História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação: O indígena nos Relatórios de...

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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOACYR SREDER BASTOS CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DO BRASIL CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação: O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo e sua visão pela literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites 1 Vlademir José Luft 2 Jefferson Eduardo dos Santos Machado 3 Marcelle Barcellos Jabor 4 João Luiz Figueira Ribeiro Junior 5 Leidiane de Castro Gonçalves 6 1 Trabalho apresentado no 2º Encontro Institucional de Iniciação Científica do UniMSB, no dia 22 de novembro de 2011. 2 [email protected] , Professor Adjunto no Curso de História do UniMSB; Doutor em História Social pela UFRJ; Pesquisador e Coordenador do projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites” e Coordenador do Grupo de Estudo e Trabalho (GET) “História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação”. 3 Professor Assistente no Curso de História do UniMSB; Mestre em História Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em História Comparada da UFRJ; Pesquisador Colaborador do Programa de Estudos Medievais da UFRJ e Pesquisador Assistente no projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”. 4 Professor do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciado em História pelo UniMSB; Pós-Graduando em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”. 5 Professora do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduada em Arte e Cultura pela Universidade Candido Mendes; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”. 1

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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOACYR SREDER BASTOSCURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DO BRASIL CURSO DE

LICENCIATURA EM HISTÓRIA

História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação: O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais

e Espírito Santo e sua visão pela literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites1

Vlademir José Luft2

Jefferson Eduardo dos Santos Machado3

Marcelle Barcellos Jabor4

João Luiz Figueira Ribeiro Junior5

Leidiane de Castro Gonçalves6

Marina Aparecida Martins da Cruz7

Michelle Moraes Aniceto Neto8

Rio de Janeiro - RJ

1 Trabalho apresentado no 2º Encontro Institucional de Iniciação Científica do UniMSB, no dia 22 de novembro de 2011.2 [email protected], Professor Adjunto no Curso de História do UniMSB; Doutor em História Social pela UFRJ; Pesquisador e Coordenador do projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites” e Coordenador do Grupo de Estudo e Trabalho (GET) “História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação”. 3Professor Assistente no Curso de História do UniMSB; Mestre em História Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em História Comparada da UFRJ; Pesquisador Colaborador do Programa de Estudos Medievais da UFRJ e Pesquisador Assistente no projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.4 Professor do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciado em História pelo UniMSB; Pós-Graduando em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.5 Professora do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduada em Arte e Cultura pela Universidade Candido Mendes; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.6 Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.7 Aluna do Curso de Licenciatura em História do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”. 8 Aluna do Curso de Licenciatura em Geografia do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”.

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novembro de 2011

Apresentação

O Grupo de Estudo e Trabalho (GET) “História do Brasil (re)visitada: do

descobrimento à abdicação”, que foi proposto a partir do programa de pesquisas com o

mesmo nome, funciona, no intuito de reunir pesquisadores e interessados em uma

(re)avaliação, e uma consequente discussão, acerca da História do Brasil, em seu período

colonial, período este, compreendido entre o seu “descobrimento”, por Pedro Álvares Cabral,

e a abdicação, de D. Pedro I, ao seu trono do Brasil.

O espaço geográfico para o qual o olhar está voltado é o dos Estados de Minas Gerais

(na sua região denominada Zona da Mata Mineira), do Espírito Santo (em sua porção Sul,

entre os rios Itapemirim, ao Norte, e Itabapoana, ao Sul), de São Paulo (em sua porção

Nordeste, entre o rio Paraíba do Sul, a serra da Mantiqueira e o Estado do Rio de Janeiro,

região denominada Valo do Paraíba) e do Rio de Janeiro (em sua região denominada Norte

Fluminense, entre os rios Paraíba do Sul, ao Sul, e Itabapoana, ao Norte).

Os temas que norteiam os estudos são: O indígena, As Ordens Religiosas, Os relatos

de Cronistas e Viajantes e O Meio Ambiente e suas transformações.

Os trabalhos são coordenados pelo Professor Vlademir José Luft e têm tido lugar no 6º

andar do bloco “E”, no UniMSB, às quartas-feiras, no horário de 16:00 às 18:00 horas, com

periodicidade quinzenal.

Como já foi dito, diante do Programa de Pesquisa e do Grupo de Estudos “História do

Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação”, alguns projetos foram propostos,

sempre no sentido de tratar os indígenas, para os quais entende-se existir, no Brasil, e quem

sabe no mundo, duas maneiras de ser visto. Uma remete ao conhecimento popular, onde ele é

considerado exótico e diferente do “civilizado”, portanto, passível de ser tutelado, conforme o

caso brasileiro e sua Constituição, de 19889. A outra maneira, relaciona-se à forma de como o

mundo acadêmico-intelectual entende este elemento.

Infelizmente a tendência da historiografia brasileira tem sido de manter o elemento

índios no domínio da Antropologia e/ou da Etnologia. Isso faz com que estes trabalhos, que

são de suma importância para as respectivas áreas, fiquem sem uma visão contemporizada e

crítica da sociedade indígena. Além disso, o historiador fica com a impressão de que este

9 Título VIII – da ordem social, Capítulo VIII – dos índios, artigos 231 e 232

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assunto não faz parte de seu objeto de estudo, logo, ele não tem qualquer responsabilidade

sobre sua análise.

É evidente que se tivermos em mente um conceito de História tradicional, ou seja, a

História que se inicia, no caso brasileiro, com a chegada da armada de Pedro Álvares Cabral

em 1500, logicamente os índios anteriores a esta data não serão do âmbito da História, e os

posteriores somente o serão na medida e que complementarão o contexto europeu da época.

Para os autores desta linha, os índios aparecem somente em alguns momentos da História do

Brasil, como por exemplo com a chegada da armada de Pedro Álvares Cabral, com as

tentativas de escravização ou com os aldeamentos.

Observando a historiografia tradicional sobre o indígena brasileiro, pode-se constatar

que o índio é visto como sendo um bloco único com características gerais. Isto ocorre por

falta de conhecimento prévio de cada grupo por parte dos cronistas e dos autores posteriores a

eles. Desta maneira, o conhecimento sobre o índio brasileiro foi sendo passado de geração em

geração, de forma pouco crítica por parte do historiador.

Como consequência desta visão acrítica, a maior parte das obras sobre os índios

brasileiros não são análises que se detêm nas particularidades de cada um dos grupos.

Um bom exemplo do que acabamos de dizer é a região Norte do Estado do Rio de

Janeiro, conhecida em sua quase totalidade pela expressão “baixada dos Goitacases”,

tradicionalmente identificada como tendo sido ocupada pelos índios Goitacá10. O que acontece

ali é que encontramos nela diversos outros grupos, tais como os Puri, os Coroado e os

Coropó. Os viajantes e depois os historiadores não se preocuparam, ou não tiveram

conhecimentos suficientes, para fazer as distinções entre cada grupo. Desta maneira, foi

traçado um “modelo” do que seria o indígena e a ocupação desta área somente a partir dos

Goitacá. Esse fato tem provocado uma série de distorções na realidade da ocupação desta e de

muitas outras áreas.

Portanto, tem sido nosso objetivo trabalhar com uma sociedade, ou um grupo indígena

específico, procurando segui-lo no tempo e no espaço para entender a forma como tem vivido.

Diante disso, como já foi dito, dois projetos foram criados para dar conta deste objeto:

o primeiro trata de “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de

Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo”, apoiado pelo Programa de Iniciação Científica do

UniMSB, e o segundo de “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e

limites” fruto do GET.

10 Para a grafia dos nomes dos grupos indígenas, seguimos a convenção estabelecida pela Associação Brasileira de Antropologia - ABA, em 1953, onde normatiza que os nomes de povos e de

línguas indígenas sejam empregados na forma invariável, sem flexão de gênero e número. In: Revista de Antropologia, volume 2, número 2, São Paulo,: USP 1954, pp. 150-154

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A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites

O projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e

limites”, conduzido por seu coordenador, o professor Vlademir José Luft, e assistido pelo

professor Jefferson Eduardo dos Santos Machado, apresenta neste momento, duas vertentes: a

primeira voltada para o Rio de Janeiro e a segunda voltada para além do Rio de Janeiro,

sempre buscando revelar, como cronistas e viajantes perceberam e relataram a terra, sua

natureza, sua gente e as relações entre elas: natureza e gente.

Em sua primeira vertente, trabalha o professor e historiador João Luiz Figueiredo

Ribeiro Junior, onde estamos apresentando o painel “O índio no olhar dos viajantes Fernão

de Cardim e Jean de Léry no Rio de Janeiro do século XVI”.

Em sua segunda vertente, trabalham as professoras e historiadoras Marcelle Barcellos

Jabor e Leidiane de Castro Gonçalves, onde estamos apresentado o painel “Três por Três: os

séculos e os viajantes”.

Como arqueólogo de origem e historiador de destino, temos proposto, faz algum

tempo, a utilização e a leitura do material produzido por viajantes11 e cronistas12, entre outros

tantos, como suporte para uma das etapas do trabalho de campo da arqueologia: a busca do

sitio arqueológico13, de uma sociedade indígena, estabelecida no Brasil, seja no período

considerado histórico (a partir da chegada do elemento europeu), seja no período considerado

pré-histórico (anterior a chegada do elemento europeu).

