionalmente os jovens, para que suas escolhas fossem compatveis com suas aptides.

importante lembrar que as obras de Medeiros e Albuquerque e Isaias Alves relacionam-se diretamente com as primeiras aplicaes da Psicologia organizao do trabalho, pois so elas co-responsveis pela introduo dos testes no pas e administrao cientfica. A racionalizao assume o dever de promover uma maior produtividade, tem um claro sentido econmico e, fundamentalmente, representa a modernizao almejada por setores da sociedade, cuja aspirao inserir o Brasil no seio do capitalismo. Isso demonstrado na orientao profissional que, de certa maneira, direciona indivduos para diferentes profisses pelas suas capacidades, sem considerar que estas ltimas tm ntima relao com a histria de vida do sujeito e acabaria, por seu turno, endossando determinaes estabelecidas pela origem de classe e no por caractersticas inerentes ao indivduo. Os testes trazem exatamente a argumentao de sua inequvoca objetividade, o que vem referendar a noo de neutralidade que caracteriza a tcnica derivada do conhecimento cientfico. Pode-se afirmar terem sido os testes ou, mais amplamente, a Psicotcnica, papel fundamental no grande projeto de modernizao do processo produtivo brasileiro. Do ponto de vista prtico, a experincia pioneira de aplicao sistemtica da Psicologia ao trabalho ocorreu em 1924, no Liceu de Artes e Ofcios de So Paulo, sob a direo de Roberto Mange. Consistiu ela na seleo de alunos para o Curso de Mecnica Prtica da escola citada, por meio da aplicao das provas de Giese e da introduo da aprendizagem racional, com base nos pressupostos da Psicotcnica. A instruo racional consiste em conseguir o mximo rendimento do menor tempo possvel e com o mnimo dispndio de energia e de dinheiro. Deve-se, antes, exigir compulsoriamente, seno um acentuado grau de aptido, ao menos um mnimo indispensvel aliado a marcado poder de educabilidade. O processo de seleo profissional bastante complexo. Se, de um lado, aptides profissionais constituem indcios de alto valor para o xito na profisso, no menos um exame psicofisiolgico, o poder de adaptao ao meio, as condies sociais, as tendncias caracterolgicas, enfim o conjunto das personalidade.

Essa citao demonstra como a Psicologia e a tecnologia dela derivada so incorporadas pelos interesses industriais. Esse trecho mostra uma abordagem mais complexa da Psicologia, em que no somente a aptido, mas a personalidade como um todo deve ser considerada para que sejam atingidos plenamente as finalidades impostas pelo processo produtivo. A essa experincia muitas outras se seguiram, com participao de Roberto Mange. Destas deve-se destacar as relativas s empresas ferrovirias que foram, sem dvida, um dos principais alicerces da Psicologia aplicada ao trabalho no Brasil. Em 1930, foi criado o Curso de Ferrovirios de Sorocaba e o Servio de Ensino e Seleo Profissional da Estrada de Ferro Sorocabana. A essas experincias devem ser somadas as pesquisas e processos de seleo de aviadores para a Aviao Militar, realizadas pelo Laboratrio de Psicologia da Colnia de Psicopatas do Engenho de Dentro em conjunto com os Ministrios da Guerra e da Justia, com a participao de mdicos militares e a coordenao de Waclaw Radecki. Foram estas as principais experincias que deram incio aplicao da Psicologia s questes relativas ao trabalho. Aps a experincia do Liceu de Artes e Ofcios de So Paulo, seguida pelo Centro Ferrovirio e pelo IDORT, merecem destaque os trabalhos realizados nas dcadas de 30 e 40 nas seguintes organizaes: SENAI, SENAC, CMTC, Estrada de Ferro Central do Brasil, ISOPFGV, Instituto de Administrao da Faculdade de Cincias Econmicas e Administrativas da USP. Percebe-se que a Psicologia no se desenvolveu no interior de outra rea de saber, mas penetra ela j na condio de cincia autnoma para colaborar num projeto amplo, para o qual convergem diversas reas de conhecimento.