Em nosso entender, os dados fornecidos neste material, podem proporcionar a

identificação mais segura que o encontro ocasional, de locais a serem estudados, ou mesmo

confirmar o local onde poderiam estar sendo encontrados restos da cultura material de uma

dada sociedade, representando, dessa forma, o elemento identificador, entre tantas outras

informações, do grupo indígena com o qual estaria se trabalhando.

Seguindo proposição de Pesavento (2004, p. 119)14 e buscando “... revelar os

significados perdidos do passado.” através de “... um método trabalhoso e meticuloso, ...”

onde as

11 Termo que se refere aos escritores, botânicos,naturalistas, pintores, desenhistas, astrônomos, cartógrafos e zoólogos que desenvolveram trabalhos individuais de caráter privado ou que integram

missões cientificas, principalmente após a instalação da Corte Portuguesa no Brasil. In: BOTELHO, Ângela Vianna & REIS, Liana Maria, Dicionário Histórico do Brasil: Colônia e Império, 4a

edição, Belo Horizonte: Autentica, 2003, p. 312.

12 Crônica – s. f. 1 – Narração histórica, por ordem cronológica. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa, São Paulo: Nova Fronteira, 1995.

13 Local onde se encontram restos de cultura passa. In: MENDONÇA DE SOUZA, Alfredo Augusto Castro, Dicionário de Arqueologia, Rio de Janeiro: ADESA, 1997, p. 117.

14 PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & História Cultural, 2a edição, Belo Horizonte: Autentica, 2004.

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Práticas sociais podem valer como discursos, silêncios falam, ausências revelam presenças, coisas portam mensagens, imagens de segundo plano revelam funções, canções e musicas revelam sentimentos, piadas e caricaturas denunciam irreverências, sendo de humor e deboche.

entendemos que o trato deste tema, a (re)leitura de viajantes e cronistas, é mais um dos

campos onde podem estar atuando os conceitos e pressupostos da história cultural,

principalmente quando o estivermos buscando na “... distinção entre representação e

representando, entre signo e significado, ...”, ou seja, “... entre o signo visível e o referente

por ele significado ...” (Chartier, 1990, p. 21) 15, ou um novo entendimento para estes

documentos que podem dizer muito de um tempo, de uma sociedade e de um espaço. Nada

além, nem aquém, do que entende Chartier (1990, pp. 16-17)16, quando refere-se a historia

cultural, ou seja, “... o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada

realidade social é construída, pensada, dada a ler.”.

Fazer uma (re)leitura de viajantes e cronistas, através do entendimento de seu mundo e

de suas práticas, bem como a força de seu imaginário como representação de um novo mundo,

conforme propõe Assunção (2000, p. 40)17 quando diz que

A maioria dos relatos, numa visão claramente utilitária do mundo natural, destacava as propriedades produtivas dos novos espaços, paisagens bucólicas, fauna e flora exuberante, variadas e exóticas. E as representações criadas proporcionavam uma apropriação com a idéia de paraíso terrestre de abundancia e riqueza, cuja obtenção não requeria grande esforço humano.

é, antes de mais nada, uma necessidade, para que possamos continuar a dispor desta que pode

ser uma importante fonte para entendermos uma determinada sociedade.

Movidos pela necessidade de identificar e analisar “todos” os tipos possíveis de fontes

e documentos que tenham informações sobre as sociedades indígenas do Brasil,

especialmente quando estamos tratando dos grupos Puri, Coroado e Coropó, sentimos a

necessidade de discutir18, da mesma forma que temos feito em outras áreas do conhecimento,

com pesquisadores experientes no trato com este tipo de questão, a validade no uso de fontes

escritas na busca de sociedades indígenas passadas e que possam interessar aos arqueólogos19.

15 CHARTIER, Roger. A História Cultural, entre práticas e representações, Viseu: DIFEL, 1990

16 op. cit.

17 ASSUNÇÂO, Paulo. A terra dos brasis: a natureza da América portuguesa vista pelos primeiros jesuítas (1549-1596), São Paulo: Annablume, 2000.

18 Da forma que temos feito com pesquisadores de outras áreas do conhecimento: como a Antropologia, a História, a Arqueologia, a Etnologia e a Literatura.

19 Com este mesmo objetivo, já participamos de uma mesa de discussão na reunião da Associação Brasileira de Antropologia, no seu encontro de Brasília e de um Seminário Temático na Reunião

da Sociedade de Arqueologia Brasileira, no seu encontro do Rio de Janeiro.

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Quando conseguimos identificar, localizar e ter acesso a um tipo de fonte que poderá

permitir um conhecimento mais profundo sobre os índios, ou sobre as Instituições que se

acredita serem responsáveis pelos mesmos, é um indício de que provavelmente novos dados,

ainda desconhecidos, poderão vir à tona. É assim que objetivamos melhor pensar, e quem

sabe propor, uma "metodologia" (técnica e prática) que possa utilizar a fonte escrita, em

especial a “literatura de viajantes e cronistas”, principalmente pelo arqueólogo, quando em

seu trabalho de campo, a partir das propostas e da experiência de áreas como a própria

Arqueologia, a Antropologia, a História, a Etnologia e a Literatura, entre outras.

O tema “literatura de viajante e cronistas” tem sido objeto de trabalho e de discussão

nas mais diversas áreas, desde a História até a Literatura, passando pela Antropologia,

Etnologia, Arte e até mesmo pela Sociologia. Em todas elas, busca-se uma forma de poder

utilizar este tipo de informação, este tipo de documentação, este tipo de registro, para melhor

entender as sociedades envolvidas: seja a local, indígena, seja a estrangeira, européia. Neste

momento em que as barreiras disciplinares estão sendo derrubadas, entendemos que a

Arqueologia não pode se furtar de considerar este assunto, uma vez que trata, diretamente,

com um dos elementos presentes nestes registros, documentos ou informações, o indígena.

O ponto de partida para isso seria saber quem estaria sendo considerado viajante,

cronista e/ou naturalista. É assim, que duas características principais se distinguem: “... o fato

de serem viajantes (e não habitantes) com um tempo de permanência limitado, e o de serem

estrangeiros, ou seja, habitantes de outros locais, sem propriedade territorial, nem ligações

mais estreitas e contínuas, com a população local.” (Leite, 1997, p. 161)20, sendo que os

mesmos teriam como objetivo principal “... observar o estado das povoações e indagar a sua

história, religião, costumes, artes, economia, comércio, alimentos, medicina, indumentária,

habitações, armas, guerras, funerais, etc...” (Leite, 1997, p. 201)21.

Dentro deste panorama e considerando que “Um viajante ... é uma espécie de

historiador. Seu dever é contar o que viu e o que ouviu. Não deve inventar, mas também não

deve omitir ...” (Isabelle, 1949 – p. 33)22, entendemos, como Reichel (2003, p. 2)23, que

Os depoimentos dos viajantes, com explicações e aparato crítico adequados, contribuem para uma melhor e mais enriquecida compreensão do passado. Temos que cuidar, porém, para não se cair na armadilha de aceitarmos as suas descrições e informações como sendo a própria e única realidade.

20 - LEITE, Miriam Lifchitz Moreira. Livros de Viagem (1803-1900), Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1997

21 - op. cit.

22 - ISABELLE, A. Viagem ao Rio da Prata e ao Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro: oooooo, 1949

23 - REICHEL, Heloisa Jochims. Os relatos dos viajantes como fonte para estudo da história, Dissertação de Mestrado, São Leopoldo: UNISINOS, 2003

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Outro ponto a ser considerado na utilização deste tipo de fonte, são os significados

implícitos, direta ou indiretamente, nos textos e/ou nas imagens. De acordo com Reichel

(2003, p. 2)24 “Para utilizarmos as representações dos viajantes como fonte histórica, é

necessário, portanto, decifrar o seu significado, articulando texto e contexto.”

Como ela, também entendemos que Chartier (1990, pp. 16-17)25 deve ser considerado,

principalmente quando propõe uma análise das práticas e das representações sociais derivadas

de uma tradição cultural historicamente estabelecida. Para ele, esta análise, “... tem por

princípio identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada

realidade social é construída, pensada, dada a ler.”, onde “As representações do mundo

social assim construídas ... são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as

forjam.” e “As percepções do social não são de forma alguma discursos neutros ...”.

Ainda segundo Chartier (1990, p. 17-18)26,

Deste modo, espera-se acabar com os falsos debates desenvolvidos em torno da partilha, tida como irredutível, entre a objetividade das estruturas (que seria o terreno da história mais segura, aquela que, manuseando documentos seriados, quantificáveis, reconstrói as sociedades tais como eram na verdade) e a subjetividade das representações (a que estaria ligada uma outra história, dirigida às ilusões de discurso distanciados do real).

É desta forma, que os próprios naturalistas, viajantes ou cronistas, como Wied (1940,

p. 399)27 pensam, discutem e elaboram o problema: “O fato é que raramente se encontram

reunidas todas as coisas agradáveis e interessantes como o imagina um autor sentado em sua

poltrona, depois de haver retirado suas descrições de viajantes acostumados a representar

tudo com exagerada beleza.”.

Dentro desta perspectiva e levando em levando em consideração Cardoso & Brignoli

(1983, p. 429)28 onde

A pesquisa científica é, antes de mais nada, uma busca de respostas a certos problemas. Obviamente, ressalvada a redundância, a pesquisa científica só pode resolver problemas científicos, isto é, questões colocadas com base teórica que possam ser submetidas a algum tipo de prova ou verificação.

24 - op. cit.

25 - CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações, Lisboa: DIFEL, 1990

26 op. cit.

27 - WIED, Maximilian. Viagem ao Brasil nos anos de 1815 e 1817, São Paulo: editora Nacional, 1940

28 - CARDOSO, Ciro Flamarion & BRIGNOLI, Hector Perez. Os métodos da história, 3a edição, Rio de Janeiro: edições Graal, 1983

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e entendendo a “metodologia” como os meios práticos e teóricos pelos quais um pesquisador

busca resolver determinado problema ou tratar determinado objeto de estudo, apresentamos

nossa sugestão e a forma como estamos trabalhando este tema.

Antes disso, é imprescindível ressaltar, que a parte técnica de um trabalho deve estar,

sempre, de acordo com a teoria proposta, uma vez que acreditamos ser ela quem determina a

técnica, que por sua vez nos permite chegar ao objetivo proposto. Também, vale lembrar que

a teoria, entendida como o conjunto de princípios fundamentais de caráter racional que

norteiam o ato de realizar uma tarefa, estaria presente em tudo o que fazemos. Neste sentido,

Kern & Schmitz29 concordam com o exagero nas "discussões teóricas" em algumas situações

da arqueologia, principalmente a brasileira. Para eles, e entendemos ser verdadeira tal

afirmativa, em tudo o que realizamos há uma teoria implícita, proposta, testada e

concretizada. Dessa forma, concordando com Becker (1993, pp. 12-13)30, entendemos que “...

toda pesquisa tem o propósito de resolver um problema que, em aspectos importantes não é

parecido com nenhum outro problema, e deve fazê-lo dentro de um ambiente específico

diferente de todos os que existiram antes.".

Por isso, ainda como Becker (1993, p. 12)31, preferimos "... um modelo artesanal de

ciência, no qual cada trabalhador produz as teorias e métodos necessários para o trabalho

que está sendo feito.".

De acordo com isso, nosso objeto de estudo nesta oportunidade, a “fonte escrita”,

requer um tratamento específico para que possamos chegar ao resultado desejado, conforme

exposto nos objetivos estabelecidos. Deve-se frisar que o objetivo maior é identificar

informações sobre os grupos indígenas Puri, Coroado e Coropó.

A primeira questão sobre estas fontes é o fato de poderem ser divididas, em termos de

existência, em dois tipos principais: pela autoria e pela forma32. Na primeira estariam

inseridos documentos produzidos por viajantes, cronistas, religiosos, historiadores e

pesquisadores em geral e por documentos produzidos pelo Estado. Quanto a forma, poderiam

ser cartas, relatórios, decretos, ofícios, instruções, mapas, plantas, cartas topográficas e livros,

entre outras.

Além disso, por sua vez, o tipo de informações apresentadas por estes documentos,

está dividida em três grandes grupos, aqui apresentados na ordem de importância no que se

29 - Comunicação oral em Simpósio do IX Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira, Rio de Janeiro, 1997.

30 - BECKER, Haward S. Métodos de Pesquisa em Ciências Sociais, Coleção Ciências Sociais, volume 31, São Paulo: Hucitec, 1993

31 - op. cit.

32 - LUFT, Vlademir José; AMANTINO, Marcia Sueli & MACEDO, Jacqueline. Programa Arqueológico Puri-Coroado: Elementos para uma tipologia de sua fontes históricas. In: Revista da

Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica, número 12, Curitiba, 1997, pp. 91-95

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refere a frequência com que aparecem: origem e dispersão, modo de vida e estrutura física, e

aldeamentos.

Dentre estes documentos, os principais, que nos informam sobre os grupos indígenas,

são os relatos de "viajantes" e "cronistas" que passaram pelo território nacional desde o

princípio do século XVI até o final do século XIX.

Contudo, este grupo de documentos apresenta, em maior ou menor escala, problemas

de ordem prática, como por exemplo, o elevado etnocentrismo e o pouco, ou nenhum,

conhecimento sobre as diversas tribos que pretendiam descrever e analisar. Estes problemas

são ainda mais sérios na medida em que recuamos no tempo, uma vez que as obras não devem

ser totalmente confiáveis, devido principalmente às inúmeras falhas nas descrições.

Todavia, ainda que apresentando problemas, estas obras, se lidas com um olhar crítico

e atento, permitem atingir, ainda que de forma frágil, o universo destes grupos, ou seja, suas

características físicas, culturais, religiosas, políticas e econômicas. Além disso, permitem-

nos também um contato com o meio ambiente que os cercavam, propiciando assim, subsídios

para as análises de paleo-ambiente, de paleo-flora e de paleo-fauna.

Para finalizar, devemos ressaltar outros dois fatos. O primeiro é que este nosso

trabalho esta elaborado no sentido de ser mais uma proposta para tratar, ou melhor tratar, o

tema de viajantes e cronistas, como todos os outros que tem sido apresentados. Pensamos que

uma classificação quanto a forma e ao conteúdo possa ser o primeiro indicativo para um guia

de consulta, leitura e utilização.

O outro fato, diz respeito à forma como estaríamos entendendo a Arqueologia. Faz

tempo, deixamos de vê-la como algo único e independente, embora interdisciplinar, para vê-la

como uma técnica a serviço da História, talvez na mesma proporção que percebemos a

História Oral para a História. É assim que o material arqueológico, ou a cultura material,

passa a ser apenas mais um tipo de documento a ser analisado, sendo o “sítio arqueológico”

nada mais que o arquivo onde estão depositados os documentos, de origem cerâmica, óssea,

vegetal, alimentar, lítica, pictográfica, etc, que servirão para reconstituir, historicamente, com

a técnica arqueológica, aquela sociedade, em seu tempo e em seu espaço. Sociedade esta

buscada intencionalmente, e não encontrada aleatoriamente. Por isso a necessidade de buscar

informações em documentos como os de viajantes e cronistas, entre outros.

É importante ressaltar ainda, que com isso não estamos desvalorizando o trabalho do

arqueólogo e as diversas técnicas de análise e de pesquisa dos mais diversos tipos de restos

materiais (cultura material), transformados agora, e dessa forma, em documentos e de seu

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constante aprimoramento, mas devemos lembrar que estas (técnicas) não são da arqueologia,

mas das mais diversas áreas correlatas e na maioria das vezes distintas, com utilização e, em

alguns casos, aprimoramento pela arqueologia.

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O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de

Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo

O projeto de pesquisa “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do

Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo”, conduzido por seu coordenador, o

professor Vlademir José Luft, e assistido pelo professor Jefferson Eduardo dos Santos

Machado, apresenta neste momento, duas vertentes: a primeira voltada para a Província do

Espírito Santo e a segunda voltada para a Província de Minas Gerais, sempre buscando

revelar, o elemento indígena é percebido e relatado nos Relatórios de Presidente de Província

no período de 1840 a 1870.

Em sua primeira vertente, trabalha a Licencianda em História Michelle Moraes

Aniceto Neto, onde estamos apresentando o painel “Os Relatórios de Presidente de Província

do Espírito Santos” e em sua segunda vertente, trabalha a Licencianda em Geografia Marina

Aparecida Martins da Cruz, onde estamos apresentado o painel “Os Relatórios de Presidente

de Província das Minas Gerais”.

Se, como já dissemos, existem duas maneiras de entendermos o elemento indígena no

Brasil, e quem sabe no mundo, e diante disso nosso objetivo é trabalhar com uma sociedade

ou um grupo indígena específico, procurando segui-lo no tempo e no espaço para entender a

forma como tem vivido, nesse trabalho estaremos utilizando os Relatório de Presidente de

Província do Rio de Janeiro, de Minas Gerais e do Espírito Santo, no período de 1840 a 1870.

Nossos objetivos principais são:

1. Analisar os RPP identificando os relatos sobre indígenas;

2. Identificar os grupos indígenas relatados nos RPP;

3. Identificar, nos relatos sobre os grupos Puri e Coroado, a cultura material, o modo de

vida, a estrutura social, a estrutura física e as relações internas e externas desses grupos

presentes nos relatos;

4. Associar os elementos identificados sobre os grupos Puri e Coroado, nos RPP, com as

referencias correlatas sobre indígenas no Brasil;

Tendo como referencial as obras de Curt Nimuendaju, “... o mais profundo

conhecedor dos aborígines do Brasil em seu tempo.” (Correa Filho, 1987, p. 9)33. Dentre elas,

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o mapa etno-histórico34 é nossa obra de referência, como tem sido para qualquer estudo sobre

indígenas no Brasil. Além disso, as obras, bem como todas as informações e referências

produzidas por Wilhelm Ludwig Eschwege, Manoel Aires de Casal, Maximilian Wied, Simão

de Vasconcelos, Gabriel Soares de Souza, Nelson Coelho de Senna, Pero de Magalhães

Gandavo, Alberto Lamego, Augusto de Carvalho, Guido Marlière, Alberto Noronha de

Torrezão e Pizarro, serão de extrema necessidade e valia. Ressalvamos que essa relação de

autores, que não representa a totalidade sobre o assunto, nem o esgota, será usada apenas

como ponto de partida para nosso trabalho.