6 LINHA DE TEMPO

1752: Mathias Ayres Ramos da Silva de Ea publica Reflexes Sobre a Vaidade dos Homens ou Discursos Morais Sobre os Efeitos da Vaidade. 1794: o iluminista francs Denis Diderot publica Ensaio Sobre o Progresso do Esprito Humano. Francisco de Mello Franco publica Medicina Theologica. 1813: Francisco de Mello Franco publica Elementos de Hygiene ou Ditames Teoreticos e Prticos Para Conservar a Sade e Prolongar a Vida. 1836: Manuel Incio de Figueiredo defende no Rio de Janeiro a tese Paixes e Afetos da Alma. 1843: Jos Augusto Cesar de Menezes defende no Rio de Janeiro a tese Proposies a Respeito da Inteligncia. 1851: Francisco Tavares da Cunha defende em Salvador a tese Psicofisiologia Acerca do Homem. 1914: Arago de Souza Pinto defende a tese Da Psicanlise: A Sexualidade das Neuroses. O Psiclogo italiano Ugo Pizzoli inaugura na Escola Normal de So Paulo um Laboratrio de Psicologia Experimental. 1917: Manuel Bonfim publica Noes de Psicologia. 1918: o pediatra Fernandes Figueira comea a trabalhar com testes

psicolgicos no Hospcio Nacional, usando as provas de Binet-Simon. O psiquiatra Franco da Rocha comea a difundir a Psicanlise atravs de cursos proferidos na Faculdade de Medicina de So Paulo. 1919: Franco da Rocha publica A Doutrina de Freud. 1922: Fundada a Liga Brasileira de Higiene Mental. 1923: Waclaw Radecki chega ao Brasil. criado o Laboratrio de Psicologia do Engenho de Dentro, local em que se destacaram W. Radecki e Nilton Campos. 1924: Medeiros e Albuquerque publicam o primeiro livro brasileiro sobre os testes psicolgicos intitulado Os Testes. Isaias Alves trabalha na adaptao brasileira da escala de Binet-Simon. 1925: Ulisses Pernambucano funda em Recife o Instituto de Seleo e Orientao Profissional de Pernambuco. Loureno Filho assume a ctedra de Psicologia na Escola Normal de So Paulo. 1926: surgem os primeiros trabalhos vinculados ao Instituto de Higiene, localizado em So Paulo. 1927: Loureno Filho publica Contribuio ao Estudo Experimental do Hbito. Henri Pieron chega a So Paulo para lecionar Psicologia Experimental e Psicometria. 1929: Waclaw Radecki publica o livro Tratado de Psicologia. 1932: Jos Leme Lopes, no Rio e Sylvio Rabello, em So Paulo introduzem o Rorschach no Brasil. 1934: Plinio Olinto publica Psicologia. A disciplina de Psicologia passa a ser obrigatria em alguns cursos superiores. 1935: Sylvio Rabello publica Psicologia do Desenho Infantil. Jean Maugu inicia a lecionar Psicologia no Bacharelado em Filosofia, permanecendo at 1944.

1936: Noemi Silveira assume a ctedra de Psicologia Educacional na Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras de So Paulo. 1937: O Laboratrio de Psicologia do Engenho de Dentro foi incorporado pela Universidade do Brasil, destacando-se os trabalhos de Nilton Campos, Antonio Gomes Penna e Eliezer Schneider. 1938: Sylvio Rabello publica A Representao do Tempo na Criana. Djacir Menezes publica em Fortaleza o Dicionrio de Psicologia Pedaggica. 1939: Arthur Ramos publica A Criana Problema. 1944: Plinio Olinto traa um panorama abrangente da experimentao no volume A Psicologia Experimental no Brasil. 1945: Annita Marcondes de Cabral cria junto a Otto Klineberg a Sociedade de Psicologia de So Paulo. 1949: Fundado os Arquivos Brasileiros de Psicotcnica, posteriormente Arquivos Brasileiros de Psicologia. 1954: criada a Associao Brasileira dos Psiclogos. O peridico Arquivo Brasileiro de Psicotcnica publica um Anteprojeto de Lei sobre a formao e a regulamentao da profisso de Psiclogo. 1962: criao dos Cursos de Bacharelado e Licenciatura e da profisso de Psiclogo. A Universidade de So Paulo contrata Fred Keller. 1963: Pedro Parafita cria o Curso de Psicologia na Universidade Federal de Minas Gerais. 1965: o Regime Militar dissolve o Departamento de Psicologia da Universidade de Braslia. 1984: Helmut Krger publica Introduo Psicologia Social. 1994: um total de 111 Centros de Formao oferecem programas de graduao em Psicologia. Realiza-se na cidade de Campos do Jordo o primeiro Congresso Nacional de Psicologia.