Devido ao pouco conhecimento e às poucas referências sobre os Puri e Coroado, não

será possível encontrar, em uma única biblioteca ou arquivo, todas as informações

necessárias. Assim, trabalharemos, principalmente nessa etapa do projeto, com os Relatórios

de Presidente de Província, disponíveis, digitalmente em http://www.crl.edu/brazil/provincial.

Por ser um trabalho de longa duração, com, em principio, cinco etapas, claramente

definidas, e com interação teórico-metodológica e prática de várias áreas do conhecimento, os

objetivos aqui apresentados não poderiam deixar de ser amplos. Dessa forma, cada um dos

objetivos representam uma etapa de trabalho, para a qual objetivos específicos deverão ser

estabelecidos.

É importante deixarmos claro que a sequência das etapas não significa que uma deva

ser concluída para que a seguinte seja iniciada. Assim, várias etapas poderão estar em

andamento concomitantemente, sem prejuízo algum para a pesquisa ou para o projeto. São

etapas complementares e não excludentes. Eis, portanto, nossos objetivos gerais:

1. Localizar geográfica e temporalmente, através de fontes primárias e/ou secundárias,

os grupos Puri e Coroado existentes na área determinada para estudo, entre os séculos

XVI e XX.

2. Identificar a partir das fontes bibliográficas, entre outras coisas, a cultura material, o

modo de vida, a estrutura social, a estrutura física e as relações internas e externas

desses grupos.

3. Relacionar as diferentes hipóteses, afirmações ou fatos existentes nessas fontes

bibliográficas e que dizem respeito à origem dos Puri e Coroado.

4. Consultar as populações atuais, das regiões mencionadas nas fontes, no sentido de

confirmar, ou não, as informações bibliográficas a respeito das localizações e

possíveis restos desses grupos indígenas.

34 IBGE. Mapa etno-histórico de Curt Nimuendajú, Rio de Janeiro: IBGE, 1987

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5. Verificar, em campo, os locais apresentados pelas informações bibliográficas e

reconhecidos pelas informações da população regional como sendo de assentamento

Puri e/ou Coroado.

Como dezenas de pequenos grupos indígenas brasileiros, principalmente os de língua

isolada, acerca dos índios Puri e Coroado existem pouquíssimos relatos.

Considerados selvagens e sem alma, como o restante dos indígenas americanos, além

de muito ferozes, resistentes e de difícil contato, até o século XVII, esses grupos são muito

pouco citados e descritos pelos viajantes e cronistas.

A partir do século XVIII, com a ocupação mais intensa do território brasileiro e com a

chegada, em maior número, de viajantes com o intuito de identificar, catalogar e descrever a

fauna, a flora e a geografia, essa situação se modificou.

Nos séculos XIX e XX, a Antropologia e a Etnologia estiveram mais voltadas para os

grupos maiores e “mais ricos” culturalmente. O aldeamento, pacífico, acabou por ser a única

saída para alguns grupos, como o caso dos Coroado de São Fidélis. Aos Puri, grupos mais

rebeldes, nem mesmo sua extinção foi motivo de notícias. Hoje, raríssimos remanescentes

escondem sua descendência. Um quadro caótico para grupos que dominaram parte dos sertões

das Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais.

No que diz respeito ao conhecimento sobre os Puri e Coroado, as informações

existentes dão conta, de modo geral, de suas origens e de sua distribuição geográfica. Os

autores que mais e melhor discorrem sobre esses assuntos são Eschwege (1881)35, Wied

(1989)36, Carvalho (1888)37, Casal (1976)38 e Reis (1979)39.

Outras informações, como as de cunho etnográfico, que deem conta da cultura, do

modo de vida, da estrutura física, da estrutura social e de suas relações internas e externas,

entre outras coisas, não são comuns.

Por sua vez, os Relatórios de Presidente de Província, nossa fonte principal neste

projeto, embora de origem confiável, traz consigo alguns problemas que não merecem aqui o

tratamento, mas que os fazem ser excluídos das relações de fontes de trabalhos acadêmicos

cotidianos.

35 ESCHWEGE, Wilhelm Ludwig. Diário do Brasil ou notícias diversas acerca do Brasil (Journal von Brailien), Edição do GR. H. S., Landes Ind. Comp., Weimar, 1818. Tradução da Dra.

Lúcia L. Lahmeyer, Rio de Janeiro: IHGB, 1946.

36 WIED, Maximilian. Viagem ao Brasil, , Coleção Reconquista do Brasil, volume 156, série 2, Belo Horizonte: Itatiaia / EDUSP, 1989

37 CARVALHO, Augusto de. Apontamentos para a história da Capitania de São Thomé,. Campos,Typ. e Lith. de Silva, Carneiro e Co, 1888

38 CASAL, Manuel Aires de. Chorographia brasileira ou relação histórico-geográfica do Reino do Brasil, , Coleção Reconquista do Brasil, volume 27, Belo Horizonte: Itatiaia / EDUSP, 1978.

39 REIS, Paulo Pereira dos. O Indígena do Vale do Paraíba: apontamentos históricos para o estudo dos indígenas do vale do Paraíba e regiões circunvizinhas, Coleção Paulística, volume XVI,

São Paulo: Governo do Estado de São Paulo, 1979.

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Entendendo a metodologia como os meios práticos e teóricos pelos quais um

pesquisador busca resolver determinado problema ou tratar determinado objeto de estudo,

apresentamos a seguir a maneira como trabalharemos os grupos indígenas Puri e Coroado.

Devemos ressaltar, ainda, que a parte técnica do trabalho deve estar, sempre, de acordo

com a teoria proposta, uma vez que acreditamos ser ela quem determina a técnica, que por sua

vez nos permite chegar ao objetivo proposto.

Com o intuito de facilitar e de melhor orientar a pesquisa, preparamos, com base nas

obras de Wied40, Casal41, Lamego42, Teixeira43 e Pizarro44, uma série de palavras-chave que

nos guiarão durante toda a pesquisa com as fontes bibliográficas. Esta lista de termos-chave

deverá ser, com toda a certeza, alterada no decorrer do tempo. Assim, novos termos serão

acrescentados a ela e muitos, já existentes, deixarão de ser utilizados. Em momento algum os

termos que deixados de ser utilizados serão retirados da listagem, uma vez que com isso

poderemos mostrar, com facilidade, a evolução da pesquisa.

Toda a referência bibliográfica consultada será fichada, retirando-se dela localizações,

descrições a respeito da cultura material, do modo de vida, da estrutura social, da estrutura

física dos indivíduos, das relações internas e externas dos grupos, bem como todas as

referências a autores e trabalhos sobre o assuntos.

No que diz respeito ao contato com as populações, no sentido de verificar as

informações obtidas com a bibliografia, a abordagem para obtenção de informações acontece

sempre com a cordialidade e paciência, tendo como intuito, saber da existência de registros

rupestres, de material cerâmico, de material lítico e de enterramentos. A linguagem usada para

tal deve ser, sempre, compatível com o nível das pessoas com as quais se está trocando

informações. Assim, os registros rupestres podem vir a ser “desenho”, o material lítico ser

“pedra de curisco”, os enterramentos serem “cemitério de caboclo” e o material cerâmico ser

“pote de barro”.

Três por Três: os séculos e os viajantes45

40 op. cit.

41 op. cit.

42 LAMEGO, Alberto Ribeiro. A Terra Goytacá, 8 volumes, Paris: L’Édittion D’Art 1913.

43 TEIXEIRA, Francisco Camargo. Bom Jesus de Itabapoana, Academia Bonjusuense de Letras, Rio de Janeiro: EDUF / DAMADA, 1985.

44

45 Fazendo referência à escolha de três viajantes e cronistas e aos séculos XVI, XVII e XVIII.

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Marcelle Barcellos Jabor46

Leidiane de Castro Gonçalves47

Vlademir José Luft48

Colaboradores:Jefferson Eduardo dos Santos Machado49

João Luiz Figueira Ribeiro Junior50

Marina Aparecida Martins da Cruz51

Michelle Moraes Aniceto Neto52

Na segunda parte do projeto de pesquisa “A leitura de Viajantes e Cronistas: suas

possibilidades e limites” apresentamos o painel, “Três e Três: os séculos e os viajantes”, onde

nossa proposta limita-se a análise de três viajantes, respeitando a temporalidade estabelecida

pelo projeto. Assim, entram em nossa discussão os relatos de Olivier VAN NOORT53 que

esteve em terras brasileiras em 1599, François Pyrard de LAVAL54 em 1610 e, John BYRON

em 176455.

Nosso estudo se utiliza de um gênero histórico como análise, a crônica. Este padrão

surgiu na Europa durante a Idade Média e o Renascimento, primeiramente em latim e depois

46 Professor do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciado em História pelo UniMSB; Pós-Graduando em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.47 Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.48 [email protected], Professor Adjunto no Curso de História do UniMSB; Doutor em História Social pela UFRJ; Pesquisador e Coordenador do projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites” e Coordenador do Grupo de Estudo e Trabalho (GET) “História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação”. 49Professor Assistente no Curso de História do UniMSB; Mestre em História Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em História Comparada da UFRJ; Pesquisador Colaborador do Programa de Estudos Medievais da UFRJ e Pesquisador Assistente no projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.50 Professora do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduada em Arte e Cultura pela Universidade Candido Mendes; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.51 Aluna do Curso de Licenciatura em História do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”. 52 Aluna do Curso de Licenciatura em Geografia do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”.53 “... primeiro marítimo da nação holandesa e o quarto do mundo... a dar a volta ao globo terrestre.” In. FRANÇA, Jean Carvalho e RAMINELLI, Ronaldo. Andanças pelo Brasil Colonial: catálogo comentado (1503-1808). São Paulo: UNESP, 2009. p. 41.54 “... autor da primeira narrativa francesa sobre as Índias Orientais...” In. FRANÇA & RAMINELLI, 2009, p. 4555 A ele coube “... testar a eficácia do novo revestimento do casco que a Real Armada pretendia adotar, o revestimento com placas de cobre. A embarcação escalada para essa viagem foi uma fragata de fabricação inglesa, construída em 1751, o Dolphin.” FRANÇA & RAMINELLI, 2009, p. 143.

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em outras línguas, como o Português: “O sentido tradicional do termo decorre de sua

etimologia grega (Khronos=tempo): é o relato dos acontecimentos em ordem cronológica.

Sua parenta mais próxima: anais.”56.

A intenção é ver embutido nos relatos de viajantes e cronistas, as características

econômicas, políticas, sociais, ambientais da colônia portuguesa na América, porém por um

olhar imparcial, viajantes que utilizavam-se da costa brasileira muita das vezes apenas para

abastecimento ou reparos de seus navios. Compreendendo57 em seus relatos o afastamento da

realidade colonial, já que é notável que muitos viajantes demonstraram uma certa aversão à

Colônia.

Nossa intenção na escolha dos viajantes foi puramente estabelecer uma ordem

temporal, portanto tivemos o cuidado em optar por três viajantes de diferentes séculos e

também de nacionalidades distintas, usando como fonte França e Raminelli58.

Partindo do pressuposto de que “todo dizer é ideologicamente marcado”59 comecemos

nossa discussão pelos relatos do capitão holandês Van Noort, que estava à frente da esquadra

da recém criada Companhia de comércio de Roterdam. Designado á ir ao Pacífico atacar e

saquear o maior número possível de possessões espanholas. Sua esquadra de quatro navios

saiu do porto de Roterdam em 13 de setembro de 1598, com destino á Inglaterra e em seguida

á costa africana: “No dia 6 de fevereiro de 1599, a frota avistou Cabo Frio e, no dia 9, lançou

ferro na entrada da baía de Guanabara, onde, mal recebida, permaneceu por somente três

dias.”60.

Para uma maior compreensão do trajeto percorrido pelo capitão Van Noort, nos

servimos do Mapa da costa do Estado de Rio de Janeiro, o mapa é recente, porém está

demarcado o trajeto percorrido, via navegação, pelos viajantes durante os séculos XVI, XVII

e XVIII (Mapa 1).

56 COUTINHO, Afrânio. Notas de Teoria Literária. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. 10357 “Compreender é saber como um objeto simbólico (enunciado, texto, pintura, música, etc.) produz sentido. É saber como as interpretações funcionam.” In. ORLANDI, Eni P. Análise de Discurso. 8ªed. Campinas, SP: Pontes, 2009. p. 26.58 FRANÇA & RAMINELLI, 2009.59 ORLANDI, Eni P. Análise de Discurso. 8ªed. Campinas, SP: Pontes, 2009. p. 38.60 FRANÇA & RAMINELLI, 2009, p. 42.

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Mapa ... 61

Van Noort e sua tripulação não foram bem recebidos no Rio de Janeiro, logo que

desembarcaram no porto foram indagados por homens enviados pelo governador, a fim de

saber de onde eram e o que pretendiam: “Respondemos que éramos flamengos e que

desejávamos obter algumas frutas e provisões em troca de dinheiro ou mercadorias, ou seja,

desejamos negociar com eles.”62. No dia seguinte, apenas o que conseguiram foram algumas

laranjas, fato que deixava claro que eles não eram bem vindos na região, “demonstração

evidente da má vontade do governo para conosco”63.

O holandês, Van Noort foi aqui o viajante representante do século XVI. Agora para o

século XVII, optamos por um francês, ou que supostamente é conhecido como francês por

participar da expansão marítima francesa, o marinheiro Laval. Este aponta no litoral brasileiro

em agosto de 1610, vindo do Oriente e a caminho da França “farto da vida do Oriente, o

suposto francês pôs-se a caminho de casa”64.

Depois de passar pela ilha de Santa Helena, na África, sua embarcação chega à Baía de

todos os Santos, onde permanece por dois meses, tempo em que despendeu para contratar

franceses e preparar-se para a viagem de volta ao porto de La Rochelle na França. O livro de

Laval reúne uma série de importantes e detalhadas informações geográficas da Baía, são

freguesias, fortificações, disposição de igrejas, dos principais prédios de Salvador da Bahia, o

comércio, os hábitos, o comportamento e a beleza das mulheres.

61 Mapa Caminhos na região do sal no decorrer dos séculos, in: Projeto Inventário de Bens Culturais Imóveis: Desenvolvimento Territorial dos Caminhos Singulares do Estado do Rio de Janeiro, Governo do Estado do Rio de Janeiro/Sebrae-RJ, 2004, p. 70, apud FIGUEIREDO, Eduardo Rodrigues. Notas para a história de Maricá, Anuário geográfico do Estado do Rio de Janeiro. IBGE, Conselho Nacional de Geografia, 1952. Acesso em: 18 de Novembro/2011. http://www.sebraerj.com.br/custom/pdf/cam/sal/00_CaminhoDoSal_FULL.pdf. 62 FRANÇA & RAMINELLI, 2009. p. 43.63 FRANÇA & RAMINELLI, 2009. p. 4364 FRANÇA & RAMINELLI, 2009. p. 45.

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Nesta terra do Brasil os portugueses não tem gente suficiente para povoar e ocupar a costa, onde tem grande quantidade de cidades, fortalezas e belas casas nobres, até vinte e trinta léguas pelo sertão. Há senhores que possuem grandes territórios e neles muitos engenhos de açúcar, ao quais territórios lhe há dado El-rei de Espanha em recompensa de algum serviço e são erguidos em título de alguma dignidade, como baronia, condado, etc.65

Estas terras são cedidas pelos senhores a quem se propuser habitá-la e cultivá-la,

pagando por isso um “tostão”. Nesse arrendamento são construídas casas, plantam-se variados

tipos de sementes, e cria-se galinha, gado e outros. Mas aos olhos de Laval, esse não deveria

ser um negócio muito lucrativo, já que menciona em seus relatos que o Brasil era uma terra

impossível de habitar: “Esta terra do Brasil é pois, tão má, que seria impossível habitá-la e

permanecer por muito tempo”66.

Os registros deixados por Laval são de fundamental importância, não só pela riqueza

de detalhes nas descrições, mas também pelo período e pela localização. Data do século XVII,

quando a Bahia era ainda a capital do Estado do Brasil (Mapa 2): “Não restam dúvidas de que

Laval e seus informantes construíram um mapa com as mais estratégicas informações da

capital do Estado do Brasil, dados indispensáveis para uma possível invasão.”67.

Mapa ... 68

65LAVAL. In. NASCIMENTO, Ana Luiza Serrano da Silva. Impressões e sensações de François Pyrard de Laval nas suas Andanças pela Baía de todos os Santos em 1610. XIV Encontro Reginal da ANPUH-RIO: Memória e Patrimônio. 2010. p.5. Acesso em: 19 de Novembro/ 2011. http://www.encontro2010.rj.anpuh.org/resources/anais/8/1276685841_ARQUIVO_ANPUH.pdf 66 NASCIMENTO, 2010, p. 6.67 FRANÇA & RAMINELLI, 2009, p. 48.68 La Baie de Tous-les-Saints. (Dessin de Ph.Guittau, 1647, BN Paris) In. FRANÇA 2009, p.47.

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Fato interessante a ser destacado é que o período em que Laval e também Van Noort

estiveram no Brasil, esses relatos devem ser analisados e entendidos acerca da história da

União Ibérica, período entre os anos de 1580 a 1640.

Já para a análise do século XVIII, optamos em estabelecer diálogo com o inglês

Byron. Saiu de Plymouth, na Inglaterra, no dia 3 de julho de 1764, e dez dias depois estava na

Ilha da Madeira. Em seguida, seu navio esteve nas Canárias em Cabo Verde: “Abastecidos...

dirigiu-se para o porto do Rio de Janeiro, o qual foi alcançado no dia 5 de setembro”69 do

mesmo ano, onde permaneceu por somente 45 dias (Mapa 3).