1999: realizado em Salvador- BA o primeiro Congresso norte-nordeste de Psicologia. Aproximadamente 100.000 psiclogos encontram-se legalmente reconhecidos para praticar a Psicologia no Brasil. Morre Nise da Silveira.

PARTE III DAS CONSIDERAES FINAIS E CONCLUSO

A penetrao da Psicologia considerada como cincia autnoma no mbito da cultura brasileira deve ser vista sob o ngulo de suas determinaes locais e de seu desenvolvimento intrnseco em termos gerais. Do ponto de vista das determinaes locais, foram elas demonstradas particularmente pelos fatos denotativos da existncia de pensamento psicolgico no pas, suas caractersticas e as condies nas quais deu-se tal produo. Desde os tempos da colnia h preocupao com os fenmenos psicolgicos, revelada pelos contedos de obras oriundas de diversas reas do saber, tais como Teologia, Filosofia Moral, Pedagogia ou Medicina.

7 DAS CONSIDERAES FINAIS

Em sntese, pode-se dizer que a produo psicolgica do perodo colonial refletia as condies da sociedade na qual se inseria, no apenas por incorporar seu pensamento dominante, como tambm seus conflitos. Essa tendncia prolonga-se no sculo XIX, principalmente nas obras filosficas e teolgicas utilizadas nos seminrios e nas escolas secundrias. Nas Faculdades de Medicina do Rio de Janeiro e da Bahia sobressaemse especialmente as teses de doutoramento, muitas das quais abordando assuntos de interesse psicolgico e consistindo em importantes fontes de produo sobre fenmenos psquicos no sculo XIX. Alm das faculdades de Medicina e a elas relacionadas, surgiram os hospcios. Buscava a Medicina o saneamento da cidade, o que significava limp-las das sujeiras e imundcies que a infestavam, tanto no plano material quanto social. Fazia-se necessrio excluir do convvio social o louco, que at ento vivia errando pelas ruas ou era simplesmente enclausurado nas Santas Casas de Misericrdia ou prises. Em 1842 foi inaugurado no Rio de Janeiro o Hospcio Pedro II, em 1852, em So Paulo. Ao lado das instituies mdicas havia tambm as instituies educacionais, sobretudo seminrios, escolas secundrias e escolas normais, nas quais eram realizados estudos sobre assuntos relacionados aos fenmenos psicolgicos, tratados particularmente pela disciplina Filosofia.

necessrio reiterar que, embora tenha sido grande a produo de idias psicolgicas nesse perodo, havia uma explcita dependncia desta em relao s outras reas de conhecimento, na medida em que o pensamento psicolgico, tal como na colnia, era produzido no interior de outras reas do saber. Embora dependente, foi essa produo que se constituiu na base sobre a qual foi possvel a Psicologia desenvolver-se no perodo subseqente, tendo sido por esse meio que a preocupao com os fenmenos psicolgicos obteve tal grau de desenvolvimento que preparou o terreno, a partir do incremento de seus estudos, para que a Psicologia conquistasse as condies para tornar-se autnoma e com grau de desenvolvimento que a tornava preparada para aqui ser incorporada na condio de cincia, tal como vinha ocorrendo na Europa e nos Estados Unidos. Houve na ltima dcada do sculo XIX grandes transformaes tambm no mbito das idias psicolgicas, que lanam as bases para que possamos nos referir Psicologia como cincia autnoma. A Medicina continuou sendo um espao dentro do qual a preocupao com o fenmeno continuou a existir. Esse fato pode ser percebido nas teses de doutoramento das Faculdades de Medicina. So defendidas teses que podem ser consideradas como obras de Psicologia. Vale a pena destacar o trabalho de Ulysses Pernambucano, que produziu extensa obra na rea propriamente psiquitrica, porm concebendo a loucura sob um ponto de vista mais psicolgico que mdico, alm de ter sido ele o pioneiro no projeto de educao para deficientes mentais, produtor de pesquisas psicolgicas e formador de muitos pesquisadores nessa rea. J era possvel ver um processo de delimitao entre Psicologia e Psiquiatria, evidenciado por fatores como: a) Uma ntida diferenciao entre os autores tratados por uma e outras reas de conhecimento; b) A preocupao com fenmenos psicolgicos propriamente ditos; c) A caracterizao de alguns profissionais como produtores de