Mapa ... 70

Seus relatos acerca das características do Brasil são muito ricos em detalhes. Fala-se

da autoridade do vice-rei na colônia, a cor dos habitantes, a comercialização de negros, a vida

de prazeres de portugueses já casados e, a condição feminina. “Os homens locais são

excessivamente ciumentos; se um estrangeiro olha em demasia para uma mulher, ele corre

sério risco de ser alvo da fúria de um marido ou de um pai mais zeloso.”71.

Neste trabalho nos propusemos à análise de somente três viajantes, porém Laval,

parece que sai do propósito do tema, por ter ido ao Nordeste do território brasileiro, já que o

69 op.cit. p. 14370 “Mappa Geographica Regni Brasiliae” de Georg Matthäus Seuter (Ca. 1735). In. TEIXEIRA, Dante Martins. Toas as criaturas do mundo: a arte dos mapas como elemento de orientação geográfica. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material. São Paulo, 2009. Acesso em: 19 de novembro de 2011. http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-47142009000100009&script=sci_arttext 71 FRANÇA & RAMINELLI, 2009, p. 145.

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nosso enfoque maior é a região Sudeste. Mas não cabe a nós fazermos delimitações por agora,

porém, estamos atentos a essas questões. A análise das obras também não está feita em sua

totalidade, por enquanto ela se limita à citações e referências de outros autores. Porem

optamos aqui em expressar as ideias e impressões de cada um dos viajantes ou/e cronistas

escolhidos para análise. Partindo da ideia que o autor, “não entendido, é claro, como o

indivíduo falante que pronunciou ou escreveu o texto, mas o autor como princípio de

agrupamento do discurso, como unidade e origem de suas significações, como foco de sua

coerência.”72.

Referencial Bibliográfico:

COUTINHO, Afrânio. Notas de Teoria Literária. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

FIGUEIREDO, Eduardo Rodrigues. Notas para a história de Maricá, Anuário geográfico do Estado do

Rio de Janeiro. IBGE, Conselho Nacional de Geografia, 1952. Acesso em: 18 de Novembro de 2011.

Disponível em http://www.sebraerj.com.br/custom/pdf/cam/sal/00_CaminhoDoSal_FULL.pdf.

FRANÇA, Jean Carvalho, Ronaldo Raminelli. Andanças pelo Brasil Colonial: catálogo comentado

(1503-1808). São Paulo: UNESP, 2009.

FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. 19ªed. São Paulo: Loyola, 2009.

NASCIMENTO, Ana Luiza Serrano da Silva. Impressões e sensações de François Pyrard de Laval nas

suas Andanças pela Baía de todos os Santos em 1610. XIV Encontro Reginal da ANPUH-RIO:

Memória e Patrimônio. 2010. Acesso em: 19 de Novembro de 2011. Disponível em

http://www.encontro2010.rj.anpuh.org/resources/anais/8/1276685841_ARQUIVO_ANPUH.pdf

ORLANDI, Eni P. Análise de Discurso. 8ª ed. Campinas, SP: Pontes, 2009.

TEIXEIRA, Dante Martins. Toas as criaturas do mundo: a arte dos mapas como elemento de orientação

geográfica. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material. São Paulo, 2009. Acesso em: 19 de

novembro de 2011. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-

47142009000100009&script=sci_arttext

72 FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. 19ªed. São Paulo: Loyola, 2009.

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Os Relatórios do Presidente da Província das Minas Gerais

Marina Aparecida Martins da Cruz73

Vlademir José Luft74

Colaboradores:Jefferson Eduardo dos Santos Machado75

Marcelle Barcellos Jabor76

João Luiz Figueira Ribeiro Junior77

Leidiane de Castro Gonçalves78

Michelle Moraes Aniceto Neto79

Apresentação

Integrante, inicialmente, da capitania do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais e

separada, primeiramente do Rio de Janeiro, em 1709, por Carta Régia, e posteriormente de

São Paulo, em 1720, por Alvará, Minas Gerais tornou-se província a partir de 1821, devido ao

juramento de D. João, em obediência às leis portuguesas, estas Capitanias passaram a ser

denominadas Províncias, confirmadas pela Constituição Outorgada de 1824 (Cunha, 2007)80.

73 Aluna do Curso de Licenciatura em História do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”. 74 [email protected], Professor Adjunto no Curso de História do UniMSB; Doutor em História Social pela UFRJ; Pesquisador e Coordenador do projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites” e Coordenador do Grupo de Estudo e Trabalho (GET) “História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação”. 75Professor Assistente no Curso de História do UniMSB; Mestre em História Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em História Comparada da UFRJ; Pesquisador Colaborador do Programa de Estudos Medievais da UFRJ e Pesquisador Assistente no projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.76 Professor do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciado em História pelo UniMSB; Pós-Graduando em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.77 Professora do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduada em Arte e Cultura pela Universidade Candido Mendes; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.78 Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.79 Aluna do Curso de Licenciatura em Geografia do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”.80 CUNHA, Alexandre Mendes. Minas Gerais, da capitania à província: elites políticas e administração da fazenda em um espaço em transformação, tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História da

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Mapa1: Província das Minas Gerais81

Com um perfil específico, os relatórios do Presidente da Província das Minas Gerais82

têm sido apresentados na abertura da Assembleia Legislativa Provincial (figura 1) relatando,

de forma geral, os mais diversos eventos, desde a casa imperial, passando pela polícia,

pelas leis, pela educação, pela igreja, pelas obras públicas, pela iluminação pública,

pela saúde pública, pelos hospitais, pela vacinação, pelos impostos, arrecadação e finanças,

pelos índios e a catequese, pelas colônias e os imigrantes, pela municipalidade,

pelo judiciário, pelo executivo, e por informações de caráter geral, apresentados em mapas e

estatísticas, como os apresentados no relatório de 184383, onde consta um mapa das estradas

do Parahynuna no ano de 1843 (figura 2), ou no relatório de 1844, onde consta um mapa dos

indivíduos mortos e feridos durante rebelião em 1842 (figura 3).

Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2007.81Mappa da Provincia de Minas Geraes levantado pelo Coronel de Engenharia Barão e Eschwege em MDCCCXXI e aumentado em 1826 por Luiz Maria da Silva Pinto, disponível em82 Disponíveis emhttp://www.crl.edu/brazil/provincial/minas_gerais, consultados entre julho e outubro de 2011.83Exposição feita pelo exm. conselheiro Bernardo Jacintho da Veiga, na qualidade de presidente da provincia de Minas Geraes, a seu successor, o exm. tenente-general Francisco José de Souza Soares de Andréa, no acto da sua posse. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e C.a, 1843.

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Figura 1: Capa do Relatório de 184084

Figura 2: Mapa anexo ao Relatório de 184385

84Falla que o ex.mo presidente da provincia do Espirito Santo dirigio á Assembléa Legislativa Provincial no dia 1.o de abril de 1840. Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1840.85Exposição feita pelo exm. conselheiro Bernardo Jacintho da Veiga, na qualidade de presidente da provincia de Minas Geraes, a seu successor, o exm. tenente-general Francisco José de Souza Soares de Andréa, no acto da sua posse. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e C.a, 1843.

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Figura 3: Mapa anexo ao Relatório de 184486

Objetivos

6. Localizar geográfica e temporalmente, através de fontes primárias e/ou secundárias,

os grupos Puri e Coroado existentes na área determinada para estudo, entre os séculos

XVI e XX.

7. Identificar a partir das fontes bibliográficas, entre outras coisas, a cultura material, o

modo de vida, a estrutura social, a estrutura física e as relações internas e externas

desses grupos.

8. Relacionar as diferentes hipóteses, afirmações ou fatos existentes nessas fontes

bibliográficas e que dizem respeito à origem dos Puri e Coroado.

9. Consultar as populações atuais, das regiões mencionadas nas fontes, no sentido de

confirmar, ou não, as informações bibliográficas a respeito das localizações e

possíveis restos desses grupos indígenas.

86Exposição feita pelo exm. conselheiro Bernardo Jacintho da Veiga, na qualidade de presidente da provincia de Minas Geraes, a seu successor, o exm. tenente-general Francisco José de Souza Soares de Andréa, no acto da sua posse. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e C.a, 1843.

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10. Verificar, em campo, os locais apresentados pelas informações bibliográficas e

reconhecidos pelas informações da população regional como sendo de assentamento

Puri e/ou Coroado.

Resultados e discussões

Após a análise dos relatórios provinciais da província de Minas Gerais dos anos de

1840 a 1844, do Diretório Geral de Índios do ano de 1755 podemos verificar poucas, mas

significantes contribuições de trechos relatando de forma direta ou indireta os indígenas.Com

exceção dos anos de 1841 e 1842 verificamos um tratamento que marginaliza os povos

indígenas. Isso pode ser visto no relatório de 184087:

No Município de Minas Novas houve uma agressão dos índios selvagens, que depois haverem acometido a fazendo de Francisco dos Santos Passos, onde todavia se limitarão a matar algum gado, a destruir plantações, atacaram a guarnição do quartel, do Asavessas,Distrito de Calhão em cujas vizinhanças assassinaram um soldado...conhecendo a deficiência que se sentia de praças na divisão do quartel de militares do Rio Doce ...

Nesse trecho, os indígenas são chamados de selvagens e são apresentadas

argumentações que passam a ideia de atitudes selvagens, mas, se analisarmos a questão

espacial,podemos nos deparar com terras indígenas sendo ocupadas por portugueses.No

trecho que apresentamos, no relatório do mesmo ano, 184088,fica clara a forma como os

indígenas eram tratados: selvagens e criminosos:

... obedeço a imperiosa Lei da necessidade,quando ela exige que se empregue a força armada contra as HORDAS SELVAGENS, eu não deixarei por isso de insistir nas idéias...acerca da catequese e civilização desses mesmo indígenas, que errantes nas matas, inúteis a si mesmo e hostis a sociedade , poderiam ser chamados ao grêmio dela pelas diversas maneiras já adotados com feliz resultado em muitas partes da América ...

Além do fato da marginalização desses indígenas, é notória a intenção de sua

catequização. Ao serem chamados de “errantes”, denota que o são perante o império

português, o que nos trás uma problemática entorno do termo e seu significado.

87Falla dirigida á Assembléa Legislativa Provincial de Minas-Geraes na sessão ordinaria do anno de 1840 pelo presidente da provincia, Bernardo Jacintho da Veiga. Ouro-Preto, Typ. do Correio de Minas, 1840.88 Relatório de 1840, op. cit.

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Essa marginalização continua nos relatórios seguintes. No relatório de 184389, por

exemplo, o Presidente da Província das Minas Gerais relata que “Essa província é uma das

que mais diversas nações de índios tem em si,os quais são sempre pobres e parece-me claro

que sempre que lhes for feita alguma violência lhes caberá em cheio o antigo provérbio – tem

razão, mas falta-lhe a justiça.”.

Minas Gerais é reconhecida como a Província onde se tem um grande número de

povos indígenas, geralmente conhecidos como violentos,embora não se faça distinção de que

povos indígenas eram, mesmo esperando-se que houvessem povos semelhantes.

Um dos temas mais comentados nos relatórios provinciais de Minas Gerais é a

abertura de estradas. Ao analisarmos os relatóriossão geradas expectativas de relatos sobre

indígenas quando da abertura dessas estradas, o que acaba por não ser concretizado, embora

possamos supor, sem que tenham sido citados, sua presença. Um exemplo poderia ser no

relatório de 184090, onde é dito que “A ponte do Paraybuna foi queimada pelos rebeldes e

algum trabalho vai dar para reconstrução...”. É provável que estes rebeldes sejam indígenas.

O trabalho requer atenção nas particularidades. No relatório de 184491, ainda em

análise, deparamo-nos com o seguinte relato: “...mandei abrir uma picada desde Cuietê por

Abre-Campo até encontrar a nova estrada do Espírito Santo, entre Matipó e Manhuassu ...

uma grande revolução nos interesses daqueles habitantes que não sabem hoje o que hão de

fazer com seus gados e outros efeitos...”.

A construção de estradas na província mineira foi intensa no século XIX, e em vários

momentos pode-se perceber, de forma indireta, que o acontecimento influenciaria os nativos

daquela área, como é o caso do trecho citado acima, onde o Presidente da Província afirma

que a construção da estrada que uniria Minas Gerais ao Espírito Santo mudaria os hábitos dos

habitantes ao longo do caminho, inclusive dos nativos, uma vez que a começar pelo nome do

local onde esta estrada tem inicio, Matipó, nome derivado da expressão indígena match-poo,

que significa milho em pó, e acabando em Manhuassu, também de nome derivado de

expressão indígena, que pode, de acordo com o entendimento, significar chuva grande, rio

grande ou peixe amarelo grande, tudo lembra e trata de nativos.

89Exposição feita pelo exm. conselheiro Bernardo Jacintho da Veiga, na qualidade de presidente da provincia de Minas Geraes, a seu successor, o exm. tenente-general Francisco José de Souza Soares de Andréa, no acto da sua posse. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e C.a, 1843.90 Relatório de 1840, Op. cit.91Falla dirigida á Assembléa Legislativa Provincial de Minas Geraes na abertura da sessão ordinaria do anno de 1844 pelo presidente da provincia, Francisco José de Souza Soares d'Andrea. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e Comp., 1844.

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Não deixando de analisar, também, o Diretório Geral de Índios que intensifica ainda

mais o processo de margilanização esses povos indígenas, em trechos do diretório podemos

observar os indígenas:

... haverá em cada uma das sobreditas Povoações, em quanto os Índios não tiverem capacidade para se governarem, um Diretor, que nomeará o Governador, e Capitão General do Estado, o qual deve ser dotado de bons costumes, zelo, prudência, verdade, ciência da língua, e de todos os mais requisitos necessários para poder dirigir com acerto os referidos índios debaixo das ordens, e determinações seguintes, que inviolavelmente se observarão enquanto Sua Majestade o houver assim por bem, e não mandar o contrário. (Diretório Geral de Índios, capítulo 1º )92

Trata-se os povos indígenas como povos necessitados de uma administração que tenha

bons costumes, já que segundo o próprio diretório os índios não tinham:

Não se podendo negar, que os índios deste Estado se conservaram até agora na mesma barbaridade, como se vivessem nos incultos Sertões, em que nasceram, praticando os péssimos, e abomináveis costumes do Paganismo, ... (Diretório Geral de Índios, capítulo 3º )93

Em todo Diretório é visível a intenção de cristianizar os indígenas com abertura de

escolas aonde seja obrigado o ensino religioso com meninas e meninos separados.

Outro relato interessante a respeito dos índios e descrito nos relatórios é o fato de muitos se

chamarem de negros.

Entre os lastimosos princípios, e perniciosos abusos, de que tem resultado nos Índios o abatimento ponderado, é sem dúvida um deles a injusta, e escandalosa introdução de lhes chamarem Negros; querendo talvez com a infâmia, e vileza deste nome, persuadir-lhes, que a natureza os tinha destinado para escravos dos Brancos, como regularmente se imagina a respeito dos Pretos da Costa da África. (Diretório Geral de Índios, capítulo 10º )94

Conclusão

Dos relatórios lidos o que mais nos chama atenção sobre a questão indígena é o fato

dos mesmos não serem citados, ate então, quando se fala da construção das estradas e o fato

de quando se fala desses povos indígenas sem pré colocá-los como violentos, rebeldes e povos

que precisam ser catequizados.

92 Diretório que se deve observar nas Povoações dos Índios do Pará, e Maranhão, enquanto Sua Majestade não mandar o contrário, In: ALMEIDA, Rita Heloísa de. O Diretório dos índios: um projeto de “civilização no Brasil do século XVIII, Brasília: UNB, 1997.93 ALMEIDA, 1997, op. cit.94 ALMEIDA, 1997, op. cit.

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No critério espacial é percebível a localização de povos indígenas sempre próximos

aos rios como é o caso do rio Manhuassu, Matipó, Cuietê, Paraybuna, que é um dos rios mais

citados no relatório e Rio Doce.

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Os Relatórios do Presidente da Província do Espírito Santo

Michelle Moraes Aniceto Neto95

Vlademir José Luft96

Colaboradores: Jefferson Eduardo dos Santos Machado97

Marcelle Barcellos Jabor98

João Luiz Figueira Ribeiro Junior99

Leidiane de Castro Gonçalves100

Marina Aparecida Martins da Cruz101

Apoio

UniMSB – Centro Universitário Moacyr Sreder Bastos

Apresentação

95 Aluna do Curso de Licenciatura em Geografia do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”.96 [email protected], Professor Adjunto no Curso de História do UniMSB; Doutor em História Social pela UFRJ; Pesquisador e Coordenador do projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites” e Coordenador do Grupo de Estudo e Trabalho (GET) “História do Brasil (re)visitada: do descobrimento à abdicação”. 97Professor Assistente no Curso de História do UniMSB; Mestre em História Comparada pelo Programa de Pós-Graduação em História Comparada da UFRJ; Pesquisador Colaborador do Programa de Estudos Medievais da UFRJ e Pesquisador Assistente no projeto de pesquisa “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.98 Professor do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciado em História pelo UniMSB; Pós-Graduando em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.99 Professora do Ensino Fundamental da rede privada da cidade do Rio de Janeiro, Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduada em Arte e Cultura pela Universidade Candido Mendes; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.100 Licenciada em História pelo UniMSB; Pós-Graduanda em História do Brasil Colonial no UniMSB e Auxiliar de pesquisa no projeto “A literatura de viajantes e cronistas: suas possibilidades e limites”.101 Aluna do Curso de Licenciatura em História do UniMSB, Estagiária de Iniciação Científica do Programa de Iniciação Científica do UniMSB no projeto “O indígena nos Relatórios de Presidente de Província do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo ”.

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Estabelecida a partir de 1534, quando da implantação do sistema de Capitanias

Hereditárias para a colonização do Brasil, o território compreendido entre a foz do rio Mucuri

até a foz do rio Itapemirim foi doada a Vasco Fernandes Coutinho102, que a batizou de

Capitania do Espírito Santo, por ser, o dia do desembarque, um domingo de Pentecostes.

Neste mesmo local decidiu erguer uma povoação conhecida hoje como Vila Velha, onde sob a

capela de São João e uma fortificação, erigiu as primeiras habitações.