conhecimento psicolgico e aplicadores da Psicologia em diversos campos de atuao. O pensamento traou um caminho diferente daquele do pensamento mdico-psiquitrico, embora coincidissem num ponto: a tentativa de empreendimento de transformaes na sociedade brasileira com base em diferentes propostas em direo a uma maior efetividade no controle das massas urbanas, em direo formao de um novo homem para a nova sociedade. O pensamento educacional, incorporando o escolanovismo, veio a tornar-se um dos instrumentos para esse projeto de fazer o Brasil ingressar, ainda que dependentemente, no mundo industrializado. No contexto da ascenso do pensamento escolanovista, a Psicologia ganhou forte incentivo para desenvolver-se, na medida em que tal tendncia, ao colocar no indivduo seu ncleo central de preocupao e ao, ao mesmo tempo que reivindica sua cientificao, encontrar nessa cincia um de seus mais importantes pilares de sustentao. A partir das dcadas iniciais do sculo XX, a Educao tornou-se um dos principais substratos para o desenvolvimento da Psicologia em termos tericos, prticos e de formao profissional no Brasil. Os laboratrios criados nas instncias educacionais, a disciplina Psicologia nas Escolas Normais ou outras instituies formadoras de educadores e as obras pedaggicas foram os mais importantes ncleos de difuso e desenvolvimento da Psicologia considerada cientfica. necessrio diferenciar a maneira como a Psicologia conquistou sua autonomia a partir da Medicina e a partir da Educao, pois tal processo deu-se de maneira diversa nessas duas reas de conhecimento. Em relao ao pensamento mdico-psiquitrico no decorrer das dcadas iniciais deste sculo, a Psicologia foi se definindo e delimitando. Aos poucos ambas as reas de conhecimento foram de distanciando, chegando mesmo a uma relao de oposio, em muitos aspectos manifestada at hoje; isso se demonstra principalmente pelo fato de que, a partir da dcada de 30, a Psicologia e seus especialistas estiveram ausentes das instituies psiquitricas. Deve-se destacar

que hoje grupos de psiclogos e psiquiatras tm lutado juntos pela causa antimanicomial. A Pedagogia, no sendo uma cincia especfica, necessitou recorrer s cincias afins s suas necessidades para obter as bases de que necessitava, principalmente num contexto em que crescia a influncia do pensamento escolanovista. O pensamento pedaggico procurou criar condies para que a Psicologia, explicitamente reconhecida como cincia autnoma, pudesse desenvolver-se no sentido de se constituir como instrumental tcnico e conhecimento cientfico. No campo da Educao, a Psicologia foi, pois, a cincia fundamental, o que lhe permitiu desenvolver-se de tal maneira que, a partir da, pde ela ampliarse para outros campos de ao.

CONCLUSO

O Brasil, com efeito, foi um dos primeiros pases do mundo em que foi aprovada a regulamentao legal da profisso do Psiclogo (pela Lei 4.119, de 27/08/1962). O desconhecimento da Psicologia brasileira com relao s prprias origens tem razes especficas em uma abordagem metodolgica, caracterstica do positivismo radical, que inspirou a historigrafia da Psicologia tradicional, pelo menos at os anos 60. Ao desvalorizar a contribuio da cultura pr-cientfica evoluo do conhecimento humano, essa corrente restringe a histria da Psicologia ao desenvolvimento da Psicologia cientfica nos ltimos dois sculos. A excluso do domnio historiogrfico dos conhecimentos psicolgicos difundidos no seio das diferentes tradies e culturais e julgados no relevantes implica a renncia memria das razes dessa disciplina presente em tais tradies e o esquecimento das questes originais que determinam o seu surgimento, ou favoreceram sua influncia e seu desenvolvimento em especficos ambientes culturais. Outra conseqncia a reduo da Psicologia apenas Psicologia europia e norte-americana, revestidas de uma pretensa universalidade.

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

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