A partir de 1821, devido ao juramento de D. João, em obediência às leis portuguesas,

estas Capitanias passaram a ser denominadas Províncias, confirmadas pela Constituição

Outorgada de 1824 (Oliveira, 2008) 103.

Figura 1: Província do Espírito Santo104

Com um perfil específico, os relatórios do Presidente da Província do Espírito Santo105

têm sido apresentados na abertura da Assembléia Legislativa Provincial, figura 1, relatando,

de forma geral, os mais diversos eventos, desde a casa imperial, passando pela polícia,

pelas leis, pela educação, pela igreja, pelas obras públicas, pela iluminação pública,

pela saúde pública, pelos hospitais, pela vacinação, pelos impostos, arrecadação e finanças,

102 Fidalgo português agraciado por D. João III com uma das Capitanias Hereditárias distribuídas no Brasil. Também participou das conquistas portuguesas na África e na Ásia.103 OLIVEIRA, José Teixeira de. História do Estado do Espírito Santo, coleção Canaã, vol. 8, 3ª ed., Vitória: SEC-SEE-APEES, 2008.104 KRAUSS, C.. Mappa geral da Provincia do Espirito-Santo relativo às colonias e vias de comunicação [Material cartográfico] / por C. Krauss. - Escala 1:1885000. - [Rio de Janeiro]: Lithografia do Imperial Instituto Artístico, 1866. - 1 mapa: litografia, color. ; 45,50x34,50 cm em, folha de 59,70x44,60 cm, disponível em http://purl.pt/1965, consultado em outubro de 2011.105 Disponíveis em http://www.crl.edu/brazil/provincial/esp%C3%ADrito_santo, consultados entre julho e outubro de 2011.

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pelos índios e a catequese, pelas colônias e os imigrantes, pela municipalidade,

pelo judiciário, pelo executivo, e por informações de caráter geral, apresentados em mapas e

estatísticas, como os apresentados no relatório de 1848106, onde consta um mapa dos

nascimentos, batismos, casamentos, falecimentos e enterros ocorridos nas mais diversas

freguesias da Província no ano de 1846 (figura 2), ou no relatório de 1841, onde consta um

mapa das pessoas vacinadas na província naquele ano (figura 3).

Figura 2: Capa do Relatório de 1840107

106 Relatório do presidente da província do Espírito Santo, o doutor Luiz Pedreira do Coutto Ferraz, na abertura da Assembléa Legislativa Provincial no dia 23 de maio de 1847. Rio de Janeiro, Typ. do Diario de N.L. Vianna, 1848.107 Falla que o ex.mo presidente da província do Espírito Santo dirigio á Assembléa Legislativa Provincial no dia 1.o de abril de 1840. Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1840.

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Figura 3: Mapa anexo ao relatório de 1841108

Figura 4: Mapa anexo ao relatório de 1840109

Destes relatos, os que mais nos chamam a atenção são os que mencionam o elemento

indígena. Principalmente encontrados com o título de “Índios”, “Civilização dos Indígenas” e

108 Falla com que o ex.mo presidente da provincia do Espirito Santo, José Joaquim Machado d'Oliveira, abrio a Assembléa Legislativa Provincial no dia 1.o de abril de 1841. Rio de Janeiro, Typ. Nacional, 1841.109 Anexo da Falla que o ex.mo presidente da provincia do Espirito Santo dirigio á Assembléa Legislativa Provincial no dia 1.o de abril de 1840. Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1840.

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“Cathequese”, relatam, como acontece no Relatório de 1845110, que “A catechese e a

civilisação dos indígenas marcha mui lentamente.”.

No que tange aos relatos, repetidas vezes feitas, dão conta “dos indígenas, que

habitam as extensas matas do Rio-Doce” 111, que transitam por seus aldeamentos e que

interferem na abertura de estradas, que devem ligar as vilas e servem-se das trilhas deixadas

pelos índios.

Objetivos

11. Localizar geográfica e temporalmente, através de fontes primárias e/ou secundárias,

os grupos Puri e Coroado existentes na área determinada para estudo, entre os séculos

XVI e XX.

12. Identificar a partir das fontes bibliográficas, entre outras coisas, a cultura material, o

modo de vida, a estrutura social, a estrutura física e as relações internas e externas

desses grupos.

13. Relacionar as diferentes hipóteses, afirmações ou fatos existentes nessas fontes

bibliográficas e que dizem respeito à origem dos Puri e Coroado.

14. Consultar as populações atuais, das regiões mencionadas nas fontes, no sentido de

confirmar, ou não, as informações bibliográficas a respeito das localizações e

possíveis restos desses grupos indígenas.

15. Verificar, em campo, os locais apresentados pelas informações bibliográficas e

reconhecidos pelas informações da população regional como sendo de assentamento

Puri e/ou Coroado.

Resultados e discussões

Através da analise das informações extraídas de forma direta ou subjetiva dos

Relatórios de Presidente da Província do Espírito Santo, acrescida das informações contidas

110 Falla com que o exm. vice-presidente da provincia do Espirito Santo, José Francisco de Andrade e Almeida Monjardim, abrio a Assembléa Legislativa Provincial no dia 23 de maio de 1844. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e Comp., 1845.111 Op. cit.

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em outras fontes históricas primárias, como por exemplo, o decreto lei n° 426 de 1845, temos

a possibilidade através do cruzamento do resultado destas obter elementos que nos conduzam

ao caminho da descoberta e entendimento da multiplicidade a cerca das características

específicas de cada grupo indígenas que habitara e/ou circula pela região do Rio Doce.

Conclusões

Destes relatos, os que mais nos chamam a atenção são os que mencionam o elemento

indígena. Principalmente encontrados com o título de “Índios”, “Civilização dos Indígenas” e

“Cathequese”, como acontece no Relatório de 1845112, que descreve “A catechese e a

civilisação dos indígenas marcha mui lentamente.”.

No que tange aos relatos, repetidas vezes feitos, dão conta “dos indígenas, que

habitam as extensas matas do Rio-Doce” 113, que transitam por seus aldeamentos e que

interferem na abertura de estradas, que devem ligar as vilas e servem-se das trilhas deixadas

pelos índios.

Através das analises estabelecidas até o presente momento, destacamos a aceitação da

catequese como critério utilizado pelos representantes do Governo Imperial como elemento

diferenciador do nativo selvagem.

Material e métodos

Entendendo a metodologia como os meios práticos e teóricos pelos quais um

pesquisador busca resolver determinado problema ou tratar determinado objeto de estudo,

apresentamos a seguir a maneira como trabalharemos os grupos indígenas Puri e Coroado.

Devemos ressaltar, ainda, que a parte técnica do trabalho deve estar, sempre, de acordo

com a teoria proposta, uma vez que acreditamos ser ela quem determina a técnica, que por sua

vez nos permite chegar ao objetivo proposto.

Com o intuito de facilitar e de melhor orientar a pesquisa, preparamos, com base nas

obras de Wied, Casal, Lamego, Teixeira e Pizarro, uma série de palavras-chave que nos

112 Falla com que o exm. vice-presidente da provincia do Espirito Santo, José Francisco de Andrade e Almeida Monjardim, abrio a Assembléa Legislativa Provincial no dia 23 de maio de 1844. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J. Villeneuve e Comp., 1845.113 Op. cit.

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guiarão durante toda a pesquisa com as fontes bibliográficas. Esta lista de termos-chave

deverá ser com toda a certeza, alterada no decorrer do tempo. Assim, novos termos serão

acrescentados a ela e muitos, já existentes, deixarão de ser utilizados. Em momento algum os

termos que deixados de ser utilizados serão retirados da listagem, uma vez que com isso

poderemos mostrar, com facilidade, a evolução da pesquisa.

Toda a referência bibliográfica consultada será fichada, retirando-se dela localizações,

descrições a respeito da cultura material, do modo de vida, da estrutura social, da estrutura

física dos indivíduos, das relações internas e externas dos grupos, bem como todas as

referências a autores e trabalhos sobre os assuntos.

No que diz respeito ao contato com as populações, no sentido de verificar as

informações obtidas com a bibliografia, à abordagem para obtenção de informações acontece

sempre com a cordialidade e paciência, tendo como intuito, saber da existência de registros

rupestres, de material cerâmico, de material lítico e de enterramentos. A linguagem usada para

tal deve ser sempre, compatível com o nível das pessoas com as quais se está trocando

informações. Assim, os registros rupestres podem vir a ser “desenho”, o material lítico ser

“pedra de curisco”, os enterramentos serem “cemitério de caboclo” e o material cerâmico

serem “pote de barro”.

Fonte

Relatório de Presidente da Província do Espírito Santo de 1840.

Relatório de Presidente da Província do Espírito Santo de 1841.

Relatório de Presidente da Província do Espírito Santo de 1842.

Relatório de Presidente da Província do Espírito Santo de 1843.

Relatório de Presidente da Província do Espírito Santo de 1844.

Relatório de Presidente da Província do Espírito Santo de 1845.

Relatório de Presidente da Província do Espírito Santo de 1846.

Referencial bibliográfico

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Decreto Lei N° 426.

OLIVEIRA, José Teixeira de. História do Estado do Espírito Santo, coleção Canaã,

vol. 8, 3ª ed., Vitória: SEC-SEE-APEES, 2008.

